as nulidades no processo penal e o papel do juiz

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AS NULIDADES NO PROCESSO PENAL E O PAPEL DO JUIZ

Autor: Rafael Andrade Linke[footnoteRef:1] [1: Apenas um rapaz latino-americano sem dinheiro no bolso. Servidor Pblico Municipal, estudante de Direito e concurseiro nas horas vagas.]

Orientador: Fbio Alexandre Sombrio[footnoteRef:2] [2: Advogado. Graduado em Direito pela UNIFOZ de Foz do Iguau/PR (1998). Mestrado em Direito pela Universidade Ibirapuera (2011). Professor de Direito Processual Penal na UNIFOZ, CESUFOZ e Professor na Escola da Magistratura do Paran.]

RESUMOAs nulidades so conceituadas pela doutrina como uma espcie de vcio ou como a sano que atinge um determinado ato processual, invalidando-o total ou parcialmente. A imperfeio do ato pode atingir um determinado grau de importncia dentro do processo, gerando mais ou menos prejuzo. A doutrina classifica os atos eivados de vcio como: ato inexistente; ato nulo e ato irregular. O juiz tem papel fundamental no decorrer do processo. ele quem d o impulso oficial e declara a nulidade dos atos viciados, analisando o grau de prejuzo. O magistrado deve agir respaldado na lei e nos princpios informadores, tais como o da causalidade e da instrumentalidade das formas.

Palavras chaves: Nulidades. Atos nulos. Atos inexistentes. Processo penal.

ABSTRACTNullities are conceptualized by doctrine as a form of vicious or sanction that impacts a determined procedural act, partially or totally voiding it. The imperfection of the act can reach a determined degree of importance within the procedure, creating more or less damages. The doctrine classifies the vicious acts as: inexistent, null or irregular acts. The judge has a fundamental role along the procedure. He's the one to officially begin and declare the nullity of the vicious acts, analyzing the damage degree. The magistrate must act supported by law and informative principles, as circumstances and form instrumentality.

Key words: Nullities. Nulls acts. Inexistents acts. Criminal procedure.

1. INTRODUO

Tema controverso perante a doutrina brasileira, as nulidades so capazes de render algumas pginas nos livros de Direito Processual Penal. Sendo assim, se faz necessrio uma abordagem cautelosa, analisando o entendimento doutrinrio e jurisprudencial, a fim de entender melhor a matria.A doutrina majoritria entende que a nulidade uma sano aplicada a determinado ato praticado em contrrio ao ordenamento legal, contudo, alguns doutrinadores entendem que a nulidade o prprio vcio que inquina o ato. Quanto classificao no h muitas divergncias, existindo assim, os atos nulos, inexistentes e irregulares.O ordenamento jurdico brasileiro adota um sistema misto em relao ao reconhecimento das nulidades dentro do processo. O texto da lei e o princpio da instrumentalidade das formas so aplicados juntamentena hora da declarao das nulidades.O juiz tem a funo de declarar quais sero os atos eivados de vcio, os quais, dependendo do grau de prejuzo sero totalmente ou parcialmente deletados da esfera jurdica que se procede. No nosso sistema o prejuzo para as partes o causador da sano de nulidade, sendo assim, o magistrado no poder declarar nulo um ato que no obstar o direito da parte.Em alguns casos o prejuzo presumido, uma vez que o ato praticado est em dissonncia com normas de interesse pblico. Trata-se aqui, de normas constitucionais garantidoras de direito fundamentais, tais como, do devido processo legal.

2. CONCEITO DE NULIDADE

A doutrina conceitua as nulidades como espcie de vcio ou como a sano que atinge um determinado ato processual. Conforme conceito de Guilherme de Souza Nucci a nulidade o vcio que contamina determinado ato processual, praticado sem observncia da forma prevista em lei, podendo levar sua inutilidade e consequente renovao.[footnoteRef:3] [3: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execuo Penal. 2. ed. ver. atual. eampl. So Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2006. p. 777.]

Segundo Fernando Capez nulidade um vcio processual decorrente da inobservncia de exigncias legais capaz de invalidar o processo no todo ou em parte.[footnoteRef:4] Herclito Mossin, por sua vez, define nulidade como sendo a falta de observncia das frmulas legais capaz de tornar sem eficcia um ou mais atos processuais, o processo ou a relao jurdico-processual.[footnoteRef:5] [4: CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19. ed. So Paulo. Saraiva. 2012. p. 693.] [5: MOSSIN, Herclito Antnio. Nulidades no Direito Processual Penal. 3. ed. Barueri/SP. Manole. 2005. p. 61.]

Para Nestor Tvora, nulidade a sano estabelecida judicialmente ante a inobservncia de norma processual que enseje prejuzo (real ou presumido) a direito das partes ou interessados no processo. [footnoteRef:6] Sendo assim, s haver sano se a deficincia do ato acarretar prejuzo. [6: TVORA, Nestor. ARAJO, Fbio Roque. Cdigo de Processo Penal para Concursos. 3. ed. Salvador. JusPODIVM, 2012. p. 671.]

