aula de civil 2- prof rafael de menezes

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http://www.rafaeldemenezes.adv.br/direitoob.htm

DIREITO CIVIL 2 TEORIA GERAL DAS OBRIGAES UNICAP Fonte: www.rafaeldemenezes.adv.br Contato: Aula 1 Neste semestre comea a ser estudada a parte especial do Direito Civil, esta que a mais extensadisciplina do curso de Direito, com sete perodos, um da parte geral, j visto, e seis da parte especial. Alm de disciplina mais extensa, peo licena aos colegas professores para afirmar que o Direito Civil tambm a matria mais importante do curso jurdico por duas grandes razes: Primeiro porque o Direito em si, como cincia, passou a ser estudado atravs do Direito Civil. Foi a evoluo do Direito Civil que levou Teoria Geral do Direito e Introduo ao Estudo do Direito. Segundo porque o Direito Civil o direito de ns todos, de Joo, Jos, de Maria e de cada cidado. Explico: o Direito Tributrio e Administrativo o direito do governo, o Direito Penal o direito do bandido, o Direito Comercial o direito do empresrio, o Direito Processual mais processo do que direito, o Direito do Trabalho o direito do trabalhador, e de qualquer modo, o Direito do Trabalho filho do Direito Civil. Igualmente o Direito do Consumidor, filho tambm do Direito Civil. O prprio Direito Comercial teve muitas de suas normas incorporadas pelo Cdigo Civil de 2002. Finalmente, o Direito Constitucional tem mais princpios gerais do que normas de aplicao direta. J as atividades do nosso cotidiano so todas reguladas pelo Direito Civil. Ns todos hoje, para estarmos aqui agora, j celebramos alguma relao civil, at porque ns todos temos nome, famlia e domiclio. E usamos um transporte para chegar de casa at a universidade. E somos proprietrios de nossas roupas e objetos pessoais. E falamos no telefone e compramos um chiclete antes de entrar na sala de aula. Quer dizer, algum pode viver dcadas e nunca se enquadrar no Cdigo Penal, Processual ou na CLT, mas com certeza [email protected]

vidas passam pelo Cdigo Civil. O que vocs acham? Reflitam! Tudo isso aumenta a responsabilidade do professor de Direito Civil, que deve ser capaz de estimular os alunos a conhecer e gostar da disciplina, sempre fazendoos refletir sobre as controvrsias jurdicas, o subjetivismo do Direito e a razoabilidade na aplicao da lei (exs: arts. 402; 1 do 1.210; 1.229; p do 944). Alm de disciplina mais extensa e mais importante do curso, o Direito Civil hoje predomina sozinho no Direito Privado. Vocs sabem que as normas jurdicas tm duas grandes divises conforme estudado na Teoria Geral do Direito: o Direito Pblico e o Direito Privado. Direito Pblico o Direito Constitucional, Administrativo, Processual, Penal e Tributrio. J o Direito Civil, Comercial e do Trabalho integram o Direito Privado, mas s o Direito Civil privado por excelncia. Isto porque o Direito Comercial tem se aproximado do Direito Pblico neste sc. XXI de mundo globalizado e mercados internacionais como a Unio Europia, o Mercosul Mercado Comum do Sul, a Nafta da Amrica do Norte, a Alca rea de Livre Comrcio das Amricas, etc. Cada vez mais as naes participam e se integram em blocos econmicos, aproximando o Direito Comercial do Direito Pblico. Igualmente o Direito do Trabalho, um filho do Direito Civil, aproxima-se do Direito Pblico na medida em que o Estado interfere nas relaes empregatcias para proteger e tornar indisponveis direitos dos trabalhadores. Tenho um artigo no meu site chamado A importncia do Direito Privado apesar da publicizao do Direito onde afirmo inclusive que o Direito do Trabalho Direito Pblico, confiram! A publicizao justamente este avano do Direito Pblico sobre o Direito Privado, com o Estado sufocando nossas atividades, atrofiando a economia, controlando nossa rotina, cobrando multas e impostos, porm fornecendo pouco em troca... O que vocs acham? Bem, voltando ao cvel, hoje vocs comeam o estudo da parte especial do Direito Civil, e durante seis semestres sero estudados os quatro grandes temas cveis: obrigaes, reais, famlia e sucesses. No Direito das Obrigaes vocs vo conhecer as normas que tratam das relaes das pessoas entre si, por isso que o Direito das Obrigaes tambm

conhecido como Direito Pessoal. As obrigaes entre as pessoas se originam de vrios modos, especialmente do contrato. J no Direito Real sero estudadas as normas que tratam das relaes das pessoas com os bens, sendo tambm chamado de Direito das Coisas. Existem vrios direitos reais (art. 1.225) e o principal deles a propriedade. Ento ao longo da nossa vida, eu, vocs, Joo, Jos e Maria nos relacionamos com vrias pessoas, atravs dos contratos, e nos apropriamos de vrios bens, adquirindo propriedade, para a formao de umpatrimnio. Este o sentido da vida: estudar e trabalhar para ficar rico! O Direito Civil o direito dos ricos! Perdoem-me os espiritualistas, mas dinheiro muito importante na nossa vida, especialmente na nossa velhice quando estamos mais vulnerveis. Pois bem, todo esse patrimnio que ns juntamos na nossa vida ser transferido a nossos herdeiros aps nossa morte. Desta transmisso de bens cuida o Direito das Sucesses. O Direito das Obrigaes, o Direito das Coisas e o Direito das Sucesses integram a chamadaautonomia privada, ou seja, o campo do Direito Civil onde os particulares se relacionam entre si, com grande liberdade, na celebrao de contratos e na apropriao de bens que lhes interessam, para a formao de um patrimnio que ser transferido aos familiares aps a morte. Se no Direito Pblico s se pode fazer o que a lei permite, no Direito Civil pode-se fazer tudo o que a lei no probe, ou seja, a liberdade aqui bem maior. Dos quatro ramos do Direito Civil, s o Direito de Famlia sobra deste raciocnio. Sem dvida o Direito de Famlia pertence ao Direito Civil, afinal trata das relaes entre familiares, e nada to ntimo e privado quanto a famlia de cada um de ns. Alm disso, tais familiares, via de regra, so os herdeiros do patrimnio adquirido na nossa vida. Mas no Direito de Famlia as questes econmicas no predominam tanto quanto no resto do Direito Civil, afinal o que alimenta a famlia o amor, a sensibilidade, a amizade e no o dinheiro. Em suma, o Direito de Famlia integra o Direito Civil, mas no integra a autonomia privada.

