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Habitação Social Projeto de Habitação de Interesse Social no Rio de Janeiro Maria Inês Ivens Brandão Gago da Câmara Dissertação para a obtenção do Grau de Mestre em Arquitetura Júri Presidente: Prof. ª Doutora Helena Silva Barranha Gomes Orientador: Prof. Carlos Moniz de Almada Azenha Pereira da Cruz Vogal: Prof. Doutor Vítor Manuel de Matos Carvalho Araújo Outubro 2013

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i

Habitação Social

Projeto de Habitação de Interesse Social no Rio de Janeiro

Maria Inês Ivens Brandão Gago da Câmara

Dissertação para a obtenção do Grau de Mestre em

Arquitetura

Júri

Presidente: Prof. ª Doutora Helena Silva Barranha Gomes

Orientador: Prof. Carlos Moniz de Almada Azenha Pereira da Cruz

Vogal: Prof. Doutor Vítor Manuel de Matos Carvalho Araújo

Outubro 2013

i

ii

iii

AGRADECIMENTOS

Ao Professor Carlos Cruz pela orientação e disponibilidade,

Ao Marcus pela amizade e colaboração na execução deste projeto,

Ao Professor Mauro Santos,

Aos meus pais e irmãos,

A toda a minha família e amigos,

À Cidade Maravilhosa,

Obrigada.

iv

v

RESUMO

O presente relatório tem como objeto de estudo o tema- Habitação Social- surgido no âmbito da

disciplina de Projeto de Interesse Social da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do

Rio de Janeiro, frequentada no decorrer do programa de Intercâmbio BRASIL, no ano letivo

2012/2013.

O principal objetivo deste relatório visa apresentar e fundamentar o exercício de projeto de habitação

social assim como uma reflexão teórica sobre o tema. Num contexto geral, este relatório pretende

fundamentar o fato de decisões de projeto, com foco neste tema, poderem melhorar ou piorar a

qualidade urbana e proporcionar habitação de qualidade para a população com menos

possibilidades económicas.

No presente relatório, o tema Habitação Social será abordado e analisado no território brasileiro.

Esta análise, com enfase nas questões da evolução histórica, social, cultural e económica, irá

proporcionar um melhor entendimento do tema neste País e também servirá como conhecimento

base para o desenvolvimento do projeto.

Para uma melhor fundamentação da solução proposta foram estudados três casos de estudo

localizados na cidade do Rio de Janeiro.

O Projeto, objeto de estudo deste relatório, localiza-se no Bairro Santo Cristo, no centro da cidade do

Rio de Janeiro, Brasil. O lote de projeto está inserido numa área muito próximo da Baía de

Guanabara, com um tecido urbano ortogonal caracterizado, maioritariamente, por edifícios industriais

associados às atividades portuárias daquela zona. A morfologia urbana deste local foi sofrendo, ao

longo de vários anos, diversas mudanças, principalmente, devido aos sucessivos aterros. No início

do séc. XX deu-se o primeiro aterro marítimo de grandes dimensões nesta zona, com o objetivo de

criar uma área central portuária. Esta nova linha possibilitou a construção do novo cais do porto

moderno e também o desenho das vias Rodrigues Alves e Francisco Bicalho, que são dois grandes

eixos viários localizados na área de estudo.

A proposta apresentada procura contribuir para a revitalização do lote de projeto, através da

habitação, mas também para uma nova continuidade urbana através do espaço público. Traduz-se

num conjunto habitacional para o total de 850 pessoas, que se materializa por uma construção

económica baseada em espaços mínimos mas capazes de proporcionar ambientes de qualidade.

Integração Social | Habitação Popular | Habitação Econômica

vi

vii

ABSTRACT

The following report has Social Housing as a case study, appeared within the course Projeto de

Interesse Social (Project of Social Interest) at the Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal

do Rio de Janeiro (Federal University of Rio de Janeiro – Architecture Institute), attended within the

BRASIL exchange program, during 2012/2013.

The main goal of this report is to present and substantiate the social housing project as well as to

reflect, theoretically, upon the theme. In a general context, this report aims to substantiate the fact

that making project decisions, on this matter, may improve or worsen the urban quality and provide

house qualities to the population with less economical resources.

In the report, the Social Housing theme will be approached and analyzed concerning the Brazilian

territory. This analysis, enhancing historical, social, cultural and economic evolution, will provide a

better understanding of the theme, in this particular country, as well as it will serve as base

knowledge to the project development.

For a better substantiation of the proposed solution, three cases, located on Rio de Janeiro city, were

studied.

The Project which this report refers to is located on the Bairro Santo Cristo (Holy Christ

Neighborhood), right in the center of Rio de Janeiro, Brazil. The project lot is based closer to the Baía

de Guanabara (Guanabara Bay), which has an orthogonal urban tissue mainly characterized by

industrial buildings associated with port activities of the area. This place’s urban morphology went

through a lot of changings, throughout the years, mainly because of the successive embankments. At

the beginning of the 20th century the first big maritime embankment was made, with the purpose of

creating a central port area. This new line enabled the construction of the new quay of the modern

port as well as the design of the Rodrigues Alves and Francisco Bicalho streets, which are two main

road axis of the case study area.

The presented proposal aims to contribute to the project lot’ revitalization, through housing, but also

to a new urban continuity through public space. It translates in a total of 850 people housing, which is

materialized by an economic construction based on minimal spaces capable of providing a good

quality environment.

Social Integration | Social Housing | Housing Economic

viii

ix

ÍNDICE

Agradecimentos

Resumo

Abstract

Índice

Índice de figuras

Abreviaturas

01. INTRODUÇÃO

01.1 Enquadramento e Objetivos …………………………………………………………………… 2

01.2 Motivação e justificação ………………………………………………………………………... 3

01.3 Metodologia e Organização do Trabalho …………………………………………………...... 3

02. HABITAÇÃO SOCIAL - “REFLEXÃO TEÓRICA”

02.1 Experiência Brasileira- Rio de Janeiro ……………………………………………………….. 6

03. CASOS DE ESTUDO

03.1 Conjunto Habitacional Prefeito Mendes Moraes- Pedregulho ……………………………... 13

03.2 Núcleo Habitacional Cafundá ………………………………………………………………….. 17

03.3 Morro da Babilônia …………………………………….……………………..…………………. 20

03.4 Relação comparativa dos casos de estudo …………………………………………………... 23

04. ANÁLISE DO TERRITÓRIO

04.1 Escalas de trabalho ……………………………………………………………………………... 26

04.2 Localização ………………………………………………………………………………………. 27

04.3 Contexto e Evolução Histórica …………………………………………………………………. 28

04.4 Características Sociodemográficas ……………………………………………………………. 33

04.5 Mobilidade …………………………………………………………………………………….….. 33

04.6 Estrutura Edificada ………………………………………………………………………………. 39

04.7 Estrutura Física ………………………………………………………………………………….. 43

04.8 Síntese ……………………………………………………………………………………………. 47

05. PROJETO

05.1 Programa e Método ……………………………………………………………………………... 51

05.2 Contexto da Intervenção ………………………………………………………………………... 52

05.3 Definição do Conceito …………………………………………………………………………... 55

06. CONSIDERAÇÕES FINAIS 62

07. BIBLIOGRAFIA 64

08. ANEXOS 67

x

LISTA DE FIGURAS

01. HABITAÇÃO SOCIAL- “REFLEXÃO TEÓRICA”

Fig. 1- Cortiço na Rua Senador Pompeu 7

Fonte: Autora

Fig. 2- Interior do pátio do Cortiço na Rua Senador Pompeu 7

Fonte: Autora

Fig. 3- IAPI Realengo- Fachada Posterior 8

Fonte: Autora

Fig. 4- IAPI Realengo- Fachada Principal 8

Fonte: Autora

Fig. 5- Conjunto Residencial Prefeito Mendes Moraes 8

Fonte: Autora

Fig. 6- Vista edifício principal, Bloco A 8

Fonte: Autora

02. CASOS DE ESTUDO

Fig. 7- Localização dos casos de estudo na cidade do Rio de Janeiro 12

Fonte: Adaptado de maps.google.pt

02.1 Conjunto Habitacional Prefeito Mendes Moraes

Fig. 8- Identificação do Conjunto Residencial Prefeito Mendes Moraes, bairro S. Cristóvão, 13

Rio de Janeiro

Fonte: Adaptado de maps.google.pt

Fig. 9- Bloco A e Ginásio 16

Fonte: Autora

Fig. 10- Escola Primária 16

Fonte: Autora

Fig. 11- Galeria de circulação 16

Fonte: Autora

Fig. 12- Vista do bloco A 16

Fonte: Autora

Fig. 13- Cobogó- Resolução do problema de insolação 16

Fonte: Autora

Fig. 14- Perspetiva do Bloco A e da Escola primária 16

Fonte: Autora

02.2 Conjunto Habitacional Cafundá

Fig. 15- Identificação do Conjunto Habitacional do Cafundá, Bairro Taquara, Jacarepaguá 17

Fonte: Adaptado de maps.google.pt

Fig. 16- Fachada edifício do conjunto 19 Fonte: Autora

xi

Fig. 17- Núcleo de acesso vertical 19

Fonte: Autora

Fig. 18- Pormenor de uma escada 19

Fonte: Autora

Fig. 19- Galeria de circulação 19

Fonte: Autora

Fig.20- Área exterior 19

Fonte: Autora

Fig. 21- Perspetiva da galeria 19

Fonte: Autora

Fig. 22- Vista aérea do Conjunto 19

Fonte: http://www.smcconsultoria.com.br/fotos/cafunda07.jpg

02.3 Morro da Babilônia e Chapéu Mangueira

Fig.23- Identificação da Favela Babilônia e Chapéu Mangueira, bairro Leme, zona sul do 20

Rio de Janeiro

Fonte : Foto- Aerea_autor_Tales-Lobosco

Fig. 24- Antes e depois do local da implantação do edifício de habitação social 22

Fonte: http://www.arquitraco.com.br/#/projeto

Fig. 25- Novo edifício de habitação social na Babilônia 22

Fonte: Autora

Fig.26- Edifício de Habitação social 22

Fonte: Autora

Fig. 27- Antes e depois- Largo do Campinho 22

Fonte: http://www.arquitraco.com.br/#/projeto

Fig. 28- Antes e depois- Urbanização 22

Fonte: http://www.arquitraco.com.br/#/projeto

03. ANÁLISE DO TERRITÓRIO

03.1 Escalas de trabalho

Fig. 29- Identificação do bairro Santo Cristo e do lote de projeto 26

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

03.2 Localização

Fig. 30- Identificação do bairro Santo Cristo na região metropolitana do Rio de Janeiro 27

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Santo_Cristo_(bairro_do_Rio_de_Janeiro)

Fig. 31- Identificação do lote de projeto 27

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

03.3 Contexto e Evolução Histórica

Fig. 32- Áreas aterradas na Cidade do Rio de Janeiro 28

Fonte: portalgeo.rio.rj.gov.br

Fig. 33- Evolução histórica da Praça XV entre 1580 e 2002 29

Fonte: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/EOUrbana/

xii

Fig. 34- Expansão urbana do centro do Rio de Janeiro 30

Fonte: https://www.ufmg.br/rededemuseus/crch/simposio/GODOY_VANESSA_F_ET_AL.pdf

Fig. 35- Identificação da operação urbanística Porto Maravilha. Bairro Santo Cristo 31

e lote de projeto

Fonte: Adaptado de www.portomaravilha.com.br

Fig. 36- Projeto premiado pelo Concurso Porto Olímpico 32

Fonte: http://concursoportoolimpico.com.br/website/

03.5 Mobilidade

Fig. 37- Análise viária na proximidade da área de estudo 35

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig.38- Vias de acesso local na área de estudo 35

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 39- Rede metropolitana de transporte público 37

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Programa_Estadual_de_Transportes

Fig. 40- Estações de autocarros no bairro Santo Cristo 38

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 41- Estrutura de espaços públicos 39

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

03.6 Estrutura edificada

Fig. 42- Núcleos inseridos no bairro Santo Cristo 39

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 43- Núcleo 1 40

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 44- Núcleo 2 40

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 45- Núcleo 3 41

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 46- Núcleo 4 42

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 47- Distribuição Funcional 42

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 48- Modelo Digital do terreno- Relevo 43

