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infi – Instituto FEBRABAN de Educação FORMAÇÃO DE CORRESPONDENTES MÓDULO II RELACIONAMENTO COM O CONSUMIDOR: PROTEÇÃO E DEFESA; ÉTICA NO ATENDIMENTO (CDC)

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infi – Instituto FEBRABAN de Educação

FORMAÇÃO DE CORRESPONDENTES

MÓDULO II

RELACIONAMENTO COM O CONSUMIDOR: PROTEÇÃO E DEFESA; ÉTICA NO

ATENDIMENTO (CDC)

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SUMÁRIO A Proteção do Consumidor no Mundo e no Brasil ........................................ 2 Proteção do Consumidor no Brasil ................................................................ 5 Código de Proteção e Defesa do Consumidor .............................................. 6 A Formação da Relação de Consumo .......................................................... 8 O Conceito de Consumidor ........................................................................... 9 O Conceito de Fornecedor ............................................................................ 13 A Política Nacional das Relações de Consumo e seus Princípios................ 19 Instrumentos da Política Nacional de Relações de Consumo ...................... 22 Direitos Básicos do Consumidor................................................................... 23 O Direito do Consumidor e suas Fontes....................................................... 28 Qualidade de Produtos e Serviços, Prevenção e Reparação de Danos....... 29 Da Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço............................. 31 Prescrição...................................................................................................... 36 Da Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço ............................. 36 Vício do Serviço............................................................................................. 43 Responsabilidade Objetiva............................................................................ 46 Garantia Legal. ............................................................................................... 47 Vício e Responsabilidade .............................................................................. 52 A Oferta ......................................................................................................... 52 Responsabilidade Solidária ........................................................................... 58 A Publicidade ................................................................................................. 59 Das Práticas Abusivas ................................................................................... 62 Orçamento Prévio .......................................................................................... 71 Da Cobrança de Dívidas ................................................................................ 72 Dos Bancos de Dados e Cadastros de Consumidores ................................. 74 Proteção Contratual ....................................................................................... 76 Direito de Arrependimento ............................................................................. 78 Garantia Contratual ....................................................................................... 79 Das Cláusulas Abusivas ................................................................................ 81 Concessão de Crédito ou Financiamento ..................................................... 86 Liquidação Antecipada .................................................................................. 87 Das Sanções Administrativas ........................................................................ 89 Sistema Nacional de Defesa do Consumidor ................................................ 93 Crimes Contra as Relações de Consumo ................................................ .... 95 Acessibilidade do Serviço ............................................................................. 99 Da Qualidade do Atendimento ...................................................................... 101 Do Acompanhamento de Demandas ............................................................ 103 Do Procedimento para a Resolução de Demandas ...................................... 103 Do Pedido de Cancelamento do Serviço ...................................................... 104

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A Proteção do Consumidor no Mundo e no Brasil

É possível afirmar que mesmo de forma indireta, a proteção do consumidor

esteve presente nas normas, na jurisprudência e nos costumes, desde épocas

bastante remotas (ainda antes de Cristo), porém a defesa do consumidor como

ramo autônomo do direito começa a surgir somente a partir da segunda metade

do século XX.

Em diversos momentos da história mundial é possível detectar fragmentos de

leis ou leis autônomas que tratam de situações onde claramente se verificam

regras de proteção do consumidor. Regras que hoje podem ser encontradas no

Código do Consumidor brasileiro.

As referências a normas de defesa do consumidor mais antigas remetem a

regras presentes no Código de Hamurabi (1700 a.c.) e no Código de Massú

(Índia séc. XIII a.c.).

Nessas codificações antigas podem ser encontrados prazos de garantia para o

reparo de barcos (um ano); modificação de contrato por desequilíbrio contratual

em razão de forças da natureza; punição para quem adulterasse gêneros

alimentícios, alterasse seu peso ou entregasse mercadoria diferente da

prometida ou, ainda, vendesse bem de igual natureza por preço diferente.

No direito romano (período clássico 130 a.c a 230), a responsabilidade do

fornecedor se restringia aos defeitos por ele conhecidos. Mas essa regra evoluiu

no período de Justiniano (530 a 565) e o fornecedor passou a responder pelos

vícios mesmo ignorando-os (a venda tem por objeto a coisa como ela deveria

ser). Leis que tratavam da distribuição de pão e cereais abaixo do preço pelo

estado diretamente à população; ações judiciais que determinavam a devolução

do valor pago em dobro, quando conhecido o defeito; proteção em caso de o

vendedor anunciar certas qualidade ou características do produto que não se

confirmavam posteriormente.

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Já na Europa do século XIII, havia regras impostas aos artesãos para assegurar

a qualidade dos produtos fabricados. Na França de Luiz XI, havia pena de banho

escaldante para quem vendesse manteiga com pedras para aumentar o peso.

ou leite diluído com água. Mais adiante, Carlos IX criou tabelamento de preços

(século XV). Nas Ordenações Filipinas havia previsão de pena de degredo para

a África para quem praticasse usura. São todas leis que podem ser lembradas

no direito romano e que remontam ao nosso direito do consumidor.

Mas somente no fim do século XIX e início do século XX é que surgiu uma

categoria própria de consumidores e de um ramo do direito destinado a regular

as relações de consumo, conforme exemplos abaixo:

Inglaterra 1891 - criação de um comitê para evitar anúncios publicitários

inconvenientes;

França 1905 - promulgada a lei de proteção aos consumidores

(preocupação com a segurança e coibição contra mentiras de vendedores

sobre natureza e utilidade de produtos, falsificações e defeitos em

alimentos);

Alemanha 1909: qualquer associação de consumidores possuía

legitimidade para atuar em juízo em situações de competição desleal;

Suécia 1910 - primeira legislação de defesa do consumidor em

colaboração com outros países nórdicos;

EUA 1914 - criação de Federal Trade Comission com o objetivo de aplicar

a lei antitruste e proteger os interesses dos consumidores;

15 de março de 1962 - mensagem do Presidente Americano ao

Congresso - o direito do consumidor adentra nos seus tempos mais

modernos, começando a ganhar a notoriedade que merece;

Obs: nessa época o c.c. Etíope de 1960 já tratava de proteção, em contratos de

adesão.

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Japão 1968 - Lei geral de proteção aos consumidores;

México 1975 - Lei de caráter geral de proteção;

EUA 1961 - Consumer protection act;

EUA 1968 - Trade descriptions act;

ONU - International Organization of Consumers Unions IOCU;

1977 - Convenção de Estrasburgo;

1975 - Ley Federal de Protección al Consumidor do México;

1964 - Estatuto de la Publicidad Espanhol;

1971 - Bélgica - Lei que regula diversos tipos de venda;

1966 - França - Lei repressora da usura.

Proteção do Consumidor no Brasil

Diferentemente dos movimentos históricos citados anteriormente que deram

origem ao movimento denominado consumerismo (entre as décadas de 40 e

60), no Brasil, os marcos referem-se à edição de normas ou outros atos

governamentais, conforme abaixo:

Lei 1.521 de 26/12/51: Lei de Economia Popular;

Lei Delegada 4 de 26/9/62 (fiscalizada pela SUNAB);

Tentativa de criação do Conselho de Defesa do Consumidor (Projeto de

Lei 70 do Deputado Nina Ribeiro em 1971);

Constituição Federal de 1967, com a emenda nº. 1 de 1969 - congregou a

defesa do consumidor;

Criação do PROCON SP - 1976;

Constituição Federal de 1988 - consagrou a defesa do consumidor como

direito e garantia fundamental, princípio da ordem econômica e

determinou expressamente a criação de uma lei de proteção ao

consumidor, fato que veio a se concretizar dois anos depois.

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Código de Proteção e Defesa do Consumidor

A partir do reconhecimento, por parte do estado brasileiro, de que o consumidor

necessita de proteção, nesta matéria é que surge o Código de Proteção e

Defesa do Consumidor - Lei .8078 de 11 de setembro de 1990.

Nossa lei adota o modelo de intervenção estatal, regrando relações privadas.

Em todo o mundo, onde há disposição de proteger o consumidor há intervenção

do estado nas relações de consumo em maior ou menor grau. A inspiração da lei

brasileira veio de diversas normas estrangeiras, dentre elas a Resolução 39/248

da ONU de 1985, do código francês, das leis espanhola, portuguesa, mexicana e

canadense.

O nosso código foi estruturado basicamente da seguinte maneira:

a) conceito dos partícipes da relação (consumidor e fornecedor);

b) enumeração dos princípios da política de defesa do consumidor;

c) direitos básicos do consumidor;

d) as regras sobre qualidade de bens e serviços;

e) proteção à saúde e segurança;

f) responsabilidade por vício de produtos e serviços;

g) oferta;

h) publicidade;

i) práticas abusivas;

j) proteção contratual;

k) bancos de dados de consumo,

l) cláusulas abusivas,

m) sanções administrativas,

n) infrações penais;

o) defesa do consumidor em juízo;

p) Sistema Nacional de Defesa do Consumidor; e

q) Convenção Coletiva de Consumo.

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Neste material, estudaremos a maior parte dos assuntos que acabamos de

enumerar e seguiremos, sempre que possível, a mesma sequência da Lei

8.078/90 para facilitar o acompanhamento e estudo dos alunos.

TÍTULO I

Dos Direitos do Consumidor

CAPÍTULO I

Disposições Gerais

Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do

consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso

XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições

Transitórias.

Já no artigo 1º, o legislador inicia recordando que os fundamentos da defesa do

consumidor brasileiro estão na Constituição Federal e o faz mencionando os

artigos, precisamente aqueles em que a defesa do consumidor foi inserida.

O art. 5º, XXXII da Carta Constitucional trata dos direitos e garantias

fundamentais; a importância disso, é que os direitos previstos no art. 5º da

Constituição não podem ser modificados pelo Congresso Nacional. Dessa forma,

a defesa do consumidor no Brasil atingiu o patamar constitucional e só poderia,

por exemplo, deixar de existir, mediante nova Assembleia Nacional Constituinte.

Já no art. 170, da Constituição Federal, estão enumerados os princípios da

ordem econômica e o direito do consumidor os integra (com o mesmo status).

Apenas para conhecimento, vamos mencionar alguns dos princípios da Ordem

Econômica: a soberania nacional, a propriedade privada e sua função social, a

livre concorrência, a defesa do meio ambiente etc.

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O último artigo da Constituição Federal, mencionado no artigo 1º do Código do

Consumidor, é o 48 do ato das disposições transitórias.

Lá o constituinte deu o prazo de 120 dias para que o Congresso Nacional

elaborasse o Código do Consumidor. Muito embora a Constituição tenha sido

promulgada em 1988, e o CDC em 1990, não se tem o que lamentar em matéria

da qualidade legislativa do nosso Código. Desde a elaboração de seu

anteprojeto, ele foi cuidadosamente preparado por um grupo de professores da

mais alta qualidade. Sua tramitação no Congresso não foi das mais fáceis, pois

havia receio de grupos econômicos de que uma lei dessa natureza poderia pôr a

perder a economia nacional. Entretanto, o que se verifica, passados mais de 20

anos da entrada em vigor da lei, é que o efeito foi justamente o contrário. Nosso

Código do Consumidor contribuiu para elevar a qualidade dos produtos e

serviços prestados no país.

A Formação da Relação de Consumo

A premissa fundamental do nosso estudo é a identificação da relação de

consumo. Do ponto de vista prático de aplicação do CDC, diante de qualquer

relação jurídica é fundamental sabermos se estamos diante de um caso onde se

pode aplicar o Código do Consumidor.

Caso não possamos aplicar o CDC, no caso concreto, a relação poderá estar

sujeita à aplicação do Código Civil, por exemplo, e não se sujeitará às regras

que estudaremos neste material.

Para sabermos quando estamos diante de uma relação de consumo, é preciso

perguntar, diante do caso concreto, se temos ali a figura do consumidor, do

fornecedor e se esta relação tem por objeto um produto ou serviço. Como todos

esses elementos estão definidos no próprio CDC, analisaremos cada um deles

para, ao final, conceituarmos a relação de consumo.

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O Conceito de Consumidor

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto

ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas,

ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

O Código não possui apenas um conceito de consumidor. Ao todo são quatro

conceitos. Dois destes conceitos estão mais à frente na lei; entretanto, esse é o

melhor momento para estudarmos todos os conceitos de consumidor que o

legislador brasileiro previu. Vamos a eles.

O primeiro que veremos é o conceito padrão. O conceito básico ou standart, que

está previsto no caput (cabeça) do artigo 2º, acima mencionado.

Aqui, o legislador determina que consumidor pode ser tanto pessoa física quanto

jurídica, desde que adquira produtos ou serviços como destinatário final.

Assim, tanto a pessoa física (chamada de pessoa natural, no direito civil) quanto

a jurídica podem ser consideradas consumidoras de produtos ou serviços.

Entretanto, no conceito da lei, para saber se estamos diante de um consumidor,

é preciso perguntar se a aquisição preenche o requisito da destinação final, ou

seja: quando adquirimos um produto ou serviço para nosso uso próprio ou de

nossos familiares, encerrando com este ato a cadeia produtiva, sem reinserir o

bem no mercado de consumo, estaremos diante da figura do consumidor.

Dessa forma, quem compra gêneros alimentícios em um supermercado, para

consumo próprio ou de sua família, é considerado consumidor e goza da

proteção da lei, em caso de irregularidade. Se essa mesma pessoa adquire

esses mesmos produtos para revenda, deixará de ser consumidora desses

produtos.

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Importante atentar para o fato de que o legislador atrelou (neste primeiro

conceito) a figura do consumidor à finalidade – destinação final – por essa razão

encontramos frequentemente, na doutrina especializada que o legislador

brasileiro utilizou, a teoria ‘finalista’. Assim, seguindo à risca esse conceito legal,

só é considerado consumidor o destinatário final de bens de consumo.

O segundo conceito de consumidor, previsto no CDC, é um conceito de

consumidor por equiparação legal. Ele está no parágrafo único do próprio artigo

2º. A primeira diferença entre o conceito do artigo 2º caput e dos demais

conceitos que veremos, reside no fato de que o primeiro define e conceitua o

consumidor, enquanto os demais equiparam a consumidor pessoas e situações

que a rigor não seriam considerados consumidores, a partir do conceito padrão.

No parágrafo único do artigo 2º, por exemplo, a figura equiparada à de

consumidor é a coletividade de pessoas (mesmo indetermináveis). Esse

dispositivo foca não mais no consumidor individual, mas no coletivo, no grupo de

pessoas que adquiriu bens de consumo. Além de tratar a coletividade como

consumidora, já que os contratos de consumo são, em regra, contratos de

massa, há um foco preventivo nessa regra.

No rol de legitimados a defender essa coletividade de consumidores, está o

próprio Ministério Público. São diversas as situações em que se pode pensar na

incidência desse artigo: veículos defeituosos, medicamentos postos no mercado

em desacordo com as normas, alimentos nocivos à saúde etc.

Nesses casos, o Ministério Público pode propor ação ou instaurar procedimento

preparatório (conhecido como inquérito civil) para investigar o caso, buscar a

reparação de danos e punir os infratores, se for caso.

O terceiro conceito de consumidor, no CDC, é outro feito por equiparação legal.

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Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as

vítimas do evento.

A seção onde esse artigo foi redigido na lei, é a que trata da Responsabilidade

pelo Fato do Produto ou Serviço, a qual estudaremos mais adiante. No CDC, o

fato do produto ou serviço é o mesmo que um acidente de consumo. Ou seja, se

uma pessoa, mesmo sem relação contratual com uma empresa que fornece

produtos ou serviços no mercado, for vítima de um acidente de consumo, ela

será considerada consumidora por equiparação.

Exemplos:

Panela de pressão com defeito na válvula, que explode durante o uso e

fere a empregada da consumidora que adquiriu o produto (panela);

Ônibus de transporte coletivo que, por defeito de fabricação, fica sem

freios e atropela pessoas na rua;

Acidente aéreo: avião que cai sobre residências matando e ferindo

pessoas;

Explosão em shopping center que fere pessoas, inclusive as que estavam

apenas passeando no local, sem praticar atos de consumo.

Em todos esses casos, as vítimas do acidente de consumo são, nos termos da

lei, equiparadas a consumidoras e gozarão (as vítimas ou seus sucessores) da

proteção legal, embora não tenham praticado atos de consumo selando uma

relação contratual com o fornecedor.

O último conceito de consumidor contido no Código, é o do artigo 29.

Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos

consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele

previstas.

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Aqui a equiparação a consumidor estende-se a diversos assuntos previstos no

CDC. Vamos a eles:

Como o comando expresso da lei é guindar à posição de consumidor as

pessoas expostas às práticas previstas neste capítulo (V) e no seguinte (VI),

este conceito alcança os consumidores expostos a:

Oferta;

Publicidade;

Práticas abusivas;

Cobrança de dívidas;

Bancos de dados e cadastros de consumidores;

Proteção contratual e cláusulas abusivas.

Importante chamar a atenção para a grande amplitude deste artigo. O

consumidor, ainda que meramente exposto a quaisquer destes assuntos acima,

poderá valer-se do Código do Consumidor para se proteger, em caso de lesão

ou ameaça de lesão a direito.

Em outras palavras, basta que o consumidor esteja exposto a uma oferta

incorreta, a uma publicidade enganosa ou abusiva, mesmo que não esteja

disposto a adquirir o produto ou serviço anunciado, já será consumidor por

equiparação legal.

Da mesma forma, se exposto a alguma das práticas ou cláusulas abusivas, que

estudaremos mais adiante, se exposto a ridículo em cobrança de dívida, lesado

por cadastros de consumo, também poderá valer-se do Código do Consumidor

para se proteger ou reparar danos sofridos.

Assim, de forma sintética, temos no Código um conceito padrão de consumidor

(chamado de standard) e mais três outros conceitos de consumidor por

equiparação legal que ampliam muito o conceito do artigo 2º caput, aumentando

também o leque de proteção ao consumidor brasileiro.

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O Conceito de Fornecedor

Diferente dos diversos conceitos de consumidor que temos no CDC, ao

conceituar o fornecedor, o legislador criou apenas uma regra, sem recorrer a

equiparações.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional

ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem

atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação,

importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou

prestação de serviços.

Assim como no conceito de consumidor, o fornecedor também pode ser pessoa

física ou jurídica. Dessa forma, mesmo que uma pessoa decida oferecer

produtos ou serviços aos consumidores, sem que para isso crie uma empresa,

ela também será considerada fornecedora e responderá nos termos de nossa lei

de consumo, em todas as fases (da oferta ao pós-contrato).

Pessoas que comercializem alimentos (p. ex. salgados) ou produtos de beleza e

que não possuam registro de pessoa jurídica perante o estado, podem ser

fornecedoras de produtos. O mesmo se pode dizer em relação aos camelôs que

atuam na informalidade. São todos os casos de pessoas físicas que podem

integrar as relações de consumo e sua cadeia de responsabilidade, a despeito

de se apresentarem como pessoas físicas.

Já as pessoas jurídicas (formalmente inscritas no Cadastro Nacional de Pessoas

Jurídicas), respondem na condição de fornecedoras desde que ofereçam

produtos ou serviços no mercado de consumo, conceitos que veremos logo à

frente.

As pessoas jurídicas de direito público podem ser aquelas que, criadas pelo

poder público, prestam serviços diretamente aos consumidores e também às

concessionárias e permissionárias de serviços públicos.

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Assim, não importa se o serviço público é prestado diretamente pelo estado ou

repassado a um ente privado; essa circunstância não descaracteriza a condição

de fornecedor da empresa. O que de fato é preponderante para entendermos

quais fornecedores de serviços públicos são fornecedores, sob a ótica do CDC,

é a forma de remuneração. Mais adiante, ao estudarmos o conceito de serviço,

teremos maior clareza sobre quais tipos de serviços públicos são considerados

objeto das relações de consumo.

Já em relação às pessoas jurídicas de direito privado (criadas e geridas por

particulares), o tipo de serviço ou produto fornecido e a forma de remuneração

(direta ou indireta) não os desnaturam como fornecedores, do ponto de vista das

relações de consumo.

Sejam as pessoas jurídicas, nacionais ou não, elas serão fornecedoras se

oferecerem produtos ou serviços no mercado de consumo brasileiro. Caso a

pessoa jurídica esteja domiciliada fora do país, mas ofereça seus produtos no

Brasil, ainda assim o consumidor terá a proteção de nossa lei de consumo.

Além das pessoas jurídicas com personalidade jurídica (públicas ou privadas), o

legislador brasileiro também incluiu no conceito de fornecedor os entes

despersonalizados. Os casos mais comuns de entes despersonalizados que

podem intervir em relações de consumo, na condição de fornecedor, são a

massa falida, o espólio e o condomínio.

Imagine que uma empresa (pessoa jurídica de direito privado) tenha sua falência

decretada judicialmente, mas que continue a produzir os mesmos bens de

consumo que já produzia anteriormente a fim de liquidar suas obrigações com

seus credores (recuperação judicial). Nesta hipótese a empresa perde sua

personalidade jurídica (torna-se massa falida), mas não deixa de ser fornecedora

para fins de relações de consumo.

Para caracterização de relação de consumo é de suma importância avaliarmos

se as pessoas físicas ou jurídicas de que acabamos de falar, desenvolvem

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determinadas atividades. Chamamos a atenção para o fato de que a atividade

requer habitualidade. Assim, se uma pessoa jurídica que fabrica creme dental

vende um veículo de uso da empresa a uma pessoa física, essa venda não

possui habitualidade, tampouco está no objeto social da empresa o que retira

essa relação jurídica da esfera das relações de consumo e a torna uma relação

civil (sujeita as regras do código civil brasileiro).

Os tipos de atividades listadas no artigo 3º como de fornecimento são as mais

diversas: produção, montagem, criação, construção, transformação, importação,

exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de

serviços.

O leque de atividades é o mais abrangente possível. Todas as fases do

fornecimento estão contempladas na regra legal. Da produção até a ‘ponta’ do

consumo, incluindo a intermediação, todas essas atividades são de fornecimento

em matéria de consumo no país.

