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ATUAÇÃO DA FAMÍLIA JUNTO AO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DOS FILHOS: UMA PROPOSTA PSICOPEDAGÓGICA Por MARTA MUNIZ DA GAMA ______________________ Monografia apresentada à UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES Como exigência do Curso de Pós-Graduação Em Psicopedagogia Junho/2003

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ATUAÇÃO DA FAMÍLIA JUNTO AO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DOS FILHOS:

UMA PROPOSTA PSICOPEDAGÓGICA

Por

MARTA MUNIZ DA GAMA

______________________

Monografia apresentada à UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

Como exigência do Curso de Pós-Graduação Em Psicopedagogia

Junho/2003

4

MARTA MUNIZ DA GAMA

ATUAÇÃO DA FAMÍLIA JUNTO AO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DOS FILHOS:

UMA PROPOSTA PSICOPEDAGÓGICA

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES RIO DE JANEIRO

Agradecimentos

5

Ao meu Deus, porque me sinto privilegiada por ter conseguido concluir a

Pós-Graduação. Muitos momentos difíceis passei, mas Jesus me sustentou durante

esse trabalho. Para mim foi algo marcante e gratificante.

As minhas filhas, Raphaelle, Rayssa, Rayanne e Rachel, que mesmo sendo

crianças sempre me apoiavam com a sua alegria.

Os meus alunos da 4a série e os seus familiares.

Todas as pessoas que estiveram diretamente ou indiretamente me ajudando e

auxiliando na conclusão da minha Monografia.

Marta Muniz da Gama

INDICE

6

Introdução ................................................................................................

Capitulo I – A Psicopedagogia e sua fundamentação .............................

Família na história ............................................................................... Relações Familiares, afeto e desempenho escolar ............................ Sujeito aprendente à luz de um novo olhar ........................................ Limite: existe o momento certo de aplicá-lo? ..................................... Em questão a criança: o desejo de querer e a possibilidade de ser ..

Capitulo II – Procedimentos Metodológicos ............................................

Resultados ......................................................................................... Relações familiares afetando o comportamento dos filhos ................ Ressignificando o sintoma na família ................................................

Capitulo III – Conclusões e Recomendações ..........................................

Recomendações aos Pais .................................................................

Referências Bibliográficas ........................................................................

Anexo I ....................................................................................................

Anexo II ...................................................................................................

05

081216273033

35364041

4447

49

51

52

4

INTRODUÇÃO

A atuação da família junto ao processo de escolarizacão dos filhos:

uma proposta psicopedagógia

Depois da família, é na escola que a criança permanece mais

tempo. Inicialmente, a escola surge como um jogo, no qual ela produz o

trabalho dos adultos. Em seguida, entre os sete e dez anos, na fase da

escolaridade, a criança desenvolve desejo de agradar, satisfações no

trabalho escolar, curiosidade, etc. (Piaget, 1998).

É importante também abordar a questão do relacionamento pais –

professores, que tem sido ponto de discussão em todas as instituições

escolares, com o objetivo de possibilitar, o crescimento do aluno como um

todo.

5

Sabemos que são inúmeros os fatores que interferem no

desenvolvimento de uma criança, principalmente, o familiar e o escolar.

Logo, a escola e os pais devem, juntos, permitir o aparecimento das

potencialidades do aluno.

A proximidade entre pais e professores só é positiva quando a

criança se desenvolve conforme o esperado por ambas as partes. Todavia,

quando a criança começa a manifestar dificuldades em alguma área, seja de

aprendizagem ou emocional, o relacionamento pode tornar-se conflituoso e

frustrante.

Crianças apresentando certas dificuldades podem gerar ansiedade

nos pais, professores, na coordenação e Direção da escola, etc.

Se os professores compreendem melhor a dinâmica que aflui na

relação professor-aluno-pais, possivelmente poderão criar expectativas mais

6

autênticas sobre o que podem esperar da ajuda dos pais, bem como lidar

melhor com a situação e assim, ajudar mais a criança em seu processo de

aprendizagem.

Algumas queixas como, desempenho escolar insatisfatório,

desmotivação, problemas de relacionamento escolar, entre outras, se

tornaram comuns no âmbito escolar.

Motivos estes que nos levaram a pesquisar sobre a atuação da

família no processo ensino-aprendizagem; já que a “culpa” sempre é

depositada na escola. Mas será que esta é a única culpada? E o papel dos

pais no ensino do seu filho? Devemos evitar direcionar o problema em

questão a apenas a um único culpado e passar a analisar o contexto numa

perspectiva mais ampla, “olhando” o sujeito como um todo e não em partes.

O objetivo principal deste estudo está em buscar com criticidade,

caminhos que nos conduzam a discutir a respeito da atuação da família junto

à Escola no que se refere ao acompanhamento do processo de

escolarização dos seus filhos numa abordagem psicopedagógica.

Pretendemos esclarecer as seguintes questões:

- o papel compete à família, cada um dos membros que compõem, tendo

uma atuação, assumindo papéis e trabalhando em função do

desenvolvimento saudável do seu filho. Por isso, a importância da família

estar integrada com a vida escolar dos filhos e com a escola, para terem

consciência do papel que devem assumir e trabalhar a partir dele.

- a segunda questão se refere a dinâmica da família e os tipos de

relacionamentos existentes entre pais e filhos, enfocando o processo

ensino-aprendizagem. Sabemos que a aprendizagem envolve o sujeito

como um todo, visto nos aspectos afetivo, cognitivo e social. Será que a

família tem procurado estimular seus filhos, oferecendo um ambiente que

propicie um desenvolvimento integral, atendendo o sujeito na sua

7

totalidade e que o estimule a buscar de forma prazerosa o novo, o

desconhecido?

Como Sinaliza Silva, ao conceituar o ser humano, “... um ser

pluridimensional com uma dimensão racional, uma dimensão afetiva

desiderativa e uma dimensão relacional, esta última implicando um aspecto

contextual e um aspecto interpessoal”. (1998, p.30)

- a terceira questão se refere a seguinte questão: como a

Psicopedagogia pode auxiliar a atuação da família junto ao processo

de aprendizagem dos filhos? Quando nos referimos ao fracasso

escolar, será que a “culpa” está localizada em um só contexto: a

escola? Como então prevenir tais “fracassos”, que só tiram da criança

o prazer de aprender, conhecer? E qual seria o papel da família junto

a aprendizagem de seus filhos?

Ao trabalharmos a questão da atuação familiar no processo de

aprendizagem, estamos nos referindo a sua postura frente à importância

do seu papel como primeira educadora e incentivadora para o

desempenho do filho na escola.

A essência deste estudo está em possibilitar e facilitar a

compreensão dos problemas que norteiam a práxis familiar.

Esta pesquisa tem como característica ser qualitativa e por se

tratar de um estudo que envolve observação e que tem como

instrumentos: entrevista e questionário, mais a análise desses

documentos, se trata de uma pesquisa qualitativa-etnográfica.

Compõe-se este estudo de três capítulos, assim distribuídos por

sessões: A Psicopedagogia e sua fundamentação; Família na história;

Relações familiares, afeto e desempenho escolar; O sujeito aprende à luz

de um novo olhar; Limite: existe o momento certo de aplicá-lo?;

Pensando as dificuldades de aprendizagem à luz das relações familiares;

8

Em questão a criança: desejo de querer e a possibilidade de ser; Relações

familiares afetando o comportamento dos filhos; Ressignificando o

sintoma na família.

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CAPÍTULO I

A Psicopedagogia e sua fundamentação

Inicialmente, a Psicopedagogia nasceu como uma ocupação

empírica pela necessidade de atender a crianças com dificuldades de

aprendizagem, cujas causas eram estudadas pela medicina e psicologia.

Com o passar do tempo, foi se tornando um “conhecimento independente

e complementar, possuidor de um objeto de estudo e de recursos

diagnósticos, corretores e preventivos próprios”. (Jorge Fasce, in Visca,

1987, p. 07).

Passou por três momentos históricos: o primeiro priorizava a

reeducação (objetivo de estudo: sujeito que não aprende); o segundo, o

não aprender é tido como carregado de significados (objeto de estudo:

sujeito aprendente); o terceiro (atual), concepção de aprendizagem a qual

participa desse processo um equipamento biológico com disposições

afetivas, intelectuais que interferem na forma de relação do sujeito com o

meio.

O corpo teórico da Psicopedagogia é influenciado pelas

seguintes áreas: Pedagogia, Psicologia, Psicanálise, Lingüística,

Fonoaudiologia e Medicina.

A Psicopedagogia, com seu caráter interdisciplinar, surgiu no

Brasil, justamente para clarificar este “não-aprender”. Resgatar no aluno

o prazer de aprender, em explicitar o porquê o aluno não aprende.

No início, o seu objetivo de estudo se resumia nos sintomas de

não aprendizagem. Dessa forma, o sujeito, o ser cognoscente, não era

10

visto como um todo, o lado afetivo, o social, o cognitivo... Havia apenas

a preocupação de analisar o seu “produto”, o sintoma.