Fonte: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/estudoscariocas/

Fig. 49- Modelo Digital do terreno- Declives e linhas de água 44

Fonte: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/estudoscariocas/

Fig. 50- Modelo Digital do terreno- Áreas inundáveis 44

Fonte: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/estudoscariocas/

Fig. 51- Evolução da linha de costa entre os anos 1500 e 2000 46

Fonte: http://portalgeo.rio.rj.gov.br/EOUrbana/

04. PROJETO

04.2 Contexto da Intervenção

Fig. 52- Avenida Cidade de Lima 53

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

xiii

Fig. 53- Avenida Professor Pereira Reis 53

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 54- Rua do Equador 53

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 55- Rua Santo Cristo 54

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 56- Lote de projeto 54

Fonte: Autora, adaptado de maps.google.pt

Fig. 57- Diagrama de Conceito I 56

Fonte: Autora

Fig.58- Diagrama de Conceito II 56

Fonte: Autora

Fig. 59- Diagrama de Conceito III 56

Fonte: Autora

Fig. 60- Diagrama de Conceito IV 56

Fonte: Autora

Fig. 61- Perspetiva global da proposta 57

Fonte: Marcus, colega

Fig. 62- Vista aérea da proposta 57

Fonte: Marcus, colega

Fig. 63- Diagrama tipológico I 58

Fonte: Autora

Fig. 64- Diagrama tipológico II 58

Fonte: Autora

Fig. 65- Diagrama tipológico III 59

Fonte: Autora

Fig. 66- Distribuição tipológica das unidades habitacionais 59

Fonte: Autora

07. ANEXOS

I Cartografia

Fig. 67- Cartografia 1769 70

Fonte: http://www.almacarioca.com.br/imagem/fotos/rioantigo2/fotoa219.htm

Fig. 68- Cartografia 1831 70

Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?p=104777002

Fig. 69- Cartografia 1867 71

Fonte: http://www.worldmapfinder.com/En/South_America/Brazil/Rio_De_Janeiro/

Fig. 70- Cartografia 1905 71

Fonte: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.096/143

Fig. 71- Cartografia 1929 72

Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?p=104777002

II Porto Maravilha

Fig. 72- Passeio público próximo à Praça Mauá 74

Fonte: http://portomaravilha.com.br/web/fotos/futuro.aspx

Fig. 73- Avenida Rodrigues Alves transformada em via expressa 74

Fonte: http://portomaravilha.com.br/web/fotos/futuro.aspx

Fig. 74- Fachada do Museu de Arte do Rio 74

Fonte: http://portomaravilha.com.br/web/fotos/futuro.aspx

xiv

III Revitalização dos Galpões da Gamboa

Fig. 75- Vista aérea dos galpões 76

Fonte: http://portomaravilha.com.br/web/fotos/futuro.aspx

Fig. 76- Vista aérea dos galpões com a cidade do samba atrás 76

Fonte: http://portomaravilha.com.br/web/fotos/futuro.aspx

Fig. 77- Estação da Gamboa antigamente 76

Fonte: http://portomaravilha.com.br/web/fotos/futuro.aspx

IV Informações Detalhadas

Fig. 78- Ficha de Informação detalhada sobre o terreno 78

Fonte: Professor da disciplina

V Desenhos Técnicos e Elementos Adicionais

Fig. 79- Modelo 3D- Apartamento T0 82

Fonte: Marcus, colega de turma

Fig. 80- Modelo 3D- Apartamento T1 82

Fonte: Marcus, colega de turma

Fig. 81- Modelo 3D- Apartamento T2 83

Fonte: Marcus, colega de turma

Fig. 82- Modelo 3D- Perspetiva da Avenida Professor Pereira Reis 84

Fonte: Marcus, colega de turma

Fig. 83- Modelo 3D- Área de estacionamento 84

Fonte: Marcus, colega de turma

Fig. 84- Modelo 3D- Espaço público, quiosques 84

Fonte: Marcus, colega de turma

Fig. 85- Modelo 3D- Perspetiva noturna da proposta 85

Fonte: Marcus, colega de turma

xv

ABREVIATURAS

IAPs Institutos de Aposentadorias e Pensões

FCP Fundação da Casa Popular

DHP Departamento de Habitação Popular

BNH Banco Nacional de Habitação

IAB Instituto de Arquitetos do Brasil

Rj Rio de Janeiro

UPP Unidade de Polícia Pacificadora

xvi

1

01. INTRODUÇÃO

HABITAÇÃO SOCIAL

2

01.1 ENQUADRAMENTO E OBJETIVOS

No presente relatório, apresenta-se e justifica-se o projeto de habitação de interesse social

desenvolvido na disciplina de Projeto de Habitação de Interesse Social, frequentada no último ano

do Mestrado Integrado em Arquitetura, pelo programa de mobilidade Brasil, no Rio de Janeiro.

Pretendeu-se elaborar um projeto de habitação direcionado para a questão social, localizado na

zona Portuária do Rio de Janeiro, estando o lote de projeto integrado no bairro de Santo Cristo. Esta

área da cidade está a ser alvo de vários projeto de revitalização e melhoramentos relativamente às

questões viárias e da vivência do próprio local. É uma área consolidada da cidade, mas com

diversos problemas referentes à qualidade urbana, de habitação e, principalmente, de ligação com o

restante tecido urbano do centro da cidade. Este último problema referente à ligação com a cidade é

agravado por diversas barreiras físicas, como por exemplo, a linha férrea e o viaduto da Perimetral,

que provocam o isolamento dos bairros desta área urbana.

Objetivos da análise:

Nesta fase do relatório, pretende-se refletir sobre conteúdo teórico relativo à habitação social no

Brasil e na cidade do Rio de Janeiro. Para fundamentar o trabalho, vão ser estudadas algumas

intervenções do mesmo caráter, procurando entender como se organizam e se desenvolvem noutros

locais, com o objetivo de comparar outras formas de projetar habitação com o mesmo propósito.

Estas intervenções são apresentadas na forma de casos de estudo, que irão assumir um capítulo no

corrente relatório de projeto. O levantamento e diagnóstico de problemas e as necessidades da área

de estudo são também um objetivo que irá ser tratado na análise.

Objetivos do Projeto:

Refletir sobre a prática de projeto de habitação social no Rio de Janeiro, analisando diferentes

métodos de intervenção. Será importante, conseguir encontrar as respostas para as carências da

população que, futuramente, habitará o local, e também do espaço urbano envolvente. Encontrar

uma resposta projetual com um desenho urbano próprio e que se articule corretamente com a

envolvente urbana.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

3

01.2 MOTIVAÇÃO E JUSTIFICAÇÃO

Tendo a hipótese de optar por realizar um Relatório de Projeto ou uma Dissertação para a obtenção

do grau de Mestre em Arquitetura pelo IST, a minha escolha recaiu sobre a primeira opção, visto ter

tido a oportunidade de realizar um trabalho sobre este tema, que acho pertinente na atualidade,

tanto nos dois países, Brasil e Portugal, como também em todo o mundo.

A temática habitacional sempre foi, e continuará a ser, objeto inerente à vida da sociedade, e

também uma questão de inevitável interesse a nível arquitetónico. De maneira a haver um

desenvolvimento social equilibrado, a questão da habitação é tratada como objeto de estudo de

grande importância na arquitetura. A qualidade habitacional é, assim, considerada um aspeto de

bastante interesse na vivência familiar e também para toda a sociedade. Esta relação está implícita

uma vez que a obra se destina ao Homem, podendo influenciar, positivamente ou negativamente, o

seu comportamento.

Neste contexto, o tema da Habitação de Interesse Social encontra-se em constante debate, sendo

um tema que suscita bastante interesse, quer para a população quer para os profissionais da

arquitetura, o que justifica a realização deste projeto e, consequentemente, do presente documento.

01.3 METODOLOGIA E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

De maneira a alcançar os objetivos propostos foi necessário, numa primeira abordagem, estudar, a

nível teórico, o tema da habitação social, investigando os acontecimentos históricos sobre tema no

Brasil e na cidade do Rio de Janeiro.

O presente trabalho foi, então, dividido em quatro capítulos principais, que apresentam conteúdos

distintos de acordo com a sua natureza.

Os dois primeiros capítulos, 01 e 02, referem-se à reflexão teórica sobre o tema. No capítulo 01,

Habitação Social- “Reflexão teórica”- enquadra-se de uma forma mais abrangente este tema no

contexto brasileiro. O capítulo 02 destina-se ao estudo de três casos de estudo, situados na cidade

do Rio de Janeiro. O primeiro caso de estudo refere-se ao Conjunto habitacional do Pedregulho, no

Rio de Janeiro. O segundo caso incide sobre o Núcleo habitacional do Cafundá e, por último, o

terceiro caso de estudo refere-se ao projeto de urbanização, com foco, também, na questão da

habitação social na favela Babilônia, situada na zona sul da cidade.

É a partir do terceiro capítulo que se inicia a análise sobre a área de estudo onde se insere o lote de

projeto. Começa-se por mencionar as diferentes escalas de trabalho e realiza-se uma descrição

sobre a localização da área de estudo. Em seguida é realizada uma análise pormenorizada sobre as

HABITAÇÃO SOCIAL

4

características do território, abordando aspetos históricos, sociodemográficos, da mobilidade,

estrutura edificada e física.

Por último, é no capítulo 04, que se apresenta o desenvolvimento da componente prática, ou seja, a

proposta para o Bairro do Santo Cristo na zona Portuária do Rio de Janeiro. Aqui o capítulo

subdivide-se em três partes, sendo apresentado na primeira abordagem relativa ao programa e

método da disciplina e a segunda em relação ao contexto da Intervenção. Na última parte, é

apresentado a definição do conceito e as suas diretrizes, bem como a maior parte do conteúdo

referente à prática do exercício de projeto durante o 2º semestre do ano letivo 2012/2013.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

5

02. HABITAÇÃO SOCIAL

“REFLEXÃO TEÓRICA”

HABITAÇÃO SOCIAL

6

02.1 EXPERIÊNCIA BRASILEIRA – RIO DE JANEIRO

O crescimento industrial que se iniciou no Brasil, a partir da década de 20, é acompanhado pelo

crescimento populacional nos centros urbanos, onde se concentrava a maior parte das indústrias. No

início dos anos 20, a população é de cerca de 30 milhões, sendo que 10% vive nas cidades; entre as

décadas de 30 e 40, o país conta com 40 milhões, 30% a morar em cidades; em meados da década

de 40, a população chega a 45 milhões de habitantes, sendo 1/3 dos habitantes a morar nas cidades

(FINEP, 1985).

A crise dos anos 30 (Populismo/ Estado Novo) que provocou a migração da população, afetou

diretamente a empregabilidade nas zonas rurais e proporcionou o aumento do comércio e dos

serviços na cidade do Rio de Janeiro, sendo esta situação a principal responsável pelo vertiginoso

crescimento populacional na cidade. Sem muita alternativa para a aquisição de moradia, a

população pobre acaba por intensificar a ocupação em encostas e área ilegais, terrenos públicos ou

sem muito valor comercial. Em contrapartida, a questão da concentração da população urbana nas

cidades desperta interesse por parte dos políticos. O Estado Novo, que tinha como uma das mais

marcantes características o populismo, atua junto à população operária através da introdução das

Leis Trabalhistas, e, por consequência na criação de fundos de previdências e pensões que mais

tarde teriam como finalidade o financiamento da moradia.

Recuando ainda um pouco no tempo, podemos constatar que no final do século XIX até à década de

1930 surgiram problemas habitacionais que provocaram o aparecimento de várias modalidades de

moradia para os setores sociais mais baixos, todas construídas pela iniciativa privada (BONDUKI

1998). De entre as várias modalidades de moradia as mais difundidas foram o cortiço1-corredor, o

cortiço- casa de cômodos, os vários tipos de vilas, e também as casas geminadas2. É importante

realçar o que essas habitações possuíam em comum: quase todas eram moradias de aluguer,

situação normal pois não existiam sistemas de financiamento da casa própria.

O aparecimento dos problemas do ramo habitacional no final do século XIX está relacionado com as

soluções habitacionais produzidas pelo mercado de aluguer, caracterizado pelas questões

Higienistas. As soluções habitacionais destinavam-se à população operária instalada em condições

que favoreciam a insalubridade que constituía uma grave ameaça à saúde pública. No entanto, “Se

as habitações populares não representassem perigo para as condições sanitárias da cidade, nada

se saberia sobre elas, pois as únicas informações sobre as mesmas chegaram através dos técnicos

preocupados com a saúde pública.” (BONDUKI, 1998).

1 Cortiço- Conjunto Habitacional

formado por vários cômodos

servindo cada um deles de habitação

para uma família.

