[artigos] a guerra fria e as influências no design de produto brasileiro

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Artigos 1ª edição Agosto de 2014

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Toda 2ª terça-feira nos próximos 3 meses, postaremos um novo artigo, com uma curadoria da nossa equipe de conteúdo. Para começar, fique com "A Guerra Fria e As Influência no Design de Produto Brasileiro", por Fernanda Cristina Rossato Arantes.

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Artigos1ª edição

Agosto de 2014

O presente estudo trata da coleta de informações sobre a influência sofrida pelo design brasileiro dos dois países envolvidos na Guerra Fria (do final da Segunda Guerra Mundial a 1991) e, caso tenha sofrido, como esta se deu. Pretende ainda apresentar conclusões sobre qual influência foi mais forte, a americana ou soviética. Os dados foram coletados através de levantamento bibliográfico e entrevistas com personalidades importantes do design brasileiro que vivenciaram ou estudaram a fundo este período. Desse modo, objetiva-se reconhecer os principais elementos configurativos desta interconexão, de modo a gerar uma base de dados sobre tal influência no design deste período histórico.

A GUERRA FRIA E AS INFLUÊNCIAS NO DESIGN DE PRODUTO BRASILEIRO

Design de Produto, Design Brasileiro, Guerra Fria

Fernanda Cristina Rossato Arantes

Ao realizar sua profissão, o designer deve ter em mente que seus projetos podem e devem contribuir para o exercício da responsabilidade social. Porém, tão importante quanto projetar para a sociedade, é entender a sociedade para a qual se pretende projetar. Para tanto, foi estudado o surgimento do design no Brasil com ênfase no período da Guerra Fria e a influência desta no design de produtos brasileiro. Quando a Segunda Guerra Mundial acabou, em 1945, o mundo se dividiu em duas potências: os Estados Unidos da América (EUA), capitalista, e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), socialista, o que durou até 1991, com o dissolvimento da União Soviética.

Enquanto isso, o Brasil vivia uma situação de grande crescimento econômico e industrial, com pleno desenvolvimento do design nacional. O advento de duas guerras e uma crise mundial fizeram com que a indústria brasileira tivesse de se desenvolver pela necessidade de suprir os produtos que não podiam ser importados. Várias escolas de design foram abertas, incentivos para pesquisas acadêmicas foram dados pelo Governo e foram criados prêmios e revistas sobre a área. Dentro desse contexto de crescimento acelerado de um lado e escassez do outro, foi realizada esta pesquisa de como se deu a influência dos EUA e URSS no design de produtos brasileiro no período, e qual país se fez mais marcante.

A Primeira Guerra Mundial e o período entre guerras

Durante a Primeira Guerra Mundial houve um sutil desenvolvimento do setor industrial no Brasil, pois os produtos que antes eram importados tiveram sua produção diminuída, devido ao fato de que estes produtos vinham de países que estavam envolvidos na Guerra (ANDRADE NETO et al. 2010; MEDEIROS et al. 2010). Com o final da Primeira Guerra Mundial, os Estados Unidos e a Alemanha se destacaram como potências mundiais, firmando pareceria com o Brasil, que se mostrou neutro durante todo este período e boa parte da Segunda Guerra Mundial (HOBSBAWM, 1995; MONTEIRO, 2010; NIEMEYER, 2007). Já o período entre as duas Guerras Mundiais no Brasil foi de grande importância para o setor industrial, uma vez que surgiram novas tecnologias e materiais, que antes eram de aplicação restrita à indústria, como o plástico e o alumínio (CAMARGO, 2003; CARDOSO, 2004;

HOBSBAWM, 1995; MOTTI e RICETTI, 2007; LEAL, 2002). Também estavam se popularizando mídias já existentes, como o cinema e o rádio, e algumas novas, como a televisão, abrindo novas opções de produtos a serem comercializados (CARDOSO, 2004). Entre o final da década de 1920 e começo da década de 1930, o Brasil enfrentou uma crise econômica causada pela superprodução cafeeira e pela crise financeira nos Estados Unidos. Com isso, a entrada de dinheiro estrangeiro caiu drasticamente, ameaçando o desenvolvimento industrial que já era escasso, pois as siderúrgicas eram rudimentares, a via aérea atendia prioritariamente ao setor primário (matérias-primas) e pela questão da disponibilidade de combustível ainda não haver sido equacionada (MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007). Mesmo com todos esses empecilhos, a produção industrial já dava sinais de recuperação em 1931 (MEDEIROS et al. 2010).

