argumentação, verdade e ser
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INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 3
I – ARGUMENTAÇÃO
1. No que consiste? .................................................................................................. 4
2. Qual é a sua relação com a verdade? .................................................................. 6
II – SER, APARÊNCIA E REALIDADE
1. O que é Ser, Realidade e Aparência? .................................................................. 8
2. Qual a sua relação? .............................................................................................. 9
III – RETÓRICA
1. O que é a retórica? ............................................................................................ 11
2. Qual a sua relação com a verdade? .................................................................. 12
IV – ARGUMENTAÇÃO, VERDADE E SER E A ANTIGUIDADE CLÁSSICA
1. Filósofos gregos – Sócrates e Platão ................................................................. 14
CONCLUSÃO .................................................................................................................. 16
BIBLIOGRAFIA e MEDIAGRAFIA .................................................................................. 17
Este trabalho é sobre a argumentação, verdade e ser. Ao defender as nossas ideias
devemos utilizar argumentos bons, não só pela sua forma lógica, mas também pelo seu
conteúdo, pois só assim os argumentos serão persuasivos e, se possível, aceites. Como já
estudámos, em lógica, um argumento, para ser persuasivo, tem de ser constituído por premissas
que sejam mais plausíveis que a sua conclusão e, para ser bom, tem de ser sólido, e como para
se ter um argumento sólido é necessário que seja válido e que as premissas sejam verdadeiras,
há uma relação entre a argumentação e a verdade. Como a verdade implica realidade, e a
relidade significa que há, ou melhor, implica existência, implica ser, significa que há uma relação
entre argumentação, verdade e ser e é sobre essa implicação/relação que incide o trabalho que
aqui apresentamos.
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A argumentação é o desenvolvimento de um raciocínio com o fim de defender ou
repudiar uma tese ou ponto de vista para convencer um oponente, um interlocutor circunstancial
ou a nós próprios. Esta desenvolve-se em função de um destinatário, que influencia directa ou
indirectamente a forma como evoluem os argumentos propostos, pois o interlocutor tenta
persuadir alguém que, à partida, não partilha os mesmos pontos de vista ou as mesmas
convicções que ele.
A argumentação não é um acto de persuasão meramente psicológica de um auditório.
Na situação comum, quem argumenta deve ter um certo conhecimento do auditório a que
se dirige. Quanto maior for esse conhecimento, maiores serão as probabilidades de êxito das
teses defendidas.
Toda a argumentação pressupõe um ajustamento às características do seu último
destinatário, por exemplo, se o auditório for composto por pessoas com uma formação cultural e
literária geral e não especializada, a melhor estratégia de comunicação será a de recorrer a
“lugares-comuns” que possam ser reconhecidos por todos.
As homilias públicas utilizam muito este tipo de estratégia, apelando a valores universais
(o bem, a justiça, a liberdade, a fé) que todos facilmente aceitam em qualquer argumentação.
Por exemplo, o Padre António Vieira desenvolvia a argumentação dos seus sermões partindo de
“conceitos predicáveis”. Esta é uma técnica de argumentação que conjectura uma estética de
recepção totalmente controlada pelo orador. Os argumentos utilizados e ilustrados com lugares-
comuns bíblicos só têm eficácia porque é suposto que o auditório conheça e aceite
pacificamente as verdades morais apresentadas pelo orador.
Platão disse, alegoricamente, que “Em situação de extrema exigência, uma
argumentação filosófica deve ser capaz de convencer até os deuses.”
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A argumentação não age sobre evidências. O que é evidente não precisa nem de
demonstração nem de apresentação de argumentos a favor ou contra.
Uma argumentação filosófica forte precisa de uma confrontação de força idêntica. Em
filosofia, só os cépticos não aceitam que a concordância de pontos de vista seja improvável. A
argumentação socrática é essencialmente refutação, não se trata de argumentar para destruir
outra argumentação, não se trata de uma pura dialéctica negativa, mas de um processo de
persuasão epistemológica, que deixa em aberto a continuação do inquérito realizado sobre uma
suposta verdade ou convicção.
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O pensamento actual busca por diversos caminhos uma noção de verdade que,
superando o relativismo e o utilitarismo manifestados nas primeiras reacções contra a
abstracção, valha por sua vez como absoluta. Assim, tem lugar sobretudo em quem chega a
fazer da verdade uma “Coincidência do homem consigo mesmo.” (por Ortega y Gasset, cit in
Dicionário de Filosofia).
