aulas sociologia

35
# Sociologia Política AULA 1 (21-09-2010) Datas propostas para exame: 9 NOV, 7 DEZ (Terça-feira). - A modernidade como pano de fundo no estudo da sociologia política e dos fenómenos políticos. 1 . Sistemas políticos e eleições . Burocracia . Elites políticas 1 SARTORI Distinção entre ciência política, sociologia da política e sociologia política.

Upload: luis-cesar

Post on 10-Feb-2016

9 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

sociologia politica

TRANSCRIPT

# Sociologia Política

AULA 1 (21-09-2010) Datas propostas para exame: 9 NOV, 7 DEZ (Terça-feira). - A modernidade como pano de fundo no estudo da sociologia política e dos fenómenos políticos.1 . Sistemas políticos e eleições . Burocracia . Elites políticas

1 SARTORI – Distinção entre ciência política, sociologia da política e sociologia política.

# Sociologia Política

AULA 2 (23-09-2010) Obras aconselhadas2 - Definição da narrativa histórica de uma disciplina. Noção de reconceptualização do objecto de estudo de uma disciplina, consoante as alterações sociais que se verificam. - Todas as narrativas históricas da Ciência Política tiveram um começo comum: o estudo das instituições do Estado, ou o estudo do Estado. Note-se que a Ciência Política nasce numa época de consenso social. - Primeira escola da Ciência Política nasce em França, em 1871. - Definição de Estado, breve história dos partidos políticos. - Contexto de criação da “Science Politique”: perda da França contra a guerra com a Prússia; o motivo apontado foi a suprema organização administrativa da Prússia em relação à França. - Buscar a racionalidade da acção administrativa: o porquê da Ciência Política surgir como Ciência do Estado. - Pierre Favre fala em factores de ordem geral: . Diferenciação e complexificação da sociedade (que se torna mais difícil de gerir);

. Necessidade de criar instrumentos capazes de compreender as mudanças sociais que ocorriam; . Expansão científica e universitária para suprir essas necessidades (novas ciências, novos núcleos de intelectuais).

- E em factores de ordem específica: . Lenta automização intelectual da Ciência Política; . Desenvolvimento do Estado no séc. XIX; . A invenção da cidadania, a consagração do indivíduo-cidadão. - O triunfo do individualismo; o critério do mérito. A importância da burocracia. - A afirmação da cidadania: dimensão civil, os direitos políticos (o sufrágio universal), os direitos sociais. - O novo conceito de soberania é importante para a afirmação da cidadania no voto. - O acomodar do diverso, o incluir do diferente. - A importância do conflito como catalisador da mudança social e é importante para a vitalidade dos regimes democráticos. Porém, não se deve escorrer para a violência. - (Sumário) Dois factores fundamentais para o surgimento da Ciência Política no séc. XIX: a invenção da cidadania e dos sistemas administrativos e o surgimento e expansão do Estado-nação. - A Ciência Política como Ciência do Estado foi um paradigma unificador e facilitou a criação de uma entidade disciplinar. . Identifica um domínio preciso; . Identifica um objecto que é relevante. - Porém, esse domínio preciso foi apontado como um inconveniente, vendo isso como um domínio fechado, que encerra o político como objecto de estudo separado da sociedade (vácuo societal). . Domínio fechado . Variável independente isolada (Visão fechada)

2Favre: “Naissances de laScience Politique en France, 1870-1914”; Luhman: “A diferenciação da

sociedade”; Thomas Marshall escreveu sobre a cidadania.

# Sociologia Política

- Três reparos da Ciência Política como Ciência do Estado: . Concepção institucionalista e formalista-legalista . Análise descontextualizada . Criava inibições à comparação - Quando surge o Estado já existiam sociedades. Esta concepção encerra o estudo às sociedades altamente organizadas. - A relação entre a esfera política e a esfera social é dialéctica. O político recebe pressões do social, mas também estabelece relações com o social.

# Sociologia Política

AULA 3 (28-09-2010) Obras aconselhadas3 Citações

1) Os fenómenos políticos são os que se realizam com a origem e o funcionamento do Estado. São essencialmente fenómenos jurídicos. (Léon Duguit, 1889)

2) O Estado da política visa a compreensão de todos os problemas relacionados com o poder e com o uso que dele se faz em contextos sociais. (R. Dowse e J. Hughes, 1972)

3) A Ciência Política estuda a formação e a distribuição do poder. (H. Lasswell, 1936) Análise

1) A componente jurídica é acentuada. O seu autor era professor de Direito Constitucional. Remete para a fazer inicial da Ciência Política, muito associada ao Direito Constitucional e à dimensão legal e normativa.

2 e 3) Procuram alargar o estudo da Ciência Política, contextualizando-a através do

estudo dos processos reais. O poder é analisado não apenas como derivado do Estado, mas também do produto social (influência, pressão, etc.). Introduz-se o conceito de poder que, desta feita, não se esgota no Estado. Daí o estudo de todos os processos de influência, afectação e distribuição do poder, incluindo os informais. Política como atributo de várias interacções sociais; procura situar socialmente o uso do objecto político.

- Esta nova concepção enriqueceu a Ciência Política. E surgiu não apenas pela evolução tecnológica e metodológica, mas também pelos novos problemas e questões que se iam levantando. - O principal impulso dado ao estudo do político foi a partir da WWII. A importância institucional dada aos partidos aumentou substancialmente. A sua solidez passou a ser um indicador das caracterizações dos sistemas políticos. A centralidade que os partidos assumiram ficou a dever-se ao facto de eles serem os principais estruturadores da opinião pública e consequentemente, do voto, para além do seu importante papel parlamentar, na apresentação de propostas e de moções. - A seguir à WWII deu-se também uma série de vagas de descolonização, o que deu um novo fôlego à Ciência Política que estudava agora a forma como as sociedades mais atrasadas se poderiam modernizar e, subsequentemente, democratizar. Alguns autores consideravam que o desenvolvimento económico era um requisito para a democratização, outros consideravam que eram os índices de escolaridade/alfabetização elevado, outros ainda que era o bem-estar social. Esta multiplicidade de hipóteses fazia com que houvesse permanentemente a necessidade de as refutar ou corroborar/comprovar/validar e esta necessidade servia de estímulo para um incremento de produção intelectual na Ciência Política. - Nesta nova concepção a Ciência Política passa a definir-se como Ciência do Poder e não do Estado, retirando o político do vácuo sociológico a que estava votado. No entanto, esta

3 Enciclopédia Internacional das Ciências Sociais; Sociologia Política (cap. Gabriel Almond – O sistema político e cap. David Easton – interacção do sistema político com o meio [análise sistémica]); Tipos de dominação (Max Weber) e a “Política como Vocação” (Max Weber); Múltiplas modernidades – Cap. 1 (Eisenstadt).

1º Paradigma

2º Paradigma

# Sociologia Política

concepção pode levar à diluição do objecto de estudo, que passa a ser muito mais ambíguo e não apenas respeitante a esta disciplina. Isto leva a que se questione a especificação da Ciência Política, por isso, esta respondeu advogando que o poder que a singulariza é o poder enquanto autoridade e não no quadro de todas as relações sociais. Mesmo assim, houve um efeito redutor sociológico, porque o Estado e as suas instituições passaram a ser tratados como variáveis dependentes/subprodutos do social, minimizando assim a relevância específica da Ciência Política enquanto disciplina.

- A análise sistémica veio resolver este problema pois veio a acentuar a interacção entre o político e o social, não vendo os fenómenos políticos como derivados do social, mas como simultaneamente objecto e causa de transformações sociais e políticas. Assim foi possível manter sólida a dimensão/domínio político (estruturas estatais), mas tratando-se de um sistema aberto esta dimensão sofria as acções do meio, mas tinha capacidade de retroagir e de se regular criativamente face às exigências que recebia do exterior. Político passava a ser não apenas o Estado e o seu domínio particular, mas também as interacções sociais que afectavam o curso do político.

- (Legitimidade) Para que o poder seja aceite é necessária a socialização política dos indivíduos porque estes vão assimilando o político. Assim, a obediência à ordem imposta passa a fazer-se por dever e não por coerção, embora se saiba que ela está presente. Concepções

1) Político: variável independente e isolada 2) Político: variável dependente do social 3) Político: variável independente e interactuante

- Uma das críticas à análise sistémica foi o descurar do estudo das instituições, por isso, da reacção surgiu o Neo-Institucionalismo que dava uma revalorização à dimensão institucional estadual, sem, no entanto, se descurar o social. Realçava-se tanto as oportunidades como os constrangimentos que as instituições propiciavam ou impunham à sociedade. Os contextos institucionais podiam funcionar como estímulos ou inibidores (ex.: critérios de amissão/recrutamento das elites políticas). As elites, por sua vez, ao ocuparem lugares fulcrais na governação, condicionam o curso social de um país, pelas decisões que tomam. Daí a relevância do seu estudo.

3º Paradigma

4º Paradigma

# Sociologia Política

AULA 4 (30-09-2010) David Easton: - A vida política é um sistema de actividades inter-relacionadas que influenciam o modo como as decisões investidas de autoridade4 são formuladas e aplicadas numa sociedade. Esta ideia está associada à análise sistémica. - O sistema político diz respeito à distribuição de decisões investidas de autoridade numa sociedade. Podemos relacionar os conceitos, do menor para o mais específico: influência, poder, autoridade. - A vida política é um sistema aberto e adaptável. Podemos interpretar a vida política como um conjunto complexo de processos graças aos quais certos inputs são transformados em outputs a que podemos chamar decisões investidas de autoridade, decisões, e acções executórias. - As interacções políticas constituem um sistema de comportamento dentro de uma sociedade, e é evidente que não podemos conceber esse sistema como existindo no vácuo, separado dela: é um sistema aberto. - O modelo de análise em termos de equilíbrio é passível de dificuldades conceptuais e empíricas. Este leva-nos a crer que os membros de um sistema têm apenas uma única finalidade fundamental quando procuram enfrentar alterações e perturbações: reencontrar o equilíbrio anterior ou procurar atingir um novo, prestando-se pouca atenção às vias seguidas pelo sistema para tentar chegar a esse objectivo. Um sistema pode ter perfeitamente outro objectivo para além de atingir este ou aquele ponto de equilíbrio – o desejo de tomar medidas positivas para destruir um equilíbrio anterior ou mesmo atingir um estado de desequilíbrio permanente. Portanto, uma característica primária de todos os sistemas é serem capazes de suscitar uma série de acções positivas, construtivas e inovadores para resistirem ou absorverem todas as forças de transformação. - Uma análise em termos de sistema oferece-nos mais vantagens – podemos definir um conjunto de variáveis, seja qual for o grau de relação existente entre elas. Nos sistemas políticos, o conjunto de interacções através dos quais, numa determinada sociedade, se realiza a atribuição de valores investidos de autoridade, é a principal diferença entre o sistema político e os restantes sistemas sociais. Pode ser considerado sob o aspecto intra-societal (sistemas que não são políticos, mas que fazem parte da sociedade a que pertence o sistema político) e extra-societal (todos os sistemas que existem fora da própria sociedade) – constituem o meio global. É nesse meio que podemos utilizar o conceito de perturbação para designar as forças do meio global que actuam sobre o sistema político alterando-o. - As variáveis essenciais do sistema político são a distribuição os valores por uma determinada sociedade e a sua aceitação pelos membros da sociedade. A importância destas variáveis é que permitem saber quando e como as perturbações que actuam num sistema podem ser fonte de tensão – ultrapassar um determinado limiar crítico). - As fontes possíveis de tensão dizem precisamente respeito aos inputs e outputs. Os inputs, sumariamente, dizem respeito aos pedidos e aos apoios – é através das flutuações dos inputs de pedidos e apoios que podemos aperceber-nos do modo como as influências dos sistemas do meio actuam sobre o sistema político. Os outputs, a acções e decisões das autoridades – as consequências decorrentes do comportamento dos membros do sistema e já não das acções do meio. É importante, também, referir que estes processos são retroactivos: tudo aquilo que atrasa, falseia ou entrava a boa informação das autoridades diminui a sua capacidade de tomar as medidas que acharem necessárias para manterem apoio a um nível suficiente.

