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1 AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS EVIDENCIADAS EM UM CONJUNTO DE EDIFICAÇÕES HABITACIONAIS RECÉM- CONSTRUÍDAS F. L. BOLINA Eng. Civil, Mestrando PPGArqUrb itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected] R. CHRIST Engenheiro Civil, Mestre itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected]. B. F. TUTIKIAN Engenheiro Civil, Doutor itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected] RESUMO As manifestações patológicas podem ser evidenciadas em construções recém-concluídas, sendo oriundas de anomalias que não foram originadas pelo uso da edificação. Neste contexto, o intento deste trabalho é apresentar a vistoria e o diagnóstico das principais manifestações evidenciadas nas primeiras idades de um conjunto habitacional residencial composto por 6 casas de dois pavimentos, construídas na região litorânea do estado do Rio Grande do Sul, no Sul do Brasil. Fundamentado em uma análise do projeto, inspeção visual in loco e ensaios não destrutivos, o estudo é dividido em 3 partes, onde se evidencia (1º) a caracterização do objeto de estudo; (2º) a descrição das manifrestações patológicas observadas e, por fim, (3º) as principais causas que culminaram na deflagração destas inconformidades. Evidenciou-se que as manifestações patológicas em idades iniciais são oriundas, essencialmente, de equívocos e insuficiências de projeto, escolha indevida dos materiais e erros provindos de uma execução errônea. 1 INTRODUÇÃO Muitas das manifestações patológicas evidenciadas em edificações podem ser observadas antes mesmo da entrega da obra ao usuário. Motivadas essencialmente por equívocos cometidos na fase do projeto, escolha errônea de materiais e deficiência na execução, estas anomalias incrementam com o avançar do tempo, comprometendo o desempenho e, por conseguinte, a vida útil da edificação. Caso não sejam sanadas em idades iniciais, a evolução destas manifstações patológicas terão custos corretivos muito mais onerosos. Com o intento de mesurar a intensidade destas anomalias ocasionadas na etapa de projeto e execução, este artigo busca listar as principais deficiências observadas em um conjunto habitacional de 6 casas que, na data da vistoria, ainda não tinham sido entregues. O objetivo é enumarar tais inconsistências e criar uma estatística fiável dos principais fatores que induzem a deficiências precoces nas edificações para evitar a repetência destas nas próximas construções. Para cumprir com este propósito este trabalho foi fundamentado em uma análise visual e em ensaios não destrutivos. As manifestações patológicas foram identificadas e, posteriormente, deduziu-se acerca da principal circunstância que culminou na referida deficiência. A anáise técnica deste estudo foi dividida em duas partes. Na primeira são apresentadas as principais manifestações patológicas encontradas nas unidades. Na segunda parte, a justificativa de cada anomalia referida, analisando o respectivo fenômeno, ou seja, uma abordagem e explanação técnica acerca das prováveis circunstâncias que potencializaram o surgimento e a propagação daquele defeito.

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AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS EVIDENCIADAS EM UM CONJUNTO DE EDIFICAÇÕES HABITACIONAIS RECÉM-

CONSTRUÍDAS

F. L. BOLINA Eng. Civil, Mestrando PPGArqUrb itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected]

R. CHRIST Engenheiro Civil, Mestre itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil

[email protected].

B. F. TUTIKIAN Engenheiro Civil, Doutor itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil

[email protected]

RESUMO As manifestações patológicas podem ser evidenciadas em construções recém-concluídas, sendo oriundas de anomalias que não foram originadas pelo uso da edificação. Neste contexto, o intento deste trabalho é apresentar a vistoria e o diagnóstico das principais manifestações evidenciadas nas primeiras idades de um conjunto habitacional residencial composto por 6 casas de dois pavimentos, construídas na região litorânea do estado do Rio Grande do Sul, no Sul do Brasil. Fundamentado em uma análise do projeto, inspeção visual in loco e ensaios não destrutivos, o estudo é dividido em 3 partes, onde se evidencia (1º) a caracterização do objeto de estudo; (2º) a descrição das manifrestações patológicas observadas e, por fim, (3º) as principais causas que culminaram na deflagração destas inconformidades. Evidenciou-se que as manifestações patológicas em idades iniciais são oriundas, essencialmente, de equívocos e insuficiências de projeto, escolha indevida dos materiais e erros provindos de uma execução errônea. 1 INTRODUÇÃO