No mesmo sentido, Paulo Rangel conceitua nulidade dizendo que: no o vcio que inquina o ato, mas, sim, a sano que se aplica ao ato viciado, em desconformidade com a lei. A nulidade a conseqncia da prtica do ato em desconformidade com a lei e no a desconformidade em si. [footnoteRef:7] [7: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 10. ed. Rio de Janeiro. Lumen Juris editora. 2005. p. 724]

A consequncia de um ato imperfeito a decretao de sua nulidade, para que assim possa ser sanado o prejuzo por ele causado. Nesse contexto, a nulidade uma qualidade, um adjetivo de determinado ato praticado em desacordo com o estabelecido legalmente.Tourinho Filho diz que a nulidade a consequncia da sano de ineficcia imposta em relao ao ato praticado com inobservncia dos parmetros normativos. a decretao de ineficcia do ato atpico, imperfeito, defeituoso. [footnoteRef:8] [8: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol3. 32. ed. rev. e atual. So Paulo. Saraiva. 2010. p. 136.]

Humberto Theodoro Jnior explica que entre o ordenamento jurdico e os atos processuais deve haver uma relao de conformidade, ou seja, se a declarao de vontade estiver em harmonia com a lei, ser vlida, caso contrrio, entrando em atrito com a lei, ser invlida. Surge assim, o conceito do referido doutrinador sobre nulidade, conforme se v: A nulidade , portanto, uma sano que incide sobre a declarao de vontade contrria a algum preceito do direito positivo. Essa sano privao de validade admite, porm, graus de intensidade. [footnoteRef:9] [9: THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. Vol. I. 47. ed. Rio de Janeiro. Forense. 2007. p. 325.]

Eugnio Pacelli explica no que consiste o ato praticado pelo juiz, conforme segue: A declarao de nulidade, seria, assim, a consequncia jurdica da prtica irregular de ato processual, seja pela no observncia da forma prescrita em lei, seja pelo desvio de finalidade surgido com sua prtica.[footnoteRef:10] [10: OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 15. ed. Rio de Janeiro. Lumen Juris. 2011. p. 811.]

Na viso de Jlio Fabbrini Mirabete existe um duplo conceito a respeito de nulidade, a saber:

H, assim, na nulidade, duplo significado, dois aspectos: um para indicar o motivo que torna o ato imperfeito, outro para exprimir a consequncia que deriva da imperfeio jurdica do ato ou sua invalidade jurdica. A nulidade, portanto, , sob um aspecto, vcio, sob outro, sano, podendo ser definida como a inobservncia de exigncias legais ou uma falha ou imperfeio jurdica que invalida ou pode invalidar o ato processual ou todo o processo.[footnoteRef:11] [11: MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 14. ed. So Paulo. Atlas. 2003. p. 591.]

Conforme extrao dos entendimentos supracitados, a doutrina majoritria entende que a nulidade a consequncia da sano aplicada ao ato processual praticado fora dos ditames legais estabelecidos e que visam dar ao processo, em seu inteiro teor, as formas adequadas para seu bom andamento, atendendo assim, princpios que asseguram s partes as garantias legais que tornam o processo um conjunto de atos emanados do Poder pblico, regido, principalmente pelos princpios da isonomia, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditrio.Entretanto, nem sempre o processo praticadoobedecendo integralmente os quesitos estabelecidos nas normas legais, sendo muitas vezes alcanado o resultado pretendido, sem resguardar os preceitos legais. Em matria de interesse pblico no h juzo de discricionariedade quanto decretao de nulidade, contudo, no que diz respeito matria de interesse exclusivo das partes, dever ser demonstrado o prejuzo causado pelo ato praticado de forma inadequada.

3. CLASSIFICAO DAS NULIDADES

A imperfeio do ato pode atingir um determinado grau de importncia dentro do processo, gerando mais ou menos prejuzo, afetando de forma mais ou menos gravosa o bom andamento da marcha processual. Dessa forma, a classificao da doutrina estabelece as formas como os atos que no observam os preceitos legais alcanam o status de ato imperfeito.A doutrina classifica-os como: ato inexistente; ato nulo e ato irregular.

3.1 ATO INEXISTENTE

O ato inexistente no produz efeitos jurdicos no processo. aquele que se afasta do modelo legal, impossibilitando que seja considerado como existente. Fisicamente ele existe, o que lhe falta o poder de produzir efeitos vlidos. Para Mirabete o ato inexistente aquele em que h falta de um elemento que o direito considera essencial, ou seja, em que ele existe de fato, mas, sem o elemento essencial, ele inexiste de jure. [footnoteRef:12] [12: MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. cit., p. 592.]

Tourinho Filho entende que a categoria da inexistncia do ato foge a toda previso normativa, sendo apenas fruto de elaborao doutrinria e jurisprudencial, e esclarece que:

Quando fala em inexistncia do ato, a doutrina quer referir-se no ausncia material do ato, mas quele ato que, embora tenha existncia material, totalmente desprovido de qualquer significado jurdico, equivalendo ao ato absolutamente nulo.[footnoteRef:13] [13: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Op. cit., p. 130 e 131.]

