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Santiago 2009 - 21st World Congress of Political Science - July 12 to 16, 2009 __________________________________________________________________ Entre novos e velhos paradigmas: tradição clientelista, participação e capital social no Programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC) na região do Médio Jequitinhonha, Minas Gerais, Brasil. Luciana Mendes Barbosa/ PUC-Minas 1 Este trabalho tem como foco a atuação de entidades executoras do Programa de Formação e Mobilização para a Convivência com o Semi-Árido: Um Milhão de Cisternas (P1MC), sendo o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e a Cáritas Diocesana, nos Municípios de Virgem da Lapa e Araçuaí, respectivamente, localizados na região do Médio Jequitinhonha em Minas Gerais. Este programa, uma iniciativa da sociedade civil organizada e do governo federal brasileiro, propõe a construção de cisternas de placas para coleta e armazenamento de água de chuva como forma de viabilizar o acesso à água para população rural do semi-árido brasileiro. O objetivo desta pesquisa é discutir e avaliar, à luz das teorias apresentadas por Bendix (1996), Nunes Leal (1975), Coleman (1990) e Carvalho (1997), até que ponto as práticas políticas democratizantes preconizadas pelo P1MC, e executadas por entidades civis em parceria com o Estado, são afetadas por traços próprios da cultura política brasileira (como o clientelismo, o assistencialismo e o mandonismo) e contribuem para a (im) possibilidade da universalização de valores mais democráticos e o fortalecimento do capital social, para a convivência independente com o semi- árido. Para tanto, foram realizadas entrevistas com representantes das entidades executoras e membros das comunidades rurais para investigar o envolvimento da população e de organizações locais no processo de planejamento, implementação e execução das etapas previstas no P1MC. Não obstante, a partir das dificuldades percebidas em campo durante a realização dessa pesquisa, a autora discute também os limites e as possibilidades das metodologias que visam estimular a participação das comunidades rurais nas etapas previstas e recomendadas pelos organizadores do P1MC. Verifica-se que, a compreensão do que é rural, do que é comunidade, bem como d o que é trabalho coletivo e participação é a condição sine qua non há a adequação dos projetos às necessidades e perspectivas locais. Palavras-chave: participação, capital social, P1MC, clientelismo, Vale do Jequitinhonha. 1 Mestranda em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e bacharel em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais.

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Santiago 2009 - 21st World Congress of Political Science - July 12 to 16, 2009

__________________________________________________________________

Entre novos e velhos paradigmas: tradição clientelista, participação e capital social no Programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC) na região do Médio Jequitinhonha,

Minas Gerais, Brasil.

Luciana Mendes Barbosa/ PUC-Minas1

Este trabalho tem como foco a atuação de entidades executoras do Programa de Formação e Mobilização para a Convivência com o Semi-Árido: Um Milhão de Cisternas (P1MC), sendo o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e a Cáritas Diocesana, nos Municípios de Virgem da Lapa e Araçuaí, respectivamente, localizados na região do Médio Jequitinhonha em Minas Gerais. Este programa, uma iniciativa da sociedade civil organizada e do governo federal brasileiro, propõe a construção de cisternas de placas para coleta e armazenamento de água de chuva como forma de viabilizar o acesso à água para população rural do semi-árido brasileiro. O objetivo desta pesquisa é discutir e avaliar, à luz das teorias apresentadas por Bendix (1996), Nunes Leal (1975), Coleman (1990) e Carvalho (1997), até que ponto as práticas políticas democratizantes preconizadas pelo P1MC, e executadas por entidades civis em parceria com o Estado, são afetadas por traços próprios da cultura política brasileira (como o clientelismo, o assistencialismo e o mandonismo) e contribuem para a (im) possibilidade da universalização de valores mais democráticos e o fortalecimento do capital social, para a convivência independente com o semi-árido. Para tanto, foram realizadas entrevistas com representantes das entidades executoras e membros das comunidades rurais para investigar o envolvimento da população e de organizações locais no processo de planejamento, implementação e execução das etapas previstas no P1MC. Não obstante, a partir das dificuldades percebidas em campo durante a realização dessa pesquisa, a autora discute também os limites e as possibilidades das metodologias que visam estimular a participação das comunidades rurais nas etapas previstas e recomendadas pelos organizadores do P1MC. Verifica-se que, a compreensão do que é rural, do que é comunidade, bem como d o que é trabalho coletivo e participação é a condição sine qua non há a adequação dos projetos às necessidades e perspectivas locais.

Palavras-chave: participação, capital social, P1MC, clientelismo, Vale do Jequitinhonha.

1 Mestranda em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e bacharel em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais.

INTRODUÇÃO

“O elemento popular “sente,”, mas nem sempre compreende ou sabe; o elemento intelectual “sabe,”, mas nem sempre compreende e muito menos “sente.”(...) O erro do intelectual consiste em acreditar que se possa “saber” sem compreender e, principalmente, sem sentir e estar apaixonado.” (Gramsci, Concepção dialética da história, p.138).

As motivações para a realização deste trabalho surgem de experiências acumuladas nas minhas andanças pelo Vale do Jequitinhonha, enquanto bolsista de um projeto de pesquisa desenvolvido pelo GESTA (Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais) em parceria com o CNPq à época da graduação em Geografia na Universidade Federal de Minas Gerais. Na verdade suas raízes são bem mais antigas, datam de julho de 2005, quando participei como voluntária do Projeto “Proteção Sanitária de Cisternas Utilizadas na Reservação de Águas Pluviais para Uso Domiciliar: Aspectos Técnicos e Educacionais”, promovido pelo Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental – DESA/UFMG. Essa primeira experiência envolvendo cisternas para captação de água de chuva foi significativa na medida em que me possibilitou conhecer melhor a técnica de construção e o trabalho desenvolvido por entidades como a Cáritas Diocesana em comunidades rurais do município de Araçuaí, localizado no Médio Jequitinhonha, em Minas Gerais.

