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CRISTIANE DE FIGUEIREDO ARAÚJO
AVALIAÇÃO DA EMPATIA EM MÉDICOS DE
DIFERENTES NÍVEIS DE ATENÇÃO À SAÚDE
Rio de Janeiro
Junho 2008
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL CURSO DE MESTRADO
CRISTIANE DE FIGUEIREDO ARAÚJO
AVALIAÇÃO DA EMPATIA EM MÉDICOS DE
DIFERENTES NÍVEIS DE ATENÇÃO À SAÚDE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Psicologia Social. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Eliane Mary de Oliveira Falcone Co-orientadora: Prof.ª Dr.ª Sandra Lucia Correa Lima Fortes
Rio de Janeiro
Junho 2008
CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CEH/A
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese. ________________________________________ _______________ Assinatura Data
A663 Araújo, Cristiane de Figueiredo. Avaliação da empatia em médicos de diferentes níveis de
atenção à saúde / Cristiane de Figueiredo Araújo - 2009. 92 f. Orientadora: Eliane Mary de Oliveira Falcone. Co-orientadora: Sandra Lúcia Correa Lima Fortes. Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Instituto de Psicologia. 1. Médico e paciente - Teses. 2. Medicina - História –
Teses. 3. Empatia – Teses. I. Falcone, Eliane Mary de Oliveira. II.Fortes, Sandra Lúcia Correa Lima. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Psicologia. IV. Título.
CDU 614.253
À minha família, cujo suporte e amor me fizeram chegar até aqui.
E a Nelson F. Figueiredo, que partiu cedo demais deixando de herança a sólida base
onde tudo se edificou.
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Eliane Mary Oliveira Falcone pela confiança, amizade e respeito em todos os momentos dessa jornada acadêmica.
À Sandra Fortes, minha co-orientadora, pelo incentivo e pelas idéias que motivaram a realização deste trabalho.
À querida Cynthia Cunha, pela disponibilidade pessoal e inestimável ajuda com os procedimentos estatísticos.
Aos professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da UERJ, pelo exemplo de compromisso com a educação e por ampliarem e enriquecerem as reflexões aqui apresentadas.
Aos profissionais de saúde que me abriram as portas e me acompanharam solidariamente na difícil etapa da coleta de dados: Carlos Marins, Berenice, Drª. Elizabeth Pinni, Drª. Flávia Cristina, Drª. Gianinna, Dr. Antonio Filpi e Dr. Hamilton Kestenberg.
À direção e às colegas da equipe de psicologia do Instituto Estadual de Dermatologia Sanitária, por compreenderem meu afastamento e me incentivarem.
E, finalmente, à minha querida amiga Célia Caldeira Fonseca Kestenberg, exemplo pessoal e profissional, a quem devo o início, o meio e o fim deste projeto.
Muito obrigada!
Ando devagar porque já tive pressa E levo esse sorriso porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte, mais feliz, quem sabe Eu só levo a certeza de que muito pouco eu sei
e nada sei.
Almir Sater e Renato Teixeira
RESUMO
ARAÚJO, Cristiane de Figueiredo. Avaliação da Empatia em Médicos de Diferentes Níveis de Atenção à Saúde. 92 f. Dissertação (mestrado em Psicologia Social) – Instituto de Psicologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.
O desenvolvimento de habilidades de comunicação em médicos tem sido apontado como uma necessidade e uma competência fundamental para o exercício da medicina. A empatia é uma habilidade interpessoal que pode ser descrita como a capacidade de compreender o ponto de vista e os sentimentos de uma outra pessoa – sem julgá-los – e de comunicar esse entendimento de modo que a pessoa que fala se sinta verdadeiramente compreendida pela pessoa que ouve. Essa habilidade promove um senso de validação na pessoa que fala, especialmente em situações de conflito, reduzindo a probabilidade de rompimento e fortalecendo os vínculos interpessoais. A empatia dos médicos é atribuída à sua educação pessoal, sendo raro o desenvolvimento dessa competência social durante o curso de formação médica. O desconhecimento sobre essa habilidade e sua função no exercício profissional motivou a realização deste estudo sobre a empatia em médicos que atuam em diferentes contextos de atenção à saúde no município do Rio de Janeiro. Participaram desta pesquisa 75 profissionais, dos quais 25 atuavam no nível da Atenção Primária, composto por equipes de saúde da família e por centros municipais de saúde; 12 pertenciam a unidades mais especializadas que correspondem ao nível de Atenção Secundária e 38 trabalhavam nos ambulatórios de hospitais universitários da Atenção Terciária. Foi aplicado o Inventário de Empatia (I.E.), que avalia os quatro fatores que compõem a habilidade empática: 1) Tomada de Perspectiva: capacidade de compreender o ponto de vista e os sentimentos da outra pessoa; 2) Flexibilidade Interpessoal: capacidade de aceitar perspectivas muito diferentes das próprias; 3) Altruísmo: capacidade de suspender temporariamente as próprias necessidades em função do outro; 4) Sensibilidade Afetiva: sentimento de compaixão e de preocupação com o outro. Os resultados mostraram que o grupo avaliado obteve médias semelhantes às apresentadas nos dados normativos do I.E. nos fatores Tomada de Perspectiva e Flexibilidade Interpessoal, enquanto superou a média no fator Altruísmo e ficou abaixo da média no fator Sensibilidade Afetiva. Esses dados indicam que a amostra de médicos avaliada possui uma capacidade mais acentuada de sacrificar suas próprias necessidades para atender ao outro, ainda que não associada necessariamente a um sentimento de compaixão equivalente. Isto pode estar relacionado com a reduzida importância dada ao aspecto emocional na formação médica. Em relação à avaliação da empatia por contexto de atenção em saúde, não foi encontrada diferença significativa entre os grupos com exceção do fator Tomada de Perspectiva. Neste componente, os médicos do Programa Saúde da Família destacaram-se significativamente do grupo de Atenção Secundária, o que parece estar relacionado com a proximidade do profissional com o contexto de vida do paciente e com a educação continuada que recebem através de treinamentos e capacitações onde são valorizadas as habilidades de comunicação desses profissionais. A partir desses resultados propõe-se que o desenvolvimento da empatia seja incluído nos cursos de formação médica e no planejamento das condições de trabalho nos diversos níveis de atenção à saúde.
Palavras-chave: Habilidades de comunicação. Empatia. Relação médico-paciente.
ABSTRACT
The development of communication skills of physicians have been argued as a necessity and a fundamental competence for medical professional exercise. Empathy is an interpersonal ability that may be described as the capacity to comprehend another person’s point of view and feelings – without judging them – and to communicate this comprehension in a way that the speaker feels truly understood by the listener. This ability promotes a validation sense on the speaker, especially in conflict situations, reducing the probability of breaking off and strengthening interpersonal ties. Physician’s empathy is attributed to personal education, being rare the development of this social competence along the medicine graduation course. Unknowing about this ability and its function on professional exercise has motivated the realization of this study on empathy of physicians that work in different contexts of health care system in the city of Rio de Janeiro. The participants of this research were 75 physicians, who 25 worked at Primary Health Care level, composed by teams of Family Health Program and by physicians of ambulatory units; 12 belonged to more specialized units, which correspond to the Second Health Care level and 38 worked at universities’ hospitals of the Third Tier of Health Care. The Inventory of Empathy (I.E.) was applied, assessing the four factors that compose the empathic ability: 1) Perspective Taking: capacity of comprehending other person’s point of view and feelings; 2) Interpersonal Flexibility: capacity of accepting perspectives very different from one’s perspective; 3) Altruism: capacity of suspending temporary one’s necessities for the other; 4) Emotional Sensibility: feeling of compassion and comprehension of the other. The results show that the assessed group has means similar to the ones presented in the normative data of the I.E. on the factors Perspective Taking and Interpersonal Flexibility while it has overtaken the mean of the factor Altruism and has undertaken the mean of the factor Emotional Sensibility. These data suggest that the physicians assessed have higher capacity of sacrificing their own necessities for attending the other, though it was not necessarily associated to an equivalent compassion feeling. This may be related to the reduced importance of emotional aspect in medical graduation. On the assessment of empathy by contexts of health attention, it was not found a significant difference between the groups, but the factor Perspective Taking. On this component, the physicians of Family Health Program have been significantly detached from the group of Second Health Care, what seems to be related to the physician’s proximity of the patient’s life context and to the continuous education that they receive through trainings in which the communication skills of these professionals are highly valued. With these results, it is proposed that the development of empathy should be included in medical training and on the working conditions plans of all health attention levels.
Keywords: Communication skills. Empathy. Doctor-patient relationship.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1. Lista de comportamentos não-verbais do médico e seus significados para o paciente
.................................................................................................................................................. 39
Quadro 2. Verbalizações não-empáticas .................................................................................. 48
Quadro 3. Verbalizações empáticas.......................................................................................... 48
Quadro 4. Unidades de saúde pesquisadas ............................................................................... 58
Quadro 5. Questão relativa à Tomada de Perspectiva no IE .................................................... 63
Quadro 6. Questão relativa à Flexibilidade Interpessoal no IE ................................................ 64
Quadro 7. Questão relativa ao Altruísmo no IE ....................................................................... 64
Quadro 8. Questão relativa à Sensibilidade Afetiva no IE ....................................................... 64
Quadro 9. Características sócio-profissionais dos participantes .............................................. 67
Quadro 10. Estatísticas descritivas para a amostra total ........................................................... 68
Quadro 11. Resultados para o fator Tomada de Perspectiva .................................................... 68
Quadro 12. Resultados para o fator Flexibilidade Interpessoal ................................................ 69
Quadro 13. Resultados para o fator Altruísmo ......................................................................... 69
Quadro 14. Resultados para o fator Sensibilidade Afetiva ....................................................... 70
Quadro 15. Empatia segundo o nível de atenção à saúde ......................................................... 70
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Avaliação da empatia segundo o gênero .................................................................. 71
Tabela 2. Especialidade médica e fatores da empatia. ............................................................. 71
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................... 11
1 CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA MEDICINA ................................................................................................
17
1.1 Primeiras práticas ............................................................................................ 17
1.2 A era moderna e a ciência médica ................................................................... 19
1.3 A medicina dos novos tempos: tecnologia, pós-modernidade e desafios à relação médico-paciente ...................................................................................
21
2 A COMUNICAÇÃO COMO HABILIDADE MÉDICA ESSENCIAL PARA A ASSISTÊNCIA EM SAÚDE ...........................................................
28
2.1 A função da comunicação na tarefa médica ................................................... 28
2.2 O que caracteriza uma boa comunicação? ..................................................... 34
2.3 Habilidades específicas de comunicação verbal e não-verbal ...................... 36
2.3.1 Comunicação verbal ........................................................................................... 36
2.3.2 Comunicação não-verbal .................................................................................... 39
3 EMPATIA: UMA HABILIDADE ESPECIAL DE COMUNICAÇÃO ......
42
3.1 Conceituando a empatia ................................................................................... 43
3.1.1 A atenção e a escuta empáticas ........................................................................... 45
3.1.2 A verbalização empática ..................................................................................... 47
3.2 Avaliação da habilidade empática .................................................................. 50
3.3 Empatia e a prática da medicina ..................................................................... 53
4 PARA ALÉM DO DISCURSO: AFINAL, OS MÉDICOS SÃO EMPÁTICOS? ..................................................................................................
57
5 MÉTODO .......................................................................................................... 58
5.1 Participantes ..................................................................................................... 58
5.2 Procedimentos de Pesquisa .............................................................................. 59
5.2.1 Primeira etapa: recrutamento dos participantes ..................................................
59
5.2.2 Segunda etapa: coleta de dados nas unidades .....................................................
59
5.3 Instrumentos .................................................................................................... 62
5.3.1 Ficha de caracterização sócio-profissional ........................................................
62
5.3.2 Inventário de Empatia (I.E.)................................................................................ 63
5.4 Análise dos dados .............................................................................................. 65
5.5 Questões éticas ................................................................................................. 65
6 RESULTADOS ................................................................................................. 66
6.1 Características sócio-profissionais dos participantes .................................... 66
6.2 Avaliação da empatia na amostra total de médicos ...................................... 67
6.3 Avaliação da empatia segundo o nível de atenção à saúde ........................... 68
6.4 Avaliação da empatia segundo as características sócio-demográficas ........ 71
6.4.1 Gênero ................................................................................................................ 71
6.4.2 Especialidade médica ......................................................................................... 71
7 DISCUSSÃO ..................................................................................................... 72
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 77
REFERÊNCIAS ............................................................................................... 78
APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(COEP/UERJ) .................................................................................................... 83
APÊNDICE B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (SMS/RJ) ...... 84
APÊNDICE C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(HUCFF/UFRJ) .................................................................................................. 85
APÊNDICE D – Ficha de Caracterização Sócio-Profissional .......................... 86
ANEXO A – Inventário de Empatia .................................................................. 87
ANEXO B – I.E. Dados normativos preliminares ............................................. 90
ANEXO C – Tabela ANOVA para os Fatores da Empatia na amostra
estudada .............................................................................................................. 92
11
INTRODUÇÃO
Este trabalho visa explorar a empatia no encontro entre médicos e pacientes na
atualidade e identificar o grau de habilidade empática do médico, através de uma medida de
auto-relato. Questões relacionais e de comunicação social têm sido levantadas como um
importante contraponto ao exercício cada vez mais tecnológico e tecnicista da medicina do
século XXI, que apesar dos inegáveis ganhos conquistados nas últimas décadas tem se
distanciado do objetivo de melhorar a qualidade de vida da humanidade. Cada vez mais as
habilidades de comunicação interpessoal para o bom exercício da medicina são consideradas
como atributos necessários à formação e capacitação médica tanto quanto as habilidades
técnicas.
Outro aspecto levado em conta no tratamento deste tema diz respeito à pessoa do
profissional de saúde. Quem trabalha com o sofrimento, a dor e a doença de outro ser humano
está, inexoravelmente, exposto a um alto grau de exigência psicológica e sob constante
tensão. O tipo de troca interpessoal que se estabelece com o paciente ou seus familiares pode
representar uma fonte de angústia para o profissional, que é exigido de uma postura ao mesmo
tempo acolhedora emocionalmente e eficaz tecnicamente, o que na prática não se constitui em
tarefa fácil. Sentir e demonstrar empatia por um paciente debilitado, com condições de vida
muitas vezes desumanas, com doenças contagiosas ou fatais é, em muitos momentos, uma
tarefa quase impossível diante do medo de se deixar levar pelas dificuldades e não conseguir
atingir o objetivo de curar ou de salvar a vida para a qual os profissionais de saúde são
preparados durante a formação acadêmica (Campos, 2005).
Nos últimos cem anos, o Brasil fez progressos sensíveis em termos de saúde pública.
O crescimento da população de 20 milhões de habitantes no início do século XX para 170
milhões no final do século é resultado, entre outros fatores, da redução das taxas de
mortalidade infantil, bem como dos índices de mortalidade por doenças infecto-contagiosas
que em 1930 respondiam por mais de 45% dos óbitos e em 1999 não passaram de 6%. A
expectativa de vida da população também se elevou no mesmo período de 33,7 para 68,6
anos. No entanto, o sistema de saúde no Brasil está muito longe do ideal, enfrentando ainda
problemas estruturais graves e apresentando grandes diferenças interregionais (Finkelman,
2002). Desde 1988 as práticas de saúde pública no país estão vinculadas ao Sistema Único de
Saúde – SUS que se caracteriza por ser um sistema único, regionalizado e hierarquizado de
atenção à saúde, que baseado nos valores do atendimento integral e universal a toda a
população deve funcionar de modo coordenado nas várias esferas do poder público, incluindo
12
a participação da sociedade, através de seus representantes, usuários e prestadores de serviços
(Serra, 2001).
O Ministério da Saúde define a atenção à saúde como:
Tudo que envolve o cuidado com a saúde do ser humano, incluindo as ações e serviços de promoção, prevenção, reabilitação e tratamento de doenças. No SUS, o cuidado com a saúde está ordenado em níveis de atenção, que são a básica, a de média complexidade e a de alta complexidade. Essa estruturação visa à melhor programação e planejamento das ações e serviços do sistema. Não se deve, porém, considerar um desses níveis de atenção mais relevante que outro, porque a atenção à Saúde deve ser integral. (Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=15544, acessado em 20/05/2008.)
O nível da atenção básica caracteriza-se pela assistência sanitária essencial baseada em
métodos e tecnologias práticas, cientificamente fundamentados e socialmente aceitáveis,
postos ao alcance de todos os indivíduos e famílias da comunidade mediante a sua plena
participação e a um custo que a comunidade e o país possam suportar, em todas e cada etapa
do seu desenvolvimento, com um espírito de auto-responsabilidade e autodeterminação
(OMS/UNICEF, 1978). Em outras palavras, a esse nível cabe resolver os problemas de saúde
mais freqüentes e relevantes de uma determinada região territorial, buscando desenvolver suas
ações sob os princípios da universalidade, acessibilidade, integralidade, continuidade dos
cuidados, humanização e participação social, entre outros (CONASS, 2006). Deve ser o
contato preferencial dos usuários com o sistema de saúde e atualmente sua organização se
compõe prioritariamente do Programa Saúde da Família (PSF), das campanhas, como a de
vacinação, e das Unidades Básicas de Saúde.
Ao ser criado com o argumento de uma reorganização da atenção básica em saúde a
partir de uma nova forma de vínculo entre os profissionais e os usuários, o PSF vem se
configurando como um dos principais dispositivos dos procedimentos de atenção integral à
saúde do indivíduo na atualidade. Além de existir em países como Canadá, Estados Unidos,
Espanha, Inglaterra, Cuba entre tantos outros, foi criado no Brasil em 1994 pelo Ministério da
Saúde, tendo como objetivo reorganizar a prática da atenção à saúde em novas bases e
substituir o modelo tradicional, levando a saúde para mais perto da família e, com isso,
melhorar a qualidade de vida dos brasileiros (Disponível em
http://portal.saude.gov.br/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=15894, acessado em 20/05/2008).
A proposta de criação desse modelo de atenção básica em saúde foi pautada nos
princípios fundamentais do SUS de integralidade, universalidade e eqüidade com participação
social. Através da vinculação de equipes de saúde da família com uma comunidade adscrita
territorialmente busca-se o compromisso de usuários e profissionais com a promoção da
13
saúde, prevenção, recuperação, reabilitação de doenças e agravos mais freqüentes, e na
manutenção da saúde desta comunidade. A continuidade do cuidado à saúde da família é um
dos dispositivos privilegiados desta reorganização do sistema de saúde.
O nível de atenção secundário é representado por programas, sistemas e serviços de
tratamento ambulatorial e pequenos hospitais de tecnologia intermediária, que incorpora
funções do nível primário e acrescenta as de tratamento especializado. É composto por ações
que visam atender aos principais problemas e agravos de saúde da população, cuja
complexidade da assistência na prática clínica demande a disponibilidade de profissionais
especializados e a utilização de recursos tecnológicos, para o apoio diagnóstico e tratamento.
O terceiro nível de atenção à saúde é o terciário, constituído por grandes hospitais
gerais e por hospitais especializados, que concentram tecnologia de maior complexidade e de
ponta, servindo de referência para os demais programas, sistemas e serviços. Incluem
normalmente os serviços de atenção ao paciente com doenças cardiovasculares, traumato-
ortopédicas, oncológicas, nefrológicas, entre outras. Além dos hospitais da rede federal, são
incluídos neste nível o setor privado contratado e os hospitais-escola ligados aos cursos
superiores de medicina.
Uma das principais marcas da implantação do SUS é a reorganização das práticas de
atenção à saúde a partir da ênfase nos conceitos de promoção da saúde e de ações de
prevenção, proteção e recuperação da doença. Em outras palavras, o atendimento integral
pressupõe priorizar ações preventivas, sem prejuízo das assistenciais. Na prática, o
funcionamento do sistema hierarquizado em níveis de atenção encontra uma série de
dificuldades de operacionalização, tanto pela inadequada aplicação de recursos financeiros
quanto pela organização dos recursos humanos.
Sobre a participação dos médicos na implantação e na mudança de atitudes proposta
no SUS, Serra (2001) afirma que “a medicina nunca será uma profissão meramente técnica.
Envolvida com o sofrimento e o infortúnio, empenhada em prolongar e melhorar a vida,
exigirá sempre de seus praticantes um espírito aguçado de solidariedade e um sentido especial
de devotamento ao próximo. Não é por acaso que os usuários do SUS reclamam
sistematicamente um atendimento mais humano – como dizem nossos vizinhos latino-
americanos, ‘com más calidad y más calidez’.” (Serra, 2001, p. 9).
Mesmo reconhecido como uma das saídas para o problema da desumanização da
prática médica, o estudo das características práticas da relação médico-paciente fica
normalmente aquém da necessidade que o exercício profissional exige, fazendo com que este
assunto tenha pouca credibilidade entre os clínicos e, ao mesmo tempo, seja considerado um
14
ideal distante da realidade da maioria dos hospitais e ambulatórios (Fernandes, 1993). Para
suprir esta lacuna entre a teoria e a prática, as habilidades sociais envolvidas em uma
comunicação eficaz e recompensadora precisam ser identificadas e esclarecidas, para que se
possa capacitar os profissionais e não somente exigir que se desempenhem adequadamente
sem dar os subsídios concretos e realistas para tal desempenho.
Historicamente a medicina se constituiu enquanto prática e ciência primeiramente a
partir do contato com o paciente e da compreensão sobre seus sintomas e doenças através da
observação conscienciosa, da escuta atenta e do exame físico. A evolução tecnológica e
científica ampliou a capacidade de atuação e a eficácia da prática médica, contudo as
demandas atuais em saúde ainda desafiam os médicos a buscar novas formas de atuar sobre a
saúde e a doença, sendo presumível que a compreensão dos fatores que influenciam os
resultados das ações em saúde deve constituir uma meta a ser permanentemente alcançada.
A influência da comunicação, enquanto via fundamental para o estabelecimento da
relação entre o médico e o paciente, é um dos fatores determinantes da qualidade do trabalho
em medicina. No entanto, apenas constatar este fato não esclarece em que medida e em quais
de seus aspectos as habilidades interpessoais do médico são exigidas na prática clínica e
ensinadas nos cursos de graduação. Estas habilidades ficam normalmente a cargo da formação
pessoal do médico, fruto de seu ambiente familiar e social e, em muitos casos, além de não
serem reforçadas durante a formação médica, ainda são deturpadas por conceitos equivocados
que são passados ao longo deste período. Parece ser necessário então que se tornem mais
claros os conceitos ligados às habilidades sociais e à sua aquisição para o bom exercício da
medicina.
Somando-se a isso o conhecimento já existente sobre a função da empatia para a
competência social, melhorando significativamente a qualidade dos vínculos interpessoais e
reduzindo a probabilidade de rompimento das relações diante de situações de conflito, é
possível levantar questões sobre a função desta habilidade para profissionais que atuam em
condições especialmente desfavoráveis de atenção à saúde, como no caso do Brasil.
Estudos sobre a empatia na prática médica que contemplem a realidade brasileira
ainda são escassos. O presente trabalho pretende alcançar um pequeno recorte deste tema,
buscando compreender em que medida existe a habilidade de empatia em médicos inseridos
nos diversos – e adversos – contextos de atenção à saúde e se esta habilidade se diferencia
segundo estes diferentes contextos a partir de uma medida multidimensional de empatia
validada para a população brasileira.
