ativar contra a violência, pela igualdade de género. caderno de apontamentos

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Publicação realizada no âmbito do projeto AtivArte, promovido pelo SYnergia - Centro Jovem de Santo Adrião e financiado pelo Mecanismo Financeiro EEA Grants | Programa Cidadania Ativa - Fundação Calouste Gulbenkian

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Ativar Contra a Violência, Pela Igualdade de GéneroSYnergia - Centro Jovem de Santo Adrião

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Introdução 7

AtivArte – Contra a Violência e pela Igualdade de GéneroO Projeto AtivArte 10Atividades desenvolvidas 11Desafios 17

Ativar para a Igualdade de GéneroIgualdade de Género. De que falamos? 20Desigualdades de Género 21Sexo e Género 23Identidade de Género e Orientação Sexual 25Estereótipos de Género 28 Ativar Contra a Violência Violência e Género 30Tipos de Violência 31Violência no namoro 32Consequências de uma relação violenta 34Como ativar contra a violência 37Sou vítima de violência! O que devo fazer? 38

Notas Finais 40

Agradecimentos 41

A Entidade Financiadora 43

Índice

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A Igualdade de Género, enquanto dimensão central de Direitos Humanos, é uma construção fundamental para a livre participação de homens e mulheres e, assim, para a efetivação da cidadania. Neste contexto, entende-se que a violência se revela um dos maiores entraves à sua concretização, constituindo uma ofensiva a direitos e liberdades. Desta forma, é urgente a rutura com a naturalização e perpetuação de desigualdades de género, sendo este um plano que compromete toda a sociedade.

Com este Caderno de Apontamentos, decorrente do projeto AtivArte – Contra a Violência e pela Igualdade de Género, pretendemos dar algumas pistas, precisa-mente sobre estas temáticas. A ideia é que o caderno se torne uma ferramenta útil para quem, como nós, pretende ativar esforços pela Igualdade de Género e Contra a Violência.

Destina-se, essencialmente, a jovens, cujo potencial de transformação de atitu-des e comportamentos é particularmente elevado. A experiência no terreno com o projeto AtivArte atestou isto mesmo. Não só se revelaram áreas de intervenção foco do interesse das/os jovens como também estas/es demonstraram constituir agentes fundamentais no que toca à disseminação de boas práticas e ideias pau-tadas pela igualdade na diversidade.

O caderno estrutura-se em três capítulos. No primeiro, denominado “AtivArte – Contra a Violência e pela Igualdade de Género” damos conta dos objetivos e ações realizadas no âmbito do projeto. Tal prende-se com a expetativa de que as atividades desenvolvidas possam ser replicadas ou sirvam de estímulo ao empreendimento de novas estratégias em outros contextos. É neste sentido tam-bém que, no final do capítulo se apontam alguns desafios. Este capítulo, em par-ticular, pode revelar-se útil para docentes e técnicas/os da área social.Já no segundo capítulo, intitulado “Ativar pela a Igualdade de Género”, apresen-tamos algumas ideias e conteúdos que consideramos centrais à compreensão da temática do Género e, desta forma, à intervenção no sentido do combate a desigualdades nesta matéria, em prol de uma sociedade inclusiva e aberta à diversidade.

O último capítulo, designado “Ativar contra a Violência” segue os objetivos do anterior, incidindo na questão da Violência de Género e, mais especificamente, da Violência no Namoro. Neste encontram-se informações úteis que esperamos contribuírem para o reconhecimento deste tipo de violência e para o estímulo à prevenção e denúncia.Esperamos que este caderno contribua para que (te) atives pela igualdade de género e contra a violência. É uma conquista de todas/os e para todas/os. Boa leitura!

Introdução i

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A

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AtivArteContra a Violência

e pela Igualdade de Género

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O projeto AtivArte, promovido pelo SYnergia - Centro Jovem de Santo Adrião, as-sociação juvenil sediada em Braga, conta com o apoio da Noruega, Islândia e Liechtenstein, sendo financiado pelo Programa Cidadania Ativa | Mecanismo Fi-nanceiro do EEA Grants/ Fundação Calouste Gulbenkian. Em linha de conta com as necessidades apontadas no V Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Não-Discriminação, desenvolveu um leque de ações incidentes em domínios específicos como a promoção da Igualdade de Género e combate à Violência de Género e outras formas de discriminação/desigualdade (etnia, orien-tação sexual, etc.), desconstruindo estereótipos e desnaturalizando assimetrias. Partiu-se, assim, do pressuposto de que uma efetiva e ativa defesa dos Direitos Humanos – em prol da promoção da diversidade e tolerância, finalidades centrais do projeto – exige uma perspetiva integrada.

Pretendeu-se, com o empreendimento de ações de sensibilização e (in)forma-ção sobre as temáticas supracitadas, junto de crianças e jovens, promover um maior conhecimento face a direitos fundamentais, no sentido de torna-los sujei-tos ativos na construção de uma cidadania plena, que não consente a exclusão social. Ações realizadas com docentes caminharam no mesmo sentido, tendo por objetivo sensibilizá-las/os mas também capacitá-las/os para a replicação e rein-venção de estratégias nos seus contextos profissionais. Conhecer, compreender, empoderar e ativar para a participação cívica, em igualdade mas na diversidade, constituíram as dimensões centrais do projeto.

Articulada com a transmissão/ troca de conhecimentos e experiências, e de forma a potenciar a participação e consciencialização, realizaram-se ações de estimulo à criatividade (expressão artística), envolvendo os públicos-alvo na disseminação de boas práticas e na sensibilização da comunidade. A designação do projeto remete precisamente para esta forma de ativação pela arte.

O projeto desenvolveu-se no distrito de Braga, entre outubro de 2014 e setembro de 2015, contanto com a colaboração de diversos estabelecimentos de ensino e associações locais (devidamente mencionadas nos agradecimentos).

Ora vejamos o que aconteceu…

O projeto AtivArte

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Cumprindo o que fora delineado em plano de comunicação, o projeto iniciou com a criação de uma identidade (logo e imagem a utilizar nas diferentes ativi-dades e materiais).