No momento em que o sintoma passou a ser visto como um

valor

11

relativo, “a Psicopedagogia mudou de objeto. Não é mais o sintoma que

se visa, não é mais o desempenho, os bons e os maus resultados que se

considera, mas a gênese da aprendizagem”. (1997)

Golbert (1992), entende que o objeto de estudo da

Psicopedagogia deve ser entendido a partir de dois enfoques: o

preventivo e o terapêutico. O preventivo considera o ser “humano em

desenvolvimento”; focalizando suas possibilidades de aprendizagem

num sentido amplo. Não se restringindo apenas em uma área: a escola,

mas indo também na família, a comunidade. No segundo enfoque, o

terapêutico, identifica-se a causa, ou as possíveis causas do

comprometimento com a não aprendizagem, elaborando o diagnóstico

para que possa acontecer a superação da dificuldade instalada.

A Psicopedagogia Institucional propõe uma atuação preventiva

dentro do âmbito escolar no sentido de instrumentalizar a criança como

um todo, propiciando-lhe uma educação integrada que compreenda as

capacidades reais adequadas à própria proposta pedagógica. Geralmente

é praticada em grupo.

Já a Psicopedagogia Clínica, normalmente é praticada em

consultórios psicopedagógicos: o atendimento é geralmente individual,

se desenvolvendo sob diferentes modalidades de intervenção que

representam as teorias que a fundamenta. O trabalho clínico não deixa de

ser preventivo, uma vez que, ao tratar alguns transtornos de

aprendizagem, pode evitar o aparecimento de outros.

É importante ressaltar que o trabalho do psicopedagogo deve-se

restringir “apenas” ao campo cognitivo e social; quando o problema

ultrapassa o campo de aprendizagem, o sujeito deve ser encaminhado a

outro profissional.

12

Psicopedagogia é um campo do conhecimento onde se

interligam a Psicologia e a Pedagogia do sujeito que tem como

objetivo de estudo

a aprendizagem sistemática ou assistemática do sujeito em todos os seus

aspectos: afetivo, cognitivo, sócio-cultural.

Segundo Bossa: “A Psicopedagogia não é sinônimo de

Psicologia Escolar ou Psicologia Educacional. É uma área recente,

resultante da articulação de conhecimentos dessas e de outras

disciplinas, apontando como novos caminhos para a solução de

problemas antigos”. (1994, p.2)

O corpo teórico da Psicopedagogia ainda está em construção.

Ainda não é possível ser considerada um saber científico. Em relação a

esta afirmação, Mamede faz a seguinte colocação: “Para chegar a

grandeza de um saber científico, ela precisa ir além da mera

constatação de fatos que se agrupam sem grandes critérios críticos e

abandonar o nível de representações esquemáticas e sumárias formadas

apenas pela prática e para a prática. É necessário e imprescindível que

os dados coletados sejam efetivamente referenciados a um contexto

teórico tal, que permita a interpretação desses dados brutos e oriente a

investigação”. (Revista Psicopedagogia 21 SP-1991)

No momento, Silva (1998), num estudo recente feito a respeito

da fundamentação teórica da Psicopedagogia, defende que esta apresenta

13

seu objeto de estudo bem definido e como o mesmo se configura, não se

trata, simplesmente, de uma junção de ciências.

Segundo ela, a Psicopedagogia “é um campo do conhecimento

que, como o próprio nome sugere, implica uma integração entre a

Psicologia e a Pedagogia tendo como objeto de estudo o processo de

aprendizagem visto como estrutural, construtivo e interacional,

integrando nele os aspectos cognitivos, afetivos e sociais do ser humano.

(...) tem como objetivo, facilitar esse processo de aprendizagem

removendo os obstáculos que impedem que ele se faça”. (p.26)

No parecer de Visca, a Psicopedagogia é denominada

de

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Epistemologia Convergente, “uma conceituação da aprendizagem e suas

dificuldades em função da integração das contribuições das escolas

psicanalítica, piagetiana e da psicologia social”. Segundo ele, de acordo

com esta conceituação, é possível “compreender a participação dos

aspectos afetivos, cognoscitivos e do meio, que confluem no aprender do

ser humano”. (Visca, 1987, p.7)

15

Família na História

O papel da família é um assunto bastante discutido hoje nas

escolas por estar apresentando certas dificuldades de atuação para com

os membros que a compõe.

Sabe-se que a principal função da família é promover em seus

membros um crescimento sadio, possibilitando que este cresça com

autonomia e segurança.

A família representa o primeiro espaço que possibilita a

satisfação das necessidades básicas de seus membros, o desenvolvimento

da personalidade dos mesmos.

Segundo Minuchin, “a estrutura familiar é o conjunto invisível

de exigências funcionais que organizam as maneiras pelas quais os

membros da família interagem. É um sistema que opera através de

padrões transacionais”. (p.57)

Local onde se determinam os papéis, as funções de cada

membro, que variam de família para família. É onde ocorrem misturas de

sentimentos, ora de prazer, quando os membros têm suas necessidades

atendidas; ora de desprazer, de frustração, quando sente negado um

desejo seu. Nesta hora que se estabelecem as regras (limites) e onde os

pais aproveitam para deixar claros os papéis de cada um.

Desta forma, dentro de um grupo familiar existem subsistemas.

“Cada subsistema familiar tem funções especificas e faz exigências

específicas a seus membros; e o desenvolvimento de habilidades

interpessoais, conseguidas nestes subsistemas, está baseado na

liberdade do subsistema de interferências de outros subsistemas”.

(op.cit.p.59).

16

É importante perceber que a família está passando por profundas

transformações, principalmente a partir doas anos sessenta.

Essas

17

transformações, na realidade, redirecionam a vida do ser humano e da

sociedade para algo mais do que a simples imposição de valores, do que

é certo e errado.

O modelo de família que imperava até então, principalmente na

classe média, era o “tradicional”, composto de um pai, de uma mãe e de

um número considerável de filhos. Os papéis desempenhados pelos

diferentes membros dessa família eram bem determinados. Ao pai, o

provedor, competia o trabalho externo para garantir a subsistência

material e impor o respeito à ordem vigente na família. À mãe, os

cuidados da casa e dos filhos. A vida destes consistia, principalmente,

em estudar, brincar e ocasionalmente, executar algum trabalho em casa

ou fora.

Naquela época, em relação a televisão, poucas pessoas a

possuíam e esta não expunha as pessoas a assistirem cenas tão violentas

e de provocante sexualidade, como hoje mostra sem pudor algum, sendo

até denominada a “TV do bumbum”.

A evolução tecnológica do pensamento; as conseqüentes

transformações sociais e dos costumes, agiram sobre a estrutura da

família, provocando importantes transformações: o termo família deixou

de ser reservado ao conceito tradicional, sou seja, à família constituída

por pais casados e vivendo juntamente com seus filhos. A este conceito

forma, acrescentado aqueles resultantes das uniões de fato, as famílias

reconstituídas, as monoparentais, etc. A emancipação da mulher e sua

conseqüente integração no mercado de trabalho, que embora tenham sido

uma grande conquista para a mesma, não deixaram de produzir também

seus efeitos na família, a começar pelo fato de a mulher ter hoje, em

relação ao casamento, uma outra postura. O casamento não se apresenta

18

mais como única opção de vida para ela. São inúmeras as que optam

hoje pelo celibato, como já faziam muitos homens há tempos, seja em

função de uma

19

maior liberdade de ação, de uma maior possibilidade de realização no

campo profissional, ou mesmo em função da necessidade de manter um

certo trabalho.

Existem mesmo mulheres que fazem tal opção por entenderem

ser esta a única forma de não perder a individualidade. Entretanto, não

faltam aquelas que, sentindo com o passar do tempo a nostalgia da

maternidade, buscam outras formas de a exercer.

As mulheres não começaram a se rebelar e mostrar sua

capacidade a pouco tempo, já vem desde o século XVIII: “através dos

testamentos e dos processos de divórcio, mulheres de diferentes níveis

sociais trouxeram tensões para o casamento, provocadas por rebeldia

ou mesmo insatisfação”. (Samara, p.35)

A partir deste episódio foi possível encontrar na sociedade da

época e que repercuti até os dias de hoje, “(...) inúmeras mulheres com

participação ativa, quer na família, quer na sociedade, gerindo negócios

e propriedade de maior e menor vulto, assumindo a chefia da família e

trabalhando para a sobrevivência da sua prole”. (op.cit.35)

Lembramos aqui um outro fator que teve seu reflexo na atual

postura da mulher com o aparecimento e a difusão do divórcio, muitas se

viram em situação econômica difícil após a separação. Em vista dessas

ocorrências, são muitas as que buscam hoje, no trabalho profissional, não

apenas a satisfação própria, uma realização mais integral como pessoa

humana, a colaboração necessária com o orçamento doméstico, mas

também uma certa independência econômica.

Mas, a pressão estressante a que são submetidos hoje, ambos os

cônjuges, em razão ao trabalho profissional e ao longo tempo que

passam fora do lar em especial nos grandes centros urbanos, têm seus

20

reflexos na família, principalmente no que se refere à formação dos

filhos, que ficam, em

21

sua maior parte, confiada a terceiros. Tem-se mesmo notícias de crianças

que passam horas diante da televisão, recebendo todas as mensagens

negativas, destrutivas mesmo, sem passar por nenhuma espécie de

“crivo”, na ausência dos pais. Esse fato pode ter, bem o sabemos,

conseqüências seríssimas para a sua formação.

