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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Keila Fernanda Lafratta AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM CURITIBA 2011

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Page 1: AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM · Antes de falarmos sobre a hiperatividade, vamos tentar entender como ocorre o processo e o problema de aprendizagem

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Keila Fernanda Lafratta

AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

CURITIBA

2011

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AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

CURITIBA

2011

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Keila Fernanda Lafratta

AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia da Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de especialista.

Orientador: Laura Bianca Monti

CURITIBA

2011

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TERMO DE APROVAÇÃO

Keila Fernanda Lafratta

AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtençãoo do título de Especialista em Psicopedagogia no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, 24 de Setembro de 2011.

__________________________________

Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia

Universidade Tuiti do Paraná

Orientador: Laura Bianca Monti

Universidade Tuiuti do Paraná

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 5

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................. 7

2.1 DESENVOLVIMENTO NORMAL NA CRIANÇA ........................................ 7

2.2 ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL .................................... 9

2.3 APRENDIZAGEM E A HIPERATIVIDADE ................................................. 10

2.4 O DIAGNÓSTICO EM HIPERATIVIDADE ................................................. 16

2.5 CAUSAS DA HIPERATIVIDADE ............................................................... 19

2.6 A HIPERATIVIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR .................................... 23

2.7 PSICOPEDAGOGIA E HIPERATIVIDADE ................................................ 28

2.8 TRATAMENTO DA HIPERATIVIDADE ..................................................... 33

3 CONCLUSÃO ............................................................................................ 36

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................... 39

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RESUMO

Através de levantamento bibliográfico será identificado quais são os principais sintomas acarretados pela hiperatividade, bem como as dificuldades que as escolas enfrentam quando possuem em seu quadro crianças portadoras dessa patologia. Propomos informar de maneira clara e ampla o que é a hiperatividade, suas principais causas e quais as estratégias que os profissionais de educação podem adotar para minimizar o impacto do comportamento hiperativo na aprendizagem. Ressaltamos alguns aspectos do desenvolvimento normal da criança, bem como os estágios estudados por Jean Piaget para fundamentar este trabalho. Relatamos os problemas sofridos pela criança hiperativa na interação com a escola e, consequentemente, no convívio social. Com as intervenções psicopedagógicas, com conhecimento sobre a doença e compreensão dos professores, mostramos que é possível diminuir o impacto da hiperatividade no processo de aprender. O aluno com hiperatividade precisa de atenção por parte do docente e é importante que este esteja preparado para saber administrar as consequências do comportamento hiperativo. Quando isso não ocorre, a escola deve procurar ajuda de profissionais especializados em hiperatividade, tanto para realizar o diagnóstico como para desenvolver um trabalho psicopedagógico. Dessa forma existe a possibilidade de tornar a situação tolerável no ambiente escolar. Por fim, sugerimos algumas medidas pontuais que professores, ou qualquer profissional que trabalhe com crianças hiperativas, podem utilizar quando estão diantes dos desafios trazidos pela hiperatividade.

Palavras-chave: hiperatividade; dificuldade de aprendizagem; comportamento hiperativo; escola; psicopedagogia.

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1 INTRODUÇÃO

A hiperatividade é uma perturbação psicomotora e que tem a capacidade de

afetar o comportamento, a percepção e as aptidões escolares em crianças

detentoras de uma inteligência normal. A dificuldade de concentração é uma das

principais características desse distúrbio, portanto podemos avaliar como essa

“falha” irá repercutir nas atividades realizadas na escola. Apesar dessas pessoas

muitas vezes terem inteligência suficiente para compreender conteúdos, estes

passam desapercebidos, ou seja, não são retidos. Essa dualidade – inteligência /

desconcentração – geralmente tem um impacto negativo no comportamento da

criança, pois acarreta um conflito entre submeter-se a dificuldade tornando-se

dependente e retraída ou seguir para o comportamento oposto, isto é, rebeldia,

agressividade, entre outras coisas.

Este trabalho, através de uma pesquisa bibliográfica, mostra principalmente

como são as crianças portadoras da hiperatividade no contexto escolar e os

efeitos na dificuldade de aprendizagem. Percebe-se em geral que se associam

as dificuldades na escola e no relacionamento com outras crianças, pais e

profissionais de educação.

Escolhemos como meta trazer informações que facilitem o convívio do aluno

em processo de alfabetização com sua escola, perante um quadro de

hiperatividade, possibilitando um satisfatório relacionamento entre a criança e a

instituição de ensino, reduzindo dessa forma os problemas de aprendizagem e

de comportamento social do hiperativo.

A desatenção e a falta de concentração, bem como a agitação psicomotora

em crianças com hiperatividade, influencia na aprendizagem acarretando o baixo

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rendimento escolar, além das mesmas não conseguirem executar as atividades

que desejam e são vistas como distraídas, inquietas e desatentas. Segundo

Smith, “muitas crianças com dificuldades de aprendizagem também lutam com

comportamentos que complicam suas dificuldades na escola. A mais saliente

dessas é a hiperatividade, uma inquietação extrema que afeta 15 a 20% das

crianças com dificuldade de aprendizagem.” (2001, p. 15).

A criança mesmo sendo considerada inteligente muitas vezes não é aceita no

grupo, porque não consegue ficar quieta , levanta da carteira o tempo todo, anda

pela sala de aula, distrai os colegas, perturba os professores, causando a

indisciplina. Consequentemente conviver com uma criança hiperativa torna-se

bastante difícil, pois em decorrência de sua agitação ela consegue transformar a

rotina de todos aqueles que convivem em seu dia a dia.

Como a hiperatividade é um quadro bastante frequente na idade escolar,

pouco se sabe sobre suas causas, contudo temos conhecimento sobre suas

manifestações sintomáticas. Geralmente a criança que apresenta

comportamento hiperativo é vista como agitada e desatenta.

Os professores que têm alunos hiperativos precisam ter muita paciência e

disponibilidade e, principalmente, conhecimento sobre as características e

funcionamento da hiperatividade já que eles necessitam de tratamento

diferenciado, mais atenção e atividades bastante estimulantes para incentivar e

desenvolver a capacidade de atenção da criança valorizando, assim, seu

potencial.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 DESENVOLVIMENTO NORMAL NA CRIANÇA

Para falarmos sobre o impacto da hiperatividade no processo de

aprendizagem precisamos entender como ocorre o aprendizado e conhecer as

principais características que abrangem a questão do comportamento hiperativo.

Ao discutirmos sobre a influência da hiperatividade na incapacidade para

aprender, pensamos como o processo contrário ocorre, ou seja, o que é necessário

para uma criança ter sucesso no processo de aprendizagem. O desenvolvimento

normal desse indíviduo é um dos fatores fundamentais para esse sucesso. Ao

nascer o bebê responde primeiramente de uma forma involuntária ou por reflexo aos

estímulos do meio ambiente. Nos dois anos seguintes o crescimento do cérebro e as

experiências vivenciadas possibilitará a criança se mover sem o auxílio de seus pais,

isto é, com completa independência aumentando assim, seu repertório de

aprendizados. Essa criança aprenderá a correr, falar e pensar de maneira criativa.

Esse desenvolvimento deve acontecer numa sequência e obedecer determinadas

etapas. Algumas são mais difíceis que outras, e muitas crianças não conseguem

seguir adequadamente todas essas etapas. E pode ser nesses casos que a

dificuldade de aprendizagem se instalará.

As estapas do desenvolvimento tem diversas características próprias.

