aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio...

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6. Aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido 2015 RDCI vol.90 (JaneiroMarço 2015) Constituição e Direitos Humanos 6. Aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido 6. Aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido Philosophical and legal aspects of death, euthanasia, orthothanas/a and assisted suicide MARILENE ARAÚJO Especialista em direito administrativo pela PUCSP. Especialista em Processo Civil pela Escola Superior da Procuradoria de São Paulo. Mestranda em Direito Constitucional pela PUCSP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional. Advogada. [email protected] Sumário: 1. O utilitarismo, o kantianismo, a felicidade, o desejo e a vida nua 1.1 O utilitarismo e o kantianismo 1.2 Felicidade 1.3 O desejo: a real imanência 1.4 Vida nua 2. Antecedentes históricos e teóricos 2.1 Os povos primitivos 2.2 A antiguidade 2.3 Idade Média 2.4 Modernidade 3. A quem pertence à vida 4. Conceitos básicos: morte, eutanásia, ortotanásia, suicídio e suicídio assistido 4.1 A questão da morte 4.2 Eutanásia 4.3 Ortotanásia 4.4 Suicídio assistido 5. Direito comparado 5.1 Bélgica 5.2 Holanda 5.3 Suíça 5.4 Estados Unidos

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Artigo sobre direito ao nome, no campo do direito civil.

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Page 1: Aspectos Filosóficos e Jurídicos Sobre a Morte, A Eutanásia, A Ortotanásia e o Suicídio Assistido (Marilene Araújo)

16/06/2015 Thomson Reuters ProView Revista de Direito Constitucional e Internacional

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6. Aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido2015RDCI vol.90 (JaneiroMarço 2015)Constituição e Direitos Humanos6. Aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido

6. Aspectos filosóficos e jurídicos sobre a morte, aeutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido

Philosophical and legal aspects of death,euthanasia, orthothanas/a and assisted suicide

MARILENE ARAÚJO

Especialista em direito administrativo pela PUCSP. Especialista em Processo Civil pela EscolaSuperior da Procuradoria de São Paulo. Mestranda em Direito Constitucional pela PUCSP. Membro

do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional. Advogada. [email protected]

Sumário:

1. O utilitarismo, o kantianismo, a felicidade, o desejo e a vida nua1.1 O utilitarismo e o kantianismo1.2 Felicidade1.3 O desejo: a real imanência1.4 Vida nua

2. Antecedentes históricos e teóricos2.1 Os povos primitivos2.2 A antiguidade2.3 Idade Média2.4 Modernidade

3. A quem pertence à vida4. Conceitos básicos: morte, eutanásia, ortotanásia, suicídio e suicídio assistido

4.1 A questão da morte4.2 Eutanásia4.3 Ortotanásia4.4 Suicídio assistido

5. Direito comparado5.1 Bélgica5.2 Holanda5.3 Suíça5.4 Estados Unidos

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5.5 França5.6 Uruguai

6. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos7. Aspectos normativos no Brasil8. Considerações Gerais9. Referências bibliográficas

Área do Direito: Constitucional

Resumo:

Desafios contemporâneos passam por questões filosóficas, como dignidade da pessoahumana, felicidade, moral, o sagrado, que são discutidas ao longo da história da humanidade.Tais desafios têm como tema central questões sobre a vida e sobre a morte. Afinal, práticascomo eutanásia, ortotanásia, suicídio existem desde tempos primitivos e são objeto de reflexãodo homem. A tecnologia e as técnicas fazem com que tais questões se tornem maiscomplexas. O Direito possui a missão de regular tais complexidades.

Abstract:

Contemporary challenges include philosophical issues, such as human dignity, happiness,morale, sacred, which are discussed throughout the history of mankind. Such challenges haveas central theme issues about life and death. After all, practices like euthanasia, orthothanasiasuicide existed since primitive times, and specific reflection of man. The technology andtechniques make these issues become more complex. The law has the task of regulating suchcomplexities.

Palavra Chave: Eutanásia Ortotanásia Suicídio assistido Utilitarismo Dignidade Felicidade.Keywords: Euthanasia Orthothanasia Assisted suicide Utilitarianism Dignity Happiness.

Recebido em: 19.12.2014

Aprovado em: 16.02.2015

1. O uti l i tarismo, o kantianismo, a fel icidade, o desejo e a vida nua

1.1. O utilitarismo e o kantianismo

Um dos debates envolvendo a questão da vida e da morte coloca, de um lado, os utilitaristas e,de outro lado, os chamados Kantianos. O inglês Jeremy Bentham (17481832), deixando delado qualquer ideia de direitos naturais, trabalha os valores éticos e morais, a partir de um únicoobjetivo: maximizar a felicidade. Para ele o que importa é a utilidade, aquilo que produz o prazer,diminuindo a dor e o sofrimento.1

A partir da ideia de que o homem se conduz e se governa pela dor e pelo prazer, Benthamconsidera que os conceitos como o que é certo e o que é errado vêm da dor e do prazer. Destemodo, a vida política e o sistema jurídico devem ser orientados pela maximização da felicidadena comunidade (corpo fictício formado pelos cidadãos e legisladores).2

Um dos planos desenvolvido por Bentham é criar reformatórios para abrigar os mendigos, paraque ocorresse a diminuição destas pessoas nas ruas. Isto porque, a presença de moradores de

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rua reduz a felicidade das pessoas que passeiam pelas ruas, ou seja, do público em geral. Paraalgumas pessoas, a presença dos mendigos traz sofrimento e para outras pessoas, a presençatraz repugnância. Ambos os sentimentos causam infelicidade

O que vale é que, muito embora, alguns mendigos ficassem infelizes, a soma da infelicidadedeles é menor de que a soma da infelicidade do público em geral. Para que a maioriacontinuasse feliz, o plano estabelece que os gastos fiquem a cargo dos mendigos, quetralhariam de forma forçada para pagar todas as despesas do abrigo. E mais, uma recompensaseria paga a todo o cidadão que capturasse um mendigo.

Em contraposição, temse a filosofia de Immanuel Kant (17241804). Crítico do utilitarismo,Kant afirma que a moral não está associada ao aumento da felicidade, ou outra finalidade. Amoral está associada única e exclusivamente ao “respeito às pessoas como fins em simesmas”.3

O homem, segundo Kant, merece respeito porque é um ser racional e autônomo. A autonomiado homem está relacionada com a sua capacidade de agir e fazer escolhas de forma livre.

Apesar de reconhecer que o homem possui as sensações de dor e de prazer, Kant consideraque como a razão está no comando, essas sensações não comandam as decisões humanas.

Para Kant, agir de acordo com as sensações de dor e prazer ou na busca de uma finalidade,não é agir com liberdade. Agir com liberdade é agir com autonomia, e, isto significa agir deacordo com uma lei que imponho para mim mesmo.

O comportamento e o agir têm finalidades em si mesmo e é a autonomia que concede para avida humana dignidade. A dignidade, por sua vez, é um fim em si mesmo e não um meio paraalcançar algo.

Kant propõe a fórmula da lei universal nos seguintes termos: “Aja apenas segundo umdeterminado princípio que, em sua opinião, deveria constituir em lei universal”. Outra proposta éo valor absoluto da humanidade. Para Kant, “o homem, e em geral, todo o ser racional, existecomo um fim em si mesmo, e não meramente como um meio que possa ser usado de formaarbitraria por essa ou aquela vontade”.

1.2. Felicidade

A questão da vida passa ainda por uma concepção de felicidade. Já preconizava Aristótelesque o homem sempre busca a felicidade.4 Assim, o homem busca a felicidade e, suatendência é afastarse de toda dor e sofrimento.

O debate sobre a felicidade retoma aos gregos. O filósofo do mundo ideal, Platão,5 consideraque o Estado tem objetivo claro: levar aos cidadãos as condições para que eles sejam felizes.A lei deve realizar a felicidade de toda a cidade (pólis).6

Em Aristóteles,7 a felicidade é o fim a ser almejado naturalmente pelo homem. Tal finalidadenecessita de bens concretos que estão relacionados a polis.8 A felicidade “é uma atividade daalma conforme a virtude perfeita”,9 a felicidade pode ser produzida por aqueles chamados deatos justos.10

A escola grega hedonista11 consiste em uma doutrina filosófica onde o prazer é o fundamentoda ética. Tal doutrina é distinta da doutrina utilitarista, pois o hedonismo tem como foco o prazerindividual, enquanto no utilitarismo, o prazer e a felicidade estão associados a uma relação decaráter quantitativo dentro da esfera social, ou seja, a felicidade do “maior número possível depessoas” (utilidade social).

