anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

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Page 1: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa
Page 2: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

A Lady

Cativa Anne Gracie

Page 3: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Sob o exterior resistente, Harry Morant oculta um coração muito cicatrizado. Sendo o

filho bastardo de um conde, as damas de nascimento nobre têm apenas um uso para ele –

nas suas camas. Agora, depois de oito anos em guerra, Harry está criando cavalos de

corrida e planejando um matrimônio prático e sem emoções. Mas, quando ele compra uma

nova propriedade, seus planos cuidadosos são ameaçados por uma paixão inesperada - e

entre todas as mulheres - pela filha de um conde.

Elogios a Anne Gracie

"Eu nunca perco um livro de Anne Gracie”.

—Julia Quinn

“Fabuloso sabor de Regência, engenhoso e viciante”.

— Stephanie Laurens

"Poderosamente sentimental, uma história que roubará seu coração… Este romance

mágico não apenas aquece o seu coração, mas aumenta a sua temperatura, também.

Bravo!".

—Romantic Times

“É raro achar uma história que seja tão inovativa e emocionante ao mesmo tempo. Eu

daria um dez para a série inteira se isso fosse possível”.

—Romance Reviews Today

"O romance na melhor acepção… Fui cativada pela história… Corra e compre este

livro— você não vai ficar desapontada”.

—Romance Junkies

Page 4: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Que escritora notável [Anne Gracie] é. Eu não posso pensar em outra escritora que

combine tão bem a comédia mais cintilante com emoções de partir do coração”.

—Anna Campbell, autora de Untouched.

Agradecimentos

Escrever é de certa forma uma ocupação solitária, mas me trouxe um mundo novo de

amigos.

Agradeço a Barbara Schenck e Linda Brumley pelo encorajamento constante e suporte

crítico, e as May toners—um grupo muito especial de brilhantes mulheres que traz um

novo significado a palavra amizade.

Finalmente, obrigada a todos os meus leitores: vocês fazem tudo ser possível.

Page 5: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Capítulo I

Hampshire, Inglaterra

Novembro de 1817.

Ela parecia uma Madona1 afogada. Harry Morant não pôde fazer nada além de olhar

fixamente. O rosto dela estava voltado para o céu, encharcado, a pele aceitando o chuvisco

nublado do mesmo modo como uma flor aceita a chuva. Os cabelos escuros estavam

agarrados em mechas ao redor do rosto, descendo como cordas úmidas além dos ombros,

misturando-se ao oleado escuro jogado ao redor de seus ombros. Sua aparência, pura e

cremosa, brilhava como uma pérola na floresta molhada e escura. Era bruxuleante, pálida,

quase extraordinária.

Harry diminuiu a velocidade de seu cavalo, Sabre, e montou para mais perto da

carroça abrindo passagem lentamente através de New Forest. Ele manteve Sabre na

extremidade da estrada, evitando a lama agitada por carroças e carruagens.

Seu companheiro, Ethan Delaney, deu a ele um olhar surpreso e diminuiu a

velocidade de seu cavalo também. Harry não percebeu. Ele só tinha olhos para a mulher.

O rosto dela era fino e estreito, com as maçãs do rosto altas. O nariz era longo e reto,

mas a boca era luxuriante, suave e vulnerável. Harry olhou fixamente para a boca e

engoliu em seco.

Ela se sentou de volta na carroça, se apertou entre barris e caixotes embalados,

espremida entre a bagagem que parecia ter sido feita de última hora. Seus pés oscilaram

sobre a estrada. Seus sapatos e a bainha de sua saia estavam cobertos de lama. Ao lado

dela estava uma pequena bolsa de carpete.

Um movimento chamou a atenção dele. Meio escondido pela lona, apertado contra a

saia dela, havia um Spaniel coberto de lama. Observa Harry cautelosamente mas não fazia

nenhum som.

A mulher mostrou pouca consciência da estrada que estava embaixo dela assim como

os quatro grandes cavalos da carroça que se moviam na lama tentando se esquivar, se

esforçando contra a carga. O corpo dela se ajustava sem pestanejar ao balanço da carroça.

Ela não parecia ouvir a série constante de obscenidades que fluía da boca do condutor.

Ocasionalmente ela vacilou com o som do chicote que ele usava muito livremente.

Ela não tirou os olhos do céu. Nenhuma vez.

Uma ordenhadeira, talvez, a caminho de uma feira para ser contratada, ou alguma

jovem empregada viajando para começar um novo trabalho. Talvez a filha de um

transportador. Não, ele decidiu, não era isso—ela não estava bem o suficiente para isto. A

menos que o transportador fosse um bruto.

1 Madona (do italiano Madonna) é o nome dado à representação artística da Virgem Maria, mãe de Jesus Cristo, em

pinturas e esculturas.

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Ela parecia exausta. Seus olhos eram grandes, com círculos escuros e cansados contra

a pele pálida. As mãos nuas e sem anéis, se embrenharam nas extremidades do oleado,

segurando-o junto do corpo, mantendo grande parte da chuva longe.

Harry diminuiu a velocidade de Sabre até que ele e a mulher na carroça estavam

viajando na mesma velocidade. Ao lado dele Ethan fez um som resignado, então

persuadiu seu cavalo adiante.

Sabre andava delicadamente pela lama remexida do caminho, trazendo Harry a uma

distância em que ele quase podia tocar a menina. Não era uma menina, ele percebeu. Uma

mulher. Vinte e cinco anos talvez?

Os rostos dele estavam quase no mesmo nível quando o olhar dela desceu e os olhos

deles se encontraram.

Harry não podia tirar os olhos dela. Eram da cor de um xerez profundo. Firmes e

claros, era como olhar para uma floresta profunda, pura, mas escura com o tanino das

folhas caídas.

O olhar dele devorou o rosto e a pele dela que estava pálida sob a lua e brilhante com

a névoa. Lábios pálidos, suaves e gelados da chuva, separaram-se ligeiramente enquanto

ela devolvia o olhar dele. Agora ele estava perto o suficiente para ver cada gota de névoa

agarrada em suas pestanas escuras e longas. Ele teve um desejo louco de saborear uma. Ele

se aproximou o suficiente para tocá-la. O que ela faria se ele simplesmente se esticasse e

tocasse a umidade de suas pestanas com os dedos? Mas enquanto ele pensava no que

aconteceria, ela piscou e a possibilidade se perdeu.

Melhor assim. Tinha sido uma ideia louca.

A chuva tinha escurecido o cabelo dela. Ele se perguntou de qual cor ele seria, como

ficaria ao sol. As mechas úmidas emolduravam seu rosto magro, agarrando-se a sua

fronte, suas têmporas, suas maçãs do rosto.

Os dedos de Harry coçaram para alcançá-la e arrumar um cacho que se pendurava

quase nos olhos dela, com o perigo de se emaranharem em suas pestanas longas. Se que

ele se enrolaria no dedo dele se ele fizesse isso? Como uma coisa viva?

Deus, mas como ela estava molhada! O olhar dela não tinha desviado, e de repente

Harry sentiu uma onda de calor passar por seu corpo. Para cobrir sua confusão súbita ele

ergueu o chapéu, como uma saudação. Mas em vez disso, se viu colocando-o suavemente

acima dos cachos encharcados dela.

Ele ficou além da testa, cobrindo maior parte do rosto. Ela não disse uma palavra,

apenas jogou a cabeça para trás e, sob a borda do chapéu, deu a ele um longo e pensativo

olhar.

"Você deveria ir para debaixo da lona”. Ele anuiu com a cabeça em direção à lona

pesada que tinha sido amarrada acima do conteúdo da carroça. Seria abafado e escuro no

pequeno espaço entre as caixas e ela não poderia ver o lado de fora, mas com certeza seria

melhor ficar seca em um lugar escuro do que se sentar a céu aberto, exposta à chuva.

Ela seguiu o olhar dele, e então suavemente agitou a cabeça. Ele não podia mais ver

bem os olhos dela, mas a boca se movia, e os olhos dele se fixaram na curva suave dos

lábios dela. Outra onda de calor passou por ele.

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Sabre se moveu inquietamente sob a compressão involuntária das nádegas e coxas de

Harry e por um momento ele estava abençoadamente ocupado em controlar sua montaria,

ocupando-se com a distração para tentar controlar o próprio corpo.

Ele devia partir. Ethan sem dúvida estava esperando impacientemente adiante e

Harry era esperado em Bath para o jantar.

Além disso, esta mulher era algum tipo de ordenhadeira ou empregada. Nada podia

resultar disto. E Tia Maude já estava fazendo acordos.

Mas de alguma maneira… O olhar dele devorou-a.

Ele não se sentia assim… há anos.

A floresta escasseava. Harry deu uma olhada adiante. Eles estavam chegando a uma

bifurcação na estrada. Um lado continuava em direção a Shaftesbury, e o outro, por

conseguinte, ia para Bath, quando a estrada mais estreita se ramificava indo para longe à

direita. Ele deixaria que o destino decidisse se ele poderia ter uma relação com esta mulher

ou não.

Ele levou Sabre junto ao lado da carroça, não dizendo nada até que eles alcançaram a

saída do caminho. A carroça virou à direita.

Assim seja, Harry pensou. O destino falou.

Ele se preparou para sair montando, mas se viu olhando fixamente para aquelas

pequenas e frias mãos enrugadas agarrando a lateral da carroça. Sem pensar, ele tirou suas

luvas de couro e as jogou no colo dela.

Ela as pegou e, sob a borda do chapéu, deu a ele um olhar perplexo.

"Use", ele murmurou. "Suas mãos parecem congeladas”.

Por um momento ela não se moveu, então deslizou a primeira mão na luva, então a

outra. Elas deslizaram facilmente; as luvas eram extremamente grandes.

E então ela jogou o chapéu para trás e deu a Harry um sorriso.

Harry olhou fixamente, deu um aceno com a cabeça aos arrancos, e persuadiu Sabre

para o oeste.

Muito mais tarde ele percebeu que realmente não a tinha ouvido dizer "obrigada”. Ele

se lembrava de ter visto os lábios dela formando as palavras. Ele anuíra com a cabeça

estupidamente e tinha montado adiante, passando pela carroça nada graciosa sem notar,

inconsciente de tudo a não ser o sorriso.

"Bem, essa é uma virada nos acontecimentos”, Ethan disse quando Harry juntou-se a

ele. "'Dandu’ seu chapéu agora, é? Eu pensava que era o seu favorito”. O olhar dele desceu

até as mãos nuas. "E, não—diga-me que você não deu as suas luvas, suas luvas polonesas

forradas de pele. Eu invejava aquelas luvas há anos”.

Harry encolheu os ombros. "Ela estava fria. E molhada”. Ele não estava bem certo do

que tinha dado em si mesmo, também.

Ethan bufou. "Estou com frio e molhado, droga. Mais frio e mais molhado por causa

dos passos de caracol que você adotou para ficar ao lado daquele maldito vagão. Eu fiquei

praticamente congelado várias vezes desde que te conheci e eu sou supostamente seu

amigo. Se você queria doar aquelas luvas, poderia ter dado para mim”.

Harry não disse nada. Ele não iria aumentar a alegria de Ethan com a situação ao

tentar explicar o inexplicável.

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Ethan persistiu, um sorriso irritantemente conhecedor no rosto danificado, "Harry

Morant, nós já viajamos de cabo a rabo a península há anos, no gelo e na neve, através de

batalhas e chamas e eu nunca te vi doar um bom par de luvas, ou o seu chapéu favorito”.

"Isso foi diferente. Eu precisava deles na época”.

Ethan deu a ele um olhar incrédulo. "E você não precisa deles agora? Homem, é

muito preocupante se você não consegue notar que precisa delas agora”.

Harry notava. Ele ergueu o colarinho mais alto e seguiu seu caminho. "Então”, Ethan

disse depois de um momento. "Qual é o nome dela?".

Harry encolheu os ombros.

"Ela não disse a você?".

Harry agitou a cabeça. "Eu não perguntei”.

"Bem, onde ela vive?".

"Ela não disse”.

"O que ela disse?"

"Nada”.

"Nada?"

"Nada”.

"Deus me dê forças. E o que você disse—não, não me diga, que foi nada, ou algo tão

bom quanto”.

"Nem todo mundo é tão loquaz quanto você, Delaney”.

"Não, mas, Harry meu rapaz, até os tocos têm que conversar se quiserem achar uma

mulher”.

Harry disse frio, "minha tia está achando uma esposa à altura enquanto

conversamos”. Ele não estava "achando uma mulher”. A menina na carroça parecia

patética, isso era tudo. E ele tinha acabado de doar a ela seu chapéu.

"Sua tia”, Ethan disse com desgosto fundo. "Que tipo de homem pede a própria tia

para achar uma noiva para ele?".

"Um prudente”.

Ethan fez um som rude. "E você com esse seu rosto bonito—por que se as mulheres

fazem fila para você, homem?".

Harry bufou.

"Eu vi isso naquele baile do casamento do seu irmão, rondando você como moscas

rondam a carne. Agora se fosse eu, com a minha cara feia, eu ‘entendria’ usar uma tia, mas

você…", ele agitou a cabeça.

"Elas eram tão bem-vindas quanto moscas”, Harry disse a ele.

Ethan explodiu com riso. "Veja pelo outro lado. Eu já te ouvi andando

sorrateiramente ao amanhecer, com o ‘cheiru’ de algum perfume adorável—e um a cada

vez”.

"Isso tinha sido um problema”, Harry murmurou.

"Deus me conceda esse tipo de problema”.

"Elas não queriam a mim”, Harry disse.

"Pode ter se enganado—"

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"Elas não estavam nem interessadas em conversar comigo”. Elas fizeram Harry se

sentir como um—como era palavra que os Italianos usavam?—Gigolô. Chamado para a

cama da dama como um capricho dela, mas nunca convidado para o jantar, nunca para um

passeio no parque. E claro, nunca para uma dança, com sua perna ruim ele era como uma

aparição em um salão de dança.

"Conversar?", o queixo de Ethan caiu. "Oh, você é famoso pela sua conversa, não é?".

Harry deu uma olhada nele. Ethan riu e bateu levemente na bochecha de Harry.

"Você é tão eloquente quanto um toco preto, meu rapaz, mas pelo menos as senhoras

apreciam as suas outras qualidades”.

Harry encolheu os ombros. "Era apenas esporte na cama”. Elas poderiam ser damas,

mas nunca o tratavam como a um igual, como um cavalheiro. Apenas um cavalheiro

bastardo.

Ethan deu um suspiro fundo. "Apenas esporte na cama, é? Uma coisa terrível de

suportar”.

Harry não pôde evitar sorrir. "Não, mas era mais difícil do que você pensa”.

Ethan deu uma olhada para a virilha de Harry e disse, "Bem, tinha que ser, pela

quantidade de uso”.

Os dois riram. Eles montaram em silêncio por pouco tempo, então Harry disse, "todas

elas eram casadas”.

"Bem, isto é só razoável, não é? Você não gostaria de ter ‘ruinado’ uma virgem, agora,

não é? Estou certo ‘diquê’ aquelas damas de Londres fizeram sua parte com os seus

maridos e produziram um herdeiro ou dois, ‘intão’ qual o problema de se divertirem um

pouco com um jovem boa pinta como você?"

Harry pensou sobre isto. "Elas fizeram votos, Ethan”.

"Sim, mas elas provavelmente não tiveram nenhuma escolha na questão. Você sabe

como é com a aristocracia—como eles organizam estas coisas. Apenas os camponeses,

como ‘mim’, são sortudos a ponto de se darem ao luxo de se casarem por amor”.

Harry aproveitou a oportunidade para mudar o tópico da conversa. "Se isso é tão

maravilhoso, Ethan, por que você nunca se casou?".

"Estava muito ocupado até agora, ‘lutanu’ em guerras pelo fazendeiro pobre e

maluco, George. Mas não se preocupe, estou de olho em uma pequena potranca. Estarei

casado antes do final do ano, conte com isto”.

"Você? Com quem?", Harry ficou surpreso. Ele não conseguia pensar em ninguém,

qualquer menina ou mulher que Ethan tivesse visto ultimamente. "Alguém que eu

conheça?".

"Ah, bem, ‘naum’ posso dizer, não até que a moça concorde”. Ele deu a Harry um

sorriso sentido. "Ela ‘naum’ é uma moça fácil ‘comas’ suas damas de Londres—minha

garota é muito difícil”.

"Muito difícil?", Harry não podia acreditar que Ethan falasse a sério. Se Ethan

estivesse saindo com uma mulher, com certeza ele teria notado.

"Sim, sem dúvida é um conceito estrangeiro para você, rapaz, com esse seu rosto, mas

nós meros mortais somos obrigados a cortejar as nossas pretendentes. Eu estou ‘ganhanu’

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bastante prática—se quiser eu posso te dar alguns conselhos, para que assim você possa

cortejar uma boa dama aristocrática para você".

Harry fungou. "Eu não tenho tempo para cortejos, e não tenho nenhuma intenção de

me casar com uma senhora da aristocracia que, feliz, irá me chifrar em alguns anos. Eu

pedi a minha tia que achasse uma noiva nas classes médias—que tem mais princípios

morais que a aristocracia. A respeitabilidade é uma paixão nas classes médias”.

"Mas você vai mesmo fazer um casamento arranjado?".

"Creio que sim”.

Ethan franziu os lábios pensativamente. "Eu sou apenas um pobre irlandês, e o que eu

sei sobre a aristocracia ou as classes médias você pode contar nos dedos, mas eu acho que

qualquer moça que tenha sido forçada a fazer um casamento de conveniência tenha mais

chance de ‘desenvolvê’ um olho errante durante os anos do que uma que tenha se casado

por amor”.

"Eu não vou me casar por amor. É tudo besteira, de qualquer maneira”.

Ethan deu a ele um olhar observador. "Ah sim, eu me lembro de ter ouvido sobre isto.

Lady Andrea ou Anthea—algo assim, não é?".

"Eu era um garoto tolo então”, Harry disse seco. "Já parei com essas tolices. Sou um

homem prático agora”.

"Oh sim, claro que é”, Ethan concordou. "É por isso que seu cabelo está ensopando e

suas mãos estão congeladas”.

Harry deu a ele um olhar agudo, mas não pôde pensar em uma palavra para dizer,

Ethan estava dizendo, "e aqui nós estamos na saída, então estou indo, adeus. Boa sorte em

Bath com a sua tia e as suas garotas respeitáveis de classe-média. Vou ‘verificá’ aquele

cavalo, e o informarei se ‘topá’ com qualquer propriedade que esteja à venda no caminho”.

E com um aceno, Ethan foi para longe.

Nell Freymore jogou o chapéu do homem para trás e observou o bonito estranho se

juntar ao seu amigo.

Que tipo de homem daria seu próprio chapéu e luvas para uma mulher desconhecida

sobre uma carroça? Uma mulher molhada ainda por cima.

Ele era um cavaleiro, ela podia dizer pelo cavalo, um magnífico puro-sangue preto

com andar orgulhoso. E pelo modo como ele montava com uma graça fácil que nunca

poderia ser ensinada, como se tivesse nascido sobre o cavalo. O pai dela montava assim.

Ela o notou bem antes dele se aproximar o suficiente para ver seu rosto. Ela tinha

observado o cavalo. Ela sempre notava os cavalos, não conseguia evitar. E ambos, o cavalo

dele e de seu companheiro eram animais excepcionais; o preto forte com um andadura

longa e graciosa, e o castanho feio, mas muito poderoso. Ambos os cavalos pareciam ser

muito rápidos.

Ela queria um daqueles. Desesperadamente. Eles acabariam os quilômetros com

velocidade fácil. Ela estava agonizando por andar na carroça pesada, viajando a um passo

frustrante de tartaruga. O que se podia dizer é que era mais rápido do que ela poderia

andar, e mais fácil, porque ela estava muito cansada quando o carreteiro tinha se oferecido

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para levá-la como carona. Ela estava agradecida por isto, mas oh, estar em um cavalo

rápido...

Ela observou os homens, meio que desejando que um deles desaparecesse e que um

cavalo sobrasse errante, para que ela o pegasse e partisse. Ela vivia em tantas fantasias nos

últimos dias, sonhando que a vida fosse diferente. Era tolo, ela sabia, mas às vezes a

fantasia mantinha as esperanças vivas.

Ela precisava disso mais do que tudo.

Quando os cavaleiros se aproximaram, ela se percebeu olhando para o mais alto.

Havia algo nele. O amigo dele falou com ele e sorriu enquanto eles viajaram, mas ele

montava tranquilamente, como se estivesse perdido em seus próprios pensamentos. Auto-

suficiente.

Ela não estava certa do que a tinha feito perceber que ele a estava observando. Ele

estava ainda a uma distância bem grande quando ela percebeu. Havia sentido.

Ela fingiu não ter notado, desviara o olhar, não queria encontrar os olhos dele. Ela não

se sentia confortável ao redor dos homens ultimamente. Ela olhou para o céu, procurando

um pouquinho de céu azul.

Era sempre um sinal de esperança, aquele vislumbre de azul, mas hoje o céu estava

do mesmo jeito que há semanas. Cinza. Frio, impiedosamente cinza.

Ela tinha a intenção de ignorá-lo—eles—à medida que eles passaram, como se eles

não estivessem lá. O amigo dele passou em um passo liso, fácil: deu uma piscada para ela

e uma saudação alegre para o carreteiro em cima e então se foi.

Mas ele demorou, diminuindo a velocidade, movendo seu cavalo para mais perto e

mais perto até que ele se aproximou muito e ela pôde sentir o cheiro de seu cavalo e da lã

úmida de seu sobretudo. Ela não podia mais fingir que ele não estava lá.

De má vontade, quase sem desejo, ela desceu o olhar.

Os olhos dele eram tão cinzas e sombrios quanto o céu, o olhar tão intenso quanto

gelo congelado, queimando-a. Abrasador.

E então ele deu o chapéu a ela.

E então ela realmente olhou para ele. O rosto masculino firme e esculpido por um

mestre, o nariz reto, arrogante, os lábios finos e bonitos, cinzelados. A encarnação da

beleza masculina.

Fora um desses momentos em que o tempo diminui a velocidade, aparentemente

infinito, e ainda assim, tinha passado num instante.

A troca inteira durou talvez cinco minutos. Ele tinha articulado algumas palavras, ela

nem mesmo tinha falado. Pela primeira vez na vida, a língua viva e ágil falhou; ela não

tinha nenhuma ideia do porquê. E durante os minutos ele tinha dado a ela um olhar

abrasador pela última vez e foi para longe.

Ela não estava certa do que tinha se passado entre eles, além do chapéu, luvas e

algumas palavras escassas. Mas ela nunca se esqueceria daquele rosto ou daqueles olhos

cinza, frios, curiosos e que queimavam.

Os dedos congelados formigavam quando lentamente a sensação neles retornava. As

luvas eram mornas—mornas com seu forro de pele e do calor das mãos grandes e fortes

dele. Eles aqueceram os dedos congelados dela.

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Eles aqueceram o espírito ferido dela até mais. A generosidade de um estranho.

Inesperado. Incalculavelmente tocante.

Nell se agarrou ao lado da carroça e impacientemente assistiu a zona rural que

lentamente deslizava. Ficava mais familiar a cada quilômetro. Ela precisava estar em casa.

Ela precisava fazer algo. Essa viagem lenta tinha dado a ela bastante tempo, tempo demais

para pensar, meditar e se afligir.

Ela ergueu o olhar para as árvores escuras, quase nuas, contra o céu cinza. O inverno

estava vindo. O mundo estava morrendo ao redor dela.

Não. Não, não estava. Nada, ninguém estava morrendo. Apenas o pai dela tinha

morrido. Apenas o pai. Ela tinha que acreditar nisto.

Ela estava indo para casa. Ela ficaria bem, então. Ela teria que juntar algum dinheiro e

retornar a Londres. E dessa vez ela a acharia, acharia Torie…

Onde há vida, há esperança, eles disseram.

Folhas, carmesins e ouro, moveram-se para o chão e estava enterradas na lama. E as

perguntas, como sempre, ressoavam sem resposta em sua mente.

Por que, papai, por quê? Por que não me disse o que pretendia? Por que fingia acreditar em

mim e agia em segredo?

Evasões, mentiras e segredos, sempre, por toda sua vida. E agora quando era tão

importante, quando ela precisava saber mais do que tudo, era muito tarde. O

conhecimento tinha ido com o pai para o sepulcro, e restavam apenas as perguntas.

Por que, papai, por quê?

A chuva nublada virou um chuvisco suave e gotejava pela borda do chapéu. O rosto

dela permanecia seco. Ela não tinha mais lágrimas mesmo.

Quando ela saíra de casa pela última vez, o verão estava irrompendo e o mundo

estava verde e estourando com vida. Agora ela estava retornando para casa, as flores do

verão já tinham murchado, o inverno estava retornando, e o mundo estava morrendo ao

redor dela.

Nell doía com vazio. Seria melhor quando ela estivesse em casa. Ela podia pensar

mais claramente lá, descobriria o que fazer a seguir.

Ela poderia até poder dormir…

Oh Deus, se apenas ela não tivesse adormecido naquela noite. Ela poderia, teria sido

capaz de pará-lo. Mas ela dormiu e, dormindo, perdeu tudo.

Ela quase nem tinha dormido desde então. Ela estava tão cansada.

Ela se forçou a se sentar direito, "nós já estamos quase em casa e então eu terei

dinheiro novamente, e com dinheiro qualquer coisa é possível, não é, Freckles?".

Um rabo bateu na carroça e o cachorro se sentou e lambeu o nariz de Nell.

"Obrigada pelo voto de confiança”. Nell deu a Freckles um abraço. O que ela faria

sem Freckles? Tinha sido um conforto e um grande amigo.

Freckles brilhou com a atenção e apontou interessadamente para as luvas de homem.

Ela deu a Nell um olhar tão esperançoso que Nell se viu rindo. "Não”, ela disse. "Estas

luvas não são para você”.

Um par de olhos marrons tristes foi da luva até Nell e para trás, demonstrando Desejo

Indizível, alternado com repreensão saudosa.

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Dessa vez Nell deu gargalhadas. "Sim, estou certo de que elas têm um cheiro muito

interessante, mas luvas não são para cachorros. E olhe, ali está o campanário de St. John.

Em mais vinte minutos estaremos em casa”.

Para a surpresa de Nell, o portão principal de sua casa estava fechado. Até onde ela

podia se lembrar, ele nunca tinha sido fechado antes. Uma corrente tinha sido passada

pelas barras e um cadeado estava firmemente apertado.

Perplexa, ela caminhou ao longo da linha da cerca para onde ela sabia que havia um

buraco onde as pedras tinham caído. Freckles passou e Nell a seguiu.

Ela foi até a carroça. A chuva havia parado, mas ela não podia ver ninguém ao redor.

Não parecia normal.

Quanto mais perto ela se aproximava de casa, mais forte o sentimento crescia. Ela

subiu os degraus dianteiros e puxou a corda do sino da campainha. Ela ouviu o som ir

longe lá dentro mas ninguém correu para atender.

Ela poderia entrar pelos fundos. A porta da cozinha, pelo menos, nunca ficava

fechada.

"Sim? Em que posso te ajudar?".

A voz a surpreendeu e ela perdeu um pouco o equilíbrio. A pergunta veio de um

homem que ela nunca vira antes. Era um homem pequeno de cerca de trinta anos,

nitidamente, quase meticulosamente vestido de calça comprida preta e um casaco

apertado na cintura e com ombros fortemente acolchoados. O fino cabelo estava escovado

para frente em uma tentativa desgraçada de fazer o estilo Brutus2 e ele carregava uma

pasta.

"Quem é você?", ela respondeu. Ele parecia um advogado.

"Eu sou o Sr. Pedlington”. Ele a olhou de cima a baixo como se ela fosse um inseto,

então fungou. "Não há nenhum trabalho disponível aqui”.

Nell supôs que parecia mais do que bastante molhada. Ela tido ido para tão longe e

então houvera a chuva, e toda aquela lama.

"Eu não estou atrás de trabalho”, ela disse a ele agradavelmente. "Eu vivo aqui. Sou

Nell Freymore”.

Os olhos dele pularam de repente. "Freymore?", ele exclamou. "Você não quer dizer—

não tão tarde—"

"Sim, eu sou sua filha”.

Pedlington parecia desconfortável. "Eu represento a firma Fraser e Shaw”. Ele

pausou, como se ela devesse reconhecer o nome.

Ela não reconheceu. Ela esperou que ele explicasse.

Ele limpou a garganta. "Ninguém te disse?".

"Disse o quê?".

"Oh Deus”. Ele correu os dedos ao redor do cravate3 apertado.

2 Corte em que o cabelo todo ficava curto, exceto na frente, onde ficavam cachos jogados para a testa, para ficar

parecido com o Imperador Romano Tito. A versão Brutus era com o resto do cabelo ainda mais aparado.

3 Cravate - lenço usado no pescoço pelos franceses, precursor da gravata moderna.

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O jeito dele a estava deixando nervosa. "O que é que eu deveria saber?".

"Hm, a casa. A propriedade”.

"Sim?".

"Esta casa—", ele gesticulou.

"Eu sei que casa é. É a minha casa, afinal”.

Ele tragou. "Não é. Não mais. Minha firma receberá uma comissão ao vendê-la”.

"Vendê-la? Você não pode vendê-la—é minha”. Ele pareceu não entender, então ela

acrescentou. "Pertence a mim”.

"Não. Temo que o… seu pai—", Pedlington hesitou. "Ele perdeu a casa em um jogo de

cartas”.

"Ele não pode”, Nell disse. Ela viu que o advogado estava a ponto de explicar e

acrescentou, "quero dizer que sei que ele perdia coisas em jogos de carta—ele sempre fez

isto. Ele tinha perdido quase tudo que possuía. Mas ele não pôde perder esta casa porque

não pertence a ele. Ele a passou para mim há anos…", ela disse com a voz baixa.

Pedlington estava agitando a cabeça.

"Foi tudo perfeitamente legal”, ele explicou. "Eu mesmo vi os documentos. A ação de

ambas as casa e as terras estão sob a posse de nosso cliente. Sozinho”.

Nell olhou para ele durante um longo momento, então os joelhos dela falharam. Ela

caiu sobre o degrau superior, seus pensamentos em tumulto. "Você quer dizer que esta

casa foi perdida, também?", o pai dela tinha perdido a casa, junto com todo o resto? Ele

jurara que as ações estavam no nome dela.

Mentiras, sempre mentiras.

"Sim”.

"Então aonde eu vou?".

"Eu não sei. Sinto muito”. Ele limpou a garganta e disse com uma mistura de

condolência e seriedade, "mas você não pode ficar aqui. Deve partir”.

Capítulo II.

Firmin Court, Wiltshire

Dez dias depois

"A casa, devo confessar, está um pouco rota”, Pedlington, o agente, disse com voz

apologética, "mas com uma pequena reforma—"

"Está extremamente rota; de fato a propriedade inteira emite cheiro forte de

negligência”, Harry Morant disse com um olhar apontado para cortinas aveludadas e

antigas em trapos.

Pedlington fez uma careta. "Temo que o antigo conde fosse bastante negligente na

realização de suas obrigações…"

Harry bufou. As obrigações tinham sido esquecidas. Pelo que ele tinha ouvido, o

último conde tinha negligenciado tudo, exceto as mesas de jogo. Mas a negligência dele

seria o ganho de Harry.

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Pedlington continuou, "esta propriedade não é parte da propriedade global. Veio

através de sua finada esposa, então não está implicado”.

Eles caminharam de quarto empoeirado até quarto empoeirado, através de corredores

com papéis de parede desbotados com remendos mais escuros que mostravam onde os

quadros e a mobília um dia estiveram. Se este lugar não estava implicado, Harry se

perguntou, por que o conde não o havia vendido? Ele vendia tudo o mais em que podia

colocar as mãos.

O quarto Conde Denton tinha levado uma propriedade grande e próspera à ruína. Ele

tinha hipotecado tudo, vendido o que podia ser vendido, e mesmo assim não tinha sido o

suficiente para cobrir suas dívidas. Ao final, enfrentou ordem de prisão por causa das

dívidas, teve um ataque cardíaco e morreu. No meio da estrada, Harry ouvira dizer.

Então os comedores de carniça se moveram; os oficiais de diligências e aqueles aos

quais o conde devia dinheiro, escolhendo o que tinha sobrado do que um dia estivera em

bom estado, arrancando o máximo de centavos que podiam. Pedlington tinha sido

designado por uma firma em Londres cuja tarefa era salvar o que fosse possível de toda a

bagunça.

Harry ouvira tudo em Bath. Ele tinha cortado seus pequenos compromissos sociais,

muito para o aborrecimento de sua tia. Não fazia sentido de qualquer maneira. Os pais das

garotas de classe-média que sua tia tinha reunido deixaram claro que aspiravam mais para

suas filhas.

Então Harry tinha vindo para cá para inspecionar a propriedade. Antes que o último

conde adquirisse Firmin Court a propriedade tinha sido famosa pelos seus cavalos.

"Não imagino que o quinto conde apreciará a tarefa”, Harry disse. Pobre bastardo.

Pedlington agitou a cabeça. "Não, realmente. Ele é o segundo primo do último

conde—vive na Irlanda—e não tem nenhuma ideia de como as coisas estão. O pobre

homem recebeu um choque quando ouviu a história toda. Desmaiou, fui informado. Que

uso tem um título quando vem com uma propriedade em que a maior parte está envolvida

em dívidas?", ele deu a Harry um olhar esperançado. "Pelo menos esta propriedade pode

ser vendida”.

Harry o ignorou. Esta casa tinha sido esvaziada, e não recentemente. Os cômodos

estavam em desuso e cheios de pó, mas não havia nenhum odor de umidade ou

decadência. Eles passaram de cômodo a cômodo, Harry insistiu que queria ver tudo, mas a

casa era o que menos importava a ele.

"O que—", o agente murmurou. Uma das alcovas estava bloqueada. O agente tentou

abrir com a chave atrás de chave com aborrecimento crescente. "É apenas uma alcova,

senhor, de nenhum interesse. Está nas mesmas condições que o resto da casa”.

Harry ergueu uma sobrancelha. "E você não tem a chave?".

"Não, mas te asseguro de que vou obtê-la em seguida”, Pedlington disse com voz

firme.

Harry, sem interesse em uma chave perdida, andou através do corredor. "Isto é tudo

que você tem para me mostrar?".

"Você teria algum interesse em ver os arredores da cozinha? Ou os quartos do sótão e

dos empregados?", o tom de Pedlington dizia que ele não esperava isto.

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Harry fez um gesto desdenhoso. "Não, estou certo de que não é necessário. A

negligência é intimidante, assim como o pó”. Ele acrescentou como se fosse uma reflexão

tardia, "mas talvez a cozinha, apesar de que eu acho que deva ser desesperadamente

inadequada. E já que eu vim até aqui, talvez eu deva olhar também os prédios ao redor”.

Pedlington, já certo de que sua viagem tinha sido feita em vão, suspirou. "Sim,

senhor. Nós podemos alcançar os prédios ao redor pela porta da cozinha”. Eles voltaram a

andar, os passos ecoando no chão de madeira nu. Um chão bom e sólido, Harry notou,

sem sinal de cupins.

Harry reprimiu um sorriso lânguido com o abatimento do agente. Nos campos vazios

que cercavam a casa, a grama crescia espessa e luxuriante. Se os estábulos fossem tão

sólidos quanto a casa, ele faria uma oferta.

Todo esse lugar precisaria de um pouco de dinheiro, muito trabalho firme e um bom

gerenciamento. O legado de sua tia-avó Gert forneceria o dinheiro; Harry poderia fornecer

o resto.

As portas do estábulo estavam entreabertas. Pedlington franziu o cenho. "Estou certo

de que havia fechado-a da última vez em que estive aqui”.

Quando eles se aproximaram, um cachorro esticou a cabeça além da porta. Rosnou

quando eles se aproximavam.

Pedlington parou como uma estátua e olhou o cachorro nervosamente. "Sai, sai,

cachorro”, ele ordenou com as mãos se movendo. "Vá embora”.

O cachorro permaneceu na entrada, curvando os lábios em um grunhido baixo. Era

um animal bonito, um springer spaniel inglês, branco, com manchas marrons.

Harry tratou o cachorro severamente. "O que você quer dizer, dama, rosnando para

nós nesse tom rude? Comporte-se”. O cachorro, reconhecendo uma voz autoritária, deu a

ele um olhar embaraçado, e a ponta de seu rabo longo e peludo sacudiu um pouco.

"Como eu tinha pensado, era só um blefe, não é, querida?", Harry se agachou e

ofereceu a mão para o cachorro. "Vamos, apresente-se”.

Torcendo-se de modo coquete, a cadela se aproximou e cheirou os dedos de Harry.

Seu rabo sacudiu mais firme, ela lambeu os dedos dele, e então virou de barriga para cima.

"Assim é melhor”, Harry disse enquanto acariciava a barriga dela. A cadela se

contorcia de felicidade. Harry se endireitou e ela ficou de pé de um salto, o rabo

balançando suavemente enquanto ela o observava.

Pedlington olhou para o animal com antipatia. "Este animal não deveria estar aqui.

Não há nenhum cachorro no inventário. É um cão vadio”.

"Sim, mas bem inofensivo, como você pode ver. Então, vamos olhar os estábulos”.

Pedlington não se moveu. O homem estava muito nervoso por causa do cachorro.

"Eu posso inspecionar os estábulos por mim mesmo”, Harry disse a ele. "Estas portas

foram abertos de alguma maneira. Você deve verificar as outras fechaduras”.

Pedlington olhou para o cachorro, então concordou com a cabeça. "Irei então, se não

se importa, senhor. Não seria bom se vagabundos entrassem”.

Harry foi para o lado de dentro. O cachorro o seguiu e foi diretamente para uma

echarpe, e o que ele achava que seriam luvas, no chão de pedra. Harry franziu o cenho. Os

artigos pareciam muito bons para estarem largados no chão, mas a cadela se abaixou

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repentinamente, colocando as patas nos dois lados da pilha, então deitou seu focinho

possessivamente em cima deles. Ela não tinha nenhuma intenção de se mover.

"Muito bem”, Harry disse a ela. "Você cuida deste material e eu olharei os estábulos”.

O rabo dela bateu duas vezes no chão, mas ela não se moveu.

Harry olhou ao seu redor e exalou devagar. Era exatamente o que ele procurava; um

estábulo para pelo menos quarenta cavalos, e o prédio parecia tão sólido quanto uma

rocha—em condição melhor do que a casa, de fato. O chão de pedras estava limpo e bem

varrido, o ar dentro tinha cheiro de feno fresco e—Harry fungou—cavalo. Cavalo novo.

Um capote de oleado estava pendurado em um gancho e um chapéu. Harry franziu o

cenho. Parecia que—um som chamou sua atenção. O que diabos? Era um cavalo em

angústia. O som foi seguido por um murmúrio baixo.

Ele foi apressado pelo corredor central dos estábulos, verificando cada baia enquanto

passava. Vazias—todas menos a última. A porta mais baixa estava fechada, mas a parte

superior estava aberta. Ele examinou.

Uma égua estava deitada ao lado de um monte de feno espalhado no chão, tentando

dar a luz, os ossos de seus flancos estavam molhados de suor. Ela estava em angústia clara,

rolando de um lado para o outro. Não era um bom sinal. Uma mulher jovem estava

abaixada ao lado da égua, com uma proximidade perigosa de ser acertada pelos cascos.

Harry não podia ver seu rosto.

Ele encolheu os ombros e tirou seu casaco. "Quanto tempo faz que ela entrou em

trabalho de parto?".

"Quase quinze minutos desde que sua bolsa estourou”. A voz da mulher estava

horrível. Ela nem girou a cabeça. Ela despejou o que parecia ser óleo de uma garrafa

pequena na palma de sua mão.

"Isto é muito tempo”. Harry pendurou seu casaco em um gancho.

"Eu sei”. Ela arrolhou a garrafa e a colocou de lado. "O potro não está saindo direito”.

Harry podia perceber. O rabo da égua tinha sido envolto em um pano e sua entrada

expandida era visível. Ele podia ver a bolsa amniótica sobressaindo, e dentro dela, a forma

de uma única e minúscula pata.

Lá deveria haver dois pequenos cascos, seguidos por um nariz. "O potro precisa ser

girado no útero”, ele disse, rolando as mangas para cima.

Ela terminou de banhar a mão e o antebraço direito com o óleo. "Eu sei. Vou tentar

agora”.

"Eu ajudarei”. Harry abriu a porta do estábulo.

"Não! Não entre—você ira aborrecê-la!", a mulher girou um rosto urgente em direção

a ele.

Era ela. A mulher jovem da carroça. Ele tinha pegado apenas um vislumbre leve dela,

um borrão de pele pálida e olhos preocupados, mas ele estava certo.

"Fique para trás! Ela fica nervosa com os homens”.

Harry a ignorou. "Você quer levar um coice na cabeça? Você não pode ajudá-la

quando ela está neste estado”.

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Enquanto ele andava na baia, a cabeça da égua se moveu e seus olhos se reviraram,

mostrando o branco. As orelhas dela abaixaram, o lábio se contorceu e ela fez um

movimento agitado como se quisesse ficar de pé.

A mulher xingou e lançou a Harry um clarão brilhante como se dissesse, "Viu?".

Harry viu, mas não iria parar. Ela precisava de ajuda e ele sabia muito sobre éguas

nervosas.

Ela girou para acalmar a égua, usando as mãos e um fluxo baixo, melódico e rítmico

de palavras. Era hipnotizador, ele pensou. Qualquer criatura seria encantada. Ele se

moveu tranquilamente para mais perto e se juntou a ela.

"Silêncio agora, minha senhora”, ele sussurrou para a égua, "você não me conhece.

mas eu não vou machucar você. Você está com o humor ruim, e assustada, eu sei, mas nós

logo cuidaremos disto”. Ele tomou o cabresto da égua em sua mão, acariciando-a leve e

calmantemente com a voz e o toque.

Os olhos da égua chamejaram, mas depois de um pouco mais de revirar de olhos, ela

pareceu aceitar sua presença e se acalmou um pouco.

"Obrigada”, a mulher disse por sobre o ombro, e ainda naquele tom hipnotizador. "Eu

tenho que dizer que fiquei surpresa. Toffee normalmente fica muito nervosa ao redor dos

homens”.

Toffee sem dúvidas tinha uma boa razão, Harry pensou severamente, olhando as

cicatrizes lânguidas nos flancos magros da égua. Alguma hora alguém havia batido na

égua sem dó.

Mas tudo o que ele disse foi, "passei a minha vida inteira ao redor dos cavalos. Agora,

você quer que eu tente girar o potro?".

"Não, eu farei isto”, a mulher disse. "Deve ser mais fácil com uma mão pequena”.

Ela estava certa, e parecia saber o que estava fazendo, então Harry se posicionou de

modo a proteger a mulher de qualquer coice e disse, "quando você estiver pronta”.

Era espantoso. Nas últimas duas semanas ele não tinha sido capaz de tirá-la de sua

mente e agora, aqui estava ela, com menos de meio metro de distância dele. O que ela

estava fazendo em Firmin Court, sozinha em um estábulo deserto, ajudando uma égua a

dar a luz?

Ele a observou enquanto ela esperava a contração terminar, respirou fundo, então

furou a bolsa com seus dedos. O fluido esguichou pela sua mão enquanto ela tomava o

pequeno potro e o puxava firmemente com sua mão, deslizando primeiro a mão, e então

seu antebraço inteiro na entrada da égua.

"O potro está vivo?", ele perguntou.

Houve um silêncio, então, "sim”. Ela franziu o cenho e se curvou de lado. "Uma pata

está dobrado debaixo dele. Eu vou tentar—ahhh—", ela cessou bruscamente com uma

arfada quando outra contração passou pelo grande animal, sujeitando seu braço.

Harry estremeceu em condolência. Ele já experimentara isso. Era terrivelmente

doloroso. Ele esperava que uma mulher gritasse, mas ela não fez nenhum som.

Ela esperou até que a contração estivesse terminada, então moveu a mão e procurou

no escuro, puxando junto com a égua, enquanto lutava para girar a perna do potro. Era um

processo delicado. Forçar muito poderia ferir o potro ou a égua.

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Ela grunhiu, fez um som suave, então cuidadosamente começou a puxar de volta. Em

um movimento lento e estável ela puxou primeiro seu braço, então a mão de dentro da

égua. Ela abriu os dedos e Harry viu duas minúsculas e escuras canelas emergirem,

seguidas depois de um momento por um nariz.

"Você conseguiu!", Harry exalou.

Ela não deu nenhum sinal de que o tinha ouvido. Ela se virou sobre os pés, uma

segunda contração veio e o potro inteiro veio escorregando para fora em uma erupção suja

de fluidos.

A égua ergueu a cabeça e olhou fixamente para o embrulho molhado e escuro ainda

parcialmente dentro da bolsa. Ela o cheirou cuidadosamente, então começou a lamber seu

bebê limpo, limpando sua cabeça.

A mulher não se moveu, então Harry deslizou uma mão debaixo de seu cotovelo para

ajudá-la a se erguer. Ela começou com o toque dele e se ergueu sem ajuda com um

movimento rápido e gracioso. "Ela precisa ficar só com seu potro”, ela disse a ele e o

reconduziu ao estábulo.

Ela se apoiou na metade da porta da baia, enxugando as mãos em um pano. Ela não

tirou os olhos da égua e do potro.

Harry não tirava os olhos da mulher.

Ele podia vê-la corretamente agora que não estava envolta em chuva e tela. Ela era de

altura média, com o rosto magro, intenso. Sua pele, agora seca e na escuridão dos

estábulos, estava ainda mais pálida do que ao luar, suave e pura. Ele imaginara que o

cabelo dela seria mais claro quando seco, e era, cor de caramelo com algumas mechas cor

de ouro. Hoje ela o usava preso atrás na nuca em um laço e algumas mechas haviam

escapado.

Ela usava uma roupa de montaria marrom velha, bem feita e antiquada. De segunda

mão, ele decidiu: pano de boa qualidade, mas muito solto no peito e muito apertado na

cintura.

Ela girou abruptamente e afundou nas pedras do piso. "Oh Deus, oh Deus”. Ela

cruzou os braços, abraçando-se com as mãos que tremiam. "Eu não pensei que conseguiria

fazer. Pensei que ela iria—que ambos—", ela cessou bruscamente e deu várias respirações

profundas e dentadas. "Quando eu senti aquele potro do lado de dentro—", a cabeça

pendeu. "Graças a Deus”.

"Você nunca tinha feito isto antes?".

Algumas respirações mais profundas e depois ela olhou para cima. Ela agitou a

cabeça. "Não”. Uma lágrima deslizou por sua bochecha.

Harry queria saboreá-la. Em vez disso passou a ela seu lenço.

Ela saltou quando a mão dele tocou em seu braço, como se ela tivesse se esquecido

que ele estava lá. Ela olhou fixamente para o lenço. "Para quê isto?".

"Você está chorando”.

"Não, não estou”, ela disse depressa. E esfregou as bochechas com a mão. "Eu nunca

choro. Não serve para nada”.

Harry ergueu as sobrancelhas, mas antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, ela

ficou de pé novamente e se virou para olhar fixamente a égua.

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Ela era muito magra. E parecia até mais exausta do que a última vez em que a vira.

Ele sentiu um fluxo de raiva. Alguém deveria cuidar melhor dela.

Quem era ela? A filha do cavalariço? Do fazendeiro? Será que ela vivia perto?

Ele não podia acreditar na sorte de tê-la achando novamente. O Destino estava dando

a ele uma segunda chance. Harry não desperdiçaria uma segunda chance; elas raramente

vinham nesta vida. Mas ele não iria atropelar os limites, também. Ela estava tensa; ele

podia ler isto em cada parte de seu corpo.

"Eu me lembro de nascimento da Toffee”, ela disse depois de um tempo.

"Ela é um bonito animal. Sua herança árabe é visível. Minha suposição é de que ela

tem movimentos graciosos”.

Ela deu a ele um olhar pensativo. "Sim, e ela é rápida, também”.

De perto, ele podia ver as minúsculas manchas cor de ouro nos largos olhos de xerez.

Sob o olhar dele eles se tornavam cautelosos e tímidos. Ela se voltou para a baia. "Eu

suponho que é por isso que ela ainda está aqui. Ela é impossível de se agarrar”.

"Você parece ter conseguido”. Harry sentia um desejo de tocar seus dedos naquelas

mechas em sua nuca, e acariciar a pele tenra embaixo.

"Sim, mas ela confia em mim”.

"Eu não fico surpreso. Ela é sua?".

"Não, não, ela não é”. Ela abriu a boca como que para dizer qualquer outra coisa, mas

fechou-a novamente.

Harry disse, "pela aparência do pelo dela, não tem recebido muita atenção nos

últimos meses”.

"Não”.

"Tratamento incomum para um animal valioso com um potro”.

"Realmente”.

"De acordo com o resto da propriedade”, Harry disse. "O lugar inteiro foi

negligenciado por anos. Apenas os estábulos estão adequados para serem usados”.

Ela suspirou. "Eu sei”.

Ele balançou a cabeça e olhou para ela. "Não é de falar muito, não é?".

Ela encolheu os ombros.

A boca de Harry se moveu de forma peculiar. E as pessoas o chamavam de toco. Ele

pegou uma brisa lânguida do odor dela, então cheirou novamente, tentando entendê-lo.

Sabão de lixívia? Não era como uma mulher jovem normalmente cheiraria. Ela tinha usado

para o nascimento do potro, ele supunha.

Eles ficaram de pé, lado a lado, na porta da baia e assistiram a égua lavar seu potro,

livrando-o da bolsa amniótica e do fluido, aprendendo sobre ele através dos longos

movimentos de sua língua. Era uma visão que Harry nunca se cansava.

Ele deu uma olhada para o perfil da mulher e viu outra lágrima deslizar por sua

bochecha enquanto ela assistia a primeira ligação preciosa da mãe com o bebê. Sua boca

suave e vulnerável tremia. Ela mordeu o lábio e secou as lágrimas quase furiosamente.

"Eu nunca choro. Não serve para nada”.

"Você vive por aqui?", ele perguntou tranquilamente.

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Ela ficou muda por um momento, então disse, "antigamente eles pensavam que os

animais realmente lambiam seus filhotes até eles adquirirem forma”.

Harry notou a evasão. Era justo. Ela não sabia nada sobre ele, mas isso podia ser

retificado.

"Sou Harry Morant, a propósito”. Ele ofereceu a mão.

Ela hesitou, então a agitou. "Nell, eu sou—apenas Nell”.

"Como vai você, Apenas Nell”, ele disse. O aperto da mão era firme. A pele era suave

o suficiente mas havia calos antigos; em alguma hora ela se acostumara a trabalho duro.

Ela não usava nenhum anel. Suas roupas eram práticas e antiquadas, o pano de boa

qualidade e os artigos de vestuário bem feitos.

Ela tinha falado muito pouco, mas ele pôde perceber que seu sotaque não era preso a

qualquer variação regional.

Então quem era ela?

Ela hesitou, então disse, "suponho que você veio por causa de seu chapéu e luvas”.

"Não, eu—"

A porta do estábulo rangeu e se abriu um pouco mais. "Sr. Morant”, Pedlington

chamou. Sua voz ecoou. "É aquele anim—oh, aí está. Devo esperar por você aqui fora”.

Harry sorriu amplamente. "Ele está com medo do seu cachorro”, ele disse a Nell.

"Ela não machucaria ninguém”.

"Eu sei. Vamos, tirar Pedlington de sua miséria”.

"Oh, mas—"

"Toffee não precisa de você agora. Ela precisa estar só com seu potro”. Harry tomou o

braço dela e depois de um breve vacilo, Nell permitiu que ele a escoltasse através dos

estábulos, em direção à porta.

Depois de uma dúzia de passos ela deu a ele um olhar enviesado. "Sua perna dói?".

Era um bom jeito de perguntar sobre seu andar manco. Todo mundo o fazia, mais

cedo ou mais tarde.

Harry se surpreendeu com sua resposta. "Não, tem sido assim desde que eu consigo

me lembrar”. Ele normalmente implicava dizer que tinha sido um ferimento de guerra. As

pessoas ficavam mais confortáveis com a ideia de um soldado corajosamente ferido do que

a verdade: que ele era um aleijado vitalício.

Quando eles chegaram à entrada, o cachorro dela saltou adiante. "Boa menina,

Freckles”. Nell pegou a echarpe e as luvas e as espanou, dizendo, "ela sempre me segue, a

menos que eu a dê algo a ela para guardar, e eu não a queria próxima a Toffee enquanto

ela estava em trabalho de parto”. Ela tirou o casaco e o chapéu do gancho e devolveu o

chapéu e as luvas dele. "Obrigada pelo empréstimo. Elas me aqueceram mais do que você

imagina”.

Harry pegou-as desconfortavelmente. Ele não sabia o que dizer. Uma parte dele

queria dizer a ela que ficasse com eles, e isso era estúpido. Ela não tinha nenhuma

necessidade deles agora, e eles eram muito grandes, de qualquer maneira.

Ela pegou uma tira fina de couro e a colocou ao redor do pescoço da cadela, então

andou até a porta do estábulo sob a luz brilhante.

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"Tudo está seguramente trancado—", Pedlington parou como uma estátua, olhando

fixamente para a mulher.

"Essa é—", Harry começou.

"Lady Helen Freymore, eu sei”, o agente disse, soando nada contente com isto.

Lady Helen Freymore? Harry piscou. Freymore era a sobrenome do Conde de Denton.

Ele tinha visto em todos os documentos da propriedade. Ele olhou fixamente para ela.

"Apenas Nell", era Lady Helen Freymore?

A mulher que viajara na chuva com os pés barrentos oscilando para fora de uma

carroça grosseira, a mulher que habilmente ajudara uma égua a fazer um nascimento

difícil era a filha de um conde? Deveria haver algum erro.

"Lady Helen, você sabe que não deveria estar aqui”, Pedlington disse com voz que

expressava ao mesmo tempo piedade e exasperação. "Eu já te expliquei tudo antes”. Ele

deu um olhar envergonhado para Harry, então continuou em tom baixo, "você não pode

ficar aqui. A casa ficou vazia por meses, e minhas instruções são de vendê-la vazia”. Ele

deu ênfase à palavra "vazia”.

"Entendo, Sr. Pedlington”, ela disse calmamente. "E já fiz outros arranjos, mas a égua

estava em angústia”.

"Égua?".

"Sim, ela é muito velha para parir novamente, e aconteceu que o potro estava saindo

na posição errada. Ambos teriam morrido se eu não estivesse aqui para girar o potro no

útero”.

"Lady Helen, por favor!", o agente a repreendeu, ficando roxo com embaraço. "Você

não deveria saber dessas coisas”.

Ela deu a ele um olhar pensativo. "Sim, mas eu sei. E nunca entendi por que as

mulheres deviam ser mantidas ignorantes desse processo isto, afinal, elas—"

"Lady Helen!", o agente deu a Harry um olhar mortificado.

Ela suspirou, mas lutou contra a sensibilidade dilacerada do homem. "A égua

costumava ser minha, então seu bem-estar importa para mim”.

"Bem, ela não é mais sua”, o agente disse com exasperação e acrescentou, "estava

certo de que você tinha algum lugar para ir, Lady Helen”.

"Eu tenho, claro”, ela disse com dignidade. "Eu iria sair esta manhã, de fato, mas—"

"Então, por favor, faça isso. Os animais não são da sua conta. Eles serão vendidos

para quem os quiser”.

O rosto pálido dela de repente ficou tomado de cor. "Você não deve movê-la! Ela

acabou de dar a luz, e o tempo está ficando pior a cada dia. O potro deveria—"

"Eles não são da minha cont—"

"Eu comprarei os dois”, Harry interrompeu.

Os dois giraram o olhar para ele. "Você?", ela disse.

Ele anuiu com a cabeça. "E cuidarei bem deles. Dou a minha palavra”. Ele ofereceu a

mão.

Ela a tomou. O aperto de mão era firme para uma dama. Ele podia sentir o cheiro do

sabão, de cavalo, do feno fresco, de mulher morna e doce. Com um puxão ele poderia

puxá-la em seus braços, saborear aqueles lábios suaves…

Page 23: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

O que ele estava fazendo? Harry brigou com seu corpo ávido. Ele nem a conhecia.

Mas ele com certeza a queria, lady ou não.

"Obrigada”. Ela sorriu para ele, aquele sorriso tão penetrante e radiante que o tinha

deslumbrado na floresta.

E o corpo dele enrijeceu.

E sua mente girou.

E nem uma única palavra permaneceu em sua cabeça.

"Sr. Morant, eu não posso ser responsável por qualquer animal deixado aqui”, a voz

de Pedlington atravessou seu devaneio. "Eles devem ser removido deste local. Sr. Morant?

Lady Helen? Eu realmente devo insistir”.

O homem soava distintamente irritado. Harry queria esmagá-lo como a um mosquito.

"E Lady Helen, devo também insistir que você deixe Firmin Court como já a informei

há mais de uma semana que ela não mais pertence a sua família, e você tem

descaradamente desconsiderado as minhas instruções. Irei longe o suficiente para dizer

que, tecnicamente, você está transgredindo—"

Ela arrancou a mão do aperto de Harry e se virou para o agente. "Como ousa dizer

isso! A família da minha mãe possuiu Firmin Court por centenas de anos e eu tenho um

dever com a propriedade"—ela fez um gesto depreciativo—"documentos de advogados

não dizem nada para mim. Mas a minha bolsa está empacotada e meus acordos de viagem

feitos, e agora que a minha égua está cuidada, com certeza, irei antes de o dia acabar”.

"Você já disse isto antes”, o agente disse emburrado. "E ainda—"

"E você está preocupado que eu ronde o local como um cachorro vira-lata para

embaraçar os novos donos”, ela relampejou furiosamente. "Você não precisa—"

"Quanta asneira”, Harry interrompeu barbaramente. Ele se virou para o agente. "Diga

mais alguma palavra desrespeitosa a Lady Helen e eu empurrarei suas palavras garganta

abaixo e você não falará por um ano”.

Os olhos de Pedlington se arregalaram, mas ele manteve a boca fechada.

Harry se voltou para Nell, que o observava com os olhos largos e surpresos. "Eu me

desculpo por Pedlington, Lady Helen. Eu sou o novo dono e você é bem-vinda para ficar

enquanto quiser”. Para sempre, se quiser, ele se pegou acrescentando silenciosamente. De

onde diabos isso tinha vindo?

Ela olhava fixamente para ele e umedeceu os lábios. Harry engoliu em seco.

O agente fez um som estrangulado em sua garganta e disse com esperança cautelosa.

"O novo dono—você quer dizer—?"

Harry disse severamente, "quero dizer que estou preparado para fazer uma oferta a

você, entretanto, duvido que encantará aos seus superiores. Porém, com o estado deste

lugar…", ele deu de os ombros.

"Oh, mas—"

"Cavalheiros, devo deixá-los a sós com seus negócios”, Lady Helen interrompeu. "Sr.

Morant, Sr. Pedlington, bom dia para vocês dois”.

Harry a pegou pelo braço. "Você não vai partir”. Ele estava cheio de uma necessidade

urgente de não deixá-la desaparecer.

Page 24: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela deu uma olhada para a mão dele que a segurava com força e deu a ele um olhar

perplexo. "Não”, ela disse depois de um momento. "Eu voltarei para ter certeza de que ela

está bem depois do parto e para ver se o potro pode caminhar e beber o leite de sua mãe

pela primeira vez”.

Pedlington corou.

Harry forçou seus dedos a se soltarem ao redor do braço dela. "Não parta”, ele a

instruiu.

Ela deu a ele um olhar frio, e ele percebeu que tinha rosnado uma ordem para ela no

mesmo tom que usava com os homens no exército. E ele tinha passado dos limites ao falar

com Pedlington sobre desrespeito.

Ele disse desconfortavelmente, "nós temos o assunto do chapéu e das luvas para

discutir”. Foi tudo o que ele pôde pensar.

O rosto dela se suavizou e um sorriso lânguido iluminou seus olhos. "Sim, claro.

Assuntos complicados”.

O corpo dele doeu enquanto ela partia. Ela se movia graciosamente, sem pressa. Sua

aparência não estava na moda, mas o corpo dele estava duro e dolorido pelo desejo

intenso que sentia por ela como nunca experimentara antes.

Na floresta ele a tinha imaginado como uma Madona—uma Madona perdida da

floresta. Ma Donna, a forma em italiano para minha dama. Nell Freymore. Lady Helen

Freymore. Sua dama perdida da floresta.

E desta vez ele não iria deixá-la ir.

Ainda que ela fosse uma lady de nascimento.

Harry tinha sido cortejado e lisonjeado por algumas das damas mais bonitas da elite.

Ele tinha aprendido muito bem e as suas próprias custas o que as senhoras elegante

queriam de Harry Morant: uma noite vigorosa, e isso era tudo.

O jovem Harry Morant não tinha entendido que… não tinha percebido que era bem-

vindo entre as coxas de uma dama nobre, mas que a mão dela nunca poderia ser sua…

Ele aprendera a lição na tenra idade de vinte e três, jovem, ingênuo e loucamente

apaixonado pela primeira vez na vida.

Harry não tinha sido ingênuo por anos. E ele sabia exatamente o que esperar de

damas nobres.

Na porta da cozinha ela parou e girou para olhar para trás.

Ele sentiu uma punhalada afiada de desejo. Ela não era nenhuma beleza, nem tinha o

corpo voluptuoso, e certamente não usava nenhuma arte para atrair. Mas ele não podia

tirar os olhos dela. E seu corpo se enrijecia possessivamente sempre que ela se aproximava.

Uma ordenhadeira ou filha de um fazendeiro, ele não se importava.

Mas ela era a filha de um conde. Isso sim era uma ironia inesperada.

Capítulo III.

Nell encheu um jarro grande com água e o levou cuidadosamente para cima. Ela o

deixou na mesa auxiliar e tirou uma chave do bolso. Até em sua própria casa com todas as

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portas do exterior firmemente trancadas, ainda assim, ela precisava de sua própria porta

trancada. Ela girou a chave e entrou em seu quarto no que seria, provavelmente, a última

vez.

A última vez.

Ela se jogou na cama com a realização. Não havia nenhuma razão para ela ficar por

mais um momento. Ela tinha que deixar Firmin Court. A única casa que já conhecera.

Ela sonhava em trazer Torie de volta para cá…

Torie… Ela não podia pensar sobre ela ainda.

Ela olhou ao redor de sua alcova, o lugar em que tinha sonhado seus sonhos de moça;

o quarto onde seus sonhos de garota tiveram um fim abrupto.

Ela esperava passar a vida aqui. Era a segurança dela saber que a escritura estava em

seu nome e que, mesmo na febre do jogo, o pai não poderia tocá-la.

Como ela estivera errada. Ele provavelmente tivera a intenção de transferir a casa

para ela—ele sempre tentava fazer o melhor, pobre papai, mas de alguma maneira ele

nunca conseguia fazer o certo.

Mentiras, sempre mentiras. Embora ele a amasse afetuosamente—ela não tinha

nenhuma dúvida—ele ainda assim mentia até sobre as coisas mais importantes, sempre

sentindo que tinha que protegê-la da realidade, sempre desejando contra toda a lógica que

de alguma maneira, ele pudesse ajeitar as coisas, tirar um coelho da cartola e fazer tudo

dar certo—não, melhor do que certo. Papai sempre desejava deixar tudo maravilhoso.

Só que ele nunca podia, e ele apenas piorava, até que finalmente aqui estava ela, sem

dinheiro e sem uma casa.

E com Torie perdida em algum lugar…

Ela estaria em Londres logo, ela se lembrava. O vigário tinha mostrado a ela um

anúncio no jornal e ela tinha solicitado a posição e conseguido. Fazer companhia a uma

dama viúva que desejava fazer sua primeira visita a Londres.

No meio de seu desespero, parecera um sinal.

Ela vivamente tirou suas roupas. Não havia nada como água fria e um bom esfregão

com sabão e flanela para tirar o sangue. Ela se lavou tão completamente quanto podia—ela

não tinha tempo para aquecer a água para um banho—e girou para escolher alguma roupa

adequada para vestir como uma dama de companhia.

Desde seu debute cinco anos antes, ela sempre preferia roupas de cores escuras e sem

graça. Ela não gostava de chamar atenção. Ela escolheu um vestido verde musgo, com

cintura alta de lã com uma peliça4 verde e cinza e botões de peltre5.

Como era surpreendente o homem com os olhos cinza ardentes estar aqui. E que ele

comprasse a casa. E sua égua. Os dois estariam em boas mãos, ela estava certa.

Ela colocou o reto de suas roupas e deu uma olhada na estante que tinha sua coleção

de bonecas desde que podia se lembrar. Havia uma dúzia de bonecas, pelo menos, a

maioria era de lindas bonecas em perfeitas condições. Sempre que o pai dela ganhava nos

4 Peça de vestuário forrada ou guarnecida de peles finas e macias.

5 Peltre - liga metálica maleável, tem normalmente entre 85% e 99% de lata, o resto é composto por cobre, antimônio e

chumbo.

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baralhos, trazia uma boneca de Londres. Elas estavam em fila, parecendo perfeitas,

sorrindo, limpas e angelicais. No fim uma boneca estava caída torta; Ella, a mais velha, a

mais danificada, a mais amada das bonecas de Nell.

A mãe dela tinha feito Ella com as próprias mãos. Ella era um diminutivo para

Cinderela e era uma boneca triste-feliz. Se Ella fosse segurada de uma maneira, estava

vestida com uma roupa rota, cinza e com um avental inaceitável, e seu rosto estava triste.

Mas se você a girasse de ponta a cabeça, seu vestido roto caía e seu rosto mudava e ela

estava lá, feliz e sorridente, usando um vestido de baile bonito, de um vermelho brilhante.

Nell nunca tinha brincado muito com bonecas—ela sempre tinha preferido cachorros

e cavalos—mas quando sua mãe morrera, ela levava Ella para a cama com ela. Ella não era

apenas feita pelas mãos da mãe, as roupas eram feitas com restos de roupas da própria

mãe dela. Nell se lembrava de ter visto a mãe naquele bonito vestido de baile vermelho.

Pobre Ella, parecia muito mal agora, com um olho de botão faltando, metade do

cabelo tinha sido mastigado por um cachorro filhote, e o vestido vermelho estava bastante

enfraquecido. Não havia lugar na mala de viagem, mas Nell não poderia deixar Ella para

trás, para ser jogada em um monte de lixo.

Nell hesitou, então tirou um par de chinelos que a apertavam e colocou Ella em seu

lugar. Era ridículo para uma mulher crescida querer ficar com uma boneca, mas ela não

conseguia evitar. Desfazer-se de Ella era como se desfazer de sua própria mãe.

Se alguma vez ela precisasse da boneca feliz-triste de sua mãe, era agora.

Ela fechou a mala, deu uma última olhada em seu quarto, ergueu sua bolsa e partiu.

Ela não foi imediatamente para o andar de baixo, mas para o escritório da propriedade. Ela

escreveu uma lista de nomes em uma folha de papel e o dobrou e colocou em sua manga,

então ergueu sua mala de viagem e se dirigiu para o andar de baixo.

As vozes soavam bravas vindas da cozinha; a voz normalmente seca e precisa do

agente agora soava mal-humorada e quase estridente, obscurecida por uma voz alta,

brusca e vulgar que Nell conhecia e amara sua vida inteira.

Se aquele agente estava sendo repugnante com Aggie novamente… Nell se apressou

em direção à cozinha.

"Não, Sr. Calças Meticulosas, eu não vou tirar meu—", Aggie estava dizendo com a

voz agressiva.

"Você está transgredindo madame, e—"

"Você não me chame de madame, sua pequena lombriga! Transgredindo?", Aggie

ruidosamente bufou. "Com quem você pensa que está falando? Eu sou Aggie Deane e vivo

aqui há mais anos do que você teve jantares quentes! E enquanto a Senhorita Nell estiver

aqui, eu estarei aqui. Não é direito a filha de um conde ficar sozinha”.

"Ela não devia estar aqui, também. Você duas estão transgre—"

Aggie fez um barulho alto, muito rude. "Oh, morda a língua, seu vagabundo. Estou

aqui para fazer a janta da Senhorita Nell e você pode ficar ditando regras até ficar com a

cara azul, mas eu não vou me mover”.

Nell tinha parado do lado de fora da porta da cozinha e escutava, um sorriso nos

lábios. Ela deveria saber que nenhum advogado de Londres levaria vantagem sobre Aggie.

"Madame, eu posso te prend—"

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"Pedlington”, uma voz funda e masculina atravessou a disputa. "Sem mais palavras.

Vá para White Hart e prepare os documentos de uma vez. Eu te encontrarei hoje à noite

para assiná-los e te dar a ordem de pagamento do meu banco”.

"Mas esta mulher velha—"

"Eu vou te mostrar que é 'mulher velha'!", Aggie respondeu bruscamente. "Se alguém

aqui é uma mulher velha, é você, agindo assim—"

"Já é o suficiente, Sra. Deane. Eu disse imediatamente, Pedlington”. A voz do Sr.

Morant era suave, mas tinha o efeito de uma estalada de chicote.

Houve um silêncio súbito, então Pedlington disse com a voz mal-humorada, "Muito

bem, senhor, mas eu não me responsabili—"

"Vá!".

Nell escutou a porta da cozinha se abrir e fechar.

"Muito bem, senhor”, Aggie disse aprovativamente. "Eu vim preparada com a ideia

de repugná-lo por tomar a casa da Senhorita Nell dela, mas qualquer um que possa se

livrar daquela lombriga, aquele pequeno tagarela fanfarrão com tão pouco rebuliço—bem,

senhor, tenho que dizer—"

"Isso é a chaleira fervendo?", o Sr. Morant cortou a fala dela quando Nell entrou no

cômodo.

"Céus, sim, e aqui está a senhorita Nell, e eu sem o chá”. Aggie saiu como um furacão

para o fogão.

Os olhos do Sr. Morant deslizaram sobre ela. "Verde combina com você”, ele disse e

Nell que de repente ficou tímida. Ela resistiu ao desejo de alisar as saias e verificar seu

cabelo. Ela era quase sempre invisível para os homens; sua primeira e única temporada

havia sido um desastre. Metade do tempo ela não conseguiu uma dança, a menos que um

dos amigos de seu pai ficasse com pena dela.

E ainda assim este homem—sem dúvida o homem mais atraente que ela já tinha visto

na vida—parecia dar a ela sua total atenção. E disse que verde ficava bem nela.

Ela tragou. Se apenas ela o tivesse encontrado quando tinha feito seu debute…

quando a vida era tão mais simples…

Era muito tarde agora.

"Eu verifiquei a égua e ambos estão esplêndidos. Já lidei com tudo”, ele disse a ela.

Ele notou a surpresa dela e disse com um torcer da boca, "bem, ela é minha agora, lembre-

se”.

Sim, Nell pensou, mas ela não teria esperado que ele lidasse com um trabalho sujo

quando ela disse que o faria. Era um gesto… galante.

Aggie tinha colocada na mesa da cozinha um pano e talheres. Sr. Morant puxou uma

cadeira para Nell se acomodar. Ele deve ter se perguntado o porquê dela se sentar à mesa

da cozinha, em vez de fazer Aggie ir até a sala de jantar.

Como uma criança, Nell amava o calor da cozinha. E nos últimos anos, quanto mais

cômodos na casa eram fechados e Nell ficava com menos dinheiro, mais ela se via ficando

por lá cada. Recentemente, era a única escolha prática.

"Você vai querer um lugar para o almoço, também, senhor?", Aggie perguntou. "Não

é nada demais — apenas sopa, torrada e um pouco de doce a seguir”.

Page 28: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Sr. Morant hesitou.

"Há muito”, Aggie o assegurou.

"Por favor, coma”, Nell disse a ele. "Aggie trouxe comida suficiente para várias

pessoas e já que vou partir em uma hora…", ela se sentiu muito doente com a situação e

não estava nem um pouquinho faminta, mas Aggie se irritaria se Nell não comesse.

"Uma hora?", Aggie exclamou em desânimo.

Nell anuiu com a cabeça. "Você sabia que chegaria, Aggie”.

"Eu sei, querida, mas tão rápido…", com um suspiro, Aggie trouxe um pano e

rapidamente colocou um lugar oposto ao dela para o Sr. Morant. "Agora se sente, senhor, e

eu trarei a sopa”.