2 Geminadas- Casa geminada é a

construção de duas ou mais

casas ligadas umas as outras, que

dividem proporcionalmente o lote de

acordo com a quantidade de

unidades.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

7

No início das aulas da disciplina de Projeto de Habitação de Interesse Social frequentada no Rio de

janeiro no âmbito do programa “Brasil”, tive a oportunidade de realizar algumas visitas de estudo a

obras relativas ao tema. A primeira visita realizada foi a um Cortiço localizado no centro da cidade do

Rio de Janeiro, na Rua Senador Pompeu nº34.

Este é um exemplo claro da habitação operária que se praticava no Brasil no final do século XIX até

à década de 1920. O cortiço geralmente ocupa uma área do interior de um edifício (exemplo da visita

de estudo). A entrada é feita por um portão localizado na frente de rua que dá acesso ao pátio

central para onde se abrem todas as portas e janelas de cada habitação. Estas estão dispostas em

fileira, todas com o mesmo aspeto, a mesma organização interior, capacidade e áreas. No geral, os

cortiços são associados a habitações insalubres e com muito poucas condições de higiene, portanto,

caracterizam-se pela má qualidade das construções, pela incapacidade espacial e má distribuição

dos espaços, com muito pouca iluminação natural e sem a necessária ventilação e também pela

carência de saneamento básico do terreno onde estão construídos.

Muitas vezes os cortiços são gerados pela subdivisão de grandes habitações de classes sociais

superiores em compartimentos de pequenas dimensões com o fim de aluguer, podendo haver

processos de modificação e adaptação dos espaços. “Esses processos chegam a recorrer, inclusive,

a reformas decorrentes de desvirtuamentos de funções, de troca de atividades dentro das

acomodações: salas se fragmentam em alcovas, vestiários e salas de banho transformam-se em

cozinhas, os corredores em verdadeiras vias públicas, os jardins em coradouros de roupa lavada, as

garagens em oficinas etc.” (LEMOS, 1978).

Neste seguimento, devido aos constantes problemas habitacionais realiza-se na década de 40 uma

análise pondo em questão se a iniciativa privada tem condições de equacionar o problema da

moradia dos trabalhadores, requerendo-se a intervenção do Estado e admitindo-se que o acesso à

casa própria deve ser estimulado de todas as formas possíveis.

No período entre 1933 e 1938, são criados os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), que

tinham como principal objetivo administrar os benefícios de diferentes categorias profissionais. A

partir de 1937 os IAPs passam a atuar de forma mais intensa no campo habitacional, sendo a

primeira intervenção do Estado na produção de moradia em grande escala. A partir de então, o

Fonte: Autor

Fig. 1

Cortiço na Rua Senador Pompeu

Fig. 2

Interior do pátio do cortiço na Rua

Senador Pompeu

HABITAÇÃO SOCIAL

8

Estado passa a ser visto, pela população trabalhadora como o fornecedor de moradia (FARAH,

1983).

É de salientar a importância que os conjuntos habitacionais dos Institutos de Aposentadorias tiveram

na solução dos problemas habitacionais que existiram.

Uma obra de grande importância dos IAPI (Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários)

foi o Conjunto Habitacional Realengo, projetado pela arquiteto Carlos Frederico Ferreira (1906-1996)

em 1938. O conjunto integra habitação com comércio, equipamentos escolares, de saúde e de

desporto. É baseada na construção em série em que o bloco principal é constituído por 60 células

habitacionais mínimas- quarto, sala, cozinha e instalação sanitária. A fachada principal é

caracterizada pelo jogo de volumes das varandas e a posterior pelas longas galerias de acesso a

cada habitação e ao núcleo de escadas.

É de salientar que, o estudo relativo às tipologias habitacionais utilizadas neste conjunto foi premiado

com Medalha de Ouro no V Congresso Pan-Americano de Arquitetos em Montevideu em 1940.

(RAMOS, 2006)

Tive a oportunidade de visitar esta obra no período em que estive no Rio de Janeiro e nas mesmas

condições em que referi a visita ao Cortiço. Outra obra que visitei foi o Conjunto Residencial Prefeito

Mendes de Moraes, mais conhecido como Pedregulho ou também Minhocão. Esta obra de Affonso

Eduardo Reidy para o Departamento de Habitação Popular DHP, do Distrito Federal, é das mais

importantes da arquitetura moderna brasileira. Mesmo não sendo uma obra dos IAPs, a sua

Fig. 3

IAPI Realengo- Fachada Posterior

Fig. 4

IAPI Realengo- Fachada Principal

Fig. 5

Conjunto Residencial Prefeito Mendes

de Moraes

Fig. 6

Conjunto Residencial Prefeito Mendes

de Moraes

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

9

conceção habitacional foi desenvolvida a partir dos mesmos princípios do que vinha a ser feito desde

do projeto de Realengo em 1938: “implantação urbanística moderna, associação de moradia com

equipamentos comunitários, renovação de relação entre espaço público e espaço privado etc.”

(BONDUKI, 1998)

Apesar destas iniciativas, o problema da habitação social na altura não foi, de todo, resolvido mas a

produção de habitação durante este período do governo de Getúlio Vargas (1883-1954) procurou “

seguir uma tendência internacional, que considerava a produção da habitação ou financiamento de

moradias pelo Estado e a protecção dos inquilinos, aspectos importantes do welfare state”

(BONDUKI, 1998).

De entre as várias iniciativas tomadas durante o governo de Vargas no Estado Novo, merece

destaque a Lei do Inquilinato, congelamento das rendas, e a avaliação dos resultados na produção

habitacional de aluguer por parte do setor privado. Foi no ano de 1942 que as rendas foram

congeladas constituindo uma das principais razões na mudança da forma de habitar no Brasil,

desvalorizando o mercado de aluguer e transferindo para o Estado e para a população operária a

responsabilidade de possuírem as suas próprias casas.

A década de 40 é então uma altura crucial da ação do Estado no setor habitacional estabelecendo

as principais intervenções- Lei do Inquilinato e produção em série da habitação por parte dos IAPs.

Para além disso é nesta altura que aparece a abertura a novas formas de habitações precárias,

ilegais como a favela e a casa própria em áreas clandestinas sem infraestrutura. Esta solução por

parte da população deveu-se principalmente pela má gestão de outra iniciativa empresarial do

Estado que nasceu em 1964 e que marcou um novo período na história da habitação no Brasil: o

BNH, Banco Nacional de Habitação. O BNH, tal como os IAPs, foi uma iniciativa do Estado de

promoção de moradia mas, no entanto, não teve o mesmo sucesso como os Institutos de

Aposentadorias e Pensões. Com o objetivo de reduzir o custo da habitação para atender à

população com menos possibilidades, alterando a gestão e a produção que encarecia o produto

final, optou por perder qualidade na construção e tamanho das habitações, criando assim moradias

mais precárias que estavam muito aquém dos conjuntos residenciais dos IAPs. Estas soluções

continuavam inacessíveis à população mais desfavorecida, incentivando alternativas de auto

empreendimento da própria casa, dando início a um dos grandes problemas habitacionais do Brasil:

as favelas.

Em resumo, consegue-se constatar que a produção de habitação no Brasil passou por diversas

especificidades de acordo com a época que estava a ser produzida e, consequentemente, por quem

era produzida, passando pelo setor privado ao público, até que por último passou a ser produzida

pelo próprio morador.

HABITAÇÃO SOCIAL

10

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

11

03. CASOS DE ESTUDO

HABITAÇÃO SOCIAL

12

Foram selecionados três casos de estudo localizados no Rio de Janeiro, que ilustram diferentes

soluções de projeto, dentro do mesmo tema, com o mesmo objetivo do projeto apresentado neste

trabalho. Estas obras foram analisadas através de visitas de estudo que decorreram no início das

aulas da disciplina de projeto que decorreu no Brasil.

Tanto o Pedregulho como o Núcleo Habitacional do Cafundá, são exemplos de conjuntos

habitacionais que apresentam, para além da habitação, outras funcionalidades. São conjuntos que

alojam muita população (edifícios com mais de quatro pisos) e com uma especial atenção à maneira

como estão inseridos no terreno, tirando o maior partido desse aspeto.

A escolha dos dois primeiros casos de estudo foi motivada, principalmente, por serem dois exemplos

de conjuntos habitacionais da cidade do Rio de Janeiro identificados como bons exemplos de

arquitetura voltada para questão da habitação com interesse social. Tanto o primeiro como o

segundo caso, reúnem soluções tipológicas que se adequam da melhor forma às especificidades

que este tema requer, logo, soluções que também foram tomadas como base e exemplo no projeto

que aqui é apresentado.

O outro caso de estudo escolhido aborda outras questões igualmente interessantes relativamente a

este tema, tendo em conta que está inserido num contexto de ocupação ilegal num terreno situado

em plena cidade do Rio de Janeiro. A opção deste caso recaiu precisamente por ser um edifício de

habitação social inserido na Favela da Babilônia, reunindo assim diversos aspetos interessantes na

perspetiva da análise de projetos de habitação social.

Núcleo Habitacional do Cafundá

Conjunto Residencial Prefeito

Mendes de Moraes

Morro da Babilônia

Fig. 7

Localização dos casos de

estudo na cidade do Rio de

Janeiro

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

13

03.1 CONJUNTO HABITACIONAL PREFEITO MENDES MORAES- PEDREGULHO

Este conjunto habitacional foi realizado no âmbito do DHP- Departamento de Habitação Popular-

fundado pela engenheira Carmen Portinho. Esta ação proporcionou a oportunidade ao arquiteto

Affonso Eduardo Reidy projetar esta obra.

Departamento de Habitação Popular

Este Departamento, foi instituído em Abril de 1946 e extinto em 1962, visava atender às

necessidades de habitação da população com salários mais baixos, incluindo também trabalhadores

do município que viviam em condições precárias. O DHP acompanhou e protagonizou a arquitetura

brasileira a nível internacional (principalmente através do Pedregulho), o processo evolutivo da

cidade do Rio de Janeiro e também o aumento da ocupação ilegal de terrenos: as favelas. A

arquitetura que projetou deu resposta a essas questões, criando um equilíbrio entre arquitetura e

urbanismo, face a problemas sociais e urbanos em crescimento.

“Imbuída de grande entusiasmo, propus ao secretário de Obras e Viação da Prefeitura do Distrito

Federal a criação do Departamento de Habitação Popular, uma vez que aqui, como na Inglaterra

naqueles anos terríveis, a moradia popular continuava sendo problema de difícil solução. (..) Logo

que assumi, o primeiro projeto seria a construção de conjuntos habitacionais, sob novo conceito de

moradia, destinados à população de baixa renda e, principalmente, localizados próximos aos seus

locais de trabalho. (..) Enfim, seriam moradias dignas, respeitando o trabalhador, pondo-lhe ao

alcance todas as comodidas da vida moderna, integrando-as também às artes.” (PORTINHO,

Carmen in Affonso E. R.-arquitetos brasileiros, 2000)

Este conjunto habitacional localiza-se no bairro de São Cristóvão, um dos bairros mais antigos do

Rio de Janeiro, e situa-se muito próximo à Avenida Brasil, que é um dos principais eixos viários da

cidade. A obra da autoria de Reidy ganhou um prémio na Bienal Internacional de São Paulo em 1953

Fig. 8

Identificação do Conjunto Residencial

Prefeito Mendes Moraes, bairro S.

Cistóvão, Rio de Janeiro

HABITAÇÃO SOCIAL

14

devido às suas qualidades estéticas e funcionais, sendo um grande ícone da Arquitetura Moderna

Brasileira.

De acordo com os objetivos do Departamento de Habitação Popular, o conjunto residencial foi

projetado para a população e trabalhadores do município do Rio de Janeiro com salários baixos. Foi,

também, através do deste Departamento que se conseguiu avaliar as condições do local e da

população a alojar, que serviu para determinar o programa total do conjunto.

O projeto envolve quatro blocos de habitação tais como instalações sociais como escola, parque

infantil, centro de saúde, centro comercial e lavandaria, envolvidos num desenho paisagístico

projetado por Burle Marx. Insere-se numa encosta com uma topografia bastante irregular,

apresentando um desnível de cerca de 50 metros. Consegue-se avaliar que houve um cuidado

especial na organização da circulação de todo o conjunto residencial, marcado por uma separação

clara entre a circulação dos pedestres e dos veículos. Conseguiu-se, desta maneira, uma circulação

livre por todo o conjunto.

Este projeto, tal como muitos projetos de origem brasileira, tem uma preocupação com a ventilação e

iluminação, que se torna evidente através da sua expressão formal e estética. A orientação do bloco

A e B é desfavorável, prejudicando claramente a sua iluminação. Em contrapartida, o excesso de

insolação, no caso do bloco A, é compensado pela vista panorâmica sobre a Baía de Guanabara.

