aspectos bioecolÓgicos do caranguejo-uÇÁ (ucides cordatus cordatus, l.1763) (decapoda, brachyura)...

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17 Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. ASPECTOS BIOECOLÓGICOS DO CARANGUEJO-UÇÁ (UCIDES CORDATUS CORDATUS, L.1763) (DECAPODA, BRACHYURA) NOS MANGUEZAIS DA ILHA DE SÃO LUÍS E LITORAL ORIENTAL DO ESTADO DO MARANHÃO, BRASIL Antônio Carlos Leal de Castro * Maria Marlúcia Ferreira Correia * Adenilde Ribeiro Nascimento ** Raimundo Nonato Piedade Júnior *** Lívia Regina Montes Gama *** Masoni Matos Sousa *** Ana Carolina Silva Sena **** Raissa Celina Costa Sousa **** RESUMO O estudo objetiva diagnosticar a atividade pesqueira do caranguejo-uçá na ilha de São Luís e nos municípios de Icatu, Humberto de Campos, Primeira Cruz e Araioses pertencentes ao litoral oriental maranhense, de acordo com informações de natureza bioecológica, bem como analisar a qualidade da carne do caranguejo “in natura”. Realizou-se a caracterização da população do caranguejo através de estudos biométricos, densidade e análise microbiológica da carne do animal. Para análise biométrica do caranguejo-uçá, as informações consistiram na identificação sexual, morfometria pelas medidas do comprimento e largura, e peso de cada indivíduo. O rendimento da carne foi obtido retirando-se e pesando-se a musculatura (parte comestível). Na análise microbiológica utilizou-se a metodologia recomendada pelo Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods (APHA). Os resultados revelam que a largura da carapaça dos caranguejos capturados estão dentro dos padrões estabelecidos pelo IBAMA. Observou-se que a captura praticada pelos pescadores exclui fêmeas ovígeras e espécimes com largura da carapaça inferior a 6,0cm, o que pode indicar a percepção da comunidade em relação à conservação da espécie. Palavras-chave: Ecossistema Manguezal. Bioecologia. Caranguejo-uçá. Estado do Maranhão. * Professor Titular do Departamento de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). São Luís-MA. E-mail: [email protected]; [email protected] ** Professora Adjunta do Departamento de Tecnologia Química da UFMA. São Luís-MA. E-mail: [email protected] *** Bacharel em Ciências Aquáticas pela UFMA. São Luís-MA. E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected] **** Acadêmicos do curso de Ciências Aquáticas da UFMA. São Luís-MA. E-mail: [email protected]; [email protected]

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ASPECTOS BIOECOLÓGICOS DO CARANGUEJO-UÇÁ (UCIDES CORDATUS CORDATUS, L.1763) (DECAPODA, BRACHYURA) NOS MANGUEZAIS DA ILHA DE SÃO LUÍS E LITORAL ORIENTAL DO ESTADO DO MARANHÃO, BRASIL

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17Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008.

ASPECTOS BIOECOLÓGICOS DO CARANGUEJO-UÇÁ (UCIDES CORDATUS CORDATUS,L.1763) (DECAPODA, BRACHYURA) NOS MANGUEZAIS DA ILHA DE SÃO LUÍS E LITORALORIENTAL DO ESTADO DO MARANHÃO, BRASIL

Antônio Carlos Leal de Castro*

Maria Marlúcia Ferreira Correia*

Adenilde Ribeiro Nascimento**

Raimundo Nonato Piedade Júnior***

Lívia Regina Montes Gama***

Masoni Matos Sousa***

Ana Carolina Silva Sena****

Raissa Celina Costa Sousa****

RESUMO

O estudo objetiva diagnosticar a atividade pesqueira do caranguejo-uçá na ilha de São Luís enos municípios de Icatu, Humberto de Campos, Primeira Cruz e Araioses pertencentes ao litoral orientalmaranhense, de acordo com informações de natureza bioecológica, bem como analisar a qualidadeda carne do caranguejo “in natura”. Realizou-se a caracterização da população do caranguejo atravésde estudos biométricos, densidade e análise microbiológica da carne do animal. Para análise biométricado caranguejo-uçá, as informações consistiram na identificação sexual, morfometria pelas medidasdo comprimento e largura, e peso de cada indivíduo. O rendimento da carne foi obtido retirando-se epesando-se a musculatura (parte comestível). Na análise microbiológica utilizou-se a metodologiarecomendada pelo Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods (APHA). Osresultados revelam que a largura da carapaça dos caranguejos capturados estão dentro dos padrõesestabelecidos pelo IBAMA. Observou-se que a captura praticada pelos pescadores exclui fêmeasovígeras e espécimes com largura da carapaça inferior a 6,0cm, o que pode indicar a percepção dacomunidade em relação à conservação da espécie.

Palavras-chave: Ecossistema Manguezal. Bioecologia. Caranguejo-uçá. Estado do Maranhão.

