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ST09 – Empresas, mercados e sociedades ARQUITETURAS COLABORATIVAS DIGITAIS: Um estudo das redes empresa – consumidores no Brasil 1 Dora Kaufman [email protected] 1 Pesquisa suportada por sete empresas: Google, Tecnisa, Tetra Pak, Banco Itaú, Grupo Abril, Magazine Luiza e Serasa Experian.

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Page 1: ARQUITETURAS COLABORATIVAS DIGITAIS: Um estudo das … · comportamento do novo consumidor – internauta que tem vivenciado uma inserção social com maior grau de liberdade e poder,

ST09 – Empresas, mercados e sociedades

ARQUITETURAS COLABORATIVAS DIGITAIS:

Um estudo das redes empresa – consumidores no Brasil1

Dora Kaufman [email protected]

1 Pesquisa suportada por sete empresas: Google, Tecnisa, Tetra Pak, Banco Itaú, Grupo Abril, Magazine Luiza e Serasa Experian.

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1. Introdução

O objetivo da pesquisa foi identificar como as empresas brasileiras estão

reagindo a duas ameaças: (i) a proliferação das experiências colaborativas articuladas

na internet (peer production, crowdsourcing, mass collaboration) e (ii) o

comportamento do novo consumidor – internauta que tem vivenciado uma inserção

social com maior grau de liberdade e poder, comportamento que podemos denominar

de um “netativismo do consumidor”2. Esse estudo sinalizou algumas das tendências

de evolução do comportamento das empresas frente a esses desafios.

A produção entre pares, não-proprietária e fora do sistema de mercado

engendrada a partir de esforços cooperativos é um sistema socioeconômico de

produção que está surgindo no ambiente digital em rede. Suas duas características –

descentralização e motivação social – conflitam com as estruturas tradicionais de

geração de valor oriundas da economia industrial. Seu diferencial baseada em redes

de redes, não se restringe a uma forma distinta de expressão midiática, mas a maneira

como essa expressão se manifesta na esfera pública ou ação social. O elemento

central na carona solidária como transporte diário, por exemplo, não são os carros,

mas a coordenação através das redes digitais. Essas experiências com base em

propriedades comuns, gradativamente se tornam uma alternativa competitiva a

produção e prestação de serviços de mercado.

Por outro lado, as redes digitais viabilizam o desejo de um novo consumidor

de interferir ativamente na geração de valor da sociedade. Essas tecnologias conferem

as atividades de produção de bens e serviços um objetivo maior, o de ampliar as

competências dos indivíduos, promovendo a sociabilidade e a autonomia. O

consumidor – internauta, atua em duas frentes: (a) no consumo de bens e serviços

direto na internet (e-commerce); e (b) no poder de influência das redes digitais, e

diversos outros canais que o consumidor acessa antes de efetuar uma compra, mesmo

que essa ocorra num ambiente físico.

As empresas estão sendo afetadas por esses movimentos. Existe um claro

conflito entre a cultura colaborativa e a cultura corporativa. Os fundamentos que

norteiam a concepção de “empresa” foram forjados na era industrial, resultando em

estruturas centralizadas, hierárquicas, compartimentalizadas, fracionadas em

2 Em alusão aos movimentos sociais articulados nas redes sociais denominados de Netativismo.

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departamentos, seções, funções, incompatíveis com as arquiteturas informativas em

rede e com as interconexões nas novas esferas públicas. A migração para redes,

mesmo que parcial, requer uma nova competência e um novo modelo.

Nesse sentido, há um paradoxo a ser investigado: como em uma sociedade de

mercado, os processos cooperativos vêm assumindo importância não só na periferia,

mas também no âmago do sistema econômico? As primeiras incursões da pesquisa

empírica detectaram uma sensibilidade das empresas ao tema da colaboração com o

consumidor, refletindo um certo esgotamento dos modelos atuais de produção e

relacionamento vis-à-vis o ambiente comunicacional. Todavia, se tomarmos como

referência de rede colaborativa a enciclopédia on-line Wikipédia, a constatação mais

plausível é a de que o mercado ainda está distante dessa prática. Trazer esse modelo

para a economia de mercado dominante implica numa quebra de paradigma, entre

outras razões, pela inevitável perda de controle por parte das corporações. O desafio

colocado para a sociedade desse milênio é conciliar esses supostos conflitos e

encontrar uma nova forma de produção de valor.

Antes de apresentar os resultados parciais da pesquisa empírica,

descreveremos (a) os fundamentos da denominada Nova Economia, contexto

socioeconômico no qual se dão as transformações mencionadas; (b) os fundamentos

da mentalidade colaborativa e (c) a convergência entre ambos através de práticas

colaborativas na economia da informação em rede.

2. Os fundamentos da Nova Economia

Consta que a mídia adotou a expressão “nova economia” a partir de um artigo

publicado em 1996 pela revista Business Week3. Sua base encontra-se nos mercados

globais e na revolução da informação, ou seja, em sua dimensão global e,

qualitativamente, em sua dimensão não-material. As novas tecnologias digitais de

informação e comunicação transformaram as relações na sociedade e o próprio modo

de estar em sociedade; um de seus efeitos é a incorporação dos indivíduos nos

processos de inovação e geração de riqueza. Esse novo contexto pode ser entendido a

partir de distintas perspectivas.

3The Triumph of the New Economy - A powerful payoff from globalization and the Info Revolution, http://www.businessweek.com/1996/53/b35081.htm, disponível em 10 de julho de 2013.

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Nosso ponto de partida é o pensamento de Marshall McLuhan (2007), para

quem o advento de uma nova tecnologia de comunicação promove um ambiente

humano totalmente novo, remetendo a novos tipos de interações sociais e a

transformações qualitativas em toda a sociedade. A estrutura de informação tem a

capacidade de interferir na nossa maneira de pensar, afetando o nível cognitivo. No

caso da revolução digital, há uma mudança na própria arquitetura do processo

informativo ao substituir a frontalidade no repasse de informações (livros, imprensa,

teatro, cinema, televisão) por uma transferência reticular, interativa e colaborativa

gerando uma nova dinâmica entre os atores envolvidos nas redes de comunicação (DI

FELICE, 2012).

Manuel Castells (2003) corrobora com essa visão ao afirmar que “como nossa

prática é baseada na comunicação, e a internet transforma o modo como nos

comunicamos, nossas vidas são profundamente afetadas por essa nova tecnologia da

comunicação” (p.59) e, sendo mais direto

O exagero profético e a manipulação ideológica que caracteriza a maior parte dos discursos sobre a revolução da tecnologia da informação não deveria levar-nos a cometer o erro de subestimar sua importância verdadeiramente fundamental. Esse é [...], no mínimo, um evento histórico da mesma importância da Revolução Industrial do século XVIII, introduzindo um padrão de descontinuidade nas bases materiais da economia, sociedade e cultura (2009, p.68).