Concentrando-nos no Direito das Obrigaes, objeto dos prximos dois semestres, podemosconceitu-lo como a disciplina que trata das relaes harmnicas entre as pessoas para a satisfao dos seus interesses individuais. Digo relaes harmnicas porque a sociedade exige harmonia, sob pena de conflito e caos social. Digo satisfao de interesses porque uma pessoa no consegue produzir sozinha tudo que precisa para viver, e por impulso precisa se relacionar com outra para obter bens de seu interesse. As relaes obrigacionais acontecem a todo instante e so o suporte econmico da sociedade moderna de consumo, especialmente atravs do contrato de compra e venda. Quanto mais a gente compra, aluga, troca, empresta, etc., mais dinheiro circula na economia, mais as lojas vendem, mais as fbricas produzem, mais os empresrios lucram, mais empregos so gerados e mais impostos so arrecadados.Todos ganham! Mas para gastar preciso ter dinheiro, e para isso preciso trabalhar, e para isso preciso estudar. Estudem pois! Aula 2 Civil 2 Unicap OBRIGAO Na primeira aula conceituamos o Direito das Obrigaes e o situamos dentro do Direito Civil, bem como situamos o Direito Civil dentro do ordenamento jurdico. Vamos hoje tratar da obrigao. Conceito: Todos temos obrigaes na nossa vida, seja para com o pas (ex: servio militar, votar nas eleies, pagar impostos) seja para com a famlia (1.566). Mas a obrigao que nos interessa neste curso a obrigao civil. Num conceito mais simples, a obrigao o direito do credor contra o devedor. Num conceito mais completo, a obrigao um vnculo jurdico transitrio em virtude do qual uma pessoa fica sujeita a satisfazer uma prestao econmica em proveito de outra. Expliquemos: - vnculo jurdico: o vnculo o motor da obrigao e precisa interessar ao Direito; um vnculo apenas moral (ex:

ser educado, ser gentil, dar bom dia) ou religioso (ex: ir a missa todo Domingo) no tem relevncia jurdica; - transitrio: a obrigao efmera, tem vida curta (ex: uma compra e venda de balco dura segundos), podendo at ser duradoura (ex: alugar uma casa por um ano), mas no dura para sempre. Inclusive um direito de crdito se extingue quando exercido (ex: Jos bate no carro de Maria, quando Maria cobra o prejuzo e Jos paga, a obrigao se extingue). J os Direitos Reais so permanentes, e quanto mais exercidos mais se fortalecem (ex: a propriedade sobre uma fazenda passa por geraes de pai para filho, e quanto mais a fazenda for usada mais cumprir sua funo social, ficando livre de invases e desapropriao). H outras diferenas dos Direitos Reais para os Direitos Obrigacionais que sero abordadas em Civil 4. - prestao: o objeto da obrigao e se trata de uma conduta ou omisso humana, ou seja, sempre dar uma coisa, fazer um servio ou se abster de alguma conduta. Dar, fazer e no-fazer, estas trs so as espcies de obrigao, voltaremos a elas abaixo. - econmica: toda obrigao precisa ter um valor econmico para viabilizar a responsabilidade patrimonial do inadimplente se no for espontaneamente cumprida. Em outras palavras, se uma dvida no for paga no vencimento o credor mune-se de uma pretenso e a dvida se transforma em responsabilidadepatrimonial. Que pretenso esta de que se arma, de que se mune o credor? a pretenso a executar o devedor para atacar/tomar seus bens atravs do Juiz (391, 942). E se o devedor/inadimplente no tiver bens? Ento no h nada a fazer pois, como dito, a responsabilidade patrimonial e no pessoal. Ao credor s resta espernear, o chamado na brincadeira jus sperniandi. Realmente j se foi o tempo em que o devedor poderia ser preso, escravizado, esquartejado e morto por dvidas, pois isto hoje atenta contra a dignidade humana. Os nicos casos atuais de priso por dvida so no contrato de depsito, que veremos em Civil 3 (652), e na penso alimentcia, assunto de Direito de Famlia. Elementos da obrigao: so trs: a) duplo sujeito: o Direito das Obrigaes trata das relaes entre pessoas, ento toda obrigao tem dois

sujeitos, um ativo, chamado credor, e um passivo, chamado devedor. No existe relao obrigacional com apenas um sujeito (381). Pode haver num dos plos mais de um credor e mais de um devedor (257). Numa relao simples, sabe-se exatamente qual das partes a credora e qual a devedora (ex: Jos bate no carro de Maria, ento Jos devedor e Maria credora), mas numa relao complexa ambos os sujeitos so simultaneamente credores e devedores (ex: contrato de compra e venda, onde o comprador deve o dinheiro e credor da coisa, e o vendedor deve a coisa e credor do dinheiro). Tais obrigaes complexas so tambm chamadas de sinalagmticas. Os sujeitos precisam ser bem identificados para que o devedor saiba a quem prestar, e o credor saiba de quem receber. Excepcionalmente o devedor pode ser desconhecido (ex: qualquer pessoa que adquira imvel hipotecado responde pela dvida, apesar de no ter originariamente assumido a obrigao; 303, mais detalhes em Civil 5) e o credor tambm pode ser desconhecido (ex: o credor faleceu ou desapareceu, deve ento o devedor pagar na Justia para se livrar da obrigao, 334; outro ex: 855). b) vnculo jurdico: o vnculo liga os sujeitos ao objeto da obrigao. O vnculo a fora motriz da relao obrigacional. O vnculo seria qualquer acontecimento relevante para o direito capaz de fazer nascer uma obrigao (ex: um acidente de trnsito gera um ato ilcito, um acordo de vontades produz um contrato, etc). c) objeto: ateno com o objeto! O objeto da obrigao no uma coisa, mas um fato humano/uma conduta ou omisso do devedor chamada prestao. A prestao possui trs espcies: dar, fazer, ou no-fazer. Na obrigao de dar o objeto da prestao uma coisa (ex: dar dinheiro, dar uma TV), mas o objeto da obrigao a ao de entregar a coisa, no a coisa em si. Na obrigao de fazer o objeto da prestao um servio (ex: o cantor realiza um show, o advogado redige uma petio, o professor ministra uma aula). Finalmente, na obrigao de no-fazer, o objeto da prestao uma omisso/absteno (ex: o qumico da fbrica de perfume demitido e se obriga a no revelar a frmula do perfume). Como o objeto da obrigao a prestao, mesmo na obrigao de dar o credor no tem poder sobre a coisa, mas

