apostila parte 1 fisica nuclear

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR E DE PARTÍCULAS ELEMENTARES UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE FÍSICA Prof. Susana de Souza Lalic 2013

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Page 1: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE

INTRODUÇÃO A FÍSICA

NUCLEAR E DE PARTÍCULAS

ELEMENTARES

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E

TECNOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE FÍSICA

Prof. Susana de Souza Lalic

2013

Page 2: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Aula 1 Estrutura nuclear: propriedades dos núcleos

Meta Introduzir os conceitos sobre as propriedades nucleares

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Reconhecer a importância da física nuclear na atualidade

Contextualizar historicamente as descobertas científicas ligadas às radiações.

Reconhecer as propriedades do núcleo atômico:

Raio

Número de massa

Volume

Densidade

Pré-requisitos Pegue uma tabela periódica ou um livro de química do ensino médio e deixe-os próximo para alguma consulta básica, se necessário

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Importância da Física Nuclear Também já soube que alguém com câncer se submeteu a uma radioterapia e que se curou? Também já viu que armas nucleares são extremamente poderosas e perigosas? Você já foi a um museu de arqueologia? Já parou para pensar como é que eles sabem datar aqueles esqueletos?

Quais os princípios físicos envolvidos nessas “coisas”? No último século (XX) a física nuclear produziu efeitos arrebatadores sobre a humanidade: benéficos e maléficos. Você seria capaz de discutir com alguém sobre esses efeitos. Teria argumentos a favor ou contra baseados em conhecimento científico? OU simplesmente é contra tudo o que for “NUCLEAR” por que pode matar, poluir etc. Veja bem: A opinião ideal é aquela baseada, não em emoções, mas em dados técnicos. Vamos começar nessa aula a mostrar a você do que se trata esse assunto para que você possa opinar com mais segurança!

O átomo Não é de hoje que as pessoas perguntam: "Do que o mundo é feito?" As pessoas concluíram que a matéria que compõe o mundo é na verdade um conglomerado de alguns blocos fundamentais de construção da natureza. A palavra "fundamental" é a chave aqui. Entendemos por blocos fundamentais de construção objetos que são simples e sem estrutura -- não são constituídos por nada menor. Mesmo na Antiguidade, as pessoas procuravam organizar o mundo ao seu redor em elementos fundamentais, como terra, ar, fogo e água. O pensador grego Empédocles foi o primeiro a classificar os elementos como fogo, ar, terra e água, embora nosso diagrama seja em homenagem à classificação de Aristóteles.

Hoje nós sabemos que há algo mais fundamental que terra, água, ar e fogo...

Por definição há cor, Por definição há doce, Por definição há amargo, Mas na realidade há átomos e espaço. -Demócrito (c. 400 AC) Por volta de 1900, as pessoas pensavam nos átomos como bolas permeáveis com pequenas quantidades de carga elétrica vibrando internamente.

Mas o átomo é fundamental? As pessoas logo perceberam que poderiam classificar os átomos em grupos que compartilham propriedades químicas similares

(como na Tabela Periódica dos Elementos). Isso indicava que os átomos eram simples blocos de construção, e que esses blocos em diferentes combinações é que determinavam quais átomos teriam quais propriedades químicas. Além disso, experimentos que "olharam" o interior de um átomo usando sondas de partículas indicaram que os átomos tinham estrutura e que não eram somente bolas permeáveis. Esses

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experimentos ajudaram os cientistas a determinar que os átomos têm um minúsculo núcleo denso, positivo e uma nuvem de elétrons negativos (e

-).

O termo "átomo" é uma expressão errada. Por que? Em grego a palavra átomo ("atomon") significa "que não pode ser dividido". Mas as entidades que nós chamamos de átomos são feitas de partículas mais fundamentais! O átomo No final do século XIX, o elétron já estava estabelecido como partícula fundamental, principalmente depois de 1897, ano em que J. J. Thomson determinou a sua razão carga/massa. E já se sabia que elétrons eram liberados por emissão termoiônica (de um metal a alta

temperatura), no efeito fotoelétrico e no decaimento de certos elementos radioativos. Desse modo, os elétrons já eram considerados como constituintes básicos dos átomos.

Segundo o modelo atômico apresentado em 1904 por J. J. Thomson, o átomo deveria ser constituído por algum tipo de fluido de forma esférica, com uma distribuição contínua de carga positiva, e de elétrons com carga negativa distribuídos no fluido em número suficiente para que a carga total do sistema fosse nula. O modelo exigia dos elétrons que tivessem movimentos oscilatórios ao redor de certas posições que definiriam configurações estáveis para o sistema. E como, segundo a teoria eletromagnética clássica, qualquer partícula com carga elétrica em movimento acelerado emite radiação eletromagnética, o modelo também exigia que os modos normais das oscilações dos elétrons tivessem as mesmas frequências que aquelas observadas associadas às raias dos espectros atômicos. Contudo, segundo a teoria eletromagnética clássica, não pode existir qualquer configuração estável num sistema de partículas carregadas se a única interação entre elas é de caráter eletromagnético. Além disso, não foi encontrada qualquer configuração para os elétrons de qualquer átomo cujos modos normais tivessem qualquer uma das frequências esperadas. De qualquer modo, o modelo de Thomson foi abandonado principalmente devido aos resultados do experimento de Rutherford. Experimento de Rutherford Na época em que J. J. Thomson propôs seu modelo, H. Geiger e E. Marsden estudavam o

espalhamento de feixes bem colimados de partículas , que já se sabia serem núcleos de átomos de hélio, por finas folhas de ouro, pelo que hoje se conhece como o experimento de Rutherford.

Uma fonte radioativa emite partículas que são colimadas, formando um feixe paralelo e estreito, que incide sobre uma folha metálica muito pouco espessa. Para que fosse possível

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construir tal folha, a maleabilidade do metal deveria ser grande e, por isso, era usado normalmente o ouro. A folha é tão fina que as partículas a atravessam completamente com apenas uma pequena

diminuição no módulo da velocidade. Ao atravessar a folha, entretanto, cada partícula sofre muitos desvios devido a sua interação eletrostática com as cargas positivas e negativas dos átomos da folha. As partículas espalhadas eram detectadas por um microscópio com uma tela de sulfeto de zinco (ZnS).

A tela de sulfeto de zinco cintila no local onde incide uma partícula . O microscópio permite identificar a cintilação de cada partícula a individualmente.

Os resultados experimentais de Geiger e Marsden mostraram que o número de partículas que eram desviadas com ângulos maiores do que 90 graus era muito maior que o esperado pelo modelo de Thomson. Em 1911, E. Rutherford mostrou que os dados de Geiger e Marsden eram consistentes com um modelo atômico em que a carga positiva do átomo se concentrava em uma pequena região que, além disso, continha praticamente toda a massa do átomo, com os elétrons espalhados ao redor dessa pequena região (chamada núcleo).

EEllee ttiirroouu aass sseegguuiinntteess ccoonncclluussõõeess ddoo eexxppeerriimmeennttoo::

EExxppeerriiêênncciiaa ddee RRuutthheerrffoorrdd

EEmm 11991111,, EErrnneesstt

RRuutthheerrffoorrdd rreeaalliizzoouu

eexxppeerriiêênncciiaass bboommbbaarrddeeaannddoo

uummaa ffiinnííssssiimmaa llââmmiinnaa ddee oouurroo

((1100--44

mmmm ddee eessppeessssuurraa)) ccoomm

ppaarrttííccuullaass aallffaa,, ccuujjaa ccaarrggaa

eellééttrriiccaa éé ppoossiittiivvaa ((22++)),,

eemmiittiiddaass ppeelloo ppoollôônniioo,, uumm

mmaatteerriiaall rraaddiiooaattiivvoo..

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AA mmaaiioorriiaa ddaass ppaarrttííccuullaass aallffaa aattrraavveessssaa aa ppllaaccaa NNoo ááttoommoo hháá ggrraannddeess

eessppaaççooss vvaazziiooss..

AAllgguummaass ppoouuccaass ppaarrttííccuullaass aallffaa ffoorraamm rreebbaattiiddaass.. NNoo cceennttrroo ddoo ááttoommoo

eexxiissttee uumm nnúúcclleeoo mmuuiittoo ppeeqquueennoo ee ddeennssoo..

AAss ppaarrttííccuullaass aallffaa,, qquuee ppoossssuueemm ccaarrggaa ppoossiittiivvaa,, qquuaannddoo ppaassssaavvaamm ppeerrttoo ddoo

nnúúcclleeoo,, eerraamm rreeppeelliiddaass ssooffrreennddoo ddeessvviioo eemm ssuuaa ttrraajjeettóórriiaa OO nnúúcclleeoo ddoo

ááttoommoo tteemm ccaarrggaa ppoossiittiivvaa..

RRuutthheerrffoorrdd aaddmmiittiiuu qquuee hhaavviiaa eellééttrroonnss ggiirraannddoo aaoo rreeddoorr ddoo nnúúcclleeoo ppaarraa

eeqquuiilliibbrraarr ssuuaa ccaarrggaa ppoossiittiivvaa..

Proposta de Rutherford: A estrutura de um átomo é semelhante à do

Sistema Solar

O Núcleo O raio de um núcleo típico é cerca de dez mil vezes menor que o raio do átomo ao qual pertence, mas contém mais de 99,9% da massa desse átomo.

Por parecer pequeno, sólido e denso, os cientistas pensaram originalmente que o núcleo era fundamental. Mais tarde, descobriram que ele era feito de prótons (p), que são carregados positivamente, e nêutrons (n), que não têm carga. E então, os prótons e os nêutrons são fundamentais? Os físicos descobriram que os prótons e os nêutrons são compostos de

partículas ainda menores, chamadas quarks. Até onde sabemos, os quarks são como os pontos na geometria. Eles não são compostos de nada mais. Depois de testar extensivamente essa teoria, os cientistas agora suspeitam que os quarks e o elétron (e algumas outras coisas que veremos na segunda parte do curso) são fundamentais. Características Gerais do Núcleo Componentes O núcleo atômico é composto de partículas chamadas núcleons. Existem duas espécies de núcleons: os prótons, com carga elétrica positiva, e os nêutrons, sem carga elétrica. Prótons e nêutrons têm spin ½ , ou seja, são férmions e obedecem ao princípio de exclusão de Pauli. O núcleo do elemento da tabela periódica de número atômico Z é constituído de Z prótons e N nêutrons. No átomo neutro correspondente, existem, ao redor desse núcleo, Z elétrons. A = N + Z é o número de núcleons ou, como também é chamado, número de massa. Massa As massas nucleares são convenientemente expressas em unidades de massa atômica (u). Uma unidade de massa atômica é definida como sendo exatamente um doze avos da massa de um átomo de carbono 12. Em outras palavras, a massa de um átomo de carbono 12 é, por definição, exatamente 12 u. Em termos numéricos:

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1u = 1,6605 x 10-27

kg (O melhor valor de u aceito atualmente é 1 u = 1,66053886(28) x 10

-27)

A massa de um átomo de carbono 12 vale: m(C) = 12 ( 1,6605 x 10

-27 kg ) = 1,9926 x 10

-26 kg

e esse valor inclui as massas dos prótons, nêutrons e elétrons. A massa de um elétron é: m(e) = 9,1093 x 10

-31 kg

de modo que a massa dos 6 elétrons do átomo de carbono 12 é: m(6e) = 6 ( 9,1093 x 10

-31 kg ) = 5,46558 x 10

-30 kg

Dessa forma: m(C) / m(6e) = ( 1,9926 x 10

-26 kg ) / (5,4656 x 10

-30 kg) = 3,6457 x 10

3

Assim, a massa dos elétrons é desprezível comparada à massa do átomo e a massa do átomo pode ser considerada igual à massa do núcleo atômico. Em termos da unidade de massa atômica, as massas do próton e do nêutron são: m(p) = 1,0078 u m(n) = 1,0087 u Por outro lado, com os valores: c = 2,9979 x 10

8 m/s módulo da velocidade da luz no vácuo

1 J = 6,2415 x 1012

MeV relação entre J e MeV Da conhecida relação de Einstein entre massa e energia, E = mc

2

1 uc

2 = 931,4815 MeV m(e)c

2 = 0,5110 MeV m(p)c

2 = 938,7471 MeV m(n)c

2 = 939,5854 MeV

Tamanho do núcleo Os elétrons estão em constante movimento em torno do núcleo; os prótons e os nêutrons vibram dentro do núcleo e os quarks vibram dentro dos prótons e nêutrons. Esta figura está bastante distorcida.

SSee oo nnúúcclleeoo ttiivveessssee oo ddiiââmmeettrroo ddee

~~11 ccmm,, aa eelleettrroossffeerraa tteerriiaa oo ddiiââmmeettrroo

eennttrree 110000 mm ee 11 kkmm

Se fossemos desenhar o átomo em escala e fizéssemos os prótons e nêutrons com um centímetro de diâmetro, então os elétrons e quarks deveriam ter um diâmetro menor do que o de um fio de cabelo e o diâmetro do átomo inteiro deveria ser maior que o comprimento de trinta campos de futebol!

UUmmaa vveezz qquuee pprraattiiccaammeennttee ttooddaa aa mmaassssaa ddoo ááttoommoo eessttáá ccoonnttiiddaa nnoo

nnúúcclleeoo ((ddeevviiddoo aaooss pprróóttoonnss ee aaooss nnêêuuttrroonnss)) ee qquuee eessssaa eennoorrmmee

rreeggiiããoo cchhaammaaddaa eelleettrroossffeerraa ((qquuee ccoonnttéémm ooss eellééttrroonnss)) pprraattiiccaammeennttee

nnããoo tteemm mmaassssaa::

9999,,999999999999999999999999%% ddoo vvoolluummee ddee uumm ááttoommoo éé

aappeennaass eessppaaççoo vvaazziioo!!

2,57 km

5,31 km

65,5 m

Plutão

Elétron mais externo

Planeta mais

externo

Terra

Átomo de ouro

Sistema

solar

Sol e núcleo de ouro com raio de 30

cm

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Ao mesmo tempo que um átomo é pequeno, o núcleo é dez mil vezes menor que o átomo, e os quarks e elétrons são pelo menos dez vezes menores que eles. Não sabemos exatamente quão menores os quarks e elétrons são; eles são definitivamente menores que 10

-18 metros, e

podem ser literalmente pontos, mas nós não sabemos com certeza. Também é possível que os quarks e os elétrons não sejam fundamentais de fato, e eventualmente acabem sendo constituídos de outras partículas mais fundamentais. As técnicas mais importantes para a determinação do raio nuclear são aquelas que incluem o espalhamento de nêutrons e elétrons. Como os nêutrons não têm carga elétrica, não são influenciados pela interação coulombiana nem com os nêutrons nem com os prótons do núcleo. Mas como são influenciados pela interação nuclear tanto com os nêutrons quanto com os prótons do núcleo, os nêutrons espalhados sondam a distribuição de massa do núcleo. Por outro lado, os elétrons não são influenciados pela interação nuclear nem com os nêutrons nem com os prótons do núcleo. Mas, como têm carga elétrica não nula, são influenciados pela interação coulombiana com os prótons do núcleo e sondam, assim, a distribuição de carga do núcleo. Raio Nuclear O raio de um núcleo com número de massa A, suposto esférico, é dado, com precisão considerável, por:

[1] 1

30R r A

onde A é o número de massa (ou o número de núcleons); ro é um coeficiente empírico, o mesmo para todos os núcleos, com ro = 1,4 fm para a distribuição de massa e ro = 1,2 fm para a distribuição de carga. Aqui se usa como unidade de comprimento o fermi:

1 fm = 10-15

m Esses números indicam que a distribuição de massa nuclear avança um pouco além da distribuição de carga. Volume Nuclear

Como o volume de uma esfera é dado por V = 34

3R , e

13

0R r A

o volume do núcleo pode ser escrito por: [2] 3

0

4

3V r A

A expressão [2] mostra que o volume nuclear é proporcional ao número de núcleons. Assim, o número de núcleons por unidade de volume é constante. Densidade Nuclear

A densidade da matéria nuclear fica: [3] 3 3

0 0

3

4 / 3 4

M Au u

V r A r

Em números:

27

17 3

315

3 1,6605 101,4447 10 /

4 1,4 10

kgkg m

m

Portanto, a densidade de núcleons é constante. Ainda, o fator de proporcionalidade na expressão [2] é o mesmo para todos os núcleos, de modo que a densidade de núcleons é a mesma para todos os núcleos.

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A massa de um próton é muito próxima da massa de um nêutron. Então, não apenas a densidade de núcleons, mas também a densidade de massa é constante e tem o mesmo valor para todos os núcleos. E mais, como a interação nuclear forte é independente da carga elétrica, os prótons e os nêutrons estão distribuídos mais ou menos uniformemente no núcleo e a densidade de carga também é constante e tem o mesmo valor para todos os núcleos. Na verdade, nos núcleos com número de massa A grande, a densidade de carga na região central aparece diminuída devido à repulsão coulombiana entre os prótons. Um núcleo não tem, evidentemente, um raio exatamente definido como se poderia inferir da expressão acima, nem uma densidade constante no interior da esfera definida por esse raio. Na verdade, a densidade nuclear diminui até zero dentro de um intervalo radial cujo centro é dado pela expressão mencionada. Por exemplo, para as distribuições de carga e de massa do carbono 12: Rc(C) =1,2 (12)

1/3 fm 2,7 fm

Rm(C) =1,4 (12)1/3

fm 3,2 fm e do cobalto 59: Rc(Co) =1,2 (59)

1/3 fm 4,6 fm

Rm(Co)=1,4 (59)1/3

fm 5,4 fm Assim, a uma distância do centro do núcleo de 2,7 fm para o carbono 12 e de 4,6 fm para o cobalto 59, a densidade de carga tem a metade do valor que atinge na região central.

As formas de alguns núcleos afastam-se significativamente da forma esférica e devem ser consideradas elipsoidais ou, mesmo, com a forma de uma pêra. Exercício O tipo mais comum de núcleo de ferro tem número de massa igual a 56. Calcule o raio, a massa aproximada e a densidade aproximada desse núcleo. Solução: Utilizaremos duas idéias principais: o raio e a massa de um núcleo dependem do número de massa A e a densidade é massa dividida pelo volume. Usando a eq.[1] R = ro A

1/3 = (1,2 x 10

-15 m) (56)

1/3 = 4,6 x 10

-15 m = 4,6 fm

Como A = 56, a massa do núcleo é aproximadamente 56u

m (56 x 1,6605 x 10-27

kg ) 9,3 x 10-26

kg

O volume é V = 4

3R

3 =

4

34,6 x 10

-15 m)= 4,1 x 10

-43 m

3

E a densidade é aproximadamente = m / V =

2617 3

43 3

9,3 102,3 10 /

4,1 10

kgkg m

m

Avaliação: a densidade do ferro sólido é cerca de 7000 kg/m3. Logo verificamos que a

densidade do núcleo é mais que 1013

vezes maior do que a densidade da matéria comum. Um cubo com 1 cm de aresta com essa densidade teria a massa de 2,3 x 10

11 kg (230 milhões de

toneladas!). Densidades dessa ordem ocorrem no interior de uma estrela de nêutrons.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Aula 2 Nuclídeos e isótopos; Spin Nuclear

Meta Introduzir os conceitos sobre Spin Nuclear

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Diferenciar características de isótopos, isóbaros e isótonos

Representar corretamente um nuclídeo

Identificar o spin nuclear

Identificar momento magnético nuclear

Compreender as bases da ressonância magnética nuclear

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Introdução

Vimos na primeira aula algumas características gerais dos núcleos.

Tamanho: aproximação por uma esfera - mas o núcleo não é uma esfera com superfície bem

definida. O raio encontrado nos dá a ordem de grandeza da localização da concentração dos

núcleons na maior parte do tempo. Alguns núcleos também podem ter formas muito diferentes

de esferas.

Massa: em geral as massas apresentadas nas tabelas correspondem ao átomo neutro (com

todos os elétrons), pois é muito difícil medir a massa apenas do núcleo. Note que se você

verificar as massas atômicas são menores do que a soma das massas das suas partes (Z

prótons, N nêutrons e Z elétrons). Na próxima aula isso será explicado.

Volume: O volume do núcleo é proporcional ao número de núcleons, o que sugere que os

núcleons estão dispostos juntos à distâncias médias fixas independentemente do número de

partículas.

