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AVALIAÇÃO DAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DO CONCRETO DE PÓS
REATIVOS COM ADIÇÃO DE CELULOSE NANOFIBRILADA
F. G. D. Machado, J. V. B. Lemes, L. G. Pedroti, G. E. S. Lima, W. E. H.
Fernandes, A. C. Gusmão, B. C. Mendes
Laboratório de Materiais de Construção, Universidade Federal de Viçosa,
36570-900, Viçosa, MG, [email protected]
RESUMO
O concreto de pós reativos (CPR) é um tipo de concreto isento de agregado
graúdo, sendo admitidos grãos de no máximo 2mm. Usualmente este material é
dosado através do Método do Empacotamento, buscando assim o preenchimento
ótimo de sua granulometria. Não raro, ao CPR são adicionadas fibras, uma vez que
se trata de um material extremamente frágil. A celulose nanofibrilada (CNF) é um
biopolímero que pode ser extraído de diversos materiais lignocelulósicos, sendo
oriunda de fontes renováveis. Devido às crescentes preocupações ambientais e
econômicas, o estudo e a utilização de novas fontes de matérias-primas a partir de
fontes renováveis e resíduos industriais tem crescido significativamente nos últimos
anos. Neste contexto, essa pesquisa avaliou os impactos da adição de diferentes
teores de CNF ao CPR e foram avaliados o módulo de elasticidade e resistências à
compressão, ao cisalhamento e à tração na flexão.
Palavras-chave: Concreto de pós reativos, Concreto de pós reativos com
adição de CNF, CPR com adição de CNF.
INTRODUÇÃO
Até o final do século XIX os sistemas construtivos usuais eram as estruturas
em madeira e em alvenaria, sendo a alvenaria de pedras ou de tijolos o sistema
estrutural empregado nas obras mais importantes. Dentro desse contexto, buscava-
se uma maneira de unir essas pedras de forma coesa, e assim inicia a história da
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cal, do cimento e do concreto, como aglomerantes para argamassas de alvenaria
(CARVALHO, 2008[4]).
Desde então, o concreto se tornou o material mais utilizado na construção civil,
principalmente em conjunto com o aço, formando o concreto armado, sendo uma
opção muito utilizada por projetistas, construtores e operários da construção civil
(TUTIKIAN, ISAIA, & HELENE, 2011[7]).
O concreto convencional (CC) é composto basicamente de cimento, agregado
graúdo, agregado miúdo e água. Com o passar do tempo, para atender a
determinadas exigências, foi preciso aprimorar o CC, incorporando outros elementos
à mistura, como minerais, aditivos, fibras e técnicas de execução diferentes. Assim
foi desenvolvido o concreto de alto desempenho (CAD), um material que apresenta
propriedades superiores ao CC, como maior resistência mecânica, melhor
trabalhabilidade, estética, integridade e, principalmente, maior durabilidade.
Como alternativa ao CAD, após pesquisas realizadas no Canadá e na França a
partir de 1990, foi desenvolvido o concreto de pós reativos (CPR). Um concreto de
ultra-alto desempenho (CUAD), que foi projetado, inicialmente, para atender às
exigências industriais e militares, sendo um material de alta tecnologia, que atinge
resistência de compressão numa faixa entre 200 MPa e 800 MPa, enquanto um CC
atinge até 60 MPa e um CAD atinge uma faixa de 60 MPa a 200 MPa (BINA,
1999[3]).
O CPR é composto basicamente de materiais finos, com partículas de tamanho
inferior a 2 mm, como areia de quartzo, cimento Portland, pó de quartzo, sílica ativa,
aditivo superplastificante e uma relação água/cimento muito baixa.
Devido às crescentes preocupações ambientais e econômicas, o estudo e a
utilização de novas fontes de matérias-primas a partir de fontes renováveis e
resíduos industriais têm crescido significativamente nos últimos anos. Neste
contexto, as fibras de celulose têm muitas características que tornam seu uso
atrativo e competitivo, tais como baixo custo, baixa densidade, alta resistência, não
são materiais abrasivos, não desgastam os equipamentos de processo, não são
tóxicos, podem ser facilmente modificados por agentes químicos, são uma classe de
polímeros mais abundantes na natureza e originados de fontes renováveis
(MIRANDA, et al., 2012[5]).
