avaliação de algumas propriedades geotécnicas de solos residuais

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Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/185 Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial III, 1117-1121 IX CNG/2º CoGePLiP, Porto 2014 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X Avaliação de algumas propriedades geotécnicas de solos residuais granitóides da região central de Angola Evaluation of some geotechnical properties of granitoid residual soils from the central region of Angola I. M. R. Duarte 1,3* , F. M. Queta 2 , F. A. B. Bonito 2,3 , A. B. Pinho 1,3 © 2014 LNEG – Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP Resumo: Para avaliar as caracteristicas geotécnicas de um solo é necessário realizar um conjunto de ensaios para obter as respectivas propriedades básicas e permitir a sua classificação geotécnica (USCS, AASHTO e SATCC). Contudo, quando se trata de solos residuais tropicais, esta tarefa é dificultada por causa das suas especificidades químicas e mineralógicas. Neste trabalho apresentam-se algumas propriedades geotécnicas de solos residuais tropicais da Região Central de Angola, relacionando-as com as suas características mineralógicas previamente determinadas em Duarte et al. (2013). A caracterização geotécnica foi efetuada a partir dos parâmetros obtidos nos seguintes ensaios: índices físicos in situ, análise granulométrica, limites de consistência, equivalente de areia, expansibilidade, compactação e CBR, com o objetivo de aferir a aptidão destes solos residuais param fins de Engenharia (rodovias, ferrovias, aeródromos, aeroportos, barragens de terra, etc.). Os resultados obtidos permitem relacionar as propriedades geotécnicas destes solos residuais tropicais com as suas características mineralógicas, assim como, indicar a sua aplicação mais adequada em obras geotécnicas. Palavras-chave: Solos residuais tropicais, Região Central de Angola, Granitóides, Características geotécnicas, Mineralogia. Abstract: In order to evaluate the geotechnical characteristics of a soil is necessary to carry out a set of tests to obtain the basic properties and allow their geotechnical classification (USCS, AASHTO and SATCC). However, when dealing with tropical residual soils, this task is made difficult because of their chemical and mineralogical specificities. This work presents some geotechnical properties of tropical residual soils from the Central Region of Angola, relating them to their mineralogical characteristics previously determined by Duarte et al. (2013). This geotechnical characterization was performed based on parameters obtained from the following tests: physical indexes in situ, particle size analysis, consistency limits, sand equivalent, swelling, compaction and CBR in order to assess the suitability of these residual soils for Engineering purposes (roads, railways, airfields, airports, earth dams, etc.). The results obtained allow relating the geotechnical properties of these tropical residual soils with their mineralogical characteristics, as well as indicating their most appropriate application in geotechnical works. Keywords: Tropical residual soils, Central Region of Angola, Granitoids, Geotechnical characteristics, Mineralogy. 1 Universidade de Évora, Escola de Ciências e Tecnologia, Departamento de Geociências, Évora, Portugal. 2 Universidade Agostinho Neto, Faculdade de Ciências, Departamento de Geologia, Luanda, Angola. ³GeoBioTec – Centro de Investigação da FCT, Universidade Aveiro, Portugal. * Autor correspondente / Corresponding author: [email protected] 1. Introdução A formação do solo é um processo lento e gradual, onde as rochas expostas na superfície terrestre ficam sujeitas às amplitudes térmicas diurnas, à acção dos ventos, à atividade dos seres vivos e, principalmente, à acção da água, que se infiltra e percola através das formações rochosas. Estes processos naturais actuam no sentido de desagregar e decompor os materiais expostos na superfície. A presença e o grau de actuação desses processos dependem principalmente de quatro fatores modificadores: rocha-mãe, tempo, clima e a geomorfologia. Em Angola os solos residuais mais desenvolvidos encontram-se em zonas cujo clima é tropical, quente e húmido, ocorrendo em grande parte nos planaltos da Região Central: Huambo, Huila, Zaire, Uíge, Malange, Cuanza-Sul e Bié (Silveira, 1967). Na sua fase inicial, o trabalho consistiu em percorrer algumas províncias de Angola com a finalidade de identificar e selecionar locais de amostragem de solos residuais de rochas granitóides. 2. Enquadramento regional 2.1. Localização Geográfica A região em estudo (Fig. 1) estende-se desde o Noroeste de Angola, na província do Cuanza-Norte (Cassenda, no Alto Dondo), passando pelo litoral Centro-Oeste, na província do Cuanza-Sul (Cangulo, Quibala e Waco- Kungo) e deslocando-se para Sudeste até ao Planalto Central do Huambo (Colêlê, CF-Caála, Cruzeiro, Sacaála). 2.2. Características climáticas O clima de Angola é geralmente considerado como clima tropical, sendo dividido em duas estações: uma estação seca e fresca (Cacimbo) de Junho a Setembro e a outra, quente e chuvosa (estação chuvosa) de Outubro a Maio. Este clima é fortemente influenciado por um conjunto de factores, dos quais se destacam, a latitude (6º a 18º), a altitude, a orografia, a corrente marítima de Benguela e as Artigo Curto Short Article