sim sobre a prestao (ex: compro uma geladeira e a loja promete me entregar em casa, mas a loja no cumpre, no posso por isso invadir a loja e pegar a geladeira fora, devo sim exigir perdas e danos, 389 trata-se da responsabilidade patrimonial do devedor, como dito acima). As obrigaes de dar e de fazer so positivas, e a de no-fazer a chamada obrigao negativa. O objeto da obrigao para ser vlido precisa ser lcito (ex: comprar drogas, contratar o servio de um pistoleiro, etc), possvel (ex: viagem no tempo, procurar um anel no mar, encontrar um dinossauro vivo), determinvel (a coisa devida precisa ser identificada, 243) e ter valor econmico para viabilizar o ataque ao patrimnio do devedor em caso de inadimplemento (947). Acrescentem valor econmico ao art. 104, II, do CC. Aula 3 Civil 2 Unicap

FONTES DAS OBRIGAES

O Direito se origina dos fatos = ex facto iur oritur. As fontes do Direito so a lei, a jurisprudncia, a doutrina e os costumes, conforme estudado em Introduo ao Direito. No caso das obrigaes, quais suas fontes? De onde se originam as obrigaes? Ressalto que h muitas obrigaes que interessam a outras reas jurdicas e que tm por fonte a lei, ex: obrigao de alimentar os parentes necessitados, assunto de Direito de Famlia (1.696); obrigao de votar, assunto de Direito Eleitoral; obrigao de pagar impostos, assunto de Direito Tributrio; obrigao dos homens de prestar servio militar, etc. Mas e as obrigaes patrimoniais privadas? Como surgem as relaes concretas entre particulares tendo por objeto determinada prestao? So trs as fontes segundo o Cdigo Civil, vejamos: 1 Contratos: esta a principal e maior fonte de obrigao. Atravs dos contratos as partes assumem

obrigaes (ex: compra e venda, onde o comprador se obriga a pagar o preo e o vendedor se obriga a entregar a coisa). No prximo semestre sero estudados com detalhes os inmeros contratos (ex: locao, doao, emprstimo, seguro, transporte, mandato, fiana, etc). 2 Atos unilaterais: segundo nosso Cdigo, so os quatro captulos entre os arts. 854 e 886, com destaque para a promessa de recompensa (ex: perdi meu cachorro e pago cem a quem encontr-lo, obrigando-me perante qualquer pessoa que cumpra a tarefa). No temos aqui um contrato, mas um ato unilateral gerador de obrigao, como ser visto no prximo semestre. 3 Atos ilcitos: j estudados no semestre passado, revisem o art. 186 (ex: Joo bate no carro de Maria e se obriga a reparar os prejuzos). O estudo dos atos ilcitos deve ser aprofundado na importante disciplina Responsabilidade Civil (927).

ESPCIES DE OBRIGAO

So trs, duas positivas (dar e fazer) e uma negativa (obrigao de no-fazer). 1 obrigao de dar: conduta humana que tem por objeto uma coisa, subdividindo-se em trs: obrigao de dar coisa certa, obrigao de restituir e obrigao de dar coisa incerta. 1.1 obrigao de dar coisa certa: vnculo jurdico pelo qual o devedor se compromete a entregar ao credor determinado bem mvel ou imvel, perfeitamente individualizado. Tal obrigao regulada pelo Cdigo Civil a partir do art. 233, salvo acordo entre as partes, ou seja, se as partes no ajustarem de modo diferente, vo prevalecer as disposies legais. Na autonomia privada, como dito na aula 1, a liberdade das partes grande, e o Cdigo Civil serve mais para completar a vontade das partes caso haja omisso no

ajuste entre elas. Diz-se por isso que a maioria das normas de direito privado so supletivas, enquanto a maioria das normas de direito pblico so imperativas = obrigatrias. O que vai caracterizar a obrigao de dar coisa certa porque o objeto da prestao coisa nica e preciosa, ex: a raquete de Guga, o capacete de Ayrton Senna, a camisa dez de Pel, etc. (235). O devedor obrigado a dar coisa certa no pode dar coisa diferente, ainda que mais valiosa, salvo acordo com o credor (313 mais uma norma supletiva). Se o devedor recebe o preo e se recusa a entregar a coisa, o credor no pode tom-la, resolvendo-se o litgio em perdas e danos (389). A obrigao no geral direito real ( = sobre a coisa), mas apenas direito pessoal ( = sobre a conduta). Excepcionalmente, admite-se efeito real caso a coisa continue na posse do devedor (ex: A combina vender a B o capacete de Ayrton Senna, B paga mas depois A recebe uma oferta melhor e termina vendendo o capacete a C; B no pode tomar o capacete de C, mas caso estivesse ainda com A poderia faz-lo atravs do Juiz; esta a interpretao do art. 475 do CC que vocs estudaro em Civil 3). Ento o 389 a regra e o 475 (execuo forada do contrato) a exceo. E se a obrigao no gera direito real, o que vai gerar? Resposta: a tradio para as coisas mveis e o registro para as coisas imveis. Tradio e registro so assuntos de Direitos Reais mas que j devo adiantar. Tradio a entrega efetiva da coisa mvel (1226 e 1267), ento quando compro uma geladeira, pago a vista e aguardo em casa sua chegada, s serei dono da coisa quando receb-la. Ao contrrio, se compro um celular a prazo e saio com ele da loja, o aparelho j ser meu embora no tenha pago o preo (237). Eventual perda/roubo da geladeira/celular trar prejuzo para o dono, seja ele a loja ou o consumidor, a depender do momento da tradio. a confirmao do brocardo romano res perit domino (= a coisa perece para o dono), seja o comprador ou o vendedor, at a tradio (492). Se o devedor danificar a coisa antes da tradio, ter que indenizar o comprador por perdas e danos (239). Por sua vez, o registro a inscrio da propriedade imobiliria no Cartrio de Imveis, de modo que o dono do apartamento no quem mora nele, no quem pagou o preo ou quem tem as chaves. O dono da coisa imvel