A celulose nanofibrilada (CNF) é produzida a partir da desintegração mecânica
das fibras celulósicas, principalmente de suas superfícies, ocasionando o
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Tabela 1: Traço padrão (em massa)
rompimento da parede celular e a posterior exposição das fibrilas e microfibrilas
(TURBAK, SNYDER & SANDBERG, 1983 apud SYVERUD et al, 2010[6]).
Com o propósito de se testar a adição de uma fibra de origem natural na
mistura, o presente trabalho sugere o desenvolvimento de um CPR com adição de
CNF, pois existem poucas pesquisas relacionadas à incorporação desse tipo de
material neste concreto.
MATERIAIS E MÉTODOS
Neste trabalho foram utilizados o cimento Portland CPV ARI Fácil da Holcim, a
areia quartzosa e pó de quartzo da mineração Jundu, a sílica ativa da Elkem e o
aditivo superplastificante Glenium 51 da Basf.
Foi utilizado como referência o traço de CPR elaborado por Vanderlei (2004)[8]
em sua tese de doutorado. A proposta inicial era reproduzir o traço de CPR usado
por ele, contudo, com a relação de a/c de 0,18 não obteve trabalhabilidade nem
adensamento adequado. Assim, foram testadas algumas relações de a/c, sendo
0,23 o menor a/c que apresentou boa trabalhabilidade. Outra modificação realizada
para melhorar a trabalhabilidade do CPR foi aumentar o teor de aditivo
superplastificante de 3% para 4%. Nas Tabelas 1 e 2 são mostradas,
respectivamente, o traço adotado e o consumo de materiais utilizado no traço
padrão deste trabalho.
Tabela 2: Consumo de materiais (kg/m³)
Inicialmente a proposta desta pesquisa era a de testar o CPR com adições de
0; 0,25 e 0,5% de CNF. No entanto, a adição de 0,5% resultou num concreto muito
seco, o que não permitiu um bom adensamento. Então, as adições foram
redimensionadas, passando a ser 0; 0,10%; 0,20% e 0,25%.
A série F0 consiste no traço padrão, sem adição de CNF. Na série F1 foi
adicionado 0,25% de CNF, na série F2, 0,20% e na F3, 0,10%. Durante a mistura
Cimento Areia Pó de quartzo Sílica ativa Superplastificante Água
853,21 939,12 200,12 209,89 34,13 197,29
Cimento Areia Pó de quartzo Sílica ativa Superplastificante Água
1 1,101 0,235 0,246 0,04 0,23
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Figura 1: Corpo de prova para ensaio de cisalhamento.
Fonte: ABNT NBR 7190 (1997).
dos traços e moldagem dos corpos de prova a temperatura da sala variou de 25 a
30°C e a umidade relativa do ar de 49 a 87%.
Para o material em seu estado fresco foi avaliada sua consistência através do
Flow Table.
Para cada série, foram moldados 12 corpos de prova cilíndricos com diâmetro
de 50 mm e altura de 100 mm, onde nas idades 1, 3, 7 e 28 dias foram
determinadas a resistência à compressão e do módulo de elasticidade. Para o
ensaio de flexão a três pontos, foram moldados três CP`s com dimensões de
40x40x160 mm, sendo ensaiados aos 28 dias.
Também foram moldados 3 CP`s, para ensaio de cisalhamento, utilizando
como base o ensaio de cisalhamento em madeira, regulamentado pela norma ABNT
NBR 7190:1997 – Projeto de estruturas de madeira[2]. A figura 1 indica as dimensões
dos CP`s.
