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COMPLICAÇÕES CRÔNICAS DO DIABETES MELITO

J.L. GROSS*, M. NEHME**

Detecção e tratamento das complicações crônicas dodiabetes melito: Consenso da Sociedade Brasileira deDiabetes e Conselho Brasileiro de Oftalmologia

Artigo Revisão

*Sociedade Brasileira de Diabetes; **Conselho Brasileiro de Oftalmologia.

UNITERMOS: Retinopatia. Neuropatia. Nefropatia. Diabe-tes Melito.

KEY WORDS: Retinopathy. Neuropathy. Nephropathy. Dia-betes Mellitus.

INTRODUÇÃO

O diabetes melito (DM) acomete cerca de 7,6% dapopulação brasileira entre 30 e 69 anos de idade.Cerca de 50% dos pacientes desconhecem o diagnós-tico e 24% dos pacientes reconhecidamente porta-dores de DM não fazem qualquer tipo de tra-tamento1.

As complicações crônicas do diabetes melito (DM)são as principais responsáveis pela morbidade emortalidade dos pacientes diabéticos. As doençascardiovasculares representam a principal causa demorte (52%) em pacientes diabéticos do tipo 22.Diversos fatores de risco, passíveis de intervenção,estão associados ao maior comprometimento car-diovascular observado nos pacientes diabéticos. En-tre eles estão a presença da Nefropatia Diabética(ND) e da Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS).

O impacto desfavorável da HAS e das dislipi-demias sobre a morbimortalidade cardiovascular éamplamente reconhecido, bem com a freqüenteassociação destas condições ao DM. Dados da Orga-nização Mundial da Saúde mostram significativaelevação da mortalidade de indivíduos com DM tipo1 e 2 na presença de HAS3. Por outro lado, sãonumerosas as evidências de que o tratamento anti-hipertensivo é capaz de reduzir a incidência deeventos cardiovasculares em indivíduos com e semDM4,5. Também a intervenção sobre a dislipidemiatem se mostrado benéfica no controle da doençamacrovascular de indivíduos diabéticos6.

A ND acomete cerca de 40% dos pacientes diabé-ticos e é a principal causa de insuficiência renal empacientes que ingressam em programas de diálise.A mortalidade dos pacientes diabéticos em progra-mas de hemodiálise é maior do que a dos não-

diabéticos. Cerca de 40% dos pacientes morrem noprimeiro ano de tratamento, principalmente pordoença cardiovascular7. O custo do tratamento dainsuficiência renal crônica (IRC) é elevado. Deacordo com os dados obtidos junto à Secretaria deSaúde do Meio Ambiente do Estado do Rio Grandedo Sul, o custo direto de um paciente em he-modiálise por ano é de R$ 13.902,00 sem contar oacesso vascular, as medicações (R$ 4.000,00), aseventuais hospitalizações e as consultas. Esse tipode tratamento consome cerca de 7% do total dispo-nível para a assistência médica deste Estado8.

A ND apresenta uma fase inicial, denominadade nefropatia incipiente (fase de microalbumi-núria) e uma fase mais avançada definida comonefropatia clínica (fase de macroalbuminúria).Existem diversas estratégias terapêuticas quepodem ser empregadas para reverter as alteraçõesencontradas na fase de microalbuminúria e retar-dar a evolução da fase de macroalbuminúria paraa IRC. A ND pode ser diagnosticada precocementepela medida da albuminúria. Atualmente já estãobem definidos procedimentos simples e efetivospara realizar o rastreamento9,10. É possível a redu-ção de custos utilizando-se uma abordagem inicialsimplificada para o rastreamento. A medida deproteinúria e albuminúria custam R$ 0,17 e R$0,78, respectivamente.

Estudos realizados em países da Europa demons-traram a elevada relação benefício/custo do empre-go de medidas de prevenção da ND11. No entanto,nestes países em menos de 50% dos pacientes comdiabetes do tipo 2 são realizados testes de ras-treamento para a ND12.

