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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS UFSCar BACHARELADO EM LINGUÍSTICA DISCIPLINA: COMUNICAÇÃO E ESPAÇO PÚBLICO FÓRMULAS DISCURSIVAS PROFª DRª LUCIANA SALAZAR SALGADO “Acessibilidade”: um baú de ‘boas intenções’ desgovernadas Aluno (a): Maria Eugênia Carvalho | R.A.: 603139 Candidato à fórmula discursiva: ACESSIBILIDADE Fevereiro 2017 São Carlos

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Page 1: “Acessibilidade” um baú de ‘boas intenções’ desgovernadas · Acessibilidade foi aprovada em dezembro de 2000, podemos supor que, tempos antes, esse tema já estava em debate

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS – UFSCar

BACHARELADO EM LINGUÍSTICA

DISCIPLINA: COMUNICAÇÃO E ESPAÇO PÚBLICO –

FÓRMULAS DISCURSIVAS

PROFª DRª LUCIANA SALAZAR SALGADO

“Acessibilidade”:

um baú de ‘boas intenções’ desgovernadas

Aluno (a): Maria Eugênia Carvalho | R.A.: 603139

Candidato à fórmula discursiva: ACESSIBILIDADE

Fevereiro – 2017

São Carlos

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JUSTIFICATIVA

A escolha do candidato: uma justificativa multifatorial

O candidato à fórmula discursiva foi “acessibilidade”. O motivo da escolha se

deu pela própria recorrência da palavra que, ao longo do tempo, ficou mais em

evidência devido às mudanças sociais e históricas que ocorreram e têm ocorrido

recentemente. O principal exemplo disso é a criação da Lei nº 10.098/2000, conhecida

como “Lei da Acessibilidade”.

Isso se dá pelo despontamento de determinadas comunidades emergentes ou

grupo de pessoas que são o público alvo do desenvolvimento do que se entende por

acessibilidade. Além disso, quando se trata da prática de “acessibilizar” algo, trata-se

também da prática de “contabilizar” isso. Ou seja, é um processo que envolve muito

mais do que pedido ou direito, envolve questões políticas e econômicas.

Sabemos que, ao longo do período de coleta, não há como prever com exatidão o

resultado de uma pesquisa. Porém, deixo aqui algumas reflexões/hipóteses que me

impulsionaram na escolha desse candidato à fórmula:

o O que é acessibilidade? Seria construir rampas, separar um banco do ônibus para

idosos e grávidas, ter um assento direcionado para obesos, saber Libras básico?

o Quem precisa de acessibilidade? Pessoas com Síndrome de Down, surdos,

gestantes, idosos, obesos, cadeirantes? Pessoas que portam alguma deficiência?

o Que tipo de deficiência? Podemos englobá-los como um mesmo grupo de

“pessoas especiais”? São as mesmas “necessidades especiais”?

o Quem é o autor da acessibilidade: os “grupos especiais” ou os “produtores da

acessibilidade PARA os grupos especiais”?

o Que tipo de acessibilidade os grupos que não são “especiais” precisam?

CORPUS

Para a compilação do corpus, houve pesquisa no Google (site de busca), no

Portal FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos) e no site do

HandTalk, um tradutor automático de sites. Do Google, selecionei seis (06) notícias

para análise, das seguintes fontes: Câmara Municipal de Campinas, Câmara Municipal

do Rio de Janeiro, Correio do Povo, Portal Brasil, e Portal Educação. Além disso,

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também fiz captura de tela da própria definição de acessibilidade que aparece no

Google.

Do site da FENEIS, fiz duas capturas de tela organizadas em um único arquivo

de imagem. E há uma foto de um cartaz do CREA – SP (Conselho Regional de

Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo), tirada na cidade de Botucatu – SP.

Como a foto do cartaz do CREA não ficou tão boa, fui pesquisar se havia a

imagem do mesmo cartaz na internet, e descobri que esse cartaz faz parte de uma

campanha intitulada “A maior deficiência é a indiferença”. E aquele cartaz da cidade de

Botucatu – SP era um dos dois cartazes da campanha. Conclusão: fiz o download dos

dois cartazes disponibilizados em PDF pelo próprio Portal CREA para analisá-los.

Além disso, a Lei da Acessibilidade poderia ter sido analisada também, afinal é

um grande palco de debate público. Porém, decidi trazer materiais que fossem mais

recorrentes do dia a dia, como notícias e campanhas, a fim de entender como a fórmula

estava circulando nesses outros veículos – tendo em vista que a lei foi um grande

disparador desse candidato. Ao final, o conteúdo da Lei foi importante para fazer as

Considerações Finais.