Algumas começam quando o embrião é formado e continua durante toda a vida e

este processo está associado intrinsicamente à maturidade do sistema nervoso

central. Consequentemente, o desenvolvimento intelectual ocorre com maior rapidez

quando o cérebro está crescendo, principalmente nos primeiros anos de vida.

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Quando se fala em desenvolvimento, a linguagem, melhor indicador da

aprendizagem futura, demonstra a capacidade que a criança apresentará de

expressar-se e receber ou decodificar as informações. De acordo com Batshaw, “a

linguagem receptiva envolve o entendimento do que é dito, enquanto que linguagem

expressiva compreende a comunicação com os outros através da fala ou usando

outros meios de comunicação.” (1990, p. 186).

Com o crescimento, os movimentos da criança apresentam-se mais

propositais. O desenvolvimento associa-se ao crescimento rápido e à mielinização

do sistema nervoso central, outro fator importante no processo de aprendizagem que

acontecerá futuramente, pois promove uma comunicação mais rápida entre o

cérebro e o restante do corpo. Caso a criança tenha algum problema nesse decurso,

poderá apresentar dificuldade para aprender.

Além das habilidades motoras e de linguagem, a criança desenvolverá a

capacidade de relacionar-se primeiramente com as pessoas mais próximas de sua

convivência e de diferenciar algumas de suas respostas emocionais. Essa

capacidade também possuí uma forte influência na aptidão para a aprendizagem.

Uma grande parte desse crescimento psicológico e social se mistura com as etapas

do crescimento físico, pois conforme o cérebro e o corpo amadurecem, a criança

desenvolve novas habilidades com as quais cuida dos problemas. A criança com

dificuldade de aprendizagem pode ter dificuldade com alguma ou todas as etapas do

desenvolvimento psicossocial. Enfim, segundo Batshaw “o desenvolvimento envolve

uma série de passos, que eventualmente capacita uma pessoa a raciocinar e

resolver problemas.” (1990, p. 191). A limitação da vida da criança está marcada à

sua competência individual para adaptar-se ao seu mundo.

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2.2 ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

O teórico que estudou e classificou de maneira bastante didática os estágios

pelos quais as crianças passam foi Jean Piaget. Apesar de alguns teóricos não

aceitarem à classificação de Piaget por não acreditarem que o desenvolvimento

ocorre em uma sequência, sua teoria possibilita entendermos a sequência do

desenvolvimento intelectual assim como a limitação que a criança possa apresentar

independente de sua causa. O processo foi dividido por Jean Piaget em quatro

fases: período sensório-motor, pré-operatório, operatório-concreto e operatório-

formal.

O estágio sensório-motor compreende do zero aos dois anos de idade e

caracteriza-se pelo início de comportamentos independentes, ou seja, a criança

realiza atividades para alcançar certos objetivos e começa a encontrar suas próprias

soluções para problemas concretos. Entretanto essas ações ocorrem mais por

tentativa e erro. Além disso, ela demonstra interesse nas coisas à sua volta e está

menos absorta em si própria. De acordo com Batshaw, podemos considerar esses

comportamentos como “as formas mais primitivas de inteligência.” (1990, p. 191).

O estágio pré-operatório abrange dos dois aos sete anos de idade. Sua

principal característica é o uso da linguagem. A criança usa símbolos para

representar objetos que não estão presentes, contudo segundo Batshaw “mesmo

com o uso da linguagem e da habilidade de pensar de forma mais abstrata, o

estágio pré-operacional caracteriza-se pela permanência de desenvolvimento em

estágio primitivo de inteligência.” (1990, p. 192).

O estágio operatório-concreto compreende dos sete aos onze anos de idade.

Nessa etapa a criança está mais apta a ordenar e classificar objetos e perceber o

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relacionamento entre os diferentes componentes, assim como deve apresentar

habilidade para resolver problemas matemáticos e ter capacidade para ler bem. De

acordo com Batshaw, nessa fase “as crianças ainda têm dificuldade para entender

problemas hipotéticos e, embora sejam capazes de entender o passado e o futuro,

em sua relação temporal, este entendimento ainda é bastante limitado.” (1990, p.

192).

O estágio operatório-formal, que abrange dos doze anos em diante, é

marcado por mudanças significativas. A criança desenvolve a habilidade para

planejar, sensibiliza-se com os sentimentos dos outros, consegue raciocinar

utilizando hipóteses e estabelece todas as soluções possíveis para um determinado

problema. Para Batshaw, “uma pessoa que não possuí habilidade para progredir

através de todos os estágios é limitada na sua capacidade de adaptação.” (1990, p.

193). Essa inabilidade pode ser causada por diversos fatores. Um deles é a

hiperatividade.

2.3 APRENDIZAGEM E A HIPERATIVIDADE

Antes de falarmos sobre a hiperatividade, vamos tentar entender como ocorre

o processo e o problema de aprendizagem. Para Fernández em ambos “estão

implicados os quatro níveis: organismo, corpo, inteligência e desejo.”(1990, p. 57).

Segundo a autora “não há aprendizagem que não esteja registrada no corpo, assim

como não há imagem enquanto o corpo não começa a inibir o movimento, e é o

registro dessa inibição o que possibilita separar o pensamento do momento em que

esse movimento vai tornar-se ativo, ficando o movimento como uma marca interior.”

(1990. p. 60). Pela dificuldade que a criança hiperativa apresenta na consciência do

próprio corpo, podemos pensar que existe uma falha nessa construção e,

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consequentemente, na capacidade que a mesma possuí em distinguir o pensamento

da ação. Quando pensamento e ação não estão coordenados dificilmente temos

êxito na aprendizagem e sem êxito muitas vezes não há motivação para tentar

novamente.

O outro nível citado pela autora é o organismo. Nesse caso é toda e qualquer

impossibilidade física e /ou orgânica que a criança apresenta e que a impeça de

aprender adequadamente.

Os últimos níveis, inteligência e desejo, estão intimamente ligados apesar da

distinção. De acordo com Fernández, “a inteligência tende a objetivar, a buscar

generalidades, a classificar, a ordenar, a procurar o que é semelhante, o comum, ao

contrário, o movimento do desejo é subjetivante, tende a individualização, à

diferenciação, ao surgimento do original de cada ser humano único em relação ao

outro.” (1990, p. 73). Para que exista aprendizagem é necessária a interação entre o

cognitivo e o desejo de aprender. Uma criança inteligente pode perder o interesse

em aprender, uma vez que os sintomas da hiperatividade influenciam negativamente

nas tarefas que são solicitadas a ela, diferentemente de uma outra criança com o

mesmo nível cognitivo que experimenta bons resultados. O prazer do aluno quando

consegue uma resposta, é o maior sinal de como a aprendizagem está se

estabelecendo.

Segundo Smith “o termo dificuldades de aprendizagem refere-se não a um

único distúrbio, mas a uma ampla gama de problemas que podem afetar qualquer

área do desempenho acadêmico.” (2001, p. 15). Nem sempre elas são detectadas

facilmente pois muitas crianças com problemas para aprender não possuem nível

cognitivo rebaixado, por exemplo. Outro fator que torna difícil comprovar a

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dificuldade de aprendizagem é que sua causa geralmente não é única. Para Smith,

“muitos aspectos diferentes podem prejudicar o funcionamento cerebral, e os

problemas psicológicos dessas crianças frequentemente são complicados, até certo

ponto, por seus ambientes doméstico e escolar.” (2001, p.15). Posteriormente

discutiremos especificamente sobre o ambiente escolar.

Independente das causas da dificuldade de aprendizagem, crianças que a

possuem tem o que Smith denominou de “baixo rendimento inesperado” (2001, p.