Em complemento ao nosso estudo há um conceito de fornecedor fora do Código

do Consumidor, que está no Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/2003). Segundo a

regra do art. 3º do Estatuto, equiparam-se a fornecedores para efeito do CDC, a

entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de

prática desportiva detentora do mando de jogo.

Assim, organizadores de competições desportivas e clubes detentores do mando

de jogo equiparam-se a fornecedores de serviços e respondem como qualquer

outro fornecedor por danos causados aos consumidores torcedores.

Visto os conceitos de consumidor e de fornecedor – as partes da relação –

vamos conhecer os objetos do consumo: produtos e serviços. Ambos com

definição no próprio CDC.

O conceito de produto:

Art. 3° (...)

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

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Bens podem ser definidos como coisas, sejam eles materiais ou imateriais

dotados de valor econômico e que possam servir de objeto a uma relação

jurídica.

No Código Civil, o legislador não utiliza o conceito de produto; ao contrário,

optou por categorizar e definir bens em: móveis, imóveis, fungíveis, consumíveis,

singulares, coletivos, públicos e reciprocamente considerados. Já no CDC, a

opção do legislador foi de dizer quais bens são considerados produtos (móveis,

imóveis, materiais e imateriais).

Os bens móveis são aqueles que podem se mover por força própria ou alheia,

sem alteração da sua substância ou destinação econômico-social. No direito

civil, os bens que podem mover-se por força própria são classificados como

semoventes. Nessa categoria, estão os animais.

Assim, animais que possuam destinação final, ou seja, que não sejam utilizados

para atividades econômicas (por exemplo, gado de corte leiteiro etc) são

considerados bens de consumo, na categoria móvel.

Além desses, os automóveis, os eletrodomésticos, eletroeletrônicos, alimentos,

medicamentos, vestuário, materiais de construção ainda não incorporados à

obra e todos os demais bens considerados móveis, no conceito do direito civil,

que comentamos há pouco, poderão ser objeto das relações de consumo, na

condição de produto.

Na categoria dos imóveis (a partir do conceito de bem móvel), estão aqueles que

não podem ser transportados, sem perda de sua substância ou destinação

econômico-social. Uma casa de alvenaria é um claro exemplo disso. Entretanto,

um prédio que possa ser separado do solo, sem perder sua unidade e, assim,

ser removido para outro local, não perderá sua característica de imóvel.

Page 17: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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O conceito de serviço:

Art. 3º (...)

Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante

remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e

securitária, salvo as decorrentes das relações de trabalho.

Aqui, voltamos a chamar a atenção para a expressão “atividade”, da qual já

falamos ao conceituar fornecedor. Essa é uma das chaves para a identificação

de serviços sujeitos ao regime do CDC. Se o serviço não é prestado de forma

habitual pelo fornecedor, ou seja, se ele presta serviço, ainda que remunerado,

mas o faz sem qualquer habitualidade, não é fornecedor de serviços. Dessa

forma, o amigo que por entender de mecânica, conserta o carro alheio, mas o

faz por solidariedade, coleguismo e sem a habitualidade, não é fornecedor de

serviços.

Porém, o mecânico que exerce sua atividade habitualmente, e com

remuneração, é fornecedor de serviços e deve realizar oferta adequada, fornecer

orçamento discriminado previamente etc.

Repare que nesse artigo o legislador conceituou, também, amplamente o

fornecedor e depois passou a listar algumas atividades sobre as quais quis ser

absolutamente enfático para que não pairassem dúvidas sobre a condição de

fornecedor de serviços destes entes (bancária, financeira, de crédito etc).

Mesmo assim, o Sistema Financeiro questionou judicialmente, através de uma

Ação Direta de Inconstitucionalidade o fato de estar sujeito às regras do CDC

como fornecedor de serviços, nas relações de consumo (ADI 2591).

A Ação, ao final, foi julgada improcedente e essa controvérsia foi dirimida pelo

Supremo Tribunal Federal (STF).

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Assim, todo aquele que exercer atividade de natureza bancária, mediante

remuneração, é considerado fornecedor de serviços.

A expressão ‘mediante remuneração’ contida nesse dispositivo merece atenção

especial, principalmente, quando o serviço possui natureza pública.

Pois bem, já vimos que o fornecedor pode ser pessoa jurídica de direito público

ou privado; o que resta saber é quais serviços públicos estão sob a égide do

CDC. Será que hospitais e escolas públicas, segurança pública e os poderes

legislativo e executivo podem ser enquadrados como relação de consumo?

As promessas de campanha dos candidatos a cargos eletivos se encaixam nos

conceitos de publicidade previstos no CDC.

Segundo a doutrina dominante, prevalece o entendimento de que o fornecedor

de serviços de natureza pública será considerado fornecedor para a lei de

consumo, quando sua remuneração for feita mediante taxa ou tarifa (preço

público).

Sob essa ótica, excluem-se do conceito de serviços a polícia militar, o legislativo,

o judiciário, hospitais públicos, escolas públicas etc, pois todos esses serviços

são remunerados mediante impostos.

Já os serviços de água, energia elétrica, telefonia, transporte público, rodovias

são remunerados, conforme o caso, por tarifas ou taxas e como tal estão

sujeitos à incidência do CDC.

Repare que textualmente o legislador apenas deixou de fora dos serviços nas

relações de consumo, aqueles de caráter trabalhista, situações já reguladas pela

CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

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A Política Nacional das Relações de Consumo e seus Princípios

O Código do Consumidor inaugura uma política de relações de consumo (Art.

4º), algo até então inexistente no Brasil. Essa política traz consigo alguns

objetivos como o atendimento das necessidades dos consumidores, respeito à

sua dignidade, saúde, segurança, proteção de seus interesses econômicos e

melhoria de sua qualidade de vida. Por fim, essa política nacional deve ser

baseada em transparência e harmonia.

Em nível federal, o órgão encarregado de zelar pela execução dessa política

nacional é a SENACON (Secretaria Nacional do Consumidor), criada em maio

de 2012.

Além de objetivos muito bem definidos, a política de relações de consumo

brasileira é orientada por princípios.

O primeiro deles é o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º,

I). Essa é uma presunção legal, ou seja, a partir da constatação da formação de

uma relação de consumo, o consumidor ali presente será sempre considerado

vulnerável. Trata-se de uma premissa.

É a partir desse reconhecimento, de que o consumidor é a parte mais fraca da

relação de consumo, que o legislador estabeleceu em todo o código uma série

de direitos e de mecanismos de proteção ao consumidor na intenção de

reequilibrar uma relação que nasce desequilibrada.

De um lado, o fornecedor que controla os meios de produção, redige os

contratos, escolhe os componentes que utilizará em seus produtos, define sua

estratégia de marketing e, de outro, o consumidor que, como regra, ignora todos

os fatores que levaram o fornecedor a colocar seus produtos no mercado e

eleger determinados consumidores como seu público-alvo. Nas relações

massificadas, o processo decisório do consumidor (quando há, fica limitado a um

sim, ou a um não.

Page 20: Apostila módulo II correspondente bancário veic

20

Ele decide apenas se contratará ou não aquele serviço ou produto. Não lhe é

dado interferir, seja customizando os bens de consumo, seja alterando regras

contratuais.

Desse modo, nada mais razoável e compreensível que o estado legisle de forma

a intervir no domínio econômico, criando limites aos fornecedores e direitos aos

consumidores.

O segundo princípio da Política Nacional de Relações de Consumo (PNRC) é a

ação governamental de proteção (Art. 4º, II, a, b e c). Essa ação pode se dar por

iniciativa governamental direta, incentivando a criação e o desenvolvimento de

associações de consumidores, pela presença do próprio estado no mercado e,

também, assegurando padrões adequados de qualidade, segurança,

durabilidade e desempenho de produtos e serviços.

A harmonização de interesses entre consumidor e fornecedor é o terceiro

princípio (art. 4º, III). A harmonização, a princípio difícil de imaginar,

considerando que por vezes os interesses de consumidores e fornecedores são

antagônicos, nada mais é do que a busca do equilíbrio entre proteção da parte

mais fraca e o desenvolvimento econômico e tecnológico nacional.

A boa-fé de ambas as partes é essencial para a busca da harmonização. O

sentido de boa fé, mais comumente empregado aqui, é em seu sentido objetivo

e não subjetivo (intenção apenas), que consiste em uma lealdade entre as

partes, em ações lado a lado que favorecem a execução do contrato e que

facilitam, em última análise, a vida em sociedade.

Outro pilar da PNRC é a educação dos partícipes das relações de consumo (art.

4º, IV). A educação de consumidores e fornecedores é fundamental para a

redução de litígios e respeito mútuo. Conhecedores de seus deveres e direitos,

consumidores não exigem mais do que a lei lhes faculta e fornecedores não

desrespeitam as garantias asseguradas aos consumidores.

Page 21: Apostila módulo II correspondente bancário veic

21

A educação é a porta aberta para que se evitem abusos nos dois sentidos das

relações consumeristas. A melhoria do mercado é a consequência que o próprio

legislador espera por meio de ações educativas.

Em regra, as atividades educativas são efetivadas pelos órgãos de defesa do

consumidor com palestras e cursos, seja para consumidores, seja para

fornecedores. Mas considerando que a proteção do consumidor é assunto de

interesse social (de toda a sociedade), empresas, entidades de classe e de

defesa do consumidor podem e devem promover a educação financeira e para o

consumo.

Outro princípio das relações consumeristas é o controle de qualidade e

segurança incentivado pelo estado (Art. 4º, V). Além disso, de meios alternativos

(aos tradicionais) de solução de conflitos de consumo.

Este inciso possui dois comandos. A primeira regra vem no sentido de evitar

lesões a direitos e acidentes de consumo; já a solução alternativa de conflitos de

consumo surge na fase da reparação de direito violado. Prevenção e reparação

estão contempladas nesse dispositivo principiológico. Sem falar na assunção de

que o estado não tem dado conta do dever de solucionar adequadamente

conflitos sociais e como os conflitos de consumo se dão em massa (aos

milhares) fica ainda mais evidenciada a incapacidade estatal de dar vazão à

solução desses conflitos, gerando o que se chama de demandas reprimidas. De

certo modo, as redes sociais vêm dando resposta a esse comando, mesmo sem

o incentivo estatal determinado na lei.

Do ponto de vista legislativo, a lei de arbitragem pode ser lembrada como regra

que atende a esse comando do CDC; entretanto, a utilização da arbitragem em

relações consumeristas ainda é praticamente inexistente.

O inciso VI, do art. 4º, reforça um dos papéis inerentes ao próprio estado: o de

reprimir condutas ilícitas constatadas no mercado de consumo. Sejam elas

relações entre consumidores e fornecedores, sejam relações anticoncorrenciais

(entre fornecedores) que causem prejuízos aos consumidores.

Page 22: Apostila módulo II correspondente bancário veic

22

Os serviços públicos prestados aos consumidores estão na mira do legislador,

em diversos momentos do CDC. Eles não foram esquecidos nem mesmo na

formação das relações de consumo e como decorrência deverão buscar

patamares de mercado elevados, oferecendo serviços com qualidade e preços

módicos. Não raro os serviços públicos são prestados em regime de monopólio

e, como tal, ao suprimir a liberdade de escolha dos consumidores, devem

garantir o binômio satisfação x preço adequado. Tal equilíbrio deriva da busca

constante pela melhoria e racionalização, conforme o princípio previsto no artigo

4, inc. VII.

O último princípio previsto no CDC é um tanto visionário (art. 4º, inc. VIII). Ele

determina que sejam realizados estudos sobre as modificações do mercado de

consumo. Seja pela velocidade das mudanças de mercado tanto em nível

mundial, o que determina mudanças no mercado interno, quanto no próprio

mercado nacional; seja falta de tradição ou investimento nesse tipo de atividade,

não temos atividades conhecidas de estudos de modificações de mercado senão

aquelas realizadas pelos próprios fornecedores com vistas a atualizar seus

produtos às novas exigências dos consumidores e manter-se atualizados, do

ponto de vista concorrencial.

Instrumentos da Política Nacional de Relações de Consumo

Após fixar objetivos e princípios da PNRC, o legislador nomeou seus executores.

Os órgãos mencionados no artigo 5º foram inadequadamente denominados de

‘instrumentos’. São eles:

a) assistência judiciária aos consumidores carentes;

b) instituição de promotorias de justiça especializadas em defesa do consumidor;

c) delegacias de polícia especializadas nos consumidores, vítimas de crimes

contra as relações de consumo;

d) criação de juizados especiais e varas especializadas na solução de conflitos

de consumo, e

Page 23: Apostila módulo II correspondente bancário veic

23

e) estímulo à criação e desenvolvimento de entidades associativas de defesa do

consumidor.

Esses órgãos de estado aqui nomeados receberam por lei especial a

incumbência de proteger o consumidor ou, no caso do judiciário, dirimir conflito.

Restou ao estado a criação de promotorias, delegacias e varas especializadas

em relações de consumo. Situação ainda distante da realidade, pois não são

poucos os estados da federação que contam com a especialização necessária, o

que por vezes inviabiliza o seu acesso a denunciar, por exemplo, crimes contra

relações de consumo em delegacias ‘comuns’, onde há desconhecimento dos

delitos e, o consumidor, caso tenha paciência, será atendido, depois de horas,

pois necessitará esperar o atendimento de crimes contra a vida ou patrimônio.

Direitos Básicos do Consumidor

Ao lado dos princípios, os direitos básicos compõem a essência dos direitos

consumeristas, a fundação de onde partiram as regras específicas. Em 15 de

março de 1962, John Fritzgerald Kennedy enviou mensagem ao Congresso

enumerando direitos dos consumidores. Direito à segurança, direito à

informação e regulamentação da propaganda, direito à opção e direito de ser

ouvido.

Esses mesmos direitos básicos foram adotados mais tarde pela ONU como

diretrizes das Nações Unidas e a data é comemorada até os dias de hoje, como

o dia mundial do consumidor.

Conforme veremos, nosso CDC incorporou os direitos mencionados por

Kennedy e foi além.

O primeiro direito básico (art. 6º, I) visa proteger a vida, a saúde e a segurança

dos consumidores contra riscos decorrentes de produtos e serviços perigosos ou

nocivos.

Page 24: Apostila módulo II correspondente bancário veic

24

Como se nota, ao utilizar a expressão proteger (e não reparar) o legislador deixa

clara a sua intenção de atuar no momento pré-contratual, ou seja, prevenir os

riscos a que o consumidor fica exposto ao utilizar produtos ou serviços,

potencialmente nocivos ou perigosos.

Outra constatação é que o legislador não ignora que a sociedade de consumo é

também uma sociedade de riscos; assim, tolerou produtos perigosos e nocivos.

Em segundo lugar, no rol dos direitos básicos previstos no CDC (art. 6º, II), está

a divulgação sobre consumo adequado, além da liberdade de escolha e a

igualdade nas contratações.

A primeira regra remete ao consumo adequado. Há aí uma previsão de

adequação entre a necessidade do consumidor e a destinação do bem de

consumo. Por certo o direito atinge tanto o consumidor de alimentos quanto o de

crédito. No primeiro caso, as informações de rotulagem devem informar sobre o

consumo adequado; no segundo caso, prospectos, informações no site da

instituição financeira, contrato e o vendedor do crédito devem apresentar ao

consumidor as características do produto vendido para que, sabedor de suas

necessidades, o consumido possa decidir se aquele produto de crédito é o mais

adequado às suas necessidades.

A liberdade de escolha pode ser assegurada tanto das informações que são

fornecidas ao consumidor para que ele possa fazer comparações entre os

diferentes produtos ou serviços, quanto da atuação estatal que privilegie a

concorrência livre. Não são raros os serviços que consumimos no Brasil, em

regime de monopólio absoluto, e onde claramente inexiste liberdade de escolha

para o consumidor. Exemplo disso é o fornecimento de serviços como de água e

energia elétrica.

A igualdade nas contratações, se pensada entre consumidor e fornecedor, deve

ser bastante relativizada (igualdade formal), considerando obviamente os papéis

Page 25: Apostila módulo II correspondente bancário veic

25

de cada um deles na relação. Alguns instrumentos de busca de igualdade

contratual estão no próprio CDC (vide art. 51). Sob outra ótica, a igualdade

(isonomia) de tratamento entre os próprios consumidores também pode ser um

aspecto a ser considerado neste dispositivo. Neste caso, estamos tratando de

evitar que haja discriminação em seu aspecto negativo.

No inciso III, o direito de informação é a tônica do dispositivo. Apesar de

espalhado em diversos outros incisos (a exemplo do inciso II) é aqui que o

direito básico de informação ganha o centro das atenções legislativas.

Todas as principais características dos produtos e serviços devem ser

informadas aos consumidores (quantidade, características, composição,

qualidade, tributos incidentes, preço, além de riscos).

Vale destacar que as informações exigidas pela lei (conteúdo), também

ganharam regras sobre sua forma (adequada). A informação adequada não é

aquela trazida em rodapés, com fontes de letras minúsculas ou

incompreensíveis. A informação, base do consumo consciente e refletido, deve

ser dada de maneira que realmente atinja o consumidor: sem enganos ou

truques.

Uma recente mudança neste inciso do CDC incorporou a ele uma regra

constitucional que desde 1988 vinha sendo ignorada. O consumidor já tinha, por

força do art. 150, da Carta Constitucional, direito a saber qual o valor dos tributos

embutidos nos bens de consumo. Em 2012, o legislador emendou esse inciso III

do art. 6º e reforçou o comando constitucional.

No inciso IV, do art. 6º, o consumidor ganhou proteção contra duas formas de

publicidade que passaram a ser consideradas ilícitas (enganosa e abusiva),

além dos métodos comerciais desleais, práticas e cláusulas abusivas.

Page 26: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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Todas essas disposições ganharam regras específicas no CDC. A publicidade

ilegal nos arts. 36 e 37 e as práticas e cláusulas abusivas (arts. 39 e 51).

Todas essas práticas foram consideradas perniciosas pelo legislador por

desequilibrar a relação consumerista em qualquer de suas fases. Seja no

momento pré-contratual (publicidade e algumas práticas abusivas), quanto na

fase contratual (cláusulas abusivas).

Ainda em relação aos contratos de consumo, outro direito básico está previsto

no inciso V do art. 6º. Porém, esse dispositivo além de focar em cláusulas que

são engendradas de forma a desequilibrar o contrato como é a característica

principal das cláusulas abusivas, também foi desenhada aqui a proteção contra

fatos supervenientes que tornem o contrato excessivamente oneroso ao

consumidor. O caso real mais comumente citado, como exemplo deste inciso, é

o das cláusulas contratuais em contrato de leasing vinculadas à variação

cambial. Com a alta do dólar, em 1999, os contratos tornaram-se excessivamente

onerosos aos consumidores, situação por que milhares de contratos foram

revistos, com base neste inciso, com fundamento na onerosidade excessiva.

A prevenção e a reparação de danos também ganharam status de direito básico

no CDC, sejam eles patrimoniais, morais, individuais ou mesmo coletivos (inc.

VI).

A prevenção no CDC se apresenta, por exemplo, pelas regras que obrigam os

fornecedores a garantir informações aos consumidores e dispositivos que

determinam o cuidado com a qualidade dos bens de consumo. Já a reparação

ganha destaque com sanções civis isoladas (art. 39 parágrafo único) e

substancialmente nos artigos 81 e seguintes com a proteção do consumidor em

juízo.

De nada adiantaria prever uma série de direitos aos consumidores sem, no

entanto, garantir-lhes acesso aos órgãos estatais responsáveis por sua tutela.

Se a efetivação da proteção legal é executada por determinados órgãos, nada

Page 27: Apostila módulo II correspondente bancário veic

27

mais adequado do que estabelecer o acesso dos consumidores a eles. Seja

tanto no poder judiciário (varas especializadas e juizados especiais), quanto nos

órgãos incumbidos da proteção do consumidor, em nível administrativo, os

conhecidos Procons estaduais e municipais.

O inciso possui um destinatário claro. O consumidor necessitado, ou seja,

aquele em situação de hipervulnerabilidade econômica, sem condições de

contratar advogado para defender seus direitos.

Além do acesso aos órgãos o legislador também estabeleceu como mecanismo

de proteção ao consumidor a facilitação da defesa de seus direitos (art. 6º, VIII).

Objetivamente essa facilitação veio por meio de um mecanismo de capital

importância no processo civil. A inversão, aplicada somente pelo juiz de direito,

pode ocorrer quando as alegações do consumidor forem verossímeis (com

aparência de verdadeiras), apesar de destituídas de prova, ou quando o

consumidor for pouco suficiente (hipossuficiente) o que o coloca em

desvantagem frente ao fornecedor.

O mecanismo de inversão do ônus da prova não é algo novo no direito brasileiro;

ele já existe nas regras de processo civil e pode ser determinado pelo juiz

sempre que a produção de determinada prova for onerosa demais para quem

tenha que produzi-la (prova diabólica, prova negativa).

A regra em direito é que a prova deve ser produzida por quem alega, mas como

nem sempre isso é possível, existe a exceção de inversão do dever de provar,

oportunamente aproveitada no CDC.

A importância dessa regra processual é indiscutível em se tratando de relações

de consumo. Em muitos casos, o consumidor não possui a seu dispor meios de

prova para demonstrar o que alega. Como um consumidor vai provar, por

exemplo, que não realizou determinada compra com seu cartão de crédito ou

chamadas telefônicas que constam da sua fatura de serviços.

Page 28: Apostila módulo II correspondente bancário veic

28

Determinados tipos de provas estão sob domínio e controle do fornecedor.

Gravação de chamadas telefônicas, controle de consumo em cartões de crédito

e telefonia são todos exemplos em que, caso o consumidor necessite

demonstrar que não realizou determinada transação, não terá como fazê-lo por

meio de provas, pois elas estão com o fornecedor.

Assim, em se tratando de relações de consumo, caso o juiz se convença de que

o consumidor está dizendo a verdade, ou quando for ele pouco suficiente do

ponto de vista técnico ou econômico, deverá devolver ao fornecedor o ônus de

provar que a alegação do consumidor é falsa; se não for capaz de fazê-lo, as

alegações do consumidor passam a valer como prova.

O último direito básico previsto no CDC (inc. X) é a adequada e eficaz prestação

dos serviços públicos em geral.