ANÁLISE DO CANDIDATO SEGUNDO AS PROPRIEDADES DA FÓRMULA

1. Caráter cristalizado

Sendo uma das primeiras marcas de uma fórmula discursiva, o caráter cristalizado

se materializa a partir dos discursos em uma sociedade, isto é, existem acontecimentos

históricos que dão luz a uma fórmula, trazendo a ela, a cada enunciação, um novo

significado. A repetição da fórmula garante o caráter cristalizado, e só por isso que ela é

reiterável. Ainda que haja variações da mesma, podemos verificar qual é a versão mais

predominante.

Como aconteceu a cristalização?

Para perseguir o nascimento da fórmula1, recorri a dois sites de jornais: ao Estadão

Jornal Digital, e à Folha de S. Paulo a fim de comparar os resultados. Filtrei notícias

1 Para evitar a repetição de “candidato à fórmula” toda vez que “acessibilidade” for referenciada, utilizei a

palavra “fórmula” diretamente. Mas é importante lembrar que, ao retomá-la como “fórmula” não afirmo

que, de fato, seja uma. É apenas uma estratégia de retomada para que a leitura não seja exaustiva.

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sobre acessibilidade a partir de 1996 até 2000, em ambos os jornais. Afinal, se a Lei da

Acessibilidade foi aprovada em dezembro de 2000, podemos supor que, tempos antes,

esse tema já estava em debate. Depois, aumentei a margem de tempo para 2000 a 2010.

E por fim, pesquisei entre 2010 até fevereiro de 2017 (atualmente).

Fiz também uma estimativa de quantas notícias por ano circularam dentro dos

respectivos períodos. Segue os resultados abaixo:

Fonte Período Registros Estimativa

Estadão Jornal Digital

1996 – 2000 --- ---

2000 – 2010 613 60 notícias/ano

2010 – 2017 1697 240 notícias/ano

Folha de S. Paulo

1996 – 2000 92 23 notícias/ano

2000 – 2010 989 98 notícias/ano

2010 – 2017 1733 247 notícias/ano

Ou seja, as ocorrências só foram aumentando a partir do ano 2000. Apesar de

sabermos que não é possível precisar o “aniversário” da fórmula, podemos perceber em

que período ela eclodiu. A criação da lei foi, certamente, uma grande disparadora dessa

fórmula, pois, desde então, muito vem sido discutido, debatido e noticiado.

Variantes e pequenas fórmulas orbitais

No caso de acessibilidade, é possível verificar, a partir do corpus, que há as

seguintes variantes: acesso e acessível, funcionando, respectivamente como substantivo

sinonímico e adjetivo.

Porém, faço uma ressalva: acesso e acessibilidade podem ser sinônimos, porém, não

funcionam da mesma forma. Enquanto acessibilidade remete a um conceito mais

abstrato, acesso traz um sentido de realizado, concreto, materializado. Tanto que cabe

melhor dizer “O acesso ao transporte público por deficientes físicos tem crescido”, e

não “A acessibilidade ao transporte público por deficientes físicos tem crescido”. A

acessibilidade seria o projeto, e o acesso seria a realização desse projeto.

Para as fórmulas orbitais, fiz um mapeamento estatístico de ocorrências, a partir do

corpus.

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FONTES FÓRMULAS ORBITAIS

empatia

inclusão/

inclusão

social/incluído/incluir

deficiência

mobilidade/

mobilidade

reduzida

pessoas deficientes/pessoas com

deficiência/pessoas portadoras de

deficiência/deficientes/portadores

de deficiência

Câmara

Municipal de

Campinas

--- --- --- 02 02

Portal

Educação

--- --- 01 12 21

Portal Brasil

--- --- --- 02 03

ICICT

(Instituto de

Comunicação

e Informação

Científica e

Tecnológica

em Saúde)

--- 03 09 01 13

Câmara

Municipal do

Rio de Janeiro

--- 01 --- --- 05

Correio do

Povo

03 02 --- --- 04

Cartaz do

Cadeirante

CREA

--- 01 --- --- ---

Cartaz

Acessibilidade

CREA

01 01 05 --- ---

HandTalk

--- 01 --- --- 01

Definição do

Google

--- 01 --- --- 02

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Por incrível que pareça, não houve nenhuma ocorrência de uma fórmula que pensei

que iria encontrar com grande frequência: “necessidades especiais”. Mas o próprio

corpus explica isso. Como são notícias e campanhas, o foco estava em promover ou

reportar algo, não em refletir sobre as “necessidades especiais” das “pessoas

deficientes”, isto é ou a notícia reportava um debate/evento, ou era campanha de

conscientização popular focando na cidadania, como foi o caso dos cartazes do CREA

(vaga de estacionamento).