Os membros da família são pessoas que vivem no mundo, que

estão inseridas numa sociedade. Eles sofrem, pois, uma influência dessa

sociedade, cujas relações nem sempre são pautadas pelos princípios que

regem a vida de suas famílias. Essa influência que a sociedade exerce

sobre a família, através de seus meios de comunicação, dificulta

enormemente seu papel de formadora de pessoas, ela será tanto mais

desintegradora da família, quanto mais vulnerável esta for.

“(...) a família é uma instituição fundamental no processo de

socialização da subjetividade. Ela será de algum modo construída,

elaborada ou desenvolvida, dependendo do ponto de partida, em função

de certas agências, mediante determinadas instituições, e a família é

uma instituição privilegiada.” (Samara, 1985, p.80)

22

Relações Familiares, Afeto e Desempenho Escolar

Ao nascer, a criança apresenta seu aparelho psíquico numa

condição de total incompletude. Essa situação faz com que seu

desenvolvimento dependa das pessoas que fazem parte de sua vida.

A criança, assim como todos os demais membros da família,

necessita de seu grupo familiar para sobreviver, desenvolver todas as

etapas de crescimento e adquirir habilidades para sobreviver.

As necessidades atendidas primordialmente pela família são

aquelas relativas à sobrevivência que implicam na segurança física,

alimentação e moradia; ao desenvolvimento emocional e cognitivo de

seus membros mediante a transmissão de um senso de valor, de ser

aceito como realmente é, e de ser cuidado, e um senso de ligação afetiva

permanente.

O contexto social é essencial para definir-se características

estruturais e funcionais da família; portanto, ao se falar sobre

desenvolvimento, sobrevivência e necessidades, fala-se das finalidades

básicas da família, que variam em função da sociedade a que pertence.

De acordo com as idéias de Piaget, psicólogo suíço que se

dedicou ao estudo do desenvolvimento cognitivo de uma criança, o bebê

ao nascer, traz consigo uma carga genética que vai se aprimorando de

forma interacionista, ou seja, em interação entre o sujeito e o meio.

Logo, quanto mais a criança for sendo estimulada, mais adquirirá meios

para responder às solicitações do ambiente físico e social.

Seu desenvolvimento se processa de forma intrínseca, ou seja, de

dentro para fora.

23

“O desenvolvimento ocorre no sentido de o sujeito adquirir uma

determinada visão do mundo que o cerca, que lhe permita um estado de

adaptação e de equilíbrio em relação às situações as quais está

24

continuamente exposto. Isto é, assim como o organismo é

biologicamente dotado de estruturas e de um modo de funcionamento

destas estruturas que lhe permite procurar manter um estado de

conforto interno (homeostase), do ponto de vista da evolução mental irá

buscar conseguir também processos que lhe permitam manter-se em

interação harmoniosa com as solicitações advindas do mundo exterior,

qualquer que seja sua natureza”. (Rappaport, 1981, p.41)

O desenvolvimento do ser humano se dá em etapas, passo a

passo. Essas etapas são flexíveis e variam de criança para criança, pois

nenhum ser é igual ao outro. O que não pode ocorrer, com base nos

estudos de Piaget, é o pular de etapas, eliminando a anterior, visto que, a

criança depende dessa seqüência para que seu desenvolvimento seja

completo e se dê de forma harmoniosa.

A importância de se conhecer as etapas de desenvolvimento

cognitivo de uma criança, está na forma do adulto estimulá-la com

procedimentos adequados a sua faixa etária que corresponde a uma etapa

do desenvolvimento. Esta forma de proceder conduzirá a criança a

explorar o seu ambiente físico e social com mais vivacidade.

A primeira etapa, segundo estudos de Piaget, faz referência a

faixa etária de 0 a 2 anos, denominada sensório-motor. É a fase de

descoberta do próprio corpo, do domínio dos movimentos, aprendizagem

dos sentidos. Ocorre a imitação direta, a aprendizagem das primeiras

palavrinhas...

Esta etapa caracteriza-se por um conjunto de fases que se

relacionam, dependendo uma da outra.

Será apresentado, de forma resumida, as características

marcantes de cada etapa, possibilitando uma intervenção adequada.

25

- 1.ª Fase (1 mês) - Exercício, reflexo (sucção, preensão, visão...). Não

26

consciência do Eu (adualismo inicial).

- 2.ª Fase (4 meses) - Reações circulares primárias – formação dos

primeiros hábitos: repetição de comportamentos emitidos

casualmente pela criança, sempre voltado ao próprio corpo.

- 3.ª Fase (8 meses) – Coordenação de visão e preensão e começo das

reações circulares secundárias. A criança repete os comportamentos

que produziram certo efeito e o faz intencionalmente.

- 4.a Fase (11 meses) – Coordenações dos esquemas secundários com

utilização em certos casos. A criança que alcança um efeito e,

determinado comportamento, utilizará o mesmo esquema para

obtenção de um objeto novo.

- 5.ª Fase (18 meses) – Diferenciação dos esquemas de ação para

reação circular terciária. A criança tenta outros meios para atingir

seus objetivos.

- 6.ª Fase (2 anos) – Início da integração dos esquemas e solução de

alguns problemas após interrupção da ação e ocorrência de

compreensão súbita.

Inicialmente, este momento de descobertas pela criança

(coordenação dos movimentos, deslocamentos), está centrado no próprio

corpo, não se colocando em interação com o mundo a sua volta.

Gradativamente, a criança se percebe como um elemento entre

outros e descobre o objeto permanente, dá-se início a fase da

representação. Logo, conclui-se que a transição entre a inteligência

prática (sensório-motor) e a inteligência representativa se efetiva através

da imagem mental.

27

Na 2.ª etapa do desenvolvimento mental da criança, denominada

PRÉ-OPERATÓRIA, que se estende dos 2 a 7 anos (mais ou menos),

a criança que antes estava centrada nela mesma, volta-se

para a

28

realidade. Começa a falar, utiliza-se de jogos de faz-de-conta,

instalando o simbólico.

O quadro a seguir mostra, de forma clara, os fatos marcantes

para cada faixa etária, de acordo com esta nova etapa:

2 A 4 ANOS 4 A 5 ANOS 6 A 7 ANOS

• Função simbólica.

• Interiorização dos

esquemas de ação

em representações.

• predomina, nesta

fase, a transdução

(pré-conceitos sem

generalizações).

• Fase dos porquês.

• Configurações

estáticas

• Tipo dominante de

raciocínio e a

intuição.

• Regulações

representativas

articuladas.

• Fase intermediária

entre não

conservação e a

conservação.

• Início das ligações

entre estados e

transformações.

Flavell, 1998, (in Goulart) ao abordar a natureza do pensamento

pré-operacional, distingue algumas características, como:

a) Egocentrismo: a criança encontra-se centrada nela mesma,

apresentando uma certa dificuldade de expressar seu próprio ponto de

vista. “É uma disposição afetivo-intelectual que se apresenta sempre

que uma alteração da realidade social do sujeito não é acompanhada

da capacidade de representar tal realidade”. (p.32).

b) Incapacidade de descentração: a criança centra sua atenção numa

característica de determinado objeto/situação.

29

c) Estados X transformações: a criança não atingiu o conceito de

conservação e ainda não reconhece que um copo pequeno de leite tem

o mesmo volume, quer seja visto em um copo grande e estreito.

d) Ação: se efetiva a partir de imagens concretas.

e) Irreversibilidade: a criança ainda não se encontra amadurecida o

suficiente de raciocinar retrospectiva e prospectivamente no tempo

(reversibilidade).

A partir dos 7 anos, mais ou menos, a criança encontra-se em

uma outra etapa, denominada: OPERATÓRIO CONCRETO. Nesta fase

ela pensa logicamente sobre os objetos e não mais a partir das ações; o

que se evidencia na imitação, na memória – através dos desenhos,

imitação, linguagem, faz de conta...

Observa-se um espiral ascendente em relação ao

desenvolvimento da inteligência. Atingiu o conceito de conservação e a

possibilidade de pensar retrospectivamente e prospectivamente no tempo

(conquista muito importante nesta etapa).

Goulard, em seus estudos sobre Piaget, define esta etapa como

uma fase de transição entre ação e as estruturas lógicas. Resumidamente

cada uma seria caracterizada da seguinte maneira:

a) operações lógico-matemáticas: semelhanças (classes e relações

simétricas); diferenças (relações assimétricas) simultâneas; número;

objetos contínuos e descontínuos.

b) São formadoras da noção de objeto: conservação, matéria, peso,

volume, espaço (comprimento, superfície, perímetro, horizontais,

verticais).

30

Com toda esta estrutura desenvolvida e chegando a idade de 11

anos em diante, a pessoa se encontra no período das OPERAÇÕES

FORMAIS, o último na teoria do desenvolvimento mental de Piaget.

Este período tem por característica marcante a capacidade de

hipotetizar. A pessoa é capaz de raciocinar indutiva e dedutivamente,

baseada numa determinada proporção, coisa ou propriedade abstrata.

