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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTITUTO DE GEOGRAFIA
FERNANDO MAYWALD
ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E RESERVA LEGAL EM
ASSENTAMENTOS RURAIS: Adequação dos Projetos de Assentamento
Flávia Nunes e Canudos à Legislação Ambiental - Uberlândia (MG)
UBERLÂNDIA
2011
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTITUTO DE GEOGRAFIA
CURSO DE GRADUAÇÃO DE GEOGRAFIA
FERNANDO MAYWALD
ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E RESERVA LEGAL EM
ASSENTAMENTOS RURAIS: Adequação dos Projetos de Assentamento
Flávia Nunes e Canudos à Legislação Ambiental - Uberlândia (MG)
Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso
de Graduação em Geografia do Instituto de
Geografia da Universidade Federal de Uberlândia
para obtenção do título de Bacharel em Geografia
Orientador: Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti
UBERLÂNDIA
2011
2
Fernando Maywald
ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E RESERVA LEGAL EM
ASSENTAMENTOS RURAIS: análise da adequação da legislação ambiental nos
Projetos de Assentamento Flávia Nunes e Canudos - Uberlândia (MG)
Uberlândia, 14 de dezembro de 2011.
Banca Examinadora
______________________________________________________________
Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti (Orientador)
Instituto de Geografia – Universidade Federal de Uberlândia
______________________________________________________________
Profa. Dra. Gelze Serrat de Souza Campos Rodrigues (Examinador)
Instituto de Geografia – Universidade Federal de Uberlândia
______________________________________________________________
Profa. Dra. Vera Lúcia Salazar Pessôa (Examinador)
Instituto de Geografia – Universidade Federal de Uberlândia
Resultado: ______________________
Data: ____/____/____/
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha família, que sempre me apoiou incondicionalmente e sempre me
deram tudo que eu precisava para alcançar meus objetivos. Um agradecimento especial às
minhas primas, Carmen e Paula, que me auxiliaram das mais diversas maneiras na confecção
deste trabalho.
Ao meu orientador de monografia, Marcelo Chelotti, que me deu a chance de trabalhar
ao seu lado diante de uma temática tão empolgante e envolvente, para que assim eu possa
concluir mais esta fase de minha vida e possa seguir meu trabalho como geógrafo.
A todos meus professores durante o curso de Geografia, que me deram todas as bases
teóricas para que eu pudesse me tornar o geógrafo que sou. Principalmente ao meu professor e
orientador de Iniciação Científica, Vicente de Paulo, que me incentivou e proporcionou a
chance de continuar meus estudos e me dedicar ao curso.
Aos integrantes da equipe Agrolago, que facilitaram o contato com os projetos de
assentamento e que sem eles meu trabalho não teria tamanha riqueza de informações.
Aos professores participantes da banca de defesa de monografia, que contribuíram
imensamente para o enriquecimento deste trabalho.
4
RESUMO
Os assentamentos rurais sob jurisdição do INCRA, do estado de Minas Gerais, de
acordo com a Deliberação Normativa 44, devem se submeter ao licenciamento ambiental para
poderem exercer suas atividades típicas. A ausência dessas licenças, cujo procedimento é
demorado e oneroso, impede a liberação de recursos para a implantação do assentamento rural
e do manejo da terra sob a pena de praticarem crime ambiental. Nesta pesquisa, propôs-se
estudar dois assentamentos rurais, PA Canudos e PA Flávia Nunes, localizados no município
de Uberlândia, Minas Gerais, que ainda não estão de acordo com a legislação ambiental. Para
tanto, utilizou-se a análise de documentos referentes à implantação dos assentamentos bem
como trabalhos de campo onde foram realizadas entrevistas com alguns assentados. Nas
entrevistas privilegiou-se as falas onde são relatadas as dificuldades em seguir as normas
ambientais bem como suas consequências para a legalização dos assentamentos.
Palavras-chave: Assentamentos Rurais. Áreas de Preservação Ambiental. Reserva Legal.
Legislação Ambiental.
5
LISTA DE GRÁFICOS, QUADROS, FIGURAS E MAPAS
Quadro 1 - Principais características dos modelos de desenvolvimento da América
Latina
25
Mapa 1: Brasil – Geografia das ocupações de terra – Ocupações entre 1988-2010 29
Gráfico 1: Número de Assentamentos por Macrorregião criados entre 1979-2010. 31
Gráfico 2: Número de Assentamentos criados por Estado no Sudeste entre 1979-
2010.
35
Gráfico 3: Número de Assentamentos criados em Minas Gerais de acordo com o
governo.
35
Mapa 2: Localização do Município de Uberlândia. 38
Gráfico 4: Número de Assentamentos criados em municípios de Minas Gerais
com maior incidência.
40
Mapa 3: Localização dos Assentamentos estudados no Município de Uberlândia. 42
Figura 1: Projeto de Assentamento Flávia Nunes 43
Figura 2: Projeto de Assentamento Canudos 46
Foto 1: Projeto de Assentamento Flávia Nunes – Poço perfurado para captação de
água.
49
Figura 3: Recorte demonstrativo dos lotes inseridos em Cerrado. 50
Foto 2: Projeto de Assentamento Flávia Nunes: A - foto de uma área dentro de
APP fora da RL. B - nascente localizada fora dos limites da Reserva Legal.
52
Gráfico 5: Projeto de Assentamento Flávia Nunes: Uso do Solo e Cobertura
Vegetal
54
Figura 4: Recorte demonstrativo dos lotes que converteram áreas com foco de
erosão em APP.
59
Foto 3: Projeto de Assentamento Canudos: A – área para plantio de pimenta. B –
foco de erosão que foi convertido em APP.
60
Gráfico 6: Uso do Solo do Projeto de Assentamento Canudos 61
6
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Brasil – Número de assentamentos, famílias e área por Estado e
macrorregiões entre 1979-2010
30
Tabela 2 – Número de assentamentos criados em Minas Gerais e no Brasil,
comparativo por governo
36
Tabela 3: Assentamentos criados no Município de Uberlândia. 40
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
1 AS LEIS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL E A REFORMA AGRÁRIA: Uma
discussão sobre o ideal e o real
11
1.1 A preocupação com o meio ambiente nas últimas décadas 11
1.2 Considerações sobre a Legislação Ambiental no Brasil 14
1.3 Áreas de preservação do meio ambiente e sua relação com a Reforma Agrária 16
2 LUTA PELA TERRA E REFORMA AGRÁRIA NO TRIÂNGULO MINEIRO
/ ALTO DO PARANAÍBA: A SITUAÇÃO NO PÓS 1990
21
2.1 Considerações sobre a questão agrária no Brasil 21
2.2 Os assentamentos de reforma agrária no Brasil: considerações sobre as
ocupações
28
2.3 Os assentamentos de Reforma Agrária em Minas Gerais no Pós 1990 34
3 OS ASSENTAMENTOS FLÁVIA NUNES E CANUDOS E SUAS
CONDIÇÕES DE ADEQUAÇÃO À LEGISLAÇÃO AMBIENTAL
38
3.1 Caracterização do Município de Uberlândia 38
3.2 Os assentamentos selecionados 41
3.2.1 Projeto de Assentamento Flavia Nunes 42
3.2.2 Projeto de Assentamento Canudos 44
3.3 A situação da questão ambiental nos assentamentos 47
3.3.1 Projeto de Assentamento Flávia Nunes 47
3.3.2 Projeto de Assentamento Canudos 57
CONSIDERAÇÕES FINAIS 63
REFERÊNCIAS 65
ANEXOS 69
A Planta de Caracterização do Uso do Solo e Cobertura Vegetal Projeto de
Assentamento Canudos
70
B Planta de Caracterização do Uso do Solo e Cobertura Vegetal Projeto de
Assentamento Flávia Nunes
71
8
INTRODUÇÃO
As leis de proteção ambiental foram gestadas como mecanismos legais para a
conservação do meio ambiente, condição necessária para a sobrevivência do homem,
considerando aqui a destruição e a degradação progressiva causada pelo próprio homem em
nome dos avanços extrativistas, industriais e tecnológicos, advento este que veio se agravando
no decorrer do século XX.
Daí a promulgação do Novo Código Florestal em 1965 (Lei nº 4.771), que estabelece
os parâmetros das áreas de preservação do meio ambiente, que se subdividem em Área de
Preservação Permanente e Reserva Legal.
Porém ao articular a proteção ambiental ao tema reforma agrária, outras questões se
abrem para análise, considerando aqui a visão sócio-política que defende o acesso a terra
como elemento essencial à justiça social. Tal visão encontra-se historicamente justificada pelo
processo de segregação do homem rural à terra, mecanismo esse sustentado pela cultura
latifundiária e que conduziu ao grande fosso social instalado na realidade brasileira e seus
conseqüentes danos às condições mínimas de sobrevivência de uma população que passou a
viver na condição de exilados da terra.
Se por um lado a lei vem ao encontro da perspectiva de buscar formas duradouras e
saudáveis de vida, estando condicionada à compatibilidade entre os modelos de
produção/consumo associados à reprodução dos ecossistemas, e não a sua destruição, por
outro, depara-se com a realidade dos antigos ―sem-terra‖, desprovidos de posses, renda e
formação, que vivem da agricultura camponesa ainda desenvolvida de forma precária em
detrimento dos passos lentos da Reforma Agrária no que diz respeito aos investimentos
devidos previstos pelo INCRA.
O dilema instalado é decorrente dessa realidade, entre a projeção de futuro e a
retificação do passado, onde, muitas das vezes, os critérios de proteção ambiental se tornam
obstáculos para uma melhor apropriação da terra como forma única de sobrevivência da
população assentada. Apesar de ser uma visão equivocada, não deixa de ser uma verdade para
aqueles que se encontram na atual condição de vida, ainda excluídos mesmo quando incluídos
no processo de reforma agrária.
9
Nesse contexto surge o interesse em pesquisar o cumprimento das leis de Proteção
Ambiental pelos Projetos de Assentamento Flávia Nunes e Canudos, situados no município de
Uberlândia (MG), e sua viabilidade segundo o posicionamento dos assentados representantes
desses dois núcleos.
Para uma maior aproximação do objeto de pesquisa foram traçados quatro objetivos
específicos: a) o resgate histórico dos Projetos de Assentamento Flávia Nunes e Canudos,
considerando aqui desde sua ocupação até sua legalização; b) a delimitação das áreas dos
assentamentos de acordo com as exigências legais de proteção ambiental, identificando seu
cumprimento ou não; c) a viabilidade do cumprimento das leis perante a realidade atípica dos
assentados, considerando o projeto maior de Reforma Agrária e o perfil da população
assentada; d) o posicionamento dos assentados sobre o interesse do cumprimento das leis de
Proteção Ambiental em relação às necessidades de sobrevivência das famílias assentadas.
Como caminho metodológico foi utilizada a pesquisa bibliográfica de assuntos
relacionados à temática, com a análise e leitura de diversas produções acadêmicas, livros e
leis sobre os movimentos sociais e sobre a questão ambiental agrária. Foram realizadas
conjuntamente visitas de campo nos assentamentos, sendo que o primeiro contato com os
moradores do Projeto de Assentamento Flávia Nunes se deu com a intermediação da equipe
da Agrolago1, em setembro de 2011, com as lideranças dos mesmos para fins de apresentação
dos objetivos da pesquisa e sua relevância social. Durante a mesma se deu um
reconhecimento por meio da observação de campo, da área como um todo e das áreas de
preservação ambiental, registradas em fotos.
Na segunda visita, em outubro de 2011, foi realizada uma reunião com os assentados,
representados por um membro de cada família, quando foram colhidas as informações
referentes à sua história de luta, as dificuldades enfrentadas no assentamento em relação à
infra-estrutura, renda, condições de moradia e posteriormente sobre as condições de
adequação da área à legislação ambiental vigente. O reconhecimento da área foi novamente
realizado logo após a reunião – conhecimento da nascente existente dentro do assentamento,
com obtenção de fotos.
O contato com os moradores do Projeto de Assentamento Canudos se deu por
intermédio de uma moradora do assentamento Flávia Nunes, onde foram esclarecidos os
1 Agrolago: empresa contratada pelo INCRA, responsável pela assistência técnica em alguns
assentamentos selecionados em Uberlândia.
10
objetivos do trabalho e marcada uma visita a campo. A visita foi realizada em novembro de
2011, e contou com a participação em formato de entrevista de uma representante do
assentamento em sua casa.
A orientação teve como base a pesquisa qualitativa de forma a reconhecer o
protagonismo dos assentados como sujeitos produtores do conhecimento e práticas com vista
à transformação da realidade. Tais informações aliadas aos dados quantitativos obtidos no
Incra e na Agrolago tornam mais claras as respostas no contexto atual sobre a realidade dos
assentados e suas condições de adequação à legislação ambiental. Os dados obtidos por
intermédio da Agrolago foram mapas e o PDA (Projeto de Desenvolvimento do
Assentamento), que contribuíram imensamente para aprofundar a discussão.
No primeiro capítulo da monografia foi realizado um levantamento teórico que utiliza
diversos autores para justificar a crescente preocupação com a conservação do meio ambiente
nas últimas décadas. Também é realizado um apanhado das principais leis que compõe a
temática ambiental e o foco da sua influência e atuação na zona rural, concomitante as
condições de criação de assentamentos de reforma agrária.
O segundo capítulo segue com a apresentação de um referencial teórico baseado em
discussões de autores que tratam da questão agrária no Brasil, tendo como recorte histórico a
Lei de Terras de 1850 até o fim do segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010.
Dados governamentais sobre reforma agrária também foram utilizados a fim de trazer maior
consistência quantitativa ao tema, trabalhados em sua abrangência nacional até o foco da área
de estudo, o Triângulo Mineiro / Alto Paranaíba em Minas Gerais.
O terceiro capítulo trata do tema em si, das condições de adequação da legislação
ambiental em projetos de assentamento na pós-conquista da terra, como alvo de estudo as
Áreas de Preservação Ambiental e Reservas Legais localizadas nos Projetos de Assentamento
Flávia Nunes e Canudos. As justificativas e dificuldades exibidas pelos assentados para que o
cumprimento das leis não tenha sido alcançado.
Nas considerações finais buscou-se refletir e repensar sobre as considerações feitas ao
longo da pesquisa, com base na interpretação dos dados coletados, quantitativos e
qualitativos, e assim assimilar à discussão as condições reais dos assentados e desta forma
propor alternativas que viabilizem ou tornem mais acessível a viabilização das leis de
proteção ambiental.