A despeito das evidências é oportuno salientar que esse não é um tema

consensual; alguns economistas creem que as transformações proporcionadas pelas

tecnologias de comunicação e informação (TCIs) não configuram uma mudança

radical na organização do sistema econômico como, por exemplo, o ocorrido na

Revolução Industrial do século XVIII com a mecanização dos sistemas de produção.

Na esfera microeconômica, observa-se também um profundo impacto. As

atividades quotidianas das empresas - administração, financiamento, inovação,

produção, distribuição, vendas, relações com diversos públicos (colaboradores,

acionistas, consumidores, mídia, mercado e público em geral) - ocorrem

predominantemente via redes digitais de comunicação. Essas mesmas tecnologias

promovem a cooperação entre pequenas e médias empresas, entre as mesmas e as

grandes corporações, e entre os atores de uma mesma cadeia produtiva; facilitam as

alianças estratégicas entre as corporações e as suas subsidiárias; facultam o acesso

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imediato a informação e pesquisa; perpassam toda a atividade econômica, ampliando

as oportunidades ao oferecer canais de conexão imediatos e de baixo custo.

Independente de sua escala de produção, as empresas na sociedade contemporânea

dificilmente sobrevivem sem acesso a internet e sem fazer uso das tecnologias

digitais.

O mesmo choque transformador constata-se no lado do consumo de produtos e

serviços. Os usuários da internet são mais exigentes, têm maior acesso a informação,

comparam preços, compartilham opiniões e recomendações. O consumidor atual

quando se vê diante da necessidade de exercer uma preferência de qualquer natureza,

em geral, consulta as plataformas de busca, acessa redes sociais, sites, editorias e

blogs especializados.

Estamos lidando com uma sociedade emergente baseada na informação e no

conhecimento, que se organiza de uma maneira totalmente distinta da sociedade

industrial constituída a partir da Primeira e Segunda Revoluções Industriais (séculos

XVIII, XIX e XX). A circulação da informação não obedece as mesmas regras que a

circulação das mercadorias, em termos de propriedade, de determinação do valor, da

natureza das transações comerciais, da lógica do consumo. O filósofo Michel Puech

(2008) crê que o trabalho e a posse dos bens materiais não são mais o centro da

estrutura social, e que o contexto geral do intercâmbio social e econômico, que foi

competitivo na era industrial, será colaborativo na era pós-industrial. O autor

compartilha a crença de que está em curso uma nova revolução industrial, onde a

“mercadoria” informação não funciona como as demais mercadorias, não gera um

mercado de escassez de bens regulados pela oferta e demanda, refletida no preço. Pelo

contrário, a nova economia caracteriza-se pela abundância, não importa quantas vezes

copiamos e enviamos aos amigos um arquivo digital com música, ele continua

disponível e reprodutível.

Outra de suas particularidades é a convergência entre produção e consumo,

que gradativamente vem perdendo sua tradicional linha divisória; um dos grandes

exemplos é a área de software livre, mas proliferam na internet as plataformas para

produção e distribuição de bens pelos próprios internautas. Em paralelo,

cotidianamente surgem novos sites que ligam diretamente produtores e consumidores

nos mais variados setores, substituindo os intermediários. Na França, por exemplo,

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temos o site La Ruche Que Dit Oui4 (“a colmeia que diz sim”) que conta atualmente

com 253 bases funcionando e 151 em processo de implantação. Baseado no conceito

de “consumo responsável”, conecta através de uma rede digital pequenos produtores

de alimentos e consumidores finais.

Com um conceito e operacionalização bem mais complexo, temos os projetos

de geração e distribuição de energia individualizada, com a criação de microusina

elétrica nas residências e locais de trabalho compartilhando o excedente em uma rede

de infoenergia. O modelo preconizado por Jeremy Rifkin (2012) supõe a coleta de

energias renováveis nos próprios edifícios, a armazenagem do excedente de energia

na forma de hidrogênio e o compartilhamento da eletricidade com terceiros por meio

de redes inteligentes, aos moldes da geração e distribuição de informação na internet.

Se na economia industrial o consumidor conquistou o grau de liberdade da

escolha de quais produtos e serviços desejava consumir, colocando-se no centro da

disputa das empresas pela sua preferência, na economia da informação em rede, o

consumidor vem reivindicando o direito de participar no desenvolvimento dos

produtos e serviços que serão consumidos.

3. Os fundamentos da mentalidade colaborativa

Diversos estudiosos de diferentes campos de conhecimento creem que existe

uma propensão natural a colaboração, sendo a mesma observada na natureza através

do comportamento animal. O morcego-vampiro se alimenta da maioria dos animais

de sangue quente, de passarinhos a cavalos e vacas incluindo os humanos. O interesse

dos biólogos pela espécie reside no fato de que, ao mesmo tempo em que é um animal

predador sanguinário, o morcego é também profundamente altruísta. Para sobreviver

o morcego tem que se alimentar no máximo a cada sessenta horas, o que levou a

espécie a desenvolver uma prática colaborativa: se um deles não encontra uma vítima

nesse intervalo de tempo, imediatamente começa a lamber debaixo das asas e dos

lábios de outro membro da colônia; os dois animais unem suas bocas e o caçador

bem-sucedido vomita sangue quente na garganta de seu companheiro. Sem essa

cooperação, a estimativa é de que morreriam mais de 80% dos morcegos-vampiros

adultos. Por sua vez, as saúvas, ou formigas-cortadeiras, se organizam em sete

4 http://www.laruchequiditoui.fr/

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funções distintas, algumas delas cortam as folhas, outras carregam os pedaços das

folhas para o formigueiro, enquanto outras cortam em pedacinhos ainda menores.

Como essas folhas contêm substâncias químicas tóxicas, precisam ser decompostas

em um fungo que só cresce no interior das colônias; um grupo de formigas se ocupa

dessas plantações subterrâneas de cogumelos, mantendo as câmaras no nível ideal de

temperatura e umidade, para o benefício coletivo (LEHRER, 2012). As formigas são

incapazes de sobreviver isoladamente, agrupadas agem como células de um

organismo complexo no qual forma-se uma inteligência coletiva com uma capacidade

de adaptação superior à de cada um dos membros da colônia. Além das citadas, vale

lembrar as abelhas; em cada colmeia convivem cerca de 80.000 abelhas num sistema

de extraordinária auto-organização, com uma rainha, dezenas de zangões e milhares

de operárias, cada um exercendo sua função social na comunidade. Na natureza,

encontramos inúmeros exemplos de comunidades colaborativas governadas por uma

inteligência coletiva, mesmo que em formas mais simples do que no universo

humano.