aquele cujo nome est registrado no Cartrio de Imveis (1245 e 1). Mais detalhes sobre tradio e registro em Civil 4. 1.2 obrigao de restituir: tambm chamada de obrigao de devolver. Difere da obrigao de dar, pois nesta a coisa pertence ao devedor at a tradio, enquanto na obrigao de restituir a coisa pertence ao credor, apenas sua posse que foi transferida ao devedor. Posse e propriedade so conceitos que sero estudados em Direitos Reais, mas d para entender que quando se aluga um filme, a locadora continua sendo proprietria do filme, apenas a posse que se transfere ao cliente. Ento na locao o cliente/devedor tem a obrigao de restituir o bem ao locador aps o prazo acertado (569, IV). Como se v, na obrigao de restituir a prestao consiste em devolver uma coisa cuja propriedade j era do credor antes do surgimento da obrigao. Igualmente se eu empresto um carro a meu vizinho, eu continuo dono/proprietrio do carro, apenas a posse que transferida, ficando o vizinho com a obrigao de devolver o veculo aps o uso. Locao e emprstimo so exemplos de obrigao de restituir, ficando a coisa em poder do devedor, mas mantendo o credor direito real de propriedade sobre ela. Como a coisa do credor, seu extravio antes da devoluo trar prejuzo ao prprio credor (240), enquanto na obrigao de dar o extravio antes da tradio traz prejuzo ao devedor. Em ambos os casos, sempre prevalece a mximares perit domino. Mas preciso cuidado para evitar fraudes (238, ex: alugo um carro que depois furtado, o prejuzo ser da loja, por isso prudente a locadora sempre fazer seguro). Outro exemplo de obrigao de restituir est no art. 1.233, ento se achado no roubado, tambm no pode ser apropriado, devendo quem encontrar agir conforme o p.. do mesmo artigo. Prxima aula: 1.3 - obrigao de dar coisa incerta. ESPCIES DE OBRIGAO (continuao) 1 obrigao de dar 1.1 obrigao de dar coisa certa 1.2 obrigao de restituir (j vistas na aula passada)

1.3 obrigao de dar coisa incerta: nesta espcie de obrigao a coisa no nica, singular, exclusiva e preciosa como na obrigao de dar coisa certa, mas sim uma coisa genrica determinvel pelo gnero e pela quantidade (243). Ao invs de uma coisa determinada/certa, temos aqui uma coisa determinvel/incerta (ex: cem sacos de caf; dez cabeas de gado, um carro popular, etc). Tal coisa incerta, indicada apenas pelo gnero e pela quantidade no incio da relao obrigacional, vem a se tornar determinada por escolha no momento do pagamento. Ressalto que coisa incerta no qualquer coisa, mas coisa sujeita a determinao futura. Ento se Joo deve cem laranjas a Jos, estas frutas precisam ser escolhidas no momento do pagamento para serem entregues ao credor. Esta escolha chama-se juridicamente de concentrao. Conceito: processo de escolha da coisa devida, de mdia qualidade, feita via de regra pelo devedor (244). A concentrao implica tambm em separao, pesagem, medio, contagem e expedio da coisa, conforme o caso. As partes podem combinar que a escolha ser feita pelo credor, ou por um terceiro, tratando-se este artigo 244 de uma norma supletiva, que apenas completa a vontade das partes em caso de omisso no contrato entre elas. Aps a concentrao a coisa incerta se torna certa (245). Antes da concentrao a coisa devida no se perde pois genus nunquam perit (o gnero nunca perece). Se Joo deve cem laranjas a Jos no pode deixar de cumprir a obrigao alegando que as laranjas se estragaram, pois cem laranjas so cem laranjas, e se a plantao de Joo se perdeu ele pode comprar as frutas em outra fazenda (246). Todavia, aps a concentrao, caso as laranjas se percam (ex: incndio no armazm) a obrigao se extingue, voltando as partes ao estado anterior, devolvendo-se eventual preo pago, sem se exigir perdas e danos (234, 389, 402). Pela importncia da concentrao, o credor deve ser cientificado quando o devedor for realiz-la, at para que o credor fiscalize a qualidade mdia da coisa a ser escolhida.

2 obrigao de fazer: conduta humana que tem por objeto um servio. Conceito: espcie de obrigao positiva pela qual

o devedor se compromete a praticar algum servio lcito em benefcio do credor. Enquanto na obrigao de dar o objeto da prestao uma coisa, na obrigao de fazer o objeto da prestao um servio (ex: professor ministrar uma aula, advogado redigir uma petio, cantor fazer um show, pedreiro construir um muro, mdico realizar uma consulta, etc.). E se eu quero comprar um quadro e encomendo a um artista, a obrigao ser de fazer ou de dar? Se o quadro j estiver pronto a obrigao ser de dar, se ainda for confeccionar o quadro a obrigao ser de fazer. A obrigao de fazer tem duas espcies: 2.1 fungvel: quando o servio puder ser prestado por uma terceira pessoa, diferente do devedor, ou seja, quando o devedor for facilmente substituvel, sem prejuzo para o credor, a obrigao fungvel (ex: pedreiro, eletricista, mecnico, caso no possam fazer o servio e mandem um substituto, a princpio para o credor no h problema). As obrigaes de dar so sempre fungveis pois visam a uma coisa, no importa quem seja o devedor (304). 2.2 infungvel: ao credor s interessa que o devedor, pelas suas qualidades pessoais, faa o servio (ex: mdico e advogado so profissionais de estrita confiana dos pacientes e clientes). Chama-se esta espcie de obrigao de personalssima ou intuitu personae ( = em razo da pessoa). So as circunstncias do caso e a vontade do credor que tornaro a obrigao de fazer fungvel ou no. Em caso de inexecuo da obrigao de fazer o credor s pode exigir perdas e danos (247). Viola a dignidade humana constranger o devedor a fazer o servio por ordem judicial, de modo que na obrigao de fazer no se pode exigir a execuo forada como na obrigao de dar coisa certa (art. 475 sublinhemexigir-lhe o cumprimento). Imaginem um cantor se recusar a subir no palco, no razovel o Juiz mandar a polcia para for-lo a trabalhar manu militari, o coerente o credor do show exigir perdas e danos (389). Ningum pode ser diretamente coagido a praticar o ato a que se obrigara. Assim, a execuo in natura do art. 475 do CC deve ser substituda por perdas e danos quando for impossvel (ex: a coisa devida no est mais com o devedor) ou quando causar constrangimento fsico ao devedor (ex: obrigao de fazer).