De fato, o ato inexistente no poder produzir efeitos, tendo em vista que lhe falta um pressuposto, uma frmula essencial para sua validade, como por exemplo, um juiz imparcial para dar o impulso oficial ao processo. Falta-lhe, portanto, um elemento jurdico essencial para sua validade. So tambm chamados pela doutrina de: no atos. Segue abaixo o conceito estabelecido por Ada Pellegrini, Antnio Scarance e Gomes Filho:So atos processuais inexistentes aqueles aos quais falta, de forma absoluta, algum dos elementos exigidos pela lei; neles, o vcio de tal gravidade que sequer seria possvel consider-los como atos processuais; so, na verdade, no-atos, em relao aos quais no se cogita de invalidao, pois a inexistncia constitui um problema que antecede a qualquer considerao sobre validade.[footnoteRef:14] [14: GRINOVER, Ada Pellegrini. FERNANDES, Antnio Scarance. GOMES FILHO, Antnio Magalhes. As nulidades no processo penal. 6. ed. rev., ampl. e atual., 4. tir. So Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 18.]

3.2 ATO NULO

O ato nulo produz efeitos at o momento que se diga o contrrio. o ato praticado com inobservncia do modelo legal e que causa prejuzo s partes. Entretanto, poder este ato ser considerado absolutamente ou relativamente nulo, a depender do seu alcance.

3.2.1 Nulidade absoluta

Ser considerado absolutamente nulo o ato, quando a inobservncia do modelo legal alcanar o processo, como, por exemplo, o interrogatrio do acusado sem presena de advogado na audincia. Contudo, para que seja considerado absolutamente nulo, necessrio o pronunciamento do magistrado reconhecendo-o nulo.Eugnio Pacelli destaca que a expresso absoluto j indicativa da diferena de grau quanto medida da preocupao destinada a especficas violaes s formas previstas em lei. E nem poderia ser diferente. [footnoteRef:15] [15: OLIVEIRA, Eugnio Pacelli de. Op. cit., p. 815.]

Conforme explica Norberto Avena: vcio que atinge normas de ordem pblica, como tais consideradas aquelas que tutelam garantias ou matrias tratadas direta ou indiretamente pela Constituio Federal.[footnoteRef:16] [16: AVENA, Norberto Cludio Pncaro. Processo Penal Esquematizado. 3. ed. So Paulo. Mtodo. 2011. p. 944.]

Hidejalma Muccio entende que: Quando a ndoa, o defeito, a mcula, em suma, a irregularidade tamanha a ponto de no ser tolerada, de no admitir um equivalente, de no poder ser convalidada, ela se diz absoluta. [footnoteRef:17] [17: MUCCIO, Hidejalma. Curso de Processo Penal. 1. ed. v. 3. Ja, SP. HM Editora. 2003. p. 436.]

Herclito Mossin destaca as caractersticas marcantes da nulidade absoluta, conforme segue:A nulidade absoluta no se cura, e insanvel. Uma vez verificada, gera como consequncia a imprestabilidade do ato processual ou mesmo do processo ou da relao jurdico-processual. A caracterstica marcante da nulidade absoluta e que pode ela ser alegada e declarada em qualquer fase do processo, mesmo quando a sentena penal condenatria tenha formalmente transitado em julgado, o que devera ser feito pelo mandamus of habeas corpus, cuja ao penal ter natureza constitutiva (art. 648, VI, do CPP). [footnoteRef:18] [18: MOSSIN, Herclito Antnio. Op. cit., p. 65.]

Guilherme Nucci explica que nulidades absolutas so aquelas que devem ser proclamadas pelo magistrado, de ofcio ou a requerimento de qualquer das partes, porque produtoras de ntidas infraes ao interesse pblico na produo do devido processo legal. [footnoteRef:19] [19: NUCCI, Guilherme de Souza. Op. cit., p. 777.]

Por ser de interesse pblico processual pode ser reconhecida de ofcio pelo juiz. No exige a demonstrao do prejuzo, sendo de decorrncia lgica da inobservncia da norma, ou seja, o prejuzo presumido. Ademais, no passvel de convalidao, isto , no poder ser aproveitado. Importante ressaltar que a nulidade absoluta no est sujeita precluso.Tourinho Filho explica que: o ato absolutamente nulo, enquanto no for reconhecido como tal, pelo Juiz, continua sendo, apenas, um ato atpico, um ato defeituoso. [footnoteRef:20] [20: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Op.cit. p. 135.]

3.2.2 Nulidade relativa

Quando o ato infringe formalidade estabelecida em norma jurdica infraconstitucional, em consonncia com o interesse das partes, a nulidade ser relativa.A arguio deve ser feita dentro do prazo estabelecido, sob pena de convalidao. A parte deve demonstrar o prejuzo no momento exato e oportuno, sob pena de precluso.Conforme explicao de Fernando Capez, o interesse, no entanto, muito mais da parte do que deordem pblica, e, por isso, a invalidao do ato fica condicionada demonstraodo efetivo prejuzo e arguio do vcio no momento processualoportuno. [footnoteRef:21] [21: CAPEZ, Fernando. Op. cit. p. 694.]