2. Inscrição em uma dimensão discursiva

O uso da fórmula nos discursos é marcado pela história e pela sociedade. É o discurso

em ato, dentro dos seus respectivos contextos e conjunturas, que afirma o caráter

formulaico. Como Krieg-Planque explica, a noção de fórmula não se constrói através do

seu aspecto linguístico, mas sim, pela sua dimensão discursiva, presente nos usos e

sentidos adquiridos a partir dos mais diversos lugares de fala (KRIEG-PLANQUE,

2010).

Gatilho disparador

O principal fator que impulsionou a circulação da fórmula foi a criação da Lei nº

10.098/2000, pois, a partir do que se estabeleceu, outras áreas foram atingidas pela

fórmula e a colocaram em debate.

Onde aparece a fórmula em questão?

Olhando para o caráter formulaico de “acessibilidade”, podemos verificar que

essa fórmula ocorre em várias diferentes áreas de atuação humana: política, turismo,

ciência e tecnologia (desenvolvimento de pesquisas), educação, entretenimento, entre

outras. Vejamos isso através de dois exemplos retirados do corpus, pois constituem duas

pontas do espectro de áreas:

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Fonte: ICIT (Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnologia em Saúde). Disponível em:

<https://www.icict.fiocruz.br/content/centro-de-estudos-debate-defici%C3%AAncia-funcionalidade-e-

acessibilidade>

Fonte: Correio do Povo. Disponível em:

<http://www.correiodopovo.com.br/ArteAgenda/Variedades/Exposicao/2016/9/598197/Exposicao-interativa-gratuita-

promove-debate-sobre-acessibilidade-e-empatia>

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Embora ambas as notícias falem sobre debates, são debates partindo de lugares

totalmente diferentes. Enquanto o primeiro vem de um lugar de fala acadêmico e

institucional, o segundo é uma iniciativa de um artista visual em pareceria com um

produtora e uma audiodescritora.

Podemos ver, portanto, que desde ciência a entretenimento, a fórmula

“acessibilidade” está sendo constantemente debatida, visto que, pelo menos um dado de

cada área de atuação humana citada acima constitui o corpus total.

3. Referente social

Ser um referente social é ser “passagem obrigatória” dos discursos, em certo

período, dentro de uma comunidade, isto é, em um espaço de tempo, a fórmula é

conhecida por todos naquela sociedade. A principal característica dessa propriedade não

é qual posição os locutores terão perante a fórmula – visto que não é possível uma

fórmula passar despercebida – mas sim, que terão algum tipo de postura, seja confrontá-

la, afirmá-la, combatê-la ou defini-la. O importante, nesse caso, é circular a fórmula,

seja de um jeito ou de outro.

Como a fórmula tem circulado?

Dado que a Lei da Acessibilidade traz implicações para dentro da política, do

mercado de trabalho, da ciência, entre outros; posicionar-se em relação a essa fórmula

se mostra uma obrigatoriedade. Seguem dois dados retirados do corpus que comprovam

isso:

Fonte: Portal Brasil. Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/turismo/2015/09/turismo-

debate-acessibilidade-para-pessoas-com-deficiencia>

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Fonte: Portal CREA. Disponível em:

<<http://www.creasp.org.br/noticia/institucional/2016/11/16/acessibilidade/2280>

Se observarmos o primeiro dado, veremos que o Ministério do Turismo se viu na

obrigação de tornar o turismo acessível para pessoas com deficiência. Foi desenvolvido

um projeto somente com essa finalidade, chamado Projeto Turismo Acessível, que além

de disponibilizar vários arquivos para download, que vão desde cartilhas a folders de

campanhas, também disponibiliza um arquivo sobre o estudo do perfil do turista

deficiente.

Já no segundo dado, vemos o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de

São Paulo (CREA-SP) fazendo campanhas de conscientização popular a respeito da

vaga de estacionamento exclusiva para cadeirantes. Ou seja, apesar do trabalho do

CREA não estar voltado diretamente para a mudança de imaginários na sociedade,

houve esse envolvimento justamente porque não foi possível passar despercebido pela

questão da acessibilidade: eles precisaram tomar partido.

4. Aspecto polêmico

Essa última propriedade permite entender os diferentes posicionamentos tomados

em relação à fórmula, ou seja, quais divergências trazem confronto, oposição, contraste.

Essa polêmica pode ser implícita ou explícita.

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Para onde aponta o vetor semântico?