* Professor Titular do Departamento de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). SãoLuís-MA. E-mail: [email protected]; [email protected]

** Professora Adjunta do Departamento de Tecnologia Química da UFMA. São Luís-MA. E-mail: [email protected]*** Bacharel em Ciências Aquáticas pela UFMA. São Luís-MA. E-mail: [email protected]; [email protected];

[email protected]**** Acadêmicos do curso de Ciências Aquáticas da UFMA. São Luís-MA. E-mail: [email protected];

[email protected]

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Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 3, n. 6, jan./jun. 2008. 18

BIOLOGICAL ASPECTS OF THE MANGROVE CRAB (UCIDES CORDATUS, L. 1763) (DECAPODA,BRACHYURA) IN MANGALS OF SÃO LUÍS ISLAND IN THE NORTHLASTEEN COAST OFMARANHAO STATE, BRAZIL

ABSTRACT

The present work surveys the quality of the extracted crab meat and sustainability of mangrovecrab fisheries in Sao Luis island and neighboring counties of Icatu, Humberto de Campos, PrimeiraCruz and Araioses, at the Northeastern coast of Maranhao State, Northern Brazil, using bioecologicalinformation. A diagnostics of the mangrove crab populations was performed through biometric analysis,field density data and microbiological analysis of extracted meat. Specifically, the biometry focused onsex, width and length data, and weight of sampled individuals. The extractable meat potential wasestimated by weighing the edible portions of the muscle tissue. The microbiological analysis followedmethodology presented in the Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods(APHA). The results have shown that the size of the captured crabs is above the minimum size establishedby IBAMA (Brazilian Federal Environmental Protection Agency). It was also noticed that the crabcollectors do not capture egg-carrying females and specimens with a carapace width less than 6 cmwide, probably indicating that the fishermen are conscious about the need to protect the resourcerepresented by the mangrove crab population.

Keywords: Mangrove swamps. Bioecological. Caranguejo-uçá. State of Maranhão.

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1 INTRODUÇÃO

Os manguezais caracterizam-se comoecossistemas tipicamente tropicais estandorepresentados em quatro continentes edistribuídos em seis regiões geográficas doplaneta. As maiores ocorrências localizam-se naAmérica Central, Caribe, Índia, Península daIndochina, Brasil e Austrália. No Atlânticoocidental organiza-se desde a Flórida (EUA) atéo Estado de Santa Catarina, Sul do Brasil (MELO,1996). Estes, ainda, crescem em zonas costeirasprotegidas, planícies inundáveis, praias lodosas,e desembocaduras de rios. Pertencem a umavariedade de família de plantas, destacando-se as Combretaceae, Rhizophoraceae eAvicenniaceae.

A fauna dos manguezais é composta porum complexo conjunto de animais que podemser residentes, semi-residentes ou visitantes.Destacam-se ainda a presença de caranguejos,peixes e camarões e um número elevado navegetação periférica de mamíferos, répteis eavifauna característica de estuários marinhos.

Numa avaliação sistêmica osmanguezais são ecossistemas de grandeprodutividade, promovendo a troca de gasesentre as várias partes da planta e a atmosferae a produção de biomassa aérea (raízes, caules,folhas e frutos) e terrestre (raízes). Colaboraainda na manutenção das bacias flúvio-marinhas, permitindo a absorção pelo lençolfreático.

A produção de biomassa em manguezaisimpactados é maior que nas formações naturais,devido às ações de manejo florestaldesenvolvidas, em face as florestas nativasapresentarem muito cedo um estágio clímax,diminuindo as atividades físico-biológicas dapopulação, e conseqüentemente diminuindo suaprodução de biomassa.

No Brasil, os manguezais cobrem uma áreaaproximada de 13.000km2. Os estados doMaranhão, Pará e Amapá, inseridos na AmazôniaLegal Brasileira, detêm cerca de 50% da área demanguezais do país (HERZ, 1991, KJERFVE;LACERDA, 1993, SANT’ANNA; WHATELY, 1981),onde as principais áreas de ocorrência e produçãode caranguejos estão concentradas nas regiõesNorte e Nordeste, as quais contribuem com 70%da produção nacional. Vários autores estimam,em algumas localidades, uma biomassa de 280t/ha, valores entre os mais altos do mundo(CINTRÓN; SCHAEFFER-NOVELLI, 1983,LACERDA; SCHAEFFER-NOVELLI, 1992).

O Maranhão com cerca de 500.000ha demanguezais, possui quase a metade da área totaldeste ecossistema no país (VANUCCI, 1999). Noestado, o caranguejo constitui-se como um dosprincipais recursos pesqueiros estuarinos, emvirtude de sua grande abundância e da facilidadede captura, a qual não exige métodos e técnicassofisticadas, impedindo deste modo o controleefetivo da sua produção total (CASTRO, 1986).

O caranguejo uçá - Ucides cordatuscordatus, Linnaeus (1763), em relação ao seutamanho é o segundo maior crustáceoencontrado no manguezal, constituindo a espéciemais explorada para o consumo humano. Suastocas pontilham todo o solo das florestas demangue, onde se alimentam das folhas epropágulos caídos (OLMOS; SILVA, 2003).