Entre os hedonistas, destacase Epicuro,12 conhecido como filósofo da felicidade, ele traz umaética que busca a felicidade. Para Epicuro o prazer é para o ser humano o primeiro bem, sendo

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inerente à natureza humana. O prazer corresponde à ausência de sofrimento e a presença detudo que o organismo precisa, mas com moderação. Em suma, o prazer no pensamentoepicurista é a “ausência de sofrimentos físicos e de perturbações da alma”.13

Para Epicuro, os desejos humanos podem ser naturais ou artificiais. Os desejos podem sernecessários e não necessários. Os desejos necessários são aqueles fundamentais para afelicidade, para o bem estar corporal e espiritual.

Os desejos não necessários não provocam nenhum sofrimento ou perturbação quando nãosatisfeitos. Estes desejos são fáceis de ser controlados, quando forem difíceis de seralcançados ou alcançálos pode resultar em causar danos. Os desejos inúteis e não naturaispodem acarretar confusão e desordem.

Em Epicuro, o saber, por si só, não tem razão de existir. O saber serve para ajudar a entendero que traz medo e perturbação ao homem. A razão14 e o saber servem para eliminar o medoda morte (fim das percepções) e dos deuses. No pensamento epicurista, o sábio não desprezaviver, tampouco teme à morte e aos deuses. O sábio sabe que os deuses em nada podeminfluir sobre aquilo que ocorre na terra.

Em razão da finalidade do saber e da razão, o conhecimento é a condição da vida prazerosa.Somente conhecendo os desejos é que se pode direcionar as escolhas ou as recusas dascoisas que podem levar à saúde, à serenidade do espírito e à felicidade.15

O fato de o prazer ser um fim a ser almejado, não afasta, para Epicuro, as virtudes. Na Carta àMeneceu, a prudência aparece como um princípio supremo de onde se originam as demaisvirtudes. Não há “vida feliz sem prudência, beleza e justiça, e não existe prudência, beleza ejustiça sem felicidade. Porque as virtudes estão intimamente ligadas à felicidade, e a felicidadeé inseparável delas”.16 A felicidade é a principal virtude.

A justiça e a segurança aparecem como dados necessários à felicidade. O justo, para osepicuristas, é a aquilo que é útil para a segurança das relações humanas. Para alcançar asegurança aplicase a regra de não prejudicar uns aos outros. Não há para o humano ointeresse de prejudicarse mutuamente; o que há é o interesse natural de viver prazerosamente.É na necessidade de não prejudicar uns aos outros que reside a necessidade de pactossociais.

Os epicuristas não aceitam a ideia de transcendência da justiça, ou seja, a justiça é algo em simesma. A justiça é o que os pactos sociais trazem para a segurança comum.

A justiça depende das circunstâncias, portanto, as leis são avaliadas pelas circunstâncias edeixam de ser justas, conforme as circunstâncias. Quando as circunstâncias fazem com queas leis prejudiquem a vida comum, as leis passam a ser injustas. O pacto social é necessáriopara trazer uma convivência humana segura e tranquila.

Na modernidade, duas declarações emblemáticas para o direito ocidental incluem o termofelicidade em seus textos. A primeira declaração, datada de 1776, expressa que todos oshomens são iguais e dotados de direitos inalienáveis, como a vida, a liberdade e “a procura dafelicidade”.17

A segunda Declaração, proclamada na França em 1789, expressa que os poderes constituídose a sociedade devem buscar a felicidade geral.18 A referida declaração integra a Constituiçãofrancesa de 1958. O termo “felicidade geral” encontrase constitucionalizado no Direito francês.

Recentemente, a Constituição do Equador de 2008, introduz o direito ao bem viver. A partir deuma visão integradora e holística da vida, onde é no todo que se encontram todas asdimensões da vida, é introduzido um novo paradigma que fortalece e amplia os direitos,reconhecendo a participação como elemento fundamental da construção da sociedade.

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Fernando Huanacuni Mamani, em sua obra Vivir bien: Filosofía, políticas, estrategias yexperiencias regionales,19 traz 13 princípios para “buen vivir”: 1. Saber comer; 2. Saber beber;3. Saber dançar; 4. Saber dormir; 5. Saber trabalhar; 6. Saber meditar; 7. Saber pensar; 8.Saber amar e ser amado; 9. Saber escutar; 10. Saber falar; 11. Saber sonhar; 12. Sabercaminhar; e 13. Saber dar e receber.20

O autor esclarece que o novo paradigma atual é o comunitário, onde el vivir bien se relaciona demanera preponderante y esencial con el sentido espiritual de la vida.

1.3. O desejo: a real imanência

É em Spinoza,21 no século XVII, que o mundo ocidental conhece um pensamento filosóficoque refuta a possibilidade de o real ser fragmentado, retalhado em partes. Spinoza enxerga oconhecimento como uma rede. Para ele o sujeito não é o centro do conhecimento.

Ao não reconhecer o sujeito como centro do conhecimento, apoiado na razão, Spinoza recusa opensamento de um mundo pensado a partir do homem como centro. Da mesma forma, oteórico recusa a ideia de que o centro do mundo é um ser divino.

O sujeito para Spinoza não existe como um ser que pode apreender de forma racional umobjeto ou uma realidade. Deste modo, o sujeito não é o princípio e não é o fim do conhecimento.Em suma, o sujeito não possui nenhuma posição de centralidade em relação às coisas.

Não existe sujeito no centro do conhecimento. O que há são meras relações entre as coisas. Oconhecimento é a formação das relações a partir da afetividade, que é imanente ao serhumano. Aquilo que afeta ao ser com mais intensidade é, nas palavras de Spinoza, “coisassemelhantes a nós”.

Spinoza considera Deus e a natureza uma coisa só. Para o filósofo não há nada transcendenteque possa determinar/interferir nos caminhos terrestres. Deus é impessoal, portanto, não existeum ser transcendente que interfira e determine o caminho dos humanos. O que acontece navida é produzido e está contido na própria vida. Deus é impessoal e é um mecanismo imanenteda natureza.

A ausência de centralidade traz a igualdade entre todas as coisas e o fim da hierarquização. Aideia hierarquia é abolida. Ao mesmo tempo, para Spinoza não há um modelo igual e uniformeentre as coisas. Cada coisa tem seus atributos próprios, portanto, tem sua singularidade.

Como não existe hierarquia entre as coisas, não se pode falar em hierarquia entre corpo emente. A relação entre corpo e mente é de paralelismo. A mente não é comandante do corpo.Um evento, um acontecimento atinge, ao mesmo tempo, o corpo e a mente.

As emoções (afetos) são importantes no pensamento de Spinoza. Elas são a alternância dapotência do agir do ser humano. Quando há uma transição que fortalece a potência de agir,ocorre a alegria; ao contrário se tem a tristeza.

As alternâncias ocorrem por meio do desejo que seria o afeto que constitui o ser humano. Odesejo é a potência que o ser humano movimenta para preservar sua própria natureza.

As emoções, na ética Spinozano, não devem ser reprimidas e contidas pela razão. A razão nãoé repressora dos desejos humanos, o seu papel é ajudar na formação de boas relações com aspessoas e com as coisas. A ética deve considerar as emoções porque elas são o queconstituem o ser humano.

No contexto do pensamento Spinozano, o desejo não é um dado da razão e sim a potência deum ser, uma subjetividade. A potência é a própria preservação da existência do humano, dodesejo.

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O direito é definido pelo desejo, pela preservação da própria existência humana. Este esforçode preservação da existência é exprimido de forma coletiva, ou seja, são inúmeros desejos deinúmeras subjetividades. O direito não é uma abstração e sim o meio onde ocorre a potênciacoletiva. Spinoza define o direito como sendo o desejo coletivo de inúmeras singularidades.

1.4. Vida nua

Na Grécia, mais especificamente após a classificação aristotélica, zoé designa vida orgânica,princípio comum de todos os seres vivos. Já bíos, significa vida humana, ou seja, a vida quepossui características simbólicas, morais e políticas. Os gregos consideram que o humanopossui, além do corpo, a linguagem, a moral, e por isso, é um membro de um grupo, um sersociável.

Para Agamben,22 não há como fazer a separação entre a zoé (simples fato de viver) e bíos(compartilhamento da vida com outros seres vivos), pois a vida propriamente humana não podeser separada de sua forma. Na vida encontramse as possibilidades e as potências, colocandoem jogo o próprio viver.

