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Autora: Fátima Irene Pinto

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Page 1: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Autora: Fátima Irene Pinto

Page 2: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de

vida.

Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre e nunca levei a sério todos os

seus veementes apelos para ressurgir e

manifestar-se.

Page 3: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Ocorre que ultimamente ando esbarrando nela a todo instante, do

jeitinho que a deixei há quarenta e tantos

anos atrás: extremamente tímida,

sobressaltada, sem defesas para um mundo que lhe

parecia por demais hostil e complicado.

Page 4: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

De família numerosa, meus

assoberbados pais não tinham

tempo para entender a minha interna tragédia, tampouco para resgatarem-me

dos dramas que a minha criança

resolveu sozinha e resolveu

completamente errado.

Page 5: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Incorporei todos os

rótulos que me deram nas

minhas primeiras

tentativas de convivência

entre os humanos:

desajeitada, limitada,

mela-festa, esquisita.

Page 6: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Então a minha criança entendeu

que para merecer fazer parte da vida e

receber um mínimo de carinho e

aceitação, era preciso fazer

coisas heróicas e grandiosas. Em cima desta idéia

pautei toda a minha existência.

Page 7: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Tenho que dar um salto aqui - não

interessa narrar os meus grandiosos e

heróicos feitos - mas é preciso ressaltar sim,

os desumanos sacrifícios

despendidos nesta empreitada e para

onde eles me levaram: depressões profundas e síndrome do pânico cujas seqüelas ainda hoje se fazem sentir.

Page 8: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

As vezes me pergunto porque o "Supremo" não intercedeu por

mim naquela época, mandando-me uma

Angélica criatura para lembrar-me que nada daquilo era preciso e que a despeito das minhas esquisitices,

eu era merecedora de amor respeito e

aceitação?

Page 9: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Esta narrativa fica pela metade, pois só agora

começo a dar-me conta do tamanho e da

gravidade do equívoco. Só agora estou disposta a romper a muralha de

aço entre o meu eu adulto (e mal resolvido)

e aquela criança que não me permiti ser e que agora explode à minha revelia, não

aceitando mais o porão escuro onde a

trancafiei por tantos anos.

Page 10: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Espero que haja tempo para resgatá-la

e deixá-la ser feliz pela primeira vez na vida, sem que nada ela tenha que fazer

de sobre-humano, de heróico ou grandioso,

de notório ou relevante.

Page 11: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Perdoa-me, minha criança!Eu joguei duro

demais com você por

ignorância.Liberto-a

agora!Esteja feliz!

Esteja em paz!

Page 12: Autora: Fátima Irene Pinto A criança que eu não fui aflora agora, após quase meio século de vida. Eu acreditei que pudesse abafá-la para todo o sempre

Respeite meu trabalho, repasse s/ retirar os créditos

Formatação: Gi ManteliE-mail:

[email protected]