Esta permitiu, logo no início do projeto, a abertura de uma página no facebook, que conta atualmente com mais de 500 seguidores (“gostos”). Já agora, aguarda-mos o teu “like”! (Fig. 1)

Alguns meses depois, e compilada in-formação de algumas atividades rea-lizadas, foi possível avançar um pouco mais, sendo criada uma página, que poderás também visitar no endereço: www.ativarte.net. (Fig. 2)

A articulação com os media revelou-se central desde o início do projeto, ini-ciando com a sua apresentação pública.A partir daí, foi possível ter algumas ações divulgadas e noticiadas em ór-gãos de comunicação local. (Fig. 3)

Atividades desenvolvidas

Fig.1 Página do Facebook

Fig.2 Site do Projeto

Fig.3 Notícia de apresentação do projeto

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Feito todo um trabalho prévio de es-tabelecimento de parcerias, nomeada-mente com Agrupamentos de Escolas, a primeira atividade, nomeadamente aberta ao público em geral, foi a apre-sentação de uma Performance Teatral alusiva ao Dia Internacional para a Er-radicação da Violência Contra as Mu-lheres. (Fig. 4)

A parceria com o Agrupamento de Es-colas de Braga Oeste revelou-se cen-tral, possibilitando o envolvimento de estudantes do 8º que, com a mentoria da Associação Krizo – Educação, Arte e Cidadania, a concretizaram. Encar-nando o formato de Teatro-forum e incididindo na questão da violência de género, a performance gerou amplo debate, sendo que as/os espetadoras/ es foram também chamadas/os a inter-vir, representando. A adesão à atividade superou as/os 100 destinatárias/os.

Já com a colaboração da Escola Profis-sional de Braga e da Escola Secundária Sá de Miranda, bem como do projeto Tetris, foi possível concretizar, ainda em 2014, a Pintura de Murais alusivos ao Dia Internacional dos Direitos Hu-manos. Estes podem ainda ser visita-dos na TOCA – Trabalho de uma Oficina Cultural e Associativa, espaço gerido pelo Centro Jovem de Santo Adrião, em Braga. (Fig. 5 e 6)

No início de 2015, atendendo à parce-ria estabelecida com o Agrupamento de Escolas André Soares, realizaram-se ações de sensibilização alusivas às temáticas da Igualdade e Violência

Fig.5 Pintura de Mural por estudantes da Esco-la Secundária Sá de Miranda

Fig.6 Pintura de Mural por estudantes da Esco-la Profissional de Braga

Fig.4 Feito todo um trabalho prévio

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de Género. Com cada uma das turmas do 7º ano da EB 2 e 3 André Soares realizaram-se sessões, de formato par-ticularmente interativo. Como forma de balanço e discussão alargada, efetuou-se uma última sessão, com todas as tur-mas, na qual, se partiu de uma peça de teatro, apresentada pelo Teatro Infantil de Braga – TinBra – (parceria informal do projeto) para o debate relativo à Igualdade de Género e combate à vio-lência. (Fig. 7)

Com as/os alunas/os dos 8º e 9º anos da mesma escola realizou-se uma ses-são única, em formato de conferência que, para além da técnica do projeto contou com dois técnicos de prevenção da violência da União de Mulheres Al-ternativa e Resposta, também parceira do projeto. (Figura 8)

Fig.7 Performance Teatral pelo TinBra

Fig.8 Conferência pela UMAR

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Ambas as atividades integraram a “Semana dos Afetos”, dinamizada pela Escola, e assumiram o tema “Ativar afetos em Igualdade. Combater a Violência no namoro”. Com o Agrupamento de Escolas Sá de Miranda estipulou-se a realização de Ses-sões de Sensibilização com todas as turmas do 6º ano da Escola Básica do 2º e 3º Ciclo de Palmeira. A relevância atribuída às sessões por parte das/os docentes responsáveis levou a que fosse solicitada a realização posterior de mais duas sessões, nomeadamente com estudantes dos Percursos Vocacionais.Com o mes-mo agrupamento de escolas definiu-se a realização de duas sessões alargadas às diversas turmas de 11º ano. Ainda que de cariz mais expositivo, foi possível criar dinâmica via debate e troca de ideias entre todas/os. (Fig.9) Relativamente à Es-cola Profissional de Braga (EPB), atendendo ao plano de actividades das diversas turmas e cursos, optou-se pela realização sessões em turma, com estudantes da área da saúde. (Fig. 10)

Posteriormente, e no quadro da semana cultural da mesma escola, foi possível realizar uma sessão aberta à comunidade, que contou, para além da equipa do projeto com a participação da Investigadora Liliana Rodrigues, da Universidade do Porto, que muito enriqueceu o debate trazendo questões relacionadas com a Orientação Sexual e Transexualidade.

O Dia Internacional das Mulheres, com a colaboração da Escola Profissional de Braga e da Escola Secundária Sá de Miranda, nomeadamente de estudantes e docentes da área de Design e Multimédia, foi assinalado com a realização de uma Maratona Fotográfica. (Fig.10) A atividade consubstanciou-se na captação de imagens alusivas ao tema da diversidade do “sujeito mulher”, assumindo o título de “Mulher? Sujeito Plural!”. Considerando-se que esta beneficiaria da participa-ção de outras entidades, contactou-se a CERCI – Braga, de forma a dar visibilidade às mulheres portadoras de deficiência, o CEB (Clube de Escalada de Braga), que conta já com um número relevante de atletas mulheres, e os TUB (Transportes

Fig.10 Sessão de sensibilização em turma na EPB

Fig.9 Conferência na Escola Secundária Sá de Miranda

Fig.11 CartazFig.10 Exposição de Fotografia “Mulher? Sujeito Plural!”

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Urbanos de Braga), que têm vindo a ser noticiados como empresa que, desafiando papeis tradicionais de género, tem vindo a integrar nos seus quadros enquanto motoristas, diversas mulheres.

Tendo a inauguração dado lugar a uma tertúlia para discussão da temática, no dia 18 de março, potenciou-se a ampliação da discussão bem como do número de destinatárias/os. A tertúlia beneficiou da presença de representantes de as-sociações como a UMAR, a Civitas e o colectivo Braga Fora do Armário. (Fig.11)

No que toca a ações de sensibilização com estudantes é ainda de relevar as sessões realizadas com turmas do 3º ano do 1º ciclo do Agrupamento de Escolas André Soares. O desafio foi o de repensar desigualdades de género atendendo a histórias infantis conhecidas por todas as crianças. Recontou-se a história da Branca de Neve, mas revestindo-a de Igualdade de Género. Posteriormente as/os estudantes realizaram desenhos alusivos à mesma. (Fig. 12)

Outra ação que se revelou central no desenvolvimento do projeto foi a realização de Sessões de (in)formação com docentes dos vários ciclos de ensino. Mais uma vez, foi central o envolvimento do Agrupamento de Escolas André Soares e da Escola Profissional de Braga. (Fig. 13)

O objetivo central desta atividade foi o de estimular a incorporação da di-mensão da Igualdade de Género e estratégias preventivas quanto à Violên-cia de Género em contexto escolar. Para além de se apresentarem conteúdos-chave nestas matérias, apelou-se ao debate e troca de ideias, tendo constituído sessões muito participadas e discutidas.