Sr. Morant se sentou e Nell imediatamente desejou que Aggie não o tivesse colocado

do lado oposto ao dela. Aqueles olhos intensos, cinzas e sombrios queimavam-na como

um toque físico.

"Aonde você vai?", ele perguntou.

Ela endireitou os talheres e evitou o olhar dele. "Para Londres. Você se lembrará de

dar a Toffee uma boa e quente mistura todas as manhãs, não é? A condição dela está

bastante ruim e—"

"A égua e potro serão bem cuidados. O que você vai fazer em Londres?".

Não é da sua conta. Só porque ele tinha comprado a casa, não significava que ela

tivesse que dizer qualquer coisa a ele. Ela já tinha recebido piedade suficiente das pessoas

ao seu redor. "Farelo de trigo triturado com linhaça fervida—"

"Eu sei como se faz uma mistura”, ele disse quando Aggie colocou as tigelas de sopa

na frente de cada um delas. "Eu sou um cavaleiro. E comprei este lugar por causa dos

estábulos. Ela terá o melhor cuidado. Então"—ele ficou o olhar nela—"eu presumo que

você esteja indo à casa de parentes”.

"Não”, Nell disse e se voltou para sua sopa com grande concentração. A princípio foi

difícil engolir com ele a observando, entretanto o olhar dele desceu e ela pegou depressa

com a colher o líquido espesso e saboroso. Devia estar delicioso, ela estava certa, mas ela

não sentia gosto de nada.

Ele se sentou lá, parecendo grande, sombrio e bonito, seus olhos cheios de perguntas.

Dois poderiam jogar esse jogo. "Então, Sr. Morant, quais são seus planos para Firmin

Court?".

Ele deu seu sorriso lento, reconhecendo que ela estava tentando distraí-lo. Nell tragou

e esperou que não estivesse corando. Ele provavelmente sorria para todas as mulheres que

encontrava. Deveria haver uma trilha de corações daqui até Londres, ela não tinha

nenhuma dúvida.

"Eu vou criar cavalos”, ele disse a ela. "Animais de sangue puro. Cavalos de corrida”.

Nell ficou muda por um momento, sua garganta coçava com invejava. Criar animais

de sangue puro tinha sido—até recentemente—o próprio sonho dela. Trazer de volta a

Firmin Court a glória que uma vez tivera. "A família da minha mãe—essa era sua casa de

infância, sabe—costumava criar cavalos, também. Firmin Court costumava ser famosa por

seus cavalos”.

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Ele anuiu com a cabeça. "Eu sei. E ouvi sobre isso quando estava em Bath

recentemente. É por isso que vim aqui em primeiro lugar. Eu percebi à primeira vista que

aqui é perfeito para o que eu quero”.

Ela anuiu com a cabeça e tentou ficar contente porque a propriedade seria cuidada a

partir de agora, não ficaria mais largada. "Você está no negócio de criação de cavalos há

muito tempo?", ela perguntou.

Ele tragou um bocado de sopa e disse, "não, eu fiquei em guerra na maior parte dos

últimos oito anos. Mas meu companheiro e eu estamos planejando isso há anos”. Ele fez

uma careta auto-depreciativa e acrescentou, "Soldados estão sempre cheios de planos para

depois, mas desta vez, o legado de minha tia-avó ajudou a transformar o sonho em

realidade”.

Ele terminou a sopa e fez uma tentativa indiferente de recusar um segundo prato. "A

sopa está excelente”, ele disse a Aggie, fazendo-a gaguejar com uma negação insincera

enquanto colocava uma porção adicional.

Ele poderia ser quieto, mas tinha mais charme do que qualquer homem deveria ter.

Nell perguntou mais a ele sobre seus planos, e enquanto ele explicava sobre sua

ambição em criar e vender animais puro sangue para corrida, ele comeu várias fatias

grossas de torrada, mastigando-as com dentes brancos e iguais. Aggie, que adorava

alimentar qualquer homem, e não podia resistir aos grandes e bonitos, manteve as torradas

grossas e quentes e até acrescentou o pote de sua melhor geleia de ameixa roxa.

Ele deu à mulher idosa um sorriso juvenil inclinado para o lado, como um obrigado e

Nell acrescentou Aggie a sua lista de conquistas. A mulher de idade avançada ergueu a

cabeça com encanto enquanto ele se enchia de geleia. Parecia que ele tinha queda por

doces. E ele era meio que impossivelmente bonito.

Nell terminou sua comida tão depressa quanto podia, comeu meia fatia de torrada e

então se levantou.

"Eu irei apenas checar—"

"Sente-se que eu colocarei seu chá”, Aggie disse a ela.

"Oh, mas—"

"Você não vai deixar esta casa sem uma boa xícara de chá e ponto final”, Aggie

declarou. "E eu fiz tortinhas de geleia esta manhã e você comerá uma, minha lady, ou eu

gostaria de saber a razão para se negar”. Ela colocou um prato com tortas pequenas na

frente de Nell muito como se tivesse anunciado um desafio.

Reconhecendo pelo "minha lady" que a sua antiga babá estava seriamente aflita por

sua partida iminente, Nell obedientemente se sentou e começou a mordiscar uma torta.

Aggie fungou e despejou o chá.

Sr. Morant devorou uma tortinha, então deu a Nell um olhar cheio de expectativa.

"Agora, sobre seu futuro—"

"Eu vou para Londres”, ela disse a ele antes que ele pudesse perguntar novamente.

Ela colocou a mão no bolso, retirou um papel e entregou a ele. "Esta lista poderá ajudá-lo a

iniciar. São todos altamente recomendados”.

Page 30: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela bebeu o chá em três goles grandes e ficou de pé. "Eu apenas verificarei Toffee e

seu potro se você não se importar”, ela disse. Levando uma chaleira emitindo fumaça junto

com ela, deixou o edifício.

Harry assistiu-a ir, franzindo o cenho. Ela parecia muito frágil.

"Ela ‘trôxe’ aquela égua ao mundo, fez sim”, Aggie disse a Harry. "A mãe dela tinha

morrido, sabe, e era muito fraca. A senhorita Nell cuidou dela ‘comusi’ fosse um humano.

O senhor quis matar a potranca, mas ela lutou por ela e ganhou. Era tão moça, oito, ou por

aí, mas se ergueu orgulhosamente até ele ceder. Criou-a ela mesma e a treinou também—o

talento corre no sangue—a mãe dela era igual. Toda aquela família era louca por cavalos.

A senhorita Nell quase ficou com o coração partido quando o pai dela vendeu-a por uma

grande soma para que ela corresse por outras pessoas”.

Ela agitou a cabeça enquanto enxugava a mesa. "Os novos donos a trataram

cruelmente, quase mataram o pobre animal. Então a Senhorita Nell juntou dinheiro para

comprá-la de volta—ela já tinha parado de ganhar na época, estava cheia de problema nos

nervos, pobrezinha”. Ela enxaguou o pano de prato e suspirou. "Vai partir o coração dela

ter que dar adeus àquele cavalo novamente, se vai”.

"O que a sua ama vai fazer?".

A boca de Aggie se apertou. "Não posso dizer, senhor”.

Harry franziu o cenho. "Você vai acompanhá-la?".

"Não, ela achou um lugar para mim como empregada do vigário, então eu ficarei

bem”, a mulher idosa disse com ênfase. "Bem, o pobre homem está precisando. Está

ficando velho, sim, e esquecido. E ele vai ficar com o cachorro dela, também. Ela sentirá

muita falta de sua Freckles, com certeza, pobre moça, mas ela não poderá levar um

cachorro, não aonde está indo”.

Então ela estava indo só. Harry não gostava nada disso. A vista de Nell sentada

encharcada naquela carroça o assombrava. "Ela não tem nenhum parente?".

Aggie bufou. "Os primos irlandeses? Não eles! De qualquer maneira, se ela for correr

para seus parentes—", ela cessou bruscamente cheia de culpa. "Olhe para mim, falando

besteiras. Vou sair e arrumar o resto das minhas coisas”.

Harry anuiu com a cabeça distraidamente. Ele estava lendo a lista que ela dera a ele.

Uma lista de nomes.

"Sra. Deane”, ele disse a Aggie. "Talvez a senhora possa me esclarecer sobre o

significado disto. Seu nome está aqui, também”.

Ele mostrou a Aggie o papel. Ela olhou com olhos semicerrados vagamente.

"Desculpe, senhor, nunca fui muito boa com a leitura”.

Ele começou a ler para ela.

"É tão injusto”, Aggie disparou antes que ele estivesse na metade. "Quase se matou de

trabalhar, ela fez sim, mantendo este lugar enquanto seu pai estava ocupado se arrastando

na sarjeta. A senhorita Nell se matou, acabando cada centavo que tinha para ter certeza de

que ninguém na propriedade passaria fome. Quase ficou abatida até a morte, ficou sim,

quando voltou e descobriu que tudo o que ela tinha feito não servira para nada e que o pai

dela tinha jogado tudo fora”.

Ele ergueu o papel. "E esta lista?".

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"Todo mundo que trabalhou aqui no ano passado, senhor, e aqueles que ficaram aqui

depois que o dinheiro tinha acabado senhor, que ficaram pela Senhorita Nell. Depois dela

ter sido levada pelo pai na última páscoa, todos foram desligados sem um centavo ou uma

promessa. Ela não sabia até a semana passada”. Aggie enxugou os olhos com seu avental.

"Eu ‘num’ sei aonde ela foi. Voltou apenas um caco do que era antigamente, sim, ela

voltou, e com olhos tão tristes”.

"Então estas pessoas precisam de trabalho?".

Aggie olhou para cima, o brilho nos olhos mostrando esperança. "Com você, senhor?

Eles iriam. Oh, senhor, e se você disser a Senhorita Nell, tiraria um peso de suas costas, iria

sim. Preocupa-se com todo mundo, aquela menina”.

Harry anuiu com a cabeça e colocou o papel no bolso. "Eu voltarei em uma semana,

seguindo os planos, e eu falarei com estas pessoas então. Estimo a lealdade. Ninguém que

tenha trabalhado para a Senhorita N—Lady Helen vai temer esse inverno que está vindo”.

O último inverno, ele sabia, tinha sido excepcionalmente duro.

"Oh senhor”, Aggie disse, a voz rachando. "Eu tiro todas as coisas ruins que pensei

sobre você”.

Harry dirigiu-se aos estábulos. Ele achou Nell de pé na baia ao lado da meia-porta,

assistindo a cena com uma expressão sonhadora e estranhamente saudosa em seu rosto.

Ele perscrutou acima de seu ombro. O potro estava de pé sugando o leite de sua mãe.

Tudo o que ele podia ver eram quatro longas e abertas pernas delgadas, uma anca escura

pequena, e um rabo balançando excitadamente. Harry sorriu. Ele nunca se cansava dessa

visão. E era um bom presságio—o primeiro potro nascido em seus estábulos.

"Ele parece um rapazinho forte”, ele comentou.

"Sim, ele é adorável”.

"Aquele papel que você me deu com a lista de nomes, eu ficarei com a maior parte

deles. Aggie me disse que todos eles são trabalhadores leais”.

Houve um longo silêncio, então ela disse, "obrigada”, com a voz sufocada. Lágrimas

reluziam em suas pestanas. Ela se virou de forma que ele não pudesse vê-la, dizendo, "me

envergonha que eles tenham sido tão mal-utilizados. Um dia espero poder pagar a eles tudo

o que eles merecem, mas enquanto isso… Obrigada”.

Ele pegou um vislumbre da ira e da humilhação absolutas que ela sentia pelo modo

descuidado e esbanjador do pai.

Ela retirou um lenço, soprou o nariz ferozmente, e começou a fazer uma mistura

quente para a égua. Harry assistiu. Ela sabia lidar com cavalos; ele não poderia ter feito

uma mistura melhor.

"O que você irá fazer?", ele perguntou a ela depois de alguns momentos.

"Eu?", ela repetiu. "Estou indo para Londres”.

Ele não disse nada e não moveu seu olhar. Sempre surtia efeito e desta vez não foi

exceção.

"Se você deseja saber, achei algo, um trabalho—um muito bom”.

"Qual?".

"Como dama de companhia de uma senhora viúva. E não há necessidade de olhar

assim para mim”, ela acrescentou com a voz incisiva. "É o que as damas que caem de

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posição fazem. Eu provavelmente passarei meu tempo lendo para ela, tomando chá com

ela, e visitando alguns locais em Londres—será na maior parte do tempo agradável, estou

certa”.

Muito verdadeiro, ele supunha. Era o tipo de coisas que as damas faziam. Isso o

entediava demais. "Nenhuma família?".

Ela encolheu os ombros. "Alguns primos distantes na Irlanda que nunca encontrei. E

já que eles foram encarregados com as dívidas de papai, não tenho nenhuma intenção de

me acrescentar na lista de seus problemas. Não há vergonha alguma em se trabalhar para

viver”.

Ele não disse nada por alguns momentos, então, "você podia trabalhar para mim”.

Ela franziu o cenho. "Como?".

Ele encolheu os ombros. "Não estou certo do termo. Você podia trabalhar com os

cavalos, treiná-los como fazia antes. Aggie me disse que você nasceu para isto. Fará o que

fazia antes, só que para mim, não para o seu pai”.

Nell olhava fixamente para ele. Ficar aqui e continuar a trabalhar com seus amados

cavalos. Ele tinha alguma ideia do que estava oferecendo a ela? O sonho dela em uma

bandeja. Ela fechou os olhos por um momento, imaginando. Mas era impossível.

Ela tinha que achar Torie.

Ela agitou a cabeça. "Sinto muito. É uma boa oferta, mas não é possível”. Ela não tinha

nenhuma intenção de explicar a razão real; afortunadamente não havia ninguém mais

sumido.

"Por que não?".

"Haveria muito falatório. Já seria ruim o suficiente você contratar uma mulher solteira

do povo para trabalhar em seus estábulos, mas ter a filha do conde como uma de suas

treinadoras—seria um escândalo”.

"Você já sobreviveu ao escândalo da bancarrota do seu pai”, ele assinalou

abruptamente.

"Sim, mas isto arruinaria a nós dois. Eu sou a filha de um conde, e você é—você é…"

ela hesitou, não sabendo o que dizer.

"Eu sou o filho de um conde inglês e uma criada”, ele terminou para ela.

Ela olhou para ele surpresa. "Você?", ela disse. "Não sabia. Pensava que você não

fosse da elite. Mas se você é o que diz, então, sim, isso seria ainda pior. Eles fofocariam

sobre mim, claro, mas iriam contra você. Eles se ressentiriam de alguém, que eles

considerariam como um novo-rico, poder empregar uma lady em uma posição servil”.

Ele bufou. "Eu não me importo com o que eles pensam”.

Ela pousou uma mão no braço dele e disse seriamente, "não, mas você deve. Você

parece ser um homem ambicioso”.

Ela pausou e ele fez um movimento com as mãos, confirmando a impressão dela.

"Bem, se o seu plano é criar e treinar cavalos de corrida puros-sangues, é com os

cavalheiros da elite que você deverá lidar—eles são as pessoas que decidem as corridas,

que compram os cavalos. Se você me empregasse, estes mesmos cavalheiros veriam isto

como um insulto a sua classe. Eles te odiariam por isto. Eles se recusariam a fazer negócios

com você e você seria educada e invisivelmente excluído socialmente”.

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Ele deu de ombros. "Eles não iria se você se casasse comigo”.

Chocada, Nell soltou o braço dele e deu dois passos para trás. "Casar com você?", ela

não podia acreditar nos próprios ouvidos.

"Por que não?".

Ela olhava fixamente para ele confusa por um momento. Por que não? "Eu acabei de te

conhecer. Você não pode querer se casar comigo”.

Ele apenas olhava para ela como se dissesse, por que não?

Ela sentiu o rosto aquecer. Sua primeira proposta—provavelmente a única que

receberia—e era entregue com tanta emoção quanto uma sacola de mercado. Ela não tinha

nenhuma ideia de como responder.

“V-você não poderia, possivelmente, me a-amar”. Ela corava enquanto ouvia o que

estava dizendo. Que desajeitada! Que estúpida! Damas da classe dela raramente casavam

por amor. Era tudo apenas posição, dinheiro e terra. Não que ela tivesse qualquer uma

dessas coisas.

Ele deu a ela um olhar divertido, como se ela tivesse dito algo tolo. "Eu apenas acabei

de te conhecer”, ele a lembrou.

"Eu s-sei. E é por isso que você não pode realmente querer dizer o que acabou de

dizer”.

"Eu quis dizer exatamente o que disse”.

Ela olhou fixamente para ele, o homem grande, quieto e seguro. Um homem de

poucas palavras. Mas aquelas poucas tiveram o poder de balançá-la. Ele se casaria com

ela? O homem mais bonito que ela já encontrara em sua vida se casaria com ela, a pobre e

sem atrativos Nell Freymore, a filha de um jogador?

"Por quê?".

"Acho que ficaríamos bem juntos”.

"Você sabe que idade eu tenho?", ela perguntou a ele. Ela já tinha passado da idade de

casar há anos.

"Eu pensei em mais ou menos vinte e cinco”, ele disse.

"Eu tenho vinte e sete”.

Ele encolheu os ombros. "Eu tenho vinte e nove. Isso importa?".

Ela olhou fixamente para ele. Ele não parecia entender. Por um momento ela

considerou a ideia. A comum e sem atrativos Nell Freymore, que tinha ficado de lado por

anos, casando-se com este homem bonito, este jovem leão alto com a voz profunda e os

olhos cinza firmes.

Oh Deus, que tentação, e apenas por um momento, foi estarrecedor. Ela podia apenas

deixar o passado, seus problemas para trás, e pisar em um futuro seguro e confortável. Era

exatamente o que pai planejara para ela.

Mas ela teria que escolher entre este estranho bonito e Torie, e ela não podia. Não

havia escolha.

O rosto dele era impassível, seu olhar cinza indecifrável. Ele já estava lamentando sua

oferta impulsiva? Ela nunca poderia lamentar. Saber que alguém tinha proposto a ela, pelo

menos. Mesmo quando apenas a ideia era impossível.

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"Não, não, obrigada. É muito amável de sua parte, mas sinto que seja impossível”, ela

disse suavemente.

"Eu não estou sendo amável”, ele disse, ainda com aquela voz calma e profunda.

"Seria melhor eu sair agora”, ela murmurou. "O vagão passará na igreja em uma hora

mais ou menos”.

Ele não disse nada, nada sobre o vagão e nada sobre sua oferta surpreendente. Era

como se ele nunca tivesse dito nada.

Nell deu mais três passos, então parou e lentamente girou, a mulher com sua

incapacidade de deixar para lá. "Eu tenho que saber”, ela disse finalmente. "Tenho uma

pergunta a fazer. Você me dirá a verdade?"

Os olhos dele se estreitaram, mas ele disse, "sim”.

Ela examinou o rosto dele atentamente e então deu um pequeno aceno com a cabeça.

"É por causa do meu título? A razão pela qual você propôs, quero dizer”.

"Suponho que seja parte”, ele admitiu. "Não faria mal a um homem ter uma esposa

com um título”.

Ela anuiu com a cabeça. "E minha habilidade com os cavalos seria útil, também,

espero”.

"Iria. Não negarei isto”.

"Entendo. Eu pensei demais. Obrigada por sua honestidade”. Ela girou para sair

novamente.

Ele limpou a garganta. "Mas elas são apenas parte da razão pela qual eu te pedi para

ser minha esposa”.

Ela se voltou. "O que mais pode haver?".

Ele engoliu em seco e pareceu desconfortável.

Nell estúpida, ela pensou. O que estava fazendo? Queria elogios agora? Patético.

O rosto dele escureceu e ele limpou a garganta.

"Não, não se preocupe—", ela começou. "Eu não queria dizer isto”. Ela girou

orgulhosamente para ir para longe.

Ele limpou a garganta. "O que acontece é que—", ele tragou novamente. "Você é

adorável e eu estou muito atraído por voc—"

"Pare. Por favor”. Ela ergueu a mão. "Eu não quero escutar”. Ela não queria, não

conseguiria aguentar galanteios forçados por ser da natureza galante masculina.

Ele olhou fixamente para ela. "Você perguntou. E eu pensei que mulheres gostassem

de ouvir tais coisas”.

"Não quando elas não são de verdade. E nós dois sabemos que não são”.

As sobrancelhas dele se juntaram. "Você está me chamando de mentiroso?".

Ela deu a ele um miserável encolher de ombros e murmurou algo sobre servir a

carapuça.

"Bem, mas não é mentira porcaria nenhuma”. Ele foi até ela, tão perto que ela podia

cheirá-lo, os odores lânguidos de couro, cavalo, água-de-colônia cara e homem.

Ela se forçou a se manter firme no chão. Ela tinha pedido, então deveria enfrentar as

consequências.

Page 35: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Os olhos frios e cinzas dele queimavam com emoção enquanto ele dizia com a voz

baixa, veemente, "eu não sou um homem de muitas palavras. Eu já fui comparado, de fato,

a um toco de árvore. Minha atração por você não é uma coisa fácil de admitir,

especialmente quando você me rejeitou, mas eu te prometi honestidade. E foi isso que eu

dei a você—em cada palavra”.

Nell não podia encontrar os olhos dele. Ela queria acreditar—que mulher não

gostaria? Mas ela não tinha nenhuma ilusão sobre a própria aparência. Tinha sido

esfregada em seu nariz por toda a vida.

Ele tinha sido gentil novamente, pensando que ela queria elogios—mesmo que

fossem falsos—e então ela o tinha deixado envergonhado expondo a mentira. Ela queria

afundar no chão.

Houve um longo silêncio, então ele tranquilamente acrescentou, "se qualquer homem

tivesse me chamado de mentiroso como você fez, teria sido jogado no chão”.

Ela vacilou e se preparou.

Ele disse suavemente, "você pode pensar em mim como um bastardo, mas eu nunca

fiz mal a uma mulher, e não pretendo começar agora. Mas já que você se recusa a aceitar a

minha palavra, e já que eu me recuso a te deixar acreditando que eu sou um enganador,

um mentiroso, devo recorrer ao modo mais básico de convencê-la de que eu realmente a

acho muito atraente”.

Ela olhou para cima, perplexa.

"Lady Helen”, ele disse. "Perdoe-me, mas—"

Para o choque de Nell, ele a beijou. Com completa confiança, ele a segurou pela

cintura e colou sua boca muito firmemente sobre a dela. Ela nunca experimentara tal coisa

em sua vida. Sua boca estava aberta com surpresa e o gosto quente dele passava por seu

corpo como um atiçador incandescente chiando ao ser tocado pela água.

Ela não fez nenhuma tentativa de lutar, não pensou nisto. Ela estava muito chocada,

muito… muito pasma com as sensações que surgiam dentro dela. Uma mão ondulava

fracamente, então pousou ligeiramente no ombro dele. A outra mão dela estava entre os

corpos dos dois e gradualmente ela ficou ciente de contra o quê as costas da mão dela

estava apertada: as partes dele. A parte muito dura e muito excitada da masculinidade

dele.

Ela devia ter se afastado, lutado, feito algo, qualquer coisa, mas seu corpo parecia não

ter vontade própria. O gosto, calor e o poder dele despejavam sobre ela; ela estava

impotente, não conseguia resistir. E o tempo todo ela podia sentir, lá contra seus dedos,

duro, quente e crescendo, maior e mais duro a cada minuto. Como um grande garanhão

humano, pulsando e urgente contra a carne dela.

Não durou muito—menos do que um minuto, ela pensou mais tarde, entretanto no

momento ela sentia como se tivesse sido para sempre, e então ele a soltou e deu um passo

para trás.

Ambos respiravam com força.

Ela tentou falar, mas não havia palavras.

"Perdoe-me”, ele disse firme. "Eu não devia ter beijado você, eu sei; não com tão

pouco tempo de conhecimento. Mas eu queria que você soubesse que o que eu disse não

Page 36: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

era nenhuma mentira. Nada do que disse. Percebo que a minha atitude é mal recebida…

mas eu queria que você soubesse”. Ele fez uma reverência aos arrancos.

Soubesse? O corpo inteiro dela pulsado com o conhecimento.

Ele a achava atraente. Ela piscou. Muito atraente, ele disse, e seu corpo havia

demonstrado…

Nenhum homem a tinha achado muito atraente. A única vez que ela atraíra a atenção

de um homem tinha sido por razões bem diferentes…

Ele não tinha feito promessas falsas a ela—Deus, se ela ainda acreditasse em

promessas. Mas Harry Morant tinha dado a evidência. A evidência dura.

Os dedos dela ainda formigavam. Muito dura.

Mas não importa o quanto ela estivesse tentada, um casamento entre eles não era

possível. Ela não poderia fazer a escolha que ele exigiria quando soubesse. Ela se sentia

com vontade de chorar, mas não tinha mais lágrimas.

Não havia dúvida de que—quem—ela escolheria. Mas era tão difícil. O homem mais

bonito que já encontrara em sua vida e que queria a ela.

Cada parte de seu corpo pulsava com o conhecimento desse querer. O sangue dela

estava em chamas.

Ela conseguiu reconhecer a reverência dele com um aceno com a cabeça. "Obrigada”,

ela disse com a voz sufocada, "mas minha resposta permanece”. A cabeça dela

permaneceu no alto por algum milagre de treino, e Nell conseguiu ir embora com algo que

lembrava um pouco dignidade.

Ela o sentiu observando-a partir. Uma mulher podia queimar para sempre na paixão

proibida daqueles olhos cinza frios. Isso era outra parte do problema.

Ela já tinha suportado muita na vida e sabia que era forte. Ela podia não ter beleza,

mas tinha força. Nada, nem ninguém, poderia acabar com seu espírito—nem mesmo este

homem.

Mas ele poderia facilmente partir seu coração. E ele iria, quando descobrisse o que ela

tinha feito—dado a luz a uma filha ilegítima que amava mais do que a própria vida.

Quando Harry Morant, que tinha passado a vida redimindo-se de seu próprio

nascimento, descobrisse isto, ele iria embora sem ela. E isso partiria seu coração.

Se ele já não o tivesse partido…

Até agora, Nell nunca tinha pensado em si mesma como uma covarde, mas enquanto

marchava para longe de Harry Morant, com a cabeça firme e bem alta para que assim ele

imaginasse que não dera a mínima para o que acabara de acontecer, ela tinha que admitir:

era uma completa covarde.

Capítulo IV.

Nell se sentou espremida entre um homem grande que cheirava a cravos-da-índia e

um outro, muito maior, que tinha cheiro forte de cebolas. Ela se sentia um pouco

nauseada. Mas não era por causa do cheiro deles combinado; era porque ela estava

deixando sua casa para sempre.

Page 37: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Sua casa, e todos os seus sonhos de garota.

Eles não eram nada especiais, apenas sonhos; apenas um homem para amar e cavalos

para criar. E bebês…

Torie…

Ela olhou para as costas do vagão. Pela janela ela podia ver a aldeia ficando pequena

e pequena, até que no final ela podia ver apenas o pináculo da igreja. Então, ela finalmente

tinha ido.

A diligência andava desajeitadamente ao longo da estrada barrenta, balançando e

sacudindo. Era pouco mais rápido do que a carroça na qual ela tinha chegado e muito mais

morna e seca.

Seus dois vizinhos se espalharam confortavelmente, os joelhos bem separados e

braços relaxados confortavelmente, enquanto ela estava bem apertada. Dois casais se

sentavam do lado oposto, os homens começando a ocupar duas vezes o espaço de suas

esposas, embora ambas as mulheres não fossem muito pequenas e um dos homens fosse

positivamente magro. Por que os homens sempre tomavam mais do que o seu espaço? Ao

menos eles a mantinham morna, ela disse a si mesma, embora de um jeito muito grudado,

e com cheiro de cebola.

E ela estava a caminho de Londres, não diretamente, mas logo. O acordo era

encontrar sua empregadora em Bristol, e então ela e a Sra. Beasley viajariam para Londres.

E então… então ela retomaria sua procura, sua procura por sua filha. Por Torie.

Ela sentiu dor pelo pensamento. Seus seios pulsavam. Ela devia ter removido as

bandagens que os seguravam antes de partir. Seu leite já tinha acabado há muito.

Mas, oh, como ela desejava seu bebê, sua filha preciosa e minúscula. Ela mantivera as

bandagens, relutantes de perdê-la, um vínculo delicado, tangível, com a criança que

estava… em algum lugar.

Perdida. Roubada.

Victoria Elizabeth… Torie, como a mãe de Nell.

Nell dobrou os braços através dos seios. Ela sentia dor por essas perguntas

incontestáveis. Quem estava alimentando sua pequena Torie agora? Alguém estava? Oh

Deus, deixe-a viver, ela rezou.

Esse tormento estava sempre com ela, como um carvão queimando em sua

consciência, dia e noite, o medo de que assim como todo mundo em sua família, Torie

pudesse estar—não! Ela não poderia pensar assim.

O pai de Nell tinha sido um perdido, mas não do mal.

Mas ele não tinha nenhum direito de tomar o bebê dela, nenhum direito de roubá-la

durante a noite. Se ela apenas tivesse predito suas intenções… mas ele não tinha dito nada.

Se ela soubesse, teria lutado com unhas e dentes pela filha.

A culpa a destruía. Ela nunca deveria ter adormecido. Mas, depois do nascimento ela

teve um pouco de febre e estava tão cansada, tão cansada…

O que o pai dela teria feito com sua filha? Aonde ele a teria levado?

Ele tinha sido encontrado, morto, em um cruzamento, no caminho de volta a Londres.

Morto, e o paradeiro de seu bebê tinha ido com ele.

Homens mortos não contavam histórias.

Page 38: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela sabia por que ele tinha feito isto. Ele tinha dito a ela depois, quando a vira pela

primeira vez depois de tê-la trancado por quase seis meses. Para o seu próprio bem. Para

salvar sua reputação. Então ela não teria que sofrer pelo mau julgamento dele…

Mas ela disse a ele que não. Que queria manter sua criança. Que amava Torie.

Ele a assegurou de que ela não teria que viver com o resultado dos erros dele. Que ela

poderia fazer uma nova vida, deixar isso tudo para trás, esquecer…

Como se Nell pudesse esquecer o bebê que tinha carregado abaixo do coração por

todos os longos meses. Na mente e no coração de Nell, sua pequena Torie não tinha

nenhuma conexão com os eventos que tinham começado tudo, pelos quais o pai dela se

culpava tão profundamente.

Era verdade que assim que ela tinha descoberto que estava grávida, tinha começado a

menosprezar e odiar, desejando que aquela “coisa” nunca tivesse sido concebida, mas…

na primeira vez em que sentiu aquele ser minúsculo tremular com vida em seu útero…

Ela nunca sentira nada como isto.

Ela se lembrou de colocar a palma da mão sobre o lugar, esperando e ofegante, até

que ela sentiu novamente. E então, de repente, ela não tinha mais uma "coisa" em sua

barriga, tinha um bebê. Um bebê minúsculo e inocente.

Uma criança que não tinha ligação com mais nada, ela não tinha nada a ver com a

feiúra que a tinha precedido. Havia apenas Nell e seu bebê.

E nos longos meses, sozinha na casa estranha onde o pai a tinha levado, fechada para

estranhos—estranhos amáveis, mas estranhos da mesma maneira—ela foi ficando cada vez

mais apaixonada pela criatura impotente e minúscula que crescia dentro dela, movendo,

chutando, envolvendo-se com as emoções mais profundas a cada movimento.

O bebê de Nell, a criança de Nell. De ninguém mais.

E ela se sentava por horas na cadeira ao lado da janela—eles não a deixavam sair com

medo de que ela pudesse ser vista—com Freckles cochilando ao lado dela. Freckles era a

única amiga que o pai permitira de sua casa. Ele nem mesmo confiava que Aggie não

acabasse dando com a língua nos dentes. Nell teria que ficar escondida longe com

estranhos, sob um nome falso. O pai não iria deixá-la sofrer novamente por seu engano…

Como se ao levá-la para longe de tudo que amava e conhecia—exceto seu cachorro—

não a fizesse sofrer. Típico do pai dela, sempre fechando a porta do estábulo depois que os

cavalos já tinham escapado.

Então ela se sentava com Freckles, com um bebê crescendo debaixo de seu coração,

sonhando como seria e fazendo planos. Ela levaria o bebê para casa para Firmin Court,

para onde a mãe dela tinha nascido, e Nell a ensinaria tudo o que a mãe tinha ensinado a

ela—e mais, porque a mãe dela tinha morrido quando Nell tinha sete anos.

Ela. De alguma forma ela nunca tinha pensado que seria um menino. Mas ela não

teria se importado se fosse. Ela sabia apenas que o amava.

E então seu trabalho de parto tinha sido longo, pela noite, com dor atrás de dor,

atravessando-a e ela pensava que poderia morrer, como a mãe tinha. E finalmente ao

amanhecer, como o céu claro e cinza, a luz dourada se derramava acima do horizonte, ela

teve seu bebê.

Page 39: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Sua filha. Sua preciosa e linda Torie… um ser minúsculo que gemia ferozmente, com

rosto vermelho e penugem dourada e uma boca que era pura e furiosa como um botão de

rosa, e minúsculos e pequenos punhos com dedos primoroso, como uma minúscula

samambaia prestes a desabrochar.

E quando a parteira tinha colocado a criatura minúscula no peito de Nell, e os

gemidos bravos tinham sido cortados com um meio-grito e a pequena boca fora

amamentada, um amor feroz inchou dentro de Nell e ela se sentia como se fosse explodir

com carinho, alegria e orgulho. Ela tinha uma filha.

Ela abraçou Torie e sussurrou em sua milagrosa e delicada orelha que a adoraria para

sempre e que não a deixaria nunca…

Mas duas semanas depois o pai dela aparecera, a primeira vez desde que ele a deixara

lá todos aqueles meses, e na manhã seguinte, ele e o bebê dela tinham sumido.

Ela se culpou. Ela devia ter imaginado, devia ter pensado, devia ter suspeitado…

Mas ela havia dito a ele que amava seu bebê. Ela tinha mostrado a ele sua linda filha e

dito a ele com tanto orgulho que daria a ela o nome de Torie—Victoria Elizabeth—o nome

da mãe dela.

E o pai dela tinha chorado e dito a Nell que ela era uma boa e valente menina, e que

ele faria tudo certo.

Ela não percebera o que ele queria dizer. Até onde Nell se importava, estava tudo

certo. A febre de seu parto estava passando e ela estava nas nuvens com o carinho por sua

filha e pelo mundo. Seu bebê era forte e saudável e ela não se importava com mais nada.

Ela não se importava de não ser casada. Ela não se importava que as pessoas descobrissem.

Ela apenas se importava com a filha.

Além disso, o pai dela vivia fazendo promessas vagas e fúteis dizendo que faria tudo

certo. Ele nunca as mantinha, então ela não pensara mais nada sobre isto.

E oh, que engano tinha sido.

Como sempre o pai só vira o que queria ver. E ele podia apenas ver o bebê de Nell

como uma criança da vergonha, um engano—um engano do qual ele se culpava.

E então, enquanto ela dormia, ele entrou sorrateiramente no quarto dela de noite e

removeu o engano, deixando uma carta que a instruía a se esquecer de tudo sobre isto…

Isto, não ela.

Como se ela pudesse. Como se alguém pudesse, ainda que quisesse. E Nell não

queria. Ela queria seu bebê, sua preciosa, filha, sua Torie.

"Você se importa, senhorita?", um dos homens no vagão—o do cravo-da-índia—

chamou-a, um pouco embaraçado.

Nell olhou surpresa para cima. Ela tinha se esquecido de onde estava. Todo mundo

no vagão a olhava fixamente.

Uma das mulheres do lado oposto se debruçou adiante e bateu levemente no joelho

dela. "Você estava balançando, senhorita, de um lado para outro, como se estivesse

tentando pôr um bebê para dormir. Só que não há nenhum bebê. Isso deixou os

cavalheiros desconfortáveis”.

Nell olhou para baixo. "Eu sinto muito”, ela disse com a voz sufocada. "Não

acontecerá novamente”.

Page 40: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

O que raios ele tinha pensado? Fazer uma oferta para uma garota que tinha conhecido

há algumas horas—e a filha de um conde, ainda por cima.

Montando Sabre, seu cavalo favorito, Harry ia devagar, levando uma série de cavalos.

Atrás dele montava Ethan, e vários cavalariços, cada um deles levando cavalos. Harry

estava movendo a maior parte de seu estábulo de Grange, a propriedade de seu irmão na

costa, para a casa dele.

As negociações de Firmin Court deixaram Pedlington cansado e desapontado, e

Harry tranquilamente soberbo. Harry trouxe os livros de propriedade da casa e apontou-

os durante várias horas com uma expressão sinistra enquanto Pedlington assistia, ficando

cada vez mais mal-humorado.

E ele fez perguntas que intimidaram o agente; perguntas selvagens como, "quantas

famílias locais sofreram de fome desde que a sua firma tomou posse da propriedade?".

No fim, Harry tinha sido tão inumano em assinalar os muitos defeitos terríveis na

propriedade que o agente até expressou surpresa que Harry comprasse uma propriedade

tão aparentemente insatisfatória.

Mas Pedlington era um homem da cidade, para o qual o papel de parede descascado

e desbotado era um defeito. Ele não via a propriedade do mesmo modo que um homem do

campo. Firmin Court tinha sido mal conduzida, mas fundamentalmente era tudo o que

Harry queria.

E agora pertencia a ele. Sua própria casa.

Foi a primeira parte de seu sonho se realizando; ele deveria estar se sentindo

exultante. Ele estava exultante, lembrou a si mesmo. Ele apenas não conseguia se esquecer

de seu momento enervante de loucura. O que o possuíra?

Você podia se casar comigo.

Tolo! Ele não tinha pensado, isso era um problema. Ou pelo menos, não com seu

cérebro.

Fazia muito tempo desde que ele estivera com uma mulher. Por isso tinha agido tão

fora de seus padrões, tão impetuosamente.

Era a única explicação que ele podia pensar.

Seu cérebro tinha estado tão louco de desejo por Lady Helen Freymore que ele falara

sem pensar.

Graças a Deus ela o tinha rejeitado.

Claro que ela tinha. Ela era a filha de um conde, uma lady. As damas das castas

superiores olhavam do alto para gente como Harry Morant. Ela devia estar na pior agora,

mas todos aqueles instintos que compunha as regras de seu nascimento estavam

enraizadas dentro dela—como o modo de olhar dela quando Pedlington se tornara muito

insistente; aquela coluna graciosa enrijecera e aqueles olhos suaves cuspiram fogo e gelo e

ela friamente tinha colocado o homem em seu lugar.

Harry tinha ficado mais excitado do que nunca, droga.

Não, ele conhecia o tipo de garota que procurava; uma quieta, com alguns bens, de

classe-média, que o respeitaria e não o faria de tolo. Ela respeitosamente permitiria que ele

tivesse acesso a sua cama e com isso o problema dele estaria resolvido.

Page 41: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

E os olhos e lábios dela não fariam o cérebro de um homem virar mingau. Ou fazê-lo

falar sem pensar coisas que não pretendia dizer.

"Há uma aldeia abaixo no vale”. Ethan interrompeu o devaneio de Harry. "Nós

pararemos para almoçar um pouco?".

Eles partiram com uma cesta grande cheia de comida—cumprimentos da mãe de

criação de Harry, Sra. Barrow, mas eles fizeram uma jornada lenta e sua comida tinha

acabado.

"Não”, Harry decidiu. "Envie um dos homens para comprar algumas tortas ou algum

pão com queijo e cerveja inglesa. Nós estaremos em Firmin Court antes do pôr-do-sol”. Ele

deliberadamente tinha escolhido dar várias voltas para não chamar a atenção para o fato

de que ele estava movendo tantos animais valiosos.

Teria sido mais seguro movê-los depressa, mas ele manteve um passo fácil. Ele estava

planejando fazer com que vários cavalos corressem nos próximos meses e ele não queria

que eles perdessem sua condição.

De sua posição estratégica na colina, ele via os aldeões se moverem. Atrás da igreja,

um casal de amantes estava fazendo um encontro secreto; um jovem sólido e uma garota,

flexível e bonita. Harry observou-os por um momento, se tocando, se beijando,

murmurando coisas doces, então desviou o rosto.

Jovem tolo. Deixando-se emaranhar pelo amor.

Ele esperava que o garoto sobrevivesse a isto.

"V-você não poderia, possivelmente, me a-amar”. E aquele maldito lábio inferior dela

tremia, enviando uma rajada de paixão crua por ele. Seu corpo se mexeu apenas com a

memória.

Claro que ele não podia amá-la—ele apenas a conhecera, e não acreditava em amor—

especialmente não acreditava na ideia tola de paixão à primeira vista.

O que ele sentira era desejo, luxúria, ou como quer que seja que as pessoas

chamavam. O corpo inteiro dele ficava torturado cada vez que ela se aproximava. E não se

casa por desejo; toma-se uma amante.

Harry olhou para os telhados abaixo da aldeia. Ele precisaria fazer uma visita à

cidade—e logo, porque era lá onde a abstinência o levaria.

Não Londres. Lady Helen estaria em Londres agora. Sendo uma dama de companhia.

Trabalho estúpido.

Ele seguira seu caminho, chocado. O companheiro de uma dama deveria ser o mesmo

que o de um homem—um cachorro. Não era um trabalho para uma mulher crescida. Ela

deveria se casar, ter um monte de crianças para mantê-la ocupada, não tinha que tentar

entreter alguma dama rica e entediada.

Não, ele não iria a Londres. Ele escreveria para sua tia novamente e a lembraria de

que ela ainda não havia achado uma provável esposa. Ele precisava se assentar, começar

sua vida. Ele precisava de alívio da tensão que o mantinha como uma corda de arco tensa.

Viajar até a cidade custaria um tempo valioso demais, e tomar uma amante no campo

simplesmente não era uma opção.

Page 42: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

O campo não era como Londres onde as damas casadas da aristocracia brincavam em

suas camas e todo mundo fazia vista grossa. Em Londres um homem poderia manter uma

amante em uma casa discreta que ninguém saberia e ele a visitaria sempre que desejasse.

No campo todo mundo descobria tudo. Os olhos cegos eram apenas os dos mendigos.

Não era a respeitabilidade que o aborrecia. Ele não podia se importar menos com o

que as pessoas pensavam dele. De qualquer forma, poucas pessoas culpavam o homem.

A mulher, por outro lado…

Ele tinha poucas memórias de sua mãe real; ela morrera quando ele era apenas um

menininho. Mas ele aprendera a palavra “prostituta” quando ainda era uma criança

aprendendo a andar, ao ouvir as pessoas na rua gritando a palavra para ela na rua, várias

vezes, algumas em seu rosto, e algumas pelas costas. A prostituta do conde e seu pequeno

bastardo… que era Harry.

Ele não era um bastardo mesmo, não legalmente. Seu pai natural tinha dado um belo

dote por sua criada grávida ao forjador da aldeia, Alfred Morant, eles se casaram bem

antes de Harry nascer.

Ainda assim as pessoas chamavam Harry de bastardo.

E quando o ferreiro—Harry nunca disse o nome dele—bebia demais, o que era

frequente, ele chamava sua bela esposa loira de prostituta também, e batia na pele macia

dela com seus punhos enormes, carnosos.

O momento em que o homem começava a beber, a mãe dele trancava o pequeno

Harry longe para que assim ele escapasse dos ossos quebrados e contusões que ela sofria.

Um pontapé tinha quebrado o quadril de Harry quando criança. Ele tinha a perna ruim

desde aquele dia. Depois disso, sua mãe apanhava por ele.

Era porque Alfred a amava, a mãe o explicava depois, chorando. Alfred sempre a

amara e desejara, e ele ficava bravo porque o conde a tivera antes… Mas o que ela podia

fazer? Ele era o conde.

A mãe de Harry morreu quando ele tinha cinco ou seis. Uma pancada muito forte e

uma criança nascera morta. "De quem é essa criança, prostituta?", o forjador berrara,

embora a mãe dele nunca tivesse olhado para nenhum outro homem. Ela nem sequer

deixava a casa mais—ela não podia enfrentar os olhos das pessoas da aldeia avaliando

suas contusões, os olhos que diziam que ela merecia todas elas.

Depois da morte da mãe, a vida de Harry ficara muito mais dura. O forjador o tinha

expulsado e ele vivia como um cachorro vira-lata dos restos dos outros aldeões.

Então Barrow um dia, um cavalariço de uma grande dama, tinha levado um cavalo

para fazer a ferradura e encontrou Harry contundido, meio morto de fome, e

estremecendo todo. Ele o trouxe para casa como um presente para a Sra. Barrow, uma

mulher sem filhos, maternal, que o acolheu e cuidou com o seu coração morno.

Os Barrow trabalhavam para Lady Gertrude Freymore, a tia solteirona do conde que

parecia um dragão. Aquela dama austera olhou para Harry e percebeu a ligação de

sangue. Junto com seu meio-irmão, Gabe, ela o criou como um cavalheiro e quando ela

morreu, deixou um legado a ele.

Mas Harry nunca esquecera seus primeiros anos…

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Ele nunca pegaria uma mulher do campo como amante. O casamento era sua única

opção. Ele escreveria para sua tia assim que chegasse a casa.

O pensamento o aqueceu. Ele tinha sua própria casa pela primeira vez em sua vida. E

logo ele teria uma esposa para aquecê-la. E colocar o cérebro dele… no lugar.

"Que lugar ‘tupendo’ que você tem aqui, Harry, rapaz”, Ethan exclamou

entusiasticamente. Assim que eles colocaram os cavalos nos estábulos, verificado o

trabalho que tinha sido feito na ausência de Harry, e informou ao novo cozinheiro que

havia oito homens para alimentar, Harry levou Ethan para uma excursão.

"Aqueles estábulos são magníficos. Há tudo que um homem possa querer—há até um

caminho remanescente de uma pista de treinamento, se meus olhos não me enganam”.

"Não te enganam”, Harry disse, sorrindo amplamente. "Os parentes da avó materna

de Lady Helen—essa era a propriedade deles, sabe—eram famosos por criarem animais de

sangue puro. Eles criaram e treinaram vários vencedores nos seus dias”.

Ethan moveu uma sobrancelha. "Lady Helen, eh? E aposto que ela é uma moça muito

bonita, esta Lady Helen”.

Harry piscou. "O que te faz dizer isto?".

Ethan encolheu os ombros. "Você já a mencionou uma dúzia de vezes nos últimos

dias”.

Harry fez uma carranca. "Isto é natural—a casa que eu comprei era dela”.

Ethan solenemente anuiu com a cabeça. "Natural, sim, a palavra exata que eu teria

usado”.

"Aquelas cercas precisarão ser renovadas antes do inverno chegar”. Harry ignorou a

diversão que percebia nos olhos de Ethan e apontou as cercas. "Algumas delas estão tão

podres que se lascarão se algum cavalo se esfregar nelas”.

"Realmente irão”, Ethan concordou, seriamente. "A primeira coisa que farei pela

manhã é trazer alguns rapazes para examinar cuidadosamente todas as cercas e farei uma

estimativa do que iremos precisar”.

"Eu já fiz isto”, Harry disse a ele. "A madeira deve chegar amanhã”.

Ethan assobiou. "Você não desperdiçou tempo, não é?".

Harry fez um gesto brusco. "Eu quero ter tudo pronto antes do inverno aparecer”. A

verdade era que ele estava queimando com desejo não satisfeitos e andar pelos arredores

nos campos frios e barrentos era apenas uma coisa para amortecer qualquer energia que

ele tinha sobrando.

"O que é esse lugar?", Ethan apontou para um chalé na extremidade da propriedade,

perto da aldeia. "Parece deserto”.

Não havia obviamente ninguém na residência; era um dia frio e todas as outras casas

na aldeia tinham fumaça saindo da chaminé. O jardim da frente estava desleixado e a hera

subia pelo sapê.

Harry chamou um dos homens no local. No dia em que ele tinha assinado os

documentos para comprar a propriedade, ele tinha retornado e com ajuda do vigário e de

Aggie achara meia dúzia de homens para começar o trabalho dos consertos mais urgentes.

"O que é essa casa?", ele perguntara ao homem. "Quem é o dono dela?".

Page 44: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"É você, senhor”, o homem disse. "Costumava ser a casa do gerente da propriedade,

mas quando o dinheiro acabou, ele não ficou. Bem, ele não era daqui das redondezas—um

estrangeiro, ele era, de algum lugar de Leicester, eu acho. Ninguém vive lá agora, ’ceto’ as

aranhas, acho”.

Harry agradeceu e o homem voltou a trabalhar. Ethan olhava fixamente para o chalé

com os olhos estreitos. "Se importa se eu der uma olhada nele, Harry?".

"Claro que não. Mas não vejo por que você está tão interessado”.

Ethan não respondeu. Ele já estava no meio do caminho até o chalé. Curioso, Harry o

seguiu. Havia um portão de madeira que gemeu quando eles o abriram, e havia ervas

daninhas no jardim dianteiro, indo até a altura dos joelhos.

Ethan rodeou-o, observando as janelas desenhadas em formato de diamante, olhando

com os olhos semicerrados para os fundos, e arrancando a hera das paredes para examinar

a superfície. "Você tem uma chave?", ele perguntou a Harry.

"Não estou certo”. Harry puxou um molho de chaves de seu bolso e examinou a

fechadura de porta da frente para ver se alguma delas se ajustava.

"Não há necessidade”, Ethan disse de repente. Ele tentou e a porta apenas abriu;

estava destrancada. Os dois homens foram para o lado de dentro. Estava empoeirado e

cheio de teias de aranha, mas tirando isso, o ar era doce, sem cheiro de mofo ou umidade.

Os degraus rangeram um pouco sob o peso dos dois homens, mas não havia nenhum sinal

de podre.

"É exatamente o que eu preciso”, Ethan disse, enquanto inspecionava o último dos

três quartos. Como a casa principal, o chalé era sólido e precisava de apenas alguns

consertos superficiais. "Você poderia vendê-lo para mim?".

"Claro, se é isso o que você quer”, Harry disse, surpreso. "Mas por que você quer

comprar um chalé? Não é como se você precisasse de uma casa própria”.

"Ah, mas eu vou precisar”, Ethan disse, pegando alguns flocos de cal com a unha do

dedo polegar.

"Eu assumi que você gostaria de dormir na casa grande, como fazíamos em Grange.

Qual seria a razão de ter uma casa com dez quartos então?".

"Eu não me importo com onde deito a minha cabeça, como você bem sabe”, Ethan

disse. "Mas uma esposa espera ser a dona de sua própria casa. Se eu tiver um chalé

pequenino e aquecido e todo pronto, poderá ser um ponto a favor para mim na decisão”.

"Uma esposa? Você não tem uma esposa”.

"Sim, mas eu disse a ‘ocê’ que ‘tava’ fazendo uma corte séria”, Ethan o lembrou. "E já

que você ‘tá’ falando em conseguir uma moça para você, eu precisarei de um lugar para

mim, duas esposas sob um telhado? Não na sua vida, rapaz”.

"Não, eu entendo o seu argumento—mas quem é esta mulher misteriosa, Ethan?".

Ethan piscou. "Espere e veja. Não se preocupe com a minha vida amorosa—por que

você ‘num’ sai e faz algum tipo de corte séria também. Que tal esta sua Lady Helen?".

"O que tem ela?", Harry disse, imediatamente na defensiva. "Eu disse a você que eu

apenas a encontrei por algumas horas. É tolice assumir que ela significa qualquer coisa

para mim. Por que deveria? Eu mal a conheço. Eu meramente a menciono de vez em

quando porque ela deixou sua marca neste lugar. Pelo o que as pessoas me disseram, ela

Page 45: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

manteve sozinha meia dúzia de famílias longe da fome no ano passado quando as

colheitas falharam desastrosamente, então eu ficaria dificilmente assombrado do nome

dela continuar surgindo. De qualquer maneira, ela está em Londres agora, mostrando a

alguma dama idosa as paisagens, lendo para ela e tomando chá”. Sua veemência o

surpreendeu e ele limpou a garganta e olhou para a janela.

Ethan deu a ele um olhar longo. "Sim, eu posso ver que você não pensou nada na

moça. Nada mesmo”.

"Está certo. Agora eu irei ver o que os homens estão fazendo”, Harry murmurou e

marchou para fora do chalé, deixando Ethan e sua expressão irritantemente satisfeita

consigo mesmo para trás.

Ethan apenas não entendia. A corte frustrante dele o estava fazendo imaginar que

todo mundo estava no mesmo estado.

Harry não tinha tempo para pensar em mulheres; ele tinha uma propriedade para

reformar. E quando tivesse tempo, aparecia em Bath onde a Tia Maude já teria achado uma

noiva apropriada para ele. Sem problema algum.

Pelas próximas duas semanas Harry e Ethan correram para fazer o máximo de

trabalho ao ar livre que pudesse ser feito antes que a primeira neve caísse. Eles

remendaram cercas, consertaram os prédios anexos, e substituíram telhas quebradas.

Dentro da casa havia um time de mulheres e homens locais esfregando a casa, deixando-a

crua e limpa.

Harry e Ethan trabalhavam como demônios, dando ordenar como se tivessem voltado

ao exército. Os trabalhadores da propriedade logo perceberam que ninguém conseguiria

fugir do trabalho ou trabalhar de má vontade. Harry e Ethan eram mestres em dar ordens

mas como eles trabalhavam mais duro do que todos, ninguém se importava. O fracasso

das colheitas no ano anterior e o fechamento da casa grande significara, para a maior parte

deles, enfrentar um Natal muito escasso. E possivelmente fome.

Agora, com emprego e moeda correndo firme em seus bolsos no final de cada

semana, havia um sentimento de esperança renovada no ar enquanto eles entravam em

uma rotina de trabalho dura e satisfatória.

No fim da terceira semana Harry recebeu suas primeiras visitas. Ele não tinha

nenhuma ideia de que eles estavam vindo; em um minuto ele, Ethan e o cavalariço chefe,

Jackson, estavam na frente da casa discutindo sobre as nuvens que indicavam neve, e no

minuto seguinte, dois curricles esportivos adentraram o portão dianteiro, sem diminuir a

velocidade um segundo enquanto eles tentavam passar pela entrada estreita, um quente

atrás do outro.

Uma vez do lado de dentro, a segunda carroça, um curricle preto e amarelo puxado

por um par de cavalos combinado, balançou firme e tentou passar pelo outro. Eles

viajavam em uma velocidade muito perigosa, ficando em primeiro lugar, enviando o

pedregulho recentemente rejuntado do passeio voando.

"Deus todo poderoso”, Ethan declarou. "Ele nunca vai passar. Ele vai se destruir—"

"Aposto um pônei com você que ele ganha”, Harry disse.

Page 46: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Feito”, Ethan disse, olhando fixamente para os cavalos cansados do curricle puxado

adiante, passando as rodas de seu rival. A clara e alta carroça saltou e balançou

perigosamente. O motorista riu e persuadiu seu time mais rápido. "Ele está louco”.

"É Luke”, Harry disse. "Você sabe que ele não se importa se vai viver ou morrer. E

Rafe sabe todos os seus truques. Eles têm feito essas corridas um com o outro durante

anos”.

Rafe Ramsey e Luke Ripton eram seus dois amigos mais próximos depois de seu

irmão, Gabe. Eles todos foram para a escola juntos, alistaram-se juntos, e juntos, de alguma

maneira, sobreviveram a oito anos em guerra.

"Eles estão ambos loucos”, Ethan declarou.

"Magnífico, apenas magnífico”, Jackson murmurou com um tom reverente. "Que

cavalos bonitos. Eu não via puros-sangues tão adoráveis deslizarem pelo passeio de

Firmin Court desde que a mãe da Senhorita Nell estava viva. Faz um bem ao meu coração

velho vê-los, sim faz”.

"Aqueles baios são particularmente bons, não é?", Harry concordou. "Mas eu acho que

os negros podem ter mais histamina”.

"Sim, ombros muito poderosos”, Jackson concordou.

"Ainda assim eles são totalmente loucos”, Ethan repetiu. "Eles quebrarão seus

pescoços tolos”.

Harry piscou. "Este é um novo curricle o que Rafe está dirigindo, não é Ethan? Muito

bom, você não acha?".

Ethan deu uma olhada para ele. "Você está louco, também”.

Harry sorria amplamente. Não era a primeira vez que ele era chamado de louco;

todos eles tinham sido chamados. Ele, Gabe, Luke, Rafe e seu amigo Michael tinha sido

chamado de os Anjos do Duque, por causa de seus nomes e porque eles enviavam os

despachos de Wellington6.

Depois da morte de Michael, o apelido deles tinha mudado para os Cavaleiros

Infernais, possivelmente por causa do hábito de Wellington de exortá-los como cavaleiros

que "cavalgavam como demônios" ou porque depois que eles perderam Michael havia

uma nova disponibilidade de tomarem riscos. Naquele tempo nenhum deles se importava

se vivia ou se morria.

O dois curricles aceleraram juntos, pescoço com pescoço, indo em direção à frente da

casa.

"Santa Mãe de Deus, aqueles lunáticos virão até os degraus da entrada”, Ethan ofegou

e saltou para o lado. Jackson murmurou um palavrão e saiu apressado atrás dele. Harry

cruzou os braços e esperou. Ele já tinha visto esta manobra particular de Luke antes.

Como esperado, no último momento, Luke puxou seus cavalos para trás e eles

bufaram e pararam, vapor vindo deles como nuvens, a apenas quinze centímetros dos

degraus. O segundo curricle parou ao lado dele três segundos mais tarde.

6 Arthur Wellesley, 1º Duque de Wellington (1769 - 1852), foi um marechal e político britânico, primeiro-

ministro do Reino Unido por duas vezes.

Page 47: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Houve um silêncio súbito, quebrado apenas pelo bufar dos cavalos e sopros de ar.

Vários cavalariços que vieram assistir a corrida se apressaram para tomar as rédeas. Os

dois condutores, ambos em casacos de corte elegante de pele de castor e capuzes, desceram

de seus curricles de modo vagaroso.

Luke afetadamente começou quando se virou para o segundo. "Rafe, meu menino

querido—você chegou, afinal!", ele bocejou. "Achei que você nunca chegaria”.

Rafe, um metro e oitenta, magro como um chicote e elegante até as unhas dos dedos,

tirou suas luvas de direção e soltou seu cachecol de seda branco com movimentos

vagarosos. "Tempo triste, eu sei. Eu fiquei preso na estrada por causa de um cara tedioso

em um curricle preto e amarelo, positivamente uma lesma—tão lento quanto uma semana

de chuva, ele era, isso te asseguro”. Ele pegou uma lente7 e a ergueu mostrando pretensa

surpresa com o curricle preto e amarelo de Luke. "Por Javé, creio que a lesma era você,

Luke. Que tipo de gado você está conduzindo estes dias?".

Rindo, Harry foi saudá-los. Ethan, também avançou com um sorriso largo, dizendo,

"loucos de pedra como sempre, percebo. A vida pacífica é muito entediante para vocês,

não é?".

Rafe Ramsey ergueu uma sobrancelha sardônica. "L-louco? Eu? Você está enganado,

Ethan querido. É o meu amigo quem está louco; eu apenas sou condescendente com ele.

Meu único problema é que estou quase morrendo de sede”. Ele deu a Harry um olhar

significativo.

"Oh realmente”, Harry riu. "Você, pobre criatura fraca, venha para dentro que eu te

darei algo revigorante para beber”.

"Nesse caso, eu me sinto quase morrendo, também”, Ethan declarou.

"E eu, por ter ganhado”, Luke os lembrou.

"Sei, e acabei de ganhar vinte e cinco libras por sua causa”, Harry disse a ele.

O queixo de Luke caiu. "Um pônei! Você apostou apenas um pônei em mim?", ele deu

um bufar repugnante. "Pelo menos Rafe tinha apostado um macaco comigo”.

"Ethan, você é um homem de bom julgamento”. Rafe olhou fixamente através de seu

longo nariz para Harry. "E você apostou contra mim, Harry, meu velho amigo? Estou

ferido, profundamente ferido”.

Harry sorriu amplamente, inalterado pela tolice de seu amigo. "Assim que eu vi que

você tinha um curricle novo, soube quem levaria a vantagem. Você poderia arriscar seu

pescoço tolo, mas um curricle novo? Não era provável!", rindo, os amigos entraram na casa

enquanto Jackson supervisionava os cavalariços conduzindo as bestas magníficas em seu

cuidado terno.

Eles tinham acabado de entrar quando Rafe girou para Luke. "Você esqueceu a cesta

da Sra. Barrow?".

Luke amaldiçoou e correu ligeiramente de volta para os degraus para buscar uma

cesta de vime grande do curricle.

7 Quizzing glass – traduzido como ‘lente’. Instrumento utilizado durante o período de Luís XV pelos homens para que

observassem de perto e descaradamente a beleza feminina, primeiramente no teatro. E a moda francesa rapidamente

chegou à Inglaterra e com o tempo deixou de ser censurada e passou a fazer parte do cotidiano.

Page 48: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Da Sra. Barrow?", Harry perguntou, perplexo. "Minha Sra. Barrow?".

"Sim, aquela boa senhora mandou a você uma cesta enorme de coisas comestíveis.

Aparentemente você está vivendo nas condições mais medonhas em algum município

estrangeiro e poderá emagrecer até ficar puro osso”.

Harry sorriu amplamente. Essa era a Sra. Barrow, com certeza. "Mas como—onde

você a viu?".

"Em Grange, claro, onde mais?", Luke disse, esvaziando a cesta em uma mesa

próxima.

"O que você estava fazendo lá?".

Rafe revirou os olhos. "Eu sei que a sua caligrafia é horrível, querido menino, mas se

você nos escrevesse para informar que tinha se mudado, teria nos economizado a viagem”.

"Não que nós nos importamos”, Luke inseriu. "Ela cozinha como um sonho—não é

nenhuma desta tolice francesa que todo mundo é louco, mas comida real, para homens

reais. Francamente, Harry, eu estava louco para ficar lá. Aposto que você não nos

alimentará nem de perto como lá”.

"Não irei”, Harry confirmou enquanto despejava as bebidas. "E os farei trabalhar”.

"Trabalhar? Céus, quel horreur”, Rafe declarou. "Eu me lembro de como é trabalhar. E

não gosto disto. Faz com que a pessoa se suje”. Ele sacudiu seu buckskin8 imaculado com

dedos meticulosos e tentou manter o cintilar fora de seu olho.

"Fazendo muito estardalhaço, Rafe”, Harry disse com um sorriso. "Nenhum de nós já

se esqueceu do modo como você saltou no entulho que bombardeamos na igreja

espanhola. Você cavou direto por doze horas e era lama amarela da cabeça até o dedão do

pé”.

Rafe encolheu os ombros. "Isso foi diferente—havia crianças presas lá. E eu nunca

consegui tirar a lama miserável de minhas roupas. Ethan, você é um homem da moda,

apreciará minha posição”.

Ethan anuiu com a cabeça com seriedade. "Oh sim, senhor, eu concordo. De fato eu

bem lembro de uma vez quando não havia nenhuma criança presa nos entulhos de certo

monastério, nem quaisquer monges mas—", ele franziu o cenho pensativamente. "Aquele

não era você, não é. Não seria o senhor pegando uma picareta com tudo sob o sol quente

espanhol, não é?", ele piscou.

Rafe sorriu amplamente. "Ah, mas eu estava certo de que nós acharíamos aquele

vinho”. Ele suspirou. "Era soberbo, também, lembram? Queria que tivéssemos algum

agora. Vou precisar se você vai me tornar um escravo—oh!", ele apalpou o bolso e tirou

duas cartas. "Eu quase me esqueci. A Sra. Barrow me deu para entregar a você”. Ele as

passou para Harry.

Harry quebrou o selo e leu a primeira. "É do meu irmão, Gabe”, ele disse a eles. "Ele

virá à Inglaterra no próximo mês. Aparentemente Callie insistiu—não consigo imaginar o

porquê”.

8 Buckskin - couro suave, amarelo acinzentado que normalmente era feito de pele de cervo, mas atualmente é

feito de pele de carneiro.

Page 49: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Esposas fazem isto”, Rafe disse tristemente. "Insistir”. Ele estremeceu e bebeu

profundamente.

Harry despejou para o amigo outra taça de vinho. O irmão mais velho de Rafe, Lord

Axebridge, estava perseguindo-o para que ele fizesse um casamento com uma herdeira. O

irmão de Rafe estava casado e feliz, mas a esposa era incapaz de ter crianças, então era a

função de Rafe, como herdeiro do irmão, fornecer os herdeiros da próxima geração. E

encher os cofres da família.

O pobre Rafe tentava evitar o inevitável desde que voltara da guerra, relativamente,

incólume. Ele não apreciava o papel de cordeiro do sacrifício—não quando isso envolvia

casamento.

"Alguém mais está ‘vinu’ com eles?", Ethan perguntou inseguramente. "Os meninos,

talvez?".

Harry consultou a carta. "Sim, os meninos e vários homens da Guarda Real de

Zindarian—oh e a amiga de Callie, a Senhorita Tibby. Ela e Callie farão compras”.

"Isso explica”, Luke disse. "As senhoras sempre gostam de fazer compras. Não há

lojas em Zindaria—não como as de Londres. Quando eles virão?".

"Dezembro”, Harry disse a ele. "Vão ficar pelo Natal”.

Ele quebrou o selo da segunda carta, leu e engoliu em seco. Ele tomou um grande

gole de vinho.

"De quem é?", Ethan perguntou curiosamente.

"Minha tia Gosforth”, Harry disse. "Ela disse que achou várias possíveis noivas

elegíveis. E que eu devo ir a Bath semana que vem para me encontrar com elas”.

Capítulo V.

"Venha agora, Harry”, Tia Maude disse, "não faça rebuliço—eu preciso apenas de um

braço forte para me apoiar quando for subir naquela colina terrivelmente íngreme”.

"É um declive, mas eu posso ir buscar para você uma liteira, devo?", Harry sabia

perfeitamente bem o que sua tia queria dele, e um braço forte era o que menos queria. Ela

queria sua companhia no Pump Room9.

Harry abominava o Pump Room, com suas cerimônias, suas fofocas, o gosto

repugnante da água, e o pior de tudo, a comunidade de solteironas refinadas que olhava a

chegada de um homem jovem com a mesma excitação de uma raposa que entra em um

galinheiro. Só que Harry não se sentia como uma raposa; ele se sentia, sob os olhares

ávidos, como uma gostosa espiga de trigo.

E Tia Maude sabia disto também, amaldiçoada seja. Ela achava a coisa toda

incrivelmente divertida.

"Você não se ressentiria que uma mulher idosa e delicada te ajudasse, não é?", ela

disse com a voz melancólica.

9 Pump Room - uma sala em uma fonte de água mineral para beber águas minerais.

Page 50: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Delicada, é, Tia Maude? E quem foi que dançou a noite toda no baile de ontem à

noite?", Harry curvou as sobrancelhas. "Deve ter sido alguma outra mulher idosa e

delicada”.

"É porque eu dancei tanto que estou me sentindo tão delicada esta manhã”, a tia dele

respondeu com dignidade.

"Oh, foi a dança, então? Eu pensei que tinha sido o champanha. Quantas taças

foram?", o sobrinho respondeu sem pestanejar.

Maude, Lady Gosforth, segurou com força a cabeça e disse com aspereza, "um

cavalheiro não contaria”.

"Eu não contei”, Harry disse. "Perdi a conta”.

"Bem, se está sendo tão vulgar para se referir a isto”, a tia declarou, "você entende por

que preciso tanto dos poderes restaurativos das águas do Pump Room. E já que a única

razão de eu ter ido ao baile ontem à noite foi para ajudá-lo a procurar uma esposa, o

mínimo que você pode fazer é me escoltar”.

Era uma mentira deslavada. Nada no mundo poderia manter Tia Maude longe de

uma festa, mas Harry estava ciente de que ela havia passado por várias dificuldades por

causa dele. Ele suspirou e ofereceu o braço. "Tudo bem, mas apenas até a porta”.

"Tolice”. A tia disse triunfante e tentou não sorrir. "Você claramente sofre do fígado e

coisas assim. Você precisa beber da água daqui”.

"Eu não preciso”, ele responde rapidamente. "É uma coisa desagradável e eu não

consigo aguentar aqueles cômodos, cheios de gatos velhos e—", ele cessou bruscamente e

disse com a voz firme, "eu te escoltarei até lá, mas isso é o máximo”.

Ele estava de mau humor. Nos últimos três dias ele tinha feito tudo o que Tia Maude

pedira que fizesse: se vestido como um alfaiate tolo, sentasse, caminhasse e conversasse

diligentemente com filhas, seus pais e mães. Ele tinha sido tão agradável quanto possível

com um grupo de pessoas que nunca mais queria ver novamente.

Tudo tinha sido um completo desperdício de tempo. Ele não estava mais perto de

achar uma esposa apropriada do que na última vez em que tinha ido a Bath. Era pior, de

fato, porque na época ele não estava comparando cada maldita garota que encontrava com

ela.

Nell, Lady Helen Freymore, com sua aparência cremosa, pura e sua voz de mel.

Nenhuma menina que ele encontrara tinha um olhar tão claro quanto o dela, tal posse

tranquila de si mesma. E nenhum podia criar tal… fogo nele.

Mas Nell não o quis. Ela preferira ir para Londres para dar chá para alguma rica

dama, sem dúvida indulgente e velha. Nell preferira fazer serviços de rua para uma

senhora a se casar com Harry. E Harry estava a quilômetros de Bath procurando por uma

substituta que não o provocaria tanto quando ela fizera.

Então por que ele se sentia tão alvoroçado?

Tia Maude também não estava no melhor de seus humores. Ela continuou, "mas você

deveria. Eu olhei de cabo a rabo por meninas de classe-média elegíveis, mas você anda tão

arredio que não dá nenhuma chance a elas!".

"Eu dei uma chance a elas”, ele disse. "Não é minha culpa se elas não eram o que eu

pedi”.

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Ela deu uma palmada ligeira na mão dele. "Ora, ora! Eu achei para você três das

meninas mais encantadoras e você disse que elas são estúpidas—"

"Elas são estúpidas”.

Ela revirou os olhos para ele. "Meninas bonitas não têm que ser inteligentes, menino

irritante!", ela respirou fundo e continuou, "mas sendo uma tia amorosa, eu achei para

você mais duas moças inteligentes, alegres e notavelmente atraentes e ainda assim você me

disse que elas eram enfadonhas”.

"Elas eram”.

"Como você saberia? Você mal trocou uma palavra com elas também”.

"Eu fiz. A de cabelo preto gosta de gatos e odeia cachorros, e estava com medo de

cavalos. E a de cabelo loiro conversava sobre poesia e falava e falava sobre um tal de

Byron10”. Ele bufou.

A tia deu um novo tapinha no braço dele novamente. "Toda mulher na Inglaterra é

apaixonada por Byron, seu selvagem! É a moda! A falha não é nas meninas mas sim em

você. Alguém pensaria que você não quer se casar, mas já que essa obviamente não é a

verdade, a única explicação é que você esteja sofrendo do fígado. E um tratamento com as

águas vai curar isto”.

Harry fez uma carranca e então deu passos desiguais ao lado dela. "Eu te escoltarei

para o lado de dentro, mas não beberei nada daquilo”, Harry rosnou, "então pare e desista,

ou então caminhe pelo resto do caminho com o braço muito forte do seu criado

extremamente capaz”. Ele gesticulou para o empregado da libré que caminhava

silenciosamente atrás deles.

A tia fungou, mas não disse mais nada.

A entrada deles causou um notável alvoroço de interesse na população do Pump

Room. Harry não sentiu nem um pouco que fosse de lisonja—ele era o único homem no

cômodo abaixo dos setenta anos. Ele olhou para os bancos para a nobreza e marchou com

a tia através do cômodo, pretendendo acomodá-la e partir.

Levou mais tempo do que ele planejara, porque sua tia parava de meio em meio

metro para saudar conhecidos, mas eventualmente ele a sentou com um de seus

conhecidos com um copo da água repugnante na mão.

Ele estava a ponto de pedir licença para partir quando ouviu uma voz atrás de si

dizer, "Lady Helen! Que criatura desajeitada você é!".

Lady Helen? A cabeça de Harry virou e ele olhou fixamente através do cômodo. Era

ela, Nell. Que diabos ela estava fazendo aqui? Ela deveria estar em Londres.

