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Page 1: Artigo Deficiência de Vitamina D em Pacientes com Suspeita ... · Fluminense (UFF) – Niterói, RJ – Brasil Correspondência: Antonio José Lagoeiro Jorge E-mail: lagoeiro@globo.com

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Lagoeiro et al. Vitamina D e Insuficiência Cardíaca Artigo Original

Rev Bras Cardiol. 2013;26(4):253-58julho/agosto

Artigo Original

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Departamento de Medicina Clínica e Programa de Pós-graduação (Doutorado) em Ciências Cardiovasculares - Universidade Federal Fluminense (UFF) – Niterói, RJ – Brasil Correspondência: Antonio José Lagoeiro JorgeE-mail: [email protected] Marquês do Paraná, 303 – Centro – 24033-900 - Niterói, RJ - BrasilRecebido em: 27/01/2013 | Aceito em: 31/07/2013

Deficiência de Vitamina D em Pacientes com Suspeita de Insuficiência Cardíaca e Fração de Ejeção Normal

Vitamin D Deficiency among Patients with Suspected Heart Failure with Normal Ejection Fraction

Antonio José Lagoeiro Jorge, Maria Luiza Garcia Rosa, Monica Di Calafiori Freire, Dayse Mary da Silva Correia, Luiz Claudio Maluhy Fernandes, Mario Luiz Ribeiro, Bruno Afonso Lagoeiro Jorge, Pedro Gemal, Evandro Tinoco Mesquita

Resumo

Fundamentos: Estudos têm demonstrado forte associação entre déficit de vitamina D (VitD) e risco de doença cardiovascular. Níveis reduzidos de VitD apresentam elevada prevalência, e são considerados fator de mau prognóstico na insuficiência cardíaca (IC). Objetivo: Avaliar a deficiência de VitD em pacientes com suspeita de IC e fração de ejeção normal e sua correlação com marcadores de função diastólica e sistólica.Métodos: Estudo transversal com 85 pacientes ambulatoriais (idade 70,8±11,5 anos, sexo feminino 72 % - Rio de Janeiro, latitude -22° Sul) com suspeita de IC e que apresentavam fração FEVE normal. Os pacientes foram submetidos à dosagem de vitamina D 25-hidroxi (25(OH)D) e BNP e realização de ecocardiograma, Doppler tecidual e eletrocardiograma para investigação de ICFEN, de acordo com os critérios da Sociedade Europeia de Cardiologia.Resultados: ICFEN foi confirmada em 32 pacientes (38 %) que tinham valores maiores de BNP (135,1 mediana 109 pg/mL vs. 23,4 mediana 16,4 pg/mL; p<0,0001) e dos índices de disfunção diastólica (volume AE-I 44,2±8,9 mL/m2 vs. 29,3±7,4 mL/m2; relação E/E’ 14,5±6,6 vs. 7,5±2,1; p<0,0001). Valores de VitD foram menores no grupo com ICFEN, com significado estatístico (34,9±14,9 mcg/L vs. 45,0±17,6 mcg/L; p=0,008). Regressão binária logística mostrou idade (p=0,001) e VitD (p=0,036) como fatores independentes significativos para ICFEN. Observou-se correlação negativa entre a relação E/E’ e valores de VitD (r=-0,300 p=0,005).

Abstract

Background: Studies have shown a strong association between vitamin D (VitD) deficiency and the risk of cardiovascular disease. Widely prevalent, VitD deficiency is considered as a poor prognosis factor for heart failure (HF).Objective: To assess VitD deficiency among patients with heart failure with normal ejection fraction (HFNEF) and correlations with systolic and diastolic function markers. Methods: A cross-section study with 85 outpatients (age 70.8±11.5 years, female 72 %, Rio de Janeiro, latitude -22°S) with suspected HF and normal EF, dosed with 25-hydroxy vitamin D (25(OH)D) and BNP measurements, with echocardiograms, tissue Doppler and electrocardiograms for investigating HFNEF, in compliance with the criteria established by the European Society of Cardiology. Results: HFNEF was confirmed in 32 patients (38 %) with higher BNP values (135.1 median 109 pg/mL vs. 23.4 median 16.4 pg/mL; p<0.0001) and diastolic dysfunction rates (volume AE-I 44.2±8.9 mL/m2 vs. 29.3±7.4 mL/m2, E/E’ 14.5±6.6 vs. 7.5±2.1; p<0.0001). The VitD values were lower in the HFNEF group, with statistical significance (34.9±14.9 mcg/L vs. 45.0±17.6 mcg/L; p=0.008). A binary logistic regression revealed age (p=0.001) and vitamin D (p=0.036) as independent factors significant for HFNEF. A negative correlation was noted between the E/E` ratio and the VitD values (r=-0.300 p=0.005).

