apostila sucessões testamento

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OAB 1ª Fase 2011.2 DIREITO CIVIL CRISTIANO SOBRAL [email protected] Complexo de Ensino Renato Saraiva | www.renatosaraiva.com.br | (81) 3035 0105 1 Direito das Sucessões 1 - Conceito No aspecto subjetivo, implica a continuação de uma pessoa em relação jurídica que cessou para o anterior sujeito e continua em outro. É a capacidade para suceder; no aspecto objetivo, é o conjunto de normas que regula a transmissão do patrimônio do extinto. 2 Espécies: Art. 1786 Legítima, testamentária e mista. 3Transmissão da herança Neste momento, surge a abertura da sucessão, instante do falecimento do titular do patrimônio, onde se pode entender que há a transmissão imediata do patrimônio, através da aplicação do princípio da “saisine 1 ”. Logo, no momento do falecimento os herdeiros já adquirem tal condição, inclusive nas sucessões onde os herdeiros são desconhecidos, pois em última análise, sempre o Estado terá capacidade sucessória para adquirir o patrimônio deixado. Juntamente com o momento da abertura da sucessão, dá-se a fase da delação ou a devolução sucessória, onde há o oferecimento da herança a quem tenha capacidade para adquiri- la 2 , habilitando o herdeiro a declarar que a aceita ou não. Sendo coincidentemente ou não com as duas fases anteriores, dá-se a aquisição, onde o herdeiro torna-se titular das relações jurídicas que têm por objeto o patrimônio do extinto. 3,1 MODOS DE SUCEDER X MODOS DE PARTILHAR 1 Instituto derivado do direito francês, o “droit de saisine” traz o imediatismo da transmissão dos bens, cuja posse e propriedade passam diretamente da pessoa do morto aos seus herdeiros, não havendo nenhuma fase intermediária. Há uma sub-rogação pessoal de pleno direito, pois o sujeito ativo da relação jurídica patrimonial é automaticamente substituído por força de lei ou da vontade do falecido. Ver sobre a matéria, Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. VI, RJ: Forense, 12 ed., p. 14. 2 Expressão originada do latim delatio, defere, quer dizer denunciar, delatar, acusar ou deferir. Neste último sentido aplica-se ao direito sucessório, referindo-se ao momento em que a herança é deferida ao herdeiro, quando há o falecimento do titular do patrimônio. Utiliza-se também de forma freqüente a expressão DEVOLUÇÃO, no sentido de translação da herança.

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Direito das Sucessões

1 - Conceito

No aspecto subjetivo, implica a continuação de uma pessoa em relação jurídica que cessou

para o anterior sujeito e continua em outro. É a capacidade para suceder; no aspecto objetivo, é o

conjunto de normas que regula a transmissão do patrimônio do extinto.

2 – Espécies: Art. 1786 – Legítima, testamentária e mista.

3– Transmissão da herança

Neste momento, surge a abertura da sucessão, instante do falecimento do titular do

patrimônio, onde se pode entender que há a transmissão imediata do patrimônio, através da

aplicação do princípio da “saisine1”. Logo, no momento do falecimento os herdeiros já adquirem

tal condição, inclusive nas sucessões onde os herdeiros são desconhecidos, pois em última análise,

sempre o Estado terá capacidade sucessória para adquirir o patrimônio deixado.

Juntamente com o momento da abertura da sucessão, dá-se a fase da delação ou a

devolução sucessória, onde há o oferecimento da herança a quem tenha capacidade para adquiri-

la2, habilitando o herdeiro a declarar que a aceita ou não. Sendo coincidentemente ou não com as

duas fases anteriores, dá-se a aquisição, onde o herdeiro torna-se titular das relações jurídicas

que têm por objeto o patrimônio do extinto.

3,1 MODOS DE SUCEDER X MODOS DE PARTILHAR

1 Instituto derivado do direito francês, o “droit de saisine” traz o imediatismo da transmissão dos

bens, cuja posse e propriedade passam diretamente da pessoa do morto aos seus herdeiros, não havendo nenhuma fase intermediária. Há uma sub-rogação pessoal de pleno direito, pois o sujeito ativo da relação jurídica patrimonial é automaticamente substituído por força de lei ou da vontade do falecido. Ver sobre a matéria, Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. VI, RJ: Forense, 12 ed., p. 14. 2 Expressão originada do latim delatio, defere, quer dizer denunciar, delatar, acusar ou deferir.

Neste último sentido aplica-se ao direito sucessório, referindo-se ao momento em que a herança é deferida ao herdeiro, quando há o falecimento do titular do patrimônio. Utiliza-se também de forma freqüente a expressão DEVOLUÇÃO, no sentido de translação da herança.

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o Há três modos de suceder:

1. Iure proprio

2. Iure representationis

3. Iure transmissionis ( O artigo 1.809 consagra o “jure transmissionis”, ou seja, falecendo

o herdeiro sem declarar se aceita ou não a herança, a aceitação ou a renúncia do patrimônio

hereditário será imediatamente transmitida àqueles que o sucedem3. )

3.2 - Há três modos de partilhar:

4. In capita - Por cabeça

5. In stirpes - Por estirpe

6. In lineas - Por linhas

Art. 1.785 - É fundamental se observar que para a abertura do processo de inventário,

partilha, arrecadação da herança e demais procedimentos judiciais que envolvam o espólio,

observar-se-á a regra do artigo 96 do Código de Processo Civil, que adota também o critério do

domicílio para a fixação da competência para a propositura de tais ações. Estabelece ainda, em

seu parágrafo único, que caso o titular do patrimônio não tivesse domicílio fixo, a competência

deverá ser fixada pelo local da situação dos bens ou ainda, se os bens estiverem em situados em

diversos lugares, o foro competente para julgar tais ações será o do local do falecimento.

A aquisição da herança no direito brasileiro surge através da disposição da lei,

denominando-se sucessão legítima, ou por expressa manifestação de vontade da parte através de

testamento válido, qual seja, sucessão testamentária.

Dentro de nossa tradição jurídica, o direito sucessório sempre esteve ligado ao direito de

família, uma vez que prevalece em nossa sociedade a concepção de que os familiares,

especialmente os filhos, são os destinatários do patrimônio amealhado pelo indivíduo durante sua

vida.

A partir desta concepção, busca-se proteger aqueles a quem a lei considera como

herdeiros necessários, nos artigos 1845 a 1850. Esta proteção constitui a legítima, quinhão

3 Ver sobre a matéria, ORLANDO GOMES, Sucessões, 2008, Forense, p. 39 a 42.

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correspondente a metade do patrimônio deixado pelo de cujus, reservado por lei às pessoas

elencadas no artigo 1.845.

Havendo testamento, prevalecerá a vontade do testador, desde que seja preservada a

legítima, quinhão reservado por lei aos herdeiros necessários. Esta solução, denominada “relativa

liberdade de testar”, é considerada por nossa doutrina e jurisprudência como a mais adequada,

uma vez que concilia a livre disposição patrimonial como desdobramento do direito de

propriedade, bem como mantém os privilégios inerentes à família.

No tocante à regulamentação da transferência do patrimônio, aplicar-se-á a legislação

vigente ao tempo da abertura da sucessão. A título de exemplo, podemos considerar que tendo a

sucessão de A sido aberta em 03 de janeiro de 2003, sua esposa B não poderá pleitear a condição

de herdeira ao lado dos descendentes, uma vez que este direito só lhe será conferido a partir da

vigência deste Código Civil.