A Segunda Guerra Mundial e seu período sucessor Durante a década de 1930, a fim de incrementar as vendas dos seus produtos, as indústrias nacionais cresceram e algumas até mudaram seu foco (ANDRADE NETO et al. 2010). A Walita, por exemplo, foi fundada nesta década em São Paulo e, inicialmente, fabricava interruptores e peças de iluminação, a partir de 1945 começou a fabricar liquidificadores, passando rapidamente ao ramo de eletrodomésticos (ANDRADE NETO et al. 2010). Durante a década de 1940, as indústrias de minerais, metalurgia e siderurgia, que são mais sofisticados tecnologicamente e constituem a base para vários outros setores industriais, começaram a se desenvolver no Brasil, abrindo as perspectivas para o desenvolvimento industrial brasileiro (MEDEIROS et al. 2010). Com o final da Segunda Guerra Mundial em 1945, os países que participaram, direta ou indiretamente do conflito, estavam em estado de recuperação financeira e física e, embora os Estados Unidos estivessem na posição de principal abastecedor de bens de consumo, ainda havia produtos que o Brasil não podia importar, como peças de maquinário agrícola (ANDRADE NETO et al. 2010; CAMARGO, 2003; CARDOSO, 2004; HOBSBAWM, 1995; MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007). Assim, a indústria brasileira se desenvolveu a partir da necessidade da substituição de importações, o que aconteceu juntamente com os planos qüinqüenais de Getúlio Vargas, que previa a expansão dos sistemas ferroviário, hidroelétrico e industrial (ANDRADE NETO et al. 2010; CAMARGO, 2003; CARDOSO, 2004; MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007; SANT’ANNA, 2004). Além disso, foram descobertas novas tecnologias e materiais e, assim como aconteceu com o final da Primeira Guerra Mundial, o final da Segunda Guerra Mundial trouxe muitas melhorias e descobertas para a indústria como um todo (CAMARGO, 2003;

CARDOSO, 2004; HOBSBAWM, 1995; LEAL, 2002; MOTTI e RICETTI, 2007; NIEMEYER, 2007).Com o término da Guerra também havia acabado a ditadura implantada em 1937 pelo Presidente Getúlio Vargas, porém, Getúlio voltou ao poder em 1950 e promoveu a expansão industrial (ANDRADE NETO et al. 2010; SANT’ANNA, 2004). Foram implantadas a Companhia Siderúrgica Nacional (1946) e a Petrobras (1953), as indústrias que receberam maior apoio foram as de bens de capital e de consumo (ANDRADE et al. 2010; ANDRADE NETO et al. 2010; CARDOSO, 2004; MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007). Mesmo com este sistema de incentivo à indústria o Brasil, juntamente com a Argentina, se sobressaiu entre os países exportadores de insumos agrícolas, posição que o Brasil ocupa até hoje e que lhe rendeu, por um espaço de tempo, a oportunidade de gozar do crescimento acelerado que acontecia nos Estados Unidos (CARDOSO, 2004; MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007). O cenário cultural crescia rapidamente, uma vez que o desenvolvimento urbano de grandes cidades como Rio de Janeiro e São Paulo gerou maior incentivo à cultura e ao lazer (BERTASO e BRAGA, 2010; LACROCE, 2008; NAPOLITANO, 2005; NIEMEYER, 2007; SANT’ANNA, 2004). Desse modo, foram inaugurados em 1947 o Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), em 1948 o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-RJ), em 1949 a Companhia Cinematográfica Vera Cruz e em 1951 o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) e a I Bienal de São Paulo (BERTASO e BRAGA, 2010; LACROCE, 2008; MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007; SANT’ANNA, 2004). Em 1952, o MAM-RJ promoveu cursos de Ivan Serpa e Milton Goldring, o que fez sua popularidade crescer, dando de oito a dez exposições anuais e palestras de críticos, designers e artistas estrangeiros, como Max Bill e Tomás Maldonado (BERTASO e BRAGA,

