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ASSESOAR: uma analise sócia histórica da identidade dos colonos do
Sudoeste do Paraná na década de 1960
Alexandro Abatti1
Palavras chave: Movimentos sociais, Sudoeste, Assesoar.
Introdução:
É fato que os estudos acerca da história de ocupação do Sudoeste Paranaense
tem se multiplicado ao longo da ultima década. A temática representa uma marca
valorosa para os pesquisadores, principalmente os sudoestinos, na busca de
“vantajosos” esclarecimentos que, por sua vez, se tornam instrumentos de analises mais
profundas.
Fonte inesgotável, cujas razões mostram-se claras pelos inúmeros artigos,
dissertações e outros documentos produzidos sobre esta significativa história de luta dos
camponeses do Sudoeste. A questão agrária tem sido alvo de intensos debates, trata-se
de uma busca incessante e o desejo de compreender os aspectos mais expressivos na
ocupação, no contexto da Revolta dos Posseiros e o processo de regularização das terras
pelo GETSOP2.
O fato é que estes inúmeros estudos tem contribuído para socializar os
principais componentes que desencadearam os conflitos da região. A priori, buscamos
fazer referencia a origem da região sudoeste, de modo que possamos compreender quais
os elementos que foram destaque neste contexto. Num segundo momento nos propomos
analisar o papel da ASSESOAR3, instituição que, fundada na década de 1960, terá papel
fundamental na região Sudoeste frente aos movimentos de luta de classes, permanência
e formação de uma identidade aos colonos recentemente assentados e com suas
propriedades regularizadas pelo GETSOP.
1 Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em História-PPGH da Universidade de Passo Fundo-UPF (Bolsista
CAPES). Contato: [email protected]. 2 Grupo Executivo para as Terras do Sudoeste do Paraná. 3 Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural.
Sudoeste do Paraná: uma história em construção
Os conflitos desencadeados na região que atualmente compreende o Sudoeste
Paranaense são retratados de modo não incomum como os mais complexos do sul do
Brasil. Ao referenciar o ano de 1895, quando o Presidente Americano Grover Cleveland
arbitra a favor do Brasil na disputa entre Brasil e Argentina, a região Sudoeste era ainda
considerada isolada e desintegrada das outras regiões do país. Barão do Rio Branco,
personagem decisivo na chamada “Questão de Palmas” é referenciado pelo autor:
O sudoeste paranaense fizera parte desta área de disputa que ficou conhecida
como a “Questão das Missões ou Palmas” sendo resolvida quando diplomata
Barão do Rio Branco, a mando do Presidente Floriano Peixoto, advogou a
questão em Tribunal Internacional com o argumento de que brasileiros já
ocupavam essa região. O presidente americano Grover Cleveland,
responsável para julgar a questão, deu ganho de causa ao Brasil em
06/02/1895. (HEINSFELD, apud VANNINI, ZATTA, 2016, p. 291).
O Sudoeste Paranaense somente passa a existir oficialmente em 20 de outubro
de 1916 após o acordo que põe fim a questão de limites entre o Estado do Paraná e o
Estado de Santa Catarina. (GELLER, 2010, p.89). Vista como uma região desprovida de
um contingente populacional que despertasse interesse politico e, sobretudo, que não
detinha de estruturas viárias que permitissem acesso a esta região, o Sudoeste é até o
ano 1930, explorada pelas companhias estrangeiras, principalmente a argentina, que
usavam o Rio Paraná como via chegada.
Foi sob os olhares dos espiões, na sua grande maioria militares - que eram a
base de apoio de Getúlio Vargas no combate a Coluna Prestes - que a partir de 1930 o
Sudoeste atrairia diferentes olhares do ‘novo governo’4 por encontrar-se em situação de
abandono e principalmente, por compreender uma região de fronteira. Nesta
perspectiva, em fins da década de 1930 o governo vai implantar uma politica de
proteção do Estado brasileiro nas fronteiras, principalmente a fronteira com a Argentina,
por reconhecer os “perigos” que esta linha-limite representava.
4 Getúlio Dornelles Vargas assumiu o poder com amplo apoio dos militares que combateram a Coluna Prestes,
portanto, eram conhecedores das fronteiras do Estado Brasileiro.