4 - Da Herança e de sua Administração

Art. 1.791 - A herança é o instituto fundamental do direito sucessório. A idéia da

transmissibilidade do patrimônio é sua força motriz, devendo ser reconhecida de pronto pelo

Ordenamento Jurídico.

É tratada como uma universalidade de direito ( v. art. 91 ). Podemos defini-la como o

conjunto de bens, direitos e obrigações deixados pelo extinto a seus herdeiros. Segundo o mestre

Orlando Gomes, é o patrimônio do defunto. Não se confunde com o acervo hereditário, que é a

massa dos bens deixados, porque pode compor-se apenas de dívidas, tornando-se passiva4.

Logo, caracterizando-se a herança como uma massa indivisível e considerando os

herdeiros como condôminos, regulando-se pelo art. 1.314 e seguintes do presente Código, cada

um dos co-proprietários poderá responder por sua integralidade.

Art. 1.792 Mantendo a disposição da lei anterior, a herança transmite-se a “benefício de

inventário”, ou seja, a responsabilidade do herdeiro quanto às obrigações deixadas pelo morto

não pode ser ultra vires hereditatis, limitando-se ao valor do quinhão recebido. 5

4 GOMES, Orlando. Sucessões. RJ: Forense, 8ª ed., 1999, p. 6.

5 Sobre a matéria, v. PEREIRA, Caio Mário. Ob. citada, p. 33-34

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Art. 1.793.

O direito à sucessão aberta é considerado como bem imóvel para efeitos legais ( v. art. 80,

inciso II ) e como tal poderá ser objeto de transmissão. Cabe ressaltar que esta possibilidade surge

após a abertura da sucessão, uma vez que é expressamente vedada a possibilidade de se estipular

contrato sobre herança de pessoa viva ( v. art. 426 ), não havendo a possibilidade de se estabelecer

pactos sucessórios, admitindo apenas duas exceções, no caso das doações mortis causa,

estabelecidas por ocasião do pacto antenupcial e de divisão dos bens da herança pelo pai de

família, ainda em vida, entre seus filhos6.

Aberta a sucessão, o herdeiro poderá livremente transmitir, a título oneroso ou gratuito, o

quinhão que lhe foi destinado. Esta possibilidade já era admitida no direito anterior pela doutrina

e jurisprudência vigente, contudo, tornou-se norma a partir desta legislação.

Cabe ressaltar o disposto no artigo 1.793, ao exigir a transferência do patrimônio por

escritura pública, uma vez que se trata de bem imóvel e como tal sua alienação deve atender a

disposição legal.

Sendo a herança uma universalidade, é conferido aos co-herdeiros direito de preferência

quando houver a cessão de direitos hereditários a título oneroso, facultando aos prejudicados a

possibilidade de se anular o negócio jurídico celebrado, no prazo decadencial de 180 dias contados

da transmissão. Segundo o mestre Luiz Roldão de Freitas Gomes, 7 “sendo a herança

disciplinada pelas regras do condomínio até a partilha, seria desnecessária a previsão, que é ínsita

à alienação da cota pelo condômino”, não sendo possível tal alienação pois não há como

transmitir direitos sobre bem não individuado sem respeitar a preferência dos demais co-

possuidores.

É importante salientar que sendo a herança uma massa de bens indivisível, a cessão

somente poderá incidir sobre uma quota parte, não podendo ser considerada sobre coisa certa e

determinada. Caso haja tal determinação, deverá ser tratada como um negócio jurídico

6 WALD, Arnold. Direito das Sucessões, SP: RT, 11ª ed. 1997, p. 94.

7 GOMES, Luiz Roldão de Freitas. “O Direito das Sucessões no Projeto do Código Civil”, in Boletim

ADV –COAD – Seleções Jurídicas, Jan. 2001, p. 37.

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condicional, que se subordinará à existência do objeto determinado e ainda, a que o bem seja

efetivamente atribuído ao cedente.

Art. 1.796 e Art. 1.797.

O artigo 1.796, inserido neste capítulo por tratar-se da administração da herança, traz o

prazo de 30 dias para que haja a propositura do inventário dos bens, para que se efetive a regular

partilha. Na lei civil anterior, esta disposição constava no artigo 1.770, utilizando a expressão “um

mês”, cuja imprecisão é maior que a terminologia adequada atualmente.

Quanto à nomeação do inventariante, o artigo utiliza-se da ordem claramente

explicitada no artigo 990 do Código de Processo Civil vigente, trazendo apenas, flagrante

modificação ao inserir, no inciso I do artigo 1.797 a possibilidade do companheiro ter a condição

de ser nomeado administrador do patrimônio.

5 - Da Vocação Hereditária

Art. 1.798, 1.799, 1.800, 1.801, 1.802 e 1.803

Antes de se considerar a existência da vocação hereditária, o artigo 1.798 explicita o

conceito de capacidade sucessória, condição comum a toda e qualquer pessoa, física ou jurídica,

existente na época da abertura da sucessão, embora a terminologia não esteja explicitada em

nossa lei. A capacidade sucessória baseia-se na existência da pessoa para fins sucessórios, a não

ser nas hipóteses prevista no artigo 1799 desta lei e a convocação para receber a herança em

razão do falecimento, sendo o chamamento ou vocação do herdeiro, quer seja legítimo ou

testamentário. É a instituição da condição de herdeiro, momento em que surge a vocação

hereditária.

A capacidade para suceder é mensurada a partir do momento do óbito, onde se dá a

delação, o oferecimento da herança àquele que tenha condições de adquiri-la.

Dentro de tal orientação, o Código Civil trata da vocação hereditária, que se pode definir

como “atribuição do direito de suceder. Não a atribuição da própria herança, que só se dará se o

beneficiário aceitar, mas a atribuição do direito a tornar-se sucessor8”.

8 ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil – Sucessões. Coimbra: Coimbra Editora. 1989, p. 141.

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Logo, a vocação hereditária é uma aptidão genérica de aquisição de direitos sucessórios,

que tem como requisito a existência do herdeiro no momento da abertura da sucessão ou ainda,

que este beneficiário já tenha sido concebido, em uma nítida proteção ao nascituro, em

consonância com o artigo 2° desta lei. Esta disposição já era prevista na lei anterior em seu artigo

1.717. É a “atribuição do direito de suceder”.9

A lei outorga ainda, seguindo a orientação decorrente da lei anterior, que sejam

contemplados em testamento a prole eventual e as fundações cuja constituição tenha sido

designada pelo de cujus em testamento. O legislador foi bastante feliz na redação de tais artigos,

ao estipular uma limitação para que a herança fique disponível ao herdeiro eventual. Logo, não

havendo o surgimento do herdeiro em até dois anos após a abertura da sucessão, esta se

destinará aos herdeiros legítimos, respeitada a ordem de vocação hereditária, conforme o § 4° do

artigo 1.800.

