artigo julianna formiga

10

Click here to load reader

Upload: nuvemdig

Post on 05-Jul-2015

396 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Artigo Julianna Formiga

Corpo e Tecnologia:

Os Dispositivos Tecnológicos como Extensão ou Distensão do Homem?

Maria Julianna Formiga Moura Sinval1

“Existir é, de maneira crescente, estar ligado a tela e interconectado nas redes”

Gilles Lipovetsky, 2007, p.257

A citação de Gilles Lipovetisky aponta com clareza uma situação

comum nos dias de hoje. Estamos vivendo a era da tela/ecrã global, isto é, a

“ecrãnoosfera”, onde um fluxo de imagens circula em telas. Nos aeroportos,

restaurantes, bares, elevadores, metrôs, carro, aviões, por todos os lugares

encontramos telas, sejam telas planas ou portáteis, elas se proliferaram em

todas as dimensões.

Dentro dessa moldura, como se reconfigura o corpo humano na

onipresença de telas que se interconectam? Qual a relação do nosso corpo

com a tecnologia? Que corpo é esse no mundo das redes, já que é um único

corpo que trabalha em dois ambientes: on line e off line? Desde logo, o corpo,

como objeto de estudo apresenta-se do ponto de vista da teoria corpomídia

(Katz e Greiner, 2005), onde a mídia à qual a teoria se refere diz respeito ao

processo evolutivo de selecionar informações que vão constituindo o corpo, isto

é, a informação é transmitida em processo de contaminação.

Esse corpo sob constante interrogação tornou-se um problema na

entrada do sec. XXI e tem ocupado o centro dos questionamentos sobre o que

é ser humano diante de tantas invenções tecnológicas. O corpo biocibernético,

o corpo interfacetado, pós-humano e tudo que tange a relação corpo-tecnologia

foram discutidos a exaustão, mas pouco espaço é dedicado para as mudanças

de ordem cognitiva promovidas pelas distintas tecnologias, ou seja, pouco se 1 Jornalista, Doutoranda e Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC SP. Professora de semiótica e Cibercultura da FANOR - Faculdades Nordeste. E-mail: [email protected]

Page 2: Artigo Julianna Formiga

investiga sobre a transformação do corpo diante das formas de comunicação

que continuam a ser inventadas. Portanto, para lidar com o mundo das redes

sociais na internet, alguns conceitos devem ser rearticulados, já que esse

corpo ativo e em constante transformação, a partir das relações com o meio

ambiente, reconfigura-se na vida permanentemente on line.

“TODO CORPO É CORPOMÍDIA”

A palavra corpo pode ser empregada em sentidos distintos. Portanto,

ao tratar do corpo é preciso deixar claro de que corpo se fala. No presente

artigo, devemos compreender o corpo “como sendo um contínuo entre o

mental, o neuronal, o carnal e o ambiental” (GREINER, KATZ, 2001, p.89). Não

se separa corpo, mente, self e psique. De acordo com Greiner (2005) o

corpomídia é um conjunto de informações, que se esforça para compreender

como funciona. Explica a autora:

O corpo não é um meio por onde a informação simplesmente passa, pois toda informação que chega entra em negociação com as que já estão. O corpo é o resultado desses cruzamentos, e não um lugar onde as informações são apenas abrigadas. É com esta noção de mídia de si mesmo que o corpomídia lida, e não com a idéia de mídia pensada como veículo de transmissão. A mídia à qual o corpomídia se refere diz respeito ao processo evolutivo de selecionar informações que vão constituindo o corpo. A informação se transmite em processo de contaminação.

Portanto, não é um corpo embalagem, moldado, mas um corpo em

fluxo, em constante transformação. Também não se trata da noção de corpo-

máquina, onde uma informação de fora é processada por uma máquina e logo

depois é devolvida ao ambiente, ou seja, a teoria corpomídia se opõe ao

modelo computacional de comunicação.

Trata-se do corpo relacionado com o ambiente. Isso significa que

aquele ambiente é assim por causa daqueles corpos e vice-versa. Essa

Page 3: Artigo Julianna Formiga

conexão corpo-ambiente acontece através dos processos co-evolutivos e

produz uma rede de pré-disposições perceptuais, motoras, de aprendizado e

emocionais. Devemos compreender este movimento como sentido de

adaptação a novas situações. Helena Katz2 explica que “o desejo de

permanecer leva à necessidade de fazer outro a partir de si mesmo, e só pode

se realizar porque no mundo onde vivemos, as informações tendem a operar

dentro de um processo permanente de comunicação”.