A partir dessas experiências, fui convidada a integrar o Projeto “Gestão de Recursos Naturais e Geração de Renda no Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais”, financiado pelo CT-Agro/ CNPq. Apesar de ter participado efetivamente do projeto somente na fase de execução em 2005, foi possível acompanhar as fases de planejamento e implementação das técnicas de captação de água de chuva e agroecologia na região. Durante esta fase, que englobava a capacitação de famílias e a construção de cisternas, fui surpreendida pela baixa adesão e envolvimento das comunidades no processo de mobilização, principalmente na comunidade de Marimbondo, no município de Virgem da Lapa. Percebi, com base na mesma metodologia, que as comunidades não conduziram o trabalho coletivo como prevêem programas como o Programa Um Milhão de Cisternas Rurais – P1MC. Daí começaram a surgir indagações a respeito da viabilidade de programas como o P1MC que tem como proposta fomentar a participação das comunidades rurais para a transformação social. A partir de então estava formulado o problema da minha pesquisa, que consistia nas seguintes questões: o estímulo à participação com base em princípios gerais de participação e de mudança na cultura política é passível de provocar mudanças na estrutura social das comunidades atendidas pelo P1MC? No caso do P1MC, a participação é construída ou imposta? Não haveria uma contradição entre as estratégias de ação empregadas por estas entidades e a filosofia que as norteiam? Apesar de o P1MC conter uma proposta de rompimento com modelos clientelista e assistencialista conduzidos pelo Estado na região, essas entidades não estariam contribuindo, mesmo que involuntariamente, para a permanência de um imaginário político e cultural local inteiramente subordinado à lógica dominante dos programas governamentais voltados para a região até então?

Através do acúmulo de conhecimento empírico e norteada pelas indagações acima citadas, meu objetivo neste trabalho é discutir alguns métodos e impactos da participação estimulados pelo P1MC para e sobre as comunidades rurais do nordeste de Minas Gerais. A partir de pesquisas de campo realizadas entre 2005 e 2006 nos municípios de Virgem da Lapa e Araçuaí, onde por meio de entrevistas com agricultores, sindicalistas e técnicos de organizações não-governamentais, foram analisadas as propostas do programa para estimular a participação e as respostas das comunidades rurais, na tentativa de delimitar seus potenciais e limites.

Diante da percepção da baixa adesão das famílias a participação no P1MC, pretendeu-se discutir até que ponto as práticas políticas deste programa, executadas pela sociedade civil em parceria com o Estado, são afetadas por traços próprios da cultura política brasileira (como o clientelismo e o mandonismo) e até que ponto tais práticas são capazes de contribuir para a universalização de valores mais democráticos. Para tanto, buscarei respaldo teórico nas discussões travadas por sociólogos e cientistas políticos consagrados como Bendix (1996), Nunes Leal (1975) e Carvalho (1997).

AS RELAÇÕES SÓCIO-POLÍTICAS NO BRASIL: ASPECTOS CONCEITUAIS

Antes de prosseguirmos, é preciso estabelecer algumas reflexões teóricas acerca do fenômeno estudado, a saber, as relações de poder entre sociedade e estado, em especial, as origens histórico-culturais que permeiam as relações de poder no Brasil. Além disso, outra discussão é bastante pertinente: entre tradição e modernidade, que pertence não só as preocupações sociológicas para com as mudanças sociais, mas também está presente nas ações governamentais para a região estudada.

Reinhard Bendix (1996) em “Construção Nacional e Cidadania” faz críticas instigantes à abordagem dicotômica dos conceitos de tradição e modernidade, na tentativa de repensar sua freqüente utilização pelo pensamento social contemporâneo. Na tentativa de distanciar-se da perspectiva evolucionista dos conceitos em foco, Bendix busca elementos e conceitos que sustentem suas críticas. Para tanto, o autor se debruça sobre a tradição weberiana, apontando para a necessidade de se evitar a perspectiva do evolucionismo social que tem “a concepção da sociedade como uma estrutura que se origina numa série fixa de precondições e que se caracteriza por atributos mutuamente reforçadores que fazem a mudança da estrutura aparecer como uma modificação inevitável de variáveis inter-relacionadas” (BENDIX, 1996, p. 367). Essa perspectiva acaba resultando no estabelecimento de leis da evolução social, baseadas numa sucessão de estágios que a humanidade deve passar para atingir um mesmo objetivo, cuja possibilidade de determinação é dada cientificamente. Bendix (1996) critica esta abordagem afirmando que “a crença na universalidade de estágios evolutivos foi substituída pela compreensão de que o momentum dos eventos passados e a diversidade das estruturas sociais conduzem a diferentes caminhos de desenvolvimento, mesmo quando as mudanças de tecnologia são idênticas” (BENDIX, 1996, p.35).

Desse modo, Bendix descarta a crença na possibilidade de um único caminho para a humanidade, tanto no que se refere à possibilidade de previsibilidade do futuro, quanto à visão do

passado como resultado invariável de leis estabelecidas e reconhecidas cientificamente. Contudo, a principal preocupação do autor está na dicotomização dos conceitos de tradição e modernidade, caudatária da tradição intelectual européia, segundo a qual “uma vez que a industrialização está a caminho, ela tem resultados inevitáveis” (BENDIX, 1996, p.367).

A principal crítica de Bendix (1996), então, dirige-se às teorias sociais evolucionistas e neo-evolucionistas que permeiam grande parte das análises sobre a mudança social e que tendem a usar a experiência histórica para construir tipos ideais contrastantes de tradição e modernidade, utilizando-os posteriormente para fazer generalizações contingentes sobre a transição de uma para a outra. Dessa forma, o autor classifica estas formulações como enganosas, uma vez que nenhuma sociedade está isenta de elementos de ambos os extremos do espectro tradição – modernidade. Uma contribuição mais atual a essa discussão empreendida por Bendix (1996), é a recente crítica acadêmica à noção de desenvolvimento conduzida por autores como Ignacy Sachs (2000) e Escobar (1996) e Rahnema (1992). Estes autores tentam demonstrar como a generalização de noções como desenvolvimento e participação após a Segunda Guerra Mundial e sua adoção na formulação de políticas de instituições governamentais e não-governamentais (inter) nacionais legitimam e aprofundam as dicotomias entre, nos termos de Bendix (1996), sociedades avançadas e seguidoras, condenando as últimas à eterna busca pela adequação a padrões falaciosos de modernidade. Esta crítica chama atenção, também, para a importância de conhecimentos e saberes desqualificados como arcaico-tradicionais em função da ascensão hegemônica do saber científico/moderno. A revalorização de saberes e formas de organização social, relegados ao plano de arcaísmos a serem superados ou de resistências irracionais a serem vencidas pelo avanço da modernidade, apontam para a necessidade de contestação das dicotomias modernas.

Além das dicotomias apontadas por Bendix (1996) entre tradição e modernidade na abordagem sociológica e em seus debates adjacentes, outro aspecto relevante para o presente estudo é a coexistência dessas dicotomias nas relações sócio-políticas brasileiras, haja vista as manifestações arcaicas do poder privado como o clientelismo, os “novos coronelismos” e o mandonismo nas políticas públicas praticadas tanto pelo Estado democrático, quanto por organizações da sociedade civil, portadoras do discurso do “empowerment” e da participação.