Registros da literatura disponívelassinalam que esse animal, representa um dosmais importantes recursos das regiões estuarinasda costa brasileira, passível de ser explorado comrelativa intensidade sem entrar em situação desobrepesca (PAIVA, 1997). Entretanto, osecossistemas costeiros vêm sofrendo umaintensa exploração, causada pelas ações

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2 METODOLOGIA

2.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA ESTUDADA

2.1.1 Ilha de São Luís

O trabalho foi realizado na bacia do rioPaciência (Mapa 1) que se localiza na partenordeste da ilha de São Luís, compreendida entreos paralelos 2° 23’ 05"S a 2° 36’ 42" S e entre osmeridianos 44° 02’ 49" W a 44º15’49" W,drenando uma área de aproximadamente171,74km2, distribuindo-se pelos quatromunicípios integrantes da ilha de São Luís: Paçodo Lumiar, Raposa, São José de Ribamar e São Luís

Segundo Cardoso (apud SOUSA, 2007) abacia hidrográfica do rio Paciência possui partede suas terras nos municípios de São Luis (5,43%),Paço do Lumiar (60,65%), Raposa (16,13%) e SãoJosé de Ribamar (11,06%). Às margens domunicípio de Raposa o rio Paciência forma umgrande estuário.

O rio Paciência é o principal curso d’águaque banha a zona leste da ilha de São Luís, tendosua nascente no município de São Luis que sedesloca em direção ao nordeste da ilha, ocasião

em que passa pelo meio rural dos municípios deSão José de Ribamar, Paço do Lumiar e Raposa,desembocando na baía de São José, em frente àponta do Curupu. Na cabeceira da bacia, nasproximidades da Raposa (alto curso), a ocupaçãohumana é intensa.

Os manguezais do rio Paciência vêmsofrendo impactos constantes por lançamentosde esgotos, resíduos sólidos e por desmatamento,acarretando um desequilíbrio ecológico que afetadiretamente a população do caranguejo-uçá. Estecrustáceo é altamente consumido pelo povomaranhense, e muitas comunidades que habitamo entorno do rio Paciência, dependem desseanimal para a sua sobrevivência.

Nesses municípios que compreendem abacia existem comunidades dependentes dosrecursos oferecidos pelos manguezais. Estima-sea existência de aproximadamente 400 catadoresde caranguejo.

antrópicas, dentre elas podemos destacar aocupação urbana de forma desordenada, olançamento de lixo, esgotos domésticos eindustriais, desmatamentos, aterros, além deocorrer nos manguezais uma super exploraçãodos recursos, onde o homem retira ostras,crustáceos, peixes e madeira em quantidadeselevadas.

Assim, impõem-se a necessidade deestudos que ofereçam base técnico-científica

para ações de sustentabilidade do recurso,fornecendo subsídios para o ordenamento dapesca, assegurando o potencial sustentável decaptura e a manutenção dos estoques em níveisadequados de exploração.

O estudo objetiva diagnosticar a atividadepesqueira do caranguejo-uçá na ilha de São Luíse em alguns municípios do litoral orientalmaranhense, enfocando também seu rendimentoe qualidade da carne “in natura”.

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2.1.2 Municípios do litoral oriental

Os municípios do litoral oriental doMaranhão cobertos pela pesquisa foram Icatu(Mamuna), Humberto de Campos (baía deTubarão), Primeira Cruz (ilha de Carrapatal), comlevantamentos realizados no mês de abril de 2007e, em Araióses (Carnaubeiras e Barreirinha), emjaneiro de 2008 (Mapa 2).

O município de Icatu localiza-se namicrorregião de Rosário, mesoregião do nortemaranhense. Com uma população estimada de24.432 habitantes em 2007, e uma superfíciede 1547km². Foi criado em 1688. Está

localizado na zona do litoral norte damesoregião do leste maranhense emicrorregião da Baixada Oriental Maranhense.É limitado ao norte pelo Oceano Atlântico; aosul, pelos municípios de Axixá e Morros; a lestepelo de Humberto de Campos e a Oeste, pelosde Axixá e São José de Ribamar. O municípiotem posição geográfica definida pelo paralelode 02º 46' de latitude sul onde se cruzam como meridiano de 44º 04' de longitude oeste. Aaltitude da cidade está a 5m acima do nível domar. Fica distante da capital do estado (SãoLuís), 36km em linha reta.

Mapa 1 - Estado do Maranhão com destaque aos limites da Bacia do Rio Paciência, Ilha de São Luís.Fonte: Imagem Landsat.

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A caracterização da população docaranguejo foi realizada, visando o estudo

O município de Humberto de Campospossui população estimada em 24.275habitantes, com uma aréa de 2.131km2. Omunicipio de Primeira Cruz, em 2007, apresentouuma população estimada de 11.999 habitantesdistribuída em uma superfície de 1.367,833 km²(IBGE, 2007).

O município de Araióses compõe aMesorregião Leste Maranhense e da MicrorregiãoBaixo Parnaíba Maranhense, situa-se nascoordenadas 02° 53' 24"S 41° 54' 10" W, possuiuma área territorial de 1.782,564km², com umapopulação de 35.212 habitantes, com densidadedemográfica de 19.8 hab./km².