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Artigo Original

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Conclusão: Pacientes com ICFEN apresentavam menores níveis séricos de VitD e quase a metade apresentava deficiência de VitD. Observou-se correlação negativa entre VitD e relação E/E’ marcador da pressão de enchimento do VE.

Palavras-chave: Vitamina D; Diástole; Insuficiência cardíaca; Prevalência

Conclusion: HFNEF patients had lower serum VitD levels and almost half were VitD deficient. A negative correlation was noted between VitD and the E/E’ ratio, an LV filling pressure marker.

Keywords: Vitamin D; Diastole; Heart failure; Prevalence

Introdução

A insuficiência cardíaca (IC) é um grave problema de saúde pública em todo o mundo e a principal causa de internação hospitalar após os 60 anos de idade no Brasil1. Metade dos pacientes com IC apresenta IC com fração de ejeção reduzida (ICFER) e a outra metade IC com fração de ejeção normal (ICFEN); com o envelhecimento progressivo da população, ocorrerá um aumento absoluto do número de casos de ICFEN2,3.

A vitamina D é descrita como uma substância responsável pela regulação da homeostasia do cálcio e a deficiência de vitamina D é uma situação comum em idosos4.

Estudos epidemiológicos têm demonstrado forte associação entre déficit de vitamina D e risco de doença cardiovascular (DCV)5. O déficit de vitamina D predispõe ao aumento do risco para comorbidades como hipertensão arterial, doença aterosclerótica coronariana (DAC) e IC5.

Níveis reduzidos de vitamina D apresentam elevada prevalência em pacientes com ICFER e estão associados com pior prognóstico6-9. O déficit de vitamina D se relaciona com a piora na qualidade de vida e redução do desempenho funcional, devido a anormalidades das funções sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo (VE) e do sistema vascular, podendo contribuir, portanto, na gênese ou progressão da IC6,7,10,11.

Receptores de vitamina D (RVD), presentes em cardiomiócitos, teriam sua expressão aumentada na presença de déficit de vitamina D, estando associados ao desenvolvimento de hipertrofia miocárdica. Além disso, vitamina D tem efeitos sobre a contratilidade e o relaxamento miocárdico5.

ICFEN acomete particularmente idosos com múltiplas comorbidades12 e a relação entre o déficit de vitamina D e ICFEN não está ainda bem estabelecido.

O objetivo deste estudo é avaliar a prevalência da deficiência de 25(OH)D em pacientes com suspeita de

IC e FEVE normal e sua correlação com marcadores de função diastólica e sistólica.

Métodos

Estudo transversal envolvendo 85 pacientes ambulatoriais consecutivos (70,8±11,5 anos; 24 homens, 61 mulheres - Rio de Janeiro, latitude -22° Sul) com suspeita clínica de IC. Foram avaliados inicialmente pacientes que apresentavam sinais ou sintomas de IC e que submetidos ao exame de ecoDopplercardiograma apresentavam a FEVE ≥50 %. Pacientes foram então encaminhados ao exame de BNP e dosagem de 25(OH)D. Deficiência de vitamina D foi definida por valores de 25(OH)D <30 mcg/L.

Foram classificados como casos os pacientes que apresentavam deficiência de vitamina D e como controles os demais. Foram excluídos pacientes com doença valvar grave e portadores de marca-passo cardíaco.

ICFEN foi definida de acordo com o documento da Sociedade Europeia de Cardiologia13 pela presença de fração de ejeção do VE ≥50 %, volume diastólico final do VE<97 mL/m2 e evidências de disfunção diastólica (DD).