2010). Havia ainda a grande concentração de imigrantes nessas cidades, espalhados em bairros específicos, que trouxeram novas culturas, dando-lhes um ar cosmopolita (ARRUDA, 2005). O design de móveis, já forte nos EUA e Europa, foi impulsionado a partir da década de 1940 por um grupo de designers e arquitetos brasileiros,destacando-se: Geraldo de Barros, Henrique Mindlin, João Batista Vilanova Artigas, José Zanine Caldas, Júlio Roberto Katinsky, Lina Bo Bardi, Michel Arnoult, Oswaldo Arthur Bratke, Paulo Mendes da Rocha e Rino Levi em São Paulo, e ainda Boal, Bernardo Figueiredo, Joaquim Tenreiro, Sérgio Bernardes e Sérgio Rodrigues no Rio de Janeiro (CARDOSO, 2004). Juntos, abriram várias empresas, lojas e pequenas fábricas, porém, o primeiro escritório de design no Brasil surgiu no início de 1947, por iniciativa do designer americano Raymond Loewy (CARDOSO, 2004). O Raymond Loewy Associates se localizava em São Paulo e estava sob direção do arquiteto e designer americano Charles Sampson Bosworth; entretanto, no final do mesmo ano, a empresa foi fechada (CARDOSO, 2004). Mesmo assim, Bosworth voltou ao Brasil na década de 1950 e se radicou brasileiro, tendo realizado inúmeros trabalhos de arquitetura industrial (CARDOSO, 2004). No começo da década de 1950, José Mindlin assumiu a Diretoria de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e admitiu que, para que o país pudesse aumentar seu nível de exportação, deveria investir mais no design (LEAL, 2002). Então, novas medidas foram tomadas; o Presidente da República Getúlio Vargas, em seu segundo mandato em 1952, proibiu a importação de peças automobilísticas que fossem fabricadas no país, surgindo assim a primeira campanha de incentivo à indústria de automóveis, fazendo com que indústrias européias, como a Volkswagen (alemã) e Simca (francesa), investissem no Brasil (ARRUDA, 2005; NIEMEYER, 2007). Em 1955 o Governo lançou um projeto para o desenvolvimento industrial, baseado no ingresso de capital estrangeiro e importação de tecnologias (NIEMEYER, 2007). No ano de 1956, Getúlio Vargas tentou um golpe de estado que falhou, então Juscelino Kubitschek (mandato 1956 a 1961) entrou no poder, implantou o Programa de Metas e fundou o Programa Nacional de Desenvolvimento para acelerar a acumulação de capital, aplicando novos investimentos em novas atividades produtivas e aumentando a produtividade das atividades já existentes (ANDRADE NETO et al. 2010; MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007; SANT’ANNA, 2004). Essa época (1950-1960) é considerada a fase pioneira do design brasileiro, bem como a fase em que este apresenta

“Com o aumento do poder financeiro

da população, também cresceu o

padrão de exigência, não dando mais

lugar aos produtos manufaturados,

que apresentavam qualidade de acabamento

inferior”