15), ou seja, em alguns momentos elas conseguem executar tarefas de acordo com

sua capacidade intelectual e simultaneamente podem paralisar caso sejam dadas

determinados tipos de atividades. Segundo Smith, “as deficiências que mais tendem

a causar problemas acadêmicos são aquelas que afetam a percepção visual, o

processamento da linguagem, as habilidades motoras finas e a capacidade para

focalizar a atenção.” (2001, p. 15). A última é umas das principais características do

comportamento hiperativo.

Existe muita polêmica a respeito da hiperatividade, isto é, suas causas e

tratamento. Porém, o que é certo e visível são as manifestações do comportamento

hiperativo. Estas envolvem a dificuldade que a criança tem em ficar sentada e

quieta, a fala muitas vezes é excessiva, presença de maneirismos desagradáveis,

discussões e conflitos com outras crianças, dificuldade em controlar as próprias

necessidades, impulsividade, coordenação motora/muscular deficitária (deixa cair as

coisas, quebra objetos facilmente), realiza muitas perguntas, entretanto não absorve

as respostas, entre outros comportamentos. Como foi citado anteriormente, muitos

desses comportamentos influenciarão diretamente no processo do aprender.

Segundo Oaklander, “com frequência a criança hiperativa tem sérias dificuldades de

aprendizagem, causadas por redução nas habilidades perceptivas – visuais,

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auditivas, e às vezes táteis. Suas dificuldades motoras provocam uma pobre

coordenação ocular-manual, afetam sua capacidade de escrever com facilidade e

clareza.” (1980, p. 248). Essas possíveis inabilidades podem ser verificadas ainda

nos primeiros estágios do desenvolvimento estudados por Jean Piaget, mas é no

período operatório-concreto que elas ficam mais evidentes pois coincidem com a

fase da alfabetização.

Apesar do foco dessa pesquisa ser na criança hiperativa, não são só elas que

podem apresentar comportamento hiperativo. Na maioria dos casos o transtorno é

manifestado na infância e, apesar de menos intensos, os sintomas continuam a

perturbar e a provocar problemas para muitos adolescentes e adultos.

Em adolescentes, problemas que envolvem o desempenho escolar, relações

sociais e afetivas e capacidade para seguir as regras e limites da sociedade,

persistem, intensificam-se ou são mais complexos no caso de adolescentes

considerados hiperativos. Para alguns estudiosos a passagem bem-sucedida pela

adolescência muitas vezes está associada à capacidade do adolescente de ser

bem-sucedido em alguma área de sua vida. De acordo com Goldstein, “isto

normalmente implica em sucesso nos estudos, sucesso social ou em uma atividade

extracurricular.” (1994, p. 135). Geralmente os adolescentes com comportamento

hiperativo possuem história de fracassos nessas áreas. Ele pode conseguir fazer

parte de uma atividade, como o time de futebol, porém apresentará dificuldade em

ficar no time, não por incapacidade, mas por não conseguir acompanhar as regras

ou até mesmo por indisciplina.

O autor também afirma que muitos adolescentes hiperativos apresentam

sintomas de depressão em consequência de seus contínuos fracassos e dificuldade

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para relacionarem-se. Por esse motivo muitas vezes são vistos como carentes de

confiança e com sentimentos de desamparo (GOLDSTEIN, 1994).

Por apresentarem significativa dificuldade em seguir adequadamente as

normas e os limites sociais, alguns jovens com hiperatividade evoluem para

problemas de delinquência sendo assim, sintomas primários como a desatenção e a

inquietação dão lugar a problemas como o comportamento de risco, problemas com

autoridade e a vulnerabilidade em relação ao consumo de substâncias químicas.

Para Goldstein “uma criança que sofre de hiperatividade além de outro distúrbio de

comportamento dissociado, tal como conduta ou oposição significativa, tem uma

grande probabilidade de experimentar problemas acadêmicos, sociais ou de

autoridade como adolescente.” (1994, p. 136).

A desatenção faz com que o adolescente com hiperatividade não tenha

capacidade para continuar a tarefa quando tenta resolver conflitos durante

discussões familiares, auxiliar com os combinados, finalizar trabalhos referentes aos

afazeres domésticos ou tarefas escolares e atender às expectativas dos pais. A

dificuldade de suportar a frustração e os problemas decorrentes da impulsividade

que alguns adolescentes hiperativos vivenciam acarretam mais discussões e

confrontos. A agitação pode ser mal identificada como desrespeito e a

desorganização vista como falta de esforço e cuidado. Por esses motivos que pais e

professores devem buscar a orientação de um profissional especializado.

No caso dos adultos hiperativos, ou seja, aqueles que foram diagnosticados

com o transtorno na infância, pesquisas revelam que essa população, quando na

fase adulta, sofrem com problemas emocionais, acadêmicos, anti sociais e de

emprego. Segundo Goldstein, “adultos com histórias de hiperatividade também

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parecem experimentar problemas de ansiedade, depressão e relacionamento.”

(1994, p. 140).

Nenhum tratamento médico e/ou com outros profissionais durante a infância

garante o sucesso na vida adulta. O melhor resultado nessa fase de vida para as

crianças hiperativas é quando a hiperatividade é mais amena, quando os indivíduos

portadores do transtorno são mais inteligentes, pois produzem um ajustamento

melhor na vida adulta e no local de trabalho, quando o comportamento dos pais é

adequado, isto é, compreendem a doença e quando existe um ambiente familiar

estável na infância. Todos esses fatores podem contribuir para resultado mais

satisfatórios na vida do adulto hiperativo.

Mencionamos resumidamente alguns sintomas do comportamento hiperativo

na criança, no adolescente e no adulto, mas o que é exatamente a hiperatividade?

Quais são suas principais causas? Como ela surge e quais são as implicações no

processo de aprendizagem?

De forma bastante simplista podemos conceituar a hiperatividade como uma

perturbação psicomotora. Esta perturbação pode ser persistente ou crônica, ou seja,

não existe cura. De acordo com Goldstein, “a hiperatividade pode ser o problema

mais persistente e comum na infância.” (1994, p. 19).

Falta de atenção, movimentos bruscos, muitas atividades, impulsividade e

dificuldade para lidar com as frustrações influenciam a integração da criança com

seus familiares, colegas de escola e professores em decorrência do estresse

incitado pelo comportamento instável e inesperado. Para Goldstein, “o

desenvolvimento da personalidade e o progresso na escola também são afetados de

forma negativa.” (1994, p. 20).

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Os comportamentos que a criança hiperativa apresenta na infância seriam

comuns nessa etapa de vida se não fossem tão intensos. Segundo Goldstein, “para

a maioria das crianças afetadas, a desatenção, a atividade excessiva ou o

comportamento emocional irrefletido e impulsivo são características do

temperamento.” (1994, p. 20). Porém, ainda podemos citar o comportamento

hiperativo como consequência de fatores hereditários ou um desequilíbrio da

química do cérebro ou como sendo efeito de ansiedade, frustração e/ou depressão.

As causas serão abordadas detalhadamente mais adiante.

2.4 O DIAGNÓSTICO EM HIPERATIVIDADE

O diagnóstico da hiperatividade não é fácil pois não existe nenhum

instrumento específico (teste, avaliação) que indique se uma criança é ou não

hiperativa. O diagnóstico se torna possível através da coleta de informações obtidas

principalmente, com os pais e os profissionais da escola. Testes, questionários

também são utilizados para subsidiar tais informações. Como foi apontado, todo

comportamento apresentado pela criança dependerá da intensidade, gravidade e

persistência que o mesmo ocorre durante o processo de crescimento.