11
1 AS LEIS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL E A REFORMA AGRÁRIA: Uma discussão
sobre o ideal e o real
1.1 A preocupação com o meio ambiente nas últimas décadas
Durante várias gerações a sociedade acreditava que o planeta possuía total capacidade
de resiliência perante as ações humanas na natureza. Porém, o processo de industrialização
aliado à degradação da natureza trouxe à tona o problema ambiental a partir da década de 50
do século XX, quando surgiram algumas discussões que vinculavam o crescimento
econômico relacionado com o meio ambiente. Pela primeira vez foram colocadas questões
que alertavam a necessidade de compatibilização entre a sociedade, o desenvolvimento e o
meio ambiente (MAIMON, 1992).
Mas foi somente no final dos anos 1960 e início dos anos 1970, em decorrência da
crise do petróleo, que a vertente de conscientização ambiental ganha aliados em decorrência
das preocupações com os recursos naturais e ambientais devido a sua influência nos âmbitos
econômico, social e político.
Em 1972, foi realizada a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente
Humana, conhecida como Conferência de Estocolmo. Considerada como um marco histórico
político internacional pela sua influência para o surgimento de políticas de gerenciamento
ambiental.
É evidente que a problemática ambiental não se dissocia da dinâmica capitalista
industrial na exploração dos recursos naturais e na poluição do meio ambiente, ações estas
justificadas pelo crescimento populacional e pela demanda crescente de bens materiais em
detrimento da preservação do meio ambiente.
A aceleração do consumo por novos bens duráveis nas décadas de 1980 e 1990,
decorrentes do avanço tecnológico trouxe sérias conseqüências ambientais. Na década de
1980, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento alertou para a
incompatibilidade entre um desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo
vigentes. Em 1987 a Comissão publicou o Relatório Brundtland, também intitulado Nosso
Futuro Comum, onde preconiza:
12
A indústria e seus produtos exercem um impacto sobre a base de recursos naturais
da civilização ao longo de todo o ciclo de exploração e extração de matérias-primas,
sua transformação em produtos, consumo de energia, formação de resíduos, uso e
eliminação dos produtos pelos consumidores. Tais impactos podem ser positivos,
melhorando a qualidade de um recurso ou ampliando seus usos; ou podem ser
negativos, devido à poluição causada pelo processo e pelo produto, ou ainda ao
esgotamento ou deterioração dos recursos. (COMISSÃO, 1991, p. 232).
Sendo assim, em decorrência dos altos custos ambientais em função da
industrialização e, posteriormente, da revolução tecnológica, os países centrais se viram
obrigados a criar dispositivos legais direcionados à proteção ambiental, expandindo-se para o
restante do mundo.
A preocupação ambiental foi se tornando hegemônica com o fenômeno da
globalização, que também não é recente, nessas últimas décadas. É nessa
circunstância que começa a surgir a idéia de sustentabilidade. A corrente do
desenvolvimento sustentável baseia-se na lógica de combinar as questões de âmbito
econômico com as questões sociais e ambientais, a serem incorporadas pelo Estado,
empresas, ONGs e sociedade. O objetivo é o de garantir que o progresso tecnológico
e produtivo não esgote os recursos naturais, nem degrade o meio ambiente de forma que venha a comprometer a sua existência futura (YOUNG, 2001, p.28).
No Brasil, a partir da década de 1970 surgiram diversos grupos ambientalistas,
estimulados pela Conferência de Estocolmo. Na época, as restrições ambientais propostas se
apresentaram como uma interferência nos planos nacionais de desenvolvimento que envolvia
a implantação de indústrias poluentes.
Nessa época, geralmente os grupos se concentravam nas regiões sul-sudeste e eram
compostos por ativistas que desenvolviam ações de educação ambiental, de proteção e
recuperação de ambientes degradados e ameaçados. Foram também desenvolvidas campanhas
de abrangência regional e nacional como a campanha de denúncia contra o desmatamento na
Amazônia (1978), lutas contra a inundação de Sete Quedas para a construção da Usina de
Itaipu (1979-1983), contra a construção das usinas nucleares (1977-1985) e para a aprovação
de leis de controle do uso de agrotóxicos (1982-1085) (JACOBI, 2000).
Já na década de 1980 houve um crescimento expressivo do movimento quando
algumas associações adquirem visibilidade pública pelo acesso às agências estatais e aos
meios de comunicação. Tal expansão se dá também pela sua vinculação a outros grupos como
os movimentos sociais, científicos e empresariais pelo discurso do desenvolvimento
sustentado. Embora pouco reconhecidas ―como interlocutoras por parte do setor público e
privado e suas ações se continuam a se concentrar na mobilização contra fábricas poluidoras e
13
degradação de áreas verdes, como parques nacionais, estaduais e municipais‖ (JACOBI, 2000,
p.13) e mais, como analisa o autor:
Ocorre uma crescente inovação na cultura ambientalista brasileira. As entidades
transcendem a prática da denuncia e têm como objetivo central a formulação de
alternativas viáveis de conservação e /ou de restauração de ambientes danificados, O
socioambientalismo se torna parte constitutiva de um universo cada vez mais amplo
de organizações não governamentais e movimentos sociais. Isto ocorre na medida
em que os grupos ambientalistas influenciam diversos movimentos sociais que
embora não tenham como seu eixo central a problemática ambiental, incorporam gradativamente a proteção ambiental como uma dimensão relevante do seu trabalho.
Nos anos 1990, o ambientalismo se consagra como um ator relevante, com ênfase na
relação entre degradação ambiental e desigualdade social, principalmente nos grandes centros
urbanos, onde se faz necessário a assimilação pela sociedade das práticas de sustentabilidade
e na politização dos riscos.
O conceito de desenvolvimento sustentável nas últimas décadas apresentou várias
vertentes, dentre elas pode-se destacar duas correntes relevantes ao tema. A primeira se volta
para o controle do crescimento da população mundial e do capital industrial em função dos
recursos limitados. Já a segunda relaciona-se com a crítica ambientalista difundida com a
Conferência de Estocolmo e se volta para uma concepção alternativa para o desenvolvimento,
onde propõe ―reconciliar as atividades econômicas com a necessidade de proteger o planeta e
assegurar um futuro sustentável para todos os povos‖ (JACOBI, 1999, p.178). O autor
esclarece:
O desenvolvimento sustentável não se refere especificamente a um problema
limitado de adequações ecológicas de um processo social, mas a uma estratégia ou
modelo múltiplo para a sociedade, que deve levar em conta tanto a viabilidade
econômica como ecológica. Num sentido abrangente, a noção de desenvolvimento sustentável leva à necessária redefinição das relações sociedade humana/ natureza e,
portanto, a uma mudança substancial do próprio processo civilizatório. Isso se
integra plenamente dentro das cinco dimensões enunciadas por Sachs (1993) e
introduz o desafio de pensar a passagem do conceito para a ação (JACOBI, 1999,
p.178).
Se de um lado o contexto no qual se configuram as questões ambientais é marcado
pelo conflito de interesses e uma polarização entre visões de mundo, as respostas precisam
conter cada vez mais um componente de cooperação e de definição de uma agenda que
acelere prioridades para a sustentabilidade como um novo paradigma de desenvolvimento.
14
1.2 Considerações sobre a Legislação Ambiental no Brasil
As leis e normas que tratam da questão ambiental datam desde a época do Brasil
Colônia, surgindo no início do século XVII até a metade do século XVIII alguns casos, como
a regulamentação para pesca de baleias, condições de exploração do pau-brasil, proibição de
corte de árvores de mangue e vegetações marginais ao mar e rios que desembocavam no mar
(ROCCO, 2002).
Este quadro teve poucas mudanças significativas até a década de 30 do século XX,
quando surgiram os três primeiros códigos ambientais: o Código das Águas, o Florestal e o de
Mineração. O fortalecimento das leis que visavam à preservação do ambiente no Brasil se deu
somente três décadas depois, nos governos ditatoriais pós 1964, onde a compreensão do uso
racional e múltiplo dos recursos transformaria as formas de exploração de modo a se ter um
melhor proveito dos recursos existentes.
Diversas leis surgiram nessa época para melhor embasar este novo ideal, dentre elas o
Estatuto da Terra (Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964) e o novo Código Florestal (Lei
nº 4.771, de 15 de setembro de 1965), que passou a exigir a criação de parcelas dentro das
propriedades rurais e o não-uso das matas ciliares com o intuito de preservar a mata nativa,
com variações de área dependendo de fatores como a vegetação e largura da lâmina d‘água,
existência de nascentes, dentre outras condições especiais.
Outras leis também contribuíram para a conservação ambiental, como a Lei de
Proteção à Fauna (Lei nº 5.197, de 03 de janeiro de 1967), o Código de Pesca e Código de
Mineração (Decreto-Lei nº 221 e Decreto-Lei nº 227, respectivamente, ambos de 28 de
fevereiro de 1967), e o Decreto-Lei nº 289, também de 20 de fevereiro de 1967, que cria o
Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal, com o intuito de colocar em prática
diversas leis criadas na mesma época.
Posteriormente, devido a pressões de outras nações e órgãos internacionais, o Brasil
percebeu a necessidade de adotar uma nova postura das políticas públicas em relação à
poluição e ao uso dos recursos ambientais, resultando assim na criação da Secretaria Especial
do Meio Ambiente (SEMA); criada pelo Decreto nº 73.030, de outubro de 1973, o órgão
possuía caráter autônomo de administração direta com orientação para a conservação do meio
ambiente e o uso racional dos recursos naturais do país.
15
O interessante deste marco na história da legislação ambiental brasileira é que pela
primeira vez foi dada maior atenção à ligação existente entre a necessidade da conservação
ambiental com o desenvolvimento econômico e o bem-estar da população, e a SEMA veio
para suprir essa necessidade, atuando junto a agentes financiadores para recuperar os recursos
naturais afetados, além de auxiliar na promoção da educação ambiental em escala nacional e
cursos especializados voltados para a preservação do meio ambiente.
Dado o primeiro passo, o que veio a seguir construiu os atuais moldes da legislação
ambiental brasileira. Em 31 de outubro de 1981, foi sancionada a Lei nº 6.938, que dispôs
sobre a Política Nacional de Meio Ambiente. Após esta, se seguiu a Constituição Federal de
1988, que trouxe novos rumos e definições para essa discussão, trazendo em seu vigésimo
terceiro artigo, inciso VI, que ―é competência comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios [...] proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de
suas formas‖, e em seu artigo nº 225, que pode ser considerado de maior importância para o
tema, exibe o teor essencial da qualidade de vida de todo cidadão desse bem de uso comum
do povo, que todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Nesse
sentido, cabe então ao Poder Público e à própria coletividade uma série de incumbências,
explicitadas no decorrer do primeiro parágrafo do mesmo artigo.
Todos os incisos do parágrafo possuem como matriz a preservação, proteção e
restauração do meio ambiente, seu manejo adequado e a educação ambiental para assim
promover a conscientização da sociedade, e a punição a quem usar práticas inadequadas que
coloquem em risco a função ecológica da fauna e flora da nação brasileira. É fundamental
destacar que somente após sua criação, a questão ambiental foi consagrada como equivalente
perante outros assuntos já tradicionais, sendo até concebido um capítulo exclusivo para o
tema.
Outra interessante novidade trazida pela Constituição de 1988 e que se encontra no
capítulo do meio ambiente é a alteração de conceitos tradicionais da doutrina penal brasileira.
Anteriormente, só era possível para a pessoa física a sujeição à lei, e com essa mudança a
pessoa jurídica pode ser considerada causadora de danos ao meio ambiente ao devido
processo legal e a provável penalidade prevista em lei para os que forem constatados como
responsáveis (ROCCO, 2002).
Posteriormente surge a Lei dos Crimes Ambientais (Lei 9.605, de 12 de fevereiro de
1998) que, apesar de não ser novidade a existência de legislação para punição de práticas
16
lesivas ao meio ambiente, incorpora os conceitos da Constituição Federal e traz diversas
inovações para consolidar as diversas condutas dispersas ao longo do tempo, além de também
incorporar a já comentada responsabilidade penal da pessoa jurídica nos casos.
Com isso, destacamos também a Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, que regulamenta o
art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VI da Constituição Federal, além de instituir o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), estabelecendo assim ―critérios e normas para
a criação, implantação e gestão das unidades de conservação‖ (art. 1º). O SNUC segue
diretrizes que envolvem a participação da população, mas também buscam apoio de
organizações não-governamentais nas atividades das unidades de conservação. Tais diretrizes
buscam assegurar que ―no conjunto das unidades de conservação estejam representadas
amostras significativas e ecologicamente viáveis das diferentes populações, habitats e
ecossistemas do território nacional e das águas jurisdicionais, salvaguardando o patrimônio
biológico existente‖ (art. 5º inciso I). O SNUC é gerido por diversos órgãos governamentais:
como órgão consultivo e deliberativo, temos o Conselho Nacional de Meio Ambiente
(Conama); como órgão central, o Ministério do Meio Ambiente (MMA); como órgão
executor temos o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama), com caráter supletivo, além do recentemente criado Instituto Chico Mendes de
conservação da Biodiversidade (ICMBio) que assumiu as atribuições do Ibama no que se
refere à gestão de Unidades de Conservação federais, pela Lei nº 11.516, de agosto de 2007.
No caso de Minas Gerais, cabe ao Instituto Estadual de Florestas (IEF) a competência da
administração das unidades de conservação do estado.
1.3 Áreas de preservação do meio ambiente e sua relação com a Reforma Agrária
Desde o Novo Código Florestal Federal (Lei n° 4.771/65), a vegetação ripária,
também conhecida como matas ciliares e de galeria, foram inseridas na categoria de Áreas de
Preservação Permanente (APP), conceituada como ―área protegida [...] coberta ou não por
vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a
estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e
assegurar o bem-estar das populações humanas‖, com texto incluído pela Medida Provisória
nº 2.166-67, de 2001, ou seja, exerce uma fundamental função como protetora dos mananciais
e filtro do escoamento superficial, dentre outros fatores.
17
Em seu artigo 2°, delimita-as como florestas e demais formas de vegetação natural
com largura de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de
largura, 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta)
metros de largura, 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a
200 (duzentos) metros de largura, 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de
200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura, e 500 (quinhentos) metros para os cursos
d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros. Ao redor das lagoas, lagos ou
reservatórios d'água naturais ou artificiais e nas nascentes, e nascentes em qualquer situação,
raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura. No topo de morros, montes, montanhas e
serras; nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na
linha de maior declividade; em restingas, bordas de tabuleiros ou chapadas, e em altitudes
superiores a 1.800 metros, qualquer que seja a vegetação.