O fato de a Coluna Prestes ter percorrido o interior do Brasil, bem como outras
regiões, é escrito por Julia Chindemi em seu estudo “Las Múltiples Fronteras de Rio
Grande del Sur (1923-1933:
[...] las tropas comandadas por los tenientes sublevados al mando de Luis
Carlos Prestes y Miguel Costa organizaram um ejército que desobedeció al
estado Mayor Revolucionario por considerar que estaba formado por “turistas
y no por guerreiros” y crearon el núcleo original de la llamada Columna
Prestes, que realizo uma increible marcha por el interior de Brasil, Paraguay
y Bolivia durante años. (CHINDEMI, 2000, p. 12).
O mapa a seguir apresenta a localização da região Sudoeste do Paraná, área em
litígio, regiões de fronteira com o Estado de Santa Catarina e com a Argentina
destacadas pelos conflitos ora apresentados.
Figura 1: Fotos Caderno Cultural. Prefeitura de Francisco Beltrão.
As inúmeras interpretações e questionamentos dados pela historiografia sobre o
conceito de fronteira nos permitem fazer algumas considerações, pois o estrangeiro
sempre representou certa ‘ameaça’ e as estratégias de proteção se fundamentaram na
individualidade de cada governo. O conceito deve estar além da atribuição de uma
‘fronteira formal’, isso significa que existem as fronteiras econômicas, sociais, culturais,
ambientais, que podem limitar mais que a divisória. (GOLIN, 2002, p. 15). O autor Tau
Golin refere-se ao conceito de fronteira:
Definido o limite como linha político-territorial extrema do Estado-nação,
inscrita na natureza, a mesma objetividade técnica não se pode utilizar para o
conceito de fronteira. Apenas como uma referência facilitadora, a fronteira é
interpretada como uma faixa ou zona existente nos dois lados da linha
divisória e de difícil precisão. [...] a zona fronteiriça é real e depende das
relações sociais em diferentes tempos históricos. (GOLIN, 2002, p. 14).
Com o inicio do governo Vargas, buscou-se implantar novas políticas e
práticas administrativas através dos Interventores dos Estados - no Paraná o General
Mário Tourinho - entre elas a prática de nacionalização das fronteiras. O General
Tourinho, por contrariar a política nacionalista de Vargas, foi desligado do governo e
em seu lugar assume Manoel Ribas do Rio Grande do Sul. Homem de inteira confiança
de Vargas prosseguiu com intenso trabalho na ocupação dos espaços “vazios” e em fins
da década de 1950 a região já consolidava uma integração interna proporcionando um
aumento demográfico e a inserção do Estado na economia nacional. (BATISTTI, 2003,
p. 28).
Esta nova politica do Estado Novo, comandado por Getúlio, deixava claro seu
interesse na ocupação destes espaços, lançava-se então a chamada “Marcha para o
Oeste”, que além de ocupar estas regiões, acabou sendo estrategicamente uma via para
proteger as fronteiras e integrar economicamente o Brasil.
Battisti expõe a intenção do novo regime:
[...] Através da “Marcha para o Oeste” o Governo buscou eliminar os
supostos “vácuos” demográficos, fazer com que as fronteiras econômicas
coincidissem com as fronteiras políticas – integração -, explicitar as supostas
unidades étnico-cultural, política e econômica e evidenciar o sentimento de
ser brasileiro. (BATTISTI, 2003, p.30).
A partir de 1943, a política de colonização e ocupação se intensificava e o
governo criava as colônias agrícolas, estas com o propósito de intensificar a ocupação
da região e extrair o excedente de mão de obra rural e resolver o problema de escassez
de terras que assolava o Estado do Rio Grande do Sul. Criava-se a CANGO5, inserida
na política federal denominada ‘Marcha para o Oeste’.
Esta foi responsável por deslocar o pequeno agricultor para o sudoeste que, na
sua grande maioria, é oriundo da região da Serra Gaúcha e Catarinense e todo processo
de ocupação da referida região esteve associado ao desejo, o sonho da garantia de
propriedade da terra e melhoria de vida. Uma característica expressiva dos pequenos
agricultores que vieram para o Sudoeste era considerar a propriedade da terra como
valor essencial na sua cultura.
No decreto de criação da CANGO constava: “[...] fica criada a Colônia
Agrícola “General Osório”, no Estado do Paraná, na faixa de 60 quilômetros de
fronteira, na região de Barracão, Santo Antônio, em terras a serem demarcadas pela
divisão de terras e colonização”. (GOMES, 1987, p.160).