Se ocorrer recusa do devedor de executar obrigao fungvel, o credor pode pedir a um terceiro para fazer o servio, s custas do devedor (249). Havendo urgncia, o credor pode agir sem ordem judicial, num autntico caso de realizao de Justia pelas prprias mos (p do 249, ex: consertar o telhado de casa ameaando cair). Mas se tal recusa decorre de um caso fortuito (ex: o cantor gripou e perdeu a voz), extingue-se a obrigao (248). Aula 5 Civil 2 Unicap ESPCIES DE OBRIGAO (continuao) 1 Obrigao de dar 2 Obrigao de fazer (j vistas) 3 Obrigao de no-fazer: trata-se de uma obrigao negativa cujo objeto da prestao uma omisso ou absteno. Os romanos chamavam de obrigao ad non faciendum. Conceito: vnculo jurdico pelo qual o devedor se compromete a se abster de fazer certo ato, que poderia livremente praticar, se no tivesse se obrigado em benefcio do credor. O devedor vai ter que sofrer, tolerar ou se abster de algum ato em benefcio do credor. Exemplos: o engenheiro qumico que se obriga a no revelar a frmula do perfume da fbrica onde trabalha; o condmino que se obriga a no criar cachorro no apartamento onde reside; o professor que se obriga a no dar aula em outra faculdade; o comerciante que se obriga a no fazer concorrncia a outro, etc. Pode haver limite temporal para a obrigao (1.147). Como na autonomia privada a liberdade grande, as obrigaes negativas podem ser bem variadas, mas obrigaes imorais e anti-sociais, ou que sacrifiquem a liberdade das pessoas, so proibidas, ex: obrigao de no se casar, de no trabalhar, de no ter religio, etc. Tudo uma questo de bom senso, ou de razoabilidade. Gosto muito da expresso razovel, uma expresso muito ligada ao Direito, inclusive tem um artigo no site sobre a razoabilidade na aplicao da lei, confiram! A violao da obrigao negativa se resolve em perdas e danos, ento se o engenheiro divulgar a frmula do

perfume ter que indenizar a fbrica. Mas se for vivel, o credor poder exigir o desfazimento pelo devedor (ex: Jos se obriga a no subir o muro para no tirar a ventilao do seu vizinho Joo, caso Jos aumente o muro, Joo poder exigir a demolio, 251). No caso do perfume no h como desfazer a revelao do segredo, ento uma indenizao por perdas e danos a soluo (389). Neste exemplo do muro, se Jos se mudar, o novo morador ter que respeitar a obrigao? No, pois quem celebrou o contrato no foi ele. Mas se Joo, ao invs de um simples contrato de obrigao negativa, fizer com Jos uma servido predial, todos os futuros proprietrios da casa no podero aumentar o muro (1.378). Servido predial assunto de Civil 5, e por se tratar de um direito real, j se percebe sua maior fora em relao a um direito obrigacional. Enquanto uma obrigao vincula pessoas (Joo a Jos), uma servido predial vincula uma pessoa a uma coisa, ento a segurana para o credor bem maior. Mais detalhes em Civil 5 (vide no site aulas 8 e 9 de Direitos Reais na Coisa Alheia). Ainda tratando do exemplo do muro, e se a Prefeitura obrigar Jos a aumentar o muro por uma questo de esttica ou urbanismo? Jos ter que obedecer e Joo nada poder fazer, pois o Direito Pblico predomina sobre o Direito Privado (250 o chamado Fato do Prncipe, em aluso aos monarcas que governavam os pases na Europa medieval).

CLASSIFICAO ou MODALIDADES DE OBRIGAES

Vistas as espcies, vamos passar as prximas aulas tratando das modalidades de obrigaes. So vrias modalidades, mas que sempre iro corresponder a uma das trs espcies de dar, fazer ou no-fazer. A primeira modalidade :

1 Obrigao Natural: a obrigao civil produz todos os efeitos jurdicos, mas a obrigao natural no, pois corresponde a uma obrigao moral. H autores que a

chamam de obrigao degenerada. So exemplos: obrigao de dar gorjeta, obrigao de pagar dvida prescrita (205), obrigao de pagar dvida de jogo (814), etc. A obrigao natural no pode ser exigida pelo credor, e o devedor s vai pagar se quiser, bem diferente da obrigao civil. Vocs sabem que se uma dvida no for paga no vencimento o direito do credor mune-se de uma pretenso, e a dvida se transforma em responsabilidade patrimonial. Mas tratando-se de obrigao natural, o credor no ter a pretenso para executar o devedor e tomar seus bens (189). A dvida natural existe, mas no pode ser judicialmente cobrada, no podendo o credor recorrer Justia. Conceito: obrigao natural aquela a cuja execuo no pode o devedor ser constrangido, mas cujo cumprimento voluntrio pagamento verdadeiro. Por que a obrigao natural interessa ao Direito se corresponde a uma obrigao moral? Porque a obrigao natural, mesmo sendo moral, possui um efeito jurdico: soluti retentio ou reteno do pagamento. Mesmo tratando-se de uma obrigao moral, o pagamento de obrigao natural pagamento verdadeiro e o credor pode ret-lo. Ento se Joo paga dvida prescrita e depois se arrepende no pode pedir o dinheiro de volta, pois o credor tem direito reteno do pagamento (882). Como diz a doutrina, a obrigao natural no se afirma seno quando morre, ou seja, com o pagamento e sua extino que a obrigao natural vai existir para o direito, ensejando ao credor a soluti retentio. Mas no se confunda obrigao natural com obrigao inexistente: se Joo paga dvida inexistente o credor no pode ficar com o dinheiro, e Joo ter direito repetitio indebiti ( = devoluo do indbito; em direito repetir significa devolver, e indbito o que no devido). Ento quem efetua pagamento indevido pode exigir a devoluo do dinheiro ( = repetitio indebiti) para que outrem no enriquea sem motivo. O credor de obrigao natural tem direito soluti retentio, mas quem recebe dvida inexistente no (ex: pago a meu credor Joo da Silva, mas por engano fao o depsito na conta de outro Joo da Silva, que ter que

