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AVALIAÇÃO DA IMPLANTAÇÃO DE MANUFATURA ENXUTA EM UM FABRICANTE DE PRODUTOS HOSPITALARES: A PERCEPÇÃO DOS GESTORES Área Temática: Gestão da Produção Guilherme Krause Alves [email protected] Rogério Nunes [email protected] Tânia Tavares [email protected] Maria das Graças Martins [email protected] Resumo: A utilização da produção enxuta nas organizações tem o propósito de incrementar a produtividade, produzindo o essencialmente necessário e eliminando o que não agrega valor aos clientes, requer ações que incluem mapeamento dos ambientes de sucesso e preparação da organização para a mudança da gestão. O trabalho apresenta um estudo de caso descritivo, com a apresentação da implantação de manufatura enxuta em um fabricante de produtos hospitalares. A partir de entrevistas realizadas com treze gestores e funcionários que participaram da implantação, avaliou o processo e identificou categorias de análise. Como resultados principais, foram identificados que os requisitos e preparativos da citada implantação estão direcionados a uma mudança comportamental que inclui preparação da liderança, alinhada à estratégia da organização, que precisa ser desdobrada para todas as áreas. Palavras-chaves: manufatura enxuta, estratégia de implantação, avaliação

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AVALIAÇÃO DA IMPLANTAÇÃO DE MANUFATURA ENXUTA EM

UM FABRICANTE DE PRODUTOS HOSPITALARES: A PERCEPÇÃO

DOS GESTORES Área Temática: Gestão da Produção

Guilherme Krause Alves

[email protected]

Rogério Nunes

[email protected]

Tânia Tavares

[email protected]

Maria das Graças Martins

[email protected]

Resumo: A utilização da produção enxuta nas organizações tem o propósito de incrementar

a produtividade, produzindo o essencialmente necessário e eliminando o que não agrega

valor aos clientes, requer ações que incluem mapeamento dos ambientes de sucesso e

preparação da organização para a mudança da gestão. O trabalho apresenta um estudo de

caso descritivo, com a apresentação da implantação de manufatura enxuta em um fabricante

de produtos hospitalares. A partir de entrevistas realizadas com treze gestores e funcionários

que participaram da implantação, avaliou o processo e identificou categorias de análise.

Como resultados principais, foram identificados que os requisitos e preparativos da citada

implantação estão direcionados a uma mudança comportamental que inclui preparação da

liderança, alinhada à estratégia da organização, que precisa ser desdobrada para todas as

áreas.

Palavras-chaves: manufatura enxuta, estratégia de implantação, avaliação

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1 INTRODUÇÃO

A manufatura enxuta surgiu na década de 1950 e ganhou notoriedade a partir de 1980,

quando as adaptações de conceitos, somadas a contribuições e elaborações próprias, fizeram

com que surgisse o que se convencionou chamar inicialmente de Sistema Toyota de

Produção.

O termo lean manufacturing, manufatura enxuta, foi utilizado por Womack et al.

(2004) para descrever a transformação e a concepção de organização da manufatura,

destacando-se como sendo um programa aplicável às operações de transformação em geral,

assim como bancos, hospitais e governo. Para Womack e Jones (2004), a manufatura enxuta

proporciona uma maior eficiência e produtividade, com foco maior nos negócios da

organização como um todo e uma transformação cultural na gestão ao estabelecer prioridade

na criação de valor ao cliente, expandindo tal lógica aos demais elos da cadeia produtiva.

Uma implantação implica em mudança cultural e na necessidade de conduzi-la de

modo seguro diante das dificuldades. As técnicas e ferramentas utilizadas inicialmente na

Toyota costumam servir de roteiro nos esforços de produzir apenas o essencialmente

necessário, eliminando processos que não agreguem valor aos clientes (LIKER, 2005).

Também é necessário avaliar os resultados da implantação, pois resultados parciais

costumam contribuir para acomodação, quando favoráveis, ou desistência, quando

desfavoráveis. Liker (2005) destaca a necessidade de disciplina, padronização e rigor na

implantação com mudanças no chão de fábrica e atitudes que reforcem a noção de que

mudanças culturais não ocorrem de forma imediata.

Na implantação da manufatura enxuta são utilizadas várias técnicas, tais como

Mapeamento de Fluxo de Valor (VSM), 5S, Troca Rápida (QCO), Jidoka, Kanban,

Manufatura Celular e Manutenção Produtiva Total (TPM). O ponto de partida é o

Mapeamento de Fluxo de Valor, que permite identificar oportunidades de melhoria, os

principais fluxos e gargalos de produção em seus principais processos produtivos. Após

identificar os principais fluxos e oportunidades de melhoria, estão os movimentos que

propiciam a redução dos desperdícios (DENNIS, 2008).

Assim, o trabalho refere-se a um estudo de caso que descreve a implantação de

manufatura enxuta na unidade de adesivos hospitalares de uma empresa com três unidades

fabris e tem como objetivos (i) descrever as modificações ocorridas na organização e (ii)

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avaliar os resultados, gerando categorias de análise de modificações decorrentes dessa

implantação, a partir da percepção dos envolvidos.