O volume por núcleon é constante para qualquer núcleo (V/A= 4/3 ro3)

Densidade: a densidade nuclear é extremamente alta, com a compactação da matéria no

núcleo, o que implica que o espaço é essencialmente vazio.

Vamos continuar nessa aula com algumas outras características do núcleo atômico.

Exemplos:

Hidrogênio-- conjunto de átomos que possuem 1 próton.

Oxigênio-- conjunto de átomos que possuem 8 prótons.

Carbono-- conjunto de átomos que possuem 6 prótons.

ÁÁttoommooss ee eelleemmeennttoo qquuíímmiiccoo

OO nnúúmmeerroo aattôômmiiccoo ((ZZ))

AAttéé hhoojjee ssããoo ccoonnhheecciiddooss 111100 ttiippooss ddiiffeerreenntteess ddee ááttoommooss qquuee,,

ccoommbbiinnaaddooss eennttrree ssii ddaass mmaaiiss ddiivveerrssaass mmaanneeiirraass,, vvããoo ddaarr oorriiggeemm aa

ttooddoo ttiippoo ddee mmaattéérriiaa eexxiisstteennttee..

ÁÁttoommooss ddee mmeessmmoo ttiippoo ssããoo aaqquueelleess qquuee ppoossssuueemm oo mmeessmmoo nnúúmmeerroo

ddee pprróóttoonnss ((oo nnúúmmeerroo ddee nnêêuuttrroonnss ee oo nnúúmmeerroo ddee eellééttrroonnss nnããoo pprreecciissaa

sseerr oo mmeessmmoo))..

CCoommoo oo nnúúmmeerroo ddee pprróóttoonnss ddeeffiinnee aa eessppéécciiee ddee ááttoommoo,, eellee ppaassssoouu aa

sseerr ddeennoommiinnaaddoo nnúúmmeerroo aattôômmiiccoo..

EElleemmeennttoo qquuíímmiiccoo éé uumm ccoonnjjuunnttoo ddee ááttoommooss ccoomm oo mmeessmmoo nnúúmmeerroo

aattôômmiiccoo..

Page 12: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

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Número de massa

Denominamos o número total de núcleons (prótons e nêutrons) de um átomo de

número de massa, que é simbolizado por A.

É importante perceber que o número de massa A não é uma massa:

O número de massa A é um número inteiro que representa o total de partículas

(prótons e nêutrons) do núcleo de um átomo.

A = p+n ou A = Z+n

Exemplo:

Considerando-se um átomo que possua 11 prótons, 12 nêutrons e 11 elétrons,

seu número atômico Z será 11 (Z = p)

e seu número de massa A será 23

A = Z + n = 11+ 12 = 23

SSíímmbboollooss ddooss eelleemmeennttooss qquuíímmiiccooss

Já vimos que os constituintes básicos do núcleo são o próton e o nêutron. Quando o átomo

está neutro, deve haver um elétron circundando o núcleo para cada próton. A estrutura

eletrônica do átomo, responsável pelas suas propriedades químicas é determinada pela carga

Z.e do núcleo.

RReepprreesseennttaaççããoo ddooss eelleemmeennttooss

CCaaddaa eelleemmeennttoo qquuíímmiiccoo éé rreepprreesseennttaaddoo ppoorr uumm ssíímmbboolloo,, ddee aaccoorrddoo ccoomm

aa IIUUPPAACC ((IInntteerrnnaattiioonnaall UUnniioonn ooff PPuurree aanndd AApppplliieedd CChheemmiissttrryy))

OO ssíímmbboolloo rreepprreesseennttaa 11 ááttoommoo ddoo eelleemmeennttoo qquuíímmiiccoo..

QQuuaannddoo qquueerreemmooss rreepprreesseennttaarr uumm nnúúmmeerroo mmaaiioorr ddee ááttoommooss,,

ccoollooccaammooss eessssee nnúúmmeerroo nnaa ffrreennttee ddoo ssíímmbboolloo..

EExxeemmpplloo::

HH ---- rreepprreesseennttaa 11 ááttoommoo ddee hhiiddrrooggêênniioo..

22 HH ---- rreepprreesseennttaa 22 ááttoommooss ddee hhiiddrrooggêênniioo..

X é o símbolo químico do elemento Z é o número atômico A é o número de massa Por exemplo, o núcleo de oxigênio com número de massa 17 é representado por

17

8O ou 17O ou O-17

Page 13: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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O número atômico (Z) é o mesmo que o número de prótons no núcleo: ele

identifica um elemento químico, comandando seu comportamento em

relação aos outros elementos. Z pode ser omitido na representação do

nuclídeo, já que o símbolo do elemento químico já representa o valor de Z.

O número de massa (A) é a soma do número de prótons e de nêutrons

presentes no núcleo.

O número de nêutrons N não precisa ser representado porque N = A - Z.

Elementos químicos naturais e artificiais Dos 110 elementos químicos conhecidos, 20 são artificiais:

• o tecnécio (Tc) Z= 43;

• o promécio (Pm) Z= 61;

• todos os elementos com número atômico maior que 92, isto é:

do neptúnio (Np) Z= 93 em diante.

Isótopos - Isóbaros - Isômeros -

Isótopos - são núcleos associados ao mesmo elemento da tabela periódica (mesmo Z), mas com diferentes números de nêutrons. Como o responsável pelas propriedades químicas é apenas o número atômico, os elementos formados por diferentes isótopos basicamente agem quimicamente de maneira idêntica. Entretanto, os diferentes isótopos geralmente apresentam propriedades físicas diferentes, tais como temperatura de fusão e de vaporização e taxas de difusão. Átomos de um mesmo elemento químico com massas diferentes são denominados isótopos. (mesmo Z, diferente N) Exemplo: O hidrogênio tem 3 isótopos:

Por exemplo, ao elemento hidrogênio (Z = 1) estão associados isótopos com N = 0, N = 1 (deutério) e N = 2 (trítio), referidos, também, pelo número de massa: hidrogênio 1, hidrogênio 2 e hidrogênio 3. Esse é o único caso em que os isótopos recebem nomes distintos, sem citar o número de massa. Todos os outros casos, diz-se o nome do elemento e o número de massa para se referir ao devido isótopo. Aos 112 elementos conhecidos estão associados uns 270 isótopos estáveis e mais de 2.000 instáveis. Isóbaros - Isóbaros são núcleos associados a elementos diferentes da tabela periódica, mas com iguais números de massa. Por exemplo, os núcleos berílio-10 (Z = 4, N = 6), boro-10 (Z = 5,N = 5) e carbono-10 (Z = 6, N = 4) são núcleos isóbaros. (mesmo A) Isótonos - Isóbaros são núcleos associados a elementos diferentes da tabela periódica mas com mesmo número de nêutrons. (mesmo N) Isômeros - núcleos num estado excitado com um tempo de decaimento longo (estado isomérico) - núcleo não estável. Ex: radioisótopo usado na medicina

99m Tc

e seu isômero

99Tc.

Page 14: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 14

Nuclídeos Um nuclídeo é um determinado núcleo com valores definidos de Z e N

A tabela periódica é pouco útil quando se trata de núcleos. Usa-se a carta de nuclídeos, que mostra todos os núcleos estáveis e radioativos. Pode-se facilmente visualizar os isótopos, isóbaros e isótonos.

Page 15: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 15

Momento Angular

Tal como no caso dos elétrons, também o P e N são partículas com spin e momento angular.

Isso vai gerar um momento angular no núcleo. Por razões históricas, o momento angular total

do núcleo é chamado de

spin nuclear (I), que é um número quântico.

OBS: Apesar de ser chamado de spin nuclear, I não implica que o núcleo esteja em rotação

como um sólido.

Lembrando que P e N são férmions:

P e N possuem spin 1/2 ( S )

momento angular orbital ( L ), associado ao seu movimento no núcleo.

O módulo do momento angular de spin S dos núcleons é:

( 1)S s s 31 1( 1)2 2 4

S

Seu componente z é:

z sS m 2zS

Lembrando que para 2 vetores s e L

O momento angular orbital total do núcleo (I) é uma combinação adequada dos s e L de

todos os núcleons.

( 1)I I I

A componente de I no eixo z

z II m com 1, ( 1),..., 02Im I I ou para I inteiro ou semi-inteiro

Portanto há 2I+1 orientações possíveis de I com valores de 0 até 7

Page 16: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 16

Como o spin dos núcleons é 1/2:

quando o número total de núcleons (A) é par I é inteiro

ímpar I é semi-inteiro

Portanto, a teoria sobre a Força Nuclear deve contemplar esses valores experimentais de I.

Níveis de Energia / Spin

• quantizados

• determinados através de reações nucleares conhecidas

• ordem de grandeza: MeV

• modelo de poço infinito: estado mais baixo 2p e 2n

(princípio de exclusão de Pauli)

• spin nuclear: momento angular nuclear intrínseco

• prótons e nêutrons: número quântico de spin ½

• núcleos com número par de prótons e nêutrons tem spin nuclear nulo

• momento magnético nuclear intrínseco associado ao spin nuclear

Momento magnético

Basicamente, as contribuições do sistema a qualquer momento magnético pode provir de dois

tipos de fontes:

(1) movimento de cargas elétricas e

(2) o magnetismo intrínseco de partículas elementares, tais como o elétron.

O momento magnético líquido de qualquer sistema é um vetor soma das contribuições de um

ou ambos os tipos de fontes.

Resultados experimentais mostram que:

• Todos os núcleos em que Z e N são par (núcleo par-par): I = 0

núcleons idênticos tendem a acoplar seus momentos angulares

em direções opostas: “efeito de emparelhamento”

• Núcleos par-ímpar: I = semi-inteiro

Supõe-se que o spin nuclear coincide com o momento angular do

núcleon desemparelhado (válido para muitos casos).

• Núcleos ímpar-ímpar: I = inteiro (pois A é par)

há dois núcleons desemparelhados, mais é difícil predizer o

resultado experimental

Supõe-se que o spin nuclear coincide com o momento angular do

núcleon desemparelhado (válido para muitos casos).

Page 17: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 17

A carga em movimento possui momento magnético orbital LM

2L

qM L

m

Para prótons q e , então:

2L

p

e

mM L

LM tem mesma direção de L

Nêutrons não têm carga elétrica e, portanto, não têm LM

Para facilitar a compreensão, vamos lembrar o caso dos elétrons:

Existe uma unidade natural de momento magnético 2

B

em

e (magnéton de Bohr).

Verifica-se que o módulo da componente z do momento magnético de spin do elétron é:

sz B

5 245,788.10 9,274.10B

eV J

T T

Voltando ao núcleo: associado ao momento angular nuclear, existe um momento magnético

nuclear.

Para discussão sobre momento magnético nuclear, vamos definir uma grandeza análoga ao

magnéton de Bohr, o magnéton nuclear ( )n

27 85,05079 10 3,15245 102

n

p

e J eVT Tm

Como 1836p em m e, portanto, o magnéton nuclear é 1836 vezes menor que o magnéton de

Bohr, podíamos esperar que

sz npróton ERRADO!!

O CORRETO: 2,7928sz npróton

E mais surpreendente, o nêutron possui momento magnético diferente de zero:

1,9130sz nnêutron

Isso indica que ele não é uma partícula elementar, pois não carrega carga líquida, mas ainda

sim interage com um campo magnético.

Page 18: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 18

O P tem carga +e próton é paralelo e de mesmo sentido que prótonS

O N não tem carga nêutron é antiparalelo a nêutronS

(o N se comporta como uma carga negativa)

O núcleo tem momento magnético da ordem de alguns n

Se colocarmos o núcleo em um campo B externo, surge a energia de interação:

zU B B

Como os z são quantizados, muitos níveis de energia surgem da interação.

Exercício

Os prótons estão submetidos a um campo magnético orientado ao longo do eixo Oz com

módulo igual a 2,30 T. a) Qual é a diferença de energia entre um estado no qual o momento

magnético de spin é orientado em sentido contrário ao do campo magnético? b) Um próton

pode sofrer uma transição entre um desses estados para o outro emitindo ou absorvendo um

fóton, cuja energia é igual à diferença de energia entre esses dois estados. Calcule a

frequência e o comprimento de onda de tal fóton.

Solução:

a) Quando os componentes z de e S estão orientados no mesmo sentido do campo

magnético, a energia de interação é dada por

8

7

(2,7928)(3,152 10 )(2,30 )

2,025 10

z

eVU B T

T

eV

Quando eles possuem sentidos contrários aos do campo

magnético, a energia é:

+2,025 × 10-7

eV

e a diferença de energia entre os dois estados é dada por

7 72(2,025 10 ) 4,05 10E eV eV

b) A frequência e o comprimento de onda do fóton com energia correspondente são

77

15

8

7 1

4,05 109,79 10 97,9

4,136 10 .

3,00 10 /3,06

9,79 10

E eVf Hz MHz

h eV s

c m sm

f s

Essa frequência está no meio da banda FM de rádio.

Page 19: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 19

Quando uma amostra de H é colocada na presença de um campo magnético de 2,30 T e a

seguir irradiada com ondas eletromagnéticas com essa frequência, a inversão dos spins

dos prótons pode ser detectada pela absorção da energia da radiação.

- Depois que ocorre esta inversão, alguns prótons podem decair para o estado de menor

energia, e emitir fótons com a mesma energia que o fóton original - em geral temos mais

prótons no estado de mais baixa energia, o que significa que o material absorve energia.

Ressonância Magnética Nuclear (RMN)

A inversão dos spins decorre do fenômeno chamado de ressonância magnética nuclear

(NMR). Uma aplicação disso possibilita a obtenção de uma imagem por ressonância

magnética (MRI), que discrimina diversos tipos de tecidos do corpo humano com base nos

diferentes ambientes dos prótons de cada tecido. Aplica-se um campo externo - diferenças

em campos locais são detectadas e processadas para dar origem a uma imagem.

Campos magnéticos: da ordem de 1 a 20 T (campo magnético da Terra da ordem de 10

-4 T)

Frequências (radio frequências - RF): da ordem de MHz, variando de 20 a 900 MHz, dependendo da intensidade do campo magnético e do núcleo a ser estudado.

- Irradiando os núcleos com fótons de energia

DE, parte deste núcleos é induzida a fazer uma

transição para o estado de energia mais alta

(inversão de spin) � Absorção Ressonante �

momento magnético é invertido �

Ressonância Magnética

- A frequência na qual ocorre a inversão de spin é dada por:

hf E 2 z B

- Para se manter a ressonância magnética, pode-se manter fixa a frequência (fótons incidentes) e variar o Bext até conseguir a inversão de spin = pico de absorção (ou emissão).

Page 20: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 20

O momento magnético de um núcleo é também uma fonte de campo magnético. Num

átomo, a interação entre o momento magnético do elétron e o campo magnético produzido

pelo núcleo produz desdobramentos adicionais nos níveis de energia dos átomos e nos

espectros atômicos, constituindo a estrutura hiperfina, usada para determinação direta do

spin do núcleo.

Conclusão:

O sistema nuclear é um sistema físico complexo composto de núcleons, ou seja, prótons e

nêutrons. As propriedades da mecânica quântica dos núcleons incluem o spin entre outros.

Desde momento magnético do núcleo depende do spin de cada núcleon individual, podem-se

verificar estas propriedades com medições dos momentos nucleares, mais especificamente, o

momento de dipolo magnético nuclear.

A maioria dos núcleos comuns existe em seu estado fundamental, embora alguns núcleos de

isótopos tenham vida longa em estados excitados. Cada estado energético de um núcleo de

um determinado isótopo é caracterizado por um momento de dipolo magnético bem definido,

sua magnitude é um número fixo, frequentemente medido experimentalmente com grande

precisão. Este número é muito sensível às contribuições individuais dos núcleons, e uma

medida ou previsão de seu valor pode revelar informações importantes sobre a função de onda

nuclear. Existem vários modelos teóricos que predizem o valor do momento de dipolo

magnético e um número de técnicas experimentais visando à realização de medições nos

núcleos ao longo da tabela de nuclídeos.

Page 21: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Aula 3 Energia de Ligação Nuclear

Meta Compreender como a energia de ligação nuclear de um núcleo depende do número de núcleons que ele contém

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Calcular a energia de ligação de um nuclídeo

Calcular a energia liberada em uma fissão e em uma fusão nuclear

Identificar se uma reação nuclear é espontânea ou não

Identificar núcleos favoráveis a fusão nuclear e os favoráveis a fissão nuclear

Page 22: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Energia de Ligação Nuclear

Da relação E = mc2, que Einstein demonstrou em 1905 e que já está verificada por um grande

número de experimentos, sabemos que se um dado sistema ganha certa quantidade de energia E, sua massa aumenta de uma quantidade dada por E/c

2, e inversamente, se um dado

sistema perde certa quantidade de energia E, sua massa fica diminuída de uma quantidade dada por E/c

2. Aqui, c representa o módulo da velocidade da luz no vácuo.

Medidas experimentais comprovam que a massa total de repouso do núcleos é maior massa dos seus núcleons separados.

A diferença de massa é chamada perda de massa ( m )

PPoorr qquuee ooss nnúúcclleeoonnss ssee uunneemm eemm uumm nnúúcclleeoo??

PPoorrqquuee nneessssee eessttaaddoo eelleess ttêêmm mmeennoorr eenneerrggiiaa!!

++

EEiinnsstteeiinn:: EE==mmcc22

---->> aa mmaassssaa ee aa eenneerrggiiaa ssããoo dduuaass ffoorrmmaass

ddaa mmeessmmaa eennttiiddaaddee

DDiiffeerreennççaa ddee mmaassssaass::

ΔΔmm==00,,00330044 uu

EEnneerrggiiaa ddee lliiggaaççããoo::

EE==ΔΔmmcc22 == 2288,,33 MMeeVV

eenneerrggiiaa ddee

lliiggaaççããoo

1uc2=(1,6605 x 10

-27kg) x (2,9979 x 10

8)2 1J = 6,2415 x 10

12 MeV 1u=931,4 MeV/c

2

IInnttrroodduuççããoo:: MMaassssaa ddoo ááttoommoo

AA mmaassssaa ddoo ááttoommoo ddeevveerriiaa sseerr,, aa

pprriinnccííppiioo,, aa ssoommaa ddaass mmaassssaass ddaass

ppaarrttííccuullaass qquuee oo ccoommppõõeemm..

MMaass iissssoo nnããoo éé vveerrddaaddeeiirroo..

QQuuaannddoo pprróóttoonnss ee nnêêuuttrroonnss ssee

rreeúúnneemm ppaarraa ffoorrmmaarr uumm nnúúcclleeoo,,

ooccoorrrree uummaa ppeerrddaa ddee mmaassssaa qquuee éé

ttrraannssffoorrmmaaddaa eemm eenneerrggiiaa.. W = massa das partículas separadas

= massa das partículas juntas

DDeessccoobbrriiuu--ssee qquuee eessssaa eenneerrggiiaa éé uuttiilliizzaaddaa ppaarraa mmaanntteerr jjuunnttooss ooss

pprróóttoonnss ee ooss nnêêuuttrroonnss..

Page 23: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 23

Considere o dêuterons (ou d), o núcleo do 2

1 H , formado por 1 próton e 1 nêutron.

A energia total das partículas separadas (em repouso) será dada pela energia de suas massas:

E = mp . c2 + mn . c

2 = (mp + mn) c

2

Mas se as partículas se aproximam suficientemente para formar o dêuteron, qual será sua massa?

Seja Ep a energia potencial nuclear. Os núcleons se movem ao redor de seu centro de massa, portanto têm energia cinética Ek

A energia total do sistema formado é:

E´= (mp + mn) c2 + Ep + Ek

As forças nucleares são atrativas e, portanto, o zero da Ep está no infinito. Assim, Ep na equação tem sinal negativo.

Como o dêuteron é um sistema estável Ep Ek . Portanto

(Ep+Ek) < 0

Assim, a energia do núcleo ligado (E´) é menor do que energia das partículas separadas (E) E´< E

Portanto, para separarmos o nêutron e o próton do núcleo de dêuteron, deve-se aplicar energia correspondente a

(E´- E) = Eb

Dado um núcleo qualquer, a energia liberada quando da sua formação a partir dos seus prótons e nêutrons separados de uma distância infinita, ou a energia que deve ser fornecida a esse núcleo para separar seus prótons e nêutrons de uma distância infinita é o que se chama de energia de ligação (Eb) de tal núcleo.