A Retinopatia Diabética (RD) acomete cerca de40% dos pacientes diabéticos e é a principal causade cegueira em pacientes entre 25 e 74 anos13. Amaioria dos casos de cegueira (90%) é relacionada àRD e pode ser evitada através de medidas adequa-das, que incluem, além do controle da glicemia e dapressão arterial, a realização do diagnóstico emuma fase inicial e passível de intervenção. Essasmedidas diminuem a progressão das alterações

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GROSS, JL

retinianas, não revertendo os danos já estabeleci-dos. Portanto, é imperativo que seja feito o diagnós-tico da RD em suas fases iniciais antes que lesõesque comprometem a visão tenham ocorrido. Omelhor procedimento para realizar a detecção pre-coce da RD ainda não foi determinado. Idealmente,o rastreamento para RD deveria ser realizado poroftalmologista da rede pública, mas este sistematem se mostrado insuficiente em locais como o

Quadro 1 – Valores de albuminúria e de proteinúriautilizados no diagnóstico de Nefropatia Diabética

Categoria Urina de 24 horas* Amostra de urina**

Normal:Normoalbuminúria < 20 µg/min < 17 mg/L

Nefropatia Incipiente:Microalbuminúria 20 a 200 µg/min 17 a 174 mg/L

Nefropatia Clínica:Macroalminúria > 200 µg/min > 174 mg/LProteinúria ≥ 500 mg/24h ≥ 430 mg/L

* American Diabetes Association. Diabetes Care 21 (suppl l):S50-S53, 1998

** Zelmanovitz T et al. Diabetes Care 20 : 516-519, 1997Zelmanovitz T et al. Diabetes Care 21: 1076-1079, 1998.0

Quadro 2 – Instruções para aplicação do monofilamento de nylon

1. Mostrar o filamento ao paciente e aplicá-lo em sua mão paraque ele possa reconhecer o tipo de estímulo e "perca o medo".

2. Pedir que o paciente não olhe para o local que estará sendotestado.

3. Pedir que o paciente preste atenção e simplesmenteresponda "sim" quando sentir o filamento; não perguntar seele sente ou não, para não induzi-lo.

4. Ao aplicar o filamento, mantenha-o perpendicularmente àsuperfície testada, a uma distância de 1-2 cm: com ummovimento suave, faça-o curvar-se sobre a pele e retireo, contando mentalmente a seqüência numérica "1001-1002" enquanto o filamento toca a pele, curva-se e sai docontato.

5. Não use movimentos bruscos na aplicação; se o filamentoescorregar pelo lado, desconsidere a eventual resposta dopaciente e teste o mesmo local novamente mais tarde.

6. Use uma seqüência ao acaso nos locais de teste, para nãoinduzir o paciente a prever o local seguinte onde o filamentoserá aplicado.

7. Havendo áreas ulceradas, necróticas, cicatriciais ouhiperceratóticas, teste o perímetro da mesma, e não sobrea lesão.

8. Se o paciente não responder à aplicação do filamento numdeterminado local, continue a seqüência randômica e volterposteriormente àquele local para confirmar.

9. Anote os resultados segundo a percepção do filamento emcada região testada.

10. Conserve o filamento protegido, cuidando para nãoamassá-lo ou quebrá-lo, se necessário, limpe-o comsolução de hipoclorito de sódio a 1:10.

Quadro 3 – Rastreamento do pé em risco de úlcera.Qualquer achado positivo (SIM) identifica paciente com péem risco

Ulcera prévia sim/não

Neuropatia

Monofilamento sim/não

Calosidade sim/não

Deformidade sim/não

Calçados inadequados sim/não

Doença vascular periférica

Ausência de pulsos tibial posterior/pedioso sim/não

Micose, Bolha, Rachaduras, Fissuras sim/não

Pacientes que apresentam calosidades sangrantes, úlceras comcelulite e/ou abscesso, deformidades importantes (ex. artropatiade Charcot), claudicação intermitente e sinais de isquemiarequerem encaminhamento imediato para equipe especializada.