A doutrina majoritria entende que a nulidade relativa no poder ser decretada de ofcio pelo juiz, entretanto, Eugnio Pacelli tem entendimento diferente. Segue abaixo sua linha de raciocnio:

Embora reservada s partes a valorao dos efeitos decorrentes do vcio do ato, no h como negar que, ao menos em algumas hipteses, ser possvel o reconhecimento exofficio de nulidades relativas. O nosso Cdigo de Processo Penal, por exemplo, permite o reconhecimento, pelo juiz, de sua incompetncia relativa, o que implica a possibilidade de reconhecimento exofficio de nulidade relativa (art. 109, CPP).[footnoteRef:22] [22: OLIVEIRA, Eugnio Pacelli de. Op. cit. p. 815.]

O art. 565 do Cdigo processual penal destaca que: Nenhuma das partes poder argir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente formalidade cuja observncia s parte contrria interesse. Sendo assim, as condies para arguir as nulidades so: que a parte que pretende arguir no tenha dado causa nulidade; no tenha concorrido para a imperfeio do ato e por fim, tenha interesse legtimo na observncia rejeitada, respeitando o princpio do interesse.

3.3 ATO IRREGULAR

Fala-se em ato irregular quando, embora praticado com no observncia dos preceitos legais, ele atinge o fim para qual se destina, no resultando prejuzo s partes ou ao prprio processo.Segundo Mirabete, so vcios de forma que no afetam a validade dos atos; h violao da forma legal e no violao do fundo que a informa. um defeito na estrutura do ato sem reflexos na sua eficcia. [footnoteRef:23] [23: MIRABETE, Jlio Fabbrini. Op. cit. p. 592.]

Conforme explicam Alexandre Cebrian e VitorRios, esse desatendimento norma processual no tem o condo decausar a invalidade do ato e no influi no desenvolvimento do processo. [footnoteRef:24] [24: REIS, Alexandre Cebrian Arajo. GONALVES, Vitor Eduardo Rios. Processo Penal: procedimentos, nulidades e recursos. 13. ed. So Paulo. 2011 (Coleo sinopses jurdicas; v. 15 - t. I). p. 137.]

No Cdigo de Processo Civil encontra-se a norma que traduz a real ideia sobre os atos irregulares, vejamos o que diz o art. 244: Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominao de nulidade, o juiz considerar vlido o ato se, realizado de outro modo, Ihe alcanar a finalidade.O artigo supracitado tem relao direta com o princpio da instrumentalidade das formas, que prega o aproveitamento dos atos processuais. Nesse sentido, Humberto Theodoro Jnior explica que o ato s se considera nulo e sem efeito se, alm de inobservncia da forma legal, no tiver alcanado a sua finalidade. [footnoteRef:25] [25: THEODORO JUNIOR, Humberto. Op. cit. p. 327.]

4. O FENMENO DA ATIPICIDADE CONSTITUCIONAL

Assim como nos caso de descumprimento do modelo legal, segundo Ada Pellegrini, Antnio Scarance e Gomes Filho, a inobservncia da norma constitucional acarreta a desconformidade com o modelo imposto pela Lei maior, ocasionando o fenmeno da atipicidade constitucional. [footnoteRef:26] [26: GRINOVER, Ada Pellegrini. et al. Op. cit.p.21.]

Quando descumprida as regras do tipo imposto pela Constituio, a sano de invalidade h de ser buscada na prpria Carta magna ou no ordenamento jurdico como um todo. Em se tratando de desobedincia a princpio ou norma constitucional com relevncia processual, a sano vir da prpria Constituio ou do ordenamento processual.[footnoteRef:27] [27: Ibid., p. 21.]

Embora visem aparentemente o interesse da parte, as garantias constitucionais processuais primam o interesse pblico na conduo do processo, segundo o princpio do devido processo legal. Sendo assim, os atos praticados em desconformidade com normas ou princpio constitucional de garantia s poder ser considerado juridicamente inexistente ou nulo, devendo ser decretada a nulidade de ofcio pelo magistrado.[footnoteRef:28] [28: Ibid., p. 23.]

5. PRINCIPAIS PRINCPIOS INFORMADORES

O instituto das nulidades rege-se por alguns princpios essenciais, dentre os quais destacam-se:

5.1 PRINCPIO DO PREJUZO

Princpio informador do instituto das nulidades, com base nele, nenhum ato ser declarado nulo se da sua inobservncia no gerar prejuzo s partes. Conforme consta no art. 563 do Cdigo de processo penal: Nenhum ato ser declarado nulo, se da nulidade no resultar prejuzo para acusao ou para defesa. Trata-se da pas de nullitsansgrief,que consiste na falta de nulidade sem prejuzo.Entretanto, quando a inobservncia das normas atinge ato essencial, a nulidade absoluta, sendo assim, no h que se falar em pas de nullit sans grief. Quando o vcio atinge normas de interesse pblico, o prejuzo presumido, sendo a nulidade absoluta decretada pelo juiz.Fernando Capez entende que atualmente, a tendncia da jurisprudncia no se apegar a frmulas sacramentais, deixando, portanto, de decretar a eiva quando o ato acaba atingindo a sua finalidade, sem causargravame para as partes. [footnoteRef:29] [29: CAPEZ, Fernando. Op. cit.,p. 700.]