A separação entre zoé e bíos reduz a vida à zoé, ou a vida nua. Agamben considera curioso ofato de que a primeiro marca da “vida nua”, como sujeito político de direito, ocorre em 1679, nafórmula do habeas corpus, que teve sua origem no século XIII, com a carta de João SemTerra(1215). Assim, aparece a fórmula de assegurar a presença física do acusado perante oTribunal.

A fórmula considera apenas o corpus, devendo se ter um corpo para mostrar, ou seja, não hábios, vida qualificada, mas apenas o zoé, a vida nua e o seu anonimato.23

Nesta fórmula, ainda há, nos dizeres de Agamben, um caráter ambíguo. Para ele:

“(…) ao mesmo tempo em que habeas corpus era destinado, em sua origem, a assegurar apresença do imputado no processo, o instrumento impede que o acusado se subtraísse aojuízo. A nova e definitiva forma, o habeas corpus se converte em obrigação, para o xerife, deexibir o corpo do imputado e de motivar a sua detenção. Corpus é um ser bifronte, portadortanto da sujeição ao poder soberano quanto das liberdades individuais.”24

Ainda, em Agamben, há o conceito de home sacer.25 O termo sacer, para Agamben, tem doissentidos opostos, o sagrado (inviolável) e o maldito (sacrificável). O termo é ambíguo, pois avida é inviolável e violável. O termo, para Agamben, quando associado à vida nua – ser vivente,a vida sem qualidade (moral, política) – tornase a vida totalmente descartável.

A partir da ideia de vida descartável, de vida sagrada, dignidade humana, utilidade, felicidaderompem os diversos dilemas referentes ao valor da vida, o valor da liberdade e a realidade damorte. Aqui se tem espaço ao debate da eutanásia, ortotanásia e o suicídio assistido.

2. Antecedentes históricos e teóricos

2.1. Os povos primitivos

Alguns povos indígenas primitivos praticavam a assistência à morte como forma de aliviar ador. Eles colocavam os seus enfermos terminais diante de fumaças de fogos e aos poucos osenfermos perdiam a consciência e morriam.

Nas tribos nômadas, as pessoas enfermas abandonavam o grupo para morrer só. Outrospovos primitivos preferiam dar aos doentes incuráveis e aos que agonizavam drogas, ervaspara que assim, tivessem uma boa morte.

Ainda há relatos de povos primitivos, onde os filhos tinham que administrar a morte dos paisenfermos. Na antiga civilização europeia, os povos celtas matavam todos os anciãos

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enfermos.26

2.2. A antiguidade

Na Grécia antiga, a eutanásia não tem a conotação de ser um procedimento que coloque fim avida de alguém. A palavra significa morrer bem, em paz, ocorrendo, deste modo, a ajuda àpessoa neste processo de morte natural. O termo utilizado na Grécia se diferencia da ideia deeutanásia que se tem hoje.

Já os pitagóricos entendem que a existência inclui a dor. A dor no final da vida tem umsignificado, devendo a duração natural da vida ser respeitada. Assim, para os pitagóricos éinaceitável a ideia de encurtar a vida para acabar com a dor e com o sofrimento.

Entre os gregos, Hipócrates, que é considerado o “pai da medicina”, pronunciou, em umaespécie de juramento a seguinte frase “não darei a nenhum homem um veneno mortal, aindaque me peça”. Segundo Dereck Humphry e Ann Wickett, os epicuristas 27 também sãocontrários à prática de indução à morte para alívio da dor.28

Os estoicistas – escola fundada por Zenão de Cício focada na questão de uma vidacontemplativa, com exaltação da sabedoria – consideram que a indução à morte é possívelpara por fim ao sofrimento. Para Platão, o papel do médico é facilitar a remoção das pessoasincapazes, negando ajuda médica, daqueles enfermos que são incapazes de contribuir com asociedade. Em sua clássica obra, a República, Platão chega a defender a morte dos anciãos edos debilitados.29

Já Aristóteles não concorda com a posição de Platão. Ele considera que é dever do Estado nãocolaborar com o ato de tirar a vida do outro, mesmo quando haja sofrimento, porque a virtudetambém se prova com o sofrimento.

Tanto na Grécia antiga, como em Roma antiga se pratica o ato de não fornecer recursos paraprolongar a vida de uma pessoa enferma. O ato de tirar a vida do enfermo também é praticado.

2.3. Idade Média

Com a chegada do cristianismo, o ato não prolongar a vida de alguém, em razão do fatorsofrimento, é um ato moralmente aceito, somente quando o tratamento ao enfermo é inútil.Deste modo, não se fornece o tratamento. Tirar a vida, por exemplo, de um soldado ferido, emum campo de guerra, também é moralmente aceito. Por compaixão, muitos soldados tiravam avida de seus companheiros que estavam agonizando de dor. O punhal usado se chamavamisericórdia.

Neste período, e principalmente na Idade Média, considerase que a vida pertence a Deus deforma que ao homem não lhe cabe decidir pela vontade divina. Santo Tomás de Aquinoconsidera ilícito o suicídio por três razões:

“(a) todo o ser ama a si mesmo naturalmente, devendo preservar a vida, assim, o ato tirar a suaprópria vida é contra a inclinação natural do homem, sendo pecado mortal;

(b) a parte pertence ao todo, o homem é parte da comunidade, assim tudo que ele é, pertence àsociedade, o suicídio é um ato contra a comunidade, e;

(c) a vida é um dom divino dado ao homem, quem tira a vida peca contra Deus.”

2.4. Modernidade

Com o renascimento, se recupera a cultura clássica, Tomás Moro, (14781535) humanista epolítico inglês, defende, em sua obra Utopia, a eutanásia, como forma de alívio do sofrimento.Tomás defende que:

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“Os infelizes afetados de males incuráveis recebem todos os consolos, todas as atenções,todos os alívios morais e físicos, capazes de lhes tornar a vida mais suportável. Mas quando aesses males incuráveis se juntam sofrimentos atrozes, que ninguém pode suprimir ou suavizar,os padres e magistrados se apresentam ao paciente e lhe levam a exortação suprema.

Mostramlhe que ele está despojado dos bens e das funções da vida; que não faz senãosobreviver à própria morte, tornandose assim um peso para si e os outros. Persuademno,então, a não alimentar mais o mal que o devora, e a morrer com resolução, uma vez que aexistência não é para ele senão uma horrenda tortura.

Confiai – dizemlhe – quebrai as cadeias que vos amarram, e desprendeivos, por vossaspróprias mãos, da masmorra da vida; ou pelo menos consenti que outros dela vos libertem.Vossa morte não é uma ímpia repulsa aos benesses da existência, mas o termo de um cruelsuplício.

Obedecer, neste caso, à voz dos padres, intérpretes da divina vontade, é fazer obra religiosa esanta.

Os que se deixam persuadir põem fim a seus dias pela abstinência voluntária ou sãoadormecidos por meio de um narcótico mortal, e morrem sem se aperceber. Os que nãoquerem a morte, nem por isso passam a receber menos atenções e cuidados; quando cessamde viver a opinião pública honra sua memória.”30

No mesmo período histórico, Francis Bacon (15611626), filósofo e jurista inglês, defende aeutanásia como tratamento médico único para as doenças incuráveis.

Em 1884, um criminologista italiano, Enrique Ferri, escreve a obra HomicídioSuicídio. Para elea morte altruísta e piedosa não deve ser considerada delito, desde que uma pessoa querida,acometida de um grave mal, peça a outro que termine o sofrimento dela. Está situação édiferente da circunstância de uma pessoa instigar o suicídio de outra.

Já no início do século XX, em 1920, Karl Binding e Alfred Hoche, respectivamente professoresde medicina e de direito penal, escrevem a obra A Autorização do aniquilamento da vida indignade ser vivida.

Os autores explicam que o suicídio não pode ser punido, porque é a expressão da soberaniaque o homem tem sobre a sua própria existência. A ordem jurídica não pode entrar nesta seara,de forma que o ordenamento jurídico, não deve, nem excluir e nem incluir a questão do suicídio.Desta assertiva, deriva, segundo Agamben, a autorização para o aniquilamento da vida indignade ser vivida.

Deste modo, aparece na comunidade jurídica europeia a ideia que existe vida que não mereceser vivida, e, portanto, pode ser eliminada, sendo a eutanásia um favor e, portanto, não passívelde ser punida.

Para Binding existem vidas humanas que perdem a qualidade de ser um bem jurídico, sendoque a sua continuidade para a pessoa e para a sociedade, perde o valor. Surge aqui, a figura devida sem valor, deste modo, aqueles que estejam com doença ou ferimento e tenham condiçãode expressar o seu desejo de liberação, devem fazêlo, optando pela morte.