15
O interesse aqui exposto pelas habilidades sociais envolvidas na interação médico-
paciente surgiu durante o curso de especialização em Psicologia Médica da Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Dentre as várias atividades
desenvolvidas pelo serviço uma em especial se relaciona com o entendimento das
particularidades e dos efeitos da comunicação entre o médico e seu paciente: a interconsulta
médico-psicológica. A interconsulta é um “instrumento metodológico” utilizado pelo
profissional de saúde mental – psiquiatra ou psicólogo – ao ser solicitado a dar seu parecer
sobre algum caso em acompanhamento médico e que esteja apresentando dificuldades de
relacionamento interpessoal com a equipe e/ou problemas no diagnóstico e no tratamento
(Botega, 2002). Durante a interconsulta, o psicólogo ou o médico-psiquiatra procura levantar,
tanto com o médico solicitante do parecer quanto com o paciente, os motivos do pedido de
avaliação e/ou intervenção psicológica, incluindo a compreensão do modo como ambos se
comunicam entre si. Em muitos casos, os problemas que levaram ao pedido de parecer são
justamente de ordem relacional, ou seja, de comunicação entre o médico e o paciente. Desta
observação, surgiu o interesse aqui explicitado por compreender melhor o papel das
habilidades sociais, em especial da empatia, na relação entre médicos e pacientes e na
formação acadêmica em medicina.
Além da formação teórica e prática acima mencionada, pude também, enquanto
profissional de saúde mental em uma Unidade Pública de Saúde do Estado do Rio de Janeiro,
constatar que a tarefa da psicologia no sistema de saúde não se resume ao atendimento clínico
dos pacientes enfermos, mas também inclui a compreensão, esclarecimento e facilitação dos
processos interpessoais da relação entre as equipes de saúde e os usuários, uma vez que este
aspecto relacional influencia, em maior ou menor grau, o resultado das ações em saúde. Neste
ponto, é possível identificar uma interface da Psicologia da Saúde com a Psicologia Social,
principalmente no que tange à compreensão dos processos sociais, cognitivos e
comportamentais envolvidos na interação entre profissionais e pacientes. Assim, os
componentes sociocognitivos e psicossociais da relação médico-paciente, em especial os
conceitos ligados à comunicação interpessoal e à teoria das habilidades sociais, servem de
embasamento e referencial teórico para esta investigação sobre a habilidade empática em
médicos.
Inicialmente é feita uma revisão conceitual sobre os principais temas a serem
abordados na pesquisa: uma breve contextualização histórica sobre a medicina enquanto arte,
ciência e profissão; a comunicação como instrumento na relação médico-paciente e a empatia
como uma habilidade refinada de comunicação. Em seguida, são apresentados os objetivos da
16
investigação e a metodologia proposta para acessar os dados desejados e avaliá-los. Por fim,
tem-se a apresentação e a discussão dos resultados encontrados.
17
Capítulo 1
CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS
SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA MEDICINA
Sem o intuito de esgotar os aspectos históricos da medicina enquanto prática e ciência,
é fundamental situar alguns dos diversos momentos que marcaram o desenvolvimento da arte
médica para compreender a função das habilidades de comunicação, e em especial da
empatia, para o médico em seu exercício profissional.
1.1 Primeiras práticas
Desde as civilizações mais primitivas a medicina existe enquanto prática. A
necessidade de possuir um “sistema médico”, onde pudessem ser cuidadas as pessoas que
padecessem de alguma mazela é inerente à própria existência dos grupos humanos. A
medicina se desenvolveu a partir de conhecimentos empíricos, influências culturais, religiosas
e de outras contribuições filosóficas e científicas que, ao longo do tempo, tornou seu corpo
teórico vasto e de apreensão complexa (Botsaris, 2001; De Marco, 2003; Porto, 2003). A
compreensão do percurso que seguiu o pensamento médico desde sua origem até os dias de
hoje nos auxilia na contextualização da questão do comportamento do médico frente aos
desafios de sua prática atual.
Por volta de 3000 a. C., quando são encontrados os escritos que caracterizavam o
surgimento das primeiras civilizações, são identificados alguns registros relacionados à
prática da cura de doenças, seja por “prescrições” ou por “incisões cirúrgicas” rudimentares.
Tais escritos tratavam, por exemplo, da responsabilidade que o praticante deveria ter para com
o doente, pois em caso de erro já eram previstas “sanções” e, em caso de sucesso, atribuíam-
se recompensas (De Marco, 2003).
Ainda sobre esta mesma época, encontraram-se também escritos relacionados à
observação de doenças, com a descrição dos sintomas que as caracterizavam, à semelhança
com o que encontramos nos tratados médicos de hoje. A diferença reside, principalmente, na
atribuição de causalidade para as moléstias, que eram identificadas com agentes sobrenaturais.
Ainda assim, os achados sobre a prescrição de substâncias para a cura de disfunções orgânicas
era condizente com os sintomas em questão e não somente com a origem sobrenatural ou
mítica das mesmas.
18
Registros sobre o Egito Antigo também mostram uma prática de cura ligada aos
hábitos e crenças espirituais-religiosos da época. Em paralelo encontram-se registros de
observação das doenças e do funcionamento do organismo, como idéias rudimentares sobre
como o ar poderia ser levado para dentro do corpo e sobre a função e características dos
humores orgânicos, como sangue, urina, esperma e saliva (De Marco, 2003).
Anos mais tarde, já por volta de 500 a. C., a visão antropomórfica e mítica sobre o
adoecer começou a ser contraposta a novas influências: a filosofia grega e seus
questionamentos iniciais sobre a constituição material do universo. Primeiro, encontramos os
pré-socráticos, que influenciariam os escritores hipocráticos. Dentre eles, o grupo de filósofos
Tales (c. 650-580 a. C.), Anaximandro (c. 560 a. C.) e Anaxímenes (c. 546 a. C.) deram
origem a dois conceitos básicos: physis (natureza) e arqué (princípio, substância original).
Pitágoras (c. 580-510 a. C.), Parmênides (c. 475 a. C.), Empédocles (c. 450 a. C.) e
Demócrito, entre outros, também contribuíram para o desenvolvimento do pensamento
médico com conceitos como os de algoritmo, conhecimento pela verdade e conhecimento pela
opinião, os quatro elementos fundamentais – água, terra, ar e fogo – e a concepção de átomo,
como unidade elementar e indivisível (De Marco, 2003).
Dentre os filósofos pós-socráticos, o que teve alguma influência na história da
medicina foi Aristóteles. Apesar de ter levantado algumas questões interessantes sobre a
reprodução dos seres vivos, seu legado acabou sendo considerado, posteriormente, um atraso
no desenvolvimento da ciência médica, uma vez que suas opiniões eram baseadas em um
conhecimento superficial sobre a anatomia e a fisiologia humanas, com pouco rigor em
termos de observação e experimentação. A principal idéia distorcida de Aristóteles foi sobre a
geração espontânea dos seres.
Seguindo na linha do tempo, encontramos Hipócrates (c. 460-380 a.C.). Filósofo e
médico praticante, suas contribuições sobre a saúde e a doença foram tão relevantes que o
fizeram merecer o título de “pai da medicina”, reconhecido até hoje, mesmo com todas as
mudanças já ocorridas na ciência médica. Uma de suas principais teorias – o sistema humoral
– se originou da observação, da descrição e do entendimento das doenças segundo alterações
das condições naturais do organismo. Os principais humores orgânicos – bile negra, bile
amarela, pituíta e sangue – funcionariam em consonância com os quatro elementos cósmicos
– terra, ar, fogo e água – com as quatro estações, com os estados climáticos – quente, frio,
seco e úmido – e com os quatro pontos cardeais. Mesmo encontrando-se superada, essa teoria
sobreviveu por muitos anos por sua simplicidade e capacidade de explicação para muitas
disfunções orgânicas, principalmente aquelas que podem ser consideradas crônicas (De
19
Marco, 2003). Ao longo de sua obra, Hipócrates descreveu acuradamente uma série de
doenças físicas e mentais, como a epilepsia, a gota, a febre amarela, além de discorrer sobre
temas como diagnóstico, exames e cirurgias. Seu trabalho permanece em muitos textos como
referência de raciocínio clínico, ética e acuidade diagnóstica (Botsaris, 2001).
Apesar da forte influência exercida por Hipócrates na constituição da medicina, foi
Galeno (131-200 d.C.) quem mais se destacou em termos de produção e descobertas sobre o
corpo humano e também sobre farmacologia, não somente durante sua vida, mas por toda a
Era Medieval e mesmo após o Renascimento. Suas idéias prevaleceram por aproximadamente
15 séculos. Ele se manteve seguidor da teoria dos humores de Hipócrates, mas ampliou
enormemente a compreensão sobre anatomia, fisiologia, patologia, cirurgia, dietética, higiene,
além da farmacologia, onde descreveu cuidadosamente sobre a manipulação de
medicamentos. Sua longa influência sobre o conhecimento médico se deveu principalmente
ao fato de não ter entrado em conflito com os valores teológicos medievais, uma vez que
propunha que o corpo era governado pela alma. Se, por um lado, as contribuições de Galeno
foram determinantes de uma prática médica duradoura, por outro, essa “ditadura médica”,
como todos os regimes totalitários, contribuiu para um atraso no desenvolvimento da
medicina, que só voltou a avançar a partir do século XVII, com o início da era moderna
(Botsaris, 2001; De Marco, 2003).
1.2 A era moderna e a ciência médica
As progressivas modificações operadas na sociedade a partir do Renascimento no
século XV, com a queda do feudalismo e o início da consolidação do regime capitalista,
marcam o surgimento da era moderna em contraposição à era medieval. Suas principais
características podem ser descritas pelo advento do método científico como forma
privilegiada de saber sobre o mundo, que, ao deixar para trás outras formas de conhecimento,
secularizam o mundo, separando o homem da natureza, dos mitos e dos conhecimentos
sagrados. Observa-se a crescente valorização da intelectualização, racionalização e
instrumentalização, que dividem meios e fins e marcam a transformação da técnica em objeto
e, mais recentemente, fim em si mesma (Galimberti, 2006).
Se este processo se iniciou gradualmente no século XV, o auge de seus pressupostos
pode ser datado do século XVIII com o movimento Iluminista. Foi neste momento que os
valores de universalidade, racionalidade e individualidade ganharam força. Pelo princípio da
universalidade os homens passam a ser concebidos como iguais, sem distinção de raça,
20
religião, sexo ou classe, o que corresponde ao ideal de “direito universal” proposto pela
ordem capitalista, onde todos teriam, pelo menos teoricamente, chances iguais de acesso aos
bens e riquezas. A racionalidade respalda a liberdade de conhecimento sobre o mundo, antes
limitada aos detentores sacralizados do saber. Através da razão, o homem poderia se libertar
das superstições e do uso indiscriminado do poder. E, finalmente, o homem poderia ser
valorizado em sua individualidade e autonomia, modificando irreversivelmente seu papel
enquanto sujeito social (Severiano e Estramiana, 2006).
Os efeitos da economia capitalista no comportamento humano individual e social são
uma marca estrutural da modernidade e é a partir da compreensão de suas premissas que
podemos avaliar a dimensão de suas conseqüências tanto nas relações interpessoais quanto na
dimensão individual, o que significa falar sobre a construção da sua identidade.
A idade da razão (XVII, XVIII), portanto, trouxe à cena a contestação radical do
“conhecimento existente” para dar lugar a um tipo de conhecimento proveniente de
raciocínio lógico, seja na forma dedutivo-matemática ou do modo empírico-indutivo. O
conhecimento pela razão substituiu o conhecimento dogmático que perseverou durante tantos
séculos em todas as áreas do saber. Em especial na medicina, este foi o momento fértil para o
surgimento do modelo biomédico, oposto, em essência, a um modelo multifatorial e
integrativo do ser – bio-psico-socio-espiritual (De Marco, 2003).
Alguns autores consideram que a medicina, em sua origem, era fundamentalmente
baseada no encontro com o doente, na compreensão de suas queixas e sintomas e no alívio de
seu sofrimento – o que Porto (2003) denominou de “medicina dos doentes” e De Marco
(2003) de “medicina dos sintomas”. A partir do Renascimento, com o desenvolvimento da
medicina científica e da microbiologia iniciou-se o fenômeno da “medicina das doenças” ou
“medicina dos tecidos” marcada pela teoria anatomoclínica em contraposição à “medicina dos
doentes”. Sem dúvida, a possibilidade de conhecer o corpo humano internamente em suas
características morfológicas, anatômicas e fisiológicas levou a inúmeros progressos no
conhecimento das doenças que afetavam o homem. No século XIX vieram as descobertas de
Pasteur e Koch sobre microbiologia, a invenção do estetoscópio e a descoberta dos raios X
(Porto, 2003).
21
1.3 A medicina dos novos tempos: tecnologia, pós-modernidade e desafios à relação
médico-paciente.
A partir do século XX e do advento da medicina tecnológica, com o desenvolvimento
de novos métodos de diagnóstico, como o eletrocardiograma, a medicina nuclear e a
ultrassonografia houve uma revolução na capacidade de identificar doenças, marcando,
segundo Porto (2003), o início da separação entre a “medicina das doenças” e a “medicina dos
doentes”. Isto representou entre outras coisas um maior investimento da ciência médica na
compreensão e no domínio dos sintomas e das doenças que afetavam o organismo humano. O
próprio fascínio pelos recursos técnicos pode ter contribuído para um aumento do foco de
atenção nos procedimentos e uma menor atenção aos aspectos psicossociais do adoecer e da
pessoa do paciente.
As relações interpessoais sofreram significativas mudanças com o advento da pós-
modernidade a partir da segunda metade do século XX. Umberto Galimberti (2006)
desenvolve algumas considerações a respeito da influência da técnica e da tecnologia na
constituição do indivíduo e da sociedade contemporânea. Ele afirma:
Continuamos a pensar a técnica como um instrumento a nossa disposição, ao passo que ela se tornou o ambiente que nos cerca e nos constitui segundo as regras de racionalidade que, misturando-se aos critérios da funcionalidade e da eficiência, não hesitam em subordinar as exigências do homem às exigências do aparato técnico. Sem saber, nos movemos ainda com as características do homem pré-tecnológico que agia em vista dos objetivos inscritos num horizonte de sentido, com um conjunto de idéias e sentimentos nos quais se reconhecia. Mas a técnica não tende a um objetivo, não promove um sentido, não abre o cenário da salvação, não redime, não revela a verdade: a técnica funciona. (Galimberti, 2006, p. 8)
Não se trata de negar a tecnologia ou de associá-la a algum tipo de poder maléfico
sobre a humanidade. Isto seria ingênuo e absurdo. O que se faz necessário é identificar e
compreender que tipo de modificações esse contexto de desenvolvimento tecnológico
promove na subjetividade humana e nas relações interpessoais. Em primeiro lugar, segundo
Galimberti (2006), é preciso desfazer a crença de que a técnica é neutra, caracteriza-se como
um meio e que seu emprego depende dos critérios de quem a utiliza. Ao contrário, a técnica
cria condições de mundo com as quais o homem irremediavelmente terá que conviver,
transformando-se obrigatoriamente. Suas ações, escolhas, paixões e condutas estão
necessariamente perpassadas pela organização técnica do mundo e não podem prescindir da
técnica para serem expressas.
Ainda sobre as modificações sofridas pela técnica é importante compreender que, em
sua origem histórica, a técnica era desenvolvida como meio para se atingir um fim. No
22
entanto, nas últimas décadas o aumento exponencial do aparato técnico levou a uma inversão
de definições, ou seja, “a técnica se transforma de meio em fim, porque não é mais o fim que
condiciona a representação, a pesquisa, a aquisição dos meios técnicos, mas será a ampliada
disponibilidade dos meios técnicos que desvela o leque dos fins, que por meio deles, podem
ser alcançados” (Galimberti, 2006, p. 12).
Não é difícil imaginar que tipo de correlações é possível estabelecer com a questão da
medicina atual. Os meios anteriormente complementares, como exames e medicamentos,
passam a ser a finalidade última do encontro do médico com seu paciente a tal ponto que em
muitos consultórios públicos e privados do país e do mundo, é praticamente dispensável o
exame clínico do paciente. Basta estarem presentes os exames laboratoriais e por imagem
para que o diagnóstico seja feito e a medicação prescrita. O médico assume uma função
basicamente informativa, prestador de um serviço, e o paciente, atual usuário-cliente,
consome – ou não – a prescrição. Se esta parece uma cena caricata, infelizmente talvez ela
não esteja muito distante da realidade de profissionais e pacientes que se encontram
diariamente pelos serviços de saúde.
Botsaris (2001) expõe diversas questões sobre o adoecimento ético da medicina atual,
onde trabalhos sobre humanização da prática médica são considerados de menor importância
para a formação profissional. Principalmente sob influência da medicina norte-americana, o
investimento em tecnologia de ponta e compartimentalização do ser humano tornam o
paciente um ser inanimado, sem emoções, anseios, medos e direitos, podendo ser depositário
de qualquer tipo de medicação ou procedimento desde que atenda a critérios técnicos.
Este domínio da técnica de forma globalizada associado à mudança constante nos
paradigmas vigentes coloca em questão o papel do médico na sua relação com o paciente no
século XXI e movimentos de reflexão sobre a prática médica, ainda que insuficientes, já
evidenciam o conflito na atuação deste profissional com o contexto no qual desempenha sua
função (Branco & Nakatani, 2003).
Como aponta Galimberti (2006), talvez o homem ainda tenha uma essência pré-
tecnológica que encontra dificuldades em se ajustar às condições impostas pela idade da
técnica. E assim, a medicina altamente desenvolvida tecnologicamente não encontra o fim
prometido ou imaginado da saúde perfeita e da qualidade de vida, mas níveis crescentes de
desafios clínicos, permeados por questões críticas sócio-econômicas, culturais e éticas.
Em resumo, o modelo biomédico caracterizado pelo enfoque anatomoclínico das
doenças e baseado na investigação de disfunções e lesões de órgãos, tecidos e sistemas
representou, e ainda representa, o paradigma que possibilitou o progresso do conhecimento
23
médico e da impressionante capacidade de diagnóstico, tratamento e cura de doenças
anteriormente letais. As dificuldades surgiram, entretanto, quando houve a separação entre o
físico (concreto) e o mental (abstrato), valorizando-se como verdade somente aquilo que
poderia ser tecnicamente avaliado e dimensionado, excluindo deste modo os componentes
psicossociais do adoecer.
Cabe ressaltar, no entanto, que isto não quer dizer que a especialização seja em si o
problema. Afirmar isso seria cometer, segundo De Marco (2003), um “holismo” ingênuo e
uma falha grave no reconhecimento do avanço do conhecimento médico. A questão da
especialização se tornou uma necessidade à medida que o objeto da medicina se expandiu e
diversificou, tornando impossível o conhecimento aprofundado do todo sem uma divisão em
partes compreensíveis. Na verdade, o que é digno de reflexão crítica é a apologia aos
especialismos, onde na prática o todo é reduzido a uma de suas partes, da qual se tenta extrair
regras para analisar o todo.
Recorrendo ainda à filosofia, pode-se compreender que os efeitos do desenvolvimento
desenfreado da técnica são também determinantes para a compreensão do que ocorre com boa
parte da medicina atual. Galimberti (2006) assinala que existe um desnível sentimental entre o
homem e o mundo dos seus produtos no sentido de que a humanidade já é incapaz de
perceber, advertir ou imaginar onde a técnica, que se desenvolve automaticamente e de modo
exponencial, fora de qualquer horizonte de sentido, conduzirá o homem e o transformará.
Essa perda de sentido também está relacionada com o que Lacroix (2006) identificou
como uma “incapacidade para sentir” característica do homem contemporâneo. Na verdade,
este acaba por procurar emoções intensas, que o façam sentir-se vivo. No entanto, e
paradoxalmente, ele perde consistentemente a capacidade para sensibilizar-se diante da vida,
o que leva a humanidade como um todo ao sério risco de se anestesiar ante a barbárie a qual
ficamos sujeitos em nome da racionalidade técnica.
Essa defasagem entre o desenvolvimento e racionalidade técnicos de um lado e a
imaginação e percepção humana de outro, torna o nosso sentimento inadequado em relação às
nossas ações que, a serviço da técnica, produzem algo desmesurado ao ponto de tornar nosso
sentimento incapaz de reagir, pois o muito grande e intenso nos deixa frios. E a falência do
sentir torna possível a repetição de coisas terríveis (Galimberti, 2006).
Relacionando esta reduzida sensibilidade do homem contemporâneo ao contexto da
interação médico-paciente, podemos falar sobre a complexa perda da humanidade que se
abateu sobre a medicina. O distanciamento afetivo pode ser percebido nas ações médicas com
freqüência maior do que se poderia supor para uma relação de ajuda e cuidado. Isso pode
24
ocorrer, entre tantas razões, pelas modificações sofridas nas habilidades de escuta dos
profissionais, que atualmente não encontram mais tempo e nem razão para investir em ouvir
verdadeiramente o que tem a dizer o paciente. Para um modelo de compreensão mais
abrangente do adoecer a escuta é uma habilidade imprescindível enquanto recurso diagnóstico
e terapêutico (De Marco, 2003).
Botsaris (2001) propõe uma reflexão sobre quais os motivos que levam um ser
humano e um segmento profissional da sociedade a agir de forma fria e distante para com seu
semelhante, quando seu dever seria agir com elevada preocupação ética, calor humano,
compreensão e solidariedade. Baseado em vários autores reconhecidos no meio médico, ele
aponta especialmente para dois aspectos: a valorização excessiva da tecnologia e a influência
que a vida moderna tem sobre a sociedade como um todo, modificando seus padrões de
comportamento.
O tradicional modelo biomédico não é mais suficiente para encontrar saídas eficazes
para uma série de patologias “pós-modernas”, como as doenças crônicas e as ligadas ao estilo
de vida. O exercício da medicina não goza mais do mesmo status de confiança e autonomia de
outrora, sendo o médico muitas vezes tratado como um prestador de serviços mecânicos,
voltado a reparar o organismo “enguiçado” em troca de remuneração calculada como
resultado entre técnica/peça utilizada somada à mão-de-obra. O paciente contemporâneo, por
sua vez, torna-se um consumidor, usuário de serviços de saúde, exigente de seus direitos, sem
ter, no entanto, a dimensão exata de quais são seus direitos e deveres. Ansioso e temeroso
pelo desconhecimento da doença, desconfiado e cético quanto à relação com aquele que
deveria ter a solução para a sua dor, esse paciente tenta todos os tratamentos, mas não se
envolve verdadeiramente com nenhum, ampliando significativamente a possibilidade de
malogro de seu tratamento (Bruckner, 2002). Diante deste panorama, movimentos de reflexão
sobre a prática médica, ainda que insuficientes, já evidenciam o conflito na atuação deste
profissional com o contexto no qual desempenha sua função e buscam estratégias para
responder aos desafios em questão (Branco & Nakatani, 2003).
Ainda no que tange à questão da tecnologia médica versus humanização do
atendimento, uma boa parte dos autores ligados ao estudo da relação médico-paciente
identifica que pelo menos parte do processo de distanciamento e desumanização da prática
médica está inquestionavelmente ligada à supremacia da tecnologia médica e do padrão
cultural pós-moderno que enfatiza o “consumo” nas ações e nas relações humanas. Por outro
lado, autores como Deslandes (2004) e Teixeira (2005) consideram em seus trabalhos e
reflexões sobre a questão da humanização em medicina que manter a oposição entre
25
desenvolvimento tecnológico e qualidade do cuidado corresponde a um equívoco teórico e
prático. Ambos argumentam que a saída para o problema da desumanização pode estar, por
exemplo, no desenvolvimento e utilização de recursos tecnológicos de cuidado, incluindo
especialmente as habilidades de escuta e de comportamentos eficazes na manutenção de
relações interpessoais enriquecedoras.
