antónio baldaia brandos costumes - fenprof.pt · 2 jornal da fenprof maio 2006 duas palavras...

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2 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006 DUAS PALAVRAS Propriedade, Redacção e Administração Federação Nacional dos Professores Rua Fialho de Almeida, 3 1070-128 LISBOA Tels.: 213819190 - Fax: 213819198 E-mail: [email protected] Home page: http://www.fenprof.pt Director: Paulo Sucena Chefe de Redacção: Luís Lobo [email protected] Conselho de Redacção: António Avelãs e Manuel Grilo (SPGL), António Baldaia (SPN), Fernando Vicente (SPRA), Nélio de Sousa (SPM), Luís Lobo (SPRC), Manuel Nobre (SPZS) Coordenação: José Paulo Oliveira [email protected] Paginação e Grafismo: Tiago Madeira Composição: FENPROF Revisão: Inês Carvalho Impressão: SOCTIP - Sociedade Tipográfica, S.A. Estrada Nacional, nº 10, km 108.3 - Porto Alto 2135-114 Samora Correia Tiragem média: 70 000 ex. Depósito Legal: 3062/88 ICS 109940 O “JF” está aberto à colaboração dos professores, mesmo quando não solicitada. A Redacção reserva- se, todavia, o direito de sintetizar ou não publicar quaisquer artigos, em função do espaço disponível. Os artigos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. SINDICATO DOS PROFESSORES DA GRANDE LISBOA R. Fialho de Almeida, 3 - 1070-128 Lisboa Tel.: 213819100 - Fax: 213819199 E-mail: [email protected] Home page: www.spgl.pt SINDICATO DOS PROFESSORES DO NORTE Edif. Cristal Park R. D. Manuel II, 51-3º - 4050-345 Porto Tel.: 226070500 - Fax: 226070595 E-mail: [email protected] Home page: www.spn.pt SINDICATO DOS PROFESSORES DA REGIÃO CENTRO R. Lourenço Almeida de Azevedo, 20 3000-250 Coimbra Tel.: 239851660 - Fax: 239851666 E-mail: [email protected] Home page: www.sprc.pt SINDICATO DOS PROFESSORES DA ZONA SUL Av. Condes de Vil’Alva, 257 7000-868 Évora Tel.: 266758270 - Fax: 266758274 E-mail: [email protected] SINDICATO DOS PROFESSORES DA REGIÃO AÇORES Av. D. João III, Bloco A, Nº 10 9500-310 Ponta Delgada Tel.: 296205960 - Fax: 296629698 Home page: www.spra.pt SINDICATO DOS PROFESSORES DA MADEIRA Edifício Elias Garcia, R. Elias Garcia, Bloco V-1º A - 9054-525 Funchal Tel.: 291206360 - Fax: 291206369 E-mail: [email protected] Home page: www.spm-ram.org SINDICATO DOS PROFESSORES NO ESTRANGEIRO Sede Social: Rua Fialho de Almeida, 3 1070-128 Lisboa Tel.: 213833737 - Fax: 213865096 E-mail: [email protected] Home page: www.spefenprof.org Sindicatos membros da FENPROF António Baldaia Brandos costumes “Vamo-nos deitar, que estes senhores querem ir-se embora”. Diplomaticamente, era assim que, não longe no tempo, entre os meus amigos, se dizia quando alguém que recebia queria despachar um visitante mais renitente em concluir a visita. De facto, supõe-se que é do senso comum perceber quando se está a mais, ou há tempo demais. Quando tal não acontece – no contexto das visitas às casas dos amigos –, normalmente deve-se a três factores: distracção, má avalia- ção das circunstâncias ou excesso de zelo dos visitados (que se aca- nham na hora dizer “meu caro, por hoje chega”). Ou então, é mesmo falta de bom senso. É claro que, por ve- zes, no ramalhete dos que nos visitam aparece uma ou outra flor des- contextualizada, que não foi para ali cha- mada, mas que, por uma qualquer virtude, nos sentimos no dever de ir tolerando – ainda que, eventualmente, come- cem a cheirar menos bem e a poluir o ambiente. Tenho sérias dúvidas que os eleitores que, maioritariamente, convidaram José Sócrates a formar governo soubessem, quando estavam a introduzir o seu voto na urna, quais seriam as flores de que se compunha o executivo que o engenheiro lhes iria apresentar. Tanto mais que, como viriam a aperceber-se, nem só de rosas se formava o ramalhete. Vício democrático, não sei se especifica- mente português, habituamo-nos a eleger deputados sem curarmos de saber que governantes escolhemos. E arrisco pensar que nem os próprios eleitos saberão atem- padamente quais os governantes que (disciplina partidária oblige) vão ter de suportar parlamen- tarmente – não fos- se esta possibili- dade, ainda que re- mota, e o senso co- mum aconselharia a não pactuarem, por exemplo, com um secretário de Es- tado que, em plena Assembleia da Re- pública (de qual?!), oculta factos ao grupo parlamentar do próprio partido do governo de que faz parte. Circunstância ri- sível, é o mínimo que pode considerar-se – esta, de alguém tirar o pão da boca a quem lhe está a dar de comer... Imagino eu, que até sou de amplas contemporizações, que não deve ser fácil aguentar em casa penetras de semelhante estaleca – mesmo considerando a brandura de costumes a que pa- recemos condenados. Por isso, senhores deputados, o melhor é irem deitar-se, que estes senhores querem ir em- bora... Tenho sérias dúvidas que os eleitores que, maioritariamente, convidaram José Sócrates a formar governo soubessem, quando estavam a introduzir o seu voto na urna, quais seriam as flores de que se compunha o executivo que o engenheiro lhes iria apresentar. Tanto mais que, como viriam a aperceber-se, nem só de rosas se formava o ramalhete. [email protected]

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2 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

DUAS PALAVRAS

Propriedade, Redacção e AdministraçãoFederação Nacional dos ProfessoresRua Fialho de Almeida, 31070-128 LISBOATels.: 213819190 - Fax: 213819198E-mail: [email protected] page: http://www.fenprof.pt

Director: Paulo Sucena

Chefe de Redacção: Luís [email protected]

Conselho de Redacção: António Avelãs e ManuelGrilo (SPGL), António Baldaia (SPN), FernandoVicente (SPRA), Nélio de Sousa (SPM), Luís Lobo(SPRC), Manuel Nobre (SPZS)

Coordenação: José Paulo [email protected]

Paginação e Grafismo: Tiago Madeira

Composição: FENPROF

Revisão: Inês Carvalho

Impressão: SOCTIP - Sociedade Tipográfica, S.A.Estrada Nacional, nº 10, km 108.3 - Porto Alto2135-114 Samora CorreiaTiragem média: 70 000 ex.Depósito Legal: 3062/88ICS 109940

O “JF” está aberto à colaboração dos professores,mesmo quando não solicitada. A Redacção reserva-se, todavia, o direito de sintetizar ou não publicarquaisquer artigos, em função do espaço disponível.Os artigos assinados são da exclusivaresponsabilidade dos seus autores.

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SINDICATO DOS PROFESSORESNO ESTRANGEIROSede Social: Rua Fialho de Almeida, 31070-128 LisboaTel.: 213833737 - Fax: 213865096E-mail: [email protected] page: www.spefenprof.org

Sindicatos membrosda FENPROF

António Baldaia

Brandos costumes“Vamo-nos deitar, que estes senhores

querem ir-se embora”.Diplomaticamente, era assim que, não longe

no tempo, entre os meus amigos, se diziaquando alguém que recebia queria despacharum visitante mais renitente em concluir a visita.

De facto, supõe-se que é do senso comumperceber quando se está a mais, ou há tempodemais. Quando tal nãoacontece – no contextodas visitas às casas dosamigos –, normalmentedeve-se a três factores:distracção, má avalia-ção das circunstânciasou excesso de zelo dosvisitados (que se aca-nham na hora dizer “meucaro, por hoje chega”). Ouentão, é mesmo falta debom senso.

É claro que, por ve-zes, no ramalhete dosque nos visitam apareceuma ou outra flor des-contextualizada, quenão foi para ali cha-mada, mas que, por umaqualquer virtude, nossentimos no dever de irtolerando – ainda que, eventualmente, come-cem a cheirar menos bem e a poluir o ambiente.

Tenho sérias dúvidas que os eleitores que,maioritariamente, convidaram José Sócrates aformar governo soubessem, quando estavam aintroduzir o seu voto na urna, quais seriam asflores de que se compunha o executivo que o

engenheiro lhes iria apresentar. Tanto maisque, como viriam a aperceber-se, nem sóde rosas se formava o ramalhete.

Vício democrático, não sei se especifica-mente português, habituamo-nos a elegerdeputados sem curarmos de saber quegovernantes escolhemos. E arrisco pensarque nem os próprios eleitos saberão atem-

padamente quais osgovernantes que(disciplina partidáriaoblige) vão ter desuportar parlamen-tarmente – não fos-se esta possibili-dade, ainda que re-mota, e o senso co-mum aconselharia anão pactuarem, porexemplo, com umsecretário de Es-tado que, em plenaAssembleia da Re-pública (de qual?!),oculta factos aogrupo parlamentardo próprio partidodo governo de quefaz parte.

Circunstância ri-sível, é o mínimo que pode considerar-se –esta, de alguém tirar o pão da boca a quemlhe está a dar de comer...

Imagino eu, que até sou de amplascontemporizações, que não deve ser fácilaguentar em casa penetras de semelhanteestaleca – mesmo considerando a brandura

de costumes a que pa-recemos condenados.

Por isso, senhoresdeputados, o melhor éirem deitar-se, que estessenhores querem ir em-bora...

Tenho sérias dúvidasque os eleitores que,maioritariamente,

convidaram José Sócrates aformar governo soubessem,

quando estavam aintroduzir o seu voto na

urna, quais seriam as floresde que se compunha o

executivo que o engenheirolhes iria apresentar. Tantomais que, como viriam aaperceber-se, nem só de

rosas se formava oramalhete.

[email protected]

JORNAL DA FENPROF 3MAIO 2006

SUMÁRIO

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EDITORIALÉ preciso travar a marcha do M.E. por caminhosque levam a nenhuresPaulo Sucena5

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ACÇÃONós sabemos porque é que não ficamos em casa!...José Paulo Oliveira

• Estatuto com história• Estatuto de A a Z (2ª parte)

REVISÃO DO ECDExpectativas, exigências e propostas da FENPROFMário Nogueira

CONTRIBUTO DE PAULO SUCENA PARA UMA REFLEXÃOFUNDAMENTAL DOS NOSSOS DIASQuem é o cidadão-professor?

Crises de identidadeDaniel Ricardo

ABEL MACEDO AO JF:“Os professores saberão assumir as suas responsabilidadesperante a sociedade através de um compromisso ético claro”José Paulo Oliveira

23 CONHECE O SEU ESTATUTO?Direitos & Deveres

24 MÁRIO NOGUEIRA AO JF:“Nesta revisão, está em causa o futuro da profissão docente.É deplorável o que estão a fazer aos professores!”

26 RICARDO VIEIRA:Ser Professor: Ensino ou aprendizagem da profissão?

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27 ESCOLA A TEMPO INTEIROFranchising - a lógica de mercado na educaçãoHelena Arcanjo

Revisãodo ECD —Divulgaçãode propostasNo momento do fecho destaedição do Jornal da FENPROF,continuávamos a aguardar aentrega da proposta do ME paraa revisão do Estatuto da Carreirados Educadores de Infância edos Professores dos EnsinosBásico e Secundário.Prevê-se, conforme o momentoem que essa entrega ocorra, apublicação, em caderno especialou em destacável da revista, detoda a informação necessáriapara que os docentesportugueses possam participarna discussão, na posse de todosos elementos.No entanto, chamamos aatenção para a páginaelectrónica da FENPROF e dosSindicatos, onde de imediatoessa informação serádisponibilizada.

4 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

NACIONAL

O Conselho Nacional de Educação(CNE) vai avaliar tudo o que foi feitoem Portugal na área da educação, du-rante o debate nacional sobre os 20anos da lei de bases do sistemaeducativo.

Júlio Pedrosa, presidente do CNE,explicou que a proposta da comissãoorganizadora passa por três fases.

A primeira, que será analítica, visafazer uma síntese e análise da infor-mação existente sobre educação emPortugal e fazer um levantamento deestudos internacionais sobre o país.

Nesta fase, o CNE refere que, senecessário, o debate deverá ser acom-panhado por pareceres de espe-cialistas, que deverão analisar ocontributo das políticas educativas.

Ainda nesta fase - que deverá ficarterminada até ao Verão - O CNEpropõe-se criar um portal na Internetpara recolha de opiniões.

Desta etapa vai sair o conjunto dequatro ou cinco questões consideradasmais pertinentes sobre a educação emPortugal e que serão essenciais parao debate, de acordo com Júlio Pe-drosa.

A segunda fase do debate de-correrá entre Setembro e Novembro evisa a realização de debates regionaisfocados nas questões consideradasessenciais na primeira fase.

Por fim, na terceira fase a comissãoorganizadora do CNE vai fazer asistematização da informação recolhi-da, cujo relatório final será entregue emJaneiro próximo à Assembleia daRepública.

O CNE é um órgão consultivo doMinistério da Educação composto poragentes educativos públicos e pri-vados.

Lusa, 12.04.2006

no alvoAniversárioda Lei de BasesConselho Nacionalvai avaliar 20 anosde Educação em Portugal

legislação em vigor designa esteprocesso por "regime educativo es-pecial" e refere que o mesmo"consiste na adaptação das condi-ções em que se processa o ensino-

aprendizagem dos alunos com necessidadeseducativas especiais" (art.º 2.º, n.º 1 do Dec.-Lei n.º 319/91 de 23 de Agosto), a imple-mentar quando se revele imprescindívelpara que os alunos com NEE possam atingiros objectivos educacionais pretendidos.".Começa assim uma nota enviada à Comu-nicação Social, na qual a FENPROF mani-festa a sua mais profunda indignação erevolta pela forma insensata e irresponsávelcomo o ME tratou o problema da realizaçãode provas de aferição pela população esco-lar com necessidades educativas especiais.

"O regime educativo especial", refere omesmo comunicado, "é organizado noinício do ano lectivo, implementando-se,ao longo do mesmo, de forma indivi-dualizada." Reside, pois, aqui, a principalcrítica dirigida pela FENPROF ao ME, já queprocessos e instrumentos de avaliação quedesrespeitem as especificidades dos alunosem causa desvalorizam "todo o trabalho

desenvolvido durante o ano lectivo edistorcem os próprios resultados obtidos,não sendo legítimo (nem sério) extrapolardestes dados elementos de avaliação doaluno ou de aferição do sistema educativo."

O texto da Federação prossegue, aindacom a outra face da mesma abordagem paraafirmar que "para além das competênciascurriculares que se pretendem avaliar, aforma como decorre a aplicação da prova,não respeita o modo como, durante o anolectivo, muitas das crianças com NEE, acederamao seu currículo. De facto, os diferenciadosprocessos de avaliação, implementados duranteo ano, extravasam, em muito, a aplicação deum mero instrumento de comunicação escrita,como aquele que é utilizado nestes exames/provas de aferição."

O comunicado da FENPROF (que pode serconsultado na íntegra em www.fenprof.pt),depois de lançar um vasto conjunto dequestões sobre a aspectos essenciais depolítica educativa para as quais urge obterrespostas do ME, admite, ainda, suspeitardos reais objectivos do ME com estas provasde aferição, tendo em consideração os seuscontornos. | LL

Provas de aferiçãonão respeitam os alunos com NEE"O atendimento a crianças e jovens com Necessidades EducativasEspeciais (NEE), nas nossas escolas, exige processos didácticos,pedagógicos e de organização (adaptações curriculares, diversificaçãode procedimentos e processos de avaliação, etc.) adaptados àsespecificidades de cada aluno.

A

4 JORNAL DA FENPROF

JORNAL DA FENPROF 5MAIO 2006

Paulo Sucena (Secretário Geral da FENPROF)EDITORIAL

É preciso travar a marcha do M.E.por caminhos que levam a nenhures

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JORNAL DA FENPROF 5MAIO 2006

screvo este editorial no limiar temporal de duasimportantes reuniões com o Ministério daEducação. A primeira prende-se com asreduções da componente lectiva a atribuir aosdirigentes sindicais. Os comportamentos e o

discurso ora elíptico ora difuso dos governantes doMinistério da 5 de Outubro indiciam uma mais queprovável redução desses créditos que, ao concretizar-se, enfraquece indubitavelmente a capacidade deacção e de ligação às escolas da FENPROF e seussindicatos. Tal tomada de decisão do Ministério daEducação, se se vier a verificar, enquadra-se numaestratégia que visa subtrair instrumentos para odesenvolvimento de práticas sindicais que sempreforam apanágio dos sindicatos da FENPROF e daprópria Federação.

Convirá avisar, desde já, a equipa ministerial deque há uma zona impenetrável no movimento sindicaldocente que a FENPROF aglutina – a da grandesolidariedade e do respeito mútuo que os setesindicatos da FENPROF alimentam entre si, compor-tamento sem o qual não seria possível manter, aolongo dos anos, a grande coesão interna que faz danossa Federação uma organização exemplar nasociedade portuguesa. Sempre as divergências naFENPROF se superaram com grande elevação ética esindical e nunca pelos caminhos da malquerença ouda maledicência, por isso a FENPROF e os seussindicatos não vêem a sua imagem enfraquecida,antes pelo contrário, junto dos docentes querepresentam e da classe docente, em geral.

