artigo - aplicação dos princípios constitucionais da ... · são os preceitos fundamentais que...

7

Click here to load reader

Upload: ngodung

Post on 14-Oct-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da administração pública

na atividade notarial e registral - Por Alex Reis da Silva

1. Introdução:

Princípios são "enunciados lógicos admitidos como condição ou base de validade

das demais asserções que compõem dado campo do saber" (REALE, 2002, p. 303).

São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas.

Os princípios não impõem coercitivamente qualquer conduta específica, mas

determinam os fundamentos que alicerçam o agir humano. Essa característica é

suficiente para distingui-los das regras jurídicas, que impõe uma conduta

determinada e contêm os elementos suficientes para disciplinar as circunstâncias e os efeitos de sua aplicação.

Celso Antonio Bandeira de Mello confere a importância de um princípio ao

preconizar que "violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma

jurídica. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico

mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma

de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido,

porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores

fundamentais, contumélia irremessível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra". (2003, p.817).

No desempenho da atividade notarial e registral os princípios assumem importância

ainda mais evidente, haja vista a parca legislação que regulamenta o agir dos tabeliães e registradores.

Há princípios específicos e exclusivos que regem a atividade notarial e registral,

que, não obstante sua importância, não serão objeto desse estudo. Cumpre aqui

inserir algumas notas sobre a aplicação dos princípios constitucionais expressos da

Administração Pública no exercício da função dos notários e registradores.

2. Natureza jurídica da função exercida pelos notários e registradores:

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu no artigo 37 que todas as pessoas

administrativas de qualquer dos poderes dos entes federativos estão submetidos aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

A doutrina não é unânime em admitir a aplicação desses princípios constitucionais à

atividade notarial e registral. Porém, com as mudanças de concepção da natureza

jurídica dessa atividade, não restam dúvidas de que também os tabeliães e

registradores estão obrigados a observar esses princípios no desempenho de suas funções.

Ao contrário das Constituições anteriores, a de 1988 inovou ao dedicar um artigo

específico para disciplinar a atividade notarial e registral, estabelecendo o regime

jurídico e a forma de exercício dessa atividade.

Preceitua o artigo 236, caput, da CF que "os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público".

Page 2: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

Podemos inferir da análise desse dispositivo constitucional que a natureza jurídica

dos serviços de notas e de registro é de atividade pública. Com efeito o Poder Público só pode delegar aquilo que lhe pertence, que lhe é próprio.

Não restam dúvidas quanto a atribuição da natureza jurídica dessa atividade como

sendo pública. Porém, a doutrina brasileira não é unânime em afirmar se essa atividade pública é considerada um serviço público ou uma função pública.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro considera serviço público "toda atividade material que

a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus

delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente de direito público" (1993, p.80).

Por outro lado há doutrinadores e juristas, a exemplo do Ministro Carlos Aires Brito

do Supremo Tribunal Federal, que defendem a atividade sob análise como sendo

uma função pública. Na ADI 3.643, em que foi relator, referido Ministro preconizou

que "serviços notariais e de registro são típicas atividades estatais, mas não são

serviços públicos, propriamente. Inscrevem-se, isto sim, entre as atividades tidas

como função pública lato sensu (...)".

No entanto a tese prevalecente nos nossos tribunais superiores, inclusive no STF, é

de que os serviços notariais e de registro são serviços públicos, e que somente a

forma de sua prestação se insere no regime privado. Diferencia-se, portanto, a natureza do regime do serviço da natureza do regime de sua prestação.

Cumpre, ainda, ressaltar que ao analisar o caput do art. 236 da CF e a doutrina

pátria, pode-se incluir juridicamente os notários e registradores na categoria dos

agentes públicos, ou mais precisamente, na célebre classificação de Celso Antônio

Bandeira de Mello, dos particulares em colaboração com o Poder Público.

Os notários e registradores não são servidores públicos por não ocuparem cargos

de provimento efetivo e não serem remunerados pelos cofres públicos. Mas são

agentes públicos, pois recebem suas atribuições mediante delegação do Poder Público, sendo fiscalizados por este.