É relevante referir a importância da análise deste caso de estudo, relativamente aos aspetos da

tipologia das unidades habitacionais e da circulação dos edifícios do conjunto. Apesar do conjunto

habitacional apresentar outros edifícios com funcionalidades diferentes, realizou-se uma abordagem

mais detalhada apenas sobre os blocos habitacionais A e B, no sentido, em que seria mais

proveitoso para a realização do projeto apresentado neste relatório.

Bloco A

Elemento com uma expressão formal marcante e identificadora da obra. Está situado na parte mais

elevada do terreno e segue uma forma sinuosa que o acompanha apresentando uma extensão de

260 metros. Este edifício tem no total 7 pavimentos, quatro superiores que são dois níveis de

apartamentos duplex, um piso intermédio amplo e vazio por onde se dá o acesso aos outros pisos e

dois inferiores com apartamentos de um só quarto. Não existe elevadores neste edifício sendo o

acesso feito somente pelos núcleos de escadas localizados de cinquenta em cinquenta metros no

piso intermédio. Este é caracterizado por uma área plana livre, bem ventilada que conecta com o

terreno através de duas pontes de acesso ao edifício.

A solução duplex nos pisos superiores deveu-se à intenção de ganhar maior rendimento no sentido

de possibilitar o acesso a quatro pisos sem elevador e também ter a capacidade de reduzir a frente

das unidades permitindo assim aumentar o número de unidades habitacionais.

A opção pelas características formais da circulação comum do edifício é referida por Nabil Bonduki e

Carmen Portinho no livro Affonso Eduardo Reidy: Arquitetos Brasileiros: “Em face das condições de

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

15

clima do local e dadas as modestas condições sociais dos futuros moradores e, ainda, com o

objetivo de facilitar a manutenção da higiene e a conservação dos edifícios, foi evitada a solução dos

banheiros e corredores internos, que exigiriam o uso de ventilação mecânica e iluminação elétrica

permanente.”.

Desta maneira, optou-se por espaços de circulação exteriores, proporcionando uma ventilação

cruzada em todas as unidades habitacionais, e também um sistema de iluminação natural

proporcionado tanto fachada principal como pela posterior. Outra opção de projeto, que foi ao

encontro de estabelecer uma ventilação cruzada em todo o edifício, foi a elevação sobre pilotis.

Bloco B

O bloco B apresenta dois edifícios com cerca de 80 metros de extensão. Cada um com dois níveis

de apartamentos duplex, ou seja, com um total de oito pavimentos, contendo apartamentos de dois,

três e quatro quartos.

Estes edifícios apresentam a mesma solução de galeria exterior que dá acesso a cada habitação e

que proporciona ventilação e iluminação em todo o edifício. Tal como acontece no bloco principal, a

questão da insolação também se verifica neste dois blocos, tendo que se optar por soluções que

melhorassem este aspeto desfavorável do projeto.

Com o objetivo de melhorar o problema de insolação dos blocos A e B, foram adotados diversos

sistemas de correção, como por exemplo, venezianas de madeira.

Escola

O volume do Conjunto reservado á escola primária apresenta uma forma trapezoidal elevada sobre

pilotis, e é um dos mais importantes elementos desta obra. As condições do terreno e a intenção de

orientar as salas de aula a Sul- lado com mais sombra- levou a adotar a forma quadrada como

modela das mesmas.

A preocupação sobre a questão da ventilação e da insolação, também está presente neste edifício.

O corredor de circulação foi posicionado no lado norte e é composto por peças de terracota que

protegem da insolação, permitindo a ventilação cruzada através de aberturas na parte superior das

paredes das salas de aula.

Em suma, esta obra foi um exemplo inovador, da época em que foi construída por apresentar um

conjunto diversificado de edifícios com funcionalidades diferentes, mas que juntos formam um

Conjunto Habitacional de qualidade, voltado para a população com poucas possibilidades

económicas.

A associação da habitação com diversos equipamentos direcionados para atividades do quotidiano,

torna a obra completa, satisfazendo as necessidades da população que nela habita.

HABITAÇÃO SOCIAL

16

Fig. 9

Bloco A e Ginásio

Fig. 10

Escola primária

Fig. 11

Galeria de circulação

Fig. 12

Galeria de circulação

Fig. 13

“Cóbógó”- Resolução do proplema de

insolação

Fig. 14

Perspetiva do Bloco A e da Escola

primária

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

17

03.2 CONJUNTO HABITACIONAL DO CAFUNDÁ

O Conjunto Habitacional do Cafundá, também conhecido por Conjunto Residencial Mirante da

Taquara é um complexo de habitação de interesse social e localiza-se na estrada do Cafundá, no

bairro taquara em Jacarepaguá, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro.

Este projeto, realizado em 1978, foi selecionado num concurso promovido pelo Instituto de

Arquitetos do Brasil no Rio de Janeiro, IAB-RJ, e pelo Instituto de Orientação às Cooperativas

Habitacionais. Os titulares do projeto foram Sérgio Magalhães e Ana Luiza Petrik, do escritório

MBPP Arquitetos Associados.

É importante salientar a importância e influência de Sérgio Ferraz Magalhães como arquiteto e

urbanista na cidade do Rio de Janeiro. Graduado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutorado em Urbanismo pelo PROUR-URFJ (Pós-

graduação em Urbanismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro). Entre 1993 e 2000, foi

secretário Municipal de Habitação do Rio de Janeiro sendo responsável pela Política Habitacional da

cidade. Foi através desse cargo que criou e coordenou programas direcionados para a resolução

dos problemas das favelas. Os programas Favela-Bairro, Morar Legal, Morar Sem Risco e Morar

Carioca são alguns de entre outros que participou.

Fig. 15

Identificação do Conjunto Habitacional

do Cafundá. Bairro Taquara,

Jacarepaguá

HABITAÇÃO SOCIAL

18

Construído no final da década de 70 pelo BNH, é um exemplo de uma construção com princípios

arquitetónicos modernos em grande escala. O conjunto possui diversos edifícios habitacionais

implantados de uma forma, aparentemente aleatória, no terreno apresentando também espaços

exteriores semipúblicos de estada e de ligação entre os vários blocos.

O conjunto conta com onze blocos habitacionais que estão implantados no terreno adaptando-se a

este, ou seja, acompanham o declive variando, apenas, o seu número de pisos (menor número de

pisos na zona de maior cota). O Núcleo Habitacional, é assim, constituído por 1.446 unidades

habitacionais, escolas, centro desportivo e comércio no piso térreo de cada bloco, albergando

aproximadamente oito mil habitantes. O conjunto articula-se pouco com o tecido urbano envolvente,

embora se perceba que exista a intenção de uma ligação através do posicionamento dos próprios

blocos e também pelos serviços estarem localizados nas extremidades dos mesmos.

Cada bloco apresenta volumes adjacentes de acesso vertical reservados a elevadores. Atualmente,

estes volumes estão desativados por questões de segurança, mas possuem a intenção de garantir o

acesso às unidades habitacionais. Tal como o caso de estudo anterior, optou-se pelo mesmo

sistema de circulação, através de galerias exteriores. Existem apartamentos duplex como também

unidades habitacionais de só um pavimento.

Nas unidades habitacionais duplex existem duas modalidades de entrada, pelo nível superior ou pelo

nível inferior, com a intenção de reduzir o número paragens dos elevadores de modo a viabilizar

economicamente a utilização do edifício. Existe também apartamentos no segundo piso que têm

acesso diretamente pelo piso térreo através de escadas individuais.

O espaço exterior tem um papel importante na integração e leitura do todo o Conjunto, adquirindo,

desta forma, o lugar de convívio, permanência e de ligação/acesso a todos os blocos do conjunto

habitacional.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

19

Fig. 16

Fachada de um edifício do conjunto

Fig. 17

Núcleo de acesso vertical

Fig. 18

Pormenor de uma escada

Fig. 19

Galeria de circulação

Fig. 20

Área exterior

Fig. 21

Perspetiva tirada de uma galeria

Fig. 22

Vista aérea do Conjunto

HABITAÇÃO SOCIAL

20

03.3 MORRO DA BABILÔNIA

O Morro da Babilônia é uma comunidade (favela) inserida no bairro do Leme, na zona sul da cidade

do Rio de Janeiro. Muito próxima do Morro Pão de Açúcar, esta favela tem o privilégio de beneficiar

de uma vista panorâmica sobre este mas também sobre a enseada de Copacabana e da Baía de

Guanabara.

Este caso de estudo refere-se, principalmente, a um edifício de especial interesse social, mas

também ao plano de urbanização desta favela. Plano este, que foi escolhido como projeto piloto do

programa Morar Carioca, estabelecendo novas soluções e propostas de estruturação com inovações

tecnológicas sustentáveis, melhorando as condições das habitações das comunidades. Neste

sentido, é de salientar que este edifício foi considerado o primeiro prédio público do Brasil a ganhar o

certificado de sustentabilidade, o Ouro do Selo Azul da Caixa.

A autoria deste projeto é das arquitetas Solange Araújo de Carvalho, Daniela Engel Javoski e

Tatiana Terry, do escritório de arquitetura instalado na cidade do Rio de Janeiro, chamado

ArquiTraço.

Fig. 23

Identificação da Favela Babilônia e

Chapéu Mangueira, bairro Leme,

zona sul do Rio de Janeiro.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

21

Contexto Histórico

A origem desta favela, situada na zona sul do Rio de Janeiro, remonta ao final do século XIX,

quando o Exército Brasileiro instalou um posto de observação no cimo do morro para proteger a

cidade de possíveis ataques.

A partir de 1930, a favela da Babilônia ocupou a zona intermédia do morro, entre uma área de

proteção ambiental e a própria cidade. Essa ocupação iniciou-se com a instalação por parte dos

trabalhadores da construção civil, que trabalhavam nos túneis entre o antigo centro da cidade e

Copacabana e Leme, na vizinhança da região.

Em 2009, com a instalação da UPP- Unidade de Polícia Pacificadora - observou-se diversas

transformações e ações sociais para melhorar as condições de vida nestas favelas.

Proposta

Foram realizadas diversas obras de estruturação de algumas ruas da favela, tais como, a rua Ary

Barroso e a rua Gal Ribeiro da Costa e também uma ligação com a avenida Atlântica, pelo bairro do

Leme. A urbanização dos acessos e áreas de lazer, assim como, a estruturação de redes de

esgotos, água e drenagem foram outros aspetos executados neste projeto.

O tema de acessibilidades, tem bastante importância em projetos direcionados para as favelas,

portanto é de notar que houve uma preocupação nesse sentido. De entre diversas intervenções, foi

projetado: o acesso à UPP instalada no cimo da Babilônia (por meio de uma via de serviço); os

limites da favela com a área ambiental protegida; reestruturação de escadarias e patamares.

O edifício de interesse social é inserido numa das principais ruas da favela, e apresenta dois bolcos

de apartamentos. Estes dois blocos são ligados, entre si, por um núcleo vertical de escadas de

acesso aos vários pisos, estabelecendo a entrada às várias unidades habitacionais.

Devido ao fato de o terreno apresentar um declive acentuado, optou-se por uma implantação sobre

pilotis, tal como vimos no primeiro caso de estudo (Pedregulho, Reidy). Esta opção é, claramente,

uma solução favorável para a implantação de edifícios em terrenos inclinados, possibilitando, desta

maneira, uma ventilação cruzada em todo o edifício.

HABITAÇÃO SOCIAL

22

Fig. 24

Antes e depois do local da

implantação do edifício de habitação

social.