Outro aspecto preocupante que pode surgir, nestaprimeira reunião a que me refiro, diz respeito àdistribuição dos créditos horários pelos sindicatos,principalmente se o Ministério da Educação adoptara posição de Pilatos e não apresentar quaisquercritérios para essa divisão, deixando em pé deigualdade o maior sindicato com o numericamente(quanto ao número de sócios) mais insignificante.Pensará porventura o Governo que com estamesquinha estratégia tornará o movimento sindicaldocente mais “domesticável”. Porém, mais uma vezse engana. A FENPROF e os seus sindicatos nunca

perfilharam a atitude de deixar cair os braços e porisso continuarão, sem tergiversações nem desânimos,a sua luta por uma melhor educação, por uma escolamais democrática e de maior sucesso educativo, poruma carreira docente revalorizada profissional esocialmente.

A segunda reunião a que me refiro, marcada para29 de Maio, inicia o processo negocial do ECD e istoquer dizer que vamos entrar num período crucialpara o futuro dos educadores de infância e dosprofessores dos ensinos básico e secundário. OSecretariado Nacional vai aprovar uma propostacontendo as suas posições sobre tão significativamatéria para a vida dos docentes, a qual apresentarápara análise e aprovação do Conselho Nacional daFENPROF que se realizará nos dias 8 e 9 de Junho.

Podemos, atendendo à extrema relevância dasmatérias em negociação, vir a ter, em torno de nós,um clima semelhante ao vivido em Junho de 2005,mas é necessário que, tal como no ano passado, nosmantenhamos coesos e imunes aos insultos, àsofensas e às infames mentiras que tombaram sobrea FENPROF, os seus sindicatos e os seus principaisdirigentes.

A unidade e a determinação da classe docente émais importante do que nunca para vencermos aárdua batalha da revisão do ECD. Unidade para nósnão quer dizer unanimismo, por isso os sindicatosda FENPROF e a nossa Federação promoverão umintenso e democrático diálogo com os docentes, quese revestirá de múltiplas formas, de modo a acolhere incorporar todas as sugestões e propostas que pelasua qualidade sejam reais contributos para oenriquecimento e fortalecimento das posições daFENPROF a apresentar na mesa das negociações.

O futuro não se herda. Conquista-se! É nisso quea FENPROF e os seus sindicatos apostam, quer nosensinos básico e secundário quer no ensino supe-rior, porque o silêncio de chumbo do Governo,relativamente aos ensinos Politécnico e Universitário,mais cedo ou mais tarde, derreter-se-á, porque osdocentes do ensino superior também sabem bemcomo passar do pensamento à acção.

6 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

O Conselho Nacionalda CGTP-IN reuniu nopassado dia 4 de Maio eanalisou a actualsituação económica,política e social do país.Perante a situação decrise existente queresulta da manutenção,no essencial, daspolíticas e governosanteriores, a Centraldecidiu convocar para odia 8 de Junho um DIANACIONAL DE LUTA, emtodos os distritos eregiões autónomas.

CGTP-IN convoca dia nacional de luta8 de Junho

ACÇÃO

Aumenta a precariedade e o desrespeito pelas leis, é

posto em causa o papel do Estado e as funções da

Administração Pública e são atacados direitos sociais

fundamentais como o ensino, a saúde e a segurança social

onsidera a resolução aprovada peloConselho Nacional que “o essencialdas políticas seguidas pelo governoe as práticas patronais estão aconduzir à continuação do enrique-

cimento dos detentores do poder económicoe financeiro e a impor mais sacrifícios aostrabalhadores, o que provoca mais desigual-dades, mais injustiças, rupturas de solida-riedades e o alargamento da pobreza nanossa sociedade”.

Perante esta situação, a CGTP-INconsidera que a mudança necessária deveriatrazer consigo “rupturas com aspectosfundamentais das políticas seguidas nosúltimos anos”. Para a seguir afirmar que seassiste “a um perigoso prosseguimento deuma matriz de desenvolvimento já conde-nada, verificando-se que o aparelhoprodutivo continua a ser destruído, aumentao desemprego, prosseguem as políticas debaixos salários e o ataque à contrataçãocolectiva, diminui a qualidade do emprego,estagna o investimento, aumenta a preca-riedade e o desrespeito pelas leis, é postoem causa o papel do Estado e as funçõesda Administração Pública e são atacadosdireitos sociais fundamentais como o

ensino, a saúde e a segurança social”, comoveio a alertar, também, a manifestaçãonacional realizada em Lisboa no passado dia19 de Maio (ver noutro local desta edição).“Estamos perante uma nova onda deimposição de políticas que fazem asistemática invocação da crise, ignorandoas suas causas e rejeitando as políticas queas combatam, para impor aos trabalhadoresum novo conjunto de medidas de “apertar ocinto”, alerta o CN da CGTP-IN, que fez tambémum balanço muito positivo das comemoraçõesdo 1º de Maio em todo o País (“uma afirmaçãoforte da dignidade do trabalho”).No dia 8 de Junho, os educadores eprofessores portugueses marcarão a suapresença activa e solidária numa luta queé de todos em defesa da segurança social,contra a diminuição das pensões e atentativa do aumento directo ou indirectoda idade da reforma; contra o aumento docusto de vida e pela melhoria dos salários;em de fesa do emprego , cont ra aprecariedade; pela contratação colectiva epela revogação das normas gravosas doCódigo do Trabalho; em defesa de umaAdministração Pública ao serviço doscidadãos e pelos direitos sociais. | JPO

C

JORNAL DA FENPROF 7MAIO 2006

ratou-se de uma importante acçãode contestação à política do governopara os serviços públicos, quer noque diz respeito ao seu funcio-namento, financiamento e desen-

volvimento, quer, ainda, no que se relacionacom os ataques aos direitos sociais eprofissionais dos trabalhadores. Durante umasemana, a Frente Comum promoveu juntoda opinião pública uma vasta campanha deinformação, divulgando as suas principaispreocupações com o designado programa dereorganização da administração central doEstado (PRACE), que mais não pretende doque desvalorizar a importância e o papel dosserviços públicos na satisfação das necessi-dades mais prementes da população portu-guesa e transferir esses serviços para a alçadado sector privado.

Esgotado que está o modelo de cresci-mento da economia a partir dos sectorestradicionais, em vez de investirem nas áreasprodutivas tradicionais e de desenvolver umaacção mais criativa assente no conheci-mento, na qualificação e na tecnologia, osgrandes grupos económicos estão a voltar-se para áreas até aqui da responsabilidadedo Estado, como aliás preconiza a Consti-tuição da República Portuguesa.

O Governo de José Sócrates, tomou, pois,a iniciativa de acelerar e alargar osprocessos de privatização também para asaúde e a educação, onde o mercado épotencialmente vasto e inesgotável. As

Administração Pública deu rosto ao futuro19 de Maio

As recentes decisões tomadas em relação ao encerra-

mento de serviços de urgência e de maternidades, bem

como de milhares de escolas, e do desenvolvimento de

uma política concentracionista, reduzindo os custos de

manutenção e de exploração, são clarificadoras das

verdadeiras intenções do governo.

recentes decisões tomadas em relaçãoao encerramento de serviços deurgência e de maternidades, bemcomo de milhares de escolas, e dodesenvolvimento de uma políticaconcentracionista, reduzindo os cus-tos de manutenção e de exploração,são clarificadoras das verdadeirasintenções do governo. Ao mesmotempo agravam a situação social emvastas regiões do país e tendem aagravar a situação socio-profissionalde milhares de trabalhadores daadministração pública.

A um ataque tão duro e gravoso parao sector é necessário responder comacção e denúncia. A iniciativa da FrenteComum de 19 de Maio e os contactosrealizados com a população durante todaa semana foram determinantes para oelevado apoio e compreensão da popu-lação para a luta dos trabalhadores daadministração pública.

Mais de 25 000 trabalhadores da administração pública desfilaram no dia 19 de Maio, doParque Eduardo VII para a Assembleia da República, representando os diversos sectores(Educação, Saúde, Segurança Social, Administração Local…).

T

8 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

ue o tentará fazer pela via daimposição também ninguém du-vida. O autismo que têm reveladoos responsáveis ministeriais, emespecial Lurdes Rodrigues e ValterLemos, a má opinião que têm dos

professores e educadores e as medidas que,no ano e meio que levam de mandato, têmvindo a impor, não deixam dúvidas sobre assuas intenções. Dúvidas existirão, apenas,sobre até onde ousarão ir.

Da parte da FENPROF a intenção sobreo processo de revisão do ECD é outro, diriamesmo, é exactamente o contrário. Para a

Expectativas, exigênciREVISÃO DO ECD

FENPROF, a revisão do ECD não é umaprioridade; contudo, a ter lugar, não lhevirará as costas. Participará, exigirá respeitopela Lei da Negociação, exigirá, ainda, ostempos necessários para que os professorespossam ser envolvidos na negociação.

Quanto às propostas da FENPROF, elaspartem de uma convicção: esta revisão deveservir para inverter o caminho negativo quetem vindo a ser percorrido, não só atravésda perversão de importantes regras estatu-tárias, como da revogação de outras e, até,pelo desrespeito de mais algumas que sãoclaras na lei, mas têm sido desrespeitadas.Em 1997/98 a revisão que então teve lugartraduziu-se em importantes passos dadosno sentido da afirmação de uma identidadeprofissional docente minimamente ajustadaaos caminhos que se deparam à nossaprofissão. Oito anos depois, a FENPROFentende que a fazer-se nova revisão eladeverá orientar-se para o aprofundamentodaquele caminho e, por isso, a revisão deveráser global e partir do conjunto de direitos edeveres profissionais, transformado em eixoem torno do qual girará todo o articulado.

Direitos fundamentais

É nesse quadro que a FENPROF apresen-tará o conjunto de direitos profissionais aconsiderar, designadamente, direito departicipação no processo educativo; direitoà formação e informação para o exercícioda função educativa; direito a condições detrabalho condignas; direito à segurança naactividade profissional; direito à negociaçãocolectiva; direito à estabilidade profissionale a uma remuneração digna; direito à nãodiscriminação. Mas também de deveres,defendendo que estes constituirão um com-promisso ético assente numa autoridadecientífico-pedagógica, configurada porvalores de excelência e afirmados nosdiversos contextos e dimensões de exercícioprofissional. Daí que, para além dos deveresgerais, a FENPROF considere tambémindispensável fixarem-se os deveres dos

Mário Nogueira (Coordenador da Comissão Negociadora Sindical)

O que pretendem o Governoe o Ministério da Educaçãocom a revisão do Estatuto deCarreira dos Educadores deInfância e dos Professoresdos Ensinos Básico eSecundário (ECD) todossabemos: liquidar direitos,aplicar normativos gerais emuito negativos como osque constam do SIADAP(Sistema Integrado deAvaliação do Desempenhona Administração Pública),consolidar medidas que têmvindo a agravar os horáriosde trabalho e adescaracterizar o exercíciode funções docentes,reestruturar a carreira nosentido de reservar apenaspara alguns o acesso aosescalões salariais de topo.

Q

no alvo

A medição da representatividadesindical poderá contribuir para dignificar omovimento sindical docente no seuconjunto, valorizando os sindicatos comoestruturas legítimas de representação doseducadores e professores.

(…) Para além dos argumentos polí-tico-sindicais, há argumentos jurídicos afavor da medição da representatividadesindical.

Medição darepresentatividadesindical em seisparágrafos

(…) O respeito pela representatividadeestá em plena sintonia com os princípios dopluralismo e da liberdade sindical e justifica--se pela necessidade de assegurar umaefectiva tutela dos interesses colectivosunitários dos trabalhadores”.

(…) O respeito pela representatividadedecorre ainda do reconhecimento doalargamento do campo de intervenção dossindicatos, aos quais são atribuídos novospapéis no desenvolvimento de uma demo-cracia social e política”.

(…)Este processo poderá mostrar quese o grupo profissional dos docentes temuma alta taxa de sindicalização, isso não épor acaso: é porque há uma estreita ligaçãoentre a história da profissão e a história doassociativismo e sindicalismo docentes.

(…) É essa ligação que faz com que aintervenção e a luta dos educadores eprofessores associe os interesses sócio--profissionais com preocupações pelaqualidade de educação e pelas políticaseducativas, numa perspectiva de desenvol-vimento e progresso do País.

Manuela Mendonça, dirigente do SPNe da FENPROF, em entrevista

ao “SPRA Informação”,edição Abril/Maio

MAIO 2006

JORNAL DA FENPROF 9MAIO 2006

profissionais docentes perante os seusalunos, os seus colegas e, ainda, os pais eencarregados de educação.

No que respeita à formação há queassegurar que seja de qualidade, em todasas suas componentes, o que significa quedeverá continuar a ser de nível superior, coma duração de 5 anos para todos, indepen-dentemente do sector ou nível de ensino aque se destina. Também ao nível daformação contínua se espera uma revisãoprofunda do actual regime de créditos.

Combate à precariedade

A estabilidade do corpo docente serátambém outra preocupação da FENPROFnesta revisão, pelo que o combate àprecariedade e o direito a integrar um quadroserão exigências a apresentar ao ME. Aexistência de um regime de vinculaçãodinâmico, assim como de incentivos à fixaçãoem zonas isoladas e desfavorecidas sãoreivindicações que não serão esquecidos.

Aspecto muito importante será o regimee o horário de trabalho dos educadores eprofessores, bem como a definição precisado que são as funções docentes e de quaisas actividades que terão lugar dentro dascomponentes lectiva e não lectiva dos

professores e educa-dores.

Desempenho

Aspecto central des-ta revisão será, sem dú-vida, a avaliação do de-sempenho. O Governoprocurará impor aos pro-fessores as regras doSIADAP aprovado em 23de Fevereiro deste anocom os seus votos da ac-tual maioria parlamentar.A FENPROF mobilizará osprofessores e educadorespara lutarem contra o

SIADAP e, em alternativa, apresentará ummodelo de avaliação do desempenhoformativo, de carácter globalizante esistémico, centrado na escola, continuado eúnico e que se apresente como factor deverdadeira exigência profissional. Ao modeloeconomicista do ME, criado simplesmentepara evitar o desenvolvimento na carreira e,assim, impedir o acesso aos escalões de topo,a FENPROF responderá com o que é impor-tante na avaliação: detectar problemas edificuldades, elaborar diagnósticos e propormedidas que se concretizem. Fora destalógica, a avaliação será pouco mais do queuma expressão de hipocrisia.

Carreira única

Já no que respeita à estrutura da carreirae estatuto remuneratório, a FENPROFretomará as posições que sempre defendeu:respeito pelo princípio da carreira única egarantia de paridade com as carreiras dostécnicos superiores. Também se defenderáa redução do leque salarial, dos mais amplosdentro da UE, do tempo de serviço paraacesso ao topo e a fixação de impulsossalariais idênticos entre cada escalão.

Também de grande importância serãoas questões relacionadas com a aposen-

as e propostas da FENPROFtação de professores e educadores. Não éaceitável a aplicação de um regime deaposentação que para além de penalizartodos os trabalhadores é particularmentepenalizador de profissionais cuja actividadeé, reconhecidamente, altamente exigente edesgastante. Sem perder de vista o que seconsidera justo (aposentação ao fim de 30anos de serviço) a FENPROF não poderáignorar o actual contexto muito negativo edeverá procurar, para já, recuperar ascondições de aposentação existentes antesdos Governos de Santana Lopes e JoséSócrates terem alterado as leis em vigor.Simultaneamente propor-se-ão condiçõesespecíficas a cumprir nos últimos anos deserviço, não sendo esquecida, ainda, aexistência de regimes diferenciados dedocência, justificando-se, por isso, regimesespeciais de aposentação.

Por fim, o conjunto de faltas, férias,licenças e dispensas. Não haverá grandesalterações a propor, apenas que os actuaisregimes em vigor sejam respeitados o quenão acontecido nos últimos tempos.

Consensos indispensáveis

É, pois, complexa a revisão que seaproxima. Há propostas que são consen-suais, outras certamente serão geradoras dealguma polémica. É natural que tal acon-teça, é até importante que assim seja, mas,para que se encontrem os consensosindispensáveis será preciso tempo para de-bater com os professores. Tempo, também,para que conheçam as propostas doMinistério da Educação.

Da parte da FENPROF tudo será feito paraque a negociação seja um processo sério erespeitador do quadro legal que a consagra,quer sendo exigente para com o ME, querrespeitando as próprias regras estabelecidas.

Da parte dos professores e educadoresespera-se também uma atitude exigente edisponível. Exigente perante o ME, disponívelpara lutar sempre que (quando e como) se viera justificar ao longo do processo negocial.

JORNAL DA FENPROF 9MAIO 2006

10 JORNAL DA FENPROF MAIO 200610 JORNAL DA FENPROF

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

Em 11 de Maio realizava-se a maiorgreve nacional dos professores eeducadores. “Por todo o país osprofessores exprimem a mais profundaindignação pelo comportamento doGoverno e do seu Ministério daEducação. As propostas de grelhasalarial que foram apresentadas parao Estatuto são uma afronta”.

ECD com históriaPela Revalorização Material da Carreira Docente

MAIO DE 1989“JF” nº 55

No editorial de Maio de 1989, PauloSucena escrevia: “Os professores portu-gueses fizeram no passado dia 11 a maiorgreve de sempre. Souberam concretizar naacção e na luta o sentimento de profundaindignação pela proposta de reforma dosistema retributivo da Função Públicaapresentada pelo Governo.” Para mais àfrente reflectir o sentimento dos professoresem relação ao comportamento do governoque se recusava a revalorizar materialmentea carreira dos professores cujos saláriosestavam mais desvalorizados do que nosfinais da década de sessenta: “um compor-tamento de um governo que reconfirma umcerto pendor totalitário, expresso na arro-gância com que falta ao prometido e nacrença de que é capaz de esmagar o sentir eo querer de mais de uma centena de milharde professores”.