A fala desenvolve-se tornando-se mais estruturada e há um

domínio

31

completo das estruturas lingüisticas.

Como já pudemos observar anteriormente, a criança necessita de

todos os membros de sua família para sobreviver, desenvolver todas

as suas etapas de crescimento, e adquirir habilidades que a tornará capaz

de se separar e individualizar.

Após o nascimento, sofre “agressões” constantes que geram

angústia. Então a criança chora, comunicando essa angústia e começa a

descobrir formas de diminuir essa ansiedade. Por isso, é indispensável

que esta cresça num ambiente favorável com carinho, proteção...

A princípio, a família atende a duas necessidades primordiais ao

desenvolvimento da criança, que são: questão da segurança física,

alimentação e moradia; a segunda refere-se ao desenvolvimento

emocional e cognitivo de seus membros mediante a transmissão de um

senso de valor, de ser aceito como realmente é, de ser cuidado e um

senso de ligação afetiva permanente.

Os primeiros dias de uma criança, é de total dependência para

com sua mãe. Ambos constituem uma simbiose “mãe-bebê” (Mahler,

1963). Esse período possui uma importância enorme para uma

estruturação saudável da criança, pois esta está envolvida de afeto e tem

suas necessidades saciadas de forma imediata. Exemplificando: ao

chorar, a mãe logo lhe oferece o seio (seu objeto de prazer e satisfação).

Nesta fase, o bebê não se diferencia da mãe, ainda não possui

uma idéia formada do “eu - não eu”.

O desenrolar desta relação vai se tornando mais conflituosa, a

partir do momento em que a mãe passa a se “distanciar” um pouco,

deixando que a criança vá tendo contato com o meio por ela mesma. Até

32

pelo fato da mãe, que trabalha fora, ter que trabalhar, deixando-a um

período do dia com uma substituta.

33

Encontra-se neste episódio um momento de frustração da

criança. A maneira como esta se comporta na ausência de sua mãe, vai

refletir na relação saudável ou não de ambas.

Segundo Mahler, “se a mãe estiver “tranqüilamente disponível”,

com imediata oferta de libido objetal, se partilhar das explorações

aventurosas do filho, se corresponder alegremente e, desse modo,

auxiliar suas tentativas de imitação e identificação, o relacionamento

entre mãe e bebê progride até o ponto em que sobrevem a comunicação

verbal, embora predominando ainda a mímica, isto é, a conduta afeto-

motora. A vaticinada participação emocional da mãe parece facilitar o

rico desenvolvimento dos processos mentais do bebê”. (1963, p.20)

Neste recorte, o papel da mãe é em ser “suficientemente boa”, ou

seja, é aquela que se ajusta quase totalmente a suprir as necessidades da

criança, pois ela gera a satisfação e a desilusão, fundamentais para a

estruturação da personalidade.

Segundo Winnicott: “a mãe suficientemente boa começa com

uma adaptação quase completa às necessidades de seu bebê, e à medida

que o tempo passa, adapta-se cada vez menos completamente, de modo

gradativo, segundo a crescente capacidade do bebê em lidar com o

fracasso dela”. (1975, p.25)

Por isso é fundamental que a mãe vá se distanciando aos poucos

e não provoque uma ruptura brusca. Este tipo de comportamento pode

gerar muita ansiedade na criança, tornando-a agressiva e levando-a a

procura de substituições, denominado por Winnicott como o “objeto

transicional”.

34

A criança quando se sente “desprezada” pelo seu outro eu (a

mãe), esta se torna perseguidora da mesma. Isto vem retratar o lado

negativo da frustração, como foi mencionado anteriormente.

35

“A “perseguição” torna-se apelo desesperado e contínuo. O

bebê exclui agressivamente qualquer outra atividade objetivo-dirigida

ou substitui a pessoa que conforta por qualquer outra que não a mãe”.

(Mahler, 1963, p.21)

Se por acaso, este tipo de comportamento não for bem

conduzido, neutralizado, pode gerar um certo desequilíbrio na

estruturação do ego da criança, podendo gerar um “conflito

intrapsíquico”.

O comportamento de certo modo estereotipado, como arremessar

coisas, bater, ... logo aparece. Se tal conduta agressiva, difusa e atípica

não for neutralizada pelo amor objetal, pode levar o bebê, muito cedo a

voltar sua agressão contra o próprio corpo.

A criança investe libido no seu objeto transicional.

O objeto é tratado pela criança como algo criado por ela e passa

a perceber que é algo do seu NÃO – EU, sentimento de posse:

proporcionando-lhe segurança.

Freud foi um grande estudioso do psiquismo infantil e

evidenciou que o ser humano, desde a mais tenra idade, busca conhecer

o mundo que o cerca; particularmente os objetos vinculados a seus

desejos.

Enquanto Piaget baseou seus estudos no desenvolvimento

adaptativo e de interação do sujeito com o meio; Freud se dedicou a

conhecer o sujeito como ser sexuado, em constante busca de satisfazer

sua libido.

Segundo Freud, o desenvolvimento da criança está agrupado em

cinco fases que se complementam. Trataremos, de forma bem resumida e

clara, cada uma delas.

36

A primeira é a fase oral (nascimento até 1 ano) – ao nascer a

estrutura mais desenvolvida é a boca. É através da boca que a

criança

37

conhece o mundo e faz sua primeira descoberta importante: o seio

(afetividade). Quando há alguma ruptura em ter o seu “seio” para

satisfazer seu prazer, este é substituído por qualquer outro objeto,

levando-o a boca como forma de substituição.

A fase anal (mais ou menos 1 ano até 3 anos) – a criança começa

a organizar sua psicomotricidade de base. É o período em que se inicia o

andar, o falar e se estabelece o controle de esfíncteres.

A mão passa do rateio e busca desenvolver grande precisão na

pinça indicador-polegar (educação infantil).

Este período é denominado de fase anal, porque a libido passa a

organizar-se sobre a zona erógena anal. A fantasia básica será ligada ao

primeiro produto (fezes) e poder controlar o mesmo onde verificamos a

projeção e o controle.

Quando a criança ama e se sente amada pelos pais, cada

elemento que a mesma produz, é sentido como bom e valorizado. Da

mesma forma acontece no período da pré-escola, onde a criança começa

a construir seus primeiros passos de conquista, desta forma tudo que

constrói, recebe de informações faz com que viva sua atividade (relações

externas e internas), liberdade – tentar expressar o que é, autoridade –

começa a coordenar o prazer, deveres e direitos começa a trabalhar a

criatividade para um futuro, isto é, começa a correr em busca do que

deseja.

Neste momento, a escola e os pais precisam estar bem

integrados, para contribuir nesse processo de aprendizagem e limite.

Pois, da mesma forma que faz o controle dos esfincteres, ela também

pode querer controlar seu mundo de forma errada. Desta maneira e neste

38

momento, a criança começa a viver os processos de indiferenciação,

diferenciação, separação, integração, respectivo a sua idade.

Freud coloca que neste período, o menino começa a ter medo

da

39

castração, se unido ao pai com medo que o mesmo o castre e começa a

se tornar agressivo com a mãe. Porém, numa família bem equilibrada,

esse período passa sem deixar seqüelas.

Fase Fálica (3 até 5 anos) – é a fase que começa a descoberta dos

órgãos genitais, onde o menino descobre o pênis e a menina acha que

ainda crescerá o pênis nela. Mas, à medida em que o desenvolvimento se

processa, a percepção correta da realidade confirmará aos olhos infantis,

que só o homem é portador de pênis ficando a mulher castrada. Nesta

fase começa a procura pelo sexo oposto.

Também verificamos quando estão brincando juntos, a relação

de quem domina e de quem é dominado, fazendo uma analogia na sua

fantasia, passa o quem castra e o que é castrado.

Nesta fase, as brincadeiras de casinha (pai e mãe) são assumidos

e verdadeiros no marido da sua mãe ou a esposa de seu pai em suas

fantasias. Dá-se o início ao que Freud denominou Complexo de Édipo

(menino) e Electra (menina), ou seja, sempre tem a entrada de um

terceiro mais forte com que a criança não poderá lutar e a mesma se

sentirá castrada. Neste momento, a criança reprime esta atração

caracterizando a etapa fálica infantil.

Mas o modelo de busca de um amor heterossexual foi

estabelecido e será posteriormente retomado com a adolescência.

A quarta fase é denominada de latência, ela acontece com as

crianças entre os 12 anos. Esta fase é intermediária entre a fálica e a

genital. Neste momento nossas crianças estarão com sua energia voltada

mais para a vida social, escolaridade e começando a buscar toda sua

energia para viver momentos importantes durante o período da

40

puberdade. Desta forma este processo de canalizar sua energia para as

realizações sociais, chamamos de sublimação.

41

A última fase, a genital, é onde se passa a puberdade e o

adolescente começa seus encontros com o sexo oposto. Suas relações

sexuais, suas buscas de trabalho...

42

Sujeito Aprendente a Luz de um Novo Olhar

A preocupação com a inteligência já existia na Antiga Grécia,

com o surgimento dos filósofos.