Muitas das manifestações patológicas evidenciadas em edificações podem ser observadas antes mesmo da entrega da obra ao usuário. Motivadas essencialmente por equívocos cometidos na fase do projeto, escolha errônea de materiais e deficiência na execução, estas anomalias incrementam com o avançar do tempo, comprometendo o desempenho e, por conseguinte, a vida útil da edificação. Caso não sejam sanadas em idades iniciais, a evolução destas manifstações patológicas terão custos corretivos muito mais onerosos. Com o intento de mesurar a intensidade destas anomalias ocasionadas na etapa de projeto e execução, este artigo busca listar as principais deficiências observadas em um conjunto habitacional de 6 casas que, na data da vistoria, ainda não tinham sido entregues. O objetivo é enumarar tais inconsistências e criar uma estatística fiável dos principais fatores que induzem a deficiências precoces nas edificações para evitar a repetência destas nas próximas construções. Para cumprir com este propósito este trabalho foi fundamentado em uma análise visual e em ensaios não destrutivos. As manifestações patológicas foram identificadas e, posteriormente, deduziu-se acerca da principal circunstância que culminou na referida deficiência. A anáise técnica deste estudo foi dividida em duas partes. Na primeira são apresentadas as principais manifestações patológicas encontradas nas unidades. Na segunda parte, a justificativa de cada anomalia referida, analisando o respectivo fenômeno, ou seja, uma abordagem e explanação técnica acerca das prováveis circunstâncias que potencializaram o surgimento e a propagação daquele defeito.

F. L. Bolina; R. Christ; B. F. Tutikian Avaliação e diagnóstico das principais manifestações patológicas evidenciadas em um conjunto de edificações habitacionais recém-construídas

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As principais inconformidades observadas na vistoria das casas são os seguintes: (a) som cavo nos revestimentos, (b) manchas superficiais no revestimento, (c) elevada espessura do revestimento, (d) fissuras horizontais (paredes), (f) fissuras horizontais (moldura das aberturas), (e) fissuras verticais e (g) flecha excessiva da estrutura. Os principais mecanismos indutores de tais processos foram deficiências na execução e erros de projeto. Com o diagnóstico mais provável definido indicou-se, então, as possibilidades de manutenções reparativas e preventivas mais adequadas para cada situação. 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA O aumento do número de manifestações patológicas é um forte indicativo de que as edificações existentes estão envelhecendo precocemente. Estima-se que em países industrialmente desenvolvidos, cerca de 40% do total dos recursos das indústrias da construção estão sendo aplicados em reparos e apenas 60% em novas instalações [9]. O surgimento de problemas patológicos está atribuído a diversos fatores. É de grande importância o conhecimento destes, pois para se determinar as medidas corretivas a serem tomadas faz-se necessário conhecer o correto diagnóstico das anomalias , proporcionando uma recuperação adequada[10]. Os componentes não estruturais têm uma influência significativa na qualidade e funcionalidade das construções. Estes podem contribuir tanto para a proteção e durabilidade de componentes estruturais (como é o caso das pinturas), como para a valorização das construções. Estes componentes têm, tipicamente, uma vida útil inferior à vida útil estrutural ou mesmo à vida útil funcional das construções [3]. A existência de dados relativos à vida útil de materiais e componentes é essencial para se alcançar maior longevidade das construções, permitindo uma correta seleção, uso e manutenção destes materiais [5]. Um diagnóstico preciso representa o sucesso do investimento e, obviamente, o início da solução do problema [5]. Contudo, dificilmente haverá a certeza do conjunto de anomalias existentes, mas sim uma redução do número de dúvidas. No diagnóstico sempre haverá, portanto, um grau de incerteza, cuja eficácia só poderá ser confirmada pela resposta satisfatória do sistema no tratamento prescrito [7]. Adicionalmente, a sustentabilidade do espaço construído requer o controle e planejamento dos materiais e recursos econômicos necessários durante o seu ciclo de vida, de forma que seja gerido de um modo mais econômico possível [4]. A realização de inspeções periódicas com a finalidade de subsidiar as atividades de manutenção certamente possibilitará uma melhor estratégia de ação, evitando que muitos dos problemas que ocorrem nas estruturas tenham seus efeitos intensificados a ponto de comprometer as condições de funcionamento e durabilidade [10]. 3 CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO O intento deste trabalho é realizar uma análise das manifestações patológicas existentes em um conjunto habitacional de casas já concluídas, porém ainda não habitadas, que irão constituir um conjunto habitacional residencial no litoral estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Foram analisadas 6 casas, enumeradas, sequencialmente de 1 a 6, conforme o croqui apresentado na Figura 1. O trabalho de vistoria, realizado no dia 30 de abril de 2014, com início às 10:40hs e término às 13:20hs, iniciou na casa número 1 e encerrou na casa de número 6. Na Figura 2 e Figura 3 são apresentadas vistas gerais destas residências, ilustrando as construções que foram inspecionadas e, por conseguinte, objeto deste estudo.