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Page 1: Avaliação de algumas propriedades geotécnicas de solos residuais

Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/185 Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial III, 1117-1121 IX CNG/2º CoGePLiP, Porto 2014 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X

Avaliação de algumas propriedades geotécnicas de solos residuais granitóides da região central de Angola Evaluation of some geotechnical properties of granitoid residual soils from the central region of Angola I. M. R. Duarte1,3*, F. M. Queta2, F. A. B. Bonito2,3, A. B. Pinho1,3

© 2014 LNEG – Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP

Resumo: Para avaliar as caracteristicas geotécnicas de um solo é necessário realizar um conjunto de ensaios para obter as respectivas propriedades básicas e permitir a sua classificação geotécnica (USCS, AASHTO e SATCC). Contudo, quando se trata de solos residuais tropicais, esta tarefa é dificultada por causa das suas especificidades químicas e mineralógicas. Neste trabalho apresentam-se algumas propriedades geotécnicas de solos residuais tropicais da Região Central de Angola, relacionando-as com as suas características mineralógicas previamente determinadas em Duarte et al. (2013). A caracterização geotécnica foi efetuada a partir dos parâmetros obtidos nos seguintes ensaios: índices físicos in situ, análise granulométrica, limites de consistência, equivalente de areia, expansibilidade, compactação e CBR, com o objetivo de aferir a aptidão destes solos residuais param fins de Engenharia (rodovias, ferrovias, aeródromos, aeroportos, barragens de terra, etc.). Os resultados obtidos permitem relacionar as propriedades geotécnicas destes solos residuais tropicais com as suas características mineralógicas, assim como, indicar a sua aplicação mais adequada em obras geotécnicas. Palavras-chave: Solos residuais tropicais, Região Central de Angola, Granitóides, Características geotécnicas, Mineralogia. Abstract: In order to evaluate the geotechnical characteristics of a soil is necessary to carry out a set of tests to obtain the basic properties and allow their geotechnical classification (USCS, AASHTO and SATCC). However, when dealing with tropical residual soils, this task is made difficult because of their chemical and mineralogical specificities. This work presents some geotechnical properties of tropical residual soils from the Central Region of Angola, relating them to their mineralogical characteristics previously determined by Duarte et al. (2013). This geotechnical characterization was performed based on parameters obtained from the following tests: physical indexes in situ, particle size analysis, consistency limits, sand equivalent, swelling, compaction and CBR in order to assess the suitability of these residual soils for Engineering purposes (roads, railways, airfields, airports, earth dams, etc.). The results obtained allow relating the geotechnical properties of these tropical residual soils with their mineralogical characteristics, as well as indicating their most appropriate application in geotechnical works. Keywords: Tropical residual soils, Central Region of Angola, Granitoids, Geotechnical characteristics, Mineralogy.

