avaliaÇÃo histolÓgia do processo de reparo em … · histologicamente o processo de reparo de...

8
82 R. Periodontia - Junho 2008 - Volume 18 - Número 02 INTRODUÇÃO A integração da psique correlacionando ao sis- tema nervoso central (SNC), o sistema endócrino e o sistema imunológico tem sido objeto de estudo na atualidade, tornando-se um novo paradigma den- tro da saúde, chamado de psiconeuroimunologia - PNI (Maier, 2003; Alder, 2003; Glaser, 2005; Macain, 2005). A afinidade entre as doenças emocionais e as doenças do periodonto não são recentes, sua rela- ção ocorre principalmente entre as doenças periodontais necrosantes (Ranney, 1993; Barnes et al .,1973; Shanon et al ., 1969). Na área da periodontia, as relações das respostas do eixo hipotálamo-pituiário-adrenal (HPA) e a periodontite têm sido motivo de estudo de um grupo de pesqui- sa liderado pelo norueguês chamado Torbjørn Breivik. Este autor através de estudos em humanos e ani- mais, demonstrou a capacidade do eixo HPA em modular uma maior ou menor progressão da periodontite. Fator extremamente relevante para este novo olhar da odontologia (Breivik & Thrane, 2000; Breivik et al., 2006). As pesquisas na área da PNI geralmente utili- zam seres humanos e animais com respostas pré- estabelecidas de hiperativação ou hipoativação do AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM FERIDAS CUTÂNEAS PROVOCADAS NO DORSO DE RATOS DA LINHAGEM ENDOGÂMICA LEWIS E FISCHER- 344 Histologic evaluation of the repair of cutaneous wounds produced in Lewis (hyporeactive) and Fischer – 344 (hyperreactive) endogamic rats. Alex Semenoff Segundo 1 , Tereza A. Delle Vedove Semenoff 2 , Tatiana Miranda Deliberador 3 , Éder Ricardo Biasoli 4 , Álvaro Francisco Bosco 4 , Tetuo Okamoto 5 RESUMO Neste trabalho avaliou-se histologicamente o reparo em feridas cutâneas no dorso de ratos hiperreativos (Fischer- 344) e hiporreativos (Lewis). Quarenta ratos adultos foram selecionados, sendo 20 da linhagem Fischer (Grupo F) e outros 20 da linhagem Lewis (Grupo L). Os animais foram anestesiados e uma ferida com área de 1 cm 2 foi feita no dorso de cada animal até atingir o tecido subcutâneo, pre- servando-se o músculo. Após 7 e 14 dias de realizadas as feridas, dez ratos de cada grupo foram selecionados alea- toriamente e submetidos à eutanásia. Os tecidos da região da ferida foram removidos e fixados em formalina para o processamento histológico laboratorial. Para análise histológica, um examinador cego aos grupos observou todos os cortes, identificando e analisando a região central e as bordas da ferida. No sétimo dia, o Grupo F apresentou discreta proliferação de epitélio junto às bordas da ferida. No tecido conjuntivo subjacente mais distante da ferida, observaram-se poucos fibroblastos e elevada quantidade de macrófagos e linfócitos. O Grupo L apresentou alta pro- liferação epitelial e moderada quantidade de fibroblastos próximos a macrófagos e linfócitos. Aos 14 dias, o Grupo F apresentou discreta proliferação de epitélio. No tecido con- juntivo, foi observado poucos fibroblastos e moderado nú- mero de linfócitos e macrófagos. No Grupo L, o epitélio recobria totalmente a ferida. No tecido conjuntivo, raros linfócitos e macrófagos foram observados. Concluindo, ra- tos do Grupo L (hiporreativos) apresentam um melhor re- paro de feridas cutâneas em dorso que os ratos do Grupo F (hiperreativos). UNITERMOS: 1 Doutor em Periodontia pela UNESP– Campus Araçatuba. Professor da Universidade de Cuiabá-UNIC e Periodontista do Centro de Especialidades Odontológicas para PacientesEspeciais – CEOPE/MT 2 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Odontologia Área de ConcentraçãoEstomatologiada UNESP – Campus Araçatuba 3 Doutora em Periodontia pela UNESP– Campus Araçatuba. Professora Titular da disciplina deClínica Integrada da Universidade Positivo e professora do Curso de Especialização emPeriodontia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) 4 Professor Adjunto da Faculdade de Odontologia – Campus de Araçatuba – UNESP 5 Professor Titular – Programa de Pós-Graduação – UNIMAR ratos endogâmicos Lewis, ratos endogâmicos Fischer 344, cicatrização de feridas. R Periodontia 2008; 18:82-89. Recebimento:04/01/08 - Correção:10/03/08 - Aceite:02/05/08