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Fig.13 Ação de (in)formação com docentesFig.12 Expressão plástica “Recontar Histórias em Igualdade de Género”

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O desenvolvimento das atividades do projeto AtivArte revelou a pertinência da prossecução de estratégias no sentido da discussão e intervenção no que con-cerne às desigualdades e violência de género na sociedade. As sessões realiza-das com estudantes dos diversos níveis de ensino demonstraram que se trata de questões ainda pouco exploradas, embora sejam inequívocos os seus impactos ao nível das suas representações e práticas sociais. Particular recetividade à mu-dança ficou evidente entre as/os estudantes mais jovens, o que impele à conti-nuação da intervenção no que toca ao 1º e 2º ciclos do ensino básico, bem como pré-escolar, com previsível impacto no médio e longo prazo. Nos restantes níveis de ensino foi notória a existência de ideias, em alguns casos, já solidificadas que tendem para a reificação de desigualdades e, em particular para uma certa acei-tação da violência, nomeadamente no namoro. Urge assim a persistência de ações destinadas a este público.

Alguma resistência à temática verificou-se entre as/os docentes, cujas rotinas instaladas, associadas às pressões profissionais e temporais a que se encontram sujeitos, tendem a fazer desvalorizar estas temáticas. A integração objetiva das mesmas nos currículos formais poderá constituir uma forma de potenciar um maior conhecimento e partilha do mesmo em contexto escolar.

Um aspeto que se relevou indiscutivelmente positivo foi o da integração da com-ponente artística e criativa na sensibilização das/os jovens e, através destes, da comunidade. Tal revelou-se particularmente estimulante, com efeito desde logo imediato, nos discursos empreendidos por aqueles. Esta é uma aposta que, sem dúvida, recomendamos!

Desafios

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A

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Ativarpela Igualdade de Género

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Igualdade de Género. De que falamos?

A igualdade entre homens e mulheres constitui um dos princípios fundamentais do Estado Português, estando presente na nossa Constituição. É também assu-mida como uma das missões fundamentais da União Europeia, e desde há muito que ocupa centralidade em declarações, recomendações, tratados e conferências de diversas organizações internacionais como a ONU, a OIT, a OCDE e o Conselho da Europa. Na realidade, se quisermos situar historicamente o primeiro grande contributo de cariz político e institucional nesta matéria temos de recuar até à criação, em 1948, da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos. Não quer isto dizer que bem antes várias vozes não se tivessem já levantado na defesa da igualdade, nomeadamente de direitos, entre homens e mulheres. Efetivamente, há mais de um século que diversos movimentos, particularmente de mulheres e feministas1 , levantam esta como uma bandeira fundamental no que remete para a construção de uma sociedade que se quer inclusiva e sem discriminações.

1 Não são poucas as vezes que vemos o conceito de feminismo aparecer como o contrário de machismo. Trata-se de um erro que importa evitar. Embora esta palavra possa assumir vários posicionamentos distintos, devendo ser entendida como plural, deve ser assumida, em termos globais como o movimento social e político que procura a igualdade entre mulheres e homens.

“Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orienta-ção sexual. “

In Constituição da República Portuguesa;Artigo 13.º Princípio da Igualdade

De que falamos então quando utilizamos a expressão Igualdade de Género? Sumariamente, podemos defini-la como o igual acesso de homens e mulhe-res a direitos, liberdades, oportunidades, ao reconhecimento e valorização nos mais variados domínios da sociedade (pessoal, familiar, económico, laboral, político etc.).

E porque insistimos tanto em falar dela? A resposta parece simples. Apesar dos inúmeros esforços no sentido da sua consagração, a igualdade de género está ainda longe de ser conseguida. Pois é! Parece que apenas as leis não chegam.

Embora a distância até à sua plena concretização não seja a mesma nas dife-rentes partes do globo, podemos afirmar que, em graus diversos, as desigual-dades entre homens e mulheres, permanecem um pouco por toda a parte. Se, em grande parte dos casos, este é um problema que tem penalizado particu-larmente as mulheres, certo é que é uma batalha que compromete e favorece a todas/os.De seguida, daremos conta de alguns exemplos.

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Desigualdades de GéneroDefinido o conceito de Igualdade de Género, por Desigualdades a este nível en-tende-se: a hierarquização ao nível dos direitos, estatutos e dignidade entre ho-mens e mulheres, não apenas no plano da lei como também das práticas sociais no nosso quotidiano. Frequentemente vemos na televisão notícias de que as mulheres em determi-nados países, mais ou menos distantes, não têm acesso à educação, a direitos políticos e são as que mais sofrem de violência e ausência de liberdades básicas, tendo taxas de mortalidade mais elevadas do que as dos homens. Se calhar, até já respiraste de alívio ao pensar que em Portugal as coisas são bem diferentes. Mas será que são mesmo?Bem… Sem sombra de dúvidas que Portugal beneficiou, nas últimas 40 décadas, nomeadamente a partir da Revolução de abril de 1974, de inúmeros avanços em matéria de igualdade de género. Importa lembrar que por cá, durante muito tempo, às mulheres foi negado o direito ao voto, o acesso ao mercado de trabalho em diversas profissões, para não falar da dependência constante da autorização dos pais ou maridos para a tomada de decisões tão simples como a de viajar, por exemplo.Mas, dizer que muita coisa melhorou a este nível no nosso país, não significa que não tenhamos ainda grandes desafios pela frente. Querem alguns exemplos?