Sobre essa possibilidade de transformação de uma tecnologia meramente utilitária
para uma tecnologia das relações interpessoais, através das habilidades de escuta e
comunicação, Pascal Bruckner (2002) afirma que:
... não é certo que estejamos condenados a essa medicina subdividida que se parece muitas vezes com o trabalho de um consertador de canos e torneiras. Felizmente, às vezes se estabelece entre o doente e o médico uma comunicação que não é somente utilitária e que permite ao primeiro falar de seu sofrimento, inserir seu sintoma em uma história pessoal. Aí a relação, em vez de ser desigual como a de um mandarim que dá ordens e de um paciente que obedece, torna-se uma troca e um contrato no qual dois sujeitos, conscientes de seus limites, tentam juntos a melhor cura possível em meio a um respeito recíproco. Talvez o futuro esteja no casamento da competência do especialista com a inteligência humana do generalista. (Bruckner, 2002, p. 205).
Algumas das principais abordagens sobre a relação médico-paciente como instrumento
de humanização da medicina surgiram com os estudos em psicologia médica durante o século
XX, especialmente a partir da década de 60. A psicologia médica, enquanto disciplina
independente nos cursos de formação médica pode ser definida, dentre várias formas, como
uma psicologia voltada às necessidades oriundas do exercício da medicina tendo como um de
seus objetivos a capacitação psicológica dos médicos, independente de seu tipo de
especialidade, para compreender e atuar sobre o paciente de modo integral (De Marco, 2003).
Em outras palavras, a psicologia médica é a parte da medicina que tem como objeto a relação
estabelecida entre todos os envolvidos no processo de tratamento de um enfermo,
especialmente com o médico, visando capacitá-lo amplamente para a realização de seu
trabalho, incluindo a compreensão dos aspectos biopsicossociais da saúde e da doença, as
reações normais e patológicas ao adoecimento e a aquisição de habilidades interpessoais e de
comunicação para lidar com o paciente, foco central de toda a atenção médica que se pretenda
integral e abrangente (Jeammet, 1982; Schneider, 1986).
Diante das transformações constantes de nosso tempo, somos desafiados a
compreender diversas dimensões do comportamento humano: individual, social, familiar,
profissional. Os efeitos da cultura pós-moderna nas relações interpessoais são passíveis de
análise e compreensão em contextos distintos. A disponibilidade para se comunicar
verdadeiramente, silenciando, ouvindo, compreendendo e apurando nossa sensibilidade pode
ser uma via de resistência à perda dos valores humanitários. Lacroix (2006) defende um duplo
26
resgate de virtudes essenciais para o exercício do sentir, tão caro aos encontros interpessoais:
a disponibilidade e a admiração. Estar disponível significa ser acolhedor frente ao mundo,
com capacidade para contemplar e dar atenção, sem objetivos utilitários, ao interlocutor.
Admirar corresponde ao poder de olhar e de perceber o mundo do outro sem pré-julgamento,
podendo se colocar em ressonância com as idéias e os afetos a partir da escuta e da
observação.
Enquanto a tecnologia médica substitui a cada dia a semiotécnica – ou o exame físico
– ainda não se pode imaginar um procedimento equivalente ou substituto para a anamnese ou
entrevista clínica (Porto, 2003). E esse é, justamente, o ponto defendido pelas correntes
humanizadoras da prática médica: a formação e capacitação dos profissionais de saúde em
habilidades de comunicação e de relacionamento interpessoal. Ainda segundo este autor, estas
habilidades estão relacionadas a três qualidades humanas fundamentais: a integridade, o
respeito e a compaixão, que associadas ao conhecimento sobre as doenças e aos princípios
bioéticos são o alicerce da “medicina dos doentes”. Tais qualidades são assim definidas por
Porto:
...integridade consiste na disposição para agir de forma correta, seja o paciente quem for; respeito significa a capacidade de aceitar a condição humana do paciente, sabendo que ele se torna mais frágil e mais sensível pela própria doença; compaixão é a capacidade de compreender o sofrimento do paciente (Porto, 2003, p. 15. Grifos nossos).
Os aspectos relacionais do trabalho médico, a despeito de todo o avanço tecnológico
disponível em termos de diagnóstico e tratamento de doenças, é ainda fonte de interesse de
muitos pesquisadores em vários países (Branco, 2003; Desmond & Copeland, 2000; Roter &
Hall, 2006; Spiro, Curnen, Peschel & St. James, 1993). As implicações da relação médico-
paciente no tratamento, na cura, no desenvolvimento e na promoção da saúde têm a
magnitude de intervenções técnicas e tecnológicas em medicina, sendo tão fundamental no
processo clínico quanto qualquer outro procedimento médico. A importância do ato de cuidar
reaparece como um resgate das características primordiais da medicina e uma necessidade
ante as deficiências do paradigma de curar, que visa à doença e não necessariamente ao
doente. O cuidar não exclui o empenho em curar, mas extrapola suas ações em busca de uma
compreensão mais complexa do indivíduo doente, onde se possa avaliar a melhor forma de
adaptação da ciência médica a um paciente específico (Porto, 2003).
Levantamentos periódicos em bases de dados como Lilacs e Medline apontam para
um aumento na produção de pesquisas e artigos científicos relacionados à relação médico-
paciente nos últimos dez anos. A maioria desses trabalhos é realizada na Europa e na América
do Norte (Bertakis, Roter & Putnam, 1991; Eide et al., 2004; Roter et al., 1997; González &
27
Beoto, 2003), sendo ainda pouco encontradas pesquisas sobre a realidade nacional (Caprara &
Franco, 1999; Caprara & Rodrigues, 2004; Franco & Alves, 2005; Franco, Bastos & Alves,
2005).
O próximo capítulo se propõe a abordar a questão da comunicação na tarefa médica,
enquanto alicerce para um modelo humanizado de atenção à saúde, voltado a visão integral do
ser humano e considerando os aspectos biopsicossociais do processo saúde-doença.
28
Capítulo 2
A COMUNICAÇÃO COMO HABILIDADE MÉDICA
ESSENCIAL PARA A ASSISTÊNCIA EM SAÚDE
2.1 A função da comunicação na tarefa médica
As transformações na medicina nos últimos anos não se restringiram aos aspectos
tecnológicos e farmacêuticos. Muitas contribuições foram formuladas na interface do modelo
biomédico com o modelo biopsicossocial, através de reflexões e pesquisas sobre a
necessidade de uma prática médica humanizada e do paradigma do cuidado enquanto forma
privilegiada de pensar sobre o doente, a doença e seus tratamentos. Os desafios impostos
pelos resultados limitados da medicina tradicional diante de pacientes com queixas múltiplas,
doenças crônicas e altos custos dos serviços médico-hospitalares originaram diversos estudos
sobre temas como qualidade do atendimento médico, relação médico-paciente e habilidades
interpessoais necessárias aos profissionais para o exercício da medicina na atualidade.
Publicações e estudos científicos sobre a natureza, o contexto, a dinâmica e as
conseqüências do diálogo médico e modificações nas exigências curriculares da formação
médica foram constantes nos últimos anos em vários países (Laidlaw & cols, 2007; Roter &
Hall, 2006; Graugaard, Holgersen & Finset, 2004; Branco, 2003; De Marco, 2003; Desmond
& Copeland, 2000; Collins & Collins, 1992; Levinson & Roter, 1993). Nos Estados Unidos,
por exemplo, a American Association of Medical Colleges (AAMC) e o Accreditation
Council for Graduate Medical Education (ACGME) indicaram que os cursos de medicina
deveriam capacitar os alunos em pelo menos seis habilidades fundamentais, dentre elas as de
comunicação interpessoal (Roter & Hall, 2006). Isto pode parecer insuficiente, mas
inegavelmente promove uma formalização da comunicação como uma das capacidades
essenciais, ao lado de postura profissional e conhecimento técnico-científico, ao bom
exercício da medicina.
Enfatizar a importância da comunicação entre o médico e o paciente não quer dizer,
entretanto, que esta seja a solução para os diversos problemas que atingem a área da saúde
como um todo (Franco & Alves, 2005; González, 2006; Roter & Hall, 2006). Certamente,
existem questões de ordem política, social e econômica que não serão esclarecidas pelos
estudos sobre a relação médico-paciente. No entanto, se pudermos compreender o quanto esta
relação pode contribuir positiva ou negativamente para os resultados individuais e coletivos
29
na saúde, será possível fomentar práticas mais satisfatórias e de melhor qualidade para todos
os sujeitos envolvidos neste contexto.
Por mais técnica que possa ser a medicina, não há como ignorar que seu exercício é
basicamente um processo social. De outro modo, não basta apenas um diagnóstico acurado e
uma prescrição de tratamento correta. Em uma consulta médica, tanto fatores sociais quanto
psicológicos interferem no processo de avaliação do paciente, de compreensão da queixa e de
seguimento das recomendações terapêuticas. Não é difícil, portanto, que ambos, médico e
paciente, reconheçam esse aspecto. A dificuldade está em não ter conhecimento claro sobre
como esse processo se desenrola e de que habilidades ambos necessitam para superar as
brechas identificadas na relação (Roter & Hall, 2006; Desmond & Copeland, 2000).
Um exemplo disso pode ser encontrado no estudo de Franco e Alves (2005) sobre a
relação médico-paciente no contexto do Programa Saúde da Família que descreve duas
conseqüências freqüentes das falhas na comunicação entre médico e paciente: a primeira se
refere ao atraso na resolução dos problemas trazidos pelo paciente devido à falta de
concordância entre a queixa do paciente e a demanda identificada pelo médico. A segunda
pode ocorrer associada à primeira e diz respeito à busca do paciente por diversos profissionais
na intenção de ser compreendido em sua queixa ou sofrimento. Isso representa obviamente
uma série de prejuízos de ordem funcional e financeira para o sistema de saúde, que além de
não contar com quantidade suficiente de profissionais, ainda padece de baixa resolutividade e
altos custos. Neste estudo foram avaliadas 408 consultas de 20 médicos de saúde da família
através de um instrumento observacional da relação médico-paciente onde se identificou o
predomínio de um estilo de comunicação não-dialógico, que inibe uma postura mais
autônoma e participativa do paciente.
Em outro estudo sobre o estilo de comunicação do médico (Laidlaw et al., 2007), os
autores buscaram identificar quais comportamentos e habilidades são característicos de
médicos considerados exemplares em termos de comunicação interpessoal. Para tanto,
utilizaram uma metodologia quanti-qualitativa, com uma ampla variedade de instrumentos
observacionais e medidas padronizadas, para identificar em uma amostra de 40 médicos os
15% mais habilidosos em interagir com o paciente em contraposição com os 15% menos
habilidosos. Os resultados mostram que os médicos do grupo com mais habilidade de
comunicação eram capazes de conduzir uma entrevista centrada no paciente sem sacrificar a
acuidade e a eficiência médica. A principal diferença entre os dois grupos foi que os médicos
do grupo mais habilidoso socialmente demonstraram dar maior importância à empatia, a
30
oferecer apoio ao paciente ao invés de emitir julgamentos e a auto-reflexão durante a
interação.
O que acontece durante uma consulta médica pode ficar registrado por muitos anos na
memória de um paciente. As palavras, os gestos, as emoções sentidas e compartilhadas, as
decisões, diagnósticos e prognósticos, enfim toda uma série de comportamentos verbais e
não-verbais que podem ter um impacto de longa permanência na vida de um paciente e de sua
família. Isto pode se refletir na disposição futura do paciente de buscar novo auxílio médico e
de confiar no mesmo ou, ao contrário, em uma verdadeira aversão a qualquer necessidade de
atendimento médico (Roter & Hall, 2006).
Ainda que médico e paciente estejam bem-intencionados ao se dirigirem um ao outro,
um observador imparcial logo poderia perceber o médico dizendo uma coisa e o paciente
ouvindo outra, e vice-versa. Helman (2003) afirma que mesmo que tenham padrões culturais
semelhantes, médicos e pacientes ainda continuarão a divergir em suas perspectivas sobre a
saúde e a doença. As conseqüências desse desentendimento incluem medicações tomadas
inapropriadamente, instruções não compreendidas, conselhos não seguidos, queixas não
ouvidas. Resultado: ambos, médico e paciente, insatisfeitos (Desmond & Copeland, 2000).
Sobre as diferenças dialógicas entre médicos e pacientes, Morin (2005) faz reflexões
acerca dos conflitos que surgem entre as antigas concepções e as novas expectativas dos
modelos que regem a relação de atenção e cuidado à saúde. No que tange aos personagens
envolvidos na cena do atendimento em saúde – médico, paciente, equipe e família –
encontramos o que o autor chamou de primeiro nível da polêmica. Os desentendimentos
característicos das relações entre estes agentes são identificados como prováveis obstáculos à
efetivação das mudanças necessárias para um melhor funcionamento do sistema de saúde.
Além das dificuldades relacionais, existe ainda a questão do tempo em dois momentos
complementares e distintos: o tempo da consulta versus o tempo do tratamento. Normalmente
o primeiro é curto e marcado pela necessidade de se fazer um diagnóstico, marcando o que
Morin (2005) chamou de “entrada na doença”. O segundo é mais duradouro e se refere ao
tempo em que um paciente precisará ser acompanhado em sua doença, quando então a
qualidade da relação e da comunicação com seus cuidadores, médicos ou não, será
fundamental.
Em um estudo sobre a relação entre o estilo de entrevista do médico com o nível de
satisfação do paciente, Bertakis et al. (1991) levaram em conta este aspecto do tempo de
relacionamento mencionado por Morin (2005). Eles avaliaram 550 consultas médicas de
retorno considerando que a maioria dos estudos anteriores sobre o mesmo tema havia
31
analisado apenas consultas de emergência ou de primeira vez, onde médico e paciente não
haviam estabelecido uma relação ainda. Os resultados obtidos através da análise das
entrevistas demonstraram, entre diversas considerações, que os pacientes ficam mais
satisfeitos quando o médico questiona sobre aspectos psicossociais da vida do paciente e
permite que este se expresse em relação a esse tema e não somente solicita informações
biomédicas. Outro aspecto considerado positivo pelo paciente é quando a entrevista é marcada
por uma atmosfera não-autoritária por parte do profissional, expressa principalmente pelo
comportamento de escutar com atenção e de não falar demasiadamente.
Tradicionalmente, o modelo biomédico não é suficiente para dar conta dos desafios
encontrados na prática cotidiana ligada ao cuidado do paciente em contraposição ao
tratamento ou cura da doença. Principalmente quando se pensa, como propõe Oliveira (2005),
em práticas de saúde baseadas no atendimento das necessidades humanas e de saúde
representadas em um determinado grupo social. Este novo paradigma no campo da atenção à
saúde aponta para a necessidade de identificação ou mesmo de construção de novas
tecnologias de trabalho que de fato capacitem os profissionais para o exercício da medicina
diante desse olhar renovado sobre as demandas de atenção em saúde. E é nesse contexto que
se torna possível pensar as habilidades de comunicação e interação social como ferramentas
privilegiadas de aproximação do médico à realidade social que se apresenta a ele.
A comunicação deficiente entre médicos e pacientes tem ainda mais um
correspondente: o esgotamento do profissional de saúde. Impasses na relação médico-paciente
podem ser conseqüência de dificuldades para exercer o cuidado de modo adequado.
Condições aversivas de trabalho como em locais com altos índices de violência urbana,
remuneração incompatível com a função, enfrentamento de epidemias e instabilidade do
vínculo empregatício além de gerar um estado de desencanto, frustração e desgosto do
profissional em burnout podem levá-lo a agir de forma despersonalizada e desumanizada nas
relações interpessoais, incluindo na interação com o paciente. E seus efeitos não se limitam a
características afetivas, mas atingem também as atitudes, levando o profissional a se
comportar de modo enviesado, baseado mais no atendimento de suas próprias necessidades
que nas de seus pacientes (Morin, 2005).
Em contrapartida, uma boa relação médico-paciente tem efeitos positivos no
profissional. Alguns estudos revelam que médicos com um melhor desempenho interpessoal
apresentam um maior índice de satisfação profissional e menor desgaste físico e mental,
mesmo quando se tratam de especialidades de maior exigência psicológica, como em serviços
de emergência e cirurgias complexas. O próprio feedback positivo de um paciente satisfeito é
32
um poderoso reforçador para o profissional, que compartilha de um sentimento de “alegria
empática”, aumentando o vínculo com o paciente e reduzindo a probabilidade de problemas
na relação (Roter & Hall, 2006).
Segundo González (2006), cerca de 80% da tarefa clínica do médico se desenvolve na
comunicação com seu paciente. A interação médico-cliente é construída principalmente
através dos processos lingüísticos presentes na verbalização e dos pára-linguísticos
identificados na comunicação não-verbal (Soar Filho, 1998). Pelo discurso verbal, por
exemplo, são investigados os primeiros sinais e sintomas que levam ao diagnóstico. E
também, através do diálogo, são feitas as prescrições de tratamento e parte das posteriores
avaliações sobre a eficácia do mesmo. Deste modo, impressiona o fato de que muito pouco
seja investido na capacitação desses profissionais em habilidades de comunicação e manejo
da relação terapêutica durante os cursos de formação acadêmica, tanto de graduação quanto
de pós-graduação (González & Beoto, 2003; Levinson & Roter, 1993).
Ainda que um tratamento marcado por uma interação pessoal de baixa qualidade possa
ter efeitos terapêuticos e até bons resultados, como alguns profissionais podem supor, não é
aceitável que não se tenha consciência dos efeitos benéficos de uma boa comunicação
interpessoal. Muitos estudos identificam a importância da comunicação no estabelecimento de
relações terapêuticas bem-sucedidas. Dentre as vantagens, encontramos: diagnósticos mais
acurados, economia de tempo e recursos, aumento da cumplicidade e confiança do paciente
com maior adesão às recomendações da equipe de saúde, aumento exponencial da obtenção
de resultados positivos, tanto na prevenção quanto no tratamento de doenças (Desmond &
Copeland, 2000; Cyrino & Cyrino, 1997; Herrero & Martín, 2005; Caprara & Rodrigues,
2004; Soar Filho, 1998; Straub, 2005).
Em um dos poucos estudos encontrados sobre a realidade nacional, Caprara e
Rodrigues (2004) apontam para o problema da comunicação na relação médico-paciente
indicando o quanto se faz necessária a aquisição de competências para atender às atuais
demandas de saúde da população. Nesta pesquisa foram avaliadas 400 consultas médicas de
diferentes regiões do Estado do Ceará através de métodos qualitativos como entrevistas
abertas e observação participante e também métodos quantitativos, com a utilização de
instrumento observacional já utilizado em pesquisas estrangeiras. Os resultados referentes à
comunicação mostram que no início das consultas a maioria dos médicos tende a demonstrar
empatia. No entanto, as dificuldades surgem ao longo da entrevista quando 39,1% dos
médicos não explicam de forma compreensível o problema; em 58% das consultas o médico
não verifica o nível de entendimento do paciente sobre o diagnóstico e em 53% das consultas
33
não é verificado o nível de compreensão sobre as indicações terapêuticas. O tempo médio da
consulta é de 9 minutos, considerado pouco para o estabelecimento de uma comunicação de
qualidade. Além disso, o estudo identifica limitações organizacionais como alta rotatividade
de profissionais, falta de estruturas físicas adequadas e serviços mal gerenciados que também
interferem na relação com o paciente. E concluem sugerindo que além de conhecimentos
técnico-diagnósticos, os médicos necessitam de sensibilidade para conhecer e compreender a
realidade do paciente, incluindo as mudanças conseqüentes ao processo de adoecimento.
Problemas de comunicação são tão freqüentes que podem ser encontrados mesmo em
países onde a qualidade dos serviços médicos pode ser considerada superior a de nosso país
(Soar Filho, 1998). Focalizando o paciente temos: alto índice de insatisfação, baixa adesão
aos tratamentos propostos, abandono ou troca constante de profissional, pouca resolutividade,
entre outros. Já pelo lado dos profissionais, encontramos médicos com elevados níveis de
estresse ocupacional, enfrentando problemas jurídicos e insatisfeitos com a profissão (Stepien
& Baernstein, 2006).
Segundo Epstain (2005), a melhora na qualidade da comunicação em saúde surge,
inclusive, como uma alternativa aos crescentes e insustentáveis custos da medicina
tecnológica, corroborando a posição defendida anteriormente por outros autores. A
comunicação habilidosa pode contribuir positivamente na redução dos gastos com exames
complementares e tratamentos, incentivando a prevenção de doenças e a mudança da postura
do indivíduo “paciente” para o indivíduo consciente e ativo na relação que estabelece com os
profissionais de saúde. A comunicação ganha status de procedimento médico, podendo ser,
quando mal trabalhada, tão responsável por fracassos terapêuticos e iatrogenia quanto um
fármaco, uma cirurgia ou um tratamento inadequados (Epstain, 2005).
A partir do exposto até momento, pode-se resumir que o que se passa no encontro
entre médicos e pacientes é primordialmente da ordem da comunicação, ou seja, a conversa
que se estabelece entre ambos vai além das palavras e é certamente o instrumento
fundamental com o qual a relação médico-paciente é talhada e os objetivos terapêuticos são
alcançados. É a conversa que organiza a história do paciente e seus sintomas e os coloca em
um contexto significativo tanto para o paciente quanto para o médico (Roter & Hall, 2006). O
desafio para a medicina do século XXI está na capacitação dos profissionais para o
desenvolvimento de habilidades interpessoais que privilegiem a sensibilidade e uma prática
humanizada, onde seja possível se relacionar com o paciente como um ser integral física,
psíquica e socialmente. Daí a relevância das habilidades de comunicação para a prática
profissional médica e a relação de cuidado que se estabelece com o paciente.
34
2.2 O que caracteriza uma boa comunicação?
O primeiro ponto a ser considerado aqui é que as habilidades necessárias para uma boa
comunicação podem ser desenvolvidas e, na verdade, este é um processo que exige um
aperfeiçoamento contínuo. No entanto isto não ocorre, como se poderia supor, por simples
exposição a situações que demandam tais habilidades. É necessário que exista uma
abordagem sistematizada, com indicação de comportamentos e posturas claras e pessoas
capazes de orientar e supervisionar a aquisição dessas competências sociais. Ou seja, o ensino
de habilidades interpessoais precisa ser tão estruturado e didático quanto o ensino de outros
conteúdos disciplinares, especialmente na medicina (González & Beoto, 2003; Desmond &
Copeland, 2000; Falcone, 2000; Caballo, 1996).
Straub (2005) enfatiza que na base do relacionamento entre o médico e o paciente está
a natureza e a qualidade da comunicação, corroborando a indicação de vários autores, dentre
eles Weinman (citado por Straub, 2005), de que o treino em técnicas de comunicação deve ser
um componente integral dos currículos da formação médica. Ainda segundo Straub, o
treinamento em habilidades interacionais deve priorizar técnicas de escuta ativa, onde os
profissionais de saúde “ecoam, repetem e tentam esclarecer declarações dos pacientes para
alcançar o entendimento compartilhado de sintomas, preocupações e expectativas em relação
ao tratamento” (Straub, 2005, p. 449), incluindo também o ensino de técnicas de comunicação
não-verbal que demonstrem interesse e respeito pelo paciente.
O estudo das habilidades de comunicação interpessoal e a concepção de programas de
capacitação profissional em habilidades interacionais têm sido uma constante em vários
lugares do país e do mundo. González, Campayo e González (2005) apresentam como
principais objetivos de seu curso de capacitação em entrevista clínica e comunicação
assistencial para profissionais de saúde que atuam na atenção primária: 1) a sensibilização dos
participantes sobre seus comportamentos verbais e não-verbais durante a entrevista clínica; 2)
a ampliação dos recursos técnicos na comunicação com o paciente, especialmente aqueles
ligados à capacidade de apoio à narrativa do paciente e à atenção centrada no paciente; e 3)
possibilitar uma conduta sistematizada nas situações mais difíceis ou conflituosas. Schraiber e
Teixeira (1995) propuseram um curso de extensão dentro do Projeto UNI-Botucatu intitulado
“Comunicação, Cultura e Educação em Saúde”, onde abordaram, entre outros aspectos, as
relações estabelecidas entre as equipes de saúde e os usuários, privilegiando as questões de
percepção e entendimento do discurso; reconhecimento e interação com o outro e construção
e desenvolvimento de diálogo.