Upload: lengoc

Post on 29-Nov-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

82

R. Periodontia - Junho 2008 - Volume 18 - Número 02

INTRODUÇÃO

A integração da psique correlacionando ao sis-tema nervoso central (SNC), o sistema endócrino e osistema imunológico tem sido objeto de estudo naatualidade, tornando-se um novo paradigma den-tro da saúde, chamado de psiconeuroimunologia -PNI (Maier, 2003; Alder, 2003; Glaser, 2005; Macain,2005).

A afinidade entre as doenças emocionais e asdoenças do periodonto não são recentes, sua rela-ção ocorre principalmente entre as doençasperiodontais necrosantes (Ranney, 1993; Barnes et

al.,1973; Shanon et al., 1969). Na área daperiodontia, as relações das respostas do eixohipotálamo-pituiário-adrenal (HPA) e a periodontitetêm sido motivo de estudo de um grupo de pesqui-sa liderado pelo norueguês chamado Torbjørn Breivik.Este autor através de estudos em humanos e ani-mais, demonstrou a capacidade do eixo HPA emmodular uma maior ou menor progressão daperiodontite. Fator extremamente relevante para estenovo olhar da odontologia (Breivik & Thrane, 2000;Breivik et al., 2006).

As pesquisas na área da PNI geralmente utili-zam seres humanos e animais com respostas pré-estabelecidas de hiperativação ou hipoativação do

AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EMFERIDAS CUTÂNEAS PROVOCADAS NO DORSO DERATOS DA LINHAGEM ENDOGÂMICA LEWIS E FISCHER-344Histologic evaluation of the repair of cutaneous wounds produced in Lewis (hyporeactive) and

Fischer – 344 (hyperreactive) endogamic rats.

Alex Semenoff Segundo1, Tereza A. Delle Vedove Semenoff2, Tatiana Miranda Deliberador3, Éder Ricardo Biasoli4, ÁlvaroFrancisco Bosco4, Tetuo Okamoto5

RESUMO

Neste trabalho avaliou-se histologicamente o reparoem feridas cutâneas no dorso de ratos hiperreativos (Fischer-344) e hiporreativos (Lewis). Quarenta ratos adultos foramselecionados, sendo 20 da linhagem Fischer (Grupo F) eoutros 20 da linhagem Lewis (Grupo L). Os animais foramanestesiados e uma ferida com área de 1 cm2 foi feita nodorso de cada animal até atingir o tecido subcutâneo, pre-servando-se o músculo. Após 7 e 14 dias de realizadas asferidas, dez ratos de cada grupo foram selecionados alea-toriamente e submetidos à eutanásia. Os tecidos da regiãoda ferida foram removidos e fixados em formalina para oprocessamento histológico laboratorial. Para análisehistológica, um examinador cego aos grupos observoutodos os cortes, identificando e analisando a região centrale as bordas da ferida. No sétimo dia, o Grupo F apresentoudiscreta proliferação de epitélio junto às bordas da ferida.No tecido conjuntivo subjacente mais distante da ferida,observaram-se poucos fibroblastos e elevada quantidadede macrófagos e linfócitos. O Grupo L apresentou alta pro-liferação epitelial e moderada quantidade de fibroblastospróximos a macrófagos e linfócitos. Aos 14 dias, o Grupo Fapresentou discreta proliferação de epitélio. No tecido con-juntivo, foi observado poucos fibroblastos e moderado nú-mero de linfócitos e macrófagos. No Grupo L, o epitéliorecobria totalmente a ferida. No tecido conjuntivo, raroslinfócitos e macrófagos foram observados. Concluindo, ra-tos do Grupo L (hiporreativos) apresentam um melhor re-paro de feridas cutâneas em dorso que os ratos do GrupoF (hiperreativos).