1Universidade de Évora, Escola de Ciências e Tecnologia, Departamento de Geociências, Évora, Portugal. 2Universidade Agostinho Neto, Faculdade de Ciências, Departamento de Geologia, Luanda, Angola.

³GeoBioTec – Centro de Investigação da FCT, Universidade Aveiro, Portugal. *Autor correspondente / Corresponding author: [email protected]

1. Introdução

A formação do solo é um processo lento e gradual, onde as rochas expostas na superfície terrestre ficam sujeitas às amplitudes térmicas diurnas, à acção dos ventos, à atividade dos seres vivos e, principalmente, à acção da água, que se infiltra e percola através das formações rochosas. Estes processos naturais actuam no sentido de desagregar e decompor os materiais expostos na superfície. A presença e o grau de actuação desses processos dependem principalmente de quatro fatores modificadores: rocha-mãe, tempo, clima e a geomorfologia.

Em Angola os solos residuais mais desenvolvidos encontram-se em zonas cujo clima é tropical, quente e húmido, ocorrendo em grande parte nos planaltos da Região Central: Huambo, Huila, Zaire, Uíge, Malange, Cuanza-Sul e Bié (Silveira, 1967). Na sua fase inicial, o trabalho consistiu em percorrer algumas províncias de Angola com a finalidade de identificar e selecionar locais de amostragem de solos residuais de rochas granitóides.

2. Enquadramento regional

2.1. Localização Geográfica

A região em estudo (Fig. 1) estende-se desde o Noroeste de Angola, na província do Cuanza-Norte (Cassenda, no Alto Dondo), passando pelo litoral Centro-Oeste, na província do Cuanza-Sul (Cangulo, Quibala e Waco-Kungo) e deslocando-se para Sudeste até ao Planalto Central do Huambo (Colêlê, CF-Caála, Cruzeiro, Sacaála).

2.2. Características climáticas

O clima de Angola é geralmente considerado como clima tropical, sendo dividido em duas estações: uma estação seca e fresca (Cacimbo) de Junho a Setembro e a outra, quente e chuvosa (estação chuvosa) de Outubro a Maio. Este clima é fortemente influenciado por um conjunto de factores, dos quais se destacam, a latitude (6º a 18º), a altitude, a orografia, a corrente marítima de Benguela e as

Artigo Curto Short Article

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1118 I. M. R. Duarte et al. / Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial III, 1117-1121

bacias hidrográficas do Zaire, Zambeze, Cuanza, Cubango, Cuando e Cunene (Silveira, 1967).

Fig. 1. Localização geográfica da área em estudo inserida na Região Central de Angola. Fig. 1. Geographical location the area under study inserted in the Central Region of Angola.

2.3. Geomorfologia

Segundo Marques (1977), é possível subdividir a região em estudo em três unidades morfológicas importantes. A primeira, mais a norte, na região do Cuanza-Norte, caracteriza-se por possuir um relevo relativamente suave, típico das planícies dos cursos superiores dos rios Cuanza e Longe. A segunda apresenta-se a sul da primeira (Fig. 1), à medida que se caminha em direcção ao Huambo e se atravessa a zona do denominado “Relevo em Escadaria”, onde se observam os degraus que limitam as planícies a norte, com altitudes de 300, 400 e 500 m. Trata-se de uma zona geomorfológica de transição. A terceira área insere-se no Planalto Central de Angola, a principal unidade morfoestrutural de Angola, uma extensa superfície distribuída pelas regiões do Bié, Huambo e em estreita faixa até ao Lubango, com cotas absolutas que podem atingir os 2600 m (Araújo & Guimarães, 1992). A Oeste, o planalto é limitado pela Cadeia Marginal de Montanhas, com relevos de desníveis muito acentuados, onde se situam as zonas de maior altitude de Angola. Nos interflúvios e no sopé das montanhas desenvolvem-se solos lateríticos. Nesta região abundam rochas granitóides, cuja alteração in-situ originou os denominados solos residuais. As propriedades texturais, geoquímicas e mineralógicas destes solos dependem não só da composição química da rocha mãe, mas principalmente das características geomorfológicas e climatéricas locais (Duarte et al., 2011; 2013).