Se todo corpo é corpomídia de si mesmo, devemos deixar de lado a

compreensão habitual de mídia e não tratá-la como um meio de transmissão.

Pois na mídia que o corpomídia ocupa-se a informação é preservada no corpo

e se torna corpo. Mas há um limite de preservação que garante a sobrevivência

de cada ser vivo em meio a essa constante transformação. Portanto, não

podemos afirmar que o corpo é, mas que o corpo está sendo, o corpo é um

estado dessa coleção de informações que vai mudando, isto é, corpomídia da

evolução.

QUAL O AMBIENTE DO CORPO HOJE?

Já que a teoria corpomídia é corpo e ambiente, se faz necessário

compreender qual o ambiente do corpo hoje. Em tempos de agora, o homem

estar permanentemente ligado ao conjunto das telas, seja por celular ou

computador, a tela permite a conexão com outras telas, marcando atos de sua

vida cotidiana.

De acordo com Lipovetsky (2007), o nascimento das telas se deu no

cinema3 - a tela suprema - , um portal luminoso que abriu outros mundos4 e

educou o olhar das pessoas durante muito tempo. Com as invenções

tecnológicas houve uma mudança progressiva e a lógica high-tech

2 Katz, Helena. Todo corpo é copo mídia. In ComCiência – Revista Eletrônica de Jornalismo Científico http://www.comciencia.br/comciencia/ – 10/03/2006. 3 Depende do lugar a história da tela começa pela televisão. 4 Os stars lançaram moda: A boina de Garbo, a camiseta branca de Brando, o vestido xadrex vichy, como também modificaram os códigos de beleza etc.

Page 4: Artigo Julianna Formiga

revolucionou os cenários e efeitos, tornando possível a criação de mundos e

cenas5 outrora impossíveis de visualizar, um cinema marcado pela velocidade.

A televisão, a partir da década de 1950, penetrou nos lares e nas

décadas seguintes houve uma multiplicação exponencial de telas. No entanto,

o cinema deixa de ser a tela suprema e vai sendo traduzido para outras telas:

computador, videogames, máquinas fotográficas digitais, celular, telas

decorativas de plasma penduradas na parede, painéis eletrônicos, GPS na tela

de bordo do carro indicando o caminho a seguir, imagens médicas

computadorizadas, telas que mostram o interior do corpo etc.

Nossa sociedade investe todas as fichas na criação de mais

tecnologias de conectividade. E essa hiper-conectividade mudou nossas vidas

nesse inicio de século, transformando nosso modo de viver e nossa relação

com a informação. Todos os investimentos na área da educação são

investimentos em tecnologia e para se diferenciar dos concorrentes, alguns

colégios substituíram o tradicional quadro retangular pelas lousas digitais ou

interativas.

Em 2010 o fato de maior relevância foi o crescimento do Facebook. O

ritmo de adesão ao site concebido por Mark Zuckerberg foi bem mais rápido do

que o fenômeno Orkut. O relatório, que faz uma análise do mercado de mídias

sociais na América Latina, mostra que o uso das redes cresceu 16% na região

em 2010, enquanto o tempo gasto nesse tipo de serviço aumentou 88%6. A

cada login no Facebook, os brasileiros permanecem, no mínimo 18 minutos e

19 segundos na rede social7. 90,8% dos brasileiros com acesso à internet

usam redes sociais. Portanto, esses dados confirmam que as Redes Sociais

Facebook e Twitter se apropriam do tempo de vida das pessoas. Hoje com 800

milhões de usuários, o Facebook devora o tempo de 800 milhões de pessoas.

E num “clique para atualizar” 8 desenfreado relações estão sendo capitalizadas.

O uso abusivo das redes sociais na Internet se tornou uma prática. Ao entrar

5 Titanic, Jurassic Park, O Senhor dos Anéis. 6 De acordo com a pesquisa realizada pela comScore, divulgada no portal Terra (acessado em 17 de novembro de 2011). 7 De acordo com um estudo da Experian. 8 Essa angústia causada pela sensação de ficar off-line já tem nome: FOMO, sigla em inglês para “fear of missing out”, ou “medo de perder alguma coisa. O comportamento Fomo já foi considerado uma patologia a ser curada, mas hoje não podemos afirmar que um sujeito que se conecta frequentemente possui um transtorno, é apenas um jeito de participar.