Eb é liberada quando o sistema se forma

Eb é energia necessária para separar todos os núcleons

Então, sendo Eb a energia de ligação de um núcleo com Z prótons e ( A Z ) nêutrons, de massa M(Z,A), pode-se escrever:

[Z mp + ( A Z ) mn - M(Z,A)] c2 = Eb

Ou Z mp + ( A Z ) mn = M(Z,A) + Eb / c2

onde mp e mn são, respectivamente, as massas do próton e do nêutron. Daí, a energia de ligação fica:

Se as massas são dadas em kg e c em m/s

Eb = [ Z mp + ( A Z ) mn M(Z,A) ] c2

Eb é dada em J

Se as massas são dadas em u e sabendo que 1uc2 = 931,4815 MeV

Eb = [ Z mp + ( A Z ) mn M(Z,A) ] 931,4815 Eb é dada em MeV

Page 24: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Como as massas são determinadas experimentalmente, a energia de ligação de qualquer núcleo pode ser determinada.

Exemplo: Calcule a energia de ligação do dêuteron, cuja massa é 2,0141 u

mp = 1,0078 u mn = 1,0087 u

Para as partículas separadas:

Z mp + ( A Z ) mn = 1 . 1,0078 + 1 . 1,0087 = 2,0165 u

A perda de massa é: m = 2,0165 u - 2,0141 u = 0,0024 u

Ou seja, a [mp + mn] > m(d)

A massa perdida está na energia de ligação do sistema

Eb = 931,4815 . m = 931,4815 . 0,0024 u = 2,2356 MeV

Comparando Eb (=2,2356 MeV) com a energia de ligação do átomo 1H (=13,6 eV),

(2,2356 x 106 eV/13,6 eV)

concluímos que a interação nuclear é ~ 106 vezes mais intensa do que a interação

eletromagnética!

Exemplo: Calcule a energia de ligação de um núcleo de lítio 6, cuja massa vale 6,0151 u:

Eb (Li) = [3 (1,0078) + 3 (1,0087) 6,0151] × 931,4815 MeV) = 32,0430 MeV

Relativamente à dissociação completa, o núcleo de lítio 6 é mais estável do que a partícula

já queEb (Li) = 28,3 MeV). Contudo, as estruturas nucleares não se dissociam completamente em seus núcleons individuais. No caso de um núcleo naturalmente radioativo (núcleo pai), pode acontecer a dissociação espontânea em um núcleo menor (núcleo filho) e uma partícula

.

Por exemplo:

226 222

88 86Ra Rn

Como: m(Ra) = 226,0254 u m(Rn) = 222,0175 u m() = 4,0026 u

vem:

Eb (Ra) = [ 88 ( 1,0078 ) + ( 226 88 ) 1,0087 226,0254 ] 931,4815 MeV

Eb (Ra) = 1734,0460 MeV

Eb (Rn+) = [ 88 ( 1,0078 ) + ( 226 88 ) 1,0087 222,0175 4,0026 ] 931,4815 MeV

Eb (Rn+) = 1738,9828 MeV

Como a energia de ligação do núcleo de rádio 226 é menor do que a soma das energias de

ligação do núcleo de radônio 222 e da partícula , Eb (Ra) < Eb (Rn+)

Page 25: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 25

a reação indicada 226 222

88 86Ra Rn é realmente espontânea.

Deve-se observar que:

E(Rn+) E(Ra) = [ 222,0175 4,0026 + 226,0254 ] 931,4815 MeV = 4,9369 MeV

A massa do núcleo de rádio 226 é maior do que a soma das massas do núcleo de radônio

222 e da partícula

m(226

Ra) < Eb (222

Rn+)

Levando em conta a relação E = mc2, isto significa, em termos energéticos, que o sistema no

estado inicial tem uma energia maior do que no estado final, ou seja, o sistema passa de um estado a outro de menor energia e, portanto, mais estável.

Por outro lado, em termos da energia de ligação, a diferença Eb(Rn+) Eb(Ra), sendo positiva, indica que, para separar o sistema em seus constituintes básicos, a energia necessária é maior no estado final e, portanto, este é mais estável.

De qualquer modo, a reação indicada acima é espontânea.

Agora, seja a reação:

107 103

47 45Ag Rh

e sendo:

m(Ag) = 106,9041 u

m(Rh) = 102,9048 u

m() = 4,0026 u

A massa do núcleo de prata 107 é menor do que a soma das massas do núcleo de ródio 103 e

da partícula .

vem:

Eb(Rh+) Eb(Ag) = [ 102,9048 4,0026 + 106,9041 ] 931,4815 MeV = 3,0739 MeV

Levando em conta a relação E = mc2, isto significa, em termos energéticos, que o sistema

no estado inicial tem uma energia menor do que no estado final, ou seja, o sistema passaria de um estado a outro de maior energia e, portanto, menos estável.

Por outro lado, em termos da energia de ligação, a diferença Eb(Rh+) Eb(Ag), sendo negativa, indica que, para separar o sistema em seus constituintes básicos, a energia necessária é menor no estado final e, portanto, este seria menos estável.

Assim, de qualquer modo que se pense a reação indicada não é espontânea. O núcleo de

prata 107 não pode decair espontaneamente por emissão de partícula .

O que foi mostrado é que a radioatividade natural por decaimento pode acontecer quando

a massa do núcleo pai é maior que a soma das massas do núcleo filho e da partícula .

O mesmo tipo de argumento pode ser feito para discutir a emissão de elétrons ou pósitrons

no decaimento .

Page 26: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 26

Energia de Ligação por Núcleon

Uma indicação da estabilidade nuclear resultante das interações coulombiana e nuclear

forte é dada pelo gráfico da energia de ligação por núcleon, Eb/A, em função do número de

núcleons, A. O gráfico de Eb/A contra A inclui tanto núcleos estáveis quanto núcleos

radioativos.

O núcleo com a menor energia de ligação por núcleon é o do deutério (H-2) e o núcleo com a

maior energia de ligação por núcleon é o do ferro 56. Assim, esse gráfico tem um máximo em A

56.

Os núcleons são mantidos juntos pela interação nuclear, de caráter atrativo, apesar do

efeito contrário da interação coulombiana, de caráter repulsivo, entre os prótons.

Page 27: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 27

Como Eb/A varia muito pouco com o aumento de A para núcleos não muito pequenos

(para A>10 Eb/A varia menos de 10%), cada núcleon deve interagir atrativamente pela

interação nuclear apenas com um certo número de outros núcleons de sua vizinhança

imediata, e esse número é independente de A.

A diminuição lenta de Eb/A para A > 56 é consequência do aumento do número de

prótons com o aumento de A e do alcance infinito da interação coulombiana, com cada

próton interagindo repulsivamente com todos os outros prótons do núcleo.

A diminuição é lenta, apesar de o efeito depender do número total de pares de prótons,

porque a interação coulombiana é cerca de 100 vezes menos intensa que a interação nuclear.

Por outro lado, para núcleos com A < 56, Eb/A diminui cada vez mais rapidamente com a

diminuição de A porque, então, diminui cada vez mais rapidamente o número de núcleons na

vizinhança imediata de qualquer núcleon, onde a interação nuclear é efetiva.

Assim, enquanto a interação nuclear contribui para a estabilidade do núcleo, a

interação coulombiana contribui para a sua desestabilização.

Como o gráfico da energia de ligação por núcleon em função do número de núcleons

apresenta um máximo em A 56, tanto processos de fusão de núcleos leves quanto processos

de fissão de núcleos pesados podem levar a liberação de energia. Podem, portanto, servir de

fundamento tanto para a construção de reatores de geração de energia quanto para a

construção de bombas com extremo poder de destruição.

Fusão Nuclear (favorável para núcleos pequenos A<56)

Fusão nuclear é o processo de formação de um núcleo a partir da colisão e posterior junção

de dois núcleos menores.

Os núcleos que colidem devem ter, inicialmente, uma energia cinética que lhes permita se

aproximar contra a repulsão coulombiana o suficiente para que a interação nuclear forte passe

a ser efetiva e mais importante.

Como a repulsão coulombiana é tanto mais importante quanto maior a carga elétrica dos

núcleos em colisão, a fusão nuclear pode ser provocada com mais facilidade entre núcleos

com número pequeno de prótons.

De qualquer modo, a fusão nuclear com liberação de energia só ocorre se o número de

núcleons do núcleo resultante é menor ou da ordem de 56.

A título de exemplo, seja a fusão de dois núcleos de oxigênio 16 para formar um núcleo de

enxofre 32:

16O +

16O

32S

Page 28: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 28

Pela observação do gráfico Eb/A contra A tem-se aproximadamente 7,8 MeV e 8,6 MeV,

respectivamente, para a energia de ligação por núcleon para os núcleos de O-16 e de S-32.

Assim, as energias de ligação dos sistemas inicial e final são:

Eb(O+O) = 2 ( 16 )( 7,8 MeV ) = 249,9 MeV

Eb(S) = 32 ( 8,6 MeV ) = 275,2 MeV

Ao passar do estado inicial para o final, o sistema sofre uma variação de energia dada por:

E = Eb(S) Eb(O+O) = 25,6 MeV

Como E > 0, a energia de ligação do núcleo resultante é maior do que a soma das

energias de ligação dos núcleos iniciais.

Em outras palavras, como uma energia de 275,2 MeV deve ser fornecida ao sistema no

estado final (núcleo de S-32) para separá-lo em núcleons infinitamente separados e uma

energia de 249,6 MeV deve ser fornecida ao sistema no estado inicial (dois núcleos de O-16)

para separá-lo em núcleons infinitamente separados, o sistema deve ter perdido (liberado) uma

energia de 25,6 MeV.

Esse resultado se deve ao fato de as energias de ligação por núcleon dos núcleos iniciais

serem menores do que a energia de ligação por núcleon do núcleo final. Ou seja, a fusão

nuclear com liberação de energia só ocorre se o número de núcleons do núcleo resultante é

menor ou da ordem de 56, já que a curva Eb/A contra A tem máximo em A 56.

Page 29: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 29

Fissão Nuclear (favorável para núcleos grandes A>56)

Fissão nuclear é o processo de divisão de um núcleo em dois núcleos menores, de tamanho

comparável.

Os núcleos com um grande número de núcleons estão sujeitos à fissão espontânea, com

uma probabilidade muito pequena, e sujeitos à fissão induzida por captura de nêutrons, com

uma probabilidade maior.

A título de exemplo, seja a reação de fissão de um núcleo de U-235 em um núcleo de Rb-97

e um núcleo de Cs-137:

n + 235

U [ 236

U ] 97

Rb + 137

Cs + 2n

Pela observação do gráfico Eb/A contra A tem-se aproximadamente 7,7 MeV e 8,6 MeV e

8,2 MeV, respectivamente, para os núcleos de urânio 236 e rubídio 97 e césio 137. Assim, as

energias de ligação dos sistemas inicial e final são:

Eb(U) = 236 ( 7,7 MeV ) = 1817,2 MeV

Eb(Rb+Cs+2n) = 97 ( 8,6 MeV ) + 137 ( 8,2 MeV ) + 2 ( 7,7 MeV ) = 1973,0 MeV

Ao passar do estado inicial para o final, o sistema sofre uma variação de energia dada por:

E = Eb(Rb+Cs+2n) Eb(U) = 1973,0 MeV 1817,2 MeV = 155,8 MeV

Como E > 0, o sistema deve ter perdido (liberado) uma energia de 155,8 MeV.

Novamente, esse resultado se deve ao fato de a energia de ligação por núcleon do núcleo

inicial (o núcleo composto de U-236) ser menor do que a soma das energias de ligação por

núcleon dos núcleos finais e dos dois nêutrons, ou seja, a fissão nuclear com liberação de

energia só ocorre se o número de núcleons dos núcleos resultantes é maior ou da ordem de

56.

Este cálculo é aproximado e é o que se pode fazer a partir do gráfico considerado. Na

realidade, a energia total liberada na reação é maior porque os núcleos resultantes são

instáveis e decaem, posteriormente, por emissão de elétrons, neutrinos e raios .

Page 30: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

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Aula 4 Propriedades da Força Nuclear e Modelo da Gota

Meta Resumir as principais características da Força Nuclear descrevendo um modelo semi-empírico para a mesma

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Relacionar as principais características da força nuclear.

Compreender a fórmula semi-empírica da força nuclear

Discutir a estabilidade dos núcleos isóbaros e o decaimento .

Page 31: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 31

Forças do núcleo atômico

Se cargas elétricas de mesmo sinal se repelem, o núcleo não deveria ser instável pela repulsão

elétrica dos prótons?

Todos os núcleos, exceto aqueles dos isótopos do hidrogênio, têm mais de um próton.

Então, deve existir, entre os núcleons, uma interação atrativa mais intensa do que a interação

coulombiana repulsiva entre os prótons, para a mesma separação. Mas qual seria essa força?

Vamos supor que a força que retém o núcleo é a Força Gravitacional. O módulo dela é dado

por

1 2

2

m m GF

r

m1 e m2 são as massas de uma partícula e do núcleo (o restante), respectivamente; r é a

distância entre seus centros e G é a constante gravitacional.

O trabalho para remover a partícula do núcleo de uma distância R até o infinito é dado por:

1 2 1 2 1 21 22 2R R R

R

m m G m m G m m GdrW Fdr dr m m G

r r r R

Para remover um próton (m =1,67 x 10-24

g) da superfície de um núcleo (supondo A= 65 e raio

R = 5 x 10-13

cm) até uma distância infinita:

24 24 835

13

1,67 10 (1,67 10 64) 6,67 101,5 10

5 10W MeV

Mas determinações experimentais mostram que W é muito maior. A energia de ligação é cerca

de 8 MeV por núcleon (W 8 MeV).

Portanto as forças que atuam no núcleo são muito mais intensas que a força gravitacional.

Portanto, ali está agindo outra força: a FORÇA NUCLEAR

Na verdade, as forças nucleares são cerca de 100 vezes mais intensas do que as forças

elétricas.

A natureza exata da força nuclear continua a ser um quebra-cabeça ainda está para ser

resolvido. Podemos enumerar as algumas propriedades da força nuclear com base em várias

observações e os fatos empíricos.

Page 32: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Propriedades da Força Nuclear

Vamos resumir as principais propriedades da força nuclear:

1) A força nuclear satura

O gráfico de Eb/A versus A mostra que a energia de ligação por núcleon é

aproximadamente constante para todos os núcleos, exceto os mais leves.

Assim, a energia de ligação de um núcleo é aproximadamente proporcional ao número de

partículas desse núcleo.

Eb A

Se cada partícula do núcleo interagisse com todas as demais partículas do núcleo, Eb

deveria ser proporcional ao número de pares de partículas, isto é, proporcional a A×( A - 1 ). E

como, para A grande, pode-se considerar A×(A-1)= A2, a energia de ligação deveria ser

proporcional a A2. Esse resultado está em contradição com o resultado experimental expresso

no gráfico Eb/A versus A.

A contradição desaparece quando se supõe que cada partícula do núcleo interage

apenas com um número limitado de outras partículas. Este é realmente um resultado da natureza de

curto alcance da força nuclear. Cada núcleon em um núcleo interage com os seus vizinhos apenas.

Como resultado, a energia de ligação por núcleon sobe rapidamente para núcleos de massa

leve e rapidamente satura. Além disso, temos a densidade da matéria nuclear

aproximadamente constante. Portanto, atribui-se à força nuclear a propriedade de saturação.

Page 33: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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2) A força nuclear é de curto alcance.

Se não fosse assim, todos os núcleons em diferentes núcleos se uniriam em um núcleo grande

e tudo, provavelmente, se tornaria um núcleo gigantesco, como uma super-estrela de nêutrons,

e não haverá mais uma variedade de elementos na natureza.

Se cada partícula do núcleo não interage com todas as outras partículas, mas apenas com

algumas partículas vizinhas, a força nuclear deve ser de curto alcance.

Esse alcance é da ordem de 1 fm (10-15

m).

Para distâncias > 10-14

m (dimensão do núcleo) a força nuclear é desprezível

Para d 10-15

m domina a Força Nuclear

Para d > 10-14

m domina a Repulsão Coulombiana

OBS: Se a Força Nuclear fosse como a Força Coulombiana ou a Força Gravitacional, qualquer

nêutron ou próton seria atraído independentemente da distância que estivesse do núcleo.

Portanto no núcleo, cada núcleon interage apenas com suas vizinhanças mais próximas.

3) A Força Nuclear tem caroço repulsivo

A força nuclear é sempre atrativa entre dois nêutrons, entre um próton e um nêutron e entre

dois prótons. Existência de nêutrons e prótons em um estado ligado (sob a forma de núcleos) é

em si uma evidência desta.

Mas, para distâncias muito menores do que o alcance de 1 fm, a interação nuclear é repulsiva.

A existência desse caroço repulsivo explica, por exemplo, o fato de que a distância média entre

núcleons é independente de A e o fato de que o volume nuclear é proporcional a A.

Essa determinação foi feita através de experimentos de espalhamento de nêutrons e prótons

pelos núcleos.

a) Para interações n-n ou n-p não há repulsão coulombiana

b) Para interações p-p há repulsão coulombiana

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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4) A Força Nuclear parece ser independente da carga elétrica

A interação nuclear é independente da carga elétrica, isto é, atua igualmente entre dois

prótons (interação p-p), entre dois nêutrons (interação n-n) e entre um próton e um nêutron

(interação p-n).

Interações p-p, n-n ou p-n são basicamente idênticas!

Confirmado devido ao fato da Eb/A ser a mesma independentemente da proporção de n

ou p no núcleo. Portanto p e n são equivalentes em relação à Força Nuclear (e por isso

designados núcleons)

Também a estabilidade do dêuteron (o núcleo com um nêutron e um próton) permite

concluir que existe interação nuclear entre nêutrons e prótons.

Núcleos grandes

O número de nêutrons cresce mais rapidamente que o número de prótons para núcleos

estáveis não muito pequenos. Isto permite concluir que existe interação nuclear entre nêutrons.

Com o crescimento do número de prótons, cresce o efeito anti-estabilizante da

repulsão coulombiana. Esse crescimento só pode ser contrabalançado pelo crescimento do

efeito estabilizante da interação nuclear. Como cada núcleon interage apenas com um número

limitado de outros núcleons, o excesso de nêutrons só pode contribuir para o crescimento do

efeito estabilizante se existe interação nuclear entre nêutrons.

Núcleos pequenos

Para núcleos estáveis pequenos, o número de nêutrons cresce junto com o número de

prótons. Este fato, mais a existência de interação nuclear entre nêutrons, permite concluir que

existe interação nuclear também entre prótons e com a mesma intensidade.

Se não existisse interação nuclear entre prótons ou se a interação nuclear entre

nêutrons fosse mais intensa do que a interação nuclear entre prótons, os núcleos estáveis

pequenos deveriam conter um número maior de nêutrons do que de prótons e não um número

aproximadamente igual de nêutrons e prótons como, realmente, acontece.

A independência da carga nas interações nucleares é, também, corroborada pelo fato

de que os resultados dos experimentos de espalhamento de prótons pelo núcleo são idênticos

aos resultados dos experimentos de espalhamento de nêutrons.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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5) A Força Nuclear depende da orientação relativa dos spins dos núcleons

A Força Nuclear depende da orientação relativa dos spins dos núcleons em interação

relativamente à reta que passa pelos núcleons.

Confirmando pela experiência de espalhamento e análise de níveis de energia nucleares

Exemplo: E para sistema com 2 núcleons

E para spins E para spins

Exemplo: dêuteron (n-p)

Estado ligado tem spins paralelos (I=1)

Mas não há estado ligado para spins antiparalelos (I=0)

6) A força nuclear não é de caráter completamente central

O momento angular orbital no dêuteron de ambos seus núcleons em relação ao seu

centro de massa não é constante (contrário a Forças Centrais). Para explicar o estado

fundamental do dêuteron devemos usar uma combinação linear das funções de onda s (l = 0) e

d (l = 2).

Na Força Nuclear → a interação spin-orbita é forte

→ há força tensorial: parecida com interação entre 2 dipolos

Para núcleos pesados, nêutrons precisam ser intercalados entre prótons para manter o núcleo estável (devido a interação nuclear) e a repulsão entre prótons não começar a

dominar. Por isso núcleos pesados tem mais nêutrons.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Apesar de todas essas informações, a expressão correta da Ep nuclear ainda não é bem

conhecida.