A Reserva Legal é definida na mesma lei, com texto incluído pela Medida Provisória
nº 2.166-67, de 2001:
área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de
preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à
conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da
biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.
As propriedades rurais devem ter uma porcentagem de área dentro de seus limites,
salvo alguns casos e exceto as áreas de proteção permanente, para que seja mantida a Reserva
Legal, e o restante da área pode ser suscetível de supressão. a área a ser mantida é de oitenta
por cento, em propriedades rural situadas em área de floresta localizada na Amazônia
Legal, trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na
Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na
forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, vinte
por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação
nativa localizada nas demais regiões do País, vinte por cento, na propriedade rural em área de
campos gerais localizada em qualquer região do País.
Sua localização deve ser aprovada pelo órgão estadual, municipal ou de semelhante
habilitação competente, e devem ser levados em consideração o plano da bacia hidrográfica, o
plano diretor municipal, o zoneamento ecológico-econômico, outras categorias de
18
zoneamento ambiental, e a proximidade com outra Reserva Legal, Área de Preservação
Permanente, unidades de conservação ou outra áreas legalmente protegidas.
As resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) vem dar apoio
ao tema, com diversas especificações na área ambiental. A Resolução n° 1 do CONAMA, de
23 de janeiro de 1986, veio para estabelecer os critérios para o uso e implementação da
Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), e em seu segundo artigo explicita quais atividades
modificadoras do meio ambiente que dependerão da elaboração de Estudo de Impacto
Ambiental (EIA) e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), sendo submetidos
aos órgãos estaduais competentes. Entretanto, quando foi criada, ela não pleiteava projetos de
assentamentos dentre as atividades listadas, e somente com a Resolução n° 237 do
CONAMA, de 19 de dezembro de 1997, os projetos de assentamentos e colonização foram
inseridos no Anexo I da mesma. Ou seja, a partir deste momento que os assentamentos rurais
deixaram de ser vistos como atividades agropecuárias que prezavam a proteção da
biodiversidade e da utilização consciente dos recursos naturais e foi visto como um
empreendimento potencialmente poluidor e ambientalmente degradante (FERREIRA NETO,
2006).
A Resolução n° 289 do CONAMA, de 25 de outubro de 2001, veio para estabelecer
diretrizes para o licenciamento ambiental nos Projetos de Assentamentos de Reforma Agrária,
que até então não havia uma regulamentação específica. A Resolução n° 387 do CONAMA,
de 27 de dezembro de 2006, revogou a Resolução n° 289, e estabeleceu assim os
procedimentos para o licenciamento ambiental nos projetos de assentamentos. É interessante
ressaltar que antes mesmo destas resoluções de cunho nacional, em Minas Gerais foi
estipulada a obrigatoriedade do licenciamento ambiental nos assentamentos rurais pela
Deliberação Normativa n° 44, de 20 de novembro de 2000.
A DN n° 44 já trazia a Licença Prévia (LP), Licença de Instalação (LI) e Licença de
Operação (LO) como integrantes do Licenciamento Ambiental, e os processos exigiam
diversas documentações e procedimentos que poderiam ser encontradas nos anexos da
mesma. Poucos anos depois, foi revogada pela Deliberação Normativa COPAM n° 88, de 13
de setembro de 2005, que trouxe pequenas mudanças no processo de licença especificamente
para projetos de assentamentos de reforma agrária, que variam de acordo com o grau de
significância do impacto ambiental e a data de instalação do assentamento:
19
Autorização Ambiental de Funcionamento – AAF: autorização cedida a
assentamentos que possuem impactos considerados não significativos ao meio
ambiente.
Licença Prévia – LP: licença concedida aos projetos de assentamento em sua fase
preliminar, onde é aprovada sua localização, concepção e viabilidade ambiental.
Licença de Instalação e Operação – LIO: licença que autoriza a implantação e
operação dos projetos de assentamento de reforma agrária, de acordo com o Plano
de Desenvolvimento de Assentamento (PDA), que também consta as medidas de
controle ambiental. Para assentamentos que já existiam antes da criação das
normas, existe a Licença de Operação em caráter Corretivo, que trata dos mesmos
termos da LIO.
A DN COPAM n° 88 possui um anexo que trata do Relatório de Viabilidade
Ambiental, que acompanha o requerimento da LP, vem com diversos questionamentos acerca
da caracterização do empreendimento, principalmente ligadas à vegetação, fauna, recursos
hídricos, relevo, solos, uso da terra, capacidade de uso e o passivo ambiental.
De acordo com o Art. 3° do Decreto n° 44.844, de 25 de julho de 2008, cabe ao
COPAM, por meio de Deliberação Normativa, classificar os empreendimentos quanto a
necessidade de Licenciamento Ambiental ou Autorização Ambiental de Funcionamento, e ao
Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) nos casos que tenham como fim cessão de
uso de água, outorga e envolvidos.
Quando a DN 44 entrou em vigor em 2000, para os assentamentos rurais já existentes
foi assinado um termo de ajustamento de conduta entre o INCRA e o COPAM para assim
realizar uma Licença de Operação Corretiva (LOC) tendo como requisito o Projeto Final de
Assentamento (PFA), que é uma exigência da Licença de Operação (LO) nos casos
convencionais. Seu objetivo é adequar o assentamento rural nos termos da sustentabilidade
ambiental, e para isso é preciso que seja feito um estudo com foco ambiental sobre todas as
condições do local e seus devidos projetos de recuperação do passivo ambiental, junto ao
INCRA e IEF. Vale ressaltar também que todo e qualquer tipo de financiamento
governamental que pode vir a auxiliar os assentamentos, além do próprio uso da terra por eles
em certas situações, depende do licenciamento ambiental obrigatório. As licenças prévia e de
instalação e operação são seqüenciais, sendo que o atraso na concessão de uma implica na
paralisação da outra (FERREIRA NETO, 2006).
20
A Lei nº 14.309, de 19 de junho de 2002, institui as políticas florestais e de proteção à
biodiversidade, traz uma versão do Código Florestal para o estado de Minas Gerais.
Interessante ressaltar que em seu Art. 10 § 1° também é considerada área de preservação
permanente, depois de declarada pelo poder público, destinada a atenuar erosão. Em seu Art.
16 § 1° fica explícita a importância de evitar a fragmentação dos remanescentes de vegetação
nativa, a busca de manter corredores ecológicos, conectando as APPs e RLs. No Art. 17 fica
clara a obrigação do proprietário rural em recompor dentro de sua propriedade a área de
reserva legal degradada, podendo optar por plantio ou isolamento com condução regenerativa,
dentre outras condições.
Entretanto, merece destaque uma condição deste artigo trata da compensação de uma
RL existente em outra propriedade que esteja localizada na mesma microbacia e ecossistema,
de acordo com o parágrafo III, e a aquisição de uma gleba não contínua na mesma bacia
hidrográfica, com constituição de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN, de
acordo com o parágrafo V.
As leis expostas neste capítulo que possuem como foco a questão ambiental em
propriedades rurais, como também as leis que envolvem os assentamentos de reforma agrária,
não estão aqui exibidas em sua totalidade, mas são embasamento suficiente para enriquecer a
discussão acerca do tema e assim progredir a temática da luta pela terra dos movimentos
socioespaciais.
21
2 LUTA PELA TERRA E REFORMA AGRÁRIA NO TRIÂNGULO MINEIRO /
ALTO DO PARANAÍBA: A SITUAÇÃO NO PÓS 1990
2.1 Considerações sobre a questão agrária no Brasil
Para entendermos a importância da terra no Brasil e os diversos motivos que levam
aos conflitos nos dias de hoje, devemos buscar suas origens na história da formação do
território nacional desde o descobrimento e colonização até as atuais intenções
governamentais para aqueles que na terra vivem e dela sua vida dependem.
A Coroa Portuguesa optou pela criação das capitanias hereditárias para garantir assim
a posse e colonização do Brasil, reduzindo custos com a colonização e elaborando as novas
fundações de fonte de renda provenientes da exploração da terra recém-descoberta.
Apesar de não haver caráter financeiro no valor das terras nesta época, sua importância
mercadológica era fundamental para a sustentação do sistema de plantation, criando assim a
base econômica do território brasileiro; desde este momento foi sustentado o favorecimento
dos grandes proprietários de terras no Brasil, que refletiu e ainda reflete na formação agrária
da nação brasileira, mesmo que até o ano de 1850 todas as terras eram propriedade da Coroa
Portuguesa e somente concedidas para uso dos sesmeiros.
Nosso território foi fundado pelos colonizadores com o modelo agroexportador com
produtos nativos e estrangeiros, devido a alta fertilidade da terra para produções de larga
escala, mas com uso de tecnologias importadas da Europa, o que elevou a produtividade.
A Lei de Terras de 1850 (Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850) trouxe grandes
mudanças no paradigma da formação da ocupação agrária no país, pois criou a possibilidade
de compra e venda das terras pertencentes à Coroa, ou seja, transformou a terra em
mercadoria. A transação foi importante para que os grandes proprietários de escravos
pudessem converter suas riquezas à mercê da extinção pela Lei Áurea em outra fonte
patrimonial. Ela deveria
representar um papel fundamental no processo de transição do trabalho escravo para
o trabalho livre, aberto com a cessação do tráfico e, ao mesmo tempo, dar ao Estado
imperial o controle sobre as terras devolutas que desde o fim do regime de
concessão de sesmarias vinham passando de forma livre e desordenada ao
patrimônio particular. (SILVA, 1996, p. 334).
22
Em outras palavras, a Lei de Terras foi a base do latifúndio no Brasil, pois
regulamentou e consolidou o modelo de grande propriedade rural, estruturando até os dias de
hoje a injusta forma como as propriedades de terra são tratadas (STEDILE, 2005).
Como não era permitido que ex-escravos comprassem as novas parcelas de terras
disponíveis, e nem condições financeiras tinham para tê-las, este grande contingente
populacional de quase dois milhões de adultos saem da condição escravista das fazendas e
buscam nas cidades uma alternativa para assim vender sua mão-de-obra. Entretanto, não
houve mudança em sua condição econômica, sem ter condições de poder comprar terras, tanto
na zona rural como na zona urbana, área já dominada pelos capitalistas, restando somente a
condição da criação de casas em zonas que não eram interesse da classe burguesa em
crescimento, formando assim as favelas nas periferias das cidades.
De acordo com Stedile (2005), a saída encontrada pelas elites brasileiras para suprir a
carência de mão-de-obra na zona rural foi trazer os camponeses europeus excluídos do avanço
do capitalismo do final do século XIX. Parte deles foi direcionada a terras no sul do país,
sendo obrigados a entrar com produtos no mercado para conseguir pagar pelas terras
―cedidas‖, e outro contingente foi direcionado para São Paulo e Rio de Janeiro, onde eram
obrigados a trabalhar nas grandes fazendas de café sob o novo regime do colonato.
Diversos conflitos surgiram das divergências entre os grandes latifundiários e os
trabalhadores da zona rural por melhores condições de trabalho e até um pequeno pedaço de
terra onde pudessem viver suas vidas e constituir seus lares com dignidade. Mobilizações
entre os menos favorecidos brotavam como alternativa para enfrentarem as desigualdades no
campo, e várias delas gerou violentos conflitos com inúmeras mortes, como Canudos e
Contestado, a Luta dos colonos nas fazendas de café, dentre outros, que se tornaram o
embrião do que é até hoje o movimento das Lutas Camponesas no Brasil. Nesse contexto o
Partido Comunista Brasileiro (PCB) foi criado, influenciando a eclosão de diversos
movimentos de luta pela terra, voltadas para
o encaminhamento de lutas mais imediatas e cotidianas, como melhores salários,
direitos trabalhistas, abolição de ―vales‖ e ―barracões‖ (instrumentos de
endividamento contínuo dos trabalhadores), apoio à resistência na terra, demanda
por maior prazo e garantia de renovação de contratos de arrendamento, diminuição
do seu valor, diminuição de impostos e frentes. De outro, buscava estimular a luta por reforma agrária, o que supunha um conjunto amplo de alianças políticas
(MEDEIROS, 2003, p.16).
23
Um período deveras conturbado para os grandes latifundiários foi a Era Vargas (1930
– 1945). Segundo Stedile (2005), a crise do modelo agroexportador refletiu em uma crise
política e institucional no Brasil, que provocou a queda do modelo monárquico e deu espaço
ao estabelecimento da República, feito num golpe militar arquitetado pela nascente elite
industrial burguesa, assim impondo um novo modelo econômico para o país.
Apesar de ainda ser dependente da oligarquia rural, a elite industrial tomou o poder de
uma classe não antes questionada. Desse vínculo surgiu um novo setor industrial voltado à
produção de insumos agrícolas, e um novo setor rural chamado agroindústria, que utiliza os
produtos beneficiados pela indústria; desse novo modelo nasce a nova burguesia agrária,
composta pelos grandes proprietários que modernizaram seu modo de produção. A redução
dos trabalhadores na área rural recorrentes da modernização do campo fez com que ocorresse
o inchaço das cidades, aumentando a oferta de funcionários na indústria e reduzindo
drasticamente seus salários.
Seguindo a mesma linha de luta do PCB por melhores condições de trabalho no
campo, mas com divergências quanto aos meios de alcançar o objetivo da conquista da terra,
surge na região nordeste do país as Ligas Camponesas, criada em 1955, que
deve ser entendido, não como um movimento local, mas como uma manifestação nacional de um estado de tensão e injustiças a que estavam submetidos os
trabalhadores do campo e as profundas desigualdades nas condições gerais do
desenvolvimento capitalista do país (OLIVEIRA, 2005, p.23).
Outros movimentos sociais atuantes que se destacaram foram a ULTAB (União de
Lavradores e Trabalhadores Agrícolas), criada em 1954, e posteriormente a CONTAG
(Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), em 1963.
Existiram diversas propostas e planos de reforma agrária criados por diversos
segmentos da sociedade até a criação da Primeira Lei de Reforma Agrária no Brasil. O PCB e
a Igreja Católica foram alguns dos segmentos de cunho social que possuíam a preocupação de
melhor distribuir a terra para o povo, organizando os assalariados e camponeses pelo país
afora.