Verifica-se, portanto, que ao exercerem uma atividade de natureza pública, sendo

considerados agentes públicos delegados, os notários e registradores devem,

obrigatoriamente, observar os princípios constitucionais expressos que regem a

Administração Pública, com as adaptações necessárias ao exercício privado dessa função pública. Passemos a analisá-los individualmente.

3. Princípio da Legalidade:

Este princípio denota, em síntese, que a Administração Pública está sujeita às determinações legais.

Para o administrativista Hely Lopes Meirelles "a legalidade, como princípio da

administração, significa que o administrador público está, em toda a sua atividade

funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles

não se pode afastar ou desviar (...)". Já se tornou clássica sua afirmação de que

"enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza" (2009, p.89).

A principal finalidade da aplicação desse princípio é evitar que os administradores

utilizem a máquina pública para favorecimentos pessoais ou perseguições de desafetos, em detrimento do fim maior que é o interesse coletivo.

Page 3: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

Na seara do Direito Notarial e Registral, com algumas adaptações em decorrência

do exercício privado dessa atividade, o princípio da legalidade encontra abrigo, porquanto os tabeliães e oficiais de registro estão submetidos à lei.

Com efeito, as funções dos notários e registradores estão disciplinadas legalmente.

A Lei 8.935/94 estabelece as normas gerais disciplinadoras dessa atividade e

prescreve, em seu artigo 30, XIV, o dever de observar as normas técnicas

estabelecidas pelo juízo competente, que são, dentre outras, as normas editadas

pelas Corregedorias das Justiças Estaduais, que são atos administrativos de caráter

normativo. Por essa atribuição das Corregedorias, pode-se inferir que se aplica o

princípio da legalidade, mas não o da reserva legal à função notarial e registral.

A Lei 8.935/94 disciplina a competência territorial; o horário mínimo de

funcionamento das serventias; as atribuições de cada especialidade de ofício; os

atos que podem ser praticados; a forma de ingresso e fiscalização da atividade; a

forma de contratação dos prepostos; a responsabilidade civil, criminal e

administrativa, bem como os direitos e deveres dos notários e registradores, dentre outras matérias atinentes a essa atividade.

Verifica-se, portanto, que tem aplicação o princípio da legalidade, pois, não só

estão disciplinados legalmente os atos que aos tabeliães e oficiais de registro são

permitidos praticar, como também as prescrições legais na sua prática. Ao lavrar

uma escritura pública, por exemplo, que é um ato previsto no art. 7º, I, da lei

8.935/94, deve o tabelião observar as prescrições do art. 215 do Código Civil Brasileiro, sob pena de invalidade desse ato.

Conclui-se que o princípio da legalidade tem ampla aplicação na atividade notarial e

registral, e que, por ser exercida em caráter privado, os notários e registradores

têm relativa liberdade apenas no que se refere à organização da serventia. Diz-se

relativa liberdade porque, ainda assim, devem ser observados o que as normas

determinam quanto aos livros admitidos; a forma de escrituração; o horário de

atendimento ao público; etc.

4. Princípio da Impessoalidade:

A finalidade maior desse princípio é impedir que a Administração Pública tenha uma

conduta diferenciada dispensada aos administrados que se encontrem na mesma

situação jurídica. Assim como o princípio da legalidade anteriormente analisado, objetiva-se coibir favorecimentos pessoais ou perseguições injustificadas.

Outro sentido aplicado a esse princípio foi exposto por José Afonso da Silva ao

preceituar "que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao

funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário" (1989, p.562).

Por esses conceitos, sobretudo o primeiro sentido desse princípio, verifica-se, em

diversos dispositivos legais, a exigência da impessoalidade na atividade notarial e

registral.

A própria exigência de prévia habilitação em concurso público de provas e títulos

para o ingresso na atividade, fazendo com que os candidatos concorram em igualdade de condições, já denota a aplicação desse princípio.