Mas, há um grande problema em relação aos incuráveis que não podem expressar a vontadede morrer ou viver. Como tal vida não tem objetivo, não há problema em eliminála. A decisãoentão sobre a morte fica nas mãos do doente, do médico ou do parente.

Em 1922, na Rússia, as autoridades soviéticas determinam a morte, em um hospital, de 117crianças enfermas de uma doença rara e incurável. A decisão é, segundo as autoridades,“inspirada por sentimento de humanidade com respeito a essas crianças condenadas a morrerdepois de um cruel sofrimento”.

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Em 1924, em Paris, uma atriz polaca, Stanislawa Uminska, é absolvida pelo Tribunal, depois deter posto fim a vida de seu amante, Juan Zinowstky, com um tiro. O seu amante pediu que aatriz colocasse fim a sua vida em razão de uma moléstia irreversível e que lhe causavasofrimento.

A obra Autorização do aniquilamento da vida indigna de ser vivida traz o conceito de vida semvalor e, portanto sem a proteção jurídica. Tal conceito é transplantado para o governo Reich.Segundo relatos, o governo autoriza, com base no programa denominado Ação T4, aeliminação de vida indigna de ser vivida, especialmente a vida dos doentes mentais incuráveis.

Mas, Hitler nunca deu forma legal para seu programa de eutanásia, o programa foi oficialmentede setembro de 1939 até agosto de 1941, quando Hitler resolveu por fim, em razão do protestoda igreja. Mas segundo relatos históricos, o programa durou de forma não oficial, tendoexterminado 275 mil doentes mentais e físicos incuráveis.

Em 1935, na GrãBretanha surge a primeira associação a favor da eutanásia. Em 1938, é a vezdos americanos fundar a sua associação.

3. A quem pertence à vida

Michel Sandel, em sua obra, Justiça o que é fazer a coisa certa, explica que a teoria libertáriaconsidera que muitas atividades do Estado moderno são ilegítimas porque são violadoras daliberdade. Os adeptos desta teoria consideram:

“(a) Não deve haver nenhum paternalismo. Não devem existir leis que protejam as pessoascontra si mesmas. Assim, desde que não haja risco para terceiros, o Estado não deve interferirsobre os riscos que indivíduo queira assumir. O Estado não tem o direito de falar quais riscosàs pessoas podem ou não submeter o seu corpo e a sua vida, por exemplo, uma lei queobrigue o uso do capacete.

(b) Não podem existir normas sobre valores morais. O Estado não deve ditar normas queexpressam as noções de virtude e as convicções morais de uma maioria. Assim, aprostituição, embora contestável do ponto de vista moral, para muitas pessoas, não pode serproibida, desde que quem pratique o ato de prostituirse seja adulto e consciente.

(c) Não deve haver redistribuição de renda ou riqueza de forma obrigatória.”

Explica o autor que, nem sempre estes pontos de vistas convergem. Assim, pode ter pessoasa favor do Estado de bemestar e a favor de muitas liberdades individuais.

É neste contexto, da teoria libertária que surge a ideia de que o indivíduo pertence a si mesmo,é o seu dono. Deste modo, o indivíduo não pertence ao Estado ou à comunidade política.

Michael Sandel expõe três casos sobre o direito que o indivíduo tem de dispor sobre o seucorpo e a sua vida.

1.º Caso – Vendendo rins

A venda de órgãos, de forma geral, é proibida na maior parte dos países. Mas muitosconsideram que este tipo de norma deve ser mudar. Isto porque, se fosse permitido o mercadode compra e venda de órgãos, a oferta aumentaria e muitas pessoas seriam beneficiadas,inclusive aqueles que necessitam de dinheiro. Se a pessoa é dona de seu corpo, ela pode usarda forma que bem entender.

Em uma primeira hipótese, um comerciante oferece oito mil dólares por um rim de umcamponês de um país em desenvolvimento. O destino do órgão não é para salvar vida, masapenas porque ele é um “excêntrico negociante de obras de arte que vende órgãos paraclientes abastados por motivos fúteis”.31 Aqueles que consideram que a venda de órgãos

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apenas é possível para salvar vidas, consideram que as pessoas não têm um direito depropriedade ilimitado sobre seus corpos.

Em outro caso, um agricultor de um vilarejo indiano envia o seu filho para a faculdade. Paraobter dinheiro e pagar as mensalidades da universidade, o agricultor decide vender seus rins aum americano rico que necessita fazer um transplante. Depois de alguns anos, o seu outro filhotambém deve ir para a faculdade e o agricultor recebe outra proposta para venda de seusegundo rim. Baseado na ideia de que o agricultor é seu único dono, tal venda poderiaacontecer?

2.º Caso – Suicídio assistido

O outro caso relatado pelo autor é do conhecido Dr. Morte (Jack Kevorkian – 19282011), queaos 79 deixou a prisão, após cumprir oito anos de prisão por administrar drogas letais empacientes em estado terminal. Ao todo foram 130 pessoas assistidas. Ele recebeu liberdadecondicional, após prometer não assistir mais pacientes a cometerem suicídio.

Para os libertários, como a vida pertence à pessoa, pode haver disposição da mesma. Destemodo, através de um ato de acordo voluntário, as pessoas podem ajudar outras pessoas acolocarem fim à vida. Nesta relação, o Estado não pode interferir.

Outros defendem a possibilidade de suicídio assistido apenas nos casos de compaixão oudignidade. Em casos de pacientes terminais os dois argumentos, compaixão e que o individuo édono de si mesmo, ficam muito associados.

3.º Caso – Canibalismo consensual

O último caso relatado pelo autor ocorre em 2001, em uma cidade alemã. Um engenheiro de 43anos respondeu a um anúncio de jornal, que havia sido colocado por um técnico de informática.A proposta aceita pelo engenheiro, e a qual outras quatro pessoas desistiram, após entrevista,era a seguinte: o técnico de informática mataria o engenheiro, cortaria o seu corpo, colocaria emsacos no freezer e o comeria.

A prisão do técnico de informática só ocorreu após ele comer 20 quilos de carne humana comazeite de oliva e alho. Como na Alemanha não tem lei que tipifique o canibalismo, a defesaalegou que o acusado não poderia ser condenado por homicídio, já que a vítima participou desua própria morte. O crime seria de “matar por solicitação” e a pena não passaria de cincoanos.

O acusado foi condenado a homicídio involuntário (oito anos e meio de reclusão). Porém, oTribunal considerou a pena muito branda e condenou o canibal à prisão perpétua. Na prisão, otécnico de informática virou vegetariano, por considerar que a criação de animais com oobjetivo de alimentar o ser humano é desumana.

Como no caso exposto não há relação com nenhuma doença e, por consequência, não existequestão de compaixão, para os libertários o acordo feito entre o canibal e sua vítima não podeser proibido, uma vez que a proibição fere o direito à liberdade.

4. Conceitos básicos: morte, eutanásia, ortotanásia, suicídio e suicídioassistido

4.1. A questão da morte

Segundo o dicionário Abbagnano, a morte pode ser considerada: “1.º como falecimento, fatoque ocorre na ordem das coisas naturais; 2.º em sua relação específica com a existênciahumana”.

No primeiro caso, há procedimento para verificação. No segundo caso, a morte pode ser

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entendida como um início de ciclo de vida, como fim de um ciclo de vida e como possibilidadeexistencial.

Como um início de ciclo, há a ideia de imortalidade da alma. “Platão chamava de ‘separaçãoentre a alma e o corpo’. ‘Com essa separação de fato, iniciase o novo ciclo de vida da alma’.(…) ‘Já o conceito de fim do ciclo de vida foi expresso de várias formas pelos filósofos’. MarcoAurélio consideravaa como repouso ou cessão das preocupações da vida. (…).32” Ainda há oconceito bíblico de morte como pena em razão do pecado original.

Nas palavras de Dithey o conceito de ciclo de vida compreende “a relação que caracteriza demodo mais profundo e geral o sentido do nosso ser, é a relação entre vida e morte, porque alimitação da nossa existência pela morte é decisiva para a compreensão e avaliação davida”.33

Do ponto de vista médico, a morte sempre foi verificável quando os sinais vitais se perdiam(respiração e batimento cardíaco). Mas em 1959 dois neurofisiologistas franceses (P. Mollaret eM. Goulon), publicam na Revue Neurologique, um estudo sobre o coma.

Até aquele momento, os cientistas conheciam três estados de coma. Um primeiro estado severifica a perda da vida em relação à consciência, à mobilidade e à sensibilidade, mas há aconservação de uma vida vegetativa, com a respiração, a circulação, ou seja, uma vida apenasenquanto organismo.