2 ASPECTOS METODOLÓGICOS

Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada por meio de um estudo de caso

descritivo em uma empresa de produtos hospitalares que passou por uma implantação piloto

de manufatura enxuta. O método de raciocínio adotado foi o dedutivo, posto que, baseando-se

no conceito de Bêrni e Fernandez (2012, p.46), compreende-se que o desenvolvimento do

presente trabalho segue uma “construção lógica de acordo com a qual, a partir de duas

proposições chamadas premissas, extrai-se uma terceira, logicamente necessária, chamada

conclusão”. Em tais condições, o fluxo da pesquisa inicia com a descrição do fenômeno em

pauta e finaliza com a definição de categorias de análises, obtidas a partir da realização de

entrevistas com informantes chaves da organização e que poderão ser aplicadas em estudos

futuros semelhantes.

Assim, inicialmente são apresentadas as transformações ocorridas a partir da

implantação na unidade de adesivos hospitalares da empresa. A seguir, os gestores foram

entrevistados, com vistas a buscar suas percepções e avaliação com relação à implantação da

manufatura enxuta na organização. Tais entrevistas ocorreram com base em um roteiro

semiestruturado previamente elaborado e buscou a construção de categorias de análise da

implantação.

Foram identificados, de forma intencional, gestores e funcionários envolvidos com a

implantação da manufatura enxuta, os quais se constituem nos informantes chaves da

pesquisa, sendo selecionados para participar da pesquisa:

a) Sensei responsável pela implantação da gestão lean;

b) Gerente das três plantas da empresa;

c) Coordenadores das três plantas da empresa;

d) Supervisores das três plantas da empresa;

e) Quatro membros do escritório lean da empresa.

O instrumento de coleta de dados foi aplicado e as respostas foram confrontadas com a

literatura existente e documentos disponíveis.

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3 MANUFATURA ENXUTA

A origem da manufatura enxuta costuma ser localizada em 1950, quando Eiji Toyoda

e Taiichi Ohno visitaram uma das plantas da Ford em Detroit (Estados Unidos). Quando

retornaram, analisaram o sistema de produção em massa e sua viabilidade no Japão, propondo

um sistema de produção conhecido como Sistema Toyota de Produção (STP) (GODINHO

FILHO; FERNANDES, 2004, 2005; LIKER, 2005)

De acordo com Dennis (2008), a economia japonesa estava devastada pela guerra e

carente de capital. A Toyota desenvolveu atividades para envolver os membros da equipe em

melhorias de forma total o que era uma ideia absolutamente inovadora (FUJIMOTO, 1999).

A crise mundial do petróleo em 1973 reconfigurou as preferências dos consumidores

por automóveis, economizar combustível passou a ser um requisito fundamental e os

japoneses avançaram no mercado mundial. A Toyota chamou a atenção em 1980, deixando

claro que havia algo de especial na eficiência japonesa, com automóveis que duravam mais e

exigiam menos manutenção que os norte-americanos (LIKER, 2005; DENNIS, 2008).

Liker (2005) afirma que a Toyota transformou excelência operacional em estratégia,

com base nos métodos de melhoria da qualidade, que a empresa tornou famosos no mundo da

indústria, tais como just in time, kaizen, fluxo unitário de peças, autonomação (jidoka) e

nivelamento de produção (heijunka). Essas técnicas ajudaram a provocar a propagação da

produção enxuta. Além disso, o contínuo sucesso na implantação origina-se de um

posicionamento empresarial com base na compreensão das pessoas e da motivação humana.

Assim, busca cultivar lideranças, trabalho em equipes e cultura para criar estratégias, construir

relacionamentos com fornecedores e manter uma organização de aprendizagem.

O Sistema Toyota de Produção passou a ser definido como um processo de cinco

passos: definir o valor do cliente, definir o fluxo de valor, fazê-lo “fluir”, “puxar” a partir do

cliente e lutar pela excelência. Para ser uma manufatura enxuta, é preciso concentrar-se em

fazer o produto fluir através de processos ininterruptos de agregação de valor (lotes unitários

de peças), um sistema puxado a partir da demanda do cliente, reabastecendo somente o que a

operação seguinte consumir em intervalos curtos, e um esforço contínuo por melhorias.

No tocante aos princípios, Womack e Jones (2004) apresentam os seguintes:

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a) Especificar valor – valor deve ser definido pelo cliente final, expresso em um bem

e/ou serviço que atenda suas necessidades a um preço e em um determinado momento.

b) Identificar fluxo de valor – conjunto de ações necessárias para que um produto e/ou

serviço passe pelas três tarefas gerenciais críticas em qualquer negócio: a solução de

problemas, gerenciamento da informação e a transformação física.

c) Fluxo contínuo – fluxo de valor de determinado produto e/ou serviço mapeado e

eliminadas as etapas que geram desperdício. É importante um fluxo contínuo para

mover rapidamente o material, com etapas e informações encadeando processos e

pessoas de modo que os problemas se tornem visíveis. Para Fujimoto (1999), é a chave

para o processo de melhoria contínua e desenvolvimento das pessoas.

d) Sistema puxado – puxar significa que ninguém do fluxo anterior deve produzir bens

ou serviços sem que a etapa seguinte tenha solicitado. Na concepção mais comum, o

cliente retira o produto e preenche-se a lacuna criada com tal retirada.

e) Perfeição – quando é especificado o valor com precisão, etapas fluem continuamente e

os clientes puxam o valor. Então, os envolvimentos com os processos de redução de

esforço, tempo, espaço, custo e erros crescem e, ao mesmo tempo, surge um produto

que se aproxima ainda mais do que o cliente realmente quer (LIKER, 2005).