Nesse sentido, a smula 523 do STF, a saber: No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficincia s o anular se houver prova de prejuzo para o ru.Nos ensinamentos de Magalhes Noronha encontramos explicao de como a demonstrao deve ser feita, conforme segue:

A demonstrao do prejuzo faz-se pelo raciocnio ou pelos meios ordinrios de prova. A demonstrao por aquele dispensa estes, pois trata-se, ento, de fato notrio e evidente. Na maior parte das vezes ele demonstrado por essa forma, isto , pelo raciocnio. Quando assim no acontea, incumbe ao prejudicado a demonstrao do prejuzo, pelos meios usuais de prova: testemunhas, documentos, exames etc. [footnoteRef:30] [30: NORONHA, E. Magalhes. Curso de Direito Processual Penal. 26. ed. Atal. Por Adalberto Jos Q. T. de Camargo Aranha. So Paulo. Saraiva. 1998. p. 440/441.]

Guilherme de Souza Nucci entende que nos ltimos anos vem alterando-se a considerao de algumas falhas processuais como sendo absolutas ou relativas. No entendimento do doutrinador:

A tendncia, hoje, estreitar o campo das absolutas e alargar o das relativas. Embora na situao geradora de uma nulidade absoluta continue a ser presumido o prejuzo, sem admitir prova em contrrio, o que se vem fazendo transferir determinadas situaes processuais, antes tidas como de prejuzo ntido, para o campo dos atos processuais, cujo prejuzo fica sujeito comprovao. Dessa forma, o conceito de nulidade absoluta fica inalterado. Muda-se, no entanto, a classificao do ato processual, transformando-o de absolutamente viciado em relativamente falho.[footnoteRef:31] [31: NUCCI, Guilherme de Souza. Op. cit., p. 779.]

5.2 PRINCPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS

O art. 566 do CPP destaca que: No ser declarada a nulidade de ato processual que no houver infludo na apurao da verdade substancial ou na deciso da causa.Sendo assim, no se declara a nulidade de um ato que no influenciou na causa. O art. 572, caputc/c inciso II refora a ideia da convalidao dos atos irregulares que atingirem sua finalidade, vejamos: Art.572.As nulidades previstas no art.564, Ill,dee, segunda parte,geh, e IV, considerar-se-o sanadas:(...)II-se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim; (...)A respeito do tema, Fernando Capez destaca que:

Segundo esse princpio, a forma no pode ser considerada um fim em si mesma, ou um obstculo insupervel, pois o processo apenas um meio para se conseguir solucionar conflitos de interesse, e no um complexo de formalidades sacramentais e inflexveis.[footnoteRef:32] [32: CAPEZ, Fernando. Op. cit., p. 701.]

Nos Tribunais tambm h a consagrao do princpio da instrumentalidade das formas. Abaixo a posio do STF:

Ementa: PROCESSO PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS. TRFICO DE ENTORPECENTES. ALEGAO DE NULIDADE ADVINDA DA INTIMAO DO PACIENTE, COM 15 (QUINZE) DIAS DE ANTECEDNCIA, EM LUGAR DA CITAO, PARA A AUDINCIA DE INSTRUO E JULGAMENTO. EXERCCIO DA AMPLA DEFESA. PRINCPIO DAINSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS.AUSNCIA DE PREJUZO. ORDEM DENEGADA. 1. O processo penal rege-se pelo princpio da instrumentalidade das formas,do qual se extrai que asformas,ritos e procedimentos no encerram fins em si mesmos, mas meios de se garantir um processo justo e equnime, que confira efetividade aos postulados constitucionais da ampla defesa, do contraditrio e do devido processo legal.[...]5. Ordem Denegada.(Grifo nosso) [footnoteRef:33] [33: STF. 1 T., HC 111.472/MG. Rel. Min. Luiz Fux. J. 25.06.2013, DJ 14.08.2013.]

5.3 PRINCPIO DA CAUSALIDADE

Conforme o art. 573, 1 do Cdigo de processo penal, a nulidade de um ato, uma vez declarada, causar a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam conseqncia.Deriva da o princpio da causalidade. Segundo entendimento de Rogrio Sanchez Cunha:

a chamada nulidade derivada, pela qual o que nulo no pode gerar efeitos. Assim, por exemplo, a nulidade da citao, reconhecida pelo Tribunal, acarreta a nulidade de todos os demais atos subseqentes, devendo toda instruo probatria ser renovada. Tal princpio, porm, deve ser interpretado com uma observao relevante: somente se anulam os atos seguintes quando eles dependerem diretamente do ato anulado.[footnoteRef:34] [34: CUNHA, Rogrio Sanches et al. Processo Penal Doutrina e Prtica. Salvador/BA. Editora JusPODIVM. 2009. p. 189.]

5.4. PRINCPIO DA CONVALIDAO

Tal princpio se funda no art. 571 do CPP, que estabelece o momento adequado para que os atos imperfeitos, que geram nulidade relativa, sejam suscitados, sob pena de precluso e de considerarem-se sanados, conforme estabelecido no art. 572 do referido diploma.A doutrina de Paulo Rangel define assim a situao:

O princpio da convalidao deve ser visto em harmonia com os princpios da celeridade e da economia processual, pois o processo procedere, caminhar, avanar, ir adiante, e no faria sentido declarar nulo todo o processo se a parte que tem interesse na alegao de nulidade no o fez, ou ainda, se o ato, mesmo atpico, atingiu o seu fim ou, por ltimo, se a parte aceitou os efeitos do ato praticado em desconformidade com a lei. [footnoteRef:35] [35: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 15. ed. Rio de Janeiro. Lumen Juris Editora. 2008. p. 772.]