Com foco no humano e, particularmente, nos impactos das novas tecnologias

digitais no que ele denominou de “economia da informação em rede”, Yochai Benkler

(2006), a partir de evidências empíricas, defende que os indivíduos são muito mais

cooperativos do que supõe o senso comum. Sentimento de “pertencimento” a uma

comunidade, intercâmbio de ideias, reconhecimento e valorização, conexões com

pares de interesses comuns, são motivadores tão ou mais fortes que recompensas

financeiras. Para Benkler se a empatia é o que nos faz identificar e sacrificar nossos

interesses em proveito de outros seres humanos, a solidariedade e a identidade de

grupo é o que nos motiva para identificar e sacrificar nossos interesses em proveito do

grupo a que pertencemos. Fortes indícios sugerem que o nosso comportamento em

qualquer situação é influenciado pelo comportamento que observamos ao nosso redor,

mesmo que essa percepção seja inconsciente, reforçando o argumento da importância

do ambiente favorável. Através do envolvimento em projetos comuns articulados na

internet, os indivíduos tentam superar rotinas monótonas que a maioria enfrenta em

seus cotidianos de trabalho; a produção compartilhada (peer-production) oferece

oportunidades para o exercício de criatividade, práticas inovadoras, experimentações

inusitadas, que fogem em muito ao, normalmente, restrito escopo das funções

profissionais delimitadas pelos empregadores. Benkler e Nissenbaum (2006) citam

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duas pesquisas (SETI@home e FLOSS) realizadas com o propósito de investigar a

motivação dos indivíduos para colaborar em projetos coletivos. Em sua maioria, os

participantes indicaram que se sentiam estimulados em compartilhar conhecimento e

habilidade porque se tratava de contribuir para a realização de ideias e projetos do

interesse da comunidade; uma pequena fração respondeu “proporcionar melhores

oportunidades de emprego” e “fazer dinheiro”. No entanto, os autores ponderam que

esses resultados não podem ser considerados como conclusivos, admitindo que as

pessoas tendem a querer se mostrar mais altruístas do que são na verdade. A

conclusão é que há boas razões para sustentar que uma proporção considerável de

colaboradores é pró-social.

Independente de seus componentes natural e social, segundo Michel Puech5 no

mundo contemporâneo temos uma nova mentalidade colaborativa cuja origem

remonta a dois momentos distintos: (a) o primeiro momento tem lugar após a Segunda

Guerra Mundial, onde as primeiras gerações de técnicos de informática, que serviram

ao exército e em seguida ao Estado e ao mercado, perceberam o poder de seu

conhecimento e de seus equipamentos, seu relativo grau de independência e que

formavam uma comunidade. Verificaram também que para desenvolver os

programas, dada a sua complexidade, era necessário compartilhá-los, dando início a

uma prática colaborativa no universo da ciência da informação; (b) o segundo

momento ocorre na década de 1970 com o advento de um novo paradigma

tecnológico num segmento da sociedade norte-americana, com um novo estilo de

produção, comunicação, gerenciamento e vida. Trata-se de uma ruptura com a

hierarquia social, com o sistema de valores competitivo, em favor de um sistema de

valores mais participativo. A ênfase nos dispositivos personalizados, na

interatividade, na formação de redes e na procura de novas descobertas tecnológicas

não tinham sinergia com o conservadorismo do mundo dos negócios e da sociedade

da época (CASTELLS, 2009).

Parece claro que as tecnologias digitais provocam uma profunda cisão e criam

um novo tipo de colaboração, associado a uma nova tecnologia social via

ecossistemas interativos. Este ambiente favorável à colaboração é parcialmente

aproveitado pela sociedade porque a cultura competitiva continua prevalecendo

5 Fonte: debates durante o período de estágio de “bolsa sanduíche” do autor sob a orientação de M. Puech, Université Paris-Sorbonne. Abril-setembro/2013.

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(desde a escola, somos treinados e estimulados pela concorrência). Vivemos hoje a

convergência dessas duas tendências. Mesmo no mundo da tecnologia coexistem

simultaneamente a cultura da dominação e a cultura colaborativa; elas convivem e em

alguns momentos se misturam. Alguns atores fazem um esforço para promover a

colaboração, outros um esforço contrário ao desenvolvimento da cultura colaborativa.

Muitas empresas desenvolvem oportunidades de colaboração, mesmo sendo

instituições comerciais e competitivas. O antagonismo não é entre as empresas de

mercado e as ações engendradas pelos indivíduos; mas entre a cultura da competição

e a cultura da colaboração. A fronteira entre essas duas lógicas não está clara, assim

como a capacidade de prever o caminho de sua evolução.

4. A colaboração na economia da informação em rede

Como vemos tentando demonstrar, o diferencial da arquitetura informativa

baseada em redes de redes não se restringe a uma forma distinta de expressão

midiática, mas a maneira como essa expressão se manifesta na esfera pública ou na

ação social. O elemento central nos sites de carona solidária (em inglês Carpool ou

Carpooling) como transporte diário não são os carros, mas a coordenação através das

redes digitais. Esses sites são cooperativas de uso compartilhado de carros

particulares; em geral, os participantes são proprietários de um auto e alternam seu

uso, reduzindo os custos de transporte, contribuindo com a melhoria do trânsito nas

grandes cidades e reduzindo a emissão de gases do efeito estufa (impacto positivo

sobre a poluição). Essa prática tem sido incentivada nos Estados Unidos, Canadá e

vários países da Europa, gerando novas operadoras como I-Go em Chicago, a City

Car Share em San Francisco, a mobiag em Portugal; na Itália, o tradicional grupo de

redes ferroviárias Trenitalia lançou recentemente um sistema que integra car-sharing,

bike-sharing e as suas redes. No Brasil, temos já diversos projetos como, por exemplo,

o portal online Carona Solidária, que oferece informações sobre o trânsito e meio-

ambiente e permite que os usuários cadastrados ofereçam e peçam carona; temos

funcionando de forma semelhante os sites E-Carona e Caroneiros.com. Com outro

modelo, o MelhorAr é um programa de carona coorporativa, onde quem se cadastra é

a empresa e os funcionários usufruem do compartilhamento dos carros. O cadastro é

gratuito, mas se a empresa tiver interesse pode adquirir benefícios como seguro,

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estacionamento preferencial, descontos, patrocínios, banners. A característica comum

é que a conexão entre seus usuários ocorre através de redes digitais de comunicação.