Expressões propostas para a força nuclear

Foram propostas expressões como:

Potencial de Yukawa (1935)

0( )r

ap

E aE r e

r

Onde E0 e a são constantes empíricas. E0 é a intensidade da interação; a está relacionada ao

alcance da força nuclear.

0r

ae

mais rápido que Ep elétrica (que cai com 1/r)

Há dúvidas se a Interação Nuclear pode ser descrita como função da Ep nuclear, como ocorre

com a força gravitacional e a eletromagnética.

A força nuclear é um efeito residual da interação forte entre os quarks que compõe os p e n.

OBS: Não podemos estudar a estrutura nuclear com a mesma amplitude que estudamos os

átomos e moléculas, pois não conhecemos a forma correta da Ep nuclear.

Fórmula Semi-Empírica da Energia de Ligação

Com o passar do tempo e na ausência de uma teoria detalhada para descrever a

estrutura nuclear, vários modelos foram desenvolvidos, cada qual correlacionando os dados

experimentais de um conjunto mais ou menos limitado de fenômenos nucleares.

Entre os modelos formulados estão o modelo de gás de Fermi, o modelo uniforme, o

modelo de partícula alfa, o modelo da gota líquida e o modelo nuclear de camadas.

Com o modelo da gota líquida foi desenvolvida a seguinte fórmula semi-empírica para o

cálculo da energia de ligação nuclear:

Eb = av A - ac Z ( Z - 1 ) A-1/3

- as A2/3

- ar ( A - 2Z )2 A

-1 + api A

-1

onde um dos possíveis conjuntos de valores (em MeV) para as constantes av, ac, as, ar e api,

obtidos por ajustes de curvas experimentais, é o seguinte:

av = 14,0 ac = 0,584 as = 13,1 ar = 19,4 api = 135 d

com d = +1 para núcleos par-par (Z par e N par), d = 0 para núcleos par-ímpar (Z par e N ímpar

ou Z ímpar e N par) e d = -1 para núcleos ímpar-ímpar (Z ímpar e N ímpar).

O primeiro termo do lado direto da expressão dada corresponde ao termo de volume,

proporcional ao número de núcleons A, e está associado ao fato de ser mais ou menos

constante a energia de ligação por núcleon ou, o que dá no mesmo, ao fato de que cada

núcleon interage apenas com um número limitado e fixo de outros núcleons.

O segundo termo corresponde ao termo coulombiano, associado à repulsão

eletrostática entre os prótons do núcleo, e aparece com o sinal negativo porque o efeito de

repulsão tende a diminuir a energia de ligação.

Page 37: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Como os prótons interagem aos pares, esse termo é proporcional ao número de pares

de prótons do núcleo, Z (Z - 1), e como a interação é tanto menor quanto maior a distância

entre os prótons, esse termo é inversamente proporcional ao raio do núcleo, ou seja,

inversamente proporcional a A1/3

.

O terceiro termo corresponde ao termo de superfície e está associado ao número de

núcleons da superfície do núcleo. Se os núcleons do interior do núcleo interagem com um dado

número de outros núcleons, os núcleons da superfície interagem, em média, com a metade

desse número.

Como se considerou, no primeiro termo, que todos os núcleons interagem com igual

número de outros núcleons, deve-se descontar um termo proporcional ao número de núcleons

da superfície ou à área da superfície, ou seja, ao quadrado do raio, A2/3

.

O quarto termo corresponde ao termo de simetria. Para um dado valor de A, existe um

valor de Z que corresponde ao núcleo mais estável.

Para núcleos pequenos, onde o efeito da repulsão coulombiana é pequeno, esse valor

é Z = A/2 ou 2Z = A. Assim, na ausência da repulsão coulombiana, valores de A diferentes de

2Z levam a menor estabilidade, ou seja, a um valor menor para a energia de ligação nuclear e

esse efeito é representado, então, por (A - 2Z)2. O quadrado serve para garantir que tanto e

excesso de nêutrons quanto o excesso de prótons levem a uma menor estabilidade.

E como esse efeito deve ser cada vez menor com o aumento do tamanho do núcleo,

ele deve ser inversamente proporcional ao número de núcleons, ou seja, inversamente

proporcional a A.

Finalmente, o quinto e último termo, corresponde ao seguinte efeito: dos núcleos

estáveis, aqueles com número par de prótons ou com número par de nêutrons são os mais

abundantes e, presumivelmente, os mais estáveis; núcleos com número ímpar de prótons ou

com número ímpar de nêutrons são os menos estáveis.

Fórmula semi-empírica da massa

Quando temos Eb, podemos também estimar a massa de qualquer átomo neutro (com os

elétrons).

2

A BZ H B

EM ZM Nm

c

O modelo da gota e a fórmula da massa deduzida a partir dele obtiveram grande êxito em

estimativas de massas nucleares. Porém outros processos como momento angular e estados

excitados são mais bem descritos com o modelo de camadas que veremos na próxima aula.

Decaimento

A fórmula semi-empírica da energia de ligação nuclear permite também a discussão da

estabilidade dos núcleos isóbaros e do decaimento .

Page 38: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Como primeiro exemplo, sejam os seguintes núcleos isóbaros com número de massa

A = 73 (ímpar): zinco, gálio, germânio, arsênico e selênio, cujas energias de ligação (em MeV)

aparecem na tabela a seguir. Nessa tabela aparecem, também, os correspondentes valores

absolutos (em MeV) dos vários termos da fórmula semi-empírica da energia de ligação.

Elemento 73

30 Zn 73

31Ga 73

32Ge 73

33 As 73

34 Se

av A 1022,000 1022,000 1022,000 1022,000 1022,000

ac Z ( Z - 1 ) A-1/3

121,579 129,964 138,628 147,572 156,795

as A2/3

228,818 228,818 228,818 228,818 228,818

ar ( A - 2Z ) 2 A

-1 44,912 32,156 21,526 13,022 6,644

api A-1

0,000 0,000 0,000 0,000 0,000

E 626,691 631,062 633,028 632,588 629,743

O gráfico da energia de ligação em função de Z é uma parábola. O núcleo de germânio 73 é o

mais estável porque tem a maior energia de ligação e aparece mais próximo do vértice da

parábola.

Os isóbaros com número atômico menor que o número atômico do isóbaro mais

estável (ramo esquerdo) decaem por emissão de um elétron (decaimento β-):

73Zn30

73Ga31

73Ge32 (estável)

Em termos dos núcleons, o decaimento β- é a transformação de um nêutron num

próton, com a emissão de um elétron e um antineutrino (*):

n p + e- + *

Analogamente, os isóbaros com número atômico maior que o número atômico do

isóbaro mais estável (ramo direito) decaem por emissão de um pósitron (decaimento +) ou por

captura de elétron (K) ou por ambos:

73Se34

73As33

73Ge32 (estável)

Page 39: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Em termos dos núcleons, o decaimento + é a transformação de um próton num

nêutron, com a emissão de um pósitron e um neutrino ():

p n + e+ +

A captura eletrônica é a captura, pelo núcleo atômico, de um elétron orbital. Se um

elétron da camada K é capturado, o processo é chamado captura K. Elétrons de outras

camadas podem ser capturados, mas com probabilidades menores.

Em termos elementares, a captura eletrônica fica:

p + e- n +

Para isóbaros com número de massa A par, a discussão é um pouco diferente por

causa do termo par-ímpar da fórmula semi-empírica da energia de ligação. Esse termo é

positivo para núcleos par-par e negativo para núcleos ímpar-ímpar, de modo que existem duas

parábolas.

Como exemplo, sejam os seguintes núcleos isóbaros com A = 64 (par): cobalto,níquel,

cobre, zinco e gálio, cujas energias de ligação (em MeV) aparecem na tabela a seguir. Nessa

tabela aparecem, também, os correspondentes valores absolutos (em MeV) dos vários termos

da fórmula semi-empírica da energia de ligação.

Elemento 64

27Co 64

28 Ni 64

29Cu 64

30 Zn 64

31Ga

av A 896,000 896,000 896,000 896,000 896,000

ac Z ( Z - 1 ) A-1/3

102,492 110,376 118,552 127,020 140,306

as A2/3

209,600 209,600 209,600 209,600 209,600

ar ( A - 2Z ) 2 A

-1 30,313 19,400 10,913 4,850 1,213

api A-1

(-) 2,109 (+) 2,109 (-) 2,109 (+) 2,109 (-) 2,109

E 551,486 558,733 554,826 556,639 542,772

Os gráficos da energia de ligação em função de Z são duas parábolas. A parábola

inferior corresponde aos núcleos ímpar-ímpar e a parábola superior, aos núcleos par-par.

Portanto, os primeiros são instáveis em relação aos segundos.

Page 40: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Pela curva correspondente aos núcleos par-par pode-se observar que existem dois

isóbaros estáveis com números atômicos diferindo por duas unidades.

Os núcleos com Z menor do que o Z do estado mais estável decaem por emissão de

elétron (decaimento -) e os núcleos com Z maior que o Z de um dos núcleos mais estáveis

decaem por emissão de pósitron (decaimento +), captura K ou ambos.

O isóbaro mais próximo do vértice da parábola ímpar-ímpar (o núcleo de cobre) pode

decair por -,

+ ou captura K.

Page 41: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Aula 5 A força nuclear: modelo de camadas

Meta Descrever o modelo de camadas para o núcleo e prever o spin nuclear

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Reconhecer o modelo nuclear de camadas

Calcular a degenerescência dos níveis nucleares após interação spin-órbita

Fazer a distribuição dos núcleons de um nuclídeo nos níveis nucleares

Interpretar os números mágicos

Prever o spin nuclear

Page 42: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Falhas do Modelo da gota

No modelo de gota líquida, os núcleons não são tratados de maneira individual, mas

seus efeitos são considerados por meio de valores médios associados às suas propriedades. O

modelo é bem sucedido no que diz respeito à determinação de algumas propriedades

nucleares como, por exemplo, a energia de ligação por núcleon. Entretanto, outras

propriedades nucleares, como por exemplo, as energias dos estados excitados nucleares ou os

momentos magnéticos nucleares, necessitam, para a sua compreensão, uma descrição que

leve em conta propriedades individuais dos núcleons que não são levadas em consideração

em um modelo de natureza mais coletiva como é o modelo de gota liquida.

O modelo de camadas foi proposto para tentar explicar essas propriedades

experimentais.

O modelo de camadas

O modelo de camadas é muito semelhante à aproximação de campo central usada na

física atômica, ou seja, ao que descreve os elétrons nos átomos. Ele considera o núcleo

atômico como um conjunto de nêutrons e prótons (núcleons) interagindo fracamente, mantidos

num poço de energia potencial, isto é, cada núcleon se move em um potencial que representa

o efeito médio de todos os outros núcleons.

O modelo de camadas supõe as partículas “suficientemente independentes umas das

outras” de tal maneira que possam ficar em uma “órbita” sem interferência das demais. São

estabelecidas “órbitas” no núcleo com números quânticos bem definidos.

A estrutura do modelo de camadas é determinada por meio de uma série de aproximações

sucessivas. Mas o núcleo apresenta mais dificuldades que o modelo atômico:

Há dois tipos de partículas (prótons e nêutrons, que obedecem separadamente o

Princípio de Exclusão de Pauli);

Ausência de força central dominante.

Considera-se, que cada núcleon se move em um campo médio de forças produzido pelos

outros núcleons, que em primeira aproximação é considerado central.

Caracterizamos cada núcleon por seu estado de energia (n, l )

Onde n = nível de energia; l = momento angular orbital.

Fazendo uma comparação com o modelo atômico, no caso dos elétrons:

n = 1, 2, 3, ..

l = 0, 1, ..., n-1

ml= - l , - l +1, ..., + l

V = V(r)

As regras surgem da

solução da Eq. de

Schrödinger e vêm da

forma particular do

potencial coulombiano 2

0

1( )

4

zeV r

r

Page 43: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Entretanto, isso não é válido para o caso dos núcleons. Sabemos apenas que a força é

aproximadamente central. Então, o potencial usado na Eq. de Schrödinger é V V(r). Portanto

não temos as mesmas soluções da equação que tínhamos no caso dos elétrons e, com isso,

as regras não existem para l dependente de n. Com esse tipo de potencial os estados (funções

de onda) dos núcleons não obedecem restrições.

Por exemplo:

Para elétrons

Se n=1 l =0 (o estado só pode ser 1s)

Se n=2 l =0,1 (estados possíveis são 2s e 2p)

Para os núcleons

Se n=1 l = qualquer (o estados possíveis são 1s, 1p, 1d ...)

Se n=2 l = qualquer (estados possíveis são 2s, 2p, 2d ...)

Não há restrição em l como no caso dos elétrons.

Números mágicos

No desenvolvimento do programa nuclear americano, muitos isótopos radiativos foram

produzidos. Depois de 1945, Maria Mayer começou a se preocupar com a sistemática das

energias de ligação (elétron-núcleo), e descobriu que aquelas energias indicavam a presença

de camadas completas nucleares.

Dados nucleares revelam que núcleos cujos números de núcleons, N ou Z,

correspondem aos números: 2, 8, 20, 28, 50, 82, 126, denominados “mágicos”, apresentam

estabilidade pronunciada, com valores mais expressivos para sua energia de ligação quando

comparados a núcleos “não mágicos”. Os núcleos que contém ambos os prótons e nêutrons

com estes números são extraordinariamente estáveis. Por exemplo:

168O,

4020Ca,

20882Pb etc.

Os núcleos atômicos com 82 nêutrons são muito mais estáveis do que os com 81 ou 83, e

ainda mais estáveis do que aqueles com 80 ou 84, por exemplo.

O número de isótopos e isótonos com Z ou N mágicos é relativamente alto, sendo

esses nuclídeos mais estáveis, em geral. Outro fato importante é que a seção de choque de

captura de nêutrons desses núcleos com número mágico de nêutrons é extremamente baixa.

Isso indica um fraco vínculo do núcleon extra, ou seja, esse núcleo não “quer” um nêutron a

mais. Aparentemente estes números mágicos indicam algo semelhante à existência de

níveis, camadas ou sub-níveis de energia no núcleo.

É importante salientar que um comportamento similar ocorre no caso atômico, que deu

por sua vez origem ao modelo atômico de camadas. No caso dos elétrons, os gases nobres

são aqueles que têm suas camadas eletrônicas totalmente preenchidas. Corresponde

àqueles elementos com Z = 2, 10, 18, 36, 54 e 86, com o mesmo número de elétrons no

átomo neutro. Esses gases não se misturam a outros facilmente, pois não querem nem doar

nem receber elétrons.

Page 44: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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No caso dos núcleos, estes fatos deram origem assim ao Modelo Nuclear de

Camadas. Núcleos com números mágicos exibem a energia de excitação do primeiro estado

excitado extremamente grande. Ou seja, se supusermos que existem níveis energéticos no

núcleo como existem para os elétrons no átomo, haveria um “gap” bastante largo entre o

último nível preenchido e o primeiro nível vazio. Isso explicaria bem os números mágicos.

Este modelo foi proposto em 1949, independentemente por Mayer e Jensen, que

receberam o prêmio Nobel por ele em 1963. Para explicar os números mágicos, Mayer e

Jensen postularam um termo adicional no potencial nuclear. Eles consideraram que, além da

força central média que os núcleons sentiriam dos outros núcleons, haveria uma interação

spin-órbita forte.

Vamos novamente lembrar o caso dos elétrons atômicos:

São carga girando em torno do núcleo, o que gera um campo magnético

O spin dos elétrons também gera campo magnético

Ambos os campos interagem (interação entre os dois momentos dipolares), o

que corresponde à interação spin-órbita de origem eletromagnética.

Essa interação spin-órbita é proporcional a L S ¨

Os núcleons também possuem spin S e momento angular orbital L bem definidos,

que, em geral, não são colineares.

Assim, se supôs que haveria no núcleo interação spin-órbita proporcional a L S

como no caso dos elétrons. Como os nêutrons não têm carga, essa interação não seria

necessariamente de origem eletromagnética.

Os níveis de energia encontrados para os núcleos correspondentes apresentam

menor energia quando j = l + ½

maior energia quando j = l - ½

que é contrário ao observado no caso dos elétrons.

Se a interação spin-órbita no caso dos elétrons é proporcional a L S , vamos supor que aqui

também seja. Vamos descobrir os níveis energéticos dos núcleons:

2 2 22

2 2 2

( ) 2 .

1. ( )

2

J L S

J L S L S L S

L S J L S

Substituindo os valores de 2 2 2

, ,J L S

21 3. ( ( 1) ( 1)

2 4L S j j l l

Page 45: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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S pode ser paralelo ou anti-paralelo a L 12

j l

2

2

1 1

2 2

1 1( 1)

2 2

L S l quando j l

L S l quando j l

A separação entre dois estados com mesmo l, mas j distintos é:

22 2 2 2

2

2

1 1 11

2 2 2 2

12

2

2 1 2 1

l l l l

l

l proporcional a l

Portanto, a separação entre dois estados aumenta com l

Preenchimento das camadas

A degenerescência de cada estado (n, l ,j) é 2j + 1, correspondendo a 2j + 1 possíveis

orientações de J relativamente ao eixo z (Jz) (Lembre-se que mj = -j, -j+1, ..., +j). Então, de

acordo com o Princípio de Exclusão de Pauli, o número máximo de nêutrons (ou prótons) em

um dado nível (n, l ,j) (camada) é 2j +1.

Lembrando que j l s ¨

para l =0 e s = 1/2 j=1/2

para l =1 e s = 1/2 j=3/2 ...

Tabela - Degenerescência das camadas nucleares

j 1/2 3/2 5/2 7/2 9/2 11/2 13/2 ...

No Max

de N ou

p

(2j+1)

2

4

6

8

10

12

14

Cada estado dos núcleons é designado por:

Números: 1, 2, 3 ... designando o número quântico n

Letras: s, p, d, f ... designando os números quânticos l = 0, 1, 2, 3, respectivamente

Valores semi-inteiros: designando o número quântico j

Resumindo:

Os níveis de energia (de 1 partícula) têm j semi-inteiro

Os níveis de energia têm degenerescência 2j+1= par

Experimentalmente verifica-se que

Que é contrário ao que ocorre com os elétrons

Page 46: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 46

Um nível de energia pode conter 2j+1 núcleons: 1 núcleon em cada estado

Representação do estado nl j exemplo: n=1 l =0 e j =1/2 estado 1s1/2

Exemplo do desdobramento dos níveis de energia

Os núcleons podem ocupar várias órbitas, de

forma análoga aos elétrons no átomo, mas

constituindo dois conjuntos distintos – um para os

prótons e outro para os nêutrons. Há uma pequena

diferença entre os níveis de prótons e os de nêutrons

devido à interação coulombinana que existem entre os

primeiros.

No caso de núcleos que, além de uma camada

fechada, possuem alguns núcleons adicionais,

podemos ignorar, até certo ponto, os núcleons

individuais na camada fechada, e nos concentrarmos nos poucos núcleons que se encontram

fora dela. As interações entre esses núcleons externos é que devem ser levadas em conta. Em

núcleos pesados, com muitos núcleons fora da última camada fechada, os cálculos tornam-se

proibitivamente complexos, até mesmo para computadores modernos.

O modelo parte do pressuposto que os níveis de energia funcionam como nos elétrons

atômicos. Os níveis são preenchidos com núcleons (separadamente, um com prótons e outro

com nêutrons) de maneira sucessiva, partindo daqueles níveis de energia com valores mais

baixos aos de valores mais altos.

Aproximação de Campo Médio:

Cada núcleon move-se num potencial médio gerado por todos os outros núcleons

Resolução da equação de Schrödinger de uma partícula com um potencial que admita

estados ligados

Obtém-se uma série de estados ligados (Ei<0) que se ordenam segundo energias

crescentes

Níveis preenchidos de acordo com o Princípio de exclusão de Pauli

Page 47: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Figura – Camadas do modelo nuclear.

O que o Modelo de camadas explica

Assim como os elétrons, os núcleos são

partículas fermiônicas, e o princípio de exclusão de Pauli

é aplicado a eles. Isso significa que dois núcleons

idênticos não podem ocupar a mesma órbita. As órbitas

formam camadas ou conjuntos de órbitas com energias

similares, com grandes vazios entre elas. Núcleos com

uma camada fechada (cheia) de prótons ou uma camada

fechada de nêutrons, e especialmente aqueles com

ambas fechadas, apresentam grande estabilidade, assim

como os átomos de gases nobres, que possuem camadas fechadas de elétrons. Assim, o

modelo de camadas consegue explicar bem a existência dos números mágicos: 2, 8, 20, 28,

50, 82, 126.

