artigo original / original article · após mais de 90 dias de imobilização em halo-colete. os...

6
COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17 Fixação posterior C1-C2 com sistema de parafuso e haste – experiência em cinco casos C1-C2 posterior fixation with screw-rod – report of five cases experience Fijación posterior C1-C2 con sistema de tornillo y clavo – la experiencia en cinco casos ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Trabalho realizado no Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil. 1 Ortopedista e Traumatologista do Grupo de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil. 2 Neurocirurgião do Grupo de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil. 3 Neurocirurgião do Pavilhão São José da Santa Casa de Porto Alegre - Porto Alegre (RS), Brasil. 4 Estagiário do Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil. Recebido: 31/08/2005 - Aprovado: 03/12/2006 RESUMO: Objetivo: o objetivo do presente estu- do foi testar a eficácia e segurança da técnica de artrodese posterior C1-C2 utilizando sistema de hastes e mini-pa- rafusos poliaxiais, colocados nas mas- sas laterais de C1 e pedículos de C2. Métodos: cinco pacientes portadores de fraturas do odontóide do tipo II fo- ram tratados cirurgicamente por esta técnica. Um paciente foi tratado preco- cemente, por ser um mau caso para osteossíntese direta do odontóide. Nos outros casos, foi realizada cirur- gia tardia, sendo as indicações uma insuficiência da órtese (halo-colete), e três pseudoartroses do odontóide, após mais de 90 dias de imobilização em halo-colete. Os pacientes foram se- guidos no pós-operatório por um perí- odo médio de 10,2 meses. Resultados: Ernani Vianna Abreu 1 Marcelo Simoni Simões 2 Albert Vincent Berthier Brasil 3 Fernando Gritsch Sanchis 4 ABSTRACT: Objective: the present study attempts to test the safety and efficiency of a C1-C2 posterior fusion technique, with systems of rods and mini polyaxial screws, inserted in C1 lateral masses, and C2 pedicles. Methods: five patients with type II dens fractures were surgically treated by this technique. One patient was operated early, being a bad candidate for direct osteosynthesis of the dens. In the other cases, late surgery was performed, indications being one orthosis insufficiency, and tree pseudoarthrosis of the dens, after more than 90 days of conservative treatment (halo-vest). Patients were followed by a medium of 10.2 months, in the post-operative period. Results: consolidation was observed in all five cases. No RESUMEN: Objectivo: el objective del presente trabajo fue atestar la securidad e efectividad de la tecnica de artrodesis posterior C1-C2, utilizando sistema de barras y mini tornillos poliaxiales, insertados en las massas laterales de C1 y pedículos de C2. Metodos: cin- co pacientes portadores de fracturas del odontoide del tipo II fueron trata- dos quirúrgicamente por esta tecnica. Un paciente fue tratado precozmente, por no ser buen candidato a osteosíntese directa del odontoide. Los otros casos fueron tratados tardíamente, un debido a insuficiencia de la ortesis (halo-chaleco), y los otros tres debido a pseudoartrosis del odontoide, después de más de 90 días de inmovilización en halo-chaleco. Los pacientes fueron seguidos en los fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:30 12

Upload: dangdiep

Post on 06-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

COLUNA/COLUMNA. 2006;5(1):13-18

12

COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17

Fixação posterior C1-C2 com sistema deparafuso e haste – experiência em cinco casos

C1-C2 posterior fixation with screw-rod – report of five cases experience

Fijación posterior C1-C2 con sistema de tornilloy clavo – la experiencia en cinco casos

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

Trabalho realizado no Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil.

1Ortopedista e Traumatologista do Grupo de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil.2Neurocirurgião do Grupo de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil.3Neurocirurgião do Pavilhão São José da Santa Casa de Porto Alegre - Porto Alegre (RS), Brasil.4Estagiário do Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil.