De acordo com o DSM-IV, “a característica essencial do Transtorno de Déficit

de Atenção/Hiperatividade é um padrão persistente de desatenção e/ou

hiperatividade, mais frequente e severo do que aquele tipicamente observado em

indivíduos em nível equivalente de desenvolvimento.” (2000, p. 77). Os sintomas que

causam prejuízos devem ter surgido antes dos sete anos, além de estarem

presentes em pelo menos dois contextos (escola e casa, por exemplo). Ainda

segundo o DSM-IV, “deve haver claras evidências de interferência no funcionamento

social, acadêmico ou ocupacional apropriado em termos evolutivos.” (2000, p. 77).

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Para finalizar os critérios estabelecidos pelo DSM-IV no diagnóstico da

hiperatividade, “a perturbação não ocorre exclusivamente durante o curso de um

Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outro Transtorno

Psicótico e não é melhor explicada por um outro transtorno mental.” (2000, p. 77).

A maioria dos pais observa pela primeira vez o excesso de atividade motora

quando as crianças ainda estão engatinhando, coincidindo com o desenvolvimento

da área motora. Entretanto deve-se ter cautela ao fazer o diagnóstico de

hiperatividade em uma idade muito precoce. Normalmente a doença é diagnosticada

durante as primeiras séries, quando a adaptação à escola está comprometida. Na

maioria dos casos observados, o transtorno é relativamente estável durante o início

da adolescência. Na maioria dos indivíduos, os sintomas diminuem durante o final

da adolescência e idade adulta. Alguns adultos retem alguns dos sintomas e estes

podem causar prejuízo funcional. (DSM-IV, 2000).

Goldstein (1994) sugere um diagnóstico detalhado durante a infância e que

deve compreender oito tipos de informação: o histórico, a questão da inteligência, a

personalidade e o desempenho emocional, o rendimento escolar, a rede de

relacionamentos, a disciplina e o comportamento no ambiente familiar, o

comportamento em sala de aula e a avaliação médica.

O histórico envolve todas as informações referentes ao desenvolvimento da

criança, outros problemas que eventualmente a família tenha tido, as tentativas de

solução no enfrentamento das dificuldades e comportamentos atípicos que por

algum motivo chamaram a atenção dos pais nos primeiros anos de vida da criança.

No caso da inteligência, Goldstein afirma que “as crianças inteligentes são as

que apresentam a maior probabilidade de tirar proveito de intervenções cognitivas e

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podem ter a intuição correta a respeito do impacto que seu comportamento tem

sobre os outros colegas.” (1994, p. 41). E completa afirmando que “as crianças

menos inteligentes têm menos probabilidade de conseguir fazer isso.” (1994, p. 41).

Sendo assim, a possibilidade desse último grupo vivenciar frustrações é muito maior

podendo acarretar problemas de hiperatividade como consequência dessas

frustrações e não necessariamente por questões de temperamento.

Algumas crianças hiperativas percebem os comportamentos que possuem e

se sentem tristes e inseguras. Outras não têm a mesma consciência e ficam alheias

às situações desconfortáveis que experimentam. Por isso, Goldstein acredita que

“uma avaliação completa da hiperatividade precisa incluir dados sobre a

personalidade e sobre o funcionamento emocional atual.” (1994, p. 42). Para o autor

é importante “entender o nível de confiança das crianças, até que ponto as crianças

acreditam que elas estão satisfazendo as expectativas em relação a suas vidas,

como se sentem sobre si mesmas e sobre as pessoas de sua vida.” (1994, p. 42).

Enfim, é necessário avaliar o quanto compreendem as dificuldades que vivenciam.

O desempenho escolar é um indicador fundamental durante o diagnóstico

porque ele vai determinar quais as habilidades acadêmicas a criança possuí, e no

caso da criança com hiperatividade, a educação precisa ser direta e particular em

decorrência da dificuldade que ela tem para aprender.

A habilidade para relacionar-se, de acordo com Goldstein, é um “fator que vai

determinar o quanto a criança vai se sair bem ou mal em termos comportamentais

ou emocionais durante o decorrer da sua infância.” (1994, p. 43). Portanto,

comportamento de isolamento pode ser um indicador de que algo não está

funcional.

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A disciplina e o comportamento em casa está diretamente ligado às funções

materna e paterna, ou seja, a interação dos pais com a criança hiperativa é um

elemento que pode definir o nível de gravidade dos comportamentos apresentados

pela mesma. Nesse caso, é importante avaliar como os pais enxergam a situação e

quais as tentativas de soluções já adotadas pela família.

Observar o comportamento em sala de aula fornece informações valiosas a

respeito da criança hiperativa e é parte essencial do diagnóstico. A observação

possibilita acompanhar não só o rendimento escolar, mas a capacidade que o aluno

possuí em cumprir regras, respeitar a hierarquia e os colegas de sala. Segundo

Goldstein, “esta informação é sempre muito útil para se compreender como a

criança está enfrentando os problemas de hiperatividade.” (1994, p. 44). Ainda

segundo o autor, “quando a hiperatividade não é orientada de uma maneira eficaz

na sala de aula, algumas crianças isolam-se e começam a ficar mais desatentas e

outras adotam um comportamento típico de oposição e desafio.” (1994, p. 44).

Por fim, encerra-se o diagnóstico com a avaliação médica. O objetivo desta é

confirmar ou descartar qualquer fator clínico como causa do comportamento

hiperativo.

2.5 CAUSAS DA HIPERATIVIDADE

Para fundamentar o diagnóstico, analisemos as principais causas da

hiperatividade. Esta pode ocorrer em decorrência de traumas durante o parto,

distúrbios clínicos, distúrbios convulsivos, efeitos colaterais causados pelo uso de

alguns medicamentos, dieta alimentar, contaminação por chumbo, infecções de

ouvido, hereditariedade, lesões cerebrais e funcionamento cerebral disfuncional.

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Após muitos estudos chegou-se a conclusão que os problemas durante o

nascimento são mínimos em relação a hiperatividade, entretanto a gravidez continua

sendo um período crítico para o desenvolvimento do bebê, isto é, se durante esse

momento a saúde da gestante apresentar problemas clínicos, principalmente antes

do parto, a criança estará mais propensa a desenvolver problemas de

comportamento e aprendizado.

Os distúrbios clínicos estão associados a qualquer quadro clínico que a

criança possa apresentar e que irá influenciar em seu comportamento (exemplo:

infecção de garganta). Uma criança doente naturalmente fica mais desatenta e

distraída ou até mesmo mais agitada, porém isso não significa que ela é hiperativa.

De acordo com Goldstein, “poucas doenças apresentam a hiperatividade como

principal sintoma.” (1994, p. 53). Por esse motivo é considerável diferenciar o

comportamento da criança antes e após a enfermidade ter iniciado.

Nos distúrbios convulsivos o quadro mais comum é a epilepsia. Nesse quadro

a criança pode ter uma breve perda da consciência, mas que ocorre várias vezes ao

dia acarretando períodos de desatenção. Nesse caso a desatenção não deve ser

confundida com hiperatividade, e a epilepsia é considerada apenas como uma

possível causa. Para controlar os sintomas da epilepsia, muitas vezes são usadas

medicações que são eficazes para minimizar o quadro sintomático da doença,

entretanto essas mesmas medicações podem desenvolver sérios comportamentos

hiperativos, prejudicando o aprendizado.