De acordo com a época e estudiosos, a inteligência passou a ser

vista por prismas distintos: ou sua aquisição era de acordo com a carga

genética (inatismo) ou então, a vida mental de um indivíduo dependia da

atuação do meio, particularmente da percepção (empirismo).

Com o passar do tempo, foi possível medir a inteligência, através

de testes que forneciam o quoeficiente intelectual, o QI. Este teste,

contudo, limitava a ver o sujeito aprendente em apenas duas

inteligências: a lógico-matemática e a linguística.

Piaget (1993), através de suas pesquisas, trouxe idéias novas a

respeito do sujeito aprendente, em relação ao processo de construção da

inteligência. Defendia que a inteligência não era estática, mas que se

desenvolvia, passando por diferentes estágios, que se caracterizavam por

tipos de respostas lógicas que a criança emitia frente às situações

desequilibradoras. Estes estágios correspondiam aproximadamente

determinadas faixas etárias da criança. O pensamento infantil era

qualitativamente diferente do pensamento adulto, idéia esta que

contradizia à idéia dominante de até àquela época dos estudos de Piaget

de que a criança era uma adulto em miniatura.

Para Piaget (1993), a construção de um novo conhecimento se

realiza a partir da interação do organismo com o meio, e nessa interação

ambos exercem influência. Isto gera conflitos no sujeito e este, por sua

vez, gera mudanças e novas elaborações (visão interacionista).

43

Nos últimos anos, o pesquisador e psicólogo norte-

americano

44

Gardner (1995), defensor das idéias piagetianas, vem desenvolvendo

uma teoria que busca explicar o conceito de inteligência. Trata-se das

Inteligências Múltiplas (TIM).

Gardner (1995) propõe que a inteligência se constitui num

potencial biológico e psicológico e que este potencial se realiza, mais ou

menos, como conseqüência de experiências e fatores culturais e

motivacionais que afetam as pessoas. A cultura influencia mais uma

parte do cérebro que outras, e desenvolve uma área de pensamento que

varia de país para país, dependendo dos fatores sócio-históricos e

culturais também.

A escola tem a sua própria cultura. Ela define inteligência como

a capacidade para resolver problemas ou criar produtos que sejam

válidos ou aceitos em um ou mais ambientes culturais. Seguindo esta

linha, muitas vezes a família acaba por estimular apenas um tipo de

inteligência, eliminando outras que descobre no seu filho. Mas como a

escola, o meio social valoriza o raciocínio, a família se sente coagida e

temerosa, desejando sempre a aprovação de seus filhos.

Gardner (op.cit.) sugere que há em todos os sujeitos, pelo menos,

sete inteligências, relativamente autônomas, que se desenvolvem e se

combinam entre si, numa multipluralidade. Elas possuem um

funcionamento próprio, funcionamento este que não é independente e

nem isolado, mas que se desenvolvem e se combinam entre si.

Os tipos de inteligência são: a lógico-matemática (capacidade de

raciocínio e compreensão de modelos matemáticos); lingüística (domínio

da expressão através da linguagem verbal); espacial (sentido de

movimento, localização e direção); musical (domínio da expressão

através de sons); cinestésica (domínio dos movimentos do corpo);

45

intrapessoal (capacidade de auto-compreensão e conhecimento de si

mesmo) e interpessoal (capacidade de se relacionar com o outro).

46

Esta visão ampla e integrada da inteligência obriga o educador a

repensar sua prática e os paradigmas que nortearam e norteiam a

educação neste século. Lançando um desafio, que é o de passar para os

pais formas de estimularem os outro tipos de inteligência que seu filho

possa apresentar, visto que, a família está a mais tempo com eles.

Todos os seres humanos possuem possibilidades e limitações.

Cabe aos pais, em parceria com o professor, buscar identificar as

diferenças, procurando ajudar seu filho a desenvolver “todas” as

inteligências, proporcionando um ambiente que favoreça esse

desenvolvimento.

Conforme o sujeito for amadurecendo sua forma de pensar, lhe

será possível descobrir seus pontos fortes, para os quais sinta mais

habilidade de desempenho e, consequentemente, prevaleça o seu

potencial criador. Caberá aos pais e professores ajudá-lo a desenvolver

essas habilidades, incentivando-o e criando situações estimuladoras. O

sucesso das pessoas depende dos pontos fortes delas e não apenas de

suas fraquezas. Resgatando no sujeito aprendente o prazer de conhecer o

novo, de aprender.

47

Limite: Existe o momento certo de aplicá-lo?

A criança, no início de sua vida, nos seus primeiros contatos

com a mãe, não se diferencia do mundo externo que está a sua volta.

Tudo faz parte de seu mundo.

Piaget (1993), caracterizou a fase de desenvolvimento da criança

até aproximadamente 5 ou 6 anos de fase egocêntrica; e a criança

conserva seu estado de onipotência, que inconscientemente ela sustenta

desde seu nascimento. Nesta fase a criança dá mais valor às suas idéias,

além de querer as coisas para si. O limite entre o que é seu e o que é do

outro não se estabelece prontamente. É nas trocas interpessoais que ela

irá percebendo o que pode, o que deve, quando deve, quando pode:

querer e poder situando-se no interjogo pessoa/pessoa.

Segundo Vygotsky (1995), a aprendizagem se realiza pela

mediação de um adulto ou de uma outra criança ou jovem, que atuando

na zona de desenvolvimento potencial, vão ajudando a criança a

estabelecer o limite, as aprendizagens e suas potencialidades. Essas

aprendizagens de limites começam na maternagem, nas primeiras trocas

mãe/bebê, marcadas pela ação de um ser que está inteiramente movido

pelo reflexo e por um adulto (mãe) consciente de seu papel de ensinante.

Quando iniciamos um trabalho com crianças, o dar limites é

essencial para lhes mostrar que nem tudo podemos ter na hora em que

desejamos. Estas idéias nos transportam a Winnicott (1982), quando se

refere a mãe suficientemente boa, aquela que estabelece, na relação com

o filho, o momento do “eu quero e posso” e do “eu quero, mas não

posso”. A mãe suficientemente boa é a que trabalha o princípio de

48

realidade de forma, embora frustrante, mas equilibrada, no sentido de

minimizar a ilusão da

49

onipotência do filho.

É importante, no entanto, que transmita segurança para a criança,

pois ela necessita confiar.

É a partir desta mãe suficientemente boa que atitudes diante do

mundo, valores e a própria personalidade da criança vai se construindo.

Desta forma, mãe educadora, professora / educadora, em suas

atuações, devem se portar com clareza, num interjogo em que a diferença

se estabeleça.

Se a criança tem tudo a tempo e hora que deseja, sem que se

estabeleça limite algum, não conseguirá vivenciar a angústia da espera,

da perda, da falta, pois não foi preparada para este tipo de sentimento. na

aprendizagem o que nos move a aprender é o que falta ao nosso saber. O

sentimento de busca, do esperar, do buscar por si próprio para encontrar

o caminho, é vivido em cada indivíduo, e se estrutura dentro do princípio

de realidade.

“O educador é aquele que deve buscar, para seu aluno o justo

equilíbrio entre o prazer individual (prazer inerente à ação das pulsões

sexuais) e as necessidades sociais (a repressão e a sublimação dessas

pulsões)”. (Freud. In: Kupfer, 1995, p.52).

A criança, desde pequena, deve aprender a esperar para que sua

vontade seja atendida, para que se crie o espaço de pensar o seu próprio

desejo e caminhe em busca de sua realização de forma saudável ao seu

desenvolvimento.

Segundo Madalena Freire (1992), “o educador educa a dor da

falta, cognitiva e afetiva, para a construção do prazer. É da falta que

nasce o desejo. Educa a aflição da tensão da angústia de desejar. Educa

a fome do desejo”. (p. 158).

50

Não podemos porém, misturar proibição e limites. Proibição,

muitas

51

vezes são utilizadas porque as pessoas não sabem porque as pessoas não

sabem explicar o porquê; estão proibindo e simplesmente dizem não,

conduzindo, desta forma, um relação de autoritarismo com a criança,

sem que esta possa argumentar para que hajam trocas.

A criança de 5 a 7 anos já elabora regras e aprende que elas

existem para serem respeitadas nos jogos ou no próprio convívio com

crianças ou adultos, refletindo, principalmente a lógica de sua faixa

etária.

A compreensão e o respeito às etapas de desenvolvimento da

criança para chegar a idade adulta, proposta por Piaget, é de fundamental

relevância para um crescimento saudável e produtivo.

“A descrição de cada um dos níveis de desenvolvimento é

ilustrada por respostas típicas, apresentadas pelos sujeitos classificados

neste ou naquele nível. Tem-se, assim, um inventário completo de como

a criança passa de um nível ao seguinte, e a razão dos diferentes níveis

na construção daquela noção”. (Macedo, 1994, p.47)

As famílias que se organizam em função de somente atender aos

desejos da criança, com medo de causar-lhe “bloqueios, traumas”, estão

deixando de lado a questão do limite, estão formando cidadãos que não

aprenderam a respeitar o espaço do outro. A essência da educação está

em assumir uma atitude de dar liberdade com responsabilidade,

esclarecendo sempre as razões que o levam a adotar o limite, frente ao

direito do aluno.