O autor Rubens da Silva Martins destaca o objetivo da criação da Cango:
A Colônia Agrícola Nacional General Osório, fora criada pelo Presidente
Vargas em 12 de março de 1943, com o objetivo de promover a ocupação
física da rica e extensa faixa de nossa fronteira, fixando nela, inicialmente,
reservistas que haviam sido deslocados de seus afazeres rurais para prestação
do serviço militar obrigatório e, posteriormente, outras famílias brasileiras
que se comprometiam a observar as diretrizes emanadas do Departamento
Nacional de produção Vegetal. (MARTINS, 1986, p.26).
A CANGO oferecia aos colonos que chegavam à região, em crescente número,
todo tipo de ajuda e assistência: a terra, a casa, ferramentas e sementes agrícolas, ajuda
médica. Tudo era de graça, mas sem o título de propriedade da terra. Na prática, os
agricultores eram ainda considerados posseiros. Tinham a posse da terra, mas não um
documento que atestasse a sua propriedade.
Ainda sobre a CANGO:
A administração da CANGO instalou-se temporariamente em Pato Branco,
em 1944, sendo que, apenas em 1948, instalava-se na Vila Marrecas, atual
Francisco Beltrão. A CANGO, em seus primeiros anos de atuação,
alimentava o sonho dos migrantes de produzir e progredir [...]. (CASTELLI;
QUADROS; BONAMIGO, 2007).
5 Colônia Agrícola Nacional General Osório.
Ocorre que neste período a maior parte da região Sudoeste fazia parte da gleba
Missões, (conforme mapa exposto acima) disputada pela União e o governo paranaense.
Na época da criação da CANGO a área estava sub judice, quer dizer, a União e o
governo paranaense disputavam na justiça a posse das terras.
Mesmo a área estando sub judice a União acabou por instalar a CANGO dentro
dos limites da Gleba Missões. Resumindo: os posseiros do Sudoeste do Paraná foram
instalados em áreas de terra que estavam sendo alvo de disputa judicial entre os
governos Federal e Estadual. Juridicamente, a área não tinha dono, mas estava
incorporada à União.
Entre os anos de 1951, ano das primeiras reações pacíficas dos posseiros e 1957,
ano do desfecho e do levante armado, os conflitos se intensificaram. Primeiro com a
instalação da CITLA6 e em 1956 com a APUCARANA7 e a COMERCIAL8, estas
companhias de terras foram responsáveis por proporcionar momentos de incertezas aos
posseiros, ainda não havia legalmente ocorrido à titulação da propriedade da terra. A
violência das companhias se intensificava e incrementava o ódio e a consequente união
de forças entre os colonos/posseiros e outros setores da sociedade Sudoestina. Cada vez
mais os colonos se recusavam a assinar os contratos fazendo com que as ameaças e os
violentos atos se tornassem constantes, as companhias criavam um clima de terror
insuportável no Sudoeste.
O ambiente hostil instalado fez com que no dia 10 de outubro de 1957, os
colonos estrategicamente ocupassem a Cidade de Francisco Beltrão, era um grande
numero de posseiros armados e furiosos que revelavam a indignação contra as
companhias. Com inúmeros atos de atrocidades cometidos pelos jagunços, os colonos
em maior numero, poderiam ter feito justiça com as próprias mãos, motivos não lhes
faltavam para isso. Os inimigos dos colonos foram preservados e a fúria destes se
expressou na destruição dos escritórios das companhias.
O desfecho, a destruição dos escritórios e de toda documentação das
companhias fizeram deste ano de 1957 um marco histórico na região Sudoeste do
Paraná. Este fato determinou uma ação coletiva de indivíduos que constituíam objetivos
6 Clevelândia Industrial e Territorial Ltda. 7 Companhia Imobiliária Apucarana Ltda. 8 Companhia Comercial e Agrícola Paraná Ltda.
claros para não perder o direito a posse da terra. Portanto, essa organização foi
fundamental para que a legalização fundiária da Gleba Missões e Chopim se tornasse
uma politica governamental de regularização, o que mais tarde, resultou na criação do
GETSOP9.
GETSOP: a regularização das terras
Após a “retirada” dos jagunços, a união dos posseiros do Sudoeste foi
fundamental para que a titulação das terras fosse possível e os tornassem proprietários
das terras. Na campanha presidencial de 1960, a população do Sudoeste votou em sua
grande maioria, em Jânio Quadros, que havia se comprometido durante a campanha
eleitoral de regularizar a situação fundiária caso eleito fosse. Eleito, Jânio regularizou a
área em litígio através do decreto nº 50.397/61. Em poucos meses Jânio renunciou e o
novo Presidente João Goulart aprovou o decreto nº 51.431/62 criando o Getsop.