UNITERMOS:

1 Doutor em Periodontia pela UNESP– Campus Araçatuba. Professor daUniversidade de Cuiabá-UNIC e Periodontista do Centro de EspecialidadesOdontológicas para PacientesEspeciais – CEOPE/MT2 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Odontologia Área deConcentraçãoEstomatologiada UNESP – Campus Araçatuba3 Doutora em Periodontia pela UNESP– Campus Araçatuba. Professora Titularda disciplina deClínica Integrada da Universidade Positivo e professora doCurso de Especialização emPeriodontia da Universidade Federal do Paraná(UFPR)4 Professor Adjunto da Faculdade de Odontologia – Campus de Araçatuba –UNESP5 Professor Titular – Programa de Pós-Graduação – UNIMAR

ratos endogâmicos Lewis, ratosendogâmicos Fischer 344, cicatrização de feridas. RPeriodontia 2008; 18:82-89.

Recebimento:04/01/08 - Correção:10/03/08 - Aceite:02/05/08

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM82

Page 2: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

83

eixo HPA, os quais, de uma forma geral, apresentam pioresou melhores respostas, respectivamente, nos indicadores clí-nicos, hematológicos, histológicos, bioquímicos e emocio-nais (Kiecolt-Glasser et al., 1995; Breivik & Thrane, 2000;Moynihan, 2003; Glaser, 2005).

O uso de ratos endogâmicos é uma alternativa em es-tudos que ajudam a obter informações auxiliares na com-preensão do funcionamento orgânico do processo saúde-doença do ser humano. Alguns trabalhos têm servido debase para o entendimento destas conexões (Exton et al.,2001; Alder, 2003). Em estudo com três diferentes linhagensde ratos, Shurin et al. (1995) demonstraram que frente a ummesmo estímulo estressor, as respostas mostraram-se dife-rentes, o que evidencia a influência do eixo HPA nas respos-tas inflamatórias.

As linhagens de ratos Lewis e Fischer são dois exemplosde diferentes espécies com reatividade do eixo neuro-endôcrino-imunológico. O animal Fischer tem forte ativaçãodo eixo HPA, induzindo a produção de maior quantidade dehormônio adenocorticitrópico (ACTH) e cortisona. Desta for-ma, deixa o sistema imunológico menos reativo, podendoocasionar maior susceptibilidade às doenças infecciosas, pormodificar o padrão de resposta imunológico. O modelo Lewiscomporta-se de forma antagônica ao modelo Fischer. A ati-vação do eixo HPA é pouco intensa, o que produz menorquantidade de ACTH. Sendo assim, torna o sistema imunemais reativo, ocasionando neste animal menos doenças in-fecciosas. Contudo, aumenta a chance de desenvolver do-enças autoimunes (Chousos, 1995; Breivik & Thrane, 2000;Dhabhar & Mcewen, 2000; Breivik et al., 2001).

Breivik et al. (2000) induziram periodontite através de li-gadura em ratos da linhagem Lewis e Fischer. Os resultadosdemonstraram que a linhagem com maior reatividade do eixoHPA (Fischer) obteve maior destruição do periodonto. Res-posta antagônica à linhagem Lewis, que obteve um melhorresultado com menor destruição do periodonto. Os autoresconcluíram que há uma relação direta entre o sistema neuro-endôcrino-imunológico, com uma maior ou menor progres-são da doença periodontal em ratos.

Em ensaio clínico randomizado Kiecolt-Glasser et al.

(1995) estudaram o efeito da reparação clínica, através dacontração de feridas e análise de interleucinas. Entre elas, ainterleucina 1β (IL-1β) importante no processo de reparo doperiodonto. Os resultados do estudo demonstraram que ospacientes com maior ativação do eixo HPA apresentaram ospiores resultados. Apesar do estudo anteriormente citadoser uma excelente referência, os estudos em animais sãomenos complexos, de custos mais baixos, e podem analisardados qualitativos dos tecidos histológicos, que nos seres

humanos seria impossível de se realizar. Outra questão é aexcelente sustentação literária para compreensão destasquestões que podem, em um breve período, serem aplica-dos em estudos nos seres humanos (Exton et al., 2001; Alder,2003).

OBJETIVO

O objetivo do presente trabalho foi compararhistologicamente o processo de reparo de lesões cutâneasprovocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344.