Dentro deste contexto pode-se aludir a um princípio de grande importância,

sobretudo no registro de imóveis, o da prioridade dos títulos, previsto nos artigos

11, 182 e 186 da Lei 6.015/73. Por este princípio, quando houver concurso de

Page 4: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

direitos sobre o mesmo imóvel, terá preferência aquele que primeiro tiver

protocolado o respectivo título. Evita-se, desse modo, qualquer tentativa de

beneficiar o titular de um direito com base em seus caracteres pessoais, porquanto

o único critério garantidor da preferência do direito real será objetivo, com

fundamento na ordem cronológica de apresentação do título no serviço imobiliário.

Outra aplicação do princípio da impessoalidade pode ser encontrada no art. 27 da

Lei 8.935/94, que impede a atuação do titular da serventia na prática de qualquer

ato de seu interesse, ou de seu cônjuge, ou de parentes, na linha reta ou na

colateral, consanguíneos ou afins, até o terceiro grau. É evidente que a norma

pretendeu evitar favorecimentos fundados em critérios pessoais.

Pode-se citar como exceção ao princípio da impessoalidade nos serviços notariais e

de registro, o art. 30, inc.III da Lei 8.935/94, que determina que as requisições de

papéis, documentos, informações ou providências solicitadas pelas autoridades

judiciárias ou administrativas para a defesa de pessoas jurídicas de direito público

em juízo, devem ser atendidas prioritariamente.

Justifica-se essa exceção pela finalidade última do dispositivo, que é, justamente, garantir a prevalência do interesse público sobre o particular.

Porém, as raras exceções existentes não nos impedem afirmar que o princípio da impessoalidade goza de farta aplicação nas atividades de notas e de registros.

5. Princípio da Moralidade:

Segundo José dos Santos Carvalho Filho "o princípio da moralidade impõe que o

administrador público não dispense os preceitos éticos que devem estar presentes

em sua conduta. Deve não só averiguar os critérios de conveniência, oportunidade

e justiça em suas ações, mas também distinguir o que é honesto do que é desonesto" (2010, p.23).

Esse princípio também tem aplicação na atividade notarial e registral, aumentando

os deveres desses agentes delegados, porquanto não basta a aplicação do princípio

da legalidade anteriormente exposto, mas eles devem agir com probidade, lealdade e boa-fé.

Exemplo da aplicação desse princípio encontra-se no dever do tabelião informar às

partes a natureza e a forma do negócio jurídico que lhes trará menor ônus, quando por mais de um modo puder ser celebrado.

Cumpre ressaltar que a aplicação desse princípio não se restringe ao

relacionamento do delegatário com seus clientes no exercício de suas funções. A

probidade, lealdade e honestidade devem estar presentes em suas relações pessoais no seio da comunidade.

Com efeito, preceitua o art. 30, V, da Lei 8.935/94 que é dever dos notários e

oficiais de registro "proceder de forma a dignificar a função exercida, tanto nas

atividades profissionais como na vida privada".

Walter Ceneviva corrobora esse entendimento ao preconizar que "mesmo no

comportamento individual estranho à função pública, em seus negócios, na vida

social, no convívio com seus iguais e com terceiros, o notário e o registrador atuam de modo a receberem o respeito da sociedade em que trabalhem" (2008, p.220).

Page 5: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

Decorrência objetiva importante desse princípio é a vedação da prática de

favorecimentos a determinadas pessoas em razão de vínculos de parentesco, o que se convencionou chamar de nepotismo.

Dando objetividade a essa vedação, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula

Vinculante nº 13 que assim dispõe, in verbis: "A nomeação de cônjuge,

companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro

grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica

investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo

em comissão ou de confiança, ou ainda, de função gratificada na Administração

Pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal".

Verifica-se na parte final dessa súmula que foi vedado inclusive o nepotismo cruzado ou transverso.

Essa súmula vinculante originou-se como extensão da aplicação da Resolução nº 7,

de 18/10/2005, do CNJ, aos outros Poderes do Estado, fazendo com que a vedação do nepotismo não ficasse adstrita ao âmbito do Poder Judiciário.