Um dos clássicos, que debate as raízes sócio-históricas que permeiam as relações de poder no país, é o trabalho realizado por Victor Nunes Leal em “Coronelismo, enxada e voto”. Neste livro, Nunes Leal (1975) discute os problemas entre o poder local e o poder nacional colocados pelo coronelismo, que é definido como uma manifestação do poder privado dos senhores de terra num regime político de extensa base representativa. Segundo o autor, o coronelismo está diretamente vinculado a existência de uma estrutura agrária – monocultora e exportadora de matéria prima – que fornecia as bases de sustentação do poder privado no interior do Brasil. Contudo, Leal (1975) localiza este fenômeno historicamente, circunscrevendo-o a Primeira República entre 1898 e 1930. Para Leal, o coronelismo estaria na confluência entre um fato político, o federalismo, e a conjuntura econômica, marcada pela decadência econômica dos fazendeiros. Dessa forma, o coronelismo pode ser entendido como uma mudança nas relações de força entre os proprietários rurais e o governo, significando o fortalecimento do poder do Estado frente ao predomínio do coronel (CARVALHO, 1997, p.10).

De acordo com Carvalho (1997), o coronelismo pode ser entendido como

“... um sistema político nacional, baseado em barganhas entre o governo e os coronéis. O governo estadual garante, para baixo, o poder do coronel sobre os seus dependentes e seus rivais, sobretudo cedendo-lhes o controle dos cargos públicos, desde o delegado de polícia até a professora primária. O coronel hipoteca seu apoio ao governo, sobretudo na forma de votos. Para cima, os governadores dão seu apoio ao presidente da República em troca do reconhecimento deste de seu domínio no estado. O coronelismo é fase de processo mais longo de relacionamento entre fazendeiros e o governo” (CARVALHO, 1997, p. 02).

Contudo, a tese de Nunes Leal de que o coronelismo teria sido sepultado junto com a Primeira República é contestada por diversos autores, entre eles José Murilo de Carvalho. Em “Metamorfoses do Coronel”, Carvalho (2001) admite as mudanças pelas quais o Brasil passou nos anos subseqüentes a República Velha, contudo tais mudanças não foram suficientes para suprimir o coronel do cenário político nacional. De acordo com Carvalho:

O coronel de hoje não vive num sistema coronelista que envolvia os três níveis de governo, não derruba governadores, não tem seu poder baseado na posse da terra e no controle da população rural. Mas mantém do antigo coronel a arrogância e a prepotência no trato com os adversários, a inadaptação às regras da convivência democrática, a convicção de estar acima da lei, a incapacidade de distinguir o público do privado, o uso do poder para conseguir empregos, contratos, financiamentos, subsídios e outros favores para enriquecimento próprio e da parentela. Tempera tudo isso com o molho do paternalismo e do clientelismo distribuindo as sobras das benesses públicas de que se apropria.[...] Nesse sentido, o novo coronel é parte de um sistema clientelístico nacional. (CARVALHO, 2001, p. 05).

A subsistência do coronelismo se dá pela existência – ainda que difusa e precária – de uma estrutura agrária arcaica, em que a parentela, a camaradagem, a patronagem e a permanência da autoridade herdada coexistem com sistemas políticos modernos, caracterizados pelos amplos direitos sociais e políticos, pela cidadania e participação.

Outro conceito importante para este estudo é o de mandonismo, que se refere à existência local de estruturas oligárquicas e personalizadas de poder. Segundo Carvalho (1997), a figura do mandão, do chefe ou mesmo do coronel enquanto indivíduo está ligado ao controle de algum recurso estratégico, em geral a posse da terra, no caso estudado, da água, que exerce sobre a população um domínio pessoal e arbitrário, que a impede de ter livre acesso ao mercado e à sociedade política. Dessa forma, “o mandonismo não é um sistema, é uma característica da política tradicional. Existe desde o início da colonização e sobrevive ainda hoje em regiões isoladas. A tendência é que desapareça completamente à medida que os direitos civis e políticos alcancem todos os cidadãos” (CARVALHO, 1997, p.02).

Apesar de Carvalho afirmar que o mandonismo tende a ser substituído pela ampliação dos direitos civis, na verdade o que se observa na prática é a convivência curiosa entre práticas mandonistas e projetos de construção democrática, sobretudo na implantação de projetos que visam à maior participação das comunidades rurais no processo decisório e de emancipação, como o P1MC. Durante as entrevistas e reuniões dos técnicos do P1MC com as comunidades rurais, ficou evidente a relação estabelecida entre os técnicos e sertanejos, em que a detenção de

um recurso estratégico, neste caso a água, pelas entidades as conduziam a práticas autoritárias e arbitrárias para forjar a participação dessas comunidades no processo de construção e gerenciamento dos recursos hídricos.

Um conceito ainda mais amplo, que engloba tanto as noções de coronelismo, quanto de mandonismo, é o de clientelismo, com a exceção de que não decresceria ao longo do tempo, sendo um atributo variável de sistemas políticos macros. Localizado no espectro de relações de poder caracterizadas por relações sócio-políticas tradicionais, o clientelismo está presente em toda história política do país e, segundo Carvalho (1997), “indica um tipo de relação entre atores políticos que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo em forma de votos” (CARVALHO, 1997, p.03).

As relações clientelísticas, além de variarem no tempo e no espaço, dispensam a presença do coronel ou do mandão, na medida em que se dão entre o governo, ou políticos, e os setores mais pobres da população. Este trabalho vai mais longe e afirma que estas relações também se dão entre atores organizações privadas de caráter público, como as ONGs, e a população-alvo das políticas públicas implementadas por elas, não com o propósito eleitoral, mas com o de permanência dos financiamentos do governo federal a estes entidades, a exemplo da atuação dos técnicos do P1MC junto à população rural do Médio Jequitinhonha. Nesse caso específico, os técnicos do programa de posse da água barganham a participação das comunidades rurais nas etapas previstas pelo programa, com o objetivo de garantir o repasse de verbas do governo para o programa, que tem como principal contrapartida a participação efetiva das populações rurais no processo de construção das cisternas. Esse processo de barganha, como será discutido mais adiante, enfraquece os principais pilares do P1MC, reproduzindo um paradigma antes criticado e combatido por estas mesmas entidades, inscrevendo o sertanejo numa lógica perversa de (re) produção social.