Page 48: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Além disso, o spin nuclear pode ser previsto utilizando o modelo de camadas.

Os núcleos par-par apresentam I = 0 em seu estado fundamental. No modelo de

camadas, podemos verificar o emparelhamento dos núcleons de núcleos par-par nas camadas

nucleares.

Para núcleos par-ímpar (ou ímpar-par) o spin nuclear (I) irá coincidir com o j daquele

núcleon desemparelhado.

Ao excitar o núcleon desemparelhado para um estado próximo, o spin nuclear do

estado excitado geralmente coincidirá com o novo j do núcleon excitado.

No caso de núcleons ímpar-ímpar é um pouco mais complicado prever o spin nuclear.

Lembre-se que só existem 4 nuclídeos estáveis do tipo ímpar-ímpar. Todos os valores inteiros

de I são permitidos no intervalo entre p nj j e p nj j .

(jp = j do próton desemparelhado e jn= j do nêutron desemparelhado)

Resumindo:

núcleos par-par I = 0

núcleos par-ímpar I = j do núcleon desemparelhado

núcleos ímpar-ímpar I = inteiro entre p nj j p nj j

Page 49: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Page 50: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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O que o modelo de camadas não explica

Apesar de funcionar bem na explicação do spin nuclear e dos números mágicos,

quando comparamos o modelo com o caso dos elétrons, vemos que estes são mantidos em

órbita em torno dos núcleos pela força eletromagnética, que é realmente fraca. A força

predominante no interior dos núcleos é aproximadamente cem vezes maior (daí seu nome:

força nuclear forte). Técnicas teóricas capazes de descrever atrações fracas, como o

eletromagnetismo, não se aplicam a fenômenos tão fortes como a força nuclear. Além disso, os

elétrons são partículas elementares desprovidas de estrutura, ao passo que os prótons e

nêutrons são aglomerados complexos de partículas chamadas quarks e glúons. A força

existente entre esses núcleons não é uma força fundamental como a eletromagnética, cujas

equações são conhecidas com precisão. Pelo contrário, a atração nuclear entre os núcleons é

um complicado subproduto das interações entre os quarks e glúons que os constituem.

O momento de camadas não explica, por exemplo, as regras de acoplamento ou

emparelhamento dos momentos angulares. As regras são atribuídas à interação “residual”

(diferença entre a interação nuclear sentida pelos núcleons e as forças central mais spin-órbita

média). A interação residual contribui para a estabilidade nuclear por meio da energia de

emparelhamento.

O modelo de camadas falha também na explicação do momento de quadrupolo elétrico

dos núcleos (cujo valor calculado é muito pequeno). O acoplamento forte entre os núcleons

leva a vários efeitos coletivos do núcleo, não previsto nesse modelo.

Núcleons ocupando o caroço (camadas completas)

agem como uma gota, capaz de oscilações do seu

formato em torno da forma esférica de equilíbrio.

As oscilações são coletivas com volume constante -

cada núcleo pode ter vários modos normais de

oscilações. Os núcleons das camadas externas não

completamente preenchidas exercem um tipo de ação polarizante dando ao núcleo uma forma

de equilíbrio não esférica. Há deformações grandes principalmente nos casos 90<N<114 e

para z>88.

Esse momento de quadrupolo elétrico resultante é relativamente grande e não é

explicado pelo modelo de camadas.

Page 51: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Apêndice

Interação Spin órbita

Page 52: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

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Aula 6 Estabilidade Nuclear e radioatividade

Meta

Apresentar as formas mais importantes pelas quais os núcleos instáveis sofrem

decaimento radioativo.

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Compreender como estabilidade de um núcleo depende do número de

prótons e nêutrons que ele contém.

Reconhecer os tipos de partículas emitidas pelos núcleos radioativos

Analisar o processo de instabilidade nuclear

Calcular a energia liberada num decaimento nuclear e a viabilidade do

mesmo

Identificar os espectros energéticos das radiações emitidas.

Page 53: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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INTRODUÇÃO

Nas aulas anteriores falamos da força que mantém os núcleos unidos.

Mas nem todos eles permanecem para sempre unidos. Há vários naturalmente

instáveis, além de vários produzidos artificialmente. Hoje falaremos das

radiações que podem ser provenientes de nuclídeos instáveis.

No dia a dia conhecemos mais as radiações eletromagnéticas, como os

raios X ou os raios solares. Mas há também outros tipos de radiações!

Espectro eletromagnético

Num sentido amplo, radiação é aquilo que irradia (sai em raios) de

algum lugar. Em física, o termo refere-se usualmente a partículas e campos

que se propagam (transferindo energia) no espaço (preenchido ou não por

matéria).

Page 54: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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A radiação pode ser de natureza particulada (de partículas) ou

ondulatória (de ondas). A radiação de natureza particulada é caracterizada por

sua carga, massa e velocidade: pode ser carregada ou neutra, leve ou pesada,

lenta ou rápida. Prótons, nêutrons e elétrons ejetados de átomos ou núcleos

atômicos são exemplos de radiação particulada. A radiação eletromagnética é

constituída por campos elétricos e magnéticos variando no espaço e no tempo,

sendo caracterizada pela sua amplitude (A) e pela sua frequência (f) (ou,

alternativamente, pelo comprimento de onda ()).

Lembrem-se E = h . f f = c / E = h . c /

h = constante de Planck

A velocidade de propagação da radiação eletromagnética num dado

meio é sempre constante, atingindo seu valor máximo no vácuo (cerca de

300.000 km/s). Apesar de não possuir carga ou massa, carrega energia e

momento. A radiação eletromagnética é absorvida e emitida pela matéria em

“quanta” de energia. As ondas de rádio, a luz visível e os raios X são exemplos

de radiação eletromagnética.

Page 55: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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EMISSÃO RADIOATIVA

A radioatividade é um fenômeno natural pelo qual algumas substâncias

ou elementos químicos, chamados radioativos, são capazes de emitir

radiações. Desde o descobrimento da radioatividade em 1896 por Becquerel, já

se sabe que os átomos radioativos se desintegram espontaneamente em

átomos (radioativos ou não) diferentes. Se um átomo tiver seu núcleo muito

energético, ele tenderá a estabilizar-se, emitindo o excesso de energia na

forma de partículas e ondas, as quais têm a propriedade de impressionar

placas fotográficas, ionizar materiais, atravessar corpos opacos à luz ordinária,

etc.

As radiações emitidas pelas substâncias radioativas são principalmente

partículas alfa, partículas beta e raios gama. Assim, o decaimento radioativo ou

desintegração radioativa é a transmutação que ocorre quando o elemento

instável (chamado muitas vezes de átomo pai) emite uma partícula

transformando-se em outro elemento (denominado átomo filho).

Veja por exemplo o C-14 ou radiocarbono, que é um isótopo radioativo

natural do elemento carbono. Este isótopo apresenta dois nêutrons a mais no

seu núcleo que o isótopo estável C-12. Ele sofre desintegração radioativa

emissão alfa emissão beta

Page 56: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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emitindo uma partícula beta, transformando-se em N-14. Assim, após a

emissão da partícula, o elemento original (C-14) transforma-se em outro

elemento (N-14). A desintegração do C-14 pode ser representada por:

Os sub-índices dos elementos, 6 do C e 7 do N, representam o número

atômico e o sobre-índice 14 de ambos, o número de massa. Uma partícula beta

() é emitida na desintegração.

O homem sempre conviveu com a radioatividade. Nas rochas,

encontramos radioisótopos (isótopos radioativos), como o U-238 (isótopo

radioativo mais abundante da crosta terrestre), U-235, Th-232, Ra-226 e Ra-

228. Até mesmo em vegetais pode ser detectada a radioatividade: as batatas,

por exemplo, contêm K-40 e C-14. Nos nossos sangue e ossos encontram-se

K-40, C-14 e Ra-226.

Dentro do incrivelmente pequeno núcleo, as duas maiores forças da

natureza (nuclear e eletromagnética) são colocadas uma contra a outra.

Quando o balanceamento é quebrado, surgem de lá partículas e ondas com

enorme energia.

Gráfico de Segrè

Dentro de um total de 2500 nuclídeos conhecidos, menos de 300 são

estáveis. Não sabemos exatamente o porquê de alguns serem radioativos e

outros não, pois ainda não conseguimos fazer um modelo nuclear preciso. Mas

dispomos de uma pista: se dispusermos num gráfico cuja abscissa é o número

atômico Z e na ordenada o número de nêutrons N teremos uma figura como

mostrada a seguir. Um gráfico como esse é chamado de Gráfico de Segrè.

Quase todas as linhas com A constante passam através de um ou dois

nuclídeos estáveis. Não há nuclídeos estáveis com A = 8, pois eles preferem

se dividir em dois nuclídeos duplamente “mágicos” com A = 4 e Z = 2. Esse

mesmo nuclídeo duplamente mágico não tem interesse em receber mais um

núcleon, portanto, não é formado nenhum nuclídeo estável com A = 5.

Para nuclídeos com massa pequena, a região de estabilidade se

concentra em Z=N. A razão N/Z cresce gradualmente com A até cerca de 1,6.

Isso é devido influência da repulsão coulombiana entre os prótons. Nuclídeos

Page 57: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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fora dessa região buscam estabilidade fazendo alterações no número de

nêutrons e prótons nele contidos tentando se aproximar dessa região.

Gráfico de Segrè - Estabilidade dos núcleos. Os círculos cheios (x)

representam núcleos estáveis. A linha cheia corresponde a N=Z.

Acima da curva de estabilidade há excesso de nêutrons e abaixo

excesso de prótons. Nenhum nuclídeo é estável também com A>209 ou Z>83,

já que um nuclídeo é instável quando é grande demais. Também nuclídeos

com Z=43 e Z=61, tecnécio e promécio, respectivamente, não são estáveis.

Page 58: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Partículas alfa

O decaimento alfa () acontece quando um núcleo (natural ou produzido

artificialmente), em geral pesado, emite uma partícula composta por dois

prótons e dois nêutrons, ou seja, por um núcleo de hélio.

O decaimento alfa é usualmente representado segundo o esquema:

4 4 2

2 2

A A

Z ZX Y He

4 2

2 He = partícula alfa ()

Um exemplo é o decaimento do amerício-241 em neptúnio-237:

24195Am → 237

93Np + 42He2+

Esse tipo de decaimento ocorre em geral para núcleos muito grandes para

serem estáveis. Ele só será possível se a massa do átomo neutro original for

maior que a soma das massas do átomo neutro final e da massa do átomo

neutro de hélio.

As partículas alfa são emitidas sempre com um espectro discreto, isto é,

as energias emitidas possuem sempre valores determinados. O 238U, 235U,

239Pu e o 231Pa são exemplos de emissores alfa.

Decaimento beta (β)

A radiação beta é uma forma de radiação ionizante emitida por certos

tipos de núcleos radiativos semelhantes ao K-40. Esta radiação são elétrons de

alta energia (β−) ou posítrons (β+) emitidos de núcleos atômicos num processo

conhecido como decaimento beta.

Decaimento β− (emissão de elétrons)

O decaimento beta ( ) ocorre em nuclídeos com razão N/Z grande

demais para que haja estabilidade, ou seja, as partículas são emitidas por

núcleos instáveis que possuem um excesso de nêutrons. Os nêutrons não são

partículas fundamentais. O núcleo atômico pode diminuir essa quantidade

excessiva de nêutrons convertendo um deles em um próton:

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Por causa da lei de conservação do momento, o produto resultante de

um decaimento deve ter um momento total zero, e a energia deve ser

conservada. No caso do decaimento beta, apenas a emissão do elétron estaria

violando essas leis de conservação, pois o átomo e a partícula beta

normalmente não retrocedem em direções opostas. A fim de impedir a violação

das leis de conservação de energia e momento linear, Wolfgang Pauli postulou

a existência de neutrinos, partículas com um momento e energia cinética

apropriada para balancear o evento, mas que apenas muitos anos depois

foram determinadas experimentalmente.

Representação do decaimento

O neutrino foi assim denominado, pois a partícula deveria ter massa

muito pequena (ou zero) e carga nula. Dessa forma era muito difícil de ser

identificada. Como os neutrinos não têm carga elétrica quase nunca interagem

com quaisquer outras partículas. A maioria dos neutrinos passa direto através

da Terra sem ter sequer interagido com um único átomo dela.

O decaimento é usualmente representado segundo o esquema:

0

01

0

1 YX A

Z

A

Z

OBS: representa a antipartícula do neutrino.

Ex: 0

0

60

28

0

1

60

27 NiCo

Os elétrons assim obtidos são chamados de radiação beta e são idênticos aos

elétrons da camada eletrônica, diferindo destes apenas quanto à sua origem.

Pela lei de conservação de massa, para ocorrer esse tipo de decaimento a

massa atômica do átomo neutro original deve ser maior que a massa do átomo

neutro final.

90Sr, 99Tc e 45Ca são exemplos de fontes de radiação beta.

Page 60: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Decaimento β+ (Emissão de pósitrons)

Em núcleos instáveis que possuem relativamente poucos nêutrons em

relação a prótons, há a conversão de um de seus prótons em um nêutron:

A partícula emitida nesse caso é um pósitron (que tem mesma massa dos

elétrons, mas com carga positiva). O decaimento é usualmente

representado segundo o esquema:

0

01

0

1 YX A

Z

A

Z

Ex: 0

0

57

26

0

1

57

27 FeCo

Pela lei de conservação de massa-energia, para ocorrer esse tipo de

decaimento a diferença entre a massa atômica do átomo neutro original e a

massa do átomo neutro final deve ser maior que duas vezes a massa de

repouso do elétron (ou seja, 1,022 MeV) para que haja a criação do pósitron, a

antipartícula do elétron.

Para cada tipo de partícula de matéria que nós encontramos, existe uma

partícula correspondente de antimatéria ou uma antipartícula. As

antipartículas se parecem com suas correspondentes partículas de matéria,

mas apresentam algum comportamento contrário, como no caso da carga

elétrica do pósitron em relação ao elétron. Por exemplo, um próton é

eletricamente positivo, ao passo que um antipróton é eletricamente negativo.

Uma partícula de matéria tem também a mesma massa de uma antipartícula.

A emissão do pósitron no decaimento β+ é sempre acompanhada por

radiação de aniquilação. A aniquilação de pares ocorre quando uma partícula

encontra a sua antipartícula e, na interação, desaparecem, produzindo

radiação eletromagnética. Na aniquilação do par elétron-pósitron, um pósitron

produzido, por exemplo, num decaimento nuclear, após perder sua energia

cinética, quando se encontra com um elétron, ambos desaparecem originando

um par de fótons (radiação gama) com uma energia de 0,511 MeV cada, que é

a energia correspondente a massa de repouso do elétron. Ou seja, são

liberados 1,022 MeV na aniquilação pósitron-elétron, que corresponde

exatamente a duas vezes a massa de repouso do elétron. Os fótons seguem a

180º um do outro para haver conservação de momento.

Page 61: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Alguns dos radioisótopos emissores de pósitrons de interesse da

medicina são: C-11, F-18, N-22. Estes radioisótopos são amplamente utilizados

em medicina nuclear nos ultrasensíveis mapeadores tipo PET (Positron Emition

Tomography). No PET são detectados os gamas resultantes da aniquilação do

par elétron-pósitron.

Captura de elétrons (CE)

Quando um núcleo que possui relativamente poucos nêutrons em

relação a prótons (i.e, razão N/Z pequena demais para haver estabilidade) não

tenha energia disponível para a produção do pósitron, ou seja, a diferença

entre a massa atômica do átomo neutro original e a massa do átomo neutro

final é menor que 1,022 MeV, o núcleo original (núcleo pai) pode capturar um

de seus próprios elétrons, em geral da camada K, que é a mais próxima do

núcleo, e emitir um neutrino. Esse processo é chamado de captura eletrônica

(CE), que é usualmente representado segundo o esquema:

0011 YeX A

Z

oA

Z

O decaimento por CE só ocorre, pela lei de conservação de massa, para

os casos em que massa atômica do átomo neutro original maior que a massa

do átomo neutro final.

Radiação gama

Geralmente, após a emissão de uma partícula ou o núcleo resultante

desse processo, ainda com excesso de energia, procura estabilizar-se,

emitindo esse excesso em forma de onda eletromagnética, da mesma natureza

da luz, denominada radiação gama.

Como a energia do movimento interno do núcleo é quantizada, um

núcleo típico possui um conjunto de níveis de energia, incluindo seu estado

fundamental e diversos estados excitados. Em geral, quando um núcleo emite

uma partícula ou , pode decair em um núcleo filho em um desses estados

excitados. O excesso de energia é liberado na forma de um fóton de raio gama

(). Como pode haver diversos níveis possíveis, o decaimento poderá ser feito

por variados caminhos.

Page 62: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Diversos esquemas de decaimento nuclear.

Enquanto que na emissão das partículas , e outros processos

radioativos, o núcleo se transforma no núcleo de outro elemento químico, no

caso da emissão gama, emissão de radiação eletromagnética, o núcleo

remanescente será do mesmo elemento químico. Os raios gama são diferentes

dos raios X apenas pelo fato de que provém do núcleo, mas maioria deles tem

energia mais alta e, por isso, são muito penetrantes. É o mais útil tipo de

radiações nucleares para fins médicos, mas ao mesmo tempo é o mais

perigoso devido à sua capacidade de penetração nas grandes espessuras de

material.

Raios X característicos

Raios X também são produzidos em decaimentos radioativos. Por

exemplo, a CE deixa um "buraco" na camada eletrônica K. O rearranjo dos

elétrons orbitais para preencher este "buraco" provoca a emissão de raios X

característicos.

Emissão de raios X característicos após a CE.

Page 63: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Conversão interna

Outro processo natural que produz a emissão de elétrons é a conversão

interna. Neste decaimento, energia de excitação do núcleo, que deveria ser

emitida como radiação gama, é transferida diretamente para um elétron orbital

que é ejetado do átomo com uma energia dada pela diferença entre a energia

de excitação EEx do núcleo e a energia de ligação do elétron na eletrosfera EB:

Ee = EEx – EB

O 137Cs, o 109Cd e o 207Bi são exemplos de fontes de elétrons de

conversão.

Novamente aqui serão emitidos Raios X característicos, pois esse

elétron ejetado essa deixa um "buraco" na camada eletrônica e haverá

rearranjo dos elétrons orbitais para preencher este "buraco".

Elétrons Auger

Embora esta energia liberada na trasição dos elétrons de níveis mais

energéticos para níveis menos energéticos ocorra às vezes na forma de um

fóton de raio X característico, essa energia pode também ser transferida

diretamente a um outro elétron orbital, que pode então ser ejetado do átomo,

sem haver emissão do fóton. Quando isso ocorre, os elétrons ejetados são

denominados de elétrons Auger.

ESPECTROS DE ENERGIA

Espectro de emissão alfa

A quantidade de energia total liberada nos processos de decaimento é

sempre correspondente diferença de massa entre o núcleo pai e os produtos

gerados, ou seja, a massa do núcleo inicial menos os produtos finais

(partículas emitidas e núcleo filho).

Devido às leis de conservação de energia e momento, no caso da

emissão alfa, podemos demonstrar que a energia total será dividida de modo

que cada produto (núcleo filho e He-4) irá receber uma quantia inversamente

proporcional a sua massa. (Lembre-se que K = p2/2m. Sendo assim, a partícula

alfa ficará com E= (A-4)/A.

Page 64: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 64

Esquema de decaimento alfa do Th-228: a esquerda, esquema de decaimento;

a direita, espectro de energia das partículas alfa discreto.

Espectro de emissão beta

No decaimento , como a massa do elétron é desprezível em relação

à massa do núcleo filho, toda a energia liberada poderá ser recebida pelo

elétron. Porém como já sabemos, há também a emissão de um anti-neutrino. O

elétron carregará uma fração da energia (Q) da reação que foi liberada; o

restante será carregado pelo antineutrino.