Estabelecimento do limite faz parte da educação da geração mais

velha sobre a mais nova, do processo civilizatório e ela se processa

apoiada numa escala de valores. Essa escala de valores varia de

sociedade para sociedade.

52

53

Em Questão a Criança:

O desejo de querer e a possibilidade de ser

Cada grupo familiar introduz expectativas e valores sobre como

o filho deve ser, como deve se comportar e passa, mesmo sem o saber, os

sonhos sobre a vida profissional futura da criança. Desde seu nascimento

começam as profecias, os mandatos, as comparações, as lealdades, os

segredos. Todas estas situações marcam profundamente o

desenvolvimento futuro da criança, impondo-lhe tarefas que estão em

desarmonia com suas capacidades, aptidões ou mesmo desejos.

Para que uma criança aprenda é necessário que ela tenha o

desejo de aprender. E que, sobretudo o desejo dos pais a autorizem.

Desde bem cedo, é colocado para a criança que se espera que ela

seja bem sucedida. Desde a educação infantil, os pais se inquietam com

as performances intelectuais de seus filhos e suas possibilidades de

sucesso. Quando o sujeito não corresponde a este panorama para ele

imposto, aparece o chamado sintoma. O traço do sintoma tem

significações múltiplas e para ser bem compreendido deve ser avaliado

sistematicamente, isto é, considerando-se o contexto mais amplo no qual

está inserido e sua forma relacional de se expressar.

“A criança, ao nascer, instala-se em uma constelação de

significações. Vêm preencher muitos desejos, carências, objetos dos

pais. É lhe designado um nome, seja um nome da moda, o do pai... A

criança terá que se inserir no lugar que o nome signifique“. (Fernandez,

1991, p.41)

Sintoma pode ser definido como uma mensagem que emerge em

determinada circunstância e que tem uma função para aquele sistema.

54

Em busca de homeostase, o sintoma na família adquire um significado

de funcionalidade, onde segundo Alicia Fernandez, a impossibilidade de

simbolizar é que opera na sua base.

Procurar compreender o sintoma é antes de tudo, tentar explicar

os significados que aprender e não aprender tem para a família, e mais

ainda, buscar as relações vinculares, os mitos, segredos e lealdade

que muitas vezes estão engajados no processo dando-lhes sustentação.

Quando se trata de uma criança cujo sintoma é dificuldade de na

parendizagem tenta-se buscar, além dos padrões de interação do grupo

familiar, a modalidade de aprendizagem que opera no sistema.

Alicia Fernandez observou que cada família tem uma

modalidade de aprendizagem, que seria a maneira pela qual cada grupo

familiar se aproxima (ou se afasta) do saber. Esta modalidade seria

passada de pai para filho determinando assim, como as gerações mais

novas vão se relacionar com o conhecimento. A modalidade de

aprendizagem faz parte da história pessoal de cada sujeito, mais é na

família que ela vai se constituir, obedecendo à dinâmica imposta pelo

grupo. “A modalidade opera como uma matriz que está em permanente

reconstrução e sobre a qual vão se incluindo as novas aprendizagens”.

(Fernandez, 1991, p.116)

Embora dificuldade da Aprendizagem seja uma condição ligada

a múltiplos fatores internos do sujeito, ela está sobremaneira pelo meio

familiar – social – escolar – ao qual o sujeito está inserido, e ainda, que a

forma como a família lida com esta dificuldade terá um papel decisivo

na condução e na evolução do problema.

55

CAPÍTULO II

Procedimentos Metodológicos

Este estudo baseia-se em uma pesquisa Qualitativa, na qual

enfatizará as questões ligadas à famíla, Psicopedagogia e aprendizagem.

Será um estudo de caso numa 4.ª Série do ensino Fundamental

numa Escola particular do Município de Duque de Caxias.

Segundo Bogdan e Biklen (in Lüdke, 1986) a pesquisa envolve:

“a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do

pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o

produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes”.

(p.13)

Os instrumentos utilizados para a obtenção dos dados, foram:

observação, entrevista (anexo) com os pais e questionário (anexo) para

os alunos.

As respostas foram analisadas e organizadas em forma de texto,

abrindo uma nova sessão.

56

Resultados

Para um estudo mais aprofundado sobre os aspectos relacionais

(pertinentes) a atuação da família no processo ensino-aprendizagem,

promoveu-se uma pesquisa direcionada, tendo como cenário o Colégio

Santo Antônio, localizado em Duque de Caxias. Sendo o pessoal

entrevistado oriundo desta escola, tendo os seguintes sujeitos

entrevistados: alunos das 4.as séries do turno da tarde, 85 crianças no

total, e seus respectivos pais/responsáveis.

As pesquisas foram elaboradas de forma a obter-se de maneira

simples e precisa a importância que a família atribui ao

acompanhamento de seu filho no processo de aprendizagem, qual o tipo

de postura é adotada por ela em relação aos seus filhos, quanto ao

acompanhamento da vida escolar; verificar até que pondo esse “olhar”

dos pais sobre as produções dos filhos contribui para uma aprendizagem

mais estimulante.

A seguir estão registrados os principais pontos colhidos por esta

pesquisa realizada com os alunos da 4.ª Série.

ALUNOS DA 4.ª SÉRIE

Em relação aos resultados da entrevista realizada com os alunos,

a maioria aponta como conceito de família, “a união de pessoas que se

amam, respeito, dedicação, responsabilidade, esforço e acima de tudo

amor”; “refúgio depois da tempestade, amor infinito”; “companheirismo

e bastante amizade”; “um tesouro da vida que ilumina tdos nós, igual a

um sol”.

57

As crianças vêem suas famílias como o princípio de tudo, a coisa

mais importante que elas possuem.

De acordo com a realidade em que nós vivemos, os pais têm

passado algumas dificuldades para educarem seus filhos. Os alunos

quando

58

foram questionados a respeito deste assunto, mostraram bastante clareza

e atualidade sobre a questão: a situação financeira, drogas, assaltos,

assassinatos, desunião da família. Um fato que despertou atenção, foi a

questão de um grupo considerável de crianças, apontarem a rebeldia

delas mesmas como uma grande dificuldade para os pais.

Alguns deles até colocaram questões relacionadas ao seu

contexto escolar, como uma das dificuldades que os pais enfrentam para

educá-los como: preocupação em estar corrigindo os erros, olhar os

materiais, ver o comportamento, pois o tempo é curto; a falta de interesse

dos filhos pelos estudos.

Hoje, devido à situação econômica do nosso país, a maioria dos

pais se vê obrigado a trabalhar, para ter condições de propiciar uma boa

escola para seus filhos, boa alimentação, conforto... e o corre-corre passa

a ser inevitável para os pais darem conta de tudo.

Por outro lado, a questão do tempo se torna um obstáculo entre

pais e filhos. Os filhos se sentem sozinhos, principalmente, quando o

assunto é a escola, já que eles gostam que seus familiares valorizem suas

produções.

Vejamos alguns depoimentos dos alunos para elucidar esta

questão: “Um pouco ruim, pois eles trabalham desde cedo e faço tudo

sozinho”; “Eles ficam fora o dia todo e à noite eles chegam e perguntam

o que se eu fiz o dever”; “Meu pai não mora comigo, e minha mãe não

olha o meu material porque não tem tempo. Ela trabalha de meio-dia até

às dezessete horas e quando chega, está muito cansada”.

Já um outro grupo em que os pais são presentes, acompanham

seus filhos, valorizam suas produções, as crianças apresentaram uma

relação muito positiva com a escola e com o aprender. Vindo reforçar a

59

impotância que os pais exercem na vida escolar da criança. Elas se

sentem mais protegidas e confiantes quando se deparam com o

novo, o

60

desconhecido.

Quando os alunos foram questionados a respeito do

posicionamento em relação às tarefas escolares e o desinteresse dos

filhos nos estudos, a maioria foi unânime em apontar que muitas vezes o

desinteresse pelo estudo é devido a falta de incentivo dos pais. Alegaram

que se os pais não olham o material, não demonstram interesse pelo seu

desempenho na escola, então não há motivo para que se dediquem e

fiquem “perdendo tempo” em estudaer e fazer coisas bonitinhas.

Outros alegam que a separação dos pais afeta muito a mente

delas, dificultando a aprendizagem.

Quanto à preocupação dos pais com os filhos a maioria das

crianças sente que seus pais estão muito preocupados com o futuro delas,

mas a questão do tempo para o diálogo, para o contato com o filho, ainda

é muito cobrada por elas.

Tem pais que possuem muitas tarefas e só têm tempo para o

filho no fim de semana; e assim, acabam ficando a semana toda sem

falar direito com o filho e às vezes, nem têm contato devido ao horário.

Alguns dados da pesquisa apontam para a necessidade que as

crianças têm de se sentirem “olhadas” pelos pais. De sentirem suas

produções valorizadas. Caso contrário, o desânimo passa a fazer parte de

seu dia-a-dia.

