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ARP!45 Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XXII, nº 85, pág. 45-50, Jan.-Mar., 2010 Avaliação Imagiológica da Doença Inflamatória Intestinal Idiopática Imaging in the Evaluation of the Idiopathic Inflammatory Bowel Diseases Tiago Bilhim 1 , Cláudia Videira 2 , Milena Mendes 3 , Dulce Travassos 4 , Ana Cardoso 5 , Ana Costa 4 1 Interno de Radiodiagnóstico 2 Interna de Radiodiagnóstico, Hospital Santarém 3 Assistente Hospitalar de Gastrenterologia 4 Assistente Hospitalar Graduada Radiologia 5 Assistente Hospitalar Graduada Radiologia 4 Serviço de Radiologia do Hospital Fernando Fonseca - Directora: Dr.ª Manuela Baptista 1,3,5 Serviço de Radiologia do Hospital Stº António Capuchos - Coordenadora: Dr.ª Zita Teresa Seabra Resumo A doença inflamatória intestinal idiopática (DII), que engloba a colite ulcerosa e a doença de Crohn, é comum e está a tornar-se mais prevalente, podendo surgir em qualquer fase da vida. A abordagem diagnóstica passa pela avaliação clínica, realização de análises sanguíneas e coproculturas, visualização directa da mucosa na colonoscopia e na endoscopia digestiva alta que permitem obtenção de fragmentos para avaliação histológica e diagnóstico definitivo. A imagiologia tem um papel importante na abordagem diagnóstica, na avaliação da actividade da doença (fase activa ou quiescente), na determinação da extensão inflamatória, na detecção de possíveis complicações e na monitorização da resposta à terapêutica médica e/ou cirúrgica. Este trabalho apresenta uma revisão das principais características imagiológicas da DII, comparando as fases activa e quiescente da doença. Os resultados apresentados permitem correlacionar os achados dos estudos contrastados baritados do tubo digestivo com a TC, de modo a optimizar a informação fornecida ao clínico. Palavras-chave Doença Inflamatória Intestinal Idiopática (DII); Colite Ulcerosa (CU); Doença de Crohn (DC); Tomografia Computorizada (TC). Abstract The idiopathic inflammatory bowel diseases (IBD), including ulcerative colitis and Crohn’s disease, are common and becoming more prevalent. IBD can occur at all ages. The diagnostic work-up includes clinic evaluation, blood tests, faeces analysis, direct visualization of the mucosa by colonoscopy or gastro-duodenal endoscopy with biopsies that allow histologic confirmation. Imaging plays an important role in the diagnostic work-up, in the evaluation of the extent and activity of the disease, detecting possible complications and monitoring the response to the therapeutics. This work revises the main imaging findings of IBD in the active and remission phases. Our results allow a correlation between the bowel barium studies and CT in order to allow a better understanding and response in the management of this disease. Key-words Idiopathic Inflammatory Bowel Diseases (IBD); Crohn’s Disease (CD); Ulcerative Colitis (UC); Computed Tomography (CT). Introdução A colite ulcerosa (CU) e a doença de Crohn (DC), conhecidas globalmente como doença inflamatória intestinal idiopática (DII) permanecem um desafio Recebido a 22/01/2009 Aceite a 09/04/2009 Artigo de Revisão / Revision Article diagnóstico e terapêutico. Enquanto que as outras doenças inflamatórias do tubo digestivo se distinguem pelo seu agente etiológico específico ou pela natureza da actividade inflamatória, a CU e a DC são patologias de etiologia desconhecida, curso clínico incerto e imprevisível e respostas variáveis à abordagem médica e cirúrgica [1,2,3]. Tradicionalmente, os estudos baritados como o trânsito seriado do delgado, a enteroclise e o clister opaco tiveram

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Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XXII, nº 85, pág. 45-50, Jan.-Mar., 2010

Avaliação Imagiológica da Doença Inflamatória IntestinalIdiopática

Imaging in the Evaluation of the Idiopathic Inflammatory BowelDiseases

Tiago Bilhim1, Cláudia Videira2, Milena Mendes3, Dulce Travassos4, Ana Cardoso5, Ana Costa4