maior crescimento (LACROCE, 2008). O país experimentou uma febre de modernização, com a inserção de multinacionais em territórios brasileiros, abrindo maiores possibilidades de trabalho e incentivando os designers a inovarem em seus projetos, tanto de produtos quanto gráficos (ANDRADE et al. 2010; CARDOSO, 2004; MEDEIROS et al. 2010; LACROCE, 2008; NIEMEYER, 2007). Com o aumento do poder financeiro da população, também cresceu o padrão de exigência, não dando mais lugar aos produtos manufaturados, que apresentavam qualidade de acabamento inferior (ANDRADE NETO et al. 2010; LEAL, 2002; NIEMEYER, 2007). A classe média urbana também passou a se inspirar, cada vez mais, na classe média urbana americana, aumentando a obsolescência programada e a migração da população do campo para a cidade (ANDRADE NETO et a l . 2010; LEAL , 2002; NIEMEYER, 2007).Todo esse crescimento teve um preço a ser pago, para que esses planos pudessem ser realizados, foi preciso recorrer à inflação, que alcançou 19,2% em 1956 e 30,9% em 1960 (MEDEIROS et al. 2010; NIEMEYER, 2007). Apesar de todas essas iniciativas, entre a maioria dos industriais não se sabia direito o que era design e os estudantes de design que se formavam encontraram dificuldade em conseguir emprego, pois os primeiros preferiam comprar projetos do exterior ou simplesmente copiá-los, fazendo com que o produto brasileiro fosse conhecido como não detentor de características próprias (ANDRADE et al. 2010; BRAGA, 2010; LEAL, 2002; NIEMEYER, 2007). Então, para fortalecer e divulgar a área, foi fundada em 1963 a Associação Brasileira de Desenho Industrial (ABDI) em São Paulo, a primeira do gênero no país e que serviu de inspiração para muitas

associações que surgiriam mais tarde (BRAGA, 2010; CARDOSO, 2004; LACROCE, 2008). Em 1963 foram criados, sob responsabilidade da Alcântara Design e pela ABDI os prêmios Prêmio Lúcio Meira de design automobilístico no Salão do Automóvel, que durou até 1974, e o Prêmio Roberto Simonsen, integrado à Feira de Utilidades Domésticas - UD (LEAL, 2002). Os anos 1960 também foram de significativos avanços nas áreas de mobiliário e interiores, além de abrir maior espaço à área de eletrodomésticos, pouco explorada até então (BRAGA, 2010). Essa época foi marcada pela criação de várias instituições de ensino em design e abertura de inúmeros escritórios de design,

caracterizando um amplo crescimento no campo de design de produtos, porém, ainda não havia mercado o suficiente, fazendo com que a maior parte dos trabalhos realizados por estes profissionais fosse na área gráfica (BRAGA, 2010; LEON, 2005). Esta foi uma década politicamente instável, com grandes dificuldades financeiras

sendo que a partir de 1962 houve um declínio nas taxas de crescimento do país. Então a população, inspirada pelos movimentos ao redor do mundo e pelo espírito de renovação dos anos 1950 iniciaram mobilizações por reformas sociais (CARDOSO e CASTRO, 2010). Isso incentivou artistas, designers e arquitetos a criarem uma arte politizada, preocupada com os problemas socioeconômicos do Brasil (ANELLI, 2009; CARDOSO e CASTRO, 2010; MADEIRA, 2002),

“A população, inspirada pelos movimentos ao redor do mundo e pelo espírito de

renovação dos anos 1950 iniciaram mobilizações por

reformas sociais”

O design no Brasil durante a Ditadura Militar A Ditadura Militar iniciou no Brasil em 1964 com um golpe de estado no dia 31 de março e durou até 1985; durante este Governo, foi estabelecido um plano de crescimento, para que o Brasil superasse a condição de Terceiro Mundo (embora essa expressão originalmente se referisse aos países politicamente neutros na Guerra Fria, mais tarde acabou ganhando o estigma de países pobres) (ANDRADE NETO et al. 2010; BARBOSA, 2009; BRANCO, 2005; MEDEIROS et al. 2010). Tal iniciativa acabou em uma espécie de corrida para o desenvolvimento industrial e combate à inflação e à crise econômica, criando um clima favorável ao investimento de empresas estrangeiras, o que levou à chegada das multinacionais em território nacional (BARBOSA, 2009; MEDEIROS et al. 2010). Para passar a imagem de uma economia crescente, os generais que estavam no comando reduziram os direitos políticos e sociais e os salários dos trabalhadores não qualificados fazendo com que muitas empresas fechassem ou mudassem o foco de seus produtos (ANDRADE NETO et al. 2010). Assim como nos EUA e os países europeus durante a Belle Époque, o Brasil aparentava uma situação de crescimento e modernidade, mas estava em crise financeira (BRAGA, 2010). Para aumentar o consumo de bens e serviços, o Governo estimulou o crédito, permitiu prazos de financiamento mais longos e combateu os juros, o que fez crescer tanto a demanda quanto a produção de produtos industrializados