Por se tratar de um tema visto como “politicamente correto”, é difícil encontrar

um posicionamento que não seja favorável à “acessibilidade”. Em termos de aspecto

polêmico, é possível citar um único caso encontrado:

Fonte: Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Disponível em:

<http://www.camara.rj.gov.br/noticias_avisos_detalhes.php?m1=comunicacao&m2=notavisos&id_noticia=11907#>

Jorge de Oliveira, representante da ONG Rede Cidadã, diz que apesar das cotas

para deficientes no mercado de trabalho, muitas empresas não os contratam. O motivo

disso? De forma branda, Jorge explicou que as empresas se justificam pela falta de

infraestrutura ou pela “cultura da empresa” não consentir tal contratação.

Devemos considerar também que esse posicionamento foi feito de maneira

indireta, pois a voz não é das empresas, mas fala por elas. Talvez essa estratégia de

discurso seja justamente para não causar polêmica a fim de que nenhuma empresa tenha

sua “imagem” afetada por tal posicionamento. Aliás, quais empresas são essas? Houve

um forte apagamento institucional nesse caso.

O maior grau de “polêmica” que encontrei foi esse. Os demais posicionamentos

foram positivos e favoráveis à acessibilidade, muito embora com conceitos, por vezes,

equivocados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ser ou não ser: eis a questão

Afinal, “acessibilidade” é uma fórmula discursiva? Através da análise do corpus,

o que fica evidente é que o sintagma em si não se caracteriza como fórmula, mas

adquire algumas propriedades dela ao ser colocado em determinados lugares. Isto é, não

é sempre que há polêmica ao retomar “acessibilidade”, e os sentidos entre tais

retomadas se assemelham consideravelmente.

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Confusão semântica a bordo

Para a maioria dos lugares onde “acessibilidade” aparece, o sentido é logo o

acesso voltado ao deficiente físico. Há ainda outras aparições que misturam diferentes

conceitos e os englobam como se fossem tipos “deficiência”, quando na verdade, não

são. A proximidade dos lugares onde ocorrem os debates sobre grupos como: idosos,

gestantes, cadeirantes, cegos, surdos, etc., pode levar a agrupá-los como um mesmo

grupo. Porém, além de não demandarem o mesmo tipo de acessibilidade – daí a

problemática em generalizar “deficientes”, também não se encaixam em uma única

categoria.

Somando-se a isso, a generalização desses grupos também traz a dificuldade de

conceitualização, uma vez todos, inevitavelmente, tornam-se idosos em um período da

vida, mas não necessariamente todos se tornam deficientes físicos, por exemplo.

Onde estão os deficientes?

Não poderia deixar de dizer que, em praticamente todos os dados, os deficientes

tendem a ser tratados como dependentes, quase que como crianças, dóceis e domáveis.

Parece que a acessibilidade é uma atitude sempre vinda de outro, nunca do próprio

deficiente. Esse outro é aquele com quem se estabelece uma relação de hierarquia entre

o deficiente e quem produz a acessibilidade. Esse “outro” que determina o que fazer e

como fazer.

Entretanto, a acessibilidade é produzida para deficientes (seja a deficiência da

natureza que for). Mas na elaboração de projetos nunca vemos a presença deles como

colaboradores dessas propostas.

Lendo a bula

Apesar das boas intenções da maioria dos projetos voltados para a

acessibilidade, pois além das implicações da Lei, há pessoas que lutam em prol dos

deficientes, muitas das vezes, não há uma organização conceitual para que tais projetos

sejam feitos com mais qualidade.

Muitos conceitos ainda se confundem, não estão claros, enquanto outros são

mais evidenciados justamente por serem mais “visíveis”, tornando outros de igual

importância, opacos.

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E, além disso, uma grande dificuldade enfrentada na concretização da

acessibilidade é o posicionamento – de superioridade ou seria cuidado? – entre quem

faz acessibilidade e quem precisa dela.

Encerro dizendo que a acessibilidade não é só uma ação de outrem, mas é,

sobretudo, uma ação que só pode ser executada com justiça e excelência a partir da

validação do deficiente: o principal alvo desse trabalho. Talvez sejamos nós que

precisemos ser “acessíveis” e dar espaço à fala de quem necessita ser escutado.

BIBLIOGRAFIA

KRIEG-PLANQUE, A. A noção de ‘fórmula’ em análise do discurso: quadro teórico e

metodológico. São Paulo: Parábola, 2010.

_____ . A fórmula “desenvolvimento sustentável: um operador de neutralização de

conflitos. In: Linguasagem, 19 ed., 2012.

MOTTA, A. R.; SALGADO, L. S. Fórmulas discursivas. São Paulo: Contexto, 2011.

ANEXOS

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