Vale ressaltar que uma solução para a questão agrária seria obviamente conflituosa
devido divergências de interesses entre socialistas e capitalistas (BORGES, 2010). O Governo
do presidente João Goulart buscava conduzir um processo de reorientação do
desenvolvimento econômico e das reformas sociais, com foco na reestruturação fundiária, o
24
que colaborou na sua derrota pelas armas militares no golpe de 1964. Apesar de a Ditadura ter
sido a época de maior repressão vivenciada pela nação brasileira no decorrer da história, com
casos críticos de violência contra os movimentos sociais, também foi nesse contexto em que
foi criada a Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, que dispunha sobre o Estatuto da Terra.
O Estatuto da Terra, apesar de seu paradoxal contexto de criação, teve significativa
importância como resultado de um longo processo de luta das classes camponesas
comprometidas com a reforma agrária. Considerada uma legislação progressista, possuía
diversas características que iam veementemente contra o novo sistema governamental vigente.
Suas características principais envolvem: um cadastro nacional das propriedades rurais; a
criação e obrigatoriedade do ITR (Imposto Territorial Rural); criou um organismo público
responsável pelos cadastros, colonização de terras públicas e desapropriações (IBRA, que
posteriormente se tornou o INCRA – Instituto Brasileiro de Reforma Agrária); criou o
instituto de desapropriação de propriedades improdutivas ou subutilizadas, uma classificação
geral para as propriedades com base em seu tamanho, utilização e capacidade produtiva;
desapropriação de minifúndios e latifúndios para reagrupamento de áreas e melhor
distribuição de terras; critérios para pagamento de áreas desapropriadas; o conceito e a
possibilidade de cooperativas (STEDILE , 2005a). Um ato puramente contraditório, uma lei
que sequer teve coerência no que regia aos interesses da classe campesina, pois praticamente
todos os poucos movimentos da luta pela terra foram extintos e seus líderes foram mortos ou
exilados na época de sua criação.
O período que se seguiu não teve avanços na questão da reforma agrária no país.
Algumas das cláusulas criadas pela Lei nº 4.504 foram atendidas, mas somente visando abafar
os movimentos sociais e incentivar a capitalização do campo para as empresas rurais,
privatização de terras públicas. Nos anos 1970, o Governo Federal lançou diversos programas
de colonização para áreas não habitadas a fim de substituir a reforma agrária, mas que
beneficiavam somente os médios e grandes latifundiários, que tinham acesso ao crédito rural.
Podemos destacar entre eles o PIN (Plano de Integração Nacional), PROTERRA (Programa
de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste),
POLONORDESTE (Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste),
POLAMAZÔNIA (Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia).
Nesta época já estava em andamento a tardia modernização do campo importada dos
países desenvolvidos, também conhecida como ‗Revolução Verde‘, que consiste na invenção
25
e disseminação de novas sementes e práticas agrícolas com o objetivo de aumentar a produção
nos países periféricos, com ênfase nas décadas de 1960 e 1970, tendo como discurso resolver
o problema da fome no mundo.
Nesse período, embora tenha havido um aumento extraordinário da produção agrícola
devido a utilização de sementes melhoradas, de insumos industriais e mecanização do manejo,
plantio, irrigação e colheita, trouxe grandes prejuízos, tanto ambientais como sociais.
Do ponto de vista ambiental, houve a substituição dos sistemas de rotação de culturas
para o sistema simplificado de utilização de insumos industriais químicos, o que afetou a
estabilidade ecológica em função da poluição e do envenenamento dos recursos naturais e dos
alimentos, assim como pela destruição dos solos e a perda da biodiversidade.
Do ponto de vista social, o avanço tecnológico no campo conduziu ao aumento do
desemprego, do empobrecimento e do êxodo rural em função da concentração da propriedade
da terra, e ao contrário do que preconizado, não diminuiu a fome no mundo.
No Brasil, tais técnicas e implementos tiveram como objetivo aperfeiçoar os processos
de produção do homem do campo, e assim criar laços de dependência e consumo das grandes
empresas produtoras de insumos agrícolas. Entretanto, quando tal revolução não é
acompanhada de uma reforma agrária, seu resultado é simplesmente uma ‗modernização
conservadora‘ que aprofundou a internacionalização da economia e aumento da dependência
de insumos estrangeiros (BRUM, 1985). Para uma melhor visualização dos modelos de
desenvolvimento assumidos na América Latina (Quadro 1).
Quadro 1 - Principais características dos modelos de desenvolvimento da América Latina
Fonte: ALTIERI; MASERA, 1997, p.73 apud BALSAN, 2006, p.127 * Grifo nosso.
Critérios Década de 1970 Décadas de 1980 e 1990
Modelo
econômico
Dominante
Substituição das importações Vantagens comparativas
Características
globais
Protecionismo, supervalorização
das taxas de cambio. Objetivo de
desenvolver a indústria doméstica
aumentando a auto-suficiência.
Liberalização das políticas
comerciais. Equilíbrio nas taxas de
câmbio. Setores-chave em nível
econômico: indústrias de mão-de-
obra intensiva, agricultura orientada
para a exportação.
Setor público Mecanismo econômico.
Fornecimento de subsídios
extensivos.
Racionalização. Venda de empresas
públicas.Eliminação de subsídios.
26
Contexto
internacional
Disponibilidade de capital. Fluxo
de capital líquido para a América
Latina. Endividamento rápido.
Grande e real interesse. Escassez de
capital. Rápida escalada da dívida
externa, gerando crise econômica.
Transferências de capital líquido
para os países industrializados.
Assinatura de acordos regionais de
livre-comércio.
Contexto
político
Ditaduras. Movimentos de
revolta.
Processo de democratização.
Multiplicação das ONGs.
Questões sociais Aumento das diferenças sociais.
Aumento dos salários reais.
Aumento das diferenças sociais.
Diminuição dos salários reais.
Cortes extensivos em programas
sociais.
Agricultura* Fonte de receita para o
desenvolvimento urbanoindustrial
Setor muito dinâmico. Importante
fonte de moeda estrangeira.
Projetos de
rápido
desenvolvimento
industrial
(PRDR)
Objetivo de aumentar a produção
de bens-salários (―wagegoods‖).
Visto também como programa
beneficente.
Drasticamente reduzidos. Objetiva
PRDR negociável.
Ambiente Em deterioração. Grande impacto
negativo dos ―projetos de
desenvolvimento‖.
Rápida deterioração em áreas rurais
e urbanas.
O modelo de desenvolvimento adotado pelo continente e pelo Brasil ficou conhecido
como ―modernização conservadora‖ ou ―modernização excludente‖, o que também se
reproduziu no modelo agrícola brasileiro, como afirma Balsan (2006, p.137):
A estratégia da modernização conservadora diante da inovação tecnológica salientou
as características do ―modelo‖ agrícola brasileiro, capitalista, dependente,
concentrador, dominador, exportador e excludente. Com a modernização capitalista
e com o processo de globalização da economia, cresceu a instabilidade do emprego
no campo, onde pequenos produtores, face à insuficiência dos seus meios de
produção, necessitaram vender sazonalmente sua força de trabalho em outros
estabelecimentos agrícolas. A extensa jornada de trabalho na produção familiar
obriga os seus elementos à auto-exploração para permanecerem no campo. Uma das
conseqüências mais significativas da introdução de formas capitalistas de produção
no campo tem sido a multiplicação do trabalho temporário e a dependência maior de formas esporádicas de trabalho entre categorias sociais como bóias-frias e familiares
não-remunerados.
Como apresentado, esse novo padrão de desenvolvimento econômico vem sendo
marcado pela exclusão do homem do campo pela diminuição de postos de trabalho e,
consequentemente, pela diminuição de renda das populações rurais. Outra questão diz respeito
a ampliação da monocultura fins comerciais e de exportação(Gliessman, 2000, p.35 apud
BALSAN, 2006, p.130).
27
A monocultura é uma excrescência natural de uma abordagem industrial da
agricultura, em que os insumos de mão-de-obra são minimizados e os insumos
baseados em tecnologia são maximizados com vistas a aumentar a eficiência
produtiva. As técnicas de monocultivo casam-se bem com outras práticas da
agricultura moderna: a monocultura tende a favorecer o cultivo intensivo do solo, a aplicação de fertilizantes inorgânicos, a irrigação, o controle químico de pragas e as
variedades especializadas de plantas. A relação com os agrotóxicos é
particularmente forte; vastos cultivos da mesma planta são mais suscetíveis a
ataques devastadores de pragas específicas e requerem proteção química.
Para além dos danos ambientais, os prejuízos sociais se ampliam com o processo de
êxodo rural, contribuindo para a exclusão social e econômica. Esse cenário conduziu ao
crescimento dos movimentos sociais voltados para a luta pela terra a partir da abertura política
empreendida pelo governo militar. Merece destaque o surgimento do Movimento dos
Trabalhadores Sem-Terra (MST) que embora formalizado em janeiro de 1984, iniciou suas
atividades no final da década de 70 no estado do Rio Grande do Sul. Emerge como um
produto social e político que envolvem:
desde as condições políticas repressivas do período autoritário, e o ativismo político
daí decorrente, às ações de mobilização e politização organizadas por setores
radicalizados do clero católico, dos efeitos da vigorosa modernização agrícola da década citada à história política das comunidades rurais do Sul do Brasil (onde o
Movimento primeiramente organizou-se), ou ainda, da abertura política iniciada em
1979 aos processos sociais que acabaram impulsionando um ―ciclo de protesto‖ em
áreas rurais daquela região brasileira (NAVARRO, 2002, p.3).
Entre os movimentos sociais que surgiram nos anos de transição política, o MST
apresenta a mais forte identidade social e tem sido capaz de bem definir a sua base social e
motivá-la. Em meados dos anos 1980 organizou-se nacionalmente estabelecendo como base
social os ―mais pobres entre os pobres do campo‖, normalmente grupos sociais de ocupação
episódica, sem moradia definida, sem acesso à escolaridade e, quase sempre, facilmente
vítimas de manipulações políticas de toda ordem‖ (NAVARRO, 2002, p.13).
Sua luta, portanto, se volta para a alteração do padrão de propriedade da terra
historicamente consolidado, ou seja, nas mãos de uma minoria que sempre usufruiu dos
privilégios Estatais. Suas ações, no entanto, não se limitam somente às ocupações de terra
como sua arma de luta e de pressão, como é divulgado pela mídia. Ao contrário, avança em
28
diversas áreas e com uma expressiva capacidade de mobilização como afirma Navarro (1997,
p.87):
Em suas estratégias de ação, os sem-terra podem ostentar, no período, uma gama de
atividades e iniciativas surpreendentes. Suas formas de pressão, por exemplo, não se
restringem simplesmente às ocupações, mas incluem um repertório extraordinário de
táticas e ações diversas, desde as ocupações de próprios públicos, até as formas mais
usuais de intensas negociações, marchas, jejuns, ―atos públicos‖ de duração mais curta, abaixos-assinados, etc. Mais ainda, se ampliada a noção de ―luta social‖, o
Movimento tem tido intensa atividade em muitos outros campos, como as
inevitáveis ações de comércio e industrialização de produtos agrícolas produzidos
nos assentamentos, as iniciativas nos campos da educação de crianças e
alfabetização de adultos, além de atividades jornalísticas próprias,como o jornal do
Movimento, pequenas e inovadoras atividades em rádio e até mesmo a home Page
recentemente criada.
Suas ações promoveram uma renovação política no meio rural com a multiplicação
dos assentamentos em todos os estados do país, pressionando os governos a assumirem o seu
compromisso, inscrito na agenda política brasileira, referente à reforma agrária. As ocupações
de terra, uma das estratégias de pressão realizada pelo MST, foram decisivas para impulsionar
o programa de reforma agrária, forçando o Estado a dar respostas mais ágeis diante do
conflito instalada. Para Navarro (1987), o ano em que a administração federal mais avançou
no programa de formação de novos assentamentos é convergente ao número de ocupações
realizadas, reforçando o protagonismo do movimento no cenário político e social brasileiro.
Tais questões serão agora discutidas a partir dos assentamentos realizados nas últimas décadas
e os obstáculos enfrentados.
2.2 Os assentamentos de reforma agrária no Brasil: considerações sobre as ocupações
O Brasil passou por diversos governos após a ditadura, e com eles a crescente
mobilização da população na luta pela terra. Locais onde há propriedades de grande porte e
supostamente improdutivas se tornaram alvo dos sem-terra durante décadas, destacando a
grande concentração de ocupações na região Centro-Sul, Nordeste e leste da região Norte
(Mapa 1).
29
Mapa 1: Brasil – Geografia das ocupações de terra – Ocupações entre 1988-2010
Fonte: DATALUTA 2011.
As conseqüências das diversas ocupações têm, obviamente, como fundamental
objetivo a conquista pela terra e a resultante criação dos assentamentos. A região Norte já é o
lar de mais de 444.724 famílias daqueles que já um dia lutaram para conquistar um espaço
onde pudessem morar e trabalhar, seguida da região Nordeste, com mais de 333.289 famílias
já assentadas (Tabela 1).
30
Tabela 1: Brasil – Número de assentamentos, famílias e área por Estado e
macrorregiões entre 1979-2010
Fonte: DATALUTA, 2011
31
As regiões que obtiveram maior sucesso em número de assentamentos criados são o
Nordeste e Norte, sendo o Sudeste a região com o menor, mas não menos importante, número
de assentamentos no território brasileiro (Gráfico 1).
Gráfico 1: Número de Assentamentos por Macrorregião criados entre 1979-2010.
Fonte: LAGEA, DATALUTA, 2011.
Org.: MAYWALD, F., 2011.
Durante o mandato do Presidente José Sarney foi criado o Ministério da Reforma e
do Desenvolvimento Agrário (MIRAD) e a primeira Política Nacional do Meio Ambiente,
que visavam a redemocratização da terra e diversas metas a curto, médio e longo prazo.
Obviamente não foi visto com bons olhos, e após diversas mudanças que surgiam para
dificultar a efetivação do projeto, surgiram os primeiros assentamentos rurais em Minas
Gerais, totalizando doze. Um número bem abaixo do necessário para atender a real demanda,
mas vale ressaltar que todos ocorreram a partir de desapropriação, que demonstra o interesse
da redistribuição de terras para exercer seu papel social (SOUZA, 2010).
No governo Collor houve uma contra-proposta perante o projeto de reforma agrária
iniciado no governo anterior, explicitamente reforçado com a extinção do MIRAD. Entretanto
no governo Itamar veio à tona novamente a iniciativa da reforma agrária com a criação do
Programa de Valorização da Pequena Produção Rural (PROVAP), para destinar créditos aos
agricultores familiares. No entanto, a maioria dos assentamentos citados como criados na
4.049
1.977
1.203
806 787
0
500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
3.500
4.000
4.500
NORDESTE NORTE CENTRO-OESTE SUL SUDESTE
32
época foram legitimados do governo anterior, sendo que somente seis foram criados: um por
doação, dois por compra e três por desapropriação.