Sabidamente pouco eficientes e sem concorrência alguma, diversos serviços

públicos prestados no país ficam muito aquém das regras de prestabilidade e

eficiência. A busca do legislador foi elevar os serviços públicos ao patamar de

qualidade exigido dos fornecedores privados.

O Direito do Consumidor e suas Fontes

O código de defesa do consumidor, apesar de principal diploma legal em matéria

de relações de consumo, não é o único. O art. 7º determina que tratados,

convenções internacionais, legislação ordinária interna, regulamentos, além de

regras decorrentes dos princípios gerais do direito, analogia e costumes, todos

são fontes do direito do consumidor.

A legislação ordinária interna é, sem sombra de dúvidas, dentre as fontes de

direito do consumidor, a mais recorrente. Há no país um sem número de leis

estaduais e municipais sobre os mais diversos assuntos em matéria de relações

de consumo. De filas em bancos e supermercados, passando por regras de

Page 29: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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segurança bancária, meia entrada e proibições de perturbar o consumidor com

ofertas publicitárias, as regras de defesa do consumidor criadas pelo legislador

municipal e estadual são por vezes repetições do próprio texto do CDC e muitas

vezes contraditórias entre si.

De todo modo, críticas à parte, segundo o art. 7º elas valem como fonte do

direito consumerista.

Qualidade de Produtos e Serviços, Prevenção e Reparação de

Danos

Em matéria de qualidade de bens colocados no mercado de consumo, vamos

analisar em primeiro lugar os artigos 8º, 9ºe 10º. Eles tratam especificamente da

proteção à saúde e segurança do consumidor

A temática do artigo 8º é a periculosidade latente e inerente. A regra legal prevê

que os bens de consumo não devem acarretar riscos à saúde e segurança do

consumidor, salvo os considerados normais e previsíveis, sempre

acompanhadas das informações a esse respeito.

Com isso, podemos tirar basicamente duas conclusões:

a) o legislador não proibiu os produtos e serviços que colocam a segurança ou a

saúde do consumidor em risco, desde que a periculosidade ou nocividade seja

inerente à característica do bem de consumo. É sabido que facas cortam; que

isqueiro queima e pode explodir, tal qual botijões de gás; que o transporte aéreo

está sujeito à lei da gravidade e que possuem reações adversas etc. O risco é

inerente a esses produtos e serviços, mas nem por isso eles devem ser retirados

do mercado.

O que o legislador proíbe ao estabelecer que os bens de consumo não ofereçam

riscos aos consumidores, salvo os normais e previsíveis é a periculosidade

adquirida e não a latente ou inerente, que é indissociável do produto ou serviço.

Page 30: Apostila módulo II correspondente bancário veic

30

A periculosidade adquirida, como o próprio nome diz, é aquela que não é

considerada previsível e surge durante o processo produtivo, seja na fase de

projeto, produção, ou após a introdução do produto ou serviço no mercado.

Os casos mais conhecidos de periculosidade adquirida no mundo envolvem a

indústria automobilística. Não raro, após introduzir um veículo no mercado o

montador descobre algum tipo de defeito que coloca a segurança do consumidor

em risco. Esse tipo de periculosidade é justamente aquela que nosso legislador

procurou regular neste artigo e no artigo 10º onde está prevista a conduta a ser

adotada quando da descoberta de periculosidade, após a colocação do produto

no mercado.

No artigo 9º, o legislador reforça o dever de informação que envolva riscos,

entretanto o foco agora é sobre os produtos e serviços potencialmente nocivos

ou perigosos. No artigo 8º, estávamos tratando de bens de consumo que

apresentam alguma nocividade ou periculosidade; aqui tudo leva a crer que a

referência legislativa se dirige aos bens de alta nocividade ou periculosidade

como os venenos em geral (inseticidas), agrotóxicos etc.

No artigo seguinte, constam os deveres dos fornecedores caso só tenham

ciência da nocividade ou periculosidade, após a colocação do bem de consumo

no mercado. A lei trata do tema sob o rótulo de ‘chamamento’. Mundialmente e

mesmo no Brasil, o assunto também é conhecido por recall.

A regra prevê, em primeiro lugar, que o fornecedor está proibido de introduzir

bens de consumo no mercado que sabe, ou deveria saber, apresentar alto grau

de periculosidade ou nocividade. Já sabemos que estamos tratando da

periculosidade adquirida, pois vimos anteriormente que a periculosidade inerente

é permitida, desde que acompanhada de informações adequadas ao

consumidor.

Porém, como não se pode ignorar que falhas podem ocorrer na produção em

massa, o legislador sabiamente previu como o fornecedor deve agir nesses

casos em que desconhecia a periculosidade (adquirida) do produto ou serviço.

Page 31: Apostila módulo II correspondente bancário veic

31

A periculosidade deve ser comunicada tanto aos consumidores quanto às

autoridades para que todos (especialmente consumidores) fiquem cientes dos

riscos a que estão submetidos e, conforme o caso, inclusive suspendam

imediatamente o uso de produto ou serviço. Com isso, busca-se evitar o dano

iminente.

A comunicação publicitária a respeito da periculosidade deve ser ampla (rádio e

televisão, no mínimo) e obviamente devem ser custeados pelo fornecedor

responsável pela introdução do bem de consumo no mercado.

Além disso, caso o Poder Público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)

tenha ciência da periculosidade, também possui o dever de alertar os

consumidores. Esse dever é usualmente cumprido pelos órgãos de defesa do

consumidor, por meio de divulgação em suas páginas eletrônicas de bens de

consumo sobre os quais incidiram campanhas de chamamento espontâneas, ou

seja, descoberta e noticiada pelos fornecedores.

Da Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço

Ainda dentro da Seção que estabelece regras sobre a qualidade de produtos e

serviços, veremos agora como a responsabilidade pelo fato do produto ou

serviço foi disciplinada no CDC (arts. 12 a 17).

Inicialmente, o Código de Defesa do Consumidor trouxe uma disciplina que é

sua marca registrada (art. 12). Trata-se da regra de responsabilidade objetiva.

Ao estabelecer esta marca, o legislador claramente estabeleceu um parâmetro

claro e transparente, um sistema de responsabilização que se estende por toda

a lei e que também é instrumento de facilitação de defesa do consumidor.

Responsabilidade objetiva significa que os fornecedores, em matéria de

consumo, respondem independentemente da apuração de culpa de sua parte

(elemento subjetivo da responsabilidade).

Page 32: Apostila módulo II correspondente bancário veic

32

Assim, em caso de acidente de consumo, cabe ao consumidor demonstrar o

dano e o nexo de causalidade do dano com o produto ou serviço, ou seja, que o

dano se originou a partir do ato de consumir.

Não é dado ao fornecedor defender-se, alegando que desconhecia a

possibilidade do dano ou o defeito. A responsabilidade recairá sobre ele, mesmo

sem qualquer culpa de sua parte.

Sejam os defeitos decorrentes do processo produtivo, acondicionamento ou

informações insuficientes sobre utilização e riscos, a regra incide fatal e

infalivelmente.

Cabe aqui um parêntese para explicar, a partir do conceito legal o que é

considerado defeito do produto.

Defeito no dizer da lei está presente sempre que o produto não oferecer a

segurança que dele legitimamente se espera.

Ainda, segundo a lei, essa segurança legitimamente esperada deve ser

analisada segundo critério:

a) apresentação - uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam, na época

em que foi colocado em circulação.

Pois bem, a partir desse critério, é possível, caso a caso, dizer se determinado

produto é ou não defeituoso.

Imagine a seguinte situação: a partir de alguns acidentes noticiados, constata-se

que um determinado veículo já introduzido no mercado de consumo, diante de

impactos provocados por irregularidades no asfalto, libera as bolsas de air bag

do motorista e dos passageiros.

A partir do conceito legal que acabamos de citar, não é preciso muito esforço

para concluir que o produto hipoteticamente criado no exemplo é defeituoso.

Page 33: Apostila módulo II correspondente bancário veic

33

Imagine um veículo em movimento nas esburacas ruas de qualquer capital

brasileira, acionando os dispositivos de air bag. Qualquer motorista perderia o

controle do carro nessa hipótese, vindo a colidir. O dispositivo de segurança (no

caso o air bag) não oferece a segurança que dele se espera que é a de disparar

apenas em situações de colisão do veículo.

Mas além de conceituar o defeito, o legislador também criou situações onde o

produto não será considerado defeituoso (Art. 12 §§ 2º e 3º).

A primeira hipótese que não gera a situação de defeito está ligada ao avanço

tecnológico. Assim, se um produto de melhor qualidade é lançado no mercado o

anterior não será considerado defeituoso. Avanço tecnológico e criação de

dispositivos de segurança não geram defeitos para os produtos anteriores a

eles, apenas obsolescência, mas não defeito.

Além disso, a regra de responsabilidade não incide sobre o fornecedor se ele

demonstrar:

a) que não colocou o produto no mercado;

b) que mesmo tendo colocado o produto no mercado o defeito inexiste, e

c) culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

É possível que um determinado produto chegue às mãos dos consumidores sem

que este fato tenha se dado, por ato do fabricante. Exemplo disso é uma carga

de produtos roubada enquanto era levada para um laboratório de análise

química. O roubo, além de imprevisível, não podia ser evitado pelo fornecedor.

Caso esse produto seja indevidamente distribuído aos consumidores pelos

ladrões ou por receptadores e causem danos à saúde dos consumidores o

fabricante não será responsabilizado.

No segundo caso, o produto foi introduzido no mercado pelo fornecedor, causou

danos a consumidores, porém não possuía defeito algum. No conceito do art.

12., ou seja, o produto oferecia a segurança esperada.

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34

No último caso, a culpa pelo acidente de consumo é exclusiva do consumidor. A

despeito da segurança do produto e informações de periculosidade (caso

fossem necessárias) ele utilizou o produto de modo a causar a própria lesão. É o

popular ‘mau uso’, a terceira causa de exclusão e responsabilidade do

fornecedor. Vale ressaltar que para afastar a responsabilidade do fornecedor, a

culpa deve ser toda do consumidor, se ele agiu mal por falha de informação, por

exemplo, a responsabilidade será do fornecedor.

Em se tratando de responsabilidade do comerciante (art. 13), é fundamental que

ele adote providências e cuidados ao expor produtos à venda, pois do contrário

sua responsabilidade será na mesma medida dos demais fornecedores.

O primeiro cuidado a ser observado é que qualquer produto exposto à venda

deve possuir identificação dos fornecedores anteriores (importador, produtor,

construtor ou fabricante); do contrário havendo acidente de consumo o

comerciante será responsabilizado.

Um exemplo disso é a comercialização de escova de dente com uma única

identificação de origem “RPC” (República Popular da China), Caso durante a

utilização esse produto solte suas cerdas e elas venham a ser engolidas pelo

consumidor, a responsabilidade será do comerciante, pois ele expôs à venda

produtos sem a identificação do fabricante ou importador. Sua negligência atraiu

para ele a responsabilidade.

Do mesmo modo se o produto estiver exposto à venda com a identificação do

fabricante, produtor, construtor ou importador, mas a informação não for clara

impedindo a identificação de origem, o comerciante responde por eventual

acidente de consumo.

A conservação inadequada é a terceira causa de responsabilização do

comerciante por acidentes de consumo. Comerciantes que costumam desligar

os refrigerados à noite para economizar energia elétrica ou os que mantêm

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35

produtos que deveriam ser mantidos refrigerados, fora de refrigeração, podem

ser lembrados como exemplos dessa situação legal.

Tal qual a regra de responsabilidade (objetiva) por danos causados por

produtos, o art. 14 traz regra semelhante para danos causados em decorrência

de prestação de serviços defeituosa.

Em relação aos serviços, o legislador apenas adaptou os critérios para aferição

dos defeitos (art. 14 §1º I a III) e suprimiu a regra de responsabilidade (e

irresponsabilidade) do comerciante, considerando que, diferentemente dos

produtos, os sérvios não possuem cadeia de produção, importação e

distribuição, até que o serviço seja prestado ao consumidor.

A última regra do artigo 14, no seu §4º acabou criando exceção à regra da

responsabilidade objetiva dos fornecedores.

Todas as vezes em que estivermos diante de um contrato celebrado com um

profissional liberal (médico, arquiteto, advogado, engenheiro, dentista etc), e a

prestação de serviço seja defeituosa, causando um acidente de consumo, a

responsabilidade do profissional deverá ser caracterizada mediante apuração e

sua culpa em qualquer das modalidades conhecidas (negligência, imprudência

ou imperícia).

O dispositivo legal é bastante criticado e, obviamente, dificulta em muito a

produção da prova por parte do consumidor que normalmente não é técnico no

assunto.

Vale dizer que a contratação de quaisquer desses profissionais, por intermédio

de uma empresa (por exemplo de um médico por meio do plano de saúde)

desnatura a relação de consumidor com profissional liberal. A hipótese aqui é de

contratação diretamente com o profissional liberal.

Outra consideração relevante é que a apuração de culpa do profissional está

prevista no capítulo que trata da responsabilidade pelo fato (defeito).

Page 36: Apostila módulo II correspondente bancário veic

36

Logo, se o profissional liberal prestar serviço com vício de qualidade, responde

objetivamente como todos os demais fornecedores.

O último artigo deste capítulo é o que equipara a consumidor todas as vítimas de

um acidente de consumo (art. 17), dispositivo já comentado no conceito de

relação de consumo.

Diante de um acidente de consumo, pouco importa se as vítimas eram ou não

consumidoras (em sentido estrito) do produto ou serviço; a proteção legal se

estende a elas.

Prescrição

O único prazo de prescrição previsto no CDC é o relativo ao fato do produto ou

serviço (art. 27).

Entendendo-se aqui de forma simplista que o prazo prescricional é o prazo para

o consumidor pleitear em juízo a reparação do dano. Vejamos qual é este prazo

e quando começa a fluir.

Em se tratando da ocorrência de um acidente de consumo, o consumidor, vítima

do acidente, ou seus herdeiros, terão 5 (cinco) anos para reclamar a reparação

dos danos em juízo. Esse prazo começa a correr a partir do momento em que o

consumidor tem conhecimento do dano (o que em geral ocorre, logo após o

acidente) e de sua autoria. Nem sempre o autor do dano é identificado

rapidamente pelo consumidor, por isso mesmo a contagem de prazo se inicia

daí. Trata-se de outro instrumento de facilitação de defesa para o consumidor.

Da Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço

Vício do produto

Para encerrar o tema do capítulo que disciplina a qualidade de produtos e

serviços, passaremos a analisar as regras consumeristas que tratam dos vícios

em produtos e serviços (arts. 18 a 26).

Page 37: Apostila módulo II correspondente bancário veic

37

A primeira consideração a fazer é destacar que o ‘fato’ do produto (Seção

anterior) difere do vício do serviço por um traço muito simples e ao mesmo

tempo marcante.

Produtos defeituosos acarretam risco à saúde ou segurança do consumidor, já

os viciados não. Estes apresentam falhas de qualidade ou quantidade que, em

regra são incapazes de ferir a incolumidade física do consumidor. Os danos

advindos dos vícios são, em regra, apenas patrimoniais.

O artigo que inaugura esta Seção (art. 18) estabelece que, em se tratando de

vícios, todos os fornecedores da cadeia de consumo respondem solidariamente

por sua reparação, ou seja, caso o consumidor adquira um eletroeletrônico em

uma loja e este apresente um vício de qualidade (por exemplo, o aparelho não

liga) cabe ao consumidor responsabilizar, à sua escolha, qualquer dos

fornecedores que integram a cadeia produtiva até o consumo.

Caso o produto apresente vício de qualidade, o consumidor aciona um dos

responsáveis e aguarda – no máximo – 30 dias para que o produto seja

reparado. O direito de tentar reparar bens de consumo é o único direito que os

fornecedores possuem no CDC. Apesar da indignação que isso causa em

alguns consumidores, mesmo que o produto seja novo e de valor elevado, o

fornecedor pode tentar consertá-lo em até 30 dias (art. 18 §1º).

Entretanto, caso o fornecedor não consiga sanar o vício no prazo máximo de 30

dias, ou restitua o produto antes do prazo e o vício reapareça, ao consumidor é

dada a tríplice opção. Ele pode escolher entre:

a) substituição do produto por outro da mesma espécie e em perfeitas

condições;

b) exigir a devolução da quantia paga;

c) optar pelo abatimento proporcional do preço (art. 18 §1º, I, II e III).

Page 38: Apostila módulo II correspondente bancário veic

38

Vale frisar que a opção de troca, rescisão contratual ou abatimento é sempre do

consumidor. Não cabe ao fornecedor impor sua vontade (em geral, pela troca).

O prazo máximo de 30 dias para reparo de produtos viciados admite

flexibilização (art. 18 §2º). Ele pode variar de um mínimo de 7 dias até um

máximo de 180 dias. Entretanto, caso haja uma cláusula de prazo em contrato

de adesão esta deverá ser redigida em separado e só terá valor com

manifestação expressa do consumidor.

Assim, cláusula que amplie o prazo de reparo para além dos 30 dias só terá

validade se obedecer à forma prevista em lei. Se houver redução de prazo,

nosso entendimento é de que a cláusula valha independentemente de ser

redigida em separado, já que amplia o direito do consumidor.

No §3º, do artigo 18, encontra-se a exceção ao que dissemos em relação ao

§1º. Se a regra é de que em caso de vício o fornecedor tem o direito de tentar

sanar o vício em até 30 dias, aqui esse direito inexiste e a tríplice opção do

consumidor passa a ser exigível imediatamente.

A primeira situação é a de comprometimento da qualidade ou características do

produto em razão da extensão do vício. Podem acontecer situações em que o

vício é de tal monta que demande a substituição de diversas peças. Se esse

reparo comprometer características ou a própria qualidade do produto, o

consumidor não precisa aguardar o reparo.

Outra situação de exercício imediato do direito de escolha das opções de troca,

rescisão contratual ou abatimento do preço é a diminuição de valor. Se após o

reparo, houver diminuição de valor do bem o consumidor pode rejeitar a

manutenção. Exemplo dessa hipótese é a de um veículo novo que antes mesmo

de sair da concessionária sofre uma colisão e necessita ser repintado. Nessa

hipótese, o retoque de pintura acaba sendo perceptível e o veículo não terá o

mesmo valor de um outro nas mesmas condições, que não sofreu uma colisão.

Page 39: Apostila módulo II correspondente bancário veic

39

A terceira e última hipótese está ligada à essencialidade dos bens de consumo.

Se o produto for considerado essencial, não há que se falar em reparo. A

questão aqui é definir quais são os bens de consumo essenciais, pois o CDC

não os definiu. Assim, teremos que buscar este conceito fora do nosso diploma

consumerista.

Dessa forma, ‘porta aberta’ do ponto de vista legislativo para essa interpretação

é o art. 7º do CDC, pois lá há expressa previsão de que os direitos previstos no

CDC não excluem outros previstos em legislação ordinária.

Na lei de crimes contra a economia popular (lei 1521 de 1951 e ainda em vigor),

encontramos alguns bens de consumo considerados de primeira necessidade e

que podem nos dar algum subsídio para descobrirmos quais produtos são

considerados essenciais.

No parágrafo único, do artigo 2º, da lei que mencionamos, consta uma lista

exemplificativa de produtos tidos como indispensáveis à sobrevivência em

condições higiênicas e ao exercício normal de suas atividades, tais como

aqueles destinados à alimentação, vestuário, iluminação, os terapêuticos ou

sanitários, o combustível, a habitação e os materiais de construção.

Evidentemente, tais gêneros não compõem uma lista exaustiva e mudam

conforme a sociedade evolui. Para que tenhamos uma ideia disso, está em

discussão judicial uma interpretação do Ministério da Justiça, por intermédio de

sua Secretaria de Defesa do Consumidor relativa à essencialidade do aparelho

de telefonia celular.

Com essa interpretação, a defesa do consumidor exige que as empresas

fabricantes de desses aparelhos providenciem a troca imediata do produto

viciado, haja vista que o consumidor não pode dispor de seu telefone por até 30

dias.

E por falar em avanço tecnológico e obsolescência de produtos, o §4º do art. 18

do CDC reconhece essa possibilidade e determina que, na impossibilidade de

substituição por outro produto de mesmas características, é possível que a troca

Page 40: Apostila módulo II correspondente bancário veic

40

se dê por outro de maior ou menor valor. No primeiro caso, o consumidor

complementa a diferença de valo; já no segundo caso ele recebe uma

restituição.

Em qualquer caso, se o consumidor não concordar em receber outro produto

nas condições que acabamos de relatar, poderá optar por rescindir o contrato ou

pelo abatimento proporcional do preço.

Uma categoria de vícios especialmente tratada pelo legislador foi a dos

impróprios. Ao categorizá-los, o legislador deixou claro que quis colocar luzes

sobre eles dadas as consequências negativas que sua exposição à venda pode

causar aos consumidores.

O primeiro tipo de produto impróprio é o de validade vencida. A doutrina

consumerista chama esse vício de impropriedade do tipo aparente. Aparente,

pois a validade vencida é um vício de fácil detecção a olho nu

independentemente de qualquer perícia ou análise do produto.

Interessante advertir que esse vício independe da constatação de que o produto

está de fato impróprio. A constatação é objetiva. Se o prazo está vencido, o

legislador pressupõe sua impropriedade ao uso e consumo.

Além dos vencidos ou deteriorados, alterados, adulterados, avariados,

falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou,

ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação,

distribuição ou apresentação são todos impróprios.

Repare que em diversos desses casos acima a apuração da impropriedade não

pode ser feita apenas visualmente como na validade vencida. Ela deverá ser

feita mediante análise ou prova pericial. Em outros casos, a apuração visual

basta (falsificação grosseira, deterioração etc).

Além dessa grande lista de produtos considerados impróprios (e viciados), o

inciso III do art. 18, §6º estabelece que a inadequação ao fim a que se destina o

produto também o torna impróprio ao uso e ao consumo.

Page 41: Apostila módulo II correspondente bancário veic

41

Se determinadas características ou qualidades são anunciadas em relação a

determinado produto e ele não as atende, estaremos diante de inadequação ao

fim. Que fique claro que não estamos falando de alguns produtos viciados dentro

de todo um lote do mesmo produto, mas, sim, de produtos que, concebidos para

determinada função não a realizam.