Assim como os problemas durante o parto, estudos sobre a dieta alimentar

demonstraram não ter um efeito significativo sobre a hiperatividade, ou seja, alguns

regimes alimentares não provaram ser possível melhorar o comportamento

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hiperativo, entretanto, segundo Goldstein, “suspeita-se que muitas e distintas

substâncias da dieta possam causar ou piorar a hiperatividade e,

consequentemente, são muitas as discussões que defendem que uma ou outra

mudança na dieta produziria uma melhora considerável.” (1994, p. 56). As

substâncias citadas pelo autor são os corantes artificiais, os aditivos e os açucares

dietéticos.

O chumbo é um metal que é facilmente encontrado no ambiente. Ele está

presente nas roupas de crianças, em alguns doces, no solo e na água consumida

pela população. Recentemente os estudos sobre a hiperatividade focam não só

sobre a hereditariedade como fator determinante, mas também o ambiente. Por isso,

a intoxicação por chumbo vem sendo considerada como uma das causas da

hiperatividade. Estudos comprovaram uma ligação entre os níveis de chumbo no

sangue e sintomas de hiperatividade e impulsividade em crianças em idade escolar.

Essa substância desorganiza a atividade cerebral alterando o processo psicológico,

principalmente o controle cognitivo.

As infecções de ouvido assemelham-se aos distúrbios clínicos na relação que

tem com a hiperatividade, isto é, uma infecção de ouvido causa irritação, dor e febre

podendo alterar o comportamento da criança. Segundo Goldstein, “a perda da

audição, bem como problemas de fala e de linguagem são descritos como

consequências ocasionais.” (1994, p. 60). Sendo assim, não é possível concluir que

tais infecções são causas de comportamento hiperativo, contudo devem ser

observados.

De acordo com Goldstein, “uma criança hiperativa tem uma probabilidade

quatro vezes maior de possuir outros membros da família com o mesmo problema.”

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(1994, p. 60). Como foi citado no parágrafo anterior, além da hereditariedade, fatores

ambientais também influenciam na hiperatividade infantil, portanto os modelos

parentais podem ter um impacto crucial no comportamento da criança, mas não quer

dizer que pais hiperativos terão, necessariamente filhos com o mesmo problema.

Contudo, o fator genético deve ser sempre considerado.

No que diz respeito as lesões cerebrais, Goldstein afirma que “lesões em

qualquer parte do cérebro parecem ter algum efeito sobre a capacidade de

concentração e atenção.” (1994, p. 62). As lesões podem ocorrer por inúmeros

motivos sendo assim, exames médicos são importantes para descartar qualquer

causa orgânica evitando, dessa forma, exigir da criança comportamentos que

fisiologicamente ela não está apta a apresentar.

Por fim, a hiperatividade pode ser decorrente da disfuncionalidade do cérebro.

Nesse caso Goldstein defende a ideia de que o comportamento hiperativo “pode ser

compreendido como resultante de uma disfunção do centro de atenção do cérebro

que impede que a criança se concentre e controle o nível de atividade, as emoções

e o planejamento.” (1994, p. 66). Assim, o desempenho fica prejudicado.

Analisando as causas, percebemos que um dos grandes desafios da

hiperatividade tem relação com a instabilidade do comportamento, isto é, a criança

não se comporta da mesma forma o dia todo, todos os dias da semana. Suas

atitudes não dependem apenas do seu temperamento, mas podem sofrer influência

do ambiente em que vive ou ainda serem influenciadas pela forma como as pessoas

lidam com elas. Por esse motivo, Goldstein considera a hiperatividade como “um

distúrbio de interção.” (1994, p. 21). Para ele, “o número de dificuldades pelas quais

passará uma criança agitada é determinado, em parte, pela situação.” (1994, p. 21).

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É importante ressaltar que a criança hiperativa tem capacidade para prestar

atenção, planejar ou ficar sentada, portanto quando discutimos sobre hiperatividade

falamos de comportamentos que ocorrem não necessariamente pela inabilidade,

mas pela inconstância. Pensar dessa forma nos ajudará a criar estratégias que

reduzam o impacto negativo na aprendizagem (papel da psicopedagogia, por

exemplo).

Citamos que essa perturbação psicomotora pode surgir em qualquer um dos

estágios de desenvolvimento, contudo os profissionais que estão aptos a

diagnosticar a hiperatividade geralmente o fazem à partir dos cinco anos de idade.

De acordo com Goldstein, “muitas crianças mais jovens têm sintomas similiares que

podem ser indicadores precoces do problema.” (1994, p. 22). Por isso, ter

conhecimento sobre as características de cada estágio do desenvolvimento e

observar o comportamento da criança torna-se fundamental pois pode possibilitar

um trabalho de prevenção. Compreender a hiperatividade centrando-se em questões

específicas, e não na deficiência de algumas habilidades, pode prejudicar ao invés

de auxiliar o seu entendimento.

2.6 A HIPERATIVIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Na cultura escolar, na grande maioria das vezes, o que é considerado

adequado são aquelas crianças que se mantêm sentadas, quietas, que prestam

atenção na aula e que atendem às solicitações exigidas pela professora. A criança

com hiperatividade, muitas vezes inábil para atender essas solicitações, está

seriamente predisposta a ser estereotipada como o “aluno problema”. Pensemos no

impacto negativo na vida de uma criança que recebe esse conceito, além das

dificuldades decorrentes do comportamento hiperativo. Para Goldstein, a mesma

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“está comprometida de forma significativa na sua capacidade para ser bem sucedida

ao lidar com a realidade.” (1994, p. 25). Ainda, segundo Goldstein, “a desatenção e

distração, a superexcitação e atividade excessiva, a impulsividade e a dificuldade

com frustrações, parecem ter um impacto significativo na personalidade de uma

criança e no desenvolvimento do pensamento.” (1994, p. 26). Sendo assim, além de

apresentarem problemas na aprendizagem, estas crianças são sérias candidatas a

desenvolverem quadros de ansiedade e/ou depressão, problemas de

interrelacionamento e baixa auto estima. Dessa forma, quais os desafios que a

escola enfrenta e como administrar o comportamento hiperativo?

Acreditamos que o desafio maior é buscar o equilíbrio entre a estrutura e as

normas de uma educação organizada e as principais características das crianças

hiperativas. Para começar, a atenção do professor não deve estar voltada ao aluno

de forma negativa, ou seja, só por ele não conseguir atender ao que está sendo

pedido. Outra questão a ser considerada tem relação com a inteligência. Nem

sempre a criança apresenta baixo rendimento em decorrência de deficits em suas

aptidões intelectuais. As dificuldades podem ser reflexos da própria hiperatividade

pois para obter êxito em uma avaliação, além de ter conhecimento sobre o assunto,

a criança precisa estar apta para ouvir, seguir instruções, prestar atenção, entre

outras coisas. De acordo com Goldstein, “as crianças hiperativas exibem uma

variação normal de aptidões intelectuais, algumas crianças hiperativas são muito

brilhantes, a maioria está dentro dos limites médios e algumas, infelizmente, ficam

abaixo da média em suas aptidões intelectuais.” (1994, p. 106). Por isso é muito

importante que o professor saiba diferenciar entre desatenção e incapacidade de

aprender, além de incentivar o aperfeiçoamento das “aptidões básicas de atenção”,

como afirma Goldstein (1994, p. 108).

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Como já frisamos anteriormente, como o comportamento hiperativo tem como

principal característica a instabilidade, outro desafio dos profissionais da área da

educação é não interpretá-lo como desobediência. Quando isso acontece corre-se o

risco do professor coagir a criança e os resultados dessa pressão serão negativos,

pois além de não conseguir que o aluno execute a tarefa determinada, ambos se

frustrarão constantemente. As consequências da frustração variam de criança para

criança. Algumas mostram-se deprimidas e inibidas, outras podem demonstrar

agressividade e irritação. Conhecer as possíveis causas desses sentimentos e

sensações ajudará o professor a administrar mais adequadamente o comportamento

hiperativo.