Figura 1 - Croqui representando, em planta, a numeração - adotada neste relatório - das residências vistoriadas.

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Figura 2 - Vista geral das casas 1 a 4.

Figura 3 - Vista geral das casas 5 e 6.

Cada residência possui dois pavimentos, totalizando 150m² de área construída. Estruturalmente, trata-se de casas executadas com alvenaria autoportante. Em alguns pontos, onde era necessária a abertura de vãos no pavimento inferior, utilizaram-se vigas de concreto armado. As lajes foram pré-fabricadas e apoiadas diretamente sobre estas alvenarias, tanto no segundo pavimento quanto na cobertura. 4 PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS OBSERVADAS 4.1 Som cavo no revestimento argamassado Algumas paredes da casa, quando submetidas à percussão, produziram um som cavo. O som cavo fornecido caracteriza uma provável deficiência de aderência entre a argamassa e a alvenaria empregada na construção. Este artifício provém como um método normatizado para avaliar a estanqueidade desta união (revestimento e alvenaria). Quanto maior o som cavo produzido, tanto maior será, teoricamente, esta deficiência de iteração entre as partes. Concluiu-se, após esta averiguação, que algumas paredes provavelmente possuem uma aderência débil entre o revestimento e a sub-base. Segundo [1], a aderência do revestimento argamassado está essencialmente associada a: (a) ao grau de absorção da base, proporcionando uma microancoragem, e (b) a rugosidade superficial, que contribui para a macroancoragem. Em se tratando de revestimentos, independente do tipo, materiais e número de camadas aplicadas, é fundamental que existam boas condições de aderência do revestimento à base. Contudo, alguns fatores podem auxiliar a compreender o mecanismo que culminou no surgimento desta anomalia. Segundo [1], para a execução do revestimento e admitindo um projeto adequado, deve-se atentar para a limpeza da base (bloco cerâmico) e para o traço empregado na produção da argamassa do revestimento. Superfícies de blocos cerâmicos não suficientemente limpas comprometem a micro e macro aderência da argamassa. Argamassas mal dosadas, ou seja, com teor de cimento abaixo do ideal (argamassa pobre), tendem a comprometer a microancoragem desta junto ao bloco. Em relação ao substrato, devem ser relevadas a absorção inicial e a textura do mesmo, sendo estas as características mais importantes na promoção de aderência do revestimento. A textura do substrato (rugosidade) provém como um dos fatores fundamentais para garantir esta propriedade. Substratos rugosos possuem maior área de contato com a argamassa aplicada, melhorando, potencialmente, as condições de aderência. Substratos lisos, geralmente, conduzem a valores de aderência menores. Substratos com baixo potencial de absorção tendem a produzir baixa capacidade de iteração com a argamassa do revestimento. 4.2 Eflorescência revestimento argamassado Foram observadas manchas esbranquiçadas nas paredes internas periféricas da casa. Estas manchas, indicativas de umidade, foram caracterizadas por depósitos esbranquiçados na superfície dos revestimentos argamassados. Estes depósitos esbranquiçados são, em tese, sais cristalizados de metais alcalinos, como sódio e potássio, e alcalinos terrosos, como cálcio e magnésio. Um dos fatores cardeais que fomentaram o surgimento e propagação do referido fenômeno, evidenciado apenas nas paredes periféricas (Erro! A origem da referência não foi encontrada. e Erro! A origem da referência não foi encontrada.), foi a grande exposição pluvial na qual estas paredes estão submetidas. A referida solubilização dos sais só ocorre meio aquoso, o que, de fato, justifica o surgimento destas eflorescências apenas nas paredes referenciadas.