Imagine, por exemplo, uma nova linha de refrigeradores que não atingem a

temperatura para conservação dos alimentos. Um medicamento que não

produza efeitos esperados (placebo), ou uma geladeira que não gele não é

adequada ao fim a que se destina e, portanto, é imprópria, por força desta regra

do CDC.

Outro de tipo de vício previsto no CDC é o de quantidade (art. 19).

A regra da solidariedade se mantém entre os fornecedores, neste caso, e a

apuração do vício se dará em relação à rotulagem ou mesmo da mensagem

publicitária.

A regra legal aplica-se a qualquer produto onde seja possível aplicar o critério de

medição por quantidade, sejam eles sólidos ou líquidos. Tanto quantidade em

unidades, quanto em peso ou volume estão sujeitos à apuração por essa regra

legal.

É preciso cuidado para a ressalva legal (respeitadas as variações decorrentes

de sua natureza), pois é possível que do envase até a prateleira possa haver

perda de peso ou volume; logo, é preciso interpretar a regra com parcimônia.

O que não se pode admitir é, por exemplo (situação real) a venda de frango

congelado onde foi constatado grande volume de água (congelada) no interior

da embalagem e o peso anunciado na rotulagem era o peso total (do frango

somado ao do gelo). Nessa situação, o consumidor adquire água ao preço de

carne de frango. A rotulagem não corresponde ao peso real do alimento e há

vício de quantidade.

Page 42: Apostila módulo II correspondente bancário veic

42

Na hipótese de vício de quantidade, o legislador também fixou como

consequência civil (reparação do dano perante o consumidor) a tríplice opção.

Nesse caso não há prazo para sanar o vício (30 dias) e as opções são:

a) Abatimento do preço. O consumidor opta por adquirir aquele produto com

quantidade inferior à anunciada e paga proporcionalmente ao que está

levando;

b) Complementação do peso ou medida. Em algumas situações essa

alternativa é viável (quando o produto não é hermeticamente fechado, por

exemplo). Se o consumidor achar por bem, exige a complementação do

peso e paga o preço anunciado;

c) Substituição por outro produto sem o vício de quantidade. Caso o

consumidor esteja diante da situação em que apenas algumas unidades

do produto foram atingidas pela quantidade insuficiente e haja outras

unidades com o peso, volume ou unidade corretos, ele pode, a seu

critério, exigir a substituição.

A ressalva a ser feita aqui é que se o consumidor optar pela substituição e ela

for impossível, seja qual for o motivo, ele pode optar por outro produto de maior

valor pagando a diferença, ou de menor valor pagando menos por ele ou

recebendo a devida restituição (art. 19 §1º).

Por fim, caso a pesagem ou medição seja realizada no próprio ponto de venda e

a balança ou o instrumento de medição não estejam devidamente aferidos, a

responsabilidade será, obviamente, do fornecedor imediato (art. 19, §2º).

As regras e o controle de aferição de instrumentos de pesagem e medição são

realizados pelo INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e

Tecnologia) e por seus órgãos estaduais delegados, conhecidos por IPEM

(Instituto de Pesos e Medidas).

Page 43: Apostila módulo II correspondente bancário veic

43

Vício do Serviço

A partir do artigo 20, do CDC, o legislador criou regras relativas aos vícios

decorrentes da prestação de serviços.

A primeira grande diferença evidenciada no artigo 20 (serviço) em relação ao

artigo 18 (produto) é que a palavra solidariedade desapareceu.

E isso se deve em razão de características muito peculiares dos serviços; em

regra, não há cadeia de fornecimento de serviços, mas apenas o prestador

direto. De qualquer modo, isso não significa que os prestadores de serviços

estejam livres da incidência da solidariedade. O artigo 7º contém regra geral

aplicável também a serviços, caso haja mais de um responsável pela causação

do dano.

Os vícios dos serviços foram divididos pelo legislador em: de qualidade,

impropriedade, de diminuição de valor e disparidade com oferta ou mensagem

publicitária.

A exemplo do que já vimos em relação ao vício do produto, o consumidor

também pode exercer tríplice opção, em caso de serviços viciados:

a) reexecução do serviço - por evidente, se o serviço foi mal executado ele

deverá ser refeito às custas do próprio prestador de serviços, sem

qualquer ônus ao consumidor. Mesmo que o fornecedor confie essa

reexecução a um terceiro, o que é permitido pela regra do §1º, essa

subcontratação corre às expensas do prestador de serviços original;

b) restituição da quantia paga – além de imediata, a lei prevê que a

devolução seja feita com atualização monetária (equilíbrio); e

c) abatimento do preço - caso o consumidor se contente com o serviço

viciado e não faça uso das alternativas anteriores, poderá exigir

diminuição do preço. A diminuição deverá ser proporcional à execução

imperfeita (viciada) do serviço.

Page 44: Apostila módulo II correspondente bancário veic

44

Da mesma forma que vimos em relação aos produtos, os serviços inadequados

aos seus fins também são considerados impróprios. Além desses, os que não

atendam às normas de prestabilidade.

Apenas para ilustrar, se o serviço de alisamento de cabelo não o deixa liso, não

atende ao que dele se espera.

Se sobre o serviço incidam também regras específicas em sua prestação (como

é o caso dos serviços bancários e financeiros) e sua prestação não está de

acordo com essas regras o serviço será considerado impróprio desde logo.

Caso o serviço tenha por objeto a reparação de produtos, a lei presume o dever

de utilização de peças de reposição originais, adequadas e novas. Não é dada

ao fornecedor de serviços a decisão de empregar componentes de reposição

não originais ou recondicionados.

Por certo, o consumidor pode fazer essa opção e autorizar o prestador de

serviços, mas a decisão será sempre do consumidor. No mercado de peças de

reposição automotivo, o consumidor acaba optando pela utilização de peças de

reposição não originais, mas que mantenham as especificações do fabricante,

normalmente motivados pelos preços das peças.

Os serviços públicos ganharam um artigo especial em matéria de vícios (art. 22).

Além da regra geral e principiológica que vimos (art. 4º, VII) que determina a

racionalização e melhoria dos serviços públicos, o artigo 22 trata de sua

responsabilização, em caso de vício do serviço.

Não há dúvidas de que, sempre que nos reportarmos aos prestadores de

serviços públicos no CDC, estaremos diante daqueles que, conforme vimos, são

considerados fornecedores nas relações de consumo. Para os serviços públicos

são aqueles remunerados, mediante preço público ou tarifas.

O artigo atinge tantos os órgãos públicos prestadores de serviços, quanto

concessionárias, permissionárias ou outra forma de trespasse do serviço

público.

Page 45: Apostila módulo II correspondente bancário veic

45

Em qualquer caso, prevê o CDC, os serviços devem ser adequados, eficientes,

seguros e contínuos (em relação aos essenciais).

A adequação é analisada em relação à prestabilidade, ou seja, se ele se presta

ao fim a que se destina.

A eficiência está ligada tanto à boa qualidade do serviço quanto à modicidade

dos preços (custo x benefício). A segurança pode ser aqui entendida sob todos

os aspectos. A segurança física é habitualmente a mais lembrada e ela envolve

desde as instalações de equipamento, tubulações e cabeamentos, visitas às

residências dos consumidores etc., mas a segurança também pode ser pensada

em relação a sistemas que garantam segurança de dados dos consumidores e a

relativa a pagamentos de faturas.

O parágrafo único, do art. 22, fixa consequências civis decorrentes do

descumprimento das regras do caput (cumprimento forçado de obrigações e

reparação de danos).

Nesse momento, não poderíamos deixar de mencionar que ao tratarmos de

prestadoras de serviços públicos, estamos falando de setores da economia

sujeitos à regulação específica do poder púbico. Essa regulação é fruto de

normatização específica oriunda das Agências Reguladoras, sejam elas federais

ou estaduais.

As Agências não apenas regulam a prestação de serviços de natureza pública

como também as fiscalizam. Convivendo com esse sistema de regulação e

fiscalização, estão os órgãos de defesa do consumidor e um rol de sanções

aplicáveis pelo descumprimento da lei de consumo.

Nesse contexto é possível que tanto a agência reguladora quanto o órgão de

defesa do consumidor apliquem sanções ao fornecedor pelo descumprimento da

mesma obrigação. A questão é tormentosa e ainda sem solução uniforme. A

premissa em direito é a do ‘non bis in idem’, ou seja, ninguém pode ser punido

duas vezes pelo mesmo fato. De todo modo, em nosso sistema atual, é possível

Page 46: Apostila módulo II correspondente bancário veic

46

que um fornecedor venha a ser sancionado pela agência reguladora (no caso

das instituições financeiras pelo BACEN), quanto por um (ou mais de um)

Procon já que esses órgãos existem em nível federal, estadual e municipal e não

há hierarquia entre eles.

Responsabilidade Objetiva

Já vimos que em relação aos defeitos (fato) do produto ou serviço o fornecedor

responde independentemente de culpa, o que a doutrina chama de

responsabilidade objetiva, um excelente meio de facilitação da defesa do

consumidor e uma opção de distribuição de ônus nas relações comerciais.

Ocorre que nos artigos que tratam da responsabilidade por vício dos produtos

(18), e do serviço (19), não há menção à responsabilidade independentemente

de culpa. Essa constatação evidentemente nos faz pensar se a

responsabilidade, em caso de vícios, seria subjetiva, ou seja, se a

responsabilidade somente se caracteriza, após demonstrada a culpa do

fornecedor.

O artigo 23, do CDC, vem para dirimir essa dúvida. Estrategicamente inserido na

Seção que trata dos vícios, prescreve que a ignorância do fornecedor pelos

vícios de qualidade ou inadequação não o exime de responsabilidade.

A doutrina responsável pela elaboração do anteprojeto do CDC costuma tratar

dessa regra de responsabilidade como de responsabilidade subjetiva com

presunção absoluta de culpa. Na prática, a responsabilidade objetiva ou

subjetiva com presunção de culpa significam a mesma coisa - o fornecedor

jamais poderá invocar ignorância do vício na tentativa de eximir-se da

responsabilidade.

Não fosse assim, bastaria ao fornecedor alegar que desconhecia a existência de

produtos vencidos em sua loja e demonstrar que repõe estoques regularmente

para não ser responsabilidade por essa infração. Ao banco bastaria alegar que

age de forma cuidadosa e diligente com todas as suas transferências e que

Page 47: Apostila módulo II correspondente bancário veic

47

possui sistemas seguros para afastar seu dever de indenizar, quando

comprovada alguma violação de seus sistemas por hackers e ao

desaparecimento de dinheiro da conta bancária do consumidor.

O sistema de responsabilidade objetiva é, portanto, um dos grandes alicerces da

reparação de danos ao consumidor no Brasil.

Garantia Legal

A garantia legal de produtos e serviços é um assunto que precisa ser estudado

reunindo, a priori, ao menos dois artigos do CDC (arts. 24 e 26).,

O primeiro comentário a ser feito apesar de ululante, é que a garantia legal

decorre da lei. O que parece óbvio nem sempre é. O que queremos transmitir

com essa afirmação é que esse tipo de garantia independe de qualquer outro

tipo de avença ou ajuste; não precisa estar prevista contratualmente para que

exista (art. 24).

Aliás, ainda que o fornecedor diga e escreva que o produto ou serviço que ele

pôs à venda não possui garantia, ainda assim ele possui. Produtos e serviços de

consumo postos no mercado brasileiro possuem sempre (e no mínimo) a

garantia legal. Dissemos, no mínimo, pois também é possível que o fornecedor

ofereça garantia contratual para seus produtos, assunto que veremos ao estudar

a proteção contratual.

Muito embora o legislador tenha reservado um local específico no CDC para

capitular as cláusulas abusivas, ele já criou um nesta seção dos vícios. A

disciplina do art. 24 nos deixa claro que o fornecedor não pode nem mesmo

escrever em seu contrato que não se responsabiliza por vícios. Caso o faça, por

força da previsão do art. 51, caput, a cláusula será abusiva e, portanto, nula.

A esta altura convém tratarmos dos prazos de garantia legal (art. 26).

A previsão de garantia legal é algo que eleva os padrões de qualidade dos bens

postos no mercado.

Page 48: Apostila módulo II correspondente bancário veic

48

Se os fornecedores sabem de antemão que serão obrigados a trocar ou reparar

produtos, até determinado prazo e suportar o ônus desse ato, terão,

evidentemente, maior preocupação com a qualidade.

Ao estabelecer o direito de reclamar por vícios (art. 26), o legislador

consumerista põe em operação o sistema de garantia legal de adequação,

previsto no art. 24, dando-lhe prazos objetivos.

O primeiro comentário a fazer é sobre os vícios aparentes (ou de fácil

constatação). Tais vícios são aqueles evidentes aos olhos do consumidor leigo.

A doutrina sugere exemplos como o do televisor sem tela, por exemplo. São

situações de mau funcionamento, inadequação, impropriedade que saltam aos

olhos do consumidor. Essa seria a categoria de vícios do tipo aparentes.

Nesses casos, o consumidor terá prazos diferentes para exercitar seu direito de

reclamar, a depender de um critério. O da maior ou menor durabilidade (art. 26 I

e II).

Se assim for, torna-se necessário um exame sobre o que é considerado durável

ou não durável. Esse conceito não se confunde com o que encontramos no

código civil brasileiro. Lá encontramos uma categoria de bens chamados de

consumíveis. Aqui, o legislador seguiu outro caminho.

Precisamos estabelecer então um critério para o exame da durabilidade. A

primeira coisa que provavelmente nos vem à mente é o critério de uso. Um

produto pode ser durável ou não, a partir de sua resistência ao uso. Mas esse

critério não parece ser adequado, pois cada consumidor possui hábitos de uso

diferentes; uns utilizam e exigem mais de seus produtos do que outros que os

utilizam apenas esporadicamente. Logo, a partir desse critério, o mesmo produto

seria considerado, ora durável, ora não durável.

Um critério interessante foi sugerido pelo promotor de justiça de SP, Willian

Santo Ferreira. O professor sugere que a medida da durabilidade seja dada em

relação ao tempo.

Page 49: Apostila módulo II correspondente bancário veic

49

Dessa forma, se um produto, independentemente de seu uso, seja resistente à

ação do tempo, será considerado durável; se perece ou perde suas

características rapidamente em relação à ação do tempo ,será considerado não

durável.

Nos exemplos, de forma simples, o professor utiliza como objeto um lápis. Um

lápis deixado à ação do tempo possui ‘vida’ longa. É durável, portanto. Se

utilizarmos o critério do uso, uns irão considerá-lo não durável, pois escrevem

bastante e a utilização (e o ato de apontar) desgastaria rapidamente o lápis.

Já os alimentos, como regra geral, não podem ser considerados duráveis, pois

perecem com facilidade, antes do consumo. É verdade que o acondicionamento

e as modernas embalagens fazem com que alguns gêneros alimentícios

permaneçam próprios ao consumo por longos períodos, mas em sua essência

são considerados não duráveis.

Aliás, os alimentos, ao lados dos medicamentos, são praticamente os únicos

produtos classificados como não duráveis nesse critério. Os demais

(eletroeletrônicos, eletrodomésticos, veículos, vestuário, materiais de construção

etc.) são todos pertencentes à categoria dos duráveis.

Em relação aos serviços, aqueles que se são prestados e por sua natureza são

de fruição imediata (serviços de transporte terrestre e aéreo) ou que não

resistem à ação do tempo (inclusive do clima) são não duráveis. É o caso de

uma lavagem de veículo, serviço de manicure ou de alisamento de cabelos. É

verdade que, no último cãs,o há serviços que prometem maior durabilidade e

resistência à água; nesses casos, não há dúvida de que o serviço somente será

considerado adequado se a promessa for cumprida.

Assim, se os produtos ou serviços são do tipo não duráveis, o prazo para o

consumidor reclamar do vício aparente ou de fácil constatação será de trinta dias

(art. 26, I). Esse prazo é contado da data da entrega do produto ou prestação do

serviço, pois, só nesse momento, o consumidor terá condição de examinar o

produto ou fruir o serviço e saber se há nele algum vício (art. 26, §1º).

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50

Se, de outro lado, os produtos ou serviços são do tipo duráveis o prazo triplica

(90 dias).

Os prazos previstos em lei são, por vezes, criticados por serem tímidos, curtos

demais. Entretanto, é preciso considerar que estamos falando de vícios que

saltam aos olhos, que são imediatamente perceptíveis e dependem apenas do

ato do consumidor comunicar-lhes ao fornecedor.

A partir daí, entramos nas regras já estudadas de prazo para que o fornecedor

tente sanar o vício (regra) e a tríplice opção, caso o vício não seja

adequadamente sanado.

Esses prazos para o consumidor exercitar seu direito de reclamar são chamados

pelo legislador de ‘decadenciais’. Se o consumidor não os exercitar, perderá

definitivamente seu direito de reclamar por eles. Há uma velha máxima em

direito que diz “dormentibus non socorrit jus” (o direito não socorre a quem

dorme).

Outra coisa que precisamos saber a respeito dos prazos decadenciais é que

eles podem ser paralisados (ou obstados), como previu o CDC (art. 26, §2º).

A primeira causa de óbice é a reclamação do consumidor perante o fornecedor

(art. 26, §2º, I).

Se em determinado caso concreto, o consumidor reclamar perante seu

fornecedor de serviços de um vício do tipo aparente no 10º dia, após a

conclusão do serviço, enquanto ele não receber uma resposta negativa

(negando sua pretensão) o prazo continuará paralisado perante o consumidor.

Porém quando o consumidor reclama e recebe resposta negativa do fornecedor,

o prazo torna a fluir.

O inciso II (vetado) previa que as reclamações formuladas perante os órgãos e

entidades de defesa do consumidor também teriam o efeito de paralisar os

prazos.

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51

O veto se deu em razão deste inciso estabelecer que o prazo deixaria de fluir

também quando o consumidor reclamasse perante uma entidade de defesa do

consumidor. As entidades de defesa são de natureza privada (em geral ONG’s)

e a paralisação de prazo é prerrogativa de órgão, por seu caráter público.

De todo modo, não é irrazoável entender que, apesar do veto, as reclamações

formalizadas perante os órgãos de defesa do consumidor têm efeito de obstar os

prazos, pois, de qualquer maneira, o consumidor está reclamando contra o

fornecedor que recebe a demanda em seu endereço físico ou virtual. A diferença

é que a carta de reclamação formalizada pelo consumidor é feita com critérios

técnicos e fundamentação, o que muitos consumidores sozinhos não teriam

condições de fazer. Dá-se cumprimento aqui ao acesso aos órgãos

administrativos, comando estampado no art. 6º, VII, do CDC.

No inciso III, do §2º, do art. 26, está a última causa de óbice do prazo

decadencial. A instauração de inquérito civil, até seu encerramento. O inquérito

civil nada mais é do que um procedimento administrativo que pode ser

instaurado pelo Ministério Público. Trata-se de um procedimento de cunho

investigatório e de coleta de provas; um procedimento que antecede e prepara

eventual ação civil pública.

O procedimento não é obrigatório; caso o Ministério Público disponha de provas

necessárias para mover uma ação civil pública, pode fazê-lo independentemente

do inquérito civil, mas caso entenda necessário, faz a coleta de provas e a

investigação através de inquérito.

Como o procedimento do Ministério Público possui caráter coletivo ou mesmo

difuso, o prazo fica obstado até a conclusão do inquérito em relação a todos os

consumidores independentemente de terem ou não efetuado uma reclamação.

Page 52: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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Vício e Responsabilidade

Na análise do artigo, dissemos que o fornecedor não pode se exonerar da

garantia legal por contrato. Pois bem, o mesmo ocorre em relação à tentativa de

dificultar ou impedir a incidência das regras de responsabilidade por vício

(impossibilitar, exonerar ou atenuar a responsabilidade).

Esta é a segunda situação de cláusula abusiva fora do capítulo específico (art.

51). Caso o fornecedor redija seus contratos restringindo a sua responsabilidade

em caso de vícios de qualidade, quantidade, impropriedade etc, a cláusula será

considerada ilegal e, se levada ao judiciário, declarada nula.

A solidariedade decorrente dos vícios, já presentes no artigo 18, vem reforçada

no §1º, do art. 25. Em se tratando de situações onde haja mais de um

responsável pelo dano ao consumido,r todos respondem solidariamente pela

reparação.

Por fim, se o dano decorre de peça ou componente incorporado ao produto ou

serviço, responderão também de forma solidária o fabricante, construtor ou

importador juntamente com aquele que efetuou a incorporação da peça ao

produto.

A Oferta

Ao lado da responsabilidade pelo vício, o tema da oferta e da publicidade são os

temas mais palpitantes dentro do microssistema de defesa do consumidor.

Em primeiro lugar, queremos ressaltar que tal qual o fez o legislador

distinguiremos oferta em sentido amplo e de caráter não publicitário da oferta

publicitária ou simplesmente publicidade.

A oferta como gênero pode ser conceituada como todas as técnicas e meios

disponíveis para aproximar consumidor e fornecedor com vistas ao comércio de

produtos e serviços.

Page 53: Apostila módulo II correspondente bancário veic

53

Dentro deste conceito amplo estão a oferta em sentido estrito ou não publicitária

e a oferta publicitária.

A oferta de caráter não publicitário e a oferta publicitária foram cuidadosamente

separadas e suas regras são inconfundíveis no CDC.

A oferta de caráter não publicitário está presente como regra na apresentação

do produto ou serviço. Na rotulagem, nas etiquetas de preço afixadas em

gôndolas de supermercados etc. são aquelas informações destinadas a levar

informações ao consumidor, sem socorrer-se de métodos de indução ao

consumo. A oferta não publicitária não tem por objetivo estimular hábitos de

consumo ou criar necessidades no consumidor.

Dessa forma, esse tipo de oferta possui regras ou deveres de caráter positivo,

ou seja, a oferta não publicitária destina-se a informar o consumidor para que

este decida de forma refletida sobre o ato de consumo, para que exerça seu

direito de escolha.