Igualmente, de suma importncia mencionar que o rol do art. 572, caput, do CPP taxativo, numerus clausus, pois so hipteses nicas. Assim sendo, as hipteses de nulidades no elencadas no art. 572 podero ser alegadas a qualquer momento, e conforme explica Magalhes Noronha: No h precluso para elas. Mesmo depois de transitada em julgado a sentena condenatria, o habeas corpus remdio legal para decretar sua nulidade ou a do respectivo processo. [footnoteRef:36] [36: NORONHA, E. Magalhes. Op. cit., p. 449.]

Ainda sobre o tema, Tourinho Filho destaca que se as nulidades absolutas no forem arguidas no momento oportuno fixado no art. 571 (por economia processual), nada impede que o seja em qualquer outro momento, salvo se ficarem preclusas as vias impugnativas e a deciso for absolutria. Entretanto, se condenatria, ainda ser possvel a arguio, seja por meio de reviso, seja pelo habeas corpus.[footnoteRef:37] [37: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Op. cit., p. 179.]

6. SISTEMA LEGAL ADOTADO NO BRASIL

A doutrina divergente em relao ao sistema adotado no ordenamento jurdico brasileiro para o reconhecimento dos atos viciados. Parte majoritria entende que agrega osistema da certeza legal e da instrumentalidade das formas.O sistema da certeza legal, segundo Paulo Rangel,

aquele em que o legislador, desconfiado do juiz, diz, expressamente, em quais casos haver a aplicao da sano de nulidade, no dando ao juiz discricionariedade para que possa perquirir se realmente o ato deva ser invalidado. Trata-se de um excessivo rigorismo formal. [footnoteRef:38] [38: RANGEL, Paulo. Op. cit., p. 773.]

Para Norberto Avena, nosso sistema o da instrumentalidade das formas, onde: o fim do ato deve prevalecer sobre a forma como ele praticado. o sistema adotado no direito brasileiro, [...]. Destarte, se o ato, ainda que desobediente forma legal, alcanar seu objetivo, poder ser validado.[footnoteRef:39] [39: AVENA, Norberto Cludio Pncaro. Op. cit., p. 942.]

No mesmo sentido, Paulo Rangel entende que o sistema adotado o da instrumentalidade das formas, contudo, admite que existem resqucios do sistema da certeza legal no Cdigo de Processo Penal. [footnoteRef:40] [40: RANGEL, Paulo. Op. cit., p. 774.]

Nestor Tvora um dos que inferem que o nosso sistema o misto. Assim dispe ele: Para ns, as hipteses passveis de nulidade no representam rol taxativo, mas exemplificativo. O CPP brasileiro adotou um sistema ecltico (com caractersticas dos sistemas legal e judicial/instrumental). [footnoteRef:41] [41: TVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 6. ed. Salvador/BA. Editora JusPODIVM. 2011. p. 1027.]

7. O PAPEL DO JUIZ FRENTE S NULIDADES

O juiz tem papel fundamental no decorrer do processo. ele quem d o impulso necessrio para o andamento da causa, no importando qual a matria. Como em todos os outros ramos do direito, o magistrado deve agir com imparcialidade, sendo que no mbito do processo penal, deve julgar a causa buscando a verdade real.Dentre vrias decises que o juiz toma no decorrer do processo est a questo dos atos viciados, sejam por irregularidade, nulidade etc. Sendo assim, se faz necessrio um profissional dotado de conhecimento suficiente para tomar as decises cabveis e aplicveis caso a caso. Observe-se que conforme art. 251 do nosso diploma processual penal: Ao juiz incumbir prover regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos, podendo, para tal fim, requisitar a fora pblica.Contudo, embora detenha o poder de deciso da causa, o juiz poder ser causador de atos viciados, irregulares ou nulos, tendo em vista que dele emanam vrias manifestaes dentro do processo. Ou ainda, nos casos em que for impedido ou suspeito e continuar decidindo no processo.Tourinho Filho destaca que:

Seja qual for a imperfeio do ato (nulidade absoluta, nulidade relativa ou simples irregularidade), deve o Juiz, dele tomando conhecimento, determinar as diligncias necessrias, visando a afastar do processo as impurezas, escoimando-o, limpando-o, sanando-o. dever de o magistrado prover regularidade do processo, di-lo o art. 251 do estatuto processual penal, e, desse modo, seja qual for airregularidade encontrada, cumpre-lhe proclam-la, tomando, de imediato, as providncias necessrias para a eliminao do ato defeituoso, quer determinando sua renovao, quer a retificao, nos termos do art. 573 do CPP, sem olvidar o princpio da causalidade (art. 573 1 e 2).[footnoteRef:42] [42: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Op. cit., p. 181.]