• Ao nível do mercado de trabalho, a participação de homens e mulheres é desigual. Verificam-se diferenças salariais, em desfavor das mulheres, o que leva a que sejam estas a vivenciar em maior número situações de pobreza;• Embora exista um número mais elevado de mulheres do que homens com habilitações escolares superiores, tanto nas empresas como na administração pública, são aqueles que ocupam maioritariamente os lugares de chefia;• Quanto à vida familiar, na maior parte dos casos, são as mulheres as principais

Fig.14 A sobrecarga de trabalho vivenciada pelas mulheres

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responsáveis pelas tarefas domésticas e pelo cuidado das crianças e/ou outros familiares. Se pensarmos que a maior parte delas exerce uma profissão, desde logo verificamos a sobrecarga de trabalho com que se defrontam. (Fig.14)• A participação na vida política e pública, em geral, por parte das mulheres é ainda bem menor face à dos homens; • As mulheres são as principais vítimas de violência, nomeadamente doméstica e conjugal.

E os homens? Não serão eles também directamente prejudicados pelas desigual-dades de género? Certamente que sim! Ora vejamos:• Apesar da licença de maternidade/paternidade, segundo a lei, poder ser par-tilhada pela mãe e pelo pai, são poucos os homens que usufruem deste direito, nomeadamente devido ao facto de isso ainda ser visto por muita gente, nomea-damente no local de trabalho, como uma “coisa de mulheres”; • É maior o número e a gravidade de acidentes de viação no caso dos homens e, para tal, tendem a contribuir certas ideias associadas ao conceito de masculini-dade (falaremos disso no próximo ponto). • A falta de autonomia no desempenho de tarefas domésticas por parte dos homens cria relações de dependência, nomeadamente na terceira idade, sendo estes que mais precocemente integram centros de apoio.

Para além de tudo isto, e em estreita associação, verificamos que são diferencia-das as expetativas e papeis ao nível do trabalho, da família, do lazer entre ho-mens e mulheres. Persistem profissões, atividades e tarefas mais associadas aos homens e outras às mulheres. Se as leis se configuram essenciais como garantida de direitos, é urgente também uma mudança ao nível das mentalidades.

É bem provável que já te tenhas confrontado com uma ou outra situação em que, por seres rapariga ou rapaz, te disseram que não é assim que te deves comportar, que isso é coisa do outro sexo. Por mais inofensivo que isso pareça, esse é exa-tamente o mesmo argumento utilizado para justificar as desigualdades, discrimi-nações e violência com base no género.Concordas que não é isso que queremos, certo? De seguida tentaremos explicar um pouco melhor como tudo isto se processa.

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Sexo e GéneroEmbora os conceitos de sexo e género apareçam frequentemente como sinóni-mos importa atender à sua distinção, ainda que esta não seja completamente estática. Quando falamos de sexo referimo-nos às diferenças do ponto de vista genético, hormonal, reprodutivo e físico entre homens e mulheres. (Fig. 15) Geralmente, a simples observação dos órgãos genitais denuncia o sexo das pessoas. Porém, ca-sos existem de pessoas em que se verifica a presença de características variadas e/ou ambíguas em termos sexuais/ genéticos, dificultando a sua categorização simples num dos dois grupos. Falamos aqui das pessoas intersexo. Embora estes casos desafiem a divisão dos seres humanos em dois sexos, esta permanece útil à compreensão de que diferença não é sinónimo de desigualdade, sendo que este último conceito é acima de tudo um produto da sociedade. É aqui que entra a noção de género. (Fig. 16)Se podemos colocar, algo grosseiramente, o sexo no domínio do natural e uni-versal, o género já remete para o do sociocultural, fazendo de homens e mulhe-res, respetivamente, sujeitos no masculino e no feminino. Referimo-nos, pois, ao género para dar conta do conjunto de atributos e de comportamentos que as sociedades esperam e incentivam a ser adoptados por homens e mulheres, de forma diferencial. Trocando por miúdos. Desde o nascimento que as crianças vão, através do contacto com a família, com as/os amigas/os, a escola, a televisão, a internet, entre outros mecanismos, aprender o que a sociedade espera delas, enquanto rapazes e raparigas, homens e mulheres. Certamente, já reparam que os brinquedos que, geralmente, se oferecem às meninas não são os mesmos que aos meninos. Também desde cedo, o vestuário vai acentuando as diferenças. A estas “pequenas” coisas soma-se toda uma série de expetativas e imposições di-ferenciadas, em função das ideias de feminilidade e masculinidade, face à forma de agir, pensar e falar, ao longo do crescimento.

Fig.16Fig.15

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Mas, se o género é então uma construção sociocultural, importa ter presente o seu carater contextual. O que se espera, incentiva e impõe a homens e mulheres não é o mesmo em todas as sociedades, países e grupos, nem tão pouco foi o mesmo ao longo da história. A história é, aliás, a prova viva da capacidade da so-ciedade em alterar visões estáticas relativamente ao “ser homem” e “ser mulher”. A isto voltaremos mais à frente.

Mas, o género não se esgota na mera dissemelhança ou desafio ao sexo. Vamos, então, complicar um pouco mais…

Sintetizando, se ao nível da reprodução humana, desde logo se verificam fun-ções distintas entre os sexos, estas pouco dizem sobre as reais capacidades de homens e mulheres tanto na vida privada quanto pública. O género, enquanto aprendizagem, construção e produto social é, assim, passível de ser alterado.

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Identidade de Género e Orientação Sexual

Se, como referimos, o género remete para a categorização social das pessoas em dois grupos com normas e papéis distintos, tendo como base o sexo de nascença, a humanidade assume configurações bastante mais complexas, sendo o reconhe-cimento dessa diversidade condição essencial à conquista da igualdade.Ora vejamos mais alguns conceitos-chave…

Em termos gerais, podemos afirmar que a identidade de género significa aquilo que nós pensamos a respeito de nós mesmos, inde-pendentemente do nosso sexo, bem como do género que nos foi atribuído. É calculável que a maioria das pessoas sinta identificação com o seu sexo, que a socieda-de transformou em género (as mulheres e os homens sentem-se geralmente confortáveis com o seu sexo e, respectivamente, identifi-cam-se com o feminino e o masculino). Para estas pessoas tem vindo a usar-se a desig-nação de Cisgénero e/ou Cissexuais. Contudo, a verdade é que nem sempre isso acontece, sendo que na presença de uma não conformidade com o sexo de nascença ou com o género, referimo-nos a pessoas Transsexuais e/ou Transgénero. Entende-se por transgénero quem, ao não se identificar com os papéis de género que lhe foram atribuídos, assume comportamentos/ papéis sociais que a socie-dade assume como pertencentes ao outro género. Já por transexual entende-se quem, tendo nascido com um determinado sexo se sinta como pertencente ao outro. Nestes caos, verifica-se com frequência o recurso a cirurgias ou interven-ções hormonais, bem como mudanças ao nível da identificação sexual presente em documentos legais, para o pleno reconhecimento do sexo com que se iden-tificam.São inúmeros os casos de vítimas de discriminação e violência entre as pessoas trans. O reconhecimento de tais identidades é essencial para a concretização de uma igualdade que se pretende na diversidade e que não consente qualquer tipo de violência de género.