4 Diferença entre decisões autoritárias (que tem uma conotação negativa, pois liga-se aos regimes autoritários em Portugal) e decisões investidas de autoridade.

# Sociologia Política

- Portanto, a teoria deve servir para descobrir de que modo um sistema consegue subsistir o tempo necessário para continuar a tomar as suas decisões, e como se comporta face às tensões a que por vezes é submetido. A análise sistemática da vida política assenta na noção de um sistema que emerge num meio e que se encontra por ele sujeito a determinadas influências sob cujo efeito por eventualmente ser atingido um limiar crítico para as suas variáveis essenciais. Gabriel Almond: - Definição de sistema político: sistema de interacções existente em todas as sociedades independentes que desempenhe as funções de integração e adaptação (tanto no interior como em relação a outras sociedades) através do recurso ou da ameaça de recurso a um constrangimento físico mais ou menos legítimo. Sistema político será o sistema legítimo encarregado de manter a ordem na sociedade ou pelo contrário de a transformar. - Se se entende como política um conjunto particular de interacções de uma sociedade com a finalidade de a ligar a outros conjuntos de interacções, sistema atribui-se a essas interacções um determinado conjunto de propriedades: o campo de aplicação (todas as estruturas nos seus aspectos políticos), a interdependência (qualquer alteração num subconjunto de interacções implica alterações em todos os outros subconjuntos) e a existência de limites (existem certos limites onde acabam os outros sistemas e onde começa o sistema político). São as estruturas situadas na fronteira do sistema político que têm maior importância para o funcionamento desse mesmo sistema – essas estruturas elaboram certas exigências, os inputs, mantendo o contacto entre o sistema político e a sociedade. - Analisa quatro propriedades comuns dos sistemas políticos. Importância da ideia de diferenciação estrutural e especialização funcional.

- Em todos os sistemas políticos existe uma estrutura política: . Universalidade da estrutura política – responsável pela tomada de decisões; . Para se poder considerar satisfatória a análise de um sistema político, ela deve localizar e caracterizar todas essas funções e não apenas as que são desempenhadas pela estrutura política especializada; . Se existem funções então também devem certamente existir estruturas, mesmo que estas se encontrem dispersas nos meandros sociais, e só aí possam encontrar-se.

- Em todos os sistemas políticos existem funções políticas: . Universalidade da função política; . A perspectiva funcional é a única que nos permite adquirir uma exacta representação de um processo contínuo; . Conjunto de funções:

1. Inputs: socialização e recrutamento político, expressão de interesses [grupos de interesses], agregação de interesses [partidos políticos], comunicação política [meios de informação colectiva]; 2. Outputs: elaboração da “norma”, execução da “norma”, função judicial.

- A multifuncionalidade das estruturas políticas . A não exclusividade de certa função em certa estrutura política – uma função pode ser partilhada por diferentes estruturas; . O modelo do sistema ocidental acentuou a especificidade funcional da estrutura política, enquanto que o do sistema tradicional acentuava o carácter indiferenciado e difuso da estrutura política e social; . Sem multifuncionalismo não podem existir estruturas políticas em relação recíproca; . Os sistemas políticos modernos caracterizam-se simplesmente pela existência de um grau de diferenciação estrutural bastante elevado, tendendo cada

# Sociologia Política

estrutura a desempenhar um papel regulador dessa função dentro do conjunto do sistema político; . Em variados casos de modernização, é comum encontrarem-se estruturas governamentais e políticas diferenciadas ao lado de estruturas tradicionais e intermitentes; . Nenhum sistema político, por mais moderno que seja, consegue eliminar totalmente a intermitência e a tradição. Pode, no entanto, controlá-lo e traduzir as suas influências particularistas e difusas numa linguagem política moderna – a expressão de interesses.

- Dualismo cultural dos sistemas políticos: . Nos sistemas políticos modernos as estruturas especializadas estão em relação com outras estruturas não especializadas que, apesar de terem sido modificadas pelas primeiras, não foram de maneira nenhuma assimiladas por elas, por exemplo, o moderno partido político de massas organizado burocraticamente não substituiu as sociedades oficiosas de notáveis que existiam antes dele – combinou-se este tipo de estrutura mais primitiva de maneira a formar com ela um sistema misto.

[O moderno é um alvo em constante movimento.] - Tradição é diferente de tradicionalismo – uma sociedade pode ser moderna mantendo a sua tradição. - Tipos de autoridade (dominação) weberiana: - Autoridade tradicional; - Autoridade racional-legal; - Autoridade carismática. - A importância da legitimidade do poder: é uma característica universal a qualquer sistema político. É necessário a qualquer sistema político uma renovação constante das fontes de legitimidade.

# Sociologia Política

AULA 5 (07-10-2010) - A legitimidade

. Não existe uma fonte única de legitimidade, existem vários padrões de dominação legítima/autoridade. . Max Weber define os tipos ideais de dominação – arquétipos da experiência humana; nenhum tipo ideal se aplica, em estado puro, a qualquer realidade histórica. A realidade é complexa, logo, as categorias podem entrelaçar-se entre si e coexistir na realidade. Não devem ser confundidos com generalidades factuais. Explicam a realidade, entrelaçando a experiência histórica a questões do âmbito do facto contingente. Possuem um elevado grau de generalização dos atributos.

(1) Autoridade tradicional (2) Autoridade racional-legal (3) Autoridade carismática

(1) Carácter ordinário. Remete para sociedades não-modernas e tradicionais. (2) Carácter ordinário. A legitimidade está ligada à ordem pessoal de Direito, à legalidade

e à racionalidade. Está ligado ao limite do exercício do poder e um conjunto de regras que pautam a relação entre governantes e governados, que caracterizam as sociedades modernas. A transição da autoridade tradicional para racional-legal pode ser gradual e lenta ou pautada por momentos de erupção (dicotomia consuetudinários/revolucionários, por exemplo). Remete para a evolução das sociedades e a transição entre sociedades não-modernas para modernas.

(3) Carácter extraordinário. Está associada a situações de ruptura e de mudança – o detentor do carisma (com um carácter excepcional) define os limites do seu próprio poder, através de um exacerbado culto da personalidade, pois reconhece-se ao detentor do poder um carácter fora do comum, como que encantamento por parte dos outros. Se o carisma é um atributo personalizado, como se dá a transferência do carisma, quando um indivíduo se finda? Isto confere ao carisma uma vulnerabilidade da autoridade, e remete para o carácter transitório do poder. Porém, poderá essa autoridade transferir-se de forma a perpetuar-se, de forma a legitimar o poder do sucessor? (Ex. Coreia do Norte) Como se institucionaliza a mudança? O carisma pode ser transferido de indivíduo para indivíduo, por rotinização; ao processo de um indivíduo para uma instituição, chamamos carisma do ofício (Ex. Papa/Vaticano). A rotinização pode instituir-se de forma diferente: pode existir transformação entre a autoridade carismática em tradicional ou racional-legal, o que representa uma ruptura com o que está estabelecido.

- A cada forma de autoridade existe um padrão de organização. Existem diferentes padrões para as diferentes formas de autoridade.

(1) Existência de uma administração burocrática (Ex. burocracia patrimonial – sociedades antigas da China e do Egipto). É patrimonial porque não existe uma separação entre a esfera política e a esfera privada, ou entre o funcionário e a administração. O indivíduo obedece a uma tradição, uma devoção ou uma lealdade pessoal, a menor nível que na carismática. Na transição para as sociedades modernas, dá-se a separação entre o funcionário e os meios de administração e entre a esfera pública e a esfera privada.

# Sociologia Política

(2) Existência de uma administração burocrática racional. Grande desenvolvimento do aparelho organizativo, que possibilita o processamento de uma maior informação – característica das sociedades modernas. Está relacionada com o processo de democratização. O indivíduo obedece à ordem legal de Direito, sendo o indivíduo um cidadão. Os indivíduos-cidadãos obedecem à Lei, mas os governados também participam na sua elaboração (as eleições e as regras de representatividade). Os cidadãos possuem direitos e deveres, de forma a manter a ordem pública. - Marx fala na passagem para a modernidade, na esfera económica, que se caracteriza pela separação do produtor dos meios de produção.

- A realidade é um entrelaçado destes ideais-tipo: a permanência de particularismos, como o exemplo do clientelismo, mina e perverte o carácter universalista que deveria pautar as sociedades modernas (a meritocracia, etc.).

(3) As formas de autoridade carismática implicam um movimento de ruptura. Por esse facto excepcional, de carácter transitório, implica um conjunto de seguidores que praticam o culto, a devoção pessoal a uma figura carismática. A regra e a rotina são inimigas da autoridade carismática, e não existem propriamente instituições – a figura carismática é a própria instituição e estabelece as regras e os limites ao seu próprio poder.

Capítulo II do programa - A compreensão da natureza e a dinâmica das sociedades constitui o desafio essencial e o problema fundador das ciências sociais. Neste sentido podemos dizer que estas emergem de uma resposta científica ao advento da modernidade e aos seus desafios. - O mecanismo da mudança das sociedades pode ser pautado por momentos de evolução gradual ou revolucionária. As diferenças desde dois mecanismos são evidentes: na primeira, a procura do consenso social para a mudança pode oferecer mais segurança; a segunda, o momento de ruptura despoleta a mudança que pode ser violenta e turbulenta. - Todos estes mecanismos encerram em si um problema: a incorporação por parte da sociedade da mudança. Pelo senso comum, o processo de mudança gradual pode facilitar esta incorporação da mudança na sociedade; a revolução é um momento de ruptura, de mudança radical, que apesar de poder ser instantânea, pode também ser pautada por avanços e recuos (Ex. Revolução Francesa), o que pode indiciar uma dificuldade na assimilação dessa mudança, ou pelo menos, uma previsibilidade. - Existe uma tendência para uma maior aceleração da mudança na sociedade o advento das tecnologias de informação e comunicação nos dias de hoje pode causar problemas de adaptação para pessoas mais velhas. - Porém, existem casos em que o processo de transformação é bloqueado porque é uma minoria ou elite que a tenta impor.