1 Interno de Radiodiagnóstico2 Interna de Radiodiagnóstico, Hospital Santarém3 Assistente Hospitalar de Gastrenterologia4 Assistente Hospitalar Graduada Radiologia5 Assistente Hospitalar Graduada Radiologia4Serviço de Radiologia do Hospital Fernando Fonseca - Directora: Dr.ª Manuela Baptista1,3,5 Serviço de Radiologia do Hospital Stº António Capuchos - Coordenadora: Dr.ª Zita Teresa Seabra

Resumo

A doença inflamatória intestinal idiopática (DII), que engloba a colite ulcerosa e a doença de Crohn, é comum e está a tornar-semais prevalente, podendo surgir em qualquer fase da vida. A abordagem diagnóstica passa pela avaliação clínica, realização deanálises sanguíneas e coproculturas, visualização directa da mucosa na colonoscopia e na endoscopia digestiva alta que permitemobtenção de fragmentos para avaliação histológica e diagnóstico definitivo. A imagiologia tem um papel importante na abordagemdiagnóstica, na avaliação da actividade da doença (fase activa ou quiescente), na determinação da extensão inflamatória, nadetecção de possíveis complicações e na monitorização da resposta à terapêutica médica e/ou cirúrgica.Este trabalho apresenta uma revisão das principais características imagiológicas da DII, comparando as fases activa e quiescenteda doença. Os resultados apresentados permitem correlacionar os achados dos estudos contrastados baritados do tubo digestivocom a TC, de modo a optimizar a informação fornecida ao clínico.

Palavras-chave

Doença Inflamatória Intestinal Idiopática (DII); Colite Ulcerosa (CU); Doença de Crohn (DC); Tomografia Computorizada (TC).

Abstract

The idiopathic inflammatory bowel diseases (IBD), including ulcerative colitis and Crohn’s disease, are common and becomingmore prevalent. IBD can occur at all ages. The diagnostic work-up includes clinic evaluation, blood tests, faeces analysis, directvisualization of the mucosa by colonoscopy or gastro-duodenal endoscopy with biopsies that allow histologic confirmation.Imaging plays an important role in the diagnostic work-up, in the evaluation of the extent and activity of the disease, detectingpossible complications and monitoring the response to the therapeutics.This work revises the main imaging findings of IBD in the active and remission phases. Our results allow a correlation betweenthe bowel barium studies and CT in order to allow a better understanding and response in the management of this disease.

Key-words

Idiopathic Inflammatory Bowel Diseases (IBD); Crohn’s Disease (CD); Ulcerative Colitis (UC); Computed Tomography (CT).

Introdução

A colite ulcerosa (CU) e a doença de Crohn (DC),conhecidas globalmente como doença inflamatóriaintestinal idiopática (DII) permanecem um desafio

Recebido a 22/01/2009Aceite a 09/04/2009

Artigo de Revisão / Revision Article

diagnóstico e terapêutico. Enquanto que as outras doençasinflamatórias do tubo digestivo se distinguem pelo seuagente etiológico específico ou pela natureza da actividadeinflamatória, a CU e a DC são patologias de etiologiadesconhecida, curso clínico incerto e imprevisível erespostas variáveis à abordagem médica e cirúrgica [1,2,3].Tradicionalmente, os estudos baritados como o trânsitoseriado do delgado, a enteroclise e o clister opaco tiveram