DO COMBATE À CONVIVÊNCIA COM A SECA: (DI) LEMAS ENTRE TRADIÇÃO E MODERNIDADE NO P1MC

Conhecido como “o vale da miséria e estagnação”, o Vale do Jequitinhonha tem sido alvo de políticas públicas cuja tônica modernizadora e desenvolvimentista privilegia os grandes projetos em detrimento dos pequenos agricultores. Com a justificativa de reverter o quadro de aparente atraso, pobreza e depressão, o Estado adotou três frentes de modernização, a saber: a expansão da pecuária extensiva, a implantação de monoculturas de eucaliptos e a cafeicultura (RIBEIRO, 1993). Contudo, o que se tem observado é um processo de modernização conservadora, que segundo SILVA (1981, p.40), “[....] privilegia apenas culturas e regiões, assim como alguns tipos específicos de unidades produtivas (médias e grandes propriedades). Nunca uma transformação dinâmica, auto-sustentada; pelo contrário, uma modernização induzida através de pesados custos sociais e que só vinga pelo amparo do Estado”.

É a partir da década de 1950, que a presença do Estado no Vale do Jequitinhonha como dinamizador da economia local (basicamente de subsistência) se dará de maneira mais efetiva e contundente. Como primeira medida tomada para romper o isolamento geoeconômico do Vale

tem-se a abertura da MG-2, fazendo a ligação entre Belo Horizonte e Salto da Divisa, passando por Diamantina e Araçuaí. Outras rodovias foram sendo concluídas ao longo dos anos, e ainda que não fizessem ligações diretas com a região, a exemplo da BR 262, elas constituíram melhorias nas comunicações e nos intercâmbios inter-regionais (TUBALDINI, 2000).

Os projetos estatais para a região se tornaram mais expressivos em meados da década de 60 com a criação da CODEVALE (Conselho de Desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha), cujo objetivo era a elaboração e a execução do plano de desenvolvimento para o Jequitinhonha. A partir de 1974, a CODEVALE passa a integrar uma linha de planejamento nacional, sob a influência do PND (Plano Nacional de Desenvolvimento) e do I PMDES (Plano Mineiro de Desenvolvimento Econômico e Social) fazendo parte, posteriormente, do II PMDES. Além das três frentes já mencionadas, seriam integradas, também, atividades de industrialização, estruturação da rede urbana e integração da região pela ampliação da rede viária (RIBEIRO, 1993).

Com a política de incentivos fiscais e a oferta de crédito subsidiado pelo Estado, houve uma tentativa de modernização da pecuária na região, atividade que ao lado da mineração e da agricultura constituía uma das mais importantes da região, cuja finalidade era o abastecimento de grandes centros urbanos e a melhora no desempenho da economia em âmbito regional.

Atendendo aos objetivos do II PND de crescimento da produção siderúrgica e de papel e celulose em Minas Gerais, foi implantada a monocultura de eucalipto na região. Tendo em vista o baixo custo da mão-de-obra e da terra, a melhoria da infra-estrutura básica e a proximidade, a região passou a ser uma das principais fornecedoras de madeira para siderúrgicas do Vale do Aço. Também, com o apoio do Estado, foi possível implantar na região uma moderna cafeicultura, que da mesma forma se beneficiou dos baixos preços da terra e da mão-de-obra (RIBEIRO, 1993).

As três frentes de modernização conservadora, a fim de integrar o Vale do Jequitinhonha à lógica desenvolvimentista em âmbito nacional, resultaram em expropriação e exploração do campesinato, na medida em que alteraram aspectos importantes da economia camponesa local. Em primeiro lugar, limitou-se a possibilidade do camponês auferir renda através da comercialização da sua produção, já que os preços desses produtos deixaram de ser regulados por fatores naturais ou pelo comércio local para serem regidos pela lógica de mercado capitalista, cuja complexidade, muitas vezes, é desconhecida pelos camponeses e comerciantes locais. Em segundo lugar, o camponês foi submetido a uma nova lógica de consumo, para a qual sua renda não é o suficiente. Isso o condiciona ao trabalho assalariado, colaborando para o aumento das migrações sazonais.

Na medida em que estes fatores exercem uma pressão cada vez maior sobre o meio de (re) produção do camponês, a terra, observa-se a alteração da estrutura agrária na região, com expropriação e aumento da concentração fundiária, que passou a registrar um aumento significativo das propriedades com mais de 100 ha, segundo levantamento realizado por RIBEIRO (1993). A redução das estratégias de (re) produção dos camponeses, através da perda das áreas de chapadas para a monocultura do eucalipto e das roças nas terras das fazendas para a cultura do café ou para a criação de gado, resultou na dependência dos lavradores locais em relação ao assalariamento, pela extinção das alternativas de subsistência.

Entregue “às traças” e alvo de desmandos e interesses políticos dos “novos coronéis” da região, a CODEVALE foi se esvaziando a ponto de ser substituída, na década de 80, pela

GEVALE (Grupo de Executivo de Coordenação de Ações dos Órgãos e Entidades dos Governos Estadual e Federal no Vale do Jequitinhonha), que consolidou o Programa Novo Jequitinhonha. Adotando como estratégia principal o combate à escassez e necessidade de água, este programa optou pelo incentivo à construção de barragens para irrigação, produção de energia e perenização dos rios da região, na tentativa de criar condições de atratividade a investimentos privados. Apontada como uma das grandes causas do atraso e o subdesenvolvimento desta região, a seca, desde o Império, deveria ser combatida com a construção de grandes obras para armazenamento de água.

Em parceria com a CEMIG, que planejava desde 1960 a implantação de projetos hidrelétricos no rio Jequitinhonha e Araçuaí, num total de 16 empreendimentos, o Governo Nilton Cardoso, através do Projeto Novo Jequitinhonha, “fez incluir no estatuto da CEMIG, a perenização de rios entre suas responsabilidades, pois a empresa até então só construía barragens para geração de energia” (RIBEIRO,1993, p.119). Essas medidas suscitaram inúmeras críticas ao Governo, pois atribuía à empresa um desvio de função para atender às necessidades eleitoreiras e salvacionistas do Estado. A partir de então, a CEMIG efetuou estudos na região e elaborou os “Planos da CEMIG para a área da GEVALE”. A principal linha de ação destes planos foi a construção de barragens na bacia do Jequitinhonha e Araçuaí e obras de perenização nos seus afluentes e subafluentes, cujo caso emblemático foi a construção da barragem do rio Calhauzinho. Neste caso específico, de acordo com Ribeiro (1993), houve inclusive a criação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar denúncias envolvendo irregularidades no processo licitatório, desrespeito à legislação ambiental e grande prejuízo aos atingidos pela construção da barragem.