Recebido: 31/08/2005 - Aprovado: 03/12/2006

RESUMO:Objetivo: o objetivo do presente estu-do foi testar a eficácia e segurança datécnica de artrodese posterior C1-C2utilizando sistema de hastes e mini-pa-rafusos poliaxiais, colocados nas mas-sas laterais de C1 e pedículos de C2.Métodos: cinco pacientes portadoresde fraturas do odontóide do tipo II fo-ram tratados cirurgicamente por estatécnica. Um paciente foi tratado preco-cemente, por ser um mau caso paraosteossíntese direta do odontóide.Nos outros casos, foi realizada cirur-gia tardia, sendo as indicações umainsuficiência da órtese (halo-colete), etrês pseudoartroses do odontóide,após mais de 90 dias de imobilizaçãoem halo-colete. Os pacientes foram se-guidos no pós-operatório por um perí-odo médio de 10,2 meses. Resultados:

Ernani Vianna Abreu1

Marcelo Simoni Simões2

Albert Vincent Berthier Brasil3

Fernando Gritsch Sanchis4

ABSTRACT:Objective: the present study attemptsto test the safety and efficiency of aC1-C2 posterior fusion technique,with systems of rods and mini polyaxialscrews, inserted in C1 lateral masses,and C2 pedicles. Methods: fivepatients with type II dens fractureswere surgically treated by thistechnique. One patient was operatedearly, being a bad candidate for directosteosynthesis of the dens. In the othercases, late surgery was performed,indications being one orthosisinsufficiency, and tree pseudoarthrosisof the dens, after more than 90 days ofconservative treatment (halo-vest).Patients were followed by a mediumof 10.2 months, in the post-operativeperiod. Results: consolidation wasobserved in all five cases. No

RESUMEN:Objectivo: el objective del presentetrabajo fue atestar la securidad eefectividad de la tecnica de artrodesisposterior C1-C2, utilizando sistemade barras y mini tornillos poliaxiales,insertados en las massas laterales deC1 y pedículos de C2. Metodos: cin-co pacientes portadores de fracturasdel odontoide del tipo II fueron trata-dos quirúrgicamente por esta tecnica.Un paciente fue tratado precozmente,por no ser buen candidato aosteosíntese directa del odontoide.Los otros casos fueron tratadostardíamente, un debido a insuficienciade la ortesis (halo-chaleco), y losotros tres debido a pseudoartrosis delodontoide, después de más de 90 díasde inmovilización en halo-chaleco.Los pacientes fueron seguidos en los

fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:3012

13

COLUNA/COLUMNA. 2006;5(1):13-18COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17

Fixação posterior C1-C2 com sistema de parafuso e haste – experiência em cinco casos

foi observada consolidação da fraturaem todos os casos. Não ocorreramcomplicações graves, somente um casode infecção superficial, tratada e resol-vida com antibióticoterapia.Conclusão:A fixação posterior rígida C1-C2 commini-parafusos poliaxiais e hastes éuma técnica segura e eficaz, com van-tagens sobre as técnicas correntes deamarras posteriores ou parafusostrans-articulares.

DESCRITORES: Fixação de fraturas/métodos; Processo odontóide/lesões; Consolidação da fratura;Fraturas ósseas/cirurgia

postoperatorios por un periodopromedio de 10.2 meses. Resultados:fue observada consolidación de lafractura en todos los casos. Noocurrieron complicaciones graves,solamente un caso de infección super-ficial, tratada y resuelta con antibió-tico-terapia. Conclusión: la técnicade fijación posterior rígida C1-C2 conmini tornillos poliaxiales y barras essegura y eficaz, con ventajas sobretécnicas corrientes de amarradurasposteriores y tornillos transarticulares.

DESCRIPTORES: Fijación defractura/métodos; Procesoodontoide/lesiones; Curaciónde fractura; Fracturas óseas/cirurgía

significant complications occurred,only one superficial infection of thewound, that responded to antibiotics.Conclusion: Posterior C1-C2 rigidfixation, with mini poly-axial screwsand rods is a safe and effective technique,with advantages over wiring or trans-articular fixation.