Em cada decaimento a fração de energia carregada pelo elétron poderá

ser diferente de outro decaimento de um nuclídeo exatamente igual. Assim, a

energia é dividida por ambos, podendo o elétron receber desde a energia total

liberada e o neutrino não receber nada ou o contrário, desde que a soma de

ambas as energias seja igual a energia total liberada (Q). O espectro de

energia do decaimento beta (do elétron emitido) será contínuo. A forma da

curva destas energias pode ser prevista a partir da teoria de Fermi do

decaimento beta.

Page 65: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 65

Espectro de emissão beta é contínuo.

No caso do decaimento , o processo será bem parecido com a

emissão do elétron. Mas nesse decaimento são emitidos pósitrons, e para criar

este último são necessários 1,022 MeV. Então, a energia máxima que um

pósitron poderá receber corresponde energia liberada (da diferença de massa)

menos 1,022 MeV, que é gasta para a produção do pósitron. O espectro de

energia do pósitron será também contínuo, pois ele também irá dividir a energia

disponível com o neutrino.

O espectro de energia dos pósitrons é contínuo.

A probabilidade do pósitron receber toda a energia liberada ou não

receber nada é bem pequena. O valor mais provável de energia recebida pelo

pósitron é cerca de 1/3 da energia máxima liberada. O mesmo ocorre com os

elétrons emitidos no decaimento beta negativo.

Page 66: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Valor mais provável de energia recebida pelo pósitron é cerca de 1/3 da

energia máxima liberada.

No caso da CE só há a emissão de um neutrino. Sendo assim, toda a

energia disponível irá para essa partícula, e seu espectro será discreto.

Page 67: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 67

Aula 7 Aplicações da radioatividade e seus efeitos biológicos

Meta

Apresentar alguns dos benefícios e riscos biológicos do uso das radiações

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Reconhecer a lei do decaimento radioativo

Compreender e diferenciar a meia-vida e a vida média de um

radionuclídeo.

Compreender as interações das diferentes radiações com a matéria

Reconhecer os efeitos biológicos das radiações.

Page 68: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Introdução

O homem sempre conviveu com as radiações. Na superfície terrestre pode ser

detectada energia proveniente de raios cósmicos e de radionuclídeos em rochas, plantas

e até em nós mesmos, além da radiação solar ultravioleta. Por exemplo, os raios

cósmicos são partículas carregadas e íons pesados de altíssima energia produzidos por

reações nucleares em toda galáxia e no Sol. Ao interagir com a atmosfera terrestre os

raios cósmicos produzem um “chuveiro” de partículas (múons, píons, káons, anti-

prótons, elétrons etc.) que atingem a superfície da Terra a uma taxa de

aproximadamente 500 partículas por metro quadrado por segundo. Não temos como

fugir disso. Mas podemos controlar outros tipos de fontes de radiação.

A radiação pode ajudar na detecção de uma doença, como em uma radiografia,

ou até curar, como é o caso da radioterapia. Mas ela também pode provocar

queimaduras, falha dos órgãos e até a morte. Então quais são os limites de exposição a

ela?

Para dar essas respostas precisamos conhecer um pouco mais das características

dos núcleos radioativos e das radiações emitidas, além das formas de interação com os

materiais. Depois de analisar o efeito de cada uma delas no corpo humano e na natureza

em geral, e finalmente poderemos estabelecer limites para a exposição. Isso é o que

vamos ver na aula de hoje.

Lei do decaimento radioativo e atividade

Em cada emissão de uma partícula alfa ou beta, há uma variação do número de

prótons no núcleo, isto é, o elemento se transforma em outro, de comportamento

químico diferente. Os núcleos instáveis de uma mesma espécie, não realizam todas as

mudanças ao mesmo tempo. As emissões de radiação são feitas de modo imprevisto,

não sendo possível adivinhar o momento em que um determinado núcleo irá emitir

radiação. Entretanto, para a grande quantidade de átomos existente em uma amostra é

razoável esperar-se certo número de emissões ou transformações em cada segundo. Essa

taxa de transformações é denominada atividade (A) da amostra.

Cada elemento radioativo se desintegra a uma velocidade que lhe é

característica. A probabilidade de que ocorra desintegração de cada núcleo de um dado

isótopo na unidade de tempo é dada pela constante de desintegração ().

Page 69: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 69

A lei do decaimento radioativo é uma função que descreve quantos núcleos

radioativos existem numa amostra a partir do conhecimento do número inicial de

núcleos radioativos e da taxa de decaimento. Ela é obtida a partir da hipótese de que o

número dN de núcleos que decaem num intervalo de tempo dt é proporcional ao número

de núcleos radioativos existentes e ao próprio intervalo dt:

dN = - N dt,

onde é a constante de decaimento do material. Integrando-se a expressão acima se

obtém a lei do decaimento radioativo:

N(t) = N0 e-t

onde N(t) é o número de átomos radioativos no instante t, N0 é o número de átomos

radioativos no instante t = 0 .

Experimentalmente se observa que a atividade de uma substância radioativa

diminui com o tempo. A atividade (A) de uma fonte é a taxa com que os núcleos

radioativos decaem, ou seja, a razão do número de desintegrações nucleares dN num

intervalo de tempo dt.

A = - dN(t)/dt

Quanto maior o número de nuclídeos radioativos da amostra, maior é o número de

núcleos que decaem em qualquer intervalo de tempo. Então, a atividade é diretamente

proporcional a N(t).

A = - dN(t)/dt = .N(t)

Substituindo a expressão para N obtém-se:

A = A0 e-t

,

onde A0 = N0 é a atividade da fonte no instante t = 0. Portanto, o comportamento da

atividade é descrito matematicamente por uma lei exponencial. Na prática, o que se

mede é o número de contagens por unidade de tempo, registrado por um instrumento

(um detector de radiação). Destas, é possível obter a atividade.

Até recentemente a unidade utilizada era o curie (Ci), definido originalmente

como a atividade de um grama de rádio e depois padronizada como 3,7 × 1010

desintegrações por segundo (exatamente).

Decaimento da atividade de amostra de I-131

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Em 1977 a Comissão Internacional de Proteção Radiológica (ICRP) definiu

como unidade padrão de atividade o becquerel (Bq), definido como uma desintegração

por segundo (1 Bq = 1 s-1

).

Meia vida (T1/2) e vida média (tm)

Qual o tempo que leva para que metade dos átomos radioativos presentes em

uma amostra se desintegrem? Esse tempo é denominado meia-vida (T1/2).

Todos os elementos radioativos têm uma meia-vida distinta e imutável. A meia-

vida é uma constante física que só depende do tipo de átomo que se desintegrará. Ela

não é alterada pela temperatura, pressão, presença de outros átomos etc. Cada elemento

radioativo tem uma meia-vida própria, que o distingue dos demais. A meia vida está

relacionada à constante de decaimento radioativo.

Lembrando que N(t) = N0 e-t

Se metade dos átomos radioativos presentes quando t = T1/2

Então

N0/2 = N0 e-

T1/2

½ = e

- T1/2

T1/2 = ln2 / = 0,693/

Já a vida média de um elemento radioativo é avaliada como sendo a soma das

idades de todos os átomos, dividida pelo número total de átomos. Ela está relacionada à

constante de decaimento através de:

tm = 1 /

Radioatividade versus raios X

O tipo mais penetrante de radiação são os raios gama. Os raios gama () são

ondas eletromagnéticas (não possuem massa) como a luz, apenas de frequência e

energia bem maior, emitidos após um núcleo ter emitido uma partícula ou .

Muitas pessoas se confundem, pensando que os raios X e a radioatividade são a

mesma coisa. Como se viu na aula anterior, a radioatividade é uma propriedade dos

núcleos radioativos. Já os raios X, diferentemente, são devido a transições eletrônicas e

podem ser gerados com a aceleração de elétrons dentro de uma ampola de vidro em

Page 71: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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vácuo (tubo de raios X). Quando o tubo é ligado, uma corrente elétrica em um filamento

faz com ele se aqueça e emita elétrons, que são atraídos e acelerados em direção a um

alvo, sendo desacelerados dentro dele. Parte da energia cinética (do movimento) dos

elétrons é transformada em raios X, que são também radiação eletromagnética como os

raios gama, mas em geral de energia menor. Assim, os raios X estão conectados com os

elétrons e, a radioatividade com o núcleo. Os efeitos provocados na matéria tanto pela

radiação gama (nuclear) quanto pela radiação X são comparáveis, levando-se em conta

a energia de cada uma.

Efeito da radiação sobre os materiais

As radiações podem ser classificadas em ionizantes ou não ionizantes. Quando a

radiação cósmica ou a radiação do ambiente ao redor do material ou que esteja dentro

do próprio material, o atinge, tanto as partículas, (como alfa e beta), quanto às radiações

eletromagnéticas (como gama e X) podem ceder energia aos elétrons da matéria, sendo

que alguns deles são liberados de seus átomos, tornando-os íons. Então, a ionização

acontece quando a energia da radiação incidente sobre um material é suficiente para

arrancar elétrons dos seus átomos. A radiação alfa, por exemplo, é muito ionizante,

porém pouco penetrante na matéria.

A radiação é dita não ionizante quando sua energia não é suficiente para arrancar

elétrons dos átomos. Mesmo quando a radiação é não ionizante ela pode promover

modificações atômicas. Neste caso pode ocorrer a excitação do átomo, em que elétrons

são levados a camadas mais externas do átomo, sem serem ejetados. Para a excitação de

um átomo, a energia fornecida pela radiação deve ser igual à diferença de energia entre

os níveis de origem e de destino do elétron. Este fato ocorre porque os elétrons se

encontram em níveis de energia bem definidos nas camadas eletrônicas dos átomos.

Radiação alfa

A principal interação das partículas alfa ocorre devido à interação coulombiana

com as camadas eletrônicas. Por ser aproximadamente 8000 vezes mais massiva do que

um elétron, ela é capaz de passar por eles sem sofrer muito deslocamento. Por isso, o

seu trajeto na matéria tende a ser linear.

No traçado do percurso da partícula alfa, podem aparecem ramificações

denominadas raios delta, que são elétrons ejetados com grande energia cinética, e que

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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antes de retornarem aos seus orbitais perdem essa energia produzindo em seu trajeto

novos pares de íons.

Como a distância percorrida por uma partícula alfa em um dado meio é pequena,

ela é de fácil blindagem. Ela percorre cerca de alguns cm no ar ou alguns μm em tecido

biológico (menos que as camadas de células mortas). Portanto, quando uma pessoa é

irradiada com esse tipo de partícula externamente, ela em geral não é prejudicial. Mas

devido ao seu alto poder de ionização, ela é muito perigosa internamente ao corpo.

Radiação beta

Como para as partículas alfa, a principal interação das partículas beta ocorre

devido à interação coulombiana com as camadas eletrônicas. Elétrons ou pósitrons são

emitidos pelo núcleo com velocidade próxima a da luz (~1/3 c). Ao se aproximarem dos

elétrons de um átomo, são desviados e perdem energia. Por ser muito pequena, a

partícula beta sofre muito a ação dos campos nucleares e dos próprios elétrons orbitais,

e assim, sua trajetória não é linear como a partícula alfa. Além disso, ao passar próximo

a um núcleo, tem sua direção alterada, sofrendo desaceleração e, consequentemente,

emite radiação de freamento, ou seja, raios X.

Seu alcance depende da sua energia cinética e do n° de elétrons com o qual

interage, que por sua vez é proporcional ao n° de elétrons por unidade de massa, i.e.,

depende da razão Z/A. Quanto maior for o número de elétrons encontrados, mais

rapidamente a partícula beta cederá sua energia. São, então, moderadamente

penetrantes. Por exemplo, penetram cerca de até alguns metros no ar ou alguns

milímetros em tecido. São bastante utilizados em radioterapia, podendo ser colocada

uma fonte emissora de radiação beta diretamente em um tumor para destruição desse

tecido.

Nêutrons

Como se trata de uma partícula neutra emitida pelo núcleo pode ser muito

penetrante. Pode sofrer colisões elásticas e inelásticas com outros núcleos ou ser

absorvida por um deles. No caso de sua absorção, pode provocar reações nucleares que

podem liberar partículas ou radiação gama, as quais geram bastante ionização do meio.

Para proteção radiológica contra nêutrons é necessária uma blindagem especial.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Radiação eletromagnética

Em geral as radiações ionizantes eletromagnéticas (raios X e gama) são muito

penetrantes (por ex. muitos metros no ar) e, por isso, de difícil blindagem, para a qual,

em geral, é utilizado o chumbo. Elas têm, porém, menor poder de ionização que as

partículas alfa ou beta.

Na escala atômica a radiação eletromagnética transfere para o meio sua energia

por quatro processos principais, a saber: efeito fotoelétrico, efeito compton, produção de

pares e fotodesintegração.

A radiação eletromagnética é a mais utilizada em indústria, hospitais etc. Pelas

suas propriedades é muito utilizada na formação de imagens médicas, por exemplo, ou

na radioterapia. Também é usada em radiografias industriais, como no caso de detecção

de fissuras em asas de aviões. Por seu grande poder de penetração, é a mais difícil de ser

blindada, e pode ocasionar graves acidentes radiológicos.

Efeito Fotoelétrico

A radiação incidente transfere sua energia total para um único elétron orbital

ejetando-o do átomo. O processo de troca de energia é dado pela equação:

Ec = h.f - Elig ,

Onde Ec é a energia cinética, (h.f) é a energia da radiação incidente e Elig é a

energia de ligação do elétron ao seu orbital.

O fotoelétron (elétron expelido do átomo) poderá perder a energia recebida

produzindo ionização em outros átomos.

Efeito Compton

Nesse caso, parte da energia da radiação incidente () é transferida para o

elétron, que sai com velocidade v. O restante da energia é cedida para o fóton espalhado

(´). O fóton espalhado terá uma energia menor e uma direção diferente da incidente. O

principal efeito que ocorre entre os raios X e as pessoas (ou materiais) em um

radiodiagnósticos é o efeito compton.

Produção de pares

Ocorre somente quando fótons de energia igual ou superior a 1,022 MeV passam

próximos aos núcleos atômicos. Nesse caso, a radiação desaparece, dando origem a um

par elétron-pósitron com energia cinética.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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O pósitron e o elétron perderão sua energia cinética pela ionização e excitação

dos átomos. Ao perder toda sua energia cinética, o pósitron interage com um elétron do

meio, havendo aniquilação de ambos e a criação de dois fótons com 511keV de energia

cada um, saindo na mesma direção mas com sentidos opostos.

A figura abaixo mostra a probabilidade de ocorrência de efeito fotoelétrico, efeito

compton e produção de pares, em função da energia da radiação eletromagnética

incidente e do número atômico Z do absorvedor. Para fótons de baixa energia o efeito

fotoelétrico é dominante. A produção de pares pode ocorrer apenas com fótons com

energia superior a 1,022 MeV (que corresponde ao dobro da energia da massa de

repouso do elétron).

Fotodesintegração

O fóton gama interage diretamente com o núcleo atômico e cria tamanha

instabilidade no núcleo que o faz emitir próton, nêutron ou partícula alfa.

Para produzir reações nucleares é necessário que o fóton gama tenha energia

superior a 6 MeV. Por exemplo, nos alimentos irradiados e na esterilização é utilizada

uma fonte de 60

Co, cujos fótons tem aproximadamente 1,25 MeV, ou seja, esse valor é

muito abaixo daquele necessário para produzir reações nucleares.

Absorção do feixe de radiação eletromagnética

Toda vez que um feixe de radiação eletromagnética incide numa lâmina delgada

ele sofre uma absorção, diminuindo-se exponencialmente sua intensidade em função da

espessura da lâmina. Essa diminuição ocorre devido aos processos de interação da

radiação com o meio, já citados anteriormente. Se a probabilidade de remover um fóton

do feixe for dada por µ, denominado coeficiente de absorção linear do material

Page 75: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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absorvedor, teremos a intensidade (I) do feixe após passar pelo absorvedor será dada

por:

I = I0exp(-X)

Sendo I0 a intensidade do feixe antes de passar pelo absorvedor, µ o coeficiente de

absorção linear do material absorvedor e X a espessura do absorvedor.

Dose de radiação

Como já foi explicado, as radiações ionizantes podem ser perigosas aos seres humanos,

pois têm um potencial de causar vários tipos de efeitos biológicos. Perguntas como estas

são constantes em práticas que usam radiação ionizante:

Há riscos associados ao uso de raios-X para fins médicos?

A radioterapia causa “efeitos colaterais” devido ao uso de radiação ionizante?

As usinas nucleares são perigosas?

Para garantir a segurança destas práticas, a Proteção Radiológica é fundamental.

Para isso, devemos ter parâmetros para calcular os efeitos das radiações. Vejamos

algumas grandezas associadas.

A Dose Absorvida ( ) é a medida da energia depositada pela radiação por

unidade de massa:

onde é a energia média depositada pela radiação ionizante na matéria de massa ,

num ponto de interesse.

O dano causado pela radiação depende da energia da radiação que é absorvida

pelo tecido. Por isso, a grandeza dose absorvida é muito importante em proteção

radiológica. Esta grandeza é aplicável a todos os tipos de radiações ionizantes. A

unidade atual desta grandeza é o gray (Gy):

1 Gy = 1 J/kg

Anteriormente, a dose absorvida era expressa em rad (radiation absorbed dose),

1 rad = 0,01 J/kg ou 10 mGy

Page 76: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Para fins de proteção radiológica, são definidas grandezas específicas, que

permitem definir valores limitantes para garantir a segurança no uso das radiações

ionizantes. Uma das principais grandezas limitantes é a dose equivalente.

A Dose Equivalente (HT) é uma medida do dano biológico específico da

radiação nos seres humanos. A Dose Equivalente é dada por:

HT = DT.R

onde DT é a dose absorvida média no órgão ou tecido e R é o fator de ponderação da

radiação. Ou seja, a dose equivalente pondera as doses absorvidas pelo tipo de radiação,

considerando que o grau de toxicidade dos diferentes tipos de radiação é variável.

A unidade atual desta grandeza é o sievert (Sv):

1 Sv = 1 J/kg

Anteriormente, a dose equivalente era expressa em rem

1 rem = 0,01 Sv ou 10 mSv.

O grau de toxicidade da radiação ionizante depende do tipo de radiação.

Quanto maior a taxa de transferência linear de energia (LET), mais eficiente a radiação

é para produzir danos biológicos, que é dada numericamente pela RBE (Efetividade

Biológica Relativa da Radiação). RBE é uma medida relativa de efetividade de

diferentes tipos de energias de radiação em induzir um determinado dano à saúde.

O fator de ponderação da radiação reflete a eficiência de cada tipo de radiação de

causar danos biológicos e está diretamente relacionado ao LET. Por exemplo, as

partículas pesadas carregadas, como as partículas alfas, são mais perigosas do que os

fótons, como os raios gama e a radiação X. e isso deve ser levado em conta para efeito

da dose equivalente.

Tabela 1. Fatores de ponderação da radiação.

Tipo de Radiação R

Fótons 1

Elétrons e Múons1 1

Nêutrons < 10 keV 5

de 10 a 100 keV 10

> 100 keV a 2 MeV 20

> 2 MeV a 20 MeV 10

> 20 MeV 5

Prótons, exceto os de recuo, energia > 2 MeV 5

Partículas , fragmentos de fissão, núcleos pesados 20

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Efeitos maléficos das radiações ionizantes

Os primeiros danos provocados pelas radiações ionizantes surgiram logo após a

descoberta da radiação X (1895) e da radioatividade (1896). Desde o início, a radiação

X foi utilizada para fins médicos, de diagnóstico e terapia, mas também foi utilizada

para fins não convencionais, como, por exemplo, a depilação.

A descoberta da radioatividade revolucionou o mundo científico, mas os malefícios

também ficaram evidentes. Os notáveis poderes curativos do rádio tornaram

primeiramente mais evidentes que a sua natureza destrutiva. Milhares de pessoas

compraram e usaram panacéias a base de rádio, que prometiam curar centenas de

doenças. Somente após muitas dessas pessoas adoecerem e morrerem devido à

exposição ao rádio, é que se compreendeu seu poder mortífero!

Os relatos de danos passaram a ser frequentes: eritemas, epilações, descamações,

infecções e dores fortes. Em muitos casos, já era tarde: os danos causados pelas

irradiações provocaram várias amputações de membros, induziram vários

aparecimentos de câncer e levaram alguns pesquisadores a óbito.

Desde então, a radiação ionizante figura como um dos mais estudados agentes

com potencial danoso aos seres humanos.