A Threadless.com é uma empresa de produtos on-line (camisetas, sacolas,

meias, canecas, etc.) onde a produção é baseada em designs gerados em sua

plataforma colaborativa; em março de 2013, o site tinha uma comunidade ativa de

2.443.696 usuários, responsáveis pela submissão de 267.533 novos desenhos6. A

camiseteria.com é o equivalente nacional. A loja virtual, fundada em 2005, tem a

configuração de uma rede social onde o usuário cadastra uma série de informações

pessoais incluindo seus contatos em outras redes, como Orkut, Twitter e MSN,

formando um conjunto de potenciais consumidores. Seu negócio é fabricar e vender

camisetas, cujas estampas são criadas pelos próprios usuários cadastrados e avaliadas

pela comunidade; as mais votadas são impressas e colocadas a venda. As regras são

claras e o processo transparente: o vencedor recebe R$ 1.100,00 em dinheiro e

R$ 500,00 em produtos, as estampas reeditadas pagam um prêmio adicional de

R$ 500,00. Os produtores e consumidores dessa loja virtual são seus próprios

usuários. Os usuários que não criam estampas também tem benefícios: a loja virtual

lançou um programa de fidelidade, no qual pode-se acumular pontos através de

compras ou indicações de amigos e trocar por outros produtos da loja. Sem falar na

possibilidade de acumular pontos enviando sua foto vestindo uma camiseta comprada

na Camiseteria.com.br. Em 2012, a loja virtual de camisetas tinha 300 mil usuários

cadastrados colaborando na criação das estampas, sendo que cerca de 30 mil enviam

desenhos e os demais participam votando e comentando as opções; a média de

aprovação e produção de novas estampas é de quatro por semana.

As experiências relatadas acima são uma parte infinitesimal de um universo de

centenas de milhares de iniciativas dessa natureza. Como proclama Yochai Benkler

(2006), essas formas de produção são caracterizadas por dois componentes principais:

(a) o primeiro é a descentralização, na qual o controle da ação (iniciativa e execução)

não está sob o domínio de um gestor central (como uma empresa) e sim entre agentes

individuais, por vezes centenas ou milhares deles e (b) o segundo é que as motivações

são mais sociais do que financeiras (ou pelo menos não só financeiras).

6 Fonte: site institucional http://www.threadless.com/?gclid=CIb3tPhrYCFQrqnAodG08Ayw&ef_id=UTZKPAAAANdgN7ek:20130318192255:s, disponível em 18 de marco de 2013.

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Por outro lado, timidamente observa-se o surgimento de estruturas digitais de

comunicação articulando empresa e consumidor, na qual a primeira exerce o papel de

mediadora e captadora dos benefícios, e a expectativa do segundo é pela recompensa

financeira e/ou pelo reconhecimento que implique em expansão do seu capital social

profissional (expansão de sua rede de contatos). Esses modelos interativos –

conhecidos por mass collaboration, peering, crowdsourcing, open innovation -

transformaram-se em potenciais alternativas para muitas empresas na criação de valor

e inovação, e uma opção de fonte de renda ou reconhecimento para muitos indivíduos,

podendo impulsionar um novo negócio ou uma nova inserção profissional, ou

simplesmente inseri-los numa comunidade (sentimento de “pertencimento”). É

praticamente consenso que os recursos internos das instituições já não respondem

satisfatoriamente às demandas atuais; nem mesmo as maiores empresas são capazes

de gerar todos os inputs necessários ao desenvolvimento de seu negócio, e nem de

reter todos os talentos dentro de suas fronteiras organizacionais. O mercado de

trabalho atual é caracterizado por uma enorme e crescente mobilidade, principalmente

para os profissionais mais experientes e capacitados. Os antigos modos de

organização e de inovação começam a não dar conta do nível de agilidade,

criatividade e conectividade que o mercado exige para que as empresas permaneçam

competitivas no ambiente atual.

Redes digitais de open innovation (processos de inovação abertos a inputs

externos às empresas), como InnoCentive7, propõem soluções para negócios, questões

sociais, políticas, científicas e desafios técnicos. Conectada a uma rede de cientistas e

empresas de menor porte em 174 países, na última década essa rede contribuiu com

organizações líderes como AARP Foundation, Air Force Reseach Labs, da Booz

Allen Hamilton, Cleveland Clinic, Eli Lilly & Company, EMC Corporation, NASA,

Nature Publishing Group, Procter & Gamble, Syngenta, The Economist, Thomson

Reuters, com ideias inovadoras e soluções para seus problemas num prazo menor,

com mais rentabilidade e com menos risco.

A Lego usa o site mindstorms.lego.com para estimular experimentações dos

internautas com o seu software. A Volkswagen na China criou o People´s Project em

maio de 2011, com o qual ganharam diversos prêmios como o Spike Ásia 2012, que é

7 http://www.innocentive.com/

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uma arquitetura reticular digital na qual os consumidores são estimulados a contribuir

com ideias de design para modelos de carro do futuro. De acordo com o seu diretor de

marketing à época, Luca de Meo, o design dos carros continuarão a refletir a tradição

da Volkswagen, mas em um futuro próximo, os carros produzidos serão a combinação

da opinião dos consumidores e da tradição. Como preconiza Don Tapscott (2007) “A

web não significa mais navegar ociosamente e ler, escutar ou assistir passivamente.

Significa produzir por peering: compartilhar, socializar, colaborar e, acima de tudo,

criar no âmbito de comunidades livremente conectadas” (p.65).

5. Pesquisa empírica, resultados e conclusões preliminares

5.1. Delimitando o campo de pesquisa

Uma das questões mais importante em qualquer estudo diz respeito ao seu

alcance e a sua delimitação. Nossa primeira missão foi identificar as práticas de

mercado na interação das empresas com os consumidores que são tratadas como

colaborativa, mas que, no nosso ponto de vista, não contém os elementos básicos que

a caracterizam. Outro aspecto a evidenciar é que não há como isolar uma ação e tratá-

la como exclusivamente colaborativa; todas as ações de colaboração tem forte

impacto em estratégias de marca, são importantes como fontes de pesquisa, agregam

informações sobre como um produto ou um serviço está sendo percebido e utilizado,

e provém contribuições do consumidor sobre distribuição, preço, design, etc. Não

pretendemos criar uma hierarquia entre os exemplos, nem demostrar a superioridade

da colaboração frente a outras práticas de mercado; o propósito é apenas delimitar o

campo de nossa pesquisa. Nesse sentido, não estamos considerando como redes

colaborativas:

a) Pesquisa de Mercado: o processo colaborativo envolve, dentre outros, três

aspectos que essa prática não contempla: (i) o primeiro diz respeito ao

reconhecimento do usuário ou consumidor de que está interagindo em

colaboração com a empresa, ou seja, a colaboração é um ato consciente; (ii) o

segundo diz respeito a transparência com relação aos objetivos e resultados a

serem alcançados; e (iii) o terceiro é que, em geral, não há uma interação

colaborativa entre os consumidores participantes da pesquisa;