Mas Maio estava ao rubro, em luta ecom forte pendor mobilizador da acção eda luta dos professores e educadoresportugueses. Era por isso, convocada maisuma Greve para os dias 22, 23 e 24 de Maio.

E ontem, como hoje, o editorial do n.º55 do Jornal da FENPROF era inequívoco:“Aos professores não restam quaisquerdúvidas de que este Ministro (RobertoCarneiro) e este Governo (o de Cavaco Silva)são inimigos dos Professores”.

Luís Lobo

“Quanto maior importância seatribui à Educação maior atençãotem de ser dada à melhoria dascondições de vida dos professores”

“O projecto de intervenção socialconsubstanciado na FENPROF e nosindicalismo docente que repre-senta é claramente maioritário edeterminante na acção global dosprofessores portugueses”

António Teodoro

“Ninguém se irá pôr de fora. Nin-guém se irá trair a si próprio.”

Paulo Sucena

Estatutoda Carreirade A a Z

(2ª parte)

FFormação de Professores — Tem um

capítulo específico no diploma, reportando--se à Lei de Bases do Sistema Educativo eaos seus princípios nesta matéria. Pelaprimeira vez é estabelecida uma relaçãodirecta e lógica entre a estrutura da carreirae a formação inicial obtida pelo docente,bem como entre a aquisição de formaçãosuperior e o posicionamento de cada umna estrutura da carreira, de acordo com oprincípio de carreira única. Aliás, a carreiraúnica valoriza o papel comunicador entreos diversos patamares de progressãoindependentemente de o professor ou oeducador ser licenciado ou bacharel.Consagra três modalidades de formaçãocom relevância para o desenvolvimento

profissional: a formação inicial, contínua eespecializada. Em relação à formaçãocontínua, ela é finalmente considerada umdireito e um dever simultaneamente. Umdireito, tendo em conta que o ECD a consideradeterminante para a valorização profissionaldos professores, reconhecendo-os comodetentores de saberes técnicos e científicospróprios, capazes de se valorizarem na relaçãocom os seus pares e externamente à profissão.Tida como formação profissional, a formaçãocontínua, que mantém uma enorme depen-dência das arbitrariedades do poder emrelação à definição de prioridades para o seufinanciamento, visa “a actualização, oaperfeiçoamento, a reconversão e o apoio àactividade profissional do pessoal docente”. Étambém um dever, na medida em que dafrequência de acções de formação dependea progressão na carreira.

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JORNAL DA FENPROF 11MAIO 2006 JORNAL DA FENPROF 11MARÇO 2006

HHorário de Trabalho — Tratando-se de

um Estatuto de Carreira, seria inacreditávelque também ele não consagrasse uma partesubstancial do seu articulado ao horário detrabalho. Convém referir que directamenterelacionados com esta matéria estão direitossociais fundamentais como o do direito ao

emprego estável, o direito ao acom-panhamento da família, à maternidade epaternidade, mas também profissionaiscomo o direito a um horário fixo de trabalho,à sua remuneração justa, ao pagamento dehoras extraordinárias, à bonificação peloexercício de funções em turnos nocturnos,à duração semanal justa do horário detrabalho e, no caso dos professoreseducadores, à definição de trabalho lectivoe não lectivo, o que, pela sua complexidade,assume características únicas ao nível daregulamentação do trabalho. O actualministério da Educação pretende aumentaro horáro lectivo de trabalho para níveisnunca verificados. Não se coíbe de impormedidas que reduzem a qualidade de ensinoe recusa-se ao pagamento de serviçodocente extraordinário o que é motivo demuitos processos que correm em tribunal.A luta dos professores e de todos ostrabalhadores da administração públicacontra o aumento do horário de trabalho éuma tarefa fundamental.

GGraus académicos — Apesar de enqua-

drar profissionalmente os professoresdetentores de bacharelato, licenciatura ousem formação de grau superior, o Estatutoda Carreira Docente valoriza inequivo-camente a licenciatura como o grauacadémico de base. Nesse sentido encontra--se consagrado no Estatuto que sempre queum professor adquire o grau de licenciaturaou qualificação para o exercício de outrasfunções educativas (através da conclusãode um Curso de Estudos Superiores Especia-lizados – equiparado, para efeitos decarreira, à licenciatura) deve ser posicionadono escalão em que se encontram osdocentes licenciados com o mesmo tempode serviço. Também estão previstas boni-ficações em tempo de serviço para osprofessores que adquiram um mestrado (4anos) ou um doutoramento (6 anos). Assim,os graus académicos assumem uma impor-tância fundamental na estrutura e posicio-namento na carreira, bem como na valo-rização da profissão. Apesar de aprovadohá 16 anos, os governos continuam a nãoassegurar que todos os professores adqui-ram, pelo menos, o grau de licenciado.Muitos professores, dos vários níveis, nãotiveram ainda possibilidade de frequentarcursos de complemento de formação,designadamente nos 2.º e 3.º ciclos e noensino secundário, que são os níveis deensino mais atingidos pela irresponsa-bilidade de sucessivos Ministérios, nestamatéria.

Por esse motivo, o Estatuto prevê aexistência de interrupções lectivas paraalunos, mas também para professores. Emrelação a estes, a possibilidade de gozodesses períodos de descanso depende dosinteresses e recursos disponíveis em cadaescola. Tem-se provado que esses momentossão fundamentais para que, com um novoperíodo lectivo, os professores e educadoresreúnam, de novo, as melhores condiçõesfísicas e psíquicas. De qualquer forma, aduração do gozo desses períodos (que podeser interrompido a qualquer momento peloórgão de gestão, desde que a conveniênciade serviço o justifique) não pode excederos 30 dias por ano, e não pode ser de maisde 10 dias em cada momento, o que, naprática corresponde a 16 dias úteis por ano.É importante referir que o mal-estarcrescente que se sente nas escolas decorre,em parte, segundo relatos obtidos junto demuitos professores e educadores, bem comode muitos encarregados de educação, daprogressiva supressão de tempos de pausana actividade docente e discente. Algunsinimigos dos professores e da qualidade doensino público pretendem acabar com essasinterrupções, chamem-se eles Valter Lemosou Miguel Sousa Tavares, usando, por vezes,a mentira para justificar os seus fins.

[na edição n.º 208 do JF fizemosreferência à Intercomunicabilidade comosendo o assunto do ECD a tratar no “A a Z”.Porém, tendo em conta os ataques a que osprofessores têm estado sujeitos, pareceu-nos ser importante tratar as questões dainterrupção lectiva]

IInterrupção da Actividade Lectiva — O

Estatuto da Carreira Docente, na esteira dedocumentos aprovados no plano interna-cional (é o caso da “Recomendação da OIT-UNESCO sobre a condição do pessoaldocente” de 1966), reconhece a profissãodocente como sendo de elevado desgastefísico e psíquico, pela sujeição crítica epermanente aos olhos da sociedade, emgeral, e pela relação estreita e indivi-dualizada que obriga a ter com os alunos eas famílias, em particular, mas também pelanecessária e constante actualizaçãocientífica e pedagógica, pelos elevados cus-tos que acarreta, pelo perigo a que sujeitaos docentes nas diárias e/ou longasdeslocações que têm de fazer, etc.

JJustificação de Faltas — Em momentos

de agudização da luta dos professores eeducadores, surgem, normalmente, crónicas,editoriais ou meras subjecções de algunsjornalistas em reportagens sobre acções deluta que procuram transmitir a ideia de queos docentes portugueses ganham muito,mas têm um elevado absentismo, muitasférias, excessivas pausas, pontes, etc., nãoadmitindo, porém, qualquer contraditório.Outra ministra, Ferreira Leite, tentoumanchar o bom nome dos docentes paraimpor medidas muito gravosas, mas acaboupor reconhecer que o absentismo dosprofessores era muito baixo. Mais recen-temente, Valter Lemos, num dia de Outonoem que os professores faziam greve,sacrificando o seu salário, veio dizer que os

JORNAL DA FENPROF 11MAIO 2006

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ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTEprofessores faltavam milhões de dias,manipulando a informação e condicio-nando o apoio da população à luta dosprofessores. Vale a pena, por isso, lembrara posição que a FENPROF tomou, já naposse dos dados disponibilizados peloGIASE-ME:

“Em média, cada professor faltou 0,4dias (menos de meio dia) por ano aoabrigo do Estatuto do TrabalhadorEstudante; Por conta do período deférias cada professor faltou, em média,3 dias por ano, o que significa que nãodeu 75% das faltas que poderia ter dado;Por doença, cada professor ou educadorfaltou 6 dias por ano. Ora, corres-pondendo muitas dessas faltas a doençasprolongadas, foram inúmeros os que nãoderam qualquer falta por doença, terãosido a grande maioria; Para assistência àfamília (filhos com mais de 10 anos oufamiliares idosos) cada professor faltou,em média, 1 dia por ano; Já paraassistência a filhos menores de 10 anoscada docente, em média, utilizou 0,8dias; E para tudo o resto (acções deformação, reuniões sindicais, greve,falecimento de familiares, casamento,cumprimento de obrigações legais, faltasnão imputáveis ao trabalhador, partici-pação em campanhas eleitorais comocandidato,…) cada professor, em média,utilizou 5 dias por ano. Releva-se o factode todas estas faltas serem devidamentejustificadas e prova-se que os milhões defaltas com que o ME pretendeu esmagaros professores não são assim tão esma-gadores e, bem pelo contrário, revelamque a taxa de absentismo dos professoresnão é superior à dos demais trabalhadoresportugueses, nem será diferente da dosseus congéneres europeus. É esta arealidade que o ME, por razões que todoscompreendemos, procura escamotear.Fazendo-o e colocando em causa aatitude profissional dos docentes, o MEnão diz a verdade, está a ser injusto epresta um mau serviço ao país que tantonecessita de professores respeitados edignificados.”

Provavelmente alguns dos detraidoresdos professores não serão tão assíduosquanto os professores.

programa da iniciativa proporcionou um interessante debate organizado emtorno de dois painéis: o primeiro subordinado ao tema “Olhares sobre a profissãodocente”; o segundo sobre “o Estatuto da Carreira Docente – perspectivas parauma revisão”. Moderado por António Avelãs, vice-presidente do SPGL e membrodo SN da FENPROF, o primeiro painel registou intervenções de Paulo Sucena,

secretário-geral da Federação; Daniel Ricardo, director executivo da revista “Visão”; eRicardo Vieira, docente do Instituto Politécnico/ESE de Leiria.

O painel da tarde, conduzido por Mário Nogueira, coordenador da Direcção do SPRCe membro do SN da FENPROF, contou com comunicações de Abel Macedo, coordenadorda Direcção do SPN e membro do SN da Federação, e de Isabel Baptista, docente daUniversidade Católica/Porto, investigadora com profundo trabalho desenvolvido noscampos da ética, da deontologia e da autonomia profissional dos docentes.

Neste caderno especial, reunindo entrevistas, depoimentos, intervenções e outrosapontamentos, o “JF” tenta dar uma panorâmica das preocupações e das ideias quemarcaram o debate realizado em Lisboa, enriquecido pelas reflexões de muitos dosparticipantes, presentes na Mesa e entre a assistência, que lembraram os “avançossignificativos” conseguidos com o Estatuto, as alterações que já sofreu, “o que temoshoje” e o que “é necessário fazer” em termos de desenvolvimento e divulgação destecombate junto de todos os docentes e da opinião pública em geral. | JPO

Dos “olhares sobre a profissãodocente” às “perspectivaspara uma revisão” do Estatuto

Seminário promovido pela FENPROF

A dinâmica de uma revisão global, contemplando, numacarreira única, um conjunto de direitos e deveres profissionais,em sintonia com o destacado papel social dos docentes, esteveem foco no seminário que a FENPROF realizou em Lisboa nopassado dia 27 de Abril, envolvendo dirigentes, delegados eactivistas sindicais oriundos de todas as regiões do País erepresentado os vários Sindicatos da Federação.

O

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s palavras são de Paulo Sucena emarcaram o arranque dos trabalhosdo seminário realizado em Lisboa nopassado dia 27 de Abril. Muito maisdo que uma intervenção formal de

abertura, foi um contributo enriquecedorpara uma reflexão fundamental nos dias quevivemos: Quem é o cidadão-professor? Quedesafios, exigências, tarefas e responsa-bilidades se atravessam no seu caminho?

Ao iniciar a sua intervenção, o secre-tário-geral da FENPROF recordou que “a Leide Bases do Sistema Educativo (1986)consagra alguns princípios gerais sobre aformação de professores dos ensinos básicoe secundário”, propondo uma reflexão àvolta de temas como:

“- formação integrada quer no plano depreparação científico-pedagógica quer noda articulação teórico-prática;

- formação que, em referência àrealidade social, estimule uma atitude

Quem é o cidadão-professor?Contributo de Paulo Sucena para uma reflexão fundamental dos nossos dias

Ser Professor Hoje……exige ao docente uma face reflexiva, interventivae reivindicativa mas também a consciência de queo seu perfil profissional se constrói e reconstrói coma problematização de questões e a produção de respostassobre o contínuo movimento da História

simultaneamente crítica e actuante;- formação que favoreça e estimule a

inovação e investigação, nomeadamente emrelação com a actividade educativa;

- formação participada que conduza auma prática reflexiva e continuada de auto-informação e auto-aprendizagem”.

Um intelectual bem preparado

“A leitura crítica destes princípios”,prosseguiu o dirigente sindical, “desde logoaponta para uma concepção de professorencarado como um intelectual portador deuma vasta e variada preparação científico-pedagógica, enriquecida nos campos daprática, da investigação e da inovação”.

Mais adiante, Paulo Sucena afirmou:“A Lei de Bases do Sistema Educativo,

produzida e aprovada num tempo em quejá se havia dado a massificação do sistemaeducativo e a consequente explosão

numérica do corpo docente, reflecte essarealidade e traça um perfil do professor como grau de exigência que considera adequadoa quem, nos finais do século XX, tem detrabalhar com uma população estudantilmuito diversificada, não raras vezes comcomportamentos anti-sociais e outros queimpõem, de facto, rigor e seriedade noscritérios de selecção dos professores.”

Um mestre muitopara lá do “missionário”

Tal perfil profissional, acrescentou osecretário-geral da FENPROF, possibilita que“a docência seja exercida, como escreveuAntónio Nóvoa, por “profissionais reflexivosque devem deter os meios de controle sobreo seu próprio trabalho, no quadro de umamaior responsabilização profissional e deuma intervenção autónoma na organizaçãoescolar”.

Evocando Rui Grácio, Sucena lembrouque “um mundo novo exige um novo ensino,um novo aluno e um novo tipo de mestre”.Um mestre capaz de suscitar no aluno,segundo Grácio, “a vontade e a capacidadede transformar o mundo”. Um mestre muitopara lá do “missionário” ou do simplestransmissor de informação.”

Construção colectiva

“Um mestre que deve, como queriaNóvoa, assumir a sua autonomia mas nãocomo uma forma de individualismo absolutoexercida numa sala de aula encarada comouma impenetrável torre de marfim. Tal seriapensar que a renovação e inovação da e naescola se alcançariam com o esforçosolitário de cada professor quando arealidade mostra que aqueles caminhos sósão passíveis de serem trilhados, comproveito individual e da comunidade, seforem construídos colectivamente, sob oimpulso de um projecto plural assumidopela escola”, observou o secretário-geral daFENPROF.

Noutra passagem, afirmaria:“Quando visionamos a renovação e a

inovação que os diferentes contextos sócio-

A

Paulo Sucena: “Quanto mais vasta e variada for a participação de cada professor no projecto colectivo daescola mais rica será a autonomia desta. Quanto mais autónoma for uma escola mais possibilidades deautonomia dá a cada um dos professores individualmente”.

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ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTEeconómico-culturais exigem associamo-lassubstancialmente à autonomia das escolaso que não significa que posterguemos aautonomia individual do professor. Aliás,quanto mais vasta e variada for a partici-pação de cada professor no projectocolectivo da escola mais rica será aautonomia desta. Quanto mais autónomafor uma escola mais possibilidades deautonomia dá a cada um dos professoresindividualmente”.

Cultura profissional

Essa autonomia profissional “também sedemonstra”, segundo Paulo Sucena, “atravésda capacidade de pensar, planificar eexecutar procedimentos e de decidir, a cadamomento, de forma comprovadamentecriteriosa”.

“Tal exige do professor uma argúciaperceptiva ampla e diversificada, acom-panhada do poder de engendrar perma-nentemente as atitudes, os gestos e oscomportamentos relacionais mais ajus-tados”, observou mais adiante.

“Deste ângulo”, avançou Paulo Sucena,“estamos a perspectivar, como Torres Santomé,a seguinte necessidade: “o professor comoinvestigador na aula terá que redefinirconstantemente a sua prática à luz das suaspróprias ideias e ideais”, assente naquilo a quese chama “cultura profissional” dos professores- o acervo de conhecimentos, de técnicas, devalores e de linguagens cuja amplitude eprofundidade aliadas a uma rigorosa eeficiente utilização nos mostram a qualidade

profissional do docente.”“Ser professor hoje obriga também a que

os profissionais do ensino não se deixemenredar pela crise que abala a escola e osistema educativo, fruto de erros, incoerên-cias e incúrias da política educativa dosúltimos anos, e se assumam como impres-cindíveis agentes de mudança e não comoreprodutores mecânicos de práticas empí-ricas”, referiu.