KEYWORDS: Fracture fixation/methods; Odontoid process/injuries; Fracture healing;Fractures, bone/surgery

INTRODUÇÃOA instabilidade atlantoaxial pode ser conseqüência de condi-ções comuns, incluindo causas traumáticas, reumatológicas, con-gênitas, infecciosas e neoplásicas1-2. A complexa anatomia des-sa região, devida às suas necessidades mecanicas únicas, temsido um desafio na busca de uma técnica de fixação cirúrgicauniversalmente satisfatória. Neste trabalho, apresentamos nos-sa experiência com a técnica de fixação posterior rígida C1-C2com mini-parafusos poliaxiais e hastes, que nos parece ser atécnica mais versátil para o tratamento cirúrgico da instabilidadeatlantoaxial por via posterior, apresentando diversas vantagenssobre as técnicas tradicionais de fixação posterior com amarrassublaminares ou parafusos trans-articulares de Margerl2-3. Omenor risco de danos às estruturas neurais e vasculares, a maiorfacilidade de redução das lesões, a possibilidade de aplicaçãoem uma grande gama de afecções, e os altos índices de consoli-dação, estão entre as vantagens descritas1-3.

MÉTODOSCinco pacientes portadores de fraturas do odontóide do tipo II deAnderson foram submetidos à artrodese com instrumentaçãoposterior C1-C2. Foi utilizado sistema de mini-parafusos poliaxiaise hastes, pela equipe do Centro de Cirurgia da Coluna, em diferen-tes hospitais. Três pacientes eram do sexo masculino e dois dofeminino. A média de idade foi de 50,4 anos (mínimo de 45 e máximode 73 anos). Todos os pacientes receberam o primeiro atendimen-to e as primeiras medidas terapêuticas por outras equipes, sendoencaminhados em fase tardia da doença, para o tratamento cirúrgi-co. Em quatro casos foi instituído o tratamento conservador comhalo-colete como primeira opção. Um destes pacientes foi opera-do com 40 dias de imobilização, devido à insuficiência da órteseem manter a redução da lesão. Outros dois pacientes foram opera-dos com aproximadamente 90 dias de evolução, devido à falha naconsolidação e um com 150 dias de evolução, devido à pseudartroseclara (Figura 1). Apenas um dos pacientes foi submetido à fixaçãoC1-C2 em fase precoce, sendo operado com sete dias de evolução

Figura 2Reconstrução sagital de

TC demonstrandodeslocamento anterior do

odontóide

Figura 1Reconstruções detomografiacomputadorizadamostrando fratura doodontóide Tipo II deAnderson, com 90 diasde evolução

da fratura. Neste caso, a paciente foi encaminhada por recusa aouso de órteses e a técnica escolhida foi esta por tratar-se de umapaciente idosa (73 anos), osteoporótica, com fratura comobliqüidade e deslocamento anterior do odontóide, o que nospareceu ruim para a síntese direta (Figura 2).

fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:3113

COLUNA/COLUMNA. 2006;5(1):13-18

14 Abreu EV, Simões MS, Brasil AVB, Sanchis FG

COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17

Técnica cirúrgicaO paciente, sob anestesia geral com intubação oro-traqueal,é posicionado em decúbito ventral, com o tronco apoiadoem coxins para reduzir a pressão sobre o abdômen. A face éapoiada em uma espuma emborrachada, devendo-se ter cui-dado para evitar a compressão ocular. Os braços sãoposicionados ao longo do tronco e a equipe de anestesia eseu equipamento fica localizada ao pé do paciente. Foi rea-lizada antibiótico-profilaxia com dois gramas de Cefazolinaendovenosa, na sala de cirurgia, com repetição da aplicaçãode um grama, aplicado duas horas após a dose inicial. Foimantido o antibiótico por um período de 48hs no pós-ope-ratório (um grama EV de 6/6hs). Para a realização adequadada técnica é necessário um aparelho de radioscopia trans-operatória e uma broca com de alta velocidade.