PAIS / RESPONSÁVEIS DOS ALUNOS DA 4.ª SÉRIE

Os resultados da entrevista com os pais mostram que a maioria

das famílias tem consciência da importância que eles têm na vida escolar

dos filhos, principalmente como incentivadores no processo de

61

aprendizagem; e que, infelizmente, nos últimos anos, a família está

perdendo seu verdadeiro

62

valor, perdendo-se no estabelecimento dos limites. Em algumas famílias,

está clara a ausência da figura paterna, na qual a mãe tem assumido os

dois papéis: o de mãe e o de pai...

Os pais, por estarem mais tempo fora de casa, acabam se

sentindo culpados e passam a permitir tudo aos filhos, ou então, se

tornam ausentes, bem distanciados dos filhos, por estarem cansados e/ou

com pouco tempo para participarem de atividades extra-escolares nas

quais estão envolvidos.

Atualmente, as crianças têm tudo muito fácil e sem

questionamentos por parte dos pais. Muitos até fazem questão de

matricular seus filhos em cursinhos e no esporte, mas um grupo

significativo, não demonstra interesse, apenas cumpre com sua

obrigação, pagando a mensalidade, mas nào reserva um tempinho para

participar.

Algumas famílias mantêm o hábito de ajudar seus filhos nas

tarefas escolares, enquanto outras delegam a responsabilidade para eles,

sem se envolverem ou para a própria escola.

Também se observou que alguns pais que foram convidados a

comparecer à escola para participarem da entrevista e que confirmaram

presença, não compareceram. Ao analisar os filhos dos respectivos pais

faltosos, constatamos que essas crianças eram justamente, as que

apresentavam as seguintes características: timidez, desinteresse, pouca

organização com o material, pouca estimulação, uma aparência apática...

A partir dessa constatação, verifica-se como a família influencia

e muito o comportamento dos filhos.

63

Relações familiares afetando o

comportamento dos filhos

O aprendizado das crianças começa muito antes delas

frequentarem a escola, contudo, trazem dentro de si características que

assimilam no seu contexto social, a família, a qual possui tarefas e

caracterísiticas próprias e importantes na formação do sujeito. É na

família que as pulsões e os desejos estão soltos num constante digladiar.

No processo inicial de socialização, a família possui um papel

importantíssimo, que o de modelar e programar o comportamento e o

sentido de identidade da criança. Fornecer maios que a façam interagir

com o seu ambiente, dando a seus membros o cunho da individualidade.

Quando nos deparamos com crianças ciumentas, autoritárias,

tímidas, introvertidas,... Não podemos supor que elas já nasçam assim.

Todo esse tipo de comportamento está relacionado as “predisposições ou

tendências fisiológicas e hereditarias”, as quais influenciam na formação

da personalidade da criança.

Neste caso, o papel da educação se torna imprescindível, pois é

ela que “modifica ou reforça o nosso temperamento”. Muitas vezes o

aluno, em sala de aula, exterioriza o que vivencia em casa. Sejam brigas

com os pais, desprezo, ... E várias outras. Todo esse festival de

comportamentos dos pais para com os filhos, resulta na conduta dos

destes na escola, provocando problemas de aprendizagem, como nos

mostra Pierre Weil (1998):

“... a maioria dos problemas de comportamento, tais como

ausência de atenção, brutalidade ou instabilidade, são causados pela

64

conduta e pelas atitudes dos pais. Já é lugar comum a afirmação de que

há mais “pais problemas”do que “filhos problemas”. (p.45)

65

Ressignificando o sintoma na família

A criança quando se encontra em idade pré-escolar sabe que

necessita ter sucesso nos estudos. Essa é uma exigência feita por seus

pais, familiares, colegas, professores, pela sociedade como um todo. O

sucesso se encontra acima do fracasso, e este implica num valor que

deve corresponder a um ideal a ser perseguido.

Esse ideal normalmente é ditado por valores familiares que são

transmitidos de geração em geração. Há famílias de engenheiros, que

espera que o filho manis velho o seja também. Há famílias de

advogados, de médicos ou de negociantes, onde o destino da criança já

está selado nem bem ela nasceu. Pode-se observar aqui o papel dos mitos

familiares que tentam a construção de uma realidade irreal desejada para

a coninuação da história familiar.

“No processo inicial de socialização, as famílias modelam e

programam o comportamento e o sentido de identidade da criança. O

sentido de pertencimento aparece com uma acomodação de parte da

criança aos grupos familiares e com sua pressuposição de padrões

transacionais na estrutura da familiar, que são consistentes durante

todos os diferente acontecimentos da vida”. (Minuchin, 1990, p.53)

O mito familiar designa as posições de cada um dentro do grupo

e fornece modelos de conduta; que acaba impondo escolhas

profissionais, incumbências de ordem cognitiva e mesmo a forma como

cada sujeito pode se aproximar ou se distancia do saber. Como a criança

ainda é pequena, esta missão não pode ser questionada.

Na maioria das vezes, o sujeito aprendente é levado a cumprir

tarefas e responder a lealdades impostas pelo meio familiar. Em relação

66

ao acionar do segredo na família, Alicia Fernandez (1991) nos dis que:

”não há

67

segredo de um só. O segredo age tanto na mente de quem o comunica

como de quem o recebe. O segredo é em algumas famílias um elemento

estrutural. Trata-se de informações vinculadas com a história do grupo

familiar ou aspectos particulares de um de seus membros, que em feral

são ocultados parcialmente, com a certeza de que não são

desconhecidos por outros integrandes”. (p.101)

Pode também, tentar rebelar-se contra eles, mas sempre terá

como referencial o modelo de família de origem. Comparações e

identificações também fazem parte do processo de aprendizagem. É

preciso corresponder a padrões impostos, onde as limitações,

dificuldades ou mesmo preferências individuais, muito poucom ou quase

nada, são levadas em conta na hora das cobranças familiares.

No sistema familiar, a capacidade de proporcionar um ambiente

seguro para o desenvolvimento intelectual está primeiramente ligada à

forma como os membros da família se relacionam com seus próprios

conflitos relativos à realização pessoal, das expectativas e conflitos dos

filhos.

Muitas famílias acabam sofrendo a síndrome da ansiedade (não

vejo a hora do meu filho ler, quando ele vai ler e escrever) e do tédio

(não adianta forçar que ele não faz).

“Quando a criança apresenta problemas para aprender, a forma

com que a família reage pode agravar ou ajudar sua recuperação. Além

disso, o contato com as famílias pode trazer informações sobre os

fatores que interferem na aprendizagem e apontar os caminhos mais

adequados para ajudar a criança. Também torna possível orientar os

pais para que compreendam a enorme influência das relações familiares

no desenvolvimento dos filhos“.(Scoz, 1998, p.144)

68

A criança apresentando alguma dificuldade de aprendizagem,

seguidas de sintomas, como: notas baixas, falta de atenção,

não

69

cumprimento de tarefas... É de fudamental importância conhecer a

estrutura familiar onde esta criança está inserida. Conhecer um pouco a

família possibilita olhar a criança como um todo e nem apenas uma parte

dela, quando a analisa apenas no âmbito escolar.

70

CAPÍTULO III

Conclusões e Recomendações

Frente ao novo, do lugar do não saber, o aprendente executa o

movimento dialético, que parte de um saber já construído para a

assimilação/acomodação. Nesse movimento circulam experiências

previamente adquiridas, fantasias de perdas e de ataque ao já sabido,

momentos, por vezes confusionais (Pichon Rivière, 1989 e Bleger, 1990)

intercalando-se com o desejo de poder apropriar-se de um não saber

significativo, que a realidade está apontando. Assim, o

sujeito/aprendente vive este fenômeno desequilibrando-se, para em

seguida equilibrar-se, quando aprende, quando acomoda a seus

esquemas, de forma estruturante, o conteúdo. Surgem, dessa forma,

reações diversas, que variam da curiosidade ao medo, por se perceber

ainda indiferenciado diante do novo.

À medida, no entanto, em que ele vai tendo contato com o desejo

numa interação ativa, vai saindo da simples sensação da falta, da

percepção do não–saber, e se permitindo conhecer, abstrair e reconhecer,

avaliar para a diferenciação. Agora, já existem dois níveis de percepção:

do eu e do outro. Assim, quando o sujeito já diferencia o que é seu di que

é do outro, consegue encontrar o novo, num outro patamar, porque

tomou uma distância ótima que não o confunde. Só então, poderá dividir,

avaliar, separar. A separação ocorre então, de forma saudável, na medida

em que, ao perceber o objeto distanciado dele, pode trabalhar em

diferentes planos e classificações (categorias): analisa-o, discrimina-o,

71

classifica-o, etc. É o processo de autonomia da reallidade que se vai

construindo.

No momento em que o sujeito conquista esta autonomia e tem

consciência do seu EU, e de seu poder sobre o objeto, consegue unir

as

72

partes, o que antes estavam separadas na realidade, organiza estas partes

(informações) e constrói uma rede de conexões internas, integrando-as.

Sente o desejo do saber diante do dever (prazer e regras). Este

movimento dialético do antigo/do novo e a ressiginificação conduzem o

sujeito à aprendizagem, que se apresenta em diferentes níveis.