Já no governo Fernando Henrique Cardoso, as decisões adotadas a favor de uma
política neoliberal colocavam em risco a produção de alimento para o mercado interno e o
incentivo para o mercado externo, atingindo diretamente o pequeno produtor. Tal situação
criou uma pressão vinda dos movimentos sociais de luta pela terra por melhores condições de
vida, resultando na criação de diversos assentamentos e programas voltados ao incentivo
rural, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF),
dentre outros.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva teve grande apoio das entidades populares de
luta pela terra, o que trouxe consideráveis benefícios para o movimento no que tange a
questões políticas sobre o caso. Entretanto, a influência da bancada ruralista indicou o
responsável pelo cargo do Ministério da Agricultura. O resultado foi uma série de metas para
o setor agrário sem seus objetivos alcançados.
O governo FHC tratou a reforma agrária com uma política compensatória a fim de
minimizar o problema socioeconômico dos excluídos, atendendo parcialmente suas
reivindicações em regiões extremamente conflituosas (FERNANDES, 2001 apud
MEDEIROS, 2009). E a luta não para com a conquista da terra, pois ainda existem diversos
problemas que inviabilizam a permanência na área, como falta de infra-estrutura, moradia,
energia elétrica, educação, saúde e crédito agrícola, com diversos exemplos para serem
citados com a ausência destes serviços.
Entretanto, de 1995 a 2002 foram assentadas 524.380 mil famílias e desapropriados
aproximadamente 20 milhões de hectares. Vale ressaltar que deste significativo número de
hectares desapropriados, cerca de 90% foram realizados a partir de ocupações de terra pelos
movimentos camponeses (FERNANDES, 2001 apud MEDEIROS, 2009). Durante esse
período, as ocupações ultrapassaram 2.900 com o envolvimento de mais de 421 mil famílias.
Existe um processo que demanda meses para que um grupo de sem-terra tenha a
iniciativa de cortar as cercas de um latifúndio, e é somente dessa forma que os camponeses
em busca de terra realmente se manifestam de forma impactante e não podem mais ser
ignorados. Entretanto, os conflitos nesse cenário são intensos, pois a intolerância do Estado
para a criação dos acampamentos é rígida. A violência e repressão coercitiva e política
reprime a grande maioria dos movimentos do campesinato com a intolerância estimulada pelo
33
Estado e financiada pelos grandes latifundiários. Fernando Henrique Cardoso, em seu
segundo mandato, criou a Medida Provisória n° 2.109-52, de maio de 2001, que criminalizava
as ocupações de terras e privilegiava os grandes donos de terras, desestimulando e
inviabilizando assim os assentados; nessa época a mídia foi uma forte aliada na luta contra os
sem-terra. O resultado é o grande paradoxo marcado por um governo que, ao mesmo tempo
em que assentou um grande número de famílias, criou diversas formas de criminalizar as
ocupações (FERNANDE, 2001 apud MEDEIROS, 2009).
O governo Lula foi visto com grande esperança por todos os envolvidos com a questão
da reforma agrária, pois o presidente, com origem na classe trabalhadora, tinha como meta de
assentar 400 mil famílias em seu mandato, meta essa que não foi cumprida Quando eleito,
mesmo com o apoio da maioria das entidades populares de luta pela terra, a bancada ruralista
se mantém forte, cabendo a ela a indicação do ministro da Agricultura, que priorizou o
desenvolvimento rural voltado para o agronegócio e a exportação, o que agravou mais ainda
os conflitos entre os proprietários e os sem-terra.
De acordo com Souza (2010, p.52), apesar do plano de metas para o setor agrário
apresentado durante a campanha de Lula que previa ―a ampliação do programa de
fortalecimento da agricultura familiar e dos assentamentos de Reforma Agrária; o crédito
rural; educação para o meio rural; luz para todos; associativismo e cooperativismo entre tantas
outras que, como a maioria destas citadas, não conseguiu alcançar seu objetivo‖, que exigia
medidas de alteração da estrutura fundiária.
Como resultado positivo, embora insipiente, tem-se as ações desenvolvidas pelo
Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) com a elaboração do o
II Plano Nacional de Reforma Agrária (II PNRA), ―que retomava a necessidade de se
estabelecer políticas coerentes voltadas ao pequeno produtor e a criação de novos
assentamentos rurais no Brasil‖ (SOUZA, 2010, p.53).
Dentro da atual política direcionada pela concepção neoliberal, podemos afirmar que
os assentamentos emergem não como uma forma de representação socialmente construída em
decorrência dos movimentos populares, mas como políticas compensatórias sem grandes
investimentos, que impossibilitam uma efetiva inclusão social por meio da promoção de uma
agricultura camponesa sólida.
34
2.3 Os assentamentos de Reforma Agrária em Minas Gerais no Pós 1990
Discorrer sobre a questão agrária em Minas gerais e, especificamente nas regiões do
Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba exige, num primeiro momento, a compreensão do
processo histórico de constituição do espaço agrário no Estado. Segundo Vale, Lourenço e
Lucas (2009), o desenvolvimento da atividade agropecuária se deu, inicialmente, para o
atendimento do mercado interno, especificamente direcionada aos complexos mineradores,
sendo utilizada a força de trabalho escrava bem como camponesa. Na época, com a intenção
de diminuir os custos, os grandes proprietários concediam terras para essas famílias
garantirem o seu sustento, o que também garantia o controle sobre esses trabalhadores pelo
monopólio da sua produção e alto poder de barganha.
Tal prática se deu em função da grande disponibilidade de terra, cuja extensão não era
explorada pelos seus proprietários, que posteriormente foi associada ao grande número de
homens livres e pobres, grande parte originária da estrutura mineira escravagista. Dentro
desse formato, o proprietário da terra passa a assumir o papel de comerciante ao financiar a
produção, monopolizar as máquinas de beneficiamento e controlar sua comercialização, se
tornando uma fonte rentável.
Esse modelo de produção perdurou até a década de 1960, quando o processo de
modernização agrícola avança para as áreas rurais do Estado. O processo de concentração da
propriedade fundiária aumenta nas duas décadas subseqüentes, quando o Estado passa a
oferecer a concessão de subsídios e incentivos fiscais, o que leva à expulsão dos agregados,
posseiros e pequenos proprietários.
Tal movimento, longe de ser pacífico, culminou em conflitos pela terra, sendo
registrados 31 casos no ano de 1981 e 200 casos em 1990 (MINAS GERAIS, 1995 citado por
ÁVILA, 1999, p.30), geralmente contra os trabalhadores sem terra envolvidos em
movimentos de ocupações, sendo que muitos culminaram em vítimas fatais. Segundo os
dados da Comissão da Pastoral da Terra, de 1985 a 2005 foram registradas 75 mortes no Estado
de Minas Gerais.
Minas Gerais é o estado da região Sudeste que possui o maior número de
assentamentos, em torno de 49%, como mostra o gráfico 2.
35
Gráfico 2: Número de Assentamentos criados por Estado no Sudeste entre 1979-2010.
Fonte: DATALUTA, 2011.
Org.: MAYWALD, F., 2011.
As políticas do Governo influenciam significativamente no número de assentamentos
criados no Brasil, não somente no estado de Minas Gerais. Como pode ser observado no
Gráfico 3, nos governos Sarney e Collor/Itamar a criação de assentamentos era uma prática
rara e pouco incentivada, enquanto nos governos seguintes o aumento foi considerável. Tal
análise deve ser levada em conta quando se pensa na questão agrária para assim compreender
a configuração nacional dos movimentos de luta pela terra.
Gráfico 3: Número de Assentamentos criados em Minas Gerais de acordo com o governo.
Fonte: DATALUTA, 2011.
Org.: MAYWALD, F., 2011.
383
248
8967
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
MG SP ES RJ
0
20
40
60
80
100
120
SARNEY 1985-1989
COLLOR / ITAMAR
1990-1994
FHC 1 1994-1998
FHC 2 1998-2002
LULA 1 2002-2006
LULA 2 2006-2010
12 14
10285
107
52
36
Porém, quando analisado este montante numa perspectiva nacional, considerando o
território do Estado, sua representatividade é muito pequena, como analisaram Souza,
Gonzaga e Cleps Jr (2010) apresentada na tabela Y, discriminadas pelos períodos
governistas:2
Tabela 2 – Número de assentamentos criados em Minas Gerais e no Brasil, comparativo por
governo
Org.: GONZAGA, H.T.; SOUZA, L. C., 2010. Base: PROJETO DATALUTA, 2009.
Anos Governos Assentamentos criados % do número de
assentamentos criados em
Minas e no Brasil MINAS BRASIL
1985 – 1989 SARNEY 12 516 2,3
1990 – 1994 COLLOR /ITAMAR 13 369 3,5
1994 – 1998 FHC 1 102 2329 4,4
1998 – 2002 FHC 2 85 1975 4,3
2002 – 2006 LULA 1 107 2383 4,5
2006 - 2009* LULA 2 29 836 3,4
TOTAL 349 8408 4,1
Obs.: * O ano limite de obtenção dos dados foi em 2009
O início da luta pela terra no Triângulo Mineiro / Alto Paranaíba não se difere das
razões já elencadas. Com a decadência da economia de mineração, a economia fundada em
bases agropecuárias se estrutura na região em função da sua localização geográfica em relação
à São Paulo, considerando a expansão urbana e industrial da capital. A partir da década de
1950, e com maior intensidade nas décadas de 1960 e 1970, passa a receber numerosos
incentivos estatais, ou seja, crédito barato a um pequeno número de produtores, que
conduziram ao processo de modernização da atividade agrária, sendo o cenário econômico da
região transformado pela incorporação das áreas de cerrado ao processo produtivo, como
afirmam Gomes e Cleps Jr (s/d).
As estratégias desenvolvimentistas e integracionistas do governo militar tinham
entre os seus objetivos primordiais o desenvolvimento industrial e a expansão da
fronteira agrícola. A ocupação dos cerrados do Triângulo Mineiro constituiu parte
integrante dessas estratégias, inclusa no Plano Nacional de Desenvolvimento,
concebido neste período. Várias iniciativas governamentais se configuraram para
apoiar este processo, destacando-se o PCI (Programa de Crédito Integrado e
Incorporação dos Cerrados), a partir de 1972; o PADAP (Programa de
Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba), 1973; o POLOCENTRO (Programa de
Desenvolvimento dos Cerrados), 1975; e o PRODECER (Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados), a partir de 1975 (GOMES;
CLEPS JR, s/d).
37
Essas iniciativas de caráter modernizador trouxeram para a região, assim como para
todo o país, o acirramento das contradições sócio-econômicas em decorrência do
privilegiamento dos grandes proprietários, o que conduziu ao agravamento dos conflitos de
classe na área rural, como também afirmam os autores:
Tais linhas de desenvolvimento regional permitem, por outro lado, a identificação de
uma burguesia agrária presente no Triângulo Mineiro, constituída a partir de interesses locais, estatais, e até mesmo estrangeiros, e que associa, constantemente,
interesses e investimentos no mundo agrário a objetivos urbano-industriais. Bem
organizada, têm em suas ações políticas estratégias claramente anti-reformistas, o
que pode ser observado no poder exercido no processo de contenção da Reforma
Agrária na Constituinte de 88 e no próprio movimento coordenado pela UDR –
União Democrática Ruralista (GOMES; CLEPS JR, s/d).
Nas décadas de 1970 e 1980, teve como principais atores os Sindicatos de
Trabalhadores Rurais (SRT‘s) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), entretanto não havia
ainda uma organização bem definida ou com metas significativas (CARVALHO, 2011). Entre
1988 e 2010, os movimentos de luta pela terra de maior significância e com abrangência
numérica relevante foram a CONTAG, FETRAF, LCP, LOC, MLST, MST e MTL, quando
surgiram os primeiros movimentos socioterritoriais em Minas Gerais, concomitante à
elaboração do I Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA) (SOUZA, 2010), organismos
diretamente envolvidos pela luta de democratização da terra.
38
3 OS ASSENTAMENTOS FLÁVIA NUNES E CANUDOS E SUAS CONDIÇÕES DE
ADEQUAÇÃO À LEGISLAÇÃO AMBIENTAL
3.1 Caracterização do Município de Uberlândia
O município de Uberlândia se localiza na região do Triângulo Mineiro (TM), no
extremo Oeste do estado de Minas Gerais (MG), na latitude 18°56‘38‘‘ Sul e longitude
48°18‘39‘‘ Oeste, de acordo com o Mapa 2. Antigamente conhecido como Sertão da Farinha
Podre, hoje Uberlândia ocupa uma área de 4.115,82 km², sendo que grande parte corresponde
à área rural, 3.896,82 km², e 219 km² de área urbana (PMU, 2010). Possui como limites
geográficos os municípios de Veríssimo e Uberaba ao sul, os municípios de Tupaciguara e
Araguari ao norte, o município de Indianópolis a leste e os municípios de Prata e Monte
Alegre de Minas a oeste. Possui população estimada em torno de 634.345 habitantes,
densidade demográfica de 151,23 habitantes por km², e é considerada a 3ª cidade mais
populosa de Minas Gerais.
Mapa 2: Localização do Município de Uberlândia.
Carrijo e Baccaro (2000) citam o município de Uberlândia no domínio dos Planaltos e
Chapadas da Bacia Sedimentar do Paraná, mais especificamente na sub-unidade do Planalto
39
Meridional da Bacia do Paraná, com relevo tabular e levemente ondulado, com altitude
inferior a 1.000 m. Os solos são ácidos e pouco férteis, tipo latossolo vermelho-amarelo,
argiloso-arenoso.
O clima dominante na região é do tipo Cwa (Mesotérmico; chuvas de verão; verões
quentes e invernos brandos) – Clima Tropical Úmido, segundo a classificação Koppen. Possui
duas estações bem definidas, com verão chuvoso e inverno seco, pluviosidade anual estimada
em torno de 1.500 mm e temperatura média de 21,4° C.
Segundo Brito e Prudente (2005), o município de Uberlândia está inserido no Bioma
Cerrado, com a vereda, campo limpo, campo sujo, cerrado stricto sensu, cerradão, mata de
várzea, mata de galeria ou ciliar e mata mesofítica como principais tipos fisionômicos. Sua
hidrografia tem como principais cursos d‘água o Rio Uberabinha e seu afluente Bom Jardim,
inseridos na bacia do rio Paraná.