O segundo estado de coma é o de coma vígil. Neste estado a pessoa permanece vigilante.Neste caso, ocorre perda das funções não de forma completa. O último estado é o coma carus,onde as funções vegetativas ficam perturbadas.

Os autores apresentam um quarto estado de coma. Este estado é justamente o denominado“além do coma”. Explicavam os cientistas que “sugerimos acrescentar um quarto grau, o comadépassé (…), ou seja, o coma no qual à abolição total das funções da vida de relaçãocorresponde uma abolição igualmente total das funções da vida vegetativa”.

Nestas circunstâncias, a vida é mantida com novas técnicas de reanimação artificial, sendomantidas a respiração e a circulação cardíaca de forma artificial. A sobrevivência cessa quandoo tratamento é interrompido.

Neste momento, o conceito tradicional de morte é colocado em discussão. Os métodostradicionais usados para verificação da parada respiratória e do batimento cardíaco sãoquestionados enquanto critérios de verificação da morte.

No mais, se verifica que no quarto estágio de coma, existe condição ideal para a coleta deórgãos para serem transplantados. Entretanto, há a necessidade, para que haja a coleta deórgãos, que não existam dúvidas quanto à morte, afastando qualquer situação referente àsquestões sobre homicídio.

Em 1968, um relatório da Universidade de Harvard fixou um novo critério para a morte, a morteencefálica. Assim, o coma irreversível passa a ser o novo critério de morte. Com a morteencefálica, o paciente é considerado morto mesmo ocorrendo reanimação artificial.

A partir daqui, o conceito morte tornase mais impreciso, em razão da tecnologia do transplante.A questão da morte, independente das várias discussões científica sobre a eficácia do critériomorte encefálica para fins de verificação da morte, ganha espaço no debate político, jurídico eético. A morte, nas palavras de Agamben, tornase “um epifenômeno da tecnologia dotransplante”.

Agora, a lei pode definir e arbitrar o momento da morte, como o fez o Brasil, com a Lei9.434/1997.

Sem entrar na questão do momento da morte, ou se a morte encefálica é suficiente para atestar

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a morte, cabe lembrar o caso Karen Ann Quinlan, que aos 22 anos, em 1975, entrou naemergência de um hospital americano, em estado de coma.

Após tomar ciência da irreversibilidade do caso, os pais entraram na Justiça para pedirautorização para desligar os aparelhos que a estavam mantendo Karen viva. Os pais alegavamque a paciente havia se manifestado, anteriormente, em que nestas circunstâncias, elapreferiria que os aparelhos fossem desligados.

A justiça, após ouvir a opinião do comitê de ética do hospital que o caso de Karen erairreversível, concedeu a autorização para desligar os equipamentos. Entretanto, Karenpermaneceu respirando e viveu até 1985, com alimentação artificial.

4.2. Eutanásia

O termo eutanásia – eu (boa) thanato (morte) – vem do grego e significa “boa morte”, mortesem angústia. Entretanto, o conceito passou por uma evolução histórica, e atualmente possuioutra significação.

Atualmente, na literatura jurídica temse entendido que a eutanásia “é a ação médica intencionalde apressar ou provocar a morte – com exclusiva finalidade benevolente – de pessoa que seencontre em situação considerada irreversível e incurável, consoante os padrões médicosvigentes, e que padeça de intensos sofrimentos físicos e psíquicos”.34

Este conceito é bem estrito, sendo a eutanásia apenas a atividade médica realizada empacientes terminais cuja morte é inevitável. Excluise, deste conceito, a eutanásia passiva, queé a omissão indireta sem intenção de provocar a morte. Também não se confunde eutanásiacom o homicídio piedoso.

A eutanásia pode ser voluntária, quando há consentimento expresso e informado, e nãovoluntária, quando não há consentimento do paciente. A eutanásia não voluntária envolve,geralmente, pacientes incapazes.35

4.3. Ortotanásia

Oposto ao conceito de distanásia – que consiste no retardamento ao máximo da morteinevitável, por emprego de técnicas médicas, mesmo que o ato provoque dores e sofrimentos –a ortotanásia considera a morte em seu tempo adequado.36 Não se retarda a morte, nem seapressa a morte, como na eutanásia. No caso da ortotanásia apenas se aceita a morte.

A conduta médica é meio para trazer um sentido de humanização para a morte, aliviado asdores, através, muitas vezes de cuidados paliativos, que são aqueles que utilizam a tecnólogadisponível para alívio do sofrimento físico e psíquicos do paciente.37

4.4. Suicídio assistido

O suicídio assistido é o ato de tirar a própria vida com auxilio ou assistência de um terceiro.Quem causa a morte é o ato do suicida e não o ato de um terceiro. O ato do terceiro é decaráter colaborativo, como a prestação de uma informação ou mesmo colocando à disposiçãoda pessoa os meios e as condições necessárias para realização do evento morte. Não se tratade induzir ao suicídio, onde há interferência na vontade. No suicídio assistido o ato desenvolvidoé apenas de assistência e auxílio.38

5. Direito comparado

5.1. Bélgica

Na Bélgica, a eutanásia é permitida desde 2002 para os adultos. Em 2014, a eutanásia foi

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estendida às crianças. A legislação determina que para ocorrer o procedimento de eutanásiadeve existir a “vontade deliberada e repetida” do paciente, podendo haver juízo de retração, aqualquer momento.

O paciente deve estar com doença irreversível, grave e incurável e ter sofrimentos físicos epsíquicos. A eutanásia é solicitada pelo paciente por meio de petição, por escrito.

O paciente pode deixar sua vontade expressa e por escrito designando um representante queserá seu interlocutor junto ao médico. Este termo de consentimento tem validade por cincoanos, sendo extremamente importante para os casos de incapacidade.

O médico tem a obrigação legal de informar o paciente sobre o seu prognóstico, devendoassegurar sobre a gravidade da doença e que a mesma é incurável. O médico também deveassegurar que o paciente está consciente e que o seu quadro é irreversível, segundo osrequisitos da ciência.

O médico deve também se consultar com outro médico especialista para confirmação docaráter irreversível da doença, além de fazer entrevistas periódicas com o paciente.

O médico não está obrigado a realizar o procedimento, sendo que a vontade antecipada dopaciente não vincula o médico. Aqui tem lugar a chamada objeção de consciência.

Após realização do procedimento, o médico deve notificar a comissão estatal de controle eavaliação da eutanásia. Na Bélgica são registrados por ano 1.500 mortes ocorridas em razãoda eutanásia.

Recentemente, a lei de eutanásia foi estendida para menores de idade. A lei não estabelece olimite de idade, baseandose apenas no “poder de discernimento”. A doença do menor deve serirreversível, devendo a criança ter sofrimento físico. O menor é avaliado por psicólogo epsiquiatra para verificação da capacidade de discernimento, por último, deve haverconsentimento paterno.

O prazo entre o pedido de eutanásia e a execução da mesma é no mínimo de um mês.

5.2. Holanda

A Holanda tem uma experiência de mais de 30 anos de prática de eutanásia, que foramrealizadas devido a autorizações judiciais. Mas, a eutanásia e o suicídio assistido sãopermitidos por lei desde 2002.

De acordo com a legislação, a eutanásia é possível quando o paciente sofrer de doençairreversível ou esteja em fase terminal e tiver acometido de sofrimento insuportável. O pacientedeve ainda residir na Holanda. A petição de eutanásia ou suicídio assistido deve ser voluntária,reiterada e refletida. O paciente pode antecipar sua vontade, por declaração.

O paciente deve ter sido informado de seu diagnóstico e prognóstico e o médico deve fazeruma consulta a outro médico, nos casos de sofrimentos psicológicos. Há controle decomissões, compostas por juristas, médicos e especialistas em ética, para verificação se osrequisitos necessários a realização da eutanásia foram cumpridos. Caso os requisitos nãotenham sido cumpridos, ocorre a apuração de responsabilidades, inclusive criminal.39

Os menores de idade de 12 a 16 anos podem recorrer à eutanásia quando haja consentimentode seus pais. Na Holanda existem clínicas particulares que realizam os procedimentos deeutanásia, além de serviço a domicílio. Em média são 2.500 casos anuais.