Essa espiral dialética está presente em todos os momentos da

vida do ser humano. Nossa vida é marcada por mudanças, e

ressignificações constantes. Daí, porque Pichon (1989) afirmar que “o

homem é um ser da práxis, é um ser em movimento”.

Esse movimento possibilita ao sujeito viver mudanças, sejam

elas positivas ou negativas, mas que o transformam em aprendente a

aprender. Estas reflexões nos conduzem a pensar nas atitudes dos pais,

no seu nível de consciência, de responsabilidades frente a um ser, que é

único e que vive estes momentos do indiferenciado ao integrado. Suas

atitudes e influências que dizem respeito ao prendizado e

desenvolvimento do aluno como pessoa são fundamentais.

Os pais precisam ter claro para si, bem definido, qual a postura

que devem adotar diante de seu filho, quer ele seja um desatento, um

aluno lento, ou mesmo uma pessoa com múltiplas necessidades. É

preciso que a família se integre com a escola, a qual possui professores

que têm instrumentos teóricos para lidar com estes casos, sem, no

entanto, deixar de exercer sua autoridade, que não se confunde com

autoritarismo.

Freire (1992) tem, aliás, uma postura clara em relação à

autoridade do professor. Vejamos:

“O professor libertador (...) assume papel diretivo necessário

para educar. Essa diretividade não é uma posição de comando, de “faça

73

isso”ou “faça aquilo”, mas uma postura para dirigir um estudo sério

sobre algum objeto pelo qual os alunos refletem sobre a intimidade

da existência do

74

objeto”. (p.201)

Assim, ele aponta que é uma atitude democrática, de diretividade

e liberdade ao mesmo tempo, porém sem o uso do autoritarismo, nem do

laissez-faire do professor.

O relacionamento entre os membros que compõe a família

precisa ser harmonioso e aberto, favorecedor do movimento dialético

entre eles. Para que ocorra um ambiente mais estimulante para o sujeito

aprendente, faz-se necessário que os pais valorizem suas produções, se

interessem pelas atividades que exercem, que saibam ouvir seus filhos.

Educar, orientar mais do que simplesmente ensinar, implica em

ver o aprendente como uma pessoa repleta de potencialidades. Desta

maneira, a família deve ter a capacidade de conhecer seu filho, entendê-

lo como um sujeito de cognosibilidade. Se assim o percebe, há trocas de

potencialidades.

Muitas vezes essas potencialidades se encontram “escondidas” e

inibidas. Cabe a família, integrada com a escola, descobrir e ajudar seu

filho a estruturar-se para que ocorra o seu crescimento, não apenas

através de conhecimentos didáticos, mas como um aprendiz de si mesmo

e da vida.

75

Recomendações aos Pais

A seguir, listam-se algumas recomendações de atitudes que

poderão ser incluídas no cotidiano da família, com o objetivo de melhor

orientar seu filho no processo de aprendizagem:

- é fundamental os pais se mostrarem compreensivos. Certas

atitudes adotadas arbitrárias pelos pais, só reforçam o estado

emocional desfavorável do eu filho, quando este se apresenta

inseguro, insatisfeito ou até mesmo agressivo;

- quando surgirem notas baixas, deve-se procurar buscar ajuda

da escola, para juntos (família e professores) analisarem as

possíveis causas. Procurar manter um contato freqüente com os

professores, independente de nota, mas para obtenção de

informações a respeito da vida escolar de seu filho. Muitas

vezes, os filhos se comportam de um modo na escola e de outro

em casa. Para que não ocorram surpresas, é válido os pais se

tornarem ativos neste processo;

- assessorar seu filho na reorganização do horário de estudo, para

que este adquira uma disciplina;

- participar de homenagens, atividades que ele desempenha fora

da escola, como: natação, inglês, dança, ... A presença dos pais

nestes eventos fz com que ele adquira segurança e sinta-se

estimulado a continuar a dsempenhar suas tarefas com mais

prazer;

- a família deve estabelecer diálogo aberto e franco com seu

filho, para que este sinta segurança em compartilhar desejos,

angústias, de forma bem natural e de confiança;

76

- estar presente, acompanhar, não significa fazer do filho uma

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pessoa insegura, dependente, mas ir aos poucos delegando

responsabilidades (de acordo com a sua faixa etária) para que

este saia, gradativamente da “moralidade da heterônomia”

(Piaget, in Kamii, 1982) desenvolvendo sua autonomia.

Para Kamii (1982): “A essência da autonomia é que as

crianças tornem-se aptas a tomar decisões por si mesmas. Mas

a autonomia não é a mesma coisa que a liberdade completa. A

autonomia significa levar em consideração os fatos relevantes

para decidir agir da melhor forma para todos. Não pode haver

moralidade quando se considera apenas o próprio ponto de

vista. Quando uma pessoa leva em consideração os pontos de

vista das outas, não está mais livre para mentir, quebrar

promessas e ser leviano”. (p. 108)

- não confundir autonomia com libertinagem. A família deve ter

bem claro a importância do seu papel como principal

educadora e incentivadora, não deixando perder de vista esta

responsabilidade e que jamais poderá ser outrogada para

outros;

As mudanças só acontecerão se os principais interessados se

mobilizarem. As mudanças não vêm de fora nem vêm de graça. As

mudanças são sempre resultado da ação dos que não estão satisfeitos,

que exigem uma família diferente, que saiba “olhar” seus filhos e

valorizá-los em todos os sentidos, respeitando suas limitações,

respeitando-os como seres em processo de desenvolvimento e

descobertas.

78

A família se reestruturando, descobrindo sua importância,

estará contribuindo muito para o processo de escolarização de seus

filhos. Tanto a família como a escola devem caminhar juntas, tendo

como principal objetivo favorecer um desenvolvimento saudável para as

crianças.

79

Referências Bibliogáficas

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Médicas, 1991.

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Terra, 1971.

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de Janeiro, Paz e Terra, 1992.

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Edição. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1992.

GARDNER, H. Estruturas da mente: A Teoria das Múltiplas

Inteligências. Porto Alegre, Artes Médicas, 1995.

GOULART, Iris Barbosa. Piaget: Experiências Básicas para utilização

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KUPFER, Maria Cristina. Freud e a educação: o mestre do impossível.

São Paulo, Editora Scipione, 1995.

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80

MACEDO, Lino. Ensaios Construtivistas. 2.ª Edição. São Paulo, Casa do

Psicólogo, 1994.

81

MAHLER, Margaret. O processo de separação-individualização. 1963.

MINUCHIN, Salvador. Famílias: Funcionamento & Tratamento. Porto

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NEVES, Maria Apparecida C. Mamede. Artigo: Psicopedagogia: um só

termo e muitas significações. In Revista da Associação Brasileira de

Psicopedagogia. São Paulo, volume 10, n.º 21, 1.º Sementre, 1991.

OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um

processo sócio histórico. 2.ª Edição, São Paulo, Editora Scipione,

1995.

PAIN, Sara. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem.

São Paulo, Artes Médicas, 1985.

RAPPAPORT, Clara Regina. Psicologia do desenvolvimento: a idade

Pré-escolar – volume 3, 8.ª Edição, São Paulo, E.P.U., 1981.

REGO, Cristina Teresa. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da

educação. 3.ª Edição, Petrópolis, 1996.

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Janeiro, Espaço e Tempo, 1985.

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Psicopedagogia. Porto Alegre, Artes Médicas, 1992.

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Editora Vozes, 1998.

82

WINNICOTT, D. W. A criança é o seu mundo. 6.ª Edição, Rio de

Janeiro, Guanabara Koogan, 1982.

83

ANEXO I

QUESTIONÁRIO PARA OS ALUNOS DA 4.ª SÉRIE

1. Qual o significado que a família tem para você?

2. Na sua opinião, quais são as dificuldades que os pais encontram

para educar seus filhos?

3. Por que atualmente, há tantos conflitos entre pais e filhos?

4. Como seus pais se posicionam em relação as suas tarefas

escolares?

5. Você sente preocupação de seus pais em relação ao seu estudo?

6. Se você tivesse oportunidade de enviar um recado para seus pais,

que recado daria?

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ANEXO II

QUESTÕES DA ENTREVISTA COM OS PAIS

1. Na sua opinião, como se encontra hoje, a relação entre pais e

filhos?

2. Que dificuldades os pais encontram na educação dos filhos?

3. Os filhos ainda carregam valores adquiridos na família?

4. Por que há conflitos entre pais e filhos?

5. Como administrar esses conflitos?

6. Existe alguma relação entre a “violência” na escola e o

relacionamento dos filhos em casa?

7. Você concorda com a seguinte afirmação: “A família é vista como

o primeiro espaço psicossocial, protótipo das relações a serem

estabelecidas com o mundo. É a matriz da identidade pessoal e

social, uma vez que nela se desenvolve o sentimento de

pertinência que vem com o nome e fundamenta a identificação

social”?

8. Você concorda com esta afirmação: “os pais de hoje não sabem

impor limites à ação dos filhos”?

9. Qual a sua opinião em relação a seguinte tíade: FAMÍLIA /

ALUNO / ESCOLA?

10. Como a família se relaciona com o conhecimento? (se costumam

estudar, fazer leituras,...).

11. Como os pais vêem as produções de seus filhos?

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