Como se v, o magistrado dever agir respaldado no Cdigo Processual e nos princpios informadores, j abordados, tais como o da causalidade, economia processual, instrumentalidade das formas, do prejuzo etc. Ao deparar-se com um ato processual eivado de vcio, dever o juiz analisar se esse ato gerou algum prejuzo s partes, lembrando que, tratando-se de norma garantidora prevista na Carta Magna, o prejuzo presumido, tendo em vista que, tais normas so de interesse pblico referente ao processo, devendo o juiz declarar de ofcio a nulidade absoluta, por outro lado, se uma das partes se sentir prejudicada, dever suscitar a nulidade, cabendo ao juiz declar-la.Em alguns casos especiais, a sanabilidade do ato essencial tem previso especial, como no caso do art. 568 do CPP, que trata da ilegitimidade do representante da parte, a qual poder ser a todo tempo sanada, mediante ratificao dos atos processuais. Entretanto, caso no seja sanado o ato por uma das formas apontadas, caber ao juiz determinar que o ato seja renovado, ou ento, retificado. [footnoteRef:43] [43: Ibid. p. 183.]

Outra questo a ser observada pelo magistrado a possvel contaminao de outros atos do processo por conta de nulidade declarada. Caber a ele estender a sano de nulidade a todos os atos dependentes do viciado (art. 573, 2 do CPP).No campo das nulidades que derivam do prprio julgador, conforme declarado no art. 564 do CPP, a incompetncia gera nulidade do processo. A incompetncia territorial gera nulidade relativa, sendo assim, os atos instrutrios (expedio de mandados de intimao, data para audincia etc.) podero ser aproveitados pelo juzo competente, o que no acontece com os atos decisrios, que sero anulados e devem ser refeitos. Assim dispe o art. 567 do CPP: A incompetncia do juzo anula somente os atos decisrios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.Uma interpretao gramatical do artigo supracitadonos leva a crer que em todos os casos de incompetncia do magistrado, podero os atos instrutrios ser aproveitados. Contudo, em face do princpio constitucional do juiz natural, elencado no art. 5 inciso LIII, que diz: ningum ser processado nem sentenciado seno pela autoridade competente, nem mesmo ser possvel o aproveitamento dos atos instrutrios do processo em se tratando de incompetncia absoluta. Nesse sentido, Guilherme de Souza Nucci, conforme segue:

[...] somente em casos de competncia relativa (territorial), pode-se aproveitar os atos instrutrios, anulando-se os decisrios. Noutras situaes, tratando-se de incompetncia absoluta, em razo da matria ou da prerrogativa de foro, fundamental renovar toda a instruo.[footnoteRef:44] [44: NUCCI, Guilherme de Souza. Op. cit., p. 785.]

Assim tambm o recente entendimento no STF. Vejamos:

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRFICO INTERNACIONAL DE DROGAS.RATIFICAODA DENNCIA E DE ATOS INSTRUTRIOSPELO JUZO COMPETENTE.NULIDADE DO PROCESSO. INEXISTNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRNCIA. MATRIAS NO LEVANTADAS NA CORTE A QUO. INDEVIDA SUPRESSO DE INSTNCIA. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA, E, NESSA PARTE, DENEGADA. I - No processo penal no h que se cogitar de nulidade, se o vcio alegado no causou nenhum prejuzo ao ru. II - Com a superveniente alterao de competncia dojuzo, possvel aratificaoda dennciapeloMinistrio Pblico e dos atos instrutriospelomagistradocompetente. III - Alegaes no apreciadas nas instncias inferiores impedem o seu conhecimento em sede originriapeloSupremo Tribunal Federal, sob pena de indevida supresso de instncia. IV - Ordem parcialmente conhecida, e nessa parte denegada. [footnoteRef:45](Grifo nosso) [45: STF.1 T., HC 98.373/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski. J. 06.04.2010, DJ 23.04.2010.]

Com entendimento diverso, Renato Brasileiro de Lima:

A questo, a nosso ver, est a merecer nova reflexo por parte dajurisprudncia a partir da insero do princpio da identidade fsica do juiz no processo penal - vide nova redao dada ao art. 399, 2a, do CPP, por fora da lei n. 11.719/2008 (o juiz, que presidiu a instruo dever proferir a sentena). Ora, se doravante o juiz que presidir a instruo deve proferir a sentena, como se pode, ento, admitir que a prova colhida perante juzo incompetente seja reaproveitada perante seu juzo, natural? A nosso juzo, portanto, uma vez reconhecida aincompetncia absoluta ou relativa, h de ser reconhecida a nulidade dos atos probatrios, renovando-se a instruo perante o juiz natural da causa, em fiel observncia ao princpio da identidade fsica do juiz.[footnoteRef:46] [46: LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. vol.I. Niteri/RJ.Impetus. 2011. p. 447.]

Paulo Rangel tambm entende que todos os atos do processo devem ser anulados. Segue a posio do doutrinador a respeito do art. 567 do CPP:

[...], a lei ordinria manda anular somente os atos decisrios, enquanto a Constituio diz que no se pode ser processado nem sentenciado seno pela autoridade competente. Pensamos que h flagrante contrariedade da lei ordinria com a Constituio, que se resolve pela revogao daquela.Desta forma, o art. 567, para ns, est totalmente revogado, no se admitindo mais, por exemplo, juiz incompetente receber a denncia e ficar a frente do processo com a consequncia de se anular somente os atos decisrios. Todos os atos do processo devem ser anulados desde o seu nascedouro. [footnoteRef:47] [47: RANGEL, Paulo. Op. cit., p. 775.]