MATERIAL E MÉTODOS

Para o presente estudo foram selecionados 40 ratos adul-tos da espécie Rattus novergicus, sendo 20 da linhagemFischer-344 e outros 20 da linhagem Lewis, com peso apro-ximado de 250 gramas. Os animais passaram por uma adap-tação ao novo ambiente durante uma semana. Foram man-tidos em caixas moradias, com 5 ratos em cada caixa, comração padronizada e água ad libitum, sob ciclo claro/escuro,com temperatura controlada em 23° C e umidade entre 40%-60%. A fim de que os animais não tivessem contato comfezes e/ou urina, foi acondicionado um assoalho metálicopermeável, separando-os da parte inferior contaminada dacaixa.

O experimento foi aprovado e registrado pelo Comitêde Ética na Experimentação Animal (CEEA) -25/06. Todos osprocedimentos cirúrgicos foram realizados sob anestesiageral, através de administração intramuscular de 0,1 ml decloridrato de quetamina (Dopalen, Agribrands. Saúde Ani-mal, Paulínia, SP, Brasil), associado a 0,05 ml de cloridrato dexylazina (Rompun, Bayer. Saúde Animal, São Paulo, SP, Bra-sil), para cada 100 gramas de peso do animal. Após aanestesia, foi selecionada a região lateral direita da linhamédia dorsal para a realização da tricotomia e desinfecção(clorexidina a 2%). Antes da incisão, as bordas das feridasforam demarcadas, utilizando-se paquímetro (digital) e ca-neta hidrográfica. As feridas foram promovidas com bisturi etesoura íris, retirando-se pele, tecido subcutâneo e gordura,preservando-se a integridade do tecido muscular. A confec-ção da ferida foi padronizada com tamanho de 1cm2, con-forme técnica preconizada por Semenoff-Segundo et al.(2007). Em todos os ratos o procedimento cirúrgico foi reali-zado pelo mesmo operador que estava cego em relação àsespécies. As feridas permaneceram sem bandagem durantetodo o experimento.

Após a cirurgia, aguardou-se o intervalo de tempo de 7

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM83

Page 3: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

84

e 14 dias, para selecionar aleatoriamente 10 animais Fischer-344 e 10 animais Lewis por período, sendo realizada a euta-násia por excesso de anestésico. Em ato contínuo, as peçasforam removidas, divididas ao meio (porção central da feri-da), esticadas com auxílio de cera utilidade e alfinete, eimersas em solução de formalina.

Decorrido 48 horas, iniciou-se o processamentohistológico laboratorial. As peças foram desidratadas em sé-rie graduais de álcool e embebidas em parafina. Foram reali-zados dez cortes histológicos seriados por espécime com 5micrômetros de espessura. Os cortes foram corados comHematoxilina de Harris e Eosina.

A análise histológica, das dez lâminas pertencentes acada bloco histológico, foi realizada em microscópio óptico(Olympikus, Tóquio, Japão) por um único examinador Sêniorque estava cego quanto aos grupos do estudo.

Em uma primeira etapa, a análise histológica foi realiza-da visualizando toda a extensão das lâminas em aumentosde 100, 200 e 400 vezes. Foi estabelecido como critério deinclusão a visualização das extremidades das bordas da feri-da e a porção central da ferida. Após esta prévia seleção,foram escolhidas as lâminas com melhor qualidade de cadaespécime, descrevendo qualitativamente o processo inflama-tório, a angiogênese e a reparação tecidual.

RESULTADOS

Os resultados correspondem as ocorrências verificadasapós 7 e 14 dias do ato cirúrgico nos animais Fischer e Lewis.

Fischer 7 dias :

Em alguns espécimes notou-se o início da proliferaçãoepitelial junto às bordas da ferida cirúrgica. O tecido conjun-tivo subjacente pouco organizado exibe pequeno númerode fibroblastos ao lado de macrófagos e linfócitos, além de

alguns vasos sanguíneos. Em outros animais, observou-sepraticamente a ausência de proliferação epitelial (figura 1).Nas áreas situadas mais distantes das bordas da ferida cirúr-gica, notou-se em alguns casos, a presença de tecido con-juntivo neoformado, exibindo pequeno número defibroblastos e elevada quantidade de macrófagos e linfócitos.Em outros espécimes, o tecido conjuntivo neoformado apre-senta maior número de macrófagos e linfócitos. Ainda foiobservada a presença de alguns pequenos vasos sanguíne-os (figura 2).