Os quatro princípios interagem entre si em um círculo poderoso (FUJIMOTO, 1999).

Fazer com que o valor flua mais rápido expõe desperdícios ocultos e, quanto mais puxar, mais

serão revelados os obstáculos, permitindo sua eliminação (DENNIS, 2004).

A manufatura enxuta busca estabilidade, confiabilidade ou robustez dos processos. A

estabilidade de máquinas exige 5S e Manutenção Produtiva Total (TPM), que ampliam a

padronização e a segurança; e a qualidade é reforçada com a prevenção de falhas (jidoka). O

início ocorre com o Mapeamento do Fluxo de Valor (VSM), que permite entender a situação

atual e identificação de oportunidades de melhoria que orientam a configuração futura.

Para Liker (2005), VSM são diagramas de fluxo de material e de informações,

captando processos, fluxo de material e de informações de uma família de produtos e

permitindo identificar perdas no sistema.

Dennis (2008) afirma que o 5S foi projetado para criar um local de trabalho visual,

aparentemente simples, que consiste em: separar; classificar; limpar (e inspecionar);

padronizar e manter. Para Liker (2005), gestão visual é qualquer dispositivo de comunicação

utilizado para avisar rapidamente como e quando um trabalho deve ser executado. Womack e

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Jones (2004) afirmam que padronização é o alicerce da produção e a utilização de um padrão

é a base da excelência. Para Dennis (2008), trabalho padronizado apresenta benefícios como:

a) Estabilidade de processos, que significa possibilidade de repetição;

b) Pontos de início e parada claros para cada processo;

c) Aprendizagem organizacional;

d) Base para o treinamento de funcionários.

Segundo Rother e Shook (2009), as ferramentas do trabalho padronizado ajudam a

identificar valor e desperdício em um processo que consiste de três elementos:

a) Tempo takt, que fornece frequência que deve ocorrer a produção de um produto;

b) Sequência de trabalho, que define a ordem em que o trabalho é realizado;

c) Estoque em processo, a quantidade mínima de peças necessárias para que o operador

complete o processo sem ficar parado na frente de uma máquina.

O objetivo básico do desenvolvimento, realização e manutenção de um arranjo físico é

aumentar ou conservar a rentabilidade, e a forma como é concebido pode também incrementar

qualidade, atendimento ao cliente e satisfação dos empregados (LIKER, 2005). Para Harmon

e Peterson (1991), mudanças nos arranjos físicos caracterizam-se por processos de construção

com anexos grandes e, à medida que processos novos e revisados são posicionados nos

espaços disponíveis, a fábrica fica menos produtiva, pois as instalações originais possuem

formatos variados e irregulares para incorporação de processos novos.

O tamanho e a forma dos blocos de processos também têm de ser determinados pelas

dimensões dos equipamentos. Há casos em que é possível modificar o desenho do

equipamento usado, de processos longos e retos para processos relativamente curtos

(HARRIS; HARRIS, WILSON, 2008). Nestes casos, processos em forma de “U” simplificam

o arranjo físico global da fábrica, podendo reduzir o custo total de equipamentos. Harmon e

Peterson (1991) apresentam as vantagens de tal arranjo físico, a saber:

a) As extremidades de entrada e saída de cada processo estão o mais próximo possível do

corredor da fábrica;

b) Cada corredor atende a processos em ambos os lados; assim, a razão entre o espaço dos

corredores e dos processos é maior que a de um corredor adjacente a uma parede ou

uma instalação não produtiva;

c) Formato em U é relativamente fácil de comprimir e expandir, como um acordeão, para

se enquadrarem.

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Com relação à Manutenção Produtiva Total (TPM), Paranhos Fº (2007) afirma que o

envolvimento do operador faz parte da técnica ao participar da manutenção de sua máquina

com atividades de lubrificação, ajustes e recebe treinamento para identificar ruídos, vibração e

temperatura, que podem servir como alerta de mau funcionamento.

Dennis (2008) considera que o 5S leva naturalmente à Manutenção Produtiva Total,

essencial à estabilidade através do treinamento da equipe para cuidar de seu próprio

equipamento. Esta representa mudança da mentalidade, com meta de nenhuma interrupção

nas operações das máquinas através do envolvimento da equipe na eliminação das seguintes

perdas: a avaria do equipamento, atrasos na montagem e nos ajustes, tempo ocioso, pequenas

paradas, velocidade reduzida, defeitos de processamento e rendimento reduzido.