Para a produção do CPR, primeiramente foram misturados todos os materiais
sólidos (cimento, areia, pó de quartzo e sílica ativa) em um saco plástico, conforme a
Figura 2, de modo que se obteve um material homogêneo e depois colocou-se este
material na cuba da argamassadeira. O aditivo superplastificante foi misturado com
a água e a CNF em um béquer, e a solução resultante era então adicionada na
cuba.
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Figura 3: Corpos de prova.
Figura 2: Mistura dos materiais.
O tempo de mistura variava de acordo com a porcentagem de CNF utilizada,
estando compreendido entre 10 e 25 minutos. A Figura 3 mostra os corpos de prova
fabricados.
As condições de cura dos corpos de prova seguiram a norma ABNT NBR
5738:2015 – Concreto – Procedimento para moldagem e cura de corpos de prova[1].
Após a moldagem, eles foram colocados na câmara úmida, onde permaneceram por
24 h. Terminada a cura inicial, os corpos de prova levados para um tanque com
solução saturada de hidróxido de cálcio onde permaneceram submersos até a data
dos ensaios.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O índice de consistência das séries são mostrados na Figura 4.
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Figura 5: Comparativo da evolução da resistência entre a série de referência e as séries com adição de CNF.
Figura 4: Comparativo dos índices de consistência da série de referência e das séries com adição de CNF.
Vê-se que com o aumento do teor de CNF diminui o espalhamento da massa,
mostrando que a massa perde trabalhabilidade com o incremento das adições
analisadas.
A Figura 5 apresenta o gráfico com a evolução da resistência de cada série ao
longo do tempo.
Os traços com fibra apresentam cerca de 90% da resistência aos 7 dias e,
além disso, o aumento do teor de CNF retarda o ganho de resistência nas primeiras
idades. O traço padrão apresentou um ganho considerável de resistência entre os 7
e os 28 dias, diferentemente dos traços com adição de CNF.
A Figura 6 indica a evolução do módulo de elasticidade com a idade.
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Figura 7: Comparativo da resistência ao cisalhamento entre a série de referência e as séries com adição de CNF.
Figura 6: Comparativo da evolução do módulo de elasticidade entre a série de referência e as séries com adição de CNF.
Nota-se que com 24 horas de idade, o CPR apresenta cerca de 80% do
módulo de elasticidade obtido aos 28 dias. Além disso, não há uma diferença
elevada do módulo de elasticidade entre a série padrão e as séries com adição de
CNF.
A Figura 7 apresenta o gráfico da resistência ao cisalhamento com o desvio
padrão em função do teor de CNF.
Nota-se que as séries com 0,10% e 0,25% apresentaram valores superiores de
resistência ao cisalhamento, porém, não se pode afirmar que esses teores de CNF
proporcionaram ganho na resistência do CPR, pois o desvio padrão da série com
0,10% de CNF foi muito grande.
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Figura 9: Comparativo da resistência à compressão de corpos de prova prismáticos entre a série de referência e as séries com adição de CNF.
Figura 8: Comparativo da resistência à tração na flexão entre a série de referência e as séries com adição de CNF.
A Figura 8 apresenta a resistência à tração na flexão indicando também os
desvios padrões para cada série. Nota-se que a adição da CNF não apresentou
nenhum ganho de resistência à tração na flexão e que o desvio padrão da série com
adição de 0,10% foi relevante.
Após os ensaios de flexão, foi realizado ensaio de compressão nos corpos de
prova prismáticos, e o resultado desses ensaios encontram-se na Figura 9.
Nota-se o traço com 0,20% de CNF apresenta resistência mais elevada, além
disso, o desvio padrão da série com adição de 0,10% de CNF também foi alto.
Para todas as propriedades avaliadas a análise estatística, por meio da análise
de variância, indicou que os resultados obtidos não apresentaram diferença
significativa, exceto para a resistência ao cisalhamento onde a adição de 0,20% de
CNF afetou de forma negativa.
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CONCLUSÕES
Após a produção dos traços com adição de CNF, pode-se notar que quanto
maior a porcentagem de CNF na mistura, mais seca esta ficava, consequentemente,
diminuindo sua trabalhabilidade e prejudicando o adensamento. Com isso, presume-
se que a CNF, por possuir uma elevada área específica, retém água em sua
superfície, reduzindo a água disponível para a hidratação do cimento.