(BRAGA, 2010). Houve, então, o período do milagre econômico (1968-1973), em que o setor de bens de consumo cresceu 11% (BRAGA, 2010; CARDOSO e CASTRO, 2010). Juntamente a este fenômeno, houve as fusões de empresas, principalmente de eletrodomésticos, consolidando suas posições no mercado (BRAGA, 2010). Apesar deste período ter demonstrado forte crescimento econômico e aumento da indústria, pouco se desenvolveu no design de produtos. A entrada de empresas estrangeiras, que utilizavam o mesmo design do seu país de origem, e o sistema alfandegário protecionista fizeram com que nascesse um fenômeno chamado tropicalização do produto, em que o bem importado sofria pequenas mudanças para se adaptar ao público

dando origem às primeiras discussões teóricas sobre o tema, promovidas pelo Governo (CARDOSO e CASTRO, 2010). Essas discussões geraram iniciativas concretas, como a implantação do Instituto de Desenho Industrial (IDI), em 1968, criado pelo Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-RJ) (BERTASO e BRAGA, 2010; CARDOSO e CASTRO, 2010). O IDI realizou projetos de móveis escolares com pesquisas antropométricas, e foi o órgão responsável pela união do design à sustentabilidade no Brasil (BERTASO e BRAGA, 2010; MEDEIROS et al. 2010). Karl Heinz Bergmiller, alemão vindo para o Brasil em 1958, coordenou o IDI, gerenciando as exposições apresentadas pelo museu e, em 1972, foi implantado na cidade de Belo Horizonte o Centro Tecnológico de Minas Gerais (CETEC) (BARROSO NETO, 1998; BERTASO e BRAGA, 2010; CARDOSO e CASTRO, 2010). Enquanto o IDI fazia trabalhos de divulgação e pesquisa, o CETEC incentivava as empresas a contratarem designers (CARDOSO e CASTRO, 2010).Nos anos 1970, José Mindlin assumiu a Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo e, para promover a ligação do design com a indústria, criou o Prêmio da Boa Forma, além de promover vários estudos sobre o design nacional e internacional (CARDOSO e CASTRO, 2010; LEAL, 2002). A Fiesp, por sua vez, sob direção de Dilson Funaro, José Mindlin e Luiz Villares, criou o Núcleo de Desenho Industrial (NDI), com Joice Joppert Leal na chefia. Este núcleo em pouco tempo se tornou no Departamento

brasileiro. Para essa adaptação, era usado o trabalho de engenheiros, não de designers (CARDOSO e CASTRO, 2010). Em 1968, o Ato Institucional 5 (AI-5) oficializou a censura prévia no plano cultural, o que repercutiu negativamente no plano artístico e intelectual do país. Devido a essa censura, pequenos empresários locais não demonstraram interesse na contratação de designers, sendo as multinacionais e grandes empresas as únicas a contar com este tipo de profissional (CARDOSO e CASTRO, 2010). Depois de um tempo de repressão ao design por parte dos empresários, começou a surgir a preocupação com os benefícios que o uso do design poderia proporcionar,