Mapa 2. Mapa do Litoral Oriental do Estado do Maranhão com localização das áreas estudadas.

2.2 ESTUDO BIOECOLÓGICO DO CARANGUEJO-UÇÁ

bioecológico, por meio de biometria, da densidadee da análise microbiológica da carne do animal.

2.2.1 Biometria

A caracterização do estado atual daspopulações de caranguejo-uçá quanto a suabiologia foi realizada utilizando-se da

biometria, densidade, rendimento da carne,microbiologia da carne “in natura” docaranguejo.

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Para análise biométrica do caranguejo-uçá, utilizou-se os dados obtidos do total de 438indivíduos, procedentes da bacia do rio Paciência(ilha de São Luís), nas localidades Mocajituba eCumbique, correspondentes ao período de abrilde 2006 a novembro de 2007. Nos municípiosde Primeira Cruz (ilha de Carrapatal), Humbertode Campos (baía de Tubarão), Icatu (Mamuna),foram coletados 270 indivíduos em abril de 2007e janeiro de 2008 e no município de Araióses(Carnaubeiras e Barreirinha) com 240 indivíduoscoletados de março a setembro de 2007.

As análises consistiram na identificaçãosexual com base em caracteres externos(ALCÂNTARA-FILHO, 1978). Nos machos oabdômen é longo, estreito, triangular e,

geralmente, com 5º e 6º segmentos soldados numsegmento longo, articulando-se com o telso. Nafêmea o abdômen é semicircular, largo, com todosos segmentos visíveis e não fusionados(Fotografia 1 e 2).

A morfometria realizou-se através dasmedidas do comprimento e largura com autilização de paquímetro com precisão de0,1mm. O comprimento da carapaça foi tomadono plano de simetria e sobre o dorso do corpo, apartir da margem anterior da fronte à margemposterior da carapaça e a largura tomada aonível aproximado do primeiro par depereiópodos, correspondentes a sua maiordimensão, segundo Alcântara-Filho (1978)(Fotografia 3 e 4).

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Avaliou-se também o peso de cadaindivíduo através de pesagem com balança digitalcom precisão de 0.1 g e rendimento da carne aoretirar-se sua musculatura (parte comestível).

Para verificar a predominância de macho

ou de fêmea, aplicou-se o teste (Qui-quadrado), com = 0,05. Esta proporção foianalisada mensalmente e para o período total,conforme a seguinte fórmula:

(01)

2.2.2 Densidade

Para a realização do estudo dadensidade do caranguejo-uçá, as áreasamostradas foram os municípios de Icatu(Mamuna), Humberto de Campos (baía deTubarão), Primeira Cruz (ilha de Carrapatal),Araióses (Carnaubeiras e Barreirinha) e na ilhade São Luís, no manguezal da bacia do rioPaciência, que são grandes pólos deexploração do caranguejo.

No manguezal delimitou-se 3 plots(quadrados) com fita métrica cada um com áreade 20m2 e corda, onde se contou o número detocas e retirou-se a medida da largura,profundidade de cada toca. Para isso considerou-se que cada toca é habitada por um únicoindivíduo, de acordo com Ivo e Gesteira (1999) eAlcântara-Filho (1978). Para a realização do

Onde:

= qui-quadrado

Fo = freqüência observada

Fe = freqüência esperada de 1:1

Todos os dados foram submetidos aosprogramas Microsoft Excel e Statistica 6.0 paraaplicação de testes estatísticos.

cálculo da densidade do caranguejo utilizou-sea seguinte formula:

(02)

Onde:

D = densidade do caranguejo, ou seja,número de indivíduos por unidade de área (m2);

N = número de indivíduos de umadeterminada área;

A = área do plot (quadrado).

Na área identificou-se o tipo de mangue,relevo, substrato e impactos que ocorrem paramelhor compreensão do habitat do animal estudadoe avaliar o estresse a que estava submetido.

2.2.3 Análise microbiológica

Analisaram-se vinte amostras da carne decaranguejo durante o período de novembro de2006 a agosto de 2007. Os animais foramcoletados nos manguezais da bacia do rioPaciência e, posteriormente transportados parao laboratório. A carne “in natura” do caranguejofoi retirada imediatamente sem passar por

processo de resfriamento, para que não houvesseinterferência nos resultados. Para cada amostraretirou-se 25 g da carne.

A metodologia empregada foi arecomendada pelo Compendium of Methods forthe Microbiological Examination of Foods (APHA,

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De acordo com o total de indivíduosamostrados no manguezal do rio Paciência,verificou-se que a média e a amplitude docomprimento da carapaça dos machos foramsuperiores as das fêmeas. A largura da carapaçados machos apresentou maior variação e médiado que das fêmeas (Tabela 1 e Figura 1). Com a

aplicação do teste t verificou-se que as médiasda largura dos machos e das fêmeasapresentaram p = 0,03 ou p < 0,05, portantodiferença significativa a nível de 5% deprobabilidade, enquanto que, com relação aocomprimento não existe diferença significativaentre os machos e fêmeas, (p = 0,13 ou p>0,05).