Fig. 25

Novo edifício de Habitação social na

Babilônia

Fig. 26

Edifício de Habitação social

Fig. 27

Largo do Campinho antes e depois

Fig. 28

Urbanização antes e depois

23

03.4 RELAÇÃO COMPARATIVA DOS CASOS DE ESTUDO

Localização

Área urbana consolidada

Tipo

Conjunto Habitacional

População a que se destina

Funcionários da Prefeitura

Integração com envolvente

Dificultada pela topografia

Localização

Área urbana consolidada

Tipo

Conjunto Habitacional

População a que se destina

Cidadão comum

Integração com envolvente

Dificultada pela topografia

Localização

Favela/Comunidade

Tipo

Edifício Isolado

População a que se destina

Membros da comunidade

Integração com envolvente

Dificultada pela topografia

1 PEDREGULHO 2 CAFUNDÁ 3 BABILÔNIA

HABITAÇÃO SOCIAL

24

Topografia

Declive acentuado

Orientação Solar

Nascente-Poente

Circulação Comum

Galeria

Tipologia

Duplex / 1 Quarto

Ventilação

2 Formas- Pilotis e cruzada

Sistema de Ensombramento

Brises e Cóbógós

Espaço Público

Amplo

Áreas verdes

Preferencialmente pedonal

Topografia

Declive acentuado

Orientação Solar

Variável

Circulação Comum

Galeria / Núcleos verticais

Tipologia

Duplex / 1 Quarto

Ventilação

Cruzada

Sistema de Ensombramento

Estore

Espaço Público

Amplo

Áreas verdes

Preferencialmente pedonal

Topografia

Declive acentuado

Orientação Solar

Variável

Circulação Comum

Núcleo vertical / Galeria (menor dimensão)

Tipologia

2 Quartos

Ventilação

Cruzada / Pilotis

Sistema de Ensombramento

Estore

Espaço Público

Preferencialmente pedonal

1 PEDREGULHO

2 CAFUNDÁ

3 BABILÔNIA

25

04. ANÁLISE DO TERRITÓRIO

HABITAÇÃO SOCIAL

26

04.1 ESCALAS DE TRABALHO

De acordo com os vários parâmetros escolhidos para a análise, o território estudado será abordado

perante limites e aproximações diferentes. Desta forma, serão definidas duas áreas- Área de

Estudo e Área de Projeto – que abordam diferentes escalas de trabalho.

A área de estudo corresponde a um território mais alargado, identificado como bairro de Santo

Cristo, inserido no centro urbano da cidade, abrangendo também uma parte da zona portuária. A

análise desta área é capaz de identificar os principais problemas existentes, pontos de interesse, as

ligações dentro do bairro e também com o centro da cidade.

A área de projeto é reservada apenas ao lote destinado ao exercício de projeto. É uma área com,

aproximadamente, 17.200m2, muito próxima à frente portuária, onde estão localizados diversos

armazéns industriais.

Fig. 29

Identificação do bairro Santo Cristo e

lote de Projeto

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

27

04.2 LOCALIZAÇÃO

A área de estudo localiza-se no centro da cidade do Rio de Janeiro, como já foi referido

anteriormente. Este bairro da cidade ocupa uma área de 168,47ha e possui, aproximadamente, doze

mil habitantes. Esta área faz fronteira com outros bairros da cidade como por exemplo, São

Cristóvão, Caju, Praça da Bandeira, Cidade Nova e Centro.

A sua identificação como “bairro portuário” está inteiramente ligada à sua localização, visto estar

inserido na zona portuária da cidade. Esta localização específica da área de estudo implicou um

estudo teórico sobre a evolução do local, a sua caracterização e influência na malha de cidade.

O lote de projeto está inserido numa zona de malha regular do bairro, muito próximo da baía de

Guanabara e é limitado pelas seguintes vias: a Sudeste pela avenida Professor Pereira Reis; a

Sudeste pela avenida Cidade de Lima; a Nordeste pela rua santo cristo e, a Noroeste, pela rua do

Equador.

Fig. 30

Identificação do bairro Santo Cristo na

Região metropolitana do Rio de Janeiro

Fig. 31

Identificação do lote de projeto

HABITAÇÃO SOCIAL

28

04.3 CONTEXTO E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Tendo em conta que a área onde se insere o projeto, desenvolve-se num contexto de avanço

territorial alcançado ao mar, ou seja, áreas aterradas ao mar, é importante compreender a sua a

evolução história e urbanística, que se relaciona com as modificações do litoral da cidade do Rio de

Janeiro.

A paisagem da cidade do Rio de janeiro é caracterizada por um conjunto de elementos naturais que

englobam: grandes rochedos e montes, lagoas, enseadas e florestas tropicais. O recorte sinuoso do

litoral desta cidade ajudou bastante na proteção da sua costa e na defesa da população indígena na

época da colonização.

A morfologia da costa do Rio de Janeiro sofreu grandes alterações durante quase quatro séculos. O

crescimento urbano da cidade registou diversos avanços sobre o mar e lagoas, mas também sobre

pântanos e mangues, sendo estes últimos elementos naturais característicos de zonas tropicais e

subtropicais. É de salientar que a imagem do litoral da cidade do Rio de Janeiro, hoje em dia, é

totalmente diferente em relação ao recorte original, devido aos sucessivos aterros que aconteceram.

A malha regular do centro histórico da cidade, caracterizada pelo traçado em reticula, nasceu da

necessidade de ligar este lugar às regiões do interior, com o objetivo de facilitar esse percurso. A

praça XV, chamada antigamente de Terreiro do Paço, com influências portuguesas, foi e continua a

ser atualmente, um elemento muito importante no desenho da cidade. O local, constituído pela Praça

e pelo Palácio Real, servia de porto desde o século XVI. No século XVIII foi construído outro porto

próximo á praça, tendo sido necessário conquistar, novamente, terreno ao mar para a sua

construção.

Fig. 32

Áreas aterradas na cidade do Rio de

Janeiro.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

29

Esta época adquire alguma importância no sentido em que marcou o início de sucessivos aterros na

cidade. Ao longo de várias épocas, a Praça foi sofrendo alterações, sendo a com maior impacto

registada na década de 1960, altura em que se iniciou a construção do viaduto que liga o centro à

zona norte da cidade. Este projeto, chamado de Perimetral ou Viaduto Juscelino Kubitschek,

localiza-se na frente marítima e é alvo de constantes polémicas por parte da população, pois

desvalorizou toda esta zona, criando também uma grande barreira física entre a cidade e a baía.

O início das alterações da morfologia do litoral da cidade verificou-se próximo ao centro da cidade e

estendeu-se pelo litoral norte. O percurso destas alterações foi impulsionado, principalmente, pelo

crescimento da cidade e também, devido à expansão das atividades portuárias.

Ainda durante o século XX, foi construído o novo porto da cidade. Esta operação urbanística marcou

a história da zona portuária da cidade. A sua criação implicou um novo aterro de uma área de 175

Fig. 33

Evolução histórica da Praça XV entre

1580 e 2002

HABITAÇÃO SOCIAL

30

mil m2 sobre a Baía de Guanabara. Esta obra marcou a imagem do bairro de Santo Cristo e também

dos seus bairros vizinhos. A área aterrada deu origem a algumas vias importantes, tanto no bairro

como em toda a cidade. São exemplo as vias: Avenida Rodrigues Alves ao longo do porto (situada

debaixo da Perimetral); Avenida Francisco Bicalho; e a Avenida Rio Branco, que liga a zona

portuária ao centro da cidade. Esta última foi projetada ao estilo dos “boulevards” de Haussmann

(responsável pela estrutura urbana de Paris no século XIX).

Bairro Santo Cristo

Caracterizado como bairro portuário, pelas razões já descritas, e denominado de Santo Cristo devido

à Igreja com o mesmo nome, situada no próprio bairro. A influência portuguesa é evidente nesta

zona da cidade, quer a nível comercial como residencial. São originais desta época os edifícios de

dois pisos, em que o primeiro destina-se, na maioria dos casos, ao comércio e o piso superior à

habitação.

Este bairro teve uma grande influência na estrutura urbana, identidade cultural e história da cidade

do Rio de Janeiro, visto ser, ainda hoje, um local onde se consegue observar o traçado urbano

original e também vestígios da vivência antiga do bairro.

Século XXI- Novas Propostas para o local

Grandes eventos desportivos como o Mundial de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016

terão lugar na cidade do Rio de Janeiro e em muitas outras cidades do Brasil nos próximos anos.

Estes acontecimentos vão provocar grandes impulsos na economia do País, tornando-o uma grande

potência mundial.

O Porto Maravilha é um, de muitos, exemplos de projetos de renovação urbana programados para

a cidade do Rio de Janeiro. O seu objetivo é focado na transformação e revitalização de toda a Zona

Fig. 34

Evolução urbana do centro do Rio de

Janeiro

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

31

Portuária da cidade, local onde se insere a área de projeto, logo é interessante mencionar neste

trabalho.

Este projeto pretende estabelecer uma nova centralidade, ativando o uso residencial, requalificação

dos espaços públicos e criando também novas propostas para o local. A demolição parcial do

viaduto da Perimetral, que é uma barreira na ligação da cidade com a Baía de Guanabara, é uma

das obras deste grande projeto. A construção de novos edifícios, como por exemplo, o novo Museu

de Arte do Rio (MAR), recentemente inaugurado, e o Museu do Amanhã do arquiteto espanhol

Santiago Calatrava situado na Praça Mauá, vão valorizar o património arquitetónico da cidade, assim

como, a promoção do desenvolvimento social e económico da cidade.

De entre as propostas já mencionadas, o projeto conta com uma diversidade de obras, sendo as

principais:

Construção de 4kms de túneis

Reconstrução de 70km de vias e 650.000m2 de calçadas

Reconstrução de 700km de redes de infraestrutura urbana (água, esgotos e drenagem)

Implantação de 17km de ciclovias

Plantação de 15.000 árvores

Demolição do Elevado da Perimetral (4km)

Construção de três novas estações de tratamento de esgoto

Este programa contempla toda a área do bairro da Gamboa, Santo Cristo, desde a praça Mauá até

ao Canal do Mangue (Avenida Francisco Bicalho).

Em relação á população residente na região portuária, este projeto urbano propõe que ela se

mantenha no próprio local. Para isso o projeto desenvolve programas de desenvolvimento social e

valorização do Património Edificado local.

Nesse sentido, são englobados no projeto várias pontos, tais como:

Fig. 35

Identificação da operação urbanísticas

Porto Maravilha. Bairro Santo Cristo e

Lote do projeto

HABITAÇÃO SOCIAL

32

Criação de Habitação de interesse social

Instalação de creches e escolas que atendam a densidade populacional prevista

Integração dos diversos transportes públicos, facilitando a acessibilidade e comunicação

com outras áreas

Geração de empregos diretos e permanentes na região

Outro projeto para a Zona Portuária é o concurso do Porto Olímpico, promovido pela Prefeitura do

Rio de Janeiro e pelo Instituto de Arquitetos do Brasil-IAB-RJ.

Este concurso tem como objetivo principal criar um elemento único para a evolução arquitetónica e

urbanística do Rio de Janeiro. Sendo o seu programa direcionado, principalmente, para os Jogos

Olímpicos de 2016 e o Mundial de 2014, também pretende ser um ícone importante do valor cultural

brasileiro.

Inserido na área urbana central da cidade, o concurso é entendido como uma oportunidade ímpar na

renovação e desenvolvimento urbano. O júri do concurso é composto por diversos arquitetos

brasileiros, focando os parâmetros de seleção da melhor proposta na busca pela qualidade espacial,

e a sua inserção no contexto urbano atual, e na capacidade de influenciar a criação de novos

projetos de ocupação urbana.

Fig. 36

Projeto premiado pelo Concurso Porto

Olímpico.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

33

04.4 CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS

É importante, para o presente relatório, conhecer as características sociodemográficas deste local,

pois é do maior interesse na perceção das necessidades da população, levando ao esclarecimento

de pressupostos para o projeto.

O bairro Santo Cristo, como se constatou anteriormente, apresenta características de ocupação que

permaneceram até hoje desde do início do século XX. Neste local onde habitava mão-de-obra

escrava e operária devido à presença do mercado de escravos e dos “trapiches” de sal mas foi-se

alterando com a chegada da corte portuguesa no século XIX ao Rio de Janeiro.

Hoje em dia, a faixa etária dos vinte e dos trinta e quatro anos é a mais elevada do bairro,

constatando-se uma população, maioritariamente, jovem. O bairro que recebe alguma população

não residente devido à localização de equipamentos que promovem a movimentação de pessoas,

como por exemplo, o terminal rodoviário.

04.5 MOBILIDADE

Em relação à acessibilidade, o bairro de Santo Cristo apresenta boas ligações com o centro da

cidade e com a restante cidade do Rio de Janeiro, principalmente ao nível do transporte individual,

sendo desprovido de boas ligações de transporte público.

Rede Viária

A área de estudo é limitada por vias importantes, na medida em que estabelecem a ligação ao

centro da cidade e também ao interior do bairro. Para uma melhor compreensão do sistema viário é

necessário uma classificação dos diferentes tipos de vias, designando-os pela função que

desempenham. A designação da hierarquia das vias no Brasil vai ao encontro do modo como se

designam em Portugal, por isso, opta-se por dar o nome que a legislação portuguesa nomeia, de

maneira a facilitar a compreensão.