(GOMES, 1987, p. 113-114).
O levante armado de 1957 foi um movimento de defesa dos direitos de posse
por ocupantes de terras que estavam sendo questionadas pelas empresas colonizadoras.
Tal afirmação supõe que as terras já estavam distribuídas e que o Getsop teria a função
de reconhecer esse direito de concessão aos que sobre suas propriedades tivessem
direito.
O Getsop nos primeiros anos de atuação ficou diretamente ligado a Presidência
da República e seus primeiros trabalhos foram de demarcar, medir os lotes no meio
rural e urbano e a escrituração destes. O projeto inicial do Getsop também incluía
assistência técnica, financiamentos e a garantia de uma organização para escoar a
produção agrícola. Foram construídas pontes e as estradas melhoradas para facilitar este
escoamento de produção, isso resultou no desenvolvimento da região nos diversos
setores.
No entanto, a percepção que se tem é que a atuação do Getsop fundamentou no
aspecto sócio econômico uma espécie de ‘identidade regional’, pois se partimos do
pressuposto de que o Getsop foi responsável por uma espécie de reforma agrária, no
9 Grupo Executivo para as terras do Sudoeste.
entendimento de que, reforma agrária seria um processo de distribuição de terras para
famílias de agricultores a partir de uma ação oficial de divisão de latifúndios ou terras
devolutas, constataríamos que o Getsop não fez reforma agrária, mas sua ação esteve
diretamente ligada na solução do conflito agrário e se efetivou a partir do
reconhecimento do direito a posse dos agricultores que já estavam sobre estas terras. O
papel de distribuição vale lembrar, coube a CANGO conforme destacamos
anteriormente. Esta ação foi responsável por transformar os posseiros em proprietários
de terras através da regularização definitiva das propriedades.
Todo o entendimento deste processo é fundamental para que possamos
compreender que o Getsop definiu e pode-se dizer, “encerrou” uma peregrinação pela
legalidade que se estendia desde o ano 1943 quando se criou a CANGO. Os posseiros
poderiam não ser os donos legítimos das terras que ocupavam, mas eram eles que
usavam a terra para produzir e sobreviver junto a sua família. O que o Getsop fez foi
conferir a posse da terra aos que mais necessitavam dela para sobreviver, de forma justa
e eficiente, fazendo nascer uma nova identidade ao colono do Sudoeste Paranaense.
A partir dessa afirmação, buscamos nos remeter ao campo da construção de
uma identidade do pequeno agricultor do Sudoeste. Para isso, foi fundamental que
buscássemos nas condições históricas e no contexto de criação do Getsop, elementos
que nos proporcionassem tal analise. E nesta perspectiva, nos remetemos a analise de
uma instituição que referenciou este constante processo, que após assentados pelo
Getsop terá papel fundamental na organização, manutenção e fortalecimento destes
pequenos agricultores, a ASSESOAR10 de Francisco Beltrão.
ASSESOAR: uma história de luta
O surgimento da ASSESOAR esta ligada a vinda de padres Belgas
missionários do Sagrado Coração de Jesus (MSC), a região sul do país com o objetivo
de iniciar uma nova missão. Os primeiros que chegaram se instalaram na região de
Descanso, Santa Catarina e no município de Barracão no Paraná. (BATTISTI, 2003,
p.153).
10 Associação de estudos, orientação e Assistência Rural.
Em meio à atuação do Getsop, chega ao Sudoeste por volta de 1961 um grupo
de padres Belgas que fariam a diferença. Estes eram movidos pelo anuncio do Papa
João XIII que convocava a Igreja Católica Apostólica Romana a participar de um
Concilio Ecumênico para discutir os desafios da igreja diante das questões de fé e a
postura da igreja frente aos problemas do mundo. Segundo João Carlos Tedesco, “O
Concílio Vaticano II (1962-1965) auxiliou na renovação para o âmbito social da Igreja
Católica nesse período, em especial em sua preocupação com o rural, em seus planos de
pastoral [...]” (TEDESCO, 2011, p. 153).