35
O Accreditation Council for Graduate Medical Education (2007), já mencionado
anteriormente, propõe uma lista de atribuições e comportamentos relativos às habilidades
interpessoais e de comunicação para os estudantes e residentes de medicina de universidades
americanas que incluem:
1. Demonstrar habilidade para desenvolver de forma respeitosa, efetiva e eficiente
uma relação terapêutica com os pacientes e seus familiares.
2. Trabalhar colaborativamente com outros membros da equipe de saúde.
3. Visualizar a experiência da perspectiva do paciente e aprender a identificar as
expectativas do paciente.
4. Demonstrar respeito pela diversidade cultural, étnica, espiritual, emocional e
relativa ao período de desenvolvimento vital do paciente e dos outros membros da
equipe de saúde.
5. Utilizar técnicas de escuta efetivas e ser capaz de solicitar e prover informações
através de estratégias verbais, não-verbais, escritas e tecnológicas.
6. Demonstrar habilidade para utilizar efetivamente o feedback fornecido pelo
paciente, seus familiares e colegas de equipe.
7. Demonstrar habilidade para negociar e resolver conflitos.
8. Demonstrar efetiva participação e mesmo capacidade de liderança na equipe de
saúde.
González (2006) apresenta um modelo de compreensão do processo de comunicação,
incluindo os aspectos não-verbais, que ilustra adequadamente o que pode ocorrer numa
situação de entrevista clínica: entre o emissor e o receptor da mensagem – verbal e não-verbal
– existem os canais de comunicação e estes podem ser bloqueados ou interrompidos por
ruídos e interferências. Os ruídos são de ordem externa e podem ter origem no ambiente onde
ocorre o atendimento, por exemplo, ambulatório cheio, sobrecarga de pacientes, falta de
condições físicas e tecnológicas, interrupções freqüentes ou ainda políticas institucionais,
familiares, entre outros.
As interferências por sua vez são de ordem interna aos sujeitos envolvidos na
interação e podem ser divididas em três classes: cognitivas, emocionais e sócio-culturais. As
interferências cognitivas se referem à incapacidade do paciente para expressar-se de maneira
compreensível, a crenças mágicas e rígidas do paciente sobre a saúde e a doença e às crenças
disfuncionais do profissional que tende a desconsiderar os aspectos psicossociais da história
do paciente. As interferências emocionais ocorrem quando o paciente está sofrendo de algum
transtorno mental, como depressão e ansiedade, ou está experimentando emoções extremas,
36
como ressentimento e agressividade. Da parte do profissional, as interferências emocionais
podem ocorrer quando o médico projeta no paciente suas próprias emoções disfuncionais,
como desamparo, irritação, cansaço. Finalmente, as interferências sócio-culturais dizem
respeito à existência de grandes diferenças sócio-culturais entre o médico e o paciente, à
relação custo-benefício e à reciprocidade, como capacidade para influenciar um ao outro
(González, 2006).
Para minimizar rompimentos dos canais de comunicação entre o médico e o paciente,
diversos autores vão identificar e propor técnicas de atenção aos componentes verbais e não-
verbais de uma consulta médica. É consenso na literatura a idéia de que deve haver o mínimo
de discrepância entre o que é dito e o que é demonstrado pela linguagem não-verbal
(González, 2006; Desmond & Copeland, 2000; Soar Filho, 1998). Em caso de dissonância,
ficará registrado para o paciente o que foi percebido no comportamento do médico e não o
que foi verbalizado. A postura corporal e o tom de voz são apontados como responsáveis por
até 93% da mensagem comunicada, enquanto apenas 7% se referem às palavras utilizadas
(Desmond & Copeland, 2000).
2.3 Habilidades específicas de comunicação verbal e não-verbal
2.3.1 Comunicação verbal
Um aspecto prioritário ao se considerar a comunicação verbal em medicina se refere
ao “código médico”. Muitas das palavras utilizadas tanto na forma escrita quanto na falada
são incompreensíveis para um interlocutor leigo e eventualmente para os próprios colegas de
profissão. O uso do jargão médico dificulta a compreensão do que precisa ser comunicado e
freqüentemente o paciente sai da consulta sem compreender o que o médico estava falando
(Roter & Hall, 2006; Desmond & Copeland, 2000). A maioria dos pacientes teme perguntar
sobre os termos que não compreendeu e parecer ignorante. Deste modo, ficam confusos e
correm o risco de não conseguirem seguir os pedidos ou recomendações médicas por total
falha de comunicação.
Comunicar de modo claro e honesto ao paciente seu diagnóstico e plano terapêutico
nem sempre é uma tarefa fácil, especialmente se as notícias não forem boas. No entanto,
estudos mostram que ao ser informado sobre o que está ocorrendo e participando da discussão
sobre o tratamento, o paciente mantém um senso de autocontrole, compreende, aceita ou
questiona o que está sendo proposto, modifica seus projetos de vida e se prepara para o que
37
está por acontecer. A utilização de termos vagos, obscuros ou de eufemismos pelo médico ao
se comunicar com o paciente vai interferir no modo como ele se comportará diante do
tratamento e como se relacionará com a equipe médica (Meredith et al., 1996; Fallowfield,
Ford & Lewis, 1994).
O médico Dráuzio Varela (2007), no livro em que relata sua experiência ao contrair
febre amarela, ilustra o que foi dito acima com a veracidade típica de quem vivenciou os
problemas de comunicação comuns à experiência de hospitalização. Ainda que os
profissionais envolvidos nos episódios descritos não fossem médicos, o padrão de
comunicação apresentado é perfeitamente associável a médicos também. Seguem os trechos:
Um técnico do laboratório passou um garrote para colher sangue e ligar o frasco de soro: ‘Vou dar uma picadinha’. Foi o primeiro de uma série infindável de diminutivos que viriam a ser pronunciados. (...) O emprego do diminutivo infantiliza o cidadão. Deitado de camisola e pulseirinha, sem forças para agir por conta própria, cercado de gente que diz: ‘Vamos tomar um remedinho’; ‘Abre a boquinha’; ‘Levanta a perninha’... há maturidade que resista? (Varela, 2007, p. 24/25).
E continua a seguir:
...o enfermeiro entrou com o comprimido de morfina solicitado. Com ar profissional, ele mediu a pressão, a temperatura, instalou um oxímetro em meu dedo para avaliar os níveis sangüíneos de oxigênio, contou o pulso, a freqüência respiratória, mas não comunicou o resultado ao maior interessado neles; limitou-se a desejar boa noite e a levantar as grades da cama, para meu espanto. (Varela, 2007, p. 28)
Os atendimentos tornam-se particularmente difíceis quando o clima entre o paciente e
a equipe que o assiste fica permeado por desconfiança e medo, quando certos assuntos não
podem ser tocados, criando-se uma espécie de “conluio de anonimato”, no qual ambos,
paciente e médico, fazem um acordo tácito no qual um não pergunta o que o outro teme
responder por imaginar que o primeiro ficará pior ao ser informado da resposta. A
comunicação empobrece dando lugar exclusivamente aos procedimentos clínicos ou
cirúrgicos (Novaes-Pinto, 2003).
A partir da experiência relatada anteriormente e de trabalhos sobre a relação médico-
paciente desenvolvidos em diversos lugares do mundo, é possível identificarmos algumas
habilidades de comunicação verbal pertinentes à prática da medicina (Desmond & Copeland,
2000, Soar Filho, 1998; Collins & Collins, 1992; Roter & Hall, 2006; González, 2006):
a) Chamar o paciente pelo nome, dando a devida importância ao modo de pronunciar o
mesmo, procurando certificar-se de que o está falando corretamente;
38
b) Empregar terminologia clara, objetiva e adequada ao nível de compreensão do
paciente para dar informações e esclarecimentos, evitando o uso de palavras
específicas do código médico-científico que não são de domínio público ou
traduzindo-as quando necessário. Explicações claras aumentam a chance de adesão ao
tratamento e economizam tempo, uma vez que diminuem a probabilidade de retorno
ou telefonemas para retirar dúvidas;
c) Evitar diminutivos e outros tipos de eufemismo que infantilizem o paciente;
d) Não se referir ao paciente, especialmente na presença do mesmo, na terceira pessoa do
singular (p.e.: “Já conferiu a temperatura do Sr. João?” ao invés de “Já conferiu a
temperatura dele?”);
e) Fazer uso adequado de perguntas abertas e fechadas com o objetivo explícito de
permitir a expressão de idéias e sentimentos pelo paciente e aguardar que o paciente
termine de responder ao que foi perguntado. Esta orientação pode parecer curiosa ou
mesmo dispensável, mas estudos como o de Beckman e Frankel (citado por Roter &
Hall, 2006) mostram que ao perguntar ao paciente sobre o motivo da consulta apenas
25% dos médicos aguardam a conclusão da resposta. Normalmente o paciente é
interrompido com menos de 23 segundos, deixando de fornecer informações
pertinentes ao esclarecimento da queixa. Nos casos onde não houve esta interrupção, a
média de tempo utilizado pelo paciente foi de 32 segundos e em nenhum caso
ultrapassou 2 minutos;
f) Perguntar sobre os sentimentos do paciente e legitimá-los (p.e.: “É compreensível que
você se sinta decepcionado diante dos resultados de seus exames.”)
g) Expressar verbalmente empatia acurada pelos sentimentos do paciente (p.e.: “Você
parece estar muito preocupada com seus filhos durante o período em que estará
internada, não é mesmo?”)
Longe de esgotar todas as possibilidades, esta lista de indicações de habilidades de
comunicação verbal representa um resumo do que vem sendo discutido e avaliado em termos
da necessidade de capacitação e educação dos profissionais de saúde em aspectos
interpessoais. Isoladamente, no entanto, a expressão verbal adequada para uma determinada
situação não é suficiente para que a mensagem a ser comunicada seja compreendida e o
vínculo relacional seja estabelecido e mantido. Muitas vezes o profissional profere as palavras
certas, porém com uma postura incompatível com o que está sendo dito. Os aspectos não-
verbais são essenciais para uma boa comunicação e também necessitam ser caracterizados e
explicitados.
39
2.3.2 Comunicação não-verbal
Em termos gerais a comunicação não-verbal é composta pela postura corporal e pelos
aspectos paralingüísticos como a entonação de voz. Ambos tendem a transmitir sentimentos e
preferências de modo involuntário, sendo responsável, como já mencionado anteriormente,
por até 90% do que é comunicado em uma mensagem. Em um contexto de atendimento
médico, por exemplo, o modo como o profissional se posiciona, sua expressão facial, olhar,
gestos e aparência pessoal certamente estarão comunicando mais do que suas palavras. No
entanto, a formação de habilidades interpessoais em medicina normalmente enfatiza o
aprendizado de conteúdos verbais – o que dizer e quando – deixando em segundo plano os
aspectos não-verbais – o como dizer.
Sendo a comunicação um processo dialógico e de interação entre duas ou mais
pessoas, não é possível deixar de considerar que dentre as habilidades sociais não-verbais
estão a percepção do próprio comportamento pelo profissional e também do comportamento
do paciente. Ou seja, a habilidade de identificar no paciente sentimentos e atitudes através de
sua expressão corporal e facial pode ser considerada uma qualidade profunda do profissional
(González, 2006; Soar Filho, 1998).
Ainda que gestos e posturas possam variar bastante segundo a cultura e o ambiente
social, algumas atitudes podem ser exemplificadas como representando de modo quase
universal certos significados. Desmond e Copeland (2000) sugerem uma lista de
comportamentos não-verbais do médico e os significados correspondentes interpretados pelo
paciente, apresentados no Quadro 1.
Linguagem corporal do médico Tradução do paciente
Examina a lâmina de raio-X enquanto o paciente relata seu sentimento de medo.
“Estou ignorando seu estado emocional. Hum, o que podemos consertar aqui?”
Movimentos rápidos e freqüentes com a cabeça enquanto o paciente está falando.
“Ok, ok. Vamos logo com isso. Eu não tenho o dia todo.”
Escuta o paciente sem esboçar nenhuma expressão facial.
“Você realmente pensa que eu me importo? Eu apenas aturo isso.”
Quadro 1. Lista de comportamentos não-verbais do médico e seus significados para o paciente
De modo algum o que este quadro sugere é que o médico tenha de fato a intenção de
passar tais mensagens. O que ocorre em boa parte das vezes é que não existe consciência por
parte do profissional do que ele está informando ao paciente com sua postura corporal. Sendo
assim, algumas orientações são apresentadas por pesquisadores, docentes e clínicos
experientes sobre comportamentos não-verbais indicados na prática clínica (Desmond &
40
Copeland, 2000, Soar Filho, 1998; Collins & Collins, 1992; Roter & Hall, 2006; González,
2006):
a) A postura corporal deve indicar abertura, receptividade e disponibilidade para
confortar. Isto inclui não cruzar os braços ou mãos ou ainda carregar o prontuário do
paciente em frente ao tórax, “protegendo-se” do paciente ou afastando-o;
b) Gesticular de modo suave para enfatizar determinado conteúdo verbal. Movimentos
rápidos e muito freqüentes podem simbolizar pressa ou inquietação;
c) Sentar-se de modo confortável, porém não muito relaxado, inclinando o dorso
levemente em direção ao paciente significa demonstrar disponibilidade para ouvir;
d) Manter contato ocular enquanto fala ou escuta o paciente falar, sem, no entanto, olhar
fixamente, o que pode indicar certa intimidação. Olhar de modo expressivo é uma
forma de transparecer empatia ou a idéia de que consegue se sensibilizar pelo que está
sendo sentido pelo paciente.
e) Tocar o paciente no ombro ou no braço pode aumentar o vínculo, mas deve ser usado
criteriosamente para não causar incômodo ao invés de conforto para o paciente;
f) Adequar o tom de voz à situação, demonstrando consternação, simpatia e polidez
conforme o contexto.
Ao identificar as posturas não-verbais adequadas ao contexto da relação médico-
paciente e somando-as às recomendações sobre a comunicação verbal, é possível ter uma
compreensão mais ampla de quais são as habilidades interpessoais mais exigidas na medicina
e nas profissões de saúde de um modo geral.
Segundo diversos autores (Bohart & Greenberg, 1997; Falcone, 1999, 2000, 2002;
Eisenberg, Murphy & Shepard, 1997; Soar Filho, 1998), uma das habilidades sociais mais
importantes no estabelecimento de um relacionamento interpessoal positivo e terapêutico é a
empatia. Intencionalmente, o termo empatia foi minimamente mencionado até o momento
com o intuito de verificar o quanto este conceito está presente na literatura médica sob
diversas formas e não apenas na literatura psicológica, o que será enfatizado a seguir.
Muitas vezes, a capacidade de estabelecer vínculos de maneira empática é considerada
no meio acadêmico e assistencial em medicina um atributo da formação pessoal do
profissional de saúde. No entanto, estudos sobre aprendizagem social indicam que o
comportamento social é composto significativamente por conteúdos aprendidos (Bandura,
1979; Caballo, 1991, 1993; Collins, & Collins, 1992; Del Prette & Del Prette, 1999; Matos,
1997 citados por Falcone, 2000). Seguindo este modelo, a empatia é uma habilidade social e,
como tal, pode ser ensinada e treinada (Caballo, 1996).
41
Identificada a importância do desenvolvimento de uma boa relação médico-paciente,
enfatizando especialmente os aspectos ligados à comunicação interpessoal, o próximo
capítulo se propõe a explorar uma das habilidades sociais mais influentes em uma
comunicação bem-sucedida: a empatia.
42
Capítulo 3
EMPATIA: UMA HABILIDADE ESPECIAL DE COMUNICAÇÃO
A humanidade é caracterizada, entre outras coisas, por viver em um contexto
absolutamente social. Durante a maior parte das horas de um dia homens, mulheres e crianças
estão em contato com outras pessoas e mesmo quando sozinhos, ainda mantêm relação com
outros através dos meios de comunicação, como rádio e televisão, e mesmo do próprio
pensamento ao lembrar-se de fatos relacionados a outras pessoas. Deste modo, a comunicação
social presente em diversas espécies animais ganha contornos mais complexos na espécie
humana, requerendo o conhecimento e o uso de habilidades sociais mais refinadas e efetivas.
Dentre elas podemos destacar como fundamentais a assertividade, a capacidade de resolução
de problemas e a empatia, entre outras. Essas habilidades parecem ser necessárias à coesão
grupal e a manutenção de vínculos interpessoais, que por sua vez tem funções ligadas à
sobrevivência de nossa espécie.
O estudo das habilidades sociais na comunicação e no relacionamento interpessoal
conta com pesquisas e reflexões de diversos autores em todo o mundo. São destacadas neste
estudo algumas contribuições como as de Argyle (1988), Bohart & Greenberg (1997), Caballo
(1996), Falcone (1998, 2002) e Ickes (1997).
Segundo Caballo (1996), o período de maior produção e difusão de conhecimentos na
área das habilidades sociais foi a década de 70. Atualmente muitos estudos ainda são
realizados e novos conceitos são incorporados a partir de estudos em outras áreas da
psicologia, além das ciências humanas, sociais e da saúde. Na década de 80, delineou-se uma
parceria incontestável entre conceitos cognitivistas e os do Treinamento em Habilidades
Sociais. No entanto, a maioria dos trabalhos sobre tais habilidades estava focada na
compreensão e no treinamento do comportamento assertivo, caracterizado pela capacidade de
expressar sinceramente os próprios sentimentos e desejos ao outro, fazendo valer seus
direitos. A assertividade mostrou-se adequada para uma série de finalidades sociais, porém
limitada ou ineficaz para o fortalecimento de vínculos, aumento do senso de conexão
interpessoal e redução dos riscos de ruptura da relação em situações de conflito (Falcone,
1998). A partir dessas constatações, novos estudos foram desenvolvidos em função de avaliar
outras habilidades sociais igualmente necessárias para um desempenho interpessoal
satisfatório.
Batson (1990, 1997), por exemplo, dedica-se a pesquisar sobre o quanto o homem
consegue comportar-se realmente de modo social, ou seja, o quanto consegue agir de modo
43
altruísta, em função das necessidades alheias, ou apenas em função das suas próprias, de
modo egoísta. Ambas as posições aceitam a premissa de que o homem é capaz de oferecer
ajuda, apoio e cuidado a outras pessoas, mas na primeira o ato de cuidar é uma finalidade,
enquanto na segunda posição o cuidado é um instrumento para, em última instância, atender
às necessidades do próprio self. Embora não haja uma única posição na psicologia sobre esta
questão (Batson, 1990, 1997; Neuberg et al., 1997; Buck & Ginsburg, 1997), o que estes
estudos sugerem é que na base do comportamento em prol do outro está a capacidade de se
colocar no lugar da outra pessoa, percebendo e sentindo como se fosse o outro, através de
sentimentos de compaixão, simpatia, ternura e empatia, o que Batson (1990) denominou de
hipótese empatia-altruísmo sobre a capacidade de cuidar. Seus estudos sugerem que o cuidado
altruístico é limitado àqueles por quem se consegue sentir empatia. Do contrário, quando a
empatia pela pessoa que necessita é baixa, o padrão de ajuda é sublinhado por motivação
egoísta ou, em outras palavras, em nome dos interesses de quem cuida e não tanto pelos de
quem é cuidado. Em última análise, o que o autor sugere é que é a empatia que permite que o
ato de cuidar tenha como finalidade o atendimento das necessidades do outro e não somente
de si próprio.
Outras pesquisas indicam que a empatia configura uma resposta humana universal,
comprovada fisiologicamente, que estaria na base do comportamento altruísta, predispondo o
ser humano a agir em prol de outro. Apesar de não terem sido encontrados estudos
interculturais específicos sobre a empatia, é possível supor que a experiência empática seja
observada em diversos grupos culturais, étnicos e etários (Wikipédia, acessado em
01/03/2007).
3.1 Conceituando a empatia
A empatia corresponde a uma habilidade social que parece se adequar cada vez mais
às necessidades do mundo atual (Falcone, 2002). Refere-se à capacidade de compreender
precisamente os sentimentos e pensamentos das outras pessoas e de manifestar, através de
comportamentos verbais e não-verbais (Argyle, 1988), essa compreensão de forma sensível e
adequada à situação ou contexto. Pode ser entendida, em linhas gerais, como a habilidade de
perceber e identificar emoções em um indivíduo e de expressar, de forma acurada, esta
compreensão, validando os sentimentos e a perspectiva da outra pessoa. É buscar ver o mundo
pelos olhos do outro, compreendendo não somente de modo intelectual, mas também afetivo a
experiência tal qual o outro a vivencia. A capacidade de empatizar adequadamente gera uma
44
série de respostas positivas tanto em quem está sendo o alvo do comportamento empático
quanto em quem o emite, potencializando os efeitos da comunicação interpessoal (Eisenberg
& Strayer, 1992; Bohart & Greenberg, 1997; Falcone, 2002).
O conceito de empatia também é definido por vários autores (Bohart & Greenberg,
1997; Ickes, 1997; Falcone, 1999) como uma habilidade social necessária e fundamental nas
relações interpessoais bem-sucedidas em diversas etapas do desenvolvimento vital, tanto no
contexto da vida privada quanto da profissional. A atitude empática está associada a diversos
efeitos positivos no interlocutor, favorecendo o estabelecimento de vínculos terapêuticos, a
redução de problemas físicos e emocionais e a resolução de conflitos, entre outros.
A habilidade empática se fundamenta em três pilares estruturais: o cognitivo, que
abarca a capacidade de compreensão dos sentimentos e pensamentos de uma outra pessoa; o
afetivo, que trata da capacidade de se sensibilizar com a questão do outro, desejando o bem ao
mesmo; e, por fim, o comportamental, quando o conteúdo apreendido nas duas esferas
anteriores é comunicado verbalmente a outra pessoa de forma que esta se sinta compreendida
por inteiro (Davis, 1980, 1983; Barrett-Lennard, 1993; Egan, 1994; Eisenberg et al., 1997).
A dimensão cognitiva da empatia corresponde à tomada de perspectiva, onde o sujeito
que empatiza procura se colocar no lugar da outra pessoa, buscando ver as situações através
do referencial do outro. Paralelamente, ocorre o componente emocional da empatia, que
segundo Eisenberg et al. (1997), também envolve um comportamento de adoção de
perspectiva do ponto de vista afetivo, ou seja, onde quem empatiza busca compreender o
estado emocional do outro. A partir desses dois estágios, o terceiro componente, referente à
comunicação adequada do que foi apreendido anteriormente, dependerá de alguns fatores, que
Lennon e Eisenberg (citados por Falcone, 1998) identificaram como três tipos de reações a
percepção dos sentimentos de outra pessoa: (1) mal-estar pessoal, levando a uma auto-
preocupação pela experiência vicária do estado emocional do outro, que não leva a uma ação
altruísta; (2) contágio emocional, onde a emoção do outro é reproduzida por quem empatiza; e
(3) preocupação empática, onde, ao compreender a emoção alheia, não ocorre
necessariamente uma equivalência entre os estados emocionais do empatizador e do
empatizado, podendo o empatizador preocupar-se genuinamente pelo outro, dando ensejo a
uma atitude altruísta.
As três dimensões da empatia – cognitiva, afetiva e comportamental – ocorrem em
dois momentos distintos: o primeiro engloba as capacidades de compreensão cognitiva e
afetiva, através dos comportamentos que demonstram a atenção e a escuta empáticas. O
segundo momento engloba os comportamentos de verbalização dos conteúdos identificados
45
no primeiro momento. A seguir, são apresentadas as características que melhor definem essas
duas etapas do comportamento empático.