Lewis 7 dias:Na maioria dos espécimes observou-se uma prolifera-

ção epitelial mais pronunciada quando comparada ao gru-po anterior. O tecido conjuntivo subjacente apresentava-secom moderado número de fibroblastos ao lado de algunslinfócitos e raros macrófagos. (figura 3). Em alguns casos, oepitélio encontrava-se menos desenvolvido e o tecido con-juntivo subjacente bem vascularizado, apresentava peque-no número de fibroblastos ao lado de alguns macrófagos elinfócitos. Nas áreas situadas mais distante das bordas daferida, o tecido conjuntivo neoformado apresentava-se bemvascularizado e com moderado número de fibroblastos aolado de alguns macrófagos e linfócitos (figura 4).

Fischer 14 dias:

Em um dos espécimes observou-se a ausência de teci-do epitelial nas áreas mais afetadas da borda da ferida cirúr-gica. O tecido conjuntivo subjacente apresentava-se com mo-derado número de fibroblastos, macrófagos e linfócitos (fi-gura 5). Em alguns casos, notava-se a permanência da cros-ta e tecido epitelial pouco diferenciado ou irregular recobrindoa ferida cirúrgica. O tecido conjuntivo subjacente exibia pou-cos fibroblastos e, em alguns pontos, moderados númerode macrófagos e linfócitos. Nos demais espécimes, a ferida

Figura-2 Fischer 7 dias centro da ferida.Figura-1 Fischer 7 dias bordas da ferida.

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM84

Page 4: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

85

cirúrgica encontrava-se recoberta por epitélio pouco diferen-ciado. O tecido conjuntivo subjacente apresentava algunsmacrófagos e linfócitos e os fibroblastos encontravam-se dis-postos paralelamente à superfície do epitélio (figura 6).

Lewis 14 dias:

Nas áreas situadas mais próximas às bordas da feridacirúrgica, o tecido conjuntivo subjacente mostrou raroslinfócitos ou macrófagos (figura 7). Em todos os espécimesas porções centrais das feridas cirúrgicas encontravam-serecobertas por epitélio geralmente pouco diferenciado (figu-ra 8). Além disso, o tecido conjuntivo subjacente situado juntoao centro da ferida cirúrgica apresentava a presença de al-guns macrófagos e linfócitos ao lado de discreto número defibroblastos.

DISCUSSÃO

Estudos do processo de reparo de feridas cutâneas emdorso de ratos são metodologias bem descritas na literaturae possibilitam informações valiosas no entendimento da re-paração tecidual. Outra vantagem são os custos baixos e ageração de excelentes informações em relação ao compor-tamento dos eventos biológicos durante a reparação do te-cido conjuntivo e do tecido epitelial, que nos seres huma-nos, seriam impossíveis de se realizar (Semenoff-Segundo et

al., 2007; Safer et al., 2004; Shapira et al.,1999).A regeneração ou o reparo de qualquer tecido é um pro-

cesso biológico complexo. Regulado por comunicações en-tre as células nos locais do estímulo e mediadores sistêmicoscomo os fatores do crescimento relacionados por linfócitose macrófagos, sempre observando, que trata-se de um pro-cesso dinâmico e associado (local-sistêmico) (Stemberg et al.,

1992; Anisman et al., 1996; Cochran & Johon, 1999).A região do epitélio juncional, do epitélio do sulco e do

dente forma uma tríade única no organismo. O dente é oúnico órgão com uma parte no meio interno e outra parteno meio externo, sendo o sulco gengival sua linha divisória.Esse local relaciona-se com um ecossistema capaz de adap-tar-se sem produzir reações inflamatórias clinicamente visí-veis ou interagir com o meio interno, originando uma infla-mação localizada no periodonto de proteção, periodonto deinserção ou em ambos (Page & Shoroeder, 1976; Socransky& Haffajee, 2005).

A patogênese da periodontite é dividida basicamenteem quatro momentos. A última fase é descrita como lesãoavançada, e sua característica é um infiltrado inflamatóriocrônico juntamente com uma migração do epitélio juncionalpara apical, a partir da região amelo-cementária, o que éconsiderado uma periodontite. O sulco gengival ou bolsa éuma das principais regiões de estudo do periodontista. Es-tudos em ratos que simulem uma periodontite induzida pormicrorganismos, correlacionam-se com uma possível situa-ção clínica e geram informações de boa qualidade, desdeque respeitada as limitações do modelo animal (Ramfjord,1959; Gargiulo et al., 1961; Segelnick & Weinberg, 2006).