É fundamental ressaltar ainda, a ausência de legitimação10 para que as pessoas recebam

quinhões hereditários, de acordo com o disposto no artigo 1.801 do Código Civil. Estas pessoas,

ainda que possuam capacidade sucessória, não podem ser beneficiárias de testamento nas

hipóteses previstas no artigo supracitado. Tais vedações visam proteger a livre manifestação de

vontade do testador, como na hipótese daquele que escreveu o testamento ou algum de seus

parentes e uma proibição de ordem moral, uma vez que veda que o concubino, em relação

adulterina, venha a ser beneficiar do patrimônio deixado por seu companheiro casado. Neste

ponto, percebe-se um avanço no sentido de se reconhecer os direitos entre concubinos, uma vez

que a comprovação da existência de separação de fato por mais de 5 anos é capaz de legitimar o

companheiro sobrevivente para a aquisição de seus direitos sucessórios. Majoritariamente, a

doutrina considerada esta ausência de legitimação como uma espécie de incapacidade passiva, ou

seja, a impossibilidade de receber o acervo hereditário através de testamento, conforme

explicitado no artigo 1.900, inciso V.

9 Id., ob. citada, p. 139.

10 Podemos entender como legitimação a idoneidade para o exercício de um direito. É a possibilidade de se agir in concreto, sendo uma faculdade que determinada pessoa possui com relação a determinados bens jurídicos. Não se discute as qualidades intrínsecas de determinada pessoa, mas apenas sua posição com relação a determinados bens ou direitos.

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Ordem de vocação hereditária

1 - Herdeiros necessários:

Art. 1.845 a Art. 1.850

A grande alteração da Lei vigente é inserir o cônjuge na categoria dos herdeiros necessários

ou legitimários, o que de acordo com o artigo 1.721 do Código Civil anterior era restrito aos

descendentes e ascendentes e inseri-la dentro dos dispositivos da sucessão legítima e não mais na

testamentária, como feito anteriormente.

O Código Civil Português, em seu artigo 2.156, define a legítima como a “porção de bens de

que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos herdeiros legitimários”.

Segundo este dispositivo, podemos entender a legítima sob duas perspectivas: a do autor da

sucessão e a dos herdeiros necessários. Para o autor da sucessão, a legítima é a porção de bens de

que não pode dispor; para os herdeiros necessários, é a porção de bens que lhes é legalmente

destinada. Logo, temos de um lado, a noção da legítima (para os herdeiros necessários) e do

outro, de cota indisponível (para o autor da sucessão).

É interessante ressaltar que embora a condição de herdeiro só surja a partir do momento da

abertura da sucessão, a proteção à legítima é garantida anteriormente, quando, por exemplo,

veda-se ao titular do patrimônio as doações que excedam à parte da qual ele poderia dispor em

testamento.

O cálculo da legítima é feito sobre o patrimônio líquido da herança, descontadas todas as

despesas e as dívidas que porventura tenham sido deixadas pelo falecido ou contraídas pelo

espólio, somando-se ainda as doações que tenham sido feitas em vida pelo autor da herança aos

seus descendentes. Toda manifestação de vontade que incida sobre a parte que exceder aos

limites da legítima será considerada uma liberalidade inoficiosa, sendo declarada ineficaz,

facultando ao herdeiro lesado ingressar com ação de redução para que obtenha a reintegração da

legítima.

O artigo 1.723 da lei anterior facultava ao titular da herança converter os bens da herança

legítima em bens de outra natureza, instituir-lhes gravames, prescrevendo-lhes a inalienabilidade,

a impenhorabilidade e a incomunicabilidade livremente. A lei atual é mais rigorosa quanto a este

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aspecto, limitando tal disposição de vontade. Inicialmente, no artigo 1.848, § 1°, é vedado ao

testador converter os bens da herança em bens de qualquer outra natureza e ainda, no caput do

mesmo dispositivo, apenas é permitido ao testador estabelecer gravames aos bens da legítima se

houver justa causa declarada em testamento.

A jurisprudência já consolidou a visão de que em nosso direito, os gravames são impostos

quando há uma legítima preocupação do testador em relação aos seus herdeiros quanto à

dissipação do patrimônio, seja por terem caráter dissoluto, ter cônjuges de conduta duvidosa, ser

viciados em substâncias ilícitas etc.

A previsão do Código Civil atual vem apenas corroborar esta posição, não permitindo que

gravames sejam impostos sobre as legítimas quando os herdeiros sejam de conduta ilibada, nada

tendo que lhes desabone a conduta, sendo a limitação a um mero capricho do testador, que os

deixará à mercê de seus desmandos.

Acolhendo posicionamento já consolidado em nossa jurisprudência, o § 2° do artigo 1.848

admite a alienação dos bens gravados, desde que haja a sub-rogação mediante autorização

judicial.

O artigo 1.849 apenas limita-se a repetir a redação do artigo 1.724 do Código Civil anterior,

prevendo que o herdeiro beneficiado em testamento com a parte disponível do autor da herança,

não perde seu direito à herança (ex. Pai que deseja contemplar um determinado filho com sua

parte disponível, não prejudicará o que este herdeiro terá direito a herdar por força da sucessão

legítima).

2 – Direito de representação - Art. 1.851 a 1.856

Pode-se definir o direito de representação como o mecanismo pelo qual se opera a vocação

indireta na sucessão legítima, não existindo na sucessão testamentária11. O artigo 1.851 prevê

apenas a hipótese da sucessão por representação pela pré-morte do herdeiro., mas também

haverá representação na indignidade (artigo 1.816), que trata expressamente da sucessão do

herdeiro do excluído, que o representa em seu quinhão e também nos herdeiros dos deserdados,

considerada uma modalidade de exclusão. Nesta hipótese, o descendente de herdeiro pré-morto,

11

A sucessão testamentária é intuito personae ou seja, atribui-se a herança ao herdeiro instituído, a não ser

que o testador tenha estabelecido no testamento uma cláusula de substituição.

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deserdado ou excluído da sucessão será chamado para suceder como se tivesse o mesmo grau de

parentesco dos herdeiros mais próximos em grau do falecido12.

Esta sucessão é caracterizada pela desigualdade de graus entre os herdeiros, pois aqueles

que possuem grau mais próximo herdam por cabeça e os mais remotos, representam aquele que

foi excluído da sucessão ou era pré-morto ao autor da herança.

O direito de representação só é admitido em nosso direito em relação aos descendentes, no

parentesco por linha reta e na linha colateral ele é limitado aos sobrinhos, não se estendendo aos

demais parentes.

O direito de representação nos traz a figura da sucessão por estirpe, onde os descendentes

do herdeiro pré-morto ou excluído da sucessão herdam o seu quinhão, independente de quantos

sejam tais representantes. Portanto, A falece deixando três filhos: B, C e D. Ocorre que E, seu

quarto filho, lhe era pré-morto, mas deixou mais três filhos, F, G e H. A sucessão de A será

partilhada da seguinte forma: B, C e D recebem cada um 1/4 da herança e F, G e H partilharão o

1/4 destinado a seu pai, resultando em 1/12 para cada herdeiro representante.

Cabe ressaltar a distinção entre direito de representação e ius transmissionis, ou o direito de

transmissão, previsto no artigo 1809. Neste caso, o herdeiro falece após a abertura da sucessão,

sem ter efetuado a aceitação. Sendo assim, seus herdeiros se habilitam a receber o quinhão que

lhes coube na herança, como se fossem o próprio herdeiro falecido. Dá-se esse fenômeno por ser

o direito de suceder um verdadeiro direito subjetivo patrimonial, passando aos herdeiros do

falecido caso este não tenha ainda aceitado ou renunciado à herança.