Os padres da Bélgica chegam ao Sudoeste e encontram muito trabalho, este
espirito de renovação e organização será responsável por transformar a fé em
compromisso de defesa da vida, da terra, e dos colonos que recentemente tinham vivido
a tempestuosa Revolta dos Posseiros de 1957. Os padres se reconhecem a partir de
1962 quando no inicio do Concilio Vaticano II, a igreja se propõe a trabalhar mais
próxima do povo, a igreja quer ser do povo.
O que chama atenção é que entre o grupo de padres, um em especial, se
sobressai na atuação da igreja no Sudoeste. José Caekelberg11, líder belga trouxe
consigo uma historia luta, de organização dos movimentos de jovens em Bruxelas,
Capital da Bélgica. Mas uma base sólida seria necessária para consolidar a ação que em
meio a um cenário de tensão social e luta pela terra pudesse levar adiante este projeto.
Foi em 10 de fevereiro de 1966 que surgiu a ASSESOAR. A instituição foi fundada por
um grupo de jovens rurais membros da JAC12, apoiada pelos belgas que estavam
empenhados com as famílias dos pequenos agricultores familiares que investem e se
mobilizam para fortalecer seu sonho de uma vida melhor e de manutenção da posse da
terra.
11 O Pe. Joseph Caeckelbergh, na região, ficou conhecido como Pe. Jef. Formou-se padre em abril de 1961 e veio
para o Brasil em 4 de novembro do mesmo ano. Antes de vir para o Sudoeste, ficou um ano em São Paulo,
aprendendo português. Jef disse que entrou para a Congregação dos MSC com a intenção de ir à África (Congo), mas
diante dos apelos dos padres daqui, aceitou vir para o Brasil. (BATTISTI, 2003, p.154). 12 Juventude Agrária Católica.
Figura 2: Na foto acima, os associados/as fundadores/as da ASSESOAR que
assinaram a ata da assembleia de aprovação dos Estatutos da ASSESOAR, no dia
08 de fevereiro de 1966 e que constam na lista de Sócios Fundadores, em livro
próprio do dia 10 de fevereiro de 1966.
Planejava-se expandir com este movimento a catequese familiar, baseada no
Plano da Pastoral dos Bispos do Brasil a CNBB, a formação da comunidade de base,
grupos de jovens e formação de líderes. Toda esta organização é resultado de ação
conjunta dos Padres Belgas, Igreja Católica e os jovens camponeses. Para os mesmos, o
movimento era reflexo da aventura embasada em sofrimentos, lutas e dificuldades
enfrentadas durante a conquista da região. Tais êxitos foram resultados da união e luta
pela posse da terra. O Jornal Cambota, produzido pela própria ASSESOAR em
dezembro de 1973, expressava a verdadeira intenção deste grupo:
Havia muita incerteza. Mas ao mesmo tempo, existia também a esperança e a
vontade de vencer. Vendo todas estas qualidades no meio do povo, um grupo
de pessoas acreditou. Foi iniciado um trabalho de educação e promoção dos
agricultores (CAMBOTA, 1973, p. 2).
Eram princípios iniciais da Assesoar: a participação de todos, a solidariedade, a
união e o incentivo para que os agricultores se organizassem de forma autônoma.
(BATTISTI, E. DAMBROS, V., 1997, p. 14).
O autor Battisti destaca sobre a inspiração dos jovens fundadores:
Os jovens fundadores, assessorados pelos MSC, foram buscar a inspiração na
Doutrina Social da Igreja250, especialmente na encíclica Mater et Magistra,
que “destacou de maneira especial a agricultura, sobretudo a familiar”251, e
no CVII - ambos de iniciativa do Papa João XXIII - nos aspectos que
objetivaram a valorização da ação pastoral dos leigos através de formas de
inserção nas práticas da Igreja e de participação ativa na transformação
social. O compromisso social orientava-se por um diagnóstico
socioeconômico resultante da leitura cristã da realidade local, regional e
nacional. (BATTISTI, 2003, p. 162).
Este processo de fundação e atuação da Assesoar é paralelo ao Getsop, porém
cabe ressaltar que a Assesoar trabalhava com base nos princípios da Igreja, dos Belgas
da MSC13, e o Getsop era órgão do Governo responsável pela titulação das terras e
organização do sudoeste nos diversos setores. O ponto em comum e o mais relevante
para este estudo é o pequeno agricultor que se instalava nesta região, agricultor este que
no pós levante de 1957 se atribuía o titulo de proprietário da terra. A identidade do
pequeno agricultor do sudoeste passava a ser construída no seu cotidiano e na atuação
da Assesoar.