devolver o dinheiro, 876). Na obrigao natural no cabe a repetitio indebiti, pois o credor dispe da soluti retentio. Falaremos mais de enriquecimento sem causa e pagamento indevido na aula 12. Em suma, a obrigao natural no se cumpre por bondade ou liberalidade ou doao, mas por um dever moral, e a moral influencia o Direito, tanto que a lei lhe atribui o efeito jurdico da soluti retentio. Falando de doao, vocs vero em Civil 3 que o donatrio deve ser grato ao doador, ento se Joo doa um carro a Maria, Maria lhe deve gratido pelo resto da vida, no podendo agredi-lo ou ofend-lo sob pena de perder a doao (557). Mas se por trs dessa doao existe uma obrigao natural, tal doao no se revoga por ingratido (564, III; ex: Joo deve dinheiro a Maria mas a dvida prescreveu, porm mesmo assim Joo resolveu pagar e doou uma jia a Maria; pois bem, caso Maria venha no futuro a agredir Joo, tal doao no se extinguir j que no foi feita por liberalidade, mas sim em cumprimento de obrigao natural). Finalizando, gostaria de transcrever a valiosa opinio de Washington de Barros Monteiro sobre a raridade da obrigao natural e a absurda proteo que a lei d ao devedor no nosso ordenamento: - numa poca em que a noo do prazo tende a desaparecer, substituda pelo esprito de moratria e pela esperana da reviso; em que o devedor conhece a arte de no pagar as dvidas e em que aquele que paga com exatido no dia devido no passa de um ingnuo, que no tem direito a nada; em que as leis se enchem de piedade pelos devedores e em que as vias judicirias se mostram imprescindveis como imposio ao devedor civil, aparece como verdadeiro anacronismo a obrigao natural, suscetvel de pagamento voluntrio, apesar de desprovida de ao (vide Direito das Obrigaes, 1 parte, Ed. Saraiva, 32 edio, pg. 215). CLASSIFICAO ou MODALIDADES DE OBRIGAES

1 Obrigao Natural (j vista)

2 Obrigao Alternativa

A obrigao simples s possui um objeto, mas a obrigao alternativa tem por objeto duas ou mais prestaes, mas apenas uma ser cumprida como pagamento. muito comum na prtica, at para facilitar e estimular os negcios (ex: vendo esta casa por vinte mil ou troco por terreno na praia; outro ex: um artista bate no seu carro e se compromete a fazer um show na sua casa ou a pagar o conserto; mais um ex: o comerciante que se obriga com outro a no lhe fazer concorrncia, ou ento a lhe pagar certa quantia; exemplo da lei: art. 1701, outro exemplo da lei, art 442). Caractersticas da obrigao alternativa: a) b) nasce com objeto composto, ou seja, duas ou mais possibilidades de prestao; o adimplemento de qualquer das prestaes resulta no cumprimento da obrigao, o que aumenta a chance de satisfao do credor, sem ter que se partir para as perdas e danos, caso qualquer das prestaes venha a perecer. Como o credor aceitou mais de uma prestao como pagamento, qualquer delas vai satisfazer o credor (253 e 256); a exonerao do devedor se d mediante a realizao de uma nica prestao. o devedor pode optar por qualquer das prestaes, cabendo o direito de escolha, de regra, ao prprio devedor (252); mas o contrato pode prever que a escolha ser feita pelo credor, por um terceiro, ou por sorteio (817); essa escolha chama-se de concentrao, semelhante a da obrigao de dar coisa incerta; ressalto todavia que no se confunde a obrigao alternativa com a de dar coisa incerta; nesta o objeto nico, embora indeterminado at a

c)

concentrao; j na obrigao alternativa h pelo menos dois objetos; d) se o devedor, ignorando que a obrigao era alternativa, fizer o pagamento, pode repeti-lo para exercer a opo. um caso raro de retratao da concentrao, e cabe ao devedor a prova de que no sabia da possibilidade de escolha (877). nas obrigaes peridicas admite-se o jus variandi, ou seja, pode-se mudar a opo a cada perodo ( 2o do art. 252). A doutrina critica essa mudana de prestao porque gera instabilidade para o credor.

e)

3 - Obrigao Facultativa

parecida, uma prima pobre, mas no se confunde com a obrigao alternativa. tambm muito rara, tanto que nosso Cdigo no reservou para ela um captulo prprio. Sua fonte est mais na lei do que no contrato, conforme exemplos que veremos abaixo. Ou seja, h casos especficos na lei que contemplam obrigaes facultativas, porque as partes dificilmente contratam prevendo uma obrigao facultativa. Conceito: aquela cujo objeto da prestao nico, mas confere ao devedor o direito excepcional de substitui-lo por outro. Exemplo: art. 1234, assunto de Civil 4, ento quem encontra coisa perdida deve restitui-la ao dono, e o dono fica obrigado a recompensar quem encontrou; mas o dono pode, ao invs de pagar a recompensa, abandonar a coisa, e a quem encontrou poder ficar com ela; pagar a recompensa a prestao principal do devedor, j abandonar a coisa prestao acessria do seu dono. O abandono da coisa no obrigao, mas faculdade do seu dono. Ao invs de pagar a recompensa, tem o devedor a faculdade de dar a coisa ao credor. Outro exemplo: art. 1382, assunto de Civil 5, ento imaginem que da Fazenda A sai um aqueduto para a Fazenda