O homem necessita de justificar por que razão em algumas ocasiões se dedica a
averiguar o ser das coisas. Tal averiguação não pode proceder simplesmente de uma
curiosidade, pelo contrário, enquanto a Filosofia tradicional afirmava que o homem é curioso e
fazia assim descer a ciência ao nível de uma inclinação, o pensamento actual, que nega a
suposta intelectualidade essencial do homem, sustenta que este se vê obrigado a conhecer
porque o conhecimento é o acto que o salva do naufrágio da existência. O saber converte-se
deste modo em saber a que se ater. Daí que seja erróneo, segundo Ortega y Gasset (op. cit.),
supor sem mais que as coisas possuem um ser e que o homem tem de descobri-lo, o certo é
que as coisas não têm por si mesmas um ser e por isso, para não se ver perdido, o homem tem
de o inventar. Se assim é, o que há a fazer? Mas então a verdade não será simplesmente a
tradicional adequação entre ser e pensar? Verdade será aquilo sobre o qual o homem saberá a
que se ater, o pôr a claro consigo mesmo em relação ao que crê das coisas.
A argumentação não pode ser a afirmação da verdade, porque todo o verdadeiro diálogo
nunca esgota a possibilidade de investigação da verdade, nem pode partir do pressuposto que
uma conclusão retórica seja, por definição, a conquista de uma verdade universal.
Argumentar é procurar coerência onde existe dúvida, é descortinar sentido num
paradoxo, mas também pode ser dar sentido a uma absurdidade ou a uma contradição. É nisto
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que a argumentação se distingue de dogmatismo, pois não parte para a discussão com a
certeza de verdades de facto e de razão.
Num discurso argumentativo, não se pode assumir que uma verdade, seja ela
contingente ou necessária, jamais possua um oposto, porque a anulação deste pressupõe a
anulação da própria argumentação. Mas para que seja convincente, a argumentação precisa de
um elevado grau de credibilidade.
A verdade é um valor a condicionar a actividade do filósofo e as intenções com que
executa o seu labor.
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O que é o Ser?
Ser é um dos conceitos de mais difícil esclarecimento. É tido como “ a essência”, “ a
existência”, “o ente” e ainda como “a substância”.
Ser é tudo o que é real, tudo o que possui realidade, tudo o que está aí, tudo quanto existe.
O que é a Realidade?
A realidade é dada no limite da experiência possível e, por isso, tudo “o que concorda
com as condições materiais da experiência (da sensação) é real.” Um dos problemas mais
importantes que se põe na área da realidade é o dos modos de expressão da mesma. Este
problema costuma ser conhecido sob o nome de realidade e linguagem. Trata-se de saber como
é possível falar acerca do real e quais são os limites linguísticos mais adequados para este
propósito.
“Os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo”, Wittgenstein
O que é a Aparência?
A Aparência é o aspecto que uma coisa oferece, diferente, e até em oposição, do seu ser
verdadeiro; alude ao aspecto ocultador do ser verdadeiro e tem um sentido análogo ao de
fenómeno, podendo apresentar diferentes aspectos.
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Usando estes três termos obtêm-se três relações que são:
A relação entre Realidade e Aparência
Só mediante a compreensão do aspecto ou aspectos que uma coisa oferece podemos
saber o que verdadeiramente ela é, daí que nem sempre seja possível confundir a aparência
com uma falsa realidade, a sua significação mais geralmente aceite é a de realidade aparente,
isto é, usando uma expressão paradoxal, aspecto que encobre e simultaneamente permite
descobrir a verdade de um ser. Para alguns, não tem sentido perguntar se uma realidade é
verdadeira ou falsa, autêntica ou aparente, pois a realidade é o que isso é, de tal modo que a
verdade é precisamente a conformidade da realidade com a aparência, ou, por outras palavras,
a maneira de a realidade se manifestar em si mesma.
A relação entre Ser e Realidade
A realidade é uma das maneiras primárias do ser. É necessário antes de tudo distinguir esta
forma de todas as que aderem equivocamente a ela. Há que haver distinções bem claras entre
os diferentes conceitos do real evitando aplicar a uma forma de realidade categorias que
correspondam exclusivamente a outra. A realidade, como algo diferente ou oposto à idealidade,
é uma das formas do ser; enquanto actualidade, é um dos modos de ser.
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A relação entre Ser e Aparência
O contraste entre o ser e a aparência exclui em princípio qualquer identificação; cada um
destes elementos é-o pela referência do outro. É possível, no entanto, conceber que não há ser
escondido atrás da aparência e que esta é todo o ser, concepção que paradoxalmente coincide
com a que afirma que o ser está sempre imediatamente presente por si mesmo e, portanto, que
é ao mesmo tempo aparente, isto é, evidente.