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b) Inovação Aberta: esse é provavelmente o tipo de ação que mais se confunde com

o conceito de colaboração. Basicamente o diferencial em relação a colaboração é

que nesse (i) não há interação entre os usuários, a comunicação é entre o

proprietário da ideia e a empresa e (ii) o direito autoral é amplamente

reconhecido, inclusive remunerado;

c) Teste de Produto: os elementos que confundem o teste de produto com a

colaboração são semelhantes aos da pesquisa de mercado: mesmo nos casos em

que o usuário sabe que está sendo “cobaia”, o processo não é transparente e nem

se verifica um engajamento colaborativo consciente do consumidor – usuário;

d) Colaboração na Cadeia de Produção: o título é quase autoexplicativo; como o foco

do estudo é a colaboração entre empresa e consumidores, a colaboração na cadeia

produtiva não está contemplada;

e) Ações de Branding: a opção por implementar um projeto numa plataforma ou

rede de colaboração, por vezes é motivada por uma ação de branding. A

colaboração entra como “acessório” para sensibilizar públicos familiarizados com

os meios digitas, ou seja, a prioridade é segmentar a comunicação, produzir

campanhas de ativação de determinado produto, ou mesmo consolidar valores de

marca. O risco nesse tipo de ação é frustrar as expectativas dos participantes com

o nível limitado de interação ou de colaboração da plataforma (restrição

tecnológica).

Como narrativa em desenvolvimento para colaboração, consideramos práticas

que contemplem interação em coletivos através de alianças e relações entre redes

internas e externas à empresa, com caráter estratégico ao integrar o consumidor nas

etapas de decisão de um produto, serviço ou processo. Procedimento transparente e

presente na esfera pública.

5.2. Percurso da pesquisa – metodologia 5.2.1. Comentários teóricos sobre a metodologia

A pesquisa em contextos reticulares demanda uma revisão das metodologias

tradicionais contemplando novos desafios epistemológicos, e a própria natureza da

relação do pesquisador com o objeto da pesquisa. Não há como pensar diferente se

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estivermos de acordo com a ideia de que toda tecnologia gera um ambiente humano

totalmente novo, onde esses ambientes não são envoltórios passivos e seus efeitos

alteram as relações entre os sentidos e as estruturas de percepção (MCLUHAN,

2007). As metodologias tradicionais são insuficientes para atender a um campo no

qual o pressuposto é a interação, e no qual as tecnologias de comunicação nos

colocam no interior do fluxo informativo.

Para efeito desse projeto, interatividade é “um processo pelo qual duas ou mais

coisas produzem um efeito uma sobre a outra ao trabalharem juntas” (SANTAELLA,

2004, p.174; DI FELICE, TORRES, YANAZE, 2012). A utilização do termo “coisas”

por Santaella indica o alinhamento com a visão de que as interações nas arquiteturas

reticulares envolvem atores humanos e não-humanos:

É fundamental ressaltar que a rede manifesta-se como o resultado de um conjunto de interações entre sujeitos (humanos e não-humanos), técnicas de informação e espacialidades, cuja forma não é nem previsível nem definitiva. Tal condição a descreve não como um “objeto” de estudo, mas como uma específica condição habitativa de interação entre entidades (humanas e não-humanas, técnicas e territoriais) que passam a construir suas especificidades temporárias a partir de suas distintas interferências.” (IBID, 2012, p.180).

Igualmente coerente com o conceito de “ator” de Bruno Latour, que “é tudo

que age, deixa traço, produz efeito no mundo, podendo se referir as pessoas,

instituições, coisas, animais, objetos, máquinas, etc.” (FREIRE, 2006, p.55). De

acordo com Freire, interpretando Latour:

Um ator é definido pelos efeitos de suas ações, de modo que o que não deixa traço não pode ser considerado um ator. Ou seja, somente podem ser considerados atores aqueles elementos que produzem efeito na rede, que a modificam e são modificados por ela e são estes elementos que devem fazer parte de sua descrição. Porém, não há como anteciparmos que atores produzirão efeitos na rede, que atores farão diferença, senão acompanhando seus movimentos (IBID).

A impossibilidade de definir a priori quais são os atores e quais os impactos

que os mesmos provocarão na rede, remete a questão de que o pesquisador tem que

estar imerso na arquitetura informativa, compartilhando de suas experiências,

condição para perceber a complexidade das sociabilidades expressas nessas

interações, parte de um ecossistema de “rede de redes” infinitas (delimitáveis só

arbitrariamente).

No Princípio de Simetria Generalizada, Latour e Callon propõem

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...ultrapassar a dupla separação moderna entre os humanos e os não-humanos, defendendo que se dê igual importância de tratamento para a produção tanto dos primeiros quanto dos segundos, estudando-os ao mesmo tempo. Ao assumirem que tudo o que há é interação, Latour e Callon vão ainda mais longe ao reivindicarem uma simetria total entre os humanos e os não-humanos. (FREIRE, 2006, p.49).

Ainda com base em Latour e Callon, Freire conclui que “o social é uma rede

heterogênea, constituída não apenas de humanos, mas também de não-humanos, de

modo que ambos devem ser igualmente considerados” (IBID).

O Atopos (Centro de Pesquisa em Redes Digitais ECA/USP), sob a

coordenação de Massimo Di Felice, tem se dedicado a enfrentar os desafios de gerar

uma nova abordagem metodológica para a pesquisa reticular, mesmo admitindo a

dificuldade de se estabelecer uma única, ou mesmo preferencial; a escolha deve

refletir o escopo e os objetivos de cada pesquisa. Porém, reconhecendo que a

comunicação reticular pressupõe a interatividade, propõe não levar em conta a

perspectiva Frontal, que coloca o pesquisador – observador numa posição externa a

arquitetura comunicacional objeto da pesquisa. Nesse caso, a rede não pode ser

considerada como uma esfera autônoma, na qual seria negada a interdependência

simbiótica das arquiteturas informativas reticulares. Di Felice, Torres e Yanaze

(2012) oferecem três perspectivas: (a) Perspectiva Imersiva, na qual a rede é

concebida como um espaço de sociabilidade e de interação, com características e

dinâmicas próprias. Trata-se de pesquisas desenvolvidas nas redes, com a observação

e documentação das práticas sociais dos usuários, a participação em suas interações e

o compartilhamento nas arquiteturas informativas de suas sociabilidades; (b)

Perspectiva Dialógica, na qual deve-se considerar a complexidade das relações e dos

dinamismos desenvolvidos nas interações sociotécnicas, numa interdependência

simbiótica. Nessa abordagem, o pesquisador tem que analisar as mudanças que as

arquiteturas reticulares provocam nos indivíduos (percepção e sociabilidade). A

conjectura é que há uma alteração profunda de todos os atores da interação, e nunca

uma simples troca mecânica de informação, e onde não há supremacia de um ator

sobre outro. Aqui a qualidade das interações sociais resultam de um processo de

interações reticulares tecno-humanas (LATOUR, 2012), e não uma simples extensão

nas redes das interações sociais off-line; e (c) Perspectiva Atópica, que envolve não

só as interações reticulares tecno-humanas, mas todo o território, envolvendo

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indivíduos, espaços, meio ambiente, arquiteturas urbanas e informativas, realidade

sociais e econômicas, práticas culturais e políticas – conflitivas. A ideia é que não são

apenas as arquiteturas informativas que estão se digitalizando, mas os territórios.