B, levando gua, com a obrigao, ajustada em contrato, de que o dono da Fazenda A dever conservar a obra. Pois bem, ao invs de manter o aqueduto, tem o dono da Fazenda A a obrigao facultativa de abandonar suas terras para o dono da Fazenda B. Ao invs de conservar o aqueduto, o devedor tem a faculdade de abandonar suas terras, dando-as ao vizinho. Ao nascer a obrigao o objeto nico, mas para facilitar o pagamento, o devedor tem a excepcional faculdade de se liberar mediante prestao diferente. vantajosa assim para o devedor. Na obrigao facultativa, ao contrrio da alternativa, o credor nunca tem a opo e s pode exigir a prestao principal, pois a prestao devida nica e s o devedor pode optar pela prestao facultativa. Ressalto que a impossibilidade de cumprimento da prestao principal extingue a obrigao, resolvendo-se em perdas e danos, no se aplicando o art. 253, pois, como j dito, a prestao acessria no obrigao, mas faculdade do devedor. Ento quem encontrar coisa perdida e no receber a recompensa, no poder exigir o abandono da coisa, mas sim dever processar o devedor pelo valor da recompensa. Aula 7 Civil 2 Unicap

Classificao ou modalidades de obrigaes (continuao)

4 Obrigao divisvel e indivisvel

Em geral, numa obrigao existe apenas um credor e um devedor. Mas caso existam na mesma relao vrios devedores ou vrios credores, o razovel que cada devedor pague apenas parte da dvida, e que cada credor tenha direito apenas a parte da prestao. Essa regra sofre exceo nos casos deindivisibilidade, que veremos hoje, e de solidariedade, na prxima aula. Tanto na indivisibilidade

como na solidariedade, embora concorram vrias pessoas, cada credor pode reclamar a prestao por inteiro, e cada devedor responde tambm pelo todo (259 e 264). Comecemos pela divisibilidade e indivisibilidade: Obrigao divisvel aquela cuja prestao pode ser parcialmente cumprida sem prejuzo de sua qualidade e de seu valor (ex: uma dvida de cem reais pode ser paga em duas metades; um curso de Direito Civil pode ser ministrado em vrias aulas). Mas a depender do acordo entre as partes, o devedor deve pagar de uma vez s, mesmo que a prestao seja divisvel (314). J na obrigao indivisvel a prestao s pode ser cumprida por inteiro (ex: quem deve um cavalo no pode dar o animal em partes, 258; mas se tal cavalo perecer e a dvida se converter em pecnia, deixa de ser indivisvel, 263). Como dito, a indivisibilidade vai despertar interesse prtico quando houver mais de um credor ou mais de um devedor. - pluralidade de devedores: imaginem que um pai morre e deixa dvidas, seus filhos iro pagar estas dvidas dentro dos limites da herana recebida do pai (1792, 1997). Ento o credor do pai ter mais de um filho para cobrar esta dvida. Se a prestao for divisvel, cada filho responde pela parte correspondente a sua herana, e a insolvncia de um deles no aumentar a quota dos demais (257). Mas se a prestao for indivisvel, cada filho responde pela dvida toda, e aquele que pagar ao credor, cobrar o quinho correspondente de cada irmo (259 e p veremos sub-rogao em breve). A relao obrigacional antes era do credor com os filhos do pai morto, agora do irmo pagador contra os outros irmos. - e se a pluralidade for de credores? Sendo divisvel a prestao, cada credor s pode exigir sua parte (257). Mas sendo indivisvel aplica-se o 260, pelo que o devedor dever pagar a todos os credores juntos, para que um no engane os outros. Ou ento o devedor dever pagar quele credor que prestar uma garantia ( = cauo) de que repassar o pagamento aos outros (ex: Joo deve um carro a trs pessoas, mas no encontra os trs para pagar, assim, para se livrar logo daquela obrigao, paga ao credor que ofereceu uma fiana; se este credor no repassar o carro aos demais

credores, o fiador poder ser processado pelos prejudicados; fiana assunto de Civil 3). Se o devedor pagar sem as cautelas do art. 260, ter que pagar de novo quele credor que, eventualmente, venha a ser lesado pelo credor que recebeu todo o pagamento, afinal quem paga mal paga duas vezes, concordam? Diz-se por isso que o pagamento integral da dvida a um s dos vrios credores pode no desobrigar o devedor com relao aos demais concredores. Mas pagando o devedor corretamente, caber aos credores buscar sua parte com o credor que recebeu tudo (261). Tratando-se de coisa indivisvel (ex: carro, barco, casa), podero os credores usar a coisa em condomnio, ou ento vend-la e dividir o dinheiro (1320). Espcies de indivisibilidade: a) fsica: a prestao indivisvel pela sua prpria natureza, pois sua diviso alteraria sua substncia ou prejudicaria seu uso (ex: obrigao de dar um cavalo, obrigao de restituir o imvel locado, etc); b) econmica: o objeto da prestao fisicamente poderia ser dividido, mas perderia valor (ex: obrigao de dar um diamante, art. 87); c) legal: a lei que probe a diviso (ex: a lei 6.766/79, que dispe sobre o parcelamento do solo urbano, determina no art. 4, II, que os lotes nos loteamentos tero no mnimo 125 metros quadrados, ento um lote deste tamanho no pode ser dividido em dois); d) convencional: o acordo entre as partes que torna a prestao indivisvel (art. 88, ex: dois devedores se obrigam a pagar juntos certa quantia em dinheiro, o que vai favorecer o credor que poder exigir tudo de qualquer deles, 258 in fine, e 259). Percebe-se que qualquer das trs espcies de obrigao (dar, fazer e no-fazer) pode ser divisvel ou indivisvel (ex: dar dinheiro divisvel, mas dar um cavalo indivisvel; pintar um quadro obrigao de fazer indivisvel, mas plantar cem rvores divisvel; no revelar segredo indivisvel, mas no pescar e no caar na fazenda do vizinho divisvel). Aula 8 Civil 2 Unicap

Classificao ou modalidades de obrigaes (continuao)