Embora ainda há muito a ser aprendido a este respeito, o que foi estudado até

agora é suficiente para que os profissionais de proteção radiológica possam manter as

práticas com o uso de radiação ionizante em níveis de risco menor ou igual às outras

práticas da saúde ou de tecnologia.

No Brasil, a norma regulatória de proteção radiológica é de autoria da Comissão

Nacional de Energia Nuclear (CNEN). As radiações ionizantes têm um potencial danoso

aos seres humanos indiscutível e, por isso, a proteção radiológica é essencial para o uso

Exemplo de efeito maléfico da radiação

Page 78: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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seguro deste tipo de radiação nos diversos fins pacíficos: medicina, indústria,

agricultura, segurança, pesquisa etc.

Contaminação

As exposições externas são caracterizadas por irradiações por fontes de

radiação posicionadas fora do corpo de pessoa irradiada. As radiações eletromagnéticas

ionizantes (radiação X e radiação gama) são as mais relevantes nas exposições externas,

devido ao seu alto poder de penetração. As partículas beta e, sobretudo, as partículas

alfa tem poder de penetração insuficiente para causar risco em exposições externas.

As exposições internas, por outro lado, são caracterizadas por irradiações por

fontes que se encontram no interior do corpo humano. Para que haja exposição interna,

é preciso que ocorra uma contaminação. A contaminação ocorre quando existe

presença de material radioativo em um local não indicado ou não esperado. Existem

várias rotas de entrada de material radioativo no corpo humano, sendo as três principais:

i. Inalação (Ar contaminado)

ii. Ingestão (bebida, comida, ou contato com a língua)

iii. Absorção (pele ou ferimento aberto).

O acidente radioativo com a capsula radioterápica de Cs-137 em Goiânia foi um

exemplo de um acidente com contaminação. O acidente com a usina Nuclear de

Chernobyl é outro exemplo famoso.

Os riscos associados a estes dois tipos diferentes de irradiação (interna e externa)

na são os mesmos. E devido às particularidades de cada uma dessas situações, os

métodos utilizados para controle dos riscos variam.

1. Partículas Alfa: devido ao seu baixo poder de penetração, este tipo de partícula não

atravessa a camada mais externa da pele. Por isso, considera-se que as partículas

alfa não apresentam risco associado a irradiações externas. O inverso ocorre em

irradiações internas. A partícula alfa se torna a mais perigosa de todas as radiações

por depositar toda sua energia no interior do corpo humano, tendo um grande poder

de ionização.

2. Partículas Beta: são mais penetrantes do que as partículas alfa e portanto podem

apresentar riscos de irradiação externa principalmente para dois órgãos e tecidos: a

pele e o cristalino dos olhos. Em ambos os casos, trata-se de um órgão superficial.

As partículas beta não apresentam risco aos demais órgãos quando as irradiações são

Page 79: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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externas, exceto em situações em que as partículas beta de alta energia interagem

com materiais de alto número atômico e geram radiação X de freiamento.

Internamente são moderadamente perigosas, já que irão provavelmente depositar

toda sua energia no corpo, porém apresentam um poder de ionização menor que a

partícula alfa.

3. Radiação Eletromagnética Ionizante (Raios X e Raios Gama): são radiações

capazes de atravessar o corpo humano e, portanto, apresentam risco a todos os

órgãos nas irradiações externas. Internamente são muito menos perigosas.

4. Nêutrons: também são capazes de atravessar o corpo humano, podendo depositar

energia por processos de interação com os tecidos (espalhamento). Podem ser

extremamente perigosos.

Efeitos da radiação

Os fenômenos associados à interação da radiação com a matéria são

absolutamente gerais no que diz respeito aos elementos químicos que formam o

material irradiado, seja biológico ou não. Destas interações surgem os efeitos biológicos

das radiações, que são as consequências posteriores à exposição.

Na primeira fase da interação da radiação ionizante com o tecido, ocorre a

transferência de energia. No processo de deposição da energia, a radiação incidente

provoca dois tipos de efeitos físicos: ionizações e excitações. Este fenômeno se

processa num intervalo de tempo muito curto, da ordem de 10-13

a 10-12

segundos.

Após os efeitos físicos, inicia-se uma fase de efeitos químicos, onde ocorrem

rupturas de ligações químicas nas moléculas, liberando radicais livres e produtos

moleculares. Esta fase se processa num intervalo de tempo de 10-10

a 10-9

segundos. É

nesta etapa que ocorre a radiólise da água, que é um fenômeno muito importante no

aparecimento de efeitos biológicos.

Após os efeitos químicos, podem surgir efeitos biológicos. As alterações

químicas podem provocar morte celular, impedimento ou retardo da divisão celular ou

modificações permanentes. O intervalo de tempo que esta etapa perdura é muito

variável: pode durar alguns minutos ou vários anos.

O aparecimento de efeitos biológicos não implica no aparecimento de doenças.

O organismo pode se recuperar dos efeitos biológicos, sem que haja um desequilíbrio

no organismo ou no funcionamento de um órgão. Entretanto, quando a quantidade e/ou

Page 80: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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a frequência dos efeitos biológicos é alta, o organismo não consegue reparar os danos e

surgem os efeitos orgânicos (ou doença). Esta etapa pode durar de horas a vários anos.

Os efeitos das radiações sobre os seres vivos são muitos e complexos. As

pesquisas sobre estes efeitos visam, em geral, correlacionar fatores tais como dose

recebida, energia, tipo de radiação, tipo de tecido, órgãos atingidos etc. Diferentes

tecidos reagem de diferentes formas às radiações. Alguns tecidos são mais sensíveis que

outros, como os do sistema linfático e hematopoiético (medula óssea) e do epitélio

intestinal, que são fortemente afetados quando irradiados, enquanto outros, como os

musculares e neuronais, possuem baixa sensibilidade às radiações.

Radiações ionizantes, no contexto biológico, são aquelas capazes de ejetar os

elétrons orbitais dos átomos de C, H, O e N. A quantidade de energia depositada por

uma radiação ionizante ao atravessar um material depende da natureza química do

material e de sua massa específica. É importante ressaltar que a absorção de radiações

ionizantes pela matéria é um fenômeno atômico e não molecular.

Em uma interação, a radiação cede a uma molécula certa quantidade de energia,

esta energia pode ser suficiente para arrancar um elétron orbital e conferir-lhe energia

cinética, provocando assim a ionização. Em outros casos a radiação não tem energia

suficiente para provocar ionização, mas consegue promover o elétron a um nível

energético superior, acarretando a excitação ou ativação. Existem também situações em

que a energia é muito baixa e apenas aumenta a velocidade de rotação, translação ou de

vibração da molécula.

A Tabela 2 mostra os primeiros potenciais de ionização para alguns elementos,

isto é, a energia necessária para que a radiação incidente possa arrancar o elétron de

valência, causando a ionização.

Tabela 2. Primeiros potenciais de ionização para alguns elementos

(em elétron-volts)

K 4,34 P 10,98

Na 5,14 C 11,27

Ca 6,11 Cl 12,96

Mg 7,65 H 13,60

Fe 7,80 O 13,62

S 10,36 N 14,55

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 81

Qual exposição à radiação sofremos diariamente?

Radônio

50,0%

Gama

13,0%

Cósmica

12,0%

Ingestão

9,5%

Médica

15,0%

Outras

0,5%

Fontes de Exposição à Radiação da

População Mundial

Dose Efetiva Anual média: 2,8mSv (Artificial: 15,5% Natural: 84,5%)

(UNSCEAR, 2000 - adaptado de HPA, 2005)

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Apêndice

Um pouco sobre radiações não ionizantes

Radiações não ionizantes

Contexto biológico

Radiações não ionizantes são aquelas que não possuem energia suficiente para

arrancar elétrons dos átomos, porém podem quebrar moléculas e ligações químicas

através da excitação atômica.

No contexto biológico a radiação não-ionizante é aquela com energia

insuficiente para arrancar elétrons de dos componentes básicos de nosso corpo: C (11,27

eV ), H(13,60 eV), O (13,62 eV) e N (14,55 eV). Assim, as radiações eletromagnéticas

com energia menor que 12,4 eV (elétron-volt) são consideradas radiações não

ionizantes. Estão incluídas aí as radiações ultravioleta, infravermelha, radiofrequência,

laser, micro-uondas, luz visível.

Radiação Ultravioleta

A radiação ultravioleta (R-UV) é a parte do espectro eletromagnético referente aos

comprimentos de onda entre 100 e 400nm. De acordo com a intensidade que a R-UV é

absorvida pelo oxigênio e ozônio e, também pelos efeitos fotobiológicos costuma-se

dividir a região UV em três intervalos UVA, UVB e UVC.

Pode-se dizer que o Sol emite energia em, praticamente, todos os comprimentos

de onda do espectro eletromagnético permeados pelas diversas linhas de absorção. 44%

de toda essa energia emitida se concentram entre 400 e 700 nm, denominado espectro

visível de energia. O restante é dividido entre radiação ultravioleta (< 400 nm) com 7%,

infravermelho próximo (entre 700 e 1500 nm) com 37% e infravermelho (> 1500 nm)

com 11%. Menos de 1% da radiação emitida concentra-se acima da região do

infravermelho, como microondas e ondas de rádio, e abaixo da região ultravioleta, como

raios X e raios gama.

Page 83: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Tipo

Intervalo

espectral

(nm)

Características

UVC 100 - 280 Completamente absorvida pelo O2 e O3 estratosférico e, portanto,

não atinge a superfície terrestre. É utilizada na esterilização de água

e materiais cirúrgicos.

UVB 280 - 320 Fortemente absorvida pelo O3 estratosférico. É prejudicial à saúde

humana, podendo causar queimaduras e, a longo prazo, câncer de

pele.

UVA 320 - 400 Sofre pouca absorção pelo O3 estratosférico. É importante para

sintetizar a vitamina D no organismo. Porém o excesso de

exposição pode causar queimaduras e, a longo prazo, causa o

envelhecimento precoce.

Índice Ultravioleta (IUV)

O Índice Ultravioleta (IUV) é uma medida da intensidade da radiação UV,

relevante aos efeitos sobre a pele humana, incidente sobre a superfície da Terra.

O IUV representa o valor máximo diário da radiação ultravioleta. Isto é, no

período referente ao meio-dia solar, o horário de máxima intensidade de radiação solar.

Como a cobertura de nuvens é algo muito dinâmico e variável, o IUV é sempre

apresentado para uma condição de céu claro. Isto é, para ausência de nuvens que, na

maioria dos casos, representa a máxima intensidade de radiação.

O IUV é apresentado como um número inteiro. De acordo com recomendações da

Organização Mundial da Saúde, esses valores são agrupados em categorias de

intensidades, conforme mostra a tabela abaixo:

CATEGORIA IUV

BAIXO < 2

MODERADO 3 a 5

ALTO 6 a 7

MUITO ALTO 8 a 10

EXTREMO > 11

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Como o IUV é calculado

Alguns elementos são imprescindíveis para o cálculo do IUV:

Concentração de Ozônio: O ozônio é o principal responsável pela absorção de

radiação UV. A concentração de ozônio, medida em unidades Dobson (DU),

integrada na coluna atmosférica é utilizada como parâmetro de entrada no modelo

computacional utilizado para o cálculo do IUV. Essa concentração de ozônio é

distribuída verticalmente de acordo com perfis atmosféricos teóricos relativos a

posição geográfica da localidade. A concentração máxima de ozônio localiza-se na

estratosfera (entre 20 e 40km de altitude).

Posição geográfica da localidade: O fluxo de radiação UV diminui com o

aumento da distância ao Equador. Ou seja, regiões mais próximas à linha do

Equador recebem maior quantidade de energia solar.

Altitude da superfície: Quanto mais alta é a localidade, menor é o conteúdo de

ozônio integrado na coluna atmosférica e, consequentemente, maior a quantidade

de energia ultravioleta incidente na superfície. De acordo com perfis teóricos de

distribuição vertical, a quantidade de ozônio decresce em torno de 1% para cada

quilômetro; o que provoca aumento de cerca de 6 a 8% a quantidade de energia UV

incidente.

Hora do dia: Cerca de 20 a 30% da quantidade de energia UV no verão chega a

Terra em torno do meio-dia (entre 11h e 13h), e cerca de 70 a 80% entre as 9h e

15h.

Estação do ano: A irradiância (quantidade de energia por área) UVB diária em

torno de 20° de latitude aumenta cerca de 25% no verão e diminui de 30% no

inverno, em relação aos períodos de primavera/outono. Em zonas de maior latitude

(cerca de 40°), esses valores correspondem a + 70% e -70%, respectivamente.

Condições atmosféricas: A presença de nuvens e aerossóis (partículas em

suspensão na atmosfera) atenua a quantidade de radiação UV em superfície. Porém,

parte dessa radiação não é absorvida ou refletida por esses elementos e atinge a

superfície terrestre. Deste modo, dias nublados também podem oferecer perigo,

principalmente para as pessoas de pele sensível.

Tipo de superfície: A areia pode refletir até 30% da radiação ultravioleta que

incide numa superfície, enquanto na neve fresca essa reflexão pode chegar a mais

de 80%. Superfícies urbanas apresentam reflexão média entre 3 a 5%. Este

fenômeno aumenta a quantidade de energia UV disponível em um alvo localizado

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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sobre este tipo de solo, aumentando os riscos em regiões turísticas como praias e

pistas de esqui.

Efeitos biológicos das radiações não ionizantes

Radiações que não são capazes de ejetar os elétrons da camada eletrônica para os

elementos considerados (C, H, O, N) são ditas não ionizantes (no contexto biológico).

Os efeitos dessas radiações nos organismos não são menos perigosos pelo fato de não

provocarem ionizações, pois elas não atuam só em nível atômico, como acontece com

radiações ionizantes, mas também em nível molecular, como acontece com a radiação

ultravioleta (UV) quando interage com a molécula de DNA (ácido desoxirribonucléico).

Os cuidados com as radiações solares são de suma importância na prevenção de doenças

como o câncer de pele (não melanoma). Deve-se evitar os raios solares entre 10h00 e

16h00 ou, caso inevitável, utilizar protetor solar com fator de proteção elevada e agir

com cuidado ao manusear frutas como o limão e figo (que contém furocumarinas) sob o

Sol pois podem ocorrer queimaduras gravíssimas e até fatais.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Aula 8 Reações nucleares e fissão nuclear

Meta

Introduzir os conceitos sobre as reações nucleares e a liberação de energia numa fissão

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Reconhecer uma reação nuclear

Compreender como é provocar uma reação nuclear

Calcular a energia liberada ou necessária para uma reação nuclear

Compreender como funciona um reator nuclear.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Introdução

Nas aulas anteriores vimos os processos de decaimento dos nuclídeos instáveis

que emitem partículas alfa e beta, que podem ser seguida de emissão de radiação gama.

Esses processos são naturais, não fizemos nada pra iniciá-los e não podemos fazer nada

para controlá-los. Agora, ao invés de processos espontâneos, veremos alguns processos

que podem ser induzidos nos núcleos em nossos equipamentos, apesar de muitos deles

também poderem ocorrer na natureza.

Reações Nucleares

É possível modificar as propriedades dos núcleos bombardeando-os com

partículas energéticas. Essas transformações são chamadas de reações nucleares. Muitos

tipos de reações nucleares ocorrem em resposta à absorção de partículas, tais como

nêutrons e prótons. Outros tipos de reações podem envolver a absorção ou

espalhamento de raios gama.

Se um núcleo alvo X é bombardeado por uma partícula a e resulta em um núcleo

Y com a emissão de uma partícula b, isso pode ser escrito como:

a + X Y + b ou X(a,b)Y

Se num evento as partículas a e b são idênticas, X e Y também serão, e o evento

é denominado espalhamento.

Pode-se caracterizar a energética da reação nuclear com a energia de reação Q,

que corresponde à energia liberada na reação. Essa energia da reação é dada por:

Q = (Ma + MX – MY – Mb)c2

Para levar em conta a contribuição dos elétrons, devemos usar as massas (M) dos

átomos neutros.

Q > 0 se a massa total dos produtos é menor que a massa do projétil junto com a

do alvo, indicando que a energia total de ligação aumentou após a reação. Essa é

uma reação exotérmica ou exoenergética.

Q < 0 se a massa total dos produtos é maior que a massa do projétil junto com a

do alvo, ocorreu uma reação endotérmica ou endoenergética. Nesse caso, a

reação só pode ocorrer se for fornecida ao menos uma energia igual a -Q ao

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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sistema, denominada energia limite, que desencadeia a reação. Em geral essa

energia é fornecida dando energia cinética ao projétil (a) que atinge o alvo (X).

No caso dos espalhamentos:

se Q = 0, a energia cinética é conservada, e a reação é chamada de espalhamento

elástico

Se Q 0, a energia cinética não é conservada e a reação é chamada

espalhamento inelástico. Isso pode ocorrer, quando o núcleo atingido pela

partícula vai para um dos seus estados excitados, absorvendo parte da energia

cinética da partícula incidente.

Exemplos de reações nucleares

Para caracterizar a probabilidade de que uma determinada reação nuclear ocorrerá, é

habitual definir um tamanho efetivo do núcleo para a reação, chamado de seção

transversal ou seção de choque. Assim, a probabilidade de um dado tipo de reação

nuclear ocorrer é chamada de seção de choque (). é dada por:

A secção de choque tem unidades de área e é da ordem do quadrado do raio nuclear.

Uma unidade comum utilizada é o barn:

Devem ser conservados a energia, o momento, a carga total e o número de núcleons

numa reação nuclear.

Por exemplo, se um átomo de Li-7 é bombardeado por um próton, duas partículas

alfa são produzidas. A reação pode ser escrita como:

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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1H +

7Li

4He +

4He ou

7Li

(1H,

4He)

4He

O número total de núcleons antes é (1+7)=8 e depois da reação também (4+4)=8. A

carga total é [(Z=1)+ (Z=3)]=4 antes e [(Z=2)+ (Z=2)]=4.

Considerado as partículas em repouso:

Q = (Ma + MX – MY – Mb).c2

M = (1,007825 + 7,016004 – 4,002603 – 4,002603) = 0,018623 u

Então, Q = (0,018623 u) (931,5 MeV/u) = 17,35 MeV

Q>0, portanto a reação é exoenergética. Para conservação da energia, as duas partículas

alfa deverão ter energia cinética e o movimento deverá ser tal que conserve o momento.

Rutherford bombardeou N-14 com partículas alfa e obteve um núcleo de O-17 e um

próton. A reação pode ser escrita como:

4He +

14N

17O +

1H ou

14N(

4He,

1H)

17O

Rutherford usou partículas alfa de fontes radioativas naturais. Qual a energia cinética

mínima que essa partícula alfa deve ter para desencadear essa reação?

M = (4,002603 + 14,003074 – 16,999132 – 1,007825) = -0,001280 u

Então Q = (- 0,001280 u ) (931,5 MeV/u) = -1,192 MeV

É uma reação endoenergética. Além das massas envolvidas, há a necessidade de mais

1,192 MeV de energia, que no experimento de Rutherford era provido pela energia

cinética das partículas alfa, pois o alvo estava e repouso.

Deve-se lembrar que deve haver a conservação da energia e do momento. Então,

quando a partícula alfa atinge o alvo em repouso, para haver conservação do momento,

parte da energia deve ser mantida em energia cinética das partículas, que não podem

ficar todas em repouso, para haver conservação do momento. A energia necessária é

ainda maior do que 1,192 MeV por esse motivo.

Mas também é possível fazer colidir dois núcleos ou partículas ambos em

movimento. Se um se move contra o outro, é possível conseguir uma proporção cujo

momento seja zero, e assim, toda a energia cinética pode ser transformada em massa,

não havendo necessidade das partículas criadas terem energia cinética para conservação

do momento. Esse é o método mais fácil de criar partículas mais pesadas, cuja energia

necessária seria muito maior, caso o alvo estivesse em repouso.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Quando uma partícula com massa m e energia cinética K colide com uma

partícula em repouso com massa M, a energia cinética total (no sistema de referência do

centro de massa) disponível para produzir a reação é

Kcm= K . M/ (M+m)

(OBS: As energias cinéticas das partículas envolvidas são muito menores do que suas

energias de repouso).