A rede estruturante ou via expressa, como é chamada no Brasil, é responsável pela ligação

municipal e também por comunicações rápidas na cidade. Estas vias têm algum impacto ambiental e

urbano, visto que não permitem atravessamentos pedonais, sendo necessário modificar as

condições do terreno para a sua construção. A Linha Vermelha, deste nível viário, não intersecta

diretamente a área em estudo mas está muito próxima, causando impacto na circulação da região. É

uma via de elevada importância na cidade pois estabelece a ligação da zona sul e centro do Rio com

a Baixada Fluminense (região que engloba vários municípios no norte do estado do Rio de Janeiro).

HABITAÇÃO SOCIAL

34

Possivelmente, uma das vias que causa mais impacto na área de estudo, e assim adquire uma

importância relevante no estudo desta área, é o viaduto da Perimetral ou Elevado Juscelino

Kubischeck, designado, tal como a linha vermelha, de via expressa. Esta via localiza-se sobre a

Avenida Rodrigues Alves, no limite com a Baía de Guanabara, entre a Praça Mauá e o Canal do

Mangue, e estabelece uma alternativa ao trânsito do centro da cidade. É uma via elevada, com uma

barreira física a meio, que opera com duas faixas de trânsito em cada sentido. Como observado no

subcapítulo anterior, em relação aos projetos futuros esta Zona Portuária da cidade, constata-se a

intenção de demolir este viaduto elevado que prejudica a ligação, a visibilidade e o aproveitamento

de toda a frente marítima deste local.

Tal como estas últimas, a Avenida Brasil também é uma via expressa da cidade, localiza-se nas

proximidades da área de estudo e é outra via de grande importância na cidade do Rio de Janeiro. É

a maior avenida em extensão do Brasil, sendo portanto uma via estratégica no dinamismo e história

da cidade. A avenida começa nas proximidades da Zona Portuária, perto do Terminal Rodoviário

Novo Rio, situado na área de estudo, e prolonga-se pela zona Oeste da cidade até ao bairro de

Santa Cruz.

Numa escala de mais proximidade, encontram-se as Avenidas Rodrigues Alves, Francisco Bicalho e

Presidente Vargas, todas identificadas como vias de proximidade que estabelecem diferentes limites

do bairro Santo Cristo.

A Avenida 31 de Março ou viaduto São Pedro, também pertence a esta categoria viária e intersecta

a área de estudo até à Igreja de Santo Cristo seguindo pela Avenida Professor Pereira Reis

terminando na intersecção com a Rodrigues Alves.

A Avenida Rodrigues Alves situa-se debaixo da Perimetral, delimita a norte a área de estudo e é

caracterizada por três faixas de trânsito para cada sentido com um separador central. Devido à sua

elevada movimentação rodoviária, proporciona que haja muito poucos atravessamentos transversais

de peões, impossibilitando a ligação com a frente portuária marcada pelos vários armazéns

portuários típicos da época da sua construção.

Uma outra via de grande importância no trânsito da cidade é a Avenida Francisco Bicalho. Está

situada num local estratégico, servindo como meio de saída do Centro para várias vias expressas

como a linha vermelha, Avenida Brasil e Perimetral. É uma via muito movimentada, logo detém

muitos problemas de trânsito durante várias horas do dia. Nela encontra-se o Terminal Rodoviário

Novo Rio, o principal da cidade e uma referência importante na área de estudo.

Com o mesmo nível de importância, encontra-se a avenida Presidente Vargas, mandada construir

por Getúlio Vargas, Presidente do Brasil na época. É uma via com uma extensão de 3,5 Km e liga a

região da Candelária, centro da cidade, até à zona Norte. A via opera com quatro vias de trânsito,

duas em cada sentido e possui a meio um canal que termina na Baía de Guanabara. A sua

importância está relacionada com a capacidade de comunicar e dar acesso às principais ruas do

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

35

centro e também por cortar, perpendicularmente, a cidade cruzando com as vias expressas próximo

à área de estudo.

O encontro de algumas das vias mencionadas permite identificar alguns nós importantes localizados

nas proximidades da área de estudo. Dos quais se pode mencionar: o encontro e ligação da linha

vermelha e avenidas Presidente Vargas e Francisco Bicalho; outro nó será a intersecção das

avenidas Rodrigues Alves e Brasil, sendo que o viaduto da Perimetral passa a um nível superior

destas.

Com esta análise, concluiu-se que a área de estudo situa-se encaixada num conjunto de vias de

grande interesse a nível de circulação de entrada e saída da cidade do Rio de Janeiro. Numa escala

mais próxima, importa referir a Avenida Professor Pereira Reis, que estabelece um dos limites do

lote de projeto e a comunicação com a Avenida Rodrigues Alves e estende-se até ao largo da Igreja

de Santo Cristo.

Rede estruturante / Via Expressa

Rede de Distribuição

Rede de proximidade

Rede de acesso local

Fig. 37

Análise Viária na proximidade da

área de estudo

Fig. 38

Vias de acesso local na área de

estudo

Rede de acesso local

HABITAÇÃO SOCIAL

36

Rede de Transportes Públicos

O território da área de estudo, e sua envolvente, é servido pela rede de transporte público coletivo, e

também pela rede ferroviária e de metropolitano. Estas últimas redes de transporte público adquirem

um papel importante na caracterização desta zona, pois intersetam-se num ponto identificado como

Estação Central. O local envolvente da Estação é caracterizado por uma grande movimentação da

população e tráfego rodoviário, influenciando deste modo a vida urbana e social da área de estudo e

da própria cidade.

Rede de metropolitano

A linha de metropolitano, mais próxima da área de estudo que não passa pelo seu interior, é a linha

2, que liga Botafogo, na zona sul da cidade, até á Pavuna, na zona norte. A estação mais próxima é

a Cidade Nova, localizada na Avenida Presidente Vargas, sendo a estação Central também uma

alternativa para aceder ao bairro do Santo Cristo através deste meio de transporte público e

também.

Na estação Central também se encontra a linha 1 de metro que percorre a cidade desde Ipanema,

zona sul, até á estação Uruguai, na zona oeste da cidade. A rede de metropolitano da cidade do Rio

de Janeiro tem apenas as duas linhas referidas, foi inaugurada em 1979 e contava com 4,3

quilómetros de extensão, atualmente, a sua expansão é significativa contando também com linhas

de metro na superfície ligando outros pontos da cidade.

É interessante perceber a relação do traçado das linhas com a orientação das vias principais da

cidade, resultando em geral no mesmo traçado. É exemplo, do que acontece ao longo da avenida

Presidente Vargas, contando no total com quatro estações na extensão: Cidade Nova, Central,

Presidente Vargas e Uruguaiana.

Rede Ferroviária

A linha ferroviária é um elemento periférico à área de estudo, mas torna-se importante referi-lo pelo

fato de ter tanta influência na população do Rio de Janeiro. A estação Central é um dos pontos de

maior afluência, aglomerando circulações de comboios, metro, autocarros e táxis, proporcionando

assim uma grande movimentação de pessoas.

Esta rede de transporte público transporta mais de nove milhões de pessoas por mês, tem oito linhas

de comboios e cerca de cem estações ao longo de treze municípios da região metropolitana do Rio

de Janeiro.

37

Fig.39- Rede metropolitana de transporte público

38

Rede de transporte rodoviário coletivo

A rede de transporte rodoviário coletivo, ônibus- Brasil, está mal organizada nesta zona da cidade

havendo muito poucos pontos de paragem dentro do bairro Santo Cristo. O terminal Rodoviário Novo

Rio provoca uma grande movimentação de autocarros, mas não dentro da área de estudo, visto que

se localiza na avenida Francisco Bicalho, limite do bairro, e só opera viagens para fora do município

do Rio.

As estações dentro da área de estudo concentram-se maioritariamente sobre os principais eixos de

proximidade do bairro, que neste caso, é a via Professor Pereira Reis. Encontram-se também nas

vias de distribuição que limitam o bairro, avenidas Rodrigues Alves, Francisco Bicalho e Presidente

Vargas.

A nível do interior do bairro operam poucos percursos de autocarros que façam ligação com o centro

da cidade. O serviço BRS - Bus Rapid Service- não opera na região, logo dificulta a comunicação

deste bairro com a restante cidade tornando-o isolado. O sistema BRS foi um sistema aplicado na

cidade do Rio de Janeiro e tem como objetivo a organização do tráfego através de uma via exclusiva

para os autocarros, gerando mais fluidez do trânsito.

Rede pedonal e espaço público

Na análise da área, dentro da área de intervenção, destinada ao uso pedonal da população,

concluiu-se que os espaços públicos existentes são residuais, de pequena dimensão e em número

muito reduzido. Estão situados de modo disperso na área, não servindo, em caso nenhum, como

forma de continuidade urbana nem como estrutura de articulação do bairro.

Tendo em conta o que se entende por espaço público, como sendo o espaço “entre edifícios”, ou

seja, o espaço que pode ser só de passagem impulsionado por uma movimentação, um espaço de

permanência durante algum período de tempo ou também um espaço que possa resultar de

Fig. 40

Estações de Autocarros no bairro Santo

Cristo

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

39

atividades sociais como áreas de lazer. A partir disso, consegue-se perceber que o espaço público

da área de estudo é desarticulado, com falta de coesão espacial e funcional.

O fato desta zona ser marcada por diferentes estruturas urbanas com malhas distintas, pode explicar

a desarticulação do seu próprio espaço público. Posto isto, pode-se observar dois tipos de espaços

públicos: espaço público resultante da malha regular da zona industrial próxima à frente portuária;

espaço público resultante da malha irregular e orgânica da zona residencial. Resultado da malha

irregular da zona residencial da área de estudo surgem algumas praças que formam um conjunto

mínimo de espaços amplos e de permanência do local.

04.6 ESTRUTURA EDIFICADA

Ao nível da estrutura edificada é interessante fazer uma caracterização mais específica de acordo

com diferentes núcleos urbanos do próprio bairro Santo Cristo, uma vez que são áreas de

crescimentos distintos com estratégias de ocupação desiguais.

1

2

3

1- Praça/Igreja de Santo Cristo

2- Largo José Francisco Braga

3- Parque Machado de Assis

1- Limite Gamboa

2- Santo Cristo

3- Limite São Cristóvão

4- Limite Morro do Pinto

1

2

3

4

Fig. 41

Estrutura de espaços públicos

Fig. 42

Núcleos inseridos no bairro

Santo Cristo.

HABITAÇÃO SOCIAL

40

Núcleo 1

Nesta área da zona portuária predominam terrenos de grandes dimensões, destacando-se a Cidade

do Samba, que contém grandes armazéns, e é palco de eventos ligados às escolas de samba, e

também a Vila Olímpica da Gamboa.

Para além destes dois equipamentos com áreas significativas, este núcleo é marcado por uma zona

residencial caracterizada por uma malha irregular. Predominam as casas com número reduzido de

pisos, máximo três. Localizam-se nesta área outros equipamentos como o Hospital Nossa Senhora

da Saúde e a Capela Nossa Senhora das Graças.

Núcleo 2

Este núcleo do bairro é caracterizado maioritariamente por armazéns da indústria portuária. É o local

onde estão localizados o terminal Rodoviário Novo Rio e a Igreja de Santo Cristo. É característico

desta zona a malha regular, marcada pelos armazéns dispostos paralelamente à Baía.

1

2 3

4 5

1- Cidade do Samba

2- Armazéns Ferroviários

3- Vila Olímpica

4- Hospital N. Sra. da Saúde

5- Capela N. Sra. das Graças

1- Terminal Rodoviário Novo Rio

2- Praça /Igreja Santo Cristo

1 2

Fig. 43

Núcleo 1

Fig. 44

Núcleo 2

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

41

Núcleo 3

Esta área do bairro é caracterizada maioritariamente por terrenos vazios de propriedade pública e

por equipamentos comerciais.

A ausência de uma zona residencial, substituída principalmente pela implantação de grandes

armazéns acompanhados por grandes vias, provoca um problema grave de conexão com a cidade,

acentuando o isolamento desta área.

No entanto, a sua proximidade com o bairro de São Cristóvão, localizado à esquerda desta área, cria

uma possibilidade de integração visto estar a ser palco de grandes renovações e investimentos

residenciais.

Núcleo 4

Este núcleo integrante do bairro Santo Cristo é, principalmente, uma área habitacional. Predominam

as casas com número reduzido de pisos e as ruas são estreitas e com alguma inclinação, tendo em

conta que esta é a zona de maior cota de toda a área de estudo. A malha é irregular e orgânica

acompanhando a inclinação do terreno.

1- Armazém Aplauso

1

Fig. 45

Núcleo 3

HABITAÇÃO SOCIAL

42

Tal como acontece no núcleo 3, esta é uma área bastante isolada do resto da cidade devido à falta

de ligações com a envolvente, sendo a barreira principal a linha férrea que delimita toda a frente sul

deste núcleo, intensificando desta maneira maior isolamento deste pedaço de cidade.