A identidade de género, de que falámos anteriormente, não tem qualquer vínculo com a orientação sexual. Esta última apenas evidencia por quem nos sentimos atraídos física, psicológica e emocionalmente. Podemos identificar cinco orientações sexuais distintas. Quando a atração se ma

Orientação Sexual

Identidade de Género

Fig.17

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Podemos identificar cinco orientações sexuais distintas. Quando a atração se ma nifesta por alguém do outro sexo, falamos de heterossexualidade; pelo mesmo sexo, homossexualidade; por ambos os sexos, bissexualidade; por pessoas in-dependentemente do sexo, pansexualidade; quando não existe atração sexual falamos de assexualidade. Importa não confundir orientação sexual com comportamento sexual visto que a primeira nem sempre se manifesta no segundo. Vale isto dizer, que uma pessoa que já teve relações sexuais com alguém do sexo oposto não é necessariamente heterossexual. O mesmo exercício pode ser feito com as restantes orientações. Afinal, a vida é muito mais rica que as categorias que se possam estabelecer mais ou menos a priori. Falando de afetos, importa ter presente que estes podem estar presentes em todas as orientações sexuais, que de igual forma devem ser respeitadas e reco-nhecidas.Continuando com as explicações…

Quando falámos de género, referimos que corresponde às ideias e normas de comportamento que as sociedades transmitem e exigem a homens e mulheres de forma diferenciada. Os estereótipos de género dizem respeito, precisamente, a essas ideias partilhadas e disseminadas em sociedade de como são (atributos de género) e como se comportam (papéis de género) os homens e as mulheres. Estes estereótipos de género são interiorizados e exteriorizados desde muito cedo, com implicações nos diversos domínios da sociedade. Se dissermos que os homens são mais fortes, mais agressivos e mais racionais e, por seu turno, as mu-lheres mais frágeis, dóceis e emotivas, estamos a utilizar estereótipos de género.

Fig.18 Estereótipos de Género presentes na sinalética.

Estereótipos de género

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Quando se afirma que as mulheres têm mais jeito para realizar tarefas domésti-cas e cuidar dos filhos e são os homens que estão mais aptos para trabalhar no exterior, estamos também a usar estereótipos de género.

Se estivermos atentas/os, verificamos como estes estereótipos estão presentes no nosso quotidiano, nas conversas, na literatura, na publicidade, no cinema, le-vando a que sejam naturalizados e incorporados nas nossas interações. (Fig. 18)Pode até afirmar-se, que devido à educação que tivemos e pela necessidade de nos adequarmos ao que a sociedade nos vai exigindo, muitas das vezes essas ideias acabam por se concretizar na realidade. Porém, elas não sendo naturais e irreversíveis, são acima de tudo generalizações, contrastando com a multiplicida-de de formas de ser, sentir e agir dos seres humanos. Mas, ao agirem no sentido de constranger a diversidade humana, criam e perpetuam desigualdades histori-camente enraizadas, que sobrevalorizam o masculino.

Assim, o afastamento às normas de masculinidade e de feminilidade comportam muitas vezes sanções para os/as seus /suas “infractores/as”. Já devem ter repara-do nos olhares de reprovação ou nos comentários negativos, por exemplo, face a um rapaz que prefere trocar o futebol pelo ballet. Do mesmo modo, uma rapariga que vivencia uma sexualidade de forma aberta e livre mais facilmente será alvo de críticas menos positivas do que um rapaz em situação semelhante, ainda que em todos os casos o mesmo respeito pelas escolhas e liberdades se exija. Se, por exemplo, durante muito tempo (e em muitos contextos ainda é uma rea-lidade) às mulheres foi vedado o acesso ao mercado de trabalho, foi com base em estereótipos que sustentam a sua ligação “natural” ao cuidado das crianças e outros dependentes e ao contexto doméstico. Como vimos, de natural tem isto tudo muito pouco!

As desigualdades de género, com base nos estereótipos, atravessam os mais va-riados contextos da sociedade, constrangendo as escolhas e impedindo homens e mulheres de se expressarem livremente. Se já por si só podemos entender que tal se trata de uma forma de violência, outras há que, pelo grau de sofrimento que causam às vítimas (psicológico, social, físico, sexual) exigem uma intervenção urgente. A este tópico dedicaremos o próximo separador.Antes disso, apenas mais um apontamento. Se a igualdade de género é um prin-cípio que vale por si enquanto garante da concretização de Direitos Humanos e de uma efetiva cidadania, ela é também imprescindível ao desenvolvimento, não apenas pessoal, como social e económico. Este para ser sustentável, exige a participação de todas e de todos.

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AtivarContra a Violência

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Violência e GéneroA violência, ao contrário do que se possa pensar, não é algo natural ou biológico, ela faz parte de um processo. Aprende-se! O facto de estarmos constantemente a assistir, nem que seja pela televisão, no cinema, no desporto, nos videojogos, a cenários de violência, contribui para que esta seja cultural e socialmente aceite, causando menor desaprovação. Violência remete, desde logo, para o exercício desproporcional de poder ou força e, no dicionário, facilmente encontramos sinónimos como agressividade, opres-são, brutalidade, imposição, etc. A diversidade de sinónimos dá conta da varieda-de de formas de violência. De facto, se a primeira imagem que nos ocorre quando pensamos no conceito é a de uma violência física/ corporal, na realidade muitas são as suas manifestações. A Violência de Género, a este nível, não é exceção.Consideram-se formas de Violência de Género, todas as que se baseiam no facto de uma pessoa ter nascido com determinado sexo, que a sociedade converteu em género, bem como as que são produto do desrespeito quer pela identidade de género, quer pela orientação sexual. Lembrando o conceito de estereótipos de género, podemos dizer que quando estes são utilizados no sentido de causar sofrimento a alguém, provocam uma situação de violência de género.Para termos uma ideia, violência de género pode encontrar-se:

- no Tráfico de Seres Humanos (visto serem as mulheres as principais vítimas, nomeadamente para exploração sexual);

- na Mutilação Genital Feminina (que se trata de uma intervenção mé-dica baseada na remoção ou lesão dos órgãos genitais femininos por razões meramente sociculturais);

- na Homofobia (que significa aversão, ódio e preconceito face a pes-soas homossexuais e bissexuais, materializando-se em manifestações violentas de todo o tipo, nomeadamente bullying);

- na Transfobia (semelhante à anterior mas face a pessoas transsexuais/ transgénero);

- na Violência doméstica e/ou conjugal e no namoro (embora nem sem-pre sejam ideias assentes no género que despoletam este tipo de vio-lência, será certamente, uma das mais comuns e também sob diversos tipos de ações).