Cumpre analisar se tem aplicação essa súmula na atividade notarial e de registro,

sobretudo diante do Enunciado Administrativo nº 1, editado pelo CNJ para explicitar

o teor da Resolução nº7. Diz esse Enunciado Administrativo nº 1 que "aplica-se a

Resolução nº 7 deste CNJ às nomeações não concursadas para serventias extrajudiciais".

Diante desse Enunciado Administrativo do CNJ, da Resolução nº 7, também do CNJ

e da Súmula Vinculante nº 13 do STF, surgiram dúvidas se estaria o tabelião ou o registrador impedido de contratar parentes para trabalhar na serventia.

Analisando e interpretando os conceitos fundamentais que permeiam a atividade

notarial e de registro, pode-se inferir que os tabeliães e registradores podem

livremente contratar parentes para trabalhar como seus prepostos na serventia, sem que essa prática configure nepotismo.

Com efeito, o próprio CNJ já confirmou esse entendimento ao argumentar que a

Súmula Vinculante nº 13 do STF aplica-se à Administração Pública, direta e

indireta, o que não vem a ser o caso das serventias notariais e registrais. A

Resolução nº 7 do CNJ aplica-se aos órgãos do Poder Judiciário, o que também não

é o caso daquelas serventias, consideradas extrajudiciais. Outro argumento do CNJ

que corrobora esse entendimento é que o Enunciado Administrativo nº 1 pretendeu

apenas vedar o nepotismo nas nomeações para as serventias extrajudiciais feitas

pelos magistrados, e não diretamente pelos titulares da delegação. Visou-se

impedir que os membros do Poder Judiciário nomeassem parentes seus para

responderem pelas serventias no período de vacância, compreendido entre a

extinção da delegação e a nomeação de um novo titular previamente aprovado em concurso público de ingresso ou remoção.

6. Princípio da Publicidade:

Pelo princípio da publicidade os atos praticados pela Administração Pública devem

ser amplamente divulgados, para que, além de conferir-lhes eficácia, possa os

administrados verificar se eles se revestem dos requisitos exigidos legalmente, reclamando sua anulação quando eivados de vícios que os tornem ilegais.

Page 6: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

Além do art. 37, caput, a Constituição Federal relaciona outros dispositivos que

ampliam ou restringem a necessidade de publicidade dos atos praticados pela

Administração. São exemplos: o inc. XIV do art. 5º que assegura a todos o acesso

à informação resguardando o sigilo da fonte quando necessário ao exercício

profissional; e o inc. XXXIII do mesmo artigo, que garante a todos o direito a

receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular ou coletivo,

ressalvadas aquelas que sejam imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado.

A Constituição Federal não só conferiu o direito à publicidade como também

garantiu seu acesso, através dos direitos de petição e de obtenção de certidões (art. 5º, XXXIV).

Sendo a publicidade a regra que deve nortear os atos da Administração, raríssimas

são as exceções em que se admite o sigilo desses atos, levando-se em

consideração que eventual publicação possa causar riscos. Têm-se como exemplos

de exceção: o art. 5º, XXXIII da CF, que resguarda o sigilo das informações que

sejam imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado; e o art. 93, IX, no

âmbito judicial, que estabelece que, apesar de serem públicos os julgamentos dos

órgãos do Poder Judiciário, pode-se limitar a presença às próprias partes e a seus

advogados, protegendo a intimidade do interessado no sigilo. Mas, neste último

caso, ainda assim, somente será garantido o sigilo quando não houver prejuízos ao

interesse público na informação. Modernamente, entende-se que a publicidade

encontra-se no plano da eficácia, e não mais no plano de validade, sendo que na

sua ausência o ato é válido, mas incapaz de produzir efeitos, podendo ser saneado. Nesse sentido entende José dos Santos Carvalho Filho (2010, p.31).