Em nossa casuística, três pacientes já estavam com halo-colete no pré-operatório, com alinhamento adequado da fra-tura, sendo operados com a órtese posicionada e que foiretirada no pós-operatório imediato (Figura 3). É interessan-te utilizar apoios para a cabeça radio-transparentes eposicionar o paciente com a mandíbula aberta, de forma apermitir radioscopia em incidência ântero-posterior.

Os campos são colocados deixando acesso para a retira-da de enxerto ósseo do ilíaco. A posição do complexo C1-C2deve ser avaliada com o intensificador de imagens em am-bos os planos, antes de realizar qualquer manipulação dopescoço. A boa exposição dos elementos posteriores podeser obtida com o pescoço do paciente flexionado ao máxi-mo, mas, em nossa casuística, isso foi limitado pelo posi-cionamento em halo-colete em três casos e por alteraçõesartrósicas em pacientes mais idosos, com estenose de canalcervical.

A abordagem foi feita por incisão mediana, localizadaentre a protuberância occipital externa e o processo espi-nhoso de C2. A dissecção muscular e a hemostasia foramrealizadas de maneira usual. Não foi necessário expor asjuntas C2-C3. Utilizamos parafusos de titânio poliaxiais comdiâmetros de 3,5 ou 4,0 mm, com comprimento variando de18 a 30 mm e hastes de diâmetro 4,0 mm, produzidos pelaEquimed, em Porto Alegre. O mecanismo poliaxial da cabeçado parafuso permite mobilidade com angulação máxima de40 graus. O ponto exato de entrada para o parafuso de mas-sa lateral de C1, como descrito por Harms e Melcher, estálocalizado no meio da junção do arco posterior C1 com oponto médio das partes posteriores e inferiores da massalateral C11-2. A massa lateral de C1 está localizada aproxima-damente na largura de 2,0 cm lateralmente ao tubérculo pos-terior do Atlas2-5. A separação cuidadosa do tecidoparaganglial da parte inferior do arco anterior C1 com umpequeno elevador de periósteo permite a segura retraçãodo gânglio da raiz dorsal C2 caudalmente, para expor a parteinferior da massa lateral do C1. Nesse ponto, pode ocorrersangramento do plexo venoso epidural entre a junta C1-C2,controlável com uma combinação de bipolar, Gelfoam® ecotonóides. O ponto de entrada para o parafuso é marcadocom uma broca de alta velocidade, para evitar o deslizamento

Figura 3Posicionamento do paciente para a cirurgia com halo-colete

do ponto de contato. Deve-se tomar cuidado com a artériavertebral, localizada em seu sulco, na superfície cefálica doarco posterior de C16. Em três de nossos casos utilizamosum ponto de entrada diferente, no centro da massa lateralde C1, por meio do arco posterior. Para este tipo de coloca-ção do parafuso é necessário que o arco posterior seja es-pesso o bastante para acomodar o parafuso sem ser violadosuperiormente, o que poderia causar lesão da artéria verte-bral2,6. Depois de feito o orifício piloto, com trajetória sagitalparalela ao plano do arco posterior de C1, e uma convergên-cia de cinco a dez graus, este canal é preparado com umafresa macho, e o parafuso com o comprimento adequado écolocado, sendo que não fizemos questão de utilizar para-fusos bicorticais. A imagem fluoroscópica deve ser usadadurante todo o processo.

A exposição do ponto de entrada para o parafuso de C2é mais fácil do que para o parafuso de C1, embora não hajaum padrão claro para este ponto1-2,7. O ponto de entradaescolhido geralmente é definido pela intersecção de duaslinhas, representando o meio das pars interarticularis deC2 e o meio da lâmina de C2. Também é possível utilizar umponto de entrada levemente medial e superior á intersecçãodessas linhas. O ponto de entrada do parafuso pedicular deC2 é marcado com uma broca de alta velocidade com pontafina. A trajetória da perfuração é definida pelos limites intra-operatórios, pelas imagens axiais de tomografia compu-tadorizada pré-operatória, e pelas imagens guiadas defluoroscopia lateral. A direção da perfuração é aproximada-mente 20 a 30 graus mediais e 20 a 30 graus cefálicos, se-guindo as superfícies superior e medial do istmo de C2 res-peitadas as variações anatômicas. Assim como em C1, oorifício piloto é feito com uma broca de 2,0 mm, e preparadocom fresa macho. A integridade do orifício piloto é verificadacom um palpador de ponta cega, e os parafusos de 4,0 mmde diâmetro e comprimento apropriado são colocados.

fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:3114

15

COLUNA/COLUMNA. 2006;5(1):13-18

Fixação posterior C1-C2 com sistema de parafuso e haste – experiência em cinco casos

COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17

Após a colocação do parafuso, quando necessário, rea-lizamos a redução da fratura. A redução pode ser feita mon-tando-se a haste nos parafusos sem fixá-la de forma rígida,e então mobilizando os parafusos até a posição adequadado complexo C1-C2, conferida por radioscopia, onde se faza fixação final da haste com bloqueio dos parafusos.

A decorticação do arco posterior de C1 e da lâmina de C2é feita com uma broca esférica até ocorrer o sangramentoósseo, e o espaço entre C1 e C2 é coberto com placa deGelfoam®. Utilizamos como enxerto uma pequena quantidadede osso esponjoso retirado do osso ilíaco posterior. O mes-mo é colocado sobre os elementos posteriores decorticados,evitando a compressão do nervo. Não é feita a colocação deenxerto intra-articular entre C1 e C2 (Figuras 4 e 5).

Os afastadores são removidos para o controlefluoroscópico final, confirmando a posição adequada dosparafusos e redução da fratura. A área cirúrgica é irrigadacom solução salina e os músculos profundos inspecionadospara qualquer fonte de sangramento restante, que são, en-tão, controladas por coagulação bipolar. È usado um drenode sucção 1.8, na camada muscular lateral da incisão. Ofechamento da incisão é feito em três camadas separadas.

Utilizamos em nossos pacientes uma órtese tipo colar cervicalde espuma, para conforto, por duas a três semanas após a cirurgia.Os pacientes são induzidos a deambular no primeiro dia pós-operatório sob supervisão dos fisioterapeutas. Os drenos sãoremovidos no segundo dia após a cirurgia. Antes da liberação dospacientes, são realizadas radiografias da junção crânio-cervical.

Os pacientes tiveram alta de três a dez dias após a cirurgia.Exames complementares posteriores foram rotineiramente mar-cados para quatro, oito e 12 semanas após o procedimento inici-al e consistiram em exames clínicos, neurológicos e radiográficos.Todos os pacientes foram avaliados por radiografia (Figuras 6 e7) e tomografia computadorizada no pós-operatório para avalia-ção da consolidação.

RESULTADOSOs pacientes foram seguidos no pós-operatório por um perío-do que variou de oito a 16 meses (média 10,2 meses). Dos cincopacientes, somente um apresentou uma complicação leve, re-presentada por infecção superficial da ferida operatória, quefoi tratada com antibióticoterapia adequada, tendo evoluídosatisfatoriamente. Os demais pacientes não apresentaram quais-quer complicações, apresentando boa evolução clínica e radi-ológica, tanto no pós-operatório imediato como tardio.

O tempo médio do procedimento foi de duas horas (mí-nimo de uma hora e meia e máximo de três horas). O san-gramento variou entre 200 e 380 ml (média 262 ml). Não ocor-reu nenhum dano às estruturas neurais e/ou vasculares noscasos relatados. As fraturas de todos os pacientes evoluí-ram para a consolidação, comprovadas por meio de radio-grafias e tomografia computadorizada dinâmica multi-slice.