Podemos, assim, afirmar que se um/a colega teu é vítima de insultos ou mesmo agressões físicas pelo facto de ser homossexual, estamos a assistir a uma situa-ção de violência de género. Da mesma forma, se uma colega tua é impedida pelo namorado de usar, por exemplo, saias curtas, ela está a ser vítima de violência de

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género. A questão da violência de género, mais do que nunca tem vindo a ser noticiada pelos vários órgãos de comunicação social. A boa notícia é que isso acontece de-vido à crescente preocupação com o problema, que cada vez mais é denunciado e condenado. A má notícia é que geralmente surge-nos devido à emergência de situações limite. Relembre-se que só no ano de 2014 morreram mais de 40 mu-lheres vítimas de violência. Relembre-se ainda que, no caso de homens vítimas de violência doméstica, por vezes estes não denunciam devido aos tais estereótipos de masculinidade (a ideia de que é vergonhoso um homem passar por tal situa-ção, por exemplo). Sim, os homens também podem ser vítimas!Todas estas situações podem e devem ser denunciadas, por qualquer um/a de nós, independentemente do consentimento da vítima. A violência doméstica, tal como a violência no namoro, são consideradas, por isso, Crime Público!Se a violência, nomeadamente de género, pode manifestar-se de diversas formas, vamos então conhecer os vários tipos de violência.

Tipos de violênciaViolência Física: É a mais conhecida e a mais facilmente visível pelas outras pessoas; realizada voluntariamente pelo/a agressor/a, causa danos e lesões corporais na vítima.

Violência Psicológica: Trata-se de uma conduta no sentido da humilhação, de-preciação, manipulação e culpabilização da vítima.

Violência Social: Refere-se ao comportamento orientado para o isolamento e controlo da vítima.

Violência Económica: Diz respeito ao controlo dos recursos económicos da vítima, criando a dependência da mesma.

Violência Sexual: Trata-se da pressão física ou psicológica com o intuito de manter contacto sexual/ íntimo com a vítima.

Se calhar já assististe, ouviste ou te confrontaste com alguma situação que se enquadra nos tipos de violência descritos anteriormente. Infelizmente aconte-cem com elevada frequência. Porque este caderno de apontamentos se dirige a jovens, vamos explorar um pouco mais o problema da Violência no Namoro, atendendo ao que abordámos anteriormente.

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Violência física

Violência no namoroVários estudos têm comprovado que a violência no namoro não é um fenómeno raro, sendo altamente provável que no meio que te rodeia, jovens ou mesmo tu sejam ou venham a tornar-se vítimas ou mesmo agressores/as.

Muitas formas de violência passam-nos despercebidas, às vezes nem tão pou-co as reconhecemos como violência de tão frequentes e social e culturalmente aceites que são. Por mais estranho que possa parecer, por vezes, manifestam-se como se de uma preocupação com o relacionamento e com o bem-estar da/o parceira/o se tratasse. Mas não, não são “pancadinhas de amor”!

É urgente falar desta forma de violência, na medida em que é enorme o impacto destrutivo que têm sobre as vítimas e sobre uma sociedade que se quer inclusiva.Passemos a caracterizar…

Podemos definir violência no namoro como aquela que, constituindo um padrão que se repete, é cometida por um dos parceiros (ou mesmo por ambos), com o objetivo de controlar, dominar e submeter a outra pessoa.

Normalmente, não surge de forme abrupta. Se numa fase inicial é tendencial-mente mais subtil e conforme aos padrões sociais aceites, com o tempo, vai-se tornando cada vez mais frequente e grave.

Violência no namoro não é a mesma coisa que conflito. Em todas as relações surgem divergências. É perfeitamente normal que assim seja. Aliás, falar delas abertamente pode ser saudável e construtivo. Já agir violentamente apenas tem um cunho destrutivo, no curto e no longo prazo, e é sempre inaceitável.

A violência no namoro, tal como a violência doméstica, não acontece apenas em certos grupos, é, sim, um fenómeno transversal. Assim, vítimas e agressores/as podem ser pouco ou muito escolarizados e encontram-se em todas as classes so-ciais, etnias e regiões. A violência surge independentemente do consumo drogas ou álcool, ou da existência de qualquer doença mental.

Repescando os tipos de violência que referimos na página 31, vamos agora exem-plificar algumas situações que consubstanciam a violência no namoro.

A/o tua/teu namorada/o empurra-te, agarra-te e/ou prende-te? Atira-te objectos e/ou queima-te? Dá-te bofetadas, murros, pontapés ou fere-te deliberadamente de uma outra forma?

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ViolênciaPsicológica

Violêncialsexual

Violência Social

A/o tua/teu namorada/o controla tudo o que fazes ao longo do dia? Liga ou manda mensagens constantemente, para saber onde e com quem estás e o que fazes? Controla, inclusive, a tua maneira de vestir? Insulta-te e humilha-te atra-vés de comentários negativos? Faz ameaças de agressão ou de fim de relação, ou persegue-se quando consegues por fim nessa situação?

A/o tua/teu namorada/o humilha-te e faz por denegrir a tua imagem junto de amigos ou de familiares? Mexe sem consentimento (ou pressionando-te) no teu telemóvel, e-mail, facebook, etc.? Proibe-te ou impede-te de estar com amigas/os ou familiares? Evita constantemente o teu círculo de amigas/os?

A/o tua/teu namorada/o obriga-te a ter relações sexuais, acaricia-te, beija-te ou apalpa-te contra a tua vontade?

Falar de violência no namoro não exige que estejam presentes todas estas situa-ções. Nem sempre elas surgem no mesmo momento de uma relação. Nem sempre surgem na sua totalidade, ainda que, frequentemente, se verifique mais do que um tipo ao longo do tempo. Certo é que a violência no namoro causa sofrimento físico e psicológico, tendo um impacto muito negativo no bem-estar e saúde da vítima. As agressões não devem nunca ser entendidas como provas de que o outro se preocupa contigo ou que te dá atenção.