3.1.1 A atenção e a escuta empáticas
O desenvolvimento de uma relação empática se inicia normalmente com o desejo de
uma ou ambas as partes de estabelecer uma comunicação realmente significativa e profunda.
Esse desejo é fundamental porque as habilidades envolvidas em uma comunicação
verdadeiramente empática não podem ser executadas apenas como uma seqüência de ações e
comportamentos; elas devem, antes de tudo, fazer sentido afetivo para o interlocutor. Para
atender ao outro e ouvi-lo em sua particularidade é necessário suspender temporariamente as
necessidades do “eu”, esquecendo-se de si mesmo para poder mergulhar na experiência do
outro (Nichols, 1995). Sem esta suspensão das necessidades pessoais por parte de quem ouve
não é possível compreender verdadeiramente a pessoa que fala, tanto em seu conteúdo
manifesto quanto no latente.
A atitude de prestar atenção é marcada por demonstrações não-verbais como olhar
atentamente para o outro, adotando uma postura corporal aberta, relaxada e levemente
inclinada em direção ao outro, além de movimentos com a cabeça em sinal de concordância
associados a vocalizações breves (Egan, 1994; Desmond & Copeland, 2000). Além de
observar seus próprios movimentos e expressões não-verbais, o indivíduo empático se
preocupa em perceber esses sinais no interlocutor também. Desmond e Copeland (2000)
identificam estes comportamentos na prática médica como habilidades de escuta ativa, cujo
objetivo é demonstrar ao paciente que está atento e interessado em ouvir o que ele tem a dizer
e compreendê-lo em seus próprios termos.
Em paralelo ocorre a escuta sensível, reflexiva e empática, caracterizada pela
priorização em ouvir, sem julgamentos ou interrupções, o que o outro está comunicando. Esta
etapa já pode ser considerada em si como um poderoso fator na redução de conflitos, por
promover no interlocutor um sentimento de validação de suas emoções e argumentos. O
comportamento de ouvir sensivelmente é caracterizado pela priorização momentânea dos
sentimentos, desejos e perspectivas do outro em detrimento dos próprios, através da
observação e leitura de suas atitudes não-verbais, identificando emoções; da busca deliberada
de se colocar no lugar do outro, buscando identificações e, finalmente, da elaboração
subjetiva da relação entre os sentimentos, a situação e os significados experimentados pelo
outro no contexto em questão.
46
Nichols (1995) abordou de forma aprofundada a relevância do ato de ouvir como uma
forma privilegiada de nos sentirmos humanos, conectados uns aos outros e valorizados
enquanto sujeitos. Sermos ouvidos e validados nos ajuda a nos reconhecermos e nos
afirmarmos enquanto nós mesmos. A necessidade da escuta está intimamente relacionada com
a sustentação do senso de significância, que por sua vez serve à satisfação de nossa
necessidade de atenção e apreciação. A empatia – o eco humano – é a matéria-prima do bem-
estar emocional.
Outras conseqüências positivas do ouvir sensível são apontadas por Barrett-Lennard
(1993) como redução do medo e da tensão, aumento do autoconhecimento, enriquecimento da
relação interpessoal, melhora da capacidade de solução de problemas e maior
desenvolvimento da compreensão sobre a natureza humana. Além disso, a interação com uma
pessoa empática leva a um aumento da própria empatia de quem está sendo ouvido, reduzindo
a autocrítica severa ou exagerada, facilitando o relacionamento interpessoal.
Segundo Nichols (1995), a escuta empática tem efeitos positivos ainda em situações
de conflito, onde uma ou ambas as partes da interação estão com raiva. O ouvir sensível reduz
a probabilidade de rompimento e de alimentação de argumentos ofensivos e defensivos
indeterminadamente. Entretanto, em alguns casos específicos, torna-se mais difícil manter o
comportamento de escuta sensível, principalmente quando a pessoa que fala é:
• Excessivamente prolixa, tornando a conversa entediante;
• Egoísta, fazendo o assunto girar em torno de si mesma todo o tempo.
Quanto a pessoa que ouve, a escuta fica prejudicada quando:
• O ouvinte está sobrecarregado de problemas que concorrem com sua atenção;
• Interpreta equivocadamente a fala da outra pessoa como sendo ameaçadora ou
aviltante;
• Deseja ou se preocupa em controlar, instruir ou mudar a outra pessoa;
• Planeja ou ensaia o que vai dizer antes da outra pessoa concluir sua fala.
Falhas na capacidade de ouvir e compreender acuradamente o que é dito têm efeitos
bastante adversos, como sentimentos de inadequação, desvalorização e solidão. O mundo
contemporâneo é marcado por uma indisponibilidade para conversar e ouvir que aumenta essa
sensação de vazio que parece tomar conta dos indivíduos, que passam a buscar compensações
para a pobreza afetiva e existencial que os acomete. Crianças que não são ouvidas tendem a
ser inseguras e isoladas, temerosas do contato com novas pessoas e experiências e vulneráveis
a rejeição, corroborando a idéia de que ser ouvido promove e sustenta um senso de
47
significância e a ausência dessa escuta leva ao isolamento e ao sofrimento psíquico (Nichols,
1995).
3.1.2 A verbalização empática
O segundo momento da atitude empática engloba os comportamentos de verbalização
dos conteúdos identificados na atenção e escuta sensíveis. O objetivo nesta etapa é fazer com
que o outro se sinta compreendido de fato, através da tentativa de explicar e validar o que o
outro está comunicando, sem julgar, e da discriminação das relações encontradas entre a
situação, os significados que ela tem e os sentimentos que ela desperta no outro (Barrett-
Lennard, 1993; Greenberg & Elliot, 1997).
Ainda que a etapa anterior de escutar atenta e sensivelmente possa ser suficiente para
demonstrar acolhimento e aceitação, principalmente através de comportamentos não-verbais,
a verbalização empática é a melhor forma de externalizar a compreensão do que foi sentido e
percebido no outro. Sua função é, portanto, fazer com que a outra pessoa se sinta entendida,
permitindo inclusive que suas preocupações sejam exploradas de forma mais completa e
profunda (Falcone, 1998). Um estudo recente sobre o comportamento de médicos diante das
preocupações verbalizadas pelos pacientes apresenta resultados que ratificam essa idéia
(Epstein, Hadee, Carroll, Meldrun, Lardner & Shields, 2007), concluindo que a atitude
empática do médico está associada com melhores avaliações do paciente sobre a qualidade do
cuidado interpessoal, especialmente em situações de dúvida e preocupação.
Habilidades de comunicação mais sofisticadas, segundo Burleson (citado por Falcone,
1998), promovem um maior grau de afinidade com a outra pessoa e com seu problema; são
mais neutras na avaliação, descrição e explicação dos sentimentos alheios e das situações que
envolvem esses sentimentos; tendem a focalizar as origens do sofrimento vivenciado pela
pessoa; legitimam o ponto de vista do outro, além de fornecer uma explicação cognitiva que
esclarece os sentimentos experimentados pela outra pessoa. Por outro lado, habilidades pobres
de comunicação focalizam-se no evento em si; impõem o próprio modo de ver a situação;
desconsideram os sentimentos e o ponto de vista da outra pessoa; tentam minimizar o
problema ou concentram-se em apontar como o outro deveria agir ou se sentir diante do
problema.
Alguns exemplos de verbalizações não-empáticas são apresentados no Quadro 2
(Desmond & Copeland, 2000, p.109):
48
PACIENTE MÉDICO “Estou tão preocupada a respeito da cirurgia na próxima semana.”
“Oh, não há porque se preocupar!”
“Eu me sinto tão triste desde a morte da minha esposa. Eu não sei o que vou fazer da minha vida...”
“Não se sinta assim... Você ainda tem muitas coisas boas a viver.”
Quadro 2. Verbalizações não-empáticas
É compreensível que, ao ouvir alguém contar um problema, a pessoa deseje ajudar o
outro, aliviando seu sofrimento com um conselho ou uma sugestão. No entanto, este tipo de
atitude pode levar a pessoa que fala a se sentir incompreendida, não legitimada em seus
sentimentos e necessidades. Minimizar o problema também pode produzir esse efeito, assim
como desviar o foco de atenção do locutor para o ouvinte, quando esta passa a relatar uma
experiência semelhante a do interlocutor ou a fazer perguntas que visam esclarecer os
pensamentos do ouvinte, desvalorizando a pessoa que fala (Falcone, 1998).
Exemplos de verbalizações empáticas nas situações acima são apresentadas no Quadro
3:
PACIENTE MÉDICO “Estou tão preocupada a respeito da cirurgia na próxima semana.”
“Eu entendo que você possa estar preocupada sobre a cirurgia. O que eu posso te dizer sobre isso é...”
“Eu me sinto tão triste desde a morte da minha esposa. Eu não sei o que vou fazer da minha vida...”
“Deve ser realmente muito difícil perder sua esposa após tantos anos de convívio harmonioso. Eu posso entender o porquê de o senhor estar tão triste.”
Quadro 3. Verbalizações empáticas
Resumindo, a verbalização empática é caracterizada pelo foco de atenção voltado para
o outro, buscando legitimar seus sentimentos e perspectivas sobre a situação apresentada, sem
fazer julgamentos. A empatia acurada acontece quando a pessoa que empatiza consegue
captar cognitiva e afetivamente o mundo tal como o outro o vê e refletir essa compreensão
para o outro de modo que este se sinta completamente compreendido, expressando, por sua
vez, este sentimento de volta para o empatizador.
Os benefícios do comportamento empático não se restringem àquele que recebeu o
apoio e a compreensão diante de seu estado emocional. Estudos mostram que o indivíduo
empático experimenta alegria ao perceber que conseguiu atingir o ponto e ser acurado em sua
49
percepção do estado interno do outro, ajudando-o. Essa alegria empática corresponde a uma
auto-recompensa, que pode fazer a pessoa se sentir motivada a ajudar e ser empática
novamente em um esquema de reforçamento positivo do comportamento empático (Roter &
Hall, 2006; Falcone, 1998). Este sentimento pode inclusive se relacionar com redução dos
níveis de estresse e de conflitos interpessoais. Indivíduos empáticos são considerados mais
habilidosos socialmente enquanto indivíduos pouco empáticos parecem carecer de
inteligência social e podem ter dificuldades em várias esferas da vida pessoal e profissional
(Goleman, 2001).
A melhor caracterização das habilidades sociais, em especial da empatia, envolvidas
em uma comunicação eficaz e efetiva tem gerado uma série de estudos sobre a avaliação
destas habilidades em populações e contextos distintos – Educação, Saúde, Negócios (Bohart
& Greenberg, 1997). Na área de saúde podemos selecionar algumas pesquisas como as de
Cape (2000), Newton et al. (2000) e Kruijver, Kerkstra, Francke, Bensing & van de Wiel
(2000), entre tantas outras já produzidas ou ainda em produção, reafirmando a relevância que
o tema das habilidades sociais e relações interpessoais têm na atualidade, como defende
Falcone (1998, 1999, 2000, 2002).
Os resultados de pesquisas sobre os efeitos sociais da empatia apontam que esta
habilidade está relacionada a interações sociais mais gratificantes, a casamentos mais
duradouros, a maior sucesso profissional, além da redução de conflitos interpessoais e de
rompimento (Brems, Fromme & Johnson, 1992; Burleson, 1985; Davis & Oathout, 1987;
Ickes & Simpson, 1997; Long & Andrews, 1990 citados por Falcone, 2000).
Estudos sobre a prática psicoterapêutica tendem a avaliar com freqüência a influência
da empatia no processo terapêutico. Baseado no pensamento pós-moderno, que enfatiza a
multiplicidade com que diferentes modos humanos podem construir a realidade (Mahoney,
1991), a habilidade do terapeuta torna-se particularmente importante. Se a realidade é
múltipla e os sujeitos constroem as suas próprias realidades, então a empatia se torna o modo
fundamental de reconhecer diversas realidades pessoais. A empatia não é meramente uma
intervenção, mas também um modo fundamental de encontrar uma outra pessoa, a partir de
uma realidade experiencial diferente. É apenas através desse encontro “genuíno” que as
intervenções terapêuticas podem ser usadas eficazmente (Bohart & Greenberg, 1997).
Em estudo recente sobre este tema, Falcone, Gil e Ferreira (2007) compararam a
freqüência de verbalização empática entre psicoterapeutas de quatro diferentes abordagens
teóricas, buscando identificar se formações distintas estariam relacionadas a estilos de
comunicação diferentes. Cada um dos 16 psicoterapeutas participantes entrevistou a mesma
50
cliente, que apresentou a mesma queixa a todos. O conteúdo das entrevistas foi analisado por
juízes e pela própria cliente. Os resultados apontaram diferenças entre os grupos de
abordagens teóricas distintas, porém não houve concordância entre a avaliação dos juízes e a
avaliação da cliente, corroborando a literatura que sugere que a empatia percebida pelos
terapeutas é diferente da avaliada pelo cliente. Devido ao caráter complexo e
multidimensional do conceito, é importante caracterizar métodos válidos e consistentes para
avaliar a habilidade de empatia.
3.2 Avaliação da habilidade empática
A avaliação da empatia segue o modelo de avaliação de outras habilidades sociais. Os
principais instrumentos utilizados em estudos científicos sobre a empatia são a entrevista, os
questionários de auto-informe, os jogos de papéis, a observação de desempenho em situações
naturais e a solicitação de informações de pessoas que interajam com o indivíduo que está
sendo avaliado (Falcone, 1998). Ainda que possam ser utilizados isoladamente, a combinação
dos métodos de coleta de dados é encontrada na literatura como sendo o formato que parece
ser o mais adequado para reduzir o efeito das limitações de cada instrumento em particular e
ampliar o escopo de avaliação da habilidade (Epstein et al., 2007; Hemmerdinger, Stoddart &
Lilford, 2007; Eide et al., 2004; Motta, Falcone, Clark & Manhães, 2006; Caballo & Buela,
1988 citado por Falcone, 1998). Freqüentemente o uso de método único está associado a
estudos de validação de instrumentos, como escalas de auto-informe e instrumentos
observacionais, como nas pesquisas de Rojas (2005), Hojat, Mangione, Nasca, Gonnela e
Magee (2005) e Roter e Larson (2001).
As medidas de auto-informe são comumente desenvolvidas e utilizadas na avaliação
da empatia em populações e contextos diversos especialmente por serem diretas e de fácil
aplicação. O auto-registro da habilidade empática apresenta a vantagem de considerar o modo
com o próprio indivíduo se percebe nas relações interpessoais, porém a desvantagem é que
nem sempre o indivíduo consegue identificar acuradamente suas próprias emoções e atitudes,
tendendo a responder segundo aquilo que avalia ser o mais adequado socialmente ou que seria
esperado dele (Edelmann, 1996 citado por Falcone, 1998).
Um dos mais citados instrumentos de auto-informe de avaliação da habilidade
empática é o Davis’ Interpersonal Reactivity Index – DIRI, desenvolvido por Davis (1980,
1983). Corresponde a uma medida de empatia que considera não somente o escore global,
mas especialmente o caráter multidimensional da empatia, ou seja, avalia separadamente os
51
aspectos cognitivos e afetivos que a compõem. A escala é subdividida em quatro grupos
conforme a dimensão considerada. A subescala “tomada de perspectiva” refere-se à tendência
para adotar espontaneamente o ponto de vista de outras pessoas segundo sua experiência
cotidiana. A segunda subescala é classificada como “preocupação empática” e diz respeito ao
sentimento de simpatia ou compaixão pelo sofrimento alheio. A terceira engloba questões
sobre o “mal-estar pessoal” sentido diante de experiências desagradáveis de outras pessoas e
finalmente a quarta subescala apresenta situações ligadas à capacidade de fantasiar, ou seja,
de colocar-se de forma imaginária no lugar de personagens em situações fictícias, como em
filmes e novelas.
Considerando a realidade nacional, foi construído e avaliado recentemente um
instrumento de auto-relato para avaliar empatia na população adulta em geral (Falcone et al.,
no prelo). O Inventário de Empatia (I.E.) corresponde a uma medida construída e validada no
contexto brasileiro, onde as respostas às perguntas são do tipo Likert, com cinco opções,
variando desde nunca até sempre. Os 40 itens da escala foram agrupados em quatro fatores, os
quais são especificados a seguir: 1) Tomada de Perspectiva (TP) (capacidade e motivação
para compreender a perspectiva e os sentimentos da outra pessoa), com 12 itens; 2)
Flexibilidade Interpessoal (FR) (capacidade para entender e aceitar pontos de vista muito
diferentes), com 10 itens; 3) Altruísmo (AL) (capacidade para sacrificar temporariamente as
próprias necessidades em benefício das necessidades da pessoa-alvo), com nove itens; 4)
Sensibilidade afetiva (SA) (tendência a experimentar sentimentos de compaixão e de interesse
pelo estado emocional do outro), com nove itens. Os quatro fatores acima estão fortemente
fundamentados por estudos teóricos e empíricos, que apontam a tomada de perspectiva como
o componente cognitivo da empatia, assim como a sensibilidade afetiva está relacionada ao
componente afetivo dessa habilidade. Além disso, o altruísmo e a flexibilidade interpessoal
também têm sido relacionados à empatia.
É importante ressaltar que instrumentos de auto-informe eventualmente correm o risco
de gerar dados pouco fidedignos à realidade devido a distorções na auto-avaliação do
comportamento do próprio sujeito. Especialmente no caso da empatia, é recomendado que
além da avaliação de quem emite o comportamento empático seja considerada também a
avaliação de quem foi o foco da ação empática para que desse modo possa se avaliar o grau
de concordância das respostas (Barrett-Lennard, 1993).
Usualmente combinados com os instrumentos de auto-informe estão a entrevista e a
observação do comportamento em situações naturais ou de representação de papéis. Na
entrevista procura-se identificar o contexto onde o comportamento social avaliado ocorre,
52
quais são as circunstâncias que facilitam e que dificultam a ocorrência do comportamento,
quais são as habilidades específicas necessárias para uma interação pessoal bem-sucedida na
situação em foco e quais estão presentes ou ausentes e finalmente quais as conseqüências das
atitudes expressadas de modo habilidoso ou não. Por conta de seus objetivos específicos, é
recomendável que a entrevista seja estruturada, porém preferencialmente conduzida de modo
flexível para a obtenção de informações sutis e relevantes (Falcone, 1998).
Já a observação do desempenho social de um indivíduo pode ser realizada tanto em
situações naturais de ocorrência do comportamento interpessoal quanto em situações forjadas
para avaliar habilidades sociais específicas, no modelo de jogos de papéis. Geralmente os
registros das interações são captados e gravados em áudio ou vídeo e posteriormente
codificados e analisados por juízes no intuito de classificar e quantificar o comportamento
observado. Uma das vantagens da observação em ambiente natural é captar o comportamento
do sujeito nas situações em que normalmente ocorre a experiência, no entanto, a premissa de
que o mesmo comportamento apresentado se repetirá igualmente em situações futuras não é
válida, pois as condições que interferem no desempenho interpessoal não ocorrem de modo
semelhante e previsível ao longo do tempo. Do mesmo modo, a observação de desempenho
social em situações artificiais pode avaliar se o indivíduo possui ou não em seu repertório
comportamental a habilidade que está sendo aferida. No entanto, ter a capacidade de se
desempenhar habilmente em uma situação forjada não garante necessariamente que se
comportará da mesma maneira em um outro contexto situacional (Falcone, 1998).
Reiterando o que foi apresentado anteriormente, estudos que visam avaliar e medir a
habilidade empática tendem a lançar mão de diversos recursos metodológicos para tentar
superar as limitações existentes em cada método isoladamente. A exceção é encontrada
quando o objetivo do estudo é testar um instrumento específico ou validá-lo para outras
populações e contextos. Como veremos a seguir, a medicina – e especialmente a relação
médico-paciente – é um desses contextos específicos onde a avaliação das habilidades
relacionadas à empatia e o desenvolvimento de instrumentos para avaliá-las são freqüentes na
literatura científica.
53
3.3 Empatia e a prática da medicina
Te informan pero no te comunican, te tratan pero no de acompañan, son amables pero no se ponen en tu lugar
y te oyen pero no te escuchan. Autor desconhecido, citado por Maristany (2008).
Como já discutido em capítulos anteriores, a medicina que é praticada atualmente
parece estar dominada por tecnologia impessoal e imperativos econômicos, entre outros
fatores que dificultam as relações humanas. No entanto, o encontro assistencial, conforme
apresentado por Borrell-Carrió (2007), é sempre um somatório de componentes humanos e
técnicos, que podem se apresentar em proporções diferentes, porém estão sempre presentes
em alguma medida. Freqüentemente, a empatia é associada a uma prática médica humanizada,
no entanto, muitos médicos ainda mantêm uma postura cética, especialmente porque
consideram que a empatia é um conceito mal-definido para fazer frente às dificuldades e
pressões do cotidiano médico-hospitalar. Segundo Haslam (2007), diante dos estudos e
pesquisas sobre empatia dos últimos anos, este ceticismo é infundado. A empatia pode ser
claramente definida como a capacidade de tomar a perspectiva do outro, sendo sensível à
experiência afetiva tal qual ele a vivencia e mostrar-se verdadeiramente engajado na
compreensão de seu estado afetivo, mais do que simplesmente compartilhar da emoção
sentida pelo outro. Em especial na medicina esta habilidade corresponde a uma capacidade de
apreciação do estado emocional do paciente, sem confundir-se com ele, e de uma expressão
compatível desta apreciação para o paciente por meio da comunicação de modo a estabelecer
uma relação terapêutica significativa.
Spiro et al. (1993) reafirmam a importância do sentir, especialmente através do
comportamento empático, para a profissão médica. Através do pensar e sentir que “eu poderia
ser você”, o médico se torna capaz de cuidar e não somente de tratar ou curar. Isto significa
que a prática médica não deve ser dicotomizada entre a ciência e a intuição, a razão e a
emoção, a tecnologia e a escuta: os médicos podem realmente ser agentes complexos de cura,
pois a doença precisa ser diagnosticada e tratada com todos os recursos que a ciência pode
oferecer, enquanto o doente e seu sofrimento necessitam do médico para serem cuidados.
Evidências empíricas da influência do comportamento empático do médico para com o
paciente surgem como resultado de um corpo de pesquisas e estudos científicos realizados em
diversos contextos sócio-culturais, demográficos e econômicos ao redor do mundo. De modo
geral, estes estudos sugerem que a empatia está associada a uma variedade de resultados
clínicos positivos, especialmente por enriquecer tanto a relação médico-paciente como a
54
comunicação entre ambos. Pesquisas desenvolvidas por Hojat, Gonnela e Mangione (2002),
Hojat, Mangione, Nasca, Gonnela e Magee (2005), Colliver, Willis e Robbs (1998), Epstein
et al. (2007), entre outras, apresentaram como resultados que estudantes de medicina mais
empáticos receberam melhores avaliações de competência clínica e se desempenharam
melhor em exames de anamnese e exame físico. Além disso, estudantes e médicos mais
empáticos também foram mais bem avaliados em escalas de satisfação para pacientes, que
demonstram melhor aderência ao tratamento, com maior autonomia e engajamento. Em um
estudo prospectivo, West, Huschka, Novotny, Sloan e Kolars (2006) encontraram dados que
indicam que quando há uma perda da capacidade empática do médico, subseqüentemente
aumenta o número de erros médicos maiores desses profissionais e também o estado de
burnout, especialmente no que diz respeito à fadiga emocional e a tendência a despersonalizar
o paciente (Silvester, Patterson, Koczwara & Ferguson, 2007).