# Sociologia Política

AULA 6 (12-10-2010) A modernidade como pano de fundo da Sociologia Política. - Utiliza-se o contraponto tradicional-moderno para distinguir esses tipos de realidades. Inevitavelmente, e sendo isto uma construção da realidade, nunca a explica totalmente. - A modernidade pode passar pela ruptura, não da tradição, mas dos elementos de tradicionalismo da sociedade (Ex. A sociedade japonesa). A tradição representa a identidade de uma comunidade política organizada. Por outro lado, entende-se por elementos de tradicionalismo como elementos que permanecem da génese de um Estado (Ex. Fraco nível de desenvolvimento do aparelho burocrático ou elevados índices de clientelismo). - A tradição pode possibilitar o mecanismo despoletador do advento da modernidade. Algumas das vezes, a tradição pode funcionar como atenuante, fazendo com que a modernização não seja tão radical (Ex. Inglaterra consuetudinária, Japão). - Natureza das sociedades modernas.

. Quais são as características da modernidade? (Ex. A sociedade moderna como sociedade industrial, em contraponto ao tradicionalismo de uma sociedade rural). - A tecnologia é um acelerador da História e das transformações da sociedade. Sociedades modernas são sociedades dinâmicas, pois a modernidade é um alvo em constante movimento. - Os processos de transformação e os rápidos ciclos de mudança tornam difícil a governação, dado que a sociedade se complexifica. - Weber define sociedades modernas como sociedades diferenciadas e burocráticas. . Quais são as condições e mecanismos da modernização? (Como e porquê se processa a modernização – condições e circunstâncias da modernidade). - No séc. XIX, a imagem de modernização estava associada ao progresso. Porém, o progresso pode ter vantagens e desvantagens. A industrialização, por exemplo, apesar de trazer crescimento económico, pode ter elevado impacte ambiental. - Várias teorias estabelecem um conjunto de etapas para uma modernização e até, por vezes, as sociedades tendem para a convergência, percorrendo as mesmas etapas (Ex. a teoria da convergência das sociedades industriais). Por outro lado, podem existir sociedades divergentes, que percorreram etapas para a modernização completamente distintas (Ex. teorias das múltiplas modernidades). Na verdade, não existe um, mas vários paradigmas da modernidade; existem várias trajectórias da modernidade. Mesmo sendo o ponto de partida diferente, se se adoptam medidas comuns, tem um efeito de homogeneização, o que não impede que existam resultados distintos – a modernidade também pode ter caminhos diferentes (Ex. A modernização pode levar a caminhos de democracia ou pode também levar a regimes autoritários).

- Avaliação dos efeitos da modernidade e da modernização. . A modernidade tem benefícios e custos para a sociedade.

. Durante algum tempo, julgou-se que o sentido da modernidade era irreversível, admitindo-se somente alguns avanços e recuos. Alguns autores demonstram colapsos da modernização, hierarquizando variáveis explicativas (Ex. Responsabilidade clara das elites de decisão política, impactando na modernidade negativamente). . A ideia do fim da história e a ideia do choque de civilizações são consequências da globalização. A globalização já é vista como pós-modernidade por uns, ou como modernidade radical (uma experiência de modernização levada ao limite) para outros. Para estes últimos, uma das características da modernização é a sua expansão, e à medida que essa expansão se verifica, a globalização foi ocorrendo e isso constitui uma experiência extrema da modernidade (Ex. Meios de comunicação, bens essenciais).

# Sociologia Política

- Características gerais da modernidade. (1) Ideia de diferenciação – diferenciação estrutural e especialização funcional (Ver Gabriel Almond). Esta ideia vai dar origem à complexificação das sociedades (alguns autores dizem que a complexificação das estruturas pode favorecer a democratização). (2) Racionalidade – a importância dos conhecimentos científicos e do pensamento racional nos mapas cognitivos da sociedade. Este conceito está ligado à despersonalização (todos os eventos personalizados têm tendência a uma emotivização; alguns autores separam o emotivo - o coração, do racional - o cérebro). Procura de leis explicativas; impossibilidade de cartografar o futuro, pela imprevisibilidade dos fenómenos sociais; possibilidade de fazer tendências para o futuro (Ex. Demografia). (3) Ideia de expansão – as sociedades têm forte propensão para a sua difusão e expansão. Intercâmbios intercivilizacionais e intersocietais: sociedades mais modernas servem como modelo para sociedades menos modernizadas. (4) Individualismo – consagração, no plano político, do indivíduo-cidadão. Desvinculação dos indivíduos a grupos rígidos e quase adescritivos (Ex. Classe social, a tribo).

# Sociologia Política

AULA 7 (14-10-2010) - Apresentações: . Eisenstadt – caps. I e IV . DieterNohlan – caps. II e V - A invenção da cidadania representa, na esfera política, o triunfo do individualismo. Mais ainda, a massificação da vida política, com um elevado impacto e variado leque de consequências. - A democratização das sociedades veio facilitar o aumento da massa de cidadãos eleitores que podem ser eleitos. A invenção da cidadania está efectivada quando se dá a universalização do voto e do sufrágio. - A universalização do voto e do sufrágio é um elemento significativo da massificação da vida política (masspolitics). O aumento da quantidade de votantes vai induzir mudanças no plano qualitativo: torna-se imperativo a criação de novos instrumentos que permitam articular e mobilizar essas novas massas sociais, aumentando a efectividade do Estado (Ex. A burocratização dos partidos políticos; a democratização da vida política, como engloba mais franjas da população, inevitavelmente, será mais heterogénea, logo, poder-se-ão criar novos partidos políticos para esses novos conjuntos de interesses). - Com a masspolitics, existe uma maior capacidade de controlo dos governantes sobre os governados. - A racionalidade das sociedades modernas trouxe uma centralização dos recursos dos meios de comando e de tomada de decisão, já que tinham de passar a conhecer melhor a realidade e a sociedade, de forma a tomar decisões que vão de encontro com essa heterogeneidade das sociedades e da própria realidade em si – instrumentos cognitivos da sociedade e do território. Esta racionalidade passa também pela noção da soberania e a alteração dos fundamentos da legitimidade do poder – a criação de instituições representativas (com o advento das Revoluções Liberais): impõe uma alteração dos símbolos de identidade nacional e também dos aparelhos estatais, como das elites governativas, que se transformaram económica e socialmente. - Paradigma clássico dos estudos da modernidade: pressupostos que influenciaram a literatura da sociedade moderna e da modernização e que depois foram alvo de uma leitura crítica.

- Dicotomia entre tradição e modernidade [esquemas analíticos dicotómicos (1)]: as características da sociedade moderna são opostas às da sociedade tradicional, logo, para a sociedade se modernizar, tem que romper com essas características tradicionais (Ex. Urbano-rural, estático-dinâmico, religião-laicização). A ideia de secularização está notoriamente ligada com este paradigma. [Crítica]: Mais do que antagónicas, as características dicotómicas são dialéticas; podem existir realidades entrelaçadas e elementos da tradição podem coexistir com uma sociedade moderna – diferença entre tradição e tradicionalismo: existem elementos da tradição que fazem parte da própria cultura de uma sociedade. Na realidade, processos de modernização exigiram uma ruptura revolucionária com o tradicionalismo. - Evolucionismo – a modernidade representa o fim último para a qual caminham as sociedades actuais, logo, pode estabelecer-se uma sequência padronizada de etapas para a modernidade. Existe, de facto, a ideia de que as sociedades caminham com uma determinada finalidade. Marx: As sociedades mais atrasadas vêm nas costas das sociedades mais desenvolvidas a imagem do seu futuro. [Crítica]: Não se pode prever com exactidão como será uma sociedade no futuro. No entanto, podem estabelecer-se modelos possíveis da modernidade.

# Sociologia Política

As trajectórias das sociedades não são unilineares e muitas vezes sociedades mais atrasadas queimam etapas. Contudo, a importação acrítica de modelos exteriores pode ser catastrófica socialmente. Por outro lado, a selecção crítica de modelos exteriores pode ter resultados positivos. Esta concepção está ligada com a ideia de irreversibilidade: pela experiência histórica, existiram colapsos de modernização. - Concepção etnocêntrica – modelo que é referência única da modernidade; construção de um único modelo de modernidade ocidental. [Crítica]: Existem outros modelos de modernização – os choques civilizacionais entre vários tipos de civilização moderna. - Primado do económico como agente dissolvente da tradicionalidade – o capitalismo seria o agente despoletador da modernidade, mas nas sociedades socialistas, a economia fez disparar a modernização. O mecanismo despoletador não é, portanto, único. A modernização também pode ter agentes de descolagem sem serem económicos (Ex. Substituição de elites políticas). - Ideia de sincronismo da modernização – a ideia de que mudança faz-se da mesma forma nas várias esferas da sociedade é demasiado perfeita. Na realidade, podem existir dinâmicas de conflito que resultam de assimetrias dos eventos de modernidade nas várias esferas sociais. Podem causar-se tensões que podem degenerar em conflito. - Prevalência dos impulsos endógenos e não de impulsos exógenos – a modernidade, seguramente, terá que ter um estímulo interno que possibilite o evento da modernidade. Porém, também podem existir estímulos externos (sociedades que procuraram fixar estímulos externos para a sua modernidade). Enquadramentos geopolíticos podem ser influências na modernidade (Ex. Sistema político que procure integrar o ambiente doméstico e o sistema internacional). - Romantização do progresso e idealização do futuro (especialmente presente nos pais fundadores das teorias da modernidade) – ideia de que a modernização é principalmente benéfica para as sociedades; a modernidade ser encarada como um aumento de bem-estar e generalização das condições de existência das comunidades. São, principalmente, ideais positivos. [Crítica]: A modernidade tem experiências negativas da sociedade: a violência das guerras mundiais ou as agressões ao ambiente são um bom exemplo. Urge fazer uma avaliação objectiva daquilo que constitui o processo de modernização.

- Talcott Parsons: Polaridades essenciais/Variáveis-padrão (1)

Sociedade Tradicional Sociedade Moderna

Status adescritivo Status por mérito

Papéis difusos Papéis específicos

Valores particularistas Valores universalistas

Orientação colectiva Orientação individualista

Afectividade Neutralidade afectiva

a) Aquilo que nós herdamos é independente da vontade do indivíduo (sociedade

tradicional – status adescritivo); indivíduos adquirem um estatuto por força do seu mérito (sociedade moderna – status por mérito), que possibilita que todos os indivíduos tenham acesso às mesmas oportunidades. Ponto de vista racional e eficaz (Ex. Burocracia – regime de recrutamento concursal por mérito).

# Sociologia Política

b) As sociedades modernas têm tendência para um maior grau de diferenciação estrutural e especialização funcional.

c) Nas sociedades modernas, existe uma tendência para a universalização dos valores (Ex. Sufrágio universal, funcionamento burocrático no tratamento igualitário); nas sociedades tradicionais, existe uma permanência dos valores particularistas (Ex. A não separação da esfera pública e privada).

d) A afirmação do indivíduo no plano político nas sociedades modernas (os representantes representam individualmente a nação – mandato imperativo).

e) Relacionado com a ideia de racionalidade e universalidade, juntamente com o império da Lei, está intimamente ligado à neutralidade afectiva.