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um papel primário no diagnóstico e na abordagem dospacientes com suspeita de DII [4]. A colonoscopia e osestudos baritados são importantes meios de avaliação dedoentes com diagnóstico ou suspeita de DII, uma vez quepermitem uma boa visualização da mucosa e de alteraçõesno calibre luminal. Contudo, estas técnicas nãodemonstram a extensão transmural da inflamação ou ascomplicações intraperitoneais (extra-intestinais).Nos últimos anos, a tomografia computorizada (TC) temvindo a revelar-se indispensável na avaliação de pacientescom DII, uma vez que permite avaliar as alteraçõespatológicas afectando a parede intestinal, a gorduramesentérica e as outras estruturas adjacentes extra-intestinais [1].Os estudos endoscópicos e os exames radiológicos sãogeralmente usados no diagnóstico e na determinação daextensão da DII [5]. A imagiologia tem um papelimportante na determinação dos segmentos intestinaisafectados, na definição da extensão do envolvimentoinflamatório, na avaliação da resposta à terapêutica e nadetecção de complicações[6].Recentemente tem surgido um interesse crescente naavaliação imagiológica do grau de actividade da DII,principalmente da DC por TC. A actividade da DC podeser avaliada em entero-TC, utilizando contrasteendoluminal intestinal neutro ou negativo, frequentementeo manitol [7,8].Tanto a TC como a Ressonância Magnética (RM) têmsensibilidade superior a 95% na avaliação da extensão eactividade da DC e podem demonstrar as condições querequerem cirurgia digestiva electiva, ajudando, destaforma, no planeamento terapêutico [9,10,11]. No planoclínico, a TC é a modalidade imagiológica de escolha namaioria das instituições [9,12].Os objectivos deste trabalho são rever as principaiscaracterísticas imagiológicas da DII, as possíveiscomplicações médico-cirúrgicas associadas, a correlaçãoentre os achados nos estudos baritados e por TC e aindadiferenciar a doença em fase activa da doença em fasequiescente, bem como mostrar as alterações imagiológicasque podem surgir na doença de longa duração.

Resultados

Foram avaliados os processos clínicos e os examesimagiológicos de doentes com diagnóstico clínico ehistológico de DII no Hospital Fernando Fonseca e no

Hospital Stº António dos Capuchos, no ano de 2007.Foram seleccionados os casos consideradosexemplificativos e de maior teor didáctico.

Colite ulcerosa1. Fase activa: Na avaliação de doentes com coliteulcerosa (CU), os principais achados de doença emactividade no clister opaco foram a presença de um padrãogranular fino da mucosa, as úlceras, (nomeadamente embotão de punho), os pseudopolipos inflamatórios e oespessamento das haustras.Os achados correspondentes em TC foram a presença deespessamento parietal do cólon (geralmente <10mm), decontornos regulares, o sinal do halo ou alvo, a ausência defezes no segmento afectado, o espessamento e adensificação da gordura mesentérica com adenopatias e ahiperemia para-cólica (Figura 1). O Sinal do halo ou alvoconsiste na estratificação parietal do cólon por hiperemiahiperdensa da mucosa, com halo de edema hipodenso dasubmucosa envolvente, com anel exterior hiperdenso dacamada muscular própria(após administração de contrastee.v.).

2. Fase quiescente: As alterações no clister opacosugestivas de CU de longa duração, em fase quiescente,foram a presença de um padrão granular grosseiro, depseudopolipos pós-inflamatórios, a estenose do lúmen, aperda das haustras e válvulas rectais e o aumento do espaçopré-sagrado.Os achados correspondentes em TC foram a presença deespessamento parietal homogéneo, a estenose do lúmen(por hipertrofia muscular), a perda das haustras e o aumentodo espaço pré-sagrado (figura 2).

3. Reactivação: Quando se trata de uma reactivação numdoente com colite ulcerosa de longa duração, o quadroimagiológico adquire maior complexidade. Há umasobreposição dos achados da doença em fase activa e dadoença quiescente de longa duração previamente referidos.A afecção do cólon pode aparentar doença segmentar,descontínua e focal, simulando doença de Crohn (DC) edificultando o diagnóstico diferencial (figura 3).

Doença de Crohn1. Fase activa: Na avaliação da Doença de Crohn (DC),as alterações observadas no trânsito seriado do delgado,na enteroclise e no clister opaco são mais variadas edependem dos segmentos afectados. Foram considerados

Fig. 1 – Pancolite ulcerosa em fase activa – Envolvimento de todo o cólon com sinal do “alvo”, ausência de fezes nos segmentos afectados, ealterações da gordura mesentérica (TC).