A maior polêmica está centrada nos pacientes com demência moderada ou demência severa.Em 2010, a comissão estatal que regulamenta a atividade considerou lícita a aplicação deeutanásia em uma mulher, acometida de demência, de 65 anos, que havia deixado por escrito

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sua vontade de morrer.40

5.3. Suíça

A legislação permite o suicídio assistido, sem necessitada de assistência médica, sendonecessário apenas para a prescrição médica da droga letal. O procedimento é realizado,geralmente, por entidades não governamentais, e consiste no aconselhamento e nofornecimento de substâncias letais, para que os assistidos ingerem.

Aquele que assiste não pode ter motivações pessoais para fornecer a ajuda, também não podeter nenhum lucro com a morte. Caso sejam constatadas estas hipóteses, quem assiste poderáresponder por crime.

Na Suíça existem três grandes entidades que promovem o serviço de suicídio assistido, sãoelas: Exit, AMD e Dignitas. A Exit só aceita suíços ou residentes na Suíça. Já a polêmicaDignitas aceita clientes estrangeiros, realizando o turismo para fins de suicídio.

A questão posta em debate na Suíça é o suicídio de pessoas que sofrem de depressão crônica.Enquanto setores do governo debatem regras mais rígidas para o suicídio assistido e aproibição do suicídio assistido em pessoas que sofrem de depressão crônica, a Dignitas tenta apermissão. Alega a entidade, que isto reduziria o número de suicídios frustrados. A questãoconsiste em saber até que ponto uma pessoa com depressão profunda tem condições deexpressar sua vontade.

5.4. Estados Unidos

Nos Estados Unidos, Estados como Oregon e Washington permitem o suicídio assistido. Em1994, após um referendo, o Estado de Oregon permitiu a prática, nos casos de enfermosincuráveis, sendo que dois médicos devem atestar que o enfermo tem, provavelmente, seismeses de vida. Os suicidas devem ser maiores de idade e expressar seu desejo de formareiterada e escrita.41Estados como Washington e Vermont possuem leis similares.

5.5. França

Na França desde 2005 está regulamentado o direito de deixar morrer e os cuidados paliativos.O País proíbe o prolongamento artificial da vida, incluindo o paciente que é incapaz deexpressar sua vontade.

A França permite o encurtamento da vida em razão de cuidados paliativos, visando o confortodo paciente, desde que o paciente seja avisado. A decisão sobre os procedimentos é semprecolegiada, após a consulta dos parentes e a expressão voluntária da vontade do paciente.

5.6. Uruguai

O Código Penal Uruguaio, de 1934, qualifica a eutanásia como homicídio piedoso, sendo que osjuízes podem não condenar o autor do homicídio, caso a vítima tenha insistido noprocedimento.42 Já o suicídio assistido é considerado crime.43

6. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos

Em decisão emblemática de 2002, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos decidiu o caso deDiane Pretty. Pretty estava acometida de doença degenerativa e incurável, estando paralítica,sendo que o Reino Unido44 negou imunidade para que o marido de Pretty lhe auxiliasse emseu ato suicida.

O Tribunal entendeu que o art. 2.º da Convenção Europeia de Direitos Humanos,45 que protegeo direito à vida, não pode ser interpretado, sem que prejudique a própria linguagem e o texto,

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compreendendo como direito totalmente oposto, o direito à vida e o direito de morrer e muitosmenos o direito de morrer com a ajuda de terceiros ou de uma autoridade pública.

Ademais, considerou a Corte que a proibição de tortura e de maus tratos prevista no art. 3.º daConvenção46 não pode ser interpretada, de forma que o Estado seja obrigado a interromperuma vida acometida de doença grave, mesmo que a doença cause sofrimento.

Ao examinar o art. 8.º 47 da Convenção, que protege a vida privada, a Corte entende que talartigo protege o desenvolvimento da personalidade, entendendo que o Estado não pode recorrerao direito penal, para fazer ingerência na esfera privado do indivíduo.

Sem negar a extensão do direito à vida, previsto no art. 2.º da Convenção, a Corte entende quena perspectiva do art. 8.º deve ser considerada a noção de qualidade de vida. Assim, um fim devida indigno e penoso é uma vulneração ao respeito à vida privada. Entretanto, pode existiringerência de uma lei, sempre que está for fruto de uma sociedade democrática.

Deste modo, o Estado tem direito de controlar, por meio da aplicação do direito penal, atividadesque coloquem em risco a vida e a segurança de terceiros a fim de proteger a vida,principalmente de pessoas que estejam debilitadas e vulneráveis.48

Em 2011, a Corte, ao analisar o caso Hass x Suíça, mantém o entendimento explicitado nocaso Pretty x Reino Unido, ao considerar que o Estado tem o direito de proteger a vida,principalmente em caso onde haja impedimento de formação de vontade. No caso em questão,um cidadão suíço, que há 20 anos sofria de alto grau de bipolaridade, não obteve de nenhummédico prescrição de droga letal, sendo que os Tribunais domésticos negaramlhe o direito areceber auxílio em seu suicídio. O paciente já havia tentado o suicídio, mas não logrou êxito.49

Recentemente, em 14.05.2013, o Tribunal decidiu o caso Alda Gross vs. Suiza.50 Alda, umaidosa de 82, sofria de doença degenerativa, mas não terminal. A idosa buscou o suicídioassistido pelo fato de não suportar mais o sofrimento em razão do declínio de suas faculdadesfísicas e mentais.

Alegava a mulher que desejava a morte, pois não suportava ter uma péssima qualidade de vida.A paciente não conseguiu a prescrição médica da droga letal, embora tivesse plena capacidadede exprimir sua vontade.

O Tribunal decidiu que “não se deve forçar prolongar a velhice ou a vida em estados de extremadecadência das atividades físicas ou mentais avançadas que entram em conflito com asnoções dominantes de autonomia e de identidade pessoal”.

A corte considerou que o governo não deixa claro quando e em quais circunstâncias umapessoa enferma pode solicitar uma receita médica com prescrição de droga letal, para colocarfim em sua vida. Assim, os médicos não tem segurança em fazer este tipo de prescrição. OTribunal considera que é dever dos Estados estabelecer normas legais, completas e que a faltadas normas claras ofende o direito à vida privada.

7. Aspectos normativos no Brasil

No Brasil a eutanásia e o suicídio assistido são tipos penais, conforme verificando no arts. 121,§ 1.º e 122, do CP,51 sendo que a eutanásia é tipificada como homicídio privilegiado.

Conforme exposição de motivos do Código Penal brasileiro de 1940, em se tratando dehomicídio privilegiado, considerase como circunstância atenuante o motivo social, ou moral,sendo que “por ‘motivo de relevante valor social ou moral’, o projeto entende significar o motivoque, em si mesmo, é aprovado pela moral prática, como, por exemplo, a compaixão ante oirremediável sofrimento da vítima (caso do homicídio eutanásico)”.

O conselho federal de medicina tem disciplinado algumas questões referentes aos cuidados do

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paciente em razão de situações terminais. A Res. 1.805/2006 estabelece que:

“É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem avida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade dapessoa ou de seu representante legal.”52

O Código de Ética médica53 dispõe, em seu inc. XXI, capítulo I, que:

“XXII – Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização deprocedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob suaatenção todos os cuidados paliativos apropriados.”

O mesmo código, em seu capítulo V, art. 41, veda que o médico abrevie a “vida do paciente,ainda que a pedido deste ou de seu representante legal”.

Entretanto, o parágrafo único, do art. 41 do Código estabelece que “Nos casos de doençaincurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis semempreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre emconsideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seurepresentante legal”.

A Res. 1.995/2012 dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes,determinando que nas “decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientes que se encontramincapazes de comunicarse, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, omédico levará em consideração suas diretivas antecipadas de vontade”.

O médico deve ainda considerar as informações levadas por representante do paciente, caso omesmo tenha designado.

Notase o avanço das normas do Conselho Federal de Medicina em relação ao temaortotanásia.54 Em São Paulo, o art. 2.º, Lei 10.241/1999, estabelece os direitos dos usuáriosdos serviços de saúde do Estado, dentre eles:

“VII – consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação,procedimentos diagnósticos ou terapêuticos a serem nele realizados;

XXIII – recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para tentar prolongar a vida; e XXIV –optar pelo local de morte.”

Destacase que em relação ao projeto de novo Código Penal, a última versão, aprovado emdezembro de 2012, mantém a figura do homicídio privilegiado55 e do suicídio assistido e cria aatipicidade penal para os casos de ortotanásia, nos seguintes termos:

“Ortotanásia

§6.º. No âmbito dos cuidados paliativos aplicados a pessoa em estado terminal ou com doençagrave irreversível, não há crime quando o agente deixar de fazer uso de meios extraordinários,desde que haja consentimento da pessoa ou, em sua impossibilidade, do cônjuge,companheiro, ascendente, descendente ou irmão. § 7.º. A situação de morte iminente einevitável ou de doença irreversível, no caso do parágrafo anterior, deve ser previamenteatestada por dois médicos.”