Page 5: Artigo Julianna Formiga

no Facebook estou aderindo a uma prática e não ao objeto. As mudanças da

tecnologia foram modificando o nosso modo de olhar o mundo, o nosso corpo.

E com o excesso de tecnologia podemos observar um novo jeito de viver on

line. Vivemos um agora que apesar de curto, se tornou mais denso.

QUE CORPO É ESSE NO MUNDO DAS REDES?

Evolutivamente o corpo vai se transformando por conta da tecnologia.

Já há quase um consenso entre os cientistas de que a tecnologia vem

acelerando a evolução do ser humano9. Robert W. Fogel e seus coautores10

afirmam nas suas pesquisas que na maior parte do mundo o tamanho do

corpo, o formato e longevidade mudaram de forma acelerada nos últimos três

séculos. Os avanços na produção de alimentos e na saúde pública tornam

mais ágil a evolução darwiniana. Todas essas alterações acontecem em um

período de tempo curto. Pesquisas cognitivas já estão sendo realizadas em

alguns laboratórios e comprovam que os números de padrões de peso e altura

na espécie humana estão mudando rapidamente. Um norueguês de 22 anos

media 1,79 cm no final de século 20, ou seja, 14 cm a mais que a média do

final do século 18. Evolutivamente 200 anos é pouco para uma mudança.

As teorias evolutivas facilitam o entendimento de que uma vez que o

corpo fica adaptado com o ambiente, ele tende a deixar rapidamente de ter

estímulos de investigação nesse ambiente porque ele já está adaptado, ou

seja, o ambiente já está mapeado e ele não possui mais estímulos cognitivos

exploratórios, estímulos os quais nós humanos não conseguimos viver sem.

Quando sentávamos frente ao computador rapidamente ficávamos cansados,

mas hoje não sentimos mais a dor nas costas ou arder os olhos, pois

evolutivamente a informação já foi absorvida. Outro sinal importante é de que o

corpo vai ficando treinado com sobreposições de imagens e simultaneidade, se

ele não é estimulado dessa forma, ele se fadiga e tende ao desligamento. Cada

vez mais é necessário mais estímulos para ficarmos atentos. Quando

9 COHEN, Patrícia. Tecnologia acelerou a evolução do homem, Patrícia Cohen. Fonte: http://www1.folha.uol.com.br. 10 Roderick Floud, Bernad Harris e Sok Chul Hong.

Page 6: Artigo Julianna Formiga

assistimos a um filme que não trabalha com a velocidade, desligamos a tensão

e dormimos.

De acordo com Helena Katz11, está acontecendo cognitivamente uma

mudança, ou seja, uma necessidade frequente de muita estimulação para

manter a atenção. Pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento -

psicologia, comunicação, ciências cognitivas etc – buscam entender que tipo

de corpo somos nós, usuários (dependentes e intensivos) do computador? Pois

o nosso corpo hoje, que funciona mediado por telas é outro tipo de corpo, ele

exercita o dom da ubiquidade. Ao mesmo tempo em que responde um e-mail,

compartilha um link no facebook, troca mensagens rápidas no MSN e ver um

site. E todas essas atividades realizadas ao mesmo tempo possuem

consequências cognitivas. Permanecer durante horas na frente da tela é um

treino. E isso nos habilita.

Portanto, um corpo que vai treinando cada vez mais fazer mais de uma

mesma coisa ao mesmo tempo, aos poucos domina essa habilidade e fica

confortável. Essa agilidade se materializa no corpo e hoje somos impacientes

com a lentidão. O que praticamos socialmente é muito mais do que

cognitivamente treinamos no computador, pois esse corpo não é de agora, ele

foi se constituindo.

Não podemos afirmar que há uma ruptura do analógico com o digital,

pois não estanca, não rompe, não empobrece, mas desenvolve-se outra

habilidade. Fluxos de antes viram agora. É o caso da Tv que não aboliu o rádio,

apenas redefiniu. Por que no tablet é preciso fazer de conta que virou a página

lendo o jornal? Porque o corpo é uma coleção de informações que se

modificam dentro do ambiente e precisa se adaptar para sobreviver. E com a

necessidade de sobrevivência surge a necessidade de fazer parte do mundo

on line.

A relação do homem com a tecnologia possui a mesma natureza ao

longo da história. O que se renova é a materialidade da tecnologia e não a

nossa relação com a tecnologia. Mas nossa tendência é sempre olhar para o

que está acontecendo no momento como algo que está sendo inaugurado. O

mundo até aquela tecnologia não é mais suficiente, não dá pra continuar 11 Comentários da Profª Helena Katz nas aulas do programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica na Puc SP no 2º semestre 2011.