Foi observado que a umidade do ambiente influencia diretamente na
trabalhabilidade e no tempo de abertura da mistura, sendo ambientes mais úmidos
os mais propícios para fabricação do material, uma vez que nessas condições o
CPR perde menos água para o ambiente.
Os resultados de compressão axial obtidos nos ensaios apresentam valores
muito superiores aos do CC, na mesma classe de resistência do CAD, pois estão
abaixo de 200 MPa. Contudo, era de se esperar que isso acontecesse, visto que não
foi utilizada a cura térmica, devido a limitações do laboratório.
Após uma análise estatística, foi constatado que a adição de CNF na mistura
não apresenta significância na resistência à compressão e ao cisalhamento do CPR,
no entanto, a adição de 0,20% de CNF acarretou em uma redução significativa na
resistência à tração na flexão (de 20,8 para 16,2 MPa).
REFERÊNCIAS
[1] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5738: Concreto -
Procedimento para moldagem e cura de corpo de prova. 2 ed. Rio de Janeiro, 2015.
9 p.
[2] ______. NBR 7190: Projeto de estruturas de madeira. 1 ed. Rio de Janeiro, 1997.
107 p.
[3] BINA, Paulo. Concretos de Pós Reativos: uma revolução no conceito do
concreto. Revista Téchne, n.38, jan. 1999. Disponível em
<http://techne.pini.com.br/engenharia-civil/38/artigo287168-1.aspx>. Acesso em: 16
jul. 2015.
[4] CARVALHO, J. D. N. Sobre as origens e desenvolvimento do concreto. Revista
Tecnológica, Maringá, v. 17, p. 19-28, 2008.
[5] MIRANDA, C. S. et al. Thermal, Mechanical and Morphological Properties of
Composites Developedfrom Glycerol and Dicarboxylic Acids Reinforced with
Piassava Fiber. Macromolecular Symposia, v.319, p. 74-82, 2012.
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[6] SYVERUD, K.; CARRASCO, G.C.; TOLEDO, J.; TOLEDO, P.G. A comparative
study of Eucalyptus and Pinus radiata pulp fibres as raw materials for production of
cellulose nanofibrils. Carbohydrate Polymers, v. 84 p. 1033–1038, 2010.
[7] TUTIKIAN, B. F.; ISAIA, G. C.; HELENA, P. Concreto de alto e ultra-alto
desempenho. In: ISAIA G.C. Concreto: ciência e tecnologia - 2 vol. 1. ed. São
Paulo: Ibracon - Instituto Brasileiro de Concreto, 2011. Cap. 36.
[8] VANDERLEI R. D. Análise Experimental do Concreto de Pós Reativos:
Dosagem e Propriedades Mecânicas. 2004. 168 f. Tese (Doutorado em Engenharia
Civil) – Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São
Carlos, 2004.
EVALUATION OF THE MECHANICAL PROPERTIES OF REACTIVE
POWDER CONCRETE WITCH ADDITION OF CELLULOSE NANOFIBERS
ABSTRACT
The Reactive Powder Concrete (RPC) is a type of concrete made of materials
with maximum diameter of 2 mm and with no coarse aggregate. The dosage of RPC
is usually made through the Method of Particle Packing, in order to achieve the
optimum filling between grains. In some cases, fibers are added to the CPR because
of concrete’s fragile behavior. Cellulose nanofibers (CNF) are biopolymers extracted
from lignocellulosic materials and other renewable sources. This work follows the
current trend of using materials from renewable sources and trying to replace usual
materials for renewable ones. In this context, this study quantified the impacts of
adding different concentrations of CNF into CPR by measuring its Young’s Modulus,
compressive and shear strength and tensile strength while bending.
Key words: Reactive Powder Concrete, Reactive Powder Concrete with
addition of CNF, RPC with addition of CNF.
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