Algumas questões são apontadas na literatura como desfavorecedoras da atitude
empática no médico (Spiro et al., 1993; More & Milligan, 1994): a descrença ou o
desconhecimento sobre a própria habilidade em si; o medo de se confundir com o sentimento
do paciente e perder o controle sobre as próprias emoções; a expectativa de que agir
empaticamente implicará em um esforço exaustivo e não-recompensador; a rotina de
determinados locais de trabalho onde as exigências de tempo, precisão e quantidade superam
as necessidades de qualidade, atenção e contemplação; o fascínio pelos recursos
farmacêuticos e tecnológicos, além da própria formação médica que drena a empatia para fora
dos estudantes com o argumento de que se eles se envolverem emocionalmente uma parte
deles morrerá com cada paciente e isso os tornará inviáveis profissionalmente.
Vários autores concordam que o período da formação médica é crítico tanto para o
desenvolvimento da empatia quanto para sua perda (Spiro et al., 1993; Branco, 2003; De
Marco, 2003; Roter & Hall, 2006). Toda habilidade não utilizada acaba se tornando uma
habilidade desperdiçada ou inexistente, o que está relacionado para Spiro at al. (1993) ao que
acontece durante o treinamento médico. Segundo este autor o que ocorre com os estudantes de
medicina é que vão perdendo sua capacidade de sensibilizar-se diante do outro ao passo que
vão aprendendo a disfarçar seus sentimentos ou mesmo negá-los por completo. A ênfase do
ensino médico recai sobre as habilidades técnicas dentro do paradigma biomédico, relegando
o ensino das habilidades humanas a segundo plano. Roter e Hall (2006) destacam que
enquanto prevalece a idéia de que as habilidades interpessoais necessárias ao exercício da
medicina serão naturalmente desenvolvidas através da experiência, cada vez mais e mais
educadores médicos reconhecem que o treinamento é necessário. A realidade mostra que um
55
médico realiza milhares de consultas e entrevistas ao longo de sua carreira e freqüentemente
com mínima instrução formal sobre este aspecto (Borrell-Carrió, 2007; González, 2006;
Lipkin, Putnam & Lazare, citado por Roter & Hall, 2006).
Maristany (2008) lembra que é costume identificar um médico competente
tecnicamente, porém alheio às reações de seu paciente, como um médico “muito
profissional”. Este conceito é totalmente divergente da concepção atual de competência
profissional, que não pode ser entendida como prescindível da atitude empática, pois quando
isso ocorre identifica-se um claro déficit de habilidades profissionais globais. Ou seja, o bom
profissional hoje é aquele que possui um conjunto de habilidades, conhecimentos e atitudes,
das quais a habilidade científico-técnica é uma delas, mas não a única, de modo que a
habilidade tecnológica, os conceitos e conhecimentos, a capacidade de escuta, de compaixão e
de empatia não são valores eletivos, mas requisitos obrigatórios da prática médica de
excelência.
No encontro entre médico e paciente, Desmond e Copeland (2000) afirmam que a
habilidade de escuta do médico é um fator crítico para a realização de um diagnóstico
acurado. Segundo informam, de cada quatro casos, três são diagnosticados principalmente
pelas informações fornecidas na entrevista pelo paciente, que são posteriormente confirmadas
com o exame físico e testes laboratoriais. Em alguns estudos, a anamnese é responsável por
até 90% dos diagnósticos (Peterson et al., 1992; Gruppen, Wooliscroft & Wolf, 1988, citados
por Desmond & Copeland, 2000). Com esses dados, as autoras enfatizam a premissa de que
ser um bom médico depende em boa parte da acuidade de suas habilidades de escuta.
Um dos efeitos da escuta reflexiva para o paciente é a compreensão que seu papel no
levantamento de dados para o diagnóstico e tratamento é relevante e valorizado.
Comportamentos verbais de parafrasear, checar entendimento e resumir a fala do paciente,
utilizando seu vocabulário, associado aos comportamentos não-verbais de demonstração de
interesse citados anteriormente, são considerados formas adequadas de comunicar-se com o
paciente, levando-o a assumir uma postura participativa e ativa na relação.
Outros efeitos da escuta empática na relação médico-paciente, segundo Desmond &
Copeland (2000) são o aumento no senso de conexão e auto-estima do paciente,
potencializando o vínculo de confiança com o médico. O estabelecimento de uma
comunicação profunda leva a um maior comprometimento de ambas as partes no andamento
do tratamento, gerando uma melhor qualidade no cuidado ao paciente e maior satisfação no
profissional. Além disso, algumas pesquisas apontam para uma redução de rompimentos na
relação e uma diminuição do risco de má prática médica ou iatrogenia (Silvester et al., 2007).
56
Com o crescimento do interesse sobre a empatia na prática médica nos últimos anos,
estudos têm sido desenvolvidos para identificar e avaliar esta habilidade no encontro entre
médicos e pacientes em diversos contextos de atuação profissional. Para atingir esses
objetivos alguns instrumentos vêm sendo continuamente desenvolvidos, como inventários e
escalas de auto-informe, instrumentos observacionais, entrevistas estruturadas, entre outros.
Hemmerdinger, Stoddart e Lilford (2007) fizeram uma revisão sistemática de medidas de
empatia em medicina e encontraram 50 artigos científicos relevantes descrevendo 36
diferentes instrumentos de avaliação de empatia. Destes, apenas oito demonstraram
evidências de confiabilidade, consistência interna e validade. Seis representavam medidas de
auto-informe – Jefferson Scale of Physician Empathy (JSPE), Davis’ Interpersonal Reactivity
Index (DIRI), Empathy Construct Rating Scale (ECRS), Empathy Test (ET), Balanced
Emotional Empathy Scale (BEES) e Narcissism, Aloofness, Confidence, Empathy Scale
(NACE) – um representava uma medida para o paciente avaliar o profissional – Consultation
and Relational Empathy Measure (CARE) – e um consistia em uma medida observacional
para uma terceira pessoa avaliar a relação entre o médico e o paciente – Four Habits Coding
Scheme (FHCS). Este estudo concluiu que nenhuma das medidas de empatia apresentou
evidências suficientes de validade preditiva para utilização em processos de seleção
acadêmica para o curso de medicina. No entanto, alguns desses instrumentos apresentaram-se
suficientemente confiáveis para serem utilizados como métodos de investigação sobre o papel
da empatia tanto no período de residência médica quanto na prática clínica.
Em outro estudo de meta-análise, Stepien e Baernstein (2006) identificaram pesquisas
que avaliavam estratégias de ensino e desenvolvimento da empatia com estudantes de
graduação em medicina. Os 13 trabalhos levantados indicaram que a empatia pode ser
associada a mudanças positivas a partir de uma variedade de estratégias de intervenção.
Seminários e cursos sobre técnicas de comunicação enfocando o aspecto comportamental da
empatia mostraram, em avaliações quantitativas, considerável impacto nos participantes.
Entretanto, estes estudos são atravessados por algumas dificuldades metodológicas como o
uso de uma variedade de definições de empatia, amostras reduzidas, falha de grupos de
controle adequados e uma variação entre os instrumentos de avaliação da habilidade empática.
Os autores sugerem que novos estudos sejam desenhados para incluir uma definição mais
clara de empatia, explicitando quais dimensões estão sendo consideradas e utilizando
instrumentos validados de avaliação e medida.
57
Capítulo 4
PARA ALÉM DO DISCURSO: AFINAL, OS MÉDICOS SÃO EMPÁTICOS?
Condensando sumariamente os aspectos teóricos abordados nos capítulos anteriores
apresentou-se neste estudo que:
a) A medicina é uma profissão historicamente determinada pelo encontro do profissional
com uma pessoa que adoece e precisa de ajuda. A supremacia do modelo biomédico
de compreensão da doença, a utilização exagerada ou inadequada dos recursos
tecnológicos disponíveis atualmente e as características da sociedade pós-moderna são
fatores relacionados a falhas na comunicação e no relacionamento médico-paciente.
b) Habilidades de comunicação são essenciais ao bom profissional. Do diagnóstico ao
tratamento, o modo de expressar-se verbalmente e demonstrar compreensão e
sensibilidade através de expressões não-verbais é uma exigência da prática médica
tanto quanto as habilidades científico-técnicas. Devido a sua importância para o bom
exercício da medicina, tais habilidades poderiam ser treinadas durante a formação
médica.
c) Dentre as várias habilidades de comunicação social envolvidas na medicina, a empatia
é apontada como uma das mais relevantes. A capacidade de compreender o paciente
em seus pensamentos e sentimentos, validando sua percepção diante da doença e a
habilidade de verbalizar este entendimento de modo que o paciente se sinta
verdadeiramente compreendido está relacionada com melhor adesão ao tratamento,
menor probabilidade de ruptura da relação e menores níveis de desgaste e stress
profissional.
Partindo dessas premissas, o presente estudo propõe uma avaliação da habilidade
empática em médicos que atuam em diferentes contextos de atenção à saúde pública na cidade
do Rio de Janeiro. Como objetivos específicos, pretende-se:
1. Avaliar o grau de empatia de médicos atuantes em instituições públicas nos níveis
primário, secundário e terciário de atenção à saúde.
2. Comparar o grau de empatia dos médicos com os dados normativos para a população
brasileira em geral, medidos através do Inventário de Empatia.
3. Comparar o grau de empatia segundo os diferentes níveis de atenção à saúde e
características sócio-profissionais.
Para atingir tal propósito, o próximo capítulo irá abordar a metodologia utilizada para
acessar os dados acima propostos.
58
Capítulo 5
MÉTODO
Esta pesquisa sobre avaliação da empatia em médicos de diferentes níveis de atenção à
saúde foi realizada em 13 unidades públicas de saúde do município do Rio de Janeiro no
período entre dezembro de 2007 a abril de 2008. Dessas 13 unidades, nove são consideradas
de atenção primária por atuarem preferencialmente no atendimento preventivo e no
tratamento dos principais agravos de uma determinada comunidade ou região territorial e
foram divididas em Centros Municipais de Saúde (CMS) e Equipes de Saúde da Família
(ESF); duas são de atenção secundária atuando preferencialmente no atendimento a pacientes
com questões de saúde que demandem, além do atendimento primário, tratamento
especializado; e duas são de atenção terciária por tratar-se de unidades de atendimento a
doenças que exijam tratamento especializado e utilização de recursos tecnológicos mais
avançados. O Quadro 4 especifica cada uma das unidades.
Atenção Primária Atenção Secundária Atenção Terciária CMS I Policlínica I Hospital Universitário I CMS II Policlínica II Hospital Universitário II CMS III ESF I ESF II ESF III ESF IV ESF V ESF VI
Quadro 4. Unidades de saúde pesquisadas
5.1 Participantes
Participaram deste estudo 75 médicos de diversas especialidades que se encontravam
trabalhando nos ambulatórios das unidades de saúde descritas. Ao todo foram convidados 140
profissionais distribuídos aleatoriamente pelos três níveis de atenção, mas apenas 75
responderam à pesquisa.
59
5.2 Procedimentos de Pesquisa
Este estudo se propõe a fazer uma análise descritiva da empatia em médicos,
considerando os diferentes contextos de atuação por nível de atenção à saúde.
5.2.1 Primeira etapa: recrutamento dos participantes.
Inicialmente, a amostra planejada para este estudo era do tipo probabilística, baseada
no levantamento da população total de médicos lotados nas unidades de saúde escolhidas para
posterior cálculo da quantidade de participantes. Com este objetivo, foram levantados dados
demográficos oficiais de cada unidade através do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de
Saúde (CNES) que, no entanto, não foram condizentes com o número de profissionais
encontrados no campo. Na prática, havia menos médicos atuando nas unidades supracitadas
por diversas razões, como afastamentos por motivo de doença, férias, transferência de
unidade, questões político-administrativas, entre outras.
Uma outra dificuldade encontrada no momento de seleção e recrutamento dos
participantes foi a epidemia de dengue que atingiu o município do Rio de Janeiro nos
primeiros meses deste ano, período em que foi realizada a coleta de dados, e que mobilizou
intensamente os serviços de saúde. O movimento de pacientes nos ambulatórios e hospitais da
cidade teve um aumento vertiginoso e foram impostas mudanças na carga horária e nas
exigências aos médicos, que em alguns relatos informais falaram sobre o sentimento de
revolta, menos-valia e esgotamento pelas condições sociais e de trabalho a que são expostos.
Tais situações de adversidade tornaram difícil manter o plano inicial de recrutamento dos
sujeitos e, a partir dessa constatação, optou-se por utilizar uma amostragem não-probabilística
de tipo intencional, com médicos das referidas unidades que se dispusessem voluntariamente
a participar do estudo. Deste modo, o recrutamento dos participantes foi feito pessoalmente
pela pesquisadora, que se apresentava à coordenação dos serviços e unidades de saúde
informando sobre a pesquisa e convidando os médicos a participar da mesma.
5.2.2 Segunda etapa: coleta de dados nas unidades de saúde.
A primeira unidade liberada para a coleta de dados foi o Hospital Universitário I. O
contato inicial estabelecido pela pesquisadora foi com o Serviço de Psicologia Médica, de
60
onde fora ex-aluna e de onde poderia obter informações sobre a localização e a rotina dos
ambulatórios nos quais iria apresentar a pesquisa e recrutar os participantes. No primeiro dia,
através da coordenadora do serviço, foi encaminhada e apresentada à direção do hospital para
dar ciência da pesquisa e ao ambulatório do Serviço de Medicina Integral (AMI). Neste, a
pesquisadora forneceu informações sobre o estudo e convidou os médicos a participarem. Os
que se voluntariaram assinaram o termo de consentimento e tiveram a opção de preencher o
Inventário de Empatia e a ficha de caracterização sócio-profissional na hora ou entregá-los
posteriormente na secretaria do serviço, onde foi deixado um envelope especificamente para
esta finalidade. Em dias subseqüentes, foram visitados os ambulatórios de Pediatria,
Dermatologia, Ginecologia e Clínica Médica, onde o mesmo procedimento de apresentação
da pesquisa e convite à participação foi feito aos médicos.
A quantidade de visitas a este hospital foi em torno de 10, uma vez que foi necessária
alguma insistência por parte da pesquisadora para conseguir ter acesso aos profissionais,
especialmente dos ambulatórios de Dermatologia e Ginecologia. No primeiro foram
encontrados apenas médicos residentes que justificaram não ter tempo para participar devido
à quantidade de pacientes para atender e às atividades acadêmicas, como aulas e provas. Por
sugestão da pesquisadora e com a concordância dos médicos, um envelope também foi
deixado na secretaria do serviço para que eles pudessem preencher o inventário em um
momento mais oportuno e o devolvessem à secretaria, onde a pesquisadora poderia recolhê-
los. Dos 10 inventários e fichas de caracterização sócio-profissional distribuídos no serviço de
Dermatologia, somente dois retornaram preenchidos. Houve ainda uma tentativa da
pesquisadora de fazer contato com o professor coordenador do serviço para tentar aumentar as
chances de participação, mas esse encontro também não foi possível por questões de
indisponibilidade de agenda.
No serviço de Ginecologia, este estudo foi apresentado a um dos professores
coordenadores, que não preencheu o instrumento, mas em conversa informal com a
pesquisadora fez algumas considerações sobre a relação médico-paciente e a empatia. Não
foram encontrados outros profissionais do serviço disponíveis para participar da pesquisa. O
encerramento da coleta de dados nesta unidade ocorreu no Serviço de Clínica Médica, onde
médicos – professores e residentes – participaram em sua maioria da pesquisa, respondendo
ao Inventário.
Em paralelo às visitas ao Hospital Universitário I e após a liberação do Comitê de
Ética da Secretaria Municipal de Saúde, a pesquisadora passou a percorrer os Centros
Municipais de Saúde e as equipes do Programa Saúde da Família selecionados para o estudo,
61
iniciando pela área programática 4.0 (bairros de Jacarepaguá, Barra da Tijuca e Recreio dos
Bandeirantes). O contato para acessar os médicos do PSF se deu através do coordenador do
programa na área que sugeriu e facilitou o encontro com alguns profissionais que estavam
reunidos em um curso de capacitação e também com os médicos que estavam nas equipes de
atendimento de duas comunidades (ESF I e ESF II). Todos tiveram a opção de preencher no
momento ou de entregar ao coordenador posteriormente para que a pesquisadora pudesse
recolhê-los.
O único Centro Municipal de Saúde desta região que recebeu a pesquisadora foi o
CMS III, através da coordenadora de estágios e recursos humanos, que se disponibilizou a
apresentar os médicos nos ambulatórios e a ficar com o envelope para o recolhimento dos
inventários de quem se dispusesse a participar. Dos 14 inventários entregues aos médicos
desta unidade apenas dois foram devolvidos preenchidos. No momento de coleta dos dados
nessa região, os postos já estavam enfrentando o aumento da demanda de pacientes por conta
dos casos de dengue e nestes foi mais difícil o acesso aos médicos.
A segunda área programática do município a ser pesquisada foi a A.P. 2.2 (bairros do
Alto da Boa Vista, Andaraí, Grajaú, Maracanã, Praça da Bandeira, Tijuca, Vila Isabel, Morro
da Formiga). Para acessar os profissionais do PSF, assim como na A.P. 4.0, foi feito contato
com a coordenadora regional do programa a quem a pesquisadora acompanhou durante as
visitas às equipes ESF IV e ESF VI.
Os dois CMS da região – CMS I e CMS II – também participaram do estudo. Em
ambos a pesquisa foi apresentada às respectivas diretoras que, por sua vez, apresentaram a
pesquisadora aos médicos presentes nas unidades. Todos os que aceitaram participar pediram
para que o inventário fosse deixado e recolhido posteriormente, como já havia ocorrido em
outras unidades. Apesar de também estarem enfrentando a epidemia de dengue e acolhendo
uma quantidade maior de pacientes, a organização dos serviços nestas unidades pareceu mais
funcional do que a situação encontrada nos postos da A.P. 4.0.
Na visita a Policlínica I, a pesquisa também foi apresentada à direção geral da
unidade, mas nesta não foi facilitado o acesso aos médicos com a justificativa de que estavam
enfrentando sérios problemas político-administrativos, além da epidemia de dengue, e por esta
razão a direção não se sentia confortável de informar sobre a realização da pesquisa e de
solicitar a participação de seus profissionais. No entanto, apesar de tais limitações, a
pesquisadora conseguiu que um dos médicos da unidade aceitasse responder ao estudo e
convidasse alguns de seus colegas a fazer o mesmo. Sendo assim, parte da amostra relativa ao
62
nível de atenção secundária foi conseguida com base na disponibilidade de um dos
participantes e de seu empenho em conseguir mais voluntários.
Além desta unidade, a Policlínica II também estava enfrentando dificuldades e
reformulações administrativas, segundo informação de um de seus diretores. No entanto,
apesar dos problemas, nesta não houve nenhuma restrição à realização da pesquisa. Assim, foi
feito contato com o coordenador do serviço de clínica médica e com seus residentes que
aceitaram participar do estudo. Aqui é importante relatar que a maioria dos profissionais desta
unidade também está vinculada ao Hospital Universitário I, ambos ligados à faculdade de
medicina de uma universidade pública do Rio de Janeiro. Para efeitos de caracterização da
amostra, os profissionais desta unidade ficaram classificados como pertencendo ao nível
secundário de atenção à saúde, por levar-se em consideração que, mesmo atuando também na
atenção terciária, na ocasião da coleta de dados estavam representando a unidade de atenção
secundária.
A última unidade a ser pesquisada foi o Hospital Universitário II onde o contato inicial
também foi feito com o Serviço de Psiquiatria e Psicologia Médica, a exemplo do Hospital
Universitário I. Nele a pesquisadora pode contar com a permissão do coordenador e com o
apoio de alguns de seus profissionais para ser apresentada aos médicos que poderiam
participar do estudo. A receptividade e disponibilidade dos participantes, tanto professores
quanto residentes, foi bastante elevada, o que dentre outras variáveis, pode estar relacionada à
característica de hospital de ensino e pesquisa e também às relações interpessoais percebidas
pela pesquisadora entre os profissionais, que, ao participarem, incentivavam a participação de
outros.
A fase de coleta de dados durou aproximadamente cinco meses, tendo sido iniciada
em janeiro e finalizada em maio de 2008. Não houve financiamento por parte de órgãos de
fomento à pesquisa para este estudo, tendo sido as despesas decorrentes do mesmo arcadas
pela pesquisadora com recursos próprios.
5.3 Instrumentos
Foram utilizados os seguintes instrumentos para a coleta dos dados:
5.3.1 Ficha de Caracterização Sócio-Profissional (Apêndice A): desenvolvida e utilizada
para levantar as características sócio-profissionais da amostra, como sexo, idade, tempo de
63
formação, universidade em que cursou medicina, especialidade médica, área de atuação e
informação sobre capacitação em saúde mental.
5.3.2 Inventário de Empatia (I.E.) (Anexo A): corresponde a uma medida do tipo auto-
informe construída e validada no contexto brasileiro, que pretende medir a habilidade
empática de indivíduos adultos. As respostas às perguntas são do tipo Likert, com cinco
opções, variando desde nunca até sempre. As questões 1, 2, 6, 7, 10, 11, 12, 14, 15, 17, 18,
21, 23, 25, 27, 28, 29, 31, 33, 34, 36, 37 e 39 pontuam de forma direta e as questões 3, 4, 5, 8,
9, 13, 16, 19, 20, 22, 24, 26, 30, 32, 35, 38 e 40 de forma reversa. Os 40 itens da escala foram
agrupados em quatro fatores, os quais são especificados a seguir:
1) Tomada de Perspectiva (TP): capacidade de entender a perspectiva e sentimentos da
outra pessoa, principalmente em situações nas quais ocorre conflito de interesses. O indivíduo
com nível elevado em TP é motivado para compreender a perspectiva da outra pessoa, nos
termos desta, antes de expressar a própria perspectiva. A TP pode ser entendida como
acuidade empática. Um escore baixo em TP significa que a pessoa apresenta dificuldade para
compreender as perspectivas e sentimentos da outra pessoa. Tal dificuldade predispõe a
pessoa a julgamento e crítica, facilitando o conflito interpessoal. Compõe-se de 12 itens: 6,
10, 11, 12, 17, 18, 21, 23, 25, 28, 31 e 33 (Alpha de Cronbach: 0,86).
10. Antes de pedir a uma pessoa para mudar um comportamento que me incomoda, procuro me colocar no lugar dela para entender o que a leva a ter tal atitude.
1 2 3 4 5
Quadro 5. Questão relativa à Tomada de Perspectiva no IE
2) Flexibilidade Interpessoal (FI): elevada capacidade em aceitar perspectivas, crenças
e valores muito diferentes, além de tolerância à frustração provocada pela atitude do
interlocutor. Pessoas com elevado nível em FI tendem a fazer menos julgamentos e críticas e
sabem regular as próprias emoções. Um escore baixo neste fator indica rigidez para aceitar
pontos de vista diferentes ou intolerância frente a comportamentos que provoquem frustração.
Pessoas com essas características estão mais propensas a se aborrecer e a reagir
impulsivamente em situações que envolvam conflito de interesses. Além disso, são mais
sensíveis e defensivas diante de criticas. Compõe-se de 10 itens: 4, 5, 8, 9, 13, 19, 30, 32 e 35
(Alpha de Cronbach: 0,78).
5. Quando alguém está me confidenciando um problema, 1 2 3 4 5
64
exponho minha opinião objetivamente, apontando os seus erros e acertos.
Quadro 6. Questão relativa à Flexibilidade Interpessoal no IE
3) Altruísmo (AL): capacidade de sacrificar temporariamente as próprias
necessidades, em benefício de outra pessoa. Indivíduos com escore baixo em AL tendem a
reagir de forma egoísta, demonstrando pouco interesse pelas necessidades das outras pessoas.
Compõe-se de nove itens: 2, 3, 16, 20, 22, 26, 36, 38 e 40 (Alpha de Cronbach: 0,75).