Outro aspecto é a necessidade de redução dos tempos de preparação de máquina. A

troca rápida de ferramenta (Quick Change Over – QCO) é fundamental para viabilizar a

flexibilidade na manufatura. Para Rother e Shook (2009), a redução de setup é importante por

três razões:

a) Com tempo de preparação alto, lotes de fabricação e estoques aumentam;

b) Com técnicas troca rápida, diminuem erros na regulagem das ferramentas;

c) Técnicas de conversão rápidas disponibilizam capacidade adicional para as máquinas.

O conceito de tempo de ciclo (lead time) em conjunto com a redução dos tempos de

preparação (setup) permite programar a produção de forma nivelada, conseguindo operar com

lotes ideais (SMALLEY, 2004; CONCEIÇÃO, 2009).

Os japoneses deram o nome de Heijunka para o nivelamento global da programação

(em termos de variedade e volume dos itens demandados) diretamente ligado ao desempenho

de vendas. Nivelar a produção significa evitar o impacto da oscilação da demanda, trazendo

estabilidade nas operações. Harmon e Peterson (1991) reforçam que, ao se reduzirem os

setups, torna-se possível a produção diária de todos os itens. A meta derradeira dos

fabricantes deveria ser atender às solicitações dos clientes através da produção, sem estoques,

exequível quando o lead time de produção é reduzido, o setup das máquinas minimizado e a

capacidade adaptada para atender a picos de demanda.

Os momentos de melhoria, chamados de Kaizens, significam, para Imai (1988), o

contínuo melhoramento envolvendo todos. Melhorias em qualidade, custo e programação são

importantes, mas sua ênfase está na melhoria dos processos (DENNIS, 2008).

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A flexibilidade tornou-se uma das virtudes e um dos requisitos mais evidentes da

manufatura. Com mercados turbulentos, concorrentes ágeis e mudanças tecnológicas, a

administração da manufatura tem que reavaliar sua habilidade em modificar o que faz e como

faz (WOMACK; JONES, 2004). As principais razões para a flexibilidade na manufatura são

prazos de entrega, ampliação do sortimento de produtos, variedade de níveis de saída e

variedade de promessas de prazo de entrega. A flexibilidade afeta três outros objetivos de

desempenho: tornar a manufatura mais confiável; acelerar o fluxo e reduzir custos diretos.

4 DIFICULDADES NA IMPLANTAÇÃO DE MANUFATURA ENXUTA

Para Nishida (2014), a primeira é quando não há alinhamento das áreas e foco nos

objetivos organizacionais. A troca constante de comando e a multiplicidade de iniciativas

estratégicas, algumas conflitando entre si, são fatores relevantes na implantação. A delegação

da implantação a coordenadores, ou gerência de produção, reforça a noção de ferramenta e

não de um sistema. (SMALLEY, 2004; NISHIDA, 2014)

Gestão das vendas é vital para um sistema puxado, evitando oscilações artificiais nos

volumes e no sortimento, com a finalidade de maximizar resultados da própria área em

detrimento das metas organizacionais; e há necessidade de trabalhar com vendas ou previsões

que utilizem metodologia consistente de análise (SMALLEY, 2004).

Também ocorre quando o Planejamento, Programação e Controle da Produção (PPCP)

percebe a mudança do sistema, com cada processo se comunicando diretamente com outro

sem que passe pelo PPCP (DENNIS, 2008). O sistema puxado pode perder agilidade,

envolvimento e engajamento das pessoas no chão de fábrica em caso de interferência e pode

continuar com elementos do sistema empurrado, mesmo com o kanban substituindo as antigas

ordens de produção (SMALLEY, 2004)

Para Nishida (2014), ainda há a falta de acompanhamento dos níveis do supermercado

e a não revisão de suas políticas de reposição. Ao dimensionar uma única vez e não revisar o

cálculo enfrentará muitas dificuldades em caso de variações significativas de demanda

(SMALLEY, 2004).

Por fim, o treinamento das pessoas, sem acompanhamento próximo dos supervisores,

com responsabilidades pouco claras, autonomia restrita e as dificuldades geradas pelos

sistemas de Tecnologia da Informação (TI), tornando a gestão mais complexa e menos visível.

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Antes da implantação, devem ser verificadas as condições básicas necessárias:

estabilidade dos 4M (Material, Método, Mão-de-obra e Máquina), estabilidade da

programação e do pessoal envolvido, compromissos da alta administração (NISHIDA, 2014),

capacidade disponível e fluxo produtivo claro, bem definido, em fluxo contínuo, padronizado

e com o ritmo definido pelo cliente (LIKER, 2005).

5 TRANSIÇÃO PARA MANUFATURA ENXUTA

Cada empresa pode utilizar-se de estratégias específicas na implantação. Para Jones e

Womack (2004), muitas implantações ocorrem por meio de melhorias (kaizens) pontuais.

Bons resultados iniciais motivam, entusiasmam e estimulam as empresas, mas não garantem

efeitos sustentáveis de médio ou longo prazo. Segundo estes autores, as atividades precisam

focalizar os fluxos de valor essenciais, estratégicos, deixar de ter um enfoque em ferramentas

isoladas e passar para uma visão sistêmica. Sugerem, ainda, iniciar pela necessidade,

identificando o problema e a ferramenta adequada. Quanto mais relevante o problema, maior

o impulso da implantação.