Desenvolvendo ainda essa temática,Paulo Sucena realçou que “nos tempos dehoje, nenhum professor que encare comrigor as exigências da sua formaçãocientífica e profissional, nenhum professorque busque com afinco as melhoresrespostas para as inúmeras e complexasquestões de ordem científica, pedagógica,sociológica, ética ou outra, pode permitirque desqualifiquem a sua profissão ou lheocultem os seus parâmetros científicos. Porisso, para que sejam os melhores a respon-derem às exigências do ser professor hoje,

Como escreveu Rui Grácio, “um

mundo novo exige um novo

ensino, um novo aluno e um novo

tipo de mestre”. Um mestre capaz

de suscitar no aluno, segundo

Grácio, “a vontade e a capacidade

de transformar o mundo”. Um

mestre muito para lá do

“missionário” ou do simples

transmissor de informação.”

“Ao professor de hoje pede-se queencare o pensamento pedagógico nãocomo um mero acervo de técnicas deintervenção prática mas como um pensa-mento científico”, destacou Paulo Sucenano seminário de Abril, que comentaria logode seguida:

”Uma das mais relevantes tarefas quese colocam aos professores, no domínioteórico, é a de questionar a própriapedagogia, no sentido de a interrogarexplicitamente e não a aceitando comomera história da pedagogia, alicerçada nasideias dos grandes pedagogos, aquilo aque se costuma chamar tradição peda-gógica. Não é a aceitação existencial datradição, do que se tornou institucional, que

é necessário que os docentes não sejam pagos“a preço de saldo” para, uma vez mais, usar umaexpressão desse grande vulto do pensamentoeducativo que se chamou Rui Grácio.”

A oficina onde se forjaa autodeterminação

Citando ainda Rui Grácio, Sucenaafirmaria que “os tempos de hoje determi-nam que os professores sejam exigente-mente seleccionados, o que implica tambémuma formação contínua adequada e dequalidade, e simultaneamente que o poderpolítico transforme uma escola selectiva ecentrífuga para grande número dos alunosnuma “oficina onde a experiência se deviaordenar, ou aceitar que se ordenasse, demaneira a garantir a cada um, no encontrocom o real e com os outros, o encontro desi mesmo; ou melhor: o constante reen-contro, a intérmina reconstrução de simesmo, pois que o eu não é um dado, masuma conquista, uma reconquista incessante.

”De qualquer modo: a oficina onde seforja a autodeterminação de um destinopessoal para satisfação própria e o proveitodo bem comum”, destacou ainda o dirigentesindical.

“Em síntese, é legítimo afirmar que serprofessor hoje exige ao docente uma facereflexiva, interventiva e reivindicativa mastambém a consciência de que o seu perfilprofissional se constrói e reconstrói com aproblematização de questões e a produçãode respostas sobre o contínuo movimento daHistória”, concluiu Paulo Sucena. | JPO

se pede ao professor, neste dealbar doséculo, antes, pelo contrário, o que selhe aponta são os fascinantes ca-minhos da inovação. De outro modo,poderia dizer que do que se trata aquinão é do professor enquanto sujeitoformal de conhecimento mas de umprofissional com consciência históricaporque a sua relação com os outrostambém é fundamentalmente histórica.”

“Ao apontar alguns breves traçospara um perfil de professor”, o se-cretário-geral da FENPROF sublinhaque “a sua concretização depende demuitos factores, de natureza política enão só, que se reflectem no sistemaeducativo e na escola”.

Questionar a própria pedagogia

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onge de mim a intenção de sequerbeliscar o vosso orgulho profissional.Mas a verdade é que, numa entrevistaque me concedeu em 2002, a pro-pósito da publicação do seu livro As

Políticas de Educação em Discurso Directo,António Teodoro, especialista, como sabem,em Ciências da Educação, já me dizia que aescola está a responder mal aos problemaslevantados pela massificação, o principaldos quais, em sua opinião, reside nadiversidade cultural. «A escola», afirmou ele,então, «foi criada para uniformizar, deacordo com os padrões do Estado-Nação.Em primeiro lugar, a língua: na escolaportuguesa, não se permitia a ninguém quese exprimisse, por exemplo, em mirandês,ainda que essa fosse a sua língua materna;em segundo lugar, os hábitos culturais,impondo-se às crianças do campo umacultura urbana, ou seja, tomando-se comomodelo o aluno da classe dominante, a queos americanos chamam WASP (White,Anglo-Saxon, Protestant) e que nós, poranalogia, poderíamos denominar BLC(Branco, Luso, Católico). O que se pedia aos

Crises de identidadeDaniel Ricardo (Director Executivo da Revista “Visão”)

Seria extremamente pretensioso daminha parte vir aqui falar-vos daidentidade profissional dos pro-fessores ou de como os professoresencaram a sua profissão, porque,como é óbvio, se trata de umamatéria que não domínio. Presumo,pelo que vejo, ouço e leio natelevisão, na rádio e nos jornais, que,

desde o advento do processo de massificação escolar, se teminstalado em diversos níveis do sistema educativo, um crescentemal-estar, porventura empolado pelos próprios órgãos deinformação e pelos chamados opinion makers , de cujas causas,múltiplas e complexas, a menos relevante não será, decerto, afalta de preparação de muitos docentes para se adaptarem àsnovas realidades.

professores era, pois, que ensinassem muitoscomo se fossem um só. Agora, pede-se-lhesque tenham em conta as diversidadesculturais, que as respeitem e as ponham adialogar. Mas eles não estão ainda preparadospara essa grande alteração do paradigma es-colar», concluiu António Teodoro.

Pessoalmente, não me espanta queassim seja. Na perspectiva, digamos, daHistória da Educação, foi muito rápida atransformação das populações escolares,antes homogéneas, em multidões devariadas origens não apenas culturais mastambém étnicas e sócio-económicas, numcontexto «de mudança de valores, em queo dinheiro e o lazer estão a ganhar peso,em prejuízo do conhecimento e da leitura,e instituições de socialização, como a Igrejae a família, se confrontam com uma pro-funda crise», conforme nota AntónioTeodoro, naquela entrevista. E sublinha: «Oprofessor tornou-se numa espécie de criadapara todo o serviço. Além de ensinar, temde ser pai ou mãe, psicólogo, assistente so-cial, polícia. Isto é, atribuem-se à escolamais e mais responsabilidades, nas quais se

diluem as funções docentes (…). Quando seacumulam muitas e diversas competências,perde-se a noção de qual é a principal.»

Como jornalista, já experimentei estesentimento de desorientação, gerador demal-estar e, consequentemente, da mesmadesmotivação de que muitos professoresactualmente se queixam. Foi quando, nofinal dos anos sessenta, pouco tempo depoisde ter ingressado na profissão, ao serviçode A Capital, me dei conta de que, por causada censura, em vez de cumprir a minha maisimportante obrigação profissional – a deinformar os leitores, com verdade e rigor,sobre o que, de relevante, se passava no Paíse no mundo – gastava o meu tempo a cobrirfaits divers (desastres, pequenos delitos,etc.) e inaugurações de miudezas peloPresidente Américo Tomaz ou a resumirdiscursos de ministros, que pouco mais oscensores deixavam publicar….

Experimentei eu esse sentimento eexperimentaram-no muitos dos jovensjornalistas da época. Defraudados nasnossas expectativas, violentamente agre-didos por uma realidade que não nospermitia realizar o sonho de contribuir,através das nossas reportagens, paramelhorar o mundo, perguntávamos uns aosoutros: qual o sentido da nossa profissão?Depois reagimos, organizámo-nos e con-corremos às eleições para os corposgerentes das duas principais instituições daclasse, o Sindicato e a Casa da Imprensa,então dirigidas por velhos jornalistas, namaioria apoiantes do regime. Ganhámos. Eo Contrato Colectivo de Trabalho de 1972,já negociado por nós, tornou-se no primeirodiploma a consagrar as incompatibilidadesprofissionais e a objecção de consciência.

Mas os paralelismos que as fragilidadesdo sistema educativo, postas a nu pelamassificação do ensino, me sugerem são,sobretudo, os que penso existirem entre asituação escolar actual, por um lado, e asque envolveram o aparecimento mass me-dia e a emergência das novas tecnologiasde informação, por outro. A vós pertencerádescobrir as diferenças e as semelhanças.

Coincidências

Foi a Revolução Industrial que criou ascondições para o aparecimento da imprensade massas (1). Com efeito - para não falarde outras transformações nos campospolítico, económico, social, cultural ecientífico que já estavam em gestação desdeo início de oitocentos (2) -, o caminho-de-

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ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

ferro, a navegação a vapor, o telégrafo e,logo a seguir, o telefone, reduziram asdistâncias, acelerando a circulação dasinformações que a linotipia e a impressãomecânica permitiam multiplicar com umarapidez até então inimaginável: em 1867,a rotativa de Hyppolite Marinoni tirava, porhora, 18 mil exemplares do Petit Journal,de Paris. E, em 1880, a fotografia estreou--se na imprensa (concretamente, no DailyGraphic, de Londres), anunciando o adventodos periódicos ilustrados.

Entretanto, alargara-se o mercadopotencial dos jornais, devido à concentraçãodemográfica nas grandes cidades e ànecessidade de informação decorrente deuma maior participação popular na vidapolítica e do desenvolvimento das relaçõesinternacionais, diplomáticas e comerciais,bem como em resultado do aumento dainstrução das populações urbanas - «aalfabetização tornara-se conveniente,necessária e, por fim, obrigatória para seter acesso a qualquer emprego», observa ainvestigadora brasileira Nilson Lage (3).

Massificava-se o público-alvo, impu-nha-se aos jornais adaptar-se à novasituação. Não surpreende, assim, que, apartir da segunda metade do séc. XIX, em

Inglaterra, nos EUA e também em Portugal,onde o Diário de Notícias simboliza a grandemudança (4), tenha começado a definir osseus contornos um novo estilo jornalístico,dirigido às recém-aparecidas camadasintermédias de administradores de empresase de operários especializados. De vocaçãoessencialmente informativa, esta novaforma de praticar o jornalismo, baseada no«relato objectivo dos factos» vai conquis-tando cada vez mais terreno. E inicia-se alenta agonia da imprensa ideológica que atéentão se publicava, «doutrinária e moralista,de espírito proselitista, ao serviço de ideiaspolíticas e religiosas», conforme observa oprofessor espanhol José Luís MartinezAlbertos (5). Sem possibilidade de ampliaremas audiências, porque o seu público leitorsão as elites politizadas, os jornais deopinião dificilmente conseguem angariarpublicidade, vendo-se obrigados a praticaraltos preços por exemplar, mesmo quandocontam com subvenções de partidos,sindicatos ou grupos de pressão.

Mas se, por esta época, os periódicosmais sérios tentavam respeitar o princípioda objectividade, que consistia em narraros acontecimentos, sem os interpretar,conquistando, por isso, grande prestígio, já

os jornais populares, de enorme peso, noconjunto da imprensa, devido às suasgigantescas tiragens, logo começaram adistorcer e mesmo a ficcionar os factos, aosabor da excitação do momento, porque oimportante, para eles, era «vender papel»,adoptando os métodos sensacionalistas que,uns anos antes, James Gordon Bennet, chefede Redacção de The New York Herald,preconizava, sob o lema «Nunca deixem quea verdade vos prive de uma boa história». (6)

Sem formação técnica, que, em jorna-lismo, implica formação ética, os jornalistasda imprensa popular, também chamada«imprensa amarela», depressa caíram nodescrédito. O problema foi que, dada atendência da opinião pública para gene-ralizar, esse labéu acabou por atingir,igualmente, a reputação dos repórteres dosjornais sérios…

Nem por isso, todavia, se registaramquebras de tiragens e de vendas. Bem pelocontrário. Os leitores mais exigentescriticavam a futilidade dos jornais sensa-cionalistas, que ignoravam as suas necessi-dades de informação. Mas corriam acomprá-los, mal eles saíam da prensa.

E vem a propósito abrir um parêntesispara dizer que, no final da sua entrevista,António Teodoro afirmou: «Quando sediscute a questão dos gangs, que soluçãose apresenta? Menos tempos livres, maisescola. Há problemas de educação sanitária,de educação rodoviária? A escola que osresolva. Aumenta o desemprego? É porqueo ensino profissional não está a responder.»E comentou: «Actualmente, toda a gente sepermite criticar o sistema escolar – os opin-ion makers, a opinião pública informada, ospais dos alunos. Mas o seu discurso éparadoxal: ao mesmo tempo que zurzem naescola – sabe o que exigem? Exigem maisescola…» Coincidência?

Só depois da II Guerra Mundial, nasequência da divulgação do duro RelatórioHutchins acerca do estado da informação (7),se generaliza a reacção contra o sensacio-nalismo da chamada «imprensa amarela».Multiplicam-se, então, as escolas dejornalismo, surgem movimentos como oNew Journalism e o do Jornalismo Inter-pretativo - igualmente em resposta àconcorrência da rádio e da televisão que jáameaçavam agravar os problemas susci-tados pela massificação - e são aprovadosCódigos Deontológicos e outros instru-mentos de auto-regulação e co-regulação.Nem sempre, porém, com grande êxito,reconhece-se…

“Por causa dos maus jornais e dos maus repórteres, bem como da

multiplicação de novos órgãos de informação multimedia, das no-

vas tendências, no campo da propriedade dos media, e das

alterações legislativas anunciadas para o sector, também na classe

a que pertenço se instalou um grande mal-estar. Por isso, o nosso

próximo Congresso, que decorrerá ainda este ano, se subordinará ao

tema... adivinhem… A identidade dos jornalistas” (Daniel Ricardo)

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JORNAL DA FENPROF 17MAIO 2006 JORNAL DA FENPROF 17

Actualmente, é a Internet que coloca osmeios tradicionais perante novos desafios.A emergência do jornalismo digital, impri-mindo uma velocidade sem precedentes àcirculação da informação e transformandoa comunicação de massas em comunicaçãoglobal, levanta questões mais sérias eurgentes que nunca, nos campos daformação dos recursos humanos (jornalistase técnicos) e da ética profissional.

E a escola? Não está também ela a sentiro impacto das novas tecnologias? Não tem,também ela, de encontrar respostas paraos problemas suscitados pela atracção quea Internet exerce sobre os jovens?

Derrapagens

Não é raro ouvirmos os nossos gover-nantes – os actuais e os que anteriormentese sucederam no poder - proclamar que oensino constitui a principal prioridade doExecutivo. Outra coisa não seria, aliás, deesperar, num país em que a taxa deabandono escolar atingiu 33,7% em 2002/03, 40% da população com idades entre 20e 24 anos não completou o 12º. ano e ailiteracia afecta, em maior ou menor grau,cerca de 80% dos portugueses com maisde 15 anos. Nem quando, num contexto deglobalização, por toda a parte se valoriza oconhecimento como factor incontornável deprogresso e desenvolvimento, e, apesardisso, o mais recente relatório da OCDEdenuncia a falta de qualidade da educação,em Portugal, devida, especialmente, àdeficiente formação dos professores e dosdirectores das escolas.

Mas se o ensino representa a maiorpreocupação do Governo, poucas medidasgovernamentais terão suscitado tantacontestação como algumas das maisemblemáticas do Ministério de Maria deLourdes Rodrigues. Esse foi – e, porventura,continuará a ser – o caso da que obriga osprofessores a permanecerem nas escolaspara além do seu horário lectivo, a fim deassegurarem substituições de colegas eactividades extra-curriculares, sem que lhestenham sido previamente garantidas asnecessárias condições de trabalho. Polémicose prevê também o anunciado encerramentode 1500 estabelecimentos de ensino, cujodiminuto corpo discente não justifica, nosplanos pedagógico e económico, segundoo Ministério, que continuem a funcionar,não obstante os prejuízos que daí advirãopara milhares de crianças. Pelo contrário,afiguram-se consensuais as decisões de

proporcionar aos alunos do 1º ciclo aaprendizagem do Inglês e à generalidadedas escolas o acesso à Internet.

De todos estes problemas, conflitos econsensos se têm feito eco os jornais. Unsmais do que outros, é certo, e alguns atravésde curtas notícias descontextualizadas, ouseja, sem o aprofundamento e mesmo ainterpretação que as decisões governa-mentais anunciadas exigiriam, para seremcompreendidas na sua verdadeira dimensãoe significado, e frequentemente com baseem fontes institucionais, ignorando ocontraditório. Bem como através de textosde opinião, da autoria quer de especialistasquer daqueles comentadores de tudoquanto acontece, muitos dos quais sobre-põem a militância ideológica ao rigor daanálise que deles se espera.

Em contrapartida, a agenda televisivaparece nunca ter prestado ao ensino aatenção que este merece. No livro que acabade publicar, sob o título Prime Time – Doque falam as notícias dos telejornais, o pro-fessor universitário Nuno Goulart Brandãorevela, com base na análise quantitativa de180 telejornais da RTP1, SIC e TVI, que, em6315 notícias, apenas 75, ou seja, 1,19%,foram sobre Educação, e somente 14 (ou0,22%) sobre Ciência e Tecnologia. Trata--se de um estudo efectuado em 2003. Mas,como afirma Francisco Pinto Balsemão, noprefácio da obra, de então para cá, astendências detectadas pelo autor pouco seterão alterado.

Fixemo-nos, pois, nos jornais. E tome-mos como exemplo, as peças relativas àgreve de fins de Fevereiro deste ano dosdocentes do 1º ciclo contra as regras deorganização dos horários, que tornaramobrigatória a sua permanência nas escolasaté às 17 e 30. Lendo-as, verifica-se quealguns jornalistas se limitaram a publicar acontabilidade das adesões, opondo ossacramentais 5%, anunciados pelo Minis-tério, às percentagens divulgadas pelossindicatos. Outros, porém, fizeram o quedeviam: contrapuseram aos argumentosministeriais as razões que levaram aFENPROF a convocar a paralisação. Se o nãotivessem feito, muitos leitores teriamacreditado, por desconhecerem os motivosdo protesto, que aqueles professores o quepretendiam era trabalhar menos horas,prejudicando, assim, os seus alunos. Esse foi,com certeza, o efeito provocado por títuloscomo «Professores em greve contra ala-rgamento dos horários».