Reino Unido, na medida em que apenas uma peque-na porção dos pacientes tem acesso ao especia-lista14. Imagens da retina obtidas em sistemasdigitais podem ser visualizadas em um monitor decomputador e armazenadas em discos. Esse examepode ser efetuado por técnicos e posteriormenteanalisado por oftalmologistas15.

Dados epidemiológicos brasileiros indicam queas amputações de membros inferiores ocorrem 100vezes mais freqüentemente em pacientes comDM16. Pacientes diabéticos com lesões graves nospés constituem 51% dos pacientes internados emenfermarias dos Serviços de Endocrinologia nosHospitais Universitários, com duração que podechegar a 90 dias17. Calculou-se que no Hospital deClínicas de Porto Alegre uma internação de 21 diaspara tratamento de úlcera nos pés de um pacientediabético custa cerca de R$ 7.000,00. Em nívelambulatorial, o custo trimestral, incluindo apenasa distribuição de antibióticos orais e antimicóticosorais e tópicos, atingiu R$ 31.400,00 no Centro dePé Diabético da Fundação Hospitalar do DistritoFederal 18. A grande maioria (85%) dos casos gravesque necessita internação hospitalar, origina-se deúlceras superficiais ou de lesões pré-ulcerativasnos pés de pacientes diabéticos com diminuição dasensibilidade por neuropatia diabética associada apequenos traumas, geralmente causadas por calça-dos inadequados, dermatoses comuns, ou mani-pulações impróprias dos pés pelos pacientes ou porpessoas não habilitadas. As úlceras associadas à doen-ça vascular periférica constituem uma menor parcela,porém requerem cuidados imediatos e especializados.

A detecção precoce do “pé em risco” pode ser feitafacilmente pela inspeção e avaliação da sensibilida-de através de testes simples e de baixo custo19, 20. O

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COMPLICAÇÕES CRÔNICAS DO DIABETES MELITO

Quadro 4 – Estratificação do risco e abordagem dos pacientes com pé em risco de úlceras

• neuropatia ausente baixo risco • educação• cuidados gerais• avaliação anual

• neuropatia presente risco moderado • educação• cuidados gerais• sapatos adequados• avaliação semestral

• neuropatia presente e/ou alto risco • educaçãodeformidades, • cuidados gerais

• proeminências e/ou • sapatos adequados e/ouisquemia, especiais

• úlcera/amputação prévia • seguimento por equipe especializada• avaliação trimestral

Quadro 5 – Cuidados gerais para os pés

1. Examine seus pés diariamente: se for necessário peçaajuda a um familiar ou use um espelho.

2. Avise seu médico se tiver calos, rachaduras, alterações decor ou úlceras.

3. Vista sempre meias limpas preferentemente de lã oualgodão.

4. Calce apenas sapatos que não lhe apertem, preferen-cialmente de couro macio. Não use sapatos sem meias.

5. Sapatos novos devem ser usados aos poucos. Use-os nosprimeiros dias apenas em casa por no máximo duas horas.Compre-os de preferência no final do dia.

6. Nunca ande descalço, mesmo em casa.

7. Laves seus pés diariamente, com água morna e sabãoneutro. Evite água quente. Seque bem os pés,especialmente entre os dedos.

8. Após lavar os pés use um hidratante a base de lanolina, masnão aplique entre os dedos.

9. Corte as unhas de forma reta, horizontalmente.

10. Não remova os calos, nem procure corrigir unhasencravadas. Procure um tratamento profissional.

emprego dessas medidas e a educação de profissio-nais, pacientes e familiares podem reduzir em até50% o risco de amputação.