Page 7: Artigo Julianna Formiga

vivendo nele. É preciso passar para o novo mundo que aquela tecnologia

inaugurou, pois desautoriza o mundo até então existente.

Que tipo de provocação a fotografia trouxe para a pintura? Que tipo de

provocação o cinema trouxe para a fotografia? Que tipo de provocação a

televisão trouxe para o rádio? É a mesma natureza, ou seja, a desautorização.

Obrigando a outra tecnologia a especificar-se. Tem um pedaço da nova

tecnologia que ainda é vinculado à anterior. A televisão começa muito mais

sendo um rádio com poucas imagens. Mas logo o rádio foi obrigado a se

singularizar, ou seja, era necessário descobrir o que é que só o rádio tinha que

a televisão não poderia ter. E o rádio descobriu que tinha a possibilidade de ser

mais ágil por conta do tipo de tecnologia. E a televisão buscou a espacialidade

dela, pois não podia mais ser só um rádio com imagens, pois o rádio com sua

velocidade já tinha dado a notícia.

Os hábitos de um telespectador se repetem diariamente. E o corpo

acaba se habituando. Estudos mostram que até o final dos anos 80 os blocos

de intervalos eram de 8 minutos. Do final dos anos 80 para os anos 90 em

diante foi caindo até os blocos serem de 4 minutos. O corpo que estava

habituado a ficar sentado prestando atenção por bloco de 8 min, encurta o

tempo de treino que fica sentado prestando atenção. À medida que vai sendo

encurtado, cria uma familiaridade rítmica no modo de lidar com a informação. E

isso vai padronizando as outras emissoras. Vai diminuindo o treino da atenção,

tornando o corpo indisponível para situações aonde a atenção é exigida por

mais tempo até o intervalo. O encurtamento dos blocos na tevê produziu

cognitivamente um comprometimento de atenção. Acontece uma troca entre o

corpo e a informação que implica numa familiarização de hábitos perceptivos,

que ficam no corpo, vira o corpo e vão consolidando o jeito de olhar o mundo.

A introdução dos tablets como material pedagógico na escola, em

substituição ao livro, vai criar outros hábitos perceptivos. É um tipo de cognição

que vai sendo horizontalizada, transformando vários hábitos corporais.

Portanto, se o “tablet substitui livros” 12, estamos iniciando mudanças

importantes em termos cognitivos. Mas é claro que isso não vai se expandir em

12 Campanha publicitária de uma escola que causou polêmica em Fortaleza Ce.

Page 8: Artigo Julianna Formiga

grande velocidade e nem vai atingir tantas pessoas ao mesmo tempo. Mas a

quem atingir, produzirá alguma transformação.

Os meios de comunicação como extensão ou distensão do homem?

Nas reflexões de Marshall McLuhan (1989), compreendemos os meios de

comunicação, como extensão do homem, isto é, em contato com cada nova

tecnologia, o corpo torna-se dependente como se a extensão sempre tivesse

feito parte dele. Assim, McLuhan argumenta:

Qualquer invenção ou tecnologia é uma extensão ou auto-amputação de nosso corpo, e essa extensão exige novas relações e equilíbrios entre os demais órgãos e extensões do corpo. (...) Como extensão e aceleração da vida sensória, todo meio afeta de um golpe o campo total dos sentidos. (MCLUHAN, 1989, p. 63).

Clarck (2001) considera que há processos cognitivos no mundo que

acoplam a mente. Não existe um ambiente interno totalmente apartado do

ambiente externo. O autor afirma que a mente não é só do dentro, ela está

distendida, portanto, objetos supostamente separados do corpo podem ser

distendidos como mente, isto é, uma ação internalizada. Portanto, o que

McLuhan chamava de extensão, podemos chamar de distensão, pois o corpo

não acaba.

Existem alguns mecanismos perceptuais e cognitivos que são

distendidos em objetos externos. Temos como exemplo a luneta ou os óculos,

que vão distendendo e ampliando a nossa percepção, no caso a visão. Os

óculos não é uma extensão. O olho com os óculos vai aprendendo como é que

funciona. E quando está sem os óculos ele tem outro treino de reconhecer o

mundo. O corpo está sempre se distendendo e dependendo dos hábitos

cognitivos que possuímos, lemos o mundo de um jeito ou de outro.