de Tecnologia (Detec) e teve importante papel na disseminação do design brasileiro entre o público geral. Essa época, inclusive, foi de grande importância no cenário do design nacional, pois surgiram vários escritórios de design, e a ergonomia se popularizou entre os empresários, que ansiavam por móveis mais confortáveis (LEAL, 2002). A Volkswagen abriu espaço para a criação de novos automóveis em sua fábrica brasileira, para o público brasileiro, latino americano, africano e asiático (ANDRADE NETO et al. 2010). Então surgiu a Brasília, primeiro automóvel de projeto brasileiro e de autoria do designer Márcio Piancastelli, abrindo espaço para a criação de novos modelos brasileiros, inicialmente para o mesmo público alvo (ANDRADE NETO et al. 2010; LEON, 2005). Em 1973, a fim de incentivar o design, o Ministério da Indústria e do Comércio lançou um programa de padronização para as embalagens das indústrias têxtil, cafeeira, de autopeças, de louças, laranjeira, de suco e de geléia; em 1978, foi instituída a Associação Profissional de Desenhistas Industriais de Nível Superior (APDINS), como reação de desacordo com a ABDI, e, em 1989, foi fundada a Associação de Designers Gráficos (ADG) (ANDRADE NETO et al. 2010; CARDOSO, 2004). No ano de 1977, o Serviço Social do Comércio (Sesc) que, apesar de ser voltado para os comerciantes, incentivou em alto grau o design brasileiro, inaugurou o Sesc Pompéia, realizando, desde então, inúmeras ações para a divulgação do design no Brasil, como a exposição O Design no Brasil, organizada pelo então diretor do Masp, Pietro Maria Bardi. Em seguida vieram as exposições Mil Brinquedos para a Criança Brasileira e Caipiras, Capiaus: Pau-a-Pique (LEAL, 2002). Em março de 1984, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), juntamente com a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a Federação das Indústrias do Estado de Santa

Catarina (FIESC) e com o apoio do próprio Governo do Estado de Santa Catarina, criou o Laboratório Brasileiro de Desenho Industrial – LBDI (BARROSO NETO, 1998; CARDOSO e CASTRO, 2010; MEDEIROS et al. 2010; LEAL, 2002; LEON, 2005). Inicialmente, seu nome era Laboratório Associado de Desenvolvimento de Produto/Desenho Industrial de Santa Catarina, somente com seu crescimento que passou a se chamar Laboratório Brasileiro de Desenho Industrial (BARROSO NETO, 1998). Este laboratório foi criado com o intuito de difundir e estimular a prática do design na região sul país, apoiando as empresas nacionais, aumentando a competitividade e auxiliando no desenvolvimento dos seus produtos ,(BARROSO NETO, 1998; CARDOSO e

CASTRO, 2010; MEDEIROS et al. 2010; LEAL, 2002). Para isso, foi utilizada a premissa de preparar tanto a demanda, quanto a oferta (BARROSO NETO, 1998).Pouco tempo depois iniciou-se uma política de descentralização das ações federais, então o CNPq criou três Laboratórios Associados de Design Industrial em Florianópolis (SC), São Carlos (SP) e Campina Grande (PB) (BARROSO NETO, 1998; CARDOSO e CASTRO,

2010; MEDEIROS et al. 2010; LEAL, 2002). Esses laboratórios deveriam atuar em atividades de pesquisa, capacitação de recursos humanos, atendimento às indústrias e divulgação de dados relacionados ao desenho industrial. Os centros tecnológicos e as universidades já realizavam todas essas tarefas, a proposta do CNPq era, portanto, realizá-las em um espaço de tempo menor e com menos burocracia (BARROSO NETO, 1998). No ano de 1985, a Secretaria de Tecnologia Industrial do Ministério da Indústria e Comércio, incluiu o design como tema prioritário no Programa Brasileiro de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico, destinando recursos para a criação do Núcleo de Informação Tecnológica em Design, instalado na Fiesp e coordenado pelo professor José Rincon Ferreira (LEAL, 2002).