2.4. Enquadramento geológico

A nível regional é frequente a ocorrência de rochas magmáticas intrusivas do Arcaico Tardio (cerca de 2250 M.a.), constituídas por um complexo de rochas granitóides (composição granítica a diorítica). Os granitos predominam na área ocupada pelo referido complexo, distinguindo-se a presença de variedades autóctones e para-autóctones. O quimismo destas rochas granitóides permite distinguir duas variedades: granitos pouco alcalinos e ricos em alumina (plagiogranitos da série sódico-potássica) e granitos propriamente ditos, ricos em sílica e em álcalis (K2O). Frequentemente observa-se nestas rochas graníticas intrusivas, xénólitos de gnaisses e xistos biotíticos, micáceos e anfibólicos (Araújo & Guimarães, 1992).

Os afloramentos rochosos que deram origem aos solos que foram alvo deste estudo pertencem ao grupo identificado na Folha nº 3 da Carta Geológica de Angola (1:1.000.000), segundo Carvalho (1980/1981), como Granitos biotíticos da Região Central (granitos regionais; 2250 M.a.), correspondentes aos locais de amostragem A, B e C (Tabela 1); e aos tipos litológicos identificados na Folha nº 1 da Carta Geológica de Angola (1:1.000.000), segundo Carvalho (1980/1981) como Granitos porfiroblásticos (tipo Quibala; 2160±42 M.a.), referente ao local de amostragem E e Granitos biotíticos da Região Central, correspondente ao local de amostragem D (Tabela 1).

2.5. Mineralogia

De acordo com Duarte et al. (2013), quando a pluviosidade é muita elevada, como ocorre na região de Huambo, a lixiviação dos metais mais móveis é quase total, restando apenas os mais imóveis (e.g. Al, Ti, Fe) ou a sílica que apesar de lixiviada ainda é dominante. Neste caso, os feldspatos e a ilite são instáveis e são transformados em caulinite. Parte do quartzo permanece estável e os óxidos de ferro tornam-se mais evidentes, propiciando a formação de solos lateríticos, de cor laranja avermelhada (Fig. 2c). Em condições de menor pluviosidade, e relevo em escadaria, (Cangulo, Cuanza-Sul), os feldspatos potássicos resistem parcialmente à meteorização. A caulinite forma-se em menores quantidades e os óxidos de ferro são menos abundantes, não propiciando a formação de concreções ferruginosas (Fig. 2b).

Ainda em condições de menor pluviosidade (Dondo, Cuanza-Norte), os feldspatos potássicos e de sódio resistem parcialmente à meteorização. A esmectite é o mineral argiloso dominante, a caulinite praticamente não se forma, sendo os óxidos de ferro menos abundantes, não conferindo a cor avermelhada visível nas outras regiões. O solo apresenta uma cor cinzenta amarelada, onde ainda são visíveis muitos minerais primários herdados da rocha mãe, com uma textura própria de um saprólito ou solo residual jovem (Fig. 2a).

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Avaliação geotécnica de solos granitóides de Angola 1119

Fig. 2. Solos residuais da Região Central de Angola: a) Kwanza-Norte; b) Kwanza-Sul; c) Huambo. Fig. 2. Residual Soils of Central Region of the Angola: a) Kwanza-Norte b) Kwanza-Sul c) Huambo.

Tabela 1. Características geotécnicas de solos residuais tropicais de granitóides de Angola.

Table 1. Geotechnical characteristics of tropical residual soils of granitoids from Angola.

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1120 I. M. R. Duarte et al. / Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial III, 1117-1121 3. Métodos

A metodologia adoptada consistiu fundamentalmente em 3 fases da investigação:

Recolha de dados: Pesquisa bibliográfica, incluindo a informação cartográfica e as técnicas de amostragem e ensaio a aplicar.