Embora não existam dados populacionais sobre aprevalência das complicações crônicas do DM noBrasil, estima-se que o número de complicaçõescrônicas seja elevado. Além disso, provavelmenteapenas uma pequena fração da população dos pacien-tes diabéticos é avaliada regularmente para a pre-sença de complicações nas suas fases iniciais erecebe orientação terapêutica apropriada.

Para reduzir o impacto dessas complicações naqualidade de vida dos pacientes diabéticos e prolon-gar a sua vida de uma forma mais saudável eparticipativa na sociedade, delineou-se o projetoque a seguir está descrito.

Objetivos

• Implantação e implementação de métodos pararastreamento da nefropatia e retinopatia diabéti-cas e do pé em risco para úlceras e tratamento paraas complicações detectadas.• Promover pesquisas operacionais em determina-dos locais que desenvolvam o programa.

MÉTODOS

Rastreamento das complicações

População-alvo

O rastreamento das complicações crônicas seráestimulado em todos os centros e locais que sededicam ao atendimento de pacientes diabéticos.Serão utilizados métodos simples, de fácil empregoe de sensibilidade elevada.

Nos pacientes com DM tipo 1, o rastreamentopara as complicações crônicas deve ser realizadocinco anos após o diagnóstico de DM ou cinco anosapós a puberdade naqueles pacientes nos quais oDM surgiu antes de 12 ou 13 anos de idade. Empacientes com DM tipo 2, o rastreamento deve serfeito por ocasião do diagnóstico de DM. Em pacien-tes com DM tipo 1 e tipo 2 o rastreamento deve serrepetido em intervalos de um ano. No caso da RD orastreamento deve ser feito também quando houversintomas de diminuição da acuidade visual ou em todapaciente com DM tipo 1 logo no início da gravidez.

Nefropatia Diabética

O rastreamento deve iniciar com a realização deexame comum de urina e urocultura em amostracasual de urina. Na ausência de hematúria e deinfecção urinária, deve ser dosada a concentraçãode proteínas totais por método quantitativo namesma amostra.

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GROSS, JL

Valores de proteinúria³ 430 mg/L apresentamuma sensibilidade de 100% e especificidade de 80%para o diagnóstico de nefropatia clínica. Este diag-nóstico deve ser confirmado com dosagem de pro-teínas totais em urina de 24 horas. Se o valor deproteínas totais na amostra casual de urina for< 430 mg/L, realiza-se a medida de albuminúria namesma amostra de urina. Valores de albuminúria³17 mg/L são considerados diagnósticos de microal-buminúria (nefropatia incipiente) e valores meno-res do que estes são considerados normais. A pre-sença de microalbuminúria deve ser confirmadaem urina de 24 horas com tempo marcado (registra-

se o horário do início e do fim da coleta). (Fig. 1)No Quadro 1 estão descritos os valores de albu-

minúria e de proteinúria utilizados para o diagnós-tico de ND9,10. A dosagem de albumina na urina deveser realizada através de método sensível e específi-co: imunoturbidimetria (ITM) ou radioimunoensaio.

Devido à grande variabilidade biológica da excre-ção urinária da albumina (EUA), é preciso confir-mar o diagnóstico de microalbuminúria com umamedida em amostra isolada e uma medida de urinade 24h, realizadas com um intervalo de três a seismeses. Nos pacientes com diagnóstico de micro oumacroalbuminúria deve ser realizada a medida dacreatinina sérica anualmente para avaliação dafunção renal.

Retinopatia Diabética

Idealmente a avaliação oftalmológica deve serrealizada por oftalmologista da rede pública. Umaalternativa para os locais em que o acesso a oftalmo-logistas seria difícil, é a obtenção de imagens digi-tais em sistemas eletrônicos. Essas imagens, obti-das por técnicos treinados, seriam armazenadas emdiscos e posteriormente analisadas por especialis-tas. A constatação de qualquer grau de RD exige umaavaliação complementar que deverá ser realizadaem Centros de Referências credenciados pela Socie-dade Brasileira de Retina e Vítreo e Sociedade Bra-sileira de Diabetes, conforme descrito na Fig. 2.