# Sociologia Política

AULA 8 (19-10-2010) Algumas crises ou desafios cruciais que os regimes políticos podem atravessar no seu processo de modernização. - A teoria da convergência das sociedades industriais defende que o processo de industrialização aproxima as sociedades, na medida em que enfrentam problemas comuns, o que apela à sua concertação para encontrarem, também, uma resolução comum. - Existe, portanto, face à eminência de uma mesma crise, que os regimes se aproximem para resolvê-la conjuntamente. Contudo, as sociedades permanecem diferentes. - Os desafios podem ser entrelaçados, tornando a realidade mais complexa, mas podem definir-se cinco desafios fundamentais para as sociedades: (1) Legitimidade; (2) Identidade; (3) Integração; (4) Participação; (5) Distribuição.

(1) Qualquer sistema político, quando se moderniza, mais gradualmente ou abruptamente, tende a substituir os seus símbolos e premissas centrais. Um elemento fundamental é a construção da confiança entre governantes e governados em busca do consenso – um contrato, um pacto; uma acomodação das diferenças através da participação colectiva, do debate, da discussão. A legitimidade tem de ser renovada por um processo de socialização permanente. A eficácia das instituições também é um elemento fundamental para renovar a legitimidade dos regimes políticos.

(2) Necessidade do sistema político, quando se moderniza, de criar sentimentos de lealdade e pertença a uma mesma comunidade política unificada e mais vasta. Este é um desafio mais difícil em sociedades mãos heterogéneas e segmentadas – seja a classe social, a cultura ou o território. Existem instrumentos para fomentar esses sentimentos de pertença, por exemplo, a utilização da cartografia, para as pessoas saberem e reconhecerem o formato do deu território; as eleições são um instrumento importante para gerar sentimentos de pertença e lealdade. Os indivíduos hierarquizam esses elementos de pertença, mas por vezes existem tensões – a UE, por exemplo, tem tido dificuldade em gerar um novo sentido de pertença para a comunidade europeia.

(3) Integração, ou penetração, diz respeito ao pleno exercício da autoridade territorial do Estado, seja coercivo ou por estímulos sociais. O Estado vai enfrentar um desafio ao enfrentar poderes de facto que permanecem na periferia. As relações centro-periferia são fundamentais para entender a integração dos diversos regimes políticos: por vezes, o Estado penetrou na periferia por imposição coerciva (Ex. A obrigatoriedade de uma língua) ou por negociação (Ex. Um regime federal).

(4) Existência de uma pressão para uma crescente participação cívica dos cidadãos, sendo a universalização dos sufrágios uma condição necessária. Esta representa uma massificação da vida política. No contexto das sociedades modernas, o protesto ganha uma nova acuidade porque a sociedade participa cada vez mais na vida política. Com o incremento de interesses e de direitos incrementa também o conflito entre diversos lados da sociedade. As sociedades modernas, na sua modernização, passam por transpor o conflito para fora da esfera política, canalizando-o para a arena judicial, o que se traduz, muitas vezes, no aumento de tensão do sistema judicial, pelo aumento dos processos litigiosos.

# Sociologia Política

(5) Só assumiu maior relevância numa fase avançada do processo de modernização. Tem a ver com a distribuição dos recursos criados na sociedade. Sociedades que se modernizaram têm a capacidade de criar mais e melhores recursos e de transformar recursos socioeconómicos em bem-estar e conforto. Com o advento da modernização, os regimes políticos procuraram auscultar as populações cada vez mais vastas, de quais são as suas ambições e desejos sociais – daí se desenvolvendo o Estado social. Marshall distingue três tipos de direitos: os civis, os políticos e os sociais; com estes garantidos, existe cidadania plena.

- Estes problemas são respondidos de maneiras diversas, ou de políticas comuns, e esse facto tem feito aproximar as diferentes sociedades modernas. Contudo, nem todas são iguais, o que apoia a teoria das múltiplas modernidades. - Consenso e conflito nas sociedades modernas. Duas formas de conceptualização:

(1) Concepção monista do conflito – está na génese das teorias autoritárias; o conflito é uma disfuncionalidade, uma patologia da sociedade, logo, o conflito deve ser erradicado. Em termos de políticas, traduz-se na recusa de uma cultura adversária, reprimindo tudo o que não se adeqúe à ordem estabelecida pelo regime. (2) Concepções pluralistas – necessidade e legitimidade do conflito; as sociedades funcionam na base do consenso e do conflito. Possibilidade de cooperação entre as partes do regime político; o conflito também é saudável, pois é uma fonte de inovação e de criatividade. A discussão de opiniões vai de encontro com o ideário democrático. Porém, nem todas as formas de conflito são positivas: o conflito saudável é aquele que cabe dentro dos limites estabelecidos pelas normas, logo, evitar-se-á que o choque de opiniões desemboque na violência. Contudo, os episódios de confronto violento podem ser positivos, na medida em que seja a única maneira possível de fazer correr o processo de modernização (Ex. O 25 de Abril marcou a passagem de um regime autoritário a democrático: a mudança foi por via das armas, logo violenta, mas sem derramamento de sangue). - A acomodação da diferença como factor de regulação do conflito. - Os mecanismos federais obedecem aos mesmos princípios de participação igualitários no processo decisório – a representação proporcional.

# Sociologia Política

AULA 9 (21-09-2010) Apresentação dos Capítulos I e IV de EisenstadtMúltiplas Modernidades. Capítulo I Conceito: A ideia de modernidades múltiplas pressupõe que a melhor forma de compreender o mundo contemporâneo é concebe-lo como história de constituição e reconstituição contínua de uma multiplicidade de programas culturais. A noção de “modernidades múltiplas” começa primeiro por contrariar a visão das teorias “clássicas” da modernização e da convergência das sociedades industriais e contraria as próprias análises clássicas de Marx, Durkheim e mesmo as de Weber. Todas elas assumiam que o programa cultural da modernidade, tal como se desenvolveu na Europa, e as constelações institucionais básicas que ai apareceram, acabariam por dominar todas as sociedades modernas e em modernização; com a expansão da modernidade, viriam a prevalecer por todo o mundo. A realidade que emergiu na sequência do chamado começo da modernidade, depois da 2ª Guerra Mundial, não suportou estas assunções. Os desenvolvimentos concretos nas sociedades em modernização refutaram as assunções homogeneizadoras e hegemónicas deste programa ocidental de modernidade. A par de uma tendência generalizada que se desenvolveu na maior parte destas sociedades, no sentido da diferenciação estrutural entre diversas instituições, as formas através das quais estas arenas se foram definindo e organizando variaram dando origem a múltiplos padrões institucionais e ideológicos. Todos eles eram distintamente modernos, apesar de largamente influenciados por premissas culturais, tradições e experiências históricas específicas. Todos eles desenvolveram dinâmicas modernas e modos de interpretação distintos, para os quais o projecto original do Ocidente se constituiu como referência crucial. - Sombart:“Porque não há socialismo nos Estados Unidos?” (Diversidade das sociedades modernas mesmo entre sociedades bastante similares.) Apesar disto, a noção de “modernidades múltiplas” implica igualmente que modernidade e ocidentalização não são idênticas; o padrão, ou padrões, ocidentais de modernidade não constituem as únicas modernidades “autênticas”, mesmo se foram historicamente precedentes e se continuaram a ser uma referência central para outras visões da modernidade. Ao admitir-se uma multiplicidade de modernidades em contínua evolução, somos confrontados com o problema de saber o que se constitui como centro comum da modernidade. Este problema é não só aumentado como é também transformado pela desconstrução ou de composição contemporânea de muitos dos componentes dos modelos “clássicos” da nação e dos estados revolucionários, em particular como consequência da globalização. O discurso contemporâneo levantou a possibilidade de o projecto moderno, pelo menos nos termos da sua formulação clássica, se ter esgotado. Uma visão contemporânea defende que esse esgotamento é manifesto “no fim da história” (Fukuyama, 1992). A outra visão mais difundida é a noção de Huntington (1996) de “choque de civilizações”, em que a civilização ocidental — a síntese aparente da modernidade — é confrontada por um mundo em que civilizações tradicionais, fundamentalistas, anti-modernas e anti-ocidentais são predominantes, algumas delas vendo o ocidente com animosidade ou desdém (de forma mais evidente, os agrupamentos islâmicos e os chamados confucionistas). Com o cada vez mais alargado reconhecimento da variabilidade das sociedades modernas e contemporâneas e a tentativa de se tentar compreender a natureza desta nova era, desenvolveram-se duas avaliações que reflectiam com fidelidade as contradições inerentes da modernidade:

# Sociologia Política

- Uma via a modernidade como uma força positiva, libertadora e progressista, representava a encarnação da promessa de um mundo melhor. (No após-Segunda Guerra Mundial – prevalece uma visão renovada e optimista.) - A outra adoptava um olhar negativo sobre a modernidade, vendo-a como uma força moralmente destrutiva e salientando os efeitos prejudiciais de algumas das suas características fundamentais. (Holocausto – Tornou-se um símbolo das suas potencialidades destrutivas e negativas.) A consciência das potencialidades destrutivas e negativas da modernidade foi reforçada ainda com a admissão de que os processos de modernização e a permanente expansão da modernidade a nível mundial não eram necessariamente benignos nem tão-pouco pacíficos. Além disto não asseguravam o progresso contínuo da razão e, além disso, as promessas e pretensões da modernidade nem sempre eram cumpridas. (Visão optimista da modernidade vê as guerras, os genocídios e a repressão como correndo contra a essência do seu programa, e muitas vezes como sobrevivências de atitudes pré-modernas.) Como o autor indica a interpretação da modernidade e do desenvolvimento das sociedades modernas e do panorama contemporâneo em termos de múltiplas modernidades está relacionado com estas diferentes abordagens e avaliações de modernidade. Esta ideia implica que a modernidade deve ser vista como um tipo novo e distinto de civilização, sendo o cerne da modernidade a cristalização e desenvolvimento de um modo, ou modos, de interpretação do mundo. Para entendermos os componentes das dimensões estruturais da modernidade e as suas dimensões culturais surge a necessidade de olhar além de uma diferenciação estrutural e desenvolvimento de arenas institucionais autónomas (Que aos olhos das teorias clássicas da modernização, foi visto como o aspecto institucional mais importante da modernidade. Ex. Advento do Capitalismo). Desta forma o autor sugere que: - Em primeiro lugar, encontrar diferenças na extensão da diferenciação estrutural entre sociedades modernas e sociedades em modernização. - Em segundo lugar, a medida em que as diversas arenas institucionais vieram definir-se e estruturar-se como autónomas variou de sociedade para sociedade. - Por fim, a forma como as diferentes estruturas se constituíram e definiram os conflitos decorrentes daqueles processos. Contra as teorias lineares da modernização como expansão uniformizadora e hegemónica de um padrão civilizacional «ocidental», o autor sustenta assim que «as várias arenas institucionais autónomas modernas — económica, política, educativa e familiar — se regulam e interagem de modos diferentes em diferentes sociedades, em função dos seus períodos históricos» Em resultado das diversas combinações destes elementos e das tensões criadas pelas diferentes formas de os concretizar, numa civilização em forte expansão e erodindo, mas não simplesmente aniquilando, as premissas institucionais e simbólicas das sociedades que nela se incorporaram «surgiu uma grande variedade de sociedades modernas ou em processo de modernização, tendo muitas características comuns, mas evidenciando também grandes diferenças entre si» (p. 37), cujos «programas culturais e institucionais *…+ implicam diferentes interpretações e reformulações profundas do programa inicial da modernidade, suas concepções e premissas básicas» O programa cultural e político da modernidade, como começou por ser desenvolvido na Europa ocidental e central, implicava premissas ideológicas e institucionais distintas. As premissas em que assentava a ordem social, ontológica e política, e a legitimação dessa mesma ordem, já não eram dadas como garantidas. Desenvolveu-se assim uma intensa reflexividade em torno das premissas ontológicas básicas das estruturas da sociedade da autoridade social e política. Concepção weberiana da modernidade:

# Sociologia Política

… o limiar da modernidade pode ser marcado precisamente no momento em que a legitimidade incontestada de uma ordem social divinamente pré-ordenada entra no seu declínio… Duas componentes centrais do projecto de modernidade: - Entre os modernos, ou entre os que se tornavam “modernizados”, a consciência da existência de uma grande variedade de papéis para lá dos papéis estreitos, determinados, locais e familiares; - A possibilidade de pertença a comunidades translocais alargadas, sujeitas a possíveis mudanças. - Manifestações da modernidade na esfera política: - Dinâmica da racionalização: Dos princípios de legitimidade (agora ancorados nas capacidades do Homem e não numa legitimidade transcendental). Da centralização administrativa e política (concentração dos meios de administração e poder político, o que vai levar ao desaparecimento de certos poderes regionais) -» aumento do funcionalismo. - Crescente especialização funcional (administrativa e de governação) – burocratização (aparecimento de novas instituições: partidos políticos, sindicatos, etc., típicos das sociedades modernas). - Cidadania: erupção das massas na esfera política (Triunfo das “masspolitics”) – implicou um princípio de responsabilidade dos governantes em relação aos governados. No centro deste programa cultural encontrava-se a autonomia do homem: a emancipação do homem ou da mulher, da corrente da autoridade política e cultural tradicionais. Neste processo de contínua expansão do domínio da liberdade e da actividade pessoal e institucional, essa autonomia começou por implicar a reflexividade e a exploração. Depois, implicou também a construção activa e o domínio da natureza, incluindo a natureza humana. Este projecto de modernidade colocava uma ênfase muito forte na participação autónoma dos membros da sociedade na constituição da ordem social e política. Da conjugação destas diferentes concepções surgiu uma crença na possibilidade de a sociedade poder ser constituída activamente por meio da actividade humana consciente. O crescente reconhecimento da legitimidade de múltiplos objectivos e interesses, individuais e colectivos, permitindo, como consequência, múltiplas interpretações do bem comum é uma das tendências. O programa moderno implicava igualmente uma transformação radical das concepções e das premissas da ordem política, da constituição da arena política e das características do processo político. O rompimento com todas as legitimações tradicionais da ordem política era central na ideia de modernidade, o que implicava a abertura a diferentes possibilidades de construção da nova ordem. Estas possibilidades combinavam temas de rebelião, protesto, permitindo a formação de novos centros e a construção de novas instituições, dando origem a movimentos de protesto que se transformaram em componente permanente do processo político. Temas e símbolos de protesto: Igualdade e liberdade, justiça e autonomia, solidariedade e identidade. A modernidade implicou também um modo distinto de construção das fronteiras das colectividades e das identidades colectivas. Desenvolveram-se novas definições concretas dos componentes básicos das identidades colectivas – civis, primordiais e universalistas, transcendentais ou “sagradas”. Desenvolveram-se fortes tendências que procuravam enquadrar estas definições em termos absolutos; desenharam-se ligações entre a construção das fronteiras da esfera política e as das colectividades culturais. Tornou-se assim inevitável que se enfatizasse a importância das fronteiras territoriais dessas colectividades, criando tensões contínuas entre os componentes territoriais e/ou particulares e outros mais alargados, mais universalistas. Antinomias:

# Sociologia Política

À medida que a civilização da modernidade se foi desenvolvendo, primeiro no ocidente, foi devastada por antinomias e contradições internas, dando origem a um contínuo discurso crítico e a contestações políticas. - As antinomias básicas da modernidade constituíram uma transformação radical em relação às que eram características das civilizações da era axial. Centradas em questões desconhecidas nessa época anterior, revelavam desta forma consciência sobre um amplo leque de visões e interpretações transcendentais. No programa moderno, estas foram transformadas em conflitos ideológicos entre avaliações concorrentes das principais dimensões da experiência humana (especialmente a razão e as emoções e o seu lugar respectivo na vida e na sociedade humanas). Não existiam afirmações acerca da necessidade de construção activa da sociedade; o controlo e a autonomia, a disciplina e a liberdade tornaram-se assuntos polémicos. - A clivagem mais crítica, em termos tanto ideológicos como políticos, talvez tenha sido a que se parava visões universalistas e particularistas — entre uma visão que aceitava a existência de diferentes valores e racionalidades e uma visão que via diferentes valores e, acima de tudo, a racionalidade, de um modo totalizante. Esta tensão desenvolveu-se, antes de mais, a respeito do próprio conceito de razão e do seu lugar na constituição da sociedade humana. Como Stephen Toulmin (1990) mostrou, de uma forma algo exagerada, na diferença entre as concepções mais particularistas de Montaigne ou de Erasmus, por oposição à visão totalizante promulgada por Descartes. O movimento mais significativo, que procurou universalizar diferentes racionalidades — muitas vezes identificado como a principal mensagem do iluminismo — foi o da soberania da razão, que subsumia a racionalidade orientada para valores (Wertrationalität), ou a racionalidade substantiva, à racionalidade instrumental (Zweckrationalität), transformando-a numa visão utópica de cariz moralista e totalizante. Conclusão Em suma, o mundo contemporâneo e a própria história da modernidade são mais bem entendidos, não como um «fim da história», uma completação e superação do projecto moderno, nem como um «choque de civilizações» em que a civilização moderna se veria confrontada com uma reacção de civilizações pré-modernas, mas antes «enquanto história da permanente formação, constituição, reconstituição e desenvolvimento de modernidades múltiplas, fluidas e muitas vezes contestadas ou conflituosas», com diversos programas políticos e culturais cujas tensões e antinomias «implicaram o correlativo desenvolvimento, nas sociedades modernas, de forças bastante destrutivas».

Capítulo IV I

O autor fala do problema da convergência das sociedades modernas com base numa análise comparativa dos movimentos de protesto, com particular incidência no protesto de classe em várias sociedades modernas. A história da política moderna pode ser vista como a história da incorporação dos símbolos e reivindicações dos movimentos de protesto – nuns casos essa transformação foi pacífica, e noutros, implicou confrontos violentos.

Para examinar essas transformações e explicar essa variação, o autor examinou o grau das premissas culturais e a experiência histórica de diferentes sociedades, revelando os aspectos centrais da estrutura e dinâmica institucionais.

O autor parte da análise na questão levantada por Sombart (e mais tarde por Lipset): Porque não há socialismo nos Estados Unidos? Os movimentos socialistas e a luta de classes, na Europa, terão constituído uma importante luta contra o capitalismo (as teorias de Marx).

# Sociologia Política

Foi na Europa, o berço do capitalismo-industrialismo, que eclodiram os primeiros movimentos socialistas fortes, e Sombart argumenta que são características estruturais e organizacionais que distinguem os EUA da Europa. Os EUA são um país de imigrantes que receberam quase imediatamente o voto e um país de fronteiras abertas; também de igualdade entre imigrantes. Todavia, estas explicações, por si só, são bastante inadequadas: por exemplo, a Austrália e a Argentina no séc. XIX foram países que desenvolveram movimentos trabalhistas ou socialistas, apesar das similaridades estruturais com os EUA. Outro exemplo, o Japão de 1930, que desenvolveu um grande complexo industrial capitalista; aí surgiram movimentos e partido socialista, mas nunca alcançaram o predomínio que este teve na Europa. II O autor começa esta análise nas características específicas dos movimentos socialistas, tal como se desenvolveram na Europa. Verificou que a maior parte dos movimentos socialistas aliava a preocupação com causas de conflitualidade industrial – salários e condições de trabalho, por exemplo – com um forte elemento de protesto, articulado com a ideia de luta de classes – uma forma bastante específica de orientação e concepção política, ou seja, uma forte consciência de classe e um amplo movimento de transformação do centro. No entanto, somente na Europa é que os movimentos socialistas (e comunistas) conseguiram proeminência política e alcançar o poder, normalmente de forma constitucional. Então, como é que se pode explicar o facto do socialismo enquanto movimento político, ter surgido em sociedades capitalistas fortemente desenvolvidas, sobretudo na Europa, mas não nos EUA e no Japão? Como explicar as diferenças intra-europeias? O protesto e a rebelião têm sido temas centrais no repertório socialista, no entanto este tendeu também para formação de centros e para a construção institucional concreta, conferindo-lhe um travo especialmente moderno. Com efeito, existiu, por parte dos movimentos socialistas, uma tentativa de reconstruir o centro com base numa visão que transcendia a realidade presente, de acordo com critérios de justiça e igualdade, com uma orientação universalista muito forte. III

O “simbolismo de classe”, histórico na Europa devido à milenar luta de classes, tal como identificada por Karl Marx, pode ser facilmente imiscuído com as premissas históricas e culturais tradicionais da Europa, na medida em que possuem características muito similares. Estas baseiam-se no enfoque, ou na preponderância, da definição dos critérios de status de um modo amplo e diversificado, combinando a proximidade de indivíduos aos tais “atributos culturais” (códigos) e sociais; à procura do individuo do seu lugar orgânico na sociedade, e no modo como acede à riqueza e ao poder.

Os grupos participam no centro da vida social enquanto identidades colectivas, daí a importância da consciência de classe. Estas classes, ao entrarem em colisão, criam tensões entre hierarquias e igualdade. Este fenómeno decorre essencialmente nas classes mais elevadas (elites), tendo em conta o alvorar e desenvolvimento da modernidade, que se pode identificar em certas características seguidamente enunciadas: a velocidade, a competição constante, procurando obter lugares de destaque; a multiplicidade e autonomia das classes, procurando adquirir identidades colectivas; a ambição de mais proeminente influência no processo decisório, assim como reconstrução do centro à sua imagem.

IV Verificaram-se, no entanto, apesar dos elementos acima enunciados, algumas discrepâncias verificáveis em termos de distribuição geográfica, mesmo no seio da Europa.