Uma mulher ricamente vestida, usando um espartilho firme com aparência

extravagante estava falando com ela em voz alta, como se ela fosse meio lesada, dizendo,

"bem, não fique aí, menina, pegue isto de uma vez”.

10 George Gordon Byron, 6º Barão Byron (Londres, 22 de janeiro de 1788 — Missolonghi, 19 de abril de 1824),

conhecido como Lorde Byron, foi um destacado poeta britânico e uma das figuras mais influentes do Romantismo.

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Ele assistiu enquanto Nell curvava com sua graça habitual e pegava um xale do chão.

A boca dele secou. Ela estava exatamente a mesma coisa. Bonita. Mais magra, talvez. Ela

agitou o xale, examinou-o e o passou para a mulher.

Ela não olhou para Harry, muito menos olhou em sua direção, mas ele estava certo de

que ela sabia que ele estava lá. Ela não poderia não ter percebido a entrada que a tia dele

fizera.

"Não, não, sua garota estúpida!", a mulher recuou de maneira teatral. "Está sujo. Eu

não devo usar um xale sujo”. A mulher lançou um longo olhar de sofrimento em torno do

cômodo, claramente se exibindo para o público.

Nell permaneceu de perfil para ele, a cabeça erguida bem alta, como um camafeu

adorável, recebendo a reprimenda com uma expressão de indiferença tranquila.

Como ela ousava agir indiferente! Como aquela mulher ousava falar com ela daquela

maneira. Ele queria estrangular a vaca de cara vermelha.

Ele queria marchar através do cômodo e levantar Nell, levá-la de volta até Firmin

Court, cavalgar com ela pela floresta…

Nell disse algo baixo para a mulher extravagante.

"Não, não está perfeitamente limpo, não mesmo, Lady Helen”, a mulher declarou de

forma depreciativa, como um burburinho. "Fico surpresa que você tenha tais padrões

baixos. Corra para casa e vá buscar outro para mim. Vá de uma vez. Você não vai demorar

muito”. Ela agitou as mãos para Nell como se ela fosse uma criança ou um cachorro,

dizendo, "apenas não fique aí de pé. Apresse-se, Lady Helen. Já estou sentindo um pouco

de frio”.

Harry friccionou os dentes enquanto Nell tranquilamente dobrava o xale e se

apressava para a rua. Ele fez um movimento para segui-la.

A tia o agarrou pela manga firmemente. "Você não pode sair ainda. É muito

fascinante. Ela é o cogumelo cruel que eu estava te contando outro dia. Lembra?".

Nell voltaria, Harry se lembrou. Ela apenas traria outro xale para a vaca. Ele falaria

com ela então, quando ele estivesse mais tranquilo. Por um segundo ele quis estrangular

aquela mulher. Falando com Nell assim. Ele permitiu que a tia o puxasse para o lado dela.

A mulher extravagante alisou as saias com uma expressão satisfeita e olhou

complacentemente ao redor do salão. Ela deu uma olhada para Harry e sua expressão se

aguçou. Sem tirar os olhos dele, ela correu um dedo em torno do decote de seu vestido,

que emoldurava seios cheios, na fenda entre eles reluzia uma joia grande.

A tia dele fez um som rude sob a respiração. "Os ares que a mulher se dá! Se ela tem

uma idade, é ao menos quarenta. Você não se lembra da história?".

Harry vagamente se recordou de ouvi-la falando sobre alguma mulher imensamente

irritante mas muitas coisas ofendiam sua tia. Tia Maude falava muitas coisas: a história

havia passado batido. Agora ele desejava ter escutado.

"Faça-me lembrar”, ele disse, os olhos na porta.

"Ela se diz Sra. Beasley. Ela é uma viúva rica—o rumor é de que seu finado marido

fosse um fabricante de salsicha, mas ela mantém seu segredo de sua origem comum—ou

tenta. Como se ela não demonstrasse com cada palavra que diz”. Tia Maude bufou.

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"E a pessoa que deixou o xale cair?", Harry perguntou casualmente. Ele sentiu a tia

girar a cabeça e olhar fixamente para ele. Ele fingiu não notar.

"Ela não o soltou”. A amiga de tia Maude, Lady Lattimer se debruçou adiante. "Eu vi

a coisa toda. Aquela Mulher jogou-o deliberadamente no chão para poder culpar Lady

Helen injustamente”.

Harry cerrou seus punhos e se forçou a dizer com tom ligeiramente curioso, "Lady

Helen?".

A tia deu a ele um olhar pensativo. "A dama de companhia dela. Ela é Lady Helen

Freymore, a filha do desgraçado Conde de Denton—ele perdeu a propriedade no jogo e se

matou. A menina é muito pobre e muito sem graça para conseguir um marido, sem falar

do escândalo que o pai dela fez”.

A tia lançou à mulher extravagante um olhar depreciativo. "Criatura sórdida e vulgar!

Ela simplesmente adora ter a filha de um conde a seus pés e a chama o tempo todo, não

permite à pobre menina um momento de paz”.

"Como ela aguenta isto?", Harry murmurou.

Tia Maude deu a ele outro olhar penetrante, mas disse com voz aprazível. "Nenhum

de nós já falou com ela—La Beasley não permite, mas a menina parece enfrentar tudo isso

com calma”.

"Ela deve ser uma criatura simples”, Lady Lattimer disse. "A Sra. Beasley a deprecia a

cada palavra, ainda assim Lady Helen nunca perde as estribeiras. Ela apenas sorri, e as

humilhações passam por ela como a água passa pelas costas de um pato”. Ela agitou a

cabeça. "Nenhuma mulher de espírito aguentaria ser tratada assim por alguém de classe

social inferior”.

"Ela não é nada simples”, Harry se percebeu dizendo, então ciente do olhar de sua tia

nele, acrescentou, "pelo menos ela não parece… hm, pelo o que eu vi agora mesmo…"

A tia dirigiu a ele um olhar de descrença e disse com a voz provocante, "não, bem, ela

não poderia ser, claro. Do que você viu agora mesmo”.

Ignorando o olhar afiado e fixo da tia, Harry esquadrinhou o cômodo. Ele precisava

achar um lugar onde pudesse conversar com Nell, sozinhos, sem todos os olhos

observadores.

"Eu acredito que ela seja desesperadamente pobre”, Lady Lattimer continuou,

desavisada das sutilezas da situação. "Não tem literalmente um centavo em seu nome,

pobre menina”.

Harry viu duas portas além do salão. Ele se ergueu, dizendo, "Com licença, Tia

Maude, Lady Lattimer, eu devo ver algo…", e saiu andando a passos largos para

investigar.

Quando ele retornou, Lady Lattimer estava cochilando e a tia o observava com

expressão aborrecida.

"E pensar em todo o tempo que eu desperdicei com todas aquelas outras garotas”, Tia

Maude murmurou, batendo no braço de Harry enquanto ele se sentava.

Estava virando um costume. Ele tirou o braço do alcance. "Não sei do que você está

falando”.

Tia Maude bufou. Harry passou seu lenço para ela.

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Ela olhou fixa e friamente para ele além de seu longo nariz e romano. "Para que isto?".

"Pelos sons que você tem feito, está ficando resfriada”, ele disse a ela.

Ela o encarou e deu uma alta e depreciativa fungada. Ele sorriu languidamente e

guardou o lenço.

Ela deu uma olhada para sua amiga, que estava roncando suavemente, então disse

com a voz baixa, "então, há quanto tempo você conhece Lady Helen?", ela perguntou para

ele.

"Como você sabe?".

Ela deu a ele um olhar murcho através de sua lorgnette11. "Oh, me poupe—eu te

conheço desde que você era criança. Além disso, era óbvio. Eu jogo quase uma dúzia de

meninas sobre a sua cabeça e você nem liga, e agora, de repente, está perguntando oh-

muito-casualmente sobre a dama de companhia de alguém, uma menina sem graça e sem

atrativos da qual você não pode tirar os olhos. E você espera que eu acredite que apenas

acabou de colocar os olhos nela?".

Ele encolheu os ombros. "Eu a vi por aí”.

Houve um curto silêncio, então a tia disse, "é mais do que curiosidade casual, não é?".

"Talvez”. Harry admitiu depois de um momento.

Não era talvez, não mesmo, ele de repente percebeu. O atingira com a força de um

trovão agora mesmo, quando ele a viu através do salão.

Não havia "noiva apropriada" para Harry; havia apenas Nell. Ele não sabia como

acontecera, não sabia o porquê; ele apenas sabia que era assim.

"Você me disse que queria uma menina com origem completamente respeitável; uma

menina bonita, quieta, moral e de classe-média, de preferência com bens do falecido

marido”.

"Isso mesmo”.

A tia dele fez um som frustrado. "Além de ser sem graça como uma estaca, esta garota

não tem dinheiro, conexões, e foi destruída por um escândalo. O pai dela jogou tudo fora

com jogos, então morreu na estrada! Ao ar livre onde qualquer um poderia achá-lo. Elite

estarrecedora”.

"Sim, ele deveria ter escolhido uma morte mais elegante”, ele disse ironicamente. "E

ela não é sem graça como uma estaca”, ele disse irritado. Eram as roupas dela, ele

supunha. Tia Maude se fixava muito no jeito como as pessoas se vestiam. Ele passou as

mãos ao redor de seu colarinho apertado. "Se você olhar além daquelas roupas sem graça,

creio que a achará adorável”.

Ela o encarou por um longo momento em silêncio, então curvou as sobrancelhas de

modo bastante conhecedor. "Bem, bem, bem, eu nunca pensei em ver isto”.

"Ver o quê?", ele olhou para a porta impacientemente. Onde diabos ela estava? Ela já

tinha ido há bastante tempo.

Ela bateu levemente na bochecha dele. "Você está caidinho, é isso que está, meu

menino”.

11 Lorgnette, o primeiro tipo de lente exclusivamente para mulheres, criada no século XV. Tinha aros pequenos, ovais

ou redondos, e uma haste lateral com 20 a 50 centímetros de comprimento.

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Caidinho? Ele olhou fixamente para a tia. "Tolice”, ele murmurou. "Eu apenas… estou

preocupado com o bem-estar dela”. Ele estava preocupado, também. Nell parecia exausta,

como se estivesse trabalhando muito. Havia ainda aquelas sombras sob seus olhos. E ela

estava mais magra.

Ele percebeu que estava com os punhos cerrados com frustração. Como aquela vaca

ousava se sentar lá tão satisfeita consigo mesma e confortável, enviando Nell correndo em

torno da cidade para cumprir suas incumbências.

"Como você a conheceu?".

"A propriedade que eu comprei era uma das propriedades secundárias do pai dela”,

ele disse a ela. "Ela estava lá quando eu a inspecionei”. Ele manteve os olhos na porta.

"Onde diabos ela está? Ela já foi há muito tempo”.

"É um passeio de dez minutos até o local onde está alojada aquela mulher. Tenha

paciência”.

Ele fez uma carranca e cruzou os braços.

"Apenas olhe para o seu estado!", tia Maude agitou a cabeça. "Teria me poupado

muito aborrecimento se você me tivesse dito sobre ela desde o começo, Harry”.

"Eu não sabia que ela estava aqui”, ele confessou. "Ela disse que iria para Londres”.

"Então por que você não foi para Londres em vez de desperdiçar meu tempo?", tia

Maude disse com aspereza.

Ele hesitou e então disse com tom baixo, "Porque ela já me rejeitou”.

Tia Maude soltou sua lorgnette. "O quê? Aquela menina—aquela solteirona sem graça

sem um centavo em seu nome ou um amigo no mundo—te rejeitou? E escolheu viver com

La Beasley?".

Harry friccionou os dentes. Ele não se sentia exatamente lisonjeado, também,

especialmente quando ele não podia entender por que ela o havia rejeitado. Ele se

lembrava do que ela dissera sobre beber chá e ler em voz alta para uma doce idosa e tentou

abafar uma onda de satisfação ignóbil. Como ela estava errada. Ela deveria tê-lo escolhido.

"O que você fez para ela?".

Harry fechou a boca com um estalo. Nada no mundo arrancaria aquela história dele,

nenhuma alma viva. Ele sentia o rosto morno enquanto se recordava do modo como ele

tinha arrastado a filha do conde para seus braços e se extasiado em sua boca até que os

dois mal podiam ficar de pé.

"Nada. Eu fui perfeitamente cortês”, ele disse frio. "Fiz uma oferta perfeitamente

correta”.

"E ela te rejeitou”. A tia dele riu. "Eu devo me encontrar com esta menina”, ela

declarou. "Há mais em Lady Helen Freymore do que os olhos podem ver”.

Nell segurou mais firme o xale e correu pela rua íngreme e de pedra, ignorando os

olhares surpresos dos transeuntes. O xale não estava nem um pouquinho sujo, claro, era

apenas um pretexto que a Sra. Beasley tinha usado para chamar a atenção para si mesma,

mas oh, Nell tinha ficado tão contente com isto. Uma escapatória.

Ela estava tremendo.

Page 56: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

O que Harry Morant fazia em Bath? De todos os lugares, por que justo no Pump

Room? Ele com certeza não poderia saber que ela estava aqui.

Bath tinha sido um desvio de última hora. A Sra. Beasley estava se sentindo mal e seu

médico recomendara a ela que a caminho de Londres parasse em Bath e fizesse um

tratamento com as águas. Elas estavam aqui há uma semana, e esta manhã a Sra. Beasley

anunciara que na segunda-feira elas partiriam para Londres.

Mais dois dias.

Mas Harry Morant a vira e ela podia dizer pelo rosto dele que ele não iria ignorá-la.

Ela o tinha observado pelo canto do olho o tempo todo, desde o momento em que ele

passara pela entrada com sua tia.

Um frisson de excitação feminina tomara o salão. Quem poderia culpar as senhoras,

ela pensou; ele era um homem tão bonito, tão alto, com ombros tão largos e tão… viril.

Ela ainda não podia acreditar que ele a pedira em casamento.

Ela quase ficara tentada—que mulher não ficaria? Mas fora apenas por um momento;

não havia realmente nenhuma escolha. Ela tinha que achar Torie.

E achar Torie acabaria com a mínima chance de casamento que Nell tinha.

Nenhum cavalheiro se casaria com uma esposa com uma filha ilegítima,

especialmente se a esposa não tinha fortuna ou beleza.

Harry Morant era ambicioso, um homem que estava determinado a subir na vida.

Mais importante, era um homem que tentava deixar seu próprio nascimento irregular para

trás.

Então ela não estava—não poderia estar—interessada.

Ela estava certa de que Torie estava em algum lugar em Londres. O pai de Nell

morrera no dia seguinte em que havia retirado o bebê dela às escondidas, e ele morreu na

estrada para Londres, então ele deveria estar voltando de lá.

Ela o enterrou na aldeia onde ele morreu. Ela vendeu o cavalo dele para pagar pelo

enterro; ela não tinha nem dinheiro para pagar para que ele fosse levado para casa. Ela

tinha tentado descobrir o máximo que podia sobre as circunstâncias da morte dele, e onde

ele havia estado antes, mas ninguém sabia dizer nada a ela.

Ela então viajara até onde podia em direção a Londres, questionando todo mundo

que encontrava no caminho. Várias pessoas viram-no voltando de Londres. Nenhum deles

o vira com um bebê em uma cesta forrada com cetim branco.

Ela procurou e questionou as pessoas desde o princípio da estrada de Londres até que

seu dinheiro dela acabara e ela vendera seu próprio cavalo. Ela manteve as idas, certa de

que as notícias de sua filha estariam na próxima casa, ou na próxima. Finalmente, sem

dinheiro algum e morrendo de fome e frio, ela percebeu que se não fosse cuidadosa

poderia morrer em uma valeta, ou em um cruzamento, como o pai dela.

E o que seria de Torie então?

Então, recusando-se a se desesperar, ela voltou se arrastando para casa, de volta para

Firmin Court. Ela tinha que chegar em casa e se preparar corretamente para a busca.

Então seu bebê deveria estar em Londres—em algum lugar. Nell estava determinada.

Não ficaria pedra sobre pedra. Ela procuraria até cair exausta.

Page 57: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela chegou ao quarto mobiliado da Sra. Beasley e se apressou para subir para buscar

outro xale. Ela teria que voltar para o Pump Room e enfrentar aqueles olhos cinza

esfumaçados.

Ela desejava que ele ficasse longe, mas ela não se sentia muito otimista. Ele iria causar

problemas, ela sabia até a alma. Ela viu o modo como ele enrijecera com o modo afrontoso

como a Sra. Beasley tinha ralhado com ela sobre o xale. Ele ficaria todo valente por causa

dela.

E se ele fizesse isso, seria um inferno para ela.

A Sra. Beasley gostava de ser o centro das atenções. Ela vivera sua vida até agora

como uma esposa virtuosa: agora estava pronta para se tornar uma viúva arrojada. A

crueldade dela não aborrecida Nell em nada. Haveria compensações. Ela mantinha Nell

sob seus acenos e a chamava a cada momento em que estava desperta, mas como a mulher

nunca se levantava antes do meio-dia, as manhãs de Nell eram totalmente livres.

Em Londres, Nell poderia usar estas preciosas horas matutinas para procurar Torie.

Poucas ocupações permitiriam tanta liberdade. Ela precisava—desesperadamente—manter

este trabalho, e não tê-lo ameaçado por um homem de boa-vontade que não tinha

nenhuma ideia de como as coisas realmente funcionavam.

Todos os sentidos de Harry se afiaram no momento em que Nell entrou

tranquilamente no Pump Room. Ela estava um pouco corada e seu peito subia e descia

rapidamente; ela tinha corrido. Ele franziu o cenho ao olhar para os seios dela. Ela parecera

bastante plana naquela região antes. Como ele não percebera aquelas curvas deliciosas

antes?

Ele sentiu o corpo ativo e apressadamente se forçou a se comportar. Ele estava no

Pump Room, pelo amor de Deus, com a tia ao lado.

"Aqui, querido, beba um pouco de água”. Um copo foi colocado em sua mão, e sem

pensar, ele o ergueu, colocou nos lábios e bebeu profundamente. "Argh!", ele conseguiu de

alguma maneira não cuspir a água nojenta da estância termal. "Isto é repugnante”.

Com um sorriso que dizia que estava satisfeita consigo mesma, Tia Maude removeu o

copo da mão dele. "Sim, eu sei, e você mereceu cada gota, meu menino querido, por me ter

feito passar por todos aqueles familiares. Eu quero te perdoar, mas—"

"Oh, você quer, é?".

"Sim, porque isso parece ser extremamente interessante, independente de qual seja o

resultado. Você sabe que ela não olhou nenhuma vez nesta direção? É muito antinatural.

Você acha que ela está fazendo isso por algum motivo?", ela sorriu para Harry

inocentemente.

Ele enrubesceu de volta, um gosto amargo na boca. "Isso não vai adiantar em nada

para ela. Tenho total intenção de falar com ela logo”.

"E eu suponho que você acha que apenas precisa atravessar o salão e começar a

conversar com ela. Você acha que aquela harpia12 não vai interferir?". 12

Harpia – em inglês pode significar uma mulher de mau gênio ou uma pessoa gananciosa, predatória; já na mitologia clássica, é

um monstro voraz com cabeça de mulher e corpo de um pássaro.

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Ele deu a ela seu um olhar frio. "Naturalmente eu tenho um plano”.

"Você realmente tem?".

"Sim, é uma simples questão de estratégia. Você e sua amiga Lady Lattimer irão

distrair o inimigo em uma conversa”.

"Vou, é? Que delícia. E sobre o que nós devemos conversar?".

"Eu não sei. Algum tipo de assunto feminino particular”.

"O que você sabe sobre assuntos femininos particulares?".

"Muito pouco, graças a Deus, mas isso dará a você uma boa desculpa para banir

Nell—"

"Nell?".

"Lady Helen”. Ele tentou ignorar o sorriso que brotara nos lábios da tia. Ela estava se

divertindo, maldita seja. "A questão é, você deve deixar claro para a mulher que deseja ter

uma conversa privada com ela e somente ela, e para isso você me enviará junto com Lady

Helen para outro cômodo separado. Deixe o resto comigo”.

Ela bateu de leve na bochecha dele pela segunda vez. "Que menino excelente,

querido. Posso ver por que você foi um soldado excelente. Apenas uma coisa”.

"Sim?", ele disse impaciente para começar.

"Seja cuidadoso. La Beasley tem interesse por você; ela tem te observado como um

gato que observa a saída da toca de um rato pelos últimos quinze minutos. Se ela perceber

seu interesse em Lady Helen, vai cravar as presas na pobre menina como uma serpente.

Então seja discreto, meu menino”.

"Eu sou sempre discreto”, Harry a informou friamente.

A tia de Harry se ergueu e agitou a amiga para acordá-la. "Venha comigo, Lizzie, nós

vamos conversar com La Beastley”.

Lady Lattimer voltou aos poucos a ficar consciente. "O quê? Mas eu não quero falar

com—"

"Tolice. Será uma aventura”, a amiga dela declarou. "Vamos salvar Lady Helen das

embreagens da górgona13”.

"Oh, nesse caso…", Lady Lattimer se ergueu e endireitou seu chapéu de renda. As

duas damas varreram o cômodo em direção a Sra. Beasley como dois navios da Armada

espanhola se lançando sobre um pequeno barco de pesca. As cabeças no Pump Room

giraram. A conversação zumbiu, e então houve um silêncio ávido.

Sra. Beasley assistiu a abordagem com fascinação congelada quando percebeu que

duas damas com títulos finalmente a notaram. Ela se ergueu de sua cadeira, sorrindo.

13 Górgona - em inglês a palavra pode ser utilizada para designar uma mulher avara, feia ou repulsiva. – E a palavra também

indica uma criatura da mitologia grega, representada como um monstro feroz, de aspecto feminino, e com grandes presas. Tinha

o poder de transformar todos que olhassem para ela em pedra, o que fazia com que, muitas vezes, imagens suas fossem

utilizadas como uma forma de amuleto. A górgona também vestia um cinto de serpentes entrelaçadas. A mais famosa da três

irmãs Górgonas é Medusa.

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"Sra. Um… ?", Lady Gosforth inquiriu, como se ela não soubesse muito bem quem era

a mulher. Ela nem mesmo olhou para Nell.

A mulher fez uma reverência. "Sou a Sra. Beasley, Madame, e você é Lady Gosforth”.

"Eu sei”, disse Lady Gosforth, inclinando a cabeça cortesmente.

Sra. Beasley riu. "É claro que já vi Lady Lattimer aqui antes. É uma presença regular”.

Lady Lattimer ergueu uma sobrancelha aristocrática com tal presunção da pessoa em

ousar notar sua regularidade e não o contrário. "Realmente”, ela disse com tom de voz com

raiva contida.

Nell estava de pé quieta de um lado. A Sra. Beasley não fez nenhuma tentativa de

apresentá-la. Ela deu uma olhada além das duas senhoras para onde o Harry estava a uma

curta distância, examinando uma gravura na parede.

"E seu amigo, o cavalheiro, se juntará a nós?", a Sra. Beasley perguntou.

"Não”, Lady Gosforth declarou. "Nós desejamos ter uma conversa privada com

você—de natureza feminina. Um cavalheiro não desejaria estar presente”.

"Entendo”. A Sra. Beasley pareceu vagamente alarmada.

Havia quatro damas presentes, contando com Nell, e apenas duas cadeiras. Lady

Gosforth gesticulou para a Sra. Beasley e para Lady Lattimer que se sentassem, e girou

para o seu sobrinho e disse, "Harry, uma cadeira, por favor”.

Harry trouxe uma cadeira para ela, e vendo que Nell ainda estava

desconfortavelmente de pé, ele estava a ponto de ir buscar outra cadeira quando sua tia

disse, "não, nós desejamos ter uma conversa privada com esta dama—por favor, ache

outra cadeira para sua companheira, Senhorita Hm…"

"Lady Helen—", começou a Sra. Beasley.

Lady Gosforth a cortou. "Ache para a Senhorita Hm uma cadeira ali em algum lugar,

Harry, e então saia também, e haja como um bom menino”. Ela acenou para que ele fosse

para longe e se voltou para a Sra. Beasley, dizendo docemente. "Meu sobrinho, sabe, é

muito jovem para ter qualquer interesse em damas da nossa idade”.

Já que a Sra. Beasley tinha uns quarenta anos bem conservados e como as duas

senhoras aristocráticas tinham seus sessenta anos, a Sra. Beasley tentou não parecer

afrontada pela sugestão. Ela conseguiu dar um sorriso estrangulado e assistiu, frustrada,

quando um dos homens mais magníficos que já vira oferecia seu braço para sua

companheira pequena e sem graça e a escoltava para um canto distante.

"Minha querida amiga Lady Lattimer estava admirando as suas joias”, anunciou Lady

Gosforth, chutando sua querida amiga no tornozelo.

"Oh—é, sim, suas joias”, Lady Lattimer disse com um olhar indignado para sua

querida amiga. Ela pegou uma lente e observou o arranjo vulgar de joias que eram

exibidas em várias partes do corpo da Sra. Beasley. "Há muitas, não é?", ela murmurou. "E

são muito, hm, brilhantes”.

Apesar da débil tentativa de elogio, a Sra. Beasley respondeu com um sorriso que

indicava que estava satisfeita consigo mesma. "Sim, o Sr. Beasley, meu finado marido,

encantava-se em comprar quinquilharias para mim”. Ela tocou um broche de rubi grande,

cercado por diamantes, aquele que descansava entre seus seios. "O Sr. Beasley costumava

dizer que as joias apenas realçavam a minha beleza”.

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"Fascinante. Conte-nos a história de cada uma”, Lady Gosforth a instruiu.

"Vá embora”, Nell sussurrou para Harry enquanto eles cruzavam o cômodo. Ela

estava muito ciente dos olhos que os observavam. "Saia agora e não converse comigo”.

Harry dobrou a mão dela embaixo de seu braço. "Eu pensei que você estava indo para

Londres”.

"Eu estava; ainda estou. Nós partiremos em dois dias”, ela silvou. "Por favor, apenas

vá embora. Se ela nos vir conversando—"

"Sim, ela, sua empregadora—o retrato perfeito de uma doce e idosa senhora… do clã

dos abutres”.

"Ela não me aborrece”.

"Ela me tira do sério”, Harry disse. "Como diabos você aguenta o jeito como ela fala

com você?".

Nell tentou retirar a mão do aperto dele e falhou, e disse intencionalmente, "pelo

menos ela não me xinga”.

"Não, mas ela fala com você como se você fosse um cachorro—pior do que um

cachorro. Você sente falta da Freckles, eu suponho”.

A mudança abrupta de assunto a pegou de surpresa. "Você viu a Freckles?".

Ele anuiu com a cabeça. "Ela vem da casa do vigário quase todos os dias, procurando

por você. Ela sente a sua falta”.

Ela mordeu o lábio. "Eu sinto falta dela, também. Sinto muito que ela seja um

problema”.

"Ela não é nenhum problema. Aggie a usa como desculpa para aparecer de vem em

sempre, apenas para nos vigiar. Em todo caso, meu companheiro, Ethan, gosta muito de

levar o seu cachorro para casa. Pessoalmente, eu não me importaria se a Freckles se

mudasse permanentemente lá para casa”.

Ela deu a ele um sorriso morno. "Ela é uma cadela adorável, não é?".

O aperto dele na mão dela aumentou. Ele parou como uma estátua e a encarou por

um longo momento.

Ela deu a ele um olhar intranquilo e deu uma olhada ao redor. O comportamento dele

estava chamando atenção não desejada para eles.

Ele pareceu perceber, e partiu como se nada estivesse acontecendo, dizendo, "se eu

soubesse que te veria aqui, poderia tê-la trazido para Bath para uma visita”.

Ela agitou a cabeça. "Não, logo ela vai se acostumar e parar de me pr—aonde você

está me levando?", um garoto em um avental segurava uma porta coberta com uma grossa

lã marrom que saía da área principal do Pump Room.

Sem uma palavra de explicação, Harry a guiou por ela. Ele empurrou uma moeda na

palma do menino, dizendo, "tenha certeza de que nós não seremos incomodados”.

Nell percebeu que se encontrava, no que parecia, com uma pequena despensa. "O que

você quis dizer com não sermos incomodados? Eu não vou ficar aqui com você!", ela

tentou se soltar dele.

"Você estava preocupada que a sua empregadora te visse conversando comigo”,

Harry disse enquanto fechava a porta e se debruçava contra ela. "Agora ela não irá”.

Page 61: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Havia uma janela que levava ao pátio da parte de trás ou algo do tipo. Nell olhou,

mas abandonou o pensamento de sair por ela. Seria ridículo, além disso, ela não tinha

nenhum medo de Harry Morant. Ela olhou para seu corpo alto, poderoso e seus ombros

largos. Seus grandes punhos estavam cerrados.

Ela cruzou os braços e o encarou. "Você claramente passou por muita dificuldade

para fazer esta reunião, então o que é que você tem a me dizer? Diga e me deixe sair. Eu

não gosto de ficar fechada em quartos pequenos contra minha vontade”.

Harry franziu o cenho. "Dizer a você?".

"Sim”. Ela esperou.

"Eu não deveria ter feito isto”, ele disse finalmente. "Forçando aquele… beijo em você

como eu fiz. Peço desculpas. Não queria ser desrespeito, mas isto não é desculpa. Eu te

tratei como uma mulher imoral”.

Ela corou, lembrando-se da cena no estábulo. Ele não estava simplesmente se

referindo ao beijo, ela percebeu. Era claro que ele percebera onde a mão dela estivera,

presa entre eles.

Mas isso não tinha sido intencional. Ele a tratara como uma mulher, e não como uma

mulher imoral. Ela tinha revivido aquele beijo, várias e várias vezes desde então.

"Eu não me im—", ela parou. Se ela dissesse que não se importava, ele poderia achar

que ela fosse nada modesta ou até um pouco promíscua. Ela procurou no escuro por uma

expressão apropriada. "Eu te perdoo", soara tão santo. "Está tudo bem”, ela disse. "Eu não

vou jogar isso contra você”.

A expressão dele abruptamente ficou vazia e ela de repente percebeu o que tinha dito,

lembrando como a mão dela inadvertidamente tinha sido apertada contra a carne excitada

dele. Segurando-a contra ele…

"Eu não queria ser tão literal—", ela ofegou. Ela apertou as bochechas quentes. "Oh

Deus”.

Ela deu uma olhada para ele novamente e seu rosto estava tão rígido que ela não

pôde evitar dar uma risadinha. "Eu estava tentando tanto demonstrar indiferença

sofisticada”, ela confessou. "Eu fiquei ponderando demais, não é?".

Ele relaxou com um remorso divertido nos olhos. "Acho que nós dois fizemos”.

Um silêncio pequeno caiu. "Bem, isto é tudo”, Nell começou. Ela estava bastante

ciente do tempo passando. E não queria arrumar problemas.

"Não, não foi por isso que eu te trouxe para aqui para dentro”, ele disse. "Eu nem

havia pensado nisso até agora mesmo quando você me perguntou o que eu queria te dizer,

e eu me lembrei de que te devia um pedido de desculpas”.

"Então, o que foi? Eu não tenho muito tempo, sabe”.

Ele olhou fixamente para ela para um longo momento, seus olhos esquadrinhando o

rosto dela de um modo que a fez ficar muito consciente. "Você não está dormindo o

suficiente”, ele disse finalmente.

Ela piscou. "Você me trouxe aqui para dentro para me dizer isto?".

As mãos dele surgiram e ele segurou as bochecha dela, balançando a cabeça dela

suavemente para a luz. "Você tem sombras escuras embaixo dos olhos”, ele disse

suavemente. "Elas são bonitas mas não deveriam estar aí”. O grande dedo polegar dele

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acariciou suavemente as maçãs do rosto dela. "E você está muito mais magra. Há buracos

aqui onde não havia antes”. O dedo polegar dele acariciou os buracos.

Nell engoliu em seco, a mente dela estava de repente em branco. Ela estava preparada

para uma discussão, até para ser intimidada, mas não para… para esta preocupação terna.

Ela não tinha nenhuma defesa pronta contra isto.

Ela olhava fixamente para os olhos cinza nublados. Ela podia cheirá-lo, cheiro limpo e

fresco de sua água-de-colônia de barbear, de linho limpo e o odor lânguido de café.

"Você precisa ser cuidada”, ele disse e sua voz suave e profunda passou por ela. "E eu

sou o homem para fazer isto”.

A palma grande e morna dele a segurava, e ela queria se debruçar nela, apertar-se

contra seu corpo grande, duro, tão forte e tão certo, e apenas deixá-lo assumir o comando e

fazer com ela o que ele queria. Seria tudo tão fácil, tão mais fácil, e ele era muito, muito

forte e atraente. E lindo. Aquela boca… tão tenra e tão perigosa…

Havia uma razão para que ela não devesse ceder a ele, havia uma razão para que ela

continuasse lutando, contra ele e contra ela também… mas agora ela não podia pensar em

qual era.

Lentamente, lentamente a cabeça dele se curvou em direção a ela. Ela sabia que

deveria se afastar, ou virar o rosto…

Mas a bochecha dela descansava na palma da mão dele e ela não conseguia se forçar a

puxá-la de volta, e aqueles olhos cinza lançavam um feitiço de tal forma que ela não podia

mover um músculo.

E ela estava cansada, tão cansada… cansada de batalhar contra o mundo, de estar só,

sempre só, cansada de resistir, e cansada de lutar consigo mesma. Um beijo não faria mal,

não é? Um beijo, apenas por conforto… para as noites frias que seguiriam… os lábios dele

tocaram os dela, ligeiramente a princípio, um sussurro morno de sensações e ela suavizou.

Ambas as mãos dele seguravam as bochechas dela, e ela se sentia como algo precioso

embalado naquelas palmas. Ele curvou a cabeça para abundantemente beijá-la, com beijos

leves como plumas. Ela realmente nunca havia sido beijada assim antes—certamente nada

como isto: ela tinha se preparado para uma tomada firme de sua boca, mas a doçura,

inesperada destas carícias suaves, fazia-a se derreter contra ele.

O olhar dele queimava no dela e ela fechou os olhos com a intensidade. Ela ainda

podia senti-los através de suas pálpebras, do mesmo modo que se sente o sol com os olhos

fechados.

Ele correu a língua ao longo da junção dos lábios dela. Com os olhos fechados, ela

sentiu cada toque mais intensamente do que nunca. Ele fez novamente, e de novo, e ela

tentou se agarrar aos ombros dele, estremecendo sem conseguir parar com as sensações

mornas e deliciosas que passavam por ela. Os lábios dela se separaram e ele a beijou com a

boca inteira, e ela estremeceu novamente com o gosto estimulante de café e de Harry

Morant em sua língua.

Ela o puxou para mais perto, amando a sensação dura e sólida dele contra ela. Ela

podia quase sentir o corpo inteiro dele contra o seu corpo; um poder firme e que a atava,

apertando-o contra ela, nela.

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Ela o beijou de volta como ele a beijou, como uma tentativa a princípio, então mais

confiante, saboreando-o com sua boca e língua do mesmo modo que ele a saboreava.

Ela deslizou os dedos pelos cabelos escuros e espessos, amando sentir os ossos duros

e magníficos embaixo, e enquanto a língua mergulhava nela, ela arqueou contra ele e

puxou um punhado de cabelo, puxando-o para mais perto.

Ele gemeu e a puxou firmemente contra ele.

"Volte para casa comigo”, ele disse. "Venha para Firmin Court e case-se comigo. Você

não pertence a este tipo de vida. E você odiará Londres”.

Chocada, ela se soltou do abraço dele. Ela cambaleou para trás contra a parede. A

sensação do tijolo áspero e frio contra suas palmas a firmaram. "O que você disse?".

"Eu te perguntei se você quer se casar comigo”. Ele franziu o cenho. "Não deveria ser

uma surpresa. Eu já te pedi antes uma vez”.

"Sim, mas não tinha sido a sério”.

"Eu estava sendo sério”. Ele ergueu a mão dela e beijou no centro de sua palma. "Você

não se lembra?".

Os dedos dela se enrolaram com a memória. As bochechas queimaram. Ela levou a

mão para longe. Claro que ela se lembrava. Ela não iria, não poderia se esquecer. "Você só

me encontrou duas vezes”.

Ele agitou a cabeça. "Três vezes—houve a vez na floresta, lembra? Mas duas vezes foi

o suficiente”.

Ela não podia suportar. "Você não sabe nada sobre mim e já quer se casar comigo?".

"Sim”. Não houve nenhum vacilo.

Ela olhou fixamente para ele, confusa. Ela tinha uma escolha clara; ela poderia se

casar com Harry Morant—o homem mais bonito que já encontrara na vida. Ele a queria.

Ele deixara isso mais do que claro; a impressão de seu desejo ainda queimava às vezes

contra a palma de sua mão.

E ela o queria; os joelhos ficavam fracos ao vê-lo.

Ele a queria e tinha dito entre linhas que cuidaria dela. Ele faria isso, ela sabia. Era

mais do que já tinham oferecido a ela na vida.

Mas ela não podia voltar para Firmin Court, não sem Torie. Já era incrível o suficiente

que este estranho moreno e intenso quisesse Nell em tão pouco tempo. Mas Torie,

também? Dificilmente.

O próprio avô de Torie não a quisera.

Ela respirou fundo e tranquilamente disse, "Sr. Morant, estou profundamente

honrada pela sua oferta—mais do que poderia dizer—mas devo recusar. Eu sinto muito.

Não posso retornar a Firmin Court. Apenas não é possível”.

"Por que não?", ele perguntou abruptamente.

"Eu não tenho que explicar”, ela disse a ele. "Um não deveria ser o suficiente para

qualquer cavalheiro”.

Ele cruzou os braços e se debruçou contra a porta. "Talvez, mas eu não sou um

cavalheiro”.

Ela tentou pensar em como explicar. Ela não podia contar a ele sobre Torie, não

depois do pai dela ter passado por tanta coisa para protegê-la do escândalo de sua

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gravidez. Não. Quanto mais pessoas soubessem, mais fácil do segredo vir à tona. A filha

dela não seria rotulada como uma criança da vergonha.

Nell tinha tudo planejado. Assim que ela achasse Torie, iria levá-la para alguma parte

distante do país onde ninguém a conhecesse e fingiria ser uma viúva com uma criança.

Torie nunca saberia das circunstâncias a cerca de seu nascimento. Apenas três pessoas

saberiam, e uma deles estava morta.

"Acredite em mim, Sr. Morant”, ela disse, "você ficará melhor sem mim”.

"Eu serei o juiz da questão”.

"Não o único juiz, eu digo. A escolha está comigo, e vou para Londres com Sra.

Beasley. Nada que você possa dizer mudará a minha ideia”.

Ele fez uma carranca. "Ela tem algo contra você?".

"Não, claro que não. Mas o emprego e muito conveniente para mim”.

"Conveniente?", ele disse ferozmente. "Duas semanas na companhia dela e você está

mais magra do que nunca. Seus olhos estão sombrios e você não pode me dizer que ela não

é uma tirana com você. Ela a trata como uma camareira ou uma imbecil na frente de

pessoas com posição social inferior a sua. Conveniente? Ser enviada correndo para lá e

para cá sob o comando de uma harpia?", ele segurou o queixo dela e sua voz aprofundou.

"Por estar parecendo tão terrivelmente exausta quando deveria estar florescendo?".

Um bolo se formou na garganta dela com as palavras dele, mas ela foi para trás. Ela

tinha que resistir. Por Torie. "Isso não me aborrece”.

"Bom, mas isso me aborrece demais”.

"Mas isso é com você, não é?", ela disse tranquilamente. "Agora você vai me deixar

sair ou eu devo gritar?".

Reconhecendo o aço na voz dela, ele relutantemente foi para o lado.

"Sim, Harry, isso foi maravilhosamente discreto, concordo”. Tia Maude disse

enquanto ele caminhava ao lado de sua liteira a caminho pela subida da colina. "Eu

particularmente admiro o modo como você se arrastou através do quarto, fez uma pausa

de dez segundos na qual olhava fixamente para a menina como um canibal morto de fome

como se fosse se jogar sobre ela—houve apenas uma pessoa que não percebeu, diga-se de

passagem—e então você a rebocou para aquele quartinho longe das vistas. Estava me

perguntando por que você nunca pensou em se juntar ao corpo diplomático do exército,

como o seu irmão, Nash”.

"Meio irmão”, Harry rosnou indo para o lado da cadeira. "E certo, talvez eu não fui

tão discreto quanto planejei ser, mas aquela garota … mexe comigo”. Essa dificilmente era

a expressão, mas não havia palavras para ele que definissem o que Nell Freymore

significava para ele.

"Sério? Eu nunca notaria”, a tia disse secamente.

Apesar de sua frustração, os lábios de Harry contraíram.

"Assim é melhor”, ela disse. "Agora em vez de pisar como um urso, eu sugiro que

você pense um pouco melhor no que quer desta menina, e o porquê. Você não acha que ela

apenas te recusada por que você está tão determinado a procurá-la? Imagino que você não

tenha levado muitas respostas negativas antes”.

Page 65: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Só essa”, Harry disse, "se nós estivermos falando sobre casamento”.

"Oh sim, o incidente de Lady Anthea”.

Harry friccionou seus dentes. "Nell não é nada como ela”.

"Não, em aparência não—Lady Anthea pode ser uma bruxa no coração, mas ela era e

ainda é de uma beleza atordoante. Considerando como esta menina é uma pequena coisa

sem graça, mas doce quando sorri. E com olhos bonitos, como você disse. Ela poderia ficar

boa com roupas adequadas, em minha opinião”.

"Isso não tem nada a ver com Anthea”, Harry retrucou, aborrecido com a implicação.

"E Nell não é nada sem graça: como você disse, são apenas as roupas”.

"Independente de qualquer diferença sobre a aparência, o fato que ambas são filhas

de conde, permanece”, a tia disse, franca como sempre. "Exceto pelo fato do pai dessa

menina não estar vivo, e não ter irmãos que poderiam te dar chicotadas”.

Harry cerrou os dentes com o modo direto que a tia dele se referira a maior

humilhação de sua vida.

A tia estendeu as mãos através da cortina da liteira e pegou o braço dele. "Esteja certo,

Harry, antes que você faça papel de tolo, de que sua perseguição a Lady Helen não seja

algum tipo de desejo profundo de provar a si mesmo e todo o mundo que você pode se

casar com a filha de um conde”.

Ele olhou para ela em choque. "Não é”, ele disse automaticamente, mas para dizer a

verdade, não estava muito certo. Nell havia perguntado a ele a mesma coisa, só que não da

mesma maneira. E ele admitia; parte de sua atração de tê-la como esposa, era por causa de

seu título. Ele apenas nunca tinha associado isto com o que sua tia chamava de o

"Incidente de Lady Anthea”.

Eles alcançaram a casa da tia e Harry ajudou-a a descer da liteira e pagou aos

carregadores.

No corredor, Tia Maude disse, "então você não está bem certo sobre seus motivos

para querer Lady Helen?".

"Não tem nada a ver com aquela história”. Anthea era história antiga.

"Você está apaixonado por ela então”.

"Apaixonado? Não!", ele acrescentou firmemente, "Bom Deus, não”, no caso de ela

começar a ter ideias peculiares. Ele se apaixonou uma vez, e não tinha sido assim, graças a

Deus.

Ela parou e curvou uma sobrancelha.

"É conveniente, isto é tudo”, ele explicou.

"É conveniente procurar uma garota destituída cujo pai a deixou com nada além de

escândalo durante o transcurso, uma garota que te recusou duas vezes ao preferir

trabalhar com uma harpia—conveniente?".

Por um momento, Harry não soube o que dizer. Ele não poderia dizer a tia de meia-

idade e viúva que ele estava motivado apenas pela luxúria e nada mais. Mas sua tia estava

esperando e vira como ele ia atrás de Nell, ele devia algum tipo de explicação à tia.

"Ela precisa ser cuidada”, ele disse.

"Concordo, assim como metade da população da Inglaterra. E no caso de você não

notar, ela está empregada, o que metade da população não está”.

Page 66: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Isso era verdade. Mas ele não conhecia metade da população, e ele tinha ficado

irritado com as sombras escuras sob os olhos de Nell. Mas de alguma maneira ele não

podia explicar isso para sua tia.

O sentimento que ele tinha por Nell, não podia explicar ou nomear. Tudo o que ele

sabia era que ele não era amor.

Ele conhecia o amor. Ele nunca mais se deixaria cair em suas redes novamente.

"Ela é boa com cavalos”, ele ofereceu finalmente.

Tia Maude olhou fixamente para ele por um momento, então fez um barulho meio

abafado. "B-boa com cavalos, é claro”. Um riso sufocado escapou. "Por que eu não pensei

nisto antes? Boa com cavalos. Justamente o que um homem procura em uma esposa”. Ela

puxou um lencinho de renda de algum lugar. "Oh, Harry, menino querido, a vida era um

tédio tão grande antes de você vir me visitar”. Ela foi para longe, enxugando as lágrimas

dos olhos, risos contidos flutuando por onde ela passava.

"Vou sair para um passeio a cavalo”, Harry disse atrás dela. "Não estou certo de

quando voltarei”. Ele se sentia como se estivesse amarrado em uma camisa de força.

Precisava se livrar de um pouco de energia.

Ela parou nos degraus e olhou de volta. "Você vai ficar até sábado, não é? Você havia

sido convidado para jantar com os Anstruthers, e eu recusei porque você havia dito que

tinha que voltar para Firmin Court no sábado”.

Harry enrugou a sobrancelha. "É mesmo?", ele se lembrava perfeitamente bem. Ele

dissera a ela que estava se sentindo sufocado por suas noivas potenciais. Antes de saber

que Nell estava em Bath.

"Sim, você disse que não podia deixar todo o trabalho para o Sr. Delaney”.

"Há limite pra o que se pode fazer nesta época do ano”, ele mentiu. "Então eu ficarei

aqui por mais alguns dias”. Pelo menos até que Nell partisse para Londres. "Mas deixe o

convite dos Anstruthers como está, obrigado”.

"E quanto ao Sr. Delaney?".

"Oh, Ethan conseguirá se virar. Ele é muito capaz. Não há nada que ele não possa

fazer”.

Capítulo VI.

Ethan Delaney estava debruçado, suando, sobre uma folha de papel coberta com

borrões e papéis amassados. Ele murmurou maldições sob a respiração enquanto lutava

com a caneta. Era tão mais difícil agora que ele estava vivendo em Firmin Court. Em

Grange ele podia se consultar com a Sra. Barrow sobre uma palavra ou outras.

De alguma maneira, ele não se importava que as mulheres soubessem. A Sra. Barrow

era uma faladora, mas nunca havia falado uma palavra de seu pequeno problema a

nenhuma outra pessoa.

Agora era um problema, não havia ninguém com quem ele pudesse perguntar aqui.

Ele tentou novamente. Não. Estava errado, estava certo disto. Ele soltou a caneta com

desgosto. "’Ce’ é um tolo, Ethan, e nunca mudará”.

Page 67: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ao lado dele houve duas batidas de rabo de um cachorro. Ele deu uma olhada para o

lado. "É, Freckles, isso é típico seu, a sua vida é tão fácil. Duas casas para viver e você pega

restos de duas cozinhas. E eles chamam isto de vida de cachorro”.

Ele dobrou o papel e colocou no bolso em seu peito. Ele nunca deixava suas tentativas

abandonadas para que alguém as visse.

"Vamos, cachorro, a noite está caindo. Eu te levarei de volta para o vigar—", ele

cessou bruscamente. O vigário… Um vigário era como um padre, não é?

Ele tinha apenas que perguntar…

Ele assobiou para o cachorro e partiu para o vigário com o passo vivo.

Aggie o saudou calorosamente na porta. "Uma boa xícara de chá, Sr. Delaney?", ela

ofereceu, já agarrando uma pequena lata com folhas de chá. Já havia se tornado meio que

um ritual; Ethan devolvia Freckles à noite, tomava uma xícara de chá com a mulher idosa,

falavam sobre as novidades do dia e então ele ia para casa.

"Hm, não agora, Aggie, obrigado”, Ethan disse, sentindo-se um pouco desconfortável.

"Seria possível que eu visse o vigário?".

"O vigário?", Aggie disse com surpresa. Ele nunca tinha pedido para ver o vigário

antes. "Claro, senhor, eu irei e falarei com ele”.

Ela retornou um momento depois, dizendo, "Entre, Sr. Delaney. Ele o verá agora”.

Ela o conduziu até um estúdio roto mas confortável onde um fogo crepitava

brilhantemente. Os livros estavam em todos os lugares, enfileirados nas paredes, dispersos

sobre mesas e empilhados ao lado da cadeira do vigário. Havia também um bom tabuleiro

de xadrez com peças intricadamente esculpidas em ébano e marfim. Ethan não se

importaria de ter uma partida de xadrez.

O vigário se ergueu de sua gasta poltrona de couro quando Ethan entrou. "Bem-

vindo, Sr. Delaney”, ele disse com uma voz jovial e sacerdotal.

Ele era um homem magro, com seus setenta anos, com uma franja de cabelos

completamente brancos. De acordo com Aggie ele fora casado uma vez mas perdera sua

esposa no parto e nunca mais tivera vontade de casar.

Ethan agitou a mão do homem. Não poderia haver um contraste maior, ele pensou,

entre ele mesmo grande, cheio de cicatrizes, a mão áspera e esfolada e esta mão delicada,

elegante e branca do homem.

O vigário indicou uma cadeira e quando os dois se acomodaram, ele disse, "agora, Sr.

Delaney, como posso ajudá-lo?".

"Eu não sou da Igreja Anglicana”, ele revelou. "Eu nasci católico, mas não sou

religioso”. Ele olhou para o padre. "Isso importa?".

O homem idoso sorriu. "Não para mim. Estou aqui por todos os filhos de Deus”.

Ethan mostrou o rosto torto. "Não estou tão certo de que me chamaria de um filho de

Deus, senhor. Eu fiz um monte de—hm, coisas bastante ruins em ‘mim’ vida. Anos no

exército”.

"Você ainda assim é um filho de Deus”, o homem idoso disse suavemente.

"’Tavez’”. Ethan se moveu desconfortavelmente. "A questão é, eu ouvi dizer que

padres católicos não devem dizer o que lhes for dito em confiança. Eu não conheço muito

sobre padres protestantes, então—"

Page 68: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

O homem idoso se debruçou adiante. Seus olhos estavam profundamente fixos e com

um azul pálido, do modo que ficavam os homens que já tinham visto o mundo por muitos

anos. "Você está aqui para se confessar, Sr. Delaney?".

Ethan olhou para ele com horror. "Bom Deus, não!".

O homem idoso riu e se sentou de volta na cadeira. "Então o que é? Prometo manter a

sua confiança, desde que você não tenha burlado a lei”.

"Não, não é nada disso”. Ele deu uma olhada em torno do cômodo. "Eu estaria certo

se pensasse que o senhor é um homem educado não é, senhor?".

"Chame-me de vigário, ou Sr. Pigeon. E sim, eu fui estudioso um dia, mas já faz

muitos anos que não”.

Ethan respirou fundo. "Bom, eu não sou, Vigário—educado, quero dizer. Não dessa

forma. Nunca fui à escola, nunca aprendi a ler ou escrever, até que pedi a uma senhora

para me ensinar no ano passado”.

"Bom para você. Nunca é muito tarde”.

"Espero que não”, Ethan disse fervorosamente. "O meu problema é que ela foi viver

em outro país, e apesar de eu ter melhorado a minha leitura, minha escrita continua

horrível e a ortografia pior”.

O homem idoso anuiu com a cabeça. "Entendo. E o que é que você quer de mim?".

Ethan correu um dedo ao redor do colarinho. "Eu estava me perguntando, Vigário, se

você se importaria de me ajudar de vez em quando com a minha ortografia”. Ele deu ao

homem um olhar direto. "Eu não quero que ninguém mais saiba sobre o meu pequeno

problema, entende?".

O homem idoso não disse nada.

"Eu pagarei”, Ethan disse a ele. "Eu nasci num pobre pântano irlandês—e não me

envergonhado disso—mas estou tentando progredir e não desejo parecer um tolo no meio

de homens educados”.

"Ser negado a receber educação não é nada para se envergonhar, Sr. Delaney”, o

vigário disse, "e minha suposição é que você não seja nem de longe um tolo”. Ele juntou os

dedos e olhou pensativamente para eles por um momento, e então disse, "eu notei que

você ficou olhando para o meu jogo de xadrez quando entrou. Você joga?".

Ethan anuiu com a cabeça. "Um pouco”.

"Você aceitaria uma partida, Sr. Delaney?".

O homem idoso estava rejeitando-o suavemente ao mudar de assunto, Ethan decidiu.

"Sim, eu aceito uma partida, senhor”, ele disse fortemente. Ele tinha se confundido, ao

pensar que o vigário seria um homem iluminado. Ele era obviamente do tipo que

acreditava que um homem não deveria ser educado acima de sua classe. Ethan já tinha se

encontrado com muitos desse tipo em sua vida, especialmente no exército.

Ele foi buscar o tabuleiro de xadrez pesado enquanto o vigário limpava uma mesa

pequena e o colocou entre eles.

"Você primeiro”, o vigário disse, e com um encolher de ombros, Ethan fez seu

primeiro movimento. Havia um pequeno nó de raiva dentro dele pela rejeição

escorregadia e resolveu acabar com este homem idoso com mãos brancas suaves que

provavelmente nunca havia passado por um dia de trabalho duro na vida.

Page 69: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Não foi fácil. O vigário tinha uma mente manhosa, e apesar de seus modos tranquilos,

jogava de forma ofensiva, conseguindo surpreender Ethan mais de uma vez. A raiva de

Ethan foi lentamente apaziguada enquanto ficava cada vez mais preso no jogo. Duas horas

mais tarde a partida terminou com um empate.

O vigário encostou-se à cadeira com um suspiro longo, satisfeito. "Essa foi a melhor

partida que tive em anos, meu menino. Esse será o valor da taxa”.

Ethan olhou para cima. "A taxa?".

"Das suas lições. Você disse que estava disposto a pagar”.

"Sim, mas eu pensei—"

"Você está certo, claro, eu normalmente faria isto de graça. Faz muito tempo desde

que eu fiz algo tão útil, e gosto de ter alunos, mas agora que vi como você joga, não posso

resistir. Para cada lição, quero uma partida de xadrez”.

Ethan deu a ele um sorriso lento. "Bem, nesse caso, senhor, você me deve uma lição”.

Ele puxou a folha de papel do bolso. "Então se ‘importria’ de me mostrar os erros que fiz

aqui?".

O vigário retirou um par de pince-nez e esquadrinhou o papel depressa. Ele olhou

sobre as lentes dos óculos. "Uma carta para uma dama?".

Ethan sentiu seu rosto ficar morno. "Sim, senhor. Para a dama que me ensinou as

letras pela primeira vez”.

O homem idoso sorriu. "E você gostaria que ela se orgulhasse de seu aluno.

Excelente”. Ele leu um pouco mais e pausou. "E ela seria uma dama de idade avançada?".

"Não, senhor”.

Os olhos do homem idoso cintilaram. "Bonita, ela?".

"Ela diria que não, mas ela nunca se viu quando olha bem nos olhos de um homem e

dá a ele um daqueles seus sorrisos. Ela tem seu próprio tipo de beleza e tem modos leais e

amorosos”. Ele acrescentou desafiadoramente, "ela é uma boa criada de uma dama, e

muito acima de mim em classe, mas estou disposto a cortejá-la”. As pessoas não

aprovariam, também, Ethan pensou, mas ele não se importava.

As sobrancelhas brancas do vigário se ergueram. Ele deu uma olhada no endereço

atrás do papel. "O Principado de Zindaria? É muito longe. Um homem idoso pode

perguntar como você encontrou esta dama estrangeira?".

"Ela é tão inglesa quanto você, senhor. Ela era governanta da princesa de Zindaria,

que é uma mulher inglesa. Eu encontrei Tibby—a Senhorita Tibthorpe, quer dizer—em

Dorset, onde ela teve seu pequeno chalé acabado. Foi queimado, apesar de ela não ter

nenhuma culpa, e perdeu tudo. Pequena, ela é, mas tem muita coragem—", ouvindo a

própria voz desafinar com emoção, Ethan parou.

Por muito tempo houve apenas o crepitar do fogo no quarto, então o vigário falou.

"Sr. Delaney, você lembrou este homem idoso o que é ser jovem e apaixonado novamente.

Seria uma honra e um privilégio ajudá-lo a escrever cartas para esta boa e jovem mulher”.

Ele retirou um lenço e assoprou o nariz. "Agora, ponha o xadrez no lugar e traga-me o

conjunto de escrita. Devemos iniciar a carta imediatamente”.

Page 70: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Harry montava com Sabre nas colinas que tinham vista para Bath. Assim que os

campos se abriram diante dele, ele deixou o cavalo o conduzir. Sabre saltou adiante

avidamente, como se tivesse contido sua necessidade de aliviar seu mestre.

Harry se curvou para o pescoço do cavalo, persuadindo-o a ir mais e mais rápido,

glorificando-se com a velocidade e a sensação de ter uma grande besta poderosa sob si. Em

cima dele, estava livre de todas as estúpidas e insignificantes regras da sociedade. Sobre

ele, trovejando acima dos campos úmidos, ele podia pensar.

Ar frio e limpo esfregava sua pele, indo fundo em seus pulmões, fazendo seus olhos

se encherem com água e seu sangue cantar. Sobre um cavalo ele se sentia verdadeiramente

vivo. Ele seguiu seu caminho, inconsciente de tudo com exceção do ritmo da batida dos

cascos de Sabre sobre a relva pesada.

Com a primeira explosão de excesso de energia queimada de seu corpo por um

galope louco que fez seu coração correr, Harry diminuiu a velocidade de Sabre para um

trote fácil ao longo do cume da colina. Ele olhou para baixo, para a vista da cidade diante

dele. Por que as pessoas queriam viver assim, em filas e mais filas de casas juntas e

espremidas, olhando para mais filas e filas de outras casas juntas e espremidas? A maior

parte delas era construída com os fundos para as colinas, como se uma visão de prédios

fosse melhor do que a visão das colinas, das árvores e do céu.

Ele agitou a cabeça. Ele nunca quis viver em uma cidade. Já era ruim o suficiente ficar

preso a uma cidade pequena como Bath; ele odiaria ficar preso em Londres.

Estou indo para Londres com a Sra. Beasley. Nada que você possa me dizer ou fazer me fará

mudar de ideia.

Harry não podia entender. Ele poderia ter jurado que alguém como Nell, alguém que

amava cavalos e cachorros, se sentiria do mesmo modo que ele sobre a cidade. Ele se

recordava do modo como ela tinha virado seu rosto para a chuva, para o céu, na floresta

no primeiro dia, como se fosse um ato de adoração.

E ainda assim ela parecia totalmente determinada a viver em local lotado e sujo como

Londres.

Eu devo ir para Londres.

Dever? Por quê? O que havia de tão especial em Londres?

Harry suspirou. Ele não entendia as mulheres. Ele nunca tinha realmente entendido.

Ele nunca tinha perseguido uma mulher como esta antes—não com tão pouco

encorajamento. Encorajamento verbal, ele emendou. Os lábios de Nell falavam palavras de

rejeição mas quando ele a beijava, eles diziam outra história. Ela o queria. Mas queria

ainda mais ir a Londres.

Por que ele simplesmente não podia aceitar isto? Era falta de dignidade ir atrás de

uma mulher que o recusava. Não que ele estivesse apaixonado, afinal… Só que ela parecia

tão… perfeita.

E ainda assim por que ela era tão perfeita? Na maioria dos aspectos ela não era nada

parecida com o tipo de mulher jovem que ele havia descrito para sua tia como a esposa

ideal.

Tia Maude estaria certa afinal?

Page 71: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ele estava tão fixado em Nell porque queria provar que poderia se casar com a filha

de um conde? Por causa do que aconteceram todos aqueles anos atrás com Anthea?

Será que não?

E pela primeira vez em anos, Harry se viu pensando—deliberadamente—em

Anthea… a mulher que o havia ensinado como era se sentir apaixonado.

Lady Anthea Quenborough tinha vinte e um anos de idade, um brinde da elite, e a

criatura mais adorável que Harry já vira na vida. Com apenas vinte anos, ele ficou

impetuosamente apaixonado pela primeira vez na vida—cegamente, apaixonadamente,

obsessivamente.

Lady Anthea era apenas alguns meses mais velha do que Harry em idade, mas tinha

décadas a mais em experiência, porém ele não tinha percebido isto na época.

Ele era novo em Londres, e apesar de conhecer muitos homens jovens da elite, foi sua

primeira experiência com uma dama adequada. Lady Anthea era uma beleza dourada, um

diamante de primeiríssima qualidade, aristocrática, rica, e mimada; a filhinha mimadinha

de um pai devoto e irmãos protetores. Alguns dos homens mais notáveis da elite

fervilhavam ao redor dela, cortejando-a, competindo por seus favores.

Para o encanto atordoado de Harry, ela o escolhera.

Foi um romance como um vendaval; dentro de quinze dias ela o havia admitido em

sua cama. Ela tinha sido a primeira mulher dele.

Com a própria mãe como exemplo, Harry tratara as meninas da aldeia local

cautelosamente—ele paquerara, beijara e abraçara um pouco, mas nunca se deixara perder

controle o suficiente para se comprometer com elas. No dicionário de Harry, se

comprometer com uma garota queria dizer casar-se com ela, e ele não estava interessado

em casamento.

E então ele encontrou Lady Anthea Quenborough… delicada, perfeitamente linda

com cachos dourados e enormes, olhos azuis inocentes…

Ela o seduziu em um baile, levou-o até uma sala de espera pequena, ela fechara a

porta, e então prosseguira com a sedução em um sofá. Deslumbrado com a beleza dela, em

uma névoa de luxúria e amor, ele nem sequer pensou em resistir, e eles fizeram duas vezes

no sofá e uma vez no chão.

Tola e ingenuamente, ele imaginara que havia sido a primeira vez dela também.

Na manhã seguinte ao baile, ele a pedira em casamento. Ela rira e dissera a ele que

não fosse tolo. E então ela o seduzira novamente, desta vez em sua carruagem.

Depois de mais duas semanas, ele decidiu—que jovem tolo ele fora—que estava se

aproveitando dela e que deveria fazer a coisa honrada. Ele se apresentou ao pai dela, o

Conde de Quenborough, usando suas melhores roupas e com um colarinho tão apertado

que achava iria sufocar. Ele tinha ficado tão nervoso…

Ele estava certo em se sentir daquele modo, mas não pelas razões que imaginara.

Ele falara sem pensar que amava Lady Anthea e que ele acreditava que ela o amava, e

que eles queriam se casar.

"Realmente”, Lord Quenborough disse com um acento gelado. "Devemos ver o que

minha filha tem a dizer sobre isto”. Ele tocou um sino e mandou buscar a filha e seus dois

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filhos. Como havia parecido longo o tempo, aquele período mudo de espera, com o frio e

orgulhoso conde encarando Harry como se ele fosse um besouro.

E finalmente Anthea chegou, vestida de branco, com uma tira azul que combinava

com seus olhos e com o ouro dos cachos de seus cabelos. Harry nunca a vira mais bonita.

"Sim, Papai?", ela disse, tão inocente quanto uma ovelha.

"Este incapacitado bastardo disse que quer sua mão em casamento”, o conde disse.

"Ele diz que você o quer, também”.

Ela arqueou as sobrancelhas delicadas cor de ouro escuro. "Casar com Harry Morant?

Onde que você tirou essa ideia tão absurda?".

Quenborough apontou com o queixo para Harry. "Dele”.

Ela nem olhou para Harry. Ela fez beicinho de um jeito que ele antes achava

encantador. "Isso é aonde a generosidade te leva. Você dança uma ou duas vezes com um

aleijado e ele já pensa que você está apaixonada por ele”.

Harry ficou congelado com o choque. Era verdade que ele não dançava muito bem. A

perna ruim o deixava tímido na pista de dança, então ele a evitava o máximo possível.

Mas ele e Anthea fizeram amor enquanto "não participavam" das danças que ela

falara. Amor terno e bonito. Ou então ele acreditava.

Ela riu. "Lord, Papai, quando a hora chegar, eu escolherei um cavalheiro—um com

todas as partes funcionando, obrigada”.

O conde anuiu com a cabeça. "Foi o que eu pensei. Vá, minha querida”. Ela deixou o

cômodo sem dar uma olhada para trás.

Harry fechou os olhos, tentando expulsar a memória do que acontecera a seguir.

"Seria melhor nós ensinarmos a este novo-rico presunçoso uma lição, meninos”,

Quenborough disse.

Com a ajuda de um par de criados robustos eles bateram em Harry que quase perdeu

os sentidos e o arrastaram do cômodo. Eles o levaram para os estábulos e quase o

desnudaram, arruinando suas melhores roupas. Então o pai e os irmãos de Anthea se

revezaram para chicoteá-lo. Completamente.

Determinada hora, Harry abrira os olhos e vira Anthea espiando da entrada. Por um

segundo ele imaginara—que tolo ele fora!—Que ela correria para ele e pararia o chicote,

clamaria que o amava, que havia sido tudo um engano.

Mas ela ficou muda, assistindo com os olhos brilhantes e um sorriso que ele nunca

esqueceria…

Finalmente eles o soltaram, meio nu e sangrando muito, nos degraus dianteiros da

mansão de seu pai em Mayfair, então tocaram a campainha. Era o meio do dia. Pessoas

vieram olhar, mas Harry não conseguia se mover. Quenborough exigira que o Conde de

Alverleigh viesse até a porta.

Foi a primeiro e única vez que Harry vira o pai de perto. Ele abriu um olho inchado

com esforço e o olhou fixamente. Era como se olhar no espelho, apenas com trinta anos

adiante. Seu pai era a imagem dele mesmo e do irmão Gabe, apenas com o semblante

severo e rigoroso.

O Conde de Alverleigh estava nos degraus, seguido por seus dois filhos mais velhos,

meios irmãos de Harry, Marcus e Nash. Harry e Gabe os conheceram por pouco tempo na

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escola. Conheceu e odiou. Eles o encaravam, Marcus com uma expressão fria que Harry se

lembraria até o dia de sua morte.

"Creio que seja o seu bastardo , Alverleigh”, o pai da Anthea disse. "Nós tivemos que

ensinar a ele seu lugar”.

O pai de Harry deu um longo olhar a Harry, contundido, sangrando e de coração

partido, então disse as palavras que Harry nunca esqueceria ou perdoaria. "Glover”, ele

disse para seu mordomo, "há um lixo nos degraus da frente. Limpe”. Ele girou e foi para o

lado de dentro. Marcus e Nash o seguiram sem dizer uma palavra.

O pai e os irmãos de Lady Anthea partiram também, deixando Harry com as

clemências tenras de alguns criados que o levaram para os estábulos de seu pai, limparam

e mandaram-no para casa de sua tia em um cavalo alugado.

Logo depois disto Harry foi para guerra, sem ligar muito se viveria ou morreria.

Houve alguns momentos muito complicados, mas de alguma maneira seu irmão Gabe e

seus amigos cuidaram de Harry até que ele se recuperasse.

Ele renunciara ao amor e as senhoras da elite por toda a vida.

Então por que ele havia proposto para outra filha de um conde? Não tinha nada a ver

com Lady Anthea, ele estava certo.

Ele a vira no ano passado. Casada agora com Freddy Soffington-Greene, ela havia

aparecido na festa de casamento de seu irmão, enfiada em um vestido dourado, saindo de

metade dele.

Ele não sentira a menor pontada, ele tinha até se sentido meio repugnado por ter

ficado tão incrivelmente apaixonado por uma mulher tão óbvia. Vendo-a na companhia de

parentes e amigos de seus irmãos fizera Harry perceber como ele havia sido jovem aqueles

anos atrás… e como o amor o havia feito de tolo.

Ele amara Layd Anthea com todo o seu coração juvenil.

Comparar Nell com Lady Anthea era como comparar uma pomba a uma serpente.

Então o que quer que ele sentisse por Nell, não era amor. Era algo mais… ordinário, e

ainda assim… melhor.

Ele colocou Sabre em um galope novamente e montou a toda velocidade ao longo do

cume das colinas, movendo-se em um semicírculo em torno da cidade abaixo.

Tia Maude estava errada sobre os motivos dele querer se casar com Nell. Era apesar

do título, e não por causa dele, que ele a queria.

Ele estava certo disto… ou quase.

Um movimento abaixo atraiu seu olho. Uma figura pequena com um chapéu marrom

vinha caminhando vivamente ao longo de um caminho que corria entre uma parede de

pedra seca e um pequeno matagal. Havia algo familiar naquele chapéu. Nell usava um

muito parecido com aquele quando chegara ao Pump Room. Não ficava nada bem nela.

Ele se aproximou.

"Boa tarde, Lady Helen”, ele chamou.

Ela parou, então girou e abruptamente perguntou, "Sr. Morant. Está me seguindo?".

Ele franziu o cenho. "Não. Eu estava dando um passeio para respirar um pouco de ar

fresco. Presumo que você estava caminhando pela mesma razão”.

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"Estava”. Ela fez, menção de partir.

"Você não pode ficar e conversar por um momento?".

Ela hesitou. "Eu não posso ficar, só tenho uma hora mais ou menos livre para voltar

ao meu trabalho”.

"Posso caminhar com você?".

"Sim”, ela disse depois de alguma consideração, "mas apenas se você me prometer

não renovar a sua oferta. Ou, fazer qualquer outra coisa que me faça enrubescer”.

Ele sorriu amplamente. "Se você quer dizer beijá-la novamente, posso te lembrar que

existe uma parede entre nós”.

Ela corou. "Eu sei, caso contrário não teria concordado. Concordei em fazer uma

conversa em geral, e isto é tudo”.

"Dou a minha palavra”. Ele ergueu a perna acima da sela e soltou para o chão. "Nós

devemos caminhar e conversar de coisas em geral, e Sabre apreciará o que bem pode ser o

gosto da última grama fresca antes do inverno aparecer”.

Ela respirou fundo. "O ar é tão fresco e limpo aqui, não é?", ela deu mais alguns

passos e acrescentou, “pode ser meu último ar fresco por algum tempo. Vamos partir para

Londres amanhã”.

"Amanhã?", ele disse surpreso. "Eu pensei que você tivesse mais dois dias”.

"A Sra. Beasley está entediada em Bath. Ela crê que o entretenimento em Londres será

mais do seu gosto”.

Pelo tom de voz, ele estava certo de como ela se sentia como ele sobre a cidade. Ele

disse casualmente, "você não gosta de Londres?".

Ela deu a ele um olhar estreito, como se o advertisse de começar assuntos proibidos

novamente, e disse, "eu me lembro das névoas em Londres de meu debute, isto é tudo”.

"Odeio Londres”, ele disse. "Não vou lá se puder evitar. Não posso respirar lá”.

Ela não respondeu, apenas se debruçou sobre a cerca e assistiu Sabre comendo a

grama. Harry assistiu as expressões que passavam pelo rosto dela.

"Como eu adoraria apenas galopar pelos campos”, ela disse.

"Eu te levarei se você quiser”.

Ela mostrou um rosto cômico. "Ficarei na sua frente como um pacote, ou atrás como

uma bagagem? É um pensamento gentil, mas não, obrigada”.

Ele prontamente ofereceu as rédeas a ela. "Então monte por conta própria. Estou certo

de que você pode”.

Ela riu. "Naquela sela? Nesta saia? A quantidade de perna exposta seria indecente”.

A boca dele secou com o pensamento. “Você já montou a cavalo, então?".

"Quando eu era uma menina selvagem e grosseira”, ela admitiu com uma risada

coma a expressão culpada. "Eu tinha uma saia feita especialmente para isso e usava calças,

mas papai ficou horrorizado quando descobriu. Ele me fez prometer que nunca mais faria

isto”.

"E você nunca fez?”.

"Não. Eu prometi. Papai sabia que eu não quebrava as minhas promessas”.

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Houve uma ênfase leve na palavra "minhas”, Harry notou, como se as promessas do

pai dela fossem algo bastante diferente. E ele supunha, que se o homem jogara tudo fora,

elas seriam mesmo.

"Você ainda é uma garota”, ele a lembrou.

Ela fez um careta torta. "Não. Não, eu não sou. Quando eu era uma garota, era tão

inocente e ingênua. Eu pensava que tudo continuaria para sempre, da mesma maneira que

era”. Ela acrescentou tristemente, "eu vivia em um mundo de sonhos tolos, sabe; como

uma linda bolha de sabão cor de rosa”.