Esse breve panorama vem revelar a gravidade da crise que se instalou no Vale do Jequitinhonha e tem mostrado a importância de se repensar o modelo de desenvolvimento proposto pelo governo para esta região. Na tentativa de alterar esse padrão relativo às relações sociedade/estado, surgem organizações da sociedade civil no semi-árido brasileiro que, com base num novo paradigma de desenvolvimento alicerçado pelos conceitos de sustentabilidade, participação e emancipação política, passam a desenvolver projetos para a convivência com o semi-árido, em substituição à noção de combate à seca presente nos projetos governamentais para a região, conforme já vimos.

Entidades como a CÁRITAS, o CAV (Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica), o Fundo Cristão para Crianças, a Visão Mundial, entre outras, buscam criar as condições para superar as vulnerabilidades decorrentes deste modelo inadequado, através da implantação de instâncias de encontro e diálogo dos diferentes atores sociais e da influencia na formulação e implementação de políticas públicas condizentes com as demandas de uma maioria pobre e diferenciada, através da auto-organização e da participação. Isso significa, além do aprendizado de novas práticas políticas, reformas na dimensão institucional, estímulos à descentralização e promoção de mudanças significativas no processo atual de tomada de decisões, por meio do estabelecimento de uma gestão pública mais representativa e mais participativa. Outro significado é o estimulo a organização das comunidades, na busca do afloramento de suas energias políticas. Desse modo, os programas para a convivência com o semi-árido podem expressar uma saída da cultura de assistência, do clientelismo e da troca de favores que caracterizam o exercício de uma cidadania passiva e do despoderamento (JARA, 1998).

Um dos primeiros programas a atuar no Vale do Jequitinhonha foi o Programa de Convivência com o Semi-árido (PCSA) da Cáritas Brasileira. Este programa teve início em 1999,

com uma grande campanha de arrecadação de recursos em todo o Brasil, tendo como objetivo ajudar as populações rurais afetadas por uma das maiores secas do século passado, a de 1998/1999. Com o apoio de instituições brasileiras e do exterior, a Cáritas Brasileira deu início a construção de oito mil cisternas de placas para a captação e armazenamento de água da chuva. Atuando de forma muito mais abrangente, este programa promove a divulgação de uma cultura de aproveitamento dos recursos naturais e de uma relação sustentável com o meio ambiente, através de projetos de apoio a grupos de agricultores familiares com a construção de barragens subterrâneas, poços amazonas, miniadutoras, sistemas simplificados de irrigação.

Outra iniciativa é o Programa de Desenvolvimento Humano Sustentável - PDHS desenvolvido pelo Fundo Cristão para Crianças em parceria com a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA), o Instituto Estadual de Florestas (IEF) e as Universidades de Viçosa e Auburn (EUA). Este programa objetiva também a captação de água de chuva através da construção de cisternas para o abastecimento humano e a construção de pequenos açudes e barragens para o incremento da produção agrícola da região. Além da captação de águas pluviais, o Fundo Cristão busca melhorar as condições de saneamento básico e moradia, através de reformas e construção de casas, sanitários e destinação correta do lixo doméstico.

Contudo, um dos programas mais expressivos do paradigma de convivência com o semi-árido é o P1MC, que tem a cisterna como símbolo da possibilidade de desenvolvimento da região de maneira sustentável, já que rompe com padrões assistencialistas/clientelistas estabelecidos pelos programas governamentais para o semi-árido.

O Programa Um Milhão de Cisternas

A realização do primeiro Fórum pelas organizações da sociedade civil brasileira para refletir sobre a realidade do semi-árido nacional aconteceu em 1993, em Recife, Pernambuco, paralelo à III Conferência das Partes da Convenção de Combate à Desertificação das Nações Unidas também em Recife. Nesta ocasião essas organizações constituíram uma rede de entidades, denominada ASA (Articulação no Semi-árido Brasileiro), congregando aproximadamente 600 organizações brasileiras. De acordo com sua Carta de Princípios2, esta rede busca

“apoiar os interesses, potencialidades e necessidades das populações locais, em especial dos agricultores familiares, baseados em: a) a conservação, uso sustentável e recomposição ambiental dos recursos naturais do semi-árido; b) a quebra do monopólio de acesso à terra, água e outros meios de produção - de forma que esses elementos, juntos, promovam o desenvolvimento humano sustentável do semi-árido” (ASA, 2000).

Neste Fórum paralelo também foi formulada a proposta do Programa de Formação e Mobilização para a Convivência com o Semi-Árido: Um Milhão de Cisternas (P1MC), que teve

2 Trecho retirado do site: http://www.asabrasil.org.br/body_carta.htm

como ponto de partida experiências bem sucedidas de se construir cisternas de placas para o armazenamento de água de chuva para o abastecimento humano. A ASA propôs então a construção de um milhão de cisternas em cinco anos, com início em 2001, em onze estados brasileiros, a saber: Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Piauí, Ceará, Maranhão, Minas Gerais e Espírito Santo, todos inseridos na região semi-árida3.

Entre os organismos conveniados e parcerias estão o Ministério do Meio Ambiente – MMA, a Agência Nacional de Águas – ANA, o Banco Mundial, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), o UNICEF, as agências de cooperação internacional, a Cáritas Brasileira e Internacional, a Comissão Pastoral da Terra, a Pastoral da Criança e a CONTAG (Confederação Nacional de Trabalhadores da Agricultura).

A idéia da construção de cisternas, além de basear-se em experiências bem sucedidas no interior de alguns estados nordestinos como Bahia e Sergipe, ganhou a preferência das organizações sociais por ser uma solução simples, de fácil adaptação às condições educacionais da população do semi-árido e além de ter um custo relativamente baixo4.

O principal argumento usado pela ASA para a implementação do programa é o aproveitamento máximo dos recursos hídricos em uma região de escassez. Porém, isso só será alcançado por um processo de transformação social, através da reeducação do sertanejo e dos atores regionais para a aquisição de uma nova visão do meio em que vive de uma nova relação Sociedade-Natureza. Outro argumento utilizado para dar sustentabilidade a proposta é a viabilização sócio-econômica da região. Para a concretização destes objetivos, segundo a proposta da ASA, alguns princípios devem ser observados: a participação social, a mobilização social, o desenvolvimento sustentável e a emancipação. Todos estes princípios podem ser resumidos pelo trecho retirado do Sumário Executivo do Programa:

Deve-se salientar que uma das maiores contribuições deste Programa será a de facilitar a emergência ou o fortalecimento do capital social existente na região. Segundo autores contemporâneos, este tipo de capital é pré-requisito para qualquer processo sustentável de desenvolvimento econômico, social, político e ambiental. Neste sentido, o fortalecimento e a consolidação das entidades da sociedade civil e da ASA devem ser entendidas como investimentos para a formação do capital social (ASA, 2003, p. 36).