Ante o exposto, possvel verificar que o juiz tem papel importante frente s possveis sanes de nulidade no processo, seja julgando ou ensejando-as. Entretanto, o art. 564, I do CPP, ainda destaca como formadores de nulidade a suspeio e o suborno do juiz. Nestor Tvora destaca que ao se fazer meno expresso suspeio ou suborno do juiz, deve-se interpretar o dispositivo de forma extensiva, de modo a abranger, tambm, o impedimento, vcio mais grave que a suspeio. [footnoteRef:48] [48: TVORA, Nestor. Op. cit., p. 675.]

Tourinho filho tambm explica o motivoda interpretao extensiva do art. 564, I, a saber: O art. 564 no se refere ao impedimento. Mas evidente que, havendo-o, a nulidade ser to intensa que os atos praticados so como se no existissem, uma vez que o impedimento (CPP, art. 252) priva o Juiz de sua funo jurisdicional.[footnoteRef:49] [49: TOURINHO FILHO, Fernando a Costa. Op. cit., p. 144.]

As causas de impedimento esto elencadas no art. 252 e as de suspeio no art. 254 do Cdigo processual penal. Se houver suspeio do juiz, cabe s partes argui-la, sob pena de aceitao do magistrado. Poder tambm, o prprio juiz, declarar-se suspeito, nos termos do art. 97 do CPP. Se julgada procedente a suspeio do juiz, os atos por ele praticados sero declarados nulos, devendo ser refeitos (art. 101 do CPP).O art. 564 fala ainda em nulidade nos casos de suborno do julgador. So os casos em que o magistrado recebe vantagem para julgar a causa conforme estabelecido por terceiros. Conforme explicao de Magalhes Noronha:

Suborno expresso que abrange a corrupo passiva (Cd. Penal, art. 317), e a prevaricao (art. 319 do Cd. Penal). A primeira o comrcio ignbil da funo [...]. Prevaricao a infidelidade ao dever de ofcio, funo exercida. o no cumprimento das obrigaes que lhe so inerentes, movido o agente por interesse ou sentimentos prprios.[footnoteRef:50] [50: NORONHA, E. Magalhes. Op. cit., p. 443.]

Destarte, ainda possvel incluir na lista citada pelo autor supramencionado, os crimes de corrupo ativa (art. 333 do CP) e concusso (art. 316 do CP).[footnoteRef:51] So hipteses em que no h que se falar em aproveitamento dos atos praticados pelo magistrado corrompido, tendo em vista que, restou-se fulminada a imparcialidade exigida. [51: CAPEZ, Fernando. Op. cit., p. 708.]

8. CONCLUSO

Dentre vrias formas de garantir a pureza e legalidade do processo, destaca-se a observncia na prtica dos atos que impulsionam a ao penal na busca da verdade dos fatos. Os princpios constitucionais no podem e no devem ser aniquilados por atos viciados que fogem regra do devido processo legal. Contudo, h de se observar que sem prejuzo no existe afronta a direitos e garantias, embora tal prejuzo seja presumido em relao s normas constitucionais, tendo em vista que, afetam preceitos de interesse pblico e garantidores de direitos fundamentais, e estes, so irrenunciveis. A adoo do sistema misto, que rene o sistema da certeza legal e o da instrumentalidade das formas, visa estabelecer um equilbrio entre o que diz a letra da lei e o interesse pblico. Sendo assim, se apreciada a irregularidade de um determinado ato processual, nem por isso sero invlidos seus efeitos, uma vez que alcanou o fim pretendido. Tutela-se, assim, o processo em si e o trabalho a ele dispensado pelo Estado. Trata-se, tambm, de economia processual.Coube doutrina apreciar o instituto da nulidade, conceituando-o e inserindo-o como uma consequncia, uma sano ao ato praticado em desconformidade com o modelo legal e que traz prejuzo s partes ou ao processo em si. Cabe ao juiz declarar a nulidade, assim como, incumbe a ele apreciar at que ponto os atos falsificados influenciaro nos demais que dele dependerem ou forem consequncia.Compete ao magistrado dar andamento ao processo, elucidando os pontos que possam interromper o bom andamento da causa. Cabe s partes, tambm, proceder de forma a no beneficiar-se da prpria malcia, provocando um prejuzo para assim aproveitar-se.Por todo o exposto possvel estabelecer alguns pontos relevantes em relao s nulidades, quais sejam: conforme entendimento majoritrio, nulidade a sano aplicada ao ato imperfeito; nenhuma nulidade ser declarada sem que haja prejuzo s partes ou ao prprio processo; em se tratando de normas constitucionais de interesse pblico e garantidoras de direitos fundamentais o prejuzo presumido; as nulidades relativas esto sujeitas precluso, o que no ocorre com as absolutas; o sistema adotado no nosso ordenamento jurdico o misto (sistema da certeza legal e da instrumentalidade das formas); no caso de incompetncia territorial (relativa) os atos instrutrios podero ser aproveitados pelo juzo competente, embora ainda haja discordncia doutrinria; a suspeio do magistrado deve ser argida pelas partes, sob pena de aceitao tcita, caso o prprio julgador no o faa.

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