Já a publicidade ou oferta publicitária tem a função de criar necessidades,

estimular o consumo, despertar sonhos. Ela mexe com nossos sentidos, sempre

no sentido de criar desejos de consumo. Os deveres em relação à publicidade

são negativos.

O CDC não estabeleceu o que a publicidade deve conter, mas o que ela não

pode fazer. O legislador não taxou a publicidade de ilícita; entretanto,

estabeleceu claros ao exercício desta atividade.

Dito isso, vamos seguir na análise dos artigos 30 a 38 do CDC. Artigos que

disciplinam a oferta e a publicidade. Sempre lembrando que o conceito de

consumidor por equiparação legal (art. 29) atinge todas as pessoas expostas à

oferta e publicidade, conforme vimos no estudo da conceituação da relação de

consumo.

Page 54: Apostila módulo II correspondente bancário veic

54

A primeira regra valiosa fixada pelo legislador em matéria de oferta e de

publicidade é chamada de princípio da vinculação (art. 30). Pela regra da

vinculação, qualquer oferta ou publicidade realizada pelo fornecedor o vincula ao

que foi dito ou ofertado. Como afirma o Ministro Herman Benjamim, do STJ, a

regra do código é: “prometeu tem que cumprir”.

É bem verdade que para vincular o fornecedor às palavras ou imagens

veiculadas há um requisito (o da precisão); entretanto, cumprido este requisito a

oferta e a publicidade amarram o fornecedor e criam para ele o dever de cumprir

com sua promessa, integrando inclusive eventual contrato a ser celebrado entre

consumidor e fornecedor.

A precisão da oferta (ou mesmo da imagem),é requisito para que se exija o

cumprimento forçado, para eliminar subjetivismos. Se por exemplo o fornecedor

anuncia seu produto com adjetivos como ‘sensacional’ ou ‘fantástico’ e o

consumidor o adquira, mas não concorde com essas afirmações, é fato que será

um tanto difícil exigir do fornecedor que o produto cumpra a expectativa

individual de “fantástico” de cada um dos consumidores.

De outro lado, se o anúncio promete ‘o melhor preço da região’ ou ‘cobrimos

qualquer oferta’ e nos deparamos com ofertas de preço inferior fica fácil

comparar as ofertas do anunciante com as do concorrente, para então exigir do

primeiro o cumprimento da obrigação.

Folhetos, panfletos, anúncios, promessas verbais, enfim, todas as formas de

comunicação, em qualquer tipo de relação de consumo, têm o poder de vincular

o fornecedor ao que ofereceu, desde que observado o requisito da precisão

suficiente.

Na venda de crédito, são diversos os relatos de consumidores nos Órgãos de

Proteção do Consumidor ou mesmo nos juizados especiais que relatam terem

recebido informações verbais (do valor das prestações) diferentes, em relação

ao valor constante do boleto que posteriormente recebe.

Page 55: Apostila módulo II correspondente bancário veic

55

Situações como essa, além de flagrantemente contrária às regras do CDC, ainda

se agravam quando o consumidor não recebe cópia do contrato, no ato da

contratação.

Daí a importância de ter sempre o cuidado de oferecer sempre e apenas o que

realmente será cumprido. A omissão de informações relevantes (por exemplo,

de uma taxa ou tarifa incidente sobre o empréstimo) que acabam surpreendendo

o consumidor, traz para o fornecedor as mesmas consequências da informação

falsa.

Nessas situações, o fornecedor será compelido a cumprir com o que foi

oferecido ou retirar a cobrança daquilo que não foi informado, mas foi cobrado.

Além da reparação civil, o fornecedor fica sujeito à sanção (multa) por

descumprimento da lei.

Os deveres do fornecedor em relação à oferta, de caráter não publicitário, estão

previstos no art. 31. Lá, o legislador tratou de estabelecer quais são as

informações obrigatórias e que devem acompanhar a oferta e a apresentação e

também como a informação deve ser prestada.

Os deveres de informar abrangem suas características, qualidades, quantidade,

composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados,

bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos

consumidores.

É evidente que a regra merece ser interpretada com bom senso. Exigir, por

exemplo, o prazo de validade de um prego, a composição de um contrato de

crédito ou de um lápis, garantia da água mineral, etc., não são razoáveis. Os

exemplos folclóricos servem para ilustrar que as informações obrigatórias de

cada produto ou serviço variam.

Page 56: Apostila módulo II correspondente bancário veic

56

Além disso, o artigo 31 prevê que, além das informações obrigatórias lá fixadas,

existem ‘outras’ que podem ser exigidas a depender do tipo de bem de consumo

oferecido. Trata-se de uma redação do tipo aberta, um rol de informações

exemplificativo.

No caso de contratos de crédito, por exemplo, as informações mínimas

obrigatórias estão previstas no art. 52 do CDC (soma total a pagar com e sem

financiamento, quantidade e valor das prestações etc.), além de outras

informações (dentre outras) como é o caso do CET (Custo Efetivo Total),

informação obrigatória por determinação do Banco Central do Brasil.

As informações obrigatórias na oferta também possuem requisitos. Não bastam

que as informações sejam prestadas; elas devem ser apresentadas ao

consumidor de forma correta, clara, precisa, ostensiva e em língua portuguesa.

Conforme o Decreto federal que trata de precificação (Dec. 5.903/2006),

informação correta é informação verdadeira que não seja capaz de induzir o

consumidor em erro. Informação clara é a informação que pode ser entendida de

imediato e com facilidade pelo consumidor, sem abreviaturas que dificultem a

sua compreensão, e sem a necessidade de qualquer interpretação ou cálculo.

Informação precisa é a informação exata, definida e que esteja física ou

visualmente ligada ao produto a que se refere, sem nenhum embaraço físico ou

visual interposto. Informação ostensiva é aquela de fácil percepção, dispensando

qualquer esforço na sua assimilação. Além disso, é aquela que possui

caracteres em tamanho adequado.

Em 2009, um parágrafo foi acrescentado ao art. 31 para acrescentar que, além

de todos os requisitos que acabamos de comentar, quando os produtos forem do

tipo refrigerados, as informações deverão ser gravadas de forma indelével. É

frequente a situação de etiquetas em papel, afixadas em produtos refrigerados,

que umedecem, borram ou se apagam e a as informações desaparecem.

Page 57: Apostila módulo II correspondente bancário veic

57

Se indeléveis (seja através de tinta especial, auto ou baixo relevo), a informação

não se perde com a umidade e manuseio da embalagem, garantindo que a

informação chegue ao consumidor.

Outro assunto tratado na Seção da oferta é o das peças de reposição (art. 32). A

regra vale para fabricantes e importadores. Como as peças de reposição

asseguram a continuidade do funcionamento de produtos, a oferta no mercado é

de fundamental importância. Sua ausência pode tornar produtos obsoletos do

dia para a noite. O comando do artigo 32 apesar de aberto é bem-vindo. A

premissa é de que enquanto o produto estiver sendo introduzido no mercado as

peças e os componentes de reposição devem ser assegurados.

Uma vez que o produto deixe de ser fabricado ou importado, as peças de

reposição devem continuar a ser fornecidas ‘por período razoável de tempo, na

forma da lei’. A razoabilidade, evidentemente, é critério sujeito à interpretação.

Um balizamento trazido para preencher essa expressão (embora não esteja

previsto em lei, mas em um decreto) está no art. 13, XXI do Decreto Federal

2.181/97, que regula as sanções administrativas do CDC. Lá, está previsto que o

período razoável não pode nunca ser inferior à vida útil do produto.

Outro critério de razoabilidade é, sem dúvida, o prazo de garantia contratual

concedido pelo próprio fornecedor. Se a garantia ainda está vigente, não é

razoável (e nem crível) que não existam mais peças de reposição no mercado.

A oferta e a venda por telefone e por reembolso postal também mereceram regra

especial no CDC (art. 33).

Segundo a lei, nessas duas modalidades de oferta ou venda, é necessário que

conste da embalagem, publicidade e impressos utilizados na transação

comercial o nome e endereço do fabricante.

Page 58: Apostila módulo II correspondente bancário veic

58

Além disso, fica proibida a publicidade de bens e serviços por telefone sempre

que a chamada for onerosa ao consumidor. Essa regra foi introduzida no CDC

em 2008, exatamente no mesmo ano em que entrou em vigor o Decreto do SAC

(Dec. 6.523/08).

Dessa forma, quando a chamada for paga pelo consumidor (no caso dos bancos

são as chamadas realizadas para as centrais de relacionamento) a publicidade é

absolutamente proibida. Já quando se tratar de SAC (a chamada é

necessariamente gratuita para o consumidor) a publicidade pode ser realizada,

desde que autorizada pelo consumidor.

Responsabilidade Solidária

Já verificamos que em diversos momentos o legislador do CDC deixou clara a

responsabilidade solidária existente entre os fornecedores, no mercado de

consumo.

No art. 34, mais uma regra dessa natureza foi redigida. Desta vez a

solidariedade é entre o fornecedor e seu preposto ou representante autônomo.

Assim, se o preposto, representante autônomo ou o correspondente,

intermediando a relação entre o fornecedor e o consumidor informa dados

incorretos do contrato, deixa de esclarecer sobre dados essenciais da operação,

ou pior, faz promessas inverídicas, coloca em movimento a roda da

responsabilidade própria e do fornecedor (instituição financeira) de forma

solidária. Daí a importância e o cuidado em atentar para as regras que protegem

o consumidor.

No início do estudo do tema ‘oferta’, dissemos que ela vincula o fornecedor.

Entretanto, o que acontece se este se recusa a cumprir o que ofertou e o

consumidor exigiu (...interrogação), a resposta a essa indagação está no art.

35.

Page 59: Apostila módulo II correspondente bancário veic

59

Diante de uma situação de recusa de cumprimento da oferta (apresentação ou

publicidade), o consumidor pode exigir:

a) o cumprimento forçado da obrigação. Se a opção do consumidor for essa,

o fornecedor será compelido a entregar-lhe o produto ou prestar o serviço

exatamente nas condições anunciadas;

b) aceitar outro produto ou prestação de serviço. Caso a opção anterior seja

inviável (o produto anunciado ainda não está disponível no mercado, por

exemplo,), ao consumidor é dado optar por outro equivalente;

c) rescindir o contrato. Nesse caso, restitui-se a situação como estava antes

da contratação, o patrimônio do consumidor deve ser reposto

integralmente se ele já houver dispendido alguma quantia, além de

perdas e danos, e o consumidor devolve o produto em desconformidade

com a oferta, caso o tenha recebido.

A publicidade

A publicidade ou oferta publicitária regulada pelo CDC é aquela criada em

função e destinada ao consumo. A propaganda, reconhecida por muitos como

aquela destinada a veicular ideias, ideologias e opiniões de cunho político,

religioso etc., não é abrangida pelas regras do nosso Código do Consumidor.

Desse modo, a primeira informação relevante é que o CDC não trata da

propaganda nesse sentido em que acabamos de conceituar, mas apenas da

publicidade de cunho comercial.

Relembramos o que dissemos quando introduzimos o assunto da oferta. Em se

tratando de publicidade, os limites são de natureza negativa. Explico: ao

contrário da oferta não publicitária onde há claramente o dever de repassar

informação ao consumidor, na publicidade, as regras vêm em sentido de

proibições. Foram estabelecidos limites, balizas, até onde os anunciantes podem

ir ao elaborar suas peças publicitárias.

Page 60: Apostila módulo II correspondente bancário veic

60

As duas linhas mestras, conforme veremos são, não enganar e não abusar.

Antes de adentrarmos nos conceitos de enganosidade e abusividade da

publicidade é necessário passarmos pelo que se conhece como princípio da

identificação da mensagem publicitária (art. 36).

O artigo mencionado determina que a publicidade deva ser facilmente

identificada pelo consumidor como tal. Há por detrás dessa regra um comando

de lealdade, de boa-fé.

Considerando que a publicidade é forma de indução ao consumo e que se vale

de instrumentos e fórmulas psicológicas para tanto, é fundamental que ela seja

facilmente identificada.

Se assim é, a publicidade subliminar fica vedada por esta norma e para muitos,

o merchandising deve vir acompanhado de uma frase (mensagem de caráter

publicitário), como acontece em diversos países do mundo.

Dessa forma, o consumidor ficaria protegido dos efeitos negativos da

publicidade, como por exemplo, o de praticar atos de consumo irrefletidos.

Além de identificar a publicidade, o fornecedor tem o dever de manter em seu

poder os subsídios (fáticos, técnicos e científicos) que dão sustentação à sua

mensagem publicitária.

Ora, se o fornecedor faz determinadas afirmações ou promessas de resultados

em suas mensagens publicitárias, evidentemente deve ter como comprovar suas

afirmações. Do contrário, serão falsas. Por essa razão, é primordial que guarde

esse material para acesso aos legítimos interessados. Como interessados,

podemos citar, é claro, o consumidor e aqueles que possuem por missão a sua

defesa (Órgãos de Defesa do Consumidor e Ministério Público ).

Adiante, vamos examinar a publicidade enganosa (art. 37).

Page 61: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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Essa modalidade de publicidade é taxativamente proibida. Por enganosa,

podemos entender a publicidade que induz o consumidor a erro, seja por afirmar

algo falso (enganosa por comissão), seja por deixar de informar dado essencial

que também leve o consumidor a engano (enganosa por omissão), art. 37, §§1º

e 3º.

Assim, seja na modalidade comissiva ou omissiva a publicidade poderá ser

inteira ou parcialmente falsa se carregar em si a capacidade de induzir o

consumidor a erro em relação ao produto ou serviço anunciado, seja em relação

ao seu preço, natureza, qualidade, características, quantidades ou qualquer

outro dado.

Como dissemos, os deveres na publicidade são bem diferentes dos da oferta;

são na verdade opostos. Logo, o fornecedor não precisa dizer nada em sua

publicidade, não precisa informar qualidade, composição, preço ou qualquer

outro dado. Entretanto, ele pode fazê-lo se assim o desejar. O que é vedado, é

utilizar-se dessas informações ou qualquer outra para atrair o consumidor ao ato

de consumir, enganando-o.

Anunciar determinado preço em folhetos que não se confirmam na fase

contratual, certa taxa de juros que não existe, características que não

correspondem ao produto oferecido ou, ainda, oferecer empréstimo omitindo

acréscimos que dão a impressão de menor preço em relação ao concorrente são

todas situações de enganosidade que ensejam como consequência civil a

incidência da regra do art. 35.

Havendo recusa no cumprimento, conforme a oferta ou publicidade, fica a cargo

do consumidor optar pelo cumprimento forçado, por outro produto ou serviço

equivalente ou rescisão contratual imediata. E isso, mesmo no caso da

publicidade parcialmente falsa.

Por abusiva (art. 37, §2º), deve ser entendida aquela que ofende valores

considerados relevantes socialmente e no âmbito do consumo.

Page 62: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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O legislador não tolera a publicidade discriminatória de qualquer natureza: a que

incita à violência, explora o medo ou a superstição, se aproveita da deficiência

de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que

seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou

perigosa à sua saúde ou segurança.

Todas essas formas de fazer publicidade são terminantemente proibidas e

punidas com sanções administrativas (art. 56, I e XII) com multa e

contrapropaganda e criminal (art. 66), com detenção de três meses a um ano e

multa. O mesmo vale para a publicidade enganosa.

O dever de provar que a publicidade taxada de falsa é do seu patrocinador (art.

38). Se o fornecedor engendrou a publicidade e se baseou em dados (fáticos,

técnicos ou científicos) para fazer determinada afirmação, nada mais lógico e

justo que caiba a ele demonstrar a veracidade da sua informação.

Não se trata de inversão do ônus ou dever de provar como o direito básico do

art. 6, VIII. A regra, em matéria de produção de provas, é que esse ônus recaia

sobre quem alega o fato e a exceção, a inversão deste dever. Em relação à

publicidade, a regra (sem exceção) é de que o patrocinador faça a prova de

veracidade de sua publicidade.

Das Práticas Abusivas

As práticas abusivas, que podem ser entendidas como condições irregulares de

comercialização ou contratação, estão concentradas no artigo 39 e espalhadas

em um ou outro artigo do CDC. Nesses casos, ao comentar o artigo,

revelaremos a prática abusiva ali vedada.

As relações de consumo podem ser divididas em fases. Normalmente em 3

fases distintas. A primeira fase é a ‘pré-contratual’. Nesse momento, o

consumidor, normalmente já interessado em algum produto ou serviço, começa

a amadurecer sua decisão de contratar.

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63

E é por meio da oferta e da publicidade que ele colhe subsídios para a prática do

ato de consumo que o fará adentrar na segunda fase.

Na fase contratual, o consumidor já se decidiu por consumir e também escolheu

qual produto ou serviço adquirir. Nessa fase denominada ‘contratual’ incidem os

comandos de proteção contratual (arts. 46 a 51).

A terceira e última fase da relação é a ‘pós-contratual’. Superadas as fases

anteriores, o consumidor enfrentou algum problema como bem de consumo e

necessita da proteção legal. O legislador reservou para esse momento de

dificuldade do consumidor o vício e a garantia legal dele decorrente, além da

responsabilidade pelo fato.

Essa ilustração, das fases da relação de consumo nos será útil neste momento

para verificar que a maior parte das práticas abusivas acontecem, antes da

formação do contrato, portanto, na fase pré-contratual.

É aí que está a grande diferença entre as práticas abusivas e as cláusulas

abusivas. Enquanto estas acontecem ‘dentro’, ou no próprio contrato, aquelas se

dão antes mesmo de sua celebração.

Vamos a elas:

A primeira consideração, em relação a práticas abusivas, é que elas não foram

completamente definidas e listadas pelo legislador; aliás, isso seria impossível

diante da infinidade de práticas irregulares que podem acontecer atual e

futuramente. Quando o legislador não consegue prever ou exaurir condutas, ele

recorre a uma solução simples: o rol exemplificativo.

Em diversos momentos, o legislador do CDC escreveu ‘dentre outras’ ou ‘entre

outras’ ou ‘qualquer modalidade’, ou ainda ‘entre outros dados’. Esses são

exemplos de situações onde a redação aberta do CDC dá ampla margem ao

aplicador da norma para encaixar o caso concreto neste ou naquele dispositivo.

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Essa redação aberta é a causa do Código ainda não ter se tornado obsoleto,

após mais de vinte anos de sua edição, mesmo diante do acelerado avanço

tecnológico e ser motivo de elogios pelo mundo afora.

As práticas abusivas são um exemplo claro de redação aberta. A lista de

práticas irregulares não se exaure nos incisos do art. 39, pois o caput estabelece

que “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas

abusivas:”

Aliás, essa expressão ‘dentre outras’ foi introduzida no artigo 39 em 1994, após

três anos da entrada em vigor do CDC ,para que nenhuma dúvida pairasse

sobre a intenção do legislador de tornar a lista de abusos meros exemplos e não

um rol taxativo.

A primeira prática considerada abusiva é provavelmente a mais conhecida delas:

a venda casada.

Na verdade, o inciso I contém duas proibições: a de venda casada e a imposição

de limite quantitativo.

Condicionar um produto a outro produto é a primeira prática vedada. Os

exemplos são inúmeros (para adquirir o sabonete é necessário adquirir também

o xampu; para conseguir contratar crédito é necessário adquirir um título de

capitalização ou seguro etc.). Para caracterizar a venda casada é importante que

tenhamos sempre a ocorrência de dois requisitos:

a) O condicionamento - se há opção ao consumidor, apesar do casamento da

venda, não haverá o ilícito. Desse modo, quando o consumidor adentra ao

supermercado e encontra uma embalagem contendo catchup e mostarda

vendidos conjuntamente na mesma embalagem, mas também encontra os

mesmos produtos vendidos separadamente, não há que se falar em venda

casada, pois está sendo dada a opção de aquisição conjunta ou separada;

b) outro produto ou serviço - o segundo requisito necessário para caracterizar a

venda casada é a existência de outro produto ou serviço.

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O condicionamento deve ser feito em relação a produto ou serviço diverso

daquele que o consumidor deseja adquirir, pois caso seja o mesmo produto ou

serviço estaremos falando da imposição de limite quantitativo e não de venda

casada.

Imposição de limite quantitativo - diferente da venda casada, a irregularidade

aqui consiste em obrigar o consumidor a adquirir quantidades de produtos ou

serviços maior do que aquelas que ele necessita ou deseja.

Então, caso o consumidor adentre a um supermercado e lá verifique uma oferta

com a seguinte condição: “leite desnatado em promoção, mínimo 4 embalagens

por cliente.” Nesse exemplo, o consumidor que desejar adquirir o produto será

obrigado a levar no mínimo 4 caixas, mesmo que sua vontade fosse adquirir

apenas uma. Repare que o limite de quantidade imposto recai sobre o mesmo

produto (leite).

Da mesma forma se, por absurdo, ao pretender adquirir um empréstimo de mil

reais, o consumidor seja compelido a emprestar no mínimo dois mil reais,

estaremos diante da imposição de limite quantitativo.

Importante considerar aqui que a venda de iogurtes em bandejas contendo seis

unidades; pacotes de arroz vendidos por quilo; refrigerantes vendidos em

garrafas de um litro ou papel higiênico em pacotes com 4 rolos de 30 metros não

caracterizam imposição de limite quantitativo.

Todos estes exemplos são um conceito de unidade, desenvolvido pelo

fabricante, a partir de estudos de hábitos de consumo.

Imaginar o contrário seria advogar a ideia absurda de que o consumidor pode

entrar no supermercado e sair violando embalagens de alimentos, bebidas,

produtos de limpeza etc., para adquirir apenas a porção de seu interesse.

Outra consideração a fazer, é que o próprio inciso I ressalva que é possível

impor limites quantitativos, quando houver justa causa.

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Em nossa economia de mercado e nas vendas ao varejo, é comum que

determinada promoção seja atrelada à venda de uma quantidade máxima de

unidades daquele produto, por pessoa.

Essa conduta também não pode ser taxada de irregular, pois a justa causa está

justamente na venda ao varejo. Se o comerciante atender aos anseios de

apenas um adquirente (normalmente um pequeno comerciante da região que

adquire em quantidade para revenda), deixará de atender os consumidores que

também gostariam de comprar o produto em preço promocional.