Com objetivo de compreender o processo de reparo (oinfiltrado inflamatório, a angiogênese e o remodelamento) eevitar vieses devido às características peculiares doperiodonto, optou-se no presente estudo em utilizar ametodologia de feridas cutâneas em dorso de ratos. Noperiodonto a prática clínica é mensurar a migração do epitéliojuncional e crista óssea para apical, correlacionando-a coma histologia destas mesmas estruturas (Ramfjord, 1959;Gargiulo et al., 1961; Tristão, 1992; Semenoff-Segundo et

al., 2007; Semenoff-Segundo et al., 2006; Breivik et al., 2006). No presente estudo, os resultados histológicos encon-

trados assemelham-se aos descritos por Breivik et al. (2001).Após indução de periodontite nas mesmas linhagens de ra-tos utilizados neste trabalho, os autores observaram maior

Figura-4 Lewis 7 dias centro da feridaFigura-3 Lewis 7 dias bordas da ferida.

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM85

Page 5: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

86

progressão de periodontite na espécie Fischer e menor pro-gressão de periodontite na espécie Lewis. A metodologiaescolhida pelos autores foi a mensuração da migração doepitélio juncional para apical, o que se molda diretamente acorrelações clínicas e histológicas descritas na literatura(Ramfjord, 1959; Gargiulo et al., 1961; Tristão, 1992).

Os mediadores químicos responsáveis pela cicatrizaçãosão principalmente secretados pelo sistema nervoso central,sistema imunológico e sistema endócrino. Estes sistemas pro-duzem citocinas, neutransmissores e neurohormônios ca-pazes de determinar uma melhor ou pior resposta do orga-nismo (Esther et al.,1992; Alder et al., 1995; Anisman et al.,1996; Glaser, 2005).

Shurin et al. (1995) em estudo sobre estresse em dife-rentes linhagens de ratos, entre elas, a Fischer e a Lewis,observaram que o grupo de animais Fischer obteve os resul-tados de pior proliferação de mitoses de linfócitos de baço.Este fator ocorreu por uma característica genética da forteativação do eixo HPA. Os resultados do estudo acima des-crito corroboram com os achados histológicos do presentetrabalho, pois evidencia uma pior qualidade do tecido

neoformado na linhagem Fischer.Em estudo em seres humanos Kiecolt-Glaser et al. (1995)

realizaram feridas cutâneas no antebraço de pacientes como eixo HPA ativado e compararam a cicatrização clínica e aquantidade de interleucinas com pacientes controle. Os re-sultados demonstraram concordância dos achados descri-tos no presente estudo, ou seja, a menor ativação do eixoHPA (Lewis) obteve melhor reparo comparado aos com mai-or ativação (Fischer).

Os resultados encontrados no presente estudo devem-se as diferenças fisiológicas do funcionamento do eixo HPAdos ratos selecionados. Em ambas as espécies, as funçõesque organizam a inflamação, iniciam-se com o estímulo daglândula hipófise. Esta conecta-se a glândula pituitária, queem sua porção anterior, secreta uma série de hormônios.Dentre eles, o hormônio adenocortocotrófico (ACTH) e as â-endorfinas produtoras dos glucocorticoides, mediadores queinterferem na qualidade da resposta inflamatória. Além dis-so, atuam diretamente em células como macrófagos elinfócitos (Chrousos, 1995; Blalock, 1994; Esther, 1992).

Os resultados histológicos descritos no presente estudo

Figura-8 Lewis 14 dias centro da ferida.

Figura-5 Fischer 14 dias bordas da ferida. Figura-7 Lewis 14 dias bordas da ferida.

Figura-6 Fischer 14 dias centro da ferida.

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM86

Page 6: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

87

mostram uma maior quantidade de linfócitos e macrófagose menor quantidade de fibroblastos nas linhagens Fischer,além de um epitélio menos desorganizado. Nos ratos da li-nhagem Lewis os resultados são opostos, o que evidencia ainterferência direta do eixo neuro-endócrino-imunológico nareparação tecidual (Kiecolt-Glasser et al., 1995; Dhabhar &Mcewen, 2000; Breivik & Thrane, 2000).

Mediadores como as interleucinas e a adrenalina influ-enciam diretamente na resposta imuno-inflamatória. Umavez iniciada a cascata inflamatória, estas substâncias dimi-nuem ou aumentam as funções inflamatórias locais do áci-do araquidônico, o qual origina as prostaglandinas e osleucotrienos. A cascata descrita, produz substâncias funda-mentais na intensidade do processo inflamatório, gerandocomo produto final um infiltrado inflamatório mais ou me-nos intenso, menor ou maior número de proliferação de va-sos e menor ou maior quantidade de fibroblastos. Caracte-rísticas apresentadas nas linhagens Fischer (pior resultado) ena linhagem Lewis (melhor resultado).