Evidências diagnósticas de DD foram obtidas pelo EDT pela presença da relação E/E`>1513. Quando a relação E/E` era sugestiva de DD (15>E/E’>8), outros parâmetros ecocardiográficos foram utilizados para confirmar o diagnóstico, como massa do VE indexada (>122 g/m2 e >149 g/m2 em mulheres e homens, respectivamente), volume de átrio esquerdo indexado (VAE-I) ≥40 ml/m2, relação E/A 0,5 e tempo de desaceleração de E (DT) >280 ms. ECG com fibrilação atrial e BNP >200 pg/mL também confirmaram DD em pacientes com E/E` entre 8 e 1513.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense sob o nº 00410.258.000-08.

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Avaliação Laboratorial

Pacientes realizaram dosagem de vitamina D 25-hidroxi (25(OH)D) pela cromatografia líquida de alta performance, considerando-se normais os valores entre 30-80 mcg/L e deficiência de vitamina D <30 mcg/L. O BNP foi dosado pelo Triage BNP Test (BioSite, Boston, USA), teste rápido por fluoroimunoanálise, com valores expressos em pg/ml.

Ecocardiograma

O ecoDopplercardiograma foi realizado com utilização do aparelho VIVID 7 (GE® Wisconsin, USA), e analisado com software ECHOPAC (GE® Wisconsin, USA), por um investigador experiente, sem conhecimento prévio dos resultados dos outros exames.

As dimensões do átrio esquerdo foram medidas no modo M na janela paraesternal e os valores indexados pela superfície corporal. Foi medido o fluxo transmitral inicial (E), o tardio (A), a relação entre eles (E/A), e o tempo de desaceleração do fluxo transmitral inicial (TD). A velocidade de relaxamento miocárdico no início da diástole (E’) foi medida nos segmentos septal e lateral do anel mitral, e obtida a média dessas medidas. A função sistólica dos pacientes também foi avaliada pela medida do estiramento do eixo longitudinal do VE (S’).

Análise Estatística

Análise estatística foi processada pelo software SPSS® 17.0 (SPSS Inc., Chicago IL, USA). Variáveis contínuas com distribuição normal foram expressas em médias±desvio-padrão e com distribuição anormal em medianas. Variáveis categóricas foram representadas em percentagem. Para comparação de dados numéricos o teste ANOVA foi usado para amostras independentes. Na comparação de dados categóricos foi utilizado o teste do qui-quadrado. Um modelo de regressão logística binária foi utilizado para analisar a influência de vários parâmetros na ocorrência de ICFEN. Correlação de Spearman foi utilizada para medir a associação entre 25(OH)D com as variáveis. Nível de significância adotado foi p<0,05.

Resultados

Deficiência de vitamina D foi confirmada em 27 (32 %) pacientes. A Tabela 1 apresenta as principais características dos pacientes estudados.

Valores reduzidos de 25(OH)D foram observados em 32 % da população amostral. O grupo ICFEN apresentava valores de 25(OH)D menores em relação ao grupo em que a ICFEN não foi confirmada (34,9±14,9 mcg/L vs. 45,0±17,6 mcg/L p=0,008), e 47 % dos pacientes com ICFEN apresentavam déficit de 25(OH)D (<30 mcg/L) versus 22 % no grupo sem ICFEN.

A média de idade dos pacientes com déficit de 25(OH)D foi semelhante à observada em pacientes com valores normais (72,6±12,4 anos vs. 70±11,1 anos p=0,340).

Pacientes com ICFEN apresentavam piora da função diastólica devido à diminuição do relaxamento do VE (E’), aumento da pressão de enchimento do VE (VAE-I e relação E/E`) e hipertrofia do VE (massa do VE-I) e da função sistólica avaliada pelo estiramento eixo longitudinal do VE (S`) (Tabela 1).

Análise de regressão logística binária mostrou que idade e valores de vitamina D foram fatores determinantes independentes de ICFEN (Tabela 2).

Não houve correlação entre parâmetros clínicos e laboratoriais com os níveis de 25(OH)D. Os parâmetros de função sistólica não se correlacionaram com os valores de 25(OH)D. Observou-se correlação negativa moderada entre a relação E/E’ e valores de 25(OH)D (r=-0,300; p=0,005) (Tabela 3).