1- Fábrica Bhering

2- Igreja N. Sra.

Montserrat

1

2

Institucional

Comercial

Industrial

Residencial

Cultural

Saúde

Religioso

Ensino

Fig. 46

Núcleo 4

Fig. 47

Distribuição Funcional

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

43

04.7 ESTRUTURA FÍSICA

No planeamento do território devem ser considerados todos os sistemas naturais e também fatores

culturais, de modo a criar bases sustentáveis para o desenho da ocupação e transformação do

território.

Relevo

O Rio de Janeiro apresenta um relevo muito diversificado, contendo desde montanhas até áreas

planas, destacando-se paisagens diferentes como: grandes escarpas na linha costeira, baías, lagoas

e florestas tropicais.

A nível global o estado do Rio de Janeiro apresenta três unidades de relevo identificadas como: a

Baixada Fluminense, onde se insere a área de estudo, o Planalto ou Serra Fluminense e os Maciços

Litorâneos, sendo exemplo o Corcovado onde está localizado o Cristo Redentor.

A unidade de relevo onde se insere a área de estudo prolonga-se ao longo de todo o litoral e ocupa

cerca de metade da superfície do estado.

A figura seguinte representa o relevo da cidade, apresentando tons que vão do vermelho ao amarelo

identificados como áreas da cidade com cotas até dez metros e tons de verde que representam as

maiores altitudes. A partir da imagem consegue-se observar que a área de estudo insere-se na

gama dos tons quentes sendo portanto uma zona de cotas baixas.

Fig. 48

Modelo digital do terreno- Relevo

HABITAÇÃO SOCIAL

44

Acompanhando esta análise, é interessante observar o mapa de declives gerado pelo relevo da

cidade.

A figura seguinte apresenta os declives até 100%, onde as partes mais claras representam áreas

mais planas da cidade, onde está inserida a área de estudo. No geral, a cidade apresenta grandes

áreas com declives acentuados, mas também é acompanhada por áreas planas, onde se

desenvolve a estrutura urbana da cidade, ou seja, é caracterizada como sendo uma paisagem mista.

Na Fig. 49, também se pode observar as linhas de águas referentes à Hidrologia da cidade do Rio

de Janeiro. Próximo à área de estudo, encontram-se dois canais identificados como linhas de

talvegue do território que se chamam: canal do Mangue e canal da Avenida Presidente Vargas.

Fig. 49

Modelo digital do terreno-Declives e

linhas de água

Fig. 50

Modelo digital do terreno-Áreas

inundáveis

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

45

Na Fig. 50, pode-se observar a distribuição de cotas médias, no intervalo entre 0,80 e 5metros, no

território da região metropolitana do Rio de Janeiro. Através da análise da imagem consegue-se

perceber que estes valores baixos de cota do terreno desenvolvem-se ao longo da linha costeira,

percorrendo desde a zona sul até à zona norte da cidade, sempre numa faixa que abrange

maioritariamente o litoral. A cota da área de estudo insere-se neste intervalo de valores

apresentados, apresentando-se como uma área plana e baixa, sendo necessário ter uma especial

atenção à possibilidade de alagamento por elevação do nível da água do mar.

Aterros

Para uma melhor compreensão da área de estudo é importante perceber a evolução urbana da

cidade do Rio de Janeiro ao longo de várias épocas. Esta evolução é, efetivamente, acompanhada

por sucessivos aterros na sua linha costeira incluindo a Zona Portuária, onde se insere a área em

estudo.

A ocupação da Zona Portuária no século XVII foi muito lenta, sendo a Praça Mauá e o Morro da

Conceição os únicos elementos que se integravam com a malha urbana existente. Já no século

XVIII, deu-se início à ocupação mais efetiva que acompanhava a linha costeira e também o interior

da cidade.

Com a chegada da Corte Portuguesa em 1808 as áreas portuárias foram privilegiadas com base no

comércio de importação e exportação. Toda a região que acompanhava a linha costeira desde a

Praça Mauá até ao canal do Mangue sofreu uma enorme expansão, delimitando o que seria hoje a

Zona Portuária do Rio de Janeiro. Nesta época, sucessivos aterros foram efetuados desde o mangal

de São Diogo até ao bairro de São Cristóvão nesta época (atual bairro do Santo Cristo).

É na primeira década do século XX que ocorre um novo aterro na Zona Portuária, para a construção

do novo porto, renovando e modernizando esta zona. A abertura das grandes vias de circulação

viária e ruas internas fizeram com que os bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo se afastassem

da Baía alterando-se assim as suas configurações inicias. É nesta época que o setor industrial passa

a assumir um papel preponderante na região, principalmente pela sua proximidade com o porto. Ao

mesmo tempo que a cidade crescia e se verticalizava, novos espaços tornaram-se privilegiados,

como o centro e a zona sul da cidade, ao contrário desta região que estava cada vez mais isolada.

HABITAÇÃO SOCIAL

46

Área de estudo

Fig. 51

Evolução da linha de costa entre os anos

1500 e 2000

47

04.8 SÍNTESE

Pode-se concluir, a partir de toda a análise referida anteriormente, que este território apresenta um

tecido urbano descontínuo e isolado em relação à restante cidade. Esta área Portuária da cidade

necessita de estratégias que incidam, a uma maior escala, ou seja, não só a do edifício mas sim ao

nível do tecido urbano. Para além de melhorar as condições urbanas desta zona, é necessário

intervir nas ligações desta com a cidade, de forma a articula-las, valorizando a continuidade do

espaço público e imagem cidade.

Os armazéns industriais, instalados na envolvente do lote de projeto, são elementos constantes na

área e marcam, de uma forma clara, a região. São originais da sua época e possuidores de grande

valor histórico, sendo por isso importante estudá-los e perceber a sua influência neste espaço.

Com base na história desta Zona Portuária, consegue-se perceber que outros aspetos como as

atividades comerciais, o próprio modo de habitar e o traçado urbano da época marcaram este lugar,

sendo possível, hoje em dia, observar as marcas desse passado.

Por ser um local de aterro, exigiu-se um estudo sobre a evolução urbana deste local, com o objetivo

de se perceber as diferentes fases de formação do tecido urbano e a maneira como elas

contribuíram para o que o local é hoje. O fato de ser um terreno aterrado, também provocou algumas

restrições a nível de projeto, assunto que será abordado mais a frente.

HABITAÇÃO SOCIAL

48

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

49

05. PROJETO

HABITAÇÃO SOCIAL

50

Neste capítulo será apresentado o exercício de projeto desenvolvido no âmbito da disciplina de

Projeto de Habitação de Interesse Social realizada através do programa Brasil, no Rio de Janeiro. A

disciplina desenvolveu-se em três fases, tendo como objetivo a concretização de um projeto para um

lote inserido na Zona Portuária do Rio de Janeiro.

A primeira fase resumiu-se apenas a algumas aulas teóricas realizadas pelos professores da

disciplina que tinham como conteúdo a história sobre a Habitação Social no Brasil e no Mundo. Esta

fase teve a duração apenas de uma semana.

A segunda fase consistiu em visitas de estudo a obras destinadas à Habitação Social na cidade do

Rio de Janeiro. Durante este período de tempo visitou-se:

Cortiço na Rua Senador Pompeu, Centro do Rio de Janeiro

IAPI Realengo

Conjunto Residencial Prefeito Mendes Moraes- Pedregulho

Conjunto Habitacional Cafundá

Colinas Campo Grande

Morro da Babilônia

Foi na terceira e última fase que decorreu o exercício de projeto propriamente dito. Foi, nesta fase

que se foi elaborou, primeiramente, uma análise ao território e depois se definiu a estratégia de

projeto para o local. Esta fase foi desenvolvida em grupo de dois elementos.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

51

05.1 PROGRAMA E MÉTODO

No âmbito da disciplina de Projeto de Habitação de Interesse Social realizada na Faculdade de

Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foi proposto o exercício de

projeto de Habitação com interesse social para a zona portuária da cidade, no bairro Santo Cristo.

Esta disciplina tem como orientação a problemática habitacional- aspetos sociais, económicos,

políticos, técnicos arquitetónicos e urbanísticos. Assenta na retrospetiva histórica das políticas

habitacionais- seu estudo, análise e novas proposições- relaciona a habitação e os espaços urbanos

e também direciona para a importância do papel do arquiteto para o projeto habitacional.

A primeira etapa do desenvolvimento do projeto incidiu sobre a análise do local onde se insere o lote

de projeto. No âmbito da disciplina realizou-se uma visita à área em estudo com o objetivo de o

conhecer, percebendo desta forma as suas necessidades e fraquezas. A visita ao local também

proporcionou um conhecimento sobre as principais atividades e equipamentos que predominam e

que caracterizam esta zona da cidade. No geral, a visita teve como intuito conhecer, não só a área a

intervir, mas também a vivência do local, procurando compreender os interesses e as expectativas

dos potenciais habitantes do projeto.

Deste modo, a etapa seguinte exigia um olhar atento ao contexto de implantação e a conceção do

sistema territorial, espacial e construtivo da habitação a projetar. A organização territorial previa

diversas ligações de acordo com o lugar onde se insere o projeto: clima, orientação solar,

perspetivas visuais, alinhamentos e relação com a estrutura urbana existente. O sistema espacial

relacionava-se com a disposição e distribuição do programa da habitação, uma vez que incluiu a

diversidade tipológica das unidades habitacionais, podendo variar entre um a três quartos. Em

relação ao sistema construtivo, requeria-se uma reflexão sobre o método de produção, tendo em

conta o aspeto económico, elemento com especial interesse neste tipo de projetos e,

consequentemente, os matérias a utilizar. A questão da altura, ou seja, o número de pisos do novo

projeto para o local, teve que ser ponderado tendo em conta as exigências de regulamentos e a

própria altura do edificado do limite do lote do projeto.

O programa previa a construção de habitação para um total de 850 pessoas numa área de 17.200

m2. Para além da Habitação, como sendo o principal objetivo do projeto, o programa não exigia

especificamente outras funções, no entanto, foi opção do grupo de alunos determinar quais as

demais funções que seriam necessárias para o local e que complementassem o projeto.

O processo de avaliação da disciplina distribui-se por diferentes etapas: avaliação do relatório de

todas as visitas efetuadas, avaliação da fase de análise do território e por último uma avaliação final

onde foi apresentado em formato digital o conteúdo final elaborado e a entrega de um painel resumo

da proposta.

HABITAÇÃO SOCIAL

52

É importante referir que este projeto foi elaborado num curto período de tempo, basicamente dois

meses de exercício do projeto, ou seja, acarreta diversas fragilidades provocadas, principalmente,

por esse curto período de tempo em que se desenvolveu, não possibilitando um desenvolvimento

detalhado, ficando apenas na fase de estudo prévio.

05.2 CONTEXTO DA INTERVENÇÃO

O terreno reservado ao projeto proposto neste trabalho localiza-se, como já foi referido

anteriormente, no bairro de Santo Cristo, mais especificamente na Zona Portuária inserida no Centro

da cidade do Rio de Janeiro. O lote reservado ao exercício de projeto com, aproximadamente

17.200m2, tem como limites as seguintes vias: avenida professor Pereira Reis, rua do Equador, rua

Santo Cristo e a avenida Cidade de Lima.

Atualmente, esta área é um terreno vazio, tendo sido, anteriormente, local de estacionamento de

autocarros. O terreno apresenta uma forma aparentemente regular e a sua localização acaba por

estar inserida no limite entre a malha regular característica da zona industrial, onde se situam os

armazéns industriais, e a malha mais irregular, onde predomina a zona residencial do bairro.

Este espaço tem por si só uma identidade degradada marcada, essencialmente, pelo abandono do

local durante um período de tempo suficientemente grande, proporcionando, desta forma, as

condições em que se encontra hoje. As ruas que delimitam a área também contribuem para uma

imagem não cuidada deste espaço, devido à falta de tratamento das construções instaladas nestes

arruamentos.

A avenida professor Pereira Reis é uma das vias com maior tráfego rodoviário desta zona, tendo por

isso contribuído significativamente para diversas decisões projetuais definidas e explicadas a seguir

neste relatório. Esta via tem uma extensão que se inicia na avenida Rodrigues Alves e termina na

praça da Igreja Santo Cristo. Nela predominam as construções típicas industriais, os armazéns

portuários, mas também alguns edifícios comerciais, como “stands” de automóveis e outros

equipamentos.