CONCLUSÃO

Concluindo, ratos endogâmicos Fischer têm piores re-sultados no processo de reparo histológico em lesõescutâneas provocadas em dorso comparado aos ratosendogâmicos Lewis.

ABSTRACT

This study evaluated histologically the repair of cutaneous

wounds produced on the back of hyperreactive(Fischer-344) and hyporeactive (Lewis) rats. Forty adult ratswere selected, being 20 Fischer rats (Group F) and 20 Lewisrats (Group L). The animals were anesthetized and a woundwith an area of 1 cm2 was made on the back of each animaluntil reaching the subcutaneous tissue, preser vingthe muscle. Seven and fourteen days after the lesions havebeen produced, 10 rats of each group were randomlyselected and sacrificed. The tissues of the region of the woundwere removed and fixed for the histologic laboratorialprocessing. For histologic analysis, an examiner blindedto the groups evaluated all sections, identifying andanalyzing the central region and the borders of the lesion.At 7 days, Group F showed discrete epithelial proliferationclose to the margins of the wound. In the connectivetissue subjacent more distant from the wound there werefew fibroblasts and a large number of the macrophagesand lymphocytes. Group L presented great epithelialproliferation and a moderate number of fibroblasts close tomacrophages and lymphocytes. At 14 days, Group F showeddiscrete epithelial proliferation. In the connective tissue, therewere few fibroblasts and a moderate number of lymphocytesand macrophages. In Group L, there was total epithelialcoverage on the wound. In the connective tissue, scarcelymphocytes and macrophages were observed. In conclusion,the rats of Group L (hyporeactive) presented better repair ofdorsal cutaneous wounds than the rats of Group F(hyperreactive).

UNITERMS: inbred Lew, inbred F344, wound healing

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM87

Page 7: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

88

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1- Ader R. Conditioned immunomodulation: research needs and directions.

Brain Behav Immun 2003; 17 (suppl 1): S51-57.

2- Alder R, Cohen N, Felten D. Psychoneuroimmunology: interactions

between the nervous system and the immune system. Lancet 1995;

345: 99-103.

3- Anisman H, Baines MG, Berczi, I, Bernstein CN, Blennerhassett MG,

Gorczynski RM, et al. Neuroimmune mechanisms in health and diseases:

2. disease. CMAJ 1996; 155: 1075-1082.

4- Barnes GP, Bowles WF, Carter HG. Acute necrotizing ulcerative gingivitis:

a survey of 218 cases. J Periodontol 1973; 44: 35-42.

5- Blalock JE, The syntax of immune-neuroendocrine communication.

Immunol Today 1994; 15: 504-511.

6- Breivik T, Gundersen Y, Osmundsen H, Fonnum F, Opstad PK. Neonatal

dexamethasone and chronic tianeptine treatment inhibits ligature-

induced periodontitis in adults rats. J Periodontal Res 2006; 41: 23-32.

7- Breivik T, Thrane PS, Gjermo P, Opstad PK, Pabst R, von Hörsten S.

Hypothalamic-pituitary-adrenal axis activation by experimental

periodontal disease in rats. J Periodont Res 2001; 36: 295-300.

8- Breivik T, Thrane PS. Psychoneuroimmune interactions in periodontal

disease. In: Alder R, Felten DL, Cohen N. Psychoneuroimmunlogy. 3rd

ed. San Diego: Academic Press; 2000. p.627-644.

9- Chrousos GP. The Hypothalamic-pituitary-adrenal axis and immune-

mediated inflammation. N Engl J Med 1995; 332: 1351-1362.

10- Cochan DL, Wozney JM. Biological mediators for periodontal

regeneration. Periodontol 2000 1999; 19: 40-58.

11- Dhabhar FS, McEwen BS. Psychoneuroimmune interactions in

periodontal disease. In: Alder R, Felten DL, Cohen N.

Psychoneuroimmunlogy. 3rd ed. San Diego: Academic Press; 2000.

p.301-338.