Quando citamos a sala de aula, é preciso pensarmos não só no impacto da

hiperatividade para o docente como também devemos ter conhecimento de como se

dá a interação da criança hiperativa com os outros colegas de sala. Segundo

Goldstein, “estudos com crianças matriculadas nas escolas frequentemente

concluem que a criança hiperativa não é escolhida pelas outras crianças como a

melhor amiga, vizinho de carteira ou parceira nas atividades.” (1994, p. 109). Essa

situação aumenta a responsabilidade do profissional da educação pois, se não for

ministrada eficientemente, pode gerar interações negativas entre o professor e a

sala como um todo. O resultado para o aluno com hiperatividade, mais uma vez,

pode ser a frustração além do sentimento de rejeição. Por isso todo profissional que

trabalha direta ou indiretamente com uma criança hiperativa, precisa entender que a

mesma possuí valores e potenciais que podem ser estimulados e desenvolvidos, isto

é, podemos valorizar o aluno por aquilo que é, não por aquilo que consegue

produzir. De acordo com Smith, “os cuidados mais preciosos estão em ensinar as

crianças a fazerem o máximo com as capacidades que têm, encorajando-as a

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acreditar que podem superar os obstáculos, ajudando-as a estabelecer objetivos

realistas e encorajando o orgulho.” (2001, p. 17).

Diante de um quadro de hiperatividade, um dos principais questionamentos é

o que fazer frente às situações daí decorrentes, principalmente quando se trata de

crianças em processo de alfabetização.

Antes de abordarmos as contribuições da psicopedagogia pensemos no

aspecto pedagógico, pois devemos considerar nos quadros de hiperatividade o

desenvolvimento afetivo da criança e sua interação com o ambiente. Nesse caso, as

ações pedagógicas devem ser orientadas, segundo Negrine “numa organização

escolar adequada, por um trabalho adaptado às possibilidades de aprendizado da

criança, sem compará-la com as demais.” (1987, p. 143). O autor destaca dois

aspectos pedagógicos que ajudam a criança hiperativa a adaptar-se ao meio e a

adquirir a capacidade de controle dos próprios movimentos. A primeira delas

favorece o desenvolvimento socioafetivo e a segunda contribui no controle da

inibição voluntária (NEGRINE, 1987).

Em relação ao primeiro aspecto, a intervenção pedagógica com crianças que

possuem comportamento hiperativo deve ter como objetivo a elevação da

autoimagem e da autoestima pois, como já foi citado, nem sempre essas crianças

são bem aceitas no grupo por suas atitudes inesperadas. De acordo com Negrine, “a

tendência dos professores, quando se lhes deparam crianças com estes

comportamentos, é utilizar a metodologia da coação, colocando-as em situação de

constrangimento frente às demais, sempre que tomam atitudes que contrariam o que

lhes é determinado.” (1987, p. 143).

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Outro comportamento constante na escola é a ação pedagógica punitiva, ou

seja, os alunos são submetidos a punições contínuas por não atenderem as

solicitações do professor (NEGRINE, 1987). Estas ações não resolvem o problema

da hiperatividade e podem, até mesmo, agravá-lo. Ao contrário das atitudes

punitivas, o profissional de educação deve reforçar os sucessos apresentados pela

criança hiperativa frente às tarefas solicitadas, mesmo que estes sejam mínimos.

Negrine afirma que “posturas estimuladoras valorizam a elevação da autoestima e

da autoimagem da criança, aumentando desta forma sua disponibilidade para

responderem às tarefas propostas pelo professor.” (1987, p. 144). Além disso, o

autor defende o contato corporal, isto é, o toque como forma de possibilitar maior

proximidade afetiva e, consequentemente, facilitar a ligação da criança com o meio.

Para ele, “os resultados determinados por esta ação pedagógica são distintos do

resultado de uma equação matemática, isto é, por meio do contato corporal logo a

criança passará a evidenciar melhoria de comportamento. O toque não deve ser

uma ação mecânica, deve ser realizado com afeto, com despreendimento, com

saber e com segurança, de tal forma que a busca constante de alternativas para

equacionar os problemas de educação norteie a conduta de todo o educador.”

(1987, p. 144). A afetividade pode ser um pré requesito à aprendizagem seja na área

cognitiva, psicomotora ou afetiva.

Colocar a criança que apresenta comportamento hiperativo em situações de

liderança pode minimizar a intensidade dos sintomas e o professor também deve

trabalhar para estabelecer limites claros e quando estes forem transgredidos, é

importante adotar uma posição firme em relação ao que ficou estabelecido. Esta é

uma posição fundamental na ação docente.

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Quanto ao segundo aspecto pedagógico, Negrine relata que “a criança

hiperativa é atingida pelos estímulos externos e se torna incapaz de inibir sua

necessidade de dispersão, fazendo com que sua capacidade de concentração fique

alterada, por isso estas crianças apresentam dificuldades no aprendizado.” (1987, p.

145). Diante disso, o autor sugere atividades que possibilitam melhorar o nível de

abstração e concentração da criança através de exercícios que diminuam as

tensões internas e controlem a excitabilidade. Além disso, o profissional de

educação pode realizar atividades que proporcionem o desenvolvimento das

percepções táteis, visuais, auditivas e cinestésicas (NEGRINE, 1987).

Enfim, trabalhar com objetivos que buscam mudanças de comportamentos e

interesses geralmente não são alcançados em um curto espaço de tempo. Em

qualquer circunstância a metodologia adotada deve ser adequada aos objetivos. O

professor precisa ter paciência, conhecimento e capacidade de identificar os

problemas de cada aluno, principalmente aquele que apresenta comportamento

hiperativo. Em qualquer um dos casos, a psicopedagogia pode ser uma importante

fonte de recursos.

2.7 PSICOPEDAGOGIA E HIPERATIVIDADE

Uma das funções da psicopedagogia é cuidar do aluno durante o seu

processo de aprendizagem considerando sempre as questões objetivas e subjetivas

que envolvem a criança. Os aspectos sociais, afetivos e cognitivos também devem

ser de conhecimento do psicopedagogo, ou seja, para o profissional dessa área não

interessa apenas o desempenho escolar desse aluno, mas todas as relações de

aprendizagem que o mesmo estabelece.

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Ao constatarmos que uma criança é hiperativa, não é o bastante conhecer a

patologia, mas entender como essa criança reage diante dos sintomas, qual o

significado da doença para a família, como a instituição de ensino compreende e

acolhe os comportamentos apresentados por ela e se a família e a escola estão

comprometidas no combate das queixas.

O propósito da psicopedagogia é auxiliar no ajustamento da realidade da

criança à sua capacidade de aprendizagem, favorecendo uma ponte entre ela e o

conhecimento. Isto implica em avaliar como a criança aprende, o que ela não

aprende e qual o seu prazer em aprender. Segundo Fernández, “entre ensinante e o

aprendente abre-se um campo de diferenças onde se situa o prazer de aprender. O

ensinante entrega algo, mas para poder apropriar-se daquilo que o aprendente

necessita inventá-lo de novo. É uma experiência de alegria, que facilita ou perturba,

conforme se posiciona o ensinante.” (2001, p. 29).