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Estas paredes, em sua face externa, estão diretamente expostas à chuva, o que permite concluir que esta é a justificativa mais plausível para a origem do fenômeno. Não foram observadas manchas nas paredes internas da edificação, as quais estão protegidas da chuva, reforçando, portanto, esta teoria. Segundo entrevistas realizadas com os profissionais que trabalham na execução das casas e que acompanharam o processo de inspeção, em períodos de chuva a umidade interna das paredes se intensifica, havendo, inclusive, escorrimento de água sobre a superfície destas. Na casa de número 5 foi possível analisar, internamente, uma parede periférica isenta de pintura. Constatou-se nesta parede a incidência de umidade na região circundante do bloco cerâmico, ou seja, na região da argamassa de assentamento deste sistema, conforme ilustrado na Erro! A origem da referência não foi encontrada.. Esta presunção elucida e reforça algumas teorias:

a) A umidade provém do ambiente externo, uma vez que no ambiente interno não se verificou agente provedor desta tipologia da manifestação patológica;

b) Não se trata de uma umidade ascensional, ou seja, oriunda do terreno natural, uma vez que as manifestações patológicas em questão foram observadas apenas no segundo pavimento;

c) Não se trata de uma umidade oriunda de alguma debilidade do sistema de telhados, uma vez que não foi constatado problema de infiltração ou manchas nas lajes ou forro do segundo pavimento;

d) Esta umidade é oriunda da chuva, sendo esta a única fonte justificável da umidade, uma vez que estas manchas foram observadas apenas nas paredes internas (adjacentes da casa) do segundo pavimento;

e) Há uma percolação hidrostática d’água da chuva do meio externo para o meio interno, através da argamassa de assentamento;

f) A referida percolação d’água fundamenta-se na existência de uma rede de poros bem formada e interconectada desta argamassa, sendo este um fator direto indicativo da qualidade da produção deste material;

g) A percolação não ocorre através do bloco cerâmico, fato comprovado na vistoria realizada sobre a parede interna com revestimento sem pintura.

Figura 4 - Evidência de umidade

percolada em parede interna periférica, sem revestimento, evidenciada na casa

número 5.

Figura 5 - Detalhe do revestimento externo argamassado, com acabamento do tipo grafiato, observado em todas as casas avaliadas. É

possível observar a aparência porosa desta superfície

4.3 Espessura revestimento argamassado Na vistoria realizada, foi analisada a uniformidade das espessuras do revestimento argamassado empregado nas obras finalizadas. Observou-se uma divergência significativa destes valores nas paredes internas, com espessuras variando de 2mm a 27mm, ou seja, fora das especificações normativas, conforme elucidado na Tabela [2].

Tabela 1 - Revestimento de paredes e tetos de argamassa inorgânica: espessuras recomendadas pela norma

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Uma comprovação fotográfica das asserções supracitadas é exposta na Figura 6 e Figura 7.Erro! A origem da referência não foi encontrada.

Figura 6 - Espessura de 27,23mm do revestimento, observado na casa 6.

Figura 7 - Espessura de 2mm do revestimento, observado

na casa 4.