Liker (2005) afirma que ao analisar o fluxo de valor mais relevante, notar-se-á que a

manufatura é um estágio importante. As ferramentas já são conhecidas e testadas,

favorecendo o início pelo chão de fábrica, mas é necessário um diagnóstico prévio de

estabilidade (materiais, máquinas, mão-de-obra e métodos).

O mesmo ocorre com o gerenciamento da força de trabalho com instruções pouco

claras, falta de mão-de-obra qualificada ou métodos inadequados que afetam indicadores de

produtividade e qualidade (DENNIS, 2008). Para Nishida (2014), o desenvolvimento de

pessoas é essencial para o surgimento de habilidades, comportamentos, qualificações e

experiências. Liderança é essencial e os diretores devem se envolver diretamente,

acompanhando e apoiando a implantação; os gerentes devem ter um foco maior no chão de

fábrica, entendendo como desenvolver suas atividades.

6 A IMPLANTAÇÃO NA UNIDADE DE ADESIVOS HOSPITALARES

A implantação da manufatura enxuta iniciou com um treinamento das pessoas de

liderança de produção, engenharia de automação, planejamento da produção, qualidade,

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engenharia de processo e operadores das máquinas com intenção de nivelar conhecimentos

antes do início da implantação.

A seguir, foi definida a família de produtos para realização do primeiro Mapa de Fluxo

de Valor (VSM): família de esparadrapos pequenos. Foi feito um mapa desde a entrada da

matéria prima até o produto acabado, passando pelos processos de agregação de valor,

identificando melhorias. O VSM do estado atual está na Figura 1.

Figura 1 – Mapa de fluxo de valor atual - esparadrapo

Fonte: Dados da empresa

A Figura 2 apresenta o estado futuro do fluxo, a partir da identificação dos kaizens.

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Figura 2 – Mapa de fluxo de valor futuro - esparadrapo

Fonte: Dados da empresa

A partir da definição, as transformações na família de esparadrapos foram: 5S, limpeza

e organização do local de trabalho; TPM, maior confiabilidade e produtividade do

equipamento de corte; dois eventos de arranjo celular, proporcionando o arranjo físico em

fluxo contínuo; um evento de troca rápida, para diminuir o setup; e um kaizen de trabalho

padrão e gestão visual, onde as atividades foram padronizadas e indicadores e medidores de

produção estabelecidos. Os trabalhos na área piloto aconteceram em aproximadamente quatro

meses e a rotina dos eventos kaizen está retratado na Figura 3.

Figura 3 – Rotina dos eventos kaizen

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Fonte: Dados da empresa

A replicação iniciou à medida que a equipe se familiarizava com as ferramentas, onde

processos similares aos da área piloto passaram pelas mesmas modificações. O plano diretor

foi resultante, concebendo a ampliação do programa com um planejamento para o parque

fabril e redimensionamento das capacidades dos maquinários.

7 AVALIAÇÃO DA IMPLANTAÇÃO

De acordo com as entrevistas, foram destacadas categorias de análises para cada

participante. Primeiramente, foi realizada a abordagem com o líder do programa na

organização (Sensei). O Quadro 2 possui a descrição de suas observações.

Ator Categoria Descrição

Sensei e Diretor

Industrial das Plantas

Analisadas

Comportamental

Devemos agir mais com a razão e não com o coração. Vários

gestores não entenderam que era uma filosofia de gestão e não

um modelo a ser seguido porque o diretor está à frente da

implantação

Quadro 1 – Análise de Conteúdo do Sensei

Fonte: Elaborado pelos autores

A entrevista com o Sensei mostrou que está desapontado com a atuação dos demais

gestores da organização na implantação do programa na empresa. Para o entrevistado, nos

antecedentes de uma eficaz implantação deve ser considerada uma categoria comportamental

dos participantes do processo. Assim, passa por um entendimento da manufatura enxuta e de

treinamento das pessoas para a aplicação e mudança da forma de gestão.

Com relação ao gerente das três plantas de manufatura, o Quadro 3 apresenta as

categorias e descrições que emergiram da entrevista.

Ator Categoria Descrição

Gerente Industrial

das Plantas

Analisadas

Formas de

Implantação

O início eu faria exatamente como foi. Equipe boa e base forte.

Teria mais cuidado na extensão para as demais áreas da empresa,

formando com maior ênfase os componentes substitutos da equipe

lean.

Cultura não

Implantada

A cultura enxuta ainda não existe, a formação das pessoas ainda não

está boa.

Choque com

outras ferramentas

Implantamos ferramentas que deram resultados e muitas não se

sustentaram. Isso também é função da não formalização delas para

uso padrão. Formalizamos procedimentos e instruções de trabalho,

no entanto a diretriz não está totalmente formalizada. É o manual da

qualidade a ferramenta já oficializada da empresa.

Manutenção do

programa pelo

Lean Walking

O lean walking deve ser feito de forma a fazer com que as pessoas

sejam questionadas, respondendo pelas perguntas farão acontecer

da forma correta, pois ficarão com responsabilidade em suas

mentes.