3 - SUCESSÃO LEGÍTIMA

Denomina-se sucessão legítima aquela que é deferida através de determinação da lei. É a

modalidade de sucessão predominante em nossa sociedade, ocorrendo na ausência de

manifestação de vontade do sucedido através de testamento, quando este for nulo ou não

contemplar a totalidade de bens da herança.

4 - Da ordem da vocação hereditária

12

Sendo a indignidade e a deserdação modalidades de sanções civis, aplica-se a pessoalidade da pena, que só

poderá atingir ao herdeiro que tenha sofrido a sanção.

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Ordem pela qual são deferidos os direitos hereditários daqueles que têm sua condição de

herdeiros reconhecida por força de lei. A vocação hereditária no direito brasileiro defere-se

através de três critérios:

a) a preferência de classes, na forma explicitada no artigo 1.829, onde só se devolverá a herança

para a classe seguinte quando esgotada a anterior;

b) Preferência de grau, onde o mais próximo exclui o mais remoto, resguardadas as hipóteses do

direito de representação;

c) Divisão por cabeça, onde sendo os herdeiros de mesma classe e grau, a parte que caberá a

cada herdeiro será igual, ressalvadas as hipóteses em que o cônjuge é herdeiro concorrente ou a

sucessão é deferida ao Estado.

A ordem de vocação hereditária estabelecida pelo artigo 1829 traz um rol de herdeiros

legítimos, a quem a herança será atribuída de forma sucessiva após o esgotamento de cada uma

das classes sucessórias13.

Deferimento de direitos hereditários ao cônjuge sobrevivente:

O cônjuge supérstite é herdeiro em três classes sucessórias: na 1ª classe como herdeiro

concorrente com os descendentes, na 2ª, quando concorre com apenas ascendentes e na 3ª

classe, quando sucederá sozinho. Apenas não se falará em sucessão concorrente entre cônjuges e

descendentes quando o regime do casamento seja o da comunhão universal, separação

obrigatória de bens ou se casado pelo regime legal, o falecido não houver deixado bens

particulares. Nas demais classes ele herdará qualquer que seja o regime de bens.

Quanto à participação do cônjuge sobrevivente na sucessão do outro, se o regime de bens

for o da comunhão parcial, cabe ressaltar que no entender de Zeno Veloso ( Revista Brasileira de

Direito de Família, ano V, vol. 17, abr – maio 2003, Porto Alegre: Ed. Síntese, p. 145 ), “a

concorrência do cônjuge com os descendentes, se o casamento regeu-se pela comunhão parcial, já

é uma situação excepcional, que portanto, tem de receber interpretação restritiva. E, diante de

13

Lembre-se: cada inciso corresponde a uma classe sucessória e só passaremos à classe seguinte se for

esgotada a classe anterior.

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um quadro em que o cônjuge aparece bastante beneficiado, não há base ou motivo, num caso de

dúvida, para que se opte por uma decisão que prejudica os descendentes do ‘de cujus’, que,

ademais, têm de suportar – se for o caso – o direito real de habitação relativamente ao imóvel

destinado à residência da família, de que o cônjuge é titular, observado o artigo 1.831”. Esta

posição tem prevalecido.

Conforme previsão do artigo 1.832, caberá ao cônjuge sobrevivente quinhão hereditário

igual aos dos que sucederem por cabeça (ver nota art. 1.835), estando no entanto, em situação

privilegiada com relação a estes, pois sua cota não poderá ser inferior à quarta parte da herança

disponível, se for ascendente dos herdeiros com os quais vier a concorrer. O artigo é claro neste

sentido, contudo, a questão que se instaura é que, dada a modificação das estruturas familiares na

atualidade, como se regulará a partilha dos quinhões entre os filhos e o cônjuge sobrevivente, se

este não for ascendente de todos os filhos do falecido? Respeitar-se-á a quarta parte prevista em

lei, ou se partilhará em quinhões iguais? A interpretação que tem prevalecido é no sentido de que

havendo a filiação híbrida14 o quinhão deverá ser dividido por igual entre o cônjuge e os filhos.

Contudo, os direitos sucessórios atribuídos ao cônjuge supérstite só lhe serão deferidos se

comprovada à existência da sociedade conjugal. Logo, não cabe falar de capacidade sucessória do

cônjuge sobrevivente se ao tempo do falecimento não estava o casal separado judicialmente ou

separados de fato há mais de 2 anos. Dispensa-se hoje a apuração da culpa na dissolução da

sociedade conjugal.

Ainda quanto à situação jurídica do cônjuge supérstite, a ele é garantido pelo artigo 1831,

qualquer que seja o regime de bens, o direito real de habitação sobre o imóvel destinado à

residência da família, desde que este seja o único bem desta natureza a inventariar15.

A concessão deste direito real em nada obsta ou prejudica o cônjuge sobrevivo quanto à

aquisição da condição de herdeiro e a conseqüente aquisição do acervo hereditário.

Direito sucessório dos descendentes – Art. 1833 a 1835

14

Filhos somente do falecido e também dele com o cônjuge sobrevivente. 15

Por analogia, aplica-se este direito ao companheiro.

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O direito sucessório dos descendentes foi bastante alterado a partir do reconhecimento

do cônjuge como herdeiro necessário e concorrente. Contudo, o modo pelo qual a herança lhes

será deferida não sofreu qualquer tipo de alteração.

A sucessão entre descendentes, conforme disposto no artigo 1.835, que mantém na

íntegra a redação da lei anterior, em seu artigo 1.604, reconhece a existência de dois tipos de

direitos sucessórios no tocante a estes herdeiros, podendo ser por direito próprio e por estirpe

A sucessão por direito próprio é aquela onde os herdeiros, por serem os mais próximos em

graus do falecido, têm sua herança deferida individualmente, in capita. Logo, sendo A, B e C

herdeiros do falecido, cada um receberá 1/3 da herança por ele deixada, havendo a divisão por

cabeça.

Os descendentes, parentes em linha reta, têm sua relação de parentesco medida para com

o extinto a partir da contagem de graus, ou seja, o número de gerações que entre eles existem.

Havendo descendentes do mesmo grau, o acervo hereditário será partilhado

proporcionalmente ao número de herdeiros. É a denominada sucessão por cabeça ou por direito

próprio, onde o monte será repartido em igualdade de condições por tantos quantos forem os

herdeiros, ressalvados os casos em que o cônjuge for herdeiro concorrente e incorrer na hipótese

do artigo 1.832. Suponha-se que C, cônjuge sobrevivo, concorra com D, E, F, G, H e I, seus filhos

com o falecido. A herança será deferida 1/4 para o cônjuge sobrevivente e 1/8 para os filhos. Não

sendo o cônjuge sobrevivo ascendente dos demais herdeiros, a herança se partilhará igualmente

entre eles, sendo 1/7 para cada um deles.

O artigo 1.834 prevê disposição que já se encontrava implícita a partir da vigência da

Constituição Federal de 1988, onde os herdeiros de mesmo grau têm os mesmos direitos à

sucessão de seus ascendentes, sem qualquer caráter discriminatório. Este dispositivo veio

substituir o artigo 1.605 do Código Civil anterior, que equiparava os filhos legitimados, naturais

reconhecidos e adotivos aos legítimos, regra incabível sob a égide de nossa Lei Maior.