2001). Usou-se a técnica dos tubos múltiplos comtrês tubos por diluição, utilizando o caldo lauril a35°C, com confirmação no caldo EC a 45°C. Paraa identificação das espécies das bactérias dos

grupos coliformes foram realizados os seguintestestes: INVIC (Indol, Vermelho de Metila, Voges -Proskauer, Citrato), Aminoácidos (Lisina) eCarbohidrato (Rafinose e Sacarose).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO DO CARANGUEJO-UÇÁ

Tabela 1 – Valores médios, desvio padrão, máximo e mínimo para a largura e comprimento (mm) da carapaçados machos e das fêmeas capturados no manguezal do rio Paciência, ilha de São Luís, Maranhão.

Fonte:dados da pesquisa.Nota: N= número de indivíduos amostrados

Apenas as fêmeas do manguezal do rioPaciência foram consideradas nas análises, nosdemais pontos estudados as fêmeas foramdesconsideradas devido à baixa porcentagem deocorrência. Com isso os machos registraram, em2007, a média de largura mais elevada na localidade

de Mamuna, seguido da ilha de Carrapatal e baíade Tubarão. Na coleta de 2008 a largura média nailha de Carrapatal, seguida de Mamuna e Baía deTubarão. Esses dados demostraram que não houvegrandes diferenças entre os valores encontrados nosdois anos estudados (Tabela 2).

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Fonte: dados da pesquisa.Nota: N= número de indivíduos amostrados

No município de Araióses na localidade deCarnaubeiras, as maiores médias de larguraregistraram-se no período chuvoso, na localidade

Fonte: dados da pesquisa.Nota: N= número de indivíduos amostrados

Estes resultados revelam que oscaranguejos capturados no litoral oriental doMaranhão, de modo geral, estão dentro dospadrões estabelecidos pelo Instituto Brasileirodo Meio Ambiente (IBAMA) que de acordo coma Portaria n. 34/2003-N, de 24 de julho de 2003,Art. 3° proibe em qualquer época a captura,coleta, transporte, beneficiamento, a

Tabela 2 – Valores médios, desvio padrão, máximo e mínimo, para a largura e comprimento (mm) da carapaçados machos nas localidades de Mamuna, ilha de Carrapatal e baía de Tubarão, litoral orientalMaranhão.

de Barreirinha apresentando esta média osmaiores valores. (Tabela 3).

Tabela 3 – Valores médios, desvio padrão, máximo e mínimo para a largura e comprimento da carapaça dosmachos no município de Araióses, localidades de Carnaubeiras e Barreirinha, litoral oriental doMaranhão.

industrialização e a comercialização dequalquer indivíduo da espécie Ucides cordatuscordatus, caranguejo-uçá, cuja largura dacarapaça seja inferior a 6,0cm. Apenas nosmanguezais da bacia do rio Paciência e Araiosesregistrou-se caranguejos capturados comlargura média inferior ao padrão estabelecidopelo IBAMA.

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No estudo da relação Comprimento/Largura da carapaça dos indivíduos da ilha deSão Luís, verificou-se a tendência dos pontos sedistribuírem de forma retilínea, para ambos ossexos (Gráficos 1 e 2), os quais depois deajustados pelo método dos mínimos quadradosforneceram as seguintes equações:

Para o total de machos amostrados: Y=0,7136x + 0, 557, R2 = 0,7024, para o total defêmeas amostradas: Y= 0,8356x – 6, 0315, R2 =0,8129. Onde y = largura da carapaça e x =comprimento da carapaça.

Figura 1 - Medianas, inter quartis e amplitude mínima e máxima do comprimento e largura (mm) da carapaçaentre machos e fêmeas capturados comercialmente nos manguezais da bacia do rio Paciência, ilhade São Luís, Maranhão.

Gráficos 1 e 2 – Relação entre o comprimento e largura da carapaça dos machos e das fêmeas do caranguejo-uçá capturados comercialmente no manguezal da bacia do rio Paciência, ilha de São Luís,Maranhão.

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3.2 PROPORÇÃO SEXUAL DO CARANGUEJO

Durante o período estudado, verificou-se emtodas as localidades amostradas que a incidênciade machos do caranguejo-uçá foi sempre maiorque a das fêmeas, com predominância da capturade machos no litoral costa oriental do maranhense.Para o total de indivíduos das amostras nosmanguezais do rio Paciência, a proporção demachos e fêmeas correspondeu a: 82,27% e16,81% (4,89M:1F), respectivamente.