8. Considerações Gerais

Os temas eutanásia, ortotanásia, suicídio assistido sempre foram objeto de debate no campoda filosofia e no campo do Direito, uma vez que são práticas existentes desde os primórdios dahumanidade.

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No atual estágio da humanidade, o avanço da ciência, das tecnologias e técnicas existentes nocampo da medicina, acaba colocando mais ingrediente em questões que sempre foram objetode reflexão da humanidade.

Tais avanços trazem maior complexidade às questões que envolvem a vida e morte. Istoporque, há vários elementos e várias áreas do conhecimento que estão relacionados com asquestões e que são, ao mesmo tempo, inseparáveis, interdependente. O Direito possui amissão de regular tais complexidades.

Neste século XXI, os paradigmas científicos têm se remodelado, transmutados ou mesmomodificados. O paradigma atual é orientado à reconstrução de um saber não reducionista, masanalisado de uma forma que considera os vários saberes humanos, considerando assim o todoe não apenas uma parte.

Considerar o todo e não apenas uma parte é reconhecer o ser humano como um sistemabiológico complexo, sem considerar que a razão, por exemplo, que a sobreponha as demaispartes, como a emoção. É de reconhecer, ao mesmo tempo, que o ser humano é parteintegrante de um todo, que constitui em seu entorno, não sendo parte dividida e superior aoambiente.

A emoção humana é reconhecida, não mais como algo que deve ser controlado e oprimido pelaracionalidade, mas como elemento primaz do próprio agir humano. A razão é apenas ummecanismo para cálculo das escolhas que potencializam a busca do bem viver, do prazersereno e da felicidade.

O Direito, ao disciplinar as questões referentes que envolvem a vida de a morte, se interrelaciona com outras áreas do conhecimento como a medicina e a filosofia, se deparando comsistemas morais que envolvem questões orientadas pela razão pura e a vontade autônoma ousistemas eu se orientam pela perfeição ou pela felicidade. Ao normatiza a conduta humana oDireito faz a seleção de uma opção a partir de várias possibilidades axiológicas.

9. Referências bibliográficas

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Pesquisas do Editorial

CONSIDERAÇÕES ACERCA DO IMPACTO DA RESOLUÇÃO 1.805/2006 DOCONSELHO FEDERAL DE MEDICINA NO TRATAMENTO JURÍDICOPENALDA EUTANÁSIA PASSIVA NO BRASIL, de Gisele Mendes de Carvalho RCP6/227

ASPECTOS MÉDICOS E JURÍDICOS DA EUTANÁSIA, de Iberê AnselmoGarcia RBCCrim 67/253

A ORTOTANÁSIA: UMA ANÁLISE A RESPEITO DO DIREITO DE MORRERCOM DIGNIDADE, de Gisele de Lourdes Friso RT 885/130

EUTANÁSIA, ORTOTANÁSIA E DISTANÁSIA, de Deusdedith Sousa RT706/283

EUTANÁSIA, ORTOTANÁSIA E DISTANÁSIA REFLEXÕES BÁSICAS EMFACE DA CIÊNCIA MÉDICA E DO DIREITO, de Elias Farah RIASP 28/131

A EUTANÁSIA E A ORTOTANÁSIA NO NOVO CÓDIGO PENAL, de PedroBellentani Quintino de Oliveira RT 931/2013/241

1

SANDEL, Michel. Justiça. O que é fazer a coisa certa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012, p. 48.

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2

Idem.

3

Idem, p. 137.

4

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, Poética/Aristóteles; seleção de textos de José Américo Motta Pessanha.(Os pensadores; vol. 2). 4. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991.

5

Platão foi um filósofo e matemático grego, viveu em Atenas, entre 428/427 a.C. e 348/347 a.C. Discípulo deSócrates, Platão fundou uma academia. É conhecido como o filósofo dos ideais, pois para ele além do mundoque percebemos, por meio de nossos sentidos, há outro mundo composto por ideias imutáveis e perfeitas.

6

“(…) a lei não se ocupa de garantir uma felicidade excepcional a uma classe de cidadãos, mas esforçase porrealizar a felicidade de toda a cidade, unindo os cidadãos pela persuasão ou a sujeição e levandoos acompartilhar as vantagens que cada classe pode proporcionar à comunidade; e que, se ela forma tais homensna cidade, não é para lhes dar a liberdade de se voltarem para o lado que lhes agrada, mas para leválos aparticipar na fortificação do laçado Estado.” A República. trad. Enrico Corvisieri. São Paulo, Nova Cultural,1997, Livro VII. p 31.

7

Aristóteles (384 a.C – 322 a.C) é filosofo e biólogo. Foi discípulo de Platão, no entanto, do mestre divergiu.Crítico de Platão em razão de sua teoria das ideais, o pensamento de Aristóteles é baseado no conhecimentoempírico.

8

“(…) o homem feliz vive bem e age bem; pois definimos praticamente a felicidade como uma espécie de boavida e boa ação.” Ética a Nicômaco. 4. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991, (Os pensadores; v. 2), p. 9.

9

Para Aristóteles é “a virtude, pois, uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consistente numamediania, isto é, a mediania relativa a nós, a qual é determinada por um princípio racional próprio do homemdotado de sabedoria prática.”

10

“Ora, nas disposições que tomam sobre todos os assuntos, as leis têm em mira a vantagem comum, quer detodos, quer dos melhores ou daqueles que detêm o poder ou algo nesse gênero; de modo que, em certosentido, chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar, para a sociedade política, afelicidade e os elementos que a compõem.” Ética a Nicômaco, Poética/Aristóteles; seleção de textos de JoséAmérico Motta Pessanha. 4. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991, Livro V.

11

“Hedonismo (in: Hedonism; fr. Hédonisme, ai. Hedonismus; it. Edonismó). Termo que indica tanto a procuraindiscriminada do prazer, quanto a doutrina filosófica que considera o prazer como o único bem possível,portanto como o fundamento de vida moral. Essa doutrina foi sustentada por uma das escolas socráticas, aCirenaica, fundada por Aristipo; foi retomada por Epicuro, segundo o qual ‘o prazer é o princípio e o fim davida feliz’ (DlÓG. L, X, 129). O hedonismo distinguese do utilitarismo do séc. XVIII porque, para este último,o bem não está no prazer individual, mas no prazer do ‘maior número possível de pessoas’, ou seja, nautilidade social.” ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 497.

12

Epicuro (341270 a.C) era grego, filósofo e fundador da escola Jardim. Na escola não participavam apenas oshomens, mas também mulheres e escravos.

13

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EPICURO. Carta sobre a Felicidade. Carta à Meneceu.

14

“Somente a Razão torna a vida alegre e agradável, excluindo todas as concepções ou opiniões falsas quepodem perturbar a mente.” Epicuro.

15

“Conhecimento seguro dos desejos leva a direcionar toda escolha e toda recusa para a saúde do corpo e paraa serenidade do espírito, visto que esta é a finalidade da vida feliz: em razão desse fim praticamos todas asnossas ações, para nos afastarmos da dor e do medo.” EPICURO. Carta sobre a Felicidade. Carta àMeneceu.

16

EPICURO. Carta sobre a Felicidade. Carta à Meneceu. São Paulo: Unesp. 1999.

17

“We hold these Truths to be selfevident, that all Men are created equal, that they are endowed by theirCreator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the Pursuit of Happiness.”Declaração da Independência dos Estados Unidos da América.

18

“Les Représentants du Peuple Français, constitués en Assemblée nationale, considérant que l’ignorance,l’oubli ou le mépris des droits de l’homme sont les seules causes des malheurs publics et de la corruption desGouvernements, ont résolu d’exposer, dans une Déclaration solennelle, les droits naturels, inaliénables etsacrés de l’homme, afin que cette Déclaration, constamment présente à tous les membres du corps social,leur rappelle sans cesse leurs droits et leurs devoirs; afin que les actes du pouvoir législatif, et ceux du pouvoirexécutif pouvant être à chaque instant comparés avec le but de toute institution politique, en soient plusrespectés; afin que les réclamations des citoyens, fondées désormais sur des principes simples etincontestables, tournent toujours au maintien de la Constitution, et au bonheur de tous.”