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vários sinais de doença em actividade, como a alteraçãodo relevo mucoso com um padrão granular, os nóduloslinfóides, as úlceras aftóides e/ou profundas e ospseudopolipos inflamatórios. O padrão em “pedra decalçada” corresponde a uma alternância entre imagenslineares de adição (traduzindo úlceras) e defeitos derepleção (em relação com pseudopolipos). O sinal da“corda” representa ileíte terminal grave, que condicionamarcada redução do lúmen intestinal. O aumento do espaçointer-ansas e a presença de complicações como fístulas oudoença ano-rectal são outros achados indicativos de doençaactiva (figuras 4 e 5).Os achados correspondentes, indicativos de DC activa emTC, reflectem as alterações inflamatórias da paredeintestinal e da gordura adjacente. O espessamento parietalintestinal assimétrico, de contornos irregulares, comestratificação da parede intestinal após administração decontraste e.v., foi um achado frequente. As alterações dagordura adjacente, com proliferação fibro-adiposa,densificação e adenopatias mesentéricas foram algunssinais indirectos observados. O sinal do “pente”corresponde à hiperemia vascular mesentérica adjacenteaos segmentos ileais inflamados, pelo que também se pode

denominar de jejunização do íleon. A presença decomplicações como abcessos/fleimões, fístulas e trajectossinusais foram alterações complementares (figuras 4 e 5).

2. Fase quiescente: Quando a DC entra numa fase deremissão passa a ter características imagiológicas distintas,podendo persistir um espessamento parietal, assimétrico,de contornos irregulares, menos marcado que na faseactiva. Geralmente não se observam alterações relevantesna gordura intra-abdominal (figura 6). À medida que adoença evolui para fibrose, passa a haver uma perda daestratificação mural, com estenose luminal fibro-cicatriciale saculações do delgado por retracção do bordomesentérico. No cólon observa-se, também, uma perda dopadrão das haustras.

3. Reactivação: Na reactivação da doença observamos ossinais descritos em fase activa e de longa duração (figuras7 e 8).

4. Entero-TC: Na avaliação da DC em entero-TC utilizou-se o manitol para opacificar o tubo digestivo como meiode contraste hipodenso, permitindo, após administraçãode contraste e.v., a visualização da mucosa hipercaptante.

Fig. 2 – Colite ulcerosa clínica e imagiologicamente em fase quiescente - TC demonstra espessamento parietal homogéneo e menos marcado, semo sinal do “alvo”.

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Fig. 3 – Colite ulcerosa de longa duração: A – Doença do recto de longa duração – Aumento do espaço pré-sagrado, perda das válvulas rectais e dadistensibilidade da ampola rectal (Clister Opaco). B – Reactivação da doença na sigmoideia – Estenose luminal, perda das haustras e úlceras nobordo antimesentérico da sigmoideia (Clister Opaco). C – Espessamento parietal da sigmoideia com hipercaptação da mucosa, menos evidente quena figura 1 (TC).

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Contudo, a detecção de complicações como abcessos oufístulas pode ficar prejudicada quando se utiliza contrasteoral negativo (figura 9).

Discussão

Neste estudo foram seleccionados os casos clínicosconsiderados mais exemplificativos das características dadoença inflamatória intestinal idiopática (DII), registados

no Hospital Fernando Fonseca e no Hospital Stº Antóniodos Capuchos, no ano de 2007. O estudo focou-se na coliteulcerosa (CU) e na doença de Crohn (DC).Os estudos contrastados convencionais do tubo digestivosão complementares aos achados em TC, uma vez que osprimeiros demonstram melhor as alterações da mucosa edo lúmen, enquanto que a TC permite uma avaliação daparede do tubo digestivo e das alterações da gordura eoutras estruturas adjacentes.Os protocolos de entero-TC com manitol estão descritosna literatura [7,8,13], embora sejam menos usados.Inicialmente utilizou-se a entubação naso-gástrica, tendosido comprovado que tal não é indispensável, conseguindo-se uma boa distensão do delgado, mesmo com aopacificação per os do tubo digestivo [13]. No protocolopor nós utilizado, são administrados 10 mg demetoclopramida oral, 75 minutos antes do exame, de formaa aumentar a peristalse gástrica e jejuno-ileal. Os doentesbebem quatro doses de 450 mL de água com manitoldiluído a 5% durante 75 minutos, perfazendo um total de1.800 mL. A primeira dose de 450 mL deve ser dada logoapós a metoclopramida e as doses subsequentes dadas aos25, 50 e 65 minutos após a ingestão do agente peristáltico.A realização da TC faz-se 75 minutos após a ingestão da