Logo, se a placa dentro do mercado dissesse “leite desnatado em promoção -

máximo de três unidades por pessoa”, não estaríamos diante da proibição de

imposição de limite quantitativo, pois o consumidor poderia comprar apenas uma

caixa ou duas, caso não desejasse as três e há aí a justa causa de venda ao

varejo.

No inciso II, do art. 39, nos deparamos com a recusa de atendimento às

demandas dos consumidores.

Esse tipo de prática abusiva costuma ser praticada em momentos de

desabastecimento ou aumento de preços de produtos, como no caso dos

combustíveis. Mesmo de posse do produto disponível para a venda (em

estoque), o fornecedor se recusa a vendê-lo ao consumidor, alegando fim de

estoque para aguardar o aumento de preço que virá no dia seguinte.

No inciso seguinte (III), o legislador proibiu a prática de envio de produto ou

serviço, sem solicitação prévia do consumidor. O que se pretendeu vedar aqui é

a ‘empurroterapia’.

O consumidor, mesmo sem solicitar o produto o recebe supostamente ‘em

cortesia’, apenas para experimentá-lo e depois recebe a cobrança pelo que não

pediu.

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A conduta abrange qualquer bem de consumo não solicitado. De assinatura de

revistas a enciclopédias e cartões de crédito. Busca-se evitar o incômodo ao

consumidor que acaba tendo que se preocupar em devolver o que não pediu, e

também com o consumo irrefletido e induzido ou imposto.

Além de vedar essa conduta, o legislador criou uma sanção civil específica para

o fornecedor que resolver desobedecer a lei. No parágrafo único, do art. 39, lê-

se que o descumprimento desse inciso transforma o bem de consumo enviado,

sem solicitação, em amostra grátis.

Assim, caso o consumidor receba algum produto ou serviço, sem solicitação

prévia, estará ganhando na verdade ‘um presente’ do fornecedor por

determinação legal expressa. Nessa situação, inexiste qualquer obrigação de

pagamento por parte do consumidor.

No inciso IV, a conduta proibida é a de que o fornecedor, conhecedor de seu

produto ou serviço e da fraqueza do consumidor (seja em função de sua idade

avançada, ignorância, saúde etc) se aproveite da situação para vender o que

pretende.

Nesse inciso, encaixa-se, por exemplo, a venda de empréstimo consignado ao

idoso sob argumentos de que ele necessita comprar um aparelho de medição de

pressão arterial ou um colchão ortopédico, tendo em vista sua saúde.

Além de moralmente condenável, esse tipo de conduta é vedada pelo código do

consumidor, como acabamos de ver. As relações de consumo devem ser

pautadas pela boa-fé. Produtos e serviços devem atender às necessidades dos

consumidores e não criar neles a necessidade antes inexistente.

A exigência de vantagem excessiva (inc. V) é a próxima prática abusiva.

Note que, diferentemente dos incisos anteriores, não há aqui uma conduta

específica; a redação é aberta e comporta inúmeras situações de abuso, de

desequilíbrio contratual.

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Situações cotidianas ilustrativas dessa regra são, por exemplo, impor ao

consumidor que a perda de seu cartão de consumo em bar ou boate lhe custará

R$ 300,00 independentemente de seu consumo. Por trás desta situação, está a

premissa de que o consumidor que perde seu cartão de consumo age de má fé,

na tentativa de pagar menos do que o realmente consumiu. O ônus de controle

de consumo é do fornecedor e não deve ser repassado ao consumidor com a

imposição de penalidades que criam, como no exemplo, vantagem excessiva.

No inciso VI, encontramos vedação específica ao prestador de serviços. Como

os serviços devem ser precedidos de orçamento, caso ele resolva prestar o

serviço, ignorando esta regra, incorrerá em abuso.

Note que a conduta é bem semelhante à de envio de produto sem solicitação.

De fato a ideia é a mesma. Se diante da constatação que seu veículo necessita

de manutenção, o consumidor deixa seu veículo na oficina mecânica e ao final

da tarde, quando retorna para verificar se havia algum problema mecânico no

carro, ele constata que o serviço já fora executado (sem orçamento), teremos

como consequência a incidência do parágrafo único, do artigo 39: o serviço será

considerado amostra grátis.

O repasse de informação depreciativa do consumidor (inc. VII) também poderá

ser enquadrado como prática abusiva. Vejamos. É sabido que no mercado de

consumo diversas informações circulam a nosso respeito. Em relação à nossa

renda, hábitos de consumo, inadimplemento etc.

O que se pretende coibir aqui é que o consumidor seja prejudicado do ponto de

vista da circulação de informação a seu respeito, mesmo que no exercício de um

direito seu. A doutrina consumerista trata esse inciso como a proibição de

repassar ‘fofoca de consumo’.

Como exemplo desse inciso, caso o consumidor, antes de adquirir sua mobília,

resolva fazer pesquisa de preços em diversas lojas e em cada uma delas realize

simulações de financiamentos, não poderá, ao final, quando decidir comprar o

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produto, ser surpreendido com a informação de negativa do financiamento, sob

alegação de ‘diversas passagens’ anteriores.

Se o consumidor não contraiu produtos nas lojas em que passou, mas realizou

apenas simulações em um nítido ato de exercício de direito, não é razoável que

a imprecisão das informações do cadastro sejam a razão de uma negativa de

concessão de financiamento.

A seguir, no inciso VII,I o legislador reforçou a observância de que os

fornecedores devem manter as normas técnicas e normas expedidas por órgãos

governamentais. De cintos de segurança a pneus, passando por pães, box de

banheiro, brinquedos e bronzeamento artificial, são inúmeros os produtos e

serviços que devem observância a regras infra-legais.

A colocação no mercado destes produtos ou serviços, sem a observância

dessas regras é, por si só, infração ao Código do Consumidor sujeita à multa,

proibição de fabricação.

Por trás de regras de fabricação expedidas pelos órgãos oficiais ou técnicos,

estão normalmente critérios de qualidade e de segurança do consumidor. A

observância às normas proporciona, além da elevação dos padrões de

qualidade, a diminuição da ocorrência de acidentes de consumo.

Por força do inciso IX, fica proibido ao fornecedor recusar a venda de produtos

ou a prestação de serviços ao consumidor que se disponha a, diretamente,

adquiri-los mediante pronto pagamento.

É certo que em nosso mercado temos alguns casos de intermediação de venda,

como é o caso dos seguros em que o profissional habilitado e com sua atividade

regulada por lei é quem, em contato com o consumidor, intermedia a venda do

serviço. O mesmo se dá em relação à corretagem de imóveis.

Entretanto, caso o fornecedor se recuse a vender seu produto ou serviço

diretamente ao consumidor que deseje adquiri-lo, mediante pronto pagamento

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(moeda corrente nacional), direcionando-o para intermediários, pratica a infração

aqui prevista.

A elevação de preço sem justa causa (inc. X) é outra prática abusiva prevista no

rol exemplificativo da lei. Considerando que vivemos atualmente em uma

economia de mercado com liberdade de fixação de preços, a aferição desta

conduta é de difícil materialização, na prática. O tabelamento de preços deixou

de existir (e foi proibido), desde a edição do plano real; apenas uns poucos

produtos (como medicamentos e cigarros) estão sujeitos a regime de controle de

preços.

No dia a dia do consumidor, todos sabemos que produtos vendidos em estádios

de futebol, shopping centers e aeroportos são mais caros do que seus

equivalentes, comercializados fora desses locais. Porém, é preciso ter cuidado

para não taxar esses preços mais elevados de abuso, a priori. É necessário

considerar que na composição desses preços são inseridos os valores dos

aluguéis de espaços, além da carga tributária e demais custos do fornecedor.

A justa causa para elevação só é aferível no caso concreto e, como não há

controle oficial de preços, é preciso cuidado na aplicação desse inciso. A

conduta proibida pelo inciso X, carrega consigo uma proibição com foco na

concorrência (ou falta dela) prejudicial ao consumidor. Prova disso é que este

inciso foi introduzido no CDC, em 1994, com a Lei 8.884 (a chamada ‘Lei do

CADE’, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

O inciso XI foi renumerado para o inciso XIII. Em razão disso, passaremos desde

logo a comentar o inciso XII.

A regra do inciso XII procura conferir mais segurança nas contratações. Esse

comando proíbe que o fornecedor se negue a estipular prazo para cumprir com

sua obrigação perante o consumidor. Proíbe ainda que a fixação de prazo fique

a critério exclusivo do fornecedor.

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A clássica situação de deixar de informar prazo para a entrega de mercadorias

encaixa-se nesse inciso. Ao adquirir um produto que será entregue pelo

fornecedor, o consumidor dever ser informado (de forma clara e precisa) sobre o

prazo de entrega. Caso contrário, ficará sujeito à vontade e disponibilidade do

fornecedor.

Por derradeiro, no inciso XIII, a vedação é de aplicação de fórmula ou índice de

reajustamento diferente do que a lei prevê ou do que foi pactuado em contrato.

Esse inciso foi incorporado ao CDC com a lei de mensalidades escolares (9.870

de 1999) e visa coibir situações como a de reajustes que não encontram

parâmetros, nem na lei nem no contrato. As referências legais de reajustamento

são poucas (escolas, planos de saúde). Já em relação a índices de reajuste

pactuados em contrato, o exemplo mais comum é o relativo ao mercado de

locação de imóveis. Não raro, o fornecedor pactua determinado índice de

reajuste no contrato e quando percebe que outro índice lhe seria mais vantajoso

decide aplicá-lo.

Orçamento Prévio

A importância que o legislador do CDC atribuiu ao direito de informação é

inquestionável. O pré-contrato foi tão bem cuidado que a intenção legislativa de

evitar surpresas para o consumidor fica evidente. Com o orçamento, essa

premissa se repete.

No artigo 39, já vimos que o CDC reprime o fornecimento de serviços

desacompanhado de orçamento prévio. Pois bem, no art. 40 temos o conteúdo

mínimo desse documento que instrui e prepara a fase contratual.

Conforme prevê a lei, o fornecedor de serviços é obrigado a entregar orçamento

prévio ao consumidor discriminando o valor mão de obra, dos materiais e

equipamentos, condições de pagamento, além das datas de início e fim do

serviço.

Page 72: Apostila módulo II correspondente bancário veic

72

Além de disciplinar seu conteúdo mínimo, a lei também fixou o prazo de validade

do orçamento, caso o fornecedor não estabeleça um prazo diferente (art. 40,

§1º). Esse prazo legal é de 10 dias a contar da entrega do orçamento ao

consumidor.

Caso o consumidor aprove o orçamento elaborado, tanto ele quanto o

fornecedor estão vinculados ao que foi ali ajustado. Isso em razão do fato de que

uma vez aprovado o orçamento, este se transforma no próprio contrato da

relação de consumo e, como tal, obriga a ambos (art. 40, §2º); sua alteração ou

modificação não é impossível, mas depende do acordo e da livre negociação

das partes. Não há que se falar em imposição, a palavra-chave aqui é o acordo,

a harmonização das relações.

Tanto o orçamento é ‘lei’ entre as partes, após elaborado e aprovado, que caso

o fornecedor não tenha previsto algum acréscimo que acabe por acontecer para

a conclusão dos serviços, esse acréscimo será suportado por ele (art. 40, §3º).

Comentamos no início do assunto das práticas abusivas que nem todas as

práticas consideradas abusivas estavam previstas no art. 39 do CDC. Exemplo

disso é justamente o orçamento. Ao violar o art. 40 ou seus parágrafos o

fornecedor incorre em práticas abusivas. Da mesma forma, acontece em relação

ao tema da cobrança de dívidas que veremos a seguir.

Da Cobrança de Dívidas

Os consumidores-devedores ganharam uma Seção específica no CDC, com o

objetivo de verem preservados tanto seus direitos como a sua dignidade.

A primeira regra relativa ao tema da cobrança de dívidas proíbe que o

consumidor-devedor seja exposto (por sua condição de devedor) a ridículo, que

seja submetido a constrangimento ou ameaça, por parte do credor.

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73

Ligações de cobrança no ambiente de trabalho para constranger o devedor,

visitas de cobradores em sua residência com palhaços fantasiados batendo

bumbo e ridicularizando não só o devedor, mas a sua família entre outros

alegóricos, porém reais exemplos, estão vedados pelo CDC. A ameaça aparece

também aqui neste artigo 42 para evitar abusos, no momento da cobrança.

Além da incolumidade psíquica do consumidor protegida no artigo anterior, o

legislador, a todo tempo, cria mecanismos de proteção econômica para a parte

mais fraca da relação. Assim, caso o consumidor seja cobrado em quantia

indevida deverá receber de volta o dobro do que pagou em excesso,

monetariamente atualizado e acrescido de juros legais.

Essa regra legal incide diante da cobrança de qualquer tipo de dívida do

consumidor, esteja ele em situação de inadimplemento ou não. Caso o

consumidor tenha lançados em sua fatura de cartão de crédito ou de telefonia

valores que não reconheça e acabe pagando por eles, ou se cobrado de uma

dívida, acaba pagando um montante além do que devia a título de acréscimos

pelo atraso, faz jus a receber o dobro do que pagou.

O primeiro requisito para que o consumidor faça jus a esse direito é,

evidentemente ter sido cobrado indevidamente; o segundo, é ter pago. Na

hipótese de o consumidor dever R$ 150,00 e ser cobrado de uma dívida de R$

180,00, caso efetue o pagamento integral de R$ 180,00, faz jus a receber R$

60,00 (o dobro do que pagou em excesso).

O legislador ressalvou que o fornecedor pode se eximir de devolver o dobro do

que cobrou a mais do consumidor, desde que prove ter se tratado de engano

justificável. Situações de homonímia estão dentro dessa exceção.

Em 2009, o art. 42 do CDC foi acrescido de mais um dispositivo (42-A). Por meio

desta regra, qualquer documento de cobrança encaminhado ao consumidor

deve vir com nome, endereço e CNPJ do fornecedor do produto ou serviço para

o qual o consumidor deva.

Page 74: Apostila módulo II correspondente bancário veic

74

Dos Bancos de Dados e Cadastros de Consumidores

Os bancos de dados e cadastros de consumidores, tema da maior atualidade em

função da recente entrada em vigor do cadastro positivo, foram tratados de

forma única pelo legislador do CDC.

Vale dizer que, diferente do que estamos vendo atualmente com a criação de um

cadastro onde só se poderão armazenar informações de caráter positivo dos

consumidores, no CDC arquivos e bancos de dados foram tratados de forma

completa e única, sem essa divisão que, ao final das contas, acaba sendo irreal,

já que o credor ao ter um pedido de concessão de crédito terá acesso a todas as

informações disponíveis sobre o consumidor.

O que realmente importa para conceder ou negar crédito ao consumidor é seu

histórico de crédito e ele não é composto apenas de informações negativas ou

positivas; é composto de um conjunto de informações que formam um score do

consumidor. É assim em diversos países do mundo. O consumidor tem acesso a

suas informações e pode, a partir daí, comportar-se de forma a aumentar sua

pontuação o que lhe confere maior acesso ao crédito.

Aliás, o acesso é o primeiro direito do consumidor aos bancos de dados. Muito

embora os bureaus de crédito sejam entidades tipicamente privadas, o legislador

garante acesso aos consumidores sobre suas fichas, registros, cadastros, além

de suas fontes (art. 43) e declara, em 1990, que essas entidades possuem

caráter público (art. 43, §4º).

Os cadastros que contêm os dados dos consumidores devem observar

determinados requisitos como objetividade, clareza, linguagem de fácil

compreensão e serem verdadeiros (art. 43, §1º).

Busca-se evitar informações ininteligíveis ou codificadas, pois de nada adiantaria

o consumidor ter acesso às informações arquivadas sobre ele e não conseguir

compreendê-las.

Page 75: Apostila módulo II correspondente bancário veic

75

Conforme o mesmo §1º, o prazo máximo de armazenamento de informações

(negativas apenas) é de cinco anos. Esse prazo deve ser contado a partir do

momento em que o débito passa à condição de vencido e não pago, e não a

partir do momento em que a informação negativa foi disponibilizada ao banco de

dados.

Esse prazo máximo de arquivamento nada tem a ver com o prazo de prescrição

da dívida. Fizemos essa ressalva, pois após a prescrição da dívida (prazo que o

credor tem para cobrar o consumidor judicialmente), o banco de dados não

poderá fornecer qualquer informação negativa do consumidor em relação àquele

débito que seja capaz de prejudicar o acesso ao crédito (art. 43, §5º).

É comum, nos dias de hoje, o consumidor receber correspondência ou

telefonemas de fornecedores oferecendo desde imóveis a bens móveis dos mais

diversos gêneros, sem nunca terem tido qualquer relação com aquele

fornecedor.

A primeira pergunta que vem à cabeça é: onde o fornecedor conseguiu meu

endereço ou meu telefone? Nossos dados são classificados por critérios como

renda, faixa etária e outros e comercializados entre os fornecedores. Essa

prática em si não encontra vedação no CDC, entretanto todas as vezes que

alguma ficha, registro, dados pessoais ou de consumo são abertas sem

autorização do consumidor, ele deve ser comunicado e por escrito!

Ao menos é o que reza o §2º, do art. 43, do CDC, provavelmente a regra legal

mais desobedecida do Código.

A partir do direito de acesso aos seus dados armazenados em bancos de dados,

o consumidor pode fiscalizar a exatidão das informações e, sempre que

encontrar incorreção, tem direito a exigir sua imediata correção (art. 43, §3º).

Cabe ao arquivista providenciar a correção e comunicar os destinatários da

informação – o mercado – da alteração feita.

Page 76: Apostila módulo II correspondente bancário veic

76

Além dos bancos de dados negativos de consumidores, o CDC criou também os

arquivos negativos dos fornecedores (art. 44). Se as informações registradas

contra o consumidor são relativas a seu comportamento de crédito, as dos

fornecedores representam seu histórico de reclamações nos órgãos de defesa

do consumidor.

Todas as reclamações consideradas fundamentadas (que tenham fundamento

em lesão a direito previsto no CDC) devem ser divulgadas anualmente pelos

Procons. A divulgação dirá se a reclamação foi atendida ou não.

Tal qual o fornecedor possui instrumentos de prevenção contra maus pagadores

para evitar a concessão de crédito a quem não tem condição de recebê-lo ou

não tem o hábito de honrar com seus compromissos, o consumidor tem à sua

disposição um mecanismo de proteção contra os maus fornecedores que não

costumam respeitar seus direitos.

O cadastro de reclamações fundamentadas é mecanismo preventivo e deve ser

consultado pelos consumidores, antes de fechar negócio com o fornecedor.

Atualmente, os cadastros de todos os Procons estaduais e de alguns Procons

municipais foram consolidados em um sistema chamado SINDEC que pode ser

acessado na página eletrônica do Ministério da Justiça. O banco de dados é de

responsabilidade da SENACON que recebe os dados dos estados e os divulga

aos consumidores.

Proteção Contratual

A partir de agora, adentraremos na segunda fase da relação de consumo: a fase

contratual.

A partir de uma das premissas mais relevante do CDC, é que foi inaugurado o

capítulo da proteção contratual – o direito à informação (art. 46). Informação é a

base da sociedade de consumo; é a porta de entrada para a formação dos

contratos. Em nosso código não é diferente.

Page 77: Apostila módulo II correspondente bancário veic

77

Se o consumidor for convencido a adquirir produtos e serviços sem que lhe seja

dado conhecimento prévio do conteúdo do contrato, ainda que a relação se

aperfeiçoe, o consumidor não está obrigado ao contrato.

Repare na importância conferida ao direito de informação. Sem conhecimento

prévio, não há vinculação por parte do consumidor. Imaginemos que o

consumidor recebe algumas informações verbais antes da aquisição de um

empréstimo consignado, assina o formulário, mas não tem a oportunidade de ler

e conhecer efetivamente o conteúdo do contrato e sequer recebe uma via do

instrumento.

Nessa situação, basta que alegue desconhecer o contrato que terá a seu favor o

art. 46. Repetimos: caso o consumidor não tenha conhecimento do conteúdo do

contrato, não há vinculação contratual de sua parte. O mesmo ocorre se o

contrato for redigido de forma a dificultar a compreensão. Contratos carregados

de expressões técnicas, demasiado rebuscados e ainda por cima redigidos em

inúmeras páginas também estão na mira do legislador.

A premissa da formação contratual perfeita é a informação adequada e

completa.

Uma antiga regra de facilitação de defesa foi incorporada no art. 47. É a regra de

interpretação ‘contra proferentem’. Se nas relações de consumo quem redige o

contrato é o fornecedor, sem qualquer ingerência do consumidor, é ônus seu

redigi-lo bem. Mas se alguma cláusula ensejar dúvidas de interpretação a

vantagem será do consumidor.

Por evidente, o requisito para que esse artigo seja aplicado é a cláusula

contratual que necessita de interpretação. Se ela for clara e lícita, não haverá

problema. Se for clara e abusiva, deverá ser anulada.

Page 78: Apostila módulo II correspondente bancário veic

78

Outra regra bastante repetida em diversos momentos do CDC é a vinculação.

Mesmo que consumidor e fornecedor troquem informações a respeito do

negócio fora do instrumento contratual, ou que sequer exista, as declarações de

vontade emanadas pelo fornecedor possuem força vinculante (art. 48).

Recibos, pré-contratos, escritos particulares, todos eles valem como prova da

relação e dos deveres do fornecedor perante o consumidor. A informalidade não

significa desoneração. No CDC, o apego à forma cedeu lugar ao apego à boa-

fé.

Direito de Arrependimento

Uma das regras mais difundidas do CDC é provavelmente o direito de

arrependimento (art. 49).

Todas as vezes que a compra se der fora do estabelecimento comercial, o

consumidor tem direito a desistir, sem ônus, no prazo de até 7 dias.

Fora do estabelecimento comercial pode ser por telefone, reembolso postal ou

internet. À época da edição do CDC (1990), ela sequer existia, entretanto hoje

não se discute sobre a incidência do artigo 49 ao comércio eletrônico. Tanto

assim que, em 15 de março de 2013, foi editado o decreto federal 7.962 que

regula exatamente esse tema.