Trabalho de campo: Consistiu no reconhecimento, com a finalidade de identificar as principais manchas de solos residuais e selecionar os locais mais favoráveis e representativos para realização dos ensaios in situ e recolha das amostras de solo residual e respetiva rocha-mãe, sã e alterada, ao longo de cada perfil de alteração (Fig. 2).

Ensaios de laboratório: Nas amostras representativas de solos residuais colhidas no decurso dos trabalhos de campo foram efetuados os seguintes ensaios laboratoriais em 14 amostras colhidas em 7 locais de amostragem: análises químicas e mineralógicas, determinações dos índices físicos in situ, análise granulométrica, limites de consistência, expansibilidade, equivalente de areia, compactação e CBR.

4. Resultados

São apresentados de forma resumida na tabela 1, os resultados dos ensaios de caraterização física e geotécnica, para os principais parâmetros obtidos, com os valores médios ou representativos, nomeadamente: o teor em água no estado natural (w0), índice de vazios inisitu (e0), densidade das partículas sólidas (Gs), análise granulométrica, limites de consistência (limite de liquidez (wL) e índice de plasticidade (IP)), expansibilidade (Exp.), equivalentes de areia (EA), para além dos parâmetros obtidos no ensaio de compactação Proctor modificado (peso volúmico seco máximo (γdmáx) e teor em água óptimo (wópt)) e índice de CBR.

Os solos foram classificados de acordo com algumas das classificações para fins de engenharia mais utilizadas internacionalmente pela comunidade geotécnica (Tabela 1), nomeadamente a Classificação Unificada de Solos (ASTM D2487-85 – USCS), a Classificação Para Fins Rodoviários (LNEC E 240-1986 – AASTHO) e a Classificação para as rodovias situadas no espaço da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), denominada Southern Africa Transport and Communication Commission (SATCC).

5. Conclusões

As propriedades dos solos residuais da região em estudo não resultam da ação isolada dos fatores, litologia da rocha-mãe, tempo, clima e geomorfologia, mas sim da atuação combinada dos mesmos, sendo o clima e a geomorfologia os fatores dominantes, como também foi constatado noutras regiões (Duarte et al., 2004; 2008).

Os solos residuais em estudo podem agrupar-se em 3 grupos, quanto à mineralogia predominante (Duarte et al., 2013) e respetivas características físicas: i) Solos residuais de granitóides do Huambo – caulinite, quartzo e óxidos de ferro, propiciando a formação de solos lateríticos,

resistentes à colheita, de cor laranja avermelhada (Fig. 2c); ii) Solos residuais de granitóides do Cangulo (Cuanza-Sul) – os feldspatos potássicos ainda resistem à meteorização, a caulinite e os óxidos de ferro são menos abundantes, não propiciando a formação de concreções ferruginosas, os solos são geralmente vermelhos escuros, friáveis (Fig. 2b); iii) Solos residuais de granitóides do Dondo (Cuanza-Norte) – tanto os feldspatos potássicos como os sódicos resistem parcialmente à meteorização, a esmectite é o mineral argiloso dominante, o solo apresenta uma cor cinzenta amarelada, os finos são expansivos (Tabela 1), mas ainda são visíveis muitos minerais primários herdados da rocha mãe, com uma textura própria de um saprólito ou solo residual jovem (Fig. 2a).

Relativamente à classificação geotécnica, os dados indicam-nos que existe uma correspondência entre os diferentes sistemas utilizados (Tabela 1). Sendo que, de acordo com a classificação USCS, os solos são essencialmente SM (areia siltosa), nas regiões mais secas (Cuanza-norte e Cuanza-Sul) e MH (Silte elástico) ou SC (areia argilosa) nas regiões mais húmidas (Planalto do Huambo). A classificação AASHTO revela-nos que os solos são essencialmente A-7-5, com Ip moderado em relação ao WL, portanto, o seu comportamento sob a camada do pavimento pode ser regular. Quanto à classificação da SATCC, os solos residuais dos granitóides das províncias onde chove menos (Cuanza-Norte e Cuanza-Sul) são materiais do grupo G7 (material para sub-leito) e no Planalto do Huambo abundam os solos do tipo G10 (material para aterro).