# Sociologia Política

Existem dissemelhanças no modo como foram construídos, em primeira instância, e depois incorporados, os movimentos de protesto. O caso escandinavo. Um caso especial, pois alia de forma única uma consciência política de classe muito forte com um sólido compromisso para com o centro e para com a comunidade política democrática. Formaram-se partidos fortes, partindo de uma também forte consciência de classe, alicerçada na experiencia histórica nórdica – como a unidade nacional, a ausência de clivagens religiosas e a despolitização do clero – combinada com um forte sentido reivindicativo, porém sempre balizado pela aceitação doa axiomas da democracia constitucional, crendo na legitimidade da mesma. PIGS apresentam fortes contrastes com o Norte, começando pelo tipo de relação clientelistanestes verificado, contrastando com a coesão familiar e regional dos nórdicos. O simbolismo revolucionário é exacerbado, degenerando em tendências sectárias, desconfianças e baixos níveis de solidariedade. Verifica-se preponderância dos intelectuais, contudo com fraca ligação à classe operaria. LuisRoniger identifica:

a) Falta de incentivo das elites à participação politica b) Resistência à incorporação das reivindicações sociais da base c) Negação/incapacidade de institucionalizar o conflito d) Conflito não influencia o centro

As elites no sul são caracterizadas por grandes fragilidades a nível interno, verificáveis no baixo nível de solidariedade e na falta de autonomia em relação ao corpo social (como aliás acontece em todos os estratos), que leva ao fenómeno do “encastoamento” e incapacidade organizacional. Estes factores levaram a que o fortalecimento da periferia fosse dificultado, uma vez que não existia uma coesa racionalidade e harmonia no centro. Também a limitação cultural, dominada pela crença em valores extra-terrenos foi um factor de bloqueio à expansão e vinculação ao poder. V Daremos, agora, mais ênfase aos EUA e ao Japão. Comecemos pelos EUA, tiveram a sua génese com a emigração de colonos, não só, mas principalmente da Grã-Bretanha – este facto contribuiu para que a nova massa populacional que lá se estabeleceu (e que rapidamente adquiriu o direito de voto), fizesse com que os sentimentos de classe, chamemos-lhe assim, tivessem reduzida expressão, porque essas massas partiram de uma base equitativa. As premissas mais importantes da sociedade norte-americana são, portanto, a combinação específica da solidariedade e individualismo na identidade colectiva e orientação antiestatista da sociedade americana. Desta, desde a sua génese, fortemente inspirada pelos valores puritanos e iluministas, nasceu uma religião civil, que se caracterizou por uma fusão dos valores religiosos e políticos, valorizado o sucesso, a igualdade, as liberdades e a abolição dos privilégios de religião organizada. Com efeito, este sentimento de igualdade metafísica entre os membros da comunidade americana causou uma crença de que todos os indivíduos tivessem acesso ao centro, ou seja, a negação do valor da hierarquia (como ainda persiste com a cultura americana do self-made man). Este ponto é fulcral para compreendermos o insucesso dos movimentos de protesto nos EUA. Em consequência, o protesto e a consciência de classe para a abolição da hierarquia foram sempre fracos.

Não são, somente estas premissas básicas que ajudam a compreender o insucesso dos movimentos de protesto nos EUA, também o explicam o papel das elites e dos estratos sociais mais importantes – a crença de que todos tinham o potencial para pertenceram às elites; as

# Sociologia Política

elites se tornarem portadoras das principais orientações e premissas culturais; a fraca organização e especialização das elites; a distinção entre elites centrais e periféricas ser pouco clara, podem ser argumentos que apoiam a premissa inicial. VI, VII No Japão, a incorporação dos símbolos das formas de protesto na sociedade foi realizada de uma forma completamente diferente. Apesar de, numa sociedade claramente com um capitalismo desenvolvido, se terem desenvolvido movimentos e partidos socialistas, estes raras vezes estiveram ligados à organização da classe operária e à reivindicação de direitos como os partidos socialistas europeus, o que fez com que a ideologia de consciência de classe não fosse muito eficaz e que os partidos socialistas permanecessem afastados do centro. Este afastamento fez com que o movimento socialista nunca tivesse sido relevante politicamente como na Europa. Razões para que isto tenha acontecido? Os símbolos da consciência de classe e luta de classe nunca foram incorporados no discurso político japonês, por causa dos seus valores que permaneceram relativamente inalterados na sua História. Por outras palavras, o facto de a sociedade japonesa ser pautada por um claro organicismo, ou seja, cada indivíduo fazer parte de um grupo, e esses grupos funcionarem como um todo, assim como as células constituem os órgãos e os órgãos desempenham funções diferentes no corpo humano. A grande diferença para os EUA diz respeito à possibilidade de diversos grupos terem acesso diferenciado ao centro, pelo contrário, tudo assentava na solidariedade, na harmonia e na coesão social da comunidade.

Ao mesmo tempo, as reivindicações das classes operárias eram normalmente conseguidas através da negociação. Por outro lado, o movimento socialista era claramente faccionado, o que não contribuiu para atrair um eleitorado mais amplo. Com efeito, os factores determinantes para a irrelevância dos movimentos socialistas foram o faccionalismo e a relação hieráquica vertical com facções dominantes.

Resumindo, as grandes diferenças entre os EUA e o Japão dizem respeito à hierarquia: se nos EUA a ausência da dimensão hierárquica explica a fraqueza dos movimentos socialistas, no Japão, pode ser explicada pela predominância relativa da hierarquia e às concepções hierárquicas verticais, com consequente fragilidade do igualitarismo no plano político. VIII Algumas conclusões sobre a convergência nas sociedades industriais modernas. - verificam-se diferenças no modo de lidar com problemas de desenvolvimento urbano, industrial, educacional e político. Estas diferenças são explicadas em grande parte pelas tradições e premissas históricas das civilizações em causa. - formas simbólicas e institucionais foram modeladas, em 1º plano, por este “peso da história”, e numa segunda fase pela interpretação e modelação levada a cabo pelas elites dominantes na estruturação societal. As mesmas elites não se podem desprender, e estão mesmo intrinsecamente concertadas com a génese social e matriz histórica na qual se inserem - o conceito de distribuição: cabe às elites modelar e distribuir as linhas orientadoras dos sistemas sociais, políticos e económicos, ou seja, a estratificação social, a formação de classes, o sistema político e sistemas macro-societais. - são responsabilidades das elites: 1) estruturar e responsabilizar-se pela autoridade 2) a justiça

# Sociologia Política

3) a estrutura de poder e conflitos políticos 4) os princípios de hierarquização social 5) a definição do âmbito de pertença às comunidades.

Eisenstadt defende que a erosão da modernidade deve ser vista como um desenvolvimento histórico inédito, pela combinação de forças políticas, sociais, económicas e ideológicas que dela advieram, e que não encontram precedente na história. Cada sociedade, partindo do mesmo tronco comum, o da cultura “Ocidental”, cristalizou-se e ramificou-se de múltiplas formas, nunca perdendo de vista as grandes premissas simbólicas das formações institucionais originais. Fala-se em múltiplas modernidades pelos distintos destinos evolucionários assumidos pelas diversas civilizações industriais/desenvolvidas, sobretudo a partir da 2ª Guerra Mundial. A modernidade deve ser assim vista como um tipo específico de civilização, plural, multifacetada e original.

# Sociologia Política

AULA 10 (26-10-2010) Questões sobre a relação entre modernização e democratização. - A modernização pode trazer evoluções tanto em termos democráticos como em autoritários. Existe uma multiplicidade de resultados, que mostram que a modernização tem uma relação complexa com o processo de democratização (Ver 5 desafios do processo de modernização). - Barrington Moore, em As origens sociais da ditadura e da democracia, identifica três vias fundamentais, mais uma residual, de modernização. Considera, também, a existência de variações dentro das próprias vias: (1) Democracias liberais: França, Grã-Bretanha e EUA; (2) Revolução conservadora vinda de cima: Alemanha e Japão; (3) Revoluções camponesas que levaram aos casos socialistas: Rússia e China; (4) Um caso residual: a Índia. - Existe, portanto, uma diversidade de trajectos de modernização das sociedades e dos seus sistemas políticos. - Samuel Huntington considera três vagas de democratização:

- Uma primeira e curta vaga, no pós-WWI, com o surgimento de vários Estados independentes e uma dinâmica de expansão de direitos em Estados existentes (com a constitucionalização dos partidos políticos, por exemplo); - Um refluxo, nos anos 20 e 30, com a ascensão dos regimes autoritários, como os casos alemão, italiano ou mesmo português; - Uma segunda vaga, no pós-WWII, com a grande derrota dos regimes autoritários; - Uma terceira vaga, a partir de 1974, cujo epicentro se localiza no regime português, e que se localiza primeiro na Europa do Sul, depois na América Latina e culminando com a queda do Muro de Berlim.

- Inventariam-se 4 democracias no inicio do séc. XX e 40 no final do séc. XX: apesar da evolução evidente, não é o regime que existe em maior ocorrência no mundo, onde se contam mais de 200 diferentes Estados. - Definição da democracia (sentido lato)

. A ciência política tem vindo a insistir num conceito minimalista de democracia. (1) Reconhecimento de um conjunto de garantias e direitos fundamentais individuais:

direitos civis (Ex. Direito da inviolabilidade do domicílio, direito da liberdade de expressão).

(2) Existência de uma estrutura política concorrencial: eleições livres com maior ou menor concorrência; conjuntos de regras mínimas mas inibição de não ser possível existir uma candidatura alternativa; eleições livres e justas, onde as elites políticas se submetem a votos e concorrem entre si – a existência de eleições numa base pacífica.

. Giovanni Sartori sublinha a importância da concorrência e das candidaturas alternativas. . Numa democracia madura, os cidadãos, fazendo uso da sua educação, são impermeáveis a pressões intrínsecas ao sistema. . O instituto do referendo, sendo um processo de democracia directa, é uma forma de aumentar a quantidade de cidadãos que participam directamente na vida política. Porém, por exemplo, em Portugal, este instrumento não é tão utilizado, porque talvez a democracia ainda seja recente. Nos EUA, para colmatar a baixa participação dos cidadãos, recorre-se frequentemente ao referendo – o que pode causar saturação social. É um importante instrumento de aprofundamento da qualidade democrática. . Três momentos de criação de uma democracia:

# Sociologia Política

a) Transição de regime; b) Consolidação institucional; c) Reforço da qualidade da democracia.

(3) Existência de partidos políticos (ou organizações de interesse) – actores políticos

organizados que moderam a estrutura política concorrencial, fazendo uma ponte entre as aspirações e preocupações fundamentais na sociedade e o processo de decisão política. Uma crise no sistema de partidos, seja por causa do desajustamento entre a sociedade e os programas políticos ou um desfasamento entre a oferta e a procura política, pode desencadear uma crise no regime democrático.

- Tendo em conta esta definição de democracia, quais serão, portanto, os processos de viabilização da qualidade do processo democrático? Ideias fundamentais:

. Por exemplo, o regime democrático deve despoletar desenvolvimento, não crescimento – mas crescimento sustentado. . A importância do jogo político e da alternância das forças políticas.

- Retorno à relação entre modernização e democratização.

. Seymour Lipset, um autor de referência, na sua obra Political Man: The Social Bases of Politics (1960), estabelece uma relação clara entre modernização e democratização. Ele pretende identificar as condições societais à existência de regimes democráticos e assenta em duas premissas fundamentais:

(1) Uma relação entre desenvolvimento económico e o estabelecimento de um regime democrático – desde logo, a difusão do bem-estar e segurança cria condições de confiança dos cidadãos nas suas instituições que são democráticas, contribuindo para o apaziguamento dos conflitos distributivos da sociedade.

(2) Quanto mais flexível for o sistema de estratificação social e mais homogénea for a sociedade, mais fácil será o processo de democratização. Uma ampla classe média é indicador de que existe uma dinâmica social e uma flexibilidade do sistema de estratificação. Um sistema de estratificação rígido ou uma sociedade muito heterogénea podem ser contraproducentes para uma democracia, contudo, não a inviabilizam.

. Existem dois tipos de divisões que se podem ou não transformar em clivagens, nas sociedades:

a) Divisões horizontais (classe social); b) Divisões verticais (língua, religião ou raça), que são mais importantes no plano político.