O direito de arrependimento nasce como forma de prevenir as compras por

impulso, irrefletidas ou situações em que o consumidor não teve sequer acesso

físico ao produto e, portanto, uma perfeita formação de sua vontade.

O prazo de 7 dias deve ser contado a partir da assinatura do contrato ou do

recebimento do produto ou serviço e nenhum valor deve ser cobrado do

consumidor durante o período de reflexão. Se ele dispendeu alguma quantia,

esta lhe deve ser ressarcida.

Outra característica fundamental atinente a esse direito de arrependimento é que

ele é imotivado.

Page 79: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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O consumidor não precisa de uma razão específica para se arrepender, ele pode

simplesmente desistir.

Garantia Contratual

Dentro do tema dos vícios, estudamos a garantia legal, seus prazos e

abrangência. Pois bem, além da garantia legal, o legislador também disciplinou a

garantia contratual (art. 50).

Diferente da garantia legal ela não é obrigatória; é faculdade do fornecedor

concedê-la, ela é um sinal de qualidade do produto ou serviço e de competição

sadia entre fornecedores de um mesmo segmento. Produtos com maior prazo de

garantia tendem a gerar maior confiabilidade no consumidor.

Outra característica que diferencia a garantia contratual da legal é a forma. A

contratual deve ser fornecida mediante termo escrito, enquanto a legal

independe dele.

As garantias (legal e contratual) se complementam. O sentido de sua

complementaridade é o temporal. Elas se somam no tempo. Como vimos, a

garantia legal de um produto durável é de 90 dias. Se nos termos de garantia

contratual o fornecedor estabelece um ano de prazo, as duas garantias somadas

conferem ao consumidor um exercício de direito para reclamar de eventuais

vícios de um ano e noventa dias.

Essa conclusão é fácil de ser tirada a partir do que diz o artigo 50, combinado

com o artigo 47. Cláusulas contratuais que deixam dúvidas devem ser

interpretadas a favor do consumidor. Assim, compete ao fornecedor cuidar com

esmero da redação de seus contratos e também do termo de garantia.

Além da forma (escrita) da garantia contratual, diversos são os seus requisitos.

Ela deve ser padronizada, deve esclarecer em que consiste, qual a forma, prazo

e local de seu exercício e se há ônus para o consumidor.

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80

Como a garantia contratual é faculdade e não obrigação, pode cobrir apenas

determinadas partes do produto e excluir outras; além disso, sua duração não é

fixada em lei e pode sim haver ônus para o consumidor que necessite utilizá-la.

Não é incomum que os fornecedores criem regras como, por exemplo, o ônus de

levar o equipamento viciado até sua rede de assistência técnica para que o

produto seja submetido a reparo.

De novo a informação clara é a base da relação. Diante do termo de garantia

com maior prazo e poucas coberturas e outro com menor prazo e cobertura total,

sem ônus de entrega do produto ao fornecedor etc, o consumidor pode se

decidir por qual produto optar.

Outro requisito obrigatório do termo de garantia contratual é que ele seja

entregue preenchido ao consumidor. A razão dessa exigência é bastante

simples e evidente. Uma vez preenchido, o termo de garantia é documento hábil

para comprovar a data da compra e o início da validade da própria garantia.

Frequentemente essa regra é desobedecida (apesar de caracterizar infração

penal) e exige-se a nota fiscal como prova da compra para fins de conferir a

vigência da garantia contratual.

Nunca esquecer do direito à informação adequada; o fornecedor também deve

entregar ao consumidor o manual de instruções; instalação em linguagem

didática (traduzido para o português) e com ilustrações.

Outra modalidade de garantia contratual bastante difundida é a chamada

garantia estendida. A bem da verdade a chamada ‘garantia’ estendida é um

contrato de seguro que tem vigência ao final da garantia contratual. Como

qualquer contrato, é fundamental que o consumidor tenha acesso prévio ao seu

conteúdo e esclareça todas as suas dúvidas, antes de contratar.

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Das Cláusulas Abusivas

A Seção II, deste capítulo, cria uma lista de cláusulas que, caso inseridas em

contratos de consumo são consideradas nulas; sem qualquer valor perante o

consumidor.

Da mesma forma como foi redigido o art. 39 (práticas abusivas), o legislador

cuidou para que a lista de cláusulas abusivas compusesse um rol exemplificativo

de situações vedadas. A lista não se exaure nesse artigo 51; na prática diária é

possível encontrarmos cláusulas contratuais que comprometem o equilíbrio

contratual e que não estejam previstas em um dos incisos do artigo 51.

Entretanto, como veremos, isso não a torna lícita.

A primeira proibição de cláusula contratual é relativa a vícios. Ao estudarmos o

tema, pudemos verificar que há uma regra que proíbe a exoneração contratual

do fornecedor em relação à sua responsabilidade por vícios. Aqui a disposição

legal foi praticamente repetida e passou a integrar expressamente o rol do art.

51.

Impossibilitar, exonerar ou atenuar a responsabilidade contratual do fornecedor

por vício de qualquer natureza, é a proibição constante do inciso I. Em se

tratando de garantia legal de adequação (já que a contratual é facultativa, como

já vimos) não é dado ao fornecedor estabelecer, por exemplo, que o consumidor

renuncie ao seu direito.

No inciso III, a proibição recaiu sobre cláusula contratual que preveja diminuição

ou subtração do direito de reembolso do consumidor. Já verificamos que, em

caso de cobrança indevida, o consumidor possui direito à devolução do dobro do

valor que pagou em excesso. Se nessa ou qualquer outra hipótese o fornecedor

decida escrever nos seus contratos que o consumidor só faz jus a receber a

devolução simples do que pagou (e não em dobro) estará redigindo cláusula

nula, inválida.

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A transferência de responsabilidade a terceiro é outra proibição fixada no rol das

cláusulas ilícitas. O sistema de responsabilidade do CDC é objetivo e contempla,

como regra, a solidariedade dos participantes da cadeia de consumo. Não é

permitido ao fornecedor tentar, por contrato, transferir alguma sua

responsabilidade a terceiro, qualquer que seja ele, alheio à relação.

Outra proibição é a de criar obrigações iníquas (desiguais), abusivas, que

deixem o consumidor em desvantagem exagerada (inc. IV). A perda total do

valor pago, em caso de atraso no embarque do consumidor de transporte aéreo,

a permissão de que em caso de inadimplemento o banco possa sacar todos os

valores da conta corrente do consumidor, são exemplos de situações que, se

previstas em contrato, caracterizam o abuso.

A inversão do ônus da prova, direito básico do consumidor não pode ser

utilizada contra ele. O legislador proibiu, no inciso VI, que ‘o feitiço’ vire contra o

consumidor. Se, como dissemos, a prova em matéria de consumo está

normalmente ao alcance do fornecedor, criar cláusula onde o consumidor deve

ser o responsável pela produção da prova criaria entraves intransponíveis para

sua proteção e defesa.

No inciso VII, o legislador proibiu que a arbitragem seja compulsoriamente

utilizada. Esse inciso sofre críticas em relação à sua redação, pois a arbitragem

para ser válida deve ser sempre um procedimento voluntário. Se houver

imposição à sua participação, haverá vicio de consentimento e nulidade.

A arbitragem, ainda sem tradição no direito do consumidor brasileiro, foi criada

pela Lei 9.307/96. Através do procedimento arbitral, as parte podem afastar a

decisão de determinado caso concreto da apreciação do poder judiciário.

As partes submetem seus casos a árbitros por elas escolhidos que têm poder

para proferir a decisão. Os árbitros são normalmente dotados de conhecimento

técnico no assunto sobre o qual devem decidir.

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Essa é uma vantagem em relação ao poder judiciário onde causas de milhões

de reais são muitas vezes postas à decisão de um magistrado que desconhece

por completo o tema. Outra vantagem da arbitragem é a rapidez. O laudo arbitral

deve ser proferido, no máximo, em 6 meses. Frente à morosidade que eterniza

causas no Judiciário brasileiro, a arbitragem, se difundida, pode significar

alternativa eficiente aos litígios.

Em seguida (inc. VIII), a proibição recai sobre a imposição de representante para

concluir outro negócio jurídico, em nome do consumidor. Essa situação é

conhecida como ‘cláusula mandato’. Na hipótese, o consumidor confere um

mandato (autoriza) outrem a realizar algum negócio que não é objeto do contrato

em seu nome.

Se em determinado contrato de empréstimo for inserida cláusula que autoriza o

fornecedor a sacar letras de câmbio em nome do consumidor para saldar o

débito, estaremos diante da situação vedada no inciso VIII.

A conclusão do contrato é premissa da contratação. Entretanto, se houver

cláusula contratual prevendo que o fornecedor poderá não cumprir com sua

parte, o mesmo direito deve ser conferido ao consumidor. Trata-se de regra que

busca equilibrar o contrato. Se o fornecedor de serviços não executar cem por

cento do contrato, é evidente que o fornecedor não deverá pagá-lo

integralmente.

A variação unilateral do preço por contrato, também é proibida (inc. X). Uma vez

aprovado o orçamento ou assinado o contrato, não se admite variação de preço

imposta pelo fornecedor; do contrário, a estabilidade contratual estaria

completamente ameaçada.

Vale dizer que esse inciso não proíbe cláusula contratual que preveja reajuste

condicionado a determinado índice oficial. O que está vedado é que o fornecedor

preveja que, a seu critério e a depender de causas externas, haverá variação no

preço já pactuado.

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Se há pouco vimos que o fornecedor não pode se conceder o direito de não

concluir suas obrigações, sem que igual direito seja dado ao consumidor, no

inciso XI, o legislador previu outra regra de equilíbrio que permite a ambos

rescindir o contrato unilateralmente. Exemplo bastante comum dessa regra está

prevista no contrato de conta corrente. Tanto consumidor quanto a instituição

financeira podem, a qualquer tempo e unilateralmente rescindir esse contrato.

É bastante comum que os contratos prevejam consequências, em caso de

inadimplemento; uma delas é o ressarcimento das despesas de cobrança. Se

uma das partes dá causa ao inadimplemento e a outra acaba arcando com

despesas para cobrá-la poderá repassar tais despesas, desde que esse direito

seja uma via de mão dupla. Qualquer das partes (consumidor ou fornecedor)

pode cobrar da outra esse tipo de despesa; todavia, se houver cláusula

prevendo que apenas o fornecedor pode repassar e cobrar tais despesas ela

será abusiva (inc. XII).

As premissas de boa-fé e da vinculação dos contratos de consumo estão

espraiadas pelo CDC; é nesse sentido que o inc. XIII reforça ao proibir que o

fornecedor insira em seus contratos de consumo cláusulas que lhe permitam

modificar o contrato de maneira unilateral, mesmo após assinado. Uma vez

firmado o contrato, este só pode ser modificado por consenso das partes e

jamais por decisão unilateral de uma delas.

Apesar de estarmos estudando regras do Código do Consumidor, o legislador

também fez referência à proteção ao meio ambiente (inc. XIV). Desse modo,

cláusulas em contrato de consumo que sejam contrárias a normas ambientais

são ilícitas (abusivas).

No início do exame do artigo 51, afirmamos o rol de cláusulas abusivas. Pois

bem, no inc. XV, há uma regra que, apesar de tratar do assunto - direito do

consumidor - vai muito além do próprio Código.

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Sabemos que existem inúmeras leis que tratam de proteção ao consumidor. Leis

federais, estaduais e municipais, além de um sem-número de normas infra-

legais.

Todo esse conjunto normativo pertence a um Sistema de Defesa do

Consumidor. Se uma cláusula contratual em contrato de consumo contrariar

esse sistema (que vai além do CDC) será considerada abusiva. Desse modo, se

em um contrato de adesão o fornecedor escrever que seus consumidores abrem

mão de um serviço de SAC, nos termos do decreto federal 6.523/08, estará

criando cláusula que não contraria o CDC diretamente, pois não há nenhum

artigo no CDC sobre SAC, mas haverá contrariedade ao Sistema de Defesa do

Consumidor.

No inc. XVI, a abusividade reside no fato de o consumidor renunciar ao seu

direito de ser indenizado, caso realize benfeitorias necessárias no imóvel. Esse

inciso é aplicável a contratos de locação imobiliária e deriva da própria lei do

inquilinato (8.245/91). Como as benfeitorias necessárias são de

responsabilidade do proprietário, caso o inquilino as realize pode cobrá-las. O

que o CDC proíbe é que o fornecedor faça com o que o consumidor renuncie a

esse direito de ser indenizado.

No inciso IV, vimos que o estabelecimento de obrigações, iníquas ou que

coloquem o consumidor em desvantagem exagerada são consideradas

abusivas. Pois bem, mas quando poderemos saber se o consumidor está em

situação contratual de desvantagem?

A resposta está no §1º, do art. 51.

Nesse artigo, estão as chamadas presunções de exagero de vantagem. O

legislador aponta uma direção ao intérprete da lei para que , diante das

situações concretas, ele possa concluir se o consumidor está ou não sofrendo

abuso, através do instrumento contratual.

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Estão entre as situações de vantagens presumidas, como exageradas, aquelas

que ofendem os princípios do Sistema de Defesa do Consumidor, as que

restringem direitos ou obrigações que ameacem o equilíbrio contratual, as que

se mostrem excessivamente onerosas, dentre outras.

Vale lembrar que, caso uma cláusula contratual seja declarada nula pelo

magistrado, isso não importa em nulidade de todo o contrato (art. 51, §2º), a

menos que ao reconhecer a nulidade o contrato crie ônus excessivos para

qualquer das partes.

Consumidores e entidades representativas de seus direitos podem pleitear que o

Ministério Público ajuíze ação, pedindo a declaração de nulidade de cláusula

contratual (art. 51, §4º).

Concessão de Crédito ou Financiamento

Dentro do tema proteção contratual, o legislador definiu quais são as

informações mínimas obrigatórias a serem repassadas para o consumidor de

crédito.

Mais uma vez o legislador focou no direito à informação como forma de evitar

conflitos e oferecer subsídios suficientes ao consumidor para que ele decida, de

forma consciente e racional, com qual fornecedor pretende contratar; se

contratará um financiamento, tomará crédito, ou se prefere pagar à vista.

O preço em moeda corrente nacional é a primeira informação exigida; além do

preço o montante dos juros de mora (por atraso no pagamento) e da taxa de

juros anual. Se houver acréscimos legalmente previstos, estes também deverão

ser informados; além disso, o número e a periodicidade das prestações; por fim,

o valor total a pagar com e sem financiamento.

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Vale dizer que essas são as informações mínimas exigidas. Além delas, o

regulador exige, por exemplo, que o credor informe o CET (Custo Efetivo Total)

da operação.

O momento em que essas informações devem ser repassadas ao consumidor

também está previsto no art. 52 – previamente. De nada adianta informar o

consumidor sobre todos estes dados da operação após a assinatura do contrato,

pois, conforme vimos, o art. 46 prevê que se as informações não foram

repassadas ao seu destinatário elas não o obrigam.

O legislador consumerista também tratou de limitar as multas de mora (por

atraso) ao teto de 2%. Apesar de a regra estar prevista dentro do CDC, no tema

outorga de crédito e concessão de financiamento, a jurisprudência brasileira já

se posicionou no sentido de que essa regra se aplica a todos os contratos de

consumo, com previsão de multa, em caso de atraso no pagamento (art. 52,

§1º).

Liquidação Antecipada

Ao consumidor que pretende liquidar antecipadamente seu empréstimo, ou

mesmo para quem antecipe parte das prestações, fica assegurada a redução

proporcional de juros e demais acréscimos (art. 52, §2º).

Para fazer jus à liquidação antecipada, o consumidor deve procurar a Instituição

Financeira e solicitar o valor do saldo devedor para quitação antecipada. Essa

informação deve ser dada por meio de uma planilha de cálculo que possibilite,

de forma simples e clara, a conferência da evolução da dívida.

O Banco Central do Brasil definiu na Resolução CMN 3.516/07, como trazer a

valor presente os pagamentos, para fins de amortização ou de liquidação.

Em contrato de compra e venda de móveis ou imóveis não é lícito ao fornecedor

pactuar a perda integral de prestações pagas, caso retome o bem em

decorrência da falta de pagamento (art. 53).

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88

Com a retomada do bem, abre-se para o credor a possibilidade de revendê-lo,

muito embora esse ato acabe ocorrendo em leilões onde não se aplica o preço

de mercado da coisa; o legislador entendeu por bem conferir algum equilíbrio à

relação para que o consumidor não fique sem o bem e ainda perca todas as

prestações pagas.

Não há um percentual ‘justo’ de devolução das prestações pagas pré-fixado. É

preciso avaliar em cada caso, qual o montante pago, prejuízos que o

inadimplente causou ao credor etc.

Caso o consumidor adira a contratos em sistema de consórcio de bens duráveis

e desista de sua quota, é permitido ao administrador do consórcio descontar a

vantagem econômica que o consumidor teve com a fruição do bem

(evidentemente, se já o recebeu) e os prejuízos causados ao grupo de consórcio

(art. 53, 2º).

Ao final do capítulo VI, o legislador conceituou a base formal da maioria

esmagadora das relações de consumo – o contrato de adesão (art. 54).

Nesse artigo 54, consta que contrato de adesão pode ser tanto aquele aprovado

pela autoridade competente ou estabelecido unilateralmente pelo fornecedor.

Em nosso país, não existe a hipótese em que os contratos de adesão, antes de

serem colocados no mercado, recebam análise e aprovação de alguma

autoridade competente. Ficamos apenas com a segunda hipótese.

O que realmente marca esse tipo de contrato é que uma das partes elabora o

documento (fornecedor) e a outra (consumidor) apenas adere sem discutir ou

modificar o conteúdo. É por isso que o Código possui tantas regras de proteção

ao consumidor em todas as fases da relação. Em muitos casos, o consumidor

possui apenas duas opções: dizer ‘sim’ ou ‘não’. Em outros tantos, como em

serviços públicos (energia elétrica, água e esgoto) sequer há alternativa, ou o

consumidor diz sim, ou fica sem o serviço.

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89

É até possível que individualmente o consumidor consiga influir e inserir esta ou

aquela cláusula no contrato, entretanto isso não descaracteriza o contrato como

sendo de adesão (ou por adesão), conforme se depreende do §1º ,do art. 54.

A clareza de informações é exigida em todas as relações de consumo. Nos

contratos não é diferente. Sua redação deve primar pela utilização de linguagem

clara, caracteres ostensivos (visíveis), nunca inferior ao corpo doze. Qualquer

cláusula que implique limitação de direito deverá constar em destaque no

contrato para que o consumidor imediatamente a identifique (art. 54, §§ 3º e 4º).

Como exemplo de limitação de direito em contrato de adesão, podemos

mencionar a cobertura parcial de uma garantia contratual. Como regra, o

consumidor tem expectativa legítima de que a garantia contratual cobre todo o

produto adquirido em caso de vício, entretanto, às vezes, o fabricante exclui

determinados itens. Essas limitações ou exclusões devem ser destacadas no

contrato.

Das Sanções Administrativas

A violação das regras de consumo sujeita os fornecedores a determinados tipos

de sanções. A mais comum é a sanção de natureza civil que na maioria das

vezes consiste na reparação do dano sofrido pelo consumidor. Além disso,

também é possível que o fornecedor seja punido administrativamente e, em

casos mais graves (crime contra as relações de consumo), a sanção também

pode ser de natureza penal.

São doze as sanções administrativas previstas no Código do Consumidor e elas

podem ser aplicadas cumulativamente entre si. Ou seja, uma multa pode ser

aplicada juntamente com uma interdição ou apreensão de produto.

Como as sanções são de cunho administrativo, podem ser aplicadas por órgãos

administrativos. Esses órgãos são os órgãos públicos da administração pública

federal, estadual ou municipal que tenham por missão institucional a defesa do

consumidor.

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90

Em nível federal, temos a SENACON (Secretaria Nacional do Consumidor).

Essa Secretaria de Estado foi recém-criada (em maio de 2012). Antes dela,

tínhamos o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), que

continua existindo e fazendo parte da SENACON. Com a criação da Secretaria,

o governo brasileiro deixa claro que está interessado e preocupado com as

relações de consumo e com a proteção ao consumidor brasileiro.

Essa Secretaria de Estado é responsável por Coordenar a Política do Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor (art. 106). Dentre suas atribuições, estão

planejar, elaborar, propor, coordenar e executar a política nacional de proteção

ao consumidor; receber, analisar, avaliar e encaminhar consultas, denúncias ou

sugestões; prestar orientação aos consumidores sobre seus direitos e garantias;

solicitar o concurso de órgãos e entidades da União, Estados, do Distrito Federal

e Municípios, bem como auxiliar a fiscalização de preços, abastecimento,

quantidade e segurança de bens e serviços, dentre outras.

Além disso, a SENACON e os Procons estaduais e municipais podem fiscalizar

as relações de consumo e aplicar as sanções administrativas previstas no CDC.

Em princípio, qualquer violação das regras do CDC sujeita o fornecedor às

sanções administrativas do art. 56.

A primeira sanção no rol do art. 56 é a de multa (inc. I). Diferente das demais

sanções que necessitam de determinados requisitos para serem aplicadas,

conforme veremos adiante, a multa pode ser imposta em qualquer caso de

violação das regras do CDC.

A multa também possui seus limites e diretrizes gerais de cálculo (dosimetria)

previstas no CDC (art. 57). Ela deve ser calculada levando-se em consideração

três fatores:

a) gravidade da infração;

b) vantagem auferida; e

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91

c) condição econômica do fornecedor.

A gravidade da infração é critério de justiça e equilíbrio da penalidade.

Seguramente, infrações menos graves devem ser apenadas com multas

menores do que infrações mais leves. Deixar de prestar uma informação ao

consumidor não pode resultar em uma sanção mais grave do que causar um

acidente de consumo que leve consumidores a óbito.

A vantagem auferida, critério de difícil apuração prática, é a vantagem que o

fornecedor conseguiu angariar ao praticar determinada infração. Se ele se

beneficiou com a infração, esse critério também deve ser levado em conta, para

que eventual lucro obtido em detrimento do consumidor não faça com que a

multa seja insignificante do ponto de vista econômico.