Não sendo os descendentes todos de mesmo graus, a lei reconhece a existência da sucessão

por representação, onde se dá uma vocação indireta, sendo o herdeiro chamado a suceder em

razão de ser descendente de herdeiro pré-morto ou que tenha sido declarado indigno (artigos

1.851 a 1.856.)

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Direito sucessório dos ascendentes - Art. 1.836 e Art. 1.837

A sucessão entre os ascendentes se operará quando não existirem quaisquer descendentes

do de cujus, situação na qual concorrerá, da mesma forma que os herdeiros de primeira classe,

com o cônjuge sobrevivente16 .

Nesta modalidade de sucessão, não existe a figura do direito de representação, havendo

apenas a sucessão por cabeça, onde o parente de grau mais próximo exclui imediatamente o de

grau mais distante. Logo, estando vivos o pai do falecido e seus avós maternos, a herança será

deferida integralmente ao primeiro, em conformidade com o preceituado no artigo 1.836, § 1°.

Não obstante, nesta modalidade sucessória ocorrerá a sucessão por linhas – in lineas – sendo

deferida metade para os ascendentes maternos do falecido e a outra metade, para os ascendentes

paternos.

Portanto, havendo ascendentes de mesmo grau e linhas diversas, o quinhão hereditário será

repartido ao meio, e atribuído aos herdeiros de cada uma das linhas. A exemplo, sendo herdeiros

um avô paterno do de cujus e os dois avós maternos, será atribuído 1/2 da herança ao primeiro e a

outra metade, será deferida aos dois últimos, sendo 1/4 para cada um deles, na forma do artigo

1.836, § 2°.

Novamente, o problema que se instaura é quando houver a figura do cônjuge sobrevivo.

Seguindo a regra do artigo 1.837 do Código Civil, concorrendo o cônjuge com ascendente de

primeiro grau, àquele tocará 1/3 da herança.

Se os ascendentes forem de 2° grau em diante ou se for apenas um, caberá ao cônjuge

sobrevivo 1/2 da herança disponível.

A exemplo, concorrendo o cônjuge com o pai e a mãe do falecido, caberá a cada um deles

1/3 da herança, conforme anteriormente demonstrado. Contudo, se o viúvo concorrer com uma

avó paterna e os dois avós maternos, a ele caberá 1/2 da herança, à avó paterna caberá 1/4, e aos

últimos, 1/8 do acervo hereditário.

Direito sucessório do cônjuge sobrevivente - Art. 1.838

16

Qualquer que seja o regime de bens do casamento.

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Não existindo descendentes ou ascendentes, o cônjuge sobrevivente será único herdeiro,

desde que atenda às disposições do artigo 1.830, fazendo parte da 3ª classe sucessória, qualquer

que seja o regime de bens do casamento.

Sucessão entre companheiros - Art. 1.790

Caracterizada a União Estável entre homem e mulher (Art. 1723 a 1727), o novo Código Civil

traz grande inovação neste artigo, ao reconhecer ao companheiro sobrevivente condições de

concorrer à sucessão do extinto.

A partir da vigência do novo Código Civil, conforme disposição contida no artigo 1790, o

companheiro sobrevivente terá direitos sucessórios, sem prejuízo da parte que lhe caiba por

meação. Destaca-se que esta faculdade incide apenas sobre o bens adquiridos onerosamente

durante a constância da união estável. Sendo os bens do de cujus decorrentes de aquisição a título

gratuito ou que componham o seu patrimônio particular, não há que se pleitear direitos

hereditários para o companheiro

Conforme o citado dispositivo, o companheiro sobrevivente poderá requerer quinhão

idêntico ao conferido aos filhos do casal; pleitear metade do quinhão conferido aos descendentes,

caso tenham apenas vínculo de parentesco com o falecido; concorrer a 1/3 dos bens havidos se

concorrer com outros parentes sucessíveis ou ainda, requerer a totalidade, na hipótese de não

existirem parentes sucessíveis.

Caberá também ao companheiro o direito real de habitação sobre o imóvel de residência do

casal, quer por analogia ao artigo 1831 ou pela aplicação da lei 9278/96 em seu artigo 7°, § único.

Sucessão entre colaterais - Art. 1.839 a 1.844

Inicialmente cabe ressaltar que os colaterais são considerados herdeiros facultativos, ou seja,

aqueles que podem ser totalmente alijados da sucessão pela manifestação de vontade do autor da

herança em testamento válido, conforme previsto no artigo 1.85017.

17

O afastamento dos colaterais da sucessão denomina-se erepção e não precisa de justificativa do testador.

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O direito brasileiro prevê a sucessão para os colaterais de até 4° grau (ver relações de

parentesco – artigos 1.591 a 1.595).

Semelhantemente à sucessão dos ascendentes, o colateral de grau mais próximo exclui

aquele de grau mais remoto, ressalvada a hipótese prevista no artigo 1.840, que concede aos

sobrinhos do falecido sucederem a seus pais pelo instituto do direito de representação.

O Código Civil trata da sucessão dos irmãos bilaterais de forma diversa da sucessão entre

irmãos unilaterais. Estes últimos herdam metade do que é destinado aos irmãos bilaterais (a lei

anterior utilizava a expressão “irmãos germanos”, hoje pouco utilizada) e esta restrição também é

estendida aos sobrinhos, filhos destes. Ou seja, A e B são irmãos bilaterais do falecido e C é irmão

unilateral. Os dois primeiros herdarão 2/5 da herança e o último, 1/5. Esta mesma solução é

aplicada quando concorrerem apenas sobrinhos do de cujus, como prevê o artigo 1.843, § 2°.

Se todos os herdeiros forem irmãos ou sobrinhos bilaterais ou unilaterais, todos herdam por

cabeça, sem qualquer distinção quanto à parte no quinhão hereditário, conforme disposto nos

artigos 1.842 e 1.843, § 3°.

Importante ressaltar o artigo 1.834 dispõe que “na falta de irmãos, herdarão os filhos

destes”, em detrimento dos tios do de cujus, parentes de grau idêntico aos sobrinhos do morto.

Não havendo sobrinhos, a herança será deferida aos parentes mais próximos em grau, sempre

respeitando o limite do 4° grau de parentesco imposto pelo artigo 1.839.

Verificando-se a inexistência de herdeiros legítimos ou testamentários, a herança será

declarada jacente, sendo deferida ao Estado, seguindo o disposto nos artigos 1.819 a 1.823 e nos

artigos 1.142 a 1.158 do Código de Processo Civil.

4 - Da Herança Jacente - Art. 1.819 a 1.823

A herança jacente caracteriza-se como aquela que, embora tenha sido aberta a sucessão, não

se transmitiu aos seus titulares, seja por inexistirem herdeiros conhecidos ou por estes a terem

renunciado. É calcada na incerteza da existência dos herdeiros, sendo aquela que permanece sem

titular.

A partir da declaração de jacência, os bens da herança se tornam uma massa cuja

administração é confiada a um administrador designado pelo juiz competente, passando a

constituir um ente despersonalizado.