Conforme relatado, esta análise da espessura do revestimento foi realizada apenas na parte interna da edificação, dada a facilidade de acesso. Admitindo uma geometria uniforme dos blocos cerâmicos, presume-se que o revestimento argamassado externo da edificação apresenta a mesma divergência de espessuras. Esta espessura, ora em excesso e ora em deficiência potencializa o surgimento de manifestações patológicas na edificação. Estas anomalias estão relacionadas não apenas ao desperdício dos materiais, dado o excessivo consumo em alguns pontos, mas indicativas da provável justificativa de fissuras existentes nos revestimentos, principalmente nos externos. 4.3 Fissuras horizontais Junto às paredes internas e externas, foram observadas fissuras lineares longitudinais, às vezes contínuas, na altura do roda forro. Segundo entrevista realizada no local da obra, constatou-se que foram utilizados blocos tipo canaletas perfil U na última fiada da alvenaria. Foi constatado que se utilizaram lajes pré-moldadas de concreto armado assentadas diretamente sobre estas canaletas. O espaço vazio existente entre as canaletas e as lajes foi preenchido por graute, formando uma espécie de viga de amarração, solidarizando o sistema laje x alvenaria. Este sistema, caso não sejam adotadas medidas preventivas na interface graute x laje, solidariza-se, comportando-se mecanicamente como um sistema monolítico. Sabe-se que as lajes, principalmente as do último pavimento (cobertura), estão mais expostas à incidência solar. O concreto, como a grande maioria dos materiais sólidos, quando submetido a elevadas temperaturas possui a capacidade de absorver calor e dilatar-se, produzindo uma variação volumétrica positiva (aumento) da sua geometria inicial (Figura 8). Caso este incremento volumétrico seja restringido, produz-se um aumento das tensões internas na interface em que se promove esta restrição, culminando na propagação de fissuras nesta região (interface laje versus alvenaria). Deste pressuposto, as fissuras oriundas deste fenômeno são tipicamente lineares, em ambos os lados da parede (interna e externamente), conforme Figura 9 e Figura 10.

Figura 8 - Descrição do fenômeno evidenciado

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Figura 9 - Fissuras lineares, tipicamente de origem

térmica, observadas junto ao roda forro da parede interna da casa número 1.

Figura 10 - Fissura linear, tipicamente de origem térmica,

observada na parte externa da edificação, próximo ao nível da laje, observada na casa de número 1.

4.4 Fissuras verticais Nas paredes externas da edificação foram observadas fissuras verticais sobre o revestimento argamassado. Estas fissuras, típicas de movimentação térmica do material, foram provenientes de uma deficiência oriunda ainda da fase de projeto, quando não foram especificadas juntas de movimentação térmica entre os panos de fachada. O fenômeno da dilatação térmica é potencializado principalmente na região Sul do Brasil, pelo alto diferencial térmico (variação de temperatura) observado em algumas estações, principalmente no outono, quando a diferença de temperatura diária entre turnos pode atingir 20ºC. Nas 6 casas vistoriadas não foram observadas juntas de movimentação térmica nos panos dos revestimentos fachadeiros. O objetivo fundamental do emprego das juntas no sistema de revestimento de fachada está relacionado principalmente ao aumento da capacidade de absorver deformações deste subsistema. Caso os esforços internos oriundos desta variação volumétrica de origem térmica do material não sejam absorvidos, o revestimento argamassado pode fissurar, criando uma junta de movimentação térmica (Figura 11).

Figura 11 - Detalhe da fissura vertical existente junto à fachada da edificação.

Ademais, as casas analisadas possuem uma execução débil do subsistema de revestimento. Observou-se uma divergência significativa das espessuras do revestimento interno, algumas vezes fora das recomendações normativas. Esta evidência leva a crer que ocorre esta mesma deficiência de uniformidade de espessuras nas paredes externas. Observou-se que, em algumas paredes internas, a espessura do revestimento empregado era demasiada, o que, de fato, potencializa o surgimento de fissuras oriundas de variação volumétrica, pois, a priori, quanto maior o volume do elemento, tanto maior será a consequência do fenômeno térmico sobre o material, uma vez que há uma correlação direta do volume do material e a espessura do mesmo.

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4.5 Fissuras horizontais e verticais O projeto arquitetônico previu o uso de molduras nas esquadrias, também conhecidas como mochetas. Segundo os executores, estes acabamentos foram realizados com argamassa convencional. Estes elementos estão propensos ao efeito da variação volumétrica de origem térmica. Por tratar-se de elementos de maior espessura, o efeito da temperatura é proporcionalmente maior. Evidencia-se que, caso não seja considerado este efeito nestes subsistemas, a possibilidade da ocorrência de fissuras será maior, provindo inevitável à ocorrência destas anomalias (Figura 12 e Figura 13) caso não tenha sido adotada medidas preventivas, seja na fase de projeto, seja na fase de execução.