Uberlândia possui destaque na produção agropecuária na região. Dados (2008-2009)
de sua produção agrícola apontam considerável participação no mercado de grãos (soja –
140.760 ton, milho – 129.600 ton, sorgo granífero – 2.731 ton, feijão – 1.380 ton, arroz – 44
ton) e diversos (olericultura – 19.600,5 ton, laranja – 10.500 ton, banana – 8.250 ton, café –
1.142,4 ton). Sua produtividade de soja é de 3.060 kg/ha, maior que a média nacional (2.629
kg/ha), estadual (2.961 kg/ha) e da região do Triângulo Mineiro (2.884 kg/ha). No setor
pecuário, seu rebanho bovino chega a 229.879 toneladas no mesmo período, com produção
anual de 86.500.00 litros de leite, produção anual de carne de 13.400 toneladas e 1.809
criadores de bovinos registrados. Também vale salientar que a avicultura de corte possui
produção de 31.269 toneladas/ano, avicultura de postura com produção de 83.300 caixas de
ovos por ano, apicultura com produção de 7,5 toneladas/ano e suinocultura com produção que
chega a 19.608 toneladas/ano.
Uberlândia é o quarto município com maior número de assentamentos em Minas
Gerais (Gráfico 4), e o primeiro no Triângulo Mineiro / Alto Paranaíba, demonstrando
tamanha importância de uma análise mais aprofundada a respeito da criação de assentamentos
na região. O município já conta com 15 assentamentos, todos criados a partir do Governo
Fernando Henrique Cardoso até o fim do Governo Lula. No entanto, a área média dos
assentamentos é pequena se comparado ao restante do país, também com menor número de
famílias, salvo exceções PA Dom José de Mauro e Nova Tangará, que possuem tamanho
considerável e grande número de famílias (Tabela 3).
40
Gráfico 4: Número de Assentamentos criados em municípios de Minas Gerais com maior
incidência.
Fonte: DATALUTA, 2011.
Org.: MAYWALD, F., 2011.
Tabela 3: Assentamentos criados no Município de Uberlândia.
Fonte: DATALUTA, 2011.
Org.: MAYWALD, F., 2011.
NOME DO ASSENTAMENTO CAPACIDADE DE FAMÍLIAS
FAMÍLIAS ÁREA (HA) CRIAÇÃO GOVERNO
PA RIO DAS PEDRAS 87 84 1.908 1998 FHC 1
PA PALMA DA BABILÔNIA 13 11 465 1999 FHC 2
PA ZUMBI DOS PALMARES 22 22 492 1999 FHC 2
PA NOVA PALMA 15 15 445 1999 FHC 2
PA MARINGÁ-MONTE CASTELO 62 62 2.021 2001 FHC 2
PA NOVA TANGARÁ 250 247 5.090 2003 LULA 1
PA FLÁVIA NUNES 17 15 433 2004 LULA 1
PA CANUDOS 24 24 682 2004 LULA 1
PA ELDORADO DOS CARAJÁS 30 22 608 2006 LULA 1
PA EMILIANO ZAPATA 24 24 645 2004 LULA 1
PA JOSÉ DOS ANJOS 45 44 1.015 2005 LULA 1
PA FLORESTAN FERNANDES 22 22 494 2005 LULA 1
PA PACIÊNCIA 25 25 468 2005 LULA 1
PA VALCI DOS SANTOS 42 36 802 2008 LULA 2
PA DOM JOSÉ MAURO 200 179 4.470 2009 LULA 2
O primeiro assentamento rural criado no município de Uberlândia foi PA Rio das
Pedras, considerado ainda um dos maiores assentamentos rurais da região, tendo sido criado
no primeiro mandato do Governo FHC. Entretanto, a maior parte dos assentamentos rurais
22
17 16 15
12 1210 10 9
0
5
10
15
20
25
41
localizados no município tiveram sua criação no primeiro e segundo mandato do Governo
Lula.
3.2 Os assentamentos selecionados
Foram analisados dois assentamentos dentre os quinze que surgiram pela ação de
reforma agrária situados no município de Uberlândia, Projeto de Assentamento Flávia Nunes
e Canudos (Mapa 3). A idéia inicial consistia em realizar um comparativo entre um
assentamento que estivesse de acordo com a legislação vigente e outro que enfrentasse
dificuldades de adequação, entretanto alterações foram necessárias na escolha dos projetos de
assentamento devido a ausência de um que atendesse tais quesitos de adequação, sendo que o
novo critério de escolha levou em consideração o interesse dos moradores dos dois projetos
de assentamento em adequar às leis, sendo que um fosse o mais próximo da adequação e o
outro mais distante das condições de atendimento da legislação. Destacamos que os dois
projetos de assentamento selecionados tiveram o MST como principal atuante na luta pela
conquista da terra.
42
Mapa 3: Localização dos Assentamentos estudados no Município de Uberlândia.
Org: GENARO, M. F.
Modificado por: MAYWALD, F.
Os estudos tiveram como base dados documentais contidos nos Planos de
Desenvolvimento de Assentamento (PDA) das duas propriedades, documentos referentes a
memorial fotográfico, cartas e mapas de variadas classes de análise obtidos no INCRA e na
empresa prestadora de serviços Agrolago, bem como relatos dos moradores durante o
trabalho de campo.
3.2.1 Projeto de Assentamento Flavia Nunes
Localizado em latitude 19°11‘45,56810‖ S, longitude 48°17‘01,58790‖ W, altitude
806,9257 m HAE, UTM N-7.875.271,9246 m E-785.678,8935 m, situado há
aproximadamente 30,6 km da sede do município de Uberlândia, a Fazenda Água Limpa, antes
43
conhecida também como Fazenda Gameleira, cedida ao INCRA devido irregularidades
ambientais e direcionada à criação do Projeto de Assentamento Flávia Nunes.
A propriedade está situada no domínio dos Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar
do Paraná, grande parte de sua composição pedológica são Latossolos Vermelhos (61,8%) e
Latossolos Vermelhos com Argilossolos Vermelho-Amarelos (33,4%), profundos, bem
drenados e com textura média. O restante é composto por Gleissolos Melânicos (4,8%),
hidromórficos, mal drenados, com forte gleização (D‘ÁVILA et al., 2006). Os recursos
hídricos disponíveis no Assentamento Flávia Nunes são o ribeirão Água Limpa em sua
confrontação norte, que é permanente, e três nascentes no interior no assentamento que
deságuam no mesmo. Estas nascentes estão disponíveis somente parte do ano. Entretanto o
potencial hídrico foi classificado no Plano de Desenvolvimento do Assentamento (PDA)
como aceitável e passível de disponibilidade durante todo o ano.
Figura 1: Projeto de Assentamento Flávia Nunes: Imagem de satélite com as divisões entre os
lotes, APP e RL, e fotos demonstrativas de moradias (A, B e D) e colheita (C) (sem escala).
Autor: MAYWALD, F. 2011. AGROLAGO.
Org.: MAYWALD, F. 2011.
44
O histórico de conquista do assentamento foi iniciado com a ocupação da fazenda São
Domingos, no município de Tupaciguara, em abril de 1999, por 87 famílias organizadas pelo
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Houve despejo da propriedade e iniciaram
outro acampamento na área do atual assentamento Zumbi. Houve nova tentativa no mesmo
mês na fazenda Palma da Babilônia, também sem êxito devido conflitos entre outras famílias
de sem-terras, e retornaram ao assentamento Zumbi. A seguinte tentativa foi em junho de
1999 na fazenda Douradinho, sem êxito devido ausência de acordo entre o proprietário e o
INCRA. Em agosto do mesmo ano, organizaram um novo acampamento próximo ao rio
Uberabinha, próximo à Uberlândia, posteriormente ocuparam a fazenda Garupa, entretanto
foram repreendidos pela força policial e somente alguns retornaram novamente ao
assentamento Zumbi. Em janeiro de 2001, cerca de 180 famílias ocuparam uma área da
Prefeitura Municipal de Uberlândia, denominada Fundação Educacional Rural de Uberlândia
(FERUB), e permaneceram nesta área até janeiro de 2004, onde somente quinze destas
famílias foram realocadas para a fazenda Água Limpa, atual Projeto de Assentamento Flávia
Nunes (Figura 1), devido o pequeno espaço da propriedade, e o restante das famílias se
deslocou para as fazendas Bebedouro e Santa Luzia (D‘ÁVILA et al., 2006).
Seus moradores possuem suas origens de diversos municípios mineiros, dentre eles os
que merecem maior representatividade por parcela considerável são Carmo do Paranaíba,
João Pinheiro e Lagoa Formosa, com média entre duas e três pessoas por família e poucos
com faixa etária abaixo da adulta. Possuem organização em forma de Assembléia e todos os
moradores são responsáveis pelas decisões do assentamento, com maioria participativa nos
assuntos coletivos.
3.2.2 Projeto de Assentamento Canudos
Localizado há aproximadamente 39 km em relação à sede do município de
Uberlândia, a Fazenda Bebedouro foi vendida ao INCRA por interesse do antigo proprietário
para assim se tornar o Projeto de Assentamento Canudos em 09/11/2004. Possui como área
total registrada 585,7419 ha e 691,5012 ha de área medida, área requerida na lei de Reserva
Legal de 138,3002 ha e efetiva a ser averbada de 143,7042 ha, e por fim a Área efetiva de
Preservação Permanente de 90,6872 ha. Habitam no assentamento atualmente 24 famílias,
com área média das parcelas de 18,3585 ha (D‘ÁVILA et al., 2006).
45
Situada no domínio dos Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar do Paraná, grande
parte de sua composição pedológica são Latossolos Vermelhos (61,8%) e Latossolos
Vermelhos com Argilossolos Vermelho-Amarelos (33,4%), profundos, bem drenados e com
textura média, propícios para a agricultura, entretanto possuem grande suscetibilidade à
erosão. O restante é composto por Gleissolos Melânicos (4,8%), hidromórficos, mal drenados,
com forte gleização (D‘ÁVILA et al., 2006). Os recursos hídricos disponíveis no
Assentamento Flávia Nunes são o ribeirão Água Limpa em sua confrontação norte, que é
permanente, e três nascentes no interior no assentamento que deságuam no mesmo. Estas
nascentes estão disponíveis somente parte do ano, entretanto o potencial hídrico foi
classificado no Plano de Desenvolvimento do Assentamento (PDA) como aceitável e passível
de disponibilidade durante todo o ano.
Situada no domínio dos Planaltos e Chapadas da Bacia Sedimentar do Paraná, grande
parte de sua composição pedológica são Latossolos Vermelhos com relevo plano suave
ondulado (20%), Latossolos Vermelhos com relevo plano, suave ondulado e ondulado (70%),
associação de Gleissolos Melânicos Distrófico com Gleissolos Háplicos Tb Distrófico ou
Eutrófico ambos indiscriminados fase campo higrófilo de várzea relevo plano (5%) e
Cambissolos Háplicos fase campo cerrado relevo ondulado e forte ondulado (5%). Os
Latossolos Vermelhos, que representam 90% da área, são solos friáveis e bem drenados,
apresentando perfis profundos, com bastante porosidade. Normalmente, são muito resistentes
à erosão e, por conseguinte, o manejo destes solos para fins de produção agrícola demanda o
emprego de calcário para a correção da acidez. Já os Cambissolos são solos jovens, rasos e
mais difíceis de serem manejados (D‘ÁVILA et al., 2006).
Cerca de 67% da área do assentamento possui declividade entre 0 e 5%, que pode ser
considerada plana e favorável a atividades agropecuárias. Integram os recursos hídricos do
assentamento o Córrego Bebedouro, que atravessa a região central do Assentamento e
também margeia uma das divisas do Assentamento, o Córrego Olhos d‘Água, que corta a
porção oeste do Assentamento e deságua no Córrego Bebedouro, e o Córrego Mulata, que é o
limite natural do Assentamento.
46
Figura 2: Projeto de Assentamento Canudos: Imagem de satélite com as divisões entre os
lotes, APP e RL, e fotos demonstrativas de moradias (A, B e D) e colheita (C) (sem escala).
Autor: MAYWALD, F. 2011. AGROLAGO.
Org.: MAYWALD, F. 2011.
A história do Assentamento Canudos inicia com a ocupação da Fazenda Vitorinha,
município de São Simão, estado do Goiás, em 28 de março de 2001, por famílias Sem Terra
organizadas pelo MST – Triângulo Mineiro. Após dois dias, o despejo realizado pelos
policias foi agressivo e conclusivo, e todos que continuaram foram para o Assentamento Cruz
de Macaúba, para o lote de um companheiro que ofereceu sua área por 30 dias e resultou na
permanência das famílias por 8 meses. Sem sucesso, se mudaram para o Assentamento Paulo
Freire (Santa Vitória – MG) em novembro de 2001 e por lá permaneceram mais alguns meses.
O seguinte passo foi ocupar uma Fazenda denominada Bebedouro na mesma cidade, onde
ocorreu novamente o despejo após 3 dias de ocupação, novamente de forma intensamente
agressiva e com extrema violência. Com o despejo as famílias foram levadas de volta a São
Simão (GO) sob ameaça de morte. Resistindo às ameaças, as famílias voltaram para Minas e
acamparam na porta da delegacia de Santa Vitória (MG) com a intenção de denunciar as
agressões e exigir justiça. Após permanecerem lá durante 9 meses, foi feito um acordo com o
prefeito de Santa Vitória. Permaneceram lá cerca de 9 meses. Após acordo com a Prefeitura
de Santa Vitória as famílias se mudaram para uma área cedida pela Prefeitura durante mais 12
47
meses. Após a permanência, as famílias foram para a FERUB (atual Acampamento Florestan
Fernandes), em Uberlândia. Algumas destas famílias foram beneficiadas com a
desapropriação da Fazenda Bebedouro em Uberlândia, e lá iniciaram seu atual Projeto de
Assentamento Canudos (Figura 2) (D‘ÁVILA et al., 2006).
Os moradores do assentamento Canudos possuem diversas origens, mas a maioria das
famílias vem de municípios das redondezas, tanto de Minas Gerais quanto de Goiás, com
pequenas ocorrências do Pará, Tocantins e São Paulo. Sua composição familiar consiste
basicamente entre união por laços de parentesco com média de três membros residentes
(D‘ÁVILA et al., 2006).
3.3 A situação da questão ambiental nos assentamentos
Nossa legislação possui uma grave falha que transfere a responsabilidade do passivo
ambiental deixado pelos antigos proprietários para as famílias assentadas, e como é o próprio
governo que realiza o licenciamento ambiental, diretamente pelo INCRA ou por contratação
de serviços, o processo se torna longo e diversas vezes repleto de lacunas.