A proporção sexual revelou diferençasestatisticamente significativas com nível designificância de 0,05, na maioria dos mesesanalisados e no total de indivíduos. Apenas nosmeses de abril e dezembro de 2006 e maio de2007 não houve diferenças significativas entre aproporção de machos e fêmeas (Tabela 4). Em

populações naturais espera-se que a proporçãoentre machos e fêmeas seja equivalente(SALOMOM apud LIMA-BENTES, 2004). Porém,um dos fatores que explicam a maior proporçãode machos é a seleção feita pelos pescadores,catadores e também pela existência da PortariaNº 34/2003-N, IBAMA de 24 de junho de 2003,no seu Art. 1º que proíbe, anualmente, no períodode 1º de dezembro a 31 de maio, a captura,manutenção em cativeiro, o transporte, obeneficiamento, a industrialização e acomercialização de fêmeas da espécie Ucidescordatus, caranguejo-uçá para os estados do Pará,Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte,Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia,o que leva o pescador a temer a cata das fêmeasdo caranguejo.

Na relação comprimento/peso os pontosse distribuem com tendência retilínea para ambosos sexos (Gráficos 3 e 4), onde foram obtidas asseguintes equações:

Para machos: Y= 2,1534x -3,535, R2 =0,7111, para fêmeas: Y = 2,017x – 3,2454, R2 =0,7901. Onde y = peso e x = comprimento dacarapaça.

Gráficos 3 e 4 – Relação entre o comprimento da carapaça e peso dos machos e das fêmeas do caranguejo-uçá capturados comercialmente no manguezal da bacia do rio Paciência, ilha de São Luís,Maranhão.

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Fonte: dados da pesquisa.Nota: Onde (ns) corresponde à diferenças não significativas e (sig) à diferenças significativas na proporção de machos e

fêmeas.

35,84g e 39,84g com proporções de 24,29%,23,71% e 26,30%. No ano de 2008 as médias derendimento foram pouco superiores às encontradasno ano de 2007, correspondendo a 46,35g (25,22%)em Mamuna; 44,27g (26,09%) na baía de Tubarãoe 48,86 g (28,37%) para ilha de Carrapatal.

Para Araioses o rendimento foi analisadono período de chuvas e estiagem e as médias derendimento e proporções em relação ao pesointeiro do indivíduo para Carnaubeiras eBarreirinha foram respectivamente, 51,44g e41.81g (23,48% e 20,74%) no período de chuvase 53,09g e 50,40g (28,71% e 29,47%) no períodode estiagem, mais altos que na bacia do Paciência.

Tabela 4 - Quantidade e porcentagem de indivíduos na Bacia do Rio Paciência no período de abril de 2006 anovembro de 2007, na Ilha de São Luís, Maranhão.

3.3 RENDIMENTO DA CARNE DO CARANGUEJO

Com relação ao rendimento da carne doscaranguejos capturados no manguezal do rioPaciência, a média para machos e fêmeas foirespectivamente 31 g e 22,9 g, verificou-se quea proporção do rendimento correspondeu 26%para os machos e 19,3% para as fêmeas, emrelação ao peso inteiro do indivíduo. De acordocom este resultado observou-se que os machosapresentaram índice mais elevado em relação aopercentual da carne e ao peso do total doindivíduo das fêmeas.

Para as coletas de Mamuna, baía de Tubarãoe ilha de Carrapatal a média de rendimento em2007 correspondeu respectivamente a 45,44g,

3.4 DENSIDADE DO CARANGUEJO

As pesquisas foram realizadas nosmanguezais de Mamuna, baía de Tubarão eCarrapatal em duas coletas dentro do período

chuvoso, na qual se observou que as áreas sãocaracterizadas por um substrato lamoso, com umgrande número de tocas e um manguezal com

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Nos manguezais do rio Paciência o númerode tocas é menor, comparando com os outroslocais de estudo, com profundidade média de77,63cm e largura 5,2cm. Assim o número deindivíduos existentes é baixo. Esta baixadensidade pode ser atribuída ao lançamento deesgoto, desmatamento e resíduos sólidoslançados sem tratamento prévio no rio Paciência,que acaba por desequilibrar todo o ecossistemamanguezal, fazendo com que os catadoresprocurem pontos de cata cada vez mais distantes.A vegetação predominante é Rhizophora mangleL., que se encontra em regeneração, possuindoum porte arbóreo pequeno.

Em Araioses (Barreirinha e Carnaubeiras)os manguezais são caracterizados por umavegetação onde há predomínio de Rhizophoramangle L. e Avicennia germinans Linnaeus,respectivamente, que servem como bases daeconomia das comunidades ribeirinhas, queextraem a madeira para construção de casas.Além disso, desmatam os manguezais para aplantação de arroz e extraem o caranguejo deforma intensiva. Para retirá-lo da toca oscatadores utilizam com freqüência o cambito, umgancho de ferro que alcança o caranguejo naprofundidade de até dois metros, que é ummétodo predatório e proibido pelo IBAMA.

vegetação de grande porte arbóreo, com apredominância de Rhizophora mangle L. Percebe-se que a intervenção antrópica não é muitoacentuada devido ao difícil acesso.

A densidade e estrutura das tocasapresentaram uma pequena variação nas coletas

de abril de 2007 e janeiro de 2008 (Gráfico 5),exceto uma diferença significante que foiconstatada no povoado de Mamuna ondeaumentou de 42,92 para 74,5 cm a profundidademédia da toca.