Figura 12 - Fissuras junto à moldura de uma esquadria

Figura 13 - Fissuras junto à moldura de uma esquadria

As molduras, por realizarem o contorno das esquadrias, possuem o comportamento mecânico (térmico) típico de elementos lineares, como, de fato, são. Estas fissuras adquirem direção perpendicular à direção de maior extensão (comprimento), pois é nesta direção que se desenvolvem as maiores tensões de cunho térmico nestes materiais. A variação linear é diretamente proporcional ao comprimento inicial dos elementos. Uma vez que o comprimento da moldura é maior no eixo x do que no eixo y (Figura 14), provém que a variação linear é maior no primeiro eixo e, por conseguinte, as tensões de tração possuem a sua maior magnitude nesta direção (Figura 15).

Figura 14 – Movimentação térmica as molduras de

esquadrias

Figura 15 – Manifestação patológica observada,

consequência da movimentação térmica das molduras das esquadrias

Deste pressuposto, entende-se que quando estes elementos são submetidos a uma variação volumétrica positiva (aumento do volume), as fissuras de desenvolvem devido a baixa resistência à tração que a argamassa possui. Não havendo uma resistência a este esforço, as tensões ultrapassam a capacidade resistiva do material, fissurando-o. Destarte, observa-se uma evidente necessidade da inserção de armaduras junto a estes elementos, objetivando propiciar uma maior capacidade de absorção dos esforços mecânicos referenciados.

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5 CONCLUSÃO Do exposto, evidencia-se que manifestações patológicas desenvolvidas durante a vida útil da edificação podem provir antes mesmo do uso da edificação, sendo consideradas, portanto, como manifestações patológicas induzidas. Salienta-se fundamental a realização de projetos que respeitem as prescrições normativas nacionais, bem como se adote uma cultura de maior controle dos materiais empregados nos sistemas, bem como uma acuidade maior na etapa de execução das edificações.

6 REFERENCIAS [1] Associação Brasileira de Normas Técnicas. “ABNT. NBR 7200: Execução de revestimento de paredes e tetos de

argamassas inorgânicas – Procedimento”. Rio de Janeiro, 1998. [2] Associação Brasileira de Normas Técnicas. “ABNT. NBR 13749: Revestimento de paredes e tetos de argamassas

inorgânicas – Procedimento”. Rio de Janeiro, 2013. [3] Branco, F.; Paulo, P.; Garrido, M. “Boletín Técnico 04: Vida Útil en la Construcción Civil”. Alconpat

Internacional: Mérida, 2013. [4] Daniotti, B.; Spagnolo, S.L. “Service life prediction buildings’ design to plan a sustainable building maintenance”.

Sustainable Construction, Materials and Prectices: Libon, 2007. [5] Masters, L. W; Brandt, E. “Prediction of service life of building materials and components”. RILEM Technical

Commite, Materials and Structures, 1987. [6] Muñoz, A. H. “Evaluación de patologías en estructuras de concreto”. Seminário Evaluación y Diagnóstico de las

Estructuras en Concreto. Bogotá, 2001. [7] Lapa, J. S. “Patologia, Recuperação e Reparo das Estruturas de Concreto”. Escola de Engenharia da UFMG.

Monografia (Especialização em Construção Civil) – Universidade Federal de Minas Gerais, 2008. [8] Pereira, V. G. Á. “Avaliação do coeficiente de difusão de cloretos em concretos: influência do tipo de cimento, da

relação a/c, da temperatura e do tempo de cura”. Dissertação de Mestrado. Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 2001.

[9] Metha, P. K.; Monteiro, P. J. M. “Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais”. 3. ed. São Paulo: Ibracon. 2008. [10] Tutikian, B. F.; Pacheco, M. “Boletín Técnico 01: Inspección, diagnóstico y prognóstico en la construcción civil”.

Alconpat Internacional: Mérida, 2013.