As medidas tomadas pelos governos consistiam em ceder as terras para os assentados
somente quando estes demonstravam claramente suas intenções de não desistir, entretanto a
entrega de terras era imediata para abafar as reivindicações e mantê-los calmos. Entretanto,
atualmente os novos Projetos de Assentamento não ocorrem se já não há bem clara e definida
as áreas que serão destinadas à averbação de RL e APP, o que já significa certo avanço por
parte das medidas presidenciais em conjunto com o INCRA e órgãos participantes.
3.3.1 Projeto de Assentamento Flávia Nunes
As visitas realizadas no Projeto de Assentamento Flávia Nunes trouxeram diversas
vertentes a serem discutidas com relação a viabilidade da adequação dos assentamentos rurais
à legislação ambiental vigente, e antes disso, às próprias condições de uma qualidade de vida
aceitável.
Os moradores do Assentamento Flávia Nunes iniciaram sua luta pela terra em abril de
1999 com sua primeira ocupação, e desde então sofreram diversos despejos de seus
acampamentos até conquistarem sua atual moradia. Das várias famílias que lutaram pela
48
conquista da terra, somente uma parte foi para a Fazenda Água Limpa em 2004, em sua
maioria os que possuíam maior tempo de luta pela aquisição de terra, sendo beneficiados pelo
INCRA. Entretanto, somente depois de oito anos de fixação na propriedade que o primeiro
assentado está recebendo o título pelo lote, o que explicita o excesso de burocracia e
complexidade de procedimentos em simples ações beneficiárias. O PA Flávia Nunes possui
vínculo com o Movimento dos Sem-Terra (MST), entretanto este contato se tornou limitado
após a conquista da terra.
Todo o assentamento teve atraso no andamento da legalização por ausência dos órgãos
ambientais. Foi feita a demarcação da reserva legal, mas o IEF demorou a fazer a vistoria pra
autorização, e quando o fez, nem ao menos entrou na propriedade, o que inviabilizou a
averbação e fez com que os assentados perdessem os benefícios do Programa ‗Luz para
Todos‘. Este programa teve como meta levar energia elétrica para mais de 10 milhões de
pessoas do meio rural, com diversas condições para participação. Somente em janeiro de 2011
foi realizada a averbação da Reserva Legal, e durante cinco anos os moradores esperaram pela
energia elétrica, somente concedida na metade de 2011.
Outro fator essencial para a sobrevivência das famílias residentes e que ainda está em
desacordo com a legislação vigente e os órgãos competentes é a outorga de uso da água
subterrânea de poço tubular. O poço foi perfurado em 2007, mas ainda não foi autorizado seu
uso, apesar de já terem todas as condições e equipamentos para captação (Foto 1). A outra
fonte de água dentro do assentamento são as três nascentes localizadas na propriedade,
entretanto, de acordo com os moradores, uma delas é imprópria para uso devido fatores físico-
químicos de qualidade de água. A qualidade da água das nascentes é baixa em sua maioria,
com grande teor de impurezas naturais, e somente um pequeno número de assentados tem
acesso à água própria para uso, tendo que recorrer a coleta no município de Uberlândia e
trazer em recipientes para armazenamento e estocagem. Para driblar as dificuldades da
escassez hídrica, os moradores também usam de técnicas de armazenamento para enfrentar os
meses com maior necessidade, com o auxílio de cacimbas. A questão da outorga de uso da
água não é finalizada na etapa que fica a cargo da Prefeitura Municipal, e é dela que os
procedimentos não são atendidos e a situação prevalece.
49
Foto 1: Projeto de Assentamento Flávia Nunes – Poço perfurado para captação de água.
Fonte: Trabalho de Campo, outubro de 2011.
Org. e Autor: MAYWALD, 2011.
De acordo com a Figura 3, quatro lotes foram delimitados praticamente por completo
em área de Cerrado preservado e dois lotes parcialmente na mesma situação (lotes n° 9 a 14),
e a autorização para desmate somente foi conquistada recentemente; vale ressaltar que estas
parcelas remanescentes de Cerrado não fazem parte sequer da APP nem da RL, dependendo
somente da autorização dos órgãos competentes o desmate. A demora na autorização remete a
uma série de documentos, e durante anos os moradores não têm sequer condições de retirar
seu sustento do solo em que vivem. Os assentados que não possuem condições de plantio
ficam à mercê da colaboração de outros moradores e de familiares não residentes do
assentamento para sobreviverem.
50
Figura 3: Recorte demonstrativo dos lotes inseridos em Cerrado.
Fonte: AGROLAGO, 2011.
Org.: MAYWALD, F. 2011.
Todas essas problemáticas trazem grande dificuldade a quem vive no assentamento
Flávia Nunes. As estratégias usadas durante os cinco anos sem auxílio e apoio governamental
foram as mais diversas, como cultivo comunitário nas áreas possíveis de plantio, doações de
cestas básicas da Prefeitura Municipal de Uberlândia e de familiares, divisão de ganhos com
venda de produtos caseiros, entre outros.
A nascente visitada também exibia nitidamente um caso de erosão e assoreamento em
grave situação (Foto 2). Apesar dos moradores terem consciência ambiental de preservação, é
prioridade a dessedentação de animais, e a ausência do recurso hídrico agrava a situação,
fazendo-os forçar o uso dos cursos d‘água, mesmo degradados.
51
Apesar dos moradores terem consciência e interesse da preservação das APPs e RL,
eles não possuem verba para realizar o cercamento adequado, o que é mais um fator essencial
para cumprir as exigências para adequação da legislação do Código Florestal. Tal
problemática é uma herança deixada pelo antigo proprietário e que estão tentando resolver a
partir de programas governamentais de financiamento, como o PRONAF. No entanto, os
moradores se dispuseram de mão-de-obra e recursos próprios para construir um cercamento
perto de uma das nascentes que possui mais proximidade com os lotes, a fim de preservar o
máximo possível até que fosse possível concluir o processo. Tal ato deve ser visto como
emergencial, já que não foi adequadamente cercado próximo aos limites do solo
hidromórfico, mas sim com a preocupação de minimizar os danos ambientais e a consequente
perda da nascente. Entretanto, recentemente a partir do PRONAF conquistaram o benefício de
financiar cercas para adequar às exigências do CF (Código Florestal) e assim poderem
concluir os diversos processos de adequação.
52
Foto 2: Projeto de Assentamento Flávia Nunes: A - foto de uma área dentro de APP fora da
RL. B - nascente localizada fora dos limites da Reserva Legal.
Fonte: Trabalho de Campo, outubro de 2011.
Org. e Autor: MAYWALD, F. 2011.
Há um interessante relato de um morador que resolveu desmatar parte da APP situada
dentro de seu lote para venda de madeira por um baixo custo. Os outros moradores ficaram a
par da situação e o ameaçaram a se responsabilizar pelos seus atos e reparar os danos, e, com
receio de acarretar diversos problemas em decorrência do desmate, abandonou os benefícios
do INCRA e transferiu seu lote para uma nova família. Este fato mostra claramente a
53
consciência ambiental dos moradores com relação à preservação das matas ciliares e a
intenção dos moradores em protegê-las.
Existem tantas problemáticas envolvidas que o processo de produção para subsistência
e venda de produtos do assentamento acabam se tornando inviáveis. Entretanto, a necessidade
de recursos é extrema, mas depois de quase uma década morando na propriedade os
assentados não conseguiram estabilizar nenhuma das diversas plantações para venda em
média e larga escala. As pretensões são a produção de mel, que foi inviabilizada devido a
produção de cana e o conseqüente uso de agrotóxicos das fazendas vizinhas, e queijo, que
ainda não foi liberada devido exigências sanitárias.
Em contrapartida às dificuldades enfrentadas pelos moradores do Projeto de
Assentamento Flávia Nunes, desde o início de 2011 eles começaram a receber a assistência
técnica da empresa Agrolago, contratada pelo INCRA para auxiliar 8 dos 15 assentamentos de
reforma agrária em Uberlândia. Antes a assistência era oferecida pelo próprio INCRA, com
equipe técnica oriunda de Belo Horizonte, tendo então como principal dificuldade a distância
entre as partes. Atualmente a assistência é oferecida pela Agrolago.
Após estudo realizado pela equipe técnica da empresa Agrolago (MANDELLI, 2011),
foram classificadas e separadas as áreas de acordo com sua cobertura vegetal: Solo
Hidromórfico 62,9945 ha, APP Preservada 29,1828 ha, APP Antropizada (pastagem) 21,4232
ha, Reserva Legal Cerrado Denso 72,5716 ha, Reserva Legal Cerrado em Regeneração
11,4539 ha, Cerrado Remanescente: 62,9658 ha, Pastagem: 142,8522 ha e Estradas, Sede e
outros 14,0395 ha. Ou seja, apesar de ainda ser necessário certo processo de recuperação de
parte da APP e da RL, as duas somadas ao solo hidromórfico chegam a totalizar
aproximadamente 47% da área do assentamento (Gráfico 5).
54
Gráfico 5: Projeto de Assentamento Flávia Nunes: Uso do Solo e Cobertura Vegetal
Fonte: AGROLAGO, 2011
Org.: MAYWALD, F. 2011.
No Diagnóstico Ambiental integrante do PDA, há discrepância de valores.
Inicialmente a área de RL seria delimitada tendo 89,8213 ha (21%), e a APP seria de 45,9705
ha (10,77%) em consonância com os parâmetros de 30 m de margem do ribeirão Água Limpa
e outros cursos d‘água e 50 m nas nascentes e veredas. Entretanto pode-se observar
claramente que a diferença entre o estudo contido no PDA e o atual, realizado pela Agrolago,
são enormes: uma diferença de 67,63 ha entre as delimitações antigas e as mais recentes,
dentro de uma área total de 417,4835 ha. Ao que tudo indica, tais valores foram somados
porque no estudo constante no PDA não foram consideradas as áreas de solo hidromórfico em
sua totalidade, e agora com os novos resultados o espaço efetivo de uso do solo dos
assentados foi reduzido consideravelmente.
Em síntese, as áreas passíveis de uso são as áreas de pastagem e do Cerrado
remanescente, somando aproximadamente 53%, tendo como resultado somente 47% do total
da propriedade para uso direcionamento de APP e RL.
55
Na Análise de Viabilidade Econômica, contida no item 8.3 do PDA Flávia Nunes,
exibe nitidamente que os recursos disponibilizados pelo INCRA para a implantação do
assentamento foi escassa.
Foram disponibilizados R$ 5.500,00 por família para toda a infra-estrutura básica,
constando abastecimento, energia elétrica, estradas e parcelamento dos lotes. O projeto para
implantação do abastecimento de água, que consistia em adquirir 6,6261 Km de rede de água,
perfuração de um poço de 100 m, hidrômetro e reservatório de 20.000 L, totalizou R$
105.014,80, ou seja, mais de R$ 7.000,00 por família. O projeto de implantação de energia
elétrica para todas as famílias do Assentamento Flávia Nunes, que envolvia adquirir linhas de
média tensão para redes mestras, extensões e derivações, transformadores e padrões de
energia, totalizou R$ 145.450,00, quase R$ 10.000,00 por família. O projeto de recuperação e
abertura de estradas para possibilitar acesso dos moradores a todas as áreas do assentamento
totalizaria R$ 35.324,80, sendo R$ 2.355,00 aproximadamente por família. E por fim o
parcelamento, demarcando os 15 lotes familiares, 2 áreas de exploração coletiva e 1 área
comunitária, que totalizou R$ 6.000,00, sendo R$ 400,00 por família. Concluindo, a verba
necessária para concluir todos os procedimentos necessários relativos a infra-estrutura é de
aproximadamente R$ 19.755,00, de acordo com o programa estabelecido no PDA Flávia
Nunes, e, como foi dito anteriormente, somente R$ 5.500,00 foi disponibilizado pelo INCRA
para o estabelecimento das famílias assentadas, deixando uma diferença de aproximadamente
R$ 14.255,00 por família, R$ 213.825,00 no total, que deve ser adquirida de outras formas,
como por exemplo outros programas de financiamento governamentais.
Os moradores do PA Flávia Nunes também contaram com uma verba do INCRA de
R$ 5.000,00 para aquisição de materiais de construção para assim poderem erguer suas casas.
Entretanto no projeto previsto no PDA eram necessários mais R$ 5.000,00 por família, sendo
provavelmente complementados pelas próprias famílias. Saneamento e Saúde foram quesitos
ausentes de financiamento governamental, e o programa ambiental de plantio de mudas e
cercamento e isolamento da RL e da APP, apesar de seu baixo custo com relação aos outros
projetos, fica em segundo plano.
Dentre as diversas problemáticas com relação à viabilidade econômica, as estratégias
encontradas pelos moradores do PA Flávia Nunes foram a busca de programas de
financiamento governamentais para atender suas necessidades básicas de sobrevivência e,
posteriormente, adequações à legislação ambiental vigente. O Programa Nacional de
56
Universalização de Acesso e Uso da Energia Elétrica, também conhecido como ―Luz Para
Todos‖, foi uma alternativa encontrada para solucionar o problema da falta de energia elétrica
no assentamento. O programa teve seu início em novembro de 2003 e tinha previsão para ser
finalizado em 2008, mas foi prorrogado para o fim de 2011 a fim de possibilitar obras já em
andamento. Tem como meta levar energia elétrica para o meio rural, atendendo milhões de
pessoas, acabando com a exclusão elétrica no Brasil, com investimentos que ultrapassaram R$
20 bilhões.
Instituída pela Lei n° 17.727, de 13 de agosto de 2008, traz a concessão de incentivo
financeiro aos proprietários e posseiros, denominada ‗Bolsa Verde‘. Tem como objetivo
incentivar financeiramente todos os proprietários rurais que se comprometerem a conservar ou
já conservem a cobertura vegetal nativa em Minas Gerais, com prioridade a pequenas famílias
e produtores rurais. O incentivo é proporcional à área preservada e as modalidades previstas
no programa são a manutenção e a recuperação da cobertura vegetal, sendo a primeira em
forma de remuneração pelos serviços prestados e a segunda é um repasse de insumos para que
ocorra a revegetação da área (IEF, 2010).
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) trata-se
de um financiamento de projetos que gerem renda aos agricultores familiares e assentados da
reforma agrária. Os benefícios principais são as baixas taxas de juros de resgate e baixas taxas
no caso de inadimplência dentre os financiamentos rurais. Tais benefícios, após aprovação,
podem ser utilizados para custear safras ou até investimentos de equipamentos, infra-estrutura
de produção e serviços.