No experimento de Rutherford, a energia cinética mínima será

1,192= K . 14,003074/ (14,003074+4,002603)

K =1,532 MeV

Bem, vejamos o que pode ocorrer no bombardeamento de partículas no núcleo:

Atração gravitacional – fraca

Atração pela força forte – somente em distâncias muito curtas

Força eletrostática – prótons (repulsão)

Para partículas carregadas como prótons ou alfa penetrarem no núcleo, elas devem ter

energia cinética suficiente para vencer a barreira coulombiana de repulsão.

Considerando o caso do próton bombardeando o Li-7. Vamos considerá-los

como cargas esfericamente simétricas. A distância entre seus centros quando se tocam é

de aproximadamente 3,5 × 10-15m.

Calculando a energia potencial repulsiva:

U = (1/40) (e . 3e)/r = (9,0 × 109 N.m

2/C

2) .3 . (1,6 × 10

-19C)

2/3,5 × 10

-15 m

U = 2,0 × 10-13

J = 1,2 MeV

Portanto, mesmo sendo uma reação exoenergética, o próton deve ter energia

cinética mínima para atravessar a barreira de potencial coulombiano.

Já nêutrons não têm carga. Assim, a absorção de nêutrons é facilitada por não

haver esse potencial repulsivo.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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A absorção de nêutrons pelos núcleos constitui uma classe importante entre as reações

nucleares.

Ao se bombardear núcleos pesados com nêutrons pode haver diversas absorções (até

~25) alternadas com decaimentos beta, criando os elementos transurânicos, não

encontrados na natureza.

A técnica de ativação por nêutrons utiliza essa ferramenta analisando as emissões beta e

gama provenientes dos núcleos ativados. As emissões dependem do nuclídeo instável e

são usadas para sua identificação.

Fissão Nuclear

Fissão é uma reação nuclear é um processo de decaimento no qual o núcleo

instável se divide e que pode acontecer de forma espontânea ou provocada. Nessa

reação, um núcleo atômico, geralmente pesado, como o do urânio, por exemplo, divide-

se em duas partes de massas comparáveis (fragmentos de fissão), liberando grande

quantidade de energia.

Se um núcleo massivo como urânio-235 se rompe (fissiona), então não haverá

um rendimento líquido de energia porque a soma das massas dos fragmentos será menor

do que a massa do núcleo de urânio. Se a massa dos fragmentos é igual ou maior do que

a do ferro no pico da curva de energia de ligação, então as partículas nucleares serão

mais ligadas do que eram no núcleo de urânio, e a diminuição da massa sai na forma de

energia de acordo com a equação de Einstein (E=mc2). Ou seja, há conversão de massa

em energia nesse processo. A matéria só se converte em energia quando há um processo

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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em que os constituintes iniciais de um núcleo atômico se rompem e a soma das massas

dos produtos é menor do que a massa de origem.

A fissão nuclear espontânea ocorre quando as oscilações naturais de núcleos

pesados fazem com que se quebrem em dois núcleos de massas semelhantes.

E a fissão nuclear induzida ocorre pelo bombardeamento de núcleos pesados, em geral

com nêutrons. A fissão de U-235 em reatores é desencadeada pela absorção de um

nêutron de baixa energia, muitas vezes chamado de "de nêutron lento" ou "de nêutron

térmico".

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Um nêutron lento pode ser capturado por um núcleo de urânio-235, tornando-o

instável para a fissão nuclear. Um nêutron rápido não será capturado, então os nêutrons

devem ser “moderados” para aumentar a sua probabilidade de captura em reatores de

fissão. Um único evento de fissão pode render mais de 200 milhões de vezes a energia

do nêutron que o desencadeou!

Se pelo menos um dos nêutrons liberados na fissão atinge um outro U-235, a

fissão novamente ocorre. A reação em cadeia é sustentada. Se a reação se auto-

sustentar, diz-se ser "crítica", e a massa de U-235 necessária para produzir a condição

crítica é chamada "massa crítica". A reação em cadeia crítica pode ser alcançada em

baixas concentrações de U-235 se os nêutrons de fissão são moderados para diminuir

sua velocidade, uma vez que a probabilidade de fissão com nêutrons lentos é maior.

Uma reação em cadeia de fissão produz fragmentos de massa intermediária, que

são altamente radioativos e produzem mais energia pelo seu decaimento radioativo.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Alguns deles produzem nêutrons, chamadas nêutrons atrasados, que contribuem para a

reação de fissão em cadeia.

Enquanto o urânio-235 é o isótopo de ocorrência natural físsil, existem outros

isótopos que podem ser induzidos à fissão por bombardeamento de nêutrons. O

plutônio-239 é fissionável pelo bombardeamento com nêutrons lentos, e tanto ele como

o urânio-235 têm sido utilizados para a fabricação de bombas de fissão nuclear. O

plutônio-239 pode ser produzido a partir do urânio-238. O urânio-238, que compõe

99,3% do urânio natural, não é fissionável por nêutrons lentos. U-238 tem uma pequena

probabilidade de fissão espontânea, e também uma pequena probabilidade de fissão

quando bombardeado com nêutrons rápidos, mas não é útil como uma fonte de

combustível nuclear. O tório-232 é físsil, de modo poderia concebivelmente ser

utilizado como um combustível nuclear.

A fissão foi descoberta em 1938, por Otto Hahn e Lise Meitner, com o

bombardeamento de nêutrons em urânio. A radiação liberada não coincidia com

nenhuma outra proveniente de nuclídeos conhecidos e através da analise química dos

fragmentos de fissão, se concluiu que ocorria a fissão nuclear do urânio em dois

fragmentos menores.

A fissão em geral é assimétrica.

Os fragmentos não serão, na

maioria das vezes, exatamente

iguais.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Como os núcleos pesados se dividem em núcleos menores, que necessitam de menor

quantidade de nêutrons, em geral, 2 a 3 nêutrons livres também são libertados e,

ocasionalmente, um nuclídeo leve como 3H pode ser liberado.

Combustível de urânio

O urânio natural é composto por 0,72% de U-235 (o isótopo físsil), 99,27% de

U-238, e uma quantidade traço 0,0055% de U-234. 0,72% de U-235 não é suficiente

para produzir uma reação em cadeia auto-sustentada. Para reatores de água leve, por

exemplo, o combustível deve ser enriquecido a 2,5-3,5% de U-235. A proporção deve

ser muito maior para haver uma explosão, como em uma bomba nuclear. Essa

proporção é maior do que 90% de U-235.

A reação controlada é usada nas usinas nucleares para a produção de energia

elétrica. A reação em cadeia descontrolada é utilizada nas bombas nucleares.

O urânio é encontrado

como óxido de urânio que,

quando purificado tem

uma cor amarela forte e é

chamado de "yellow

cake".

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Após a redução, o urânio deve passar por um processo de enriquecimento

isotópico. Mesmo com a necessidade de enriquecimento, ainda leva apenas cerca de

3 kg de urânio natural para abastecer as necessidades energéticas de um americano por

um ano. A quantidade necessária de outros tipos de combustível é muito maior.

História da fissão do U-235

Na década de 1930, os físicos/químicos alemães Otto Hahn e Fritz Strassman

tentaram criar elementos transurânicos bombardeando urânio com nêutrons. Ao

contrário do esperado, eles obtiveram vários produtos não identificados. Quando eles

finalmente identificaram um dos produtos como bário-141, eles estavam relutantes a

publicar o achado, porque foi tão inesperado. Quando finalmente publicaram os

resultados em 1939, isso chamou a atenção de Lise Meitner, uma física austríaca que

havia trabalhado com Hahn em seus experimentos nucleares.

Após a invasão de Hitler na Áustria, ela foi forçada a fugir para a Suécia, onde

ela e Otto Frisch, seu sobrinho, continuaram a trabalhar no problema de

bombardeamento de nêutrons. Ela foi a primeira a perceber que o bário de Hahn e

outros produtos mais leves dos experimentos de bombardeamento de nêutrons foram

provenientes da fissão do U-235. Frisch e Meitner realizaram novos experimentos que

mostraram que a fissão do U-235 produziu uma quantidade enorme de energia, e que a

fissão rendeu pelo menos dois nêutrons por nêutron absorvido na interação. Eles

Equivalência energética

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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perceberam que isso tornou possível uma reação em cadeia com uma produção

energética sem precedentes.

Como funciona a geração de energia elétrica?

Numa hidrelétrica a água em queda gira as turbinas, ligadas por um eixo até o gerador.

Lá ocorre a indução eletromagnética, que cria corrente elétrica.

Uma termoelétrica utiliza a energia térmica para gerar vapor d’água que gira as pás da

turbina.

Como funciona uma usina nuclear?2

A usina nuclear, nada mais é do que uma termoelétrica, mas que usa a fissão do U-235

como combustível para gerar calor e esquentar a água.

2

http://www.eletronuclear.gov.br/Saibamais/Espa%C3%A7odoConhecimento/Pesquisaescolar/EnergiaNuc

lear.aspx

Page 98: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Página 98

A fissão dos átomos de urânio dentro das varetas do elemento combustível

aquece a água que passa pelo reator a uma temperatura de 320 graus Celsius. Para que

não entre em ebulição – o que ocorreria normalmente aos 100 graus Celsius -, esta água

é mantida sob uma pressão 157 vezes maior que a pressão atmosférica.

O gerador de vapor realiza uma troca de calor entre as águas deste primeiro

circuito e a do circuito secundário, que são independentes entre si. Com essa troca de

calor, a água do circuito secundário se transforma em vapor e movimenta a turbina - a

uma velocidade de 1.800 rpm - que, por sua vez, aciona o gerador elétrico.

Esse vapor, depois de mover a turbina, passa por um condensador, onde é

refrigerado pela água do mar, trazida por um terceiro circuito independente. A

existência desses três circuitos impede o contato da água que passa pelo reator com as

demais.

Uma usina nuclear oferece elevado grau de proteção, pois funciona com

sistemas de segurança redundantes e independentes (quando somente um é necessário).

Page 99: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Defesa em Profundidade

É um conceito de projeto que envolve a criação de sucessivas barreiras físicas

que mantêm a radiação sob total controle.

1 – As pastilhas de dióxido de urânio possuem uma estrutura molecular que retém a

maior parte dos produtos gerados na fissão.

2 – As varetas que contêm as pastilhas são seladas e fabricadas com uma liga metálica

especial.

3 – O vaso do reator funciona como uma barreira estanque.

4 – A blindagem radiológica permite que os trabalhadores possam acessar áreas

próximas ao reator.

5 – O envoltório de aço especial, com 3 centímetros de espessura, é projetado para

resistir ao mais sério acidente.

6 – O envoltório de concreto, com 70 centímetros de espessura, conterá qualquer

material caso as demais barreiras falhem.

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Aula 9 Fusão nuclear

Meta

Introduzir os conceitos sobre as forma de fusão nuclear com a liberação de energia

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

Compreender como é provocar uma fusão nuclear

Entender como funciona um reator nuclear baseado na fusão.

Reconhecer de como são gerados os resíduos da fusão nuclear.

Reconhecer vantagens e desvantagens da produção energética por

fusão nuclear.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Introdução

Na aula anterior vimos as reações nucleares e como podemos extrair

energia da fissão nuclear, produzindo energia elétrica nos reatores de potência.

Hoje veremos como funciona a fusão, e como a ciência está trabalhando para

tentar extrair energia da fusão nuclear.

Energia liberada por reações nucleares

Na fissão nuclear núcleos pesados (urânio, plutônio) liberam energia quando

eles se separaram. Os núcleos produto pesam menos do que o núcleo original.

E a energia liberada provém dessa diferença de massa.

Na fusão nuclear, núcleos leves (como hidrogênio, hélio) liberam energia

quando fundem. Os núcleos produto pesam menos do que os núcleos pai,

liberando energia.

A fusão usa principalmente o deutério, que é obtido da água (0,02% de todo o

hidrogénio é hidrogénio pesado ou deutério), e o trítio, que é obtido de lítio (um

metal leve comum na crosta da Terra).

Este ciclo de fusão (que tem a mais rápida taxa de reação) é de interesse para

a produção de energia

Deutério + Lítio → Hélio + Energia

O mundo, particularmente os países em desenvolvimento, precisa de uma nova

fonte de energia.

O crescimento da população mundial e o crescimento na demanda de energia

a partir da industrialização vão levar a um gap de energia que será cada vez

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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mais difícil de preencher com os combustíveis fósseis. Sem melhorias na

eficiência vamos precisar de energia de 80% a mais em 2020.

Mesmo com melhorias de eficiência no limite da tecnologia, ainda assim

precisaremos de 40% a mais de energia.

Incentivos para o Desenvolvimento de Fusão

Poderes de fusão do Sol e as estrelas estão agora ao alcance para uso na

Terra. No processo de fusão elementos mais leves são "fundidos", fazendo

elementos mais pesados e produzindo quantidades prodigiosas de energia

A fusão oferece características muito atraentes:

A energia de fusão pode ser usada para produzir eletricidade e

hidrogênio, e para a dessalinização

É uma fonte de energia sustentável (para o ciclo DT)

Não há nenhuma emissão de efeito estufa ou outros gases poluentes

Não há risco de um acidente grave

Não há produção de resíduos radioativos de longa vida.

Os volumes dos resíduos radioativos num reator de fusão são maiores do que

na fissão, mas menores do que para usinas térmicas a carvão de mesmo porte

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Desvantagens geração de Energia por Fusão

Reação de fusão é difícil começar! Altas temperaturas (milhões de graus) em

um ambiente puro de alto vácuo são necessários. São necessários reatores

tecnicamente complexos e de alto de custo. Mais investigação e

desenvolvimento são necessários para trazer um conceito rentável. A física

está bem avançado, mas requer um desenvolvimento sustentado em uma

escala de tempo longo (20 a 40 anos).

Reatores de Fusão Nuclear

Reatores de fusão nuclear, se eles puderem ser feitos, prometem potência

praticamente ilimitada para o futuro indefinido. Isto é porque o combustível, os

isótopos de hidrogénio, são essencialmente ilimitados na Terra. Os esforços

para controlar o processo de fusão e utilizá-lo para produzir energia estão em

andamento.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Fig. 1. Um diagrama mostrando uma reação de fusão típica.

A fusão nuclear é a fonte de energia do sol e das estrelas onde as altas

temperaturas e as densidades permitem aos núcleos carregados positivamente

se aproximar o suficiente um do outro para que a força (atrativa) nuclear vença

a força (repulsiva) elétrica e permitir que a fusão ocorra. A Fig. 1 mostra uma

reação de fusão. A reação de fusão mais promissora

3H + 2H → 4He + n + 17,6 MeV

envolve o nuclido de trítio radioativo (3H), disponível a partir da reação de

produção nuclear

6Li + n → 3H +4He

Plasma

Um plasma é um gás

ionizado. Uma mistura de

íons positivos e elétrons

negativos com a

neutralidade de carga

geral. Plasmas constituem

o quarto estado da matéria,

e são obtidos a

temperaturas de mais de

100.000 graus.

Plasmas conduzem

eletricidade e calor.

Page 105: Apostila Parte 1 Fisica Nuclear

CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Os núcleos 4He (partículas α) carregam cerca de 20% da energia e

permanecem no plasma. Os outros 80% são levados por neutrons e podem ser

usados para gerar vapor.

O plasma torna-se auto-sustentável ou inflamável quando há uma potência α

suficiente para equilibrar as perdas do plasma.

Nas estrelas, as partículas do plasma (incluindo α) são essencialmente

limitadas pela força da gravidade e as densidades elevadas no plasma são

alcançadas

Na Terra, plasmas quentes e densos podem ser confinados em campos

magnéticos (fusão por confinamento magnético) e plasmas superdensos

podem ser obtidos implodindo bolinhas sólidas de deutério e trítio (fusão por

confinamento inercial).

Para produzir energia a partir da reação D+T, tanto o reator de confinamento

magnético com plasma de alta temperatura (um gás que tenha sido

completamente ionizado) quanto o reator de confinamento inercial (que utiliza

tecnologias de implosão de laser) foram investigados.

Confinamento inercial

A implosão do laser de pequenas pelotas (diâmetro 3 mm) sólidas de deutério

e trítio produz as condições de fusão.

O combustível é comprimido por um foguete do tipo sopro. A pressão obtida

corresponde a 200.000 milhões de atmosferas no núcleo. Com a compressão

pico, o combustível atinge a densidade de líquido 1000-10000 vezes por um

tempo extremamente curto (10-11 segundos). O núcleo é aquecido e a “faísca

de ignição” ocorre.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Confinamento magnético

Campos magnéticos fazem as partículas carregadas girarem em espiral em

torno das linhas de campo. Partículas de plasma são perdidos para as paredes

dos vasos apenas por difusão relativamente lenta ao longo das linhas de

campo. O sistema toroidal (em forma de anel) evita que o plasma atinja o final

do recipiente. O dispositivo de Confinamento Magnético de maior sucesso é o

Tokamak (do russo para “câmara magnética toroidal” - toroidal'naya kamera s

magnitnymi katushkami)

Tokamak

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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Quão grande é um dispositivo de fusão?

Para a fusão iniciar um plasma: deve haver uma densidade suficiente de íons

de deutério e trítio (ni); Os íons reagentes têm de estar suficientemente quentes

(Ti); A energia gerada na fusão com as partículas alfa deve ser confinada por

tempo suficiente (E). E aumenta com o quadrado do tamanho do dispositivo -

portanto uma máquina grande é necessária.

O produto de fusão tripla (niTiE) e a temperatura dos íons (Ti) devem ser

suficientemente grandes (abaixo de uma determinada temperatura, a

probabilidade da reação de fusão é demasiadamente pequena)

pressão (NiTi) ≥ 2 atm

tempo de confinamento> 5 s

temperatura do plasma de íons ≈ 100 - 200 milhões ° C

Temperaturas extremamente elevadas no plasma são necessárias no reator de

confinamento magnético e técnicas difíceis de implosão a laser são

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

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necessárias para o reator de confinamento inercial. Embora progressos

significativos tenham sido feitos nessas investigações, nenhum reator de

potência que produz mais energia do que consome foi construído. Infelizmente,

o financiamento para continuar este trabalho tem diminuído, e a pesquisa

avança a um ritmo mais lento.

Embora esses tipos de reatores não teriam o problema de eliminação de

resíduos do produto de fissão dos reatores de fissão, os reatores de fusão

gerarariam grande número de nêutrons rápidos, levando a grandes

quantidades de subprodutos radioativos.

Reações que liberam energia

O futuro da fusão nuclear

Outra abordagem para a fusão nuclear - uma abordagem que poderia levar a

potência aneutrônica (potência sem nêutrons) e energia nuclear não-radioativa

- utiliza o conceito de colidir feixes de fusão (CBF). Um dos métodos inclui a

reação 2H + 3He deixando os produtos 1H + 4He. No entanto, isso requer 3He,

que só tem disponibilidade limitada na Terra. A Lua é uma fonte potencial de

3He produzidos por raios cósmicos de prótons que atingem a Lua diretamente e

não absorvidos por uma atmosfera como na Terra.

Outra abordagem possível para fusão é a reação 11B + 1H, que conduz a três

núcleos 4He. A libertação de energia tem a forma de partículas carregadas,

cuja energia cinética pode ser convertida em eletricidade com uma eficiência

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muito alta. A pesquisa atual prevê que esta fonte de energia tem um elevado

grau de pureza e eficiência.

Em todas as fontes de energia de corrente, aproximadamente dois terços da

energia é perdido na forma de calor residual ou poluição térmica. Na

abordagem CBF, não há praticamente nenhum desperdício. Este projeto

favorece tamanho pequeno para a maior eficiência (100 MWe ou menos), e

levaria a plantas de potência com vários reatores ou descentralização da

produção de energia.

ITER: International Thermonuclear Experimental Reactor

Projeto internacional com objetivo de demonstrar a viabilidade científica e

econômica de fusão nuclear

A União Europeia, Russia, Japão, USA, Índia, China, Coréia estão prestes a

construir o ITER - um TOKAMAK no sul da França, em Cadarache.-para

demonstrar a viabilidade científica e tecnológica da energia de fusão.

Caradache, França

O ITER vai produzir 500 MW de energia de fusão e o custo total do projeto é de

cerca de US $ 15B. O objetivo é produzir entre dez a cinco vezes mais energia

que o necessário para manter o plasma a temperaturas de fusão,

demonstrando assim a viabilidade da energia de fusão. A previsão é a

produção comercial da energia nuclear dentro de 50 anos.