É claro que, nos casos desta natureza, o

ideal seria que os jornais tomassem ainiciativa de enviar equipas de reportagempara o terreno, a fim de verificarem se asescolas dispõem ou não das tais condiçõesde trabalho exigidas pelos docentes emgreve. Infelizmente, porém, hoje em dia, namaioria dos diários, é através de entrevistas,frequentemente feitas pelo telefone, que serecolhem as notícias e se cumpre (emboranem sempre) o contraditório. Os jornalistascada vez saem menos das redacções, ondecontam com os despachos da Lusa paraencherem uma boa parte das páginas dosseus jornais. E, na televisão, chegam aentrevistar-se uns aos outros. O pivot detelejornais da SIC João Adelino Fariamanifesta, num texto que escreveu para osite do Clube dos Jornalistas, a suaperplexidade, após ter assistido, numaestação concorrente, que não identifica, aoque pode considerar-se um momento deextrema bizarria: um jornalista convidadocomentava um comentário de outrojornalista que, na véspera, fora convidadopara comentar um determinado acon-tecimento. Além disso, por, geralmente,exigir o empenhamento, durante longosperíodos, de um repórter ou de uma equipade repórteres, que, nas pequenas redacçõesportuguesas, os editores consideramnecessários para se ocuparem de outrastarefas, o jornalismo de investigação temsido progressivamente abandonado.

Por outro lado, desde a emergência, emPortugal das televisões privadas e doaparecimento de novos jornais sensa-cionalistas que a corrida desenfreada dosmedia aos primeiros lugares nas tabelas devendas e audiências e consequente acessoàs campanhas publicitárias mais rentáveis,arrasta muitos jornalistas para uma guerra

“Será por acaso que os

professores, os políticos, os

juízes, os magistrados do

Ministério Público, até os

árbitros de futebol, e tantos

outros grupos profissionais,

incluindo o dos próprios

jornalistas, se queixam de que

os media, ou antes, os maus

jornalistas, aqueles que

funcionam como reverenciais

porta-vozes das suas fontes,

lhes denigrem a imagem?”

(Daniel Ricardo)

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ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

que não é deles, mas dos seus patrões,levando-os a sacrificar os deveres profissio-nais aos interesses comerciais ou ideoló-gicos das empresas para as quais trabalham.É o que acontece, por exemplo, quando, naânsia de publicarem uma notícia emprimeira mão, reproduzem opiniões bom-básticas de fontes... anónimas…

E se à concorrência entre as empresasjornalísticas juntarmos a competição entreos próprios jornalistas, determinada querpelo desejo de alguns de ascenderem aovedetismo, trocando «a ética pela suaimagem, o rigor da informação peloespectáculo, a distância crítica pelaintimidade com as fontes» (8), em especialcom as poderosas e as mundanas, quer, noque respeita aos mais jovens, quase todoscontratados a prazo, pela justo desejo deingressarem nos quadros - então, teremosconfeccionado o caldo de cultura propícioà precipitação e à leviandade na recolha eà superficialidade no tratamento dasinformações.

Neste contexto, agravado pela concen-tração da propriedade dos media, que aUNESCO já considerou lesiva do pluralismoda informação e mesmo da liberdade deexpressão do pensamento, e pela criseeconómica que atravessa quase todos ossectores de actividade, no nosso país,multiplicam-se as derrapagens deon-tológicas, com grave prejuízo da isenção edo rigor que devem caracterizar todo otrabalho jornalístico.

Será por acaso que os professores, ospolíticos, os juízes, os magistrados doMinistério Público, até os árbitros defutebol, e tantos outros grupos profissionais,incluindo o dos próprios jornalistas, sequeixam de que os media, ou antes, os mausjornalistas, aqueles que funcionam comoreverenciais porta-vozes das suas fontes,lhes denigrem a imagem?

Manipulações

No que ao ensino se refere, não énovidade para ninguém que nenhumGoverno resiste à tentação de deixar a suamarca no sistema educativo. De Executivopara Executivo, sucedem-se, pois, asmedidas avulsas, algumas apresentadascomo autênticas reformas, que os órgãosde informação não podem deixar de noticiar,dado o seu interesse para largas camadasda população. O problema é que, em geral,os jornalistas encarregados de as tratar, quepouco ou nada sabem de educação, não se

interrogam sobre a sua natureza. Vão essasmedidas no sentido de reforçar a implan-tação de uma escola para todos ou apostamnuma pedagogia elitista e meritocrática?Visam contemplar as diferentes necessidadeseducativas das heterogéneas populaçõesescolares ou ir ao encontro da reivindicaçãoneoliberal de um ensino que premeie aeficácia e a competitividade?

Dir-se-á - e com justiça - que, não sendoespecializados em educação, os jornalistasdeviam consultar especialistas que osajudassem a compreender e a interpretar ostemas sobre os quais escrevem, para nãocometerem erros factuais ou conceptuais. Noentanto, a velocidade a que, devido,sobretudo, à concorrência, têm de trabalhar,para não perderem as cachas (ou notíciasem primeira mão), leva-os a queimar algumadas etapas que o bom jornalismo aconselhaa percorrer, chegando mesmo a ignorar aobrigação do contraditório.

Além disso, acontece, com frequência, sero anúncio das medidas governamentais maisimpopulares acompanhado por artigos deopinião, cujos autores, ligados ao partido nopoder, não hesitam em misturar dados quenada têm a ver uns com os outros, para assimdefenderem as decisões do Governo. Econseguem fazê-lo de tal modo que os seusraciocínios até parecem possuir algumalógica. A técnica é simples. Por exemplo, apropósito do aumento do tempo de perma-

nência dos professores nas escolas,escrevem o que o senso comum consideraindiscutível: só é preciso mudar aquilo queestá mal. E o que é que está mal? O ensino,pois claro. Vejam-se os índices de insucessoe abandono escolar, a incapacidade dosresponsáveis de tornarem as escolas emespaços apetecíveis para os alunos, etc.,etc. E quem são os responsáveis? Osprofessores, pois claro, que não queremperder os seus privilégios, entre os quaisse contam os chorudos ordenados queauferem, em comparação com os dos outropaíses europeus, devendo eu abrir aquimais um parênteses para registar que, seas contas de certos opinion makersestivessem certas, então, em algunsdaqueles países, os docentes ganhariamabaixo do salário mínimo local…

Consequentemente, a imagem dosprofessores que tais artigos de opinião,certas notícias e alguns títulos passam paraa opinião pública é a de um grupo socialprivilegiado, bem pago, que não gosta detrabalhar, não sabe ensinar e transformaos estabelecimentos escolares em lugaresonde os alunos não querem estar.

Não se pense, no entanto, que osjornais detêm o exclusivo de desfocar oretrato da vossa classe. Permitam-me quelhes leia uma carta dirigida ao director daVisão por uma leitora:

«Já se impunha que Morangos com

“ Acontece, com frequência, ser o anúncio das medidas governa-

mentais mais impopulares acompanhado por artigos de opinião,

cujos autores, ligados ao partido no poder, não hesitam em misturar

dados que nada têm a ver uns com os outros, para assim

defenderem as decisões do Governo” (Daniel Ricardo)

18 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

JORNAL DA FENPROF 19MAIO 2006

Açúcar tomasse um lugar importante emcursos de formação de professores e degestores escolares, a fim de, com base nestasérie, se mostrar o que não se deve fazer.Tomemos como exemplo a ‘professora deInglês’: não deve falar português na aula; nãodeve usar a língua inglesa só como adorno ousó para repreender (‘Open your books on pageX e façam os exercícios’ ou ‘Meninos, silence!’);não deve usar a avaliação/testagem comoarma de repressão (‘Hoje há um mini teste desurpresa!’); não deve dar aulas particulares emcasa, a alunos seus, etc. Em outros momentos,os alunos têm para com os professores, emsala de aula, atitudes de grande irreverência,sem que, por isso, sejam repreendidos (numaaula de substituição, os alunos abandonam asala deixando ‘a professora’ conformada coma situação).

No plano da gestão escolar, repare-secomo foram tratados os casos disciplinares.Mais pareciam julgamentos sumários,lembrando um passado distante, sem quepassos fundamentais consagrados pelo nossoactual sistema educativo, como inquéritos,audição de testemunhas e reunião com osencarregados de educação fossem sequerreferidos, para já não falar da composiçãodo chamado Conselho de Turma.

Muitos seriam os exemplos a estudar numasérie que está a transpor o patamar entre aficção e a realidade – numerosos são os jovensque hoje se vestem, dançam ou agem como aspersonagens de Morangos com Açúcar.

Nada disto seria importante se a sérienão pretendesse passar mensagens sobre aconduta dos jovens em situação escolar. Oque deve preocupar os profissionais doensino é a imagem distorcida que deles, asérie, transmite. E por quê quase sempreatravés da ‘professora’ de Inglês?

Será que a TVI, a editora escolar que apoia asérie e as instituições associativas de professoresainda não repararam neste fenómeno?»

Como certamente se terão dado conta,ao falar da forma como os jornalistasdenigrem a imagem dos professores, denegrieu a imagem dos jornalistas. Impõe-se, porisso, sublinhar que, felizmente, ainda há, emPortugal, bons jornais e óptimos repórteres.Só que, por causa dos maus jornais e dosmaus repórteres, bem como da multi-plicação de novos órgãos de informaçãomultimedia, das novas tendências, nocampo da propriedade dos media, e dasalterações legislativas anunciadas para osector, também na classe a que pertenço seinstalou um grande mal-estar. Por isso, onosso próximo Congresso, que decorrerá ainda

este ano, se subordinará ao tema... adi-vinhem… «A identidade dos jornalistas».

Daniel [email protected]

(1) Seguindo a evolução dos jornais, nos paísesdesenvolvidos da Europa e nos Estados Unidos da América,desde meados do séc. XIX, tal como a descreve o inves-tigador Angel Benito (Teoria General de la Información,Ed. Guadiana, Madrid, 1973, pág. 163), verificamos que,em consonância com o próprio desenvolvimento social, aum jornalismo marcadamente ideológico se sucederam ojornalismo informativo e, já nos anos 50 do séc. XX, ojornalismo de explicação ou interpretativo, os quaiscoexistem, hoje em dia, nas publicações de referência.

(2) Desde o início de oitocentos que já estava emgestação uma impressionante série de transformações, noscampos político, económico, social, cultural e científico,da qual haviam de resultar a implantação do liberalismo,promotor da liberdade de publicação; a consolidação daeconomia de mercado e o consequente boom dapublicidade, determinado pela crescente concorrênciaempresarial e que não só possibilitaria a baixa do preçodos jornais, como desencadearia a corrida destes àconquista do maior número possível de leitores; a institu-cionalização, nos países industrializados, do sufrágio uni-versal; e, acima de tudo, o progresso tecnológico, no quadroda Revolução Industrial e dos avanços na utilização daelectricidade.

(3) Ideologia e Técnica da Notícia, Ed. Vozes,Petrópolis, 1979, pág. 21

(4) Os primeiros jornais portugueses eminentementeinformativos foram os lisboetas Jornal d’Utilidade Publica(1841) e O Telegrapho (1845). Mas, segundo o historiadorJosé Manuel Tengarrinha (História da Imprensa PeriódicaPortuguesa, Ed Portugália, Lisboa, 1965), só no período de1865 a 1885 se estabelecem, no nosso país, «as condiçõespropícias à transformação industrial da imprensa». É,efectivamente, em 1 de Janeiro de 1865 que se publica,em Lisboa, o nº 1 do Diário de Notícias, o quotidiano quesimboliza aquela transformação. Trata-se, escreveTengarrinha, «de um jornal popular, de preço, 10 réis [en-tre duas e quatro vezes menor que o dos outros jornais], eestilo ao alcance de todos (…), essencialmente noticiosoe sem filiação partidária», que, em 1865 já vendia 26 milexemplares, carregados de publicidade.

Explica o historiador: «Prefere-se cada vez mais ainformação objectiva à discussão e à opinião, as notíciassensacionalistas aos editoriais reflectidos – o que é reflexoda transformação da sociedade e da evolução ideológicada burguesia. Na necessidade de encontrar um públicomais largo, o jornal procura manter uma atitudeimparcialmente objectiva, dirigindo-se, assim, a todos, enão a um mercado específico de leitores ideologicamenteafins, mas necessariamente muito mais restrito.»

(5) Curso General de Redacción Periodística, Ed.Paraninfo, Barcelona, 1992, pág. 266

(6) Conta o investigador Nicolás Gonzalez Ruiz(Periodismo, Teoria e Prática, Ed Noguer, SA, Barcelona,1955, pág. 578): «Bennet estimulava e incitava os seusrepórteres mais empreendedores a procurarem crimes,escândalos, incluindo os sexuais, e os aspectos maissórdidos da vida. E o público, ainda que, ao princípio, sesentisse – como, de facto, se sentia – escandalizado eofendido por semelhante exposição da luxúria, dos víciose das baixas paixões do homem, ao mesmo tempo quecondenava o director que publicava esse lixo, corria acomprar o Herald, mal este saía da prensa.»

(7) Free and Responsable Press, 1947, estudo enco-mendado pelo Governo dos EUA

(8) Do manifesto da lista que, em 1996, venceu aseleições para o Conselho Deontológico dos jornalistas

JORNAL DA FENPROF 19MAIO 2006

“Não será nunca demais

referir a complexidade que

preenche hoje o quotidiano de

qualquer escola. Como

escrevia recentemente Isabel

Baptista, “na realidade, a

acção educativa desenvolve-

se num contexto de

especificidade humana que

torna inconcebível a redução

da função docente a uma

dimensão meramente técnica

ou instrumental”. E é isto que,

objectivamente, pretendem

Maria de Lurdes Rodrigues e

José Sócrates.

É isto que manda o

neoliberalismo em Educação.

Para quem pensa assim os

professores têm formação a

mais, não são ainda

suficientemente controlados,

medidos no seu desempenho

pelos resultados que

consigam obter, não importa

os contextos próprios de

escola, a comunidade onde se

insere, as pressões sociais

que sofre”.

Abel Macedo

20 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

Em 24/05/05 (salvo erro), Miguel Sousa Tavares em artigo de opinião no “Público” (Sonae- Eng. Belmiro de Azevedo) escrevia qualquer coisa como isto: de acordo com algunsinquéritos, sondagens ou estudos de opinião os portugueses em geral (ou na sua grandemaioria) concordavam com as reformas que o Governo preparava e/ou anunciava, desdeque não atingissem o sector onde trabalhavam, isto é, reformas estruturais sim, mas para osoutros. Até aqui, enfim, talvez nada de especial haja a registar.

Mais para a frente, M. S. Tavares (que pelos vistos faz parte da grande maioria queconcorda com as reformas - e aqui parece também não haver nada de especial a registar)escolhe os professores para “provar” que devem existir reformas estruturais. E “prova” como?

“Demonstrando” que os professores dão aulaspoucos dias por ano!

E como “demonstra”?Assim: o ano tem 365 dias; 52 semanas são

104 sábados e domingos (subtrai 104 de 365); 3meses de férias (?) são 90 dias (subtrai mais 90dias, “esquecendo” que está a subtrair 26 dias quejá tinha retirado - 13 sábados e 13 domingos de 3meses de férias no Verão que M. S. T. “decreta”para os professores); segue o mesmo “raciocínio”(?) para o Natal, Carnaval, Páscoa (sempre asubtrair de novo sábados e domingos já retiradosno início); retira feriados, talvez “pontes”, parachegar à conclusão desejada, creio que pouco maisde 100 dias por ano!

Sabemos que M. S. Tavares é escritor (?)/jornalista (?)/comentador (?), pelo menos. É lidoe ouvido. Devia exigir a si próprio, um mínimo de honestidade intelectual e talvez um poucode ética, o que, não usou certamente na “elaboração” da peça jornalística citada.

Sete meses e meio mais tarde...Estreia no “Expresso” (Impresa - Dr. Francisco Pinto Balsemão) em 7/01/06 (estreia

antecipada de várias semanas de publicidade com fotografias suas - e de outros colaboradoresa partir do início de 2006 - no referido órgão de informação).

E como se estreou esta aquisição do “Expresso” no mercado de Inverno?Na página 2 (também com fotografia) sob o título “Sobreviverá Portugal depois de 2013?”

escreve (citamos):“...Um país assim só pode ser um país falhado. Se nada mudar radicalmente, nós vamos

ser um país falhado....Peguemos em dois pequenos exemplos. Domingo 1 de Janeiro, arrastando com filas de

trânsito e arriscando acidentes, tive de tratar do regresso do meu filho mais novo a Lisboa,porque no dia seguinte abriam as aulas no ensino público e no Liceu central onde estuda eonde se imagina que todos os professores públicos gostariam de estar colocados. Das cincoaulas marcadas para 2ª feira, teve uma; das quatro marcadas para 3ª feira teve outra; todosos restantes professores estavam de “baixa”. Ou seja, prolongaram as férias que nós nãotivemos...” (sic)

Factos: à 2ª feira, a turma do filho de M. S. T. tem 3 aulas e não cinco; efectivamente sóteve uma (uma das colegas que faltou tinha um familiar gravemente doente); à 3ª feira tem5 e não quatro. E (pasme-se, face ao escrito de M. S. T.!) teve todas!

(Cinco aulas com oito professores - há áreas/opções diferentes!).Se M. S. T. é jornalista (?) bastaria um telefonema (Conselho Executivo ou Director de

Turma, por exemplo) para verificar que a sua fonte de informação o enganou! Ou terá sidoapenas a sua fértil imaginação a trabalhar? (já em Maio passado terá imaginado que ninguémrepararia no “truque” de subtrair 2 vezes muitos sábados e domingos de cada ano?)