São diversos os motivos que levaram os moradores do PA Flávia Nunes a não
concluírem o processo de adequação da legislação ambiental e terem suas APPs e RL
devidamente preservadas. Entretanto, há claros indícios do interesse dos mesmos em realizar
a preservação do meio ambiente, independente de ser ou não uma exigência governamental. A
busca por financiamentos governamentais para adequação é constante, mas não podemos
deixar de entender que existem necessidades mais urgentes, como o caso da escassez hídrica,
que prejudica não somente o bem estar dos moradores como também seus modos de
produção, afetando suas colheitas e animais. Existem urgências maiores que devem ser
tratadas com mais seriedade e comprometimento.
Em resumo, as maiores evidências que exibem o engajamento dos assentados foram a
remoção do antigo morador que infringiu a lei e desmatou a área de preservação permanente
57
de seu lote, o cercamento emergencial com recursos próprios de uma das nascentes dentro do
Projeto de Assentamento, a busca constante do uso de recursos alternativos naturais para
fertilização e remoção de pragas de suas colheitas.
3.3.2 Projeto de Assentamento Canudos
A visita realizado no Projeto de Assentamento Canudos apontou diversas
problemáticas enfrentadas pelos moradores, e grande parte delas pode ser assimilada ao caso
do Projeto de Assentamento Flávia Nunes, onde um sem número de dificuldades em
necessidades básicas acaba por prejudicar as adequações à legislação ambiental.
Os assentados de Canudos ficaram durante cinco anos sem o devido projeto de
instalação de moradia e infra-estrutura básica. O sentimento de abandono dos moradores é
facilmente perceptível em seus relatos. A fazenda foi vendida ao INCRA pelo antigo
proprietário por interesse do mesmo, pois este não encontrava compradores interessados, e
dizem os atuais moradores que a área, apesar de existirem muitos focos de degradação, em
sua maioria há muita vegetação nativa preservada.
A infra-estrutura atualmente está longe de ser a mais adequada. Os lotes são divididos
de forma que cada morador tenha uma pequena parcela de APP em seu terreno, e ainda há
ausência de cercas entre os lotes, também nas APPs e RLs. Entretanto, a preservação das
margens dos córregos é alta, fruto da consciência dos moradores construída desde os tempos
de luta na conquista da terra com o MST.
Para buscar a conservação de áreas com alto grau de erosão, alguns moradores
buscaram transformar estas áreas em APP em detrimento da perda de área útil de seus lotes,
melhorando assim as condições ambientais do assentamento (Mapa 5). Em toda a área do PA
Canudos há ausência de bacias de contenção para evitar a erosão causada na época das
chuvas, dificultando o trabalho de conservação do solo. A criação de ‗curvas de contenção‘ de
água foi proposta para a Prefeitura Municipal de Uberlândia e para o INCRA, entretanto, por
diversos fatores de falta de comunicação entre as partes, não houve avanços nesse quesito.
Existem diversos projetos envolvendo incentivos para cercamento de propriedades
rurais, mas o IEF cria diversas restrições para a entrada de assentamentos no projeto, o que
acaba por desestimular os moradores com o passar do tempo de insistência.
58
A maioria dos moradores de Canudos, apesar de não quererem abandonar suas
famílias e sua cidade de origem, vieram para Uberlândia por enxergarem com essa mudança
melhores condições de mercado, escoamento de produção e venda, além da urgente
necessidade da terra moradia e de onde tirar seu sustento.
Canudos atualmente passa por um sério problema sobre a averbação da RL, porque,
apesar de seu projeto ter sido feito conjuntamente com os Projetos de Assentamento Flávia
Nunes e Emiliano Zapata, ainda possui irregularidades antes desconhecidos pela maioria dos
moradores. Mesmo após dez anos assentados, os moradores ainda não conseguiram adequar
suas áreas de RL. Após estudos recentes realizados pela equipe Agrolago, foi descoberta a
ausência de 2% da área, não atendendo assim às exigências do Código Florestal Federal e
Estadual.
Quando um Projeto de Assentamento não possui averbação regularizada, fica
indisponível o acesso a créditos governamentais de financiamento, como é o caso do
PRONAF. Então a solução mais adequada a ser feita seria a adequação com a disposição de
uma pequena parte cedida por cada lote para assim somar a parte restante e realizar a
averbação. No entanto, quando houve a separação entre os lotes, os moradores entraram em
um consenso que as terras consideradas menos propensas a produção comporiam lotes
maiores, enquanto as consideradas mais ‗férteis‘, menores. O resultado é uma perda mais
significativa dos lotes considerados mais produtivos, e somando ao fato de que vários lotes já
haviam reduzido sua área produtiva devido focos de erosão, temos como resultado lotes com
proprietários extremamente prejudicados, como pode ser visualizado na Figura 4 os recortes
das áreas de APP antropizada que não estão próximas às margens do curso d‘água.
59
Figura 4: Recorte demonstrativo dos lotes que converteram áreas com foco de erosão em
APP.
Fonte: AGROLAGO, 2011.
Org.: MAYWALD, F. 2011.
A questão da água no assentamento também merece destaque. Durante sete anos os
moradores esperaram a perfuração de um poço artesiano, e já faz três anos que esperam a
liberação de uso do mesmo; alguns moradores tentam driblar a escassez de água com o uso de
cisternas, auxiliando também moradores vizinhos. Captar água dos rios, ribeirões e córregos
também é inaceitável e a autorização não é liberada. Mesmo assim, os moradores têm a
necessidade do uso da água, mas são desestimulados pela constante preocupação com relação
a possíveis contaminações que as fazendas vizinhas podem acarretar por usarem agrotóxicos
em colheitas plantadas irregularmente próximas às APPs.
Não é rara a desistência de moradores do PA Canudos de permanecerem em suas
terras arduamente conquistadas, pois as dificuldades são diversas e demandam muito tempo e
dedicação para resolver. A produtividade é limitada, e acordos entre os moradores nem
sempre acontece, e quando existe, não garante bons resultados.
60
Para demonstrar as dificuldades enfrentadas pelos moradores do Projeto de
Assentamento Canudos, existe o caso de uma moradora que perdeu sua colheita de maracujá,
pois a ausência de cercas de delimitação de lotes permitiu o acesso ao gado do vizinho e
conseqüente destruição de sua lavoura (Foto 3). A produção já possuía como comprador a
Prefeitura Municipal de Uberlândia, e a venda será perdida por não ser possível o adiamento
de prazo para replantio. Também no mesmo caso, o auxílio de insumos oferecidos pelos
órgãos governamentais atrasado resultou na baixa produtividade da lavoura, exemplificando
mais uma problemática enfrentada freqüentemente nos assentamentos. Há também a
pretensão de alguns moradores de fazer um criadouro de peixes, mas também não é liberado.
Foto 3: Projeto de Assentamento Canudos: A – área para plantio de pimenta. B – foco de
erosão que foi convertido em APP.
Fonte: Trabalho de Campo, 2011.
Org. e Autor: MAYWALD, F. 2011.
61
O INCRA disponibilizou um projeto para inserção dos assentados de plantar eucalipto
com auxílio de mudas, entre dois e três hectares. Apesar de ser uma opção viável para
concluir o cercamento dos lotes e APP, seu cultivo vai contra os princípios dos moradores da
sustentabilidade ambiental, porém as opções estão escassas com relação à produtividade e a
necessidade é extrema.
O INCRA libera projetos de eucalipto para os assentados, que vai contra os princípios
do movimento, mas é a opção existente para ter alguma condição de renda.
A Reserva Legal do PA Canudos se divide em seis parcelas, interligadas pela APP. A
área útil do assentamento soma 353,9780 ha, RL estimada em 140,3761 ha, solo hidromórfico
de 49,4895 ha, entre outros. Concluindo, a área ocupada pela RL, solo hidromórfico e APP
somam aproximadamente 45% da propriedade, sobrando cerca de 55% para uso dos
moradores (Gráfico 6).
Gráfico 6: Uso do Solo do Projeto de Assentamento Canudos
Fonte: AGROLAGO, 2011.
Org.: MAYWALD, F. 2011.
Somente com a verba cedida pelo INCRA para a construção da habitação não foi
possível concluir, então com auxílio de familiares e verba própria algumas casas puderam ser
finalizadas. Os valores discutidos no item 8.3 da Análise de Viabilidade Econômica são
53%
21%
17%
7%
1% 1%0%
Área Útil Reservas APP
Solo Hidromórfico Servidão de Pastagem Estrada Vicinal
Área Social
62
semelhantes aos cedidos para o PA Flávia Nunes, então a discussão gira em torno somente
dos gastos de infra-estrutura proporcionais ao tamanho do assentamento e número de famílias,
que ambos são maiores. No Programa Territorial, os gastos com infra-estrutura básica para
captação de água somariam R$ 141.252,00, implantação de eletrificação rural somaria R$
247.656,00, recuperação de estradas existentes e abertura de estradas projetadas teria valor
estimado de R$ 175.225,00, e a demarcação dos 24 lotes e uma área comunitária somando R$
9.600,00. Sendo que somente é disponibilizado R$ 5.500,00 por família, a diferença resultante
para completar os projetos é de R$ 384.133,00. Os gastos com habitação também são
disponibilizados pelo INCRA, no entanto são somente R$ 5.000,00 por família, e com a
estimativa de gastos em torno de R$ 240.000,00, a diferença chega a R$ 120.000,00, somando
outras necessidades, como saneamento e cercamento de APP e RL, as diferenças aumentam
para mais de R$ 140.000,00.
Devido diversas dificuldades financeiras enfrentadas pelos assentados, as alternativas
que restam são as linhas de financiamento governamentais e projetos que foquem
especificamente em algumas necessidades. As fontes de financiamento disponíveis citadas
foram o PRONAF e o fomento disponibilizado pelo INCRA na criação do assentamento. A
aquisição de energia elétrica foi por intermédio do programa ‗Luz para Todos‘, entretanto o
tempo necessário para adquirirem este benefício foi de cinco anos.
Grande parte dos moradores do assentamento demonstra interesse e engajamento para
adequar suas propriedades à legislação ambiental. No entanto, a urgência para com
necessidades básicas é maior, como água, energia, e meios de produzir seus alimentos e ter
condições de venda de suas produções. Todos estes fatores foram claramente exibidos na
construção do perfil de viabilidade do tema dos moradores do Projeto de Assentamento
Canudos.
63
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A preocupação com o meio ambiente se tornou uma pauta indispensável atualmente, e
a perspectiva é que não deixe de ser foco constante de diversas discussões para as atuais e
futuras gerações. As leis vêm para suprir a necessidade de normatizar a busca pelo bem maior
da sociedade, e com as leis de cunho ambiental não é diferente. O Código Florestal traz
exigências mínimas para que o pouco que resta da natureza já excessivamente antropizada
pelo homem mantenha condições de se regenerar. Entretanto, a consciência da preservação e
conservação não é algo que abrange o coletivo, mas sim um ideal muito vago e distante de
uma pequena parcela da humanidade.
O resgate histórico da questão agrária brasileira foi de fundamental importância para
compreender o contexto da atual discrepância distributiva da terra no Brasil. A Reforma
Agrária surge justamente como uma resposta à evidente desigualdade fundiária embasada
historicamente desde antes da proclamação do Brasil República, mas o grau de sua eficiência
também já é fadado ao fracasso diante dos mesmos fatores. Um país que cresceu nos alicerces
cimentados pelos grandes proprietários de terras faz questão de proteger a herança deixada
por seus antepassados.
A criação de Projetos de Assentamentos, bem como os ideais da Reforma Agrária, se
faz de forma isolada e pontual, um processo oneroso e complexo, que diversas vezes nem
chega perto de alcançar seu real objetivo. Tamanha é a verdade que, de todos os Projetos de
Assentamento de Uberlândia, nenhum sequer chegou a concretizar sua finalização do projeto
para ser realmente um Assentamento de Reforma Agrária. O sentimento de abandono é
latente daqueles que supostamente usufruem dos benefícios governamentais, e as dificuldades
que enfrentam em questões consideradas ‗básicas‘, como é o caso da água, luz, esgoto e
habitação, reforçam que, independente dos ideais ambientais que possuem, as necessidades
possuem prioridade e assim serão encaradas.
As exigências do INCRA para com os projetos de assentamento no quesito da
adequação da legislação ambiental são injustas pois os tratam com as mesmas condições
econômicas dos grandes latifúndios. Projetos de Assentamento de Reforma Agrária já
deveriam ser criados com todas as condições ambientais adequadas, pois o Código Florestal já
está em vigor há décadas e é de responsabilidade do proprietário sua adequação. Antes de ser
um assentamento, a propriedade esteve em posse do INCRA, e o mesmo não deu condições
64
dos moradores de cercarem suas Áreas de Preservação Permanente e Reservas Legais. No
caso dos moradores do PA Canudos, a irregularidade dos limites da RL, antes desconhecida
pelos moradores, fez com que o acesso a financiamentos governamentais se tornasse
temporariamente inalcançável. Deve-se pensar que as exigências com os PAs precisa ser
diferenciada com relação a outras propriedades rurais, além de ter maior rapidez e efetividade
em seus processos de regularização.
É ímpeto que o INCRA, como um órgão governamental de caráter impar, mantivesse
uma comunicação mais clara em relação às necessidades dos assentados com outros órgãos,
como, por exemplo, o Instituto Estadual de Florestas (IEF) e as Prefeituras Municipais. a
criação de assentamentos rurais é uma necessidade, mas o fortalecimento e adequação dos
assentamentos já criados deve ser visto como prioridade.
Dentre todos estes fatores, resta saber o que ocorrerá com o projeto de lei em
andamento que altera o Código Florestal vigente, se favorecerá ou dificultará ainda mais a
vida dos assentados no projetos de reforma agrária.
65
REFERÊNCIAS
ÁVILA, R. V. A viabilidade econômica da reforma agrária em Minas Gerais. 1999.
Monografia. Universidade Federal de Minas, Gerais Faculdade de Ciências Econômicas.
Belo Horizonte, 1999. Disponível em: gipaf.cnptia.embrapa.br/publicacoes/artigos-
etrabalhos/avila99.pdf. Acesso em 13 out. 2011
BALSAN, Rosane. Impactos decorrentes da modernização da agricultura brasileira. CAMPO-
TERRITÓRIO: revista de geografia agrária, v. 1, n. 2, p. 123-151, ago. 2006.
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