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Consequências de uma relação violenta para as vítimas

Algumas consequências da violência no namoro para as vítimas tendem a verificar-se logo num curto prazo, manifestando-se, emocionalmente, em reações negativas como: medo, raiva, isolamento, tensão, sofrimento. Se existem consequências físicas que advém de agressões corporais (como nódoas negras, queimaduras, ossos partidos, etc.), outras há menos visíveis como dores de cabeça, insónias e mau estar geral. É óbvio que as vítimas tam-bém não vivenciam todas da mesma forma as situações de violência, mas é sabido que estas aumentam a probabi-lidade do surgimento de problemas do foro psicológico como: depressão, an-siedade stress, distúrbios alimentares, alcoolismo e toxicodependência bem como o risco de suicídio. (Fig.19)

Fig.19

A vivência de relações violentas tem implicações na qualidade de vida, na au-to-estima e nas relações interpessoais. Muitas das vítimas, após passarem por situações deste tipo desenvolvem receio de se envolver em novas relações. Para além disso, não são raros os caos em que surgem sentimentos de culpabilização pela própria situação vivenciada. É comum questionarmo-nos porque é que as vítimas não rompem com facilida-de com situações de violência. É comum até ouvirmos dizer que se as pessoas permanecem numa situação deste tipo é porque assim o desejam. Será mesmo assim? Não! A existência do denominado “ciclo da violência” ajuda-nos a perce-ber melhor este facto.

Acumulação de Tensão

Explosão ViolentaLua-de-Mel

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Como vemos na imagem, este ciclo, consubstancia-se em 3 fases centrais. A pri-meira respeita à acumulação de tensão. Trata-se do período (que pode ser até bastante longo) em que surgem episódios cuja violência é menos evidente. Po-dem emergir ofensas, humilhação, colocando-se a vítima no papel de ameniza-dora da situação, para evitar o surgimento de uma explosão violenta.

A explosão violenta diz respeito ao momento em que a tensão é descarregada, agravando-se a violência, que pode ser, para além de psicológica e social, física e sexual objetiva ou via ameaças.

A fase seguinte, designada de “lua-de-mel”, diz respeito à encenação de arrepen-dimento por parte do/a agressor/a, que pede desculpa, promete que não haverá novos episódios violentos, e demostra algum tipo de afeto pela vítima. Tal con-tribui para que a vítima tenha esperança na mudança, minimizando os episódios violentos. A ideia de que o amor deve ser defendido a qualquer preço e é acima de tudo a capacidade de resistência a todo o tipo de situações compactua com a perpetuação de situações de violência.

De algum modo, o cinema e a literatura, por exemplo, corroboram esta visão romantizada que, pelo contrário, só acarreta sofrimento e é uma clara ofensiva à liberdade das pessoas.

A ideia de que os ciúmes são uma coisa natural e expressam a existência de um amor incondicional exemplifica esta situação. Frequentemente justificam-se situações de violência sob este argumento. Desenganem-se! Os ciúmes apenas expressam o desejo de controle sobre a/o outra/o, o sentimento de propriedade face a algo que, na realidade não é de ninguém, mas apenas de cada um/a.

Também o medo de retaliações por parte do/a agressor/a, sob a forma de mais violência, perseguições, ou mesmo do cumprimento de ameaças de morte ou suicido, leva a que se mantenham relações violentas. O próprio medo de ficar só no futuro, é produto e alimento para relações deste tipo.

A tudo isto somam-se os sentimentos de isolamento e vergonha. O distancia-mento provocado pelo/a próprio/a agressor/a, face a amigas/os e/ou familiares, tende a ser um entrave a pedidos de ajuda para sair da relação. A vergonha de o fazer, devido ao necessário reconhecimento de uma relação que fracassou, acaba por constituir também, por vezes, um impedimento. A tudo isto associam-se ainda sentimentos de culpabilização por esse fracasso, muitas vezes decorrentes da interiorização, ao longo do tempo, das acusações efetuadas pelo/a agressor/a.

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Se este já parece ser um fardo demasiado pesado para as vítimas, a verdade é que, frequentemente, ainda se confrontam com a incompreensão de quem as rodeia, que acentua a auto culpabilização.

Os maus exemplos…

“De certeza que houve um motivo legítimo.”“Ela/e andava a pedi-las!”“Com aquele feitio, é normal que ele/a lhe faça isso.”“Porque é que ela/e responde?!

Referenciou-se anteriormente que, embora tanto homens quanto mulheres pos-sam ser vítimas de violência no namoro, esta acontece particularmente contra as segundas. De qualquer forma, tem-se vindo crescentemente a alertar para o facto de ser cada vez mais presente independentemente do sexo.

Pois é, como vimos, os estereótipos de género com que somos educados e socia-lizados têm aqui um papel importante. Embora a sociedade esteja em constante mutação ainda não é algo meramente do passado a ideia da subordinação das mulheres face aos homens. A violência contra as mulheres acaba por ser também uma forma de perpetuar essa situação. Também o silêncio e a vergonha em de-nunciar por parte dos homens quando vítimas, caminha no mesmo sentido.

Conscientes agora das dificuldades vivenciadas pelas vítimas, da multiplicidade de formas de violência e da sua especificidade no contexto do namoro, talvez seja o momento de pensar em como agir…

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Como ativar contra a violência?Ajudar uma vítima de violência nem sempre se configura uma tarefa fácil. Se por um lado, tal pode ser encarado como uma intromissão, por outro, podemos também ser levados pelo receio de represálias pelo/a agressor/a. São, assim, ne-cessários alguns cuidados.

Desde logo, importa fazer com que a vítima se sinta acompanhada, auxiliando no reconhecimento de que não tem qualquer responsabilidade na violência exercida sobre ela. Nada justifica a violência!

Auxiliar nesse reconhecimento não significa impor determinadas ideias de como agir ou do que é certo. O caminho da ruptura deve ser traçado pela própria vítima. Mesmo se esta não for a sua decisão e mesmo que a violência permaneça após o final da relação, o nosso apoio permanece fundamental.