Gráfico 5 - Densidade, largura e profundidade das tocas de Mamuna, Baía de Tubarão, Carrapatal nos anos de2007 e 2008.

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A ação antrópica é considerada como umfator de grande importância na variação dadensidade e estrutura de tocas. Como respostaao volume crescente de capturas e impactosambientais, a exploração do caranguejo se tornacada vez mais difícil e as tocas atingemprofundidades maiores.

Estudos anteriores feitos por Castro (1985)nos manguezais do rio Paciência mostraramflutuações na densidade média entre as estaçõesseca e chuvosa. A densidade média totalencontrada foi de 5,58 ind/m2.

Paiva (1997) observa uma densidadedecrescente do Maranhão; considerando-se a ilhade São Luís e principalmente a áreacompreendida entre Tutóia e o Delta do Parnaíbaaté o Ceará. Este mesmo decréscimo foiobservado por Rebelo-Mochel (1997). Emdecorrência do elevado consumo em outrascapitais do nordeste brasileiro, onde a demandapelo recurso devido ao turismo, tem sidointensificada, reforçando a tendência dediminuição na densidade pela pressão de capturasobre indivíduos cada vez menores.

Tanto nas comunidades de Barreirinha,Carnaubeiras e no rio Paciência (Mocajituba) osestudos foram realizados com o propósito defazer uma comparação entre os períodoschuvosos e de estiagem (Gráfico 6). Foiobservado que não houve uma variação

considerável na estrutura e na densidade dastocas, durante os dois períodos distintos. A maiorprofundidade média encontrada ocorreu emCarnaubeiras que apresentou uma variação ouaumento de 20 cm na profundidade da tocaentre os dois períodos.

Gráfico 6 - Comparação de dados da densidade dos caranguejos do período chuvoso e de estiagem nascomunidades Barreirinha, Carnaubeiras e no rio Paciência.

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Das vinte amostras analisadas, onze nãoapresentaram contaminação por coliformes a45°C, o que levaria a pressupor que o caranguejonão estivesse contaminado. No entanto asamostras posteriores apresentaramcontaminação por coliformes totais e a 45°C. Deacordo com a Resolução n° 12 de 2 de janeiro de2001, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária(ANVISA), ainda não existe um padrão específicopara a quantidade de bactérias do grupocoliforme encontradas em carne de crustáceos,pescado, ovas de peixes e moluscos, utilizadopara o consumo humano cru ou “in natura”, oque impossibilita a avaliação do resultado obtido,recomenda-se, portanto, o consumo dessecrustáceo com o cozimento adequado.

Verificando-se as médias entre os períodossazonais, observa-se que a estação chuvosaapresenta índices mais elevados tanto decoliformes totais como de coliformes a 45°C(Gráfico 7). Castro (1985) sugere que o maioraporte de água doce no período chuvoso, provocaenxurradas que colaboram para aumentar aincidência dos microrganismos do solo que sãoarrastados pelas águas. Este processo atinge ohabitat e o alimento deste crustáceo, além deatualmente a bacia do rio Paciência ser utilizadapara lançamento de parte de esgotos nãotratados dos bairros do Maiobão, Cidade Operáriae Cohatrac.

No presente estudo as médias obtidaspara a densidade populacional do caranguejo-uçá mostraram-se estáveis na maioria dasregiões com exceção da região dosmanguezais do rio Paciência, sendo a maisimpactada. Podemos observar também que otrabalho realizado por Castro (1985) no

estuário da bacia do rio Paciência apresentoumédias superiores aos dados atuaisconstantes deste estudo, demonstrando queas alterações causadas pelas ações antrópicasque ocorreram durante o espaço de tempo de22 anos, reduziram a população destecrustáceo.

3.5 ANÁLISE MICROBIOLÓGICA DA CARNE DO CARANGUEJO “IN NATURA”

Gráfico 7 - Médias sazonais e número mais provável para coliformes totais e a 45°C.

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Para análises das espécies do grupo doscoliformes, isolou-se 32 cepas as quais foramidentificadas, as bactérias: Escherichia coli,Enterobacter aerogenes, Enterobacter sp,Klebsiella oxycota, Citrobacter amalonaticus,Citrobacter freundii, Citrobacter diversus, Serratiamarcescens e Kluyvera cryocrescens. No entantoas espécies que apresentaram maior freqüênciano material foram Enterobacter aerogenes com39% seguido da bactéria Escherichia coli 22%.

A principal causa de doenças diarréicas éa ingestão de alimentos e/ou consumo de águascontaminadas por microrganismos patogênicos.Um dos principais agentes etiológicos dasinfecções entéricas é a bactéria Escherichia colique, quando presente na água ou alimentos, éum importante indicador de contaminação deorigem fecal e colocando em risco a saúdehumana (TÔRRES, 2003).

O grupo coliforme é restrito aos organismosque crescem no trato intestinal do homem e deanimais de sangue quente. Fazem parte deste

grupo pelo menos três gêneros: Escherichia,Klebsiella e Enterobacter (HITCHINS et al. apudTÔRRES, 2003), porém apenas a E. coli tem comohabitat primário o trato intestinal do homem e deanimais, enquanto Klebsiella e Enterobacterpodem estar presentes em vegetais e solo(FRANCO ; LANDGRAF apud TÔRRES 2003).