. Uma sociedade é mais homogénea se existir um sistema de estratificação mais flexível e menos hierárquico. . A democracia é um regime que acomoda a diferença, e as instituições têm o objectivo de integrar as diversidades que residem nas sociedades, aliás, essa é uma ferramenta de vitalidade dos regimes democráticos – integrando as várias partes que compõem a sociedade, incorporando a discussão de ideias e o estabelecimento de pontos de vista distintos para se chegar ao consenso social e à decisão política adequada. . A virtude não está tanto no facto de a sociedade ser homogénea ou heterogénea, mas da existência de mecanismos de regulação do conflito. . Lipset formula a teoria das frentes compactas ou frentes cruzadas de conflito – quando as diversas frentes se sobrepõem entre si, reforçam-se mutuamente. Quando linhas de divisão convergem no mesmo sentido, a comunidade política tende a ser dicotomizada. Quando as linhas de divisão são cruzadas, é provável que existam lealdades cruzadas.

# Sociologia Política

AULA 11 (28-10-2010) Apresentação do texto de Robert Dahl Democracia. Parte IV – Condições Favoráveis e Desfavoráveis Que condições favorecem a democracia? - O autor parte da pergunta: Como poderemos explicar a instauração das instituições democráticas em tantos países e em tantos lugares do mundo? E como podemos explicar o seu fracasso? - As formas clássicas não democráticas declinaram fatalmente pela legitimidade e pela força ideológica; embora tivessem sido substituídas por alternativas antidemocráticas estas apenas floresceram por pouco tempo. - A democracia ainda não é, de longe, o regime mais frequente a nível mundial: a China, por exemplo, o país mais populoso da terra, ainda não foi democratizada. Existem, portanto, países que realizaram a transição para a democracia consolidando as suas instituições democráticas durante muito tempo; países em que a transição seguiu-se de colapso e países que nunca realizaram essa transição. A maioria dos países em vias de desenvolvimento ainda não reuniu um certo conjunto de condições que se dizem altamente favoráveis para a democracia. Essas condições podem ser essenciais (1, 2 e 3) e favoráveis (4 e 5):

1. Controlo dos militares e da polícia por dirigentes eleitos: se as forças militares e policiais não estiverem sobre completo controlo dos dirigentes eleitos democraticamente, as instituições políticas democráticas provavelmente não se desenvolverão nem manterão. A ameaça interna mais perigosa para a democracia vem de líderes que têm acesso aos mais importantes meios de coerção física: os militares e a polícia – se os dirigentes eleitos democraticamente pretendem conseguir o controlo eficaz sobre as forças militares e policiais, devem submeter-se a eles.

2. Convicções democráticas e cultura política: mais cedo ou mais tarde, todos os países enfrentam crises profundas e por conseguinte um sistema político democrático deve ser capaz de sobreviver aos desafios e à agitação social causada por estes episódios sociais; se for incapaz de sobreviver a uma crise, certamente existe espaço para a ascensão de regimes autoritários e o colapso das democracias. As perspectivas de uma democracia estável num país são melhoradas se os seus cidadãos e os líderes apoiarem fortemente as ideias, valores e práticas democráticas.

3. Inexistência de controlo estrangeiro forte hostil à democracia: é menos provável que as instituições democráticas se desenvolvam num país sujeito à intervenção de um outro, hostil a um governo democrático nesse país.

4. Uma economia de mercado e uma sociedade modernas: uma condição altamente favorável às instituições democráticas é uma economia de mercado em que empresas na área da economia são principalmente propriedade privada, e não do Estado – uma economia capitalista em vez de socialista ou de pendor estatal. Porém, o capitalismo gera desigualdades e prejudica a igualdade política, mas o crescimento económico que ele produz constitui uma condição altamente favorável ao desenvolvimento e à manutenção das instituições políticas democráticas.

5. Pluralismo subcultural fraco: é mais provável que as instituições políticas democráticas se desenvolvam e mantenham num país culturalmente bastante homogéneo do que num país com subculturas profundamente diferenciadas e em conflito – a língua, religião, raça, identidade étnica; os indivíduos partilham de uma identidade comum, numa sociedade estratificada na vertical. Sob um processo democrático pacífico, a resolução de conflitos políticos requer negociação, conciliação e compromisso, de forma a evitarem-se conflitos culturais graves. Num país em que todas as outras condições são favoráveis à democracia, as consequências políticas potencialmente

# Sociologia Política

adversas da diversidade cultural podem tornar-se mais manejáveis. Existem várias maneiras de acomodar o diverso e reduzir o conflito:

a. Assimilação, como o caso americano, sem ou com obrigatoriedade de coerção, onde os novos emigrantes, sem ou com intervenção do Estado, se aculturam;

b. Decisão por consenso, como o caso suíço, onde se criaram disposições políticas para a unanimidade ou um consenso alargado para decisões tomadas pelo gabinete e pelo parlamento; o princípio da maioria estava subordinado ao princípio da unanimidade; condições não comuns;

c. Sistemas eleitorais que podem ser projectados de forma a mudar os incentivos dos políticos, de modo a tornar a conciliação mais rendível do que o conflito;

d. Separação, quando as clivagens culturais são demasiado profundas, procede-se à separação dos grupos culturais em unidades políticas diferentes, dentro das quais tenham autonomia suficiente para manterem a sua identidade.

- A Índia é um exemplo curioso: numa população muito numerosa, onde existem várias clivagens sociais passíveis de conflito (como a língua ou o sistema de castas, por exemplo), onde os níveis de pobreza são extremos deveria ser um exemplo em que a democracia não vingasse. Pelo contrário, em 1950 foi instaurado uma Constituição com contornos democráticos, vivendo um curto espaço de ditadura (em 1975, por Indira Gandhi) que acabou por não vingar – com efeito, as elites políticas estão mais ligados às instituições democráticas: devido à sua história (uma herança de ocupação britânica com valores tipicamente liberais e democráticos), as tradições militares darem pouco apoio a um golpe militar ditatorial (apesar da corrupção instalada), o facto de o hinduísmo ser uma característica unificadora da sociedade indiana (80% dos indianos são hindus) e, por fim a fragmentação cultural é tão imensa e espalhada/fragmentada geograficamente, que uma minoria cultural não poderia sozinha governar a Índia. Porque favorece o capitalismo de mercado a democracia - A moderna democracia representativa – a democracia poliárquica, vingou apenas em países com uma predominante economia capitalista de mercado, e nunca vingou num país com uma economia que não seja predominantemente de mercado. - Esta relação estrita existe porque certos aspectos básicos do capitalismo de mercado o tornam favorável às instituições democráticas. Inversamente, alguns aspectos básicos de uma economia que não seja predominantemente de mercado tornam-na prejudicial para as perspectivas democráticas.

. A longo prazo o capitalismo de mercado conduziu ao crescimento económico, e o crescimento económico é favorável à democracia; . O capitalismo de mercado também é favorável à democracia devido às suas consequências sociais e políticas: cria uma ampla camada média de proprietários que procuram, regra geral, a educação, a autonomia, a liberdade pessoal e a participação no governo; . Uma economia de não mercado pode existir onde os recursos sejam escassos e as decisões económicas poucas e óbvias.

- Reservas: o crescimento económico não é exclusivo dos países democráticos, nem a estagnação económica de nações não democráticas; o capitalismo de mercado existiu em países não democráticos. Porque prejudica o capitalismo de mercado a democracia - A democracia e o capitalismo de mercado estão fechados num conflito persistente em que cada um modifica e limita o outro.

# Sociologia Política

. As instituições básicas do capitalismo de mercado requerem a vasta intervenção e a regulamentação do governo. Uma economia de mercado não é, e não pode ser, completamente auto-reguladora. . Sem esta intervenção e regulamentação, uma economia de mercado inflige, inevitavelmente, sérios danos a algumas pessoas, e os que são prejudicados ou esperam ser prejudicados solicitarão a intervenção do Governo.

- Dado que o capitalismo de mercado cria inevitavelmente desigualdades, limita o potencial democrático da democracia poliárquica ao gerar desigualdades na sua distribuição dos recursos políticos.

. Alguns cidadãos conseguem uma influência mais significativa do que outros sobre as políticas, decisões e actos do governo – o fundamento moral da democracia, a igualdade política entre os cidadãos, e gravemente violada.

- O capitalismo de mercado favorece muito o desenvolvimento da democracia até ao nível da democracia poliárquica. Mas, devido às suas consequências adversas à igualdade política, é desfavorável ao desenvolvimento da democracia para além da poliarquia. A viagem inacabada - Dahl apresenta quarto desafios para as democracias actuais:

. A ordem económica: não se vislumbra qualquer alternativa comprovadamente superior à da economia de mercado, já que, durante o séc. XX, as alternativas histórias à propriedade e ao controlo capitalistas tinham perdido a maior parte do seu apoio. Assim, a tensão entre os objectivos democráticos e uma economia capitalista de mercado continuará, quase de certeza, indefinidamente. . A internacionalização: assegurar que os custos para a democracia são perfeitamente tidos em consideração quando as decisões são mudadas para níveis internacionais e fortalecer os meios de tornar as elites políticas e burocráticas responsáveis pelas suas decisões. . A diversidade cultural: a dinâmica de movimentação dos indivíduos inter-societal pode originar factores de tensão e clivagem social nas sociedades de recepção, mas a diversidade deve ser acomodada pelos sistemas políticos de forma a atenuar essas clivagens. A natureza e a qualidade da democracia dependerão muito das disposições que os países democráticos desenvolvam para resolver as diversidades culturais do seu povo. . A educação cívica: os países democráticos criaram muitas vias para o esclarecimento público. Porém, com os mecanismos de modernização das sociedades, essas vias tornaram-se muitas vezes obsoletas e foram dando lugar a outras mais eficientes. Podem definir-se três desenvolvimentos interligados que mostram esta evolução:

- A mudança de escala: devido à internacionalização crescente, as medidas que afectam significativamente os cidadãos são tomadas em áreas cada vez maiores que incluem cada vez mais pessoas dentro das suas fronteiras; - A complexidade: embora o nível médio de educação tenha aumentado, a dificuldade de compreensão das questões políticas aumentou e ultrapassou os ganhos nos níveis de educação mais elevados. Consequentemente, nenhum indivíduo pode ser perito em todas elas; - As comunicações: a moldura social e técnica de comunicação social sofreu alterações extraordinárias, tornando-a mais barata, rápida e eficaz. Porém, a complexidade e quantidade de informação não são sinónimos de qualidade informativa.

Uma das necessidades imperativas dos países democráticos é melhorar as capacidades dos indivíduos, de modo a que eles se empenhem inteligentemente na vida política.

# Sociologia Política

AULA 12 (02-11-2010) [Lijphart – As democracias contemporâneas, Gradiva] . Lijphart faz uma distinção entre democracias maioritárias e democracias consensuais, dando relevo à importância dos sistemas eleitorais: - Sistemas eleitorais maioritários desembocam em democracias maioritárias; - Sistemas eleitorais proporcionais desembocam em democracias consensuais. . Esta avaliação permite, sem prejuízo para os critérios de Dahl, identificar duas formas dominantes de democracia, estudando as suas principais características, a estruturação do corpo político (definição das regras do jogo eleitoral e como se traduzem votos em mandatos, etc.), com especial incidência nos sistemas eleitorais. . De acordo com Lijphart, a questão da heterogeneidade pode intensificar o potencial de conflito, mas não necessariamente uma coisa leva à outra: existem sociedades socialmente homogéneas em que existe conflito. O que para ele é relevante na democracia é a questão da capacidade das elites políticas de instituírem mecanismos eficientes de mediação do conflito (o acomodar do diverso; o consenso que nasce do dissenso).