DISCUSSÃOA instabilidade atlantoaxial ocorre como conseqüência dediversas condições comuns, incluindo causas traumáticas,

Figura 4Enxerto posicionado sobreos elementos posteriores

Figura 5 Radiografia para controleem perfil com enxerto sobreos elementos posteriores

Figura 6Radiografia trans-oral paracontrole com oito semanaspós-operatório

Figura 7Radiografia em perfil paracontrole pós-operatório.Oito semanas de evolução

reumatológicas, congênitas, infecciosas e neoplásicas. Acomplexa anatomia dessa região, devidas à sua necessida-de mecânica únicas, tem sido um desafio na busca de umatécnica de fixação cirúrgica universalmente satisfatória.

As técnicas tradicionais de amarria posterior, como atécnica de Gallie e outras semelhantes, são insatisfatórias,tanto devido ao risco de dano à medula espinhal durante apassagem dos fios, como às propriedades mecânicas daconstrução, formando uma banda de tensão posterior nãorígida e instável em rotação, que tem propensão à perda daredução das lesões C1-C2, levando à necessidade de imobi-lização pós-operatória com halo-colete nos casos de insta-bilidade maior1,8-10.

A técnica de fixação C1-C2 de Magerl, com parafusostrans-articulares, foi um avanço importante, proporcionan-do uma construção estável, inclusive em rotação, e elimi-nando a necessidade de fixação externa rígida pós-opertória.Porém, ela ainda apresenta muitos problemas, como as altastaxas de dano à artéria vertebral (AV), a necessidade deincisões longas ou múltiplas, com dissecção extensa, devi-do ao ângulo necessário para colocação dos parafusos e anecessidade de redução da lesão C1-C2 antes e durante acirurgia. Além disso, não é infreqüente que a técnica sejaimpossível de executar, em razão do perfil das curvas sagitaiscérvico-torácicas, ou de alterações ou variações na anato-mia da AV2-3, 11-12.

fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:3115

COLUNA/COLUMNA. 2006;5(1):13-18

16 Abreu EV, Simões MS, Brasil AVB, Sanchis FG

COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17

Os sistemas de mini-parafusos poliaxiais, para uso na re-gião cervical, permitiram que Harms e Melcher, na Alemanha,desenvolvessem uma técnica que tornou possível a fixaçãorígida C1-C2 de forma altamente adaptável, resolvendo mui-tos desses problemas. Nesta técnica, são colocados parafu-sos poliaxiais nas massas laterais de C1 e nos pedículos deC2, e são utilizadas hastes como elemento longitudinal defixação. Entre as vantagens dessa técnica estão a fixaçãorígida, as altas taxas de fusão, e a possibilidade de reduçãotrans-operatória direta da lesão1-3,13. Também é possível tes-tar várias posições e manobras de redução, checadas pormeio da radioscopia, sem a necessidade de colocações e reti-radas repetidas de parafusos. Além disso, a colocação deparafusos de massa lateral em C1 e pediculares em C2 propi-cia maior margem de segurança com relação à artéria vertebrale uma elevada flexibilidade de adaptação quando nos depara-mos com uma anatomia incomum ou alterada. Esse tipo defixação requer uma incisão única e pequena, na região sub-occipital, com menor dissecção dos tecidos moles, dispen-sando, ainda, a imobilização externa pós-operatória. A cifosecérvico-torácica não é um problema para a execução da técni-ca. Da mesma forma, evita-se os perigos da passagem sub-laminar de fios, além da construção C1-2 poder ser facilmenteintegrada aos elementos de fixação occipitais ou sub-axiais,em casos de lesões com maiores extensões. Além disso, essesistema de fixação com haste e parafusos tem rigidez equiva-lente à conseguida com os parafusos transarticulares, no quediz respeito à redução da mobilidade atlantoaxial10.

As indicações para a instrumentação atlantoaxial poste-rior com sistema de parafusos e hastes incluem todas ascondições em que tradicionalmente se indica a fixaçãotransarticular popularizada por Magerl. Essas indicações,entretanto, se expandem enormemente pela flexibilidade esegurança possibilitadas por essa técnica.