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Fig. 4 – Doença de Crohn do íleon distal em fase activa. A – Padrão em “pedra de calçada” da última ansa ileal (trânsito seriado do delgado). B –Estenose luminal do íleon terminal com granularidade do relevo mucoso (clister opaco). C – Espessamento parietal assimétrico, estratificação daparede intestinal e fleimão envolvente (TC).

Fig. 5 – Doença de Crohn do íleon distal em fase activa. A – Sinal da “corda” (seta fina) e trajecto fistuloso êntero-cutâneo (seta grossa) (trânsitoseriado do intestino delgado). B – Aspecto correspondente, reformatação coronal (seta) (TC). C – Abcesso da parede abdominal (seta) (TC).

Fig. 6 – Doença de Crohn ileo-cecal em fase quiescente - Ligeiroespessamento parietal ileo-cecal, sem alterações significativas da gorduraadjacente (TC).

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Fig. 9 – DC ileal activa. A – Hipercaptação da mucosa nas zonasafectadas do íleon distal (entero-TC). B – Mucosa ileal hipercaptantecom imagem sugestiva de abcesso na fossa ilíaca (imagem de cima –Entero-TC). TC correspondente com contraste endoluminal iodadoconfirmou a natureza extra-luminal da colecção (imagem de baixo).

metoclopramida, com administração de 1 mg de glucagone.v. antes. A aquisição é feita com injecção de 150 mL decontraste iodado e.v., com um fluxo de 3mL/seg., e com70 segundos de atraso (fase venosa portal). Este protocolopermite obter uma boa distensão luminal e evidenciar ahipercaptação do contraste e.v. pela mucosa, comodemonstrado nos resultados deste trabalho. Se houvercontra-indicação para a administração de contraste e.v.,não há benefício na utilização do protocolo de entero-TCcom manitol.Existem, também, muitos estudos de entero-RM em curso[9,10]. É provável que esta técnica venha a ganhar maiorrelevo na avaliação destes doentes de uma forma maisgeneralizada.

As características particulares da CU e da DC explicam asdiferenças observadas no tipo de espessamento parietalintestinal. Na CU o espessamento deve-se em grande parteao edema da submucosa na fase aguda (responsável pelapresença do sinal do “alvo”) e à hipertrofia da camadamuscular própria, na doença de longa duração. Já na DC,o espessamento parietal intestinal deve-se a um processoinflamatório granulomatoso de toda a parede e não só damucosa que condiciona estenose luminal mais acentuada.Na DC de longa duração, o espessamento parietal deve-seà fibrose e não à hipertrofia muscular parietal.Neste trabalho descreveram-se exemplos das complicaçõesmais frequentes da DC como os abcessos, as fístulas, adoença peri-anal (que ocorre em até um terço dos casos) ea obstrução intestinal. É de salientar que na avaliação daDII em TC é fundamental obter uma aquisição completado períneo, pois podem ser deixadas por diagnosticarcomplicações peri-anais que modificam a abordagemterapêutica.A diversidade de achados imagiológicos é muito maior naDC do que na CU. Esta situação deve-se às diferentescaracterísticas previamente descritas para estas doenças eao facto de as complicações serem mais frequentes na DC.Além disso, a avaliação da afecção do delgado na DCpermanece de difícil acesso aos gastrenterologistas (apesarda introdução da enteroscopia por video-cápsula), fazendocom que se realizem mais exames de imagem nestesdoentes.Quando apenas o cólon é afectado na DC podem colocar-se alguns problemas no diagnóstico diferencial entre DCe CU, sendo que entre 10% a 20% dos casos ficamdesignadas como colite indeterminada. As alteraçõespreviamente descritas no mesentério podem ser visíveis

Fig. 7 – Doença de Crohn ileal. A e B – Fase activa com o sinal do “pente” e estratificação mural do íleon distal (TC). C – Mesmo doente, 8 mesesdepois. Evolução fibro-estenosante do íleon terminal que condiciona sub oclusão intestinal (TC).