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A retórica é afim da dialéctica: tal como a dialéctica, não tem um objecto específico
porque concerne a todo o tipo e espécie de objecto e, todavia, é própria de todos os homens
porque todos “se ocupam a indagar sobre qualquer tese e a sustê-la, a defender-se e a acusar.”
(Ret., I, 1354 a).
A função da retórica não é a de persuadir, mas de mostrar os meios que são aptos a
induzir à persuasão.
A retórica procura descobrir quais são estes meios relativamente a qualquer argumento
dado, neste sentido, não constitui a técnica própria de um campo específico. O objectivo da
retórica é o verosímil, isto é, o que acontece o mais das vezes (enquanto o objecto da ciência é
o necessário, que acontece sempre): o mais das vezes é o análogo do necessário nas
disciplinas cujo objecto é privado de necessidade (Ib., I, 2,1357 a).
Dado que todo o discurso é dirigido a um auditório que é o fim do próprio discurso e o
auditório pode ser ou um simples auditório ou um simples juiz, que deve pronunciar-se sobre
coisas passadas ou futuras, há três géneros de retórica: a deliberativa, a judicial e a
demonstrativa. A retórica deliberativa é a que se volta para coisas futuras e deve persuadir ou
dissuadir, demonstrando que qualquer coisa é útil ou perniciosa. A retórica judicial refere-se a
factos ocorridos no passado e o seu objectivo é acusar ou defender, persuadindo que tais factos
são justos ou injustos. Finalmente, a retórica demonstrativa refere-se a coisas presentes e o seu
objectivo é louvá-las ou condená-las, como verdadeiras ou falsas, boas ou más.
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Na Grécia antiga, Sócrates e Platão opuseram-se a este ensino, o da retórica. Ambos
sustentaram que a Retórica era a negação da própria Filosofia. Platão, no Górgias e no Fedro,
estabelece uma distinção clara entre um discurso argumentativo dos sofistas que através da
persuasão procura manipular os cidadãos, e o discurso argumentativo dos filósofos que
procuram atingir a verdade através do diálogo, pois só esta importa. A Filosofia surge, assim,
como discurso dirigido à razão, e não à emoção dos ouvintes. Esta é, aliás, a condição primeira
para que a verdade possa ser comunicada. Não se trata de convencer ninguém, mas de
comunicar ou demonstrar algo que se pressupõe já adquirido - a Verdade de que o filósofo é
detentor.
Na Idade Moderna, a retórica continuou a desfrutar ainda de algum prestígio nos países
católicos, recorde-se a este respeito o notável orador que foi o Padre António Vieira. A
tendência do tempo era todavia outra. A Retórica como arte argumentativa começou a ser
completamente desacreditada. Descartes reafirma o primado das evidências sobre os
argumentos verosímeis. Na mesma linha se desenvolve o discurso científico. Não se trata de
convencer ninguém, mas de demonstrar com "factos", "dados", "provas" a Verdade (única e
irrefutável).
No século XX a Retórica volta a ser retomada, em consequência da generalização das
teses relativistas e o descrédito das ideologias. A "Verdade" que os filósofos afirmavam não mais
pode ser admitida como um ponto de partida para qualquer discussão. Antes de poder afirmar o
que quer que seja como verdadeiro, o filósofo deve procurar a adesão de um dado auditório para
as suas posições. Todas as filosofias não passam de opiniões plausíveis que devem ser
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continuamente demonstradas através de argumentos também eles meramente plausíveis. Neste
sentido, toda a filosofia é um espaço sempre em aberto e susceptível de contínuas revisões.
Persuadir não é a mesma coisa que manipular. A grande diferença reside na intenção do
orador. No caso da persuasão, o objectivo é apenas provocar a adesão, apelando a factores
racionais e emocionais. No caso da manipulação, existe uma intenção deliberada de
desvalorizar os factores racionais, apelando a uma adesão emocional. O próprio discurso é
baseado em falácias, onde é patente a intenção de confundir o auditório.
As técnicas de persuasão (manipulação) ensinadas pelos sofistas, apesar da sua
eficácia, podem ser consideradas muito rudimentares face às aplicadas no século XX para
manipularem milhões de pessoas. As técnicas de persuasão actuais tornaram os oradores parte
de uma vasta encenação, onde se recorre a uma enorme variedade de meios para seduzir,
persuadir e manipular.
O ditador Adolfo Hitler foi o primeiro a integrar a retórica em gigantescos espectáculos de
propaganda, produzindo um poderoso efeito hipnótico sobre os auditórios.