A condição econômica do fornecedor deve ser considerada para a fixação da

multa, pois se for demasiadamente baixa em relação ao poder econômico da

empresa não terá o poder de desestimular que o ilícito seja repetido. De outro

lado, se for em montante muito elevado poderá arruinar a empresa e passar a

ter cunho confiscatório, além de desproporcional.

O dinheiro arrecadado com pagamento das multas não reverte em proveito

(direto) do consumidor, mas deve ser direcionado aos Fundos de Direitos difusos

da União. Estado ou Município, conforme o órgão que aplicou a sanção (art. 57).

Os limites mínimo e máximo da multa são: de 200 até três milhões de Unidades

Fiscais de Referência (Ufir). Como a Ufir foi extinta no ano de 2000, o DPDC

passou a basear as multas no IPCA do IBGE. A multa mínima é hoje de R$

400,00 e a máxima chega a R$ 6 milhões.

Há pouco dissemos que a multa é a única sanção que pode ser aplicada

independentemente de condições. Qualquer violação das regras do CDC sujeita

o fornecedor à sua aplicação.

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Seja o desrespeito ao direito de informação, deixar de reparar produtos com

vícios, valer-se de práticas ou cláusulas abusivas, deixar de entregar o contrato

ao consumidor etc, todas essas condutas são consideradas práticas infrativas.

No art. 58, está um grupo de sanções que, para que possam ser aplicadas

dependem da ocorrência de vícios de qualidade, quantidade ou insegurança.

São elas: apreensão, inutilização, proibição de fabricação, suspensão de

fornecimento, cassação do registro do produto e revogação da concessão ou

permissão de uso.

No art. 59, o legislador reuniu um outro grupo de sanções que dependem de um

requisito diferente: a reincidência em práticas infrativas de maior gravidade.

Essas sanções são: cassação de alvará, interdição e suspensão temporária de

atividade e intervenção administrativa.

Em qualquer caso, a sanção administrativa só poderá ser aplicada mediante

processo em que seja garantida ampla defesa ao autuado.

Caso a prática infrativa seja de publicidade enganosa ou abusiva a sanção mais

adequada é a de contrapropaganda (art. 60). A contrapropaganda deve ter o

efeito de desfazer o malefício causado pela publicidade ilícita. Assim, se ela

causou um engano, a afirmação falsa deve ser desmentida, caso se trate de um

abuso ele deve ser reparado.

A forma de divulgação da contrapropaganda deve obedecer à mesma da

publicidade original, com a mesma frequência, preferencialmente no mesmo

veículo de comunicação, mesmo local, espaço e horário. Sempre com o intuito

de desfazer o malefício da publicidade ilegal (art. 60, §1º).

Outro aspecto relevante em relações às sanções administrativas é que, além da

possibilidade de serem aplicadas cumulativamente (multa e contrapropaganda),

também podem ser aplicadas de forma cautelar e antecedente (art. 56,

parágrafo único).

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Imaginemos que durante um ato fiscalizatório os fiscais detectem a

comercialização de alimentos com prazo de validade expirado e outros

visivelmente deteriorados. Nessa situação, não seria adequado que os agentes

aplicassem uma multa no fornecedor e permitissem que os produtos

continuassem nas prateleiras. Esse tipo de situação enseja a aplicação cautelar

e incidente (antes mesmo da instauração do processo) de uma sanção de

apreensão e/ou inutilização dos produtos.

O mesmo se dá em uma fiscalização que constata a adulteração em

combustíveis. Se o estado permite a continuidade da comercialização, aplicando

apenas uma multa, ou se fosse necessário aguardar a conclusão do processo

para lacrar as bombas e apreender o produto, os consumidores continuariam

sendo lesados. Cautelar e de forma incidente, lacram-se as bombas de

combustível e apreende-se o produto adulterado.

Sistema Nacional de Defesa do Consumidor

No tema das sanções administrativas, dissemos que os órgãos administrativos

de defesa do consumidor são os responsáveis por processar

administrativamente os fornecedores, em caso de violação das regras do CDC.

Mas será que somente esses órgãos integram o Sistema Nacional de Defesa do

Consumidor (SNDC)? Na verdade não.

O SNDC é composto pelos órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e

municipais de defesa do consumidor e também pelas entidades civis de defesa

do consumidor (art. 105).

Mas não são apenas esses os integrantes do Sistema. Aqueles que o legislador

chamou impropriamente de ‘instrumentos’, no art. 5º, do Código, também

somam esforços na proteção do consumidor. Além destes, as Defensorias

Públicas também atuam fortemente na proteção dos interesses dos

consumidores.

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As promotorias de justiça do consumidor, as delegacias especializadas em

crimes contra as relações de consumo, as varas especializadas em resolver

conflitos de consumo, todos eles integram o SNDC.

Uma questão que frequentemente surge é se as Agências Reguladoras também

compõem o sistema de defesa dos Consumidores. A resposta é negativa. As

agências reguladoras, a exemplo do Banco Central, muito embora possam

regular condutas, fiscalizar e punir empresas que são fornecedores de produtos

e serviços nos termos do CDC, não possuem o foco de atuação nas relações de

consumo, em sentido estrito, mas na atuação competitiva das empresas e no

risco sistêmico (no caso do BACEN). Seu foco em regulação de mercado não

visa diretamente às relações de consumo, embora indiretamente isso aconteça.

A atuação popularmente mais conhecida dos órgãos do Sistema de Defesa do

Consumidor é a dos Procons. Nesses órgãos os consumidores levam suas

queixas de consumo, recebem orientações e têm seus conflitos intermediados

perante os fornecedores.

A relação entre a SENACON e os Procons estaduais é de coordenação, ou seja,

o órgão federal não determina o que os órgãos estaduais e municipais devam

fazer. Como integrador do Sistema, o órgão federal dialoga com os órgãos e

propõe caminhos para uma política nacional.

Existem hoje no País aproximadamente oitocentos órgãos de defesa do

consumidor entre Procons estaduais e municipais, defensorias públicas e

demais integrantes do sistema.

A SENACON também centraliza as informações do Cadastro Nacional de

Reclamações Fundamentadas através do SINDEC (Sistema Nacional de

Informações de Defesa do Consumidor). O órgão federal recebe dos estados e

municípios conveniados os dados de demandas e reclamações de consumo e os

divulga anualmente, de forma consolidada, conforme manda o art. 44 do CDC.

Page 95: Apostila módulo II correspondente bancário veic

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Crimes Contra as Relações de Consumo

Se a princípio, as sanções administrativas podem ser aplicadas em qualquer

violação das regras de consumo, o mesmo não acontece com as sanções

penais.

Justamente por tratar-se de condutas (e penas) mais graves, as sanções penais

são reservadas para determinados casos.

É verdade que determinadas condutas sujeitam o infrator a pagar indenização

ao consumidor, ser apenada administrativamente com multa, além da aplicação

da sanção penal.

A publicidade enganosa ou abusiva e a exposição à venda de produtos vencidos

são situações em que a mesma conduta pode repercutir nas três esferas de

responsabilidade.

Os crimes contra as relações de consumo previstos no CDC não são os únicos

crimes envolvendo consumo na legislação brasileira. A Lei 8.137/90 que define

crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo,

também contém tipos penais. A exposição para a venda de produtos com

validade vencida, por exemplo, não está prevista no CDC como crime, mas

nessa lei que acabamos de comentar.

A maior parte dos quinze tipos penais contra as relações de consumo, previstos

no CDC, são apenados com detenção de seis meses a dois anos e multa.

Outros com detenção de três meses a um ano e multa a depender da gravidade

da infração, ou mesmo com detenção de um a seis meses, ou multa em casos

de crimes culposos (praticados sem intenção).

A apuração de condutas de natureza criminal pode ser feita pela polícia judiciária

e o inquérito policial deve ser remetido ao Ministério Público para que dê início

ao processo crime contra o acusado.

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No entanto, o Ministério Público sempre poderá instaurar processo e conduzir as

investigações independentemente do inquérito policial.

A omissão de sinais ou dizeres ostensivos sobre nocividade ou periculosidade

de produtos e serviços nas embalagens, invólucros, recipiente ou publicidade é o

primeiro crime previsto no CDC (art. 63 e §1º).

Como a ausência dessas informações pode ocasionar acidentes de consumo

com lesões físicas e até mesmo a morte, em alguns casos, é prudente que tal

conduta tenha previsão criminal no CDC.

Caso o fornecedor descubra a periculosidade ou nocividade do produto,

somente após sua colocação no mercado, deve comunicar o fato às autoridades

e aos consumidores (art. 10). Realizar o chamamento é dever do fornecedor e

uma das consequências da desobediência a essa regra é a sanção penal (art.

64).

Caso haja determinação da autoridade competente para a retirada dos produtos

perigosos do mercado e o fornecedor não atenda à determinação, também

incorrerá em crime (art. 64, parágrafo único).

Caso o serviço a ser executado pelo fornecedor possua alto grau de

periculosidade e haja determinação de autoridade sobre a forma de sua

execução ou proibição, o fornecedor também fica sujeito a responder processo-

crime (art. 65). Como a simples execução do serviço perigoso é capitulada como

crime. Há aí o chamado perigo abstrato para a sociedade e para os

consumidores. Caso a realização do serviço culmine em lesão corporal ou

morte, esses crimes também serão apurados e os responsáveis punidos (art. 65,

parágrafo único).

A violação do direito de informação que consiste em fazer afirmação falsa ou

enganosa, omitir informação relevante sobre preço, qualidade, desempenho,

quantidade e segurança também colocam o fornecedor em situação de sujeito

passivo em processos-crime.

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Sempre lembrando que, no aspecto criminal, responde pelo crime a pessoa que

fez a firmação falsa. A responsabilidade penal é pessoal, aliás, personalíssima.

Enquanto na infração administrativa a multa decorrente de um ato ilícito de um

funcionário ou preposto recai sobre a pessoa jurídica, no crime a pena é

aplicada na pessoa que praticou a infração.

A publicidade enganosa e a abusiva também foram criminalizadas (art. 67).

Assim, além da eventual reparação de danos aos consumidores lesados, da

multa administrativa e da sanção de contrapropaganda ainda é possível que

recaia sobre o fornecedor uma acusação de prática de crime contra as relações

de consumo.

Curiosamente, o legislador separou em dois artigos diferentes a prática de

publicidade abusiva. No artigo 67, a lei apena com detenção de três meses a um

ano quem pratica publicidade enganosa ou abusiva e, no artigo 68, quem

comete publicidade abusiva de forma a induzir o consumidor a se comportar de

forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança recebe pena maior – de

seis meses a dois anos e multa.

A atenção do legislador para a publicidade não parou por aí. Ignorar a obrigação

imposta ao fornecedor de organizar dados fáticos, técnicos e científicos (art. 36,

parágrafo único) também tornou-se crime, conforme se verifica no art. 69.

Os serviços de reparo de produtos realizados com peças de reposição e

componentes não originais também fazem parte do rol de crimes contra as

relações de consumo. As peças recondicionadas ou simplesmente as usadas

podem colocar a vida dos consumidores em risco, principalmente quando

instaladas em automóveis ou motocicletas e por isso ganhou artigo especial (art.

70).

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Cobranças de dívidas ameaçadoras, realizadas mediante constrangimento físico

ou moral, além de procedimentos que exponham o consumidor a ridículo ou

interfira em seu trabalho, descanso ou lazer de forma injustificada, também

mereceu a alcunha de crime (art. 71).

Os dois artigos seguintes tratam de infrações penais cometidas por violações a

direitos ligados a bancos de dados. A primeira é dificultar o acesso do

consumidor a bancos de dados e a segunda deixar de corrigir imediatamente

informações inexatas sobre o consumidor (arts. 72 e 73).

Por fim, a situação mais corriqueira nas relações de consumo e que

provavelmente seja denunciada às autoridades: a conduta de deixar de entregar

o termo de garantia preenchido ao consumidor também se tornou crime. À

primeira vista, essa conduta parece ter pouca relevância para merecer ganhar

um tipo penal, entretanto aos olhos do legislador, por ser capaz de inviabilizar o

direito ao exercício da garantia contratual, ela também se tornou criminosa (art.

74).

Serviço de Atendimento ao Consumidor - SAC

O serviço de atendimento ao consumidor, realizado por telefone, foi oficialmente

criado em nosso país com a entrada em vigor do Dec. Federal 6.523/08.

Apesar de ser uma norma que regulamenta o Código do Consumidor, o decreto

do SAC não atinge todos os fornecedores previstos no art. 3º, do CDC. Foi feito

um recorte de modo que a norma incide apenas sobre os serviços regulados

pelo Poder Público Federal (art. 1º).

Desse modo, estão fora da aplicação do decreto todos os fornecedores de

produtos e os fornecedores de produtos ou serviços que não tenham suas

atividades reguladas pelo Poder Público Federal.

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Para facilitar a identificação dos prestadores de serviços sujeitos à incidência do

decreto do SAC, sugerimos que você verifique se esse fornecedor sujeita-se à

regulação, ou seja, se há alguma agência reguladora disciplinando suas

atividades.

Seguem alguns exemplos de fornecedores sujeitos ao SAC e suas respectivas

agências reguladoras: transporte aéreo (ANAC); energia elétrica (ANEEL),

serviços financeiros (BACEN); telefonia (ANATEL); saúde suplementar (ANS);

transporte terrestre (ANTT).

O decreto do SAC possui, como vimos, incidência sobre determinados

fornecedores (prestadores de serviços regulados) e assuntos específicos, ou

âmbito de aplicação.

A finalidade do SAC é resolver as demandas dos consumidores sobre

informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento de contratos e de

serviços (art. 2º).

Como a oferta e a contratação de serviços estão fora do objetivo do decreto, é

permitido que os fornecedores mantenham canais telefônicos onerosos com

finalidade comercial. Além disso, em relação às instituições financeiras, os

canais telefônicos de prestação de serviços (consulta de saldos, realizações de

transações, transferências etc) continuam existindo e a chamada pode ser

custeada pelo consumidor.

O decreto veio para ampliar o acesso dos consumidores diretamente aos canais

de atendimento dos fornecedores.

Acessibilidade do Serviço

Em matéria de acessibilidade do SAC as regras são (arts. 3º ao 7º):

Gratuidade: as chamadas para o SAC devem ser gratuitas.

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A norma não determina que a gratuidade deva ser através de telefone tipo

“0800”, embora parte dos prestadores de serviços se utilize desse número.

As empresas de telecomunicações possuem à sua disposição números de

telefone com numeração diferente do 0800 com custo da chamada bem inferior.

Até mesmo chamadas a cobrar podem ser utilizadas para cumprir com a regra

da gratuidade. Importante é retirar o ônus de o consumidor pagar para reclamar

de um serviço mal prestado. As chamadas podem ser efetuadas de terminais

fixos, móveis ou públicos, aí a gratuidade se mantém.

Uma das dificuldades enfrentadas pelos consumidores quando ligavam para os

fornecedores era conseguir falar com um atendente. Menus intermináveis

desviavam o consumidor para outros menus que não levavam à nada.

No intuito de facilitar a vida do consumidor, o SAC deve garantir, no primeiro

menu, opções de contato com o atendente (que também deve ser garantido em

todas as subdivisões do menu), reclamação e cancelamento.

Consta do decreto até mesmo uma proibição de desligar o telefone ‘na cara’ do

consumidor. Uma regra de educação que virou jurídica. A regra visa tentar

impedir que a chamada ‘caia’, antes da conclusão do atendimento e o

consumidor seja obrigado a fazer nova chamada.

Outra regra que veio para facilitar o acesso ao atendente, impede que o

atendimento seja condicionado ao fornecimento de dados pelo consumidor. Note

que nos canais transacionais ou de relacionamento das instituições financeiras,

o consumidor só tem acesso à sua conta, após identificar-se mediante senha.

Essa regra (de segurança) não se confunde com o regulamento do SAC.

Uma vez que o consumidor opte por falar com o atendente, também não poderá

ser submetido a esperas intermináveis. O decreto delegou para norma

específica fixar esse tempo máximo de espera. A regra específica é a Portaria

2.014/08 do Ministério da Justiça que estabeleceu que esse tempo máximo de

espera para falar com o atendente é de sessenta segundos.

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No caso dos serviços financeiros, o tempo máximo de espera é de quarenta e

cinco segundos. Já nos dias considerados de pico (segundas-feiras, nos dias

que antecedem e sucedem feriados e no 5º dia útil de cada mês) o tempo

máximo é de até noventa segundos.

A continuidade no funcionamento do SAC foi outra deliberação governamental.

Vinte e quatro horas por dias, sete dias por semana o SAC deve estar operando.

É bem verdade que o próprio decreto fez ressalvas a essa regra. Elas também

estão na Portaria 2.014 que mencionada anteriormente.

As exceções são: caso o serviço ofertado não esteja disponível para fruição ou

contratação, vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana; o SAC

destinado ao serviço de transporte aéreo, não regular, de passageiros e em TV

por assinatura com até cinquenta mil assinantes.

Pessoas com deficiência auditiva ou de fala tem preferência de atendimento no

SAC e as empresas podem destinar-lhes número específico.

A divulgação do SAC deve estar presente em todos os documentos impressos

entregues ao consumidor no ato e durante a contratação; além disso, deve estar

presente na página eletrônica do fornecedor.

Para evitar transferências e redirecionamentos de chamada, o decreto também

prevê que caso a empresa ou grupo empresarial ofereça diversos serviços

conjuntamente, o consumidor terá acesso a canal único para que possa ser

atendido em relação a qualquer dos serviços prestados pela empresa.

Da Qualidade do Atendimento (Arts. 8º ao 14)

Tal qual o CDC prevê comandos principiológicos, o decreto do SAC também os

previu.

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Dignidade, boa-fé, transparência, eficiência, eficácia, celeridade e cordialidade

são os mandamentos que regem todas as demandas no SAC.

A capacitação é outro ponto de atenção fundamental e que afeta diretamente a

resolutividade das questões levadas ao SAC. Atendentes bem preparados e

conhecedores dos serviços prestados pela empresa têm maior chance de

conferir atendimento adequado e dar o melhor encaminhamento para a

demanda.

Em caso de reclamação e cancelamento, o atendente não poderá transferir a

chamada do consumidor. Nos demais casos (de informação por exemplo), o

atendente pode transferir a chamada para o setor competente para que este dê

atendimento definitivo ao caso, prestando a informação correta. Quando

permitida, a transferência deve ser efetuada, em até 60 segundos.

É fácil entender a motivação governamental para proibir a transferência da

chamada em caso de reclamação ou cancelamento. Presumiu-se que nessas

situações o consumidor seria transferido e não teria seu problema resolvido.

Entretanto, perdeu-se a oportunidade de, com uma transferência, resolver o

problema do consumidor na mesma chamada ao invés de sujeitá-lo a esperar 5

dias úteis para solucionar a demanda.

O acesso ao histórico do consumidor é outra determinação governamental que

visa inibir repetições e aborrecimentos. Uma vez que os atendentes devam ter

acesso ao histórico das demandas do consumidor, mesmo que a chamada

venha a ser interrompida, ou nos casos de transferência, o consumidor não

precisa repetir toda a história que já contou ao atendente que o atendeu, em

primeiro lugar.

No caso de chamadas onerosas ao consumidor, já sabemos que por força do

art. 33, parágrafo único, do Código do Consumidor, não se permite. Já no SAC,

a publicidade consentida pelo consumidor é permitida durante a espera.

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Do Acompanhamento de Demandas (arts. 15 e 16)

Além de acessar o SAC, registrar suas reclamações e solicitar informações ou

cancelamentos, o consumidor também tem o direito de acompanhar as

demandas que originou neste canal.

O registro numérico (ou protocolo) é o primeiro instrumento que possibilita ao

consumidor acompanhar a sua demanda junto ao fornecedor. O protocolo é a

prova do contato com o fornecedor; deverá possuir sequência numérica única e

fornecido logo no início da chamada. O registro numérico acompanhado de data,

hora e objeto da demanda deve ser encaminhado ao consumidor, se ele assim o

desejar, seja por correspondência ou meio eletrônico a sua escolha.

Esse registro de atendimento deve ser guardado pelo fornecedor por, no

mínimo, dois anos após a solução da demanda e deve permanecer acessível ao

consumidor e aos órgãos fiscalizadores.

Caso o consumidor solicite acesso ao histórico das demandas, deverá recebê-

las em até setenta e duas horas.

A gravação das chamadas também deve ser realizada pelos fornecedores e

guardadas por, no mínimo, noventa dias. Caso o consumidor queira ter acesso à

gravação, também possui esse direito.

Do Procedimento para a Resolução de Demandas (art. 17)

Demandas relativas a pedidos de informação devem ser resolvidas no ato,

entretanto as reclamações têm prazo de até cinco dias úteis, a contar do registro

para serem resolvidas.

É obrigatório dar um retorno ao consumidor sobre a solução de sua demanda e

caso ele solicite receberá comprovação do fato por correspondência ou meio

eletrônico. Essa resposta deve ser clara, objetiva e abordar todos os pontos da

demanda. Respostas evasivas ou que nada dizem, não são aceitas.

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Caso o consumidor entre em contato com o SAC para reclamar de cobrança

indevida ou serviço que não solicitou, o fornecedor deve suspender a cobrança

imediatamente a menos que consiga desde logo indicar o instrumento (contrato

ou a solicitação do serviço) que justifique a cobrança.

Do Pedido de Cancelamento do Serviço (art. 18)

Os pedidos de cancelamento de serviços devem ser processados de imediato e

deve ser assegurado por todos os canais onde o consumidor pode efetuar a

contratação. Se o fornecedor oferece a contratação de empréstimo por telefone

deverá permitir o distrato por essa mesma via.

O pedido de cancelamento deve ser prontamente atendido e processado mesmo

que haja inadimplemento contratual do consumidor, e sua comprovação enviada

a ele. Com isso, buscou-se evitar que o consumidor permaneça preso ao

contrato enquanto o montante da dívida cresce em função do atraso no

pagamento.

Por fim, e como era de se esperar, o próprio decreto do SAC prevê que as

violações de suas regras sujeitam os fornecedores às sanções do Código do

Consumidor.