Desonestidade intelectual já é mau, MST! Mentir é ainda pior, MST!Até quando?

Os equívocos de MSTJorge Manuel Serra Almeida (Escola: Sec /3 CEB Pedro Nunes)

20 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

O professore a sua

Alfredo Maia(Presidente do Sindicato dos Jornalistas)

Ao encerrar a “Semana” que de-dicou à Educação, o anterior Presidenteda República enfatizou duas profissõesque não devem permanecer refénsdessa desculpabilização recorrente,segundo a qual “em todas as profissõeshá bons e maus profissionais”. Pelo es-pecial valor que, no limite, estáconfiado às suas mãos, uma é a demédico. Pela importância decisiva naformação dos cidadãos, a outra é a deprofessor.

Quando recordamos os professoresque marcaram a nossa vida, há nomesque ficaram gravados de forma inde-lével, no catálogo dos que nos inicia-ram nos prodígios da Língua ou nofascínio das Ciências, ou, “simples-mente”, nos ajudaram a crescer comos outros. Ou ficaram pela razãoinversa. E há nomes que se esfumaram.

Nesse ajuste de contas com a nossamemória ou no alinhamento apressadopor certos discursos, raramente temospresente que um professor é ele e a suacircunstância. Em lugar de nos apres-samos a aplaudir – ou simplesmente aser cúmplices... – da condenaçãoacrítica dos erros e dos defeitos, seriaútil um pequeno esforço, para com-preender por que não nos batemos maispela criação de condições corres-pondentes ao nível de exigência emrelação ao qual tanto e tão facilmenteelevamos a fasquia.

circunstância

JORNAL DA FENPROF 21MAIO 2006

JF – Em traços gerais, o que é querepresenta o actual Estatuto da CarreiraDocente?

Abel Macedo (A.M.) - Há que recuaralguns anos… O Estatuto, o de 89/90, sujeitoa uma revisão global em 1998, apesar denão ser perfeito, consagrou os largos passosque foram dados no caminho da afirmaçãode uma identidade profissional docenteminimamente ajustada aos caminhos que sedeparam hoje à nossa profissão.

Deixou definitivamente para trás os tem-pos do “missionarismo”, do “mestre escola”, dosimples reprodutor de conceitos, e abriucaminho ao profissional reflexivo, autónomo eintelectualmente apetrechado, preparado paraagir de forma contextualizada e responsávelprincipal pela condução de complexosprocessos de ensino e aprendizagem.

JF – Prossegue uma ofensiva contraos educadores e professores também no

“Os professores têm que perceber que tudo se vai jogar num curtoespaço de tempo. O nosso Estatuto já foi adulterado, e não épreciso lembrar aqui em que partes. As outras partes, que são asque interessam ao Governo, estão na calha, são já conhecidas e,se deixarmos que o poder actue como anteriormente, corremossérios riscos de, daqui a pouco tempo, se falar ainda de um Estatutode Carreira, mas completamente desvirtuado, transformado numamassa informe de contradições em que, do inicial, o de 89/90,apenas restará o acessório e menos significante”, sublinha AbelMacedo.O coordenador da Direcção do Sindicato dos Professores do Norte(SPN) e membro do Secretariado Nacional da FENPROF alertapara a ideologia do neoliberalismo em relação ao papel da escolae dos docentes na sociedade e para as tentativas de “controlocerrado sobre a profissão”, destacando ainda a importância deum Estatuto da Carreira Docente “globalmente negociado”.

sentido do controlo cerrado da profissão.O que é que destacas nesta difícil situaçãocriada aos docentes portugueses?

A. M. - Quando, já em 1992, AntónioNóvoa abordava a desprofissionalização dafunção docente, sabia que já estava emcurso uma ofensiva, desenvolvida tanto poralguns académicos como por decisorespolíticos, de controlo cerrado sobre aprofissão, se estava a abrir um caminho defuncionalização, de sujeição, de ausência deautonomia, que atentava contra a essênciade uma profissão que se queria, e se quer,reflexiva, autónoma e responsável.

Que responsabilidade existe quando secumprem apenas desígnios predeter-minados?

Que autonomia pode existir quandoquase tudo está previamente configurado?

Que reflexão, individual ou colectiva, sepode fazer em contextos em que somoschamados a desenvolver processos que

correspondem ao que outros já pensaram?

JF – Os tempos que se aproximamassumem o carácter decisivo de alteraçõesprofundas ao Estatuto. O que é que o MEpretende, na verdade?

A. M. - Pelo que se vai sabendo, nãouma revisão global, porque isso nãointeressa ao poder instituído, mas sim umarevisão subvertida, parcelar, apenas dasmatérias que ao Governo interessam – comoa avaliação do desempenho, a configuraçãoda carreira e as implicações de uma noutra.

JF – Nesse contexto, que mensagemqueres deixar aos milhares de docentesnossos leitores?

A. M. - Os professores têm que perceberque tudo se vai jogar num curto espaço detempo. O nosso Estatuto já foi adulterado,e não é preciso lembrar aqui em que partes.As outras partes, que são as que interessam

Abel Macedo ao JF:

“Os professores saberão assumiras suas responsabilidades perante a sociedadeatravés de um compromisso ético claro”

José Paulo Oliveira (Jornalista)

JORNAL DA FENPROF 21MAIO 2006

22 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTEao Governo, estão na calha, são já conhe-cidas e, se deixarmos que o poder actuecomo anteriormente, corremos sérios riscosde, daqui a pouco tempo, se falar ainda deum Estatuto de Carreira, mas comple-tamente desvirtuado, transformado numamassa informe de contradições em que, doinicial, o de 89/90, apenas restará oacessório e menos significante. Temos quereforçar a discussão nas escolas. Temos queestar atentos, unidos e mobilizados.

JF – Que orientação essencial tem aFENPROF face aos desafios que a nego-ciação do Estatuto vai levantar?

A. M. - A FENPROF afirma sem tibiezasque os professores saberão assumir as suasresponsabilidades perante a sociedadeatravés de um compromisso ético claro, quecomporte, em simultâneo, aquilo que são assuas obrigações sociais (perante os alunos,os pais, a escola, o sistema educativo) e orespeito pelos direitos individuais e colectivosinerentes ao desempenho da sua função,referentes a cada professor e deste com eperante os seus pares.

JF – Noutros apontamentos destaedição do “JF” abordamos a parte dosdeveres fundamentais que cabem aosdocentes. Quanto aos direitos , que

apreciação nos podes deixar?A. M.- Desde logo temos que

reflectir sobre se os direitos hojeconsagrados são bastantes eajustados e se a sua consecuçãoestá devidamente acautelada.Por exemplo – o direito à nego-ciação, um dos direitos decisivosa ser consagrado em sede deEstatuto. A forma como está hojetraduzido é bastante para quenós, professores e educadores,possamos sentir que nos cabe,efectivamente, a negociação como um direito?Se não, só nos resta um caminho. Procurarmos,com as nossas forças, uma redacção quesalvaguarde a afirmação plena desse direito.

O conjunto de direitos consagrados, e quese enunciam rapidamente – 1) direito àparticipação no processo educativo; 2) direitoà formação e informação para o exercício dafunção educativa; 3) direito ao apoio técnico,material e documental; 4) direito à segurançana actividade profissional; 5) direito ànegociação colectiva – é suficiente, inclui eacautela todos os princípios essenciais àafirmação da profissão? Não faltarão alguns?Por exemplo, o direito à estabilidade profissio-nal e a um salário digno e compatível com aprofissão está hoje expresso? Não, e deveriaestar. O direito à não discriminação, seja por

“A imagem socialdos docentes portu-gueses vive hoje um

tempo de descrédito, de desvalorização dos seus saberes, deresponsabilização até aos limites do absurdo pelos atrasos queregista a educação no nosso país. Simultaneamente, essesmesmos docentes sentem-se transformados num alvo fácil ondese descarregam todas as incompetências dos políticos e muitasdas frustrações sociais que pautam os nossos dias”, sublinhouAbel Macedo, coordenador da Direcção do Sindicato dosProfessores do Norte (SPN) e membro do Secretariado Nacionalda FENPROF, no recente seminário promovido pela Federaçãosobre “a imagem social dos professores e o seu Estatuto”.

“Ainda recentemente, a propósito das comemorações do25 de Abril, e mediante um conjunto de entrevistas de rua ajovens sobre o feriado que comemora aquela data histórica,perante o desconhecimento de muitos sobre o seu realsignificado, jorrou mais um conjunto de “culpas sobre osprofessores, sobre o que ensinam ou supostamente deviam

A propósito do 25 de Abrildo desconhecimento dos jovense da “responsabilidade”dos professores

ensinar, esquecendo as responsabilidades políticas de quemnão promove mais do que um acto formal na Assembleia daRepública e quase esquecendo uma figura do antigamenteque nem esse acto formal deixou realizar numa parte do todonacional”, observou o dirigente do SPN e da FENPROF, quecomentaria mais adiante:

“É verdade que Abril está distante, para muitos pelo aquémque fica de sonhos de justiça, de fraternidade, de igualdade,enquanto sinónimos de liberdade, para outros, porque aconspurcação da palavra liberdade está no seu quotidiano, nasua demagogia, a ponto de nem a solenidade formal admitirem.”

“De quem assim olha para os valores de Abril pouco há aesperar. Assim como nada há a esperar de quem desprezaostensivamente a profissão docente, a despromove deimportância aos olhos de todos, funcionaliza até ao limite doabsurdo os seus profissionais e os expõe às mais estúpidascríticas e aos mais soezes insultos. E estes são osresponsáveis políticos dos nossos dias, em Abril de 2006”,concluiu Abel Macedo.

questões de género, étnicas, religiosas, deorientação sexual, políticas, ou outras, estáhoje expresso no ECD? Não, e deveria estar.

O conjunto de direitos que, na fase emque estamos, vamos trabalhar com osprofessores até obtermos um enunciadorigoroso, forte e exaustivo, imbrica necessa-riamente no conjunto de deveres quetambém iremos construir. Este binómio seráo eixo onde girará um articulado limpo dematérias que, sendo importantes masporventura não essenciais, serão trabalhadasà parte, como matéria regulamentadora dotronco central que será o novo ECD, quequeremos, e exigimos, seja globalmentenegociado.

22 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

JORNAL DA FENPROF 23MAIO 2006

1. O direito de participação pode ser

exercido

a) Pelas organizações sindicais.b) Por todos os outros indivíduos

menos pelo próprio, para evitarproblemas de consciência.

c) Por cada indivíduo, grupos e/oupelas organizaçõesprofissionais ou sindicais.

2. O direito de participação no

processo educativo exerce-se

a) Na preparação das aulas.b) Nas áreas do sistema de

ensino, da escola, da aula e darelação escola-meio.

c) Na sala de aula e na escola.

3. Eleger e ser eleito para órgãos

colegiais ou singulares das escolas

a) É um direito.b) É um direito dos professores

mais antigos.c) Voltará a ser um direito na

Madeira, em breve.

4. A negociação colectiva

a) Foi um direito.b) É um direito.c) Deixou de haver negociação

desde 2005.

5. Direito de intervir na orientação

pedagógica através da liberdade de

iniciativa

a) Sempre que o docente o desejeexercer.

b) Nos períodos sazonais abertospelo Conselho Pedagógico àintervenção.

c) Quando o docente escolhe osseus métodos de ensino.

6. O direito à formação e informação

para o exercício da função educativa é

garantido

a) Por uma assinatura dosemanário Expresso.

b) Pelo acesso à formaçãocontínua e apoio àautoformação dos docentes.

c) Pelo acesso a acções deinformação.

7. Tal direito à formação e informação

pode também visar objectivos de

a) Reconversão profissional,mobilidade e progressão nacarreira.

b) Mobilidade e progressão nacarreira.

c) Reforço da cultura geral dosdocentes sobre contra--informação

8. O direito à segurança na actividade

profissional compreende

a) Um seguro de vida contra todosos riscos e um kit de primeirossocorros de bolso.

b) Protecção por acidente emserviço, penalização de ofensasao docente e prevenção/tratamento de doençasresultantes da sua actividade.

c) Penalização de ofensas aodocente e protecção poracidente em serviço.

9. O dever de contribuir para a

formação e realização integral dos

alunos concretiza-se

a) Promovendo o desenvolvimentodas suas capacidades eestimulando a sua autonomia ecriatividade.

b) Promovendo a consciênciasobre a importância daobediência para a suafelicidade.

c) Desenvolver as suascapacidades, a autonomia, acriatividade e formar cidadãosresponsáveis e intervenientes.

10. Reconhecer e respeitar as

diferenças culturais e pessoais dos

alunos e demais membros da

comunidade educativa

a) É um dever do docente.b) Uma opção moral do docente.c) Foi um dever até 25 de Abril de

1974.

11. Respeitar as diferenças culturais e

pessoais do alunos e demais

membros da comunidade educativa

implica

a) Valorizar os diferentes saberese culturas e combater processosde exclusão e discriminação.

b) Valorizar todas as pessoas semexcepção abraçando-as, pelomenos, uma vez por dia.

c) Valorizar os diferentes saberese culturas.

12. Ser missionário na profissão e

optar pelas virtudes de uma vida

ascética e abnegada da materialidade,

valorizando os prazeres simples e

bucólicos

a) É um dever do docente.b) É um caminho possível para a

felicidade.c) Não é um dever do docente.

13. O dever de gerir o processo de

ensino-aprendizagem, no âmbito dos

programas definidos, implica

a) Adoptar mecanismos dediferenciação pedagógica.

b) Adoptar mecanismos deselecção pedagógicasusceptíveis de responder àsnecessidades individuais dosalunos.

c) Ter sensibilidade face àsnecessidades individuais dosalunos.

14. Contribuir para a reflexão sobre o

trabalho realizado individual e

colectivamente

a) É um dever do docente no finalde cada ano lectivo.

b) É um dever contínuo epermanente.

c) Um dever? Era o que faltava.

15. O dever de enriquecer e partilhar

os recursos educativos e utilizar

novos meios de ensino é feito numa

perspectiva de

a) Abertura à inovação e dereforço da qualidade daeducação e ensino.

b) Cumprimento do valor cristão dapartilha.

c) Reforço da qualidade daeducação e ensino.

16. O dever do docente actualizar e

aperfeiçoar os conhecimentos,

capacidades e competências visa

a) O desenvolvimento pessoal esocio-afectivo.

b) O desenvolvimento da contabancária pessoal.

c) O desenvolvimento pessoal eprofissional.

Conhece o seuEstatuto de Carreira?

Direitos & Deveres

Ver soluções na pág. 28

JORNAL DA FENPROF 23MAIO 2006

24 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

JF - O que está em causa no ECD coma sua revisão?

Mário Nogueira (MN) - Está o futuroda profissão docente. Há grandes perigosnesta revisão. A maioria absoluta quegoverna o país tem demonstrado um grandedesrespeito pelos profissionais docentes,não apenas através do discurso, como,também, pelas medidas que tem vindo atomar. Nesta revisão prevê-se que pretendaliquidar alguns dos direitos mais impor-tantes conquistados pelos professores eeducadores e restringir outros. A avaliaçãodo desempenho, a estrutura da carreira, ascondições de progressão na carreira, sãoaspectos que estão na mira penalizadora doME. Mas também outros aspectos relacio-nados com a estabilidade no exercício daprofissão docente, com o seu conteúdofuncional, horários de trabalho, as com-ponentes lectiva e não lectiva, a apo-sentação e mesmo os regimes de dispensas,de faltas e de férias não estarão fora dosfortes ataques que serão movidos peloMinistério da Educação.

JF - Esperava-se outro sentido de umarevisão do estatuto de carreira dosprofessores e educadores?

MN - Em condições normais, é claro quese esperava. Só que deste governo e dapolítica que desenvolve não se esperava

penho, não temos qualquer dúvida sobre oque pretende o ME. Todos recordamosquando, em 23 de Fevereiro passado foiaprovado, no Parlamento, o SIADAP. Apreocupação era a de fazer saber que estemodelo de avaliação dos “funcionáriospúblicos” seria para aplicar também aosjuízes, médicos e professores. Por isso, sobreisso não há qualquer expectativa positiva.Todavia, não partiremos rendidos e comba-teremos as intenções do ME/Governo compropostas que vão no sentido de conferir àavaliação do desempenho um carácteressencialmente formativo. Esse sim, é ummodelo difícil de definir e capaz depromover a excelência de que tanto se fala,gostando eu muito mais de falar naqualidade do ensino.

JF - Os responsáveis do ME têmdificuldades em compreender essamatéria…

MN - Talvez por ser difícil, esta equipaministerial parece incapaz de compreenderestar ali o pomo da questão. É ali que se faza maior diferença maior entre o que éproposto e o que faz falta ao sistemaeducativo. Além disso, como a senhoraministra já um dia afirmou (e foi título dejornal), não fica preocupada se perder osprofessores, interessa-lhe, sobretudo,ganhar na opinião pública. Com essepensamento, é natural que as propostas que

Mário Nogueira ao JF:

“Nesta revisão, está em causa o futuroda profissão docente. É deplorável o que estãoa fazer aos professores!”

Mário Nogueira, Coordenador do Sindicato dos Professores daRegião Centro, membro da Direcção da FENPROF e Coordenadordo Grupo Negociador, sublinha ao JF: “A anteceder alterações deâmbito profissional e de carreira, a ministra lança campanhascontra os professores e de ataque à sua imagem social, parapreparar o terreno para alterações muito negativas de ordemsocio-profissional. É o que pretende agora ao aproximar-se arevisão do Estatuto da Carreira Docente.”

nada de diferente, dada a sua natureza neo-liberal e o comportamento agressivo quetem revelado contra os trabalhadores.