Pé em risco de úlceras

Os fatores de risco mais importantes para oaparecimento de úlceras nos pés são a neuropatiadiabética periférica, a desinformação sobre os cui-dados com os pés, presença de pontos de pressãoanormal que favorecem as calosidades, as deformi-dades, a doença vascular periférica e as dermatosescomuns (sobretudo entre os dedos). Os pacientescom história prévia de úlcera ou amputação sãoparticularmente considerados como de elevado ris-co para o desenvolvimento de novas úlceras. Aavaliação clínica baseia-se em um exame físico dos

Fig. 1 – Fluxograma para o rastreamento e diagnóstico daNefropatia Diabética

*EQU, exame qualitativo em amostra isolada de urina

Fig. 2 – Fluxograma de diagnóstico de tratamento daRetinopatia Diabética (RD)

Fig. 3 – Técnica de aplicação de monofilamento e pontos dopé que devem ser testados

Aplicação do monofilamentos

Locais de teste1º, 3º e 5º dedos e metatarsos

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pés que inclui a inspeção e palpação da pele (colora-ção e temperatura), unhas, do subcutâneo e daestrutura dos pés, a palpação dos pulsos arteriaistibial posterior e pedioso (que pode estar ausenteem 10% de indivíduos normais) e a avaliação dasensibilidade protetora plantar. Idealmente, estadeve ser feita utilizando um monofilamento de 10gem seis regiões do pé conforme demonstrado naFig. 3 e de acordo com as instruções descritas noQuadro 2. Em cada consulta deverá ser realizadainspeção dos pés para avaliar a presença de unhaencravada e/ou deformada, deformidades dos dedose do arco plantar, áreas de calosidades, rachaduras,fissuras e bolhas, úlceras e intertrigo micótico.Além disso, deve-se realizar uma inspeção dos cal-çados, verificar a presença de pontos de atrito ou depressão plantar excessiva, desgaste irregular, etc.Seguindo esses procedimentos, os pacientes diabé-ticos em risco de apresentarem úlceras poderão serfacilmente identificados (Quadros 3 e 4).

Emprego de medidas de tratamento

Nefropatia

Pacientes diabéticos tipo 1 com micro ou ma-croalbuminúria, mesmo quando forem normoten-sos, devem receber agentes inibidores da enzima deconversão da angiotensina (ECA) como primeiraescolha, respeitando-se as contra-indicações (ges-tação, hipercalemia, pacientes idosos com estenosebilateral da artéria renal ou com doença renalavançada = creatinina sérica > 3,0 mg/dl) e efeitosadversos (tosse, angioedema, urticária, leuco-penia, perda do paladar). Nas mulheres em idadefértil deve-se alertar a cerca dos riscos destasdrogas durante a gravidez. Nos pacientes diabéti-cos tipo 2 há algumas evidências que suportem asua indicação preferencial21, inclusive como pre-venção do desenvolvimento da ND22. A maioria doscasos de ND apresentarão também HAS. Havendoa opção pelos inibidores da ECA e não ocorrendo aredução dos níveis tensionais abaixo de 130/85mmHg, acrescentam-se outros agentes. De fato estespacientes necessitam de dois ou mais agentes paraobter um bom controle pressórico. Pode-se iniciarcom diuréticos tiazídicos em baixa dosagem (12,5 a25 mg/dia), indapamida ou se houver insuficiênciarenal (creatinina sérica > 2,5 mg/dl) furosemida, oubeta-bloqueadores, idealmente do tipo cardios-seletivos, desde que adequadamente consideradasas contra-indicações e efeitos adversos, que limi-tam o seu uso no DM. Os agentes bloqueadores doscanais de cálcio devem ser utilizados com cautelaem pacientes diabéticos, pois podem estar associa-dos a um aumento da mortalidade por doençacardiovascular, quando usados isoladamente23.