12- Exton MS, Herklotz J, Westermann J, Schedlowski M. Conditioning in

the rat: an in vivo model to investigate the molecular mechanisms and

clinical implications of brain–immune communication. Immunol Rev

2001; 184: 226–235.

13- Gargiulo AW, Wents FM, Orban B. Dimensions and relations of the

dentogengival junction in humans. J Periodontol 1961; 32: 261-267.

14- Glaser R, Stress-associated immune dysregulation and its importance

for human health: a personal history of psychoneuroimmunology. Brain

Behav Immun 2005; 19: 3–11.

15- Kiecolt-Glasser JK, Marucha PT, Malarkey WB, Mercado AM, Glasser

R. Slowing of wound healing by psychological stress. Lancet 1995;

346: 1194-1196.

16- MaCain NL, Psychoneuroimmunology, spirituality, and cancer. Gynecol

Oncol 2005; 99: S121.

17- Maier SF. Bi-directional immune–brain communication: Implications

for understanding stress, pain, and cognition. Brain Behav Immun 2003;

17: 69–85.

18- Moynihan JA, Mechanisms of stress-induced modulation of immunity

Brain Behav Immun 2003; 17: S11–16.

19- Page RC, Schroeder HE, Pathogenesis of inflammatory periodontal

disease. A summary of current work. Lab Invest 1976; 34: 235-249.

20- Ramfjord, SP. Indices for prevalence and incidence of periodontal

disease. J Periodontol 1959; 30: 51-59.

21- Ranney RH, Classification of periodontal disease. Periodontol 2000

1993; 2: 13-25.

22- Safer JD, Tara M. Crawford TM, Holick MF. A role for thyroid hormone

in wound healing through keratin gene expression. Endocrinology 2004;

145: 2357–2361.

23- Segelninck SL, Weimberg MA. Reevaluation of initial therapy: when

is the appropriate time? J Periodontol 2006; 77: 1598-1601.

24- Semenoff-Segundo A, Bosco AF, Semenoff TADV, Buzelle SL, Ribeiro

RV, Jardin-Júnior EG. Dois métodos histométricos distintos comparativos

de periodontite induzida em ratos. Revista Periodontia 2006; 16: 22-

28.

25- Semenoff-Segundo A, Semenoff TADV, Bosco AF, Biazoli ER, Ribeiro

RV, Rocato GEGD, Buzele Sl, Cirilo DM, Rosa SlG. Efeito do estresse

crônico na progressão de periodontite induzida por ligadura em ratos.

Revista Periodontia. 2007; 17: 5-9.

26- Shanon IL, Kilgore WG, O’learn TJ. Stress as a predisposing factor in

necrotizing ulcerative gingivitis. J Periodontol 1969; 40: 240-242.

27- Shapira L, Houri-Haddad Y, Frolov I, Halabi A, Ben-Nathan D. The

effect of stress on the inflammatory response to Porphyromonas

gingivalis in a mouse subcutaneous chamber model. J Periodontol 1999;

70: 289-293.

28- Shurin MR, Kusnecov AW, Steven E, Reichman SE, Rabin BS. Effect of

a conditioned aversive stimulus on the immune response in three strains

of rats. Psychoneuroendocrinology, 1995; 20: 837-849.

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM88

Page 8: AVALIAÇÃO HISTOLÓGIA DO PROCESSO DE REPARO EM … · histologicamente o processo de reparo de lesões cutâneas provocadas em dorso de ratos da linhagem Lewis e Fischer-344. MATERIAL

R. Periodontia - 18(2):82-89

89

Endereço para correspondência:

Tereza Aparecida Delle Vedove Semenoff.

Rua da Aviação, 1800 - Residencial Itamaracá Bl.11, Apto. 11

Bairro Aviação

CEP: 16.056-725 - Araçatuba, SP

Tels.: (18) 3608-1909 ou (18) 8112-2517

E-mail: [email protected]

29- Socransky SS, Haffajee AD. Periodontal microbial ecology. Periodontol

2000 2005; 38: 135-87.

30- Sternberg EM, Chousos GP, Wilder RL, Gold PW. The stress response

and the regulation of inflammatory disease. Ann Intern Med 1992;

117: 854-866.

31- Tristão GC, Espaço biológico: estudo histométrico em periodonto

clinicamente normal de humanos. [Tese de doutorado]. São Paulo:

Universidade de São Paulo, 1992. 47p.

periojun08 03-04-09.pmd 4/9/2009, 5:16 PM89