A bolha de sabão tinha virado uma bolha de queimadura, ele percebeu.

Ela suspirou. "Devo voltar. A Sra. Beasley foi para a cama com uma de suas cabeças,

mas ela estará de pé logo”. Ela cessou bruscamente com uma risada. "É assim que ela

chama a enxaqueca—'uma de minhas cabeças'—e cada vez que ela diz isto, eu a imagino

abrindo uma caixa e selecionando uma de suas várias cabeças”. Ela deu a ele um olhar

travesso. "Tolo, eu sei”.

Ele agitou a cabeça, incapaz de pensar em uma palavra para dizer. Quando ela olhava

para ele assim, com os lábios de um modo afetadamente bonito com alegria e os olhos

dançando, a única coisa que ele pensava era em saltar a parede e beijá-la até que ela

perdesse a consciência.

Ela desviou o olhar. "Sabre é uma criatura bonita. Posso dar um presentinho a ele?".

"Sim, claro, mas seja cuidadosa; ele não é sempre um cavalheiro quando o assunto é

comida”.

Do bolso da saia ela retirou um caroço de maçã ligeiramente amarronzado. Ela viu o

olhar dele e explicou. "Hábito de toda a vida, temo. Eu sempre guardo meus caroços de

maçã. Continuo esquecendo que não tenho mais cavalos”. Ela ofereceu a palma,

sussurrando em voz baixa, "Sabre, seu bruto bonito, olhe o que eu tenho para você."

A cada palavra Harry se sentiu enrijecendo. Graças a Deus havia uma parede entre

eles. Sabre respondeu quase avidamente, esticando a cabeça para cheirar sofregamente o

bocado. Harry manteve a mão no cabresto, por via das dúvidas, mas Sabre ergueu o caroço

delicadamente da palma da mão dela.

"Oh, que calúnia, você é mesmo um cavalheiro. Você tem bons modos, não é?", ela

disse ao cavalo, roçando seu nariz com uma mão e erguendo outra para arranhar suas

orelhas. "Você gosta disso, não é, querido?".

Harry estava tentado a assinalar que gostaria, também, mas sabia que ela iria embora.

"Esses modos bonitos são o resultado de muitas e longas horas de treino contra sua

própria natureza. A raça dele foi encorajada a morder as mãos de qualquer outro que não

seu mestre desde tempos imemoriais”.

Ela olhou para cima, uma sobrancelha enrugada. "Sua raça? Os únicos cavalos que eu

ouvi falar que ainda são criados para lutar são cavalos guerreiros de Zindarian, e eles

deveriam ser um mito”.

"Então um cavalo mítico acabou de comer seu caroço de maçã”, ele disse a ela.

Os olhos gloriosos dela se arregalaram. "Você quer dizer—", ela girou para examinar

Sabre mais detalhadamente. "Ele é diferente de qualquer outro cavalo que eu já tinha

Page 76: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

visto—lembro de tê-lo admirado desde a primeira vez na floresta. Ele é realmente um

cavalo guerreiro de Zindarian?".

"Sim, e há mais sete como ele nos estábulos em Firmin Court”. Harry não pôde

manter o orgulho fora de sua voz.

"Mais sete?", ela exclamou. "Como você conseguiu isto?".

"Meu irmão é casado com a princesa de Zindaria. Sabre foi um presente para mim.

Meu companheiro de negócios, Ethan Delaney, possui os outros sete. Ele se jogou na frente

de uma bala atirada contra o pequeno príncipe herdeiro e salvou sua vida. Como uma

recompensa o príncipe regente concedeu a Ethan o presente de escolher sete cavalos dos

estábulos Reais de Zindar pelos próximos sete anos”.

"Mas isso serão quarenta e nove cavalos de Zindarian”, ela ofegou.

"Sim, e ninguém tem olho melhor para cavalos do que Ethan. Ele escolherá o melhor,

e nós criaremos os animais mais rápidos de sangue puro inglês, nós queremos criar um

haras com reputação ao longo da Europa”.

"Cavalos guerreiros de Zindarian”, ela respirou. "Eu nem sequer acreditava neles até

agora. Sabre é muito rápido, vi quando você estava galopando com ele ao longo do cume

agora a pouco”.

"Sim, e planejo fazê-lo correr na próxima estação”. Então ela o assistiria, Harry

pensou, reprimindo um sorriso. E isso quando a atrevida o tinha acusado de segui-la

quando ele estava apenas montando.

"Oh, como eu adoraria ver todos os oito juntos”.

"Você poderá se voltar comi—"

"Por favor, não diga!", ela disse, cortando-o. "Você me prometeu que não iria propor

novamente”.

"Hoje. Sim, eu sinto muito”, ele disse sem estar arrependido. Como ele pensara, ela

estava encantada com a ideia do que ele e Ethan estavam tentando fazer. Então que diabos

ela estava fazendo ao ir para um lugar como Londres onde tudo seria tão rígido?

"Por que você está indo para Londres?".

Ela deu a ele um olhar estreito. "Estou procurando por alguém”.

"Um homem?".

"Não”.

"Quem?".

"Isso é da minha conta”.

Harry podia perceber que ela não seria mais específica. "Você está apaixonado por

algum outro homem?", ele se viu perguntando.

Ela parou e girou para mostrar uma carranca a ele.

"Eu não sou de quebrar as minhas promessas”, ele disse às pressas. "Apenas estou…

tentando conversar”.

"Conversar? Parece mais um interrogatório”.

"Desculpe. Eu não sou muito bom com conversas”, ele disse a ela.

Ela deu a ele um olhar duvidoso.

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"É verdade”, ele a assegurou. "Quando eu estava crescendo, tia-avó Gert costumava

me buscar, junto com meu irmão Gabe para ter uma 'conversa cortês' todos os domingos à

tarde. Era uma agonia. Eu era um fracasso miserável. Ainda sou”.

O rosto dela suavizou. "Sério?".

Ele anuiu com a cabeça tristemente. "Meu amigo Ethan me chama de toco de árvore.

Sabe, ele poderia arrancar palavras de uma panela de ferro. Ele é irlandês, e um contador

de histórias nato”. Ele sorriu refletindo. "Com as histórias de Ethan, os homens podiam se

esquecer de seus medos e de suas barrigas vazias…"

"Papai tinha esse dom, também”, ela disse depois de um momento. "Tanto charme…

e as histórias que ele podia contar… ele mesmo acreditava em suas histórias”.

Ela suspirou e caminhou. "Conte-me sobre o seu amigo Ethan”, ela disse.

"Ele é mais velho do que o resto de nós, mais ou menos quarenta anos, aparência feia

e bruta mas muito janota. Ethan é o tipo que emergia de uma batalha sangrenta com meia

dúzia de ferimentos e ruidosamente lamentava a ruína de seu colete”.

Ela riu. "Ele é o homem que estava com você na floresta, não é?".

"Sim, aquele era Ethan”. Encorajado pelo interesse, Harry continuou, "no exército ele

não era realmente um de nós; éramos oficiais e ele um sargento, oficiais e inferiores não se

misturam. Mas ele tinha a cabeça fresca e nós éramos jovens tolos e imaturos, e ele nos

salvou de cometer enganos desastrosos uma ou duas vezes. Eu sempre gostei de Ethan e

ele é um gênio com os cavalos, então depois que nós deixamos o exército, entramos nessa

sociedade, este empreendimento de criar cavalos-”.

"Você diz que ele é mais velho. Ele tem família?".

"Não. Ele diz que está fazendo a corte, mas eu não sei quem possa ser. Eu nem sequer

o vi com uma mulher desde a guerra. Como eu disse, ele não é nenhuma pintura a óleo—

não do tipo que as señoritas e mademoiselles pareceram se importar—mas a única mulher

com o qual eu o vi na Inglaterra foi—", ele cessou bruscamente, franzindo o cenho. "—

Tibby? Não, não pode ser”.

"Tibby?", ela iniciou.

"Senhorita Tibthorpe. Ela era a antiga governanta da minha cunhada”.

"Ela é velha?".

Ele agitou a cabeça. "Não. Ela é uma pequena solteirona afetada com rosto esperto,

bem no final dos trinta, e segura de si como nenhuma mulher que eu já tenha visto—", ele

olhou para Nell e acrescentou devagar, "mas com força suficiente para duas. Agora que

estou pensando sobre isto, eles passaram bastante tempo juntos no ano passado. Pensei

que era por causa dos meninos, mas..."

"Eu gostei de como a Tibby parece”, ela disse. "E gostei de como Ethan deve ser,

também”.

"Sim, Tibby é uma pequena desinteressante, e Ethan é um homem excelente—e o que

ele não pode fazer com um cavalo… simplesmente não pode ser feito. Mas não, Tibby está

em Zindaria. Não pode ser ela. Ethan sempre teve as amantes mais encantadoras; por que

ele gostaria de se casar com uma solteirona passada da idade que não é uma beleza? Ela

não tem onde cair morta, também”.

"Ela se parece muito comigo”, Nell disse tranquilamente.

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"Não, você é bonita”, ele disse distraidamente. "Mas Tibby e Ethan… eu me

pergunto…", ele caminhou, perdido em pensamentos.

Nell o assistia, um gosto agridoce na boca. Ele acabara de dizer que ela era bonita,

sem pensar, sem calcular, sem mesmo perceber…

Ninguém no mundo já havia chamado Nell de bonita. Exceto talvez a mãe quando ela

era um bebê. E o pai dela, claro.

"Eu, eu realmente devo ir agora”, ela disse rouca. "Espero que Tibby e Ethan

encontrem a felicidade”.

Ele girou com uma expressão apologética. "Eu sinto muito, fiquei te chateando com

pessoas que você nem conhece. Eu te disse que era um inútil para conversas”.

"Não, não, foi fascinante”, ela disse sinceramente. "Amei cada minuto”.

Os olhos deles se encontraram. Ela foi a primeira a desviar.

"Eu nunca tive uma chance com você, não é?", ele perguntou tranquilamente.

"Não. Eu sinto muito, não no modo como as coisas são agora”.

Ele olhou no rosto dela, como se tentasse encontrar o significado escondido por trás

do que ela tinha dito.

Incapaz de suportar a intensidade do olhar dele, ela abaixou os olhos. "Se nós

tivéssemos nos encontrado há um ano, então talvez…", ela fez um gesto fatídico. "Mas

agora, eu realmente tenho que ir. Nós sairemos amanhã de manhã”.

"Então essa é a última vez que eu a verei?".

Ela hesitou. "Sim. A Sra. Beasley exige mais uma visita ao Pump Room para

completar seu tratamento com as águas que seu médico prescreveu. Ela fará isso amanhã

cedinho e assim que pudermos, pegaremos a estrada”.

Ele anuiu com a cabeça bruscamente. Ele tinha um dia a mais. A menos.

"Foi uma honra te conhecer, Sr. Morant”, ela disse com um levíssimo tremor na voz.

Ela ofereceu a mão para ele acima da parede de pedra.

Os olhos deles se encontraram enquanto Harry girava a mão dela para cima e

colocava um beijo no centro de sua palma. Os dedos dela se curvaram ao redor da

mandíbula dela em uma levíssima carícia, então ela retirou a mão.

"P-por favor, dê meu amor a todos em Firmin Court quando você retornar e—", a voz

dela desafinou e ela continuou roucamente. "T-tome conta bem deles. E de si mesmo. A-

adeus, Harry Morant”. Ela girou e se apressou colina abaixo longe, desaparecendo em

minutos.

Harry montou Sabre pensativamente. Tudo o que ele aprendera sobre ela na última

hora apenas tinha confirmado o que já pensava há dias. Ela seria a esposa perfeita.

Não porque ela era a filha de um conde, mas porque ela era Nell.

Capítulo VII.

Harry achou duro dormir aquela noite. Nell ainda iria para Londres. Não era por

causa de um homem; ela dissera que não estava apaixonada por nenhum outro, e ele

acreditava nela.

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E a mulher Beasley não tinha nada que a prendesse, era apenas conveniente.

Harry chutou os cobertores que estavam embolados ao redor de suas pernas.

A única razão pela qual Nell estava indo a Londres era para achar alguém.

Ele podia achar essa pessoa. Ele podia ir para Londres.

E ele não a faria correr na chuva par fazer coisas para ele. Ele teria certeza de que ela

sempre ficaria morna, seca e confortável.

Ela não era indiferente a ele, ele estava certo. Quase certo. Bastante certo.

Tão certo quanto um homem poderia após ter sido rejeitado duas vezes.

Mas ela o beijara de volta aquela vez na despensa. Então ela o desejava.

E ele a queria com uma força que quase o fazia perder o ar.

Mais do que qualquer mulher em sua vida. Por qual motivo ela o afetava tanto, ele

não estava certo, ele apenas sabia que ela fazia. E todos os instintos dele diziam que ele

tinha que segurá-la, agora que a tinha achado novamente.

Seu instinto o manteve vivo durante anos de guerra. Ele tinha aprendido a não

questioná-lo.

Harry bateu em seu travesseiro decididamente. A solução era óbvia. Ele levaria Nell

para Londres e a ajudaria a achar quem quer que fosse que ela estava tentando achar. E

enquanto eles estivessem fazendo isto, ele descobriria o que a fizera dizer não a ele e… ele

consertaria isso.

Simples.

Contanto que ele conseguisse persuadi-la a ir para Londres com ele.

Ele não tinha sido muito persuasivo até agora, refletiu. Mas ele podia apenas tentar.

E droga, ele iria.

Elas iriam ao Pump Room cedo. Que horas seria cedo? Ao amanhecer, Harry decidiu.

Não, antes do amanhecer—o amanhecer era ao redor das oito, e ele tinha a ideia de que o

Pump Room abriria antes para o povo que não tivesse título. E talvez para as pessoas que

pretendessem sair cedo para Londres.

Ele levantaria às cinco da manhã então se barbearia e se vestiria. Ele queria estar em

sua melhor forma. O mínimo que fosse ajudaria.

A terceira vez é a da sorte, diziam.

As portas abriram às seis. Harry entrou e se sentou ao lado de uma coluna para

esperar. Uma quantidade surpreendente de inválidos passou por ele; estava claro que as

vezes que ele tinha vindo antes eram as horas das pessoas elegantes.

Ele assistiu as pessoas que mancavam, em cadeiras de roda, que eram levadas ou

sustentadas. Pobres coitados. Eles bebiam a água e partiam. Harry agradecia a Deus por

sua saúde e verificava de seu posto o relógio de bolso.

Elas chegaram às oito e meia. Sra. Beasley apareceu com um vestido escarlate

aveludado e usando um chapéu com flores suficientes para cobrir um sepulcro. Nell estava

usando uma roupa marrom e novamente aquele chapéu marrom, pequeno e feio, que ela

sempre usava. Era o tipo de chapéu que merecia um tiro, Harry pensou.

Ele se escondeu atrás da coluna um pouco mais quando La Beasley passou

rapidamente. Não que ela o notaria. Sem esperar ninguém achar pessoas da elite, ela não

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dava um olhar a ninguém, mas imperiosamente repelia para o lado qualquer um que

estivesse em seu caminho.

Nell a seguia com um sorriso ou uma palavra tímida para as pessoas pelas quais

passava, e quando ela parou para ajudar uma mulher idosa com artrite sentar em uma

cadeira, Harry saiu de detrás da coluna. Ela congelou por um momento, deu uma olhada

para a Sra. Beasley, que não havia percebido, então agitou a cabeça para Harry e foi

apressada atrás de sua empregadora.

Como ele esperava, ela não planejava falar com ele. Ele esperou enquanto ela

colocava a Sra. Beasley em uma cadeira e um xale ao redor de seus ombros, então, quando

ela ruidosamente reclamou que havia uma corrente de ar, ajudou-a a trocar para outra

cadeira.

Finalmente Nell se moveu em direção à água. Harry entrou no caminho dela. "Tenho

que falar com você”, ele disse.

Ela deu uma olhada para trás para verificar se sua empregadora não notara. "Não,

nós dissemos nossas despedidas”. Ela encheu o copo.

"Uma palavra final”.

Ela agitou a cabeça e tomou o copo da água mineral quente para a Sra. Beasley.

Harry se moveu para mais perto, deixando claro para ela que ele não iria partir

mansamente. Ele falaria com ela. Ele cruzou os braços e esperou.

Não demorou muito para a Sra. Beasley notar, como ele sabia que ela iria. Ela olhou

para o corpo dele, deu uma olhada para Nell, então olhou de novo para Harry para

verificar quem ele estava observando.

Harry inclinou a cabeça educadamente na direção dela mas não se moveu. A mulher

enfeitada, adornada com outra joia enorme descansando na divisão significativa de seus

seios deu a ele um olhar que dizia ‘venha’.

Harry não se moveu.

Nell olhou.

A Sra. Beasley se debruçou em direção a Nell e disse algo que Harry não podia ouvir.

Nell agitou a cabeça e pareceu discordar.

Harry tentou não sorrir. Ele sabia exatamente o que estava acontecendo.

Com uma expressão amotinada no rosto, Nell marchou na direção dele. "A Sra.

Beasley queria que eu trouxesse um convite a você para que se juntasse a ela”, ela disse

sem inflexão na voz, e então com uma insinuação de fogo, acrescentou, "e eu trouxe meu

desejo que você parta”.

Harry puxou seu relógio de bolso e o consultou ostentosamente. Então com uma

expressão dolorosa que ele esperava que fosse visível do outro lado do cômodo disse,

"diga a sua ama, que eu fico devastado em ter que desaponta-la, mas tenho um

compromisso”. Ele sorriu e acrescentou, "com você no quarto pequeno em dois minutos”.

"Não. Eu não irei—"

"Caso contrário eu me juntarei a vocês duas agora e te direi exatamente o que se passa

na minha mente”.

Ela estreitou os olhos para ele. "Isto é chantagem”.

"Terrível não é?", ele concordou. "Mas eficiente”.

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Ela hesitou, a mandíbula se apertou enquanto lia a determinação nos olhos dele. "Oh,

muito bem, se você é tão sem princípios. Mas só por um momento”.

Ele inclinou a cabeça. "Eu te verei lá em dois minutos”.

Nell retornou à cadeira mostrando um rosto que não exibia o tumulto interno que

estava sentindo. Homem miserável. Se ela não o tivesse encontrado... ele ainda traria

dificuldades a ela.

Ela não queria encontrá-lo. O que havia para se dizer, afinal? Ela dissera as

despedidas, estava pronta para partir… tanto quanto alguém podia. Oh, por que ele tinha

que fazer tudo tão difícil para ela?

Homem teimoso, impossível. Todos os homens que ela tivera na vida a deixaram mal.

Ele achava que ela iria confiar seu futuro e sua felicidade—e mais, o futuro feliz e a

segurança da sua filha—a um homem que ela encontrara apenas quatro vezes?

Ainda que ele fosse o homem mais atraente que ela já encontrara.

Papai era amável, doce e tinha muito charme mas ele arruinara a vida de Nell.

Quanto ao que ele fizera a Torie…

E o pai amava Nell.

Nem uma única palavra de amor passara pelos lábios de Harry Morant. Não que ela

fosse acreditar nisto de qualquer maneira, mas ainda assim, ela estava contente, pelo

menos. A última coisa que ela queria era um homem como ele apaixonando-se por ela.

O quanto isso seria impossível?

"Bem?", a Sra. Beasley disse quando ela retornou.

"Ele disse que sente muito, mas tem um compromisso”.

"Hmph. Suponho que seja por isso que ele estava aqui em hora tristemente

inadequada. Que pena”. Ela olhou fixamente através do salão para ele. "Ele é um espécime

tão divino de masculinidade”.

E um aborrecedor, Nell pensou. Hoje ele estava usando botas de cano alto cintilantes,

calça comprida amarela apertada que moldava as coxas poderosas, um casaco azul escuro

e um jaleco azul e cinza listrado que contrastava maravilhosamente com seus olhos cinza.

Ele estava muito incrivelmente bonito para seu próprio bem. E ele sabia disto. Ele

devia ter pensado que ela ao olhá-lo cairia nos braços dele.

Bem, ela tinha coisas mais importantes em mente, e ela não cairia nos braços de

ninguém, ainda que ele fosse parecido com Apollo14. Com cabelo marrom escuro. E olhos

cinza. E um sorriso que a fazia sentir as coisas mais estranhas em seu interior.

A única pessoa com a qual Nell podia contar era si mesma. Ela não precisava de sua

vida ainda mais complicada. E ela não estalava os dedos por qualquer homem encantador,

bonito, vigoroso e teimoso.

Sra. Beasley saltou. "O que foi isso?".

Nell piscou. "O quê?".

"Você estalou os dedos”.

"Oh, desculpe. Eu só estava pensando em algo”.

14 Apolo, filho de Zeus e Leto, um dos mais importantes e multifacetados deuses do Olimpo. Nas mitologias grega, romana e etrusca, Apolo foi

identificado como o deus da luz e do sol, da verdade e da profecia, do pastoreio, do tiro com arco, da beleza, da medicina e da cura, da música, da

poesia e das artes.

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"Bem, não pense”. Sra. Beasley bebeu um gole d’água mineral quente com desgosto.

"Coisa repugnante. Posso sentir que me faz bem, mas graças a Deus é a última dose”.

Elas se sentaram em silêncio durante algum tempo. Nell o encontraria, certo, ela

decidiu. E ela daria a ele um uma reprimenda.

Ela se moveu inconfortavelmente na cadeira. Um momento mais tarde ela

ziguezagueou novamente.

"Por Deus, menina, sente-se quieta”.

"Não posso”, Nell confessou. "Acho que preciso ir ao reservado. Imediatamente. As

azeitonas na carne de vitela ontem à noite, talvez…"

A Sra. Beasley a despachou com um gesto de desgosto. "Bem, corra então. Espero que

você não cause nenhum atraso na estrada, porque te advirto que não tolerarei isto”.

Nell se apressou em direção à parte de trás do salão. Ela deslizou pela porta coberta

com a lã- e entrou silenciosamente na despensa. Estava vazio, então Harry Morant

apareceu deslizando atrás dela.

De repente a despensa parecia muito pequena.

"Suponho que você pensou que eu não viria?", ela disse. A pele da mandíbula dele

tinha aquela aparência fresca de recém barbeado que ela achava tão atraente nos homens.

Ela podia sentir o cheiro lânguido de alguma água-de-colônia.

"Eu sabia que você viria”. Os olhos dele ondularam em um sorriso lânguido e

triunfante.

O sorriso dele fez com que ela perdesse a calma. "Só porque você me chantageou!",

ela cutucou o dedo no peito dele. "Como ousa ameaçar o meu sustento?".

"Sustento!", ele bufou. "Trabalhar para aquela bruxa não é um sustento”.

Ela jogou as mãos para o alto com frustração. "Não é da sua conta. Agora, você está

desperdiçando meu tempo. Nós partiremos para Londres dentro de uma hora”. Ela tentou

forçar a passagem mas ele a parou.

"Eu te levarei para Londres”.

Nell estava confusa. "O quê?".

"Você me ouviu”.

Ela estreitou os olhos. "Mas você não quer ir para Londres. Você odeia Londres, você

disse que não pode respirar lá”.

Ele fez um gesto impaciente. "Você quer ou não quer ir para Londres?".

"Eu quero, mas—"

"Então eu te levarei”.

"Você não pode. Não—não seria adequado. Se eu chegasse com você em Londres,

todo mundo pensaria que eu sou sua—", ela cessou bruscamente.

"Minha—?", ele ergueu uma sobrancelha.

"Você sabe muito bem o quê”, ela replicou.

"Talvez. Mas seria mais adequado se você fosse como minha esposa”, ele disse. "Case-

se comigo e eu te levarei para Londres”.

Nell começou a tremer. "Case-se comigo e eu te levarei para Londres”.

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Ele se moveu para mais perto. "Olhe, não é o sonho de amor da juventude que estou

te oferecendo mas faz sentido. Você e eu nos desejamos—você sabe disto. Eu preciso de

uma esposa e você precisa que alguém cuide de você. E eu te levarei para Londres”.

Ela abaixou as mãos e o manteve longe. Ele não fez nenhuma tentativa de abraçá-la,

mas ele não se moveu. Seu colete era liso e sedoso sob as pontas dos dedos dela. Ela podia

sentir a batida forte e fixa de seu coração. Ela queria puxar as mãos de volta, mas sabia que

isso apenas o moveria adiante novamente.

"Eu—eu te disse que não posso me casar com você”, ela disse tremendo. "Por que

você não me escuta?".

"Seus lábios dizem uma coisa…", ele olhou para os lábios dela e a voz aprofundou.

"Mas quando eu te beijo, eles dizem outra”.

"Foi um beijo roubado”, ela murmurou.

"Talvez, mas você me beijou de volta. Você me puxou para mais perto. Você apertou

seu corpo contra mim e correu os seus dedos pelo meu cabelo”. A voz dele era profunda e

intensa. "Você tomou minha língua em sua boca”.

Ela fez um gesto envergonhado de negação, e ele imediatamente tomou vantagem,

movendo-se para mais perto, até que eles estavam juntos em pé, peito contra peito e coxa

contra coxa. O calor do corpo grande e firme dele queimava através do vestido marrom de

viagem dela como se ele fosse da mais fina seda.

"Você sabe que me quer o mesmo tanto que eu te quero”.

Ela o queria sim, que Deus a ajudasse.

"Você trabalha para aquela bruxa porque ela está indo para Londres. Conveniente,

você disse. Case-se comigo e você terá conveniência e segurança. Até que a morte nos

separe”.

Oh Deus, por que ele tinha que colocar as coisas assim? Nell pensou. Como se ele

soubesse o quanto ela desejava segurança após os vinte e sete anos de incertezas

inconstantes da vida com o pai.

E ela o desejava. Que mulher de sangue quente não iria. O mistério era por que ele a

desejava, mas ela não questionava isto. Ela podia sentir o desejo que irradiava do corpo

grande e tenso dele, tão perto na despensa.

Ela engoliu em seco. E agora ele queria levá-la a Londres.

A tentação era enorme. Se ela dissesse sim, poderia ter tudo o que queria… ou quase.

Mas ela teria que mentir. Mentir por omissão.

Ela girou a cabeça para um lado e para o outro, tentando escapar daquele intenso

olhar cinza, mas não adiantou. Ela estava presa.

Ele pensava que ela era inocente. Ele mudaria de conversa se soubesse sobre Torie, ela

tinha certeza.

Ele não a amava. Seria necessário um grau de amor extraordinário para aceitar uma

esposa com uma criança ilegítima—uma que ela não tinha nenhuma intenção de dar,

esconder ou se envergonhar por ter. O que acontecera não era culpa de Torie, nem dela.

Seria necessário amor… ou talvez incrível indiferença. Com o tempo, talvez, existisse

alguma chance para eles…

Ela abriu a boca para explicar.

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"Então é assim que você se comporta!", a Sra. Beasley gritou da entrada. "Escapando

sorrateiramente pelas minhas costas para fornicar em uma despensa! Às nove horas da

manhã! Sua pequena prostituta! Há quanto tempo isso está acontecendo?".

"Eu não fiz nada, não é o que você pensa—", Nell gaguejou. "Sra. Beasley, eu juro—"

"Não minta para mim, sua prostituta!", Paf! A mão relampejou, deixando uma marca

lívida na bochecha tenra de Nell.

Enfurecido, Harry puxou Nell para trás. "Toque nela novamente, madame, e Deus me

ajude, porque eu nunca levantei a mão para uma mulher em toda a minha vida, mas você

será a primeira”.

A Sra. Beasley deu uma olhada para o rosto branco dele e seus olhos que reluziam e

deu um passo para trás para sair do alcance. Ela olhou para Nell e disse em voz alta,

rancorosa, "eu sempre soube que você era uma prostituta! Você tem ficado de olho em

todos os homens desde que eu te admiti—"

"Silêncio!", Harry rosnou. "Fale com Lady Helen com respeito ou sofra as

consequências”.

Ela corou furiosamente e disse para Nell. "Você sabe que ele é um bastardo, não é,

Lady Helen? Algum lorde se enrabichou por uma criada vagabunda e conseguiu um

bast—"

Paf! A mão de Nell deixou uma marca branca na bochecha da Sra. Beasley. "Como

ousa falar assim dele!", Nell relampejou.

"Sua pequena cadela!", La Beasley se adiantou, o braço erguido para dar um tapa com

as costas da mão.

Harry pegou o braço carnoso dela no meio do ar. "Já chega”.

"Ela é minha empregada, posso fazer o que quiser”.

"Não, senhora, ela é minha futura esposa, e se você tocá-la, eu a estrangularei”.

"Tire suas mãos imundas de mim, seu bastardo fornica—"

Nell surgiu adiante para defendê-lo novamente. Harry soltou o braço da Sra. Beasley

e pegou Nell pela cintura. Preso entre duas mulheres furiosas, ele pôde pensar em apenas

uma coisa para fazer.

Ele jogou Nell sobre o ombro e abriu caminho através da empregadora enfurecida e

furiosa. Ignorando os pontapés e mandos de Nell de que fosse colocada no chão, ele andou

a passos largos e desiguais através do silêncio, olhando fixamente as pessoas no Pump

Room, seu andar manco muito em evidência.

"Bom dia, senhoras e senhores”, ele disse, como se nada desfavorável estivesse

acontecendo. "Estou apenas levando a minha noiva para um passeio”.

"Ah, aquelas águas”, um homem idoso disse no silêncio. "Maravilha o que elas

podem fazer pelo corpo”.

Capítulo VIII.

"Desça-me”, Nell insistiu pela vigésima vez.

Ela o esmurrou com os punhos para dar ênfase à demanda.

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"Não até que eu te leve para um lugar seguro”, Harry continuou andando, inalterado

pelos olhares fixos de estranhos na rua. "A casa da minha tia é quase na esquina”.

"Isto é sequestro”.

"Que seja”. Ele bateu levemente na anca dela e ela gritou com aborrecimento e bateu

nas costas dele.

Nell se acalmou quando ele alcançou a casa da tia e tocou a campainha. "Bom dia,

Sprotton”, Harry disse. "Manhã adorável”.

"Linda, Sr. Harry”, o mordomo respondeu suavemente, como se Sr. Harry não tivesse

nenhuma mulher jogada sobre o ombro.

"Minha tia está?".

"Não, senhor, ela saiu há meia hora mais ou menos”.

"Que pena. Oh bem, quando ela retornar, avise-a que temos uma dama que ficará

conosco”. Ele se curvou e colocou Neil de pé, dizendo, "Lady Helen Freymore, esse é

Sprotton, o mordomo da minha tia. Sprotton, ela ficará no melhor quarto sobressalente”.

O chapéu dele caíra em algum lugar na rua, seu cabelo estava bagunçado em todas as

direções, e ela tinha certeza de que parecia ter sido jogada de um penhasco, mas Nell

estendeu a mão para o mordomo, dizendo calmamente. "Como vai, Sprotton?".

"Bem-vinda, minha dama”, Sprotton disse e agitou a mão com igual dignidade.

"Sprotton, a bagagem de Lady Helen está—", Harry girou para Nell. "Onde você

estava ficando mesmo?".

Não havia sentido em discutir. Ela não tinha mais nenhum futuro com a Sra. Beasley.

Nell deu ao mordomo o endereço do alojamento e disse a ele que fosse buscá-la. Ele se

curvou, emitiu as instruções para os dois criados em espera, e os enviou.

"Você gostaria de uma xícara de chá, Lady Helen?".

"Isso seria adorável, obrigada, Sprotton”, Nell disse.

"Na sala de visitas?", o mordomo inquiriu, indicando o cômodo com um gesto sutil.

"Perfeito”, Nell disse e seguiu para se retirar. Ela estava ficando louca.

Harry seguiu-a, os olhos cintilando. Ela se acomodou em uma cadeira dura e pequena

e o considerou friamente. "Então, como eu disse a você que iria, aquela reunião me custou

o trabalho”.

"Sim”, disse Harry. "Sinto muito”.

"Você não sente nada”, ela retrucou. "Está é muito feliz com isto”.

"Eu sei. E assim que você se acalmar um pouco, perceberá que está em uma situação

muito melhor. Eu te levarei para Londres e ajudarei que você faça o que precisa fazer”.

"E se eu não quiser fazer isto com você?".

Isso tirou a expressão contente do rosto dele. Mas apenas por um segundo. Ele

encolheu os ombros. "Melhor comigo do que com aquela harpia”.

"Pelo menos as minhas coisas pessoais teriam continuado pessoais”, ela murmurou

deselegantemente.

"E não seria comigo?".

"Não”.

"Mas você viveu com ela por várias semanas e se encontrou comigo apenas quatro

vezes”.

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"Sim, mas mesmo depois de duas semanas, ela ainda é uma estranha, enquanto—",

ela parou, ciente de que estava falando demais. Era assustador como ele tão depressa tinha

se tornado parte da vida dela.

Eles se sentaram por um momento em silêncio. "Obrigado por vir em minha defesa”,

ele disse eventualmente. "Fiquei muito tocado”.

Ela fez um gesto envergonhado.

"Não me chateia realmente, ser chamado de bastardo”, ele disse a ela. "Fui chamado

assim por toda a minha vida. Fique acostumado com tal coisa”.

"Eu nunca poderia me acostumar com isto”, ela disse veementemente. "Odeio esta

palavra e não deixarei que seja falada em minha casa. Minha presença”, ela tardiamente se

corrigiu.

Ele deu a ela um olhar pensativo. "Entendo”.

"Não, você não entende”, ela começou, mas quando estava para explicar, Sprotton

entrou com a bandeja de chá. Para a surpresa de Nell, além do pote de chá, havia um prato

grande com sanduíches, bolo de gengibre, e meias dúzia de tortinhas de geleia.

"Com certeza não é hora para almoço”, ela disse.

"Não, minha senhora, mas a cozinheira pensou que, por ter visto o Sr. Harry deixar a

casa pela manhã antes do café, ele pudesse ficar contente com algo para comer antes do

almoço”.

Sr. Harry, cuja boca já estava cheia de sanduíche de presunto, anuiu com a cabeça

para Sprotton e piscou para Nell. Quando ele tragou, disse, "delicioso. Diga a cozinheira

que ela acertou na mosca como sempre. Eu mesmo irei lá agradecê-la mais tarde”.

Ele viu o olhar de surpresa de Nell e disse, "a primeira vez que encontrei a cozinheira

foi quando meu irmão Gabe e eu éramos rapazes na fase de crescimento e sempre

famintos. Nos alimentar se tornou a missão de sua vida”. Ele comeu outro sanduíche e

acrescentou lamentosamente, "ela ainda acha que eu sou um rapaz em fase de

crescimento”.

Sprotton disse secamente, "devo corrigir o engano dela, Sr. Harry”.

"Faça por sua conta e risco, Sprotton”, Harry disse com um sorriso e agarrou um

terceiro sanduíche. O mordomo se curvou ironicamente e deslizou para fora do cômodo.

Foi a primeira vez que Nell viu Harry Morant em seu ambiente familiar. Ela gostou

do modo fácil que ele tinha com os empregados. Isso o deixava mais atraente do que

nunca.

Ela bebeu seu chá. Ela tinha que dizer a ele.

A porta se abriu de repente e Lady Gosforth entrou deslizando. "Que acontecimento”,

ela declarou, removendo o chapéu e deu-o ao mordomo, que a tinha seguido. "Outra

xícara, Sprotton. O Pump Room está em alvoroço, meus queridos. Tanta excitação. Toda

Bath está impaciente”. Ela removeu o casaco, decidiu se sentar no sofá e os considerou com

os olhos cintilantes. "Então, nós temos um casamento para organizar”.

"Sim”, Harry disse.

"Não”, disse Nell.

"Sim”, Harry repetiu mais firmemente.

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"Ele está certo, minha querida”, Lady Gosforth disse a Nell. "Não há realmente

nenhuma escolha depois da cena pública que ele fez. Ele realmente te carregou desde o

Pump Room por toda a rua?".

"Até esta casa”, Sprotton murmurou enquanto enchia uma xícara com chá,

acrescentava limão e a passava para ela.

"Maravilhoso. Que história! Harry, menino querido, nunca pensei que você faria algo

assim. Nós teremos o casamento em Bath ou em Londres?".

"Não haverá casam—", Nell começou.

"Em Londres”, Harry disse. "Nell quer chegar a Londres assim que possível”.

"Excelente. Farei todos os arranjos”. Lady Gosforth drenou a chávena e saltou de pé.

"Oh, como eu amo casamentos”.

"Nós partiremos para Londres esta tarde”, Harry disse a ela. "Você virá conosco,

espero, Tia Maude”.

Nell quase derramou seu chá. Esta tarde?

"Eu não perderia por nada no mundo. Além disso, tenho que levar a pobre criança às

compras—ela não pode se casar com as roupas que tem”. Ela se curvou e beijou Nell

calorosamente na bochecha. "Bem-vinda à família, minha querida. Estava louca de vontade

para te vestir, louquinha!", ela saiu deslizando do quarto, batendo palmas e dizendo,

"Sprotton, chame o pessoal, vamos para Londres esta tarde. Devemos fazer as malas”.

Nell piscou e respirou.

Harry viu a expressão dela e riu. "Como um vendaval, não é?".

Nell anuiu com a cabeça, então tragou. "Ela é muito gentil. Vocês todos são. Mas—eu

não posso me casar você”.

"Besteir—"

"Eu não sirvo para casamento”.

Ele se curvou adiante com preocupação súbita. "Você está doente?".

Pela segunda ela ficou tentada a dizer sim, mas não conseguiu se forçar a mentir para

ele, não quando ele era tão aberto com ela. "Não de saúde. Moralmente imprópria”.

Ele franziu o cenho. "Você quer dizer que não é uma jovem inocente?".

"Não, não sou. Não mesmo”.

Ele encolheu os ombros e encostou as costas de volta na cadeira. "Nenhum de nós é,

com nossa idade. Eu não sou um padrão de respeitabilidade, não sou”.

"É pior que isto. Eu tive um bebê. Uma filha”.

Ele piscou. Ele ficou em silêncio por muito tempo, então disse, "quem é o pai?".

Ela agitou a cabeça. "Não importa”.

"Importa”.

Ela firmou a mandíbula. "Não te direi. Minha filha não tem nada a ver com ele”. Ela

quase rosnou a palavra.

Harry franziu o cenho. "Você quer dizer que ele não a reconhece?".

"Não”. Ela mal encontrou o olhar dele. "Você pode me perguntar até cansar que

nunca direi nada”.

"Nem mesmo a sua filha?".

"Especialmente a ela”.

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Ele não gostava disso, ela podia perceber. Pior para ele, ela não mudaria de ideia.

Ele tinha um olhar sinistro no rosto, mas sua voz era muito gentil quando perguntou,

"onde está o bebê agora?".

"Eu não sei. Eu a perdi”.

"Perdeu? Você quer dizer—oh, eu sinto muito”.

"Não!", ela disse depressa, vendo sua expressão. "Não perdi assim—", ela não

conseguia dizer as palavras. "Ela está viva, acho—rezo—mas está perdida. E eu não sei

onde ela está. Meu pai a roubou de mim enquanto eu estava adormecida, e antes que eu

pudesse descobrir aonde ele a tinha levado, ele morreu. Acho que ela está em algum lugar

em Londres”.

Ele não disse nada por algum tempo, parecendo pensativo. Ele estava chocado, ela

sabia.

"Há quanto tempo você deu a luz?".

Ela o olhou fixamente. Era uma coisa estranha de se perguntar. "Apenas dois meses

atrás”.

Ele franziu o cenho, "dois meses? E mesmo assim quando eu te vi pela primeira vez,

você estava viajando só, sem cuidados, na parte de trás de uma carroça!", ele soou furioso.

"Droga, você—alguém precisa cuidar melhor de você do que você faz! Só dois meses do

parto!".

"Não tive nenhuma escolha”, ela disse tranquilamente.

Ele pareceu dominar a raiva. "E agora você está começando a procurar por ela?".

"Não, claro que eu não esperei tanto! Eu segui papai imediatamente. Mas ele morreu

na estrada. Eu o enterrei e então continuei em Londres. Procurei em todos os lugares pela

minha filha. Por semanas eu caminhei pelas ruas de Londres, procurando por ela,

perguntando a todos que podia imaginar, mas então…"

"Finalmente você desistiu”.

"Não! Eu nunca desistirei dela”, ela disse veementemente. "Mas eu fiquei sem

dinheiro e desmaiei na rua”.

"Droga! Então você ficou doente porque ninguém estava cuidando de você”. Ele

cerrou os punhos.

"Não, eu não estava comendo o suficiente, isso foi tudo. Eu tenho guardado cada

centavo para procurar por Torie. Este é o nome dela, Victoria Elizabeth, assim como a

minha mãe”.

Ele xingou novamente sob a respiração.

"Eu percebi que não poderia continuar como estava. Não poderia ajudar a minha filha

se eu morresse ou se ficasse numa valeta. É por isso que voltei para casa, para Firmin

Court, para juntar um pouco mais de dinheiro, para poder voltar e continuar procurando

até que eu a ache”.

Harry olhou fixamente para ela. "É por isso que seus pés e saias estavam tão

barrentos”, ele disse devagar. "Você tem caminhado. Você caminhou para casa. A distância

toda de volta até Londres?".

"Oh não”, ela o assegurou. "Não a distância toda. Eu peguei várias caronas”.

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"Eu não enviaria uma égua em uma jornada assim logo depois de dar a luz!", ele

fechou os olhos e disse algo sob a respiração. "E quando você chegou lá, viu que a casa

havia sido vendida”.

Ela anuiu com a cabeça. "Eu estava em completo desespero a princípio, sem saber

como poderia voltar, mas o vigário viu o anúncio que procurava uma companheira de

viagem para a senhora Bristol até Londres. Foi a resposta para uma oração”.

"E você conseguiu o inferno da harpia”.

"Não, honestamente, eu não dava a mínima para o modo como ela agia. Desde que

ela me levasse até Londres e que eu pudesse procurar Torie, ela podia me chamar de

qualquer coisa que quisesse. Meu problema com ela foi com o atraso que ela teve em Bath

para beber as águas”.

"Bem, isso nós temos que discordar, porque se ela não tivesse vindo, eu nunca teria te

achado novamente”.

Ela olhava fixamente para ele. "O que você quer dizer?".

"Eu pensei que fosse perfeitamente óbvio”.

"Você não pode estar ainda pensando em se casar comigo”, ela disse a ele. "Eu sou

uma mulher decaída!".

"Que bobagem, claro que você não é. É claro que eu ainda vou casar você”.

"Embora eu tenha um bebê?".

"Sim. Eu quero que você tenha bebês. Quero uma família”.

"Mas e quanto a Torie?".

"Nós começaremos a procurá-la assim que chegarmos a Londres”.

"Eu não a darei”.

Ele franziu o cenho. "Eu não te pedi isso”.

"Mas ela é—você sabe—ilegítima. A maioria dos homens nem sequer pensaria em

tomar uma criança assim em sua casa”.

"Eu não sou a maioria dos homens. Ela viverá conosco, claro”.

Ela olhou fixamente para ele, incapaz de pensar em algo para dizer. A boca tremia. As

lágrimas lentamente encheram seus olhos e caíram, desenfreadas.

Ele retirou um lenço e começou a secar as bochechas dela. "Com a minha experiência,

percebi que não faz nenhuma diferença se você é legítimo ou não. Meu irmão Gabe nasceu

em um matrimônio. O pai ficou com titica na cabeça e decidiu que Gabe não era seu filho,

e se recusou a tê-lo na casa. Gabe cresceu a imagem cuspida dele. Não fez diferença

nenhuma. O pai nunca cedeu. Chamou-o de bastardo até o dia em que morreu”.

"Isto é terrível”, ela sussurrou com a voz sufocada.

"Eu nasci do mesmo pai, mas a minha mãe era uma criada. Assim que ela descobriu

que estava grávida, ele a casou com o ferreiro da aldeia e eu nasci de um matrimônio.

Legalmente legítimo. Mas você sabe como as pessoas me chamam”.

Ele terminou de secar as lágrimas e segurou o lenço no nariz. "Assopre”, ele disse, e

ela como uma criança pequena assoprou. Estava exausta.

Ele colocou o lenço de lado e então disse, "agora que deixamos tudo claro, seria

melhor você ir para cima. Lave seu rosto e tire um bom e longo cochilo. Eu te despertarei

para o almoço e nós partiremos para Londres depois disto”.

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Ela olhou fixamente para ele, incapaz de entender tal generosidade de espírito. "Eu

não entendo; por que você quer alguém como eu quando poderia escolher meninas jovens

e sem manchas no passado?".

"Você ainda não entendeu?".

Ela agitou a cabeça, confusa.

"Por causa disto”, ele disse e a beijou.

Não era o tipo de beijo em chamas de antes; era apenas um beijo simples, terno e

gentil. Uma promessa, uma afirmação. E a tocou incrivelmente.

Harry a soltou e se afastou. Eles tinham suas vidas para organizar. Ele tocou o sino e

mandou buscar a empregada de sua tia para conduzir Nell para cima. Ele esperou que ela

aceitasse seu conselho sobre o cochilo. Ela parecia exausta. Ele era parcialmente

responsável por isso mas pelo menos agora ele poderia se assegurar de que ela seria

cuidada corretamente de em vez de ser cansada ainda mais.

Dois meses após o parto!

Ele se forçou a se focar na tarefa que tinha: havia muito a fazer se eles partissem para

Londres hoje. Normalmente ele montaria, mas para essa viagem ele contrataria um chaise

rápido para ele mesmo e para Nell. Ele queria um pouco de isolamento. A tia os seguiria

em sua própria carruagem com sua dama de companhia, Bragge. Ela não se importaria.

Mas primeiro, ele tinha que escrever algumas cartas. Ele foi buscar uma escrivaninha

móvel do aparador e tirou uma caneta, tinta e várias folhas de papel.

Ele aparou o bico, imergiu-o na tinta, e olhou fixamente para o papel branco em

branco, a cabeça cheia com perguntas.

Uma criança. Ele tinha que admitir que era um choque. Ele não esperava nada assim.

Quem diabos era o pai? Por que ela não diria? Ela o amava? Tinha soado como se ela

o odiasse, mas o amor facilmente poderia virar ódio, ele sabia. Por que ela não disse nada

sobre o bebê para o cara? Ele devia ser casado, caso contrário ele teria se casado com ela,

será?

Ele descobriria, jurou. O principal a fazer era ter Nell sob seu teto. O teto de sua tia,

ele emendou, mas era a segunda melhor coisa. Ele não a deixaria fugir novamente.

Tudo o que ele tinha que fazer agora era achar o bebê, casar-se com ela, e levá-los

para casa para que morassem em Firmin Court. Eles seriam uma família. Ele imergiu a

caneta na tinta e começou a escrever.

Ele escreveu para Rafe e Luke primeiro, pedindo para que fossem encontrá-lo em

Londres. Eles poderiam ajudar na procura pelo bebê de Nell, em vez de ficarem correndo

em torno da zona rural arriscando seus pescoços tolos.

Ele escreveu para o Sr. e a Sra. Barrow, dizendo a eles que iria se casar. Os Barrows

eram a coisa mais próxima que ele tinha de pais.

A Sra. Barrow choraria, ele sabia. Ela sempre fazia nos casamentos, e por ser Harry,

ela provavelmente choraria baldes. Ela compraria um novo vestido e chapéu, também.

Especialmente para um casamento chique em Londres, que estava destinado a ter Tia

Maude no comando. Harry não se importava. Ele faria tudo rapidamente com uma licença

especial, mas as mulheres eram diferentes.

Tendo Nell presa pelo casamento, ele queria que ela tivesse a festa que desejasse.

Page 91: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ele lacrou a carta para os Barrow, e então escreveu uma nota rápida para Ethan,

desculpando-se por deixar as coisas em suas mãos por tanto tempo e explicando a ele que

estava se casando. Ele também pediu a Ethan que atendesse a alguns pedidos pessoais.

Ele sorriu quando imaginou o rosto de Ethan quando ele soubesse que Firmin Court

teria uma nova ama antes de o mês acabar e quem ela seria. Harry polvilhou a carta com

areia e se perguntou como o namoro de Ethan estaria progredindo.

Ethan pegou a carta mais recente de Tibby pela terceira vez. Uma escrita tão fina e

elegante—ele nunca aprenderia a escrever de forma tão graciosa, mesmo que praticasse

pelo resto da vida. Ele a leu lentamente, os lábios se movendo na medida em que lia.

Acho que eu te disse que quando cheguei aqui pela primeira vez, meu querido gatinho Kitty era

uma novidade, gatos amarelos eram incomuns em Zindaria. Estou envergonhada em falar que eles

estão muito comuns estes dias, o gatinho Kitty fez amizade com vários gatos da cozinha do palácio.

E também está descaradamente amigo do cozinheiro, que o alimenta com petiscos. É muito bom

viver em um palácio, mas devo confessar que há dias em que eu sinto falta do meu antigo pequeno

chalé. Mas eu não devo me lamentar. Sou uma mulher muito afortunada.

Callie tem sido muito gentil e me empregou como sua secretária particular. O trabalho não é

muito exigente e não mereço o salário significativo que me pagam, mas é interessante. Estou

familiarizada agora, através das minha carta escritas em nome dela,para metade da realeza da

Europa, e eu entendo muito mais esses dias das dificuldades da etiqueta de tribunal.

Ethan engoliu em seco. Etiqueta no tribunal—ele nem sabia o que a expressão

significava até perguntar ao vigário. Ele estava sonhando ao desejar que uma mulher que

escrevia cartas para metade da realeza da Europa olhasse para um Irlandês danificado.

Já estou ensinando aos meninos por algum tempo—Jim quase já alcançou Nicky. É tão

agradável ter um aluno tão rápido e capaz. Você não acreditaria no pequeno cavalheiro que ele se

tornou, apesar de ainda ter aquele espírito tão aberto e preocupante que ele tem que eu aprecio tanto.

Sim, Ethan pensou tristemente, não como um grande estúpido que tinha começado as

lições ao mesmo tempo em que Jim.

A escrita de Tibby era como ela mesma, ele pensou; pequena, elegante, firme e

resoluta. Nenhum floreado ou voltas desnecessárias, toda a carta era precisa e cristalina e

não havia um borrão que chamuscasse a vista.

Deus, o que ela deveria pensar das cartas dele? Mesmo depois de conseguir que o

vigário corrigisse sua ortografia, Ethan cometera enganos na cópia limpa que fizera.

E quando ele lia do início ao fim as próprias cartas—para ficar com aquelas que o

vigário havia escrito, verificar o que ele havia dito a ela e para ver a ortografia correta de

algumas palavras—ele ficava envergonhado do modo como elas soavam desajeitadas.

Mas ele não podia se forçar a parar de tentar. Ethan imergiu sua pena na tinta

novamente e começou a trabalhar…

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Eu ‘cumprei’ um chalé de quatro cômodos na extremidade ocidental da propriedade. Três

quartos são maiores do que ‘cê’ pode imaginar. Grande ’dimais’ para um homem solitário como eu,

mas tenho alguém em ’menti’ para ir comigo para lá e tenho esperanças de que ela ‘aceiti’. Estou

caiando as paredes e arrumando para que fique tudo agradável.

Ele olhou para a carta e suspirou. Ele poderia descrever o chalé tão facilmente se eles

estivessem conversando; as palavras estavam em sua cabeça, boas, brilhantes e reluzentes.

Mas quando chegava a hora de escrever essas mesmas palavras e lutar com a pena, a tinta

e a ortografia, no fim suas palavras terminavam ásperas, duras e sem vida.

Havia alguns lápis na caixa com as penas e as tintas, então Ethan a pegou. Ele ouvira

pessoas dizerem que uma imagem vale mais do que mil palavras. Ele não sabia disto, mas

ele levaria a eternidade para achar as palavras que ele pudesse utilizar para descrever o

chalé, mas ele poderia desenhá-lo em um minuto.

Ele sempre fora bom com desenhos, desde o tempo em que era um menininho,

fazendo desenhos no chão ou com um pedaço de carvão. Quanto mais ele desenhava,

melhor ficava. No exército ele podia desenhar rapidamente, mapas limpos e desenhos de

fortalezas e havia sido promovido como resultado. Ninguém já percebera que ele não sabia

ler. Ethan era muito bom para achar meios sem que precisasse ler qualquer coisa.

E ninguém sonhava que um homem tão rápido com um lápis poderia ser tão tolo com

a pena.

Com acesso a papel, lápis e carvão ele tinha feito alguns desenhos de alguns

companheiros a seu redor. A notícia se espalhou e Ethan estava logo recebendo pedidos de

pequenos esboços que seriam enviados para casas, para mulheres, companheiras ou mães.

Eles até o pagavam por isto. Um desenho era melhor do que uma carta quando as pessoas

não sabiam ler.

E cada pouco que ele recebia era acrescentado a sua poupança. Ele estava

determinado a fazer algo bom com o dinheiro se sobrevivesse à guerra.

E olhe onde ele tinha acabado, sendo um sócio nesse empreendimento de criação de

cavalos com um cavalheiro bom como Harry Morant, que também era seu amigo. E agora

Ethan tinha uma casa própria.

Satisfatório para um homem que nascera em um chalé no pântano e sentira a fome

corroer a sua barriga.

Tudo o que ele precisava era se educar em um bom nível, o nível de uma boa e

educada dama como Tibby que poderia considerar se casar com ele, apesar de sua origem

humilde.

Era desejar a lua, ele sentia às vezes. Mas apesar de suas diferenças, apesar do fato de

que muitas sociedades desaprovariam uma união tão desigual, Tibby era a dama que ele

tinha no coração.

Ele deu uma olhada no caderno de esboços que estava na mesa ao lado. Estava

completamente aberto em uma página com o esboço de Tibby como ele se lembrava dela.

Ele não se apaixonara por ela imediatamente…

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Ele sorriu amplamente, lembrando-se do modo como ela o tinha encarado quando ele

tinha sido tão lento em responder a sua mensagem muda de que estava sendo mantida

refém. Como ele parecera estúpido e como ela ficara zangada.

Mas quando ele a tinha pegado e eles saíram galopando… pensando que ela ficaria

com todas as mulheres, histérica com ele, ela tinha ficado excitada. Qual era o nome pelo

qual ela o chamara? Loch-alguma-coisa. Escocês, não irlandês. Lochinvar, sim, era isto.

E então depois que ele a levara para segurança, ela tinha voltado para ajudá-lo,

armada com uma pá.

Foi então que começara para ele. Como ela era uma pequena interessante: seus olhos

cuspiam desafio, suas bochechas rosadas e seu cabelo em um pequeno e arrumado coque.

Pronta para defendê-lo—um homem com duas vezes o tamanho dela—contra os muitos

homens que a mantiveram refém. Uma dama que parecia uma leoa. Ela tinha entrado

como um furacão em seu coração naquele dia, com certeza, com pá e tudo. E ficou lá.

Ele tinha que descobrir sobre essa cara, Lochinvar, algum dia. Mas primeiro ele

terminaria este esboço.

Ele rapidamente desenhou o chalé que ele estava preparando para ela, com as janelas

todas adornadas com hera e algumas rosas na porta. Ele hesitou, então com algumas linhas

rápidas desenhou o contorno de uma mulher de pé olhando, um braço erguido fazendo

sombra nos olhos.

As rosas eram apenas pequenos botões agora, mas vindo o verão, ele esperava que

elas florescessem. E vindo o verão, ele esperava que Tibby estivesse de pé lá, fazendo

sombras nos olhos e esperando Ethan voltar para casa.

Ele iria para Zindaria na primavera para escolher seus próximos sete cavalos, e ele

faria a pergunta a ela então. Enquanto isso, as cartas tinham a intenção de cortejá-la…

Ele pegou a pena e escreveu as palavras finais:

Desejo que a dama que estou ‘cortejanu’ não pense que eu sou ‘terivelmente’ impertinente

quando eu propuser mas ela é tão boa e educada que pode não olhar para um homem como eu mas

posso apenas sonhar.

‘Respeitoamente’ seu, Ethan Delaney.

Capítulo IX.

Nell foi despertada por uma batida suave na porta. Céus, ela realmente dormira. Ela

estava na cama porque não havia mais nada para fazer—e, além disso, precisava pensar

em tudo que acontecera pela manhã—e de alguma maneira, ela dormiu.

Ela se esticou, sentou-se e disse, "entre”.

Uma jovem criada entrou, trazendo uma lata da qual saía vapor d’água. Ela a deixou

e fez uma mesura cortês. "Sinto muito por tê-la perturbado, Lady Helen, mas sou Cooper.

O Sr. Sprotton e a Senhorita Bragge mandaram que eu a ajudasse. O Sr. Sprotton disse que

eu a avisasse que o almoço será servido em meia hora”.

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"Ajudar?".

"Sim, minha senhora. Ajudá-la a se vestir, ajudá-la com o cabelo e assim por diante, a

senhora não trouxe sua própria empregada”.

"Obrigada, Cooper, mas eu não preciso de uma empregada”, Nell disse a ela

enquanto despejava um pouco de água quente em uma tigela. Ela não tinha uma

empregada pessoal há anos. Não desde que ela havia debutado.

O rosto da menina caiu. "Oh. Muito bem, m’ lady”. Ela fez outra mesura e girou para

partir.

Nell franziu o cenho pensativamente. "Cooper”, ela disse enquanto a menina

alcançava a porta.

"Sim, m’ lady?".

"Quais são seus encargos normais?".

"Limpar, espanar, polir prata, ou qualquer coisa que o Sr. Sprotton me diga para

fazer, m’ lady”.

Nell entendeu imediatamente. Seu pequeno tempo como dama de companhia dera a

ela uma nova compreensão das nuances da vida de um empregado. Ajudar Nell, mesmo

que por pouco tempo, era um passo positivo para Cooper. Se ela devolvesse a menina,

refletiria negativamente para ela. "Você é boa com cabelos?".

Cooper brilhou. "Oh sim, m’ lady. Eu e minhas irmãs costumávamos uma fazer o

cabelo da outra o tempo todo”. Ela deu uma olhada para o cabelo de Nell. "Eu poderia

fazer você parecer realmente bonita, m’ lady, honestamente”.

Nell deu uma olhada no espelho e riu. "Então eu ficaria muito feliz se você tentasse.

Pareço uma assombração no momento. Fiz o coque pela manhã mas perdi meu chapéu, e o

coque se desfez a caminho daqui”.

O rosto da menina de repente ficou branco. "Realmente, m’ lady?", ela disse com

cortesia cuidadosa.

Nell estava se divertindo. "O Sr. Sprotton a instruiu a não mencionar o modo como eu

cheguei, não é?".

"Sim, m' sen—", Cooper colocou a mão sobre a boca, horrorizada. "Desculpe, m’

lady”.

Nell riu novamente. "Não se preocupe, estou certa de que toda a cidade já sabe”. Ela

lavou o rosto e as mãos, secou-os na toalha que Cooper passou, então sentou em frente à

cômoda.

Ela pegou o monte de cabelo que caia ao redor dos ombros. "Ser carregada nos

ombros de um homem não é nada bom para um penteado, não é?".

"Não, m’ lady”, Cooper disse e começou a escovar o cabelo de Nell. "Mas é tão

romântico, não é?".

"Romântico?", Nell não pensava nada isso. Ela tinha ficado furiosa na hora. Sem

mencionar desconfortável.

"Oh sim”. Cooper deu um suspiro saudoso. "O Sr. Harry carregando sua dama amada

na frente de toda a cidade, tão forte e tão bonito, e não ligando para o que qualquer um

pensasse. Alguns das meninas lá embaixo quase desmaiaram quando ouviram”.

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"Sério?", Nell estava achando engraçado. O Sr. Harry carregando sua dama amada? É

assim como as pessoas viram?

Ela se recordou das próprias palavras do Sr. Harry: não é o sonho de amor da juventude

que estou te oferecendo mas faz sentido.

Cooper sorriu vagamente para o espelho. "Todo mundo está tão emocionado por

você, m’ lady. E Lady Gosforth disse que será um grande casamento em Londres. E todas

as novas roupas para você, m’ lady”. Ela suspirou novamente.

Nell suspirou, também. Ela odiava compras roupas novas. Ela tinha sido

completamente miserável nas preparações para seu debute. E durante ele. Como uma

tentativa vã de tentar tirar leite de pedra.

Seus pensamentos estavam a quilômetros de distância enquanto Cooper escovava,

penteava, alfinetava e trançava seu cabelo.

"Então, m’ lady, gostou assim?".

Nell deu uma olhada no espelho e uma sobrancelha se ergueu. Cooper tinha trançado

seu cabelo ao redor da cabeça e junto coma trança tinha colocado uma tira verde e branca.

Algumas mechas tinham se soltado, o que suavizava o efeito.

Nell se moveu e girou a cabeça, olhando fixamente para seu reflexo. O estilo

realmente ficava bom nela e ainda assim era bastante simples e muito prático para uma

longa viagem. "Espantoso. Eu pareço uma jovem”, ela exclamou.

Cooper irradiou com a reflexão dela. "Não, m’ lady, você parece com uma futura

noiva”.

Uma futura noiva. Nell deu uma olhada novamente no espelho. Dificilmente a noiva

perfeita, ela decidiu, mas ela parecia melhor do que quando era mais nova. O pai dela

tinha bastante dinheiro na época de seu debute e contratara uma dama de companhia

muito intimidante, que tinha sido altamente recomendada. O gosto dela, e do pai, era

cheio de ornados e firulas: argolinhas, cachos, e todas as espécies de coisas presas em sua

cabeça.

Este estilo simples com um toque de extravagância ficava muito melhor.

"Cooper”, ela disse com um impulso. "Você gostaria de vir para Londres comigo?".

Os olhos de Cooper se arregalaram. "Eu, m’ lady?".

"Sim, com permissão de Lady Gosforth, eu gostaria que você me vestisse para o meu

casamento”.

"Seu casamento, m’ lady?", Cooper a olhou fixamente, o queixo ficou frouxo, então de

repente começou a chorar.

"Mas se você não quiser, claro—", Nell começou horrorizada. "Você provavelmente

não vai querer deixar a sua família—"

"Não, não, senhorita, quero dizer, m’ lady, eles ficarão contentes por mim, vão sim”.

Cooper enxugou o rosto com o canto do avental. "Desculpe pelo berreiro, m’ lady, é que

sempre foi um sonho para mim, trabalhar para uma boa dama e ir para Londres, nunca

esperei que pudesse acontecer”.

"Lady Gosforth terá que dar permissão primeiro”, Nell a advertiu.

Page 96: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Ela dará”, Cooper disse confiante. "Ela está emocionada com você, te daria qualquer

coisa que pedisse, m’ lady. Disse que você é exatamente o que o Sr. Harry precisa. Oh,

espere até as meninas debaixo ouvirem sobre isso. Ficarão com ciúme”.

Um pouco confusa com esta visão assombrosa de seu casamento, Nell foi para o

andar de baixo para almoçar.

Quando ela entrou na sala de jantar, Harry ficou de pés e parado, olhando fixamente

para ela através do cômodo. Seu olhar nublado era como um toque. Uma carícia.

Ela pôs uma mão no cabelo muito consciente de sua aparência.

"Você parece muito elegante, minha querida”, Lady Gosforth disse. "Sem dúvida meu

sobrinho se ajeitará como você em seu próprio tempo”.

Acordado de seu devaneio, Harry se moveu para segurar uma cadeira para Nell se

sentar. Ela pensou como se sentiria se ele tocasse os dedos na nuca dela enquanto ela se

sentava, mas ele não disse nada e se moveu para se sentar do lado oposto ao dela.

Uma refeição leve já estava sobre a mesa. Lady Gosforth disse uma oração rápida e

então os convidou para comer. "É uma comidinha muito leve”, ela disse a eles. "Apenas

um pouco para as pessoas que serão sacudidas em uma carruagem por horas. Coma,

minha querida”.

Nell pegou algumas fatias de presunto, um pouco de galinha, pão e manteiga. Ela

comeu muito timidamente. Harry Morant não parecia tirar os olhos dela. Era quase como

se sentar para jantar com um lobo voraz, exceto que ele devorou várias fatias de ovo e torta

de bacon, carne de veado e um pouco de tortinhas de geleia.

"Quem fez o seu cabelo?", Lady Gosforth perguntou. "Ficou muito bom”.

"Cooper”, Nell disse a ela. "De fato eu iria perguntar se você me deixaria levá-la

comigo para Londres. Claro, se você precisar dela aqui—"

"Ela irá”, Harry disse.

A tia olhou para ele com as sobrancelhas arqueadas.

Ele franziu o cenho. "O quê?", ele deu uma olhada da tia para Nell e de volta para a

tia. "Nell quer que ela vá”, ele disse à tia, como se isso fosse um prova concludente.

As sobrancelhas de Lady Gosforth se ergueram mais alto. "Meu sobrinho já disse

então”.

Nell estava envergonhada. "Não se a sua tia precisar”, ela disse a ele firmemente.

Lady Gosforth riu. "Não, não, minha querida, está perfeitamente bem. Você pode

levar a menina que quiser”.

Ela deu uma olhada para Harry, que estava mastigando uma maçã com dentes

brancos e nivelados, então ele estendeu o braço e com a mão bateu levemente na mão de

Nell. "Eu vou gostar disso”.

Logo depois da refeição, as carruagens rodaram pelas ruas. Era mais uma cavalgada;

Harry contratou um chaise para ele mesmo e para Nell; e um chaise amarelo dirigido por

dois postilhão15. Lady Gosforth e Bragge, sua dama de companhia, montavam em seus

15

Postilhão – condutor de cavalo que levava correspondência, monta o cavalo à esquerda do cavalo principal ou

apenas o par de cavalos que puxavam uma carruagem.

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chaises ambulantes, e várias carroças seguiam, transportando vários outros empregados e

um monte de bagagem. Finalmente um cavalariço a cavalo levava o cavalo de Harry, Sabre

no final.

"Por que você precisa de uma carruagem separada, Harry?", a tia exigiu. "Há muito

espaço na minha”.

"Porque eu quero viajar com a minha noiva”, ele respondeu.

"Não é adequado que vocês dois viajarem sozinhos, sem alguém de vigia”, a tia

insistiu.

"Que chatice, nós vamos nos casar”, Harry disse a ela e colocou Nell na carruagem. "E

eu quero conversar com ela”.

Nell hesitou e esteve para descer—a última coisa que queria era criar problemas entre

Harry e a tia. Além disso, ela não estava certa de que queria ser interrogada por seu noivo

quando ela estivesse presa em uma carruagem e não pudesse escapar.

Lady Gosforth viu o dilema e disse com um cintilar, "vá em frente, minha querida. Eu

não consigo deixar de perturbar meu sobrinho de vez em quando. Se ele fizer qualquer

coisa imprópria, grite”. Rindo, ela permitiu que Harry a ajudasse em sua própria

carruagem e em minutos ele partiram.

O postilhão deu um grito e o chaise se moveu com um puxão. "Finalmente a sós”,

Harry disse.

"Sim”. Ela deu a ele um sorriso brilhante e nervoso. Ela perscrutou com grande

concentração para fora da janela. "Uma vista tão fascinante, Bath deste ângulo”.

"Fascinante”. Ele se sentou para trás, cruzando os braços e observando-a. Ele sabia

que deveria ir com calma.

Ela assinalou visão interessante atrás de visão interessante, nunca parando por um

momento, não deixando nenhum espaço para quaisquer perguntas que ele pudesse fazer.

Uma grande quantidade de muito bonito, interessante, edifício estranho, feio, ou

impressionante foi comentada com detalhe enquanto os cavalos trabalhavam seguindo por

colina íngreme depois de colina íngreme. E quando os edifícios sumiram e viraram terra

cultivada, ela foi capturada pelas belezas da natureza.

Harry sorriu. Ela não era uma tagarela natural, mas produzia um fluxo contínuo de

palavras que até a tia dele poderia invejar.

Mas a tática dela era apenas um adiamento. Ela logo ficaria sem coisas para exclamar,

Harry pensou, cruzando as pernas estendidas o mais confortavelmente possível e encostou

as costas no acolchoado da cadeira. Ele não se importava. Ele podia observar o rosto dela e

escutar aquela voz baixa e adorável por horas e nunca se cansaria.

Eles passaram por Bath-Easton, então pelo vilarejo de Box, que ela achara muito

bonito, como toda a zona rural. Ele suspeitou que ela tivesse feito um fluxo contínuo de

palavras a distância toda até Chippenham, mas uma pontada de desespero apareceu em

sua voz.

Tomando as rédeas da situação, ele se debruçou para frente e a beijou no meio de

uma frase. Firme e possessivamente. Capturando a boca e parando o fluxo de palavras.

Nell piscou para ele enquanto ele voltava a encostar-se à cadeira. "O-o que foi isso?".

Page 98: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Eu tinha que te parar de alguma maneira e esse pareceu um bom modo”.

"Parar o quê?".

Ela sabia perfeitamente bem o quê. "Adiar o momento. Vamos, encare querida. Você

sabe que vai ter que me contar tudo algum dia. Poderia ser agora, para que não atrapalhe a

sua cabeça. Você se sentirá melhor por isto, estou certo”.

Ela caiu contra a cadeira, silenciosamente reconhecendo que ele estava certo. "Certo, o

que você quer saber?".

"Tudo o que você não me disse esta manhã”.

"Não há muito a dizer”, ela disse com a voz seca. "Eu fiquei grávida. Quando papai

descobriu, me levou para uma casa em outro município para dar a luz em segredo de

forma que ninguém soubesse e minha reputação não fosse arruinada. Três semanas depois

que a minha filha nasceu, ele a tomou enquanto eu dormia, erroneamente acreditando que

era o que eu queria. E então ele morreu antes que eu pudesse descobrir aonde ele a tinha

levado. E isso é tudo”. Ela estendeu as mãos. "Fim da história”.

"Não é o bastante e você sabe disto”. Havia muitos buracos na história e Harry

precisava que eles fossem tapados.

Ela tentou olhar fixamente para ele, mas falhou.

"Quem é o pai da Torie?".

Ela encolheu os ombros. "Não importa”.

Ele bateu o punho contra a parte de trás de sua cadeira, fazendo-a saltar. "Mas é claro

que isso importa! Quem diabos é ele e onde está? Por que ele não se casou com você? E por

que diabos ele deixou que você resolvesse tudo isso sozinha?".

Ela cerrou a mandíbula e desviou o olhar. Mas não antes que ele visse um vislumbre

de algo nos olhos dela que o fez querer se chutar. Vergonha. Ela tinha vergonha. Claro. E

ele estava atacando-a como um bruto.

Ele se forçou a se acalmar. Ele se debruçou adiante e disse suavemente. "Você tem que

entender que importa quem é o pai da criança. Eu preciso saber”.

"Por quê?", ela o desafiou. "Você saber o nome não mudará nada. Isso é passado e é ao

passado que pertence. Remexer tudo é apenas… triste”.

"Eu sinto muito, mas não posso tirar isso da cabeça”, ele admitiu.

Ela cruzou os braços e desviou a vista para a janela durante algum tempo.

Eventualmente disse, "oh, muito bem, se você quer saber, ele está morto”.

Harry franziu o cenho. Ele não estava certo de que acreditava. Se o porco estava

morto, por que todo o segredo? "Morto? Como?".

"Ele se afogou. Foi para o mar e seu navio afundou em uma tempestade”.

"Qual era o nome do navio? Aonde ele estava indo?".

"Então isto é uma interrogação afinal”, ela retrucou.

"Não, eu sinto muito”. Ele se sentou de volta e tentou parecer relaxado. Ele não estava

relaxado, nem um pouquinho. Ele estava tenso como um arco.

Ele se dominou e disse mais suavemente, "então, como você o conheceu, este—qual

era o nome?".

"Ele era um amigo de papai”, ela disse a ele. "Papai o trouxe para a casa um dia e…

nós, nós nos apaixonamos. E a noite antes dele ir embora, ele… nós… você sabe. E meses

Page 99: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

mais tarde eu percebi que estava aumentando, e logo depois eu ouvi que ele morreu”. Ela

deu de ombros. "Você sabe o resto”.

"Uma história muito tocante”. Harry não acreditou em uma palavra. Ela tinha

contado a história com pouquíssimo sentimento. Ela era uma criatura sentimental; não

poderia falar impassivelmente da perda de seu amante assim. Mas ele não forçaria mais o

assunto, ainda não. Apenas faria com que ela ficasse mais espinhosa e mais defensiva.

"Conte-me sobre o lugar no qual você ficou”.