“Então surgiu a Brasília, primeiro automóvel de projeto brasileiro e de

autoria do designer Márcio Piancastelli, abrindo espaço

para a criação de novos modelos brasileiros”

No final do anos 1980 o crescimento econômico nacional, tão marcante e crescente nos últimos trinta anos, começou a diminuir, fazendo com que investidores estrangeiros e brasileiros retirassem seus investimentos em novos projetos, ficando apenas os investimentos nos já existentes. Este fato criou um estancamento econômico, que, acompanhado de alta inflação (1782,90% em 1989) minou o poder de consumo das classes média e baixa. O mercado de consumo apresentava crescimento mínimo e o Governo se viu obrigado a reduzir os investimentos nas áreas de educação, planejamento urbano e saúde (ANDRADE NETO et al. 2010). Em 1988, foi criada a Associação Brasileira de Ensino de Design (Abed), posteriormente denominada Associação de Ensino-Pesquisa de Nível Superior em Design no Brasil (AENnD-BR) (LEAL, 2002). Vários prêmios foram criados, com destaque para o Prêmio Museu da Casa Brasileira, criado

sob a gestão de Roberto Duabili; alguns designers começaram a ganhar prêmios internacionais, fazendo com que a área se destacasse na mídia, surgindo assim a primeira revista de design com grande aceitação do público geral, a Design & Interiores (CARDOSO e CASTRO, 2010; LEAL, 2002).Após a construção de Brasília, o povo passou a clamar por progresso e modernidade, então, para atender aos desejos da população, João Goulart apostou no design, para que o país não parecesse retrógrado e desenvolvesse a produção industrial, que estava a todo o vapor na época.

Esse apoio ao design no Brasil tinha um grande motivo financeiro, pois, com um grande número de designers trabalhando em território nacional, as empresas evitariam ter de pagar royalties de patentes importadas. As massas também se beneficiariam, pois poderiam gozar de objetos funcionais, confortáveis e bonitos sem ter de desembolsar uma quantia exorbitante (ANDRADE et al. 2010).

O Brasil após a Ditadura Militar

Pesquisa de campoSujeitos, materiais e procedimentosForam realizadas entrevistas com 5 pessoas ligadas à área do design que vivenciaram ou estudaram o período dos anos 1950-1960. As áreas de atuação dos indivíduos seguem a seguinte ordem: dois ergonomistas, uma especialista em semiótica, um designer gráfico e uma arquiteta.

Estas foram feitas individualmente por meio de trocas de e-mail, telefonemas ou conferência online; o questionário contemplava dez perguntas relacionadas ao trabalho do entrevistado e sua percepção sobre o design brasileiro durante o período da Guerra Fria.

Dado estas conclusões, é importante dar destaque a outros resultados, como a declaração quase unânime de que o Brasil não tinha, e continua não tendo, um setor industrial forte durante a época estudada. Desde o começo do século XX o país se firmou como exportador de insumos agropecuários, e continua mantendo essa posição atualmente (CARDOSO, 2004). Por último, foi afirmado que não existe nenhum designer de produtos ou um produto em si com características construtivistas fortes o suficiente para se declarar influenciado somente pelo Construtivismo Russo.

A ESDI foi de grande importância para a formação

do ensino do design no país, pois foi a primeira escola de ensino superior de design no Brasil, entretanto, seu sistema de ensino foi baseado na Escola de Ulm, dando a esta mais destaque que à primeira;

ResultadosDentre as diversas opiniões demonstradas pelos sujeitos entrevistados, três foram enfáticas:

1 Os movimentos Concreto e Neoconcreto,

embora demonstrem semelhanças com o Construtivismo Russo, foram influenciados diretamente pelo design alemão da Bauhaus;

2 A influência soviética no design de

produtos brasileiro foi irrelevante, uma vez que o país estava muito mais próximo fisicamente, socialmente e economicamente dos EUA, além do fato de que a URSS estava isolada dos outros países pela cortina de ferro.

3

ConclusãoHá semelhanças em produtos brasileiros tanto com o design americano, quanto soviético, no entanto, durante o período da Guerra Fria, os designers brasileiros sofreram maior influência da Europa em geral, principalmente Alemanha. O próprio sistema de ensino de design foi cunhado sobre as principais escolas alemãs: Bauhaus e Escola de Ulm. No entanto, o país recebeu, e continua recebendo, forte influência americana, sendo possível concluir que a influência soviética no design brasileiro foi irrelevante.

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