5 Obrigaes solidrias

Como visto na aula passada, quando numa obrigao indivisvel concorrem vrios devedores, todos esto obrigados pela dvida toda, como se existisse uma solidariedade entre eles (259). Assim, se vrias pessoas devem coisa indivisvel, a obrigao tambm solidria. Mas pode haver obrigao solidria mesmo de coisa divisvel devida por vrias pessoas. Conceito legal: h solidariedade quando na mesma obrigao concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito ou com responsabilidade pela dvida toda, como se fosse o nico (264). As obrigaes solidrias e indivisveis tm conseqncias prticas semelhantes, mas so obrigaes diferentes, vejamos: - a obrigao indivisvel impossvel pagar por partes, pois resulta da natureza da prestao (ex: cavalo, lote urbano, diamante, barco, fazer um quadro, etc). J a obrigao solidria at poderia ser paga por partes, mas por fora de contrato no pode, tratando-se de uma garantia para favorecer o credor. Na solidariedade cada devedor deve tudo, na indivisibilidade cada devedor s deve uma parte, mas tem que pagar tudo diante da natureza da prestao. Pelas suas caractersticas a solidariedade no se presume, decorre de contrato ou da lei (265). Exemplo de solidariedade decorrente de lei a patroa que responde pelos danos causados a terceiros por sua empregada domstica (932, III, 942 e p). - pode haver obrigao solidria de coisa divisvel (ex: dinheiro), de modo que todos os devedores vo responder integralmente pela dvida, mesmo sendo coisa divisvel. Tal solidariedade nas coisas divisveis serve para reforar o vnculo e facilitar a cobrana pelo credor. - o devedor a vrios credores de coisa indivisvel precisa pagar a todos os credores juntos (260, I), mas o devedor a vrios credores solidrios se desobriga pagando a qualquer deles (269).

- se a coisa devida em obrigao solidria perece, converte-se em perdas e danos, torna-se divisvel, mas permanece a solidariedade (271 e 279). Se a coisa devida em obrigao indivisvel perece, converte-se em perdas e danos e os co-devedores deixam de ser responsveis pelo todo (263). - o devedor de obrigao solidria que paga sozinho a dvida ao credor, vai cobrar dos demais co-devedores a quota de cada um, sem solidariedade que no se presume (265 e 283). Ento A, B e C devem solidariamente dinheiro a D. Se A pagar a dvida toda ao credor, A vai cobrar a quota de B e C sem solidariedade entre B e C. Elementos da obrigao solidria: a) multiplicidade de credores ou de devedores, ou ainda, de uns e de outros; b) unidade de prestao; c) co-responsabilidade dos interessados.

5.1 - Solidariedade ativa Configura-se pela presena de vrios credores, chamados concredores, todos com o mesmo direito de exigir integralmente a dvida ao devedor comum (267). A solidariedade ativa rara porque na sua principal caracterstica est sua principal inconvenincia (269). Assim, o devedor no precisa pagar a todos os concredores juntos, como na obrigao indivisvel (260, I). Pagando apenas a um dos credores solidrios, mesmo sem autorizao dos demais, o devedor se desobriga, e se este credor for desonesto ou incompetente, e reter ou perder a quota dos demais, os concredores nada podero reclamar do devedor, tero sim que reclamar daquele que embolsou o pagamento. Mas caso algum dos concredores j esteja executando judicialmente o devedor, o pagamento dever ser feito ao mesmo (268), o que se chama de preveno, ficando tal credor prevento para receber o pagamento com prioridade em nome de todos os concredores. Outro inconveniente que se um dos credores perdoar a dvida, o devedor fica liberado, e os demais concredores tero que exigir sua parte daquele que perdoou (272).

Como se v, na solidariedade ativa cada credor fica sujeito honestidade dos outros concredores. Por estes inconvenientes a solidariedade ativa rara, afinal no interessa ao credor.

5.2 Solidariedade passsiva Esta comum e importante, devendo ser estimulada j que protege o crdito, refora o vnculo, facilita a cobrana e aumenta a chance de pagamento, pois o credor ter vrias pessoas para cobrar a dvida toda. E quanto mais se protege o credor, mais as pessoas emprestam dinheiro, e com mais dinheiro os consumidores se equipam, as lojas vendem, as fbricas produzem, os patres lucram, geram empregos e o governo arrecada tributos. Como se sabe: proteger o crdito estimular o desenvolvimento scio-econmico. Entendo at que, por isso mesmo, para proteger o crdito, a solidariedade passiva, no a ativa, deveria ser presumida. Violando o art. 265, o art. 829 acertadamente faz presumir a solidariedade passiva conforme ser visto em fiana. Conceito: ocorre a solidariedade passiva quando mais de um devedor, chamado coobrigado, com seu patrimnio (391), se obriga ao pagamento da dvida toda (275). Assim, havendo trs devedores solidrios, o credor ter trs pessoas para processar e exigir pagamento integral, mesmo que a obrigao seja divisvel. O credor escolhe se quer processar um ou todos os devedores (p do 275). Aquele devedor que pagar integralmente a dvida, ter direito de regresso contra os demais coobrigados (283). Na solidariedade passiva no se aplica o benefcio de diviso e nem o benefcio de ordem. O que isso? Pelo benefcio de diviso o devedor pode exigir a citao de todos os coobrigados no processo para juntos se defenderem. Isto ruim para o credor porque atrasa o processo, por isso a solidariedade passiva no concede tal benefcio aos co-devedores.

Pelo benefcio de ordem, o coobrigado tem o direito de ver executado primeiro os bens do devedor principal (ex: fiana, 827). Mas o fiador pode renunciar ao benefcio de ordem e se equiparar ao devedor solidrio (828, II). O avalista nunca tem benefcio de ordem, sempre devedor solidrio, por isso se algum amigo lhe pedir para ser avalista no aceite, mas se ele insistir seja seu fiador com benefcio de ordem, mas jamais fiador-solidrio ou avalista. Fiana e aval so exemplos de solidariedade passiva decorrente de acordo de vontades. Ento a Universidade quando financia o curso de um estudante, geralmente exige um fiador ou um avalista (897), de modo que se o devedor no pagar a dvida no vencimento, o credor ir processar o devedor, o fiador ou o avalista. Fiana ser estudada em Civil 3 e aval em Direito Empresarial. Exemplos de solidariedade passiva decorrente da lei esto na responsabilidade civil (932), no comodato (585) e na gesto de negcios (p do 867).