"Eu estava muito só”, ela disse, e sua voz mudou. "Papai me deixou com estranhos—

eles não sabiam meu nome real, ou o dele. Ele pagou para que eles fossem gentis comigo”.

"E eles eram gentis com você?".

"Oh sim, do jeito deles, acho”, ela disse. "Mas eu me sentia miserável. E não pude

levar Aggie, apenas Freckles, e mesmo assim, não tinha permissão de ir para o lado de

fora, nem mesmo caminhar com Freckles, exceto depois que escurecia”.

"Por que não?".

"Papai dera instruções rígidas”. Ela agitou a cabeça incapaz. "As pessoas podem ter

me visto, alguém pode ter me reconhecido mas eu não sei. Não havia nem mesmo um

jardim adequado. Parecia que eu estava na prisão”.

Esta parte da história era verdade, ele decidiu. Havia sentimentos, não apenas uma

recitação dos fatos. "O que você fazia?".

"Oh, eu lia e costurava—nunca tinha me interessado por costura antes. E eu tricotava,

mas não era boa nisto. Ainda assim, ajudou a passar o tempo até o m-meu bebê nascer.

Minha filha, minha pequena Torie”. O rosto dela enrugou. "Eu a amava. Pensei que a

manteria comigo, mas eu estava doente… e meu pai veio…"

Harry ficou em pé o máximo que podia, que foi mais ou menos três segundos, então

ele a puxou em seus braços.

"Nós a acharemos, não se preocupe”.

Ela murmurou algo incoerente e tentou não chorar. Ele a segurou contra ele,

acariciando os cabelos, a nuca e deslizando as mãos nas costas. Soluços secos e mudos a

sacudiam em intervalos estranhos.

Ele se lembrou do que ela tinha dito, no primeiro dia em Firmin Court. "Eu nunca

choro. Não serve para nada”.

Harry odiava ouvir uma mulher chorar. Ele odiava ver Nell lutando com estes

soluços rotos, aos arrancos. "Vá em frente, deixe sair. Chore”, ele disse a ela. "Você tem um

bom motivo”.

"Eu não chorarei. Eu não choro”, ela disse com a voz sufocada. "Minha filha está viva,

eu sei que está. E eu a acharei”.

"Nós a acharemos, eu prometo”. Ele a segurou bem apertado e se perguntou o que

diabos estava fazendo, fazer uma promessa assim quando no fundo ele achava que a

criança já estaria provavelmente morta.

Bebês morriam muito facilmente. Os bebês recém-nascidos tirados da mãe tinham

menos chance ainda do que os demais. E se o pai dela realmente quisera se livrar da neta

ilegítima não desejada, não seria muito difícil. As pessoas faziam isso o tempo todo.

Page 100: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Eles vieram para o próximo posto e enquanto eles mudaram o postilhão e os cavalos

Nell entrou na pousada e lavou o rosto. Ela apareceu com o rosto pálido e composto.

Harry observava-a infeliz. Ele não sabia a história toda—havia buracos enormes que

não faziam sentido—mas ela estava muito emocionalmente desgastada para continuar.

Ele deu uma olhada para fora da janela. Eles estavam se aproximando de Cherrill, ele

viu.

"Você já viu o famoso cavalo branco de Cherrill?", ele perguntou.

"Não”, ela disse com a voz fraca.

"Vai surgir logo”, ele disse a ela. "Um marco famoso por aqui. Você verá em alguns

minutos”.

Apareceu como prometido, em torno da próxima curva. Harry se lembrou da

primeira vez em que o vira quando menino. Ele tinha ficado excitado com a visão, uma

figura gigante de um cavalo branco esculpido contra a relva verde.

"Dizem que apenas o rabo tem mais de nove metros de comprimento”, ele disse a ela.

"Surpreendente”, ela disse monotonamente.

Eles assistiram em silêncio até que ele passou. Ela estremeceu.

"Você está com frio?", ele perguntou desconfortavelmente.

"Um pouco”.

Ele abriu um compartimento no lado da carruagem e retirou um tapete de pele. Ele o

colocou ao redor dela. Ela se acomodou nele e fechou os olhos, deixando ele e o resto no

lado de fora.

Maldição, maldição, maldição, Harry pensou. Ele tinha pensado em ir devagar.

Eles pararam durante a noite em Marlborough. Harry enviou um cavalariço adiante

para verificar a troca dos cavalos em vários postos no caminho. Ele também organizaria a

acomodação em Castel Inn, uma mansão que apenas alguns anos antes tinha sido a

residência do Duque de Somerset.

Estava escuro quando eles pararam e as luzes da pousada eram muito bem-vindas. O

cavalariço tinha obtido uma ala privada de quartos que continham uma sala de estar assim

como várias e excelentes alcovas e quartos para os empregados também.

Lady Gosforth, descartando qualquer comida ou refresco, foi diretamente para sua

alcova, Bragge em sua assistência.

"Ela fica assim pela noite”, Harry disse a Nell, vendo seu olhar de preocupação.

"Minha tia sempre fica um pouco indisposta depois de viajar. Mas sua empregada sabe

exatamente o que fazer”.

Eles se sentaram para jantar. "Você estava certo”, Nell disse a ele.

Ele olhou por sobre um capão de carne de vitela. "Sobre o quê?".

"Você disse que ajudaria se eu conversasse, e estava certo. Eu estava chateada no

momento, mas desde o meu cochilo, percebi que me sinto muito melhor por você saber”.

Ele não sabia tudo, Harry pensou, mas agora não era a hora para levantar a questão

novamente.

Eles foram servidos com uma comida deliciosa que incluía uma rabada saindo

fumaça, capões de carne de vitela, bife, um pudim de rim excelente e uma torta de

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marmelo com coalhada. Eles comeram com silêncio virtual, mantendo uma conversação

trivial, e na hora que a comida acabou eles concordaram que já estava tarde e que eles

precisavam partir pela manhã cedinho.

Nell examinou a porta de sua alcova. "Não há fechadura”, ela exclamou.

"Não há necessidade”, Harry disse a ela. "Esta seção inteira é privada e separada do

resto da pousada”.

Ela se sentia incomodada.

"Há fechadura lá, a porta leva a outra parte da pousada. É perfeitamente seguro”,

Harry a assegurou.

Ela mordia o lábio e parecia infeliz, mas disse simplesmente, "então, boa noite”, e se

retirou.

Um som despertou Harry na noite. Ele parou para escutar e o ouviu novamente, o

som de alguém se movendo suavemente em torno do quarto. Ladrões?

Ele se ergueu, pegou a pistola, tranquilamente avançou e abriu a porta de sua alcova.

Ele observou na escuridão, havia apenas o brilho lânguido do fogo agonizante. Do canto

do olho ele viu por um momento uma figura fantasmagórica insubstancial. Ele congelou

por um momento. Mas se moveu novamente.

Não era nenhum fantasma, mas Nell em uma longa camisola branca. Ele abaixou a

pistola.

"O que foi?", ele perguntou suavemente.

Ela não nem percebeu, mas andou através do quarto com os pés nus, indo à porta.

Ele a seguiu. "Nell? O que foi?".

Ela murmurou algo que ele não pôde entender.

"O que você disse?", ele sussurrou. Ele não queria perturbar sua tia ou os outros.

Novamente ela murmurou algo ininteligível e se moveu para a porta.

"Está bloqueada, você não lembra?", ele disse a ela, perplexo e transtornado pelo seu

comportamento estranho.

"Precisa achá-la”, ela murmurou. "Achá-la”.

"Achar quem?".

Novamente ela se aproximou confusa da manivela da porta. Ela disse algo e então se

virou e caminhou rapidamente em direção à janela. Ela puxou de volta as cortinas. O luar

inundou o quarto.

E foi quando Harry viu o rosto dela.

Os olhos estavam escancarados, mas brancos e cegos. Ela estava adormecida,

caminhando e conversando, mas adormecida.

"Nell”. Ela tentou destravar a janela. Oh Deus, ela iria subir na janela.

Ele a pegou pelo braço. "Nell”, ele disse mais urgentemente. "Nell, acorde”. Ele estava

para agitá-la para que acordasse até que ele se recordou de uma história de um homem

que foi despertado enquanto estava em estado sonâmbulo e parou chocado. Ele não sabia

se a história era verdade ou não, mas ele não queria arriscar.

"Preciso achá-la, achá-la, achar Torie”, Nell murmurou, lutando para abrir a janela.

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Oh, Deus. Ele de repente compreendeu. Ele disse que a primeira coisa que veio a sua

mente. "Torie está segura. Ela está aqui”.

Imediatamente Nell girou na direção dele, o rosto ansioso, os olhos quietos e

horrivelmente brancos. Era uma visão de partir o coração. Ele a ergueu. Ela lutou um

pouco, murmurando ininteligivelmente.

"Torie está adormecida, ela está bem”, ele a acalmou e a preocupação lentamente saiu

de seu rosto. "Agora, volte para a cama”. Ele fez murmúrios calmantes pela segurança da

filha, e levou Nell, dócil agora, de volta para sua alcova e para a sua cama.

"Torie está adormecida e você precisa dormir, também”, ele disse a ela. Confiante

como uma criança, ela se enrolou de volta na cama e ele puxou as cobertas para cobri-la.

Ele silenciosamente fechou a porta e se debruçou contra ela com um suspiro de alívio.

Graças a Deus que ele a ouvira. Só Deus sabia o que poderia ter acontecido se ela subisse

na janela.

Ele despejou para si mesmo uma grande quantidade de conhaque e se sentou em uma

das cadeiras de braço do quarto. Ele já tinha ouvido falar em sonambulismo mas nunca

tinha visto antes.

Ele bebeu o conhaque e se recordou de quando ela tinha falado pela primeira vez

sobre o bebê a ele, ele tinha suspeitado, apenas por um momento, que ela o tivesse perdido

deliberadamente. Havia sido por apenas um segundo, e ele tinha banido o pensamento

desmerecedor imediatamente.

Agora ele se sentia envergonhado de apenas tê-lo considerado por um segundo que

fosse. Ele entendia a razão daquelas sombras violeta sob os olhos dela agora. A perda da

filha estava fazendo-a em pedaços, mesmo quando ela dormia.

Ele bebeu o último gole do conhaque e colocou o copo de lado. Ele pedia a Deus que

eles achassem o bebê logo. Ele retornou ao seu quarto, mas na hora em que puxou as

cobertas, ouviu uma porta se abrir novamente.

Era Nell, ainda adormecida, rumo à porta bloqueada novamente. Harry não iria

passar por aquilo tudo novamente.

Ele a alcançou em três passos largos e a guiou suavemente em direção ao quarto dele.

"Torie está segura”, ele murmurou. "Agora, vá para a cama”, ele disse a ela e como antes,

ela subiu na cama. A cama de Harry. E ele deslizou para o lado dela.

"Venha aqui, querida”, ele murmurou. "Você está segura com Harry agora. Torie está

segura. Nell está segura. É hora de dormir”. Ela suspirou e relaxou contra ele. Os pés e as

mãos dela estavam congelados. Harry a dobrou contra ele e envolveu o corpo ao redor do

dela.

Ele se deitou, abraçando-a, sentindo o corpo gelado dela lentamente ficar morno

contra o dele. Os pés dela eram como gelo. Lentamente ela respirou aliviada, e ele se

percebeu respirando na mesma velocidade que a dela. A camisola era de algodão, velha,

suave e já tinha passado por várias lavagens. Era tão fina que era quase como abraçar o

corpo dela nu. Ela tinha cheiro de linho limpo, sabão e mulher, e seu corpo doía contra o

dela, torturado com uma maré de calor de desejo.

Ele a ignorou. Ele tinha coisas mais importantes a fazer. O desejo podia esperar. Ela

era dele, para que ele cuidasse dela.

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E ela não vagaria à noite sozinha novamente se ele pudesse evitar.

Nell despertou para a consciência, gradualmente. Ela se sentia morna, confortável e

segura.

Um braço a estava segurando. Forte, peludo e masculino. Ela sentiu outra coisa

também, também muito masculina.

Havia um homem em sua cama. Um homem excitado.

Os olhos dela abriram de repente. Com um grito apavorado ela atingiu o homem que

a segurava. Chutou, bateu com os punhos e conseguiu sair tropeçando da cama,

arrastando a maior parte da roupa de cama com ela.

Ela cambaleou para trás e olhou fixamente para o homem em sua cama.

Ele se sentou e acariciou o peito. O peito nu. Ela tentou não encarar. "Ai”, ele disse

tentando puxar assunto. "Você bate muito bem para uma dama”. Ele deu um sorriso

sonolento. "Mas eu te perdoo. Creio que você dormiu bem. Nesse caso, meus esforços

foram recompensados”.

Ele estava completamente nu? Ela se perguntou. O que ela podia ver dele estava nu. E

ela não queria ver mais. "Esforços? Que esforços? E o que você está fazendo aqui?", ela

exigiu.

Ele então deu a ela um sorriso lento, travesso.

"O que você está fazendo na minha cama?", ela repetiu furiosamente.

Ele se esticou e esfregou a cabeça, parecendo impossivelmente bonito. "Eu não estou

na sua cama. Você está na minha”.

"Eu não estou”. Ela deu uma olhada ao redor, e seu queixo caiu. Ela estava na alcova

dele. "Co—Como eu cheguei aqui? O que você fez—"

"Você veio por vontade própria”.

"Eu não fiz isso”. Ela disse. E acrescentou, com menos certeza, "eu não iria”. Oh

Senhor, ela achava que, ela poderia…

Ele não fez nenhuma tentativa de se cobrir e parecia bastante desembaraçado com seu

peito e braços nus. Nell sentia-se nua, apesar de sua camisola de algodão robusto e a roupa

de cama embreada nela.

Ele se debruçou para trás apoiado em um cotovelo e ficou olhando-a envolvida na

roupa de cama. "Eu te guiei, confesso, mas você veio de muita boa vontade”.

"Tolice”, ela disse defensivamente. "Eu não me lembro de nada disso”. Ela morreria

de embaraço se ele pensasse que ela iria até a cama dele procurá-lo pela noite e apenas

subiria em sua cama.

Ele deu a ela um olhar observador. "Não, mas você sabe que é sonâmbula. Isso já

aconteceu antes, não é? É por isso que você estava preocupada por lá não ter nenhuma

fechadura na porta”.

"Sim”. Ela desmoronou sobre uma cadeira próxima à cama, ainda com a roupa de

cama embrenhada nela. Ele compreendeu. Ainda bem. "A Sra. Beasley é que costumava

pedir a uma das empregadas que me trancasse durante a noite. E em casa, Aggie

costumava fazer isso. Eu devia ter pedido a Cooper que dormisse comigo, mas eu pensei

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que… eu desejava que… Parecia que… eu não queria que você pensasse que eu não

confiava em você”.

Ele perguntou curiosamente. "Você sempre teve sonambulismo?".

Ela agitou a cabeça. "Não desde que eu era uma menininha. Começou depois que

mamãe morreu, mas eu cresci sem isto. Só começou novamente depois—", ela cessou

bruscamente.

Ele anuiu com a cabeça. "Eu sei. Você estava procurando por Torie”.

Ela pôs a cabeça entre as mãos. "O que eu vou fazer?".

"Não você—nós. E nós vamos achá-la”, ele disse vivamente e jogou as próprias

pernas para fora da cama. Nell o olhava fixamente. Ele usava um calção de algodão

branco, mas ele disfarçava muito pouco sobre sua masculinidade.

A masculinidade dele muito desperta. Ela sentira um pouco antes, apertado contra

ela.

Seus pensamentos sobre Torie de repente foram empurrados para longe com a visão

de algo imediato e muito mais interessante. A palma dela formigava com a recordação e

ela estava corada, ela lentamente desviou a cabeça. "Por que você não me pôs na minha

própria cama?", ela perguntou.

"Eu fiz”.

"O quê?", ela girou. "Então por que eu despertaria na sua cama?", os olhos dela

desviaram para o calção dele.

"Não foi por isso que eu te coloquei na minha cama”, ele disse a ela. "A primeira vez

que você começou a vagar, eu te coloquei de volta na sua cama e não pensei mais nada

sobre isto. Dez minutos mais tarde lá estava você novamente, tentando subir na janela. Era

quase óbvio que eu teria de passar a noite te perseguindo ou levá-la para a minha cama e

mantê-la segura”.

"Segura?".

"Segura”, ele repetiu firmemente. "E ter certeza de que você dormia corretamente.

Você dormiu melhor, não é? Você parece melhor esta manhã do que nos últimos dias”.

Ela pensou sobre isto. Ela se sentia menos exausta do que já sentia há algum tempo.

"Suponho que sim”.

Ele anuiu com a cabeça. "Bom. Então meu plano funcionou perfeitamente… até você

acordar. E começar a me dar socos”.

Ela fez um gesto apologético. "Eu sinto muito. Não sabia que era você”.

Ele franziu o cenho. "Sei. Então quem você esperava que pudesse ser?".

Nell não iria dizer a ele; nem a ele, nem a ninguém. Ela saltou de pé. "Está ficando

tarde. Os empregados estarão ao redor a qualquer momento. É melhor eu ir”.

"Ele estuprou você, não foi—o pai do seu bebê?", os olhos cinza dele estavam presos

nela.

Ela congelou, a mente, subitamente, ficou apenas um branco.

Ele continuou, "é por isso que você despertou em pânico agora mesmo”.

"Não, eu—"

"Você ficou apavorada quando pensou que havia um homem na sua cama, mas o

momento em que viu que era eu, se acalmou completamente”. A boca dele se moveu em

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um sorriso cheio de remorso. "Embora você tenha motivos para me temer no meu estado

atual”.

Ela mordeu o lábio. Ele não poderia saber: não podia. Ela não iria dizer a ele, não iria

dizer a ninguém. E ela não temia Sir Irwin—ela o odiava. Ela tinha levado um susto, é

tudo. Isso tinha trazido as memórias de volta. Mas ela tinha se libertado delas e faria isso

novamente.

Ela não deixaria que Sir Irwin tivesse qualquer papel em sua vida. Nem mesmo como

uma memória vil. Ou um pesadelo.

Harry persistiu. "É por isso que o seu pai levou o seu bebê durante a noite, pensando

que estaria fazendo a coisa certa por você, não é? Fazendo uma restituição. Tirando de

você o fardo de criar uma criança de um estuprador”.

"Ela não é uma criança de um estuprador; nunca diga uma coisa tão imunda sobre a

minha filha novamente!", Nell retrucou. "Ela é minha, só minha e de ninguém mais. Minha

filha é preciosa, pura e inocente”. E ela saiu correndo do quarto.

Ela foi estuprada. As palavras ecoavam repetidas vezes na cabeça de Harry. Claro que

ela tinha. Tudo fazia sentido agora. Quem era o bastardo? Como aconteceu? As perguntas

o corroíam.

A memória da primeira vez em que eles realmente se encontraram de repente o

cortou como uma faca.

Cristo! Não era de se admirar que ela não queria nada com ele em Bath. Por que ela

gostaria de conhecer o homem que, na primeira vez, tinha forçado um beijo nela? Um beijo

muito carnal. E ele apertara seu corpo excitado contra o dela.

Ele fechou os olhos e passou os dedos pelo cabelo, e se perguntou novamente o quê

diabos o havia possuído. Ele nunca tinha feito nada remotamente parecido na vida. Ele

sempre tratava as mulheres com extremo respeito. E ainda assim ele se comportara

rudemente com a mulher mais irresistível que ele já encontrara.

Ela foi violada do pior modo…

E então ele a tinha forçado a uma situação em que tinha sido compelida a se casar

com ele.

Deus, ela deveria desprezá-lo. Ele xingou novamente e esmurrou a cama.

Capítulo X.

"Eu devo ir com Nell no chaise esta manhã”, Lady Gosforth declarou no café da

manhã. "Você pode montar seu cavalo, Harry. Desejo ter uma conversa particular com a

minha futura sobrinha”.

Nell engoliu em seco. Lady Gosforth tinha descoberto onde Nell tinha passado a

noite? Nell estava para receber uma lição sobre moralidade?

Ela deu uma olhada para Harry. Os olhos dele queimavam sem chamas com as

perguntas que ela conseguira evitar mais cedo pela manhã.

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Por outro lado uma lição sobre moralidade poderia ser preferível a uma inquisição.

Ela não tinha, afinal, feito nada de errado.

"Isso seria ótimo”, Nell disse vivamente. "E estou certa de que Harry apreciaria um

bom galope. Ele precisa de um”. Ela esperou que ele pudesse aceitar a sugestão. Ela não

olhou para ele mas se concentrou em um pedaço de torrada com manteiga que não tinha

vontade de comer. Ela a comeu mesmo assim. Era melhor do que se encontrar com aquele

olhar afiado como uma faca através da mesa.

"Excelente”, Lady Gosforth disse. "Então nós, damas, devemos cozer

confortavelmente”.

Harry ajudou primeiro a tia, então Nell a subir no chaise contratado, dando a Nell um

olhar que dizia pense bem no que vai dizer. "Ela nunca para de falar”, ele murmurou.

Nell não se importava. Era falar sobre si mesma que ela temia. Era provável que Lady

Gosforth, assim como o sobrinho, interrogasse Nell, e ela seria de longe menos tolerante,

Nell estava certa.

"Minha cesta!", Lady Gosforth disse nitidamente quando Harry estava a ponto de

fechar a porta. Sua dama de companhia, Bragge, passou uma cesta grande e coberta.

Nell olhou fixamente para a cesta, sentindo-se um pouco enjoada. Era como a cesta

que o pai tinha levado Torie, só que sem a cobertura…

Era estúpido, Nell sabia, mas por alguns momentos, ela não pôde respirar.

Lady Gosforth colocou a cesta na cadeira ao lado dela. Soltou o trinco e abriu a tampa.

A cesta era forrada com algodão azul e não cetim branco, e continha dúzias de meadas de

lã boa e branca.

Nell começou a respirar novamente.

"Eu tricoto”, Lady Gosforth explicou, vendo o olhar fixo de Nell. "Antiquado, eu sei,

mas é útil e me relaxa. Não consigo bordar ou esse tipo de tolice. Gosto de fazer algo que

possa ser usado”.

Nell anuiu com a cabeça, como se estivesse escutando. Mais um dia, ela disse a si

mesma. Mais um dia e eles estariam em Londres. Amanhã de manhã…

A carruagem se moveu com um puxão e Lady Gosforth retirou uma meada enrolada

e espessa de lã. "Você não se importa, não é?", ela perguntou a Nell, debruçando-se

adiante.

"Não por isso”.

"Coloque as suas mãos no centro da meada—vê como é um grande laço? Ambas as

mãos agora, segure-as separadamente—isto. Vejo que você já fez isto antes”.

Nell anuiu com a cabeça. "Sim, mas não por anos”. Ela tinha envolvido a lã com

Aggie quando ela era uma menininha, mas quando os dedos de Aggie tinham ficado

duros, ela parara de tricotar.

"Agora assim. Eu acho o fim… Ah, está aqui”. Com movimentos vivos Lady Gosforth

começou a enrolar a lã boa ao redor dos dedos, formando o início de uma pequena bola.

Nell imergiu primeiro uma mão e então a outra, soltando o fim da meada.

Por um longo tempo elas ficaram em silêncio. Eles passaram por Marlborough e

chegaram na estrada aberta. Era bastante agradável, Nell pensou, enrolando a lã e

assistindo a zona rural passar deslizando.

Page 107: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Quando você encontrou meu sobrinho pela primeira vez?", Lady Gosforth

perguntou.

Uma pergunta afinal.

"De certo modo, nós nos encontramos em uma floresta. Estava chovendo, e ele foi

muito amável comigo”, Nell disse. Ela não queria explicar o que tinha acontecido na

floresta. Algo especial, mágico e particular havia ocorrido entre eles naquele dia, e ela não

queria explicar, ainda que pudesse. De alguma maneira, ela sentiu que a situação seria

arruinada se falasse. Porque de certa forma não havia sido nada, apenas um pequeno e

insignificante incidente com estranhos em uma estrada…

"Realmente, nós só nos encontramos corretamente quando ele veio até a minha casa—

pelo menos, onde costumava ser a minha casa. Firmin Court”.

"Quando Harry a comprou?".

"Sim”.

"A primeira vez que vocês se encontraram?", Lady Gosforth parecia perplexa.

"Propriamente, sim. Ter uma conversa, quero dizer”. As poucas palavras que ele

articulara na floresta na primeira vez não podiam contar como conversa.

"E a vez seguinte?".

"No Pump Room em Bath. A senhora estava lá”, Nell a lembrou.

Lady Gosforth quase soltou sua bola de lã. "Você quer dizer que aquela vez no Pump

Room foi a segunda vez que você conversou com o meu sobrinho? A terceira vez que

vocês se encontraram?".

Nell anuiu com a cabeça.

"Bom Deus!", ela girou a lã por muito tempo, franzindo o cenho. "Eu nunca teria

acreditado nisto. Três vezes. Ele me disse que te pediu em casamento duas vezes antes e

que você o tinha rejeitado as duas vezes”.

"Isso mesmo”.

"Você quer dizer que ele te propôs casamento na primeira vez que a encontrou?".

Nell anuiu com a cabeça. "Ele estava sendo amável, apenas. Eu tinha perdido a minha

casa e tudo que possuía”.

Lady Gosforth franziu o cenho. "Um homem que ainda está solteiro na idade de vinte

e nove não pede uma mulher em casamento para ser amável, minha jovem. Caso contrário

ele teria se casado há muito tempo. E o Harry que eu conheço não pede nada. Nunca.

Muito menos se já foi rejeitado duas vezes”.

"Da última vez, ele não me perguntou exatamente”, Nell assinalou secamente.

"Sim e isto é ainda mais extraordinário”. Ela considerou Nell pensativamente. "Eu

acho que há mais coisas do que vocês dois estão dizendo”.

Nell se preparou par algo desagradável.

"Mas não me importa, ouso dizer que não é da minha conta”, Lady Gosforth disse

vivamente. "Eu queria conversar com você sobre Harry e também sobre Gabriel. Você sabe

quem eu quero dizer?".

"O irmão dele”, Nell disse.

"Seu meio-irmão, sim”. Ela consertou com um olhar firme para Nell. "Você sabe as

circunstâncias do nascimento de Harry, não sabe?".

Page 108: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Nell anuiu com a cabeça. "Sim, ele foi muito cuidadoso em me explicar desde o

início”.

"Bom. Você sabe que há um cisma na família?".

"Não, eu sei muito pouco sobre a família, exceto uma menção ocasional a Gabe—e

você, claro”.

Lady Gosforth anuiu com a cabeça. "Era o que eu pensava. Ele não te disse que

quando o conheci, não queria ter nada a ver com ele”.

Nell olhou para ela, surpresa.

Lady Gosforth arqueou as sobrancelhas. "Bem, por que eu iria? Com um filho de uma

pulada de cerca do meu irmão?".

Nell enrijeceu. Ela cerrou os punhos dentro da meada de lã e não disse nada.

Lady Gosforth continuou. "Gabriel, também. Naturalmente eu tomei o lado do meu

irmão e de acordo com ele Gabriel era um cuco em seu ninho, para todos os intentos e

propósitos, um bastardo. Ele estava errado, claro, mas meu irmão era um homem teimoso

e irreconciliável. E certamente alguém como Harry—um acidente com uma criada—era

alguém muito aquém para nos preocupar”.

"Um acidente com uma criada?", Nell disse furiosamente. "Que jeito vil de se falar de

alguém”.

A tia de Harry deu a ela um olhar atento. "Isso te ofende?".

"Sim”, Nell disse, encontrando o olhar de Lady Gosforth no mesmo nível.

Lady Gosforth sorriu. "Bom para você, minha querida. Fico ofendida, também, agora,

mas foi isso o que pensei na época”. O sorriso dela enfraqueceu. "Deixe-me dizer a você a

história toda—que é um conto que acho que você devia conhecer”.

Ela chegou a uma linha quebrada, então houve uma pausa enquanto eles procuravam

pelo novo fim. Uma vez que acharam, Lady Gosforth continuou. "Gabriel e Harry foram

educados por minha tia Gert, uma mulher formidável que fazia as coisas do seu próprio

jeito”.

Nell franziu o cenho. "Mas eu pensei—"

Lady Gosforth anuiu com a cabeça. "Harry esteve inicialmente aos cuidados da Sra.

Barrow, cozinheira da minha tia. A mãe dele tinha morrido e ele havia sido abandonado, e

assim teria ficado com exceção do fato de que Harry é a imagem viva de seu pai. No

momento em que a minha tia viu a semelhança de família ela decidiu criar a ambos os

meninos como cavalheiros—afinal não seria bom haver um cavalariço que fosse a imagem

viva do conde. Além disso, Tia Gert dava uma importância absurda ao sangue Renfrew.

Ela disse que criava cavalos e cachorros sem se importar com certificados de casamento, e

filhos mais jovens não eram em nada diferentes. E se o pai deles não cuidava deles, ela

iria”.

Lady Gosforth bateu a língua com tal atitude ultrajante, então continuou. "Quando

chegou a hora de enviar os meninos para a escola, Tia Gert mandou ambos para Eton,

onde os Renfrews sempre foram—a mesma escola em que Marcus e Nash, os dois irmãos

mais velhos, frequentaram”.

Ela agitou a cabeça. "Eu não sei o que ela estava pensando talvez estivesse pensado

que faria bem aos meninos lutarem”.

Page 109: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Lutarem?".

"Sim. É uma peculiaridade do sexo masculino, uma vez que eles façam seu melhor em

baterem um no outro até cansar, eles irão, frequentemente, se tornarem ótimos amigos. E

com certeza a fase era a certa para uma briga. Marcus e Nash tinham sido ensinados a

tratar com desprezo e menosprezar Gabriel e Harry, que sem dúvida se ressentia de seus

irmãos mais velhos por sua posição privilegiada. Criou-se uma inimizade imediata e

amarga. Um pouco permanece ainda hoje, mas Nash conseguiu criar algum tipo de ponte

entre todos eles. Um diplomata nascido, aquele menino”.

Ela suspirou. "Para encurtar uma história comprida, a situação ficou muito

complicada e Gabriel e Harry foram expulsos. Minha tia ficou indisposta no momento e

me pediu para que cuidasse deles. Eu fiquei horrorizada. Eu não queria nada a ver com

um ou com o outro”. Ela sorriu com as reminiscências e acrescentou, "Mas quando eu disse

'pediu’, era uma ordem. Minha tia Gert era algo como um militar, e nos anos da minha

juventude, eu ficava muito nervosa para desobedecê-la”.

Era de família, Nell pensou secamente.

"Claro, assim que eu vi os dois meninos soube que meu irmão estava errado sobre

Gabriel. Ambos tinham a beleza extraordinária do pai—de fato é uma ironia que eles se

pareçam mais com o pai do que os dois meninos mais velhos. Você já se encontrou com

Gabriel?".

"Não”.

"Ele e Harry são quase idênticos, mas Gabriel tem os olhos azuis da mãe e seu cabelo

é mais escuro. Os olhos cinza de Harry, porém, vieram direto de meu finado irmão.

Marcus, o atual conde, tem os mesmos olhos”. Ela estremeceu. "Eles podem ser

extremamente frios”.

Eles podiam queimar também, Nell pensou com um tipo diferente de

estremecimento, e estava pensando em Harry, não em Marcus.

"Eu me lembro deles chegando à minha porta, dois meninos pequenos e idênticos,

machucados, contundidos, firmes e cautelosos. Eu me decidi de uma vez que tomaria

Gabriel—que afinal, era um Renfrew legítimo, mas não tinha nenhuma intenção de cuidar

do bastardo de uma criada, e eu disse isso. Eu disse a Gabriel que entrasse—eu não tinha

nenhuma ideia de qual era—e disse que o outro menino poderia ir para os fundos que os

empregados cuidariam dele. Ele poderia ficar desde que fosse útil”.

Nell pôs uma mão sobre a boca para esconder a angústia. Era cruel, mas ela sabia que

Lady Gosforth seria considerada por muitos como uma seguidora dos padrões adequados.

A maioria das pessoas não pensaria duas vezes sobre isto.

Ela não poderia aguentar se alguém tratasse Torie desse modo.

Lady Gosforth disse com remorso, "eu sei, mas eu nunca pensei como se ele tivesse

sentimentos. Harry ficou longe, lá do outro lado da estrada, fazendo uma carranca, os

braços cruzados, declarando que não precisava que ninguém cuidasse dele. Gabriel estava

furioso, claro. Ele ficou na minha porta e brigou comigo dizendo que ele não ia a lugar

nenhum sem seu irmão Harry. E ele me disse que como todo mundo na família, exceto a

tia-avó Gert e Harry, eu era ignorante, estúpida e uma velha esnobe e repugnante. E então

ele saiu como um furacão para o outro lado da estrada e ficou lá com Harry”.

Page 110: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela riu um pouco trêmula. "Estava chovendo, eu mencionei isto? Eles ficaram

encharcados, mas nada podia movê-los. Harry não iria aonde não o queriam e Gabriel não

iria a lugar algum sem seu irmão. No fim, eu fiquei assustada achando que eles ficariam

doentes e que a Tia Gert me culpasse e assim eu finalmente disse que ambos poderiam

entrar pela porta da frente. Gabriel me fez prometer que seu irmão não sofreria nenhum

insulto adicional. Eu tive que cruzar a estrada e convidar Harry pessoalmente e então ele

me fez prometer que eu não culparia Gabriel por sua lealdade. No final ele veio todo

relutante, você não acreditaria nisto”.

Nell anuiu com a cabeça vagamente. Ela podia acreditar. O menino teimoso crescera e

virara um homem teimoso.

Lady Gosforth deu a Nell um sorriso aguado. "Tia Gert sabia o que estava fazendo,

enviando aqueles meninos para mim. Eu tive quatro bebês, sabe… mas nenhum deles

viveu… E quando eu vi estas duas firmes e pequenas criaturas meio afogadas, com a

mesma aparência do meu irmão quando… dois moleques não desejados, juntos, lado a

lado contra o mundo, bem, meu coração se escancarou”.

Lady Gosforth pôs de lado sua lã e pegou um estojo para retirar um lenço. "Quanto

mais eu comecei a conhecê-los, quanto mais eu percebi como os dois meninos eram bons”.

Ela tocou de leve nos olhos. "Eles vinham para mim frequentemente então, nos feriados da

escola ou quando queriam visitar Londres. Eles se tornaram os filhos que eu nunca tive.

Mas Harry nunca se esqueceu da primeira vez. Levou anos para que ele finalmente

acreditasse que eu o queria e estimava por ele mesmo. Ele nunca se sente querido, sabe, e

ele é muito orgulhoso para pedir qualquer coisa”.

Ela terminou de esfregar os olhos e soprou vigorosamente no lenço. "E então, minha

querida, é por isso que eu acho incrivelmente fascinante que ele tenha te pedido duas

vezes”.

Três vezes, Nell pensou.

"Depois de apenas três encontros—uma menina que ele mal conhece. E quando você

o recusou, ele te carregou e fez tal escândalo que você não teve nenhuma escolha. O Harry

que eu conheço e amo nunca faria algo assim… A menos que…"

Nell esperou, mas Lady Gosforth não disse nada e continuou com a lã.

"A menos que?", Nell perguntou afinal.

Lady Gosforth deu a ela um olhar aflito. "Você ama meu sobrinho?".

Nell não respondeu. Ela não sabia o que dizer. Ela não estava certa do que sentia por

Harry Morant. Ela estava muito confusa para saber.

Ela achava que sabia o que ele queria dela. Parecia ser bastante direto. Mas desde a

noite anterior, ela não estava mais certa de qualquer coisa.

Lady Gosforth suspirou. "Apenas não o machuque, minha querida. Isto é tudo o que

eu peço. Não o machuque”.

Depois do almoço, Lady Gosforth retornou a sua própria carruagem, para um cochilo,

ela alegara. De acordo com Harry, era seu costume habitual cochilar através do país.

"Quem me dera eu soubesse como ela faz isto”, ele disse a Nell enquanto a ajudava a subir

Page 111: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

no curricle amarelo. "As carruagens balançam e saltam por todo o caminho. E então o

momento em que ela chega, vai diretamente para a cama”. Ele agitou a cabeça.

"Você gosta dela, não é?", Nell disse.

Ele pareceu surpreso. "Suponho que sim, sim”. Ele encolheu os ombros. "Eu não

tenho muita família—só ela e os Barrow realmente. E Gabe, em Zindaria”.

Nenhuma menção aos dois outros irmãos, ela notou. "Os Barrow?".

"Meus pais adotivos. A Sra. Barrow era a cozinheira da minha tia-avó. Ela me criou

quando eu tinha mais ou menos sete anos e tem sido a minha mãe desde então”. Ele sorriu

amplamente. "Ela ainda me trata como se eu tivesse sete mas ela cozinha como um sonho,

então eu deixo”.

"Aggie faz o mesmo para mim”.

"E Barrow ensinou a Gabe e a mim tudo o que nós sabemos sobre cavalos”.

"Ele deve ser muito inteligente”, Nell disse.

"Sim, ele é. Então, sobre o que você e a minha tia conversaram?".

"Oh, ficamos tricotando e coisas assim”, ela disse vagamente.

"Tricotando?", ele pareceu horrorizado.

"Nós enrolamos lã”.

"Deus. Eu te adverti”. Ele deu uma olhada para ela sob as sobrancelhas. "Ela te disse

alguma coisa sobre mim?".

"Não muito”, ela contou uma lorota. "Ela me disse sobre a primeira vez em que

encontrou você e Gabriel, isto é tudo. E como ela veio a amar vocês dois como filhos”.

Ele pareceu surpreso. "Ela disse isto? Sobre mim? Como um filho?".

"Sim”. Nell observou o rosto dele. Parecia chocado.

"Você está certa de que ela não estava falando sobre o meu irmão Gabe?".

"Claro que eu estou certa. Por que ela estaria falando comigo sobre o seu irmão?".

Ele agitou a cabeça, ainda aparentemente pasmo. "O que mais ela disse?".

"Ela mencionou que você e seu irmão Gabriel são próximos. Você sente muita falta

dele?".

"De certo modo. Nós sempre fizemos tudo junto. Mas é inevitável que isso aconteça

quando os homens crescem e seguem caminhos diferentes. Ele está em Zindaria com sua

princesa e eu tenho meu haras para me preocupar agora”. Ele olhou para ela e acrescentou,

"e você”.

Por um momento Nell pensou que ele iria beijá-la. O rosto dela se aqueceu. Seus

beijos estavam se tornando muito viciantes.

Ela deu uma olhada para fora da janela. "Oh, olhe”, ela disse, apontando. "Aqueles

dois cavalheiros estão fazendo uma corrida através do brejo”. Um pouco fora da estrada,

dois jovens a cavalo estavam fazendo uma corrida pescoço a pescoço, dando gritos de

euforia.

Harry olhou e ela desejou tê-lo distraído. A linha da chegada estava presa em

arbustos ao longe. Três outros homens jovens esperavam próximos a ela, alegres e

gritando também.

"O cavalo baio vai ganhar”, Nell disse. "O castanho tem o cavaleiro melhor, mas o

cavalo baio é o melhor cavalo”.

Page 112: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Harry assistiu por um momento. Ela estava certa. O cavalo baio estava bem atrás do

castanho, mas seu passo era longo, firme e poderoso. Ele deu uma olhada na expressão

concentrada de Nell e disse, "aposto com você que o castanho ganha”.

"Eu nunca faço apostas”, ela disse imediatamente. Havia gelo em sua voz.

Claro que ela não faria, não com sua história. "Não uma aposta de real”, ele disse.

"Apenas um beijo”.

"Um o quê?", a cabeça dela virou.

"Se aquele castanho ganhar, você me paga com um beijo”.

"Não seja tolo”.

"Que mal pode fazer? É só um beijo. Você não confia em seu julgamento?".

O pequeno enrugar entre as sobrancelhas apareceu enquanto ela tentava ignorar sua

zombaria gentil.

"É”, Harry disse suavemente. "O castanho vai ganhar, e você tem medo de que eu

esteja certo”.

"Tolice! Muito bem, eu aceito a aposta”, Nell declarou. "Você verá quem está certo”.

Eles assistiram enquanto os dois jovens chegavam à linha do final. O cavalo baio

puxou a dianteira, comendo a distância em passos largos, longos e poderoso.

"Está vendo, está vendo?", ela saltou de cima a baixo na cadeira. "Ele é o premiado,

meu cavalo é o premiado! Apareça cavalo baio!".

Harry era o premiado, também, ele pensou. Com um beijo como aposta, de qualquer

modo, ele não poderia perder.

"Eu ganhei”, ela gritou com alegria. "Meu cavalo ganhou”.

"Sim”, ele disse fingindo remorso. "E agora eu terei que pagar a minha aposta”. Ele se

debruçou adiante.

Ela olhou para ele nervosa. "O que você está fazendo?"

"Pagando a minha aposta”, ele disse e antes que ela pudesse dizer uma palavra, ele

tomou sua boca com um movimento firme e possessivo. Com o gosto dele, um tiro rápido

de calor passou depressa por ela, e os cavalos do lado de fora, o chacoalhar da carruagem,

e o mundo foram se enfraquecendo. Havia apenas ele, sua boca, suas mãos, seu gosto, seu

odor e sua sensação. Ela derreteu.

Depois de um momento ela percebeu que ele estava se afastando. Ela se sentou,

tentando parecer que não tinha praticamente subido nele.

"Nós temos público”, ele disse com um sorriso sentido, e ela viu que eles tinham

chegado a uma pequena aldeia. As pessoas na rua os observavam passar. Eles podiam ver

dentro da carruagem, graças à grande janela na frente. Não era nenhuma maravilha ele ter

parado. Ela estava muito contente. Quase.

"Aquele cavalo era muito rápido”, ela murmurou, desejando que soar composta.

Apostar um beijo—era quase tão perigoso quanto apostar dinheiro. "Eu me pergunto,

quem será que o criou?".

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"Ele não é tão rápido quanto Sabre”, ele disse a ela. "E Ethan pegou uma potranca de

Zindarian com dois anos de idade que poderá dar o valor de Sabre em prêmio de corrida.

Nós vamos entrar no St. Leger Stakes16 em Doncaster no próximo ano”.

Nell anuiu com a cabeça. "Boa ideia. As éguas correm melhor nessa época do ano do

que no verão. Ficam menos distraídas, acho”.

Ele olhou para ela, surpreso. "Isso mesmo”.

Ela riu da expressão dele. "Você já se esqueceu tão rápido que os avôs de alguém

criavam cavalos de corrida? Era meu sonho, também. Tenho altas esperanças no potro da

Toffee, deixe-me te dizer. A propósito, você já deu um nome a ele?".

Ele sorriu. "Eu o chamei de Firmin's Hope17”.

"Ohh”. Por um momento foi tão inesperadamente tocante que Nell não pôde dizer

nada. Ela não poderia ter escolhido um nome melhor. Resumia tudo; a esperança dela pelo

potro, pela propriedade, e as esperanças dele também, parecia. Sem mencionar os

trabalhadores da propriedade que conseguiriam uma porcentagem do dinheiro do prêmio

cada vez que o potro ganhasse. "Esse é um nome adorável”, ela disse rouca. "Apenas

perfeito”.

Ele olhou fixamente para ela abaixo. "Assim como você”, ele disse e a trouxe para

seus braços. A aldeia estava atrás deles…

O Palácio de Zindaria

Senhorita Jane Tibthorpe, conhecida entre os amigos como Tibby, aceitou a dúzia ou

mais de cartas que o criado trouxera em uma bandeja de prata com um agradecimento

silencioso.

Ela imediatamente começou a classificá-las: convites luxuosamente gravados,

correspondência com relevos ornados, papéis de notas feitos com linho, cartas com selo

real, uma nota pessoal da Duquesa de Braganza para a Princesa Caroline de Zindaria.

"Por favor, leve esta para a princesa”, ela disse ao criado. "É uma nota pessoal e não

deveria vir para mim”.

Os dedos dela congelaram quando surgiu uma pequena carta branca, escrito em um

papel de carta comum e diário. O coração começou a bater forte sob o justilho recatado e

seu simples vestido azul.

Tibby soube de cara de quem era.

Ela vivia por aquelas cartas.

"Isso é tudo, obrigada”, ela disse ao criado. Assim que ele se foi, ela rapidamente

dobrou a carta e colocou no seio dentro seu vestido.

As cartas de Ethan ela lia em isolamento absoluto. Elas eram sua e apenas sua. Como

eram seus sentimentos.

16 St. Leger Stakes é o campeonato de corrida de cavalos de primeira qualidade no Reino Unido, aberto a potros e

potrancas de sangue puro de três anos. Tem a distância de 2,937 metros e é realizada na Pista de Corridas de

Doncaster, todos os anos em Setembro.

17 Firmin's Hope – A esperança de Firmin. Referência à residência de Harry, Firmin Court.

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Ela se curvou tranquilamente para sua tarefa, trabalhando metodicamente no

pequeno monte de correspondências até que seu trabalho estava concluído.

Até isso já era o meio da tarde. Callie tinha a prática de continuar a cerimônia inglesa

de chá e bolos neste horário do dia. Ela fazia isto por Tibby e por si mesma, então Tibby

teve que demorar um pouco mais para ler a carta.

Ela bebeu seu chá, mordiscou um bolo, e tentou manter conversa. Afortunadamente,

havia convidados no palácio e Callie estava muito ocupada para notar que sua amiga

estava distraída. Assim que o chá acabou, Tibby se desculpou e saiu para o jardim.

Era um dia seco e frio e ela sabia onde ela ficaria bastante só. Havia apenas mais uma

hora de luz do dia—os dias estavam ficando curtos depressa—mas se ela fosse para seu

quarto para lê-las, alguém saberia onde achá-la. Ela não suportaria ser interrompida

quando estivesse lendo uma das cartas de Ethan.

Ela se dirigiu ao alto labirinto da sebe, caminhando viva e infalivelmente para seu

centro. Ela se sentou no banco que havia lá, respirou fundo e tirou a carta. Ela quebrou o

selo cuidadosamente e abriu a carta, alisando as pregas ternamente.

Minha querida Senhorita Tibby…

A caligrafia familiar a fez sorrir, era muito como Ethan: de aparência áspera, nada

convencional e atraente. Ela deu uma olhada depressa para a segunda folha, e sim, havia

um desenho. Ela não se deixou olhar para ele, não ainda.

Ela leu a carta lentamente, saboreando-a, ouvindo as frases e as palavras escolhidas

com a voz profunda e rica de Ethan. Ela amava ouvir sobre os vários eventos de sua vida,

como os cavalos estavam indo, as esperanças dele com certa potranca, sua amizade

crescente com o vigário de idade avançada e os jogos de xadrez que eles jogavam muito

frequentemente.

E oh! Ele comprara um chalé. Um chalé… por que ele precisaria de um chalé? Com

três quartos.

Ela virou a folha de papel e pela primeira vez olhou propriamente o desenho. Era

bonito, desenhado com toda a vitalidade habitual e graça de Ethan. O chalé saltava da

página, real e vívido, e as rosas que se curvavam em direção à entrada eram tão delicadas

e reais que ela quase poderia cheirá-las. Mas a mulher…

Tibby semicerrou os olhos, tentando perceber suas características, mas era apenas um

esboço, realmente.

Ela esquadrinhou o resto da carta depressa e ofegante.

…a dama que estou cortejando…

Ethan estava cortejando! Cortejando uma dama. Por um momento Tibby não pôde

respirar. Era como se uma pedra tivesse se formado em seu peito. Ela olhava fixamente

para as palavras.

…a dama que estou cortejando é tão boa e educada…

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Tibby deu várias respirações profundas. Ela estava contente por ele ter achado

alguém, ela se dizia, apesar de estar ficando um pouco difícil para respirar. Sr. Delaney—

não era adequado pensar em um homem comprometido pelo seu primeiro nome—era um

homem bom, forte, muito atraente e com muito charme. Um cavalheiro por natureza.

Nada mais natural do que ele rapidamente achar uma mulher jovem e adorável para se

casar e se acomodar.

O que ela pensava? Que ele olharia duas vezes para uma solteirona magra já nos seus

trinta e sete anos? Claro que não, não um homem viril como Ethan. Ele escolheria uma

mulher entre várias. Ele provavelmente apenas escrevia para Tibby como forma de

gratidão por tê-lo ensinado as letras.

Que coisa boa esta mulher jovem e adorável ser educada; ela poderia ajudar Eth—Sr.

Delaney com seus livros.

Ela estava muito contente por ele, ela disse a si mesma. Muito contente realmente.

Emocionada por ele, de fato. Ela escreveria e diria isso a ele. Imediatamente.

…Ela pode não olhar para um tolo como eu…

Um tolo? Como esta mulher ousa—quem quer que ela fosse—tratar Ethan com

desprezo. Se ela não pudesse ver o homem sensível e inteligente que ele era, ela não

merecia tê-lo.

E o Sr. Delaney não deveria tolerar menos do que o extremo respeito de sua esposa.

Tibby escreveria imediatamente e o lembraria disso. Ethan era às vezes muito modesto

consigo mesmo.

Ele provavelmente pararia de escrever para ela quando estivesse casado.

Uma gota de chuva espirrou no papel. Tibby olhou para cima. Não estava chovendo.

Ela olhou para a carta novamente.

‘Respeitoamente’ seu, Ethan Delaney.

Respeitosamente dela… Oh, Ethan…

Outra gota d’água caiu sobre a carta, então outra e mais outra.

Harry despertou ao amanhecer. O alvoroço de Londres sempre fazia com que ele mal

conseguisse dormir. Continuava até tarde na noite, e então um homem estava apenas

adormecendo quando vinha barulho de carruagens, carroças, carrinhos de mão, gritos de

trabalhadores, vendedores de tortas e só Deus sabe mais o quê.

Era até mais irritante ainda quando ele estava duro e rígido com frustração.

Nell se mexeu suavemente em seus braços.

Eles chegaram tarde à casa de sua tia em Mount Street, fizeram uma ceia leve, e

ordenaram banhos quentes. Eles foram para a cama quase imediatamente depois.

Harry organizou que Nell tivesse o quarto oposto ao dele. Depois que ela foi para a

cama, ele esperou, deixando a própria porta entreaberta.

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E então, dentro de uma hora ele ouviu a porta se abrir. Nell emergiu, com os olhos

vítreos e murmurando ansiosamente, de camisola e com os pés nus. Ela estava a meio

caminho da passagem para baixo antes de ele pegá-la e suavemente girá-la. Ele a levou de

volta para a cama, murmurando certezas para ela sobre a segurança de Torie e desejando

com o máximo de força que elas fossem verdade. Ele a persuadiu até a cama e então subiu

com ela.

Confiante como uma criança ela se enrolou contra o corpo dele.

Mas ela não era nenhuma criança e ele e seu corpo sabiam disso. Era uma agonia

deitar ao lado dela desse jeito. Ele doía com a vontade de tomá-la, de fazê-la sua. Ela se

mexeu novamente e ele suavemente diminuiu o aperto, o braço entorpecido correndo para

fora de sob seu corpo suave e relaxado.

Descansando sobre um cotovelo ele olhou para ela. Ela era tão adorável sob a suave

luz matutina, tão aberta e desavisada, sem suas defesas habituais. O decote de sua

camisola deslizara, revelando um ombro magro e nu. Ele se curvou e suavemente o beijou.

Deus, ele não estava preparado para isso quando se decidira pelo casamento.

Acordada ela parecia tão independente, tão forte, mas adormecida… adormecida ela

era tão vulnerável.

Ela precisava de alguém que cuidasse dela.

Ela precisava dele.

Harry estava contente pelo pai dela estar morto; o homem deveria ter levado um tiro

por ter deixado a filha naquele estado. Ele a tinha deixado só, sem dinheiro, sem casa, e de

coração partido. Tudo o que tinha ficado para ela era a ideia de achar a sua filha.

O que aconteceria se ela nunca achasse a criança?

Deus a ajudasse. Ela precisaria dele ainda mais, então.

Ninguém jamais precisara dele antes, não assim. Ninguém dependera dele de um

jeito tão devastadoramente pessoal. As pessoas no exército dependiam dele, mas qualquer

oficial competente teria se saído bem da mesma maneira. Como peças de xadrez, eles eram

intercambiáveis. Era o trabalho que importava, não a pessoa.

Ninguém nunca tinha realmente precisado de Harry.

Era isto o que significava ser uma família de verdade? Ele sempre considerara que

tinha uma família, ou algo assim. Ele tinha um irmão pelo qual morreria; Gabe faria o

mesmo por ele.

Mas eles não precisavam um do outro. Senhor, eles viviam em países diferentes, a

centenas de quilômetros de distância. Gabe poderia faltar ocasionalmente, mas ele não

precisava dele.

Tia Maude dissera a Nell que acabou vindo a amá-lo como a um filho mas ele sabia

mais do que bem que ele não era necessário para ela de uma forma real. Os Barrows o

amavam, e ele os amava, também, mas ele os deixara quando era uma criança para seguir

o tambor que anunciava as batalhas.

Oito anos de guerra o ensinara que um homem não precisa de ninguém ou de nada—

mesmo para os amigos você tinha que se blindar com aço porque eles poderiam morrer em

um piscar de olhos. Ou lenta e dolorosamente. Ou poderiam ser levados por uma carroça,

para morrer em outro lugar.

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Todo mundo te deixava no fim.

Mas se ele deixasse Nell—seus braços se apertaram ao redor dela com o pensamento;

não havia nenhum modo possível que ele pudesse deixá-la, não conscientemente…

Ele podia matar por ela, podia morrer por ela, mas deixá-la? Nunca.

Mas e se ele falhasse ao tentar achar a criança dela? Ela o deixaria então?

Através da luz suave do amanhecer em seu cabelo, espalhada sobre o travesseiro, era

cor de caramelo e nata. Um cacho caiu sobre seus olhos. Ele o levou para trás. Sua pele era

como uma seda morna.

Dormindo ela parecia menos tensa, mais jovem e mais suave. A respiração era

profunda e regular, os lábios estavam separados suavemente. Ele pensou em beijá-la até

que acordasse, tranquila e suavemente, e ir aprofundando-o, e então…

Não, não ainda. Ele tinha que ir lentamente com ela, deixá-la se acostumar com ele,

ensiná-la a confiar seu corpo a ele. Ela era frágil, vulnerável. Deus sabia o que aquele porco

imundo tinha feito a ela…

Ele mataria por ela, com certeza.

Ele fechou os olhos e tentou fazer algum sentido do caos dentro de si. Deus, mas ele

não estava preparado para estes sentimentos quando ele se decidira pelo casamento. Ele

não estava acostumado aos sentimentos em si.

Ela não era nada como a esposa confiante, bem organizada e friamente apropriada de

classe-média que ele tinha planejado. Ele imaginava que ter uma esposa seria algo como

ter uma… uma gerente para a casa, alguém que daria conta de todos os aspectos

domésticos e da vida em sociedade. Ele imaginara alguém confortável e obediente que, ele

esperava, apreciaria a parte corporal do casamento.

E mesmo que ela apreciasse ou não esta parte do casamento, com o tempo ela o

forneceria com crianças e então Harry teria sua própria família—uma família real. Tudo

sem mudar demais sua própria vida. E deixando-o livre para embarcar nos negócios de

criar cavalos para serem campeões de corrida.

Nell era muito diferente da esposa que ele contava que seria possível, mas ele não a

trocaria pelo mundo.

Era apenas uma questão… de se acostumar.

Ele não estava acostumado a ter que lidar com tantos sentimentos—dele e dela. Era

desestabilizante, caótico.

No passado ele sabia exatamente o que sentia e por que. Ele estava com raiva ou feliz,

preocupado ou cansado—e havia razões, sempre havia razões para o modo como ele se

sentia; ele estava preocupado porque estava enfrentando outra batalha pela manhã, ou ele

estava bravo porque alguém tinha arruinado as ordens, deixando seus homens mal-

equipados ou famintos.

Costumava fazer sentido. Agora ele não sabia como se sentia, e o que quer fosse, não

era confortável ou lógico.

Ela se moveu e as doces curvas da parte detrás do corpo dela roçaram contra o corpo

dele. Harry quase gemeu em voz alta. Algumas sensações permaneciam lógicas, e não

exatamente confortáveis.

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Ele a abraçou, sentindo desejo, desesperado para fazer amor com ela. Em outras

circunstâncias ele poderia seduzi-la agora, enquanto ela ainda estava toda suave,

sonolenta, morna e cheia de confiança em seus braços. Mas ele não podia. Seria quebrar a

confiança dela.

A confiança dela seria o presente mais precioso que ela poderia dar a ele.

Ela fora estuprada. Harry não conseguia nem imaginar como seria a sensação.

O mais próximo do terror que ele conhecia era aquela surra que ele recebera do pai e

dos irmãos de Anthea quando ele tinha vinte anos. Dominando, despido e vulnerável,

então espancado e sangrando muito. E Anthea assistindo, os olhos cintilando com

excitação. O momento mais humilhante de sua vida. A pior coisa não foi o sangue ou a

dor: foi a violação do seu sentido de seu próprio corpo, o seu desamparo completo à vista

do poder deles.

Ele se lembrava como se tivesse sido ontem, mas tinha acontecido há quase dez anos.

Para Nell não havia passado nem um ano.

Ele deitou a boca contra o ombro nu dela e inalou o odor de seu corpo. Sua mulher.

Para proteger e cuidar.

Ele não sabia o que tinha acontecido com ela, o que aquele bastardo havia feito, mas

ele sabia que ela teria lutado, assim como Harry tinha lutado contra seus algozes. E sido

dominado, impotente e humilhado contra sua vontade.

Depois que ele recuperou a saúde física, ele tinha arrumado brigas, entrado em rixa

atrás de rixa, sempre contra um grupo de homens, sempre contra todas as chances, tendo

que provar a si mesmo, repetidas vezes, que ele era um homem. Finalmente a guerra

queimara o ódio e a necessidade de vingança dele. Ele estava tranquilo e confiante sobre

ser um homem agora. Não tinha que provar nada.

O que as mulheres faziam? Ele não sabia.

Mas se as duas situações fossem um mínimo possível semelhantes, ela precisava do

poder de fazer a escolha para se dar o quanto quisesse. Ela precisava tomar o controle de

volta, ao invés de ter isto tirado dela.

Ele se lembraria disso quando ele finalmente fizesse amor com ela. Seria logo, ele

pensava. Mas não hoje.

Ele levou seu corpo para longe do dela e saiu da cama dela. Mergulhar em um lago

com frio glacial, ou um fazer passeio firme no amanhecer frio deveria ajudar.

Ele andou nas pontas dos pés para fora e cruzou o corredor para seu próprio quarto.

Ele tinha apenas colocado suas calças quando ele ouviu a porta de Nell ser aberta.

Em dois passos ele cruzou o quarto e abriu a porta.

"Oh”, Nell ficou na passagem de camisola, mas com um xale apertado ao redor de seu

corpo pelo menos. Os pés dela ainda estavam nus, ele notou irritado. Os dedos ficariam

congelados. Ele tinha passado muito tempo aquecendo aqueles dedos na noite anterior.

Eles estavam como pequenos blocos de gelo. Ele se sentia um pouco dono daqueles dedos.

"Oh, bom, você já está de pé”, ela disse. "Eu me arrumarei em cinco minutos”.

"Para?".

"Para começar a procurar Torie”.

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"É muito cedo. Nenhum diretor de orfanato estará de pé ainda, muito menos para

receber visitas”.

"Mas—"

"Nós concordamos às oito horas, lembra?", foi o máximo que ele conseguiu dizer que

ela concordasse. Se eles não tivessem chegado a Londres na escuridão, ela com certeza

teria saído imediatamente para procurar.

Os dedos brincaram com a franja do xale. "Eu sei, mas não consigo dormir. Tenho que

começar a procurar”.

Ele estava muito tentado a dizer que ela estava dormindo perfeitamente bem há

apenas alguns minutos antes, mas examinando os olhos agoniados dela, ele fechou a boca.

Não era que ela não pudesse dormir, ela não podia esperar.

"Faz semanas”, ela disse. "Mas agora que estou aqui não posso desperdiçar um

minuto. Se você não quiser ir, está bem, eu irei sozinha”. Ela voltou para seu quarto.

"Não, nós iremos juntos”, ele disse a ela. "Eu te encontrarei no andar de baixo em

quinze minutos”.

"Obrigada”. Os olhos dela deslizaram pela mandíbula áspera, então o tórax nu, e

descansaram brevemente em suas calças de buckskin. Ela franziu o cenho. "Você não vai

assim, não é? Quero dizer, com essas calças de montar. E sem se barbear. É que, se você se

vestir mais formalmente, estou certa de que eles seriam mais cooperativos”.

Ele ergueu as sobrancelhas.

"É verdade”, ela disse seriamente, "nos meus últimos dias em Londres, as pessoas

com as quais eu conversava eram às vezes terrivelmente rude e não me ajudavam, acho

que era porque eu estava bastante molhada e desesperada. Então se você estiver… eu não

sei bem… respeitável e dominante, poderia ajudar”.

Ele estava tentado a lembrá-la que no passado ela tinha objetado seriamente contra

seus modos dominantes, mas ela estava tensa como uma corda de arco, e agora não era a

hora certa.

"Farei o meu melhor”, ele disse. "E Nell—"

Ela se voltou e ele a pegou em torno da cintura e a trouxe contra ele. "Pare de se

afligir. Nós vamos achá-la”, ele disse e firmemente a beijou.

Os olhos embaçados se ergueram e ela anuiu com a cabeça, apertando os lábios bem

juntos como se fosse incapaz de conversar, e desapareceu do quarto dele.

Harry pediu água quente e ordenou um café da manhã simples para estar pronto em

quinze minutos. Ele se barbeou—não era o que fazia melhor, ele tinha que pensar em

conseguir um camareiro—e rapidamente se vestiu. Afortunadamente quem quer que seja

que tivesse desempacotado suas roupas também as tinham apertado e elas pareciam

bastante respeitáveis. Ela sabia como se impor mesmo que estivesse com a barba por fazer

e meio vestido.

Ele se vestiu depressa mas quando abriu a porta ela já estava esperando por ele, os

pés dançando impacientemente. Ela estava usando aquele vestido marrom pardo

novamente. Maldição, ele não conseguia esperar que ela pegasse algumas roupas decentes.

"Eu não tenho um chapéu!", ela disse como se fosse um grande desastre. "Você perdeu

meu chapéu em Bath, lembra, e não parou para pegar. E agora eu não tenho um chapéu!

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Eu preciso parecer respeitável. Eles não serão úteis se não pensarem que eu sou

respeitável. E como eu posso parecer respeitável se não tiver um chapéu?".

"Nós arrumaremos um chapéu para você”.

Ela torceu as mãos. "Nesta hora da manhã? Onde?".

Ele deu uma olhada além dela e viu que a criada estava apressada ao longo da

passagem. "Você deveria ter me chamado, m’ lady”, Cooper começou. "Eu não sabia que

você estaria de pé tão—"

"Lady Helen precisa de um chapéu”, Harry disse a ela. "Nós iremos para o andar de

baixo tomar café da manhã—"

"Eu não posso comer nada”, Nell disse a ele.

Harry dobrou a mão de Nell em seu antebraço e disse à empregada, "Ache um

chapéu, seja uma boa garota, e o traga para a sala de estar do café da manhã”.

"Sim, senhor”. Cooper foi fez uma mesura e saiu.

"Agora, café da manhã”, ele disse e levou Nell em direção aos degraus.

"Mas eu não quero nada”.

"Você vai comer ou não vai colocar um pé para fora desta casa”.

"Mas—"

"Não discuta. Na última vez que você foi procurar sua filha, você desmoronou de

fome. Eu não vou aceitar isso”.

Ela suspirou e anuiu com a cabeça. "Certo. Eu não pensei nisso… Estou tão nervosa

que é provável que eu não consiga manter nada no estômago”.

"Você vai. São seus nervos que te fazem se sentir assim. Acredite, é um homem que

viveu em campanhas que está te dizendo, você se sentirá melhor com algo no estômago”.

Eles caminharam de braços dados degraus abaixo.

"Você dormiu na minha cama ontem à noite?", ela perguntou abruptamente.

"Sim, dormi. Você começou a andar novamente, então era mais fácil apenas entrar na

sua cama e te manter lá. E deu certo”, ele acrescentou, perguntando-se por que diabos ele

se sentia tão defensivo sobre isto. "Você dormiu a noite inteira sem despertar”.

"Eu me perguntei se tinha sido isso. Obrigada”.

Harry olhou surpreso para ela. ‘Obrigada’ era a última coisa que ele esperava ouvir.

Ela explicou, "apesar de tudo, eu me sinto bem descansada”.

Era mais do que Harry poderia dizer. "Café da manhã”, ele disse e a conduziu para a

sala de estar do café. A cozinheira os fez ficarem orgulhosos com tal rapidez. Ela fez ovos

mexidos, bacon, torrada de presunto, massas doces, e um bule com café e outro com

chocolate quente.

Nell optou por uma massa e chocolate quente, Harry escolheu outra coisa e café.

"Eu fiz uma lista ontem à noite”, ele disse entre as mordidas. "Marquei os lugares aos

quais você foi. Nós começaremos com todas as instituições ao noroeste da cidade primeiro.

Creio que seria mais provável que seu pai tivesse escolhido um lugar perto de onde estava,

talvez uma área com a qual ele estivesse familiarizado, mais do que atravessar a cidade a

cavalo”.

Nell anuiu com a cabeça. "Isso faz sentido”. Ela não tinha comido quase nada, mas

pelo menos estava bebendo o chocolate. Seus dedos tremiam enquanto erguia a xícara.

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Ele se debruçou e pegou a mão dela na dele. "Pare de se preocupar, nós a acharemos.

Agora coma algo”.

Ela anuiu com a cabeça. "Nós iremos, sim, iremos”, ela disse, como se estivesse se

convencendo. Ela desintegrou a massa com os dedos, então acrescentou com a voz em um

quieto desespero, "nós devemos”.

Houve uma batida na porta e Cooper entrou, com uma peliça parda e um chapéu.

"Tenho um chapéu para você, m’ lady. É um velho de Lady Gosforth. Eu melhorei o

aspecto com um pouco de tiras e algumas penas—"

"Obrigada, Cooper”. Nell saltou, pegou-o e colocou. Ela girou para Harry.

"Respeitável?".

"Muito bom”, ele disse. Ele não sabia muito sobre chapéus, mas ele gostava deste.

Não escondia o rosto dela como a maioria dos chapéus ridículos que as mulheres usavam

estes dias.

"Então vamos”. Cooper ajudou Nell a entrar na peliça. Nell fechou os botões com

dedos febris e desajeitados, dizendo a Harry, "você já acabou, não? Nós precisamos sair

agora”.

Harry deu um olhar sentido para seu prato meio cheio, bebeu sua xícara de café, e

ficou de pé.

"Bom dia, meus queridos”. Lady Gosforth entrou no cômodo. Ela parou e

esquadrinhou Nell detalhadamente. "Céus! Esse é o meu chapéu velho? Parece bastante

elegante, devo dizer. Não há necessidade de abrir a boca para mim como um peixe, Harry,

eu já levantei várias vezes em horários tão selvagens, e com um casamento em três

semanas, há muito para ser feito. Sprotton, um pouco de chocolate quente, por favor.

Estou fazendo planos para as nossas expedições de compras hoje, minhas queridas. Eu

pensei que começaríamos com uma visita a minha fabricante de mantua18”.

"Mas eu não posso!", Nell lamentou. E girou para Harry, "Nós temos que ir”.

"Nell não estará livre hoje, Tia Maude”, Harry disse. "Negócios urgentes. Amanhã,

talvez, ou alguma outra vez”, e ele marchou com Nell porta a fora.

"Que pena, Harry, mas a menina precisa fazer compras. Diga a ele, minha querida—"

Mas eles já tinham ido.

Capítulo XI.

"Isso foi maravilhoso”, Nell ofegou quando o curricle se moveu em um trote rápido.

"Quando sua tia entrou, achei que nunca conseguiríamos sair”.

"Estou usando as minhas roupas de comando”, ele disse secamente. "Ah, aqui

chegamos”.

Para a surpresa de Nell, Harry parou e o cavalariço saltou para segurar os cavalos.

Eles ainda não tinham saído de Mount Street.

"Por que nós estamos parando?".

18 Mantua- vestido solto feminino usado como um manto ou sobretudo no início do século 18.

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Harry gesticulou para um edifício alto. "A casa de correção da paróquia de St. George,

em Hanover Square. Devemos começar pelo mais próximo”. Ele saltou e a desceu.

Nell se sentia de repente oca.

O edifício era grande, três pavilhões altos, construídos de tijolo e boas intenções, mas

sombrio, mesmo assim, com janelas pequenas. Se havia crianças do lado de dentro, não era

possível ouvir.

Harry bateu na porta. Depois de um momento, uma mulher magra vestida de cinza

abriu-a. Ela olhou para eles com surpresa. "Em que posso ajudá-los?".

"Harry Morant”, Harry disse e cumprimentou-a tirando o chapéu. "E essa é minha

esposa. Nós desejamos falar com quem está no comando”.

Nell apenas assistiu o fato de ele tê-la chamado de sua esposa. Ela estava tentando

controlar o tremor que havia começado com as palavras "casas de correção da paróquia”.

Ela já tinha perdido a conta de quantas vezes ela já havia visitado uma antes. Se ela

soubesse que essa era tão perto, teria vindo na noite anterior.

A mulher deu um passo para trás para deixá-los entrar. "O diretor não está, não

ainda. Mas talvez eu possa ser capaz de ajudar”.

Dentro havia vapor e cheiro forte de sabão de lixívia. "Dia de limpeza?", Nell falou

sem pensar e se perguntou por que dissera isto.

A mulher deu a ela um olhar frio. "Isso mesmo”. Ela se virou para Harry. "Como

posso te ajudar?".

"Uma falecida prima da minha esposa deu a luz a uma menina meses atrás”, ele disse,

apertando a mão de Nell para que assim ela não reagisse. "Nós acreditamos que o pai dela

possa ter trazido o bebê para cá—tragicamente, ele, também, está morto, e é por isso que

nós demoramos tanto para seguir a trilha da criança. Nós desejamos criar a criança como

nossa”.

A mulher os levou para um escritório pequeno e tirou um pesado e amarrado livro-

razão azul. "Quando isto teria acontecido?".

Harry deu uma olhada para Nell.

"Em torno do dia dezenove ou vinte de outubro”, ela disse. Quase seis semanas antes.

A mulher virou as páginas com lentidão exasperante. "Dia dezenove…", ela disse. "E

qual a idade da criança na época?".

"Cinco semanas”.

A mulher ergueu as sobrancelhas. "É improvável que nós pegássemos uma criança

nessa idade”, ela disse. "Ela tinha sido batizada?".

"Não”.

"Mas a mãe ou o pai eram membros desta paróquia, certo?".

"Não a mãe. E—não estou certa quanto ao pai”. Ela não achava que Sir Irwin fosse um

membro de qualquer paróquia, mas se ele fosse, não seria uma paróquia de Londres mas

sim a igreja próxima de sua casa no interior.

"Nós só cuidamos de membros desta paróquia”, a mulher disse. "Então se a criança

não é desta paróquia…", ela se moveu para fechar o livro pesado. A mão de Harry

disparou e bateu sobre a página aberta.

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"Seria bom checar os seus registros de qualquer maneira”, ele disse com uma voz

sedosa e tranquila que enviou um calafrio coluna abaixo de Nell. Os olhos dele reluziam

friamente.

"Sim, claro, senhor”, a mulher disse apressadamente. Ela correu a lista com o dedo.

Nell prendeu a respiração.

"As únicas crianças que nós recebemos naquela semana fora um menino de dois anos

e uma menina de dez meses que entraram com a mãe”.

O coração de Nell afundou. Ao longe ela ouviu Harry dizendo, "você disse que

normalmente não aceita bebês muito jovens. Quem aceita?”.

"O Hospital dos Enjeitados do Capitão Coram, em Bloomsbury Fields”.

"Então é para lá que nós iremos a seguir”, ele disse.

Nell já estava a meio caminho da porta.

O Hospital dos Enjeitados do Capitão Coram ficava no local mais aberto de

Bloomsbury Fields. Um edifício de tijolo imponente, construído com duas alas

significativas se estendendo ao redor do pátio central.

Desta vez eles falaram com o diretor, um homem grande usando um severo terno

preto. "Sim, nós só pegamos crianças com menos de doze meses”, ele disse a eles, polindo

um par de pince-nez com aros dourado. "A criança da sua prima é ilegítima, correto?".