As afecções mais comuns tratadas por essa técnica sãoas fraturas do odontóide do tipo II14, principalmente noscasos de pseudartrose, tratamento tardio, com traço de fra-tura oblíquo com orientação anterior, ou pacientes mais ido-sos, com qualidade óssea ruim, e a instabilidade atlanto-axial em pacientes com artrite reumatóide. A técnica podeser indicada em qualquer tipo de afecção, que apresentecom instabilidade C1-C2 com indicação para fixação interna,com ou sem redução.

Outras indicações para a instrumentação atlantoaxialposterior rígida existem em pacientes com malformações doodontóide (e.g: os odontoideum sintomático), malformaçõescongênitas variadas, e instabilidade atlantoaxial sintomáti-ca em pacientes com a síndrome de Down1,2. Pacientes comsubluxação rotatória fixa C1-C2, causada por trauma ou in-fecção, nos quais o tratamento por redução fechada tenhafalhado, tornam-se candidatos para a redução aberta cominstrumentação de C1-C2. Nesses casos, pode-se utilizar osimplantes apenas como fixação interna temporária, remo-vendo o sistema após três a quatro meses2,4.

Indicações para fixação atlantoaxial podem também exis-tir após procedimentos que levem à instabilidade iatrogênica,

como a ressecção de tumores da região por via anterior, oude algumas situações de ressecção trans-oral da apófiseodontóide.

Os parafusos poliaxiais e as hastes utilizadas nessa téc-nica também podem ser integrados como parte de constru-ções mais extensas, podendo ser utilizados do occipital atéa coluna torácica, em pacientes com comprometimento oumúltiplos níveis, como artrite reumatóide, infecções ou tu-mores2,13,15.

Nossa casuística foi composta apenas por pacientes comfraturas de odontóide do tipo II de Anderson. A maioria dospacientes com fraturas deste tipo não deslocadas, oudeslocadas posteriormente, ainda são melhor tratados porfixação direta anterior com parafuso de odontóide. Entre-tanto, pode ser muito difícil obter uma boa redução de fratu-ras muito deslocadas, de fraturas oblíquas com desloca-mento anterior da odontóide, de fraturas do tipo IIA, comcominução da base do odontóide, ou fraturas do tipo IIIcom cominução. Nesses casos, a colocação de um parafusoanterior pode ser ineficiente e perigosa, e a fixação posteriorrígida é uma boa alternativa.

A trajetória dos parafusos nos pedículos de C2, maiscefálica e mediana, em comparação com a trajetória requeridapor uma técnica de fixação trans-articular, reduz o risco dedano à artéria vertebral. Apesar disso, os pacientes com umforame transverso de C2 muito extenso, ou com outros ti-pos de trajetória anatômica aberrante da artéria vertebral,podem não ser os candidatos ideais para cirurgias com atécnica. Fraturas das massas laterais do Atlas ou do Axis,bem como a sub-luxação ou erosões massivas, como aspresentes na artrite reumatóide, podem obscurecer as in-correções anatômicas, tornando a colocação dos parafusosmais difícil. Por essa razão, muitos autores não recomendama escolha desses casos para o aprendizado da técnica.

Mesmo estando limitada a cinco casos de fratura doodontóide, a nossa experiência com a técnica de fixaçãoposterior rígida C1-C2 com mini-parafusos poliaxiais ehastes nos pareceu suficiente para demonstrar que estaé a técnica mais versátil para o tratamento cirúrgico dainstabilidade atlantoaxial por via posterior, apresentan-do, ainda, diversas vantagens sobre as técnicas maistradicionais, em termos de resultados, segurança, e fa-cilidade de aplicação da técnica.

CONCLUSÃOA fixação do complexo atlantoaxial usando mini-parafu-sos poliaxiais e hastes é uma técnica segura e confiável,podendo ser considerada uma alternativa eficiente àstécnicas tradicionais de fixação posterior previamenterelatadas.