Sendo assim, a intervenção psicopedagógica é uma ferramenta que está à

disposição dos professores para auxiliar nos casos de hiperatividade e,

consequentemente, na questão do fracasso escolar. Para Fernández, “uma vez

gerado o fracasso e conforme o tempo de sua permanência, o psicopedagogo

deverá também intervir, ajudando através de indicações adequadas como

assessoramento à escola, mudança de escola, orientação a uma ajuda extraescolar

mais pautada e a um espaço de aprendizagem extraescolar mais expressivo.” (1990,

p. 81). Ainda sobre o fracasso escolar, a autora afirma que quando este “provém de

causas ligadas à estrutura individual e familiar da criança, vai ser requerida uma

intervenção psicopedagógica especializada: grupo de tratamento psicopedagógico à

criança, grupo de orientação paralelo de mães, tratamento individual

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psicopedagógico, oficina de trabalho, recreação e expressão com objetivos

terapêuticos e entrevistas familiares psicopedagógicas.” (1990, p. 82).

É importante avaliar quais são as queixas da escola quando esta procura um

psicopedagogo. Os profissionais podem estar esgotados e precisam de ajuda, ou

porque precisam de uma avaliação psicopedagógica, ou ainda, porque a psicóloga

que acompanha o aluno precisa de um parecer psicopedagógico para delinear uma

estratégia de abordagem junto a escola, ou ainda porque o médico solicitou tal

avaliação. Para cada demanda temos uma necessidade específica, o que implica

mais ou menos o comprometimento da criança e seu desenvolvimento. É comum os

professores terem dúvidas entre um quadro de hiperatividade e o perfil de um aluno

lento, agitado ou indisciplinado. É difícil para eles entenderem que ao mesmo tempo

que são crianças que não param ou não apresentam bom rendimento acadêmico,

contudo sabem todas as regras de um jogo de vídeo game. Nesses casos, a

avaliação psicopedagógica tem o objetivo de reorganizar a vida escolar e familiar da

criança que possuí comportamento hiperativo.

Uma das contribuições da psicopedagogia para o trabalho com crianças

hiperativas são as atividades lúdicas. Estas podem ser utilizadas pelos profissionais

da educação pois facilitam a aprendizagem, consideram determinados interesses e

necessidades sociais já que auxiliam a socialização e a colaboração entre os alunos.

A escola deve possibilitar situações significativas de aprendizagem, oferecendo

atividades desafiadoras que proporcionem a construção de conhecimentos, além de

conceder oportunidades à criança hiperativa de ser mais criativa, participativa e ativa

em seu processo de aprender. Dessa forma, ela terá mais iniciativa pessoal e

autonomia e poderá alcançar atitudes de respeito mútuo em seus relacionamentos

interpessoais.

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Para tudo isso ocorrer torna-se necessário que o professor prepare aulas

interessantes e variadas e que explorem diversas habilidades nos alunos,

favorecendo benefícios significativos principalmente na criança hiperativa. De acordo

com Barros, “no que se refere ao lúdico, sabe-se que o comportamento da criança

hiperativa, em relação às crianças normais, se mostra muito deficitário devido à

grande dificuldade de atenção, concentração e impulsividade causada pelo distúrbio,

portanto ao utilizar os jogos como estratégias pedagógicas deve levar em

considerações características da criança com hiperatividade, bem como as

condições sob as quais deverá realizar as atividades, objetivando auxiliar o aluno a

desenvolver habilidades necessárias para um desempenho social, emocional e

cognitivo.” (2002, p. 56). Para o autor “a hiperatividade dificulta o desenvolvimento

de um comportamento social adequado em uma criança hiperativa e através dos

jogos ela pode aprimorar seu senso de respeito às normas grupais e sociais.” (2002,

p. 56).

A atividade lúdica é um instrumento criativo, agradável e interativo que

ajudará o professor a diminuir os problemas de desatenção e de comportamento

social nas crianças hiperativas, melhorando, dessa forma, a aprendizagem. Através

da brincadeira a criança vivencia diferentes situações e percebe o mundo exterior e,

ainda, relaciona-se com outras crianças. Segundo Vygotsky, “a aprendizagem é um

processo social e é possibilitada através das áreas de desenvolvimento proximal,

isto é, da distância entre a zona de desenvolvimento real, que se costuma

determinar através das soluções independentes de problemas, e o nível de

desenvolvimento potencial, ou seja, aquilo que a criança ainda não sabe, mas que

pode aprender.” (2004, p. 72). Esse conceito de Vygotsky demonstra a capacidade

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que uma criança tem em realizar atividades no futuro que, anteriormente, dependiam

da ajuda de um adulto.

É fundamental o docente estimular continuamente a atenção das crianças

com hiperatividade, para que a mesma não se perca a qualquer novo estímulo do

ambiente. Possibilitando que a criança fixe a atenção em uma única atividade por

um tempo significativo, a mesma terá maior chance de aproveitar ao máximo essa

experimentação. Quanto maior a vivência da criança hiperativa com as atividades

propostas, maiores serão os ganhos que ela terá no que diz respeito à sua

motivação para aprender. Enfim, o ato de brincar é extremamente importante no

desenvolvimento e aprendizado da criança.

Outra contribuição da psicopedagogia no trabalho com crianças hiperativas é

assessorar em questões que envolvem todo o funcionamento da instituição de

ensino. Por exemplo, uma sala de aula apropriada para crianças com hiperatividade

deve ser organizada e estruturada, por isso o professor deve conhecer as principais

características desse quadro. Um programa de reforço também pode fazer parte do

trabalho de classe e a avaliação deve ser frequente e imediata, pois possibilita que

novas estratégias sejam adotadas caso as atuais não estejam tendo efeito positivo

sobre o aprendizado. Sugere-se que pequenos incidentes sejam ignorados

diminuindo o risco de estereotipias. O material didático deve ser adequado às

habilidade do aluno e devem ser ensinadas formas que facilitem a autocorreção e

que melhorem o comportamento nas tarefas solicitadas.

As atividades devem variar, porém serem interessantes para a criança, os

horários de transição, bem como o recreio devem ser supervisionados. Pais e

profissionais da escola ligados à criança hiperativa devem estabelecer uma

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comunicação contínua e os professores devem prestar atenção à qualidade do

reforço negativo do próprio comportamento. Além disso, o professor deve criar

canais para que a criança com hiperatividade adquira novas amizades pois os

amigos são indispensáveis para o desenvolvimento da criança. Como foi dito

anteriormente, a instabilidade comportamental, a ansiedade e a falta de

concentração em algumas crianças hiperativas, fazem com que outras crianças se

afastem delas achando-as inconvenientes.

Ainda podemos sugerir algumas medidas pontuais que podem ser adotadas

pelos profissionais da educação quando se deparam com uma criança hiperativa em

sua sala de aula e que também são trabalhadas pela psicopedagogia: regras

claramente definidas, colocar a criança perto de colegas que não irão provocá-la ou

perto da mesa do professor, elogiar, ser afetuoso e acolhedor, delegar

responsabilidades para que a criança se sinta valorizada, iniciar com tarefas simples

e aumentar o grau de dificuldade gradativamente, não causar qualquer

constrangimento para a criança, trabalhar com grupos pequenos, incentivar a

socialização entre a criança hiperativa e seus colegas e recompensar os esforços.

2.8 TRATAMENTO DA HIPERATIVIDADE

De acordo com Rodhe “as intervenções precoces podem representar um

grande passo para minimizar o impacto negativo que a hiperatividade traz à vida da

criança, dos pais e dos seus professores.” (1999, p. 63). Além da abordagem

psicopedagógica, é importante citar que o comportamento hiperativo precisa de

intervenção multidisciplinar, ou seja, um conjunto de profissionais aptos a atender

esse tipo de transtorno. O tratamento medicamentoso seria uma dessas

intervenções.