Nell não podia falar.

"Sim”, Harry disse.

"A primeira criança da mãe?".

"Sim”, ele disse novamente.

O homem colocou os óculos em seu nariz e perscrutados através dele para Nell. "E de

uma mãe de bom caráter?".

"Sim”, Harry disse firmemente.

"Então há uma boa chance de que ela tenha sido admitida aqui. Dezenove ou vinte de

outubro, você diz”. Ele ajustou o pince-nez e consultou os registros.

A mão de Nell deslizou na de Harry. Ela esperou.

"Várias meninas dessa idade foram admitidas da segunda para a última semana de

outubro”, ele disse finalmente. "Qual era o nome da sua finada prima?".

Nell olhou fixamente para ele sem expressão.

"Ela não está certa de qual nome o tio poderia ter dado à criança quando a trouxe”,

Harry explicou.

"Ele queria esconder o escândalo”, Nell finalmente conseguiu se controlar e dizer. "O

nome dela é Victoria Elizabeth”.

O homem ergueu as sobrancelhas. "Dois nomes próprios”, ele disse. "Entendo”. Ele

consultou o registro e agitou a cabeça. "Nenhuma criança listada com esse nome”.

"Quais nomes você tem?", Harry perguntou.

"Temo que não possa revelar isto”.

Nell embreou firmemente na mão de Harry. "Tente Freymore”.

O homem examinou os registros. "Não”.

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"Demon19”.

Novamente aquela espera agonizante mas, "não”.

"Firmin”.

"Não”.

"Smith, Jones, Brown20”.

O homem nem se aborreceu. Mas seus olhos estavam compassivos, e ele tocou um

pequeno sino. Uma mulher usando bombazine escuro entrou. "Enfermeira-chefe, por

favor, poderia mostrar a esta senhora e seu marido as fichas de outubro deste ano? Pode

haver algo que ela reconheça”.

"Fichas?", Nell se perguntou o que ele queria dizer. Ela deu uma olhada para Harry

mas ele agitou a cabeça.

"Venha por aqui, senhora”, a mulher disse e saiu apressada. O tecido duro sussurrava

a cada passo. Ela os levou para um quarto pequeno com uma mesa e um armário grande.

Ela gesticulou para Nell e Harry se acomodarem, então abriu o armário. Continha

arquivos enfileirados em caixas pequenas, cada uma com etiquetas. Ela pegou uma com a

etiqueta ‘outubro de 1817’ e a colocou na frente de Nell.

"Veja se há qualquer coisa aqui que chame a sua atenção, senhora”. Ela foi para um

canto do aposento e esperou.

Intrigada, Nell abriu a caixa. A princípio parecia uma pilha de lixo, bugigangas sem

qualquer relação ou propósito; uma chave, um coração de madeira pequeno com iniciais

esculpidas, um medalhão esmaltado, um rolinho de papel amarrado com um pedaço

encardido de tira, um pedaço de trapo trançado ao redor um alfinete, um botão, um antiga

moeda inglesa quebrada, um coração de seda branco, perfeitamente bordado, um peixe

artificial do tipo que os pescadores usam, um anel trançado que parecia feito de cabelo

humano. Cada artigo tinha uma etiqueta amarrada a ele com um barbante.

Curiosa, Nell ergueu o coração esculpido para ler a etiqueta. Continha um número e

uma inscrição: Jimmy Dare, seu pai esculpiu isso para nós dois. Ela sentiu um aperto no

coração.

"A maior parte das mães deixam algo, algo que demonstre um pouco de seu amor

pelo bebê”, a enfermeira-chefe explicou. "Eu escrevo algumas das notas. Muitas destas

pobres meninas não sabem ler ou escrever”.

Nell ergueu outra etiqueta numerada. Deus abençoe e mantenha a minha filha segura. Os

lábios dela estremeceram. Com os dedos trêmulos ela virou cada etiqueta, mais rápido e

mais rápido, rezando para achar algo escrito pelo pai dela.

Seu pai era marinheiro e eu amava ele.

Uma dizia simplesmente, Perdoe-me.

O broche dizia, Tommy Jones de sua mamã.

Ela ergueu o coração bordado com seda branca. O cartão tinha sido escrito em uma

letra bonita usada para gravar chapas de cobre . De sua mãe que perdeu a Graça e o Presente

mais precioso que Deus tinha dado a ela. Os olhos de Nell se encheram de lágrimas.

19 Demon = Demônio

20 Smith, Jones, Brown = nomes mais comuns.

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Ela examinou cada e todas as fichas e etiquetas, desesperadamente desejando achar

uma escrita com a mão de seu pai.

Finalmente restava apenas um pequeno rolo de papel. Com dedos agitados ela

desatou a tira desgastada. Ela olhou fixamente para o papel mas quanto mais firme ela

olhava, mais borrada a escrita ficava. Tudo o que ela podia ver era que não era a letra do

pai dela. E que era algum tipo de verso.

"É a letra dele?", Harry perguntou.

Ela agitou a cabeça. "Mas eu quero ler de qualquer maneira”.

"Dê-me aqui, então”. Harry tomou o papel dela e leu com a voz profunda:

Eu te deixo aqui meu pobre e pequenino bebê

Com lágrimas eu me Despeço de você

Mesmo sendo Órfão de mãe por todo o ’vivê’

Eu nunca me esquecerei de você.

Harry cuidadosamente prendeu-o novamente com o pedaço de tira e Nell lamentou

ver as grandes mãos tão gentis com o fragmento minúsculo.

"Nós usamos isso para que as mães possam identificar as crianças se for necessário”, a

enfermeira-chefe disse. "Nada disso significa alguma coisa para você, senhora?".

"Não, não há nada”, Nell disse com a voz sufocada. "Nada”. Ela esfregou os olhos

com o lenço que Harry deu a ela. Se ela soubesse que Torie seria tirada dela, teria deixado

algo que a identificasse.

"Nem toda mãe deixa uma ficha”, a enfermeira-chefe disse.

Nell olhou para cima, esperançosa. "Eu posso ver os bebês?", ela perguntou. Ela

reconheceria Torie, estava certa, ainda que fizesse seis semanas e um dia desde que ela a

vira.

"Oh, não há nenhum bebê aqui, senhora”, a mulher disse. "Nós os mandamos para

amas de leite pelos primeiro quatro ou cinco anos, então elas voltam para cá para serem

treinados e educados”.

"Então, onde estão as amas de leite?", ela perguntou avidamente.

"O diretor tem os detalhes, senhora, mas sem a identificação adequada, temo que ele

não dará a você nenhuma informação”.

"Oh, mas—"

"Eu falarei com o diretor”, Harry disse a Nell. "Você fica aqui”.

Ele emergiu do escritório pouco tempo mais tarde do diretor com uma expressão

gelada. Ele dobrou a mão no braço dela e andou a passos largos pelo edifício. Nell teve que

correr para acompanhá-lo.

"Bem?", ela perguntou se ar.

"Tenho uma lista de todas as amas de leite que receberam uma menina como bebê”.

Ele a colocou no curricle. "Há seis, mas o diretor não acredita que nenhuma delas seja

Torie”.

"Mas nós podemos verificar de qualquer maneira?"

Ele disse com a voz sinistra, "nós podemos verificar”.

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A escuridão estava caindo enquanto eles estavam de volta ao caminho para Londres.

Nell estava contente por Harry não estar falando muito. Ela estava muito cansada para

conversar. Estava exausta e abatida.

Eles visitaram cada ama de leite da lista do Hospital dos Enjeitados. Todas estavam

no campo, em aldeias a mais ou menos quatro ou cinco quilômetros de Londres. O campo

tinha a fama de ser mais saudável para os bebês minúsculos do que a névoa da cidade com

o péssimo miasma que se erguia de noite do rio, trazendo doença com ele.

Quando eles paravam em cada chalé, Nell ficara tensa e muito agitada. Este bebê seria

a filha dela? Ela iria embora desta casa com Torie nos braços?

Todas as vezes Harry a descia do curricle e não soltava a mão dela. Ela tinha

começado a depender daquele suporte firme e mudo. Ela precisava tanto disto.

Porque todas as vezes as esperanças dela tinham sido esmagadas.

"É apenas o primeiro dia”, ele disse abruptamente. "Há dúzias de casas de correção e

instituições em Londres”.

"Eu sei”.

A carruagem bateu em um buraco particularmente grande e ela saltou.

Imediatamente Harry transferiu as rédeas para uma mão e a puxou para perto dele na

cadeira. Ele não fez nenhum movimento para desencostar seu braço e para dizer a

verdade, Nell ficou contente com isto, não apenas pela segurança acrescentada, mas

também pelo conforto morno que ele dava. Ele era tão grande e sólido e de alguma

maneira tranquilizante.

Nell nunca tinha conhecido um homem assim antes. Em toda sua vida ela tinha

conhecido homens que apenas falavam. Mentirosos. Sonhadores. Que tomavam tudo.

Harry Morant não era de falar; era de fazer. E de se doar.

Eles tinham coberto uma área que ela levaria uma semana a pé sozinha. Se ela tivesse

o dinheiro para contratar um curricle ou um trole antes, ela poderia ter achado Torie há

semanas. Mas ela não tinha.

Parte dela, a parte brava, desesperada e culpada, continuava dizendo que se ela

apenas tivesse continuado naquelas primeiras semanas, teria achado Torie.

A outra parte, a parte mais tranquila a lembrava do quão impotente ela se sentira ao

desmoronar na rua, cercada por estranhos. E como tinha sido apavorante retornar à

consciência com estranhos tocando suas roupas e seu corpo.

Aquele último dia em que ela desmoronara e acordara molhada e gelada, seus dedos

estavam azuis de frio. Ela devia ter ficado inconsciente por algum tempo. As luvas, o

chapéu e até seu lenço tinha sumido. Ela tinha sorte de os ladrões não terem levado seu

vestido e sua anágua. Ela poderia ter congelado até a morte, se Freckles não estivesse

aconchegada junto de seu corpo mantendo-a morna. Nell não tinha sido capaz de ficar de

pé no começo, estava muito, muito fraca. Ela percebeu naquela noite que poderia

facilmente morrer ali mesmo, nas ruas de Londres… sem fazer falta a ninguém, sem

receber nenhuma consideração.

Page 127: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela estava certa em se dirigir para casa, para Firmin Court, para conseguir o dinheiro

que a ajudaria a fazer a busca corretamente. Ela não sabia que tudo tinha acabado, e que

ela estaria impotente da mesma maneira que antes.

Ela odiava se sentir impotente.

Se ela tivesse vindo para Londres com a Sra. Beasley, ela não teria nenhuma

esperança de buscar nestas aldeias exteriores. Ela nem teria conhecido o lugar.

Antes, ninguém dissera a ela que todos os bebês órfãos e enjeitados levados às casas

de correção de Londres eram enviados para o campo. Eles simplesmente diziam a ela que

não havia nenhum bebê. E Nell, tola, acreditava em suas palavras.

Por que eles não disseram a ela que os bebês eram mandados embora? Ela queria

gritar com ira impotente. O tempo que a omissão a tinha feito desperdiçar, percorrendo

casa depois de casa de correção, tempo que ela não podia dispor, tempo que Torie não

podia dispor.

Se apenas ela e Harry Morant tivessem se conhecido então. Harry não era o tipo de

homem que as pessoas ignoravam. Harry pressionava para mais informações, e quando

necessário, subornava ou intimidava para ter as informações extraídas.

Eles balançaram, girando uma curva, e Nell se debruçou contra ele agradecida pelo

milagre que a levara até este homem. Ele não falava sobre o que poderia fazer, teria que

fazer ou poderia fazer: ele simplesmente fazia o que precisava ser feito. Sem estardalhaço.

Eles alcançaram a estrada de Londres e pararam para iluminar as luminárias da

carruagem. Mas um quilômetro e meio de estrada e ele virou para uma direção diferente.

"Há uma casa de correção em Islington”, ele explicou. "Não fica longe da estrada para

Londres, então seu pai poderia ter ido lá. Nós descobriremos aonde eles enviam os bebês e

começaremos a procurar novamente de manhã cedinho”.

Ela anuiu com a cabeça.

Ele olhou para ela e deu um pequeno aperto. "Cansada?".

"Um pouco”.

Ele ficou mudo por um momento. "Eu gostaria de sua permissão para que meus

amigos Rafe e Luke tivessem sua confiança. Nós estivemos no exército juntos e eles são

bons companheiros. Eles poderiam visitar várias casas de correção e descobrir aonde os

bebês foram enviados, e você e eu iremos lá. É um jeito mais eficiente de busca”.

"Essa é uma ideia maravilhosa”, ela disse. Dois ex-oficiais não se deixariam ser

enganados. Se houvesse algo, eles perceberiam. Quanto a eles saberem, se a questão era

entre a reputação dela ou a recuperação da filha, não havia nenhuma competição.

"Eu não me importo que você diga a eles. Eu não me importo com o que eles pensem

de mim, contanto que eu ache a minha filha”.

Ele deu a ela seu um olhar aguçado. "Eles não terão nada que fazer além de te

respeitar”.

As luminárias a gás iluminavam as ruas quietas de Mayfair. Estava tarde. Quando

eles pararam em Mount Street, Harry desceu primeiro, então a desceu. Ele pagou ao

cavalariço e eles entraram.

Page 128: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Não demorou nada e a porta foi aberta e a tia dele entrou como um furacão na sala de

visitas. "Meus queridos, onde vocês estavam esse tempo todo? Nell, minha menina

querida, você parece exausta. Harry, seus negócios estão—"

Nell se preparou para a interrogação.

"Nell está com enxaqueca”. Harry interrompeu o fluxo da tia. "Você terá que

desculpá-la. Ela vai para o quarto para tomar um banho e se deitar”. Ele colocou as mãos

nas pequenas costas de Nell e a levou firmemente os degraus acima.

Nell foi de boa vontade. "Mas eu não tenho enxaqueca”, ela disse a ele enquanto eles

alcançavam o segundo andar.

Ele pausou, a mão morna e forte nas costas dela. "O que você prefere, tomar um

banho, fazer a ceia no quarto, e dormir mais cedo, ou voltar para o andar de baixo e ter a

minha tia te perguntando sobre o seu dia? Ou te levar para o teatro ou algo assim? Você

apenas tem que dizer”.

Ela o olhou fixamente. Ele tinha adivinhando como ela se sentiria se tivesse que

enfrentar a tia dele depois do dia que tinha passado. "Não! Não, um banho e uma noite

tranquila soa divino. Sua tia é maravilhosa, mas eu estou um pouco… cansada”. Miserável

seria uma palavra melhor, mas ela não iria ceder. Amanhã será um novo dia.

"O que você vai fazer?", ela perguntou.

"Vou contatar Rafe e Luke”. Ele a entregou nas mãos de sua criada e partiu.

Cooper despejou óleo cheiroso no banho e o remexeu. "A senhorita Bragge me deu

esse óleo de banho e um sabão especial para você, m’ lady. É francês e cheira bem,

baunilha, flor de maçã e qualquer outra coisa”.

Nell despertou para responder. A última coisa que ela queria fazer era ter que

tagarelar, mas Cooper estava tão determinada a se provar como uma empregada de uma

dama que Nell não teve como dizer a ela que ficasse quieta. "Eu terei que agradecer à

Senhorita Bragge”, Nell disse. "É muito gentil”.

"Ela está me ajudando ao me treinar, m’ lady. Ela me deu isso e um jarro com extrato

de óleo de tartaruga verde para sua aparência e disse que é para a senhora esfregá-lo pela

manhã e à noite”.

"Extrato de óleo de tartaruga verde?", Nell olhou desconfiada para o jarro.

"É muito caro”, Cooper disse a ela orgulha enquanto ajudava Nell a tirar seu vestido.

"Eu nunca usei muito loções”, Nell disse. A verdade era que ela nunca tinha dinheiro

para tais coisas.

Cooper fez um som de anuência baixinho. "Todas as pessoas precisam de loções, m’

lady. A senhora está bonita agora, mas vai querer continuar assim quando ficar mais

velha, não é? E fazer com que o Sr. Harry continue olhando para você como se quisesse

comê-la, não é?".

"Comer?", Nell olhou para cima com surpresa.

Cooper sorriu amplamente. "Como um cachorro meio morto de fome olhando para

um osso suculento, m’ lady”.

"Céus”, Nell disse vagamente. Ela soltou sua camisa e entrou no banho. Ela estava um

pouco tímida; não estava acostumada a ter uma empregada pessoal, e não ficava nua na

Page 129: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

frente de ninguém desde que era uma criança. Ela se perguntou se Cooper poderia dizer

pelo corpo dela que ela já dera a luz.

Ela deslizou dentro da água do banho. A água era fragrante e graciosamente quente,

lentamente a fadiga e a tensão saíram do corpo dela.

Ela ensaboou seu washcloth21 pensativamente. Um cachorro meio morto de fome olhando

para um osso suculento?

Claro que Cooper tinha uma veia romântica forte, isso era óbvio. Ela pensava que

Nell tinha feito a união por amor, quando Harry tinha explicado para Nell que tinha sido

apenas por condições puramente práticas. O título dela seria útil assim como ela seria útil

com os cavalos. E ela conhecia a propriedade e as pessoas que lá trabalhavam. Fazia

sentido.

Mas as observações de Cooper causaram nela um pequeno palpitar de ansiedade.

Nell se esfregou por toda parte e então permitiu que sua empregada esfregasse as

suas costas e lavasse seu cabelo. Ela massageou o couro cabeludo e o pescoço de Nell

completamente. Divino.

Harry Morant tinha feito da forma mais simples que um homem poderia, tinha

deixado claro desde o começo que a desejava. Se ela fechasse os olhos, poderia sentir a

forma e dureza exata dele pulsando contra sua mão.

Ela fechou os olhos e enxaguou as espuma com água morna, então enrolou o cabelo

em uma toalha, ficou de pé e se secou na frente do fogo.

Cooper trouxe sua camisola velha e a deslizou pela cabeça. Nell estava um pouco

envergonhada pela roupa antiga e remendada. Ela nunca pretendera que alguma outra

pessoa a visse. A senhorita Bragge provavelmente teria algumas coisas mordazes para

dizer sobre o guarda-roupa dela.

Enquanto Cooper supervisionava a remoção do banho e da água, Nell se ajoelhou no

tapete na frente do fogo, secando seu cabelo. Ela tinha lembranças de fazer isso com sua

mãe. A mãe secava o cabelo de Nell com a toalha e então o penteava, e ela frequentemente

contava uma história a Nell…

Nell tentou tragar o bolo em sua garganta. Ela chegaria a fazer isso com Torie?

Quando o cabelo dela estava quase seco, ela se moveu até a penteadeira e se sentou.

Ela pegou o jarro de óleo de tartaruga verde, desenroscou a tampa e cheirou. Tinha cheiro

bastante agradável. Ela imergiu um dedo e passou um pouco da loção cuidadosamente na

pele. A sensação era geladinha e calmante.

Ela olhou fixamente para si mesma no espelho. Seu rosto ordinário olhava de volta

para ela. Se ela apenas se assemelhasse a mãe ao invés do pai na aparência. A mãe tinha

sido linda.

Ela não entendia o que Harry Morant achava tão desejável nela, mas ela tinha que

aceitar isto. Um calafrio delicioso a percorreu, juntando na base de sua barriga. Ela não

tinha nenhuma dúvida do desejo dele.

21 Washcloth, pequeno pedaço de pano utilizado para lavar o rosto e o corpo.

Page 130: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Mas isso a preocupava. Por causa de seu desejo por ela, ele tinha deixado tudo de

lado para trazê-la a Londres para procurar por Torie, uma criança que não era dele, que

traria escândalo a sua vida.

A vontade dele de aceitar a filha dela fazia-a querer chorar com gratidão. Ele até

planejara a busca, como um soldado que planeja uma campanha, ela pensou com um bolo

na garganta.

Cooper pegou uma escova e começou a escovar o cabelo de Nell.

Nell se sentou, com pensamentos profundos. Por causa de seu desejo, Harry Morant

casaria com Nell, restabelecendo na vida dela quase tudo que ela perdera: um futuro

seguro, uma posição respeitada e a casa que amava. Ela teria até a chance de criar cavalos

como sempre tinha desejado.

Se—quando eles achassem Torie, seria como se todas as coisas terríveis que Nell

passara no último ano, fossem jogadas para longe, e apenas o bem permaneceria. Exceto a

morte do pai dela.

E tudo por causa de uma coisa.

Desejo.

Por uma mulher que abominava a ideia de um intercurso sexual.

Ela umedeceu os lábios. Não poderia ser muito ruim, ela pensou, não com Harry.

Fisicamente, ela o achava muito atraente—bonito, realmente, se é possível usar esta

palavra para um homem. E ela gostava dele. Mais do que gostava, uma pequena voz a

lembrou, ainda que ele não quisesse saber…

E de qualquer maneira, não durara muito naquela vez. E mesmo sendo vil, a

recompensa tinha sido grande, ela pensou, enviando outra oração para Torie.

As éguas nunca pareciam apreciar ser cobertas por um garanhão, também. O que

uma égua poderia suportar, Nell também poderia. Ela apenas desejava que fosse o

suficiente para ele.

Porque o que ela tinha para dar a ele por tabela, ele não queria.

Amor.

Ela amava Harry Morant. Ela não estava certa de quando tinha acontecido. Talvez

tivesse sido no primeiro dia na floresta, quando os olhos cinza dele queimaram os dela

durante um longo tempo. E então quando ele tinha dado ela seu chapéu…

Talvez tivesse sido na primeira vez em que ela o beijara. Ela tinha lutado contra o

sentimento, negado, até para si mesma, quando pensava que ele ameaçava sua busca por

Torie.

Poderia ter sido naquele momento quando ele disse, ela viverá conosco, claro.

Ou talvez quando ela percebera como ele a abraçá-la pela noite, mantendo-a segura,

sem pedir nada dela embora a desejasse muito.

Ele nunca a tinha pedido nada.

Ela suspeitava que ele nunca pedira nada a ninguém. Era uma maneira de se manter

seguro. Nell também fazia isto por si mesma.

Mas não é possível se manter seguro para sempre. Nell tinha sentido um movimento

em seu corpo e então outro, e de repente ela estava impotente cheia de carinho pela

criatura minúscula que crescia dentro dela.

Page 131: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

E isso não tinha sido nada comparado ao que ela sentira quando segurara Torie pela

primeira vez contra seu coração, sentindo o cheiro de sua filha enquanto a colocava junto

ao seio. Ela faria qualquer coisa para manter Torie segura. Qualquer coisa.

Mas ela não a tinha mantido em segurança; ela dormira e deixara o pai dela roubar

sua filha. O pensamento trouxe uma onda de náusea.

Houve uma batida na porta e Cooper colocou a escova de lado para atender. Ela

voltou com uma bandeja coberta. "Sua ceia, m’ lady. O Sr. Harry fez a cozinheira enviar

aqui para cima para a senhora”.

Nell agitou a cabeça. "Eu não quero nada, obrigada. Devolva”.

Cooper hesitou, então aceitou devolver a bandeja.

"O que você está fazendo com isto, Cooper?", Harry tinha visto a bandeja subir nem

dois minutos antes. Ela possivelmente não poderia ter terminado.

"M’ lady disse que não quer comer a ceia, senhor”.

"Ela comeu alguma coisa?".

Cooper agitou sua cabeça.

"Então pare aí mesmo”, Harry disse a ela e subiu os degraus rapidamente. Na porta

de Nell ele bateu, abriu-a, então tomou a bandeja das mãos de Cooper. "Isso é tudo,

Cooper”, ele disse decisivamente, entrando na alcova de Nell e chutou a porta atrás de si

para fechá-la.

E congelou. Maldição. Ele devia ter pensado nisso.

Nell estava na frente do fogo, se aquecendo. A boca dele secou. Com o fogo dançando

através da camisola de algodão velha, ela ficava incrivelmente transparente, mostrando o

esboço das pernas longas e esbeltas e dos quadris luxuriantes. A pele estava delicadamente

corada e seu cabelo solto e enrolado, ainda ligeiramente úmido.

Ele já tinha imaginado isto, admitiu.

Pela última hora ele tinha batalhado contra visões dela no banho, quando ele poderia

ajudá-la a ensaboar a carne sedosa e cremosa, enxaguando-a, então a envolvendo com uma

toalha e carregando-a corada e úmida para a cama.

E agora aqui estava ela, corada, sedosa, úmida e cheirando como um bolo saído

diretamente do forno. E embrulhada em algo que era menos significativo do que uma

toalha. Mas ele não iria tocá-la, ele se lembrou. E ele podia lidar com isto.

Ela olhou para a bandeja cheia de suspeita. "Por que você a trouxe de volta? Eu disse

a Cooper que não estava com fome”.

"Eu não me importo se você está com fome ou não”, ele disse, colocando a bandeja em

uma mesa auxiliar pequena. "Nós saímos no café da manhã, então venha e coma”. Ele

segurou uma cadeira para ela.

Ele podia ver a mancha escura dos mamilos através do algodão fino. Os primeiros

cinco botões no pescoço estavam abertos, deixando um vislumbre tentador da sombra dos

seios. Ele reprimiu um gemido.

De onde vieram esses seios abundantes? Quando ele a vira pela primeira vez ela

parecera bastante uma tábua. Não que isso tivesse feito alguma diferença para ele, nem lá

nem agora.

Page 132: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Todas as vezes que ele se aproximava dela, seu corpo respondia com tal intensidade

feroz que ele tinha que batalhar consigo mesmo para manter o controle.

Ele não deveria ter vindo aqui. Ele sabia como seu corpo responderia. Era estúpido

encarar essa tentação na frente dele. Já era ruim o suficiente ter que abraçá-la puramente

durante a noite, mas agora seria pior, porque ele teria a imagem dela na mente. Em sua

mente e em seus braços.

E em sua cama.

Ainda bem que havia uma mesa entre eles. Ele removeu a cobertura da bandeja. Ele

tinha ordenado uma ceia leve para ela: um ovo quente, torrada, manteiga, marmelada e

um bule de chá.

"Eu não quero”, ela repetiu.

"Você não gosta de ovos?".

"Eu normalmente gosto, mas não estou com vontade de comer hoje à noite”.

"Você está cansada e se sentindo miserável, isto é tudo. Você se sentirá melhor se

comer”.

Ela cruzou os braços e deu a ele um olhar amotinado. Ele pegou uma das fatias de

torta, passou manteiga, cortou pela metade, e então cortou cada metade em tiras estreitas.

Ela o observou cheia de suspeita. Ele claramente cortou a cabeça de um dos ovos cozidos,

colocou um pouco de sal e pimenta, então trouxe até ela o prato com o ovo cortado sobre

uma torrada para ela.

Ela não descruzou os braços, mas Harry não se importou. A pressão empurrou seus

seios mais para o alto e a abertura da camisola aumentou, revelando as curvas tentadoras.

Ele se forçou a não notar. Ele mergulhou uma tira da torrada na gema de ovo líquida,

e manteve-a nos lábios dela.

Ela os apertou firmemente juntos. Ele manteve a comida lá. "Abra a porta”, ele disse

como se ela fosse uma criancinha.

Ela tentou não sorrir.

"Você sabe como costumávamos chamar isso quando eu era uma criança?", ele

perguntou.

"Torrada soldado—mmph”, ela concluiu, quando ele deslizou o ovo entre os lábios

abertos dela.

Ela mastigou e engoliu. "Isso foi muito furtivo—", ela começou, e ele deslizou outro

pedaço de torrada em sua boca. Ele sentiu a respiração morna dela em seus dedos.

Na vez seguinte ela tentou evitar mas ele foi mais rápido e deslizou mais entre os seus

lábios de qualquer maneira. Os olhos dele dançavam enquanto ela comia.

No quinto pedaço da torta se tornou um jogo; ela estava rindo e o problema de Harry

foi ficando cada vez pior. Quem teria pensado que aquela alimentação com torrada seria

uma experiência erótica?

"Eu não como ovos soldados há anos”, ela disse a ele. "Era a minha ceia favorita na

época de criança”. Ela umedeceu os lábios, então os separou para receber o próximo

bocado.

Page 133: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Harry reprimiu um gemido. Seria tão fácil se debruçar adiante e cobrir os lábios doces

e rosados dela. Mas seria um convite a loucura. Ela ainda não estava pronta para o que ele

procurava.

Ele picou o soldado no ovo e o mergulho. Uma gota da gema caiu sobre a curva

interna de um seio cremoso.

"Oh”, ela disse.

Harry não disse nada. Por um longo momento os dois olharam fixamente para a gota

de gema dourada, cintilando e úmida contra a pele sedosa. Ele tragou, mas não pôde mais

resistir à tentação.

Lentamente, deliberadamente, ele abaixou a cabeça e lambeu a gema, lavando a pele

com sua língua. A pele era fresca, sedosa e lisa. Ela tinha um cheiro morno e delicioso,

como bolo recém saído do forno e maçãs.

Ela tinha gosto de mulher. Totalmente.

Ele inalou profundamente e lutou contra a tentação de enterrar seu rosto no buraco

fragrante. Ele esfolou ligeiramente a pele de cetim com a barba de sua mandíbula.

"Ohh”, ela murmurou. Seus mamilos ficaram tensos, empurrando contra o tecido fino

de sua camisola, apenas poucos centímetros de suas mãos, de sua boca. Ele podia sentir

um tocando o braço dele. Ele moveu o braço. Ela estremeceu deliciosamente e seus olhos

escureceram.

Ao ver a resposta clara a ele, ele sentiu uma onda primitiva e triunfante de

possessividade. Ele a achara, contra todas as chances ele tinha achado esta mulher, esta

mulher como nenhuma outra, sua sereia pessoal. Sua mulher. Sua esposa.

Sua futura esposa.

Ele se forçou a se endireitar e imergiu o próximo pedaço de torrada no ovo, como se

nada tivesse acontecido. Ele ofereceu o pedaço, o olhar dele preso no dela. Os olhos

estavam escuros, quase sonolentos com desejo. Ela separou os lábios e os dedos dele os

tocaram quando ele a alimentou com a torrada. Ele a assistiu cheio de desejo enquanto ela

lentamente mastigava e engolia.

Ela comeu em silêncio, olhando-o nos olhos. Parecia que ela estava examinando sua

alma, mas ele não podia tirar os olhos dela.

Ele a alimentou com mais uma torrada e mais outra. Tudo o que podia ser ouvido no

quarto era o silvar e crepitar do fogo, a respiração deles, e os sons suaves que ela fazia ao

comer. Sons íntimos. Pessoais. Sugestivos.

Ela poderia ouvir o coração dele batendo? Ele se perguntou. Ele estava totalmente

certo de que ela podia.

Ele a alimentou porção após porção até que o ovo acabou. Ele foi muito cuidadoso em

não deixar que qualquer gota de gema caísse novamente. Ele não poderia confiar em si

mesmo se acontecesse de novo.

Ele nunca perdia o controle. Não iria acontecer agora.

Ele foi buscar o pote de marmelada e a espalhou sobre o pedaço restante de torrada,

cortou-a em triângulos e deu o prato a ela, dizendo. "Coma”.

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Ela deu a ele um olhar longo, então pegou um pedaço e mastigou, começando de um

canto e indo até o fim. Quando ela terminou, um pedaço minúsculo da geleia brilhava no

canto de sua boca.

Ele não podia tirar os olhos da geleia. Era como um ponto belo a tentá-lo.

Estremecendo a cada movimento dos lábios dela. Ele assistiu enquanto ela comeu o

segundo triângulo e o terceiro. Ela comeu delicadamente, como um gato, ainda assim

aquele pedaço minúsculo de geleia dourada permaneceu, pairando sobre um canto de sua

boca.

Aquela boca ótima de se beijar.

"Chá?", ele disse e sem esperar pela resposta despejou um pouco na xícara e

acrescentou leite e um pouco de açúcar. O chá lavaria a geleia.

"Você se lembra de como eu gosto”, ela comentou enquanto ele mexia o chá e o dava

para ela.

Claro que ele se lembrava. Ele se lembrava de tudo que ela já tinha dito ou feito na

presença dele.

Ela tomou um gole e fez uma careta. "Frio”. Ela deixou a xícara de lado dizendo

suavemente "nós tomamos muito tempo com aquele ovo”. Não soou como se ela

lamentasse nem um pouquinho.

Não que ele se importasse. Ela teve sua chance. Aquele pedaço de marmelada ainda

estava no canto da boca e ele não podia deixá-lo lá nem por um momento a mais.

Olhando nas profundidades douradas escuras dos olhos dela, Harry se debruçou

adiante até que sua boca estava a poucos centímetros da dela.

Ela se balançou contra ele, erguendo seu rosto para ele, oferecendo-se sem falar nada.

Com um gemido baixo ele lambeu a gota minúscula de marmelada do canto de sua boca.

"Doce”, ele murmurou, "ainda assim penetrante”. Ele lambeu a boca novamente,

apesar de que não houvesse mais geleia. "Delicioso”.

Ele provocou ligeiramente ao longo da junção dos lábios dela com seus próprios

lábios e com a língua, e ela suspirou e se abriu para ele. Um grunhido baixo de satisfação

surgiu do fundo de sua garganta enquanto ele a trazia contra ele e a beijava

profundamente, lacrando sua boca com a dele, aprendendo o gosto e a textura dela.

O gosto entrou em seu sangue como uma tempestade de fogo e ele a puxou para mais

perto, sentindo a gentil suavidade dela contra sua dureza. Ele a beijou profundamente,

acariciando o interior de sua boca e sentindo-a arquear e estremecer contra ele a cada

movimento. Ela era a faísca de sua fogueira, o vinho mais intoxicante.

Ela murmurou algo e esfregou as palmas das mãos junto à linha do queixo dele,

correndo os dedos pelo seu cabelo.

O beijo aprofundou enquanto ela pegava o ritmo que estava queimando-o vivo,

torturando seu corpo em um desejo feroz e primitivo que inundava seus sentidos.

Nell o beijou de volta, cega e apaixonadamente, seguindo seus movimentos e seus

instintos. Ele tinha gosto salgado, picante, extremamente masculino, e ele a beijava com

uma fome feroz que derretia seus ossos.

Uma fome profunda dentro dela acordou, uma que ela nunca havia experimentado

antes, uma que não tinha nenhuma relação com comida.

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Ela amava senti-lo, o gosto, a fricção deliciosa onde os pelos dele raspavam contra a

pele dela. Ela se agarrou a ele, seu corpo empurrando contra o dele repetidas vezes em um

ritmo que ela vagamente reconhecia.

E então ela sentiu uma dura empurrada contra sua barriga que ela definitivamente

reconheceu. De repente ela percebeu o significado do ritmo.

Uma linha de pânico cego extinguiu o calor em seu sangue. Chocada consigo mesma,

com o que estava para fazer, e pelo que deseja fazer. Ela jogou a cabeça para trás e olhou

fixamente para ele. "Não”, ela sussurrou. "Eu não posso”.

Ele parou, a boca ainda quente sobre a dela, e ela se preparou para empurrá-lo para

longe. Ela não estava pronta, era muito cedo, ela estava muito instável. Ela tinha que

pensar. E ela não poderia fazer isso enquanto ele estivesse aqui.

Mas antes que ela pudesse se mover ou dizer uma palavra, ele a soltou e andou para

trás, o peito arfando.

"Você está certa”. A voz dele era profunda e rota. Ele endireitou as roupas e correu

uma mão pelo cabelo espesso e escuro. "Eu não deveria ter deixado isso acontecer. Não

ainda. Não até que nós estejamos casados, até que você esteja pronta. Sua virtude está

segura comigo, eu prometo. Boa noite”. Ele segurou a bochecha dela suavemente entre as

mãos e caminhou firmemente em direção à porta.

Nell piscou, a mente pensando nas palavras dele. Ela disse não. E ele havia escutado.

Ele tinha dado um passo para trás de uma vez, articulando palavras que fatiaram todas as

defesas que ela tinha, cortando diretamente seu coração.

Sua virtude está segura comigo, eu prometo.

Ela não tinha virtude para proteger, ele sabia disto. E ainda assim, de qualquer

maneira, ele prometeu que protegeria a dela. E com tal sinceridade, como se não houvesse

nenhuma dúvida ou questão em sua mente.

Devolvendo a honra a ela.

Ele parou na porta. "Você está bem, agora?".

"S-sim, perfeitamente bem, obrigada”, ela conseguiu dizer.

"Bom, eu pensei que você se sentiria melhor com um pouco de comida. Durma bem”.

Ela olhou fixamente para a porta fechada, querendo segui-lo, sabendo que não podia.

O que ela sentira não tinha nada a ver com comida, e tudo a ver com Harry Morant.

Durma bem, ele havia dito a ela. Harry esperava que ela dormisse, mas ele não

colocava nenhuma fé nisto. Por uma hora no máximo ele tinha conseguido distrai-la, fazê-

la parar de se agoniar pelo bebê perdido.

Ele tinha conseguido se distrair ainda mais. Ele gemeu.

O que o tinha possuído para dá-la de comer?

Ele não iria fazer isto novamente. Não até que eles estivessem seguramente casados.

De agora até seu casamento, se ela quisesse sofrer com fome, ele a deixaria. Talvez.

Eram apenas algumas semanas. Ela não conseguiria se causar tanto mal. Talvez.

Ele cruzou o corredor para sua alcova e revolveu a gaveta até que achou o que estava

procurando. Ele havia notado na última vez em que estava aqui, um pequeno sino com

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uma manivela. Ele o amarrou com um laço e andou na ponta dos pés através do corredor e

o prendeu na maçaneta da porta dela.

Se ela abrisse a porta, o sino o despertaria.

Ele sabia que deveria apenas cruzar o corredor e ficar na cama com ela, puramente,

como tinha feito nas últimas duas noites. Ela dormiria melhor se ele fizesse. As sombras

lilases ao redor de seus olhos estavam enfraquecendo consideravelmente desde que ele

tinha começado a compartilhar a cama com ela.

Harry, por outro lado, não estava nada descansado.

E quando ele dormia pouco, seu autocontrole não era muito confiável. E depois da

última hora, seu autocontrole estava consideravelmente desafiado.

Ele não estava certo de que conseguiria compartilhar mais uma vez a cama com ela.

Não sem fazer amor com ela. E ela não estava pronta ainda.

Ele precisava de alívio físico. Desesperadamente.

Ele estava bastante certo de que se ele se segurasse mais sem fazer amor com ela, isso

o mataria. Ele acabaria explodindo.

Havia custado cada fragmento de força que ele tinha para sair de perto dela e andar a

passos largos ao longo do quarto.

Mas ela disse não, embora ele soubesse que ela o queria. E Senhor, como lembrar que

ela o queria fazia seu sangue queimar novamente.

Mas não era não. No código de Harry era assim que funcionava.

Quem era o bastardo que a estuprou? A pergunta o corroía. Ele não iria sair impune,

não se Harry pudesse fazer alguma coisa.

Nenhum homem que forçasse uma mulher merecia o título de homem.

E um homem que forçasse alguém como Nell… era um homem que não merecia

viver.

Capítulo XII.

Ethan semicerrou os olhos para a carta de Tibby que havia chegado naquele dia. Não

era a letra usual dela. Ela deveria ter escrito para ele com pressa. E na chuva, porque o

papel estava ondulada em alguns lugares, e algumas palavras estavam manchadas onde a

tinta escorrera.

Meu querido Sr. Delaney,

Devo confessar alguma preocupação com o tom de sua última carta, particularmente quando

você estava falando sobre esta mulher que está cortejando. Longe de mim, criticar uma mulher que

nunca encontrei.

Ethan franziu o cenho. Nunca encontrou? Quem diabos ela achava que ele estava

cortejando?

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Mas me parece que ela não o estima o quanto deveria. Você é um homem bom, decente, honrado

e inteligente Sr. Delaney, e um ser humano igual a qualquer outro.

Ethan leu aquela parte novamente, saboreando o som das palavras: bom, decente,

honrado e inteligente. Ele não conhecia nenhuma outra alma viva que o descreveria

naquelas condições. Alguém poderia descrevê-lo como bom. Ou decente. E possivelmente

honrado. Mas nunca as três coisas de uma vez e nunca com a palavra "inteligente" junto.

Nunca aceite tratamento inferior, e não se despreze pelas coisas que não podem ser mudadas, e

pelas quais você não pode ser culpado. O que é importante é o que você faz com a sua vida, e as

habilidades que você aprendeu, e acima de tudo, seu coração. Se esta mulher não estima tudo isso em

você, meu querido Sr. Delaney, ela não te merece.

Aqui a escrita ficava muito manchada realmente. A chuva deveria ter aparecido, ele

pensava. Isso explicaria o modo estranho como ela a concluíra.

Digo isto como sua antiga professora, para quem o seu bem-estar futuro e felicidade são

importantes.

Sinceramente sua, Senhorita Jane Tibthorpe

Ethan sorria amplamente enquanto cuidadosamente dobrava a carta e a colocava na

caixa com todas as outras cartas dela.

Então Tibby não gostava de saber que ele estava cortejando, é? Um toque do monstro

do ciúme, talvez? "Assim espero, ‘quirida'. Realmente espero”, ele disse enquanto fechava

a tampa da caixa.

"Ela pode ter alguns sentimentos por mim afinal, Freckles, então, o que você acha?", o

cachorro bateu o rabo no chão.

"Sim, e ela me considera inteligente, também. Nada ruim para um tolo e ex-

analfabeto irlandês, não é?", e com um passo animado ele foi para a casa do vigário.

"Agora, Vigário, o que você pode me dizer sobre um cara chamado Lochinvar?",

Ethan moveu seu cavalo restante. "Xeque-mate”, ele declarou e se sentou de volta.

O vigário franziu o cenho sobre o tabuleiro, então agitou a cabeça. "Abençoada seja

minha alma, nunca imaginei isso. Excelente, meu menino, excelente”.

Ethan reprimiu um sorriso. Ele já estava no final dos quarenta, mas o homem idoso

ainda o chamava de "meu menino”.

"Você sabe quem eu quero dizer?".

"Lochinvar? Sim, sei”, o vigário disse. "Isto tem a ver com a sua dama amada,

suponho”.

"Sim, eu nunca ouvi falar dele, mas ela sabe tudo sobre ele, parece”.

"Então a sua Senhorita Tibby tem uma queda por heróis românticos”.

Page 138: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Oh”. Ethan franziu o cenho. Ele não era um tipo romântico, e certamente nenhum

herói. Tipos românticos eram bonitos e arrojados. Ele era apenas um gato macho velho e

danificado, que queria se firmar com uma mulher que não deveria amar. Ele contava com

a bondade de Tibby em pegar gatos vira-latas para criar.

O vigário citou, “Tão fiel a paixão, e tão corajoso na guerra; nunca houve um

cavaleiro como o jovem Lochinvar!".

Ethan se sentou adiante. "Um lutador, ele era? Ela me disse na primeira vez em que

nos encontramos que ela pensava em mim como um jovem Lochinvar”.

As sobrancelhas do vigário ergueram. "Céus. O que você fez?".

"Ela estava refém de alguns bandidos que estavam atrás de uma princesa e seu filho”.

"Uma princesa?".

"A princesa era antiga aluna de Tibby e ela estava indo até a Tibby em segredo, ou era

o que elas pensavam. Mas os bandidos descobriram e chegaram lá antes da princesa. Eu

bati à porta para pedir direções e lá estava Tibby, branca como um fantasma, morta de

medo e furiosa”. Ele sorriu amplamente com as reminiscências. "Uma pequena valente, ela

é. Ela deslizou para mim uma nota que dizia sobre os homens que a mantinha prisioneira,

mas eu nem sequer olhei para isto. Ela me deu um olhar feroz por eu ser um grande

estúpido—ela não sabia então que eu não podia ler”.

"Então o que você fez?", o vigário perguntou, tão ávido quanto um menino.

"Eu a peguei dos vilões, joguei-a sobre o meu cavalo, e galopei com ela até que ela

estivesse em segurança”.

"Maravilhoso, maravilhoso! Que aventura”, o homem idoso exclamou. "Nenhuma

maravilha ela te chama de jovem Lochinvar. É de autoria de Sir Walter Scott22, do épico

Marmion, que estava incrivelmente na moda há vinte anos. Um longo poema”, o vigário

explicou, vendo a expressão em branco de Ethan. Ele citou, "Oh, Jovem Lochinvar que veio

do oeste! Por todo o continente seu corcel era o melhor".

Ethan brilhou. "Isto soa como eu. Creio que tenho os melhores cavalos do país”.

" 'E, exceto sua boa espada, não usa armas; ele montava desarmado, e só!' ".

Ethan se sentou de volta. "Nem, o homem é um bobo. Se você estiver montando só,

precisa estar mais armado do que isto. Com um punhal em sua bota, pelo menos”.

O vigário sorriu. Ele foi buscar um volume em sua prateleiras para livros, achou a

página, e deu para Ethan. "Leia isto”.

Ethan leu lentamente, tropeçando em uma palavra pouco familiar ou duas, e então foi

para trás de novo, pensativo. "Então, ele sequestrou a loira Ellen de seu casamento…"

O vigário suspirou. "Sim. Eu nunca entendi o carinho dela pelo jovem Lochinvar. Eu

teria pensado que isso favoreceria um escândalo chocante, sem mencionar o difícil

problema legal—ter o seu primeiro casamento anulado—particularmente difícil, eu teria

pensado, quando todos os parentes da noiva e do noivo saíram para matar o jovem

22

Sir Walter Scott, criador do verdadeiro romance histórico. Escritor de Ivanhoé.

Page 139: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Lochinvar. Os escoceses, sabe, levam seus feudos muito a sério. A coisa toda foi

extremamente mal-julgada. Mas não há limites nas fantasias femininas”.

Ethan concordou. "Se eu fosse ele, teria agarrado a mulher na primeira oportunidade,

logo depois que o pai tivesse dito não a mim, em vez de esperar pelo último minuto, para

só então invadir e atrapalhar o casamento. As mulheres odeiam isto. É seu grande dia.

Aposto que a loira Ellen o repreendeu por isso todos os dias de sua vida, pobre camarada”.

O sino tocou na maçaneta da alcova de Nell alguma hora após a meia-noite. Harry

saiu tropeçando de sua cama em suas roupas de baixo e saiu apressado no corredor atrás

dela.

Ela estava meio correndo, murmurando com a voz angustiada, "onde está ela? Onde?

Devo achá-la, achá-la, achá-la”.

Como sempre a visão da angústia durante o sono o moveu profundamente. Ele a

alcançou no topo dos degraus e a girou, colocando-a dentro do círculo de seus braços.

"Silêncio, querida”, ele murmurou. "Torie está aqui. Está segura”.

Desta vez ela lutou com ele. "Não, não, não ela. Não Torie. Não a minha Torie”, ela

murmurou veementemente, afastando as mãos dele desesperadamente, tentando abrir

caminho além dele. Ela estava surpreendentemente forte.

"Venha para a cama”, ele disse, e quando ela continuou a lutar, ele a ergueu, seus pés

estavam frios e nus e ele a segurou contra seu peito.

Ela olhou fixamente além dele com olhos brancos e de partir o coração. "Ela está

morta, não é? Minha Torie?", as lágrimas deslizaram pelas suas bochechas.

O pesar mudo e cego dela o despedaçou. Ele a levou pelo corredor de volta para a

cama. Ele a segurou contra ele, o rosto dela descansando em seu peito, molhado com as

lágrimas. Ele beijou as lágrimas, sentindo o gosto de sal e desejando que ele pudesse levar

a dor.

Ele disse a si mesmo que de manhã ela não se lembraria de nada disso.

Não ajudou. Ele a segurou contra ele, balançando-a, murmurando segurança e

mentiras confortantes, acalmando-a com palavras e mãos até que a tempestade de pesar da

meia-noite passou. Finalmente ela parou exausta em seus braços, a respiração diminuindo

a velocidade, e ela dormiu o sono dos justos. E Harry, exausto, dormiu também.

De manhã ele a levou para montar no parque, para desenferrujar. A equitação ajuda

quando se está tenso. E Nell estava tão tensa que podia estalar.

A procura já estava continuando há muito tempo.

Vozes masculinas soaram no corredor quando Nell emergiu de sua alcova, lavada e

com roupa trocada depois de seu passeio no parque. O exercício tinha feito bem a ela.

Curiosa para ver os amigos de Harry, ela desceu tranquilamente a meio caminho dos

degraus e pausou.

O que eles pensariam do amigo se casar com uma mulher decaída? Ela se perguntou.

Não que ela se importasse com o que eles pensariam, desde que eles achassem Torie. Mas

poderia importar para Harry.

Um era Rafe Ramsey e o outro era Luke Ripton, mas quem era quem?

Page 140: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

O mais alto dos dois homens era extremamente elegante, com um casaco azul escuro

de corte soberbo, camisa altamente engomada, um pano no pescoço intricadamente

amarrado, calças amarelas e botas cintilantes. Seu traje tinha todas as características de um

janota. O que o distinguia daquele grupo, ela pensou, eram seus ombros largos, que não

provinham de um enchimento de alfaiate, mas sim de seus trabalhados como um

cavaleiro.

Ele deveria ser Rafe. Ela tivera a impressão através de Harry que Rafe era cabeça fria

e desonestamente indolente. Desinteressado era uma palavra que ele usara e este homem

certamente deva essa impressão.

Harry chamara Luke de "anjo caído" e quando ela vira seu rosto, ela entendeu o

porquê. Ele era obscuramente bonito e de alguma maneira tinha uma aparência trágica,

com olhos e maçãs do rosto escuras pelos quais uma mulher choraria. Seu cabelo escuro

espesso estava amarrotado, e ele usava seu pano no pescoço negligentemente amarrado.

Ele parecia cheio de energia inquieta, por se mover o tempo inteiro, estalando seu chicote

contra as botas, compassando de um lado para outro à medida que eles conversaram, e

pontuando suas orações com gestos vivos.

O relógio bateu no corredor dizendo que eram quinze para as oito. Nell respirou

fundo e continuou a descer os degraus.

Ela soube na hora quando Harry a viu. Seus olhos se encontraram e ela se aqueceu

sob seu olhar. Ela estava ciente de seus amigos olhando mas ela não se importava. Ela se

sentia bonita quando Harry olhava assim para ela. Cooper tinha trançado seu cabelo

novamente e desta vez tinha usado uma tira amarela.

Harry avançou e tomou sua mão enquanto ela descia os últimos e poucos degraus.

"Estes são os meus amigos, Nell: Rafe Ramsey e Luke Ripton. Cavalheiros, minha noiva,

Lady Helen Freymore”.

"Como vai você, Sr. Ramsey, Sr. Ripton”. Nell fez uma reverência cortês, contente por

ter adivinhado corretamente.

"Encantado em conhecê-la, Lady Helen”, Rafe Ramsey disse. Ele teve olhos

curiosamente pesados e de um azul extremamente frio e pálido. Eles descansaram sobre

ela friamente. Olhos desconfortáveis, ela pensou enquanto ele erguia a mão dela até seus

lábios. Ela não estava certa de que gostava do Sr. Ramsey.

"Harry nos contou sobre o seu problema”, Luke disse curvando-se sobre a mão dela.

Ele olhou para ela com olhos intensos, escuros. "Nós faremos o nosso melhor para achar

seu bebê, prometo”.

Sem aviso prévio Nell se achou despedaçando. Ela deu a ele um sorriso instável,

anuiu com a cabeça, e apertou sua mão.

Harry avançou e pôs um braço ao redor da cintura dela.

"Vamos à sala do café da manhã”, Rafe sugeriu. "Harry prometeu que se nós

chegássemos aqui a esta hora impossível, ele nos alimentaria, Lady Helen”.

Todos entraram na sala do café. Os amigos de Harry pareciam conhecer seu caminho

ao redor da casa da tia dele, ela pensou, assistindo-os se dirigirem diretamente para os

pratos cobertos no aparador. Eles pareciam muito em casa.

Page 141: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Nós conhecemos Harry e Gabe desde a escola”, Rafe explicou. Aqueles olhos

misteriosos devem ter notado a surpresa dela. "Nós fomos domesticados nas várias casas

de Lady Gosforth desde que éramos moços”.

"Eu achei que vocês estiveram juntos no exército”, ela disse.

"Nós estivemos”, Luke disse a ela. "Todos nós nos alistamos juntos”.

"Não consegui me livrar deles”, Harry murmurou enquanto segurava uma cadeira

para Nell se acomodar. "Gabe e eu tentamos mas eles nos seguiram”.

"Seguir? Palavra interessante”, Rafe arrastou as palavras. "Meu pai comprou o meu

uniforme, e então você e Gabe conversaram com a tia-avó Gert para comprarem o de vocês

e então se eu me lembro bem, Luke decidiu que poderia ir também”.

"Hmm, sim, bem, alguém tinha que te manter longe dos problemas”, Luke disse,

enchendo um prato com presunto fatiado, salsichas e ovos. Os outros dois homens riram.

"Nos arrastou, seria melhor”, Harry disse. "Parece um anjo, mas parece um demônio

para arrumar problemas, minha querida, te advirto”. Ele colocou um prato na frente de

Nell. "Maçãs fritas. A cozinheira achou que você poderia gostar, mas se você preferir um

café da manhã mais normal…"

"Não, obrigada, parece delicioso”. E estavam, bem fritas e borrifada com açúcar e

canela. Pela primeira vez ela se sentiu faminta.

Satisfeito, Harry fez seu próprio prato e se sentou.

"Então, Lady Helen”, Rafe disse, "Meus parabéns pelo casamento. Mas parabéns

talvez seja a palavra errada. Condolências, talvez. Estava na hora de alguém aparecer para

civilizar este bruto”.

Nell deu a ele um olhar agudo, insegura se haveria algo escondido no que ele estava

dizendo.

"Não acho que ele precise ser civilizado”, ela disse e pegou um bocado de maçã.

"Estou muito satisfeita pelo modo como ele é”.

Luke se retirou com uma expressão de choque fingido. "Bom Senhor, uma mulher que

não quer mudar um homem”, ele exclamou. "Você sabe o quão rara é?".

Rafe Ramsey deu a ela um olhar longo. "Lady Helen, você não pode se casar com

Harry”.

Ela olhou para ele cuidadosamente e não disse nada.

"Você deve se casar comigo”, ele disse.

Nell piscou, insegura de aonde isto a levaria. Os olhos de um azul pálido a

consideravam brandamente, mas ela pensou ver um preguiçoso cintilar neles.

"Você está tentando roubar a minha noiva de mim?", Harry disse e despejou um

pouco mais de chocolate quente para Nell, aparentemente desinteressado.

"Naturalmente”, Rafe respondeu. "Quem não gostaria de uma dama encantadora sem

nenhuma intenção de mudar um marido após o casamento? Qual homem não gostaria de

pegá-la?".

"Ah, mas se eu me casasse com você”, Nell disse a ele seriamente, "estou certa de que

teria que mudar de ideia quanto a isto”.

Page 142: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Houve um silêncio súbito, então um rugido de riso masculino. Rafe tentou parecer

afrontado, mas logo sucumbiu ao riso também. Ele deu a Nell uma piscada e ela sorriu

timidamente de volta. Parecia que os amigos de Harry a aceitaram.

"Eu conheço esse som de algum lugar”, Lady Gosforth disse, entrando como um

furacão. "Rafe, meu menino querido, e Luke, faz tanto tempo”.

Eles ficaram de pé e fizeram reverências elegantes e bonitas, que Lady Gosforth

ignorou, beijando-os ternamente na bochecha. Ela fez um aceno para que sentassem de

volta em suas cadeiras, e fez perguntas a eles sobre seus vários parentes e ao mesmo

tempo dava ordens a Sprotton.

Nell escutou quieta, apreciando as trocas. Era claro que isto era um evento rotineiro.

Lady Gosforth tratava os amigos de Harry como se fossem seus próprios parentes e eles

obviamente gostavam dela, também. Para uma menina que passara tantos anos sem uma

família ou na companhia de pessoas de sua idade, era uma coisa boa para o coração assistir

esta visão.

Mas enquanto o riso e as trocas sobre as pessoas que ela não conhecia continuavam, a

mente de Nell vagou. Com Rafe e Luke passando por várias casas de correção da paróquia

, eles tinham mais chances de achar Torie. Ela se moveu furtivamente para dar uma olhada

no relógio acima da cornija da lareira. Estava ficando tarde.

Ela viu um movimento através da porta. Era Cooper, trazendo a peliça e o gorro de

Nell, como havia sido solicitado, para a partida das oito horas.

Harry deveria tê-la visto também. Ele deixou os talheres juntos, acabou seu café,

colocou o guardanapo de lado, e disse, "é hora de irmos andando”.

Imediatamente seus dois amigos fizeram a mesma coisa. Era óbvio que eles tinham

sido soldados, ela pensou. Atenção imediata para o assunto em questão.

Lady Gosforth assistiu com desânimo quando Nell se ergueu também.

"Você não vai levar a menina o dia todo novamente, não é?", ela disse a Harry. "Ela

tem um enxoval para preparar”.

"As compras devem esperar”, Harry disse. "Há negócios legais e é importante que nós

o concluamos primeiro. Tem a ver com a propriedade”, ele acrescentou, quando viu o

olhar questionador da tia e que ela iria continuar com as perguntas.

A tia fez um barulho depreciativo. "Como se Nell ficasse interessada nisto. A menina

precisa de roupas, pelo amor de Deus. Você dois, meninos, devem concordar comigo,

estou certa”. Ela olhou para Luke e Rafe pedindo suporte.

Rafe cuidadosamente pegou um pedaço de penugem invisível de seu casaco

imaculado, franzindo o cenho com concentração extrema. Luke tirou um livro pequeno de

seu bolso e o consultou fervorosamente. Nem parecia que ele ouvira a pergunta.

Lady Gosforth bufou. "Vocês, meninos, juntos como sempre, entendo. Bem, meu

querido, nós mulheres—"

Nell disse urgentemente, "sinto muito, Lady Gosforth, mas realmente devo ir com

ele”.

"Você é muito leal, minha querida”, Lady Gosforth disse revirando os olhos. Ela se

virou para Harry com um olhar que deixava claro que ela o culpava pela ruína de seus

planos—e não Nell. "Como que eu posso conseguir o enxoval e o vestido de noiva da

Page 143: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

menina se você fica continuamente arrastando-a para fora de casa o dia todo? O casamento

é em menos de três semanas!", ela deu ao sobrinho um olhar militante. "Eu não me

importo com o que você diga Harry, eu já fiz compromissos para Nell com meu fabricante

de mantua, meu modista de chapéus, o fabricante de botas—"

Nell deu a Harry um olhar de solicitação desesperada. Ele podia ver que ela estava à

beira de revelar tudo. Ela queria dizer a tia dele o que eles estavam fazendo. Era o certo já

que eles iriam levar Torie para a casa de Lady Gosforth, ela dissera. Ela poderia fazer

objeções.

Ela realmente poderia, Harry pensou, lembrando de sua primeira experiência com a

tia. Poucas pessoas toleravam ilegitimidade. Tia Maude tinha feito uma exceção para um

parente de sangue, mas ele estava ciente de que Gabe havia forçado sua decisão. O bebê de

Nell não tinha nenhuma relação com ela.

Ele deu a Nell uma sacudida mínima com a cabeça e disse a tia, "muito bem, você

pode ter Nell por duas horas a partir de uma da tarde”.

"Duas horas?", a tia deu um bufar de desaprovação. "Você espera que eu organize um

enxoval em duas horas?".

"Não, mas você pode trazer o fabricante de mantua aqui a uma hora quando nós

retornarmos do almoço e ela poderá tomar todas as medidas de Nell. Isso te dará algo para

começar”.

"Mas Nell vai querer escolher, menino tolo. O sentido das roupas novas é o prazer de

escolher, não é, minha querida?".

Nell olhava fixamente para ela, querendo gritar com frustração. Lady Gosforth estava

sendo muito gentil mas Nell queria apenas partir e procurar por sua filha. Agora! Ela não

se importava com roupas.

Mas a generosidade tinha sido pouca na vida de Nell recentemente, e ela não podia

rejeitar a de Lady Gosforth, especialmente quando ela tinha posto tudo de lado pelo

benefício de Nell. Dividida, ela olhou para Harry, sem saber o que dizer ou fazer.

Ele avançou. "A dama de companhia dela poderá fazer isto”, ele disse. "Ela pode fazer

compras para Nell”.

Cooper, de pé e quieta na entrada, ofegou. A mão voou para a boca em choque.

Nell, também, estava atordoada, mas era uma solução brilhante. Nell tinha pouco

interesse em roupas nos seus melhores tempos e nenhum no momento, mas Cooper…

Cooper adoraria.

"Sua dama de companhia?", Lady Gosforth exclamou, intimidante. "Harry, não seja

ridículo!".

Nell ergueu as sobrancelhas para Cooper.

"Por que não?", Harry continuou. "Você mesma disse que ela era talentosa. Ela saberá

o que Nell precisa”.

Cooper, incrédula mas ávida, nervosamente anuiu com a cabeça de volta para Nell.

"Mas você não pode. A dama de companhia é muito boa”, Lady Gosforth declarou,

"mas ela simplesmente não pode—"

"É a solução perfeita”, Nell interrompeu. "Eu verdadeiramente não tenho tempo no

momento para fazer compras, mas Cooper sabe o que eu preciso, e ela tem gosto excelente.

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Estou certa de que ela também se beneficiará com o seu conselho, e o da Senhorita

Bragge”, ela acrescentou tacitamente. "Você não se importa, não é, Cooper?", Nell

perguntou, acenando para ela.

Os olhos de Cooper brilhavam com excitação. "Oh não, m’ lady. A senhora não se

arrependerá ao confiar em mim, m’ lady, eu prometo”.

"Excelente”, Harry disse vivamente, como se a impaciência para ir fosse toda dele.

"Agora eu sinto muito, mas nós realmente temos que partir”.

"Mas eu estava desejando tanto levar Nell para as compras”, disse Lady Gosforth,

enfadada.

Nell soltou seu braço do aperto de Harry e correu de volta e deu à senhora de idade

avançada um abraço. "E eu adoraria fazer compras com a senhora também, querida Lady

Gosforth”, ela disse a ela. "Mas é verdade que é um assunto urgente. Eu sinto muito, mas

nós teremos toda a vida para fazer compras, não é?".

"Sim, minha querida, eu suponho. Mas é o seu enxoval—"

"Será uma bela surpresa”.

Lady Gosforth considerou o pensamento e se iluminou um pouco.

"Nós a veremos a uma da tarde, Tia Maude”, Harry disse e escoltou Nell para o

curricle à espera.

Cada um de seus amigos tinha um curricle e um par combinado, ela viu. Os

cavalariços tinham andado com os cavalos para que não ficassem com frio. "Que cavalos

esplêndidos”, ela comentou quando Harry a ergueu. Ela rodou em sua cadeira e olhou

detalhadamente para os dois pares enquanto ele subia depois dela.

Rafe e Luke, que estavam esperando por seu curricles chegarem, olhavam fixamente.

"Bom Deus”, Luke exclamou. "Não me diga a mim que ela gosta de cavalos também? Ela é

a mulher perfeita”.

"Eu sei”, Harry rosnou, envolvendo um braço ao redor dela e arrastando-a ao longo

da cadeira para o lado dele. "Mas ela é minha. Veja você a uma da tarde”.

Nell deu a ele um olhar de lado e um sorriso tímido. A mulher perfeita? Ela sabia que

era apenas parte da brincadeira que ele tinha com os amigos, mas a possessividade áspera

dele aquecera-a. Assim como a faixa firme de músculos que a seguravam. Os músculos

ficaram lá muito depois que os amigos dele desapareceram.

Enquanto eles continuavam a procura por sua filha, Nell jurou que da próxima vez

que ela despertasse e o achasse dormindo em sua cama, não seria tão covarde.

"Então, quem era o pai da Torie?", Harry perguntado inesperadamente. A pergunta o

tinha corroído desde que ele tinha entendido o que tinha acontecido com ela.

Ao lado dele, Nell enrijeceu. Eles tinham acabado de partir de um dos chalés em que

uma bebezinho tinha sido colocada com uma ama de leite. Outra menininha que não era

Torie.

"Você não precisa me contar os detalhes”, ele disse depressa. "Só quem era”.

"Ninguém”, ela disse a ele.

"Nell”.

"Você não precisa saber. Não faz sentido”.

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Não fazia sentido? Claro que fazia. Ele manteve a voz tranquila. "Por que diz isto?".

"Meu pai tentou chamá-lo depois de—você sabe. Ele usou o pretexto de ter sido

roubado nas cartas—seria um escândalo se soubessem que o motivo era eu. Papai queria

mais do que tudo proteger a minha reputação”.

Teria sido muito melhor, claro, se o pai dela tivesse protegido a filha em primeiro

lugar, Harry pensou com fúria quieta.

"Mas Sir—ele—o homem—recusou a lutar com papai. Ele o chamou de um pobre

perdedor, mas ele sabia qual era o verdadeiro motivo”.

"Então ele sabe sobre o beb—"

"Ele não sabe nada”, ela disse veementemente. "Em primeiro lugar, ele nem sabe que

eu fiquei grávida. Papai o desafiou meses antes que eu percebesse a minha… minha

condição”.

"Entendo”.

Ela deu a ele um olhar no mesmo nível. "E se eu te desse um nome, você

provavelmente iria fazer o mesmo que o meu pai, não é?".

Não exatamente, Harry pensou. Ele não desafiaria uma escória como essa para um

duelo de cavalheiros como pretexto e então quando o sem-vergonha se recusasse a lutar,

ele apenas bateria no bastardo até cansar.

Ela deve ter lido a verdade nos olhos dele, pois movimentou a cabeça. "Apenas duas

pessoas sabem quem é o pai da minha criança, e papai eram um deles. Ele—o homem não

sabe nada sobre ele e é assim que eu quero que fique. É o melhor para todo mundo,

especialmente para Torie”.

Harry podia perceber isto. Ela não gostaria que a filha soubesse que é fruto de um

estupro. Quem gostaria?

Mas a pergunta ainda corroía Harry. Quem diabos seria o porco?

Eles retornaram a Mount Street a uma hora da tarde. Durante o almoço Harry

conversou com Rafe e Luke para ver o que eles tinham descoberto.

Nell estava se sentindo desanimada e sombria. A lista de lugares para procurar que

Harry tinha feito quando começaram estava ficando cada vez menor. Eles tinham coberto

uma grande distância e ainda assim não havia nenhum sinal de Torie.

E ela estava chateada e brava com Harry. "Como você pode dizer que não é Torie?",

ele perguntou no último lugar. Acrescentando, "todos os bebês parecem iguais para mim”.

Todos os bebês não eram iguais, e ela estava furiosa com ele por ter sugerido isto. Ela

se virou contra ele e respondeu impaciente à observação e eles voltaram para casa pelo

resto do tempo em silêncio.

Mas com silêncio veio a reflexão, e com a reflexão uma realização terrível.

O comentário dele era inocente o suficiente; ela sabia que ele não queria dizer nada

com isto. O problema era que ele tinha mexido em algo que ela tinha tentado ignorar. E

sob os medos e dúvidas havia a inquietação.

Como ela poderia, de fato, reconhecer sua própria criança? O coração dizia a ela que

ela iria, mas quanto mais berços, quanto mais rostos minúsculos e bochechudos ela via

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com rosto vermelho, penugem dourada e uma boca pura como um botão de rosa mais as

dúvidas começaram a aparecer…

Bebês mudavam muito em seis semanas.

Após o almoço, que tinha sido comido em uma atmosfera de tensão quieta, Nell tinha

sido levada por Lady Gosforth para preparar seu enxoval.

Ela gostava de roupas bonitas quase tanto qualquer pessoa, mas agora, o processo

inteiro a desgastava. Eles mediram cada parte imaginável de seu corpo, a magra e

ferozmente elegante fabricante de mantua usara uma fita para medir e deu os números

para sua assistente em francês. Então seus pés e batatas da perna foram medidos e um

modelo desenhado. E então a cabeça igualmente, e vários chapéus encomendados,

inclusive um para montar.

Nell suportou tudo em silêncio relativo, tentando ser tão cortês e tão cooperativa

quanto podia mas completamente incapaz de entrar no espírito da coisa. Ela deixava a

maior parte das decisões para Lady Gosforth, Cooper e Bragge.

Ela se sentia muito mal. E se Torie fosse um daqueles bebês que eles viram e a própria

mãe não a havia reconhecido?

A fabricante de mantua, o fabricante de bota, o alfaiate—para sua roupa de

equitação—e o assistente do modista de chapéus não notaram nada estranho, mas Lady

Gosforth notou.

No momento em que eles terminaram, Lady Gosforth despediu todos. Assim que elas

estavam a sós ela levou Nell até um sofá e se sentou ao lado dela. "Qual é o problema?", ela

exigiu, encarando-a com um olhar fixo e cortante.

"Problema?", Nell começou.

"Não tente vir com besteiras, minha jovem dama. Você pensa que pelo fato de eu usar

óculos para leitura não posso ver o que está na frente do meu nariz? O que quer que esteja

te levando com o meu sobrinho para fora o dia todo, todos os dias, não tem nada a ver com

os negócios legais de Harry ou da propriedade. É tudo sobre você. Posso ver nos seus

olhos”.

Nell mordeu o lábio.

Lady Gosforth continuou, "ontem à noite você voltou para casa parecendo tão doente

e depressiva, e agora você dois voltaram com cara de quem ficou uma semana na chuva. E

você, minha menina, se portou na compra de algumas roupas bonitas—roupas que

qualquer outra mulher jovem de sua idade daria o sangue para ter—como se fosse uma…

visita ao dentista. Então…", ela lamentou.

Nell não sabia por onde começar. Ela queria explicar a Lady Gosforth sobre sua filha;

não era direito não dizer ela. Ela estava aliviada pelo momento ter chegado, mas era tanta

coisa, que ela não sabia por onde começar.

Lady Gosforth se debruçou adiante e tomou sua mão. "Escute, minha querida”, ela

começou com um tom muito mais suave, "eu nunca tive uma filha, mas era o desejo mais

querido de minha vida, e você não parece ter uma mãe, então—"

Nell entrou repentinamente em lágrimas.

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Quando Harry veio buscar Nell, perguntando-se o que a mantinha em cima, Nell

tinha soluçado a maior parte de sua história no seio grande e confortante de Lady

Gosforth.

Assim que ele entrou, Nell saltou de pé, dizendo, "está na hora de irmos?".

O olhar de Harry foi diretamente para os olhos com as bordas vermelhas.

"Está tudo bem, Harry”, Lady Gosforth disse. "Nell já me disse tudo e nós duas já

choramos bastante, o que nos fez muito bem, apesar de que você não deva achar isso ao

olhar para nós, eu sei. Agora saiam e achem o bebê”.

Eles caminharam juntos para a porta da frente, onde o curricle estava esperando.

Lady Gosforth deu a Nell um abraço rápido. "Você saberá quando a vir, minha querida,

estou certa, então não se preocupe”.

Harry deu a Nell um olhar chocado. "Era isso que estava te chateado antes?", ele

perguntou quando eles já tinham ido embora. "O medo de não reconhecer Torie?".

Ela anuiu miseravelmente com a cabeça. Ele pôs o braço ao redor dela, sem dizer

nada.

Eles retornaram tarde novamente naquela noite depois de outro dia longo e

infrutífero. Harry tentou animar Nell durante toda a ceia, mas uma pequena pedra de

dúvida tinha se formado no coração dela.

Se sua filha tivesse sido perdida para sempre, Nell não sabia como poderia viver com

esse conhecimento. Se ela apenas tivesse dormido aquela noite com Torie nos braços, em

vez de deixá-la na cesta… Isso a assombraria para sempre. Ela nunca poderia se perdoar.

Harry estava sentado ao lado dela, falando com resolução quieta do que o amanhã

poderia trazer e passava os pratos para ela que ele esperava que tentassem o seu apetite.

Mas os medos tinham levado embora todo o apetite, Nell tinha comido apenas para que

ele ficasse feliz e por que ela sabia que deveria comer.

Ela poderia estar assolada por dúvidas e medos e cheia de culpa, mas ela nunca

desistiria de sua filha. Enquanto ela respirasse, ela a procuraria.

Capítulo XIII.

Na manhã seguinte, Nell despertou com o som suave da chuva que tamborilava

contra as janelas do quarto.

Estava muito molhado para ir montar no parque. Ela copularia com ele esta manhã,

ela decidiu. Ela o devia isto, no mínimo.