Discussão

O estudo é pioneiro em demonstrar o aumento da prevalência do déficit de vitamina D em pacientes com ICFEN, empregando os critérios da Sociedade Europeia de Cardiologia13.

Neste trabalho foram estudados pacientes ambulatoriais, sem restrições de mobilidade ou limitações à exposição à luz solar que difere dos pacientes estudados com déficit de vitamina D na Europa14, e mesmo assim observou-se redução dos níveis de 25(OH)D em 47 % dos pacientes com ICFEN.

A forma ativa da vitamina D, hoje considerada um hormônio esteroide, atua nos RVD presentes em diferentes células incluindo os cardiomiócitos e o endotélio. O mecanismo pelo qual a vitamina D protege o indivíduo de ter DCV não está ainda bem estabelecido, e esse efeito protetor pode estar relacionado à regulação negativa da renina, efeito antiproliferativo cardíaco, melhora da complacência vascular e melhora do controle glicêmico5.

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A população estudada é constituída em sua maioria de pacientes idosos e a deficiência de vitamina D em idosos é causada principalmente pela redução de sua síntese na pele devido a pouca exposição à luz solar e pela piora da conversão de 7-de-hidrocolesterol para provitamina D relacionada ao envelhecimento4. Os pacientes estudados apresentavam comorbidades que desempenham também papel importante na fisiopatologia da ICFEN e o déficit de vitamina D se correlaciona com diferentes comorbidades15. O envelhecimento e o déficit de vitamina D estão relacionados ao desenvolvimento de ICFEN conforme demonstrado neste estudo (Tabela 2).

Níveis reduzidos de vitamina D são frequentemente observados em pacientes com redução da função renal. Na amostra estudada não houve correlação entre a taxa de filtração glomerular estimada e os valores de vitamina D.

Tabela 1 Características clínicas, laboratoriais, função sistólica e diastólica pelo ecoDopplercardiograma e ecoDoppler tecidual da população estudada

Total Com ICFEN Sem ICFEN p

(n=85) (n=32) (n=53)

25(OH)D mcg/L 41,2±17,3 34,9±14,9 45,0±17,6 0,008

Idade (anos) 70,8± 11,5 76,9±11,2 67,2±10,1 <0,0001

Sexo feminino (%) 72,0 81,0 66,0 0,131

FC (bpm) 77±16 81±20 75±13 0,087

IMC (kg/m2) 28,9±6,1 28,9±7,7 28,9±4,9 0,999

HAS (%) 93,0 97,0 91,0 0,262

PAS (mmHg) 151±26 156±26 148±26 0,154

Diabetes (%) 32,0 44,0 25,0 0,055

Glicose (mg/dL) 105±24 110±29 102±19 0,128

Fibrilação atrial (%) 14,0 28,0 6,0 0,006

PCR US (mg/dL)* 0,47(0,28) 0,47(0,24) 0,47(0,29) 0,991

BNP (pg/mL)* 65,5(30,2) 135,1(109) 23,4(16,4) <0,0001

Função renal

Creatinina (mg/dL) 0,93±0,32 0,93±0,32 0,93±0,35 0,947

TFG (ml/min) 80,9±37,2 72,4±37,5 86,0±36,4 0,103

Função sistólica

FEVE (%) 72±8 70±9 74±8 0,051

S’ (cm/s) 8,8±2,5 7,3±2,2 9,6±2,3 <0,0001

Função diastólica

E’ (cm/s) 8,7±2,7 7,6±2,6 9,4±2,6 0,002

Relação E/E’ 10,2±5,5 14,5±6,6 7,5±2,1 <0,0001

VAE-I (ml/m2) 34,9±10,7 44,2±8,9 29,3±7,4 <0,0001

Massa VE-I (g/m2) 90,1±23,6 97,2±26,8 85,9±20,5 0,032

Valores expressos em médias±desvio-padrão; (*) medianaFC=frequência cardíaca; PAS=pressão arterial sistólica; HAS=hipertensão arterial; IMC=índice de massa corporal; 25(OH)D=vitamina D; TFG=taxa de filtração glomerular; PCR US=proteína C-reativa ultrassensível estimada; FEVE=fração de ejeção do ventrículo esquerdo; VAE-I=volume do átrio esquerdo indexado; Massa VE-I=massa do ventrículo esquerdo indexado Variáveis categóricas: teste de Pearson qui-quadrado; Variáveis numéricas: teste t de Student