Portanto, recomenda-se evitar o seu emprego comomonoterapia inicial, podendo utilizá-los quandonão se tiver obtido o controle adequado dos níveispressóricos com beta-bloqueadores, inibidores daECA e diuréticos.

Os pacientes macroalbuminúricos devem rece-ber prescrição de dieta hipoprotéica (0,8gr de pro-teína/kg de peso), ser avaliados pelo menos a cadatrês meses e ser feito todo o esforço para a obtençãode um bom controle glicêmico. Recomenda-se tra-tar intensamente os fatores de risco cardiovascularassociados, como por exemplo, a HAS, a dislipi-demia e o tabagismo. Outras complicações do DM,freqüentemente associadas, como a retinopatia,neuropatia, vasculopatia periférica e cardiopatiaisquêmica devem ser pesquisados.

Retinopatia

Na presença de qualquer grau de RD, é crucialprocurar obter o melhor controle possível da pres-são arterial (<130/85 mm Hg), e da glicemia e doperfil lipídico. O tratamento oftalmológico específi-co, de acordo com a linhas gerais do fluxograma emanexo, deverá ser realizado em Centros de Referên-cia capacitados (Figura 2).

Pé em risco de úlceras

A detecção de diminuição de sensibilidade aomonofilamento ou de insuficiência circulatória pe-riférica, assim como a presença de lesões pré-ulcerativas cutâneas ou estruturais, definem o pa-ciente em risco para úlceras. Esses pacientes de-vem receber material informativo de educação(Quadro 5), avaliação freqüente, receber cuidadospor profissional habilitado a cerca do uso de calça-dos adequados e acesso a um tipo de calçado espe-cial, se houver deformidades.

Estratégias

• Conscientizar a população e o poder público daimportância das complicações crônicas através decampanha publicitária em jornais, televisão, cartazespublicitários (out-doors) nas principais cidades do País.• Sensibilizar e priorizar a detecção das complica-ções crônicas nos Programas de Educação e Contro-le de Diabetes no País.• Divulgar as normas através de Revistas Científi-cas (AMB, ABEM), folhetos de divulgação, EncontrosCientíficos. (Programas locais, Harvard-Joslin-SBD,Congressos Nacionais de Diabetes, Endocrinologia,Oftalmologia e Congressos de Clínica Médica).• Sensibilizar os responsáveis pela política de saú-de para o repasse de recursos necessários naimplementação destas medidas através do SistemaÚnico de Saúde.

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GROSS, JL

• Estimular a realização periódica de oficinas paratreinamento teórico-prático destinadas aos clíni-cos, enfermeiros e demais membros das equipes desaúde.• Buscar recursos específicos em agências de finan-ciamento internacionais.

AGRADECIMENTOS

Aos Laboratórios Servier e Biobrás por terem patrocinadoa reunião realizada em São Paulo no dia 18/07/98.

Redação do documento final: Jorge Luiz Gross, MirelaJobim de Azevedo, Sandra Silveiro, Sandra Roberta GouveaFerreira, Domingos Malerbi, Hermelinda Cordeiro Pedrosa.Participantes do Consenso: Adriana Costa e Forti, Ana TeresaMana G. SantoMauro, Antônio Carlos Lerário, Antônio Rober-to Chacra, Antônio Rodrigues Ferreira, Bernardo Leo Waj-chemberg, Ethel Spichler, Helena Schmid, Hermelinda Cor-deiro Pedrosa, Jorge Luiz Gross, Laercio Joel Franco, Laure-nice Pereira Lima, Márcio Nehme, Maria Teresa Zanella,Marília de Brito Gomes, Mirela Jobim de Azevedo, RobertoAbdala Moura, Sandra Roberta Gouvea Ferreira, SandraSilveiro, Simão A Lottenberg, Domingos Malerbi, Ruy Lyra,Reine M. Chaves Fonseca, José Egídio Paulo de Oliveira.

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