Harry estava deitado ao lado dela, um braço preguiçosamente envolvendo-a

protetoramente através do travesseiro sobre sua cabeça, o outro curvado ao redor da

cintura dela, a mão livremente através de seu diafragma, apenas abaixo de seus seios. Nell

estava deitada enrolada contra ele, o corpo relaxado e musculoso dele era uma fonte de

calor e conforto. Os pés estavam dobrados entre as batatas da perna dela. Ela se sentia

segura e protegida.

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Ela girou a cabeça de forma que sua bochecha deitasse contra seu braço e respirou seu

odor de limpo, de homem, agora tão familiar para ela, e tão querido.

Com Harry dormindo ao seu lado, ela não se sentia muito só, tão só. Era

surpreendente como em tão pouco tempo ela tinha ficado acostumada a dormir com um

homem em sua cama.

Ou melhor, acordar com um. Todas as noites ela ia para a cama só e todas as manhãs

ela acordava bem descansada nos braços dele. Presumivelmente ela ainda estava andando

enquanto dormia.

A respiração dele era fixa e regular. A excitação dele estava apertada contra a parte

inferior do corpo dela, como sempre. Isso a intrigava. Ela sabia como os cavalos se

reproduziam, e cachorros, e parecia que com as pessoas era quase a mesma coisa. Exceto,

que ela não estava na época para isso, então por que ele estava excitado?

O porquê não importava, ela disse a si mesma. Ele estava pronto para ela e esta

manhã eles iriam… qual era a palavra correta? Acasalar? Copular?

Ele se mexeu, movendo durante o sono. As pernas deslizaram contra a pele das coxas

dela, e a sensação a fez estremecer, não era desagradável. A excitação dele se apertava

insistentemente contra ela.

Estava na hora.

Ela respirou fundo e se virou para enfrentá-lo. Ele estava acordado e observando-a.

"Dia”, ele disse com a voz funda e ligeiramente rouca. Ele pegou um cacho do cabelo

dela sobre os olhos e colocou suavemente atrás da orelha. "Você dormiu bem?".

"Sim. Obrigada”. A carne quente roçava contra a barriga dela e ela piscou.

"Eu estou te perturbando”, ele disse imediatamente. "Vou partir”. Ele fez um

movimento.

"Não, f-fique”. A voz dela terminou como um fio.

Harry franziu o cenho. Ela parecia assustada e firme. Ele deu uma olhada em torno

do quarto, mas tudo estava quieto e mudo. "Qual o problema?".

"Nada”. Ela engoliu em seco. "Eu quero c-copular com você”.

Harry observou o rosto dela. "Não, você não quer”, ele disse após um momento. Ela

estava tão firme quanto uma corda de arco. Assim como ele, mas de um modo diferente.

"Eu quero, realmente quero. Você tem sido tão amável comigo, tudo bem”. Os olhos

dela estavam arregalados, claros e ansiosos. "Eu quero agradecer, e eu sei que você me

quer, então…", ela tragou novamente.

Ela estava agradecida. Harry tentou não deixar seus sentimentos aparecerem. Ele

estava bravo, não com ela, mas consigo mesmo, por não perceber que isso aconteceria.

Ela queria agradecê-lo—droga!—fazendo um último sacrifício.

Ele queria o corpo dela, sim, mas não assim, como um tipo de pagamento. E ele

estava totalmente certo de que não queria sua gratidão.

"Você não me quer, e não precisa me agradecer. Vou sair para o meu passeio

matutino. Até o café da manhã”. Ele se debruçou adiante e beijou-a brevemente na boca.

Os lábios dela estavam frios e trêmulos. Ele jogou as cobertas para trás para sair.

"Não”, ela disse e o agarrou. Ele estava bem certo de que ela tinha visado segurá-lo

pela cintura. Ou a coxa. A bainha do calção, talvez…

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Mas não foi isso o que ela acabou pegando. Através do algodão do calção ela o

segurou. O corpo dele imediatamente respondeu.

Ela o agarrou mais firmemente. Ele tentou não arquear contra a pressão. Ele apertou a

mandíbula com força. Ele deveria ter feito algum tipo de barulho porque os olhos dela se

arregalaram com preocupação.

"Eu te machuquei?", ela perguntou. O aperto diminuiu, mas ela não o deixou ir.

"Não”, ele conseguiu dizer. "O que diabos você pensa que está fazendo?".

"Eu quero copular com você. Hoje. Agora”.

Sim, saldar a sua dívida, ele pensou amargamente. "E se eu não quiser copular?".

"Você quer”, ela disse com certeza firme. "Eu posso ser ignorante em muitas coisas

mas já assisti a cobertas de éguas por garanhões o suficiente para saber que você está

pronto para acasalar. Comigo. Agora”.

Tremores ondularam por ele. Deus, sim, ele estava pronto para acasalar com ela

agora. Ele estava assim desde o momento em que colocara os olhos sobre ela. Mas ele não

era um animal e ele podia controlar seus desejos. Ele podia.

A mão dela apertou ao redor dele. Ele friccionou os dentes e esperou. Houve um

longo silêncio.

Ele deveria ir para longe agora. Ela estava tremendo como uma folha. Mas ele não

conseguiu se forçar a se mover. Ele a queria há muito tempo. Ele não estava tão no controle

como imaginava. Uma parte dele queria ir, outra parte se recusava a partir. Ele não

conseguiria evitar ceder para ela. Para ela.

"Eu não sei o que fazer a seguir”, ela disse com frustração. Seus olhos estavam

brilhantes com lágrimas não derramadas. "Diga o que tenho que fazer”.

Ele estava tentado a assumir o comando e fazer o que estava morrendo de vontade de

fazer desde que a vira pela primeira vez: assumir o comando e fazer amor com cada

centímetro dela.

Mas ele se lembrava do que tinham feito com ela. Se ele desse vazão a seus instintos

luxuriosos, ela ficaria ainda mais apavorada do que já estava.

Provavelmente iria matá-lo, mas ele não queria ir para a cama com um cordeiro de

sacrifício—e ele estava certo de que teria que deixá-la fazer tudo do seu modo.

Deixá-la se sentir no comando.

"Faça o que quiser”, ele disse irritado. Já era ruim o suficiente que o corpo dele

estivesse torturado com o esforço de conter todo o instinto, agora ela queria instruções?

Ela deu a ele um olhar frustrado e ele se recordou de que ela poderia ser uma mãe,

mas era praticamente inexperiente. Ele xingou calado.

"Olhar, tocar, lamber”, ele explicou. "Faça o que quiser comigo, eu não me

importarei”. Ele deu um sorriso sentido. "Eu amarei qualquer coisa que você faça. Você

está certa, eu te quero, muito. Mas eu nunca farei qualquer coisa que você não queira. Eu

sou como a argila do escultor em suas mãos”.

"Argila do escultor?", ela disse com um toque de humor. "Isto não parece nada com

argila para mim”. Ela apertou.

Ele deu um pequeno riso sufocado. Iluminou o momento, aliviou a tensão. Ele sentiu

que ela relaxou um pouco.

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Ele observou-a considerando cuidadosamente, ainda segurando firmemente o seu

pênis que estava dentro do calção.

"Eu normalmente durmo nu”, ele disse.

Os olhos dela foram para os botões no cós, então ela lentamente os soltou. Ele queria

dizer a ela que aceitava que esquecesse o que ele disse, mas ele friccionou os dentes e

esperou. Seria o inferno, mas se ele pudesse apenas ser paciente e se manter sob controle, o

céu poderia estar logo ali adiante.

O céu estava aqui em uma camisola de algodão branca e fina, franzindo o cenho e

corando enquanto soltava os botões do calção dele. Havia apenas três. Ela os tinha soltado

em um instante.

Ela deu uma olhada para ele. "Você realmente dorme nu?".

"Sim”, ele conseguiu dizer. Ela parecia surpresa. Então o bastardo tinha ficado

vestido, Harry imaginou. Bom. Quanto mais diferenças entre eles, melhor.

Ela tirou o calção lentamente, deslizando pela barriga dele e pausando no lugar onde

o caminho de pelos escuros e espessos ia além de sua barriga. Sem tirar os olhos dela, ele

ergueu o traseiro da cama para facilitar que ela tirasse o calção. Ela respirou fundo e os

arrastou passando além dos joelhos. Os olhos dela se arregalaram quando o pênis dele

pulou livre.

Ele chutou o calção o resto do caminho e tentou parecer relaxado enquanto ela o

examinava. Ela estava muito vermelha, mas sua mandíbula estava fixada em um ângulo

determinado. Ela iria até o fim.

Assim como ele. O pensamento deu a ele uma sensação de diversão distorcida. Qual

dos dois era o cordeiro do sacrifício? Ele estava começando a se perguntar.

Os lábios dela estavam separados; a respiração entrava em sopros suaves. Ela estava

excitada, Harry percebeu. Não tanto quanto ele, mas era um bom sinal.

A mão dela pairou indecisamente sobre o pênis dele. Harry prendeu a respiração,

mas ela se moveu para o peito dele. Ela alisou suavemente, as mãos frias sobre ele,

explorando a diferença entre eles. A fricção da pele com pele.

Ela se debruçou sobre dele, seus seios balançando através de uma mortalha de

algodão branco. Ele seguiu os mamilos intumescidos com olhos famintos. Ela explorou o

corpo dele, correndo as mãos através dos ombros, pelos braços, a sobrancelha enrugada

em concentração. Aprendendo sobre ele. Os lábios estavam separados e ele sentiu o odor

dela. Ele queria sentir o gosto dela em sua boca.

Mas se ele se movesse, se ele a tocasse, se começasse a beijá-la, ele poderia não ser

capaz de parar. Ela levemente tocou os mamilos dele e ele involuntariamente arqueou. Ele

não foi capaz de impedir.

Ele fechou os olhos, pensando que isso poderia fazer tudo mais fácil. Mas não o fez.

Com cada carícia, cada toque, o corpo dele gritava a cada chamada do corpo do macho

pelo corpo da fêmea. E o odor morno feminino intensificava a sensação. Cada partícula de

seu corpo doía de desejo e o impulsionava a se juntar a ela.

Harry segurou os lençóis com punhos determinados. Mesmo que isso o matasse, ele

suportaria. Por ela. Não importava que cada fragmento de controle que ele tinha tivesse

que ser estirado até o limite.

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Porque era isso que ela precisava dele.

Ela era uma covarde, Nell pensou, ao evitar sua… coisa. Ela não tinha uma palavra

para isto. O de um cavalo era chamado de pizzle23, mas não parecia direito usar a mesma

palavra para o de um homem.

Era quente através do algodão antes. Mas tinha ficado maior desde que ela o despira,

e ela estava um pouco hesitante em tocá-lo novamente, ainda. Ela iria, claro, no fim.

Ela tentava não pensar sobre o fim. Isto era diferente. Era fascinante. Ter esse animal

masculino grande e magnífico nu sob o toque dela, deitado como um grande leão, tenso,

mas tão disposto a ser acariciado…

O desejo dele por ela era palpável. Ela se sentiu aquecer por isto. Mais que aquecida.

Em brasas. E ainda assim ela não estava com medo.

A pele dele era tão lisa e elástica, cortada e cicatrizada em vários lugares. Anos em

guerra, ele disse uma vez.

"Onde você conseguiu isto?", ela localizou com o dedo uma cicatriz branca e dentada.

"Uma baioneta francesa”, ele disse a ela. Ele não tirou os olhos dela.

Ela colocou um dedo em um trecho enrugado na pele. "E esta?".

Ele franziu o cenho. "Uma bala, acho. Ou talvez algum estilhaço de metralha”.

"Você não sabe?".

Ele deu a ela um sorriso lânguido. "Acho que estava insensível no momento em que o

cirurgião mexeu. Eu consegui ao mesmo tempo”. Ele virou a cabeça e ela viu uma cicatriz

que ia da orelha para cima até seu coro cabeludo.

Ela deslizou os dedos pelo cabelo dele, tocando a cicatriz, massageando sua cabeça

ligeiramente. "Você poderia ter morrido”, ela disse suavemente.

Ele deu a ela um indiferente encolher de ombros, como se não se importasse. Nell

ficou chocada. Mas ela supunha que os homens em guerra tinham que pensar assim, caso

contrário eles ficariam paralisados pelo medo.

Como ela quase ficara. Ela tinha que continuar, ir para a parte que ela temia e ansiava,

a parte em que eles iriam se unir. Ela se distraiu com suas cicatrizes, mas ele devia estar

ficando impaciente. Sem mencionar o frio.

"Você está com frio?".

Ele deu a ela um sorriso lento. "A minha pele está fria?".

Ela correu as palmas através dos ombros dele e abaixo de seus braços, então o alisou

através de seu tórax e lentamente abaixo pelo estômago. Não, a pele dele não estava fria.

Nem ela estava no que dizia respeito a esse assunto.

Não havia nada de gordura no homem; ele era puro: músculos, nervos e ossos.

Poder. Ela se lembrava de como ela tinha se sentido pequena, leve e impotente

quando ele a tinha jogado sobre seu ombro naquela vez. Ela se recordou de como ele

pulsava contra a palma de sua mão naquele estábulo escuro.

Ele podia tê-la tomado a qualquer hora.

23 Pizzle – é uma palavra antiga que indicava pênis, hoje em dia é usada especificamente para indicar o órgão sexual dos animais.

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Ela deslizou os dedos através de seus mamilos pequenos e firmes, e ele arqueou um

pouco e fez um som suave vindo do fundo de sua garganta. Ele tinha gostado. Será que era

como ela se sentia quando tocava os próprios mamilos? Quando ela estava grávida, eles

eram tão sensíveis que… Ela podia senti-los agora, deslizando contra o algodão de sua

camisola.

Ela circulou os mamilos pequenos, circulou e circulou, sentindo sua resposta involuntária.

Ela arranhou as unhas ligeiramente através deles. Ele inalou nitidamente e os olhos cinza

escureceram.

Ele não tentou controlá-la. Ele apenas ficou deitado, assistindo-a com os olhos cinza

esfumaçados, deixando que ela o tocasse como queria.

Ela podia sentir a batida do próprio coração. Estava batendo rápido e ela arquejou

como se estivesse feito uma corrida.

Nervos, ela disse a si mesma. Quanto mais ela brincava nesta exploração aprazível do

corpo dele, mais a coisa que ela tinha que fazer ficava para depois. Passe por isso. Acabe

de uma vez.

Ela respirou fundo e deixou a mão continuar seu caminho exploratório descendo

pelos cumes firmes de sua barriga, seguindo a linha de pelo escuro que levava em direção

ao… pau. A palavra veio para ela afinal. Seu pau.

Com um dedo ela o acariciou da base até a ponta, então correu a ponta do dedo em

torno da cabeça. A respiração dele deu um arranco, e ela deu uma olhada rápida para o

rosto dele. Seus olhos estavam pesados como chumbo e escuros. Mantendo os olhos no

rosto dele ela correu o dedo em torno da cabeça de seu pau novamente, e novamente ele

deu uma arfada rota e cerrou a mandíbula. Os músculos de seus braços e pernas estavam

rangendo. As solas de seus pés estavam cravadas no colchão e ele segurava firmemente os

lençóis com os punhos, como se estivesse se ancorando à cama.

"Não é dor o que você está sentindo, não é?", ela perguntou, acariciando-o à medida

que falava. A pele de sua cabeça era suave como veludo. Sob ela era firme e quente.

Ele agitou a cabeça e friccionou os dentes.

"Você gosta disto, não é?".

Os olhos dele queimaram para ela com uma confirmação muda, potente, e ela sentiu

uma pequena excitação feminina. Ela estava fazendo isso por ele. Ela agarrou a base do

pau com a mão inteira e correu muito lentamente da ponta até o fim. Ele gemeu e jogou a

cabeça para trás. Ela hasteou a mão novamente, apertou firmemente e novamente ele

gemeu e cerrou o corpo como se estivesse com dor. Apareceu uma umidade na ponta e ela

correu o buraco com a palma, girando e girando, e ele violentamente estremeceu.

"Não mais”, ele falou irritado, a mandíbula cerrou e a cabeça voou para trás.

Ela o soltou imediatamente. "O que foi?".

Ele abriu os olhos e deu a ela um olhar firme. "Estou pronto para acasalar com você e

mais um toque desse e eu vou ejacular”.

Ela entendeu de uma vez. Os garanhões faziam isto, também.

Ela ficou fria. Ele estava dando a ela uma maneira de sair. Deixando que ela soubesse

que ela não tinha que passar por aquilo.

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Mas ela tinha que fazer, tinha. E tinha que se recuperar disto. Ela não viveria sua vida

com medo disso, não iria.

A hora chegou. Ela parou a camisola a meio caminho acima das coxas e disse, "então

vamos, acasale comigo. Agora”.

Ele não se moveu por um momento, então ela se esticou e pegou nele novamente. Ele

não precisou de uma segunda persuasão. Ele ficou sobre ela, abriu suas pernas, e a tocou

lá. Ela enrijeceu enquanto sentia os dedos dele abrirem a sua divisão. Ele a acariciou

ligeiramente e ela começou a relaxar, mas ele tocou em algo e uma convulsão súbita

passou por ela. Antes que ela tivesse tempo para pensar, a mão dele se moveu novamente,

e novamente uma lança quente de sensações turbulentas por ela.

Ele fez um som masculino do fundo de sua garganta e ela o sentiu entrando nela. Ele

empurrou uma, duas vezes.

E ela viu tudo branco.

Harry sentiu, sentiu-a enrijecer, o corpo dela congelar. Ele estava certo de que não a

estava machucando. Ela estava pronta para ele, estava morna, molhada e escorregadia, e

ela tinha respondido tão docemente.

Ele parou de se mover de uma vez. "Nell, o que foi? Qual o problema?".

Ela não respondeu. Ela estava firme, mas seu corpo inteiro tremia. E não era de um

modo bom.

"Nell? Querida?".

Os olhos dela estavam fechados, seu rosto fixo em uma carranca.

Harry soube imediatamente o que tinha feito. Ele tinha-a sujeitado efetivamente

portanto ela não podia se mover. Ele se amaldiçoou silenciosamente. Havia apenas uma

coisa na qual ele podia pensar em fazer.

Ainda bem fundo nela, ele rolou, levando-a para cima dele. Então, mesmo que isso

fosse matá-lo, ele observou o rosto dela e esperou.

Parecia que havia demorado uma eternidade antes que a rigidez fosse para longe dela

e seus olhos abrissem cautelosamente. Confusa, ela olhou fixamente para ele abaixo. "O

que você está fazendo? Termine com isto”.

Ele agitou a cabeça. "Você termina. Ou não. A escolha é sua”.

Ela olhou fixamente para ele. "Mas você é o homem”.

"E você é a mulher”, ele respondeu suavemente. "Os dois são necessários”.

A sobrancelha dela se enrugou. "Como?".

"Você pode cavalgar, não é?", ele colocou as mãos nos quadris dela e ele a moveu um

pouco, para mostrar a ideia. "Deste modo você controla tudo”.

Não acreditando muito nele, ela se moveu experimentalmente e ele viu também

quando ela sentiu sua resposta. Franzindo o cenho com concentração, ela se moveu

novamente. Ele gemeu e deslizou a mão entre eles. Ela começou e ela sentiu o golpe no

minúsculo ponto e então ofegou. Ele sentiu o aperto do corpo dela ao redor do dele em

resposta.

Daria tudo certo, ele pensou aturdido quando o último de seu controle roto se

dissolveu e ele se moveu para cima, dentro dela. Ela ofegou e se agarrou dentro e fora

dele, com as coxas e músculos internos. Ele se esquivou empurrou enquanto ela o montava

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tão habilmente quanto qualquer cavalo, mais rápido e mais rápido, ofegando com cada

movimento enquanto o incitava.

No último instante, quando ele soube o que estava por vir, ele chamou o nome dela.

"Nell, Nell!", agressivamente, precisando que ela respondesse.

Os olhos dela se abriram de repente e ela olhou fixamente para ele, ofuscada,

preocupada, montando-o furiosamente.

"Olhe. Para. Mim”, Harry disse asperamente, e os olhos dele ficaram presos nos dela,

e naquele momento, a mente e o corpo juntos, ele arqueou para um longo e estremecedor

clímax. Ele ouviu um lânguido grito juntando-se ao grito rouco de triunfo dele, então tudo

se partiu ao redor deles.

Depois de certo tempo, Harry ficou ciente de que ela estava deitada sobre o tórax nu

dele, chorando silenciosamente.

Algo no peito dele se partiu. Não havia nada que um homem pudesse fazer quando

uma mulher chorava, exceto abraçá-la. Ele tinha aprendido isso com Barrow, quando ele

era um menino e ficava chocado ao ver a Sra. Barrow, a mulher mais forte que ele já tinha

conhecido, chorando nos braços de Barrow.

"Homens cortam madeira, ou esmurram coisas”, Barrow disse a ele posteriormente.

"As mulheres choram. Não há nada para fazer, rapaz, exceto abraçá-las e amá-las até que

passe”.

Então Harry abraçou Nell, acalmando-a com as mãos, acariciando seu cabelo,

segurando-a contra ele, amando-a silenciosamente.

Amando-a?

Oh Deus. Ele não esperava isto. Ele empurrou o pensamento para longe. Ele não

estava pronto para pensar em nada assim.

Ele a colocou ao lado dele, murmurando frases confortantes sem sentido. "Sim, sim…

está tudo bem…", não tendo a menor ideia do que elas queriam dizer.

Mechas úmidas do cabelo dela se agarravam em suas bochechas e testa, e quando ele

as colocava para trás, sem pensar muito sobre isto, dava pequenos beijos onde cada uma

esteve: nas maçãs do rosto, nas têmporas, ele beijou as pálpebras e saboreou o sal.

Ela olhou para ele com os olhos encharcados com lágrimas e ele beijou os cantos de

seus olhos, então desceu junto à linha da mandíbula até o ponto sensível sob a orelha. Ela

se enrolou contra a boca dele como um gato. O desejo chamejou novamente à medida que

ele a saboreava, beijava e confortava. E se excitava.

Desta vez, ele resolveu, seria tudo pelo prazer dela. Nada de copular. Fazer amor.

Esta palavra novamente. Amor.

Ele fechou os olhos e voltou a beijá-la.

"Não”, ela disse de repente e o afastou.

Ele congelou. O que ele tinha feito?

"Você não ouviu o carrilhão do relógio agora mesmo?", ela se sentou. "São quinze

para as oito. Rafe e Luke estarão aqui a qualquer minuto. Nós precisamos nos vestir e nos

preparar para partir”. Ela escapou dos braços dele e saiu da cama.

Harry suspirou e puxou o lençol ao redor do corpo.

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Outro dia infrutífero de busca. Foi ficando muito frio, e Nell se envolveu em um

tapete de pele. Por causa da chuva da manhã, Harry contratou um chaise, que veio com

um motorista. O chaise fechado dava mais isolamento como também proteção. Nell se

sentou ao lado de Harry na cadeira com os pés dobrados para cima, debruçando-se contra

ele, dentro de seu braço com a bochecha aconchegada contra seu ombro.

Por mais desajeitado e carregado de tensão que tinha sido o ato de fazer amor pela

manhã, o resultado tinha sido uma facilidade física nova de um com o outro. Harry estava

contente por isto.

Nell estava muda na maior parte da última hora.

Eles não podiam ver muito; o chuvisco com neblina embaçava as janelas, mas o

condutor disse que eles estavam voltando às estradas principais e se aproximavam de

Londres. As luminárias da carruagem tinham sido acesas pouco antes. O brilho dourado

fosco balançava ritmicamente seguindo o dos cascos dos cavalos.

"Papai o levou para Firmin Court”, ela disse, como se estivesse continuando uma

conversa. "Ele tinha ficado jogando cartas com ele em uma casa de festas antes e ele o tinha

convidado para ir lá em casa. Por mim, suponho. Papai queria que eu casasse, e Firmin

Court era um dote tentador”.

Ela já era tentadora o suficiente como era, Harry pensou, mas ele não a interrompeu.

Ele sabia de uma vez de quem ela estava falando. Ele não sabia o que tinha iniciado a

conversa sobre ele agora—talvez a intimidade da carruagem fechada com a chuva caindo

do lado de fora, o assobio das rodas, e o clop-clop dos cascos dos cavalos.

"Eu o repugnei à primeira vista”, ela disse. "Você conhece alguma pessoa que ao

encontrar pela primeira vez, de cara, teve uma antipatia instantânea?".

"Sim”.

"Não era que eu soubesse o tipo de homem que ele era”, ela qualificou. "Eu apenas

sentia repúdio por ele. Ele era bonito, suponho, mas os seus olhos eram muito próximos e

ele tinha uma boca meio cruel. Ele sorriu muito para mim e me deu todos os tipos de

elogios mas nunca olhou realmente para mim. O tempo todo ele estava observando a casa,

pensando em seu valor”. Ela pausou. "Eu podia ver que ele estava desapontado. Papai

sempre gostava de dourar a pílula. Eu era uma beleza e a propriedade rica e cheia de

tesouros inestimáveis”.

"Você é uma beleza”, Harry disse. "E a propriedade ficará rica, apenas espere e veja”.

Ela sorriu. "Sir—ele não percebia isto”.

Maldição, ela quase deixara o nome vazar. Harry estava determinado a descobrir.

Ela ficou em silêncio por um tempo, então disse, "ele era o tipo de homem que

perseguia as criadas domésticas. Até quando elas não estavam dispostas”. Os dedos dela

apertaram ao redor do braço. "Especialmente quando elas não estavam dispostas. Nossas

criadas domésticas eram boas meninas. Ambas eram noivas de homens na nossa

propriedade. Ele não se importou”.

"O que aconteceu?", Harry iniciou.

"Eu o peguei tentando estuprar uma delas. Eu bati na cabeça dele com um esfregão

molhado. Ele estava furioso. O esfregão era um pouco fedorento, mas eu não me importei.

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Eu estava furiosa, também. Eu o repreendi na frente dela e de todos os outros empregados.

Eu gritei furiosamente, chamando-o de todas as coisas horríveis que pensei”. Ela fez uma

careta.

"Eu fiz um inimigo naquele momento. Era muito tarde para que ele partisse naquela

noite, mas eu disse a ele que ele teria que partir de manhã cedinho”.

Ela deu uma respiração trêmula e continuou, "eu não confiava nele. Coloquei dois

criados no pé dos degraus para os quartos das empregadas”. Ela estremeceu. "Nunca

pensei que ele viria atrás de mim—a filha do cavalheiro em sua própria casa”.

Harry abraçou-a com força, mas não disse nada.

"M-mas ele fez”, ela terminou tremendo. "Eu apenas causei isso para mim mesma”.

"Tolice”, ele rosnou ferozmente. "Não foi culpa sua. Você protegeu aquelas meninas e

isso foi a coisa certa a se fazer. Seu pai deveria tê-lo expulsado de lá”.

Ela suspirou. "Papai tinha perdido no jogo, estava bêbedo e insensível. Além disso,

ele nunca teria suspeitado que um cavalheiro pudesse fazer isto”.

O modo como ela sempre defendia o pai o irritava. O homem era um inútil. Ele a

tinha decepcionado de todas as maneiras possíveis, e ainda assim ela o amava. "Ele deveria

ter feito isso para proteger seus empregados. Era a responsabilidade dele como seu

empregador”.

"S-sim, mas fui eu quem o humilhou—"

"Parando seus hábitos sórdidos?".

"Por insultá-lo na frente dos empregados”.

Ele bufou. "Você jogou insultos sobre a minha cabeça falando o mais alto possível na

frente de todo mundo em Bath e não me aborreceu em nada”.

Ela franziu o cenho para ele e disse devagar, "sim, mas você é diferente”.

"Exatamente. Eu não sou um estuprador imundo que persegue mulheres. Eu sou um

homem”.

Ela olhou fixamente para ele por um momento, os lábios tremendo. "Sim, você é um

homem—um homem maravilhoso”. E ela jogou os braços ao redor dele e o abraçou

convulsivamente.

Ele a segurou contra ele. "Não foi sua a culpa, não mesmo”.

"Não, não, não foi”, ela murmurou no pescoço dele. Lentamente ele sentiu a tensão

sair do corpo dela.

Depois de um longo silêncio ela suspirou e esfregou a bochecha contra o tecido do

casaco dele. "Eu me sinto bem melhor agora que nós conversamos sobre isto”, ela disse a

ele. "Há apenas mais uma coisa que eu preciso te dizer, e então eu nunca mais terei que

falar sobre isto novamente”.

Harry ficou tenso. O nome. Ele queria saber o nome do bastardo. Ele jurava que iria

vingá-la.

"Foi tudo muito depressa”, ela disse a ele. "Eu estava adormecida e já tinha passado

da metade quando percebi”. Ela estremeceu. "De forma que foi assim. Agora você sabe

tudo”.

"Não exatamente tudo”.

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"Eu não direi o nome dele a você”, ela disse firmemente. "Ele não sabe sobre Torie e

eu quero que fique assim. Um pai tem direitos sobre uma criança, sabe. Ele poderia levá-la

de mim e a lei permitiria”.

"Tolice. Você estará casada comigo”, Harry disse a ela. "E eu nunca permitiria que tal

coisa aconteça”.

Ela agitou a cabeça. "Não, eu não me arriscarei”. E era sua palavra final.

Durante a noite Harry ficou chocado com a história, enquanto ele esperava que ela se

despisse. Ela ainda estava muito tímida para deixá-lo ajudá-la a se despir e ele não iria

forçar a barra. Ele dormiria com ela hoje à noite e não esperaria que ela começasse a ter sua

crise de sonambulismo.

Ele foi buscar uma folha de papel, uma caneta e tinta e se sentou escrever para Ethan.

Alguém em Firmin Court saberia quem era aquele bastardo. Aquela mulher idosa,

Aggie—saberia. Algumas perguntas discretas seriam o suficiente.

Ethan sabia como ser discreto. Ele não precisava saber detalhes, apenas descobrir qual

era a visita que tinha corrido atrás das criadas domésticas e tinha sido repreendido

severamente por Lady Nell.

Quando ele terminou a carta, fechou-a hermeticamente, e a enviou para ser postada,

ele bateu na porta de Nell.

"Entre”. Ela estava sentada ereta na cama, aquela maldita camisola abotoada até o

queixo.

“Não faz sentido começarmos a noite separados”, ele disse a ela. "Nós dois sabemos

onde vamos acabar, então com sua permissão…", ele esperou pelo consentimento dela.

Ela pensou para um momento, então anuiu com a cabeça e corou de maneira

brilhante, sacudiu as cobertas para trás e fez um convite sem palavras.

Harry se despiu depressa e deslizou na cama ao lado dela. "Agora me beije”, ele

murmurou. Ela não precisou de nenhum encorajamento adicional.

Capítulo XIV.

Era a carta mais importante que Ethan já escrevera, e talvez que viesse a escrever. A

felicidade futura dele estava nela. Também era a mais difícil. Essa era uma carta que ele

não iria deixar o vigário ler e corrigir.

Tibby estava na Inglaterra. Apenas algumas centenas de quilômetros de distância. A

mensagem tinha vindo no dia anterior. Ela tinha vindo com Gabe, a princesa e os dois

pequenos meninos. Eles todos estavam hospedados em Alverleigh, a casa do detestado

meio irmão de Harry, o conde.

Harry não gostaria, Ethan sabia. Mas Ethan não se importava. Tibby não estava no

além mar em Zindaria; Ela estava a menos de um dia a cavalo.

Minha querida Senhorita Tibby…

Não. Ele riscou.

Minha adorada Senhorita Tibby... Não. Ele riscou a palavra Senhorita.

Page 158: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Minha adorada Tibby... Ela o acharia presunçoso? Ela era muito adequada, sua Tibby.

Ele gemeu. Ela não era a sua Tibby, esse era o problema.

Ele abaixou a caneta e enxugou as palmas pela quadragésima vez. Ele estava suando.

No frio congelante de dezembro.

Ele fez um esboço e o corrigiu o melhor que pôde. Essa era a cópia final. Ele

continuou desperdiçando papel tentando decidir como começar. "Chega disso e vá com

tudo, Delaney”, ele disse a si mesmo.

Ele levantou a caneta e começou novamente:

Minha querida Senhorita Tibby,

Eu levei as suas palavras da última carta ao pé da letra e peço a licença de te dizer que irei vê-la

em Alverly na próxima quarta-feira à tarde. Espero que seja conveniente.

Sinceramente seu, Ethan Delaney.

Pronto. Estava feito. Ele a secou cuidadosamente, então o dobrou e fechou

hermeticamente com uma gota vermelha de cera, lacrando-o. Vermelho para perigo.

Vermelho para sangue. Vermelho para amor. Com um hábito antigo que ele pensou que já

tinha esquecido há muito, ele se benzeu, beijou a carta e sussurrou, "Boa sorte”.

Então ele guardou a carta e saiu. Se ele não a postasse agora, perderia a coragem

novamente.

Era o sétimo dia de busca. O sol do inverno fraco estava afundando no oeste e Nell e

Harry estavam voltando para Londres. Nell se sentava curvada no canto do curricle,

desviando a vista para a paisagem em transcurso, muda e quieta.

Eles tinham riscado o último endereço da lista.

Entre os quatro, eles tinham visitado todas as casa de correção da paróquia, o

Hospital dos Enjeitados, o asilo para órfãs em Westminster, cada instituição de caridade

que cuidava de órfãos e crianças não desejadas, e cada ama de leite conectada em cada

local de caridade ao redor de Londres.

Não havia nenhum sinal de Torie em nenhum deles.

Com um último e desesperado esforço, eles decidiram refazer a jornada do pai de

Nell da casa onde ela tinha dado a luz a Torie, a aldeia onde ele tinha morrido e de lá até

Londres.

Eles passaram algum tempo na aldeia onde ele morreu fazendo um interrogatório às

pessoas. Eles determinaram que não, ele não tinha nenhuma cesta ou nenhuma criança

com ele quando desmoronou. E não, ninguém na área, de repente, tinha aparecido com um

bebê.

Sim, era certo que ele tinha sido visto vindo na direção da aldeia vindo da direção de

Londres.

Page 159: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Nell tinha colocado flores no túmulo do pai e eles continuaram o caminho, parando

em cada vila e aldeia e inquirindo. Era desesperador, Harry pensou. Eram sete semanas

agora.

Ele apenas desejava que as perguntas ajudassem Nell a aceitar a perda de sua filha. O

medo dele era que ela nunca aceitasse.

Eles diminuíram a velocidade ao passar por um rebanho de gansos sendo

pastoreados em uma minúscula vila que consistia de uma igreja solitária, cercada por

fazendas e chalés dispersos.

Quando eles passavam pela igreja, Nell se sentou de repente. "Pare!", ela gritou. "Pare

aqui. Pare!".

Harry parou os cavalos, mas ela já tinha descido do curricle e estava correndo de

volta em direção à igreja.

"Aqui, segure os cavalos”, ele disse para um pastor de gansos e jogou as rédeas para

ele. "Há um xelim nele para você”. E ele foi apressado atrás de Nell.

Ela estava de pé na varanda da entrada da igreja, olhando fixamente para uma cesta

de legumes que estava lá.

"O que é isto?", Harry perguntou a ela.

Ela girou o rosto radiante para ele. "É uma cesta”.

Ele franziu o cenho e agitou a cabeça, confuso.

"Pessoas deixam coisas na porta da entrada de igrejas, coisas em cestas”, ela disse

excitadamente. "Bebês. Eles deixam bebês. Quantas vezes você ouviu falar de bebês sendo

deixados nos degraus de uma igreja?".

Praticamente nunca, Harry pensou. Era muito comum na Espanha, ele sabia, mas

eram conventos e as freiras ficavam com as crianças. Os vigários ingleses pareciam muito

menos prováveis de fazer isso na opinião dele.

"Nós nunca pensamos em verificar as igrejas reais”.

O coração de Harry afundou. Outra receita para lentamente ter o coração partido, ele

pensou. Era agonizante o suficiente assisti-la se matar lentamente com preocupação e saber

que não havia nada que ele pudesse fazer para impedir isto.

"E essa é São Stephen”, ela disse febrilmente.

Ele deu seu um olhar em branco.

"O segundo nome de meu pai era Stephen. Poderia ser um presságio. Ele acreditava

em presságios. Nós temos que perguntar”, ela disse e foi circundando-a em direção aos

fundos até a casa do vigário.

Harry a seguiu. Ela estava se agarrando a migalhas.

Era uma casa pequena, com um jardim limpo, bem tratado, nu agora na estação fria.

O metal da aldrava cintilava com cera. Nell a puxou, movendo impacientemente os pés

enquanto o som musical enchia o ar.

Uma mulher de meia-idade com cabelo cinza respondeu. "Sim?".

"Alguém deixou um bebê aqui?", Nell revelou sem preâmbulo. "Sete semanas atrás,

um bebê em uma cesta?".

A mulher franziu o cenho. "Sete semanas? Não achava que fazia tanto tempo assim”.

Page 160: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Nell empalideceu e cambaleou. Ela embreou os braços na mulher com um aperto

convulsivo. "Você quer dizer que havia um bebê?".

A mulher anuiu com a cabeça, claramente andando para trás com a intensidade dos

olhos selvagens de Nell. "Uma pequena menina, coitadinha”.

"Onde ela está agora?", Nell exigiu, arquejando.

A mulher apontou e, quase sem olhar, Harry soube onde.

"Onde? Qual casa?", Nell insistiu andando nas pontas dos pés, perscrutando

avidamente nas casas ao longe.

Harry tomou o braço dela. "No jardim, Nell”, ele disse tranquilamente.

Ela franziu o cenho, perplexa, sem entender. "O jardim. Quem vive em um jardim?", e

então ela soube. "Nãããoooo”, ela lamentou, voltando-se para a mulher. "Não pode ser. Ela

está viva, diga-me que ela está viva”.

Os olhos da mulher se encheram com lágrimas de simpatia. "Eu sinto muito, moça.

Ninguém sabia que ela existia, entende? O vigário tinha saído para Londres pela noite e eu

estava na casa da minha irmã, então não havia ninguém para ouvir a pobre pequena

criatura chorando”.

Nell deu um soluço sufocado.

A mulher continuou, "era uma noite amarga e congelante, tinha matado as minhas

últimas flores. O bebê, também. Ela estava morta quando nós a achamos pela manhã.

Parecia tão bonita, como um anjo congelado em sua cesta forrada de cetim”.

"Forrada de c-cetim…", Nell desfaleceu. Harry a pegou antes que ela caísse.

Recusando todas as ofertas de ajuda da mulher, ele levou Nell de volta para o curricle. Ela

não estava doente, apenas com o coração partido.

Ela soluçou a maior parte do caminho para casa, não era um choro normal, mas um

terrível soluçar que parecia rasgar seu corpo.

Harry a segurou firme contra seu coração. Cada soluço convulsivo que vibrava pelo

corpo dela era como um corte no corpo dele. Se apenas ele pudesse ter feito isso terminar

de outro modo. Ele a segurou e suavemente a balançou, odiando-se por ser tão

malditamente impotente. Ele estava furioso. Ele precisava esmurrar alguém.

Ele voltaria. Ele faria algo sobre o sepulcro, mas no momento, tudo o que ele queria

era matar. Ele nunca tinha conhecido tal raiva.

A vingança é minha, juro pelo Senhor, mas Harry queimava para vingar o dano que

havia sido feito a ela. Ele não tinha ninguém para esmurrar. Ainda. E quando ele achasse o

porco, seria muito mais do que um soco, com certeza.

Enquanto isso, ele tinha uma mulher preciosa e arrasada para cuidar.

Ele a levou para casa, suavemente a despiu até sua camisa longa, e a colocou na cama.

"Eu quero ficar com você”, ele disse a ela e esperou. Ele não forçaria sua presença a ela.

"Fique”, ela disse em um sussurro por um fio.

Graças a Deus. Ele não sabia como iria deixá-la se ela quisesse ficar só. Ele depressa se

despiu e subiu na cama com ela. Ela estava estremecendo. Ela o agarrou imediatamente e

se apertou contra ele como se não pudesse ficar perto o suficiente. "Não me deixe”, ela

sussurrou.

Page 161: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Algo se partiu fundo dentro dele. "Nunca”, ele falou com a voz baixa. Em seu pesar

ela girou para ele. Ela precisava dele. E ele não tinha nenhuma maldita utilidade para ela,

mas ela ainda o queria.

Por muito tempo eles se deitaram calados e juntos. Eventualmente ela parou de

estremecer. Ele pensou que ela tinha adormecido quando ela disse de repente, "eu fico

pensando nela, chorando e sem ninguém para ouvir. Que jeito horrível e doloroso para

m—"

"Não”. Ele a cortou. "Não teria sido nada doloroso”.

Ela foi para trás. Os olhos cor de âmbar inchados e fixos nele com intensidade

dolorosa. "Como você poderia saber?".

Ele sabia sobre todos os tipos de mortes. Os soldados sabiam. Mas ele não disse isto a

ela. "Na guerra em Pyrenees uma vez, houve um temporal inesperado. Mais tarde, nós

achamos alguns corpos. Soldados. Eles tinham caído em um fosso estreito e congelado até

a morte”.

Ela estremeceu. Ele a puxou para mais perto e continuou em voz baixa. "Eles ficaram

um sobre o outro. O homem na parte inferior da pilha estava vivo, mas meio congelado.

Ele me disse mais tarde que em toda aquela neve, eles adormeceram lentamente. Ninguém

gritou. Não houvera nenhuma dor, ele disse. Nos pés, era o mais doloroso, ele me disse,

era quando o corpo voltando à vida. Excruciante foi a palavra que ele usou. Mas congelar

lentamente na neve era pacífico e quieto”.

Ela deu um suspiro longo, aos arrancos e baixo contra seu tórax. Ele sentiu as

lágrimas dela em sua pele, mas ela não fez nenhum som. Ele a envolveu nos braços e a

embalou contra ele até que ela finalmente dormiu.

Ela não moveu um músculo a noite toda. O sonambulismo tinha acabado. A procura

estava terminada.

Nell passou o dia seguinte na cama, no quarto escuro, lamentando. Ela enviou Harry

para longe pela manhã, dizendo que estava com enxaqueca. Ela não podia enfrentar o

mundo. Não ainda. A dor pela perda de Torie era muito intensa.

Naquela noite ela tinha feito amor amargo e mudo com Harry e adormeceu depois

quase que imediatamente.

Na manhã seguinte ela fingiu que estava dormindo até que Harry partiu. Como ela

iria enfrentá-lo pelo resto de sua vida? Ela pensou desesperadoramente e puxou as

cobertas sobre a cabeça.

A resposta veio para ela de Aggie, do tempo terrível depois que a mãe dela tinha

morrido. "Uma coisa de cada vez, querida. Um passo de cada vez. Quem está vivo deve

isto para quem morreu; você deve isto pela vida de sua mãe. Você sabe que ela gostaria

que fosse assim”.

A memória dessas palavras tinha dado força para Nell antes, depois que o pai dela

tinha morrido e quando ela tinha começado a procurar Torie pela primeira vez. E mais

tarde, quando ela caminhara, derrotada e exausta de Londres até Firmin Court. Um passo

de cada vez. E mais tarde, quando ela tinha descoberto que o pai tinha perdido tudo e ela

Page 162: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

não tinha nem casa, dinheiro ou família, ela tinha conseguido continuar, um dia de cada

vez.

Não mais. Ela não podia enfrentar outro dia. Ela não conseguia mais. Era tudo muito

doloroso.

Ela rolou e enterrou o rosto no travesseiro. E sentiu o cheiro familiar de seu querido

Harry. Ela ficou deitada lá durante algum tempo, respirando o cheiro dele, pensando em

tudo que ele era para ela, tudo o que ele tinha dado a ela, tudo o que ele era que fazia a

vida dela ainda ter valor de viver. Fazendo-a juntar suas forças novamente para continuar.

Ela não devia a ele apenas continuar a viver, ela deveria permanecer viva. Por Harry.

Porque ela o amava.

Ela tocou o sino para chamar Cooper e abriu as cortinas, deixando a luz fria do dia

entrar no quarto.

Ela tinha promessas a manter.

Enquanto ela descia, ouviu sons de uma discussão vindo da sala de visitas.

"Nós não vamos fazer isso lá!", Harry rosnou quando Nell alcançava a porta.

"Se você não fosse tão teimoso veria que é perfeito—", Lady Gosforth cessou

bruscamente quando Nell entrou no cômodo. Lady Gosforth se apressou para abraçá-la.

"Minha menina muito querida, estou tão contente por você ter decidido se juntar a nós. Eu

sinto muito, muito mesmo pela sua pequena. Como você está se sentindo?".

"Você está bem?", Harry pairou ao lado dela protetoramente.

Ela sorriu e anuiu com a cabeça. "Sobre o que vocês estavam discutindo?".

"Nada”, Harry disse imediatamente.

Ela arqueou sua sobrancelha para ele, então girou para sua tia.

"Sobre onde será o casamento”, Lady Gosforth disse. "Mas talvez você queira adiá-

lo”.

Nell agitou a cabeça. "Não. Não há razão para adiá-lo. Qual era a discordância?".

Lady Gosforth acenou com a mão. "Oh, eu organizei tudo, e agora ele quer destruir

todos os meus acordos”.

"Por quê?", Nell perguntou.

"Porque nós não vamos casar em Alverleigh”, Harry rosnou, encarando a tia.

"O que é Alverleigh?", Nell olhou para Harry.

"A casa da família”, Lady Gosforth respondeu.

"A toca do meu meio irmão”, Harry disse ao mesmo tempo.

Lady Gosforth deu uma olhada para Nell. "Por favor, não entenda errado, minha

querida, mas você deve reconhecer que haverá falatório, pelo modo como Harry a

sequestrou em Bath. Se vocês se casaram em Alverleigh, será um sinal claro para o mundo

que ambos têm o suporte do Conde de Alverleigh e do resto da família. Então não haverá

nenhuma migalha para ser usada como base para um escândalo mais tarde”.

"É a casa da família Renfrew”, Harry disse. "Não é a minha família. Eu sou um

Morant, lembra?".

Lady Gosforth fez uma onda no ar. "Hah, só porque sua mãe se casou com um

Morant, não te faz um. Com esse rosto, você é totalmente um Renfrew”.

Page 163: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Harry fez uma carranca para ela e ela acrescentou, "além disso, espero que não negue

Gabriel como um parente”.

"Claro que não”.

"Bem, Gabriel vai passar o Natal em Alverleigh com sua esposa, a Princesa Caroline”.

"O quê?", ele pareceu surpreso. "O Natal todo? Eu pensei que ele passaria conosco”.

"Ele vai. Todos nós fomos convidados. A família inteira”, a tia deu ênfase à palavra

"inteira”.

Harry não pareceu muito contente. "Quando isto foi organizado?".

Lady Gosforth acenou vagamente com uma mão. "Há tempos. Creio que Nash

organizou quando estava na Áustria. Ele passou por Zindaria e por todos os intentos e

propósitos ficou famoso com todo mundo lá”. Ela deu a Harry um olhar estreito. "Mas

Nash tem modos encantadores”.

Ele grunhiu. "Nash é um diplomata. Ser encantador é seu negócio”.

"E ser como uma mula é o seu”, a tia amorosa disse docemente.

Os lábios dele se contraíram. "Eu posso tolerar compartilhar uma mesa com Nash se

tiver que fazer, mas não com Marcus”.

"Marcus?", Nell perguntou.

"O Conde de Alverleigh, o cabeça da família e irmão mais velho de Harry”, Lady

Gosforth explicou.

"Meio irmão”, Harry retrucou. "E ele não me reconhece”.

"Ele reconhece agora”, Lady Gosforth replicou. "Ele reconhece desde que recebeu o

título. É você quem não o reconhece”. Ela bufou delicadamente. "Essa cabeça dura sua é

puro Renfrew, também”.

"Ele é um valentão de coração gelado, como o pai dele”.

"O pai dele", Nell notou, e não "nosso pai”.

"Ele logo será o cunhado de Nell. Estou certo de que neste momento será um conforto

para Nell saber que tem uma família inteira, pronta e disposta a lhe dar boas-vindas em

seus corações”, Lady Gosforth acrescentou intencionalmente.

Harry deu a ela um olhar brilhante. "Como você sabe que eles vão querer dar as boas-

vindas a ela?", ele perguntou com voz mais aprazível.

"Porque Marcus me disse quando se ofereceu para que o casamento fosse lá na capela

da família Alverleigh”.

Harry franziu o cenho. "Por que lá? Por que não em Londres?".

"Porque apesar de suas cores, Nell ainda está em luto pelo pai, e agora, claro, pela

pequena Torie”.

Os olhos de Nell inundaram. Ela se virou, apertando os lábios que tremiam juntos até

que ela tivesse controle sobre eles novamente. Harry pôs o braço ao redor dela como

suporte imediato. Nell anuiu com a cabeça agradecendo e foi para longe. Ela tinha que

aprender a se cuidar sozinha. Ela não podia ficar para sempre caindo e esperando que ele a

erguesse.

"Então não seria apropriado que ela se casasse em St. George, Hanover Square”, Lady

Gosforth continuou mais tranquilamente.

"A igreja da aldeia dela seria mais apropriado”, Harry disse firmemente.

Page 164: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Por um momento, Nell ficou tentada. Ir para casa em Firmin Court e se casar na igreja

onde tinha sido batizada… Ver os bancos da igreja cheios com todos os rostos queridos e

familiares da aldeia onde ela crescera—todos viriam para vê-la casar, ela sabia.

Mas ela planejara batizar Torie lá, no manancial de pedra antiga onde Nell tinha sido

batizada, a mãe de Nell, e sua avó, e quem sabe quantas gerações antes de ela ter sido

batizada. De alguma maneira, ela ainda não poderia enfrentar o manancial, não depois de

ter perdido Torie.

Lady Gosforth claramente estava tentando reconciliar os meio-irmãos separados.

Harry estava defensivo e hostil sobre os dois irmãos mais velhos. Nell não entendia o

porquê, e não queria interferir.

Mas ela sabia como era não ter família nenhuma.

"Eu gostaria de me casar em Alverleigh, se você não se importar”, ela disse a Harry.

"Por que você gostaria?", Harry exigiu. "Você não conhece nenhum deles”.

"Não, mas gostaria de conhecer”, ela disse simplesmente. "Eu não tenho nenhuma

família e gostaria de conhecer a sua. A não ser que você não queira que eles me conheçam,

claro”.

Harry olhou fixamente para ela. "Nada do tipo. Eles seriam privilegiados de conhecê-

la. Não é por isto, é que—oh, espere, Nell, você realmente quer ir lá?".

"Não se você não quiser”. Ela esperou.

Ele ergueu as mãos. "Então nós nos casaremos em Alverleigh, mas não me culpe se

você odiar aquilo lá”. Ele olhou para a tia, cujos olhos estavam cintilando com diversão. "E

não me culpe se eu socar o rosto de Marcus”.

"Não, meu menino querido, nós não iremos; nós provavelmente ficaríamos deliciadas

se você fizesse”, Lady Gosforth disse.

"O quê?", Nell e Harry disseram com surpresa.

Ela encolheu os ombros. "Os homens sempre começam se esmurrando e então

acabam como melhores amigos. Nell, no dia em que Harry e Gabriel se encontraram, eles

eram menininhos ainda, e de acordo com a minha tia eles tentaram um matar o outro—e

dali em diante ficaram inseparáveis”.

Ela sorriu para Harry, "então se você começar uma briga com Marcus, nós saberemos

que no seu peculiar modo masculino você estará apenas tentando ser amigo dele, não é,

Nell querida?".

Harry pareceu tão intimidado com esta visão das coisas que Nell foi forçada a fechar

os lábios e olhar para o chão com medo de sorrir. Ela não confiava que conseguiria

encontrar os olhos de Lady Gosforth.

Lady Gosforth continuou, "agora corra Harry, agora que Nell está de pé, quero

conversar com ela sobre o enxoval. Você faça algo sobre si mesmo”.

Harry deu a tia um olhar estreito. Ele estava bem ciente da tática de sua tia, Nell

decidiu.

Lady Gosforth acrescentou, "e veja se consegue algo decente para vestir em vez

daquele casaco velho. Leve Rafael com você. Aquele menino é elegante até as pontas dos

dedos; ele poderá te aconselhar. E contrate um camareiro enquanto você estiver fazendo

isso; os céus sabem como você precisa de um”.

Page 165: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Sim, General Gosforth”, Harry disse secamente. Ele girou para Nell. "Ela é uma velha

e artificiosa harpia, então não a deixe te conduzir”.

"O que você quer dizer com velha?", a tia disse indignada.

Harry piscou para Nell. "Você não tem que fazer isto, sabe”, ele disse com a voz baixa.

Ela deu a ele um sorriso nublado. "Eu sei, mas eu quero”. E para sua própria surpresa,

ela queria.

No momento em que Harry deixou o cômodo, Lady Gosforth abraçou Nell. "Estou

tão orgulhosa de você, minha querida”.

Nell estava perplexa. "Por quê?".

Ela gesticulou para que Nell se sentasse com ela no sofá. "Pelo modo como você lidou

com Harry agora mesmo. Foi perfeito. E fico enormemente agradecida. Ele precisa de sua

família, mas negaria isto até o último suspiro. As ações de meu irmão conseguiram a

destruição emocional entre seus filhos, e agora ele se foi, é meu desejo mais forte é ver toda

a família em paz novamente. Seu casamento pode ser o início desse processo”.

"Então eu fico contente por isto”.

A mulher mais velha abraçou-a novamente e disse com uma voz diferente, "E eu me

orgulho por você ter se levantado e continuado, apesar de que eu sei o quão duro está

sendo para você, minha querida”.

Nell olhou para ela e seus olhos se encheram com lágrimas novamente. "Não é?", ela

disse tolamente.

"Eu enterrei quatro bebês na minha mocidade, quatro meninos lindos”, Lady

Gosforth disse com uma voz baixa. "Nenhum deles viveu até seu primeiro aniversário”.

Oh, Deus. Nell se virou, lágrimas escorrendo. "Tão jovens?", ela não conseguia

imaginar. "Eu sinto muito”.

Lady Gosforth anuiu com a cabeça, os próprios olhos molhados. "Meus minúsculos

queridos. Até hoje eu não consigo ouvir um bebê chorar sem pensar deles”.

"Como você conseguiu seguir?".

A senhora idosa gesticulou, um eco pungente da sua vivacidade habitual. "Mantendo-

me ocupada, como você e eu faremos nos próximos dias. Agradeça a Deus pelas compras,

não é, minha querida? E ajustes, visitas e qualquer outra coisa que você possa fazer.

Mantenha-se ocupada. É tudo o que você pode fazer. Não se deve ceder ao desespero”. Ela

se ergueu do sofá.

De repente Nell entendeu muito melhor a relação de Lady Gosforth com Harry e seus

irmãos. E mesmo seus amigos. Não era nenhuma maravilha que ela quisesse os quatro

irmãos reconciliados como uma família novamente. A família dela.

"Agora, eu sei que você não está apaixonada pelo meu sobrinho—"

"Mas eu estou”, Nell interrompeu.

"O quê?".

"Eu o amo muito. Com todo o meu coração”, Nell disse a ela. "Eu tenho desde o

início, acho, mas tudo aconteceu tão rápido que eu não estava certa”. Ela fez um gesto

impotente. "Não vejo como alguém não poderia amá-lo”.

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Lady Gosforth se sentou novamente com um baque. "Oh, minha querida, você não

sabe como isso me deixa contente. Ele não sabe, claro”.

"Ele deve saber”. Ela já tinha mostrado para ele tão claramente quanto podia.

Lady Gosforth agitou a cabeça. "Harry não acredita que seja merecedor do amor.

Nunca. E agora que ele falhou com você—"

Nell olhava para ela fixamente. "Falhou comigo? Como ele pode pensar isso depois de

tudo que já fez?".

Lady Gosforth deu de ombros. "É o que ele pensa. Por quê? Ele é um homem. Eles

pensam diferentemente de nós”.

Nell pensou sobre isto. Ela nunca tinha dito a ele que o amava, mas havia razões para

isto. "Ele disse no princípio que não queria esse tipo de coisa de mim”. E ela tinha usado

isto como uma desculpa para não dizer desde então, ela percebeu.

Lady Gosforth bufou. "Um Renfrew cabeça dura até o caroço. O que ele quer dizer é

que não vai deixar ninguém se aproximar o suficiente no caso de que ele seja rejeitado ou

abandonado”.

"Entendo”, Nell disse devagar. Sim, claro. Ela tinha estado tão perdida em sua

própria miséria e solidão por todo o tempo, que não poderia ver a dele. Ela abraçou Lady

Gosforth firmemente.

"Por que isso, minha querida?".

"Harry é tão sortudo por ter você, Lady Gosforth”, Nell disse. "Todos eles são. Todos

nós somos”.

"Oh, ora, ora, minha querida”, ela disse, claramente encantada. Com uma reassunção

de sua maneira habitual, ela acrescentou decisivamente, "e está na hora de você começa a

me chamar de Tia Maude. Agora nós vamos começar com o enxoval”.

Nell estava quase tentada a chamá-la de General Gosforth, como Harry tinha, mas

tudo o que ela disse foi, "Sim, Tia Maude”.

Os próximos dias passaram em um frenesi de compras. Nell teve pouquíssimo tempo

para si mesma, e mesmo o pesar sendo sempre uma parte dela, como um buraco enorme

aberto em seu peito, ela estava agradecida pela distração.

Lady Gosforth estava certa. Se manter ocupada ajudava.

Elas visitaram tantas lojas que sua cabeça estava em um redemoinho; Modistas de

chapéus, fabricantes de luva, vendedores de armarinho, joalheiros, e fabricantes de

perfumes. Nell se familiarizou com lugares como a Bond Street24 e o Bazar do Pantheon25

onde ela ficou quase tentada a comprar um papagaio colorido, assim como um xale verde

adorável.

E o tempo toda ela aprendeu coisas sobre si mesma que nunca conhecera antes.

24 Bond Street - é a maior rua de compras em Londres. Fica no distrito de Mayfair, e foi uma rua na moda para se fazer

compras desde o século 18.

25 Pantheon - lugar do entretenimento público no lado sul da Rua Oxford em Londres, Inglaterra. Foi projetado por James Wyatt

e inaugurado em 1772.

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Lady Gosforth tinha sido muito direta: "damas como você e eu, Nell, nunca seremos

bonitas, mas podemos ser elegantes, o que é muito mais útil. A beleza enfraquece depois

de alguns anos, mas a elegância só aumenta com a idade”.

Nell fora atingida por sua sabedoria. Era verdade. Lady Gosforth, com seu rosto

longo e nariz romano, não era o que as pessoas chamavam de bonita, mas era

imensamente elegante e, apesar de sua idade, ainda muito notável.

E o melhor sobre isso era que, diferentemente, das características com as quais a

pessoa nasce, a elegância era algo que se pode controlar. Ela resolveu se tornar elegante.

No fabricante de mantua Nell aprendeu sobre as linhas simples e as cores suaves que

a deixavam melhor. Ela estava pasma com a diferença na própria aparência que algumas

cores faziam. Todas as roupas que ela usava eram marrom escuro por razões práticas e

isso a fazia parecer pálida. Mas um ouro leve, ou a sombra de um pêssego faziam-na ficar

muito diferente, e verdes suaves realmente combinavam com ela.

Ela aprendeu a ser corajosa. Depois do desastre de seu debute, quando os gostos

discretos dela tinham sido desprezados e ela tinha sido vestida com coisas espalhafatosas,

com vestidos em cores brancas ou brilhantes "para garotas”, e ela perdeu toda a confiança.

Dessa vez as roupas também tinham sido escolhidas por alguém diferente de Nell,

mas oh, que diferença. Cooper deixara-a orgulhosa, ela percebeu, assim como Bragge e

Lady Gosforth. Não havia nada que ela não gostasse— nada! E algumas roupas ela

realmente amava.

Enquanto ela colocava o vestido após alguns ajustes, ela lentamente percebeu que

estava certa, então; o estilo simples sempre se adaptaria melhor a ela, as cores suaves que

ela preferia também eram as melhores.

No modista de chapéus, ela experimentou dúzias de chapéus, Nell aprendeu através

de Lady Gosforth, Bragge, Cooper e o modista de chapéus que ela tinha um bom rosto

para usar chapéus. Ela nunca soubera isto antes.

Todos foram ao alfaiate onde duas roupas de equitação tinham sido encomendados.

A primeira tinha sido feita em tecido amarelo colorido com azul e passamanaria de ouro.

Era bonito e se justava perfeitamente a ela. A segunda Lady Gosforth tinha deixado que

Nell escolhesse o tecido. Ela olhou para todas as seleções, os olhos indo automaticamente

para os tecidos marrons e os escuros. E então ela viu um tecido purpúreo e sua respiração

prendeu.

Corajosa, ela pensou. "Quero esse”, ela disse.

Houve um pequeno silêncio. O alfaiate, Lady Gosforth e Bragge trocaram olhares.

Cooper, franzindo pensativamente, ergueu o tecido e o colocou ao redor de Nell. "O

que vocês acham?".

O público olhou fixamente. "Excelente escolha”, Lady Gosforth disse após um

momento. "Eu nunca teria pensado nessa cor para você, mas é perfeito. Você fará moda. Os

revestimentos cor de creme acho—"

"O amarelo mais pálido”, Cooper interrompeu e então empalideceu com sua própria

temeridade.

Lady Gosforth estreitou os olhos. " O amarelo mais pálido, sim. Escolha corajosa

novamente. E um chapéu para combinar, com uma pena de tom amarelo pálido”. Ela

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olhou fixamente para Cooper através de seu nariz longo e deu um aceno com a cabeça.

"Você tem talento para isso, menina. Muito bem. Entre nós faremos minha sobrinha se

tornar uma referência em estilo”.

Cooper corou e tentou não irradiar com prazer.

As palavras de Lady Gosforth aqueceram Nell, também. Não apenas a ideia

surpreendente de que ela se tornasse uma referência em estilo, mas as palavras mais

preciosas, minha sobrinha.

Era mais um pequeno passo, mais um pequeno degrau para o futuro.

Um dia e um passo de cada vez e ela estava seguindo. Ela estava em uma batalha. De

dia—a maior parte do tempo—ela estava bem; à noite era o problema.

Eles faziam amor todas as noites agora. Ela almejava o êxtase, a intimidade e o

temporário esquecimento de tudo. Ela normalmente adormecia imediatamente.

Eram as horas desertas antes do amanhecer que a assombravam, quando ela estava

deitada alerta nos braços de Harry enquanto ele dormia.

Ela pensaria sobre o dia que viria ou sobre o que tinha passado, sobre montar no

parque com Harry, Rafe e Luke, ou sobre os papagaios e os macacos no Bazar do

Pantheon, ou como ela aprendera a colocar o chapéu de forma a fazer o melhor efeito, e

então de repente o buraco dentro dela se abria novamente, quando ela se lembrava de que

nunca chegaria a fazer nenhuma destas coisas com sua filha, com Torie.

Então ela chorava, silenciosamente na escuridão, para não despertar Harry.

Um dia, uma noite de cada vez.

Capítulo XV.

Todas as noites quando ela fazia amor com Harry, Nell pensava no que Lady

Gosforth—ela ainda achava difícil pensar nela como Tia Maude—dissera a ela: Harry não

acredita que seja merecedor do amor. Nunca achou.

Se ele ainda não soubesse que ela o amava, havia apenas uma coisa a se fazer: ela teria

que dizer a ele. A dificuldade é que ela era muito covarde para fazer isto.

E se Lady Gosforth estivesse errada? E se ele tivesse dito exatamente o que pensava

ao dizer que não queria o amor dela?

E se ela abrisse seu coração para ele e ele ficasse envergonhado? Ela morreria de

mortificação.

Ou se ele olhasse para ela desconfortável, como os homens faziam e mudasse de

assunto?

A pior e a mais provável das possibilidades era que ele seria gentil sobre isto. Ela não

poderia aguentar se ele fosse amável e compreensivo, como se ela se tivesse feito

completamente de tola e ele não se importasse. Porque ele era amável.

Todas as noites ela ficava nervosa para dizer a ele e todas as noites ela tomava a saída

covarde, não dizendo nada.

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Harry olhou sobre sua carta para Ethan. Ele lembrou a Ethan que descobrisse o nome

da visita que tinha aborrecido as empregadas. Ele ainda não tinha recebido a resposta. Ele

tinha dito a Ethan que seu casamento seria em Alverleigh e que Gabe, a princesa, Tibby e

os meninos já estavam lá e que se—quando Ethan descobrisse o nome dele, ele deveria

enviar a carta para Alverleigh. Ele tinha sublinhado isto.

Havia também uma lista considerável de coisas a serem feitas. Ethan provavelmente

gostaria de atirar nele quando a lesse. Ele tinha feito a barganha pelos cavalos, e não por

todo esse trabalho.

Mas um homem só se casava uma vez.

Ele acrescentou um pós-escrito lembrando Ethan de que teria que ir para Alverleigh

em mais dois dias.

Ele também escreveu para os Barrows, convidando-os para irem a Alverleigh para

seu casamento. E se o conde não gostasse, ele poderia lidar com isto. O Sr. e a Sra. Barrow

eram mais família para Harry do que qualquer homem de sangue frio, muito mais do que

um conde de sangue azul.

De manhã eles partiriam para Alverleigh. Hoje à noite tinha que ser a noite, Nell disse

a si mesma. Não haveria outra oportunidade como essa. Quem sabe como poderia ser em

Alverleigh? Ela mal poderia vê-lo. Ela tinha que reunir sua coragem, ir direto ao ponto e

dizer a ele. E mostrar também. Em mais de um modo.

Ela nunca tinha tirado a camisola antes, e ele nunca tinha pedido. Ele a acariciava

através dela e deslizava até acima de seus quadris, mas ela tinha ficado muito tímida sobre

ficar completamente nua com ele, e—novamente—tinha pegado a saída covarde.

Hoje à noite ela deixaria de ser covarde. Hoje à noite ela se despiria para Harry

Morant, de corpo e alma.

Depois do jantar ela ordenou que um banho fosse colocado em frente à lareira em sua

alcova. Enquanto os criados traziam baldes de água quente para os degraus acima e

Cooper colocava bastante óleo de rosas na água, Nell colocou velas em torno do quarto.

Ela pediu que um criado fosse buscar uma tela e a colocou em frente ao banho.

Quando os criados todos tinham partido, Cooper ajudou Nell a se despir.

"Obrigada, Cooper”, ela disse enquanto entrava no banho. "Por favor, apague as

luminárias antes de partir, e então diga ao Sr. Harry que eu gostaria de falar com ele”.

Os olhos de Cooper se arregalaram mas ela tinha sido muito bem treinada e não fez

nenhum sinal externo. Ela sabia, claro, que Harry dormia com Nell todas as noites—que

Nell imaginava que a casa inteira sabia, mas todo mundo fingia não notar. Havia, afinal,

um casamento para menos de uma semana.

Nell afundou na água quente e esperou.

Harry bateu na porta da alcova de Nell e, ouvindo a resposta dela, ele entrou. Não

havia nenhum sinal de Nell. Ele franziu o cenho para o quarto escuro, iluminado apenas

por talvez uma dúzia de velas. As luminárias não estavam funcionando? Esse era o

problema? Então por que mandou buscá-lo e não um criado?

Então ele ouviu um barulho de água e notou a tela. A boca dele secou. Aquela

fantasia que ele tinha de ajudá-la no banho não tinha enfraquecido. Ele se forçou a

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esquecer isso novamente. Ela era uma mulher muito modesta. Tal ideia sem dúvida a

chocaria.

"Nell? Você quer algo?", o que era esse cheiro? Rosas? Em dezembro?

"Sim”. Mais barulho na água. "Você poderia vir aqui por um momento, por favor?".

O coração de Harry começou a trovejar. Ele andou em torno da tela e parou. Toda

coerência foi drenada de sua mente. Ele apenas podia olhar. Ela era tão incrivelmente

linda.

Em um semicírculo de luz de vela ela estava sentada no banho, corada, nua, a pele

toda cor de pêssego e ouro, suave e molhada. Os cabelos estavam presos no alto, mechas

úmidas se agarravam em suas têmporas e pescoço. Os seios cheios e cremosos não estavam

totalmente submersos, os mamilos de um rosa escuro suave na água morna. Sob o olhar

dele ficaram firmes, os bicos intumescidos.

As pernas eram longas, os joelhos flutuando como ilhas na fragrante água do banho.

Pelo ondular da água ele podia ver o v cor de ouro escuro onde as coxas dela se

encontravam com a base de sua barriga.

Com alguma dificuldade ele conseguiu dizer, "O que você quer?", e terminou em um

coaxar. Tudo o que ele podia pensar era no que ele queria.

Ela tirou uma esponja da água e lentamente a ensaboou. Ele assistiu hipnotizado

quando os seios dela balançavam a cada movimento. Ela ofereceu a esponja para ele e ele

estendeu a mão cegamente, mas no último instante ela a puxou para trás.

"Talvez você deva tirar seu casaco”, ela sugeriu.

Ele o arrancou depressa e jogou-o em uma cadeira próxima.

Ela deu a ele um olhar especulativo. "E talvez a camisa, também. Você não vai querer

que ela fique toda molhada, não é?", os olhos dela cintilavam.

E o cérebro dele começou a trabalhar novamente. Sua modesta e pequena Nell estava

fazendo isso tudo para seduzi-lo, como uma sereia. Cada gota de sangue nele aceitava o

desafio: quem seduziria quem?

Ele deu a ela seu sorriso lento. "Uma camisa molhada? Nem pense nisso”. Ele desatou

o pano do pescoço, lançou-o sobre o casaco e tirou a camisa.

Os olhos de xerez colorido o inspecionaram com profunda aprovação feminina.

"Agora, dê-me aquela esponja”. Tomando-a, ele foi para trás dela. Senhor, ela era

igualmente bonita de costas. Ele se agachou e começou a esfregar as costas, roçando firme,

com movimentos circulares, então de cima a baixo todo o comprimento de sua coluna.

"Sabão”. Ela passou o sabão para trás e ele ensaboou as duas mãos e massageou o

pescoço dela e ombros até que ela estava quase ronronando e se arqueando contra ele

como um gato.

"Erga os braços”, ele murmurou, a centímetros de sua boca e orelha, e quando ela o

fez, ele deslizou as mãos lentamente ao redor das costelas e ensaboou seu estômago. O

tórax dele estava apertado contra as costas dela. A respiração dela arfava todas as vezes

que os antebraços e os lados das mãos dele roçavam pelas laterais dos seios dela mas ele

não fez nenhum movimento para tocar neles. A princípio.

Page 171: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ele esperou até que ela estivesse se arqueando e retorcendo sutilmente contra ele, e

quando ele finalmente os tomou com firmeza, pegando os mamilos entre as pontas dos

dedos, ela gemeu e teve um clímax imediato.

Ela tentou sair então, mas ele apertou as costas dela na água.

"Não ainda”.

Ele se moveu ao redor dela indo para a frente do banho, encarando-a.

"Dê-me seu pé”, ele disse.

"Mas eu quero —"

"Pé”. Ele ofereceu a mão.

Com um toque sutil ela esticou o pé na água, espirrando nele deliberadamente.

"Desculpe”, ela disse sem realmente ter a intenção enquanto inspecionava a gota de água

na virilha dele. Ela sorriu amplamente e espirrou novamente. "Ops”.

O sorriso dela desapareceu quando ele ergueu o pé dela até sua boca. "Harry. O que

raios está—ohhh”, ela ofegou quando ele chupou os dedos de seu pé. Eles enrolaram

contra a língua dele e ele chupou mais firme, correndo a língua ao longo da pele entre cada

dedo do pé. Ela tinha gosto de rosas.

Ele mordiscou, chupou e ao mesmo tempo começou a ensaboar as pernas, parando as

mãos entre as coxas. Elas estremeceram e se acalmaram e os dedos dele afundaram na

abertura suave dela, acariciando profunda e novamente, ela culminou em alguns

momentos.

Ele a tirou do banho, colocou uma toalha ao redor dela, e a levou para a cama, onde

ele a secou cuidadosamente e então prosseguiu fazendo amor com ela novamente. Ela

estava mais do que pronta para ele e quando o clímax e o êxtase rugiram por ele, ela o

alcançou, quebrando e mergulhado no esquecimento.

Ele não estava certo de quanto tempo havia passado quando ele ficou ciente de que

ela estava acordada contra ele. "Não deveria ter sido assim”, ela murmurou. "Eu iria

seduzir você”.