A pesquisa empírica base desse projeto adotou as perspectivas Imersiva e

Dialógica, mesmo atentando para as inúmeras limitações dado o extenso campo da

pesquisa e as restrições temporais do seu cronograma.

5.2.2. Percurso da pesquisa empírica e primeiras constatações

Para delimitar o campo e empreender a pesquisa reticular, percorremos 5

fases:

1. Fase de identificação das potenciais empresas: pesquisa efetuada no jornal

Valor Econômico, referência de informações sobre empresas e economia

empresarial no Brasil, usando termos chave como internet + colaboração,

colaboração + consumidor, consumidos + colaboração + empresa. A partir

desse filtro, identificamos as empresas que de fato apresentavam estruturas

interativas com o consumidor – internauta;

2. Fase Imersiva nas estruturas interativas: cada membro da equipe de

pesquisadores atuou como “pesquisador - observador” num conjunto pré-

determinado de 45 empresas, documentando as interações entre

empresa/consumidores, e entre os próprios consumidores. Avaliamos o grau

de intensidade de interação, a facilidade de participação, a relevância

quantitativa, o feedback, a relevância do conteúdo e a presença de práticas

colaborativas. Selecionamos as arquiteturas digitais colaborativas.

3. Fase de Investigação junto as empresas selecionadas na fase anterior: a partir

da identificação da rede interna relacionada a rede externa da arquitetura

digital colaborativa, realizamos entrevistas com os funcionários envolvidos

visando (a) aprofundar o entendimento das estruturas observadas e agregar

experiências off-line, (b) identificar o gap entre o propósito inicial e o que foi

de fato implantado, (c) apontar a distância e as barreiras entre concepção e

prática, (d) colher os depoimentos das experiências individuais e (e) entender

as perspectivas de continuidade do projeto piloto;

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4. Fase Dialógica: imersão nas arquiteturas digitais colaborativas selecionadas,

interagindo diretamente com os atores envolvidos;

5. Análise dos resultados, com base no quadro teórico de referência.

Não foram observadas iniciativas de criação de ecossistemas colaborativos,

apenas projetos pilotos ou pontuais. Evidências coletadas: (a) alta sensibilidade ao

tema por parte das empresas; (b) entendimento do mercado de que o consumidor –

internauta é um novo ator (reconhecendo também que se faz necessário um novo

código de ética); (c) em geral, criação de estruturas informativas digitais isoladas da

operação e da cultura interna dominante, sem regras claras de estímulo e recompensa,

e de organização (iniciativas desarticuladas); (d) existência de um conflito entre a

cultura colaborativa e o ambiente altamente competitivo no qual as empresas estão

inseridas; (e) observação de que os principais momentos críticos estão na concepção e

gestão da arquitetura informativa colaborativa; e (f) a não flexibilidade da linha de

produção é um fator restritivo a incorporação das colaborações externas.

As duas arquiteturas digitais colaborativas mais relevantes encontradas e

investigadas com profundidade, foram os projetos “Fiat Mio” e “Magazine Você”.

5.3. Cases mais significativos identificados no mercado brasileiro Case 1:

Projeto: Fiat Mio

Empresa: Montadora Fiat Brasil

Em agosto de 2009, a montadora Fiat Brasil lançou o projeto Fiat Mio,

convidando o público a pensar num modelo de carro para o futuro, comprometendo-se

a materializar essas ideias em um carro-conceito a ser exposto no Salão do Automóvel

de São Paulo em outubro de 2010. A Fiat se dispôs a tornar transparente suas áreas

mais estratégicas, historicamente protegidas e blindadas. A inspiração para pensar em

um desenvolvimento mais aberto, veio de duas fontes: (a) a experiência com o

lançamento no Brasil do carro Línea produzido na Turquia no ano de 2008, na qual a

equipe de marketing, rompendo com a tradição do setor, antecipou em trinta dias

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alguns de seus elementos (“tropicalização” do design, etc.) e (b) a leitura do livro

What Would Google Do? De Jeff Jarvis, no qual o autor especula como seria um

processo de desenvolvimento de um carro numa “montadora Google”. O propósito

original era apenas mostrar o passo a passo do desenvolvimento (making of), sem

interatividade com o usuário. O debate evoluiu para “participação/não-participação”

dos usuários e, dentro de uma perspectiva mais ampla de inserção da montadora nas

práticas de open innovation, surgiu a plataforma colaborativa Fiat Mio. Pela primeira

vez na montadora, e provavelmente na indústria automobilística, a decisão sobre um

novo carro-conceito não seria do seu comitê diretor. O projeto foi efetivamente

produzido em colaboração com o internauta, em tempo real e contínuo (projeto de

open source8, utilizando licenças Creative Commons9).

Não houve um planejamento prévio, as equipes envolvidas foram “aprendendo

fazendo”, com dois desafios: preservar a gestão da dinâmica do projeto no formato

colaborativo e controlar o tempo em função da data do Salão do Automóvel. A rede

interna conectada a rede externa dos usuários envolveu as áreas de estilo, marketing,

engenharia, inovação, produto, pesquisa, jurídico, dentre outras. A maior preocupação

era como exercer uma mediação neutra, não conduzindo o processo; o lema era

“somos a mão que desenha”.

Ao se comprometer a respeitar as contribuições dos usuários, a Fiat assumiu

um risco em relação ao produto final, que poderia ou não ter lógica. Em paralelo,

havia a preocupação com a limitação do tempo e com o medo de gerar frustração

entre os participantes, que poderiam confundir um carro-conceito com um produto

comercializável, a ser posto a venda no final do processo. A racionalidade permeou a

maior parte das colaborações dos usuários, que refletiram a preocupação com o papel

do carro na sociedade abordando aspectos como mobilidade, sustentabilidade,

poluição e praticidade; as soluções miraram mais o cotidiano atual do que

8 Projeto de open source deriva de software de código aberto, onde qualquer usuário por modificá-lo (inserir novas funcionalidades). No caso de projetos, o desenvolvimento quase sempre efeito de forma colaborativa.