Na atividade notarial e registral o princípio da publicidade tem contornos próprios,

com significado independente. A publicidade deixa de ser apenas princípio para

assumir a posição de finalidade a ser alcançada pelos tabelionatos e registros. Com

efeito, diz o art. 1º da Lei 8.935/94 que "serviços notariais e de registro são os de

organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos".

Infere-se desse artigo a relevância do princípio sob exame, constituindo o conceito

e finalidade dos serviços de notas e de registro.

Contudo, na atividade notarial e registral o princípio da publicidade tem acepção e

aplicação diversa da Administração Pública. Salvo raras exceções, não se faz

publicação dos atos realizados nas serventias extrajudiciais. Os atos, após

realizados, são perpetuados mediante o sistema de organização e arquivamento,

garantindo-se ao interessado obter os dados consignados nos arquivos através da obtenção de certidões e informações.

A publicidade, neste caso, não tem a finalidade de conferir eficácia ao ato jurídico,

como na Administração Pública. Os efeitos dos atos são obtidos com o registro,

sendo a publicidade a forma de informar quem tenha interesse em saber que

determinado ato foi realizado e se encontra arquivado na serventia. Na verdade, a

publicidade não é um meio para se conferir eficácia ao ato notarial ou registral, mas

tanto uma quanto a outra são finalidades a serem alcançadas. Nesse aspecto, a

publicidade está mais relacionada com a produção da segurança jurídica, e menos ligada à obtenção da eficácia do ato.

Costuma-se referir que a publicidade notarial e registral é indireta, haja vista que

não se permite a consulta aos arquivos da serventia diretamente pelos

Page 7: Artigo - Aplicação dos princípios constitucionais da ... · São os preceitos fundamentais que inspiram todo o modo de agir de determinada categoria de pessoas

interessados, mas pelo sistema de obtenção de certidões e fornecimento de

informações, como previsto no art. 16 da Lei 6.015/73.

Ademais, a publicidade dos atos notariais e de registro não é ilimitada, porquanto

nem tudo que faça parte dos arquivos das serventias pode ser divulgado ao público. Há exceções previstas em diversas leis.

O art. 30, VI, da Lei 8.935/94, excepciona o princípio em tela ao determinar que os

tabeliães e registradores devam "guardar sigilo sobre a documentação e os

assuntos de natureza reservada de que tenham conhecimento em razão do

exercício de sua profissão". Visa-se a assegurar a privacidade e a intimidade das pessoas, sem, contudo, mitigar a segurança jurídica do sistema.

O notário ou registrador deve proceder com muita cautela ao lavrar uma certidão,

para não expor indevidamente a intimidade das pessoas, sobretudo diante do

consignado no art.17 da LRP, que assegura a qualquer pessoa o direito de requerer certidões, mesmo sem informar o motivo ou interesse do pedido.

Em determinados casos, a própria lei elenca quais informações são proibidas

constar nas certidões. O art. 6º da Lei 8.560/92, que regula a investigação de

paternidade dos filhos havidos fora do casamento, determina que não devem

constar nas certidões de nascimento: indícios de que a concepção foi decorrente de

relação extraconjugal; o estado civil dos pais; a natureza da filiação; o cartório do

casamento dos pais, e ainda, a referência à própria lei. Somente através de

autorização ou requisição judicial será possível a extração de certidão de inteiro teor nesses casos.

Também o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) proíbe o

fornecimento de certidões que constem observações sobre a origem do ato de

adoção do registrado, bem como do próprio mandado que a determina (art. 47,

caput e §4º).

A LRP já proibia nos artigos 19, §3º; 45 e 95,§ único, que constasse na certidão ser legítima ou não a filiação, bem como a origem desta em caso positivo.

Verifica-se, portanto, que tem aplicação o princípio da publicidade na atividade

notarial e registral, salvo algumas exceções, porém com contornos diversos do aplicado à Administração Pública.

Autor: Alex Reis da Silva é bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Sul de

Minas - Registrador Civil de Pessoas Naturais na cidade de Niterói-RJ - Pós-graduando em Direito Notarial e Registral.

Fonte: Arpen-SP