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Findo o processo de jacência, o acervo hereditário se incorporará ao domínio do Poder

Público (Município ou Distrito Federal), através da declaração de vacância, quando se reconhece

que não houve qualquer herdeiro em condição de se habilitar àqueles bens. Nesta fase, o

patrimônio permanecerá sob a propriedade resolúvel do Município ou do Distrito Federal, até que

se completem 5 (cinco) anos da abertura da sucessão ou que a herança seja reivindicada pelos

herdeiros que a ela se habilitarem. Findo o prazo de 5 anos, a herança passará a ser parte

integrante do patrimônio do Estado em caráter definitivo.

O procedimento de arrolamento dos bens de uma herança jacente é feito através de

arrecadação na forma do artigo 1.145 do C.P.C., objetivando realizar um levantamento dos bens

deixados, bem como anunciar a jacência do patrimônio para que haja a habilitação dos possíveis

herdeiros.

Obs.: A herança jacente não se confunde com o espólio, pois embora ambos sejam uma massa de

bens, este possui titulares desde a abertura da sucessão, enquanto aquela não possui seus

herdeiros identificados.

Hipóteses em que a herança será considerada jacente:

a) Não há herdeiro certo e determinado

b) Não se sabe da existência de herdeiros

c) É repudiada e não existem outros herdeiros

d) Será destinada a nascituro

e) Aguarda-se a constituição de pessoa jurídica a quem foram destinados os bens

f) O herdeiro foi instituído sob condição suspensiva ainda pendente.

5 - Da petição de herança - Art. 1.824 a Art. 1.828

A doutrina e a jurisprudência fartamente reconheciam a possibilidade do sucessor que foi

afastado da sucessão hereditária intentar em face daqueles que detinham a posse do acervo

patrimonial do de cujus, ação de petição de herança, de rito ordinário, com o objetivo de

reconhecer sua qualidade de herdeiro. Ocorre que o Código Civil atual acolheu expressamente em

seu texto esta ação, reconhecendo seus efeitos para os herdeiros que por qualquer motivo

tenham sido afastados da sucessão.

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Esta ação possui dois objetivos fundamentais: reconhecer judicialmente a capacidade

sucessória do herdeiro a quem foram negados os direitos sucessórios e por conseqüência,

restituir-lhe os bens da herança, seja em parte ou na sua totalidade.

É fundamental que o herdeiro demonstre sua qualidade sucessória, para que haja a

recuperação no todo ou em parte da herança, o que via de regra é realizado através da

propositura de uma ação de estado, v.g., investigação de paternidade, para que haja o

reconhecimento dos seus direitos sucessórios. Esta ação é considerada como uma ação real e deve

ser proposta em face dos herdeiros aparentes ou qualquer pessoa que esteja na posse ou

administração do patrimônio.

Cabe ressaltar a existência da Súmula 149 do STF, que reconhece a imprescritibilidade da

ação de investigação de paternidade, mas não da petição de herança.

PROTEÇÃO AOS HERDEIROS NECESSÁRIOS

1 – LIMITAÇÃO AO PODER DE DISPOR:

Herdeiros necessários: Art. 1.845 a Art. 1.850.

- O Código Civil Português, em seu artigo 2.156, define a legítima como a “porção de bens de que

o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos herdeiros legitimários”. Segundo

este dispositivo, podemos entender a legítima sob duas perspectivas: a do autor da sucessão e a

dos herdeiros necessários. Para o autor da sucessão, a legítima é a porção de bens de que não

pode dispor; para os herdeiros necessários, é a porção de bens que lhes é legalmente destinada.

Logo, temos de um lado, a noção da legítima (para os herdeiros necessários) e do outro, de cota

indisponível (para o autor da sucessão).

- Obs.: Embora a condição de herdeiro só surja a partir do momento da abertura da sucessão, a

proteção à legítima é garantida anteriormente, quando por exemplo, veda-se ao titular do

patrimônio as doações que excedam à parte da qual ele poderia dispor em testamento (doações

inoficiosas – art. 549)

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- Companheiro deve ser considerado herdeiro necessário? Antes do Código Civil o STJ entendeu

que não ( Resp. 191.393-SP ) . Sob a égide da nova lei, para Caio Mário ( Carlos Roberto Barbosa

Moreira ), é forçoso que se reconheça a condição de herdeiro necessário ao companheiro, uma

vez que esta união, possuindo o status de família, tem especial proteção constitucional. Para o

autor, a redação do artigo 1790 “determina” a participação do companheiro na sucessão e

portanto, tornando-o uma espécie de herdeiro necessário. No entanto, para a maioria

esmagadora da nossa doutrina, o companheiro não pode ser considerado herdeiro necessário.

- CÁLCULO DA LEGÍTIMA:

O cálculo da legítima é feito sobre o patrimônio líquido da herança, descontadas todas as

despesas e as dívidas que porventura tenham sido deixadas pelo falecido ou contraídas pelo

espólio, somando-se ainda as doações que tenham sido feitas em vida pelo autor da herança aos

seus descendentes.

- Toda manifestação de vontade que incida sobre a parte que exceder aos limites da legítima

será considerada uma liberalidade inoficiosa, sendo declarada ineficaz, facultando ao herdeiro

lesado ingressar com ação de redução para que obtenha a reintegração da legítima.

O Código Civil atual é mais rigoroso quanto a este aspecto, limitando tal disposição de

vontade. Inicialmente, no artigo 1.848, § 1°, é vedado ao testador converter os bens da herança

em bens de qualquer outra natureza e ainda, no caput do mesmo dispositivo, apenas é permitido

ao testador estabelecer gravames aos bens da legítima se houver justa causa declarada em

testamento18.

18

“Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer cláusula de inalienabilidade e de impenhorabilidade, sobre os bens da legítima. ......................................................................................................................... § 3o Ao testador é facultado, livremente, impor a cláusula de incomunicabilidade “. (NR) 152. Art. 1.848: O art. 1.848, caput, em sua redação atual só admite a imposição de cláusulas restritivas à legítima – inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade –, se houver justa causa, declarada no testamento. Não devia ter sido incluída na previsão do art. 1.848 a cláusula

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Acolhendo posicionamento já consolidado em nossa jurisprudência, o § 2° do artigo 1.848

admite a alienação dos bens gravados, desde que haja a sub-rogação mediante autorização

judicial.

O artigo 1.849 apenas limita-se a repetir a redação do artigo 1.724 do Código Civil anterior,

prevendo que o herdeiro beneficiado em testamento com a parte disponível do autor da herança,

não perde seu direito à herança.

Portanto, sendo A, B e C filhos do testador, e tendo este beneficiado B com sua parte

disponível, este herdará 2/3 da herança e os demais herdarão 1/6. Vejamos:

Desta forma, analisemos os dados apresentados:

• O testador, era pai de A, B, C.

• Deixou “a disponível”, equivalente a 50%, para seu filho B.

Matematicamente, a modelagem do problema é a seguinte:

A legítima, equivalente a 1/2 (50%) será dividida entre os três filhos (A, B, C).

• 1/2 divididos por 3 = 1/2 x 1/3 = 1/6 = 16,66% para cada filho.

A disponível, equivalente a 1/2 (50%) teve como beneficiário apenas o filho B.