A rua Santo Cristo, que delimita a Este o lote de projeto, apresenta características opostas à Avenida

Professor Pereira Reis, uma vez que a sua largura é muito menor apresentando muito menos fluxo

viário e também por ser constituída por edifícios habitacionais e moradias familiares com um número

reduzido de pisos, atribuindo um ambiente mais residencial a este lado do lote.

Na área de projeto está inserido um edifício identificado como património histórico havendo portanto

a necessidade de o conservar, podendo-se propor apenas um novo uso para o seu interior,

mantendo a sua fachada original.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

53

Fig. 52

Avenida Cidade de Lima

Fig. 53

Avenida Professor Pereira Reis

Fig. 54

Rua do Equador

HABITAÇÃO SOCIAL

54

Fig. 55

Rua Santo Cristo

Fig. 56

Lote de projeto

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

55

05.3 DEFINIÇÃO DO CONCEITO E PROPOSTA

A análise de toda a área de estudo e, principalmente, da envolvente direta do lote de projeto

direcionou para diversas opções de desenho urbano e conceito tipológico da proposta de habitação.

De entre as diversas tipologias habitacionais que existem, a opção escolhida recaiu sobre o edifício

habitacional em dupla banda com um vazio central. Esta escolha teve como princípio, a facilidade de

proporcionar habitação para um número elevado de pessoas, 850, sem haver a necessidade de

ocupar a maior parte da área do lote, libertando maior área para o espaço público.

A estratégia de implantação de todo o conjunto assenta em princípios relacionados com a estrutura

viária, ligação com o tecido urbano existente e também, como aspeto indispensável, a questão da

orientação solar. Este último, teve uma importância significativa no desenho da proposta uma vez

que a cidade onde se insere este projeto regista temperaturas elevadas, localizada no hemisfério sul,

logo requer uma especial atenção em relação a este tema.

Neste sentido, optou-se pelo desenho de três edifícios habitacionais com a mesma expressão formal

e ainda um outro, também habitacional, mas que adquire o papel de edifício exceção da proposta.

O posicionamento da proposta vem, intencionalmente, dividir o lote em espaços distintos, como

praças, espaços de lazer e áreas de estacionamento. Optou-se pelo afastamento da construção

relativamente à avenida Professor Pereira Reis, uma vez que esta possui um elevado tráfego

automóvel, criando-se desta forma uma praça que se assume como a “porta de entrada” do conjunto

habitacional. A intenção de criar uma ligação Este-Oeste no lote de projeto unindo duas malhas

distintas da cidade, traduziu-se no desenho de outra praça, que acentua essa vontade, sendo

também um elemento dinamizador e central de toda a proposta.

A expressão formal dos três edifícios localizados a norte no lote de projeto nasceu da necessidade

de criar espaços internos nos edifícios, de forma que pudesse haver uma constante ventilação

cruzada na construção. A intenção de criar espaços onde os habitantes pudessem ter maior

privacidade nasce da necessidade de proporcionar simultaneamente espaços mais seguros, uma

vez que esta questão da segurança foi bastante debatida no decorrer do exercício de projeto.

O edifício exceção do projeto apresenta as mesmas características formais que os outros edifícios,

mas a sua forma é, intencionalmente, diferente, de modo a criar outra dinâmica ao projeto,

relacionando-se, de certa forma, com o edifício identificado como património histórico.

HABITAÇÃO SOCIAL

56

Eixos Principais | Afastamento em relação à Avenida Professor Pereira Reis |Ligação das malhas

Eixo Central | Ventilação Cruzada

Espaços Internos | Privacidade

Núcleos de acesso vertical

Fig. 57

Diagrama de Conceito I

Fig. 58

Diagrama de Conceito II

Fig. 59

Diagrama de Conceito III

Fig. 60

Diagrama de Conceito IV

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

57

Fig. 61

Perspetiva global da proposta

Fig. 62

Vista aérea da proposta

HABITAÇÃO SOCIAL

58

Organização interior

A escolha da tipologia das unidades habitacionais e dos espaços de circulação dos edifícios do

conjunto proposto, teve em consideração os estudos e análises realizadas na aula e nas visitas de

estudo efetuadas. Optou-se por uma organização baseada num Módulo, que, uma vez multiplicado,

constituiu diferentes unidades habitacionais que podem ir até três quartos. Esta escolha também

proporciona uma leitura simples e clara da fachada do edifício, marcada por uma evidente repetição

dos módulos proporcionando um ritmo sistemático da fachada.

A acompanhar este sistema de organização interior das habitações foi proposto, como tipologia de

circulação interna do edifício, a galeria. Esta opção tipológica apresenta diversas vantagens quando

exterior, ou seja, quando proporciona ventilação cruzada no edifício. A galeria exterior é recorrente

em edifícios habitacionais no Brasil, principalmente, por ser um País com temperaturas elevadas,

logo requer formas de ventilação eficazes nas suas construções. Para além da galeria existem

núcleos de acesso vertical que complementam todo o sistema de circulação dos edifícios.

Havendo a intenção de criar uma organização interior simples e clara, foi criado um Módulo de

2,60m, que multiplicado irá constituir as diferentes habitações. Admitiu-se que dois módulos de

2,60m satisfazem uma unidade habitacional de um quarto, constituindo no total um apartamento de

35m2. Assim sucessivamente, três módulos de 2,60m constituem um apartamento de dois quartos

com 50m2 e por último, quatro módulos de 2,60m uma habitação de três quartos com uma área de

65m2.

Definidas as diversas tipologias para a proposta, três tipologias de unidades habitacionais,

organizou-se a sua disposição no edifício. O resultado final foi obtido depois de diversas tentativas

relacionadas com a ordem e simetria das unidades habitacionais.

Fig.63

Diagrama tipológico I

Fig. 64

Diagrama tipológico II

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

59

Fig. 65

Diagrama tipológico III

Fig. 66

Distribuição tipológica das unidade

habitacionais

HABITAÇÃO SOCIAL

60

Espaço Público

Este tema foi tratado com especial atenção durante a fase de desenvolvimento do projeto. Apesar do

principal objetivo do programa ser a habitação, foi indispensável conseguir conciliá-lo com o devido

espaço público envolvente.

Contudo, o espaço público da proposta resume-se a duas praças, orientadas em eixos oposto, e ao

espaço entre os edifícios habitacionais. Estes últimos destinam-se às áreas de estacionamento do

conjunto habitacional proposto.

As diversas opções de criar estacionamento no projeto foram abordadas no decorrer do

desenvolvimento da proposta, sendo as condições do terreno determinantes na decisão da opção

final. O fato de ser um terreno originado por um aterro, impossibilitou, á partida, a opção de realizar-

se estacionamento subterrâneo, sendo a opção ao ar livre a mais indicada.

Ao longo das praças que apoiam toda a proposta, localizam-se algumas áreas de lazer, como por

exemplo, áreas destinadas a idosos e crianças, com mobiliário adequado. Também foi proposto

alguns quiosques que se localizam ao longo das praças.

Como complemento do espaço público, também foi proposto comércio ao longo do piso térreo do

edifício habitacional virado para a Avenida Professor Pereira Reis, tirando o maior partido da praça.

Materialidade

Sendo este projeto destinado à habitação social, houve uma preocupação acrescida na escolha das

opções estruturais e, consequentemente, nos materiais a utilizar. Apesar da falta de tempo para um

desenvolvimento mais detalhado deste aspeto foram definidos alguns aspetos indispensáveis tais

como o sistema estrutural simples e elementos adicionais que caracterizam a fachada.

A opção estrutural recaiu sobre sistema simples em betão armado. A expressão estrutural é evidente

através das fachadas dos edifícios, sendo estas acompanhadas, também, por um sistema de painéis

deslizantes localizados em todas as unidades habitacionais. Estes painéis permitem uma

versatilidade das fachadas contribuindo também para a sua identidade e expressão.

Segurança

Por questões de segurança, os edifícios da proposta foram elevados, em relação ao piso térreo

1,5m. O acesso direto ao piso térreo da habitação, através do espaço público exterior, deveria ser

impossibilitado, para uma maior segurança de todo o conjunto.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

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06. CONSIDERAÇÕES FINAIS

HABITAÇÃO SOCIAL

62

A falta de habitação é uma realidade no contexto global brasileiro mas particularmente visível, e

sentida, na cidade do Rio de Janeiro. No último ano do Mestrado Integrado do Curso tive a

oportunidade de vivenciar, in loco, uma realidade que há muito me perturbava quando confrontada

com o “mundo” das favelas, das desigualdades sociais e da vulnerabilidade das populações às

catástrofes naturais. Em termos académicos, a “explicação” para tão contraditória, e ao mesmo

tempo fascinante, realidade, foi uma experiência única e um “privilégio” na aquisição de

conhecimentos que vão marcar a minha futura vida profissional.

A par da deslumbrante riqueza natural e da diversidade da orografia, a paisagem urbana da grande

metrópole facilmente revela uma flagrante, e histórica, má ocupação de solos e espaços. O

inadequado uso de terrenos para urbanização resultou da falta de políticas, consistentes e eficazes,

de ordenamento do território especificamente dirigidas para as populações mais carenciadas e

socialmente fragilizadas. O direito à habitação foi impossibilitado, principalmente, pelo

desregulamento do mercado imobiliário, pelos baixos salários e também pela desigualdade social.

Tendo em conta que a população mais carente, ou seja, a classe social mais baixa, representa a

maior parte da população brasileira, existe uma necessidade urgente de encontrar políticas

alternativas para melhorar as condições de vida desta população. As novas opções terão de

envolver a execução de novos projetos de habitação direcionados para esta complexa temática

social que deverão ser uma constante no planeamento futuro, no sentido de melhorar as condições

de habitabilidade dos menos favorecidos economicamente.

A minha reflexão sobre a Habitação Social, especifica do contexto carioca proporcionou um

conhecimento aprofundado sobre diversas realidades sociologicamente inter-relacionadas com o

tema da Habitação e com a realidade global do próprio País para as quais, à partida, não estava

desperta, mas que foram visivelmente reveladas no local onde tive a oportunidade de concluir o

último ano do Mestrado Integrado em Arquitetura.

O princípio que orientou a proposta -Habitação de Interesse Social- assentou na criação de um

conjunto habitacional adequado, na medida do possível, às exigências socio económicas e tendo em

conta o tecido urbano existente. A estratégia tomada baseou-se na intenção de criar habitação para

a população de “baixa renda”, mas também no tratamento do espaço público, de forma a haver uma

articulação com a realidade urbana presente.

Acredito que havendo a possibilidade de desenvolvimento do projeto durante um período de tempo

mais longo, teria a oportunidade de um maior detalhamento da proposta e, possivelmente a correção

de alguns aspetos.

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

63

07. BIBLIOGRAFIA

HABITAÇÃO SOCIAL

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Livros

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HABITAÇÃO SOCIAL

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PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

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08. ANEXOS

HABITAÇÃO SOCIAL

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PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

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I CARTOGRAFIA

HABITAÇÃO SOCIAL

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Fig. 67

Cartografia 1769

Fig. 68

Cartografia 1831

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

71

Fig. 69

Cartografia 1867

Fig. 70

Cartografia 1905

HABITAÇÃO SOCIAL

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Fig. 71

Cartografia 1929

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

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II PORTO MARAVILHA

HABITAÇÃO SOCIAL

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Fig. 72

Avenida Rodrigues Alves transformada

em Via Expressa

Fig. 73

Avenida Rodrigues Alves transformada

em Via Expressa

Fig. 74

Fachada do Museu de Arte do Rio

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

75

III REVITALIZAÇÃO DOS GALPÕES DA GAMBOA

HABITAÇÃO SOCIAL

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Fig. 75

Vista aérea dos galpões

Fig. 76

Vista aérea dos galpões com a cidade

do samba atrás

Fig. 77

Estação da Gamboa antigamente

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

77

IV INFORMAÇÕES DETALHADAS

78

Fig. 78- Ficha de Informações detalhadas sobre o terreno

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

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80

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

81

V DESENHOS TÉCNICOS E ELEMENTOS ADICIONAIS

HABITAÇÃO SOCIAL

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Fig. 79

Modelo 3D- Apartamento T0

Fig. 80

Modelo 3D- Apartamento T1

83

Fig. 81

Modelo 3D- Apartamento T2

HABITAÇÃO SOCIAL

84

Fig. 82

Modelo 3D- Perspetiva Avenida

Professor Pereira Reis

Fig. 83

Modelo 3D- Área de estacionamento

Fig. 84

Modelo 3D-Espaço Público , Quiosques

PROJETO DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL NO RIO DE JANEIRO

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Fig. 85

Modelo 3D-Perspetiva noturna da

proposta