2. Eu adiaria a decisão de terminar um relacionamento se percebesse que o meu par está com problemas.
1 2 3 4 5
Quadro 7. Questão relativa ao Altruísmo no IE
4) Sensibilidade afetiva (SA): tendência a experimentar sentimentos de compaixão e
de interesse pelo estado emocional da outra pessoa. Indica preocupação genuína com o bem-
estar dos outros e um cuidado com os efeitos do próprio comportamento sobre o bem-estar do
outro. Um escore baixo neste fator indica tendência a ser desatento ou descuidado no contexto
interacional, sugerindo egocentrismo. Compõe-se de nove itens: 1, 7, 14, 15, 27, 29, 34, 37 e
39 (Alpha de Cronbach: 0,72).
39. Deixo de revelar uma experiência de sucesso se percebo que a outra pessoa está triste ou com problemas.
1 2 3 4 5
Quadro 8. Questão relativa à Sensibilidade Afetiva no IE
Estes quatro fatores estão fortemente fundamentados por estudos teóricos e empíricos,
que apontam a Tomada de Perspectiva como o componente cognitivo da empatia, assim como
a Sensibilidade Afetiva está relacionada ao componente afetivo dessa habilidade. Além disso,
o Altruísmo e a Flexibilidade Interpessoal também têm sido relacionados à empatia.
65
5.4 Análise dos dados
O software utilizado para registrar a caracterização da amostra e os dados obtidos no
Inventário de Empatia foi o Microsoft Excel© versão 2003 e para a análise estatística o SPSS
13.0.
Foi calculada a pontuação de cada participante nos fatores que compõe o Inventário de
Empatia: TP (Tomada de Perspectiva), FI (Flexibilidade Interpessoal), AL (Altruísmo) e SA
(Sensibilidade Afetiva) e também a confiabilidade dos fatores através do coeficiente Alpha de
Cronbach.
Para as variáveis contínuas calcularam-se média, desvio-padrão, amplitude e mediana.
As diferenças entre os grupos foram avaliadas por meio de Análise de variância (ANOVA)
seguida pelo teste de comparação múltipla Dunnett’s T3. O nível de significância adotado foi
de 5%.
5.5 Questões éticas
Antes de iniciar o processo de coleta de dados, o projeto desta pesquisa teve que ser
submetido a três Comitês de Ética (CEP) diferentes. Mesmo estando todos os comitês
subordinados à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) a decisão pela aprovação
do projeto por um comitê não é necessariamente acatada por outros. Especialmente no caso
deste estudo, que incluiu unidades de saúde de esferas públicas distintas (municipal, estadual
e federal), esta foi uma exigência burocrática compulsória para a liberação do início da
pesquisa. Os termos de consentimento encontram-se nos apêndices A, B e C.
66
Capítulo 6
RESULTADOS
Os resultados apresentados referem-se à avaliação da empatia no estilo interpessoal
dos médicos estudados e não caracterizam necessariamente seu comportamento na relação
com o paciente. O número limitado de participantes determina que os dados apresentados não
possam ser generalizáveis à população de médicos, mas que sugiram tendências de atitudes
interpessoais nestes profissionais.
6.1 Características sócio-profissionais dos participantes
Do total de participantes, 25 atuam no nível da atenção primária, sendo 11 médicos do
Programa Saúde da Família (PSF) e 14 dos Centros Municipais de Saúde (CMS). No nível da
atenção secundária, foram 12 médicos participantes e, finalmente, no nível terciário foram 38.
Em relação à caracterização por gênero, no total foram 26 médicos do sexo masculino e 49 do
sexo feminino, com idades que variaram de 24 a 67 anos (X̄= 41,1; DP= 11,6).
Sobre a universidade onde cursaram medicina, 11 participantes haviam se formado
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), 18 participantes pela Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ), cinco pela Universidade Federal Fluminense (UFF), 10
pela Universidade Gama Filho (UGF) e 31 por outras universidades, como a Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNI-RIO) e outras faculdades de medicina. Quanto ao
tempo de formação dos profissionais a variação encontrada foi desde seis meses até 39 anos
de formado (X̄= 16,4; DP= 11,3). As especialidades médicas dos participantes incluem: três
em Medicina de Família, 30 em Clínica Médica, nove em Pediatria, quatro em Dermatologia,
quatro em Ginecologia, seis em Medicina Alternativa e 19 distribuídos em outras
especialidades. Do total de participantes seis informaram ter recebido algum tipo de
capacitação em saúde mental.
Se considerada a distribuição dos médicos por nível de atenção à saúde, o grupo da
atenção primária contou com seis participantes do sexo masculino e 19 do sexo feminino, com
idades variando de 26 a 66 anos (X̄= 42,6; DP=11,1) e tempo de formação entre 1 e 36 anos
(X̄= 17,2; DP=10,7). No nível de atenção secundária foram cinco homens e sete mulheres, de
idades entre 35 e 61 anos (X̄= 50,4; DP=6,8), com o mínimo de nove anos de formado e
máximo de 35 anos (X̄= 25,1; DP= 8,4). Finalmente, os participantes do nível da atenção
terciária se dividiram em 15 do sexo masculino e 23 do sexo feminino, com idades variando
67
entre 24 e 67 anos (X̄= 37,1; DP=11,5) e tempo de formação de seis meses a 39 anos (X̄=
13,1; DP=11,2).
CARACTERÍSTICA
SÓCIO-PROFISSIONAL
NÍVEL DE ATENÇÃO À SAÚDE
Atenção Primária Atenção
Secundária Atenção
Terciária Total CMS PSF
Feminino 11 8 7 23 49 Masculino 3 3 5 15 26
Média de idade 43,6 41,3 50,4 37,1 41,1 Média de tempo de
formação (anos) 19,3 17,2 25,1 13,1 16,4
Total de participantes 14 11 12 38 75 Quadro 9. Características sócio-profissionais dos participantes
6.2 Avaliação da empatia na amostra total de médicos
Os 75 médicos participantes do estudo apresentaram níveis de empatia compatíveis
com a média da população segundo os dados normativos do Inventário de Empatia (ANEXO
B). No que tange ao componente cognitivo da empatia, as médias do grupo foram 43,4 para
TP – Tomada de Perspectiva e 32,9 para FI – Flexibilidade Interpessoal, correspondendo a
níveis medianos no I.E. Já no componente afetivo da empatia, o resultado dos médicos foi de
32,4 para AL – Altruísmo e de 37,9 para SA – Sensibilidade Afetiva, sendo superior ao dos
dados normativos do I.E. no aspecto Altruísmo e inferior no aspecto Sensibilidade Afetiva.
No quadro 10 essas médias são apresentadas seguidas pelos cálculos de erro-padrão, desvio-
padrão e mediana.
O coeficiente Alpha de Cronbach calculado para cada um dos fatores foi bastante
próximo aos do instrumento, reforçando a confiabilidade da medida e a validade dos
construtos que medem a empatia.
68
ESTATÍSTICA
AMOSTRA TOTAL TP FI AL SA
N 75 75 75 75 Média 43,4 32,9 32,4 37,9 Erro-padrão 0,7 0,7 0,7 0,5 Desvio-padrão 6,4 5,7 5,9 4,2 Mínimo 25,0 20,0 18,0 25,0 Máximo 60,0 50,0 45,0 45,0 Percentil 25 39,0 30,0 27,0 36,0 Percentil 50 (Mediana) 44,0 33,0 33,0 38,0 Percentil 75 48,0 36,0 37,0 41,0 Alpha de Cronbach 0,85 0,76 0,78 0,71
Quadro 10. Estatísticas descritivas para a amostra total TP – Tomada de Perspectiva; FI – Flexibilidade Interpessoal; AL – Altruísmo; SA – Sensibilidade Afetiva
6.3 Avaliação da empatia segundo o nível de atenção à saúde.
Considerando os diversos contextos de atuação, no fator Tomada de Perspectiva os
médicos de ambulatórios da Atenção Primária (CMS) obtiveram média de 41,7 pontos
(DP=8,4 e Me=43,5); os do PSF, 48,3 pontos (DP=5,1; Me=49); os de ambulatórios de
atenção secundária, 40,3 pontos (DP=6,4; Me=39) e, finalmente, os da atenção terciária, 43,6
pontos (DP=5,2; Me=44). Na comparação das médias dos grupos, segundo o teste ANOVA
(Anexo C), a diferença mostrou-se significativa (p-valor=0,014), sendo o grupo dos médicos
do PSF o que apresentou a maior média e o grupo da atenção secundária o que ficou com o
menor valor.
ESTATÍSTICA
ÁREA DE ATUAÇÃO Atenção Básica Atenção
Secundária Atenção
Terciária CMS PSF N 14 11 12 38 Média* 41,7 48,3 40,3 43,6 Erro-padrão 2,2 1,5 1,8 0,8 Desvio-padrão 8,4 5,1 6,4 5,2 Mínimo 25,0 39,0 31,0 32,0 Máximo 55,0 56,0 52,0 60,0 Percentil 25 37,0 45,0 36,0 40,0 Percentil 50 (Mediana) 43,5 49,0 39,0 44,0 Percentil 75 47,0 52,0 44,5 47,0
Quadro 11. Resultados para o fator Tomada de Perspectiva * p-valor < 0,05
69
No fator Flexibilidade Interpessoal, não houve diferença significativa entre os grupos
dos diversos níveis de atenção à saúde. As médias apresentadas neste fator foram: CMS, 31,5;
PSF, 31,4; Atenção Secundária, 31,8 e Atenção Terciária, 34,2, correspondendo aos níveis
medianos da população referência para os dados normativos do I.E. (Quadro 12)
ESTATÍSTICA
ÁREA DE ATUAÇÃO Atenção Básica Atenção
Secundária Atenção
Terciária CMS PSF N 14 11 12 38 Média 31,5 31,4 31,8 34,2 Erro-padrão 1,4 1,4 1,5 1,0 Desvio-padrão 5,2 4,7 5,3 6,0 Mínimo 22,0 23,0 21,0 20,0 Máximo 42,0 36,0 39,0 50,0 Percentil 25 28,0 29,0 30,5 31,0 Percentil 50 (Mediana) 32,5 33,0 33,0 34,0 Percentil 75 34,0 35,0 34,5 38,0 Quadro 12. Resultados para o fator Flexibilidade Interpessoal
Os resultados ligados ao fator Altruísmo apontaram uma tendência à diferença entre os
grupos (p-valor=0,88), tendo o grupo da Atenção Terciária obtido a maior média (X̄=33,9) e o
grupo dos CMS a menor (X̄=29,9). Ainda que as diferenças não tenham sido significativas
entre si, o resultado dos médicos em Altruísmo foi mais elevado que o da média da população
medida pelo I.E. (Quadro 13)
ESTATÍSTICA
ÁREA DE ATUAÇÃO Atenção Básica Atenção
Secundária Atenção
Terciária CMS PSF N 14 11 12 38 Média* 29,9 32,3 30,8 33,9 Erro-padrão 1,4 1,4 1,8 1,0 Desvio-padrão 5,4 4,5 6,1 6,0 Mínimo 22,0 25,0 18,0 20,0 Máximo 39,0 39,0 39,0 45,0 Percentil 25 25,0 27,0 27,0 29,0 Percentil 50 (Mediana) 27,5 33,0 32,5 35,0 Percentil 75 35,0 37,0 35,5 38,0
Quadro 13. Resultados para o fator Altruísmo * p-valor < 0,10, se Atenção Básica for considerada em conjunto.
Finalmente, no último fator analisado pelo I.E. – Sensibilidade Afetiva – os grupos
também não pontuaram diferenças significativas entre si. As médias foram: CMS, 37,4; PSF,
70
39,3; Atenção Secundária, 37,3 e Atenção Terciária, 38. A média deste fator na população
avaliada pelo I.E. é 43,9, o que mostra níveis de sensibilidade afetiva menores nos médicos
em comparação com a amostra total na qual foram baseados os dados normativos do
instrumento.
ESTATÍSTICA
ÁREA DE ATUAÇÃO Atenção Básica Atenção
Secundária Atenção
Terciária CMS PSF N 14 11 12 38 Média 37,4 39,3 37,3 38,0 Erro-padrão 1,4 1,2 1,4 0,6 Desvio-padrão 5,4 4,1 4,9 3,4 Mínimo 29,0 34,0 25,0 30,0 Máximo 45,0 45,0 44,0 45,0 Percentil 25 33,0 34,0 36,0 36,0 Percentil 50 (Mediana) 37,5 40,0 36,5 38,0 Percentil 75 42,0 43,0 40,5 40,0 Quadro 14. Resultados para o fator Sensibilidade Afetiva
Em resumo, o resultado da avaliação da empatia nos médicos segundo o nível de
atenção à saúde correspondeu aos dados apresentados no quadro seguinte, onde é possível
visualizar também a pontuação correspondente aos dados normativos do Inventário de
Empatia.
FATORES DO INVENTÁRIO DE EMPATIA
NÍVEL DE ATENÇÃO À SAÚDE Dados
Normativos I.E.
Atenção Primária Atenção
Secundária Atenção
Terciária CMS PSF
TP 41,7 48,3 40,3 43,6 40,92 FI 31,5 31,4 31,8 34,2 31,08 AL 29,9 32,3 30,8 33,9 24,46 SA 37,4 39,3 37,3 38,0 43,92
Quadro 15. Empatia segundo o nível de atenção à saúde
71
6.4 Avaliação da empatia segundo as características sócio-demográficas
6.4.1 Gênero
Não foram encontradas diferenças significativas nas médias de empatia entre os
gêneros. Os resultados dos médicos do sexo masculino e do sexo feminino estão apresentados
na Tabela 1.
Tabela 1. Avaliação da empatia segundo o gênero
SEXO FATORES DA EMPATIA
TP FI AL SA
Masculino 43,7 31,0 31,4 37,5
Feminino 43,2 33,9 33,0 38,2
6.4.2 Especialidade Médica
Os resultados da avaliação da empatia segundo a especialidade médica não puderam
ser analisados estatisticamente por conta da amostra insuficiente, mas estão apresentados na
tabela a seguir, sugerindo possibilidades de estudos futuros que priorizem a diferenciação dos
médicos por especialidade e não somente por área de atuação.
Tabela 2. Especialidade médica e fatores da empatia.
ESPECIALIDADE
MÉDICA FATORES DA EMPATIA
TP FI AL SA
Medicina de Família 48,7 32,3 34,3 40,7
Clínica Médica 43,9 32,5 33,1 37,9
Pediatria 42,4 31,8 30,7 38,2
Dermatologia 45,0 38,0 32,5 37,8
Ginecologia 42,3 32,3 27,8 31,5
Medicina alternativa
(Homeopatia/Acupuntura) 38,0 31,0 31,3 37,3
Outras 43,7 33,8 33,2 39,0
72
Capítulo 7
DISCUSSÃO
Este estudo teve como objetivo descrever e caracterizar a empatia em médicos em
diferentes condições de trabalho e assistência em saúde e contribuir com informações sobre a
importância da empatia e de seus componentes específicos no repertório de habilidades de
comunicação do profissional de medicina. O número de participantes desta pesquisa não
permite, no entanto, que as reflexões aqui desenvolvidas sejam generalizáveis a toda a
categoria médica e a todas as regiões do país. Desse modo, os resultados deste estudo indicam
possibilidades de compreensão a respeito do tema empatia na prática médica e sugerem
referências para a realização de novos trabalhos na área.
Dentre as primeiras considerações que podem ser feitas sobre a habilidade empática
no grupo estudado, uma delas é que os médicos apresentaram escores compatíveis com as
médias referidas nos dados normativos do Inventário de Empatia. Especialmente no que
representa os componentes cognitivos de Tomada de Perspectiva e de Flexibilidade
Interpessoal, os médicos da amostra demonstraram uma capacidade mediana de enxergar o
mundo pelos olhos do outro, colocando-se em seu lugar, percebendo e compreendendo seu
modo de pensar e sentir e de ser flexível, aceitando sem julgar crenças e valores diferentes dos
seus próprios.
Já no componente afetivo da empatia, pode-se perceber que no fator Altruísmo o
grupo total de médicos apresentou um escore médio bastante acima da média da população
sugerindo que existe uma capacidade mais pronunciada neste grupo de suspender
temporariamente suas próprias necessidades em função de atender as demandas alheias. Se for
considerado que esses profissionais estão atuando no contexto da saúde pública, reconhecido
historicamente pela escassez de recursos materiais e humanos, parece que esta capacidade
altruística se exemplifica na continuidade da assistência aos pacientes mesmo diante das
dificuldades que se impõe aos médicos, como as condições precárias de trabalho, baixos
salários, demanda crescente de pacientes, entre outros.
Por fim no fator Sensibilidade Afetiva o que os resultados mostraram é que, se
considerada a média referida da população pelo I.E., os médicos tiveram um desempenho
inferior neste item. Talvez este seja um dos componentes da empatia que gere mais
controvérsias entre as correntes humanizadoras da prática médica e as escolas de formação
médica, que enfatizam a dessensibilização do médico, para que ele possa tratar sem se
73
envolver emocionalmente. O conceito de competência e profissionalismo em medicina ainda
permanece impregnado da idéia de que sensibilizar-se diante da dor e do sofrimento alheio
pode ser prejudicial ao profissional, como se ao ter acesso ao conhecimento do outro o
médico pudesse perder sua capacidade de autoconhecimento e autocontrole, confirmando o
que foi dito anteriormente por Spiro et al. (1993), More e Milligan (1994) e Maristany (2008).
O que esses resultados sobre a empatia em seus componentes cognitivos e afetivos
informam é que, com exceção do fator Altruísmo, os médicos não demonstraram níveis muito
superiores de empatia em relação à população avaliada pelo I.E. Com base na literatura que
aborda a relevância das habilidades interpessoais para o bom exercício da medicina (Roter &
Hall, 2006; De Marco, 2003; Desmond & Copeland, 2000), o que isto pode sugerir é que a
formação e a prática médica não produzem um diferencial significativo na capacidade
empática dos profissionais, o que poderia ser esperado diante das exigências da tarefa
assistencial e da função que a empatia apresenta no estabelecimento de relações terapêuticas
eficazes e de vínculos mais satisfatórios (Bohart & Greenberg, 1997; Desmond & Copeland,
2000; Falcone, 1998, 2000; Spiro et al., 1993). Uma das justificativas para tal fato é o
desconhecimento sobre as características e formas de desenvolvimento e treinamento das
habilidades interpessoais em geral e da empatia em particular.
As diretrizes curriculares propostas para os cursos de medicina tanto no Brasil quanto
no exterior deixam claro que é esperado do aluno ao final de sua graduação, entre outras
competências, que se comunique adequadamente com os colegas de trabalho, os pacientes e
seus familiares (ABEM, 2000). No entanto, as orientações sobre o que constitui uma
comunicação adequada nem sempre têm sido colocadas de forma objetiva e operacional, o
que acaba reforçando a pouca importância que este tema tem no meio médico.
Considerando os diferentes níveis de atenção à saúde focalizados nesta pesquisa, ainda
que os resultados não sejam conclusivos e nem generalizáveis, os dados sugerem que as
condições de trabalho do médico influenciam em maior ou menor grau a capacidade de
comunicar-se de modo empático.
A habilidade de Tomada de Perspectiva levantada nos diferentes grupos da Atenção
Básica, Atenção Secundária e Atenção Terciária mostrou-se significativamente diferente entre
os grupos. Os médicos do PSF destacaram-se como o grupo de melhor desempenho neste
fator e algumas considerações podem ser feitas diante desta constatação. A princípio, as
competências exigidas do médico de família diferem em grande parte da postura tradicional
médica de receber o paciente em um consultório, descontextualizado de suas condições de
vida. Dentre as tarefas atribuídas ao médico do PSF está a de ir até a comunidade com o
74
objetivo de interagir com a população, conhecendo suas características e necessidades,
visando à promoção, prevenção e recuperação da saúde (Branco & Nakatani, 2003). Este
novo modelo de atenção à saúde apresenta ao médico um sujeito inserido em uma rotina,
acompanhado de seus familiares, o que provavelmente favorece a tomada de perspectiva dos
médicos por conta da proximidade com a realidade do paciente.
Segundo Tavares e Takeda (2004), dentre as habilidades fundamentais que distinguem
um médico de família estão a capacidade de estabelecer um vínculo com o paciente, sua
família e sua comunidade, onde a comunicação desempenha um papel central. Para
compreender e diferenciar quando um sintoma exige ou não intervenção médica, o
profissional precisa conhecer a fundo os hábitos de vida, condições de moradia e subsistência,
as relações que estabelece com familiares, amigos e vizinhos e mesmo suas crenças e valores
de vida. Como o ensino de habilidades interpessoais e da relação médico-paciente nas
faculdades de medicina já era deficitário para o atendimento individual, agora ele
definitivamente se mostra insuficiente e inadequado para a prática da medicina de família
(Branco & Nakatani, 2003). Deste modo, programas de capacitação, formação e educação
permanente em Saúde da Família e Comunitária são oferecidos às equipes do PSF.
Uma vez que comunicar-se com o paciente isoladamente já poderia representar
dificuldades para o médico, certamente relacionar-se com uma família potencializa os
desafios de lidar com uma rede complexa de relações interpessoais. Uma situação que pode
exemplificar esta complexidade é a da violência familiar. Além de ter que atender ao pedido
de auxílio médico para o tratamento das lesões decorrentes de agressão física, é esperado do
profissional que ele compreenda a situação tanto da vítima quanto do agressor para que sua
ação seja resolutiva. Em outras palavras, se o problema da agressão estiver ligado ao consumo
de álcool por parte do agressor, por exemplo, será fundamental uma intervenção no sentido de
ajudá-lo com o comportamento aditivo. Compreender o contexto é uma habilidade do “fazer”
médico que difere em boa medida do “saber” médico sobre as doenças e exige do profissional
tanto competências técnicas quanto emocionais.
Em contraste com o grupo do PSF, os profissionais que atuam nos ambulatórios e
unidades hospitalares do nível de Atenção Secundária obtiveram a média mais baixa para o
fator Tomada de Perspectiva. Dentre as relações entre tal desempenho e as condições de
trabalho encontradas neste setor, é possível dizer, a partir de observações livres e relatos
informais coletados pela pesquisadora ao longo do estudo, que as condições de trabalho deste
grupo são as menos favorecedoras da expressão da empatia. Ambas as unidades de atenção
secundária selecionadas para o estudo enfrentavam dificuldades de ordem político-
75
administrativa, como mudanças na gestão e desentendimentos entre servidores de autarquias
diferentes (municipal e federal), o que parecia se refletir no comportamento de seus
profissionais. Uma delas, cuja história guardava episódios de pioneirismo e referência em
termos de assistência médica, estava lidando com a falta de investimento em insumos,
recursos humanos e tecnológicos, além da exposição à violência por parte de alguns pacientes
sob a qual estavam trabalhando os médicos. Em condições como essas, onde o profissional
precisa se proteger, lidando com o medo, a frustração e a raiva, pode-se supor que a expressão
das habilidades de empatia fiquem de fato dificultadas ou mesmo tornem-se inviáveis.
Nichols (1995) enfatiza que os canais de escuta empática ficam interrompidos quando
a pessoa que ouve está sobrecarregada de problemas, preocupada em controlar, instruir ou
mudar a outra pessoa ou ainda interpretando a fala da outra pessoa como ameaçadora ou
aviltante, o que parece representar a realidade experimentada pelos médicos nas condições
descritas acima. Por outro lado, é importante sinalizar também o quanto a habilidade empática
desenvolvida no profissional é capaz de ter um efeito moderador do stress, especialmente no
que se refere à capacidade de tomar a perspectiva do outro em situações de conflito,
compreendendo-o de modo a reduzir a tensão interpessoal e restabelecer os canais de
comunicação. Além disso, um outro efeito da empatia enquanto moderadora do desgaste
emocional do médico está no sentimento de satisfação que a pessoa que empatiza tem ao
perceber que sua forma de se comunicar foi bem-sucedida.