Apesar das classificações utilizadas demonstrarem um comportamento geotécnico moderado, regular ou menos bom, para aterros e vias de comunicação, os dados obtidos para os parâmetros de compactação e índice CBR (Tabela 1), assim como a observação de obras geotécnicas na região, revelam tratar-se de geomateriais com aptidão para esses propósitos. Pensa-se que esta resistência adicional que os solos tropicais lateríticos apresentam, como refere Duarte et al. (2011), deve-se às concreções ferruginosas típicas destes solos residuais, o que nem sempre é considerado nas classificações geotécnicas convencionais.

Existe, portanto, alguma incongruência entre o comportamento geotécnico destes solos residuais em obra e o previsto por métodos tradicionais de classificação de solos de clima temperado, pois existem algumas características especiais dos solos residuais tropicais que não são adequadamente consideradas por essas classificações baseadas essencialmente nos parâmetros granulométricos e consistência dos solos. Assim, sugere-se a introdução na classificação e descrição destes solos tropicais, de características tais como, a expansibilidade e a composição mineralógica.

Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) pela concessão de uma Bolsa de Licença Sabática e ao Centro de Investigação GeoBioTec -

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Avaliação geotécnica de solos granitóides de Angola 1121

Projeto PEst-OE/CTE/UI4035/2014, à Universidade Agostinho Neto o acolhimento e apoio logístico, às Universidades de Évora e Aveiro os meios disponibilizados, à Empresa Pron’gila a utilização dos laboratórios em Luanda.

Referências Araújo, A.G., Guimarães, F., 1992. Geologia de Angola. Notícia

Explicativa da Carta Geológica à escala 1:1.000.000. Serviços Geológicos de Angola, Luanda, 137 p.

Carvalho, H., 1980/1981. Carta Geológica de Angola, na escala 1:1.000.000. Instituto de Investigação Científica Tropical, Lisboa, 4 Folhas.

Duarte, I.M.R., Ladeira, F.L., Gomes, C.F., 2004. Influência das propriedades químicas e mineralógicas no comportamento geotécnico de dois solos residuais graníticos. 9º Congresso Nacional de Geotecnia. SPG/Universidade de Aveiro, Vol. 1, 229-238.

Duarte, I.M.R., Mirão, J.P, Rocha, F.T., Bonito, F., Queta, F., Falcão, W., 2013. Pathway Weathering in Granitoid Rocks from Central Region of Angola: Geochemical and Mineralogical Data. Editora da Universidade Agostinho Neto (EDUAN), 28 p.

Duarte, I.M.R., Pinho, A.B., Gomes, C.F., 2008. Residual soils on granitoids from Alentejo, Portugal: typology based on mineralogical and geochemical data. Actas do IX Congresso de Geoquímica dos Países de Língua Portuguesa, Cabo Verde, 91.

Duarte, I.M.R., Rodrigues, C., Bonito, F., Pinho, A., 2011. Caracterização do comportamento geomecânico de um laterito do Huambo – Angola. In: J.F. Silva Gomes, C. António, C.F. Afonso. A.S. Matos, (Eds). A Engenharia como alavanca para o Desenvolvimento e Sustentabilidade. Edições INEGI, Maputo, 673-674. [on CD-ROM insert, Ref.CLME’2011_3109A, 11 p.].

Marques, M.M., 1977. Esboço das grandes unidades geomorfológicas de Angola. Garcia de Orta, 2(1), 41-43.

Silveira, M.M., 1967. Climas de Angola. Serviço Meteorológico de Angola, Luanda, (2ª Ed.), 44 p.