Fig. 8 – Doença de Crohn jejunal e colo-rectal de longa duração. A – Fístula entero-entérica jejunal (enteroclise). B – Saculação de ansa jejunal(enteroclise). C e D – Alteração segmentar do calibre, relevo mucoso e perda das haustras colo-rectal (clister opaco). E – Envolvimento do delgadoe cólon. Fístula ano-cutânea (TC).

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em ambas as doenças, mas são mais exuberantes na DC,pela proliferação fibrolipomatosa e adenopatias de maioresdimensões. Nas fases iniciais, a diferenciação imagiológicaentre CU e DC pode ser mais simples, contudo, à medidaque a doença vai tendo maior tempo de duração, com váriasfases de remissão e reactivação, o diagnóstico diferencialpode ficar dificultado.Ainda mais, os achados imagiológicos descritos tambémpodem ser encontrados noutras situações como enterocoliteinfecciosa, diverticulite, apendicite, colite isquémica, coliterádica, colite neutropénica, doença do enxerto versushospedeiro, neoplasia, uso crónico de laxantes, de AINE’se outras. Mesmo o sinal do “alvo” e a estratificação muralnão são patognomónicos, pelo que a correlação com aclínica, com os achados endoscópicos, a histologia, osexames laboratoriais e as coproculturas (com pesquisa dequistos, ovos, parasitas e exame bacteriológico) é essencialpara uma melhor abordagem diagnóstica destes doentes.Outros aspectos importantes na avaliação imagiológica daDII são a determinação da extensão e da actividade dadoença, o seguimento da resposta à terapêutica e aidentificação de possíveis complicações.No caso particular da DC de longa duração com evoluçãofibro-estenosante, é importante avaliar a estratificaçãomural intestinal por TC, uma vez que a sua presençasignifica tratar-se de uma doença inflamatória ainda emactividade, reversível. Se se perder a estratificação muralna evolução da DC e o espessamento parietal passar a serhomogéneo, hipocaptante, significa que houve evoluçãopara fibrose.Na avaliação da DC é muito importante a avaliação dograu de actividade da doença, tendo sido criado um índexde actividade da doença de Crohn (IADC) [8]. O IADCbaseia-se em critérios clínicos e histológicos. A utilizaçãode contrastes endoluminais neutros ou negativos (no nossocaso, o manitol) na entero-TC, permite visualizar melhora hipercaptação da mucosa e, assim o grau de actividadeinflamatória [14], podendo vir a ser utilizado no futurocomo mais um elemento no IADC. Contudo, devem sertidas em conta algumas limitações deste tipo de exame. Adetecção de abcessos e fístulas pode ser prejudicada, peloque se recomenda a utilização de contraste endoluminalpositivo quando se suspeite destas complicações.

Conclusão

Os protocolos utilizados em TC, nomeadamente autilização de contraste endoluminal digestivo positivo(iodado) ou negativo (manitol), com ou sem recurso àentubação naso-gástrica, devem ser tomados em conta eutilizados de forma específica em cada caso.Os principais objectivos da avaliação imagiológica da DIIsão auxiliar no diagnóstico, avaliar se a doença está emfase activa ou quiescente, determinar a extensão dainflamação, excluir possíveis complicações e monitorizara resposta à terapêutica médica e/ou cirúrgica. A selecçãocriteriosa de exames e de protocolos a seguir deve serajustada de acordo com o contexto específico e com ainformação clínica desejada, englobada numa decisãoconjunta entre diferentes especialidades.

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CorrespondênciaTiago Campos Andrada de Faria BilhimServiço de RadiologiaHospital Santo António dos CapuchosAlameda Santo António dos Capuchos1169-050 LisboaEmail: [email protected]