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Muitos estudos revelaram que mais de 70% das crianças e adolescentes com

hiperatividade demonstraram melhoras significativas dos sintomas de desatenção

e/ou de impulsividade na escola com o uso correto de remédios. Para saber se a

medicação terá o efeito desejado não há outro jeito a não ser testando-a, isto é,

iniciar o uso e observar a resposta da criança. Nem todas as pessoas portadoras do

transtorno necessitam de medicação. Nos quadros considerados leves, abordagens

como as citadas anteriormente podem alcançar efeitos satisfatórios. Porém, na

maioria dos casos os prejuízos decorrentes dos sintomas são grandes e o uso do

remédio é indispensável.

O metilfenidato, conhecido como ritalina, e os antidepressivos tricíclicos são

as medicações mais utilizadas nos quadros de hiperatividade. Ambas são

medicações consideradas estimulantes pois, segundo Rodhe, “estimulam a função

das áreas cerebrais responsáveis pelo comportamento inibitório e por isso tendem a

melhorar o freio inibitório.” (1999, p. 67). Esses remédios aumentam a

disponibilidade de neurotransmissores que parecem estar deficitários nessas áreas.

Infelizmente algumas crianças não apresentam melhora com o uso de

medicações. Nesses casos, a melhor alternativa é suspendê-las. Para aquelas que

demonstram resultados satisfatórios, após um ano é indicado que a dosagem seja

diminuída gradativamente para avaliar o comportamento da criança.

Durante a avaliação médica a criança hiperativa pode ser comportar de forma

quieta e educada. Sabendo o que é esperado, pode demonstrar ser uma criança

tranquila. Sendo assim, é importante que os pais estejam preparados para

descrever, de forma precisa e objetiva, o comportamento do seu filho em casa e nas

atividades sociais. Se a criança está encontrando dificuldade na escola, o

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profissional de educação pode conversar com o médico ou enviar-lhe um relatório

por escrito. Pode ser preciso várias consultas antes que o comportamento hiperativo

torne-se aparente, porém um especialista em crianças, geralmente, pode realizar um

diagnóstico preciso.

Ao tratar da criança hiperativa, o objetivo é ajudá-la a fazer o melhor possível,

em casa, na escola, e com os amigos. A criança com hiperatividade luta com todas

as forças para superar uma deficiência do sistema nervoso. Por isso, a família não

deve se sentir envergonhada ou culpada quando o filho não se comporta de maneira

adequada e esperada.

É preciso muita paciência para amar e apoiar a criança portadora de

hiperatividade em todos os desafios e frustrações inerentes à doença. Os pais da

criança hiperativa estão sempre preocupados e atentos. Consequentemente é fácil

sentirem-se cansados, abatidos e frustrados algumas vezes. É de importância vital

para esses pais serem bons consigo mesmos, descansar quando apropriado, além

de buscar e aceitar o apoio para eles e para o filho.

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3 CONCLUSÃO

Com a elaboração desse trabalho tivemos a oportunidade de verificar o

quanto a hiperatividade é um assunto instigante. A escolha do tema ocorreu em

função de lidarmos frequentemente com muitas crianças agitadas ou mesmo sem

limites, por isso a importância de conhecermos a doença para sabermos qual a

melhor forma de conviver com crianças ditas hiperativas e, ainda, ter a possibilidade

de avaliar se o mal comportamento é simplesmente falta de limites ou se trata

realmente do comportamento hiperativo.

A cada nova pesquisa percebíamos a enorme fonte de informações que

alcançávamos e tomávamos conhecimento de como agir com uma criança

hiperativa. Existem vários estudos publicados sobre a hiperatividade e o impacto

desse tipo de perturbação psicomotora no processo de aprendizagem. Alguns

autores concordam que o comportamento hiperativo possuí manifestações no

campo neurológico, comportamental e escolar. No aspecto neurológico, afeta as

áreas da coordenação motora, atenção e função cognitiva. Quanto ao

comportamento, influencia no controle dos impulsos, nas relações inter pessoais e

na emoções. O problema escolar acaba sendo uma combinação, em proporções

variáveis, das dificuldades citadas acima.

Verificamos que a hiperatividade é um distúrbio e deve ser tratado. Ainda não

existe cura, porém com o tratamento adequado existe grande chance de melhorar os

sintomas. Nos casos mais leves, o auxílio de uma terapia, como o acompanhamento

psicopedagógico, com a criança hiperativa e com a família muitas vezes já ajuda a

amenizar os sintomas. Em casos mais graves, geralmente necessita-se de uma

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intervenção multidisciplinar, isto é, pais, médicos, terapeutas e profissionais da

educação.

Segundo Schain (1978), a “hiperatividade foi definida, num trabalho de âmbito

nacional especificamente organizado, como um estado descritivo de crianças com

inteligência geral quase média, média ou acima da média, com certas incapacidades

de aprendizagem e/ou de comportamento, variando de discretas a acentuadas,

associadas a desvios de função do sistema nervoso central. Estes desvios podem

se manifestar através de combinações variadas de comprometimento da percepção,

conceituação, linguagem, memória e controle de atenção, de impulso e de função

motora”.

O papel do professor é fundamental para ajudar no diagnóstico da

hiperatividade, mesmo porque o comportamento hiperativo normalmente fica

evidente no período escolar, ou seja, quando é preciso aumentar o nível de atenção

e concentração para aprender. Sendo assim é extremamente importante os

profissionais da educação estarem bem orientados e obterem conhecimentos sobre

a hiperatividade para poderem diferenciar entre uma criança sem limites de uma

hiperativa.

A criança hiperativa precisa ter na escola um acompanhamento diferente, pois

não consegue controlar seus instintos, perturbando a sala de aula, a rotina dos

colegas e dos seus professores. Torna-se necessário implantar uma ação didática

pedagógica voltada para este aluno hiperativo com o objetivo de estimular sua

autoestima, considerando a sua falta de concentração, além de criar atividades

variadas para que não exista um comprometimento durante sua aprendizagem.

Page 40: AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM · Antes de falarmos sobre a hiperatividade, vamos tentar entender como ocorre o processo e o problema de aprendizagem

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O professor pode ser a ponte entre a família e o especialista durante o

tratamento, já que seu papel não é o de fazer o diagnóstico, mas sim de clarificar

aos pais que se o comportamento hiperativo não for tratado, provoca muitas

complicações para o convívio social da criança, podendo levá-la à depressão, à

insatisfação, à desmotivação, a um conflito interno por não conseguir realizar as

atividades do dia a dia, bem como à rejeição causada pelos companheiros da

escola.

Ainda, verificamos que a psicopedagogia é uma ferramenta valiosa que pode

auxiliar os pais e, principalmente os profissionais da educação, a reorganizar a vida

doméstica e escolar da criança hiperativa. Além disso, o psicopedagogo é o

profissional que está melhor preparado para trabalhar com a dificuldade de

aprendizagem, já que esta frequentemente está presente nos quadros de

hiperatividade.

Concluímos, portanto, que a hiperatividade não tem cura, pode ser tratada

com a ajuda de profissionais especializados como o psicopedagogo e que nem

todas as crianças que possuem comportamentos não aceitáveis são hiperativos,

mas podem precisar de limites para aprenderem a conviver nos grupos sociais.

Page 41: AS CONSEQUÊNCIAS DA HIPERATIVIDADE NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM · Antes de falarmos sobre a hiperatividade, vamos tentar entender como ocorre o processo e o problema de aprendizagem

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