Então a parte de B é a seguinte: 1/2 (disponível – 50%) + 1/6 (legítima – 16,66%) = 4/6 = 2/3 =

66,68 %

Assim,

de incomunicabilidade. De forma alguma ela fere o interesse geral, prejudica o herdeiro, desfalca ou restringe a legítima, muito ao contrário. O regime legal supletivo de bens é o da comunhão parcial (art. 1.640, caput), e, neste, já estão excluídos da comunhão os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão (art. 1.659, I). Assim sendo, se o testador impõe a incomunicabilidade quanto aos bens da legítima de seu filho, que se casou sob o regime da comunhão universal, nada mais estará fazendo do que seguir o próprio modelo do Código, e acompanhando o que acontece na esmagadora maioria dos casos.

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Filhos A disponível A legítima Total

A 0 1/6 = 16,66% 1/6 = 16,66%

B 1/2 = 50% 1/6 = 16,66% 2/3 = 66,68%

C 0 1/6 = 16,66% 1/6 = 16,66%

TOTAL 1/1 = 100%

Partilha na hipótese de representação:

: B, C e D recebem cada um 1/4 da herança e F, G e H partilharão o 1/4 destinado a seu pai,

resultando em 1/12 para cada herdeiro representante, conforme figura abaixo.

SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

1 – Conceito e natureza

É a aquela que emana da manifestação de vontade do titular da herança através de

declaração manifestada em um negócio jurídico denominado testamento. É a ordem sucessória

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que se revela através da manifestação de vontade efetuada pelo testador, que estabelece sua

sucessão de maneira diversa daquela estabelecida em lei.

A sucessão testamentária não exclui a sucessão legítima, podendo coexistir quando existirem

herdeiros necessários ou bens que nele não tenham sido contemplados. Neste caso, denomina-se

sucessão mista, onde a parcela do patrimônio não prevista no testamento será deferida aos

herdeiros pela ordem de vocação hereditária estabelecida em lei.

É a possibilidade que a lei confere ao titular de um patrimônio de instituir seus herdeiros e

legatários.

Poderá ser estabelecida a título universal ou singular. Sucessão testamentária universal é

aquela em que são chamados a suceder os herdeiros com a totalidade do acervo hereditário ou

através de quinhões divididos em frações ideais.

Na sucessão testamentária singular, há a instituição do legado, onde os herdeiros, ora

denominados legatários, herdam coisa certa e determinada, individualizada pela vontade do

testador.

Em nossa sociedade esta modalidade sucessória é uma excepcionalidade, pois a esmagadora

maioria das transmissões dos direitos hereditários dá-se através da sucessão legítima.

O direito brasileiro adota como princípio norteador da transmissão da herança a relativa

liberdade de testar. O testador está limitado pela existência de herdeiros necessários, vedação

explicitada no artigo 1.857, § 1°. Há a liberdade de testar mitigada, em face da existência da

legítima.

Pode-se definir testamento como o negócio jurídico unilateral através do qual o autor de

determinada herança dispõe sobre a sua própria sucessão. O testamento se aperfeiçoa no

momento da manifestação de vontade, desde que atenda aos requisitos da Lei. Poderá ser total,

quando incidir sobre a integralidade do patrimônio ou parcial, quando contemplar apenas parte

do acervo hereditário.

Para nossa melhor doutrina, o testamento é negócio jurídico pessoal, unilateral, formal,

gratuito, de última vontade, revogável e mortis causa, não havendo qualquer possibilidade de

produzir efeitos durante a vida do testador. A legislação brasileira prevê a existência dos

testamentos ordinários e dos testamentos especiais. Contudo, qualquer que seja a modalidade

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escolhida pelo testador, havendo o respeito às formalidades exigidas pela lei, seu valor jurídico

será exatamente o mesmo.

Como negócio jurídico revogável, o testamento pode ser modificado a qualquer tempo pelo

testador, podendo ser totalmente revogado ou modificado em apenas parte de seu conteúdo.

A lei confere ao interessado a faculdade de impugnar o testamento quando seu teor não

esteja em conformidade com a manifestação de vontade do de cujus, ou contenha algum vício em

sua constituição no período de 5 anos contados do registro, prazo este de natureza decadencial.

Esta disposição não possui correspondência na legislação anterior.

3– Pressupostos:

A validade do testamento está condicionada à apuração de elementos intrínsecos ( capacidade

do testador, espontaneidade da declaração, objeto e limites desta ) e de elemento extrínseco ou

formal. No entender de Caio Mário, pressupõe os requisitos externos ou formais e bem assim, os

de natureza subjetiva.

3.1 – capacidade de testar – art. 1860 e 1861

Capacidade de testar é a condição objetiva para que a pessoa manifeste de forma válida

sua vontade em testamento para que produza efeitos após o seu falecimento. É uma capacidade

de exercício, não se confundindo com a capacidade de direito do indivíduo. A exemplo, aquele que

testar e for acometido de incapacidade posterior, mantém-se no exercício do seu direito a ver

efetuada a sucessão na forma em que manifestara, contudo, não poderá efetuar um novo

testamento que seja válido.

O legislador foi mais feliz ao elaborar a redação do presente dispositivo, quando prevê que o

testador tenha como requisito fundamental para que tenha capacidade de testar o denominado

discernimento. A questão que sem dúvida se levantará é como mensurar a existência do

discernimento para testar. Nas hipóteses em que houver sentença de interdição declarando a

incapacidade do indivíduo, é evidente a inexistência da incapacidade. Contudo, nos casos em que

este discernimento não seja explicitado, o interessado em declarar nulas as disposições

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testamentárias deverá provar a ausência condições objetivas para que o testamento seja

celebrado.

Para Orlando Gomes19, a incapacidade para testar deve sempre ser provada em juízo,

admitindo-se todos os meios de prova para tal, havendo no entanto, a predominância da prova

documental sobre a testemunhal. Devendo-se provar que o manifestante da vontade era portador

de uma incapacidade permanente, extensiva a todos os demais atos da vida civil ou acidental, que

não decorre sempre de uma anomalia psíquica, mas que no momento da elaboração do

testamento o agente não estava em seu perfeito juízo.

A capacidade à qual os dispositivos acima se referem é a capacidade ativa, qual seja, a

condição objetiva de elaborar testamento válido, que coadune com a real intenção do

manifestante. A incapacidade de testar acarreta a nulidade do testamento, não podendo ser

validado posteriormente, ainda que a situação do testador seja modificada. Ou ao contrário,

celebrando o testamento quando plenamente capaz, o testador acometido de incapacidade

posterior não terá sua manifestação de vontade eivada de nulidade, sendo perfeitamente válida e

produzindo seus regulares efeitos.

Das disposições testamentárias

As disposições testamentárias são o instrumento através do qual o testador busca solucionar

a partilha de seu patrimônio após a sua morte, podendo também estabelecer cláusulas de caráter

não patrimonial e que deseja que produzam efeitos após a sua morte. Na lição de Oliveira

Ascensão, testamento não pode ser caracterizado apenas como um ato de disposição de bens,

pois deve atender tanto ao seu aspecto patrimonial quanto pessoal. Embora seja corrente a

concepção de que a principal vocação da disposição testamentária é regular a questão

patrimonial, não raro encontramos em testamentos disposições tocantes ao reconhecimento de

filhos fruto de relações extraconjugais, a revogação de testamento anterior, a designação de

tutores ou curadores aos filhos incapazes do de cujus, a nomeação de testamenteiro, o perdão a

herdeiro excluído por ter incorrido em uma das hipóteses do artigo 1.814, disposições acerca do

enterro, solenidades post mortem e outras tantas.