De acordo com Pelczar et al. (apud TÔRRES,2003) a microbiota encontrada nas espéciesaquáticas recém capturadas refletem a qualidademicrobiológica da água de onde foramcapturadas. A presença desses organismos nasamostras nos possibilita deduzir que o habitatnatural (manguezal) do caranguejo apresenta umgrau de contaminação antrópica, e vem sofrendoalterações ao longo dos anos. O lançamento deesgoto, desmatamento e resíduos sólidos vêmdiminuindo consideravelmente a população dessecrustáceo de grande valor socioeconômico dosmanguezais e de grande importância para asubsistência das populações de baixa renda quepor conseqüência estão consumindo um alimentode baixa qualidade.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados obtidos na execução dopresente trabalho sinalizaram para as conclusõesque se seguem:

Com relação ao total de indivíduosamostrados houve predominância de machos emtodos os locais, isso ocorre pela fácil identificaçãono ato da captura das fêmeas que apresentammenor tamanho, sendo devolvidos ao ambientejunto com os indivíduos machos de pequeno portepor falta de interesse pelo mercado consumidor,com isso todos os indivíduos machosapresentaram largura média superior a 60mmque corresponde ao tamanho mínimo de capturapermitido pelo IBAMA.

Observou-se que os caranguejos deMamuna, Carnaubeiras e Barreirinha apresentammaior tamanho em relação às outras localidades,alcançando médias de largura de 76.5mm,81.2mm. Isso ocorre provavelmente peladificuldade de captura, principalmente, emCarnaubeiras e Barreirinha devido à dureza dosubstrato do manguezal como também pelaelevada profundidade das tocas.

Verificou-se através de análise deregressão para o caranguejo-uçá da ilha de SãoLuís que os machos são maiores que as fêmeas eque ocorre maior desenvolvimento da largura emrelação ao comprimento para ambos os sexos.

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Evidenciou-se que os caranguejos da ilha deCarrapatal obtiveram o maior rendimento de carneem relação ao peso inteiro do caranguejo com26,5%, seguido dos machos da ilha de São Luiscom 24.5%. Apesar do maior tamanho e maiorquantidade de carne o rendimento em relação aopeso inteiro dos caranguejos de Carnaubeiras eBarreirinha foi de respectivamente 23,47% e20,97% representando os mais baixos rendimentos.

Na captura da espécie em Carnaubeiras eBarreirinha o “cambito” é o apetrecho utilizadopelos catadores, constituindo conflito em relaçãoàs normas estabelecidas pelo IBAMA, quepermite a técnica do braceamento, a qualpredomina no município de Icatu, Humberto deCampos, Primeira Cruz e Ilha de São Luís. De ummodo geral, o tipo de captura praticada pelospescadores exclui fêmeas ovígeras e espécimescom largura de carapaça inferior a 6,0cm, o quepode indicar a percepção da comunidade emrelação à conservação da espécie.

Para os catadores, o período de reprodução(“andada”) dos caranguejos acontece de janeiroa março; porém, a chuva, a fase lunar (minguante)e a maré são fatores importantes desta etapa dociclo do caranguejo.

O período da ecdise (mudança de casca)varia nas diversas localidades, sendo necessáriospelo menos quatro meses para a conclusão desteprocesso biológico. Nos municípios de Icatu,Humberto de Campos, Primeira Cruz e Ilha deSão Luís a ecdise ocorre de setembro a dezembroe em Araióses de setembro a janeiro.

As análises microbiológicas da carne docaranguejo “in natura” mostraram que novedas amostras do caranguejo-uçá apresentaramcontaminação pelas bactérias do grupocoliformes, tendo as espécies Enterobacteraerogenes e Escherichia coli como principaisrepresentantes. A Resolução n° 12 de 02/01/2001 da ANVISA, não apresenta padrão parao consumo desse animal “in natura”,entretanto não se recomenda o consumo desseanimal sem o devido cozimento, pois asbactérias que se apresentaram na carne sãopatogênicas.

Na ilha de São Luís a densidade média docaranguejo apresentou-se bastante reduzida,quando comparado com os outros locais deestudo, evidenciando os impactos que ocorremna área os quais afetam as populações docaranguejo-uçá.

A variação da estrutura e densidade dastocas, no período chuvoso e de estiagem,permaneceu insignificante. A comparação dasmédias da densidade indica que a estruturaquantitativa da população do caranguejo-uçá érelativamente constante, sendo necessários,porém a obtenção de dados em séries anuais parauma conclusão mais precisa.

Por fim é importante destacar que aspopulações de caranguejo-uçá, da bacia do rioPaciência se encontram ameaçadas quanto a suabioecologia e quanto à qualidade de sua carne“in natura”, pois o uso de técnicas pedratóriasestão dizimando este recurso.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Banco da Amazônia pelo apoio financeiro para o desenvolvimentodeste projeto de pesquisa.

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