Para a materialização dos objetivos do programa além do arcabouço teórico-ideológico, é necessário também todo um aparato institucional. Este aparato está organizado em uma estrutura de gestão descentralizada, que reúne as Unidades Gestoras distribuídas por microrregiões, em âmbito estatal, as Unidades Executoras, compostas por instituições municipais, tudo isso conduzido por uma Unidade Gestora Central, representada pela Associação Programa Um Milhão de Cisternas para o semi-árido – AP1MC.

3 Do ponto de vista climático, a região semi-árida é aquela formada pelo conjunto de lugares contíguos, caracterizada pelo balanço hídrico negativo, resultante de precipitações médias anuais iguais ou inferiores a 800 mm, insolação média de 2800h/ano, temperaturas médias anuais de 23º a 27º C, evaporação de 2.000 mm/ano e umidade relativa do ar média em torno de 50%. Caracteriza-se essa região por forte insolação, temperaturas relativamente altas e pelo regime de chuvas marcado pela escassez, irregularidade e concentração das precipitações num curto período, de apenas três meses. 4 À época da pesquisa, o custo médio de uma cisterna com capacidade para 22 mil litros de água era de 1200 reais.

Nos municípios onde o programa é implantado são formadas comissões municipais compostas por representação de três a cinco organizações da sociedade civil (Sindicatos, Associações comunitárias, ONGs, Pastorais da Igreja, etc), em que uma dessas organizações é escolhida para ser a unidade gestora municipal. Cabe lembrar que, para fins deste estudo, foram escolhidas duas unidades gestoras dos municípios de Virgem da Lapa e Araçuaí, neste caso, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e a Cáritas Diocesana, respectivamente. Essas comissões têm como função a escolha das famílias que participarão do programa, a mobilização e organização dos cursos de capacitação, a supervisão e o monitoramento da execução do programa pela entidade gestora municipal.

Mais importante que a estrutura institucional do programa são os critérios adotados por estas entidades para gerir o processo de organização e mobilização social das comunidades em escala municipal. Esses critérios são a) a mobilização social, b) o controle social, c) a capacitação das famílias rurais, d) a comunicação; e) o fortalecimento institucional, e e) a construção de cisternas. Todos estes critérios têm como pressupostos o fortalecimento da auto-estima da população do semi-árido, a difusão das experiências e conhecimentos adquiridos pelas entidades, o fortalecimento da cidadania pelo exercício da co-responsabilidade dos atores, o emprego de metodologias participativas e democráticas e a garantia da participação e envolvimento das famílias na execução do Programa.

A mobilização, segundo os dados e informações analisadas, é a característica fundamental de todo o processo e se dá com as famílias do semi-árido. As organizações de base municipal (STRs, Igrejas, Movimentos pastorais, etc.) juntamente com as organizações comunitárias são as responsáveis pela execução do Programa e a escolha das famílias que receberão as cisternas.

Busca-se no protagonismo das comunidades, que ser alcançado por processos educacionais (reuniões de capacitação e mobilização), a construção de políticas sustentáveis para o semi-árido. Segundo os autores do programa, as organizações da sociedade civil, representantes das famílias rurais, seriam capazes de multiplicar sua atuação sobre o território através do contínuo processo de formação de agentes para a transformação social. Uma das formas de mudança social é a realização de reuniões constantes entre as entidades e as comunidades e entre as próprias entidades, sejam elas em âmbito municipal, estadual e/ ou federal.

Discutindo as mudanças

O Programa P1MC, como dito anteriormente, não se limita apenas a construção de cisternas para estocagem de água. Este visa introduzir um processo efetivo de organização e mobilização social e de formação para a gestão de recursos hídricos. Para isso, o P1MC tem como um de seus principais objetivos estimular no sertanejo ações e idéias que dêem a ele uma oportunidade de romper com comportamentos historicamente determinados, embasados numa cultura política marcada por práticas clientelistas, assistencialistas, mandonistas, etc. Através de um processo educativo, este programa objetiva então contribuir para a transformação social, através da ampliação da compreensão e da prática da “convivência com o semi-árido”.

Nesse sentido, “conviver com o semi-árido” é antes de tudo, um processo político, social, econômico e cultural, que implica na mudança de um paradigma dominante para um novo paradigma, em que prevaleça uma nova cultura política, baseada na participação da população rural nas decisões e nos planejamentos políticos para a região semi-árida; uma nova relação/interação do sertanejo com o ambiente; uma nova organização social, na qual as políticas públicas estejam voltadas para a promoção da região, tornando-a viável sócio-economicamente.

Para isso, as entidades que congregam o P1MC acreditam que a cisterna (Figura 1) é o símbolo desta mudança, a representação deste novo paradigma, já que para a sua construção um longo caminho tem que ser percorrido, desde a liberação de recursos pelas organizações parceiras e governo federal passando pela aquisição dos materiais e seu transporte às comunidades, até a mobilização e capacitação das famílias para a construção das cisternas e sua gestão. Um dos componentes considerado decisivo para o sucesso do P1MC é a mobilização, o que significa “convocar e unir vontades para atuarem em busca de um objetivo comum” ASA (2003, p. 12). Na verdade, essa mobilização envolveria toda a população brasileira, desde a dona de casa que decide doar recursos para o P1MC até as empresas privadas e organizações não governamentais dispostas a contribuir com o programa. Porém, a base dessa espiral de mobilização (ASA, 2003) seria a família que mora nas comunidades rurais do semi-árido.

Figura 1: Cisterna de placas

Fonte: BARBOSA, 2005.

Para que essa mobilização de base se efetive, as organizações reunidas em torno do programa devem adotar uma metodologia, que segundo seus organizadores é adequada, capaz de levar as comunidades rurais à organização, ao fortalecimento do sentido de coletividade e solidariedade. Essa “metodologia participativa” é basicamente representada por um sistema de ajuda mútua, o mutirão – que pode ser definido como “... práticas de auxílio mútuo, a que não são estranhas, também, motivações de amizade, parentesco e compadrio, ora revestem caráter pessoal

e se traduzem na prestação recíproca de toda sorte de serviços, ora grupal ou coletiva, envolvendo a maioria dos elementos que formam a vizinhança” (CALDEIRA, 1956, p. 29).

O mutirão, enquanto vetor desta mobilização, é difundido pelo P1MC por todo o semi-árido, inclusive nos municípios estudados. No entanto, o que se observa a partir de relatos e conversas com agricultores rurais, e também por vivência própria, é que este método não foi muito bem aceito pelas famílias participantes das entrevistas.