Quadro 2 – Análise de Conteúdo do Gerente Industrial

Fonte: Elaborados pelos autores

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O Quadro 4 apresenta categorias adicionais, com a preocupação com relação à forma

da implantação, cultura da organização, ferramentas de gestão e manutenção do programa.

Também mostrou preocupação com a expansão da implantação para outras áreas, sendo

necessária a preparação dos gestores, com ênfase da fase inicial. Tal preocupação vem de

encontro às observações de Jones e Womack (2004) que afirmam que os resultados iniciais

são motivadores, mas não garantem efeitos de médio e longo prazos. As atividades iniciais

precisam focalizar nos fluxos essenciais, passando de um enfoque em ferramentas isoladas

para uma visão sistêmica e abrangente.

Emergiu a categoria cultura lean, onde o entrevistado salientou a necessidade de uma

boa formação das pessoas para uma mudança real da cultura de gestão. Neste sentido, Dennis

(2008) corrobora, salientando que a organização pode gerir melhor a força de trabalho com

instruções claras, diminuindo o efeito da falta de mão-de-obra qualificada ou métodos

inadequados, que podem atrapalhar a implantação. Outra, foi o choque com outras

ferramentas, onde o entrevistado salientou não ter havido preocupação com a tecnologia de

informação existente.

A última categoria foi a manutenção do programa por meio da ferramenta lean

walking, remetendo ao acompanhamento sistemático dos gestores no chão de fábrica de

maneira formal e focada nos desvios que possam ocorrer, com correção imediata. Os

coordenadores das plantas fabris têxtil, adesivos e plásticos foram entrevistados e as

categorias de análise e as descrições das observações estão demonstradas no Quadro 4.

Ator Categoria Descrição

Coordenador

da Planta

Têxtil

Formas de implantação Não implantar as ferramentas de uma só vez. Estudar

melhor as ferramentas antes de colocá-las em prática.

Preparação das pessoas Preparar as equipes de forma diferente. Não houve

cobrança no que deveriam fazer.

Manutenção do conhecimento Manter a equipe do escritório lean.

Coordenador

da Planta

Adesivos

Preparação dos líderes

Preparação do líder primeiro nas ferramentas. O

programa atingiu primeiro as células de manufatura, sem

que os líderes conhecessem o que estava mudando.

Treinamento da liderança de cima para baixo.

Preparação das áreas Preparar com antecedência as áreas para receber o lean.

Colocação de um facilitador em cada setor.

Implantar e manter as

ferramentas de impacto na

organização

Garantir a implantação das ferramentas do Manutenção

Produtiva Total (TPM), QCO (Troca Rápida – Quick

Change Over) e Jidoka (modo de prevenção de falhas)

Cultura Lean Cultura do Lean a ser incorporada pelos líderes de frente.

Coordenador

da Planta

Plásticos

Preparação dos líderes Envolver a liderança em Kaizens base como 5S e

Trabalho Padrão.

Alinhamento de metas Alinhamento dos objetivos e metas de cada área com os

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objetivos e metas lean.

Sustentabilidade Garantir a sustentabilidade das ferramentas implantadas

Implantar e manter as

ferramentas de impacto na

organização

Garantir a implantação das ferramentas de confiabilidade

(TPM) e flexibilidade (QCO).

Garantir a base do programa Começar pelo básico 5S (organização e limpeza)

Quadro 3 – Análise dos Coordenadores das Plantas Industriais

Fonte: Elaborado pelos autores

Na planta têxtil, o coordenador salientou três categorias: formas de implantação,

preparação das pessoas e manutenção do conhecimento. Quanto a formas de implantação, a

preocupação do coordenador da unidade têxtil, corrobora o descrito em Womack e Jones

(2004), que sugerem começar pela necessidade, identificando qual é a crise ou a prioridade do

negócio. Quanto mais relevante o problema inicial, mais impulso tem a implantação. A

preparação das pessoas remete à delegação da implantação aos coordenadores ou a gerência

de produção e reforça a visão de ferramentas e não como um sistema. A manutenção do

conhecimento deve-se ao fato de que houve modificações rápidas da equipe de implantação

inicial. Esta observação reforça que troca constante de comandos, multiplicidade de

iniciativas estratégicas, às vezes conflitando entre si, são relevantes à implantação

(SMALLEY, 2004; NISHIDA, 2014).

As categorias identificadas nas repostas do coordenador da unidade de adesivos foram:

preparação dos líderes, preparação das áreas, implantar e manter ferramentas de impacto e

cultura enxuta. As categorias preparação dos líderes e das áreas foram salientadas de forma

semelhante ao assinalado pelo coordenador da área têxtil. Em implantar e manter as

ferramentas de impacto na organização foi destacada a implantação da gestão lean por meio

de ferramentas. Este entendimento de obter pequenos sucessos que não irão se sustentar ao

longo do tempo não é um método adequado de implantação (JONES; WOMACK, 2004).