O menor risco de lesão às estruturas nervosas evasculares, associado a uma alta taxa de consolidaçãodas fraturas, e a uma grande versatilidade de aplica-ções, leva-nos a acreditar que o esforço inicial para su-perar a curva de aprendizado associada a essa novatécnica demonstra ser bastante recompensador.

fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:3116

17

COLUNA/COLUMNA. 2006;5(1):13-18

Correspondência

Centro de Cirurgia da Coluna

Centro Clínico do Hospital Mãe de Deus

Rua Costa nº 30 Sala 603

Porto Alegre (RS), Brasil

CEP: 90110-270

Tel: (51) 32302728

E-mail: [email protected]

REFERÊNCIAS1. Bradford DS, Zdeblick TA, editors.

Master techniques in orthopaedicsurgery: the spine. 2nd ed.Philadelphia: Lippincott Williams &Wilkins; 2004. p. 129-45.

2. Harms J, Melcher RP. Posterior C1-C2fusion with polyaxial screw and rodfixation. Spine. 2001; 26(22):2467-71.

3. Margerl F, Seemann PS. Stableposterior fusion of the atlas and axisby transarticular screw fixation.Cervical. In: Kehr P, Weidner A,editors. Cervical spine I. Wien:Springer; 1987. pp 322-7.

4. Haid RW Jr. C1-C2 transarticularscrew fixation: technical aspects.Neurosurgery. 2001; 49(1): 71-4.

5. Ebraheim N, Rollins JR Jr, Xu R,Jackson WT. Anatomic considerationof C2 pedicle screw placement. Spine.1996; 21(6): 691-5.

6. Abou Madawi A, Solanki G, Casey AT,Crockard HA. Variation of the groovein the axis vertebra for the vertebralartery. Implications forinstrumentation. J Bone Joint Surg Br.1997; 79(5): 820-3.

7. Paramore CG, Dickman CA, SonntagVK. The anatomical suitability of theC1-2 complex of the transarticularscrew fixation. J Neurosurg. 1996,85(2): 221-4.

8. Kim SM, Lim TJ, Paterno J, HwangTJ, Lee KW, Balabhadra RS, Kim DH.Biomechanical comparison of anteriorand posterior stabilization methods inatlantoaxial instability. J Neurosurg.2004; 100(3 Suppl Spine):277-83.

9. Puttlitz CM, Melcher RP, KleinstueckFS, Harms J, Bradford DS, Lotz JC.Stability analysis of craniovertebraljunction fixation techniques. J BoneJoint Surg Am. 2004; 86-A(3):561-8.

10. Melcher RP, Puttlitz CM, KleinstueckFS, Lotz JC, Harms J, Bradford DS.Biomechanical testing of posterioratlantoaxial fixation techniques. Spine.2002; 27(22):2435-40.

11. Richter M, Wilke HJ, Kluger P,Neller S, Claes L, Puhl W.Biomechanical evaluation of a newmodular rod-screw implant system forposterior instrumentation of theoccipito-cervical spine: in-vitro

comparison with two establishedimplant systems. Eur Spine J. 2000;9(5):417-25.

12. Abumi K, Takada T, Shono Y, KanedaK, Fujiya M. Posterior occipitocervicalreconstruction using cervical pediclescrews and plate-rod systems. Spine.1999; 24(14):1425-34.

13. Dickman CA, Sonntag VK. PosteriorC1-C2 transarticular screw fixation foratlantoaxial arthrodesis. Neurosurgery.1998; 43(2):275-80; discussion 280-1.

14. Anderson LD, D’Alonzo RT.Fractures of the odontoid process ofthe axis. J Bone Joint Surg Am. 1974;56(8): 1663-74.

15. Haid RW Jr, Subach BR, McLaughlinMR, Rodts GE Jr, Wahlig JB Jr. C1-C2 transarticular screw fixation foratlantoaxial instability: a 6-yearexperience. Neurosurery. 2001; 49(1):65-8; discussion 69-70.

Fixação posterior C1-C2 com sistema de parafuso e haste – experiência em cinco casos

COLUNA/COLUMNA. 2007;6(1):12-17

fixacao_posterior_210207.pmd 02/03/2007, 15:3117