Segundo relato dos agricultores o mutirão é inadequado por referir-se a uma prática, de acordo com as normas locais, cuja finalidade é coletiva e não privada. Para as comunidades entrevistadas, o mutirão é uma prestação de serviços recíproca, que se dá de forma grupal ou coletiva, possuindo uma regra intrínseca, não descrita em manuais ou convenções. Para eles, esta categoria de ajuda mútua, na maioria das vezes, é solicitada em dois casos distintos: no primeiro se enquadram os pequenos mutirões, prestados em situações de determinada urgência, em que imperam o fator surpresa, tais como morte, doença, partos, acidentes, calamidades, etc. No segundo, encontram-se as derrubadas, roçadas e queimas em terras coletivas ou áreas comunais (neste caso específico, áreas de chapada destinadas a caça, extração e pastagem) com o objetivo de realizar funções de acordo com a necessidade do grupo. O mutirão pode ainda estar associado à realização de obra ou serviço de interesse geral, tais como a construção ou conserto de estradas ou ainda a promoção de atividades recreativas ou religiosas. Nas comunidades estudadas, o mutirão é solicitado para a realização de obra ou serviço de interesse coletivo, como a construção de creches, escolas, estradas vicinais e para a realização de festas da igreja ou ainda para a realização de enterros.

Contudo, no momento em que as entidades reunidas no P1MC propõem a essas comunidades a realização de mutirão para outra finalidade, que não faz parte de suas práticas sociais, há uma colisão de culturas, de posturas diante da proposta do programa. De um lado, encontram-se as entidades que importam um ideal de participação condizente com os fluxos financeiros e ideológicos de organizações internacionais para o nível regional e local; e de outro, estão as comunidades que reagem, muitas vezes, de forma inesperada para os técnicos, se recusando a participar do programa ou simplesmente adotando estratégias para dissimular/forjar a participação.

É importante observar o processo de reflexão desses agricultores acerca do “modelo de participação” proposto pelo programa, na medida em que revela a força de pressupostos culturais na seleção de determinadas experiências que surgem ou que são propostas pelas entidades para as famílias de lavradores. De acordo com Galizoni e Ribeiro (2004, p. 08) esses lavradores “podem recusar “inovações” porque elas podem ir contra arcabouços teóricos, seus conhecimentos e pressupostos que alicerçam suas relações com a natureza e com outros lavradores. E esses pressupostos não podem ser entendidos como folclore ou crenças absurdas, ao contrário são conhecimentos locais que foram sendo construídos ao longo de muito tempo, de forma cumulativa e sistemática, baseados na experimentação e na prática de várias gerações”.

Nesse sentido, programas como o P1MC, que tem como proposta uma mudança na organização social de comunidades tradicionais como as do Médio Jequitinhonha, não podem esperar uma adesão ampla e irrestrita da população, mesmo diante do argumento da escassez, visto que outros aspectos também devem ser considerados como a reciprocidade, as estratégias de sobrevivência e reprodução social/material, o sistema de produção e suas temporalidades, o sistema de parentesco, a sazonalidade e organização do trabalho, entre outros. Neste caso o

mutirão, entre as muitas estratégias desenvolvidas por estas famílias, só é posto em prática para fins já previstos pelas regras do grupo, conforme já mencionado acima. Assim, além da importância da finalidade coletiva, tanto quem recebe ajuda quanto quem concede o auxílio espontâneo tem o dever de contribuir, embora não haja nenhum tipo de acordo contratual.

Logo, uma das explicações para o malogro da participação nas comunidades rurais estudadas é a existência desse acordo tácito entre seus moradores. Se não há garantias de que todos de determinada comunidade receberão cisternas, não há como garantir o comparecimento efetivo das famílias, visto que esse é um acordo que tem como pressuposto a reciprocidade.

Outra explicação para essa discordância entre as expectativas das entidades e o real papel desempenhado pelas comunidades rurais dos municípios estudados é a existência de uma incompatibilidade de significados atribuídos às cisternas, bem como a incompatibilidade entre as noções de organização do trabalho vigentes no imaginário das entidades e a forma própria e específica de organização do grupo, do qual são recrutados os participantes para a construção das cisternas. No primeiro caso, para as comunidades as cisternas pertencem ao domínio do particular/privado, sendo denominadas de acordo com as famílias que a receberam, por exemplo, a cisterna da Dona Maria, do Seu Rufino; enquanto que para as entidades, as cisternas são símbolo de solidariedade, organização, coletividade.

No segundo caso, as contradições entre as formas de organização residem no fato de que para as comunidades o mutirão é um compromisso espontâneo, de caráter recíproco, e não uma obrigação, uma tarefa a cumprir enquanto condição para se participar ou não de um determinado programa. Como o P1MC não compreendeu essa dimensão do mutirão, muitas vezes, seus técnicos são levados a coagir as famílias a participarem, sob a ameaça de não serem contempladas com as cisternas. Isso implica em uma idéia de participação forjada, direcionada, passiva e acaba por refletir os anseios e expectativas de desenvolvimento do proponente dos projetos e não os das comunidades, assentados em bases locais, ou seja, no seu histórico e na sua própria forma de organização.

Essas diferentes concepções interferem de forma decisiva na adesão das famílias ao programa, já que, enquanto forma de ajuda mútua tradicionalmente integrante da organização camponesa, o mutirão só é viável quando posto em prática segundo a finalidade prevista pelas regras do grupo (enterros, festas religiosas, serviços de interesse geral). Outra explicação, dada por Galizoni e Ribeiro (2004) em um estudo sobre o significado da água para os sertanejos no Médio Jequitinhonha, é que boa parte dos recursos naturais das comunidades rurais da região (terra, água, plantas, minérios, etc) são de domínio coletivo, ou seja, tanto abundância como escassez devem ser compartilhadas, comunitarizadas.

“... a população rural tem formuladas uma série de princípios aplicáveis em relação à água [...]. Segundo os lavradores, “a água é comum, ninguém pode tirar o direito dela; água tem dono, é do povo, é dos bichos, água é pra todo mundo”. A terra, de acordo com eles pode ser divisível e dividida, mas a água é um recurso público, não privativa, sem donos, pois o destino dela é “circular igual”, uma vez que a água presa, barrada, impedida de circular torna-se suja, imprópria, inservível. Dessa maneira, a suposta acumulação de águas em estoques pode reverter em dano para quem a privatiza, pois parada sua serventia decresce, prejudica a quem prende” (GALIZONI; RIBEIRO, 2004, p. 12).

Não obstante, a privatização da água através das cisternas, é percebida de forma negativa pelas famílias do Médio Jequitinhonha, visto que elas a concebem como um bem público, compartilhado. Dessa forma, as comunidades percebem o problema da escassez de forma diferente daquela apreendida pelas entidades do P1MC, na medida em que este problema não se manifesta da mesma forma. As diferentes e, muitas vezes, contraditórias concepções acerca do que seja escassez, água e cisternas, faz toda a diferença no que tange à formulação e implementação de medidas de combate ou convivência com a seca.