A FENPROF, contudo, não virará a caraao que entende importante nesta revisão enão adoptará uma atitude meramentedefensiva, de resistência, nada disso. Teráiniciativa, apresentará propostas e lutarápor uma revisão de sentido positivo que,afinal, consolide e aprofunde os passos queforam dados em 1997/98 quando o ECDmereceu a sua primeira revisão. Assim,teremos propostas que permitirão alargaros direitos e definir, com precisão eobjectividade, os deveres os profissionaisdocentes; teremos propostas que visamconferir mais qualidade à formação deprofessores e dar mais estabilidade aoexercício da profissão; proporemos soluçõesdestinadas a revalorizar a carreira docentee, em especial, os seus escalões mais baixos;reivindicaremos um regime de aposentaçãocompatível com as exigências cada vezmaiores que se colocam aos docentes etransformam a sua profissão numa das queprovocam um acentuado desgaste físico epsicológico.

JF - A avaliação do desempenho podepassar por um processo mais burocráticoou há ainda uma possibilidade de a pensarcomo motor da qualidade de ensino?

MN - Quanto à avaliação do desem-

24 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

JORNAL DA FENPROF 25MAIO 2006 JORNAL DA FENPROF 25

defende não saiam daquilo que, por norma,se considera o senso comum. Para si, émelhor que seja assim… não trará grandesresultados (excepto os financeiros, claro),mas permitir-lhe-á fazer mais uma quanti-dade grande de demagogia contra osprofessores e, dessa forma, humilhá-los,espezinhá-los, rebaixá-los… isso temparecido suficiente!

JF - Que significado teve entretanto oSeminário Nacional realizado pelaFENPROF em 27 de Abril?

MN - Teve a vantagem de reunirdirigentes e delegados sindicais e acertar aestratégia. Na senda do primeiro encontroque se realizou numa frase muito embrio-nária de lançamento do debate…

Neste Seminário coube-me moderar umasessão, precisamente aquela em que sediscutiu o ECD. Na curta intervenção que fizprocurei apenas recordar um pouco dahistória e das lutas dos professores eeducadores em torno do seu Estatuto, queraté à aprovação em 1989/90, quer no âmbitoda revisão de 1998/99. Fiz, ainda, um pontode situação das condições em que iremosentrar nesta revisão: tempo de serviçoroubado, progressões congeladas, funçõesdocentes abastardadas, horários de trabalhoagravados, regras várias do ECD alteradas oumesmo revogadas. Questionei sobre as razõesdo atraso de mais de dois meses na entregadas propostas do ECD: será falta de tempopara o assunto ou estratégia? Não ficamdúvidas, atirar a apresentação do primeirodocumento para o final de Maio, jogar como Julho/Agosto meses de férias e com oSetembro, mês de regresso, permitirá ao MEganhar tempo. Depois Outubro e Novembroserá para apressar o processo sempre com aameaça de que um eventual atraso naaprovação do novo ECD poderá significaratraso no “descongelamento” do tempo deserviço. Percebe-se a estratégia!

Depois, foi o sacudir da consciênciasindical, particularmente importante nestainiciativa em que a maioria dos presentes eramdirigentes e delegados sindicais. Serão elesquem terá de assumir todo o trabalho deesclarecimento, promoção do debate emobilização dos seus colegas. Serão eles, osquadros sindicais, os elementos mais impor-tantes de todo o processo de revisão dada aresponsabilidade que nele irão assumir.

JF - Qual o grau de conhecimento queos professores têm do seu Estatuto e deque forma são capazes de o defender?

MN - Penso que os professores conhe-cem o seu estatuto. Podem não saber citá-lo de cor, mas quando os impedem deusufruir de direitos que ele consagra, ou lhesquerem impor tarefas que ferem o conteúdodas funções docentes, logo reagem. AFENPROF tem também contribuído paraesse conhecimento ao colocar, nos últimosanos, a versão integral do ECD na agendaque oferece aos associados dos seusSindicatos e ao promover iniciativas diversassobre o tema. Dir-se-á que, sendo assim,não se compreende como em muitos casosestão a ser violadas normas do ECD emmuitas escolas. É verdade que estão e, emmuitos casos, a par da contestação sindical,os Sindicatos estão a apoiar processos decontestação jurídica das situações emcausa, o que significa que muitos professo-res não se têm calado.

JF - Tal deve-se às pressões que sãoexercidas sobre os docentes a diversosníveis? Qual é a sua origem?

MN - Hoje, mais do que nunca, osprofessores estão a sofrer grandes pressõesque, por vezes, resultam no silenciamentoque fazem de situações inaceitáveis.Silenciam os problemas e também a suarevolta. É deplorável o que estão a fazer aosprofessores e educadores. A origem de taispressões é de todos conhecida: está noMinistério da Educação e os seus principaisrostos chamam-se Lurdes Rodrigues e ValterLemos; chamam-se, em algumas regiões,direcções regionais de educação; são, emalgumas escolas, os próprios órgãos de gestão,neste caso, felizmente numa minoria de casos,mas ainda assim, não deverá ser desvalorizadaesta componente em que o ME e as DRE’stanto apostam para acentuar o controleburocrático, senão mesmo político, sobre osdocentes; chamam-se, ainda, “sousas-tavares”, “filomenas-mónicas”, “fátimas-bonifácios”, “manuéis-correias-economistas”,entre outros… tem sido assim, é verdade, masnão é menos verdade que, apesar de tudo, aesmagadora maioria dos professores eeducadores tem sabido resistir e opor-se.

JF - E neste movimento de resistênciaqual é o sentimento?

MN - A FENPROF tem motivos paraestar satisfeita, ou não seja a granderesponsável por essa capacidade de resis-tência, de denúncia e de contestação dosprofessores. Vamos continuar, ou melhor, seos tempos que aí vêm forem, como afirmou

o Primeiro-Ministro, ainda piores que osactuais, não iremos só continuar, vamosaumentar o protesto e a luta. Tem de ser!.

JF - Poderá ou deverá o ECD serinstrumento regulador em matéria dedeontologia profissional?

MN - É evidente que deverá! Há quemgostasse que assim não fosse e que ele sereduzisse a uma mero enunciado de cláusulascontratuais e de enunciação de mecanismosde relação laboral. Não é essa a nossa opinião.É aqui, no seu estatuto de carreira eprofissional que os professores deverãogarantir essa regulação, assente, sem dúvida,no conjunto de direitos e deveres consagradose com uma expressão particularmente forteno regime de avaliação do desempenho quevier a ser aprovado. Daí a importância destesdois capítulos: para o ME, no pior dos sentidos,para os professores no sentido mais positivo.

A FENPROF, contudo,

não virará a cara ao que

entende importante nesta

revisão e não adoptará

uma atitude meramente

defensiva, de resistência,

nada disso.

Hoje, mais do que

nunca, os professores

estão a sofrer grandes

pressões que, por vezes,

resultam no silenciamento

que fazem de situações

inaceitáveis.

A FENPROF tem

motivos para estar

satisfeita, ou não seja a

grande responsável por

essa capacidade de

resistência, de denúncia e

de contestação dos

professores.

JORNAL DA FENPROF 25MAIO 2006

26 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE

26 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

relativamente fácil pensar que podehaver ensino sem aprendizagem eaprendizagem sem ensino direccio-nado por objectivos. Eis pois o motepara pensar a minha mensagem. O

professor é de facto uma pessoa e já o eraantes da certificação profissional. A suaprática docente é mista de racionalidade eafecto, de bricolage e planificação. É a práticadum modo de ser tantas vezes desempenhadocomo um inconsciente prático. De facto nemsempre estamos a racionalizar o que estamosa fazer na prática lectiva.

Os pintores não copiam o que observam,mas seleccionam cuidadosamente, sendodotados de significado os elementos queseleccionam, e com tanto mais impacto porserem, por vezes, irracionais... Aquilo queos artistas visuais, como os pintores,pretendem ensinar é fácil de perceber masdifícil de explicar. Eles próprios têmdificuldade em explicar por que traduzemas suas experiências para formas e cores, enão para palavras. (Highet, 1951, cit inWoods, Peter (1999). Investigar a Arte deEnsinar, Porto: Porto Editora).

Este posicionamento parece estar nosantípodas da certeza científica. É como separte do ensino consistisse em “não saber” .Em contraste com a ênfase na racionalidade,o ensino parece ter um lado emocional, umainteligência do coração.

Por outro lado, o Ensino é na maior partedas vezes discutido em termos da intençãoe da actividade do professor. Mas os alunosnão são recipientes passivos das mensagensdo docente. Não basta vender latim, fazerpalestras e dar grandes aulas. O produto fi-nal tem de fazer a diferença, lançar umasemente que se venha a desenvolver emalgo, que reestruture o conhecimento e queeduque. O sistema tem de ser possivelmentemais de aprendizagem do que de ensino.

No caso dos professores aqui estudados,quanto mais diversificados são os mundosculturais que atravessam, maior é aprobabilidade, por um lado, de surgiremconflitos na sua mente, em consequência

da dificuldade que há por vezes emconstruírem um projecto que integre einterpenetre estas variadas esferas da vidasocial que atravessam nas suas trajectóriasbiográficas e que lhes constroem os gostose as formas de pensar. Por outro lado,também, maior e mais alargada é a visãodos mundos culturais que coexistem nacontemporaneidade, mais relativizado é oetnocentrismo e mais multicultural é opróprio eu de cada professor. O eu que, se osujeito conseguir criar pontes e continui-dades entre essas partes, faz dele um eu maistranslocal (Fortuna, 1991), mais transcultural,mais total (Sousa Santos, 1992 e 1994) emais cidadão da conhecida metáfora aldeiaglobal, com uma identidade mais intercul-tural e multi-terceira - instruída. Ou ainda,de acordo com Giddens (1994), o self torna--se num projecto reflexivo:

[...] Quanto mais a tradição perde a suainfluência, e quanto mais a vida diária éreconstituída em termos do jogo dialéctico en-tre o local e o global, tanto mais os indivíduossão forçados a negociarem escolhas de estilosde vida de entre uma diversidade de opções.

Corresponderá, com grande probabi-lidade, à construção dum eu pessoal, sociale profissional menos etnocêntrico, maisreflexivo, com uma mente mais relativizadae talvez também mais utópica e criativa nosentido da construção de projectos pessoaise culturais aos quais submete dialectica-mente o seu viver. Viver esse que tenteicaptar e entender nos nove professores queestudei e cujas vidas, práticas e represen-tações sociais aqui aflorei.

Gostaria, enfim, de recordar que hácompetências do perfil de professor que sóse aprendem no terreno.

E, para terminar, levanto de novo apergunta com que iniciei esta comunicação:

Ser Professor: ensino ou aprendizagemda profissão?

Passagem da comunicação de Ricardo Vieira,docente da ESE /IP de Leiria no Seminário da

FENPROF sobre o Estatuto da Carreira Docente,Lisboa, 27/4/06

“Saiu o semeador parasemear a sua semente.Enquanto semeava, umaparte da semente caiu àbeira do caminho, foi pisadae as aves do céu comeram-na. Outra caiu sobre a rochae, depois de ter germinado,secou por falta de humidade.Outra caiu no meio dosespinhos, e os espinhos,crescendo com ela,sufocaram-na. Uma outracaiu em boa terra e, uma veznascida, deu frutocentuplicado.”(São Lucas 8, 5-8)

Ser ProfessorRicardo Vieira

Ensino ou aprendizagem da profissão?

É

JORNAL DA FENPROF 27MAIO 2006

EM FOCO

É

O mediatismo e a aparentecentralidade que este governopretende dar à imperiosanecessidade de a escola poderoferecer uma resposta social,é inequivocamente o reconhe-cimento que as exigências daFENPROF e de outros agenteseducativos sobre esta matérianão podiam ser, por maistempo, adiadas.

incontornável que, a partir de agora, aESCOLA a TEMPO INTEIRO terá quefazer parte da agenda política educativados futuros governos. No entanto, omodelo e a sua concretização actual

merecem a maior das reprovações.Assente no princípio de menos estado,

melhor estado, a lógica de racionalidadeeconómica dirigida aos alunos enquantoclientes e consumidores, a escola comoprestação de serviços e a alienação docurrículo e dos direitos dos professores estãoa ser utilizados como instrumentos con-ceptuais, por este governo, para pôr emprática uma escola que responda às

necessidades dos alunos e das famílias.O modelo de outsorcing que está

plasmado no programa de generalização doinglês lançado pelo ME, no início deste anolectivo, é exemplar no que diz respeito à pré--privatização de serviços educativos,nomeadamente os da área social. Mas, nestedomínio, o actual governo pretende ir maislonge nas suas intenções neoliberais. AMinistra da Educação pretende passaralgumas áreas do actual currículo do 1º ciclopara os prolongamentos e, dessa forma,permitir (através de programas ou outrosmecanismos) que instituições públicas ouprivadas se possam candidatar à contra-tualidade destes serviços educativos, comose fosse o único caminho possível –caracterizado por uma política educativa sem

Escola a Tempo InteiroOutsorcing - a lógica de mercado na educação

escolha – tendo como matriz defundo a da edificação de umEstado Mínimo.

Na óptica deste governo, osfins justificam os meios. Estemodelo híbrido em que o Estadoapenas pretende desempenhar opapel de financiador e de re-gulação, deixando às insti-tuições, que operam nestadimensão “nova” da escola e quetêm o lucro como principalobjectivo a atingir, total liber-dade na escolha dos recursos

humanos e gestão do financiamento. Estasituação põe em causa a qualidade daresposta social da escola e a demo-craticidade da Escola a Tempo Inteiro.

O balanço preliminar efectuado pelaFENPROF é profundamente negativo. Assoluções de improviso, a falta de qualidadedos espaços e equipamentos, recursoshumanos insuficientes e muitas vezestecnicamente mal preparados, a discriminaçãoe as assimetrias, são alguns dos factores quecaracterizam este modelo de resposta social.Não é esta Escola a Tempo Inteiro que sempredefendemos. Para que tal aconteça o Estadodeve rapidamente assumir a sua inteiraresponsabilidade na construção de umaefectiva rede de serviço público de educação– Uma escola a tempo inteiro para todos.

Helena Arcanjo (Direcção do SPRC e Conselho Nacional da FENPROF)

A ANESPO (Associação Na-cional do Ensino Profissional)enviou, recentemente, à FENPROF,e, pela primeira vez, em cinco

anos, uma contraproposta deContrato Colectivo de Trabalhopara os trabalhadores das es-colas profissionais privadas.

Recorda-se que este é umprocesso que se arrasta desde

Junho de 2001, altura em que a FENPROF apresentou, pelaprimeira vez, uma proposta de CCT à ANESPO paranegociação. Esta organização nunca apresentou qualquercontraproposta e foi adiando sistematicamente as reuniões

Ensino Profissional: Professores e trabalhadores não

docentes vão, finalmente, ter direito a um CCT específico

de negociação com a FENPROF, tendo-se chegado a umasituação de impasse, pelo que tivemos de solicitar ao Ministériodo Trabalho que arbitrasse este processo negocial.

Entendíamos, na altura, e continuamos a entender, agora,que à especificidade do ensino profissional deve corresponderum CCT próprio, clarificador do conjunto de direitos e deveres,da estrutura de carreira e das condições de trabalho necessárias àestabilidade e realização profissional dos docentes e formadoresdeste subsistema de ensino.

Com o início das negociações, vamos também proceder aum processo de auscultação do pessoal docente, através dereuniões de escola e de plenários, onde daremos a conheceras propostas da FENPROF e as contrapropostas da ANESPO(disponíveis no site da FENPROF para consulta).

28 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

1. a) 1; b) 0; c) 2

2. a) 0; b) 2; c) 1

3. a) 2; b) 0; c) 1

4. a) 0; b) 2; c) 1

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6. a) 0; b) 2: c) 1

7. a) 2; b) 1; c) 0

8. a) 0; b) 2) c) 1

30-32 pontos:

Parabéns, é um docenteconsciente do essencialdos direitos e deveresespecíficos da profissão.É improvável que seja“enrolado” pelaspropostas de alteração aoEstatuto da Carreira que oME venha a fazer.

9. a) 1; b) 0; c) 2

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Some os pontos: Sentença:

20-29 pontos:

Precisa de reler oEstatuto da CarreiraDocente no capítulodos Direitos e Deveresquanto antes, para nãocair no “conto dovigário” que a Ministravai tentar contar-lhe.

0-19 pontos:

Você parece umburocrata do Ministérioda Educação. Devetentar a carreira deSecretáriode Estado.

Conhece o seu Estatuto de Carreira?Direitos & Deveres

FENPROF, desde a sua fundação em1983, que se bate por uma profundarenovação da Escola do 1º Ciclo doEnsino Básico. Essa intervençãodesenvolve-se em três planos: a

denuncia da pobreza em que funcionam amaioria das escolas, a reflexão e a cons-trução de soluções e a apresentação depropostas ao Ministério da Educação.Nessas propostas esteve sempre presente anecessidade de uma resposta social no 1ºCiclo do Ensino Básico.

No último Congresso da FENPROF aresolução aprovada afirma:

“(…) No que diz respeito à ocupação detempos livres e serviço de refeições, aspropostas da FENPROF assentam em trêsquestões essenciais:

1) A resposta social que as famíliasnecessitam e a que têm direito não podeobedecer a um modelo nacional único, an-tes se exigindo a organização de soluçõesmultidisciplinares, social e culturalmentelocalizadas.

2) A ocupação de tempos livres nãopode assumir um carácter escolarizante,antes devendo possuir uma forte com-ponente lúdica e cultural.

É aos poderes central e local que cabeassegurar a resposta a esta crescentenecessidade das famílias. Em qualquer casodeve tratar-se de um serviço público queassuma uma visão integrada dos recursoscomunitários (…).