Capítulo III do programa Instituições e processos eleitorais. - As eleições são um processo fundamental e estão intimamente ligadas à democratização e à modernidade. Embora elas não nascessem com o advento da modernidade, foi com as Revoluções Francesa e Americana que estes princípios, o recurso às eleições e a consagração da representatividade se consolidaram politicamente. Eles instituem um padrão de representatividade entre governantes e governados. - As eleições não são exclusivas dos sistemas democráticos – foram utilizadas por regimes autoritários para legitimar o seu poder. - As eleições desempenham várias funções nos sistemas políticos.

(1) Função de legitimação: instituir o padrão de responsabilização entre governantes e governados e instituir o mecanismo da regulação do conflito; (2) Nacionalização da vida política: construção das entidades e lealdades nacionais, a formação de um Estado nacional, intensificar os fluxos de comunicação política; (3) A questão das elites: as eleições são um importante instrumento da selecção e recrutamento das elites/classe política (ex. a carreira parlamentar como imperativo fundamental para a entrada num governo). Pareto define a circulação das elites – as sociedades onde esta seja menos dinâmica caem em estagnação; (4) A universalização do voto, resultante da extensão do sufrágio, representa as molduras institucionais da acção colectiva (ex. os partidos políticos são indissociáveis do sistema eleitoral).

- A importância da escala: maiores eleitorados colocam novos problemas ao sistema eleitoral, resultando no desenvolvimento da máquina burocrática e no aparelho administrativo do Estado, como consequência, para dar resposta a novas e diferentes situações sociais. - Durante muito tempo, existiram critérios restritivos para o acesso à cidadania: . Critérios de género; . Critérios capacitários (a educação);

. Critérios censitários, o rendimento, este não apenas para o sufrágio, mas em muitas vezes também para a elegibilidade de cargos políticos (Diderot afirmava que quem quer bem para o Estado tem bens no Estado).

# Sociologia Política

- Só existe plena democracia quando estes critérios são abolidos e o sufrágio é universalizado, ou seja, a expansão do eleitorado, que causa: . Alteração dos enquadramentos organizacionais da acção política;

. A heterogeneização do eleitorado, diversificando as opiniões e interesses na arena eleitoral, origina a formação de clubes/partidos políticos, de forma a representar diversos grupos sociais que entretanto se foram formando.

- A mudança da escala eleitoral causa uma burocratização, uma alteração na máquina administrativa, para dar resposta ao aumento do número de indivíduos. Este facto não só provoca uma mudança administrativa, mas também uma mudança na máquina comunicacional, da relação do Estado com o eleitorado. - Dimensões da dinâmica dos sistemas eleitorais latu sensu:

(1) Extensão do sufrágio: amplitude do direito de voto, mais estrito ou ampliado; espaço político em que, em última instância, participam todos os indivíduos adultos. (2) O sigilo de voto: o voto é secreto; atributo fundamental ao exercício da cidadania plena – a possibilidade de os indivíduos votarem em plena consciência, sem receio de quaisquer represálias ou pressões externas. Garantia fundamental para que as eleições sejam livres (o que os ingleses chamam free and fair). Despersonalização sociológica do indivíduo-cidadão. A importância da escala: é mais fácil garantir o sigilo de voto em grandes cidades do que em aldeias pequenas. (3) Sistemas eleitorais strictu sensu: o modo como os votos são convertidos em mandatos políticos. Existem duas formas essenciais de sistemas eleitorais que têm a ver com os princípios de representação: a proporcional e a maioritária.

- Até 1918 só existiam sistemas de representação maioritária, com variações e modalidades internas. Só na 2ª metade do séc. XIX é que os métodos de proporcionalidade começam a ser aplicados, sendo a primeira vez, na Bélgica. [John Stuart Mill – Princípios do Governo Representativo] - Stuart Mill foi o grande idealizador do método proporcional (a grande revolução na arte de governar). - A Igreja detém um longo histórico de eleição do seu representante máximo – o Papa. - Existem vários exemplos históricos em que a extensão do voto e os métodos representativos foram princípios vindos de baixo, por pressões das massas e das camadas populacionais mais radicais ou revolucionárias. No entanto, existem também movimentos vindos de cima, ao que a literatura chama cálculos de racionalidade instrumental das elites no poder, que consistem na capacidade de antecipação por parte dos sistemas políticos. As elites políticas, em muitos casos, apercebem-se das dinâmicas sociais de alteração das premissas de base, e por antecipação, resolveram actuar de forma a colmatar uma possível conflitualidade social. As dicotomias urbano-radical, por oposição a rural-tradicional são importantes para explicar este fenómeno (ainda para mais, no passado, o eleitorado rural era muito mais elevado, e o que as elites fizeram, por vezes, foi alcançar o sufrágio a essas camadas mais rurais para contrapor a esse eleitorado urbano mais reivindicativo e potencialmente conflituoso). - De acordo com Stein Rokkan, os mecanismos de representação proporcional foram primeiramente instituídos em países em que a diversidade cultural/heterogeneidade sociológica do eleitorado era mais elevada, como a Bélgica, a Dinamarca e a Finlândia. - A representação proporcional está ligada à justiça governamental; representação maioritária está ligada à eficácia governamental. Porém, em sistemas de representação proporcional, é possível, embora mais difícil, a obtenção de maiorias, sinónimo de eficácia governamental.

# Sociologia Política

- O efeito mimético: se um conjunto de países elabora e introduz um novo sistema, para mais se forem influentes socialmente, outros países irão imitar esses princípios e aplica-los às suas sociedades. - A ambiguidade funcional da representação proporcional: a garantia de uma representação parlamentar às minorias é útil tanto para partidos em expansão do eleitorado como para partidos em declínio de poder social. Porém, se um partido em desenvolvimento utiliza e faz uso da representação proporcional para crescer no eleitorado, quando e se chega à maioria vai abdicar dessa bandeira. Logo, esse princípio pode ser utilizado tanto para partidos de esquerda como de direita.

# Sociologia Política

AULA 13 (04-11-2010) Sistemas eleitorais strictu sensu. - É importante definir três dimensões fundamentais:

1. A fórmula matemática que é utilizada para converter os votos em mandatos, o que faz com que se distingam entre dois tipos de sistemas:

a. Sistemas maioritários: com diferentes tipos de maiorias – simples, absolutas ou qualificadas;

b. Sistemas proporcionais: com diferentes métodos de contagem, sejam eles de maior método ou de maior média (como é o caso do método de Hondt).

2. Círculos eleitorais: pressupõem uma organização espacial das eleições e a definição de

círculos de voto. Podem ser de dois tipos: a. Uninominais, ou de Westminster: elegem só um deputado; princípio do the

first past the post; associado a sistemas maioritários, como o caso das eleições inglesas;

b. Plurinominais: elegem dois ou mais deputados. - Os círculos uninominais e plurinominais estão associados à representação maioritária mas só os círculos plurinominais estão associados à representação proporcional. Podem considerar-se duas dimensões que têm grande impacto no grau de proporcionalidade dos sistemas proporcionais:

a. Dimensão e configuração territorial: o modo de organizar o círculo; influi na relação de intimidade entre o eleitor e o eleito. No desenho dos círculos eleitorais pode, tanto activa como passivamente, existir manipulação da carta eleitoral:

. Passivamente, quando a carta se mantém inalterada durante muito tempo, adulterando a representação de zonas mais ou menos povoadas que se alteraram no tempo; . Activamente, pelo gerrymandering, que consiste no desenho dos círculos eleitorais de forma a beneficiar certo partido; tentar diminuir a influência de um partido adicionando ou concentrando círculos de voto – dispersão ou concentração.

b. Magnitude dos círculos: o número de deputados que um círculo elege. Quanto mais deputados elege um círculo, mais proporcional ele é. O grau de proporcionalidade de um sistema de representação é variável – nem todos os sistemas asseguram a mesma justiça eleitoral aos partidos mais pequenos; ele depende da fórmula utilizada para converter votos em mandatos, mas o que influi mais é a magnitude do círculo eleitoral.

3. A existência de vários tipos de lista: a possibilidade ou não de o eleitor expressar no

boletim de voto uma preferência na escolha de um candidato. Podem ser de dois tipos:

a. Sistemas de lista fechada e bloqueada, como o caso português; b. Sistemas de lista aberta, onde se podem hierarquizar preferências, como o

caso do voto alternativo na Austrália. - É importante para garantir a relação de intimidade entre o eleitor e o eleito – os eleitos estão independentes de orientações partidárias e podem estabelecer preferências entre candidatos. - O voto preferencial é uma forma de maximizar a intervenção dos cidadãos no sistema eleitoral.

# Sociologia Política

- Pode existir instrumentalização político-partidária dos sistemas eleitorais. As reformas mecânicas dos sistemas eleitorais podem ter impactos políticos (componente normativa – positiva ou negativa) e um efeito estruturante no sistema político:

. O sistema eleitoral pode afectar o sistema de partidos (o sistema inglês uninominal e maioritário pode favorecer o bipartidarismo); . O sistema eleitoral pode ter efeito multiplicador: quanto maior o grau de proporcionalidade, maior será a multiplicidade de partidos – favorece-se o governo de coligação para se alcançar a estabilidade governativa pela maioria; . O sistema eleitoral pode afectar o sistema de governo (a relação entre o governo e o parlamento); . O sistema eleitoral pode afectar os padrões de recrutamento das elites políticas (certo tipo de candidatos com certo perfil sócio-demográfico são mais facilmente eleitos que outros – na Alemanha, as mulheres tinham mais facilidade em serem eleitas em sistemas plurinominais do que em uninominais). O critério pode ser dificultado ou beneficiado pelo sistema político. . O sistema eleitoral pode influenciar a centralização do sistema político.

- A reforma eleitoral é, portanto, um ponto importantíssimo na agenda das democracias. - A grande discussão sobre as vantagens e desvantagens da representação proporcional começou com Stuart Mill e Walter Bagehot:

. Stuart Mill considerava que a representação proporcional trazia a vantagem de garantir a representação de minorias expressivas. Assegurava a justiça eleitoral, a igualdade política e a formação de assembleias eleitorais plurais e dinâmicas. O direito de tolerância e diversidade era valorizado pelas suas virtudes e era um factor de dinamismo do sistema político. O sistema defendido por Mill era a existência de um sistema de representação proporcional uninominal à escala nacional. . Bagehot considerava que a representação proporcional estimulava a inacção parlamentar e dificultava a acção de governos – a representação matemática exacta das minorias levava a uma dificuldade em se chegar ao consenso, levando a uma paralisia governamental. Com a formação de governos fracos, prejudicava-se a estabilidade governativa. O radicalismo político: a representação independente de uma multiplicidade de opiniões e interesses variados poderiam minar o sistema parlamentar e o espírito de moderação. Como a representação proporcional está associada aos círculos plurinominais, facilita-se a tirania dos partidos e a partidocracia.