19

Sucessões, 2008, Forense, 83-86

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Ao regular tais disposições, o legislador buscou nortear a manifestação de vontade do

testador, de maneira a assegurar a formalidade e os princípios jurídicos e morais que devem estar

contidos em todos os negócios jurídicos. Cabe ressaltar que todas as disposições acerca da

herança devem se originar do ato causa mortis. Não é possível que haja qualquer disposição em

outros instrumentos contratuais ou declarações de vontade.

Partindo-se do pressuposto que todo testamento é um negócio jurídico (ver comentários ao

capítulo I do Título III deste Livro), como tal deverá ser considerado, podendo, portanto, conter

disposições que estipulem aos herdeiros condições ou encargos para que sua situação jurídica se

aperfeiçoe. É importante ressaltar que não se admite em nosso Direito a herança a termo, com

exceção do instituto do fideicomisso.

Contudo, nossa doutrina consideram que tais condições devam ser físicas e juridicamente

possíveis, não tendo validade quando versarem sobre questões limitadoras das liberdades

individuais do herdeiro, reputando-se como não escritas, assim como aquelas que contrariem

normas de ordem pública, v. g., considera-se inválida a condição que estabeleça que o herdeiro

nunca deva se casar, deixar de estudar, converter-se a determinada religião ou praticar atos

ilícitos.

Também deve ser relembrada a concepção existente no direito brasileiro de que apenas as

pessoas podem ser consideradas sujeitos de uma relação jurídica, logo, podendo ser beneficiadas

em testamento. Não há a possibilidade de se testar em favor de coisas ou animais, salvo se

beneficiá-los indiretamente através de disposição testamentária que determine que o herdeiro

deverá zelar por um desses objetos de direito.

Quanto à instituição da pessoa do herdeiro, é eivado de nulidade por disposição expressa do

artigo 1.900 a instituição do herdeiro sob condição captatória, a herdeiro que não se possa

averiguar a identidade ou que venha a ser identificado por terceiro, que estabeleça legados sem

valor fixo, com exceção do previsto no artigo 1.901, inciso II (ver artigo 1.912 e seguintes) e que

beneficie as pessoas elencadas nos artigos 1.801 e 1.802.

Serão perfeitamente válidas as disposições a pessoas incertas, desde que no momento da

abertura da sucessão haja a possibilidade de se precisar a identidade de tais herdeiros, como na

hipótese do artigo 1.901, inciso I, da Lei. Contudo, o artigo 1.903 traz exceção quanto a não

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identificação do herdeiro ou legatário, quando por outros instrumentos inequívocos puder se

precisar a pessoa ou à coisa pretendida pelo testador.

Quanto à partilha do quinhão hereditário, todos os bens não contemplados em testamentos

serão partilhados conforme a regra da herança legítima, conforme a ordem de vocação

hereditária. Os artigos 1.904 a 1.908 estabelece de forma cristalina o modo pelo qual deverão ser

partilhados os bens do acervo hereditário, no momento da execução do testamento válido.

O artigo 1911, consagra-se uma tendência jurisprudencial já consolidada através da Súmula

49 do STF, ao trazer presunção de que a inalienabilidade imposta aos bens através de disposição

testamentária, implica também na incomunicabilidade e na impenhorabilidade dos bens. Reflete

também a jurisprudência já pacificada ao admitir a sub-rogação dos bens clausulados mediante

autorização judicial, partindo exclusivamente da conveniência econômica do donatário ou

herdeiro20.

Dos Legados

É toda disposição testamentária a título singular, ou seja, aquela que deixa para o

beneficiário na sucessão, ora denominado legatário, bens ou direitos individualizados. Portanto, o

legado se caracteriza pela transmissão de um bem específico e pelo fato de o legatário não

responder pelo passivo da herança, enquanto o herdeiro, como recebe um quinhão, fração ou

parcela do falecido, abrangendo tanto os haveres como os débitos da massa de bens que

constituiu o espólio.

Das substituições

Instituto privativo da sucessão testamentária, é o ato através do qual o testador nomeia

herdeiro ou legatário para ser chamado a suceder na ausência daqueles originariamente

designados no testamento ou pelo advento de termo ou condição resolutiva.

20

Atenção: Não há necessidade de se apresentar justa causa para gravar tais bens, somente quando os

gravames incidirem sobre a legítima (art. 1848)

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Este herdeiro é denominado substituto ou suplente e poderá ocorrer nas hipóteses do artigo

1947 a 1953.

Da deserdação

É a manifestação de vontade efetuada em testamento, através da qual o titular do

patrimônio afasta o herdeiro necessário da sucessão legítima. É uma modalidade de disposição

testamentária negativa, excluindo da sucessão àqueles a quem a lei garante um quinhão. É

instituto que visa afastar apenas os herdeiros legítimos, pois a exclusão dos herdeiros facultativos

se faz pelo mero ato do testador dispor de seu patrimônio de forma diversa daquela prevista em

lei.

A deserdação só poderá ser efetuado nas hipóteses previstas em lei, sendo portanto,

numerus clausus, não podendo ficar ao arbítrio do testador, devendo ser declarada por justo

motivo, na forma do artigo 1.964 e reconhecida por sentença em ação própria, movida pelo

herdeiro interessado, através de ação de rito ordinário, cujo prazo decadencial de 4 anos

encontra-se explicitado no artigo 1.695, § único.

Da redução das disposições testamentárias

Quando existirem herdeiros necessários, como já tratado na análise dos dispositivos acima, o

testador só poderá testar sobre metade de seu patrimônio disponível. Ocorre que, havendo

violação deste dispositivo, através de disposição testamentária ou através de doação inter vivos,

que caracterizem excesso nas manifestações de vontade emanadas do “de cujus”, poderão os

herdeiros necessários, qualquer daqueles que estejam sub-rogados em seus direitos ou créditos

ou os credores do herdeiro lesado, requerer no curso do processo de inventário ou através de

ação própria, denominada “actio in rem scripta”, a anulação das partes das disposições que sejam

fruto da liberalidade excessiva do testador.

Da revogação do testamento

Sendo o testamento uma modalidade de negócio jurídico essencialmente revogável, poderá

o testador a qualquer tempo modificar a sua manifestação de vontade, até o momento de sua

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morte. É possível esta revogação a qualquer tempo por ser o testamento uma disposição de

última vontade, por ser aquela que irá prevalecer após a sua morte, bem como poderá torná-lo

sem efeito a qualquer tempo, até o momento de seu falecimento.

O testador poderá revogar seu testamento, através de outra disposição de qualquer

natureza, não necessitando ser feita no mesmo tipo de instrumento pelo qual a vontade foi

manifestada. A revogação poderá ser expressa, quando especificamente mencionar nos termos do

ato revogador o desejo de se tornarem ineficazes as disposições de testamento anterior. Será

tácita quando as disposições do testamento mais novo forem incompatíveis com as cláusulas do

documento anterior.

Quanto o testamento revogatório tratar de todo o patrimônio do testador de forma diversa

do primeiro, haverá a revogação total. Havendo ato posterior apenas dispondo sobre parte dos

bens, haverá uma revogação parcial e nesta hipótese os dois testamentos deverão ser

considerados, valendo as disposições do primeiro negócio jurídico que não conflitarem com as

cláusulas do último.