9 Creative Commons é uma organização não governamental sem fins lucrativos, fundada em 2001 por Larry Lessig, Hal Abelson e Eric Eldred com apoio do Centro de Domínio Público, localizada em São Francisco, Califórnia/EUA, com o objetivo de expandir a quantidade de obras criativas disponíveis. Suas licenças (licenças Creative Commons) permitem a cópia e compartilhamento com menos restrições que o tradicional todos direitos reservados.

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propriamente o futuro. Os participantes entenderam o projeto e não usaram o canal

para outro fim, quebrando o paradigma de que é preciso controlar tudo o tempo todo.

A primeira etapa foi livre; a partir daí, houve uma condução da montadora visando

interpretar o pensamento do usuário, nem sempre expresso com clareza,

fundamentalmente orientada pela praticidade (exemplo de pergunta condutora: “um

carro tão pequeno que não tenha porta mala?”).

De certa forma, o perfil do usuário-colaborador10 destoou do esperado: idade

média de 35 anos, 52% de indivíduos casados, 41% com ensino superior, 41% classe

A/B, 46% com 1 carro; cara de família, ligado em religião, não usuário intensivo de

redes digitais (não “nativo digital”), não produtor de conteúdo. A maior motivação

apurada foi a oportunidade de participar de um projeto inovador, envolvendo a

concepção de um carro; contudo, os brindes oferecidos ao longo do processo tiveram

sua cota de influencia. Importante lembrar que esse projeto foi inteiramente realizado

num ambiente de menor acesso a redes sociais, distinto do atual contexto digital.

O processo não foi isento de resistências internas, surgiram barreiras derivadas

de vaidades, crenças, ausência de desprendimento para abrir mão do controle do

processo, dentre outras. Ao final, o projeto gerou impactos profundos na cultura

interna, nas redes de processos, nos modelos de interação das redes internas, e nos

próprios colaboradores das equipes diretamente envolvidas. Se ainda não trouxe

mudanças radicais no processo geral da montadora, já são percebidas inovação nos

mini-processos.

Como mencionado anteriormente, o não equacionamento por parte das

empresas do dilema transparência versus concorrência é uma das maiores resistências

a formação de redes colaborativas com os consumidores. Essa experiência mostrou

que talvez o caminho esteja na interpretação das informações, que será sempre

específica de cada corporação e reflexo de sua personalidade, cultura, identidade,

história. O processo de digitalização não impacta apenas as atividades de

comunicação, entretenimento e informação, mas oferece um caminho novo de fazer

negocio e de estruturar uma empresa.

10 Informações transmitidas pela Fiat resultado de pesquisa interna com os usuários do site do projeto.

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Case 2:

Projeto: Magazine Voce

Empresa: Varejista Magazine Luiza

O projeto “Magazine Você” é um novo canal de vendas da varejista Magazine

Luíza, lançado em 2012, amparado no conceito de “social commerce”: comércio

eletrônico envolvendo o relacionamento entre pessoas, que se sustenta na premissa de

que a decisão de compra se torna mais fácil e, possivelmente, mais confiável, quando

os vendedores são pessoas do ciclo de relacionamento social do comprador. Com a

entrada de novos consumidores a partir da ascensão da classe C e a forte presença dos

brasileiros nas redes sociais, a internet passa a ser vista como uma oportunidade de

expansão da rede de potenciais clientes.

Nesse canal, uma pessoa física usuária das redes sociais Orkut e Facebook,

denominado Divulgador, pode criar sua “vitrine” online (loja virtual) com os produtos

do Magazine Luíza disponíveis em sua plataforma de comércio eletrônico (site

comercial); o Divulgador ganha comissão por cada produto vendido. O Magazine

Luiza incentiva o Divulgador a incluir em sua vitrine os produtos nos quais seja

reconhecido por sua rede de contatos (“amigos” das redes sociais) como um

“especialista”, sendo capaz de atestar suas qualidades e seus benefícios, além de dar

sugestões e dicas de uso.

Para ganhar agilidade, o time que desenvolveu o projeto contou com as áreas

de marketing do e-commerce e tecnologia da informação (TI) corporativa, com a

colaboração de duas agências de marketing e mídias sociais, com relativa autonomia

na escolha dos caminhos a serem seguidos. A área jurídica apoiou elaborando as

políticas de utilização da plataforma, o entendimento das políticas de uso dos

aplicativos, e as questões relativas ao relacionamento com o Divulgador.

O projeto foi lançado em versão “alfa” por seis meses, período no qual esteve

disponível apenas para parentes de funcionários convocados a experimentar o novo

canal e colaborar no seu aperfeiçoamento; foram criadas 800 lojas virtuais nessa fase.

Em inicio de 2012, o Magazine Você foi aberto a qualquer usuário de redes sociais; a

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meta inicial de 20 mil lojas virtuais até o final desse ano, foi alcançada em apenas

duas semanas (em julho, o numero de Divulgadores cadastrados era de 33 mil).

Uma das preocupações da equipe líder era tornar o aplicativo ágil e flexível,

propondo soluções adequadas em tecnologia e gestão. A opção foi (1) armazenar em

cloud, escalável em função da demanda de tráfego de usuários e armazenamento de

dados e (2) utilizar a infraestrutura do Google (Google App Engine), evitando a

obrigatoriedade de manter um servidor próprio, e garantindo capacidade de

armazenamento tendo em vista que não havia controle sobre o volume de adesões nas

redes sociais.

A colaboração no Magazine Você acontece em três momentos: (1) interação

colaborativa no Facebook e Orkut entre Magazine Luiza e os Divulgadores no

Facebook (feedback sobre a performance de venda, problemas ou ideias de melhoria

para o sistema de logística, dentre outros temas que interferem e aperfeiçoam

diretamente o negócio); (3) interação colaborativa no Facebook e Orkut entre os

divulgadores (troca de dicas de como vender mais, auxilio na utilização do aplicativo

para vendas); (2) interação colaborativa na própria construção e aperfeiçoamento do

aplicativo (projeto em fase “beta”, sendo modificado permanentemente). Além das

redes sociais, o Divulgador possui um canal telefônico e um endereço de e-mail

exclusivo para o seu atendimento.

O Magazine Você, mesmo sendo um projeto relativamente recente e ainda em

fase de consolidação, já apresenta resultados relevantes, dentre outros: (1) é o canal de

venda com a maior taxa de crescimento (mesmo que não significativo em termos

absolutos); (2) gerou um valor agregado na imagem da marca institucional,

repercutindo intensamente na mídia, ate então mais centrada na figura da fundadora e

CEO Luiza Trajano; (3) impactou a cultura organizacional, transformando-se num

modelo de inovação e gestão eficiente de projeto; (4) estimulou a criação da área de

Pesquisa & Desenvolvimento (P&D); e (5) aumentou o fluxo de usuários nas

plataformas digitais do Magazine Luiza.