Percebe-se que o gestor da unidade de adesivos, quando salienta o uso de ferramentas

de impacto na organização, está enfrentando situações que precisam ser corrigidos antes da

implantação. Assim, deveria se buscar previamente resolver problemas no fluxo de materiais,

informações, confiabilidade dos equipamentos e fluxo contínuo a partir da demanda.

(NISHIDA, 2014). Com relação à cultura enxuta a ser incorporada pelos líderes, a mudança

de valores, cultura e sistema de gestão são fundamentais para as transformações do negócio e

há a necessidade de desdobrar as estratégias da organização, alinhando planos da alta

administração com ações dos demais níveis hierárquicos (JONES; WOMACK, 2004).

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Na entrevista com o coordenador da unidade plásticos, emergiram as categorias

preparação dos líderes, alinhamento de metas, sustentabilidade, implantar e manter as

ferramentas de impacto na organização e garantir a base do programa, já comentadas pelos

gestores anteriormente citados, mas destacou a base, que deve ocorrer antes da implantação:

5S (programa de organização e limpeza), manutenção dos 4 Ms (Material, Método, Mão-de-

obra e Máquina), estabilidade da programação e de pessoal, assim como os compromissos da

alta administração (NISHIDA, 2014).

Da mesma forma que foi feita a entrevista com os coordenadores de planta, foram

analisadas as entrevistas dos coordenadores de áreas, apresentadas no Quadro 5:

Ator Categoria Descrição

Coordenador de

Manutenção

Perfil dos Integrantes da

Equipe Lean

Implantar uma visão mais operacional e menos

estratégica dos integrantes da equipe lean. Este fato

proporcionaria uma aceitação maior por parte dos demais

colaboradores

Coordenador da

Tecelagem

Utilização das Realidades de

cada grupo

Elaborar estratégias de trabalhar nas melhorias propostas

com os que realmente executam cada tarefa.

Garantir a base do programa Começar pelo básico 5S (organização e limpeza)

Coordenador do

Almoxarifado e

Recebimento de

Materiais

Tempo de Implantação Demora em atingir toda a empresa

Benchmarking Visitar outras empresas para analisar as melhores

implantações para cada ferramenta.

Sustentabilidade Garantir a sustentabilidade por meio de auditorias.

Participação Envolvimento maior de todos os setores da empresa

Garantir a base do programa Começar pelo básico 5S

Coordenador de

Manufatura

Divisão de coordenação Dividir os setores, os integrantes do escritório lean

precisa estar com um representante em cada setor.

Rotinas diárias Aplicação das rotinas lean no dia-dia não esperar o

momento de melhoria (kaizen)

Quadro 4 – Análise dos Coordenadores de Setores

Fonte: Elaborado pelos autores

O coordenador de manutenção afirma que há necessidade de um maior engajamento

operacional com a implantação por parte da equipe que detém o conhecimento das

ferramentas (equipe lean ou equipe de implantação), com ênfase no conhecimento das

operações. Assim, conforme Womack e Jones (2004), a promoção acontece quando há uma

alavanca ou crise que proporciona o mapeamento do fluxo de valor, organização por família

de produtos e a promoção por meio de um escritório de gestão, que deve ser temporário, até a

concretização do treinamento de todos na organização por um sensei, sendo absorvidas estas

pessoas pelas demais áreas. Assim, a categoria perfil dos integrantes deve ser operacional,

para ser absorvido posteriormente nos cargos de estratégia e apoio das organizações.

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O coordenador da tecelagem apresentou uma categoria diferente das anteriores, a

utilização das realidades de cada grupo, em que as pessoas que fazem falta a um determinado

setor prejudicam o desempenho daquele setor. Assim, os momentos de melhoria kaizens são

executados com pessoas que não executam a função ou área analisada, fazendo com que as

melhorias não ocorram de forma sustentável. Para Nishida (2014), o desenvolvimento de

pessoas é essencial, com um novo conjunto de habilidades, comportamentos, qualificações e

experiências.

Na entrevista com o coordenador de almoxarifado e recebimento de materiais,

emergiram as categorias tempo de implantação e benchmarking. No tocante ao tempo de

implantação, Nishida (2014) salienta que o tempo vai ser longo se os problemas crônicos não

forem resolvidos antes da implantação. É mais relevante tratar da movimentação interna de

materiais e logística (interna, externa, almoxarifado) no caso de falta crônica de materiais ou

iniciar um programa de manutenção para as máquinas e equipamentos que estão quebrando

muito e atrapalhando o fluxo. Quanto a benchmarking, as melhores práticas devem ser

discutidas e analisadas por meio de fóruns específicos e visitas técnicas como as observadas

pelo entrevistado.

Com relação ao coordenador de manufatura, cabe esclarecer que tinha menos de seis

meses na empresa e, portanto, ainda estava se familiarizando com a implantação. As

categorias expressam a necessidade de ter suporte do entendimento, sugerindo a

descentralização da implantação e rotinas diárias de execução com correções pontuais.

De maneira semelhante para os quatro membros do escritório lean da empresa, foram

feitas as mesmas perguntas e as categorias levantadas por estes membros estão demonstradas

no Quadro 6.

Ator Categoria Descrição

Membro 1

Formas de implantação Não implantar as ferramentas de uma só vez. Estudar melhor

as ferramentas antes de colocá-las em prática.