19

Fernando Huanacuni Mamani. Secretaria Ejecutiva del Convenio Andres Bello, 2010

20

“1. Suma Manq’ aña 2. Suma Umaña. 3. Suma Thokaña. 4. Suma Ikiña. 5. Suma Irnakaña 6. Suma Lupiña7. Suma Amuyaña 8. Suma Munaña Munayasiña 9. Suma Ist’aña 10. Suma Aruskipaña 11. Suma Samkasiña12. Suma Sarnaqaña 13. Suma Churaña, Suma Katukaña.” Secretaria Ejecutiva del Convenio Andres Bello,2010.

21

Baruch Espinoza foi filósofo da era moderna. Nasceu em 1632 e morreu em 1677. Em 1656 recebeu puniçãoequivalente à excomunhão, em razão de sua formulação teórica de que Deus era um mecanismo imanente danatureza.

22

Filósofo italiano nascido em 1942.

23

AGAMBEN, Giorgia. Homo Sacer. O poder soberano e a vida nua. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002, p.129130.

24

Idem, ibidem.

25

Do direito romano, o homo sacer é uma figura obscura, uma pessoa que é excluída de todos os direitos civis,sendo sua vida considerada sacra, de forma negativa. O homo sacer pode ser morto por qualquer um.

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26

JIMENEZ, Luiz. Liberdade de amar e direito de morrer. Buenos Aires: Historia Nova, 1929, p. 122.

27

Epicuro: “A morte é um castigo para alguns, para outros um presente e para muitos um favor. Temido poralguns como o mais horrível dos males, não é, na realidade, nada, pois enquanto nós somos, a morte não é,e quando a morte chega, nós não somos”.

28

HUMPHRY, Dereck; WICKETT, Ann. El derecho a morir. Ed Tusquets, 2005, p 1921.

29

JIMENEZ, Luiz. Liberdade de amar e direito de morrer. Buenos Aires: Historia Nova, 1929, p. 126.

30

MORUS, Thomas. A utopia. Disponível em: [www.virtualbooks.com.br]. Acesso em: 28.04.2014.

31

SANDEL, Michel. Op. cit.

32

ABBAGNANO, Nicola. Op. cit., p. 683684.

33

Idem, ibidem.

34

BARROSO, Luís Roberto e MARTEL, Letícia de Campos. A morte como ela é: dignidade e autonomiaindividual no final da vida. Disponível em: [www.luisrobertobarroso.com.br/wpcontent/themes/lrb/pdf/a_morte_como_ela_e_dignidade_e_autonomia_no_final_da_vida.pdf]. Acesso em:29.04.2014.

35

Idem.

36

Idem.

37

Para alguns a ortotanásia também pode ser referida como eutanásia passiva.

38

BARROSO, Luís Roberto e Martel, Letícia de Campos. A morte como ela é: dignidade e autonomia individualno final da vida. Disponível em: [www.luisrobertobarroso.com.br]. Acesso em: 29.04.2014.

39

“Artículo 293: El que disponga de la vida de otro, respondiendo a una petición seria y explicita de éste, serácastigado con pena de cárcel de hasta 12 años y multa. No será punible si la acción la ha llevado a cabo unmédico cumpliendo los requisitos del artículo 2 de la Ley de comprobación de la finalización de la vida apetición propia y del auxilio al suicidio, y esto lo ha comunicado al forense municipal. Art. 294: Aquel queintencionadamente induzca a otro al suicidio, le preste auxilio o le facilite los medios necesarios para hacerlo,si el suicidio se consuma, será castigado con pena de cárcel de hasta tres años y multa. No será castigado sila ayuda es prestada por un médico cumpliendo los requisitos del artículo 2 de la Ley de comprobación de lafinalización de la vida a petición propia y del auxilio al suicidio.”

40

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[http://sociedad.elpais.com/sociedad/2011/11/09/actualidad/1320793212_850215.html].

41

[www.eutanasia.ws/eutanasia_suicido.html].

42

“Artículo 37. (Del homicidio piadoso) Los Jueces tiene la facultad de exonerar de castigo al sujeto deantecedentes honorables, autor de un homicidio, efectuado por móviles de piedad, mediante súplicasreiteradas de la víctima.”

43

“Artículo 315. (Determinación o ayuda al suicidio) El que determinare a otro al suicidio o le ayudare acometerlo, si ocurriere la muerte, será castigado con seis meses de prisión a seis años de penitenciaría. Estemáximo puede ser sobrepujado hasta el límite de doce años, cuando el delito se cometiere respecto de unmenor de dieciocho años, o de un sujeto de inteligencia o de voluntad deprimidas por enfermedad mental opor el abuso del alcohol o el uso de estupefacientes.”

44

Na Inglaterra, o suicídio hoje não é crime. Até o ato 1961, a tentativa de suicídio na Inglaterra era punível.

45

“Art. 2.º (Direito à vida) 1. O direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei. Ninguém poderá serintencionalmente privado da vida, salvo em execução de uma sentença capital pronunciada por um tribunal, nocaso de o crime ser punido com esta pena pela lei. 2. Não haverá violação do presente artigo quando a morteresulte de recurso à força, tornado absolutamente necessário: (a) Para assegurar a defesa de qualquer pessoacontra uma violência ilegal; (b) Para efetuar uma detenção legal ou para impedir a evasão de uma pessoadetida legalmente; (c) Para reprimir, em conformidade com a lei, uma revolta ou uma insurreição.”

46

“Art. 3.º Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes.”

47

“Art. 8.º (Direito ao respeito pela vida privada e familiar) 1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da suavida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência. 2. Não pode haver ingerência daautoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituiruma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para asegurança pública, para o bemestar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracçõespenais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros.”

48

Texto íntegro del fallo de la Corte Europea de Derechos Humanos en el caso dictado en Estrasburgo el 29 deabril de 2002, en inglés y en francés.

49

Haas v. Switzerland, n. 31322/07, judgment of 20 January 2011.

50

Sentencia del Tedh, Alda Gross vs. Suiza (n. 67810/10) del 14 de mayo 2013.

51

“Art. 121. Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos. Caso de diminuição de pena § 1.º Se oagente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violentaemoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio Art. 122 – Induzir ou instigar alguém a suicidarse ou prestarlheauxílio para que o faça: Pena – reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um atrês anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Parágrafo único – A pena éduplicada: Aumento de pena I – se o crime é praticado por motivo egoístico; II – se a vítima é menor ou temdiminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.”

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52

A Resolução foi objeto de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público (ACP 005019662.2007.4.01.0000).

53

Res. CFM 1931/2009 (Publicada no DOU 24.09.2009, Seção I, p. 90) (Retificação publicada no DOU13.10.2009, Seção I, p. 173) Código de Ética Médica.

54

“É uma eutanásia por omissão, segundo o professor Lattes. O art. 13, § 2.º, do CP estabelece: ‘a omissão épenalmente relevante, quando o emitente devia e podia agir para evitar o resultado’. No caso o médico,embora omisso, não está obrigado a prolongar a morte inexorável. O professor Lattes da Universidade dePavia afirma: a materialidade dos fatos em tais casos é muito diversa da verdadeira eutanásia. Nesta, a morteé devida a um fato concreto executado voluntariamente pelo médico. Naquela, o curso espontâneo daenfermidade e suas complicações são alheios aos fins e iniciativas médicas: matar é distinto de deixar morrer.Baseiase Lattes na omissão de socorro. Para que exista este crime é mister haver uma norma jurídicaexpressa. Assim, quando a intervenção médica não puder obter a cura do enfermo, que se ache esta além daspossibilidades humanas e, se longe de aliviarlhe, apenas proporcionelhe mais sofrimento, não se podeafirmar o dever de prolongar essas penosas existências.” Contornos atuais da eutanásia e da ortotanásia:bioética e biodireito. A necessidade do controle social das técnicas médicas. Maria Celeste Cordeiro LeiteSantos Professora Associada do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direitoda USP. Disponível em: [www.revistas.usp.br/rfdusp/article/viewfile/67442/70052]. Acesso em: 03.05.2014.“não há dever jurídico de prolongar uma vida irrecuperável”. COSTA JÚNIOR, Paulo José. Curso de direitopenal. São Paulo: Saraiva, 1991, vol. 2.

55

“§ 3.º A pena é diminuída de um sexto a um terço se o agente comete o crime impelido por motivo derelevante valor social ou moral, ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida de injusta provocação davítima.

Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio Art. 122. Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao suicídio: Pena –prisão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma, e de um a quatro anos, se da tentativa resulta lesãocorporal grave, em qualquer grau. § 1.º Não se pune a tentativa sem que da ação resulte ao menos lesãocorporal grave. § 2.º A pena é aumentada de um terço até a metade se o crime é cometido por motivoegoístico.”