Sendo assim, o P1MC, ao uniformizar o modelo de participação para todo o semi-árido brasileiro, pulveriza as especificidades internas, territoriais e culturais locais, por meio da homogeneização da solução e do uso de “formulas consagradas” de participação que, de alguma maneira, não respeitam as singularidades locais. Diante da baixa adesão das famílias ao processo participativo, as entidades ameaçam as famílias com a retirada do projeto das comunidades, acusando-as de “não saberem conviver com o semi-árido”. Desse modo, o saber da população local é deslocado para os técnicos, organizações e governos, tidos como os possuidores do discurso competente, moderno e atualizado, não podendo ser questionados (CUCHE, 1995).

Nesta fronteira entre o tradicional e o moderno que se encontram as entidades congregadas no P1MC, na medida em que buscam (re) forçar valores democráticos e universais modernos pela adesão a práticas do tradicionalismo político brasileiro, situando-se entre o avanço modernizador capitalista e a tentativa de manter o ideal de comunidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O modelo de participação preconizado pelo P1MC presume que o envolvimento das comunidades rurais no processo de construção de projetos de captação e manejo de água de chuva melhoraria a qualidade da informação e aumentaria o engajamento dessas populações como fator de viabilização desses projetos, incluindo a redução de custos. De fato, nesse modelo, as equipes técnicas mantêm a gestão e o controle da metodologia, operando o funcionamento do grupo e determinando, senão os conteúdos, mas os tipos de resultados que esperam do diagnóstico e do planejamento, ditos participativos. Contudo, para que esse programa prospere nos moldes idealizados, são necessários o reconhecimento e uma certa submissão ao saber local, numa postura que valorize este saber através do emprego de práticas que compreendam a abrangência e a complexidade do processo social, incorporando variáveis políticas e de comportamento.

Para a construção da autonomia do sujeito social na formação e apropriação dos recursos, o método de organização deveria ser não-diretivo e autônomo, apoiando-se na reflexão crítica dos mecanismos de poder que presidem a organização dos agrupamentos coletivos e suas vinculações sociais. A autonomia não se constrói sem um método de organização que opere coletivamente respeitando os espaços individuais; onde a instância reguladora deixe de ser personalizada nas lideranças para ser prerrogativa de comunidades rurais organizadas com respeito às suas singularidades. Se, do ponto de vista meramente instrumental, os métodos mais hierarquizados e diretivos, centrados nas lideranças e no respaldo de organizações fortes, têm muita aceitação

entre as populações rurais na perspectiva de ganhos visíveis, como é o caso da mobilização para o acesso à água P1MC, freqüentemente as organizações que deles resultam têm baixa estabilidade e carecem de investimentos permanentes de reforço, controle ideológico e político.

Constatou-se nessa pesquisa que o peso da dependência, reforçado pelo individualismo e pelas dificuldades nas relações com as entidades, aparece na base das principais dificuldades de desenvolvimento das comunidades, com repercussão direta na ausência de comunidades rurais com iniciativa própria e autonomia para tomar suas próprias decisões. Nessas condições, os modelos de planejamento participativo preconizados e aplicados pelos mais diversos agentes de apoio às populações rurais dos Municípios de Virgem da Lapa e Araçuaí parecem pouco consistentes para o engajamento e compromisso dos agricultores com as decisões coletivas, tanto pela deficiência dos métodos em si, como pela postura diretiva dos agentes externos que os aplicam. É preciso superar a dependência com relação às entidades, ao governo e a outros atores externos às comunidades, sem construir dependências para dentro. A prática de organização comunitária deve permitir a construção de laços de confiança entre os membros das comunidades rurais, baseados em uma relação dialógica, sem que isso ameace as pessoas e a estabilidade da organização.

Com isso, surgem as inconveniências da mobilização e da organização em bases comunitárias para superar as condições de dependência e subordinação. De um lado, a luta contra a os problemas freqüentes no semi-árido, exigindo métodos mais objetivos com resultados mais rápidos, privilegiando estratégias e métodos de mobilização mais efetivos a curto prazo, com ênfase na homogeneização das práticas (estratégias que exigem o alinhamento de estruturas centralizadas e hierarquizadas, do plano nacional para o regional e desse para o local). Neste caso, por exemplo, enquadra-se o controle social, claramente exercido pelas entidades executoras do P1MC. Enquanto pressuposto da cooperação, esse controle social se faz através da exigência ao comparecimento às reuniões e da participação dos agricultores nos mutirões de construção promovidos pelo programa. A presença de comportamentos não cooperativos resulta em ações coercitivas ou de apelo moral, tais como ameaças às comunidades pelas entidades, de não ampliarem o número de famílias beneficiadas pelo programa, caso elas não participem do mutirão. Ou ainda, a ameaça de retirar da pauta de negociações algumas comunidades em virtude desses “problemas”. É óbvio que esta visão é legitimadora do status quo presente nas ações de modernização conservadora e até mesmo nas ações implementadas por organizações da sociedade civil de promoção do “desenvolvimento sustentável”, cujo sustentáculo encontra-se na dependência de determinados grupos, comunidades e sociedades às ingerências de outro.

Por outro lado, a subordinação e a dependência das estruturas locais em relação às estruturas regionais, nacionais e quiçá internacionais de poder inibem a construção de processos locais mais consistentes, com base em reflexões críticas sobre as práticas políticas.

Não obstante, é preciso evidenciar a importância de métodos já experimentados com resultados objetivos na formação de sujeitos sociais autônomos, como é o caso do Fundo

Rotativo Solidário5, que segundo relato dos representantes das entidades executoras do P1MC, fortalecem a participação e fomentam a organização social. Nesse sentido, as diversas formas de organização autônoma das comunidades que, se apoiadas de maneira adequada por práticas não-diretivas, podem beneficiar e fortalecer a associações comunitárias e o capital social dos agricultores familiares.

5 1 O Fundo Rotativo Solidário consiste na aplicação de uma quantia de recursos financeiros suficientes para dar início à primeira etapa de construção de cisternas. As comunidades resgatam parte dos custos das cisternas através de pequenas prestações mensais, definidas a partir das condições sócio-econômicas das famílias a serem contempladas. À medida que os recursos financeiros aplicados inicialmente retornam ao fundo criado, essas comunidades destinam esses recursos em benefício próprio, seja para construção de novas cisternas, seja para a construção de tendas de farinha, implantação de projetos de caprinocultura, irrigação, etc.

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