Geralmente não estamos munidas/os de todas as ferramentas para que a si-tuação fique resolvida em definitivo. Para além disso, normalmente, leva tempo. Assim, uma forma de ajudar é aconselhar a vítima a procurar auxílio em adultos da sua confiança (um/a professor/a, a/o psicóloga/a da escola). Existem também diversas organizações especializadas nestas questões, sempre disponíveis para atender vítimas de violência e encaminhar as situações da melhor forma. Claro que, se verificares que a situação é demasiado perigosa, deves denunciar!

De qualquer forma, o nosso papel não se esgota neste tipo de ajuda. Prevenir este tipo de situações é fundamental! Assim, todas/os temos a responsabilidade em alertar amigas/os, conhecidas/os e a sociedade, em geral, para as diferentes for-mas de violência, condenando qualquer uma delas. A sensibilização/ prevenção é o veículo por excelência de combate à violência. Nunca é demais lembrar que amar é, também, e acima de tudo, dar liberdade e respeitar.

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Se és tu própria/o vítima de violência, primeiro que tudo:- Não te culpabilizes pela situação;- Não guardes o problema só para ti. Partilha com alguém da tua confiança. Só conhecendo a situação, alguém te poderá ajudar!

PROTEGE-TE E DENUNCIA!

Existem diversos serviços de apoio a vítimas de violência. Por exemplo:

• A CIG (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género) disponibiliza um ser-viço de informação e apoio jurídico de carácter confidencial e gratuito a vítimas.• A UMAR (União Mulheres Alternativa e Resposta), é uma organização não gover-namental de mulheres que disponibiliza centros de atendimento, apoio e acolhi-mento a mulheres vítimas de violência• A APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) faculta apoio jurídico, psico-lógico e social às vítimas de crime e a seus familiares.

Alguns conselhos práticos:

- Opta por frequentar locais públicos e movimentados quando estiveres com o/a teu/tua namorado/a. Locais isolados podem acarretar maiores riscos.

- Põe alguém de confiança a par dos teus movimentos (onde vais e a que horas prevês regressar).

- Mantém no teu telemóvel contactos importantes caso necessites de pedir ajuda. Numa situação de emergência, podes sempre ligar para o 112.

Contacta! O apoio é gratuito e confidencial.

LINHA NACIONAL DE EMERGÊNCIA SOCIAL (24h por dia): 144

LINHA TELEFÓNICA DE INFORMAÇÃO ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTI-CA (24h por dia): 800 202 148.

LINHA DE APOIO À VÍTIMA (9h-17h): 116 006

Sou vítima de violência! O que devo fazer?

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Qualquer vítima ou testemunha deste tipo de crime pode também denunciar: - Através do Portal Queixa Eletrónica do Ministério da Administração Interna. - Nas Autoridades Policiais: PSP; PJ; GNR; - Institutos de Medicina Legal, gabinetes médico-legais ou hospitais.

Para a denúncia podem ser necessárias informações como:- A hora, data e local do crime; - A identificação do queixoso; - A descrição da ocorrência; - A identificação das testemunhas.

ATIVA(-TE) CONTRA A VIOLÊNCIA NO NAMORO! ATIVA(-TE) PELA IGUALDADE DE GÉNERO!

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Todas as informações contidas neste caderno são, como deves calcular, limita-das. Trata-se de temáticas bastante complexas e muito há ainda para conhecer e discutir.

Se, tal como nós, tens interesse em intervir neste domínio o primeiro passo será pesquisar. É ampla a bibliografia e videografia neste domínio, só tens de dedi-car algum tempo a procurar. A internet, que bem conheces, pode ser uma boa ferramenta, desde que não te esqueças de confrontar informações e fontes. O conhecimento ativa-nos!

De qualquer forma, tens já algumas pistas que te podem ajudar a agir. Tu próprio, em casa, na escola, na rua, podes fazer a diferença. Exprime a tua reprovação sempre que te confrontares com situações de desigualdade e violência. Denún-cia, quando for caso disso, e não deixes de apoiar e partilhar o que sabes com quem necessita.

É claro que amplas mudanças levam tempo e os esforços têm de ser conjuntos. Existem movimentos e associações que trabalham sobre estas questões a que te podes juntar. O ativismo é também uma excelente forma de lutar por uma socie-dade sem violência, pautada pela igualdade na diversidade.

Notas FinaisNF

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A realização deste caderno de apontamentos só foi possível dada a colaboração de diversas entidades. Efetivamente, ele surge da experiência no terreno com o projeto AtivArte – Contra a Violência e pela Igualdade de Género, promovido pelo Synergia. As parcerias sedimentadas durante o projeto revelaram-se fundamen-tais. Assim, importa agradecer a todas/os os estudantes e docentes que colabo-raram nas atividades, nomeadamente estimulados pelas Direções Executivas das escolas parceiras. Foram elas: o Agrupamento de Escolas André Soares, o Agru-pamento de Escolas de Braga Oeste, o Agrupamento de Escolas Sá de Miranda e a Escola Profissional de Braga. A Associação Krizo – Educação, Arte e Cidadania, bem como o TinBra (Teatro Infantil de Braga) merecem também todo o nosso agradecimento pelo excelente trabalho criativo desenvolvido com os estudantes. Um último agradecimento ao núcleo de Braga da UMAR, pela partilha de expe-riências, participação em algumas das atividades e mentoria na elaboração do caderno.

Agradecimentos A

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Como foi referenciado anteriormente o projeto AtivArte, e esta publicação em particular, beneficiou do apoio fundamental do Mecanismo Financeiro das EEA Grants. A atuação das EEA Grants e Norway Grants, Islândia, Liechtenstein e No-ruega têm vindo a contribuir para reduzir as disparidades sociais e económicas e estabelecer relações bilaterais tendo como beneficiários países europeus. Os três países têm estreita cooperação com a União Europeia, no âmbito do Acordo com a Área Económica Europeia (Agreement on the European Economic Area – EEA). No período compreendido entre 2009 e 2014, as EEA Grants e Norway Grants investiram 1.79 billiões de euros. A Noruega contribuiu com cerca de 97% do total do financiamento. Este tem sido destinado a ONGs, investigação e institui-ções académicas, bem como aos setores público e privado dos 12 mais recentes membros da União Europeia, Grécia, Portugal e Espanha. Existe uma ampla coo-peração entre as entidades estatais donatárias e as atividades devem ser im-plementadas até 2016. As áreas abrangidas são: proteção ambiental e mudan-ças climáticas, investigação e bolsas escolares, sociedade civil, saúde e infância, igualdade de género, justiça e herança cultural. Para mais informações consultar: www.eeagrants.org.

A Entidade Financiadora A

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