Preparação das pessoas Preparar as equipes de forma diferente. Precisa haver

maiores cobranças por parte da alta direção.

Membro 2

Preparação dos líderes Preparação do líder primeiro nas ferramentas. Treinamento

da liderança de cima para baixo.

Implantar e manter as

ferramentas de impacto na

organização

Garantir a implantação das ferramentas do Manutenção

Produtiva Total (TPM), QCO (Troca Rápida – Quick

Change Over).

Sustentabilidade Garantir a sustentabilidade das ferramentas implantadas

Membro 3

Cultura Lean Cultura do Lean a ser incorporada pelos líderes de frente.

Alinhamento de metas Alinhamento dos objetivos e metas de cada área com os

objetivos e metas lean.

Membro 4 Manutenção do conhecimento Manter a equipe do escritório lean.

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Sustentabilidade Garantir a sustentabilidade das ferramentas implantadas

Quadro 5 – Análise dos Membros da Equipe Lean

Fonte: Elaborado pelos autores

O Quadro 6 ratifica as análises anteriores, repetindo as categorias e permitindo inferir

ocorrem as mesmas preocupações dos demais líderes e uma preocupação com o andamento e

o aprendizado verificado ao longo da implantação. Os membros da equipe lean demonstraram

que foram treinados nas diferentes ferramentas e passaram a entender a forma e os conceitos.

Acreditam que muitos destes conceitos conflitavam com as idéias da empresa como um todo e

dificultavam a implantação por não ocorrer o alinhamento das áreas com foco nos mesmos

objetivos, que encontra amparo em Nishida (2014). Relataram que havia metas de quantidade

de kaizens a serem realizados, que prejudicava a análise das reais necessidades identificadas

nos mapeamentos de fluxo de valor.

A pesquisa documental mostrou que houve progresso maior nas unidades de adesivos

e plásticos em relação aos resultados da unidade têxtil. Segundo os membros da equipe lean,

tal diferença ocorreu em função de um engajamento maior da liderança destas unidades em

treinamentos. Todos os seus coordenadores e supervisores fizeram uma pós-graduação lean

oferecido in company para os membros da empresa.

8 ANÁLISE DAS CATEGORIAS

As categorias que emergiram durante as entrevistas por meio das descrições de acordo

com os Quadros 2, 3, 4, 5 e 6 estão apresentados no Quadro 7.

Categorias

Preparação das pessoas Garantir a base do programa

Manutenção do conhecimento Perfil dos Integrantes da Equipe Lean

Preparação dos líderes Utilização das Realidades de cada grupo

Preparação das áreas Tempo de Implementação

Implantar e manter as ferramentas de impacto na organização Benchmarking

Cultura Lean Participação

Alinhamento de metas Divisão de coordenação

Sustentabilidade Rotinas diárias

Comportamental Formas de implantação

Quadro 6 – Categorias de Análise que Emergiram das Entrevistas

Fonte: Elaborado pelos autores

Pode ser observado que as categorias remetem às preparações que antecedem à

implantação. A base principal está na preparação das pessoas que necessitam estar treinadas

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em todas as áreas de aplicação da empresa. A manufatura enxuta é comportamental e precisa

estar alinhada com as demais estratégias da empresa. Também pode ser observado que há

variação com relação à importância atribuída a cada categoria por parte dos entrevistados.

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho, após descrever a implantação de manufatura enxuta em uma

unidade fabril de adesivos hospitalares, identifica as modificações ocorridas na organização,

tornado possível, com o apoio das respostas obtidas nas entrevistas realizadas junto às pessoas

envolvidas com o processo, produzir um conjunto de categorias de análise de modificações

decorrentes dessa implantação.

Diante desse quadro, verificou-se que os principais preparativos para a aplicação da

manufatura enxuta foram formação de uma equipe de implantação, com pessoas treinadas e

que detivessem conhecimentos sobre as ferramentas envolvidas no processo. As lideranças

operacionais não tinham o mesmo nível de conhecimento das ferramentas, afirmando que o

treinamento foi insuficiente, provocando defasagem de compreensão dos conceitos entre os

envolvidos com a implantação.

Constatou-se, ainda, que a motivação para implantação foi a mudança na diretoria,

com a necessidade diagnosticada pela nova composição de rever processos e incrementar

resultados. Os preparativos ficaram centrados na preparação para a mudança comportamental

dos envolvidos, embora tenham sido identificadas diferenças entre os preparativos entre uma

unidade fabril e outra.

Semelhanças e diferenças na implantação foram percebidas nas categorias que

emergiram durante as entrevistas. Acomodação, expectativas com relação à atuação da equipe

de implantação e diferenças com relação aos conhecimentos e motivação para participar da

implantação foram percebidas.

As dificuldades na implantação, identificadas pelos autores, foram destacadas pelos

entrevistados, em especial a preparação da liderança, alinhamento de metas e sustentabilidade

dos resultados alcançados, servindo de auxílio à expansão de implantação, bem como a outras

empresas que enfrentem o desafio de implantação mudanças em sua gestão de operações.

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