A cultura corporativa da varejista é um dos fatores de sucesso do projeto. Sem

atributos como autonomia, flexibilidade, colaboração entre áreas e equipes, processo

de decisão ágil, reconhecimento de mérito, dificilmente um projeto com essa

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magnitude e pluralidade poderia ter sido se quer concebido, muito menos

implementado.

6. Considerações finais

O mundo está em metamorfose e as tecnologias digitais, a internet, são uma

das causas principais dessa ruptura. Estamos no processo de escrever uma nova

sociedade, caracterizada por uma inédita relação entre o indivíduo e o coletivo, por

transformações profundas nas empresas e nas suas relações com os diversos públicos

(parceiros, funcionários, consumidores, clientes, fornecedores, investidores) e no

nosso próprio desenvolvimento cognitivo. Faz sentido denominá-la de “revolução

tecnológica” porque ela abriga um desenvolvimento tecnológico que tem um

tremendo impacto no social, tanto do ponto de vista de sua penetração quanto em sua

potência. Esta revolução é de natureza comparável ao aparecimento da linguagem, da

escrita e da impressão. A diferença é que essas tiveram a sua disposição um longo

período de difusão, permitindo a sociedade de se apropriar de seus benefícios e

transformar-se gradualmente. A aceleração e a potência das tecnologias digitais

impõem uma outra dinâmica.

Existe um intenso debate em torno dos conceitos de “moderno” e de “pós-

moderno” nas reflexões sobre a sociedade. Não há uma divisão clara, muito menos

um critério objetivo para defini-los; trata-se apenas de uma interpretação. O concreto

é que saímos de uma época industrial para uma sociedade da informação, onde a

informação é um valor. Nessa sociedade o essencial é imaterial, o que faz de fato

funcionar a economia não é palpável. Os bens assumem um valor simbólico. O carro,

por exemplo, não é um mero meio de locomoção, muitos dos seus aparatos tem

funções outras que não apenas o transporte – status, bem-estar, entretenimento,

conforto, etc. A publicidade baseia-se justamente nesse imaterial; atualmente é mais

difícil vender um produto do que produzi-lo.

Observamos uma mudança na lógica econômica: a informação comanda tudo

na sociedade contemporânea. Essa nova lógica cria uma espécie de redistribuição

dentro do social, inclusive de poder. Com a nova produção, distribuição e controle da

informação, muda o poder. As mídias sociais estão “pautando” a grande mídia, como

verificamos claramente nas recentes manifestações sociais de rua no Brasil e mundo

afora. O interlocutor é a “opinião mundial”, não está mais restrito aos indivíduos

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diretamente envolvidos no diálogo, seja ele entre o Estado e os seus cidadãos, ou

entre a empresa e os seus consumidores. Transparência, sociabilização,

compartilhamento, colaboração são valores que impõem uma nova ética, contrária aos

valores de controle, dominação, exclusão. Não existe mais o domínio centralizado de

quais assuntos irão ou não para a esfera pública.

Essa explosão do poder dos indivíduos com o crescimento da adesão a redes

sociais, obriga as empresas a refletirem sobre a internet e o seu significado. Nos EUA,

no final de 2010, 87% das empresas já tinham integrado as redes sociais em suas

estratégicas, mesmo que ainda em torno de benefícios restritos como medir a

visibilidade de sua marca, o aumento do tráfego em seus sites, e a percepção sobre

seus produtos e serviços11. Um estudo conduzido pela IBM em outubro de 2011

revelou que o segundo maior desafio atual expresso pelos diretores de marketing,

depois da explosão de dados, são as redes sociais. Segundo Christine Balagué (2013),

assistimos a uma mudança de paradigma, particularmente na abordagem de mercado,

nas funções de marketing e comunicação, e na gestão da relação com o cliente. O

marketing tradicional praticado pelas empresas nos últimos cinquenta anos se

fundamentou sobre padrões largamente difundidos: os mercados são os indivíduos

(individual centric); as tecnologias de comunicação são majoritariamente push (a

empresa define uma mensagem, depois a difunde através das mídias com o objetivo

de maximizar sua audiência); a pesquisa de marketing repousa essencialmente sobre

os estudos qualitativos ou quantitativos a base de amostras; a gestão da relação com o

cliente se efetua via os modelos de CRM (Customer Relationship Management)

focada numa relação one too one com o consumidor; e a inovação ocorre

fundamentalmente pela contribuição das equipes internas do departamento de

Pesquisa & Desenvolvimento (P&D). As tecnologias digitais de informação e

comunicação (TIC) modificaram esse paradigma em cada um de seus componentes:

os mercados são agora “de conversas” (tornou-se conversation centric); a

comunicação é interativa, num modelo não mais push, mas many to many com as

comunidades de internautas interagindo também entre si; as conversas sobre um

produto ou serviço são frequentemente iniciadas por essas comunidades, com menor

controle das empresas sobre o processo de difusão das mensagens e de seus

11 Christine Balagué (2013)

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conteúdos; os estudos de marketing se baseiam em metodologias sofisticadas (big

data intelligent); a gestão da relação cliente não é mais do tipo one to one, mas

essencialmente com a comunidade de internautas; por último, o open innovation

(inovação aberta a participação externa) predomina.

As tecnologias digitais estão colocando mais e mais o indivíduo a frente dos

processos, das decisões, dos movimentos, mas trata-se de um indivíduo conectado à

um coletivo; temos um deslocamento do “individualismo” para a “individualização”.

No novo modelo socioeconômico os internautas se utilizam dos meios digitais para se

informar sobre os produtos e os serviços que desejam adquirir; a próxima etapa,

talvez seja a colaboração num nível original de interatividade. Os coletivos digitais

tendem a ser mais colaborativos.

Esse ambiente favorável à colaboração é parcialmente aproveitado pela

sociedade porque a cultura competitiva continua prevalecendo. Vivemos no presente a

convergência dessas duas tendências. Provavelmente as transformações virão da

periferia do mercado dominante, das pequenas empresas, e dificilmente das grandes

empresas, hierarquizadas, solidamente estabelecidas. Não há como prever o que vai

acontecer no futuro, se o próprio conceito de empresa vai sobreviver, se as mesmas

vão ser capazes de se transformar ou serão substituídas por formas inéditas de

organização dos negócios. Necessitamos de uma nova geração, que assuma o controle

do processo de construir uma nova sociedade, evitando assim as resistências

absolutamente compreensíveis por parte da geração analógica, formada “pela

televisão”. É animador pensar num futuro no qual predomine a coprodução de valor

entre as empresas e os seus consumidores.

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