Ainda no que tange à falta de recursos e de segurança, um dos fatores que pode fazer
diferença para os médicos que atuam em condições adversas é a qualidade do apoio social
disponível entre os membros de um mesmo grupo, fator que tende a reduzir o stress e que
inclui a qualidade da escuta entre os pares profissionais. A falta de comunicação e o
isolamento entre os próprios médicos pode ser um fator que contribua para sentimentos de
inadequação e desvalorização, enquanto que a escuta empática entre os profissionais aumenta
o senso de conexão e de significância, protegendo o indivíduo da solidão e do sofrimento
psíquico (Nichols, 1995). Por exemplo, os médicos do PSF e os que atuam no nível Terciário
em hospitais universitários normalmente exercem suas funções em equipes, ao contrário dos
médicos de ambulatórios da rede básica e secundária que atuam de modo mais individual e
contam, a princípio, com menos apoio coletivo durante o exercício da assistência ao paciente.
Para os outros fatores da empatia medidos pelo I.E. não foram encontradas diferenças
significativas entre os grupos dos diversos níveis de atenção. No aspecto Altruísmo,
entretanto, a diferença ficou no limiar de significância, tendo sido o grupo da Atenção
Terciária o que obteve a maior média no fator. Se a amostra nos três níveis tivesse sido maior
76
talvez essa diferença fosse menos discreta e mais considerações poderiam ser feitas sobre este
aspecto.
Quanto ao método utilizado neste estudo, o Inventário de Empatia mostrou ser um
instrumento interessante para avaliar os diferentes fatores da empatia em médicos,
especialmente a capacidade de tomar a perspectiva do outro e de agir de modo altruísta. Seria
importante analisar futuramente o quanto esta medida de auto-relato é condizente com a
avaliação feita pelo paciente sobre o comportamento do médico, para que dados mais
fidedignos pudessem ser levantados.
Ainda como indicação de estudos na área ficam as sugestões de avaliar amostras
maiores e, portanto, mais significativas estatisticamente e que ampliem também a abrangência
geográfica. A realização de um estudo longitudinal que avaliasse os níveis de empatia ao
início do curso de medicina e ao final também poderia fornecer dados enriquecedores sobre
como o ensino pode afetar a capacidade empática de alunos de medicina.
Propõe-se ainda que novas pesquisas atentem para a diversidade e a importância de
considerar a questão da relação médico-paciente o mais amplamente possível, não
alimentando visões dicotômicas entre a tecnologia mecânica e a tecnologia humana neste
campo. Essa tarefa certamente não é simples. Ao defender e justificar a importância do ensino
de habilidades sociais que independam da formação pessoal do profissional de saúde, é
preciso atentar para o fato de que não há uma necessidade de se negar uma habilidade –
técnica – em função de outra – humana.
77
Capítulo 8
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De todas as justificativas encontradas para o não desenvolvimento das habilidades de
empatia na medicina, algumas foram indicadas neste estudo: as características dos tempos
atuais como a pressa, o aparato tecnológico exponencial e a falta de reconhecimento
acadêmico-curricular para as habilidades interpessoais, só para citar alguns exemplos.
Entretanto, uma das que talvez mais influencie tal negligência seja o desconhecimento do que
seja a habilidade da empatia e de como ela pode ser desenvolvida de modo estruturado,
consistente e coerente com as necessidades técnicas e profissionais da medicina.
Em suma, este estudo verificou que a empatia identificada na amostra de médicos
estudada não se diferenciou acentuadamente da média da população de adultos referida nos
dados normativos do Inventário de Empatia. Considerando que esta habilidade é apontada na
literatura como fundamental para o exercício humanizado e eficaz da medicina, poder-se-ia
supor que os médicos teriam uma capacidade mais acentuada de se comportar empaticamente,
o que não foi confirmado pelos resultados desta pesquisa. No entanto, a partir da constatação
de que os médicos do Programa Saúde da Família tiveram um desempenho significativamente
superior ao dos médicos de outros níveis de atenção à saúde no fator Tomada de Perspectiva,
é possível supor que alguns fatores característicos deste grupo como educação continuada –
inclusive em saúde mental – e aproximação da realidade de vida dos pacientes possam
contribuir para um aumento da capacidade do médico de se comunicar de modo empático.
A contribuição que este estudo traz para a área das habilidades interpessoais e de
comunicação em medicina é que tanto a formação médica quanto as condições de trabalho
nos diversos contextos de atenção à saúde podem ser planejados de modo a favorecer a
empatia em médicos, promovendo relações mais satisfatórias e possibilitando um exercício da
medicina mais adequado às necessidades humanas na atualidade.
78
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83
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Pesquisa: Avaliação da empatia em médicos de diferentes níveis de atenção à saúde. Coordenadoras: Cristiane de Figueiredo Araújo e Eliane Mary de Oliveira Falcone (Programa de Pós-graduação em Psicologia Social do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Prezado participante, Este estudo tem como objetivo avaliar as habilidades interpessoais do médico que se refletem em seu exercício profissional. Ao participar do mesmo, você estará contribuindo para uma melhor compreensão dos fatores que determinam o estabelecimento de relações mais satisfatórias entre médicos e pacientes, que podem levar a melhora da qualidade do atendimento, dos resultados do tratamento, da prevenção de problemas de saúde e da redução dos níveis de estresse profissional. Se concordar em participar, você irá preencher um inventário onde constam diversas situações interpessoais, não necessariamente relacionadas ao contexto profissional. Esse preenchimento levará poucos minutos. Todas as informações serão absolutamente confidenciais, sendo utilizadas, anonimamente, apenas pelas pesquisadoras para a finalidade deste estudo. Os dados obtidos serão para uso exclusivo desta pesquisa e somente os resultados gerais poderão ser publicados em periódicos científicos, apresentados e discutidos em eventos científicos. A participação neste estudo não implica em riscos ou desconforto de nenhuma ordem. Você não terá despesas como também nenhum ganho direto, financeiro ou de outra ordem, por participar desta pesquisa. Você poderá também desistir de sua participação a qualquer momento do trabalho, bastando para isso entrar em contato com as pesquisadoras. Para maiores esclarecimentos, você poderá entrar em contato com as pesquisadoras: Eliane Falcone e Cristiane Figueiredo através do e-mail [email protected] ou pelos telefones 2178-2067 e 8858-0507 ou ainda na secretaria do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social: Rua São Francisco Xavier, 524, 10º andar, sala 10019, bloco F, Maracanã, Rio de Janeiro, RJ. Caso você tenha dificuldade em entrar em contato com opesquisador responsável, comunique o fato à Comissão de Ética em Pesquisa da UERJ: Rua São Francisco Xavier, 524, 3º andar, sala 3020, bloco E, Maracanã, Rio de Janeiro, RJ, e-mail: [email protected] – Tel.: 2569-3490. Tendo sido apresentadas as informações acima, eu, de forma livre e esclarecida, concordo voluntariamente em participar deste estudo e poderei retirar meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem penalidades ou prejuízo.
_________________________________________ Local e Data
_________________________________________
Assinatura do Participante
_________________________________________ Assinatura da Pesquisadora
Elaborado em 30/06/2007.
84
APÊNDICE B
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pesquisa: Avaliação da empatia em médicos de diferentes níveis de atenção à saúde. Coordenadoras: Cristiane de Figueiredo Araújo e Eliane Mary de Oliveira Falcone (Programa de Pós-graduação em Psicologia Social do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Prezado participante, Este estudo tem como objetivo avaliar as habilidades interpessoais do médico que se refletem em seu exercício profissional. Ao participar do mesmo, você estará contribuindo para uma melhor compreensão dos fatores que determinam o estabelecimento de relações mais satisfatórias entre médicos e pacientes, que podem levar a melhora da qualidade do atendimento, dos resultados do tratamento, da prevenção de problemas de saúde e da redução dos níveis de estresse profissional. Se concordar em participar, você irá preencher um inventário onde constam diversas situações interpessoais, não necessariamente relacionadas ao contexto profissional. Esse preenchimento levará poucos minutos. Todas as informações serão absolutamente confidenciais, sendo utilizadas, anonimamente, apenas pelas pesquisadoras para a finalidade deste estudo. Os dados obtidos serão para uso exclusivo desta pesquisa e somente os resultados gerais poderão ser publicados em periódicos científicos, apresentados e discutidos em eventos científicos. A participação neste estudo não implica em riscos ou desconforto de nenhuma ordem. Você não terá despesas como também nenhum ganho direto, financeiro ou de outra ordem, por participar desta pesquisa. Você poderá também desistir de sua participação a qualquer momento do trabalho, bastando para isso entrar em contato com as pesquisadoras. Tendo sido apresentadas as informações acima, eu, de forma livre e esclarecida, concordo voluntariamente em participar deste estudo e poderei retirar meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem penalidades ou prejuízo.
_________________________________________ Local e Data
_________________________________________ Assinatura do Participante
_________________________________________ Assinatura da Pesquisadora
Para maiores esclarecimentos, você poderá entrar em contato com as pesquisadoras: Cristiane Figueiredo Araújo (tel.: 2178-2067 / 8858-0507) e Eliane Falcone (tel.: 2540-5238 / 9635-7444). Caso você tenha dificuldade em entrar em contato com o pesquisador responsável ou tenha alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria Municipal de Saúde: Rua Afonso Cavalcanti, 455, sala 701 – Cidade Nova. Tels.: 2503-2024 / 2503-2026. E-mail: [email protected].
85
APÊNDICE C TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pesquisa: Avaliação da empatia em médicos de diferentes níveis de atenção à saúde. Coordenadoras: Cristiane de Figueiredo Araújo e Eliane Mary de Oliveira Falcone (Programa de Pós-graduação em Psicologia Social do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Prezado participante, Este estudo tem como objetivo avaliar as habilidades interpessoais do médico que se refletem em seu exercício profissional. Ao participar do mesmo, você estará contribuindo para uma melhor compreensão dos fatores que determinam o estabelecimento de relações mais satisfatórias entre médicos e pacientes, que podem levar a melhora da qualidade do atendimento, dos resultados do tratamento, da prevenção de problemas de saúde e da redução dos níveis de estresse profissional. Se concordar em participar, você irá preencher um inventário onde constam diversas situações interpessoais, não necessariamente relacionadas ao contexto profissional. Esse preenchimento levará poucos minutos. Todas as informações serão absolutamente confidenciais, sendo utilizadas, anonimamente, apenas pelas pesquisadoras para a finalidade deste estudo. Os dados obtidos serão para uso exclusivo desta pesquisa e somente os resultados gerais poderão ser publicados em periódicos científicos, apresentados e discutidos em eventos científicos. A participação neste estudo não implica em riscos ou desconforto de nenhuma ordem. Você não terá despesas como também nenhum ganho direto, financeiro ou de outra ordem, por participar desta pesquisa. Você poderá também desistir de sua participação a qualquer momento do trabalho, bastando para isso entrar em contato com as pesquisadoras. Para maiores esclarecimentos, você poderá entrar em contato com as pesquisadoras: Eliane Falcone e Cristiane Figueiredo Araújo através do e-mail [email protected] ou pelos telefones 2178-2067 e 8858-0507 ou ainda na secretaria do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social: Rua São Francisco Xavier, 524, 10º andar, sala 10019, bloco F, Maracanã, Rio de Janeiro, RJ. Caso você tenha dificuldade em entrar em contato com o pesquisador responsável ou tenha alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (CEP): Av. Brigadeiro Trompowsky, s/nº, sala 01D-46, 1º andar, Ilha do Fundão. Tel.: 2562-2480. E-mail: [email protected].
Acredito ter sido suficientemente informado a respeito das informações sobre o estudo acima citado que li ou que foram lidas para mim. Ficaram claros para mim quais são os propósitos do estudo, os procedimento a serem realizados, seus desconfortos e riscos, as garantias de confidencialidade e de esclarecimentos permanentes. Ficou claro também que minha participação é isenta de despesas. Concordo voluntariamente em participar deste estudo e poderei retirar meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem penalidades ou prejuízo.
______________________________ Nome do Participante ______________________________ Data: _____ / _____ / _____ Assinatura do Participante ______________________________ Data: _____ / _____ / _____ Assinatura do Pesquisador
86
APÊNDICE D FICHA DE CARACTERIZAÇÃO SÓCIO-PROFISSIONAL
Nº. ____________
1) IDADE ______________ 2) SEXO (A) Masc. (B) Fem. 3) UNIVERSIDADE ONDE SE GRADUOU (A) UFRJ (B) UERJ (C) UFF (D) UGF (E) OUTRA _______________________ 4) TEMPO DE FORMAÇÃO ___________________________________________ 5) ESPECIALIDADE MÉDICA (ESPECIALIZAÇÃO E/OU RESIDÊNCIA MÉDICA) (A) MEDICINA DE FAMÍLIA (B) CLÍNICA MÉDICA (C) PEDIATRIA (D) DERMATOLOGIA (E) GINECOLOGIA (F) MEDICINA ALTERNATIVA (HOMEOPATIA, ACUPUNTURA) (G) OUTRAS _______________________ 6) ÁREA DE ATUAÇÃO ATUAL: (A.1) UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE (A.2) PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA - PSF (B.1) AMBULATÓRIO HOSPITAL GERAL (B.2) AMBULATÓRIO DE POSTO DE ATENDIMENTO MÉDICO (PAM) (C.1) AMBULATÓRIO DE HOSPITAL ESPECIALIZADO (C.2) AMBULATÓRIO DE HOSPITAL UNIVERSITÁRIO (D.1) OUTRA ______________________________________ 7) VOCÊ TEVE ALGUMA CAPACITAÇÃO ESPECÍFICA EM SAÚDE MENTAL? (A) NÃO (B.1) SIM, ESPECIALIZAÇÃO (B.2) SIM, APERFEIÇOAMENTO E/OU EXTENSÃO (B.3) SIM, SUPERVISÃO EM SERVIÇO
87
ANEXO A I.E. (Falcone & cols.)
Nº ____________
Abaixo você encontrará uma série de afirmações que descrevem reações em diversas situações sociais. Por favor, leia cada uma delas e responda com que freqüência essas afirmações se aplicariam a você, marcando o número de acordo com a escala abaixo. Caso nunca tenha passado por alguma dessas situações, tente imaginar como você reagiria ao enfrentá-la. Responda a todas as perguntas.
1 2 3 4 5
Nunca Raramente Regularmente Quase sempre Sempre
1. Quando faço um pedido, procuro me certificar de que este não irá trazer incômodo à outra pessoa.
1 2 3 4 5
2. Eu adiaria a decisão de terminar um relacionamento se percebesse que o meu par está com problemas.
1 2 3 4 5
3. Se estiver com pressa e alguém insistir em continuar conversando comigo, encerro imediatamente o assunto dizendo apenas que tenho que ir.
1 2 3 4 5
4. Quando alguém faz algo que me desagrada, demonstro livremente a minha raiva.
1 2 3 4 5
5. Quando alguém está me confidenciando um problema, exponho minha opinião objetivamente, apontando os seus erros e acertos.
1 2 3 4 5
6. Costumo me colocar no lugar da outra pessoa quando estou sendo criticado, para tentar perceber os sentimentos e razões dela.
1 2 3 4 5
7. Ao ter que fazer um pedido a uma pessoa que está ocupada, declaro o meu reconhecimento do quanto ela está atarefada, antes de fazer o pedido.
1 2 3 4 5
8. Quando recebo uma crítica, costumo me defender imediatamente. 1 2 3 4 5
9. Quando percebo que minha opinião contrasta com a do meu interlocutor, procuro me expor de forma mais incisiva.
1 2 3 4 5
10. Antes de pedir a uma pessoa para mudar um comportamento que me incomoda, procuro me colocar no lugar dela para entender o que a leva a ter tal atitude.
1 2 3 4 5
11. Tenho facilidade de entender o ponto de vista de outra pessoa, mesmo quando ela me critica.
1 2 3 4 5
12. Antes de apontar um comportamento que me incomoda em alguém, procuro demonstrar que considero seus sentimentos e que compreendo suas razões.
1 2 3 4 5
13. Ao fazer um pedido incompatível com os interesses de outra pessoa, procuro ser persuasivo até conseguir o que desejo.
1 2 3 4 5
14. Ao acabar de ouvir um amigo que está com problemas, evito comentar sobre minhas conquistas.
1 2 3 4 5
15. Eu abriria mão de fazer um pedido importante se este causasse incômodo considerável à outra pessoa.
1 2 3 4 5
88
16. Quando pretendo terminar uma relação, procuro por em prática a minha decisão em vez de ficar pensando muito a respeito.
1 2 3 4 5
17. Quando recebo uma crítica, esforço-me para identificar as razões que levaram a outra pessoa a me criticar.
1 2 3 4 5
18. Quando discordo do meu interlocutor, procuro ouvi-lo e, em seguida, demonstro compreender o seu ponto de vista antes de expressar o meu.
1 2 3 4 5
19. Quando alguém expõe uma opinião contrária à minha, sinto-me incomodado e procuro logo demonstrar o meu ponto de vista.
1 2 3 4 5
20. Se alguém me deve algo, cobro-lhe a dívida imediatamente, mesmo que ele possa ter motivos que justifiquem o não pagamento.
1 2 3 4 5
21. Antes de expressar a minha opinião sobre algo com que não concordo, eu procuro compreender o lado de todas as pessoas envolvidas.
1 2 3 4 5
22. É melhor terminar logo uma relação com uma pessoa do que ficar adiando, mesmo que naquele dia ele (a) não esteja bem.
1 2 3 4 5
23. Se eu fizer um pedido e receber uma negativa, procuro entender as razões do outro, mesmo me sentindo frustrado(a).
1 2 3 4 5
24. Quando alguém age comigo de maneira hostil, respondo da mesma forma.
1 2 3 4 5
25. Quando recebo uma crítica procuro expressar para a outra pessoa a minha compreensão do que ela disse, para me certificar de que a entendi.
1 2 3 4 5
26. Quando alguém me faz um pedido que não posso ou não quero atender, digo “não” sem rodeios.
1 2 3 4 5
27. Evito revelar meus problemas pessoais quando percebo que a outra pessoa não está bem.
1 2 3 4 5
28. Consigo compreender inteiramente os sentimentos e razões de outra pessoa que se comportou comigo de forma hostil ou prejudicial.
1 2 3 4 5
29. Antes de desabafar meus problemas com um amigo procuro me certificar de que ele está receptivo a me ouvir.
1 2 3 4 5
30. Não consigo ficar calado quando ouço alguém falar um absurdo. 1 2 3 4 5
31. Antes de expressar minhas opiniões em uma conversa procuro compreender as opiniões da outra pessoa, especialmente quando estas são diferentes das minhas.
1 2 3 4 5
32. Eu sou do tipo que não leva desaforo pra casa. 1 2 3 4 5
33. Costumo me colocar no lugar de uma pessoa que está me revelando um problema para ver como me sentiria e o que pensaria se a situação fosse comigo.
1 2 3 4 5
34. Durante uma conversação procuro demonstrar interesse pela outra pessoa, adotando uma postura atenta.
1 2 3 4 5
35. Quando percebo que alguém se comporta de um modo que me incomoda, expresso imediatamente a minha insatisfação para deixar as coisas bem claras.
1 2 3 4 5
89
36. Antes de encerrar um relacionamento, eu me coloco no lugar da outra pessoa para avaliar como ela irá se sentir.
1 2 3 4 5
37. Ao fazer um pedido conflitante com os interesses de outra pessoa, procuro expressar meu reconhecimento sincero do incômodo que estou lhe causando.
1 2 3 4 5
38. Quando alguém não paga o que me deve, fico muito irritado e não hesito em cobrar a dívida.
1 2 3 4 5
39. Deixo de revelar uma experiência de sucesso se percebo que a outra pessoa está triste ou com problemas.
1 2 3 4 5
40. Se decidir recusar um pedido, vou direto ao ponto. 1 2 3 4 5
90
ANEXO B
INVENTÁRIO DE EMPATIA (IE)
DADOS NORMATIVOS PRELIMINARES
AMOSTRA TOTAL (N= 713) Estudantes universitários de ambos os sexos
Idades: 17 a 62 anos (Média = 23,09; DP: 5,70) ESTATÍSTICAS
ESCORES DAS SUBESCALAS Tomada de perspectiva (12 itens)
Flexibilidade X Rigidez
(10 itens)
Altruísmo X Egoísmo (9 itens)
Sensibilidade afetiva
(9 itens) Média 40,92 31,08 22,46 43,92
Desvio Padrão 7,36 6,40 5,95 4,84 5 12-29 10-21 9-13 9-27
P 10 30-32 22 14-15 28-29 E 20 33-35 23-26 16-17 30-31 R 30 36-37 27 18-19 32 C 40 38-39 28-30 20-21 33-34 E 50 40-41 31 22 35 N 60 42-43 32-33 23 36 T 70 44-45 34 24-25 37 I 80 46-47 35-36 26-27 38-39 S 90 48-50 37-39 28-30 40-41 99 51-60 40-50 31-45 42-45
AMOSTRA MASCULINA (N = 286)
Idades: 17 a 62 anos (Média = 24,09; DP: 6,56)
ESTATÍSTICAS
ESCORES DAS SUBESCALAS Tomada de perspectiva (12 itens)
Flexibilidade X Rigidez
(10 itens)
Altruísmo X Egoísmo (9 itens)
Sensibilidade afetiva
(9 itens) Média 40,45 31,10 23,64 34,19
Desvio Padrão 7,95 6,62 6,45 5,06 5 12-27 10-20 9-13 9-26
P 10 28-31 21-22 14-16 27-28 E 20 32-34 23-25 17-18 29-30 R 30 35-36 26-27 19-20 31-32 C 40 37-38 28-30 21 33 E 50 39-40 31 22-23 34 N 60 41-43 32-33 24-25 35-36 T 70 44-45 34-35 26 37 I 80 46-47 36-37 27-29 38-39 S 90 48-51 38-40 30-32 40
91
99 52-60 41-45 33-45 41-45
AMOSTRA FEMININA (N = 426)
Idades: 17 a 51 anos (Média = 22,41; DP: 4,95)
ESTATÍSTICAS
ESCORES DAS SUBESCALAS Tomada de perspectiva (12 itens)
Flexibilidade X Rigidez
(10 itens)
Altruísmo X Egoísmo (9 itens)
Sensibilidade afetiva
(9 itens) Média 41,21 31,06 21,65 35,40
Desvio Padrão 6,92 6,26 5,46 4,64 5 12-29 10-21 9-13 9-27
P 10 30-32 22 14-15 28-29 E 20 33-35 23-26 16-17 30-31 R 30 36-37 27-28 18-19 32-33 C 40 38-40 29 20 34 E 50 41-42 30-31 21-22 35 N 60 43 32-33 23 36 T 70 44-45 34 24 37-38 I 80 46-47 35-36 25-26 39 S 90 48-50 37-39 27-29 40-42 99 51-60 40-50 30-45 43-45
92
ANEXO C
Tabela ANOVA para os Fatores da Empatia na amostra estudada
Tomada de Perspectiva
Flexibilidade Interpessoal
Altruísmo
Sensibilidade Afetiva
Sum of Squares
df Mean Square F P-valor
Between Groups 421,2345477 3 140,4115159 3,812973 0,014 Within Groups 2614,552119 71 36,82467773
Total 3035,786667 74
Sum of Squares
df Mean Square F P-valor
Between Groups 137,1827911 3 45,72759702 1,451239 0,235 Within Groups 2237,163876 71 31,50935036
Total 2374,346667 74
Sum of Squares
df Mean Square F P-valor
Between Groups 166,1410526 2 83,07052632 2,519191 0,088 Within Groups 2374,205614 72 32,97507797
Total 2540,346667 74
Sum of Squares
df Mean Square F P-valor
Between Groups 28,75021189 3 9,583403964 0,543886 0,654 Within Groups 1251,036455 71 17,62023176
Total 1279,786667 74
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