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Filósofos gregos: Sócrates e Platão
Sócrates parte da sincera convicção do carácter inacessível da verdade absoluta, mas
não à maneira dos cépticos, antes vendo o pensamento como um estar a caminho.
“Filosofar é a constante busca duma verdade que sempre atrai e sempre se escapa.
Ninguém é dono da verdade”, daí a árdua tarefa, aceite por Sócrates, de acordar os seus
concidadãos do sono dogmático, prevenindo-os contra os vendedores ambulantes de doutrinas.
Daí o seu método da confissão da própria ignorância: a do irónico questionamento dirigido aos
seguros interlocutores para os colocar na mesma fecunda insegurança que é a condição para
entrar no caminho da verdade, uma vez que estes não se resolviam a aceitar como verdade que
os convencesse de que estavam a fingir saber alguma coisa quando, na realidade, nada sabiam.
Na primeira parte da Apologia de Sócrates, Platão exarou que este disse quase se
esquecer de quem era devido ao discurso tão persuasivo dos seus acusadores.
“ Não terem eles encorajado só com o pensamento do desmentido formal que desde já
lhes farei pareceu-me, da parte deles, o cúmulo da impudência, a menos que chamem hábil em
falar àquele que diz a verdade.”
Sócrates criticava os sofistas pelo facto de cobrarem honorários pelos seus
ensinamentos e também pelo seu cepticismo. Ao contrário daqueles, Sócrates defendia que era
possível alcançar a verdade que estaria já à partida dentro de nós e que, devidamente procurada
através de um método eficaz, poderia tornar-se evidente para todos os homens. Este método
(diálogo) dividia-se em duas partes: numa, a ironia, Sócrates simulava a sua ignorância como
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forma de poder interrogar os seus interlocutores. Através de um conjunto de perguntas
sistemásticas embaraçava o interlocutor de tal modo que este se apercebia que os
conhecimentos que possuía afinal eram menos sólidos do que supunha.
Após esta primeira fase mais descontrutiva, seguia-se outra mais pedagógica e
construtiva. Através de novas perguntas o filósofo conduzia o interlocutor a descobrir
conhecimentos que já possuía mas de que não tinha consciência e que uma vez despertos se
revelavam como evidentes e mais satisfatórios que as crenças superficiais. Esta segunda fase
tinha como objectivo ajudar as pessoas a descobrirem que a verdade estava dentro delas
próprias.
A filosofia platónica inaugura uma visão dualista da realidade que separa o espírito e a
matéria, sendo esta apenas a sombra ou a negação daquele.
Para Platão, o filósofo não pode ser um simples delator das verdades possuídas, um
demolidor das posições seguras. A incompreensão e a morte injusta não podem ser o destino do
filósofo.
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Ao terminarmos este trabalho concluímos quão importante é o facto de aceitar a verdade
e a realidade e usá-las nas nossas argumentações. Quer seja um discurso persuasivo no
sentido de depor a ideia de outrém ou um discurso que o apoie, é essencial que se racionalize e
use bons argumentos para que não haja falhas ou injustiças tal como houve com outros filósofos
em tempos e que, por dizerem verdades, embora apresentadas nua e cruamente, foram
acusados de enganar as pessoas, quando as pessoas se enganavam a si mesmas e não
queriam aceitar alguma tese que fosse contra as suas. O facto de existir uma realidade, um ser,
uma existência que prova a tese, por nós apresentada, mostra que apresentamos a verdade,
que é indispensável numa boa argumentação.
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Abrunhosa , Maria Antónia & Leitão, Miguel - “ Um Outro Olhar Sobre o Mundo ” Filosofia
11º ano – Vol. I – Edições ASA, Porto, 2006;
Alves , Manuel dos Santos – “ História da Filosofia ” – Porto Editora, Porto, 1989;
Magalhães , Júlio Baptista – “ Viver & Filosofar ” – Edições Contraponto, 1988;
Mora , José Ferrater – Dicionário de Filosofia – D. Quixote, Lisboa, 1982;
Platão – Diálogos III, Apologia de Sócrates, Críton e Fédon – Europa-América, Mem-
Martins;
Vilhena , V. de Magalhães – “ Pequeno manual de Filosofia ” 5ª. Ed. Lisboa (Livraria Sá
da Costa, 1977 ( p.602-603);
http://www.jorgeferrosa.com/filoargumentacao.html ;
http://www.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/A/argumentacao.htm ;
http://pt.wikipedia.org/wiki .
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