3) A FENPROF jamais aceitará que aosprofessores seja solicitada intervençãonestes serviços de resposta às necessidadesdas famílias, por duas ordens de razões: a)toda a sua atenção e empenhamento devemestar voltadas, nas componentes lectiva enão lectiva do horário, para as actividadescurriculares; b) o conteúdo funcional dacarreira docente não permite o envolvi-mento dos professores naquelas actividadesde resposta social da escola(…)”

Pouco tempo após a tomada de possedo actual Governo, a FENPROF entregou aoMinistério da Educação um documento queaponta os caminhos e as propostas para arenovação do 1º Ciclo do Ensino Básico. Sãosoluções discutidas com os professores eque, em 2002, no âmbito do Manifesto”“Poruma Nova Escola do 1º Ciclo do EnsinoBásico”, mereceram o apoio de milhares deorganizações de todo o país.

O autismo do Governo de José Sócratescomeçava a dar os primeiros sinais e, emconsequência, o Ministério da Educaçãoignorou completamente as propostas dosprofessores. Como a FENPROF já disse “oque o Governo decidiu neste domínio estáa colocar actividades de enriquecimentocurricular no lugar da ocupação de temposlivres, muitas vezes armazenando criançasnos mesmos espaços onde decorre aactividade lectiva sem qualquer financia-mento específico e com recurso aosprofessores, desvalorizando a profissão

docente e quase impedindo o trabalho in-dividual dos docentes indispensável a umaboa qualidade da actividade lectiva.”

Na generalidade das situações trata-sede meros exercícios de propaganda com oobjectivo de tentar esconder a falta devontade política para investir no 1º Ciclodo Ensino Básico. Aquilo a que se conven-cionou chamar “prolongamento de horário”é uma inutilidade absoluta para crianças efamílias.

Por outro lado importa dizer que umapolítica séria de institucionalização daescola a tempo inteiro implica a concre-tização de medidas que acabem de vez comos horários de curso duplo – estes acontecemsobretudo nas zonas urbanas e suburbanas,onde as actividades de ocupação de temposlivres e a escola a tempo inteiro são maisnecessárias às famílias.

Mas, isto que parece óbvio, implica amobilização de recursos financeiros,materiais e humanos. Ora, o ME não quergastar nem mais um centavo nas escolasque há décadas vivem uma confrangedorapobreza franciscana.

Como os professores educadores jágritaram em várias acções de luta por todoo país “é preciso e é urgente uma políticadiferente”.

Omeletas sem ovos ou a inutilidadedos prolongamentos de horário

AFrancisco Almeida (Secretariado Nacional da FENPROF)

EM FOCO

JORNAL DA FENPROF 29MAIO 2006

Colóquio MundialO Fórum UNESCO sobre EnsinoSuperior, Investigação e Conhe-cimento, plataforma dedicada ainvestigadores para discutir ques-tões importantes do desenvolvi-mento, anunciou a abertura doperíodo de apresentação decomunicações para o ColóquioMundial “As Universidades en-quanto Centros de Investigação ede Criação de Conhecimentos:Uma Espécie Ameaçada?” , inicia-tiva que decorrerá na sede da UNESCO, em Paris, de 29 de Novembro a 1de Dezembro de 2006. O prazo limite para o envio dos textos é já o próximodia 9 de Junho. Mais pormenores em www.unesco.pt

“As Universidades enquanto Centrosde Investigação e de Criação de Conhecimentos:Uma Espécie Ameaçada?”

Três profissionais da revista holandesa“Vrij Nederland” arrebataram os pri-meiros prémios das categorias dejornalismo e de fotojornalismo do con-curso europeu de jornalismo “PelaDiversidade. Contra a Discriminação”,promovido pela União Europeia (UE).

O artigo vencedor - escrito porSander Donkers e Harm Ede Botje eintitulado “Er wordt gediskrimineerd.

Punt uit” (Há discriminação. Ponto final) - trata da discriminação étnica eracial no mercado de trabalho holandês. A fotografia vencedora, da autoriade Joost van den Broek, retrata a mesma realidade e chama-se “Composiçãomulticultural da força de trabalho nas empresas holandesas”.

O júri do concurso atribuiu ainda um segundo prémio a Bendyk e JacekZakowski, autores de um artigo sobre gays e lésbicas publicado pela revista“Polityka”, da Polónia, e um terceiro prémio à irlandesa Fiona Ness, do “Sun-day Business Post”, que abordou a discriminação das pessoas comdeficiência no emprego.

A entrega dos prémios - uma bolsa no valor de 1000 a 3000 euros parauma viagem de investigação a um país da UE à sua escolha - decorreu nopassado dia 15 de Maio em Bruxelas com a participação de Vladimir Spidla,comissário europeu responsável pela pasta do Emprego, dos AssuntosSociais e da Igualdade de Oportunidades.

Vladimir Spidla realçou a “coragem e dedicação” dos jornalistas em “trazera lume histórias que nem sempre dão títulos de primeira página”, ajudandoa “conhecer em profundidade” algumas das questões “que mais desafioscolocam à sociedade de hoje”.

Entretanto, até 31 de Dezembro estão abertas as inscrições para aedição 2006 do Prémio Europeu de Jornalismo “Pela Diversidade. Contra aDiscriminação”, destinada a jornalistas da imprensa escrita tradicional e daimprensa digital dos 25 Estados membros da UE.

Holandeses conquistamPrémio “Pela Diversidade,contra a Discriminação”

48 anos de fascismonum documentoexcepcional

No fecho desta edição do “JF” estava tudoa postos para a estreia, na sala 2 do King, emLisboa (Av. Frei Miguel Contreiras, 52 A), do filme“Natureza Morta – Visages d’une Dictature”,um trabalho de Susana de Sousa Dias queconquistou o prémio atalanta filmes e melhordocumentário português (DocLisboa 2005).

“Utilizando apenas materiais de arquivoe sem recorrer a palavras, Natureza Mortapretende redescobrir e penetrar na opacidadedas imagens captadas durante os 48 anosda ditadura portuguesa (actualidades,reportagens de guerra, documentários depropaganda, fotografias de prisioneirospolíticos, mas também rushes nunca utilizadosnas montagens finais), permitindo a suareabertura a diferentes leituras”, sublinha umanota de apresentação deste filme de 72minutos, que reuniu apoios do Centre Nationalde la Cinématographie, Procirep, Arte Francee Fundação Calouste Gulbenkian.

Estão previstas sessões às 22h00, às

19h00 e às 11h00, sendo estas últimas ex-clusivas para grupos e mediante marcaçãoprévia, contando com a presença da realiza-dora e de um historiador. Estão tambémprogramados debates regulares nas sessõesdas 19h00 (ver em www.kintop.net).

Informações e marcações: Elsa Sertório ouAna Almeida (telef. 213541958; telem 963154917;fax 213541958; e-mail [email protected]).

“Natureza Morta” tem música de AntónioSousa Dias, produção de Ansgar Schafer(KINTOP) e Xavier Carniaux (AMIP), emontagem de Susana de Sousa Dias comValérie Bregaint e Helena Alves.

VILAMOURA

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30 JORNAL DA FENPROF MAIO 2006

JAZZ

“E se mais mar houvesse...”: viagem ao continente africano da era colonial

CULTURAIS

Estoril Jazz 2006 em Julho

TEATRO

Tim Hagans com a “Ernie Wilkins AlmostBig Band” vão abrir no dia 7 de Julho, apartir das 21h30, o XXV Estoril Jazz 2006,que se prolongará até 16 desse mês, noauditório Fernando Lopes Graça (ParquePalmela), na Av. Marginal, junto ao HotelEstoril Sol.Bilhetes entre 20 e 30 euros e passe espe-cial para oito concertos por 90 euros.Mais informações pelo telefone 214825447ou em www.projazz.pt

Os alunos do 3º ano do curso de Teatro e Educação da Escola Superiorde Educação de Coimbra (ESEC), no âmbito do estágio supervisionadopela Camaleão- Associação Cultural e pela referida Escola, apresentamde 2 a 10 de Junho, no Teatro da Cerca de São Bernardo, às 21h30,o espectáculo “O Dom de Juana, as Donas de Juan”, construído “apartir da personagem e do mito de Don Juan, e onde confrontamosalgumas das mais conhecidas versões que sobre ele foram escritas ecompostas ao longo da história da dramaturgica ocidental - Tirso deMolina, considerado o primeiro, Moliére, o mais importante e Mozart/Da Ponte, o mais operístico. Para além disto, confrontamos o mito dosedutor com o seu espelho: Ama em o “Auto da Índia” de Gil Vicente,Juana em “Dona Juana” e Elvira em “O fim Atroz de um Sedutor”ambas de Anca Visdei. Este espectáculo pretende, pois, ser uma leiturada sedução (masculina e/ou feminina) no teatro, através de um dosseus personagens mais marcantes”, revelam os organizadores doespectáculo.

Preço dos bilhetes: 3 eurosReservas e informações pelos números: 916043248/ 968608929/ 916583585/ 964417368.

“O Dom de Juana, as Donas de Juan” em Coimbrapelos alunos da ESEC

Até 11 de Junho, o Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa,apresenta “Medeia”, uma tragédia grega, do autor clássicoEurípides. O trabalho tem encenação de Fernanda Lapa,tradução de Sophia de Mello Breyner e interpretação deManuela de Freitas, António Rama, Fernanda Lapa, João Grosso,José Neves, Luísa Cruz, Inês Nogueira, Margarida Mestre, MartaLapa, Sara Carinhas, Sofia Petinga e Sónia Neves.Sessões na Sala Garrett às 21h30 de terça-feira a sábado e às16h00 aos domingos. Informações pelo telefone 213250827.

“Medeia”, de Eurípides no D. Maria II

Fotografia

Parto do princípio que(também) o amigo lei-tor gosta de fotografia.E que sente uma certacuriosidade pelo tra-balho pioneiro obtidocom aquelas maqui-netas mais antigas,

que ajudaram a registar a História. Então,não pode perder a exposição patente até11 de Junho no Centro Português deFotografia, na cidade do Porto.

A proposta é uma viagem à era docolonialismo português em África, atravésda Colecção de António Faria e ÂngelaCamila Castelo-Branco.

Subordinado ao tema geral “E Se MaisMar Houvesse...”, o certame inclui foto-

grafias de autores portugueses, que nosmostram parcelas e momentos da históriasocial de Angola, Moçambique, Guiné, CaboVerde e S. Tomé e Príncipe.

“Não se mostra a Colecção completa, nãoestão presentes todos os mares do mito, apenasse seleccionou, dentro do espírito que norteouos coleccionadores, aspectos fotográficos dascolónias portuguesas em África, desde o últimoquartel do século XIX.”, sublinha o texto deapresentação, que esclarece mais adiante:

“É o tempo em que a fotografia portu-guesa atingia, como acontecia lá fora, a suamaturidade e em que a progressiva eviolenta ocupação de África pelas potênciaseuropeias, se efectuava através do exércitoe da marinha e implicava uma vastaoperação científica das Sociedades de

Geografia, habitualmente acompanhados deantropólogos politizados. É pois umterritório de alteração e mudança, umaaceleração do domínio europeu numcontinente que vira a recente organizaçãode uma explosiva e guerreira ofensivaafricana contra o ocupante branco, umaterra difícil para os europeus que aí refazemtoda a sua vida ou representavam, comopodiam, a metrópole. É essa complexaconjuntura de crise, ilusão e ideologia queesta Colecção, reunindo eventos políticos ediplomáticos, paisagens que alimentam ovelho sentir sobre África, gestos de poder ede contenção, na vida nas roças e notrabalho agrícola, nas cerimónias, naschegadas e nas partidas, esse imensoefabulário que se fez com imagens de

JORNAL DA FENPROF 31MAIO 2006

LETRAS

Mário Laginha edita primeiro álbum a solo

A professora e investigadora de Estudos Clássicos Maria Helena da RochaPereira, catedrática da Universidade de Coimbra, recebeu, no InstitutoCamões, em Lisboa, o V Prémio da Latinidade.Fundada em 2000 por 35 Estados de língua oficial ou nacional românica,a União Latina visa promover a reflexão sobre os valores culturais elinguísticos do conjunto da comunidade latina e a consciência daidentidade cultural comum destes povos. Em Portugal, esta missão temsido cumprida com eventos como o Concurso Diálogo Latino, colóquios,representações de Teatro Clássico e, sobretudo, as comemorações, emMaio, do Dia da Latinidade, que culmina com a atribuição do Troféu Latino.No âmbito das celebrações, realizou-se no Instituto Camões uma mesaredonda subordinada ao tema “Tradução, Ensino, Mercado, Práticas eInstrumentos”, dirigida por João Barrento.Em simultâneo foi organizada uma exposição intitulada “Portugal,Património da Humanidade”, patente ao público diariamente, das 10h00às 17h00, até finais de Maio, na sede do Instituto Camões.O cineasta Manoel de Oliveira (2202), o ensaísta Eduardo Lourenço(2003), o arquitecto Siza Vieira (2004) e Mário Soares (2005) foram osgalardoados nas anteriores edições do Troféu Latino, instituído em 2002.Maria Helena da Rocha Pereira, professora catedrática da Faculdade de

Letras de Coimbra, é considerada a maior autoridadeportuguesa em Estudos Clássicos e tem contribuído,de uma forma decisiva, para a divulgação daliteratura clássica em Portugal. Foi a primeira mulhercatedrática da Universidade de Coimbra e tem comoárea de investigação os Estudos Literários-Línguase Literaturas Clássicas e Cultura e Literatura Gregas,

com várias obras publicadas. | Lusa, 16/05/2006

Prémio da Latinidade 2006 distingueMaria Helena da Rocha Pereira

O primeiro álbum a solo do pianista Mário Laginha, “Canções & Fugas”, editado pela Univer-sal, apresenta 12 temas inéditos de sua autoria, alguns inspirados no compositor alemão doséculo XVIII Johann Sebastian Bach.Fascinado pela obra de Bach, Mário Laginha compôs uma série de fugas, respeitando a técnicade escrita desta estrutura musical clássica mas introduzindo elementos tradicionais do jazz.“Esta poderia ser uma homenagem a Bach. Mas a verdade é que a sua dimensão como músicoe compositor tornar-me-ia essa tarefa impossível. Limito-me a tirar-lhe o chapéu e sorrir”,afirmou o músico. Além das fugas, Laginha compôs canções como “Do lado de cá do mar”,“Berenice”, “Do lado de lá do mar” e um “Fado”.Mário Laginha é considerado pela crítica musical como um dos melhores pianistas portuguesesda actualidade, com a cantora Maria João constituiu a mais popular dupla na área do jazz.Trabalharam juntos desde 1994 até ao ano passado quando ainda se apresentaram emvários festivais de jazz, nomeadamente em Valado de Frades e Portalegre. Esta parceriaproduziu uma dezena de álbuns, tendo o último, “Tralha” sido editado em 2004.Pianista e compositor, Laginha, 45 anos, foi distinguido com vários prémios e convidadoa participar em inúmeros festivais nacionais e internacionais, nomeadamente o deMontreux (Suíça), Montreal (Canadá) e San Sebastian (Espanha). Tocou e gravoucom Wayne Shorter, Ralph Turner, Manu Katché, Trilok Gurtu, Toninho Horta,Gilberto Gil, Julian Argüelles, Django Bates, Bernardo Sasseti, entre muitosoutros, e também com a Orquestra Filarmónica de Hannover para quemcompôs em 1999 “Lobos, raposas e coiotes”. | Lusa, 2/04/2006

A obra recente de três pintoresalemães e um polaco, da novageração, pode ser apreciada noMuseu de Serralves, no Porto, até9 de Julho.Eberhard Havekost, Johannes Kahrs,Magnus Von Plessen e o polacoWilhelm Sasnal começaram a

apresentar os seus trabalhos com mais regularidade no final dos anos 90,sendo hoje nomes conhecidos no roteiro das principais cidades europeias.Ulrich Loock é o comissário desta exposição no Porto, que pode ser visitadade terça a quinta-feira das 10h00 às 19h00, aos domingos e feriadosdas 10h00 às 20h00 e às sextas-feiras e sábados das 10h00 às 22h00.Mais informações pelo telefone 226156500.

Representantes da nova geração alemãe polaca em Serralves

Até 17 de Junho pode ser apre-ciada em Viseu uma parte ex-pressiva do trabalho da artistaGabriela Albergaria, subordinadoao tema “mouvement, instability,conflito - a selection”.Tendo como pano de fundo anatureza, a tempestade e o movi-mento, a selecção presente naGaleria António Henriques (RuaCândido dos Reis, 7) teve já duas anteriores exibições: em Coimbra e emBerlim. A exposição está agora patente ao público de terça-feira a sábado,das 15h00 às 19h00.

ARTES PLÁSTICAS

Trabalhos de Gabriela Albergaria em Viseu

Reconhecer – Um Lugar 84, (2004)

MÚSICA

álbum, é essa convulsão de umcontinente, que aqui se junta, emimagens fixas e interrompidas que onão podem explicar. Indicadoresdiversos de uma só realidade que avida em África nunca foi.”

Quem se deslocar ao CentroPortuguês de Fotografia/Cadeia daRelação, no Campo dos Mártires daPátria, na Invicta, pode apreciaroutras duas exposições: “MissãoBotânica Angola 1927-1937” (ima-gens do espólio científico do Depar-tamento de Botânica do InstitutoDoutor Júlio Henriques/JardimBotânico da Universidade de Coim-bra) e “Cabo Verde: Tempo deLibertação”, trabalhos fotográficosdo holandês Frits Eisenloeffel.

Horário: de terça a sexta-feiradas 15h00 às 18h00 e aos sábados,domingos e feriados das 15h00 às19h00. A não perder. | JPO