Marshall McLuhan (1989) chamou atenção para essas tecnologias em

relação ao corpo, na medida em que elas colocavam o corpo em locais onde o

corpo não tinha estado antes e ele chamava de extensão. Mas extensão é algo

Page 9: Artigo Julianna Formiga

que é acoplado a algo existente para aumentar o desempenho, o alcance.

Extensão na tecnologia é um tipo de dispositivo de acoplamento. O corpo não

acaba no limite onde ele acabava. A informação modifica o comportamento e o

jeito de olhar.

A teoria corpomídia deixa claro que as informações que são repetidas

no corpo, se estabilizam nesse corpo. O corpo vai distendendo as habilidades,

portanto, não é uma extensão que se acopla. Dentro desse viés podemos

entender o iPhone não como um acessório da memória, mas como memória.

Katz (2011) nos conta que David Chalmers, no prefácio que escreveu para o

mais recente livro de Andy Clarck13, relata que seus amigos se impressionavam

com a mudança que o iPhone havia produzido no seu cérebro e muitas vezes

sugeriam que ele implantasse o iPhone no cérebro, mas David Chalmers

percebeu que o implante não precisaria ser feito, pois o iPhone já fazia parte do

seu corpo, já havia transformado seu comportamento. O dispositivo de

memória não precisa ser colocado dentro do corpo para fazer parte do corpo e

ser considerado mente, o dispositivo mesmo corporeamente separado é uma

distensão da mente.

De acordo com Christine Greiner14, o objeto transforma a capacidade de

memória, que é uma habilidade interna, portanto, o instrumento também possui

uma ação cognitiva. Greiner explica que para Andy Clarck a técnica é um

artefato cognitivo. O organismo produz artefatos, que não precisam ser

exatamente objetos, mas modelos cognitivos. Mas não é algo que está sendo

colocado no organismo. A ação do sujeito em relação ao ambiente e do

ambiente em relação ao sujeito não pode ser separada, são ações

indistinguíveis.

Vamos à direção de um comportamento do mundo off line, mas com

outros mecanismos. Portanto, não podemos separar o mundo virtual do mundo

real. São demandas e desejos transitivos. A comunidade digital pauta o nosso

comportamento via nosso corpo e o nosso corpo pauta essas especificidades

das mídias em relação ao seu suporte. Portanto, ler o jornal no computador

13 Supersizing the mind; embodiment, action, and cognitive extension (2008). 14 Comentários da Profª Christine Greiner na aula do programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica na PUC SP em 21 de outubro de 2011.

Page 10: Artigo Julianna Formiga

com a página virando faz um hábito cognitivo e mantém uma ponte aberta para

o papel. Ao mesmo tempo em que se avança, também conserva.

A mudança ocorre nos dois ambientes. Tanto nas máquinas como em

nós. Por isso evitamos utilizar a expressão “pós-humano”. Pois é como se

existisse um certo projeto humano que acabou e agora vem outro, mas não

rompe, a proposta é que vai se distendendo. E todas as informações que

configuram o mundo hoje nos contaminam e vão sendo por nós contaminadas.

Referencias Bibliográficas

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo, Paz e Terra, 2000.

GLEICK, James. The Information. A History. A Theory. A Flood. New York: Phanteon Books, 2011.

GREINER, Christine. O Corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo: Annablume, 2005.

GREINER, Christine, KATZ, Helena. A natureza cultural do corpo. In: PEREIRA, R. SOTER, S.(orgs.). Lições de Dança 2. Rio de Janeiro: Ed. Centro Universitário Cidade, 2001. p. 77-102.

KATZ, Helena. De que fala o corpo hoje?. In: ALTEMEYER, Fernando; BOMBONATTO, Vera (orgs.). São Paulo: Paulinas, 2011. P. 15-27. Teologia e Comunicação: corpo, palavra e interface cibernéticas.

LIPOVETSKY, Gilles; SERROY, Jean. O Ecrã Global. Editora 70, 2007.

MARTINS, Francisco Menezes e MACHADO da SILVA, Juremir, orgs. A Genealogia do Virtual. Comunicação, Cultura e Tecnologias do Imaginário. Porto Alegre: Sulina, 2004.

MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. Trad. Décio Pignatari. São Paulo: Cultrix, 1964.

SHIRKY, Clay. A Cultura da participação: criatividade e generosidade no mundo conectado. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

SODRÉ, Muniz. Sociedade, Mídia e Violência. Porto Alegre: Editora Salina/Edipucrs, 2006.

THOMPSON, John B. Ideologia e Cultura Moderna. Petrópolis: Vozes, 2007