Diferenças significativas entre grupos para valor de p<0,05

Tabela 2 Preditores de ICFEN em análise de regressão logística

Variável B Intervalo de confiança 95 %

Valor de p

Idade 0,085 1,034 a 1,146 0,001

Vitamina D -0,35 0,934 a 0,998 0,036

ICFEN=insuficiência cardíaca com fração de ejeção normal.

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Baixas concentrações de vitamina D estão correlacionadas a indicadores clínicos de IC grave como alto escore de NYHA e níveis elevados de peptídeos natriuréticos16. Neste estudo, pacientes com ICFEN apresentavam valores elevados de BNP, porém não se demonstrou relação entre os níveis de 25(OH)D e BNP.

Não está ainda comprovado se a reposição de vitamina D poderia trazer algum benefício para pacientes com IC. Witham et al.6 administraram 100.000 U de vitamina D ou placebo a pacientes idosos com ICFER e déficit de vitamina D (<20 ng/mL). A suplementação de vitamina D não melhorou a capacidade funcional ou a qualidade de vida após 10 semanas no grupo que recebeu vitamina D em relação ao grupo-placebo6.

Os resultados aqui encontrados mostraram uma correlação negativa entre níveis de 25(OH)D e a relação E/E’ que é um substituto não invasivo da medida das pressões de enchimento do VE e principal parâmetro para diagnóstico de ICFEN de acordo com os critérios estabelecidos pela Sociedade Europeia de Cardiologia13. O déficit de vitamina D promove aumento da expressão de RVD e interfere com a função diastólica e também aumento da produção de renina que poderia promover retenção hidrossalina e contribuir para o aumento das pressões de enchimento ventricular. Em associação o déficit de vitamina D

poderia contribuir para o agravamento das comorbidades que são altamente prevalentes em ICFEN como hipertensão arterial, diabetes, DAC e insuficiência renal crônica12. Novos estudos devem ser delineados para confirmar esses achados e testar se a reposição de vitamina D poderia ser benéfica na ICFEN.

Conclusão

Neste estudo pacientes com ICFEN apresentavam, em média, menores níveis séricos de 25(OH)D e quase a metade apresentava deficiência de vitamina D. Observa-se correlação negativa entre a vitamina D e a relação E/E’ que marca a pressão de enchimento do VE.

Novos estudos necessitam ser realizados objetivando testar os efeitos da intervenção com vitamina D em portadores de ICFEN, avaliando o impacto sobre desfechos clínicos.

Potencial Conflito de InteressesDeclaro não haver conflitos de interesses pertinentes.

Fontes de FinanciamentoO presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação AcadêmicaO presente estudo pertence à linha de pesquisa do Programa de Pós-graduação (Doutorado) em Ciências Cardiovasculares da UFF.

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Tabela 3Correlação entre a 25(OH)D e variáveis clínicas, laboratoriais e ecocardiográficas

Spearman (r) p

Idade (anos) -0,160 0,144

FC (bpm) -0,096 0,380

TFG (ml/min) -0,142 0,195

BNP (pg/ml) -0,185 0,090

FEVE (%) 0,082 0,453

S’ (cm/s) 0,072 0,520

E’ (cm/s) 0,133 0,226

Relação E/E’ -0,300 0,005

VAE-I (ml/m2) -0,163 0,136

Massa VE-I (g/m2) 0,049 0,653

FC=frequência cardíaca; VAE-I=volume do átrio esquerdo indexado; Massa VE-I=massa do ventrículo esquerdo indexado; BNP=-peptídeo natriurético tipo B; FEVE=fração de ejeção do ventrículo esquerdo; TFG=taxa de filtração glomerular estimada pela formula de Cockroft-Gault; E=velocidade do fluxo transmitral no início da diástole; E’=velocidade do anel mitral no início da diástole; S’=velocidade de estiramento do eixo longitudinalCorrelação significativa até o p valor=0,05

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