Hall especifica sobre a ideia de identidade:
A identidade [...] formada e transformada continuamente em relação às
formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas
culturais que nos rodeiam. É definida historicamente e não biologicamente.
[...] O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos,
identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente. (HALL,
2014, p.12)
Nesta concepção a Assesoar passou a organizar, fundamentar e efetivar o
colono em suas pequenas propriedades, incentivando prática da agricultura através de
organizações e ou associações, catequese mais próxima do povo e não mais nas
Paróquias, grupos de jovens que se reuniam para refletirem sobre a prática de
produtividade familiar, visto que é neste período que ocorreu a chamada “Revolução
verde”.
A ASSESOAR fundamentou e promoveu melhores condições de vida aos
pequenos agricultores na lavoura e na pecuária de acordo com a doutrina social cristã.
Estes objetivos somente foram alcançados pelo fato dos agricultores estarem ativos na
Associação e pelos meios de atuação por ela promovidos. A educação e a formação da
13 Missionários do sagrado Coração.
identidade do homem do campo procurou atingir todas as faces que dizem respeito a a
sua personalidade moral, religiosa e social e principalmente quando relacionadas as
atividades profissionais do campo. (BATTISTI, E. DAMBROS, V., 1997, p. 14).
Considerações finais
Este estudo teve por finalidade observar o contexto de fundação da
ASSESOAR e sua atuação frente aos Pequenos agricultores familiares do Sudoeste
Paranaense. É importante mencionar que a construção da identidade destes esteve
diretamente ao processo de titulação das terras pelo Getsop, mas principalmente a
Assesoar, que após o levante e a regularização fez um trabalho de fixação e
permanência do agricultor em suas terras. Este trabalho foi responsável por fortalecer o
meio rural, as organizações familiares, as comunidades, a atuação dos jovens e a
formação de lideranças.
Portanto, o objetivo da ASSESOAR foi o fortalecimento de uma identidade
sócio cultural e de valorização da identidade profissional dos agricultores familiares. Os
resultados foram perceptíveis ao longo dos anos pelas manifestações dos agricultores na
afirmação de suas condições e de sua importância enquanto produtores no contexto
atual.
Referências Bibliográficas:
Livros:
GOLIN, Tau. A Fronteira. Introdução: A fronteira como centralidade entre a região e a
nação. Porto Alegre: L&PM, 2002, v. 1.
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HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução; Tomaz Tadeu
da Silva & Guacira Lopes Louro. Lamparina, 2014.
MARTINS, R. S. Entre Jagunços e Posseiros. 1º ed. Curitiba, Studio GMP. 1986.
Capítulo de livro:
BONAMIGO, C. A.; CASTELLI, C. T.; QUADROS, M. Ocupação e Colonização: o
conflito pela posse da terra no Sudoeste do Paraná. In: BONAMIGO, C. A.,
SCHNEIDER, C. R. (Orgs.). Revisitando a história: a Revolta dos Posseiros de 1957
no Sudoeste do Paraná. Francisco Beltrão: Editora e Gráfica Grafisul Ltda., 2007. p.
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GELLER, O. E. Região: considerações a respeito de um estudo a ser feito. In: SILVA,
C. L.; SCHNEIDER, C. R. (Orgs.). HISTÓRIA: traços de cultura e memória. Francisco
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Artigo em periódico:
CHINDENI, Julia. Las multiplas fronteras de Rio Grande del Sur ( 1923-1933).
Anais das Primeiras Jornadas de História Regional Comparada. Porto Alegre, 2000.
TEDESCO, J. C. Conflitos de Interesses e Tutela Camponesa: O Associativismo
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ZATTA, R. VANNINI, I. A. O sudoeste do Paraná e a presença Militar na
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ISSN: 2317-1979. Páginas: 288-307. 03/03/2016.
Dissertação de Mestrado:
BATTISTI, Elir. Agricultura Familiar e Cidadania: os embates da Assesoar.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da
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Revistas:
BATTISTI, E. DAMBROS, V. ASSESOAR: Uma História em Construção – 32 anos
fortalecendo a Agricultura familiar. ADM Artes gráficas e editora Ltda. Fco. Beltrão:
1997.
CAMBOTA, Jornal, Anos 1973 a 1975. Volumes nº 01 a 12. Francisco Beltrão:
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