"Mas você me seduziu”, ele disse.

"Não, você assumiu o comando”. Ela suspirou contra o tórax dele. "Mas eu te amo de

qualquer maneira”.

Harry congelou. "O que você disse?", ele disse depois de um minuto.

Mas ela estava adormecida. Ele tentou dizer a si mesmo que tinha imaginado ou que

tinha ouvido errado. Mas ele tinha ouvido claro como o dia.

Ela não tinha dito com a intenção que ele imaginava que ela tinha, estava certo disso.

Era o tipo de coisa que pessoas diziam às vezes.

Era apenas que ninguém nunca havia dito isso a ele antes.

Será que ela realmente queria dizer isto, ou era simplesmente gratidão? Ele não

queria gratidão.

Ele não merecia gratidão—ele não tinha conseguido salvar o bebê dela. Ele nem tinha

se vingando de quem tinha feito mal a ela.

Ele não tinha o direito de amar.

Não ainda.

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Ele despertou sentindo dedos se movendo e a sensação de um corpo suave e delicioso

com cheiro de rosas e uma mulher doce e excitada… que tinha montado nele e os olhos

dele abriram de repente. E se fixaram em seus seios cremosos e sedosos.

"Você está acordado, Harry Morant?", ela disse a ele com uma voz estranhamente

determinada.

Ele tirou os olhos dos seios e examinou o rosto suave dela. "Estou acordado”.

Ela se ergueu sobre ele e lentamente o colocou dentro de seu corpo. "Você está me

escutando, Harry Morant?", ela disse ondeando seu corpo de um modo que o deixava

selvagem.

Ele gemeu com a sensação. Ela beliscou os mamilos dele e seus olhos se abriram de

repente novamente.

"Eu disse, você está me escutando?".

"Estou escutando”, ele conseguiu dizer. "Mas seria muito mais fácil me concentrar se

você parasse de fazer is—aahhh”.

"Pare de falar e me escute. Eu amo você, Harry Morant”.

Os olhos dele voaram até os dela.

"Eu amo você”, ela disse de novo, deliberadamente. O corpo dela começou a se mover

em um ritmo lento e todo o tempo em que se movia, ela dizia novamente: "Eu amo você,

eu amo você, eu amo você”.

Ainda se movendo, ela se curvou e deu vários beijos através do peito dele,

murmurando, "eu amo você”, entre cada um.

O peito dele parecia que tinha uma pedra em chamas. Ele não podia dizer uma

palavra.

"Eu amo você”. Ela o envolveu com os braços, e de repente ela se virou para o lado.

Eles rolaram, ainda juntos, e ele estava em cima. "Eu amo você”, ela repetiu, e o corpo dele

começou a investir, mais firme e mais firme, e com cada estocada ela dizia novamente, os

olhos de xerez claros nunca deixando os dele. "Eu amo você, Harry. Eu amo você”.

Uma onda escura de paixão o consumiu, levando-o mais e mais alto, a negação

batendo furiosamente nele, e ainda assim ele ouvia. "Eu amo você”.

E quando ele rugiu e o mundo inteiro se partiu, ele ouviu novamente, as palavras que

ele não conseguiria se cansar, mas não merecia: "eu amo você, Harry Morant”.

Harry tinha marcado hora para montar no parque com Rafe e Luke antes do café da

manhã. Ele desejou agora que não tivesse feito. Seu coração estava tão completo. Eu amo

você, Harry Morant.

O que um homem respondia a isso? Ele não tinha feito nada para merecer. Ela

provavelmente queria as mesmas palavras como resposta, mas ele não podia dizer a ela.

Não ainda.

Ele deslizou para fora da cama relutantemente e ela trouxe as cobertas sobre seu

corpo pequeno e sedoso. Ele andou pelo quarto e se trocou depressa para as suas roupas

de equitação.

Rafe e Luke estavam esperando no corredor. "Desculpe, estou atrasado”, Harry disse,

pegando o chapéu e o casaco.

Page 173: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Rafe fungou e franziu o cenho. "Isto é cheiro de rosas? Em dezembro?".

Luke cheirou e fez que não com a cabeça. "Não consigo cheirar nada”.

Rafe se debruçou em direção a Harry, cheirou novamente, e curvou uma sobrancelha.

"Mudou a água-de-colônia, menino querido?".

"Nem”. Harry entrou no casaco, ainda tentando lidar com as emoções confusas. Um

pensamento acima de todos. Nell o amava.

Ele se sentia tão desmerecedor do presente. Mas ele ganharia o direito, ele jurou. De

alguma maneira.

Rafe deu a ele um olhar pensativo. "Entendo”.

"A que hora você vai partir para Alverleigh?", Luke perguntou.

"A General organizou que a cavalgada parta as dez”, Harry disse. "Está certo de que

eu não posso persuadir vocês dois a virem conosco?".

"Em uma toca de Renfrews com amor fraterno tão grande? Não é provável”, Luke

disse a ele francamente.

"Sim”, Rafe arrastou a palavra. "Poupe-me dos encantos do reencontro de sua família,

menino querido. Eu já estive na guerra, lembre-se, e apesar de alguns bons momentos, eu

já tive o suficiente disto”.

"Você virá ao casamento”, Harry os lembrou.

"Claro. Não faltaria por nada nesse mundo”, Rafe disse.

"Oh, você ainda está aqui”, disse uma voz dos degraus. "Estou tão contente por não

ter me desencontrado de você”.

Harry girou e viu Nell saltando os degraus abaixo. Um bolo se formou em sua

garganta. Ela era tão bonita. Tão preciosa. Ele andou a passos largos na direção dela e

conseguiu não erguê-la e girá-la. Ele tomou sua mão e, olhando profundamente em seus

olhos gloriosos, beijou o centro de sua palma.

Os olhos cor de âmbar claro ardiam com carinho. "Eu amo você, Harry Morant”, ela

sussurrou.

"Você está linda”, ele disse com a voz rouca com emoção.

"Sim, minha nova roupa de equitação. Não é prático?", ela girou. "Tenho outra sendo

feita—espere até ver”.

"Eu gostei mais do que você estava usando ontem à noite”.

Ela corou brilhante e girou para saudar seus amigos.

"Agora eu consigo sentir o cheiro de rosas”, Luke disse.

"Meu óleo de banho”, ela confessou. "Não é delicioso?".

Rafe deu a Harry um olhar sabedor. "Delicioso”.

Harry tentou não sorrir.

Mais tarde no parque, ele assistiu Nell colocar seu cavalo no ritmo. "Ela é uma

amazona magnífica, você não acha?", ele disse para Rafe.

"Magnífica”, Rafe concordou, acrescentando, "você é um homem sortudo, Harry

Morant. Você e Gabe”.

Harry deu a ele um olhar interrogativo.

"Você dois acharam mulheres extraordinárias. Posso ver em seus olhos—primeiro

Gabe, agora você. Você dois tem o olhar de homens que amam e são amados”.

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Harry ficou surpreso pelo comentário. Rafe era sempre o frio; nada o afetava. Ele

nunca falava sobre tais coisas como sentimentos, muito menos amor.

Nem Harry. Não ainda. Seus olhos retornaram para Nell que estava levando o animal

de um meio-galope decoroso a um galope inteiramente impróprio. "Você achará um dia”,

era tudo o que ele podia dizer.

Rafe agitou a cabeça. "Não acontecerá. Meu destino está selado. Meu irmão escolheu a

égua de ninhada perfeita para mim, alguma herdeira horrível com antecedentes

excelentes”.

Harry deu a ele um olhar simpatizante. O irmão mais velho de Rafe. Lord Axebridge,

e sua esposa não tinham filhos, então era dever de Rafe agora casar e fornecer um

herdeiro. O próprio Lord Axebridge tinha ficado com a tarefa de achar a mãe do herdeiro

com entusiasmo, trazendo sua fascinação por criação de gado junto com sua paixão em

aumentar os cofres da família.

"Ela não pode ser tão ruim, não é?".

"Oh, ela tem boa aparência, garanto a você”, Rafe disse tristemente. "Mas ela ri como

um burro zurrando”.

"Você não pode sair disto?".

Rafe negou com a cabeça. "Eu tive um ano para apresentar alguém apropriado e

falhei. Haverá uma festa em Axebridge no ano novo. A menos que algo aconteça para

prevenir—um raio me atingir talvez—o noivado será anunciado na conclusão. Eu te digo,

Harry, há horas em que eu queria jogar meu dever de família pelos ares e fugir para o fim

do mundo”.

"Com quem eu me encontrarei em Alverleigh?", Nell perguntou a Harry.

Eles estavam viajando em outro chaise e Nell estava percebendo como era difícil

manter-se ocupada enquanto sentava em uma carruagem por horas e horas. Em todas as

igrejas que eles passavam, seus pensamentos iam para Torie…

"Até onde eu me preocupo, a pessoa mais importante é o meu irmão Gabe. Ele é o

melhor dos bons companheiros. Você gostará muito de Callie, sua esposa—Princesa

Caroline de Zindaria”, ele acrescentou como uma reflexão tardia.

"Eu nunca me encontrei com uma princesa”.

Harry apertou a mão dela. "Ela te dirá para chamá-la de Callie, como o resto de nós

faz. Há os meninos, Nicky—Príncipe Nikolai—e Jim, um menino pescador órfão que eles

cuidam como uma companhia para Nicky. E Tibby, Senhorita Tibthorpe que costumava

ser governanta de Callie. Você se lembra dela—é aquela que eu suspeito que Ethan está de

olho”.

"Oh sim. Quem mais?".

"Meu meio-irmão Nash, ele é o diplomata. Você provavelmente gostará dele. Ele tem

um modo encantador com as pessoas”, Harry disse sombriamente, com uma voz que

implicava "pessoas encantadoras" eram similares a ladrões de cegos.

Nell reprimiu um sorriso. Era claro que Harry gostava de Nash, mas desejava não

gostar. "E eu sei sobre Marcus, o conde”, ela disse. "Por que você o detesta tanto?".

Page 175: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Porque ele é um daqueles tipos frios, superiores, que olham para o resto do mundo

com desprezo”, ele disse sem vacilar. "Ele fez a minha vida a de Gabe um inferno durante

o pouco tempo em que nós estivermos na mesma escola. Ele é um bastardo desumano”.

Ele deu uma risada melancólica. "Ele e seus amigos conseguiram nos tirar daquela escola”.

"Eu pensei que você tivesse sido expulso por brigar”.

A cabeça dele virou rapidamente. "Como você soube disto?".

"Sua tia me disse”.

Ele grunhiu. "É bem verdade. Nós lutamos com Marcus. Ele e Nash com o resto de

seus amigos valentões esnobes. Você verá como ele é quando o encontrar. Você poderia

notá-lo em uma multidão—ele tem os olhos mais frios do mundo”.

"Então por que ele se ofereceria para hospedar o nosso casamento?".

Harry bufou. "Minha aposta é que ele foi encurralado pela nossa tia em comum. Uma

vez que aquela mulher coloca alguma coisa na cabeça, ela é como um tufão, varrendo tudo

ao passar”.

"Sim”, Nell disse, sorrindo. "E vocês todos gostam muito dela”.

Ele bufou, mas não negou.

Ela assistiu a paisagem do transcurso e pensou no que Harry dissera a ela. Parecia

que Nash tinha sido mais ou menos perdoado por sua inimizade no colegial, mas Marcus

não. Por quê?

E se Harry ainda estava tão ressentido com o conde, então por que Gabe tinha

concordado em ficar em Alverleigh? Os dois irmãos eram muito próximos. Pelo o que ela

já sabia, se Gabe não estivesse já em Alverleigh, nada no mundo arrastaria Harry para lá.

Finalmente eles passaram pelo ferro forjado que ornava o portão e se dirigiram ao

passeio longo e curvo. Alverleigh House a fez perder o ar. Era enorme, com quatro

pavimentos altos, com uma seção central e duas alas. Doze colunas sustentavam a entrada

curva, que era alcançada por um conjunto de degraus largos de mármore. A calçada de

pedras fez uma curava e um jardim magnífico apareceu no centro. No gramado extenso à

esquerda do edifício havia um labirinto grande. À direita havia um jardim informal

magnífico à la Capability Brown26. Seu ponto principal era um lago largo com uma ilha

apresentando uma ruína pitoresca de um templo grego.

O nervosismo de Nell cresceu em face de enorme grandeza. "Você não me disse que

era assim tão grande”, ela disse, endireitando as roupas e o cabelo.

"Eu não sabia. Nunca tinha estado aqui antes”, ele disse, surpreendendo-a. "É a

primeira visita de Gabe, também—e ele é um filho legítimo”.

Nenhuma maravilha que ele fosse amargo. Mas não havia tempo para discutir mais

nada, os cavalos estavam diminuindo a velocidade e os empregados vieram correndo para

ajudá-los a descerem e tomar suas bagagens.

26

Lancelot Brown, mais conhecido como Capability Brown foi um arquiteto paisagístico inglês. Lembrado como o

"último dos grandes artistas ingleses do século dezoito ", e "o maior jardineiro da Inglaterra". Projetou mais de 170

parques, muitos dos quais ainda existem.

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Um cavalheiro alto veio descendo os degraus, três de cada vez. Não havia

necessidade de Nell perguntar quem era; ele era a imagem cuspida de Harry, exceto seu

cabelo que era mais escuro.

Os dois homens se abraçaram e bateram-se de maneira masculina, cheios de alegria.

"Tio Harry”, uma voz de criança gritou e Nell girou e viu dois meninos pequenos

correndo com tudo os degraus abaixo, o menor dos dois não fazia nenhuma concessão a

sua perna desajeitada e manca que era um eco misterioso da de Harry.

"Nicky!", Harry pegou o menino manco e o ergueu, girando ao redor, rindo. "E Jim.

Como vocês dois cresceram”. Ele agarrou o outro pequeno menino e atirou um menino

sobre cada ombro e eles oscilavam, de cabeça para baixo, gritando com indignação falsa e

dando risadinhas.

Ele seria um pai maravilhoso, ela pensou melancolicamente. Ela podia apenas

imaginá-lo com uma menininha…

Nell viu que estava sendo observada por um príncipe de cabeça para baixo e se

forçou a sorrir. "Eu sei exatamente como é isso”, ela disse a ele.

Rindo, Harry abaixou os meninos e a apresentou.

"Então. Minha nova irmã, encantado em conhecê-la”, Gabriel Renfrew disse com um

sorriso morno. Ele a beijou na bochecha. Ele tinha os olhos muito azuis, fora isso, a

semelhança era espantosa.

Para o encanto de Nell, ambos os pequenos meninos receberam a introdução com bela

formalidade, batendo os saltos dos sapatos em uníssono e se curvando firmemente de

maneira prussiana. Então eles saíram correndo para olhar Sabre, que tinha sido trazido por

um cavalariço.

"Jovens selvagens”, Gabriel Renfrew riu, e ligou seu braço com o de Nell. "Venha e

encontre Callie, ela está morrendo de vontade de te conhecer”.

"Mas os meninos precisam tomar cuidado com Sabre—", Nell começou.

"Eles são meninos de Zindarian—ou Jim é quase um”, Gabe disse a ela. "Eles estão

acostumados com os modos dos cavalos de Zindarian. Sabre é um gatinho comparado a

alguns nos estábulos reais. Ah, aqui está a minha Callie”. Sua voz se aqueceu.

No alto dos degraus havia uma mulher com cabelo ondulado escuro e uma expressão

doce. A princesa. Ela era pequena e redonda. Muito redonda.

Nell hesitou, olhando fixamente para ela. A princesa sorria para Nell abaixo. Harry se

apressou os degraus à frente de Nell para saudar a princesa com um abraço e um beijo.

Nell não se moveu. Havia uma razão para a princesa estar tão redonda. Ela estava

grávida. Maduramente e gloriosamente grávida.

"Você está bem?", o irmão de Harry disse ao lado dela.

"Sim, só me recuperando das sacudidas da carruagem”, Nell disse brilhantemente, e

com uma respiração funda ela subiu os degraus para encontrar sua futura cunhada

grávida. Um passo de cada vez.

"Estou tão feliz por conhecê-la”, a princesa disse, dando a Nell um abraço morno.

"Bem-vinda à família. Eu sempre quis uma irmã”.

Era uma saudação tão bondosa e generosa que Nell esqueceu seu nervoso. Ela sorriu.

"Eu, também”.

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A princesa girou, dizendo, "onde está Tibby? Eu pensei que ela tivesse me seguido”.

"A correspondência chegou há quinze minutos”, um homem elegante e ágil disse por

detrás ela. "Havia uma carta para ela. Marcus deu a ela no corredor agora mesmo”.

Já que esse não era Marcus, ele devia ser Nash, Nell pensou. Ele era claramente um

Renfrew.

Nash agitou a mão de Harry calorosamente e beijou a mão de Nell de uma maneira

galante. "Bem-vinda à família, Lady Helen”, ele disse com um sorriso deslumbrante. "Eu

ouvi dizer que você é uma excelente amazona. Espero que monte comigo amanhã”.

"Isso seria adorável, obrigada”, Nell disse a ele. O charme era certeiro.

Quando eles giraram para entrar, um homem alto, de aparência séria, com o rosto

sem sorrir saiu da casa. O conde.

Ele formalmente se curvou para Harry e se curvou sobre a mão de Nell de maneira

formal. "Bem-vindos à Alverleigh, Lady Helen, Harry”, ele disse. "Meu mordomo escoltará

você para seus quartos”.

Nell encontrou o olhar dele e sua respiração ficou presa. Havia uma semelhança clara

de família entre todos os irmãos, mas enquanto Gabriel e Nash tinham olhos muito azuis,

os olhos do conde eram cinza: de um cinza frio e esfumaçado. Ele tinha os olhos de Harry.

Era misterioso.

O conde continuou. "O chá será servido na sala de estar verde em meia hora. Alguém

irá mostrar o caminho a vocês”. Ele deu um aceno com a cabeça cortês e então se virou.

Os olhos mais frios no mundo, Harry tinha dito. Ela tinha pensado o mesmo sobre

Harry na primeira vez em que examinara seus olhos. E então ele tinha dado a ela seu

chapéu.

Nell, ainda tentando absorver tudo, ficou agradecida quando Harry tomou seu braço

e a guiou atrás do mordomo.

Ela esperou ser posta em ala diferente por causa do decoro, mas o mordomo a

conduziu junto com Harry ao longo do mesmo corredor, o que a deixou com esperanças. O

tamanho do lugar era um pouco intimidante. Era fácil de se perder.

O mordomo abriu uma porta. "Sua alcova, Lady Helen”.

"Que quarto adorável”, Nell exclamou. "E que vista”.

"Lady Gosforth solicitou este quarto especialmente para você m’ lady”, o mordomo

disse a eles. "E Sr. Morant, se puder vir por este caminho, por favor?", Harry desapareceu.

Nell explorou o quarto. Era ainda mais luxuoso do que a casa de Lady Gosforth em

Londres. Havia uma porta fixa na parede, e por curiosidade, ela a abriu.

Dava para outra alcova—a de Harry. Ele estava sentado na cama lendo uma carta.

"Oh, você está aqui”, ela disse.

Ele saltou e enfiou a carta no bolso.

"O que é isto?", Nell perguntou a ele.

"Nada. Só uma carta do Ethan. Sobre nada. Cavalos, contas, a coisa habitual. Quartos

bons, não é? Tia Maude solicitou este aqui especialmente para mim, o mordomo disse.

Quartos juntos. Eu disse a você que ela sabia”.

Nell teve que concordar. Até aquele ponto Nell estava certa de que Lady Gosforth não

tinha nenhuma ideia de que ela e Harry tinham antecipado seus votos de casamento.

Page 178: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Mas ela não se importava nem um pouco com isso no momento. Algo havia mudado.

Havia um ar de tensão sobre ele, algo diferente de quando eles haviam chegado.

"Você tem certeza que é só isso que há na carta?".

"Sim”. Havia algo sinistro em seu rosto quando ele disse a ela, "ela apenas confirma

algo que eu pensei desde o princípio”.

"O quê?".

Ele agitou a cabeça. "Tem a ver com negócios. Nada a ver com você”.

Nell franziu o cenho. "Ainda que sejam notícias repugnantes, eu prefiro saber”.

"Não são notícias repugnantes. Estou muito contente em tê-las”. Ele a beijou, um beijo

rápido e decisivo. "Mas é negócio de homem”.

Ela bateu o pé. "Não, eu odeio isto. Quero saber”. Ele não estava dizendo a verdade a

ela. Ela tinha anos de experiência acumulada com o pai.

Ele deu a ela um olhar duro. "Não discuta comigo sobre isso, Nell. É negócio de

homem. Agora, lave seu rosto e suas mãos que nós iremos para o andar de baixo”.

"E essa é minha querida amiga, Senhorita Tibthorpe”, disse a Princesa Caroline, que

estava presidindo a bandeja de chá. "Tibby, essa é a noiva de Harry, Lady Helen

Freymore”.

A mulher chamou Tibby mas ela não se moveu. Uma mulher pequena, magra, de

aparência esperta no meio de seus trinta anos, permaneceu com a mão apertada no seio,

desviando a vista para a janela.

"Tibby?", a princesa disse.

Tibby se assustou e procurou. "Oh, por favor, perdoe-me”, ela disse às pressas. "Eu

estava aérea. Lady Helen, como vai você?".

"Qual é o problema, Tibby? Notícias ruins?".

Tibby olhou para ela inexpressivamente. "Não”. Ela corou. "Quero dizer, não sei. Eu

ainda não li. Se me dão licença, por favor, eu preciso…", e ela correu para fora do cômodo.

"Perdoe-a”, a princesa disse. "Ela faz isto de vez em quando, quando uma carta de

uma certa pessoa chega. Ela sempre fica um pouco agitada depois”.

Nell sabia como ela se sentia. O que Ethan dissera na carta que causara aquela

aparência sinistra nos olhos de Harry? Era muito preocupante. Se ela não o conhecesse

bem, pensaria…

A princesa pegou o bule. "Mas olhe para mim, falando sobre Tibby quando você

apenas acabou de conhecê-la. Vamos beber o chá. Lady Gosforth se retirou para sua alcova

para se deitar até o jantar e os homens e os meninos saíram para os odiosos estábulos para

olhar algum cavalo repugnante, então nós não devemos esperar por eles. Você não detesta

cavalos?".

"Não”, Nell disse. "Eu os adoro. Planejo criá-los”.

A princesa riu. "Então você está se casando na família certa. Todo membro é obcecado

por cavalos. Exceto eu. Agora, você gosta com leite ou limão? Nenhum dos dois? Bom”.

Ela passou uma xícara de chá para Nell. "E agora você poderia me contar como conheceu

Harry”.

Page 179: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Nell sorriu e tomou um gole de chá. "Não estou certo de por onde começar, Princesa

Carolin—"

A princesa ergueu a mão. "Por favor, você deve me chamar de Callie, como os outros

fazem. Nós seremos irmãs. Eu nunca tive uma irmã e sempre quis uma”.

"Eu também”, Nell disse.

Callie ergueu sua xícara para beber e de repente ofegou. Um olhar distante entrou em

seus olhos.

Depois de um momento, ela corou e olhou timidamente para Nell. "Meu bebê se

moveu. Eu sinto muito, sei que é indelicado eu mencionar tal coisa, especialmente na

frente de uma menina solteira, mas este bebê é tão precioso para mim”.

Nell agitou a cabeça, seus olhos ardendo com lágrimas. "Eu não acho que seja

indelicado mesmo, e você não precisa se importar comigo”.

Callie deitou a mão sobre a barriga inchada. "Foram nove anos desde o nascimento de

Nicky eu pensei que tivesse ficado estéril e, oh—", ela cessou bruscamente novamente.

Nell sorriu ao ver o êxtase nos olhos verdes adoráveis da princesa e se lembrou de

como tinha se sentido na primeira em que houve o milagre do movimento de Torie dentro

dela. Ela disse suavemente, "é a sensação mais maravilhosa do mundo, não é? Sentir esse

minúsculo tremular embaixo de seu coração, sabendo que há um bebê pequenininho

crescendo dentro de você. E sentindo um amor tão intenso…"

Ela de repente parou, ciente de que tinha dito demais.

A princesa olhou fixamente para ela com os olhos arregalados.

Nell mordeu o lábio. Ela não queria dizer a ninguém, mas tinha escapado. E agora

que tinha, ela não se lamentava. Era direito que a família de Harry soubesse. Eles tinham

dado boas-vindas a ela como um deles. Os segredos acabariam eventualmente—pelo

modo como tinha facilmente escapado para a princesa. E Tia Maude. E se eles

descobrissem mais tarde em vez de mais cedo, bem, isso seria como trair a confiança deles.

Ela queria a aceitação deles, mas não debaixo de falsas pretensões. Ela queria que eles

soubessem a verdade. Ela respirou fundo e começou.

Quando os homens chegaram dos estábulos o chá estava frio e Nell já tinha contado

toda a sua história para Callie. A única parte que ela omitira era sobre Sir Irwin. Ela estava

determinada a enterrar essa parte de sua vida completamente.

Durante a história, ambas as mulheres choraram e se abraçaram e Nell tinha achado

uma amiga. Uma irmã.

Harry viu os olhos inchados das duas mulheres e achou que sabia sobre o que elas

haviam conversado. Ele enviou os meninos para a cozinha e estava para enviar seus

irmãos para longe quando Nell o interrompeu. "Não, por favor, todo mundo, fiquem. Há

algo que eu tenho que dizer a todos vocês. Tem pesado na minha consciência—"

"Você não tem que explicar nada a eles”, Harry falou abruptamente.

"Não, Harry. Se eu vou me tornar parte de sua família, eles devem saber a verdade.

Eu me sentiria como uma impostora se não dissesse”.

"Que chatice. Você será a minha esposa. Não há nada de impostor nisto”.

Page 180: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Ele está certo”. Gabriel cruzou o cômodo e pôs o braço ao redor de sua esposa. "Você

não tem que nos dizer nada. Você será a esposa de Harry, e isto já é o suficiente para

qualquer um de nós”.

"Eu concordo”. Callie tomou a mão de Nell e apertou-a mostrando seu suporte.

Nem Nash nem o conde disseram qualquer coisa.

Nell olhou para Harry. "Se você me pedir, não direi nada”.

Ele deu a ela um olhar afiado. "Não é comigo que eu estou preocupado, sua mulher

tola. Diga a eles o que quiser, não faz nenhuma diferença para mim”. Ele foi ficar de pé ao

lado dela, braços cruzados, como um protetor.

"Então eu quero explicar”, ela disse. "Prefiro que a minha história não deixe esta sala,

mas—"

"Tenha a certeza, de que não irá”. Nash cruzou o cômodo e se sentou. O conde

permaneceu de pé, firme, ao lado da entrada.

Depressa e simplesmente Nell contou sua história. Com uma voz calma nascida de

seu esgotamento sentimental, ela disse tudo a eles, de descobrir que estava grávida a ver a

cesta de legumes nos degraus da igreja.

Ela não disse a eles como tinha ficado grávida, em primeiro lugar. Isso não era da

conta de ninguém, somente dela.

"E então”, ela terminou, "agora vocês sabem”.

Callie ficou de pé e a abraçou seu dizer nada. Nenhum dos homens se moveu.

Estavam todos olhando para o conde.

Houve um longo silêncio. Então o conde limpou a garganta. "Eu tenho uma

pergunta”.

Todo mundo endureceu. Nell ficou tensa enquanto Harry ao seu lado cerrava os

punhos.

Nell se endireitou, como se estivesse para enfrentar uma sentença. "Sim?".

"Seu pai está morto”.

Nell piscou. "Sim”.

"E você não tem nenhuma parente neste país?".

"Isto mesmo”, ela disse e deu uma olhada rápida para Harry. Ele agitou a cabeça, tão

confuso quanto qualquer um deles sobre aonde o conde queria chegar.

O conde limpou a garganta novamente e olhou para ela com os olhos de Harry.

"Então eu posso me oferecer para conduzir a noiva?".

"Eu ainda não confio nele”, Harry rosnou na cama de noite. "Um gesto galante não

elimina as coisas que ele fez no passado”.

"Mas Nash não fez, também? Você parece tê-lo perdoado”.

"Sim, mas ele era mais jovem que Marcus. Marcus era sempre o líder. E, além disso,

Nash se desculpou no ano passado. E ele ajudou Gabe e Callie com um grande problema”.

"Talvez Marcus se desculpará, também”.

Ele bufou. "Os porcos poderiam voar antes. Ele é muito cabeça-dura para se desculpar

por qualquer coisa. E algumas coisas não podem ser curadas com palavras”.

Page 181: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ele tinha sido muito ferido, ela percebeu. "O que ele fez a você?", ela perguntou

suavemente.

Ele deu a ela um olhar direto. "Você vai continuar com isso, não é?".

"É que eu não entendo. Eu sempre tomarei seu lado de qualquer maneira, você sabe

disto. Mas eu gostaria de entender”.

Ele suspirou. "Muito bem. Mas fique confortável primeiro, é uma longa história e não

muito interessante, então você provavelmente adormecerá”.

Ela se aconchegou. E ele contou a ela a história de seu primeiro amor, Anthea, que o

traíra do pior modo e tinha assistido secretamente enquanto ele trilhava rumo ao quase

fim de sua vida.

Nell ficou horrorizada e brava, e o abraçava convulsivamente como se de alguma

maneira ela pudesse confortar o eu jovem dele.

E de alguma maneira ele se sentiu confortado.

"E então eles me levaram, meio nu e sagrando muito, e me deixaram no pé dos

degraus do meu pai em Londres—Alverleigh House, no coração de Mayfair. E claro que

meu pai, o Conde de Alverleigh, tinha que estar lá”, ele disse amargamente. "Minha

primeira reunião com meu pai real e eu estava meio nu, sangrando e incapaz de ficar de

pé”.

"Por que eles o levaram para lá, se você não o conhecia?".

Ele encolheu os ombros. "Sem dúvida Lord Quenborough achava que meu pai

deveria se responsabilizar por seu bastardo”.

"E ele fez?".

“Ele deu uma olhada para mim e disse para o mordomo, ‘Glover, há um lixo nos

degraus da frente. Limpe’. Eu nunca me esquecerei daquelas palavras”.

Nell ofegou. "Tão insensível”.

"E então meu irmão Marcus desceu os degraus e ficou me olhando fixamente, aqueles

olhos impiedosos assistindo cada detalhe. Ele não disse uma palavra para mim. Apenas

olhou e então seguiu seu pai para o lado de dentro. Tal pai, tal filho”.

"Eu entendo agora”, ela disse, os braços ao redor dele. "Seria muito duro perdoar tal

crueldade. E sinto muito por ter trazido isso à tona, mexendo em antigos machucados e

abrindo velhas feridas”.

Harry a beijou, sentindo-se confortado. Ele nunca tinha contado a ninguém, exceto

Gabe. E ele não sabia de tal detalhe.

Ele não tinha se sentido provocado, quando seus velhos ferimentos reabriram. Ao

invés disso ele se sentira… curado.

Contar isso a ela, deitado entrelaçado com ela, falando em voz baixa na noite, fez com

ele percebesse como tinha sido jovem então. Não era amor o que ele sentira por Anthea,

ele de repente percebeu. Era obsessão, paixonite, sua primeira paixão séria da juventude.

Não era amor mesmo.

Não era nada como amor.

"Oh Harry”, Nell sussurrou. "Eu te amo tanto…"

Ela olhou para ele com os olhos cheios de amor e expectativa.

Page 182: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Harry olhava fixamente para ela abaixo. Ele não podia falar as palavras que ela queria

ouvir. Elas estavam presas em sua garganta. E elas permaneceriam lá, ele sabia, até que ele

fizesse algo, até que ele pudesse dar a ela algo mais do que palavras.

Eles fizeram amor novamente, e foi lento, tenro e agridoce. As palavras não ditas

permaneceram penduradas, mudas e pesadas no quarto.

Capítulo XVI.

Cooper deu os últimos toques no penteado de Nell. Ela tinha tentado algo diferente

novamente, trançando partes do cabelo formando um círculo contínuo em torno do topo

da cabeça de Nell, como uma coroa.

Nell considerou seu reflexo com assombro. Quem era aquela jovem mulher elegante?

Certamente não era Nell, a grosseira que havia crescido nos estábulos com saias erguidas

para impedir que elas arrastassem na lama e o cabelo caindo ao redor das orelhas.

Lady Helen, talvez? Não, ela nunca se sentiria como uma Lady Helen. Lady Nell

talvez…

"Você está brilhando, m’ lady”, Cooper disse a ela. "Você parece maravilhosa”.

"Obrigada, Cooper, você fez milagres”.

"Eu não poderia fazer tudo, m’ lady. O amor fez o resto, eu acho”.

Nell corou. Ele tinha feito amor com ela na noite anterior com uma doçura terna que a

havia derretido completamente.

E cedinho esta manhã eles tinham feito amor novamente com uma paixão feroz que

tinha queimado totalmente as suas últimas inibições com uma gloriosa conflagração. Ela

ainda estava um pouco dura com isto. Mas não se importava.

Ele ainda não tinha dito que a amava. Fisicamente, ela se sentia bem amada, mas

almejava ouvir as palavras dele. Cada vez mais ela se recordava das palavras que ele tinha

dito na primeira vez que tinha proposto. Não é o sonho de amor da juventude que estou te

oferecendo.

Não era o sonho de amor da juventude que ela procurava. Apenas amor. O amor de

Harry.

Houve uma batida na porta.

"Entre”, ela disse.

Um criado entrou e se curvou. "Eu fui enviado para mostrar à senhora a sala de estar

do café da manhã, m’ lady”.

"Oh, obrigada. Você poderia chamar o Sr. Morant, por favor?".

O criado franziu o cenho. "Mas ele já foi, m’ lady”.

"Já foi tomar café da manhã?", ela franziu o cenho. Parecia tão diferentemente dele.

"Não, m’ lady, ele tomou o café da manhã uma hora atrás. Ele saiu para Londres logo

depois”.

"O quê?", o queixo dela caiu.

"Sim, m’ lady”.

Page 183: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Por que ele havia ido para Londres sem ao menos dizer a ela? Ela só podia pensar em

uma razão—a carta. Nell abriu a porta conectora e passou apressada. Ela procurou, mas

não havia nenhum sinal da carta. Não havia lá nenhuma nota de Harry explicando por que

ele tinha saído sem dizer nada a ela.

Um sentimento sombrio cresceu dentro dela.

Ela girou para o criado. "Leve-me até o Sr. Gabriel Renfrew, imediatamente”.

"Ele está no—"

"Por favor, apenas me leve. E depressa”. Ela não conhecia a casa ainda.

Eles passaram ao longo do corredor, desceram degraus, fizeram várias curvas até que

finalmente o homem parou, então abriu uma porta. "A sala de estar do café da manhã, m’

lady”.

Gabriel estava a ponto de se sentar à mesa, com um prato de rosbife na mão. Seus

irmãos, Nash e Marcus, já tinham começado. Com a sua entrada, eles ficaram de pé, como

sempre. Ela tentou respirar.

"Lady Helen, o que foi?", o conde perguntou.

Nell olhou para ele, sem estar bem certa de como começar. A idéia irracional na sua

cabeça somente continuava a crescer.

"Harry foi para Londres”, ela disse.

O conde anuiu com a cabeça. "Sim, a negócios”, ele disse.

Ela olhou para Gabriel. "Eu não acho. Eu acho que—acho que ele poderia ter ido

matar um homem”, Nell disse. Soou tão dramático quando ela disse em voz alta. Mas todo

o instinto dela dizia que ele tinha saído atrás de Sir Irwin.

"Por que raios você pensaria isso?", Gabriel perguntou a ela. "Venha aqui e sente-se.

Tome uma xícara de chá”.

Ela permitiu que ele a acomodasse e aceitou o chá, mas não o bebeu. "Ele está atrás

desse homem há algum tempo. Ele—está muito bravo com ele”.

"Sim, mas não se sai matando pessoas porque se está bravo com elas”.

"Não, mas eu acho que ele poderia desafiar este homem para um duelo”.

Houve um pequeno silêncio. "Um duelo?", Gabriel deu a ela um olhar afiado. "Por

qual razão?".

Nell tragou. "Por mim”. Ela se forçou a encontrar os olhos dele. "É o homem que me

es—estu—"

"Nós entendemos”, Nash disse, cortando-a com compaixão.

"Mas se você estiver certa”, Gabriel disse, "por que ele não desafiou este homem

antes? Por que esperou até agora?".

"Ele não sabia o nome do homem até agora. Eu me recusei a dizer. Mas acho que a

informação estava na carta que ele recebeu ontem. Isso explica a tensão posterior dele”.

Os homens trocaram olhares. "Você poderia estar certa”, Gabe disse. "Eu nunca soube

que ele desafiou alguém para um duelo, mas com esta razão, qualquer homem iria”.

"Eu não quero que ele lute com Sir Irwin", Nell disse. "Por favor, você deve segui-lo e

pará-lo”.

"Nós iremos”, Gabriel disse. "Mas se chegar a um duelo, ele é um muito bom em

atirar e um mestre com a espada. Harry não fica atrás de ninguém no país”.

Page 184: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Há leis contra duelos”, o conde disse. "Eu sou um magistrado”.

"Exatamente!" Ela contorceu as mãos em angústia. "O que acontecerá se Harry matar

Sir Irwin? Eu não quero que ele seja enforcado, deportado ou que tenha que sair do país

como um fugitivo da justiça”. Ela o amava. Ela queria se casar com ele e viver em Firmin

Court, criar cavalos de raça e ter bebês com ele.

"Nós cuidaremos dele, não se preocupe”, Gabriel a assegurou. "Qual é o nome do

bandido?".

"Sir Irwin Clendinning”.

"E onde ele vive?".

Ela olhou para ele inexpressivamente. "Oh não!", ela lamentou. "Eu não sei onde ele

vive”.

Houve um pequeno silêncio enquanto eles refletiam sobre o problema.

"Sir Irwin?", Nash disse de repente. "Ele é um baronete”.

Ela agitou a cabeça. "Sim, ou um cavaleiro, o que isso importa?".

"Debrett’s27”, Nash disse. "Ele estará listado”. Eles correram para a biblioteca.

O livro estava aberto sobre uma mesa. "Aqui”, o conde disse. "Abra na entrada do

nome dele. Harry deve ter olhado, também”. Ele anotou rapidamente o endereço. "Certo,

vamos”.

"Você?", Gabriel disse surpreso.

O conde deu a ele um olhar frio. "Sim. Por que não?".

"Oh, por favor, apenas se apressem”, Nell pediu eles, e eles esqueceram suas

diferenças e foram.

A casa de Sir Irwin Clendinning ficava nos subúrbios de Londres na sempre

tumultuada Grande Estrada do Norte28. Vagões, treinadores de cavalos e carroças de todo

o tipos chacoalhavam ininterruptamente ao passar pela casa. Harry se pergunte como

alguém poderia viver em tal lugar. O barulho era horroroso. Mas esse era o endereço que

ele pegara.

Harry montou através do portão aberto. Um chaise esperava na calçada pequena na

frente de uma casa em estado ligeiramente precário. Um homem vestido de forma muito

asseada e de cabelo ruivo estava para subir no chaise: Sir Irwin?

Ele levou Sabre, ignorando o xingamento de aborrecimento do homem quando ele

empurrou o grande cavalo entre o homem e o condutor.

"O que diabos pensa que está fazendo, senhor?", diferentemente de sua casa, o

homem se mantinha cuidadosamente arrumado. O grande bastardo era algo como um

janota. Harry imaginou o homem dominando o corpo pequeno de Nell e uma ira fria o

consumiu. Mas ele não podia se permitir a enfurecer. Não ainda.

"Sir Irwin Clendinning?", era preciso verificar se o porco era realmente o porco.

27

Debrett’s – guia da genealogia britânica. Publicado até os dias de hoje, inclui um pouco da história de cada família portadora

de título.

28 Grande Estrada do Norte – nome alternativo para A1. Estrada numerada mais longa do Reino Unido com 658 km. Une

Londres, a Edimburgo (capital da Escócia).

Page 185: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Realmente, e o dono desta propriedade. Quem diabos é você?".

Harry desmontou de Sabre. "Harry Morant”.

Sir Irwin observou as roupas empoeiradas de Harry e fungou com desdém. "Não

acredito que tive o prazer”, ele disse afetadamente e deu um passo ao redor de Harry.

"Gentilmente saia de minha propriedade”.

"Oh, não será um prazer”, Harry disse com uma ameaça sutil.

"O que diabos—"

Mas isso foi tudo o que ele teve tempo de dizer antes que Harry o agarrasse pelo

casaco muito elegante. Praticamente erguendo-o do chão.

"Solte-me, seu—!"

Como resposta Harry o balançou e jogou contra a porta da carruagem. O cocheiro

reagiu, tentando pegar um rifle antigo. Relutantemente Harry deixou Sir Irwin ir e jogou o

homem no chão. Ele caiu todo espalhado. Uma bota no meio do peito e o rifle se tornou

inútil.

"Isto é um assunto particular entre mim e o seu amo”.

Harry rosnou para o cocheiro. "Saia e fique fora disso se estima a própria vida”.

Os cavalos mergulharam agitadamente enquanto o cocheiro ficava de pé, deu uma

olhada assustado para o rosto de Harry, e desapareceu rápido.

Sir Irwin teve a mesma ideia. Com uma injúria selvagem ele se jogou sobre Harry,

tentando empurrá-lo para o lado e ir na mesma direção que seu cocheiro.

Como resposta Harry o agarrou pelo pescoço e o jogou firme contra a carruagem. Sir

Irwin lutou, chutando e empurrando, mas ele era como um homem algemado. Tinha

muito em tamanho, mas Sir Irwin não era páreo para um homem que havia passado anos

em guerra.

"Ajudem-me! Assassino! Mohocks!", Sir Irwin gritou, mas sua voz foi abafada pelo

som do tráfico na Grande Estrada do Norte.

"Não acho que assassinato está na agenda para hoje. Apenas uma castração”, Harry

disse agradavelmente e jogou o homem contra a carroça novamente.

Sir Irwin girou com uma cor horrível. "C-castra—o que você quer dizer?", os olhos

dele chamejaram além do ombro de Harry. "Peguem ele!", ele gritou.

Dois dos empregados vieram atrás de Harry. Ele soltou Sir Irwin, dando um soco à

medida que girava. Ele bateu com o punho na mandíbula do primeiro homem e quase no

mesmo movimento afundou outro soco na boca do estômago do segundo.

O primeiro homem cambaleou para trás, o outro afundou de joelhos na calçada,

ofegando para respirar. Harry o ergueu pelo pescoço e o lançou no gramado. Vários outros

empregados juntaram-se na entrada ao ar livre. Ele ergueu os punhos convidativamente.

"Alguém mais que provar o que eu tenho a oferecer?".

Eles foram para trás juntos. Obviamente havia coisas que precisavam ser feitas do

lado de dentro. Urgentemente. Coisas domésticas.

A porta bateu. Sir Irwin estava só.

Um brilho leve deu um aviso a Harry. Ele girou, na hora certa de pegar o braço de Sir

Irwin quando ele começava sua descida assassina. Um punhal, fino e mortal…

Page 186: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Harry agarrou o braço do homem e arrancou o punhal dele. Sir Irwin estava lutando

mais firme agora, o terror emprestando força a ele, mas anos de campanha tinham deixado

os músculos de Harry prontos e afiados. A vida de Sir Irwin de indolência significava que

ele nunca teria uma chance de ganhar.

"Um punhal pelas costas, é?", Harry rosnou, torcendo o braço dele e o jogando para

trás com repulsa. "Porco. Mas eu posso achar um uso para ele mais tarde”. Ele jogou o

punhal para detrás de seu corpo e ele afundou no gramado.

"Peguem ele, seus covardes, ele não está armado”, Sir Irwin gritou em direção à porta

fechada da casa. A porta não se abriu. Apenas alguns movimentos nas cortinas dos vãos

das janelas diziam que eles ainda estavam sendo observados.

Era o suficiente. Harry o agarrou pelas lapelas, sentindo uma repulsa profunda nas

tripas. "Falando em covardes”, ele rosnou. "Onde nós estávamos? Oh sim, vamos falar

sobre mulheres…"

Os olhos de Sir Irwin se estreitaram. "Mulheres? Se alguma pequena prostituta correu

até você contando alguma história, ela está mentindo”, ele disse. "Acontece o tempo todo,

alguma vagabunda tentando me prender em casamento. Eu sou um homem de

importância”.

"Estou falando sobre uma dama”.

Sir Irwin pareceu espantado por um momento, então se recompôs. Ele tentou

empurrar Harry para trás. "Então você pegou o homem errado. Eu uso vagabundas, as

mulheres que pedem”.

"Engraçado, eu ouvi dizer que algumas delas lutam”.

Os lábios de Sir Irwin se curvaram. "Algumas mulheres gostam que seja áspero. Elas

apenas não gostam de admitir. Deixa-as envergonhadas”, ele disse zombando.

Os dentes dele eram muito iguais. Como dentes de ratos, Harry pensou. O homem

fazia-o querer vomitar.

"Prazer mútuo. O homem não pode ser o culpado”.

"E você gosto que seja áspero, também?", Harry perguntou, a voz sedosa.

"Às vezes”, ele disse cautelosamente. O joelho dele foi para cima quando ele tentou

acertar as bolas de Harry.

Harry bloqueou a ação com o quadril. "Você gosta quando elas lutam, não é?".

Como resposta, Sir Irwin cuspiu nele. Quando Harry jogou a cabeça para trás, Sir

Irwin tentou furar os olhos de Harry.

Jogando os dedos em garra para o lado, Harry jogou um punho contra a boca de Sir

Irwin. "Então você gosta de briga”, ele disse suavemente. "Então vamos nos divertir”.

Como um porco no chiqueiro, o homem lutou, cuspindo um dente e xingando

horrivelmente.

"Mas você me disse que gostava que fosse áspero. Mudou de ideia?".

"Pare”, Sir Irwin ofegou. "Independente de quem seja, eu pagarei”.

"Tolice, isto é de graça”. O punho de Harry o acertou novamente. "Você me disse que

gosta quando elas lutam. Bem, eu estou lutando. É divertido, não é? Prazer mútuo. Eu,

certamente estou apreciando”. Ele o agarrou em torno da garganta. "E agora quanto a

castrar… onde está o punhal?".

Page 187: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Sir Irwin rosnou e resistiu. Os dedos espessos arranhando os pulsos de Harry.

"Pare, seu tolo, você não pode matá-lo!".

Por um momento Harry não percebeu quem era. Sua ira estava quase o dominando.

Droga, ele quase tinha se sentido capaz de ir em frente e castrá-lo, não apenas ameaçar.

Deixar este ser desprezível viver…

Mas era Gabe, entrando do portão como um louco, gritando a plenos pulmões. Os

cavalos da carruagem ainda andavam. Antes que Harry pudesse responder ele saltou de

seu cavalo e tirou Harry de perto de Sir Irwin. Sir Irwin caiu de joelhos, ofegando para

respirar, e Gabe arrastou Harry para longe.

"Solte-me seu idiota”, Harry estalou. "Ele não está morto”.

"Não ainda, mas—"

Mais pessoas apareciam no portão. Nash saltou de seu cavalo, e agarrou Harry,

também. E então—Harry piscou—de todas as pessoas, Marcus.

"Que diabos?", ele se soltou das mãos de seus irmãos. "Que diabos vocês todos estão

fazendo aqui?", havia cavalos em todos os lugares, empregados abrindo a porta

novamente, transeuntes observando através do portão. Sir Irwin ofegou no chão tentando

respirar.

"Salvando você de si mesmo”, Gabe disse a ele.

Sir Irwin ficou de pé com dificuldade, indo em direção à porta da carruagem. Harry

foi à direção dele, mas Gabe o segurou de volta. "Deixe-o ir”.

"Por mais que você queira—por mais que ele mereça—você não pode matá-lo”, Nash

acrescentou.

Harry olhou fixamente para Nash como se tivesse nascido uma segunda cabeça nele.

"Eu não estava planejando isso”.

Nash fez um gesto para o casaco de Harry, que agora estava coberto com sangue.

"Você está dando muito essa impressão”.

Harry fez um som repugnado. "Diplomatas! É apenas um pouco sangue. Estou dando

ao porco o que ele merece. E eu tinha pensado em castrá-lo”.

"Atrás de vocês!", o grito de uma voz desconhecida veio dos degraus.

Harry e Gabe, agindo com seus instintos afiados por anos de guerra, mergulharam e

giraram ao mesmo tempo. Uma bala passou zumbindo pela orelha de Harry. Ele ouviu um

cavalo gritar. Sabre deu um coice e mergulhou. Havia uma linha magra de sangue no

flanco de seu cavalo.

Sir Irwin tinha uma pistola em cada mão. Ele abaixou a que tinha disparado e

transferiu a outra para sua mão direita.

"Onde diabos ele conseguiu uma daquelas?", Nash exigiu, tentando—para o desgosto

de Harry—empurrá-lo para trás dele.

"A carruagem”. Marcus já estava se movendo na direção de Sir Irwin quando ele

apontou a pistola para Harry. "Abaixe-a”, ele ordenou.

Sir Irwin ergueu a segunda pistola e apontou-a para Harry. "Você arruinou os meus

dentes, seu bastardo. Eu vou te matar por isso”.

"Vou te enforcar se você fizer isso”, Marcus disse a ele.

Page 188: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Os olhos de Sir Irwin chamejaram, "eu fui atacado sem nenhuma razão. Eu tenho

testemunhas”.

"Eu sou o Conde de Alverleigh e um magistrado”, Marcus disse. "Se você puxar esse

gatilho, eu te prometo que você será enforcado”.

"E antes que você seja enforcado, meus irmãos irão te castrar”, Harry disse.

A pistola oscilou. "I-irmãos?", ele olhou de modo selvagem de um para outro, e Sir

Irwin começou a andar para trás. "Você não me pegará, não vai. Fiquem para trás, fiquem

para trás todos vocês”. Com a pistola apontada para eles ele andou para trás.

"Eu não vou deixar ele cair fora”, Harry rosnou e fez um mergulho em sua direção.

Sir Irwin amaldiçoou e a pistola disparou.

"Harry!", Gabe gritou.

Harry se moveu. "O bastardo falhou”.

Sir Irwin disparou para a estrada. Harry correu atrás dele.

Houve um barulho alto e um gritou ensurdecedor.

"Que diabos?", Harry parou de chofre. Uma carruagem pesada estava inclinada no

outro lado da estrada, os cavalos mergulharam e deram coices. Harry mergulhou até as

cabeças dos líderes, arrastando-os, fazendo barulhos calmantes.

Gabe juntou-se a ele num instante e entre si conseguiram acalmar os cavalos. "Que

diabos aconteceu?", ele perguntou ao cocheiro assim que os cavalos estavam sob controle.

"Não foi minha culpa, senhor”, o cocheiro explicou. "Eu não o vi chegando. Ele

apenas entrou no meio da estrada. Ele está morto?".

Eles olharam. Sir Irwin estava deitado, quieto, os olhos vítreos na estrada, a metade

de baixo do corpo apenas uma massa esmagada. Morto realmente.

E castrado até o talo. Justiça poética, Harry pensou enquanto inspecionava o corpo

mutilado. Ele não tinha planejado que o homem morresse mas agora que ele tinha… Nell

nunca teria que se arriscar a se esbarrar com o bastardo novamente.

"Tire o corpo da estrada”, Marcus ordenou, dispondo os empregados que tinham

vindo olhar.

Enquanto eles estavam fazendo isto, outro empregado, um homem em um terno

preto limpo veio de maneira tímida adiante. Ele trazia Sabre. "Capitão Morant?".

Harry girou. "Sim?".

"Esse foi o homem que gritou 'atrás de vocês’", Nash disse.

Harry olhou para o homem com novo interesse. "Foi você? Tenho que te agradecer

pela minha vida então”.

O homem, que tinha a idade de Harry, disse, "não é necessário agradecer, senhor. Eu

não suporto um homem que atire em outro pelas costas. Especialmente quando um é um

oficial valente e o outro um…"

"Verme?".

O homem fez uma carranca. "Ele era sim, senhor, e mais. Eu não suportava o modo

como ele agia e as coisas que fazia”.

"Para as mulheres?".

"Sim, e para sua própria carne e sangue”.

Harry franziu o cenho. "O que você quer dizer com sua própria carne e sangue?".

Page 189: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Um homem idoso veio aqui uma vez, com um bebê, dizendo que Sir Irwin era o

pai—"

Um bebê? Harry de repente ficou atento. Ele agarrou o braço do homem. "Quando foi

isto? O que aconteceu com o bebê?".

O homem pareceu surpreso. "Minha primeira semana, senhor. Meio de outubro. Ele

me fez levar o bebê para este lugar—o tipo de lugar que eu não manteria um cachorro,

muito menos sua própria carne e sangue! Isso me deixa doente do estômago, senhor. Eu

não teria aceitado se trabalhos para antigos soldados não fossem tão difíceis”.

"Você tem um novo trabalho a partir de agora”, Harry disse a ele. "Você vai me

mostrar aonde levou aquele bebê. Você pode montar?".

Ele anuiu com a cabeça avidamente. "Isso eu posso senhor, desde que alguém me

empreste um cavalo”.

"Gabe, empreste a este rapaz seu cavalo”, Harry disse. Gabe assobiou e seu cavalo

veio trotando.

"Qual é o seu nome?", Harry perguntou.

"Evans, senhor”. Ele saudou.

A sobrancelha de Harry se ergueu. "Em que regimento você estava?".

Evans sorriu amplamente. "No seu, senhor. Eu era o bagageiro do Major Edwardes,

até que ele foi morto”.

Harry bateu de leve no ombro dele. "Bom homem. Você pode lidar com tudo isso, não

é?", Harry disse a Gabe, gesticulando para o caos. "O Evans, aqui, que era o bagageiro do

pobre Johnny Edwardes, disse que um homem idoso trouxe um bebê aqui para o Sir Irwin

em outubro”.

O rosto de Gabe se iluminou com compreensão.

Harry agitou a cabeça, advertindo. "Independente do que você faça, não diga a Nell o

que eu vou fazer. Ela morrerá se tiver de novo outra falsa esperança”.

"Vá em frente”, Gabe disse. "Nós resolveremos aqui. Se um magistrado e um

diplomata não podem resolver esta bagunça, eu não sei quem pode”.

"E o que você fará?", Harry perguntou enquanto montava.

"Supervisionar as tropas, o que mais? Agora vá, e boa sorte”.

"Sr. Ethan Delaney”, o mordomo de Alverleigh, Tymms, anunciou. Nell olhou para

cima com interesse. Esse era o amigo e companheiro de negócios de Harry.

Um homem de altura mediana, ombros largos, aparência dura, e com um atraente

rosto danificado entrou no quarto. Ele estava vestido com elegância, com um jaleco

corajosamente bordado e botas altas cintilantes.

Ele se curvou para Callie, dizendo com uma voz irlandesa suave, "Princesa Caroline”.

O olhar desceu até a cintura e a formalidade caiu, seu rosto moreno se dividiu em um

sorriso largo. "Agora, isto não é uma boa visão? Parabéns, Madame, estou certo de que o

Capitão Gabe está tão orgulhoso quanto feliz”.

Callie, sorrindo, avançou e deu a Ethan sua mão. "Sr. Delaney, realmente estou muito

contente por vê-lo, também”.

Page 190: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ele deu uma olhada em torno do quarto, viu Lady Gosforth e se curvou. "Lady

Gosforth”, ele disse com um sorriso. "Eu perguntaria como a senhora está indo, mas posso

ver que parece esplêndida”.

Lady Gosforth corou ligeiramente. Ela disse em um tom cáustico que não enganava

ninguém, "Sr. Delaney, vejo que você não desistiu de sua propensão chocante em flertar

com mulheres velhas”.

"Mas como você saberia se não há nenhuma uma mulher velha ‘poraqui’?", ele

prontamente respondeu.

Ela fungou, mas seus lábios se contraíram.

Callie introduziu Nell. O irlandês se curvou. Seus olhos se estreitaram e o homem de

repente sorriu. "A moça da carroça”. Ele se recordou de seu ambiente e disse com um

sorriso, "se eu tivesse percebido que Lady Helen e a moça da carroça eram a mesma, teria

entendido tudo muito mais cedo”.

Para a surpresa de Nell, em vez de meramente agitar sua mão, ele a beijou com uma

simplicidade que a moveu. "Estou trabalhado em Firmin Court há quase seis semanas, m’

lady, e não ouvi nada além de elogios a Lady Nell de todos na propriedade. Todos

esperam que a senhora volte para a casa, onde pertence”.

Os olhos de Nell arderam. "Obrigada, Sr. Delaney. Eu mal posso esperar para ir para

casa e ver todos, também”.

O rosto dele ondulou em um sorriso. "De fato, como foi pedido por Harry, eu trouxe

alguém comigo que você poderá ficar contente por ver”.

Nell deu a ele um olhar perplexo.

"Ela está amarrada no corrimão do lado de fora”, Ethan disse.

Curiosa, Nell olhou da porta. Uma comoção súbita soava no corredor: um cachorro

latindo excitadamente pedindo para ficar livre.

"Freckles!", Nell gritou e saiu correndo para saudar sua cachorrinha amada.

Ethan deu uma olhada em torno do cômodo pela terceira vez, como se esperasse ver

outra pessoa.

"Você quer se sentar, Sr. Delaney?", a princesa perguntou.

Ethan hesitou. "Eu desejava…"

"Todos os cavalheiros foram para Londres”, Lady Gosforth disse a ele.

"Sério? Uma pena eu ter me desencontrado com eles”, ele disse, ainda olhando.

"Ela está no labirinto, Sr. Delaney”, Callie disse a ele suavemente.

Ethan sorriu. "Você é realmente uma princesa, Madame”, ele murmurou e

rapidamente deixou a sala.

Ethan estava de pé olhando a parede alta e de folhas, seu coração batia como se ele

tivesse acabado uma maratona. "Senhorita Tibby, você está aí?", ele chamou.

Não houve nenhuma resposta mas ele pensou ter ouvido um som. "Tibby?".

"E-Ethan? É você, Ethan?".

"Ele mesmo”.

"N-não entre. Eu não posso te ver agora”. Ela soara ligeiramente em pânico.

Page 191: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ele entrou no labirinto, seguindo a direção da voz dela. "Mas eu vim de tão longe

para te ver. Você não quer conversar comigo, Tibby?".

"Não—s-sim, mas não agora. Eu-eu não estou pronta”, ela lamentou. "Você chegou

cedo”.

Ethan sorriu. "Apenas um dia”. Ele não pôde esperar até quarta-feira. Ele se virou e

dobrou duas vezes para trás. O destino estava do seu lado. Ele achou pouquíssimos becos

sem saída.

"Você não vai me fazer esperar outro dia, não é, Tibby?".

"Oh. Oh, não. Eu estou horrível! Oh, céus”.

Ele girou uma esquina e lá estava ela, sentada em um banco no centro do labirinto,

com um punhado de cartas junto ao peito. Os olhos estavam molhados, e seu cabelo estava

uma bagunça. Ela apressadamente enxugou as bochechas e se endireitou. Ela tentou

esconder as cartas sob a saia.

Ethan as reconheceu. Eram as cartas que ele tinha escrito para ela. Ela tinha lido suas

cartas e chorado sobre elas.

"Por que você está chorando, Tibby?", ele perguntou suavemente. "Eu escrevo tão mal

assim? Eu tenho trabalhado duro e minha leitura é tão boa quanto a de qualquer outra

pessoa agora, mas a escrita, bem, a escrita é uma coisa realmente enganadora”.

"Não, claro que não, Ethan”, ela disse com um soluço. "As cartas são lindas. Todas as

suas cartas são lindas”.

"Então por que você está triste?", ele perguntou, sentando ao lado dela e tomando sua

delicada e pequena mão entre as suas, grandes e ásperas.

"Nada, nada”, ela disse, esfregando em as bochechas e tentando se recompor. "De fato

eu-eu fico muito feliz em ler suas novidades”.

"’Meus’ novidades?".

Ela olhou fixamente para ele com olhos marrons grandes e afogados. "Você vai se

casar, não é? É para isso que você veio aqui, não é? Para me convidar para o casamento”.

"Sim, realmente”, ele disse solenemente. "Então, você virá?".

O rosto dela tremeu mas ela se dominou e disse firmemente, "eu ficaria honrada. Qu-

quem é a noiva?".

"Bem, sobre isto, eu ainda não a pedi, realmente”.

Tibby franziu o cenho. "Ethan, por que você está hesitando? Porque se for alguma

noção absurda de inferioridade—"

Ethan se sentou ao lado dela no banco. "A questão é, Senhorita Tibby, eu sei que sou

um irlandês nascido em um pântano e tive uma vida áspera, e ela é uma dama tão boa—"

"Se você ousar se rebaixar novamente na minha presença, Ethan Delaney, eu—eu

irei—", quando ela olhou para ele para completar, cessou bruscamente, percebendo como

ele estava perto.

Ethan não deu tempo a ela para ficar ansiosa e mandá-lo embora. Ele a beijou. A boca

era suave e ela tinha um gosto doce, de ansiedade e de mulher.

Ele a trouxe contra ele e continuou beijando-a. As mãos dela tremiam inutilmente,

então foram até seu tórax, e depois de um momento ela começou a beijá-lo de volta,

desajeitadamente e com total falta de perícia que quase derreteu o coração dele.

Page 192: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Isto mesmo, minha querida“, ele murmurou. "Venha para Ethan”.

Ela foi para trás. "Oh, Ethan, nós não devemos. Você vai se casar”.

"Sim, mas apenas se você me quiser”, ele disse a ela.

Levou um momento para que ela entendesse suas palavras.

"Você quer dizer, eu?", ela ofegou. "Você quer se casar comigo?".

"Sim. Esse é o meu desejo mais profundo no coração e tem sido já por algum tempo”.

"Comigo?".

Ele sorriu. "Se você me quiser”.

"Você sabe que eu tenho trinta e seis anos”.

"E eu tenho quase quarenta e estes adoráveis trinta e seis anos é a soma dos meus

sonhos”. Ele alisou o cabelo dela para trás.

O rosto dela enrugou. "Oh, eu nunca fui chamada de adorável em minha vida”.

"Você tem falado com as pessoas erradas, então”, ele disse simplesmente. "Ou talvez

eles nunca observaram seus lindos olhos marrons. Ou te escutaram ler uma história sob a

luz de uma vela, ou viram quando você ergue o olhar e sorri sem pensar”. Ele alisou o

cabelo dela para trás novamente e a beijou.

Lágrimas desciam por suas bochechas. "Oh, Ethan, você tem um dom com as

palavras”. Ela se endireitou, tentando ser sensata. "Mas eu sou muito velha para ter

filhos”.

Ele a beijou novamente. "Se nós vamos ter um pequeno ou não, está nas mãos de

Deus. Agora, acabe com a minha miséria e diga sim ou não”.

Ela olhou fixamente para ele. "Claro que é sim!", ela disse. "Mil vezes sim. Oh, Ethan,

eu nunca sonhei—", e ela se jogou nos braços dele e o beijou como se sua vida dependesse

disto. O coração velho e danificado de Ethan quase estourou com carinho e orgulho.

Quando o beijo estava acabado, ambos estavam respirando com força e Tibby estava

acomodada em seu colo.

"Eu mal posso esperar para te mostrar o chalé”, ele disse a ela. "Eu deixei tudo

certinho, como o que você tinha que foi totalmente queimado, mas ele está te esperando

para se transformar em uma casa”.

Ela anuiu com a cabeça. "Eu sou uma boa dona de casa”.

Ele deu a ela um olhar interrogativo. "Eu não estou falando de ser boa dona de casa,

querida. Estou falando sobre um lugar para o qual um homem pode voltar e se sentar

perto do fogo, com você lendo para mim, ou costurando, e então nós dois subiremos para a

cama e faremos o tipo de amor que fará seus ossos derreterem”.

Ela suspirou e o abraçou mais firme.

"Algumas das noites mais felizes de toda a minha vida foram aqueles que nós

passamos juntos no ano passado, quando Nicky e o jovem Jim iam para a cama, e você

ficava me ensinando a ler e lendo seus livros para mim, e eu ficava lá sentado observando

seu rosto doce e sonhava que você era minha”.

"Oh, Ethan”.

"A única parte que eu não gostava era quando eu ia para a minha cama e você ia para

a sua. Eu te amo, Tibby, com todo o meu coração”.

Page 193: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Os olhos dela encheram com lágrimas. "Oh, Ethan, eu nunca soube, por que você não

disse?".

"Eu não tinha nada para te oferecer na época”, ele disse a ela. "Mas agora eu tenho um

chalé e sou realmente o sócio de Harry—aqueles cavalos de Zindarian que eu pego todo

ano fazem grande diferença. Então, agora eu estou em posição de poder te propor”.

"Eu teria me casado com você sem nada”. E ela o beijou novamente.

Ethan a beijou até que ambos estavam quase descuidados e acariciou os seios dela

através do vestido. Ele correu sua grande, áspera e esfolada mão suavemente pelo corpo

dela e ela estremeceu com prazer. Ainda beijando-a, ele deslizou uma mão devagar entre

suas coxas suaves e sedosas. Ela gritou e ofegou, ziguezagueando um pouco, mas não fez

nenhum esforço para pará-lo. Ela estremeceu e se agarrou a ele, beijando-o febrilmente.

E em um banco duro, no meio de um labirinto em dezembro, Ethan levou a Senhorita

Tibby ao, seu primeiro, clímax.

Depois ela estava em seu colo, seu corpo pequeno e delicado enrolado no dele.

"Isso foi extraordinário”, ela disse afinal. "Eu nunca soube que… eu não tinha

nenhuma ideia”.

"Da próxima vez será melhor em nossa noite de núpcias”, ele disse a ela. "Caso

contrário é capaz de eu perder cabeça e te tomar. E quando eu te tomar, Tibby, quero que

nós estejamos em nossa própria cama, em nossa própria casa”.

"Oh sim, por favor, Ethan”, ela disse. "Eu te amo tanto. Eu apenas nunca tinha

sonhado…"

Ethan a beijou novamente.

Capítulo XVII.

Evans levou Harry a uma parte de Londres que ele nunca estivera, próximo às docas.

As ruas eram estreitas, cheias de crianças maltrapilhas, mendigos, prostitutas e sujeira. Os

edifícios eram velhos e tortos, como se tivessem crescido como fungos em vez de terem

sido construídos pelo homem; eles eram sujos e esquálidos e mostravam isso.

Harry sempre odiara cidades e este local péssimo era a melhor razão que ele já tinha

visto para ficar longe delas. Deus querido, como as pessoas poderiam viver assim?

E como alguém podia trazer um bebê para cá?

"Lugar sórdido para se viver, é sim, senhor”, Evans disse, como se estivesse lendo sua

mente. "Minha mãe vive no País de Gales caso contrário eu teria levado a pequena para

ela. Mamãe é louca com bebês. Teve oito de nós, sabe”.

Ele continuou seguindo através de um cruzamento de ruas e finalmente apontou para

uma viela estreita. "Lá”, Evans disse.

Era muito estreita até para passar um cavalo. "Espere aqui e cuide dos cavalos”,

Harry disse a ele. "Qual casa?".

"A última, você não poderá ir além. Entre e suba os degraus, é no topo, a porta

verde”. Ele deu a Harry um olhar irônico. "Procure 'Mãe'".

Page 194: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

A casa fedia. Tentando não respirar muito profundamente, ele subiu os degraus

raquíticos e bateu na porta verde.

A porta abriu uma fenda e um olho o observou. Uma voz disse, "É um ‘cavaneiro’,

‘mãm’”.

"’Deixa eu vê’”.

Um segundo olho substituiu o primeiro, então a porta abriu alguns centímetros. Uma

mulher bruta, suja e com um vestido curto, olhou-o de cima a baixo. Ela abaixou o justilho

mais um pouco e o olhou conscientemente. "E o que posso fazer por você, bonitão?", ela

tinha cheiro forte de gim.

O estômago de Harry revirava. Ele disse friamente, "estou aqui para falar com 'Mãe'

sobre um bebê”.

A mulher cacarejou. "Bem, você veio ao lugar certo, queridinho. Eu sou Muvver. Não

há escassez de bebês aqui”. Ela deu um passo para trás e acenou para que ele entrasse.

O chão era coberto de recipientes de todos os tipos: caixas de peixes, caixas de ovos,

até uma ou duas gavetas velhas quebradas—qualquer coisa que pudesse ser transformada

em uma cama para um bebê. As caixas eram forradas com palha. Em todas as caixas havia

uma criança, às vezes duas, viradas de ponta a cabeça.

Harry segurou sua ira. Ele estava aqui por apenas um bebê—Torie—mas mais tarde,

ele faria algo sobre este lugar.

"Qual você quer, queridinho? Estes aqui têm donos—as mães estão fora trabalhando”.

Ela fez uma varredura com os braços.

Nenhuma mãe deixaria uma criança nestas condições, a menos que estivesse

desesperada, Harry pensou.

A "Mãe" apontou. "Os órfãos estão lá. Faça sua escolha”.

Deus querido, eles estavam à venda?

Ele disse firme, "estou procurando por uma menininha que foi trazida para cá no final

de outubro. Ela estava em uma cesta forrada com cetim branco”.

"Oh sim, eu me lembro daquela cesta. Nós não a temos mais”.

Um frio correu por sua espinha. "Você quer dizer que ela morreu?".

A mulher bruta cacarejou como se ele tivesse feito uma boa piada. "Deus te ama,

senhor. Não, nós vendemos a cesta e as roupas bonitas dela. O bebê está por lá”. Ela

apontou para a seção de órfãos. "Tilda, mostre ao ‘cavaneiro’ sua pequena mascote”.

Uma mulher jovem, uma simplória, levou Harry para o outro quarto. Havia três

caixas no quarto.

"São dois meninos, e esta aqui é minha pequena mascote”, a menina disse, e apontou.

Ela estava quieta em uma caixa de ovo, envolvida em trapos. Tudo o que ele podia

ver na escuridão eram seus olhos o observando. Ele não podia ver qual cor eles tinham,

mas Harry de repente estava certo de qual cor eles viriam a ser—um xerez claro, assim

como os de sua mãe.

Torie, finalmente.

"Ela minha pequena mascote, ela é”, a menina disse. "Quer beber, queridinha?", ela

suavemente tirou a criança de seu ninho fedorento de palha, abriu seu justilho, e mostrou

um peito inchado para a criança. Ela não era nada limpa, foi o primeiro pensamento de

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Harry e ele quis pará-la, mas ele percebeu que esta menina simples poderia ser a razão

pela qual Torie tinha sobrevivido nestas condições.

Tilda balançava e sussurrava para Torie enquanto ela se alimentava. "Meu próprio

bebê morreu, morreu sim, mas essa chegou aqui, toda limpa e bonita. Minha pequena

mascote, não é, queridinha?".

Harry deslizou o olhar para as outras duas caixas. De onde esses dois pequenos

pedacinhos de vida não desejada tinham vindo?

Mas a graça de Deus havia sobre ele mesmo. Se Barrow não tivesse sido incapaz de

aguentar a visão de um menino pequeno, abandonado, abusado e o pegado para criar,

apenas Deus sabia o que poderia ter acontecido com ele.

Harry esperou que Torie terminasse. "Eu a levarei, agora”, ele disse a menina

enquanto ela colocava o bebê contra seu ombro Ela parecia aflita. "Ela ficará bem, eu vou

levá-la de volta para a mãe. Mas obrigado por ter cuidado tão bem dela”.

Ele deu uma olhada para as duas pequenas figuras nas outras duas caixas. "Eu te

darei cinco xelins agora se você alimentar aqueles dois como alimentou sua pequena

mascote. E alguém entrará aqui em algumas semanas e te dará um guiné se eles ainda

estiverem vivos. Você pode fazer isso por mim, Tilda?".

Ela anuiu com a cabeça e pegou as moedas, olhando furtivamente sobre o ombro para

o outro quarto.

"Agora a embrulhe para mim, para que fique quente, vou levá-la para casa”.

Tilda anuiu com a cabeça e envolveu Torie em alguns trapos encardidos. "Ela

precisará de sua pequena ‘bunequinha’”.

Harry franziu o cenho. "Que pequena ‘bunequinha’?".

A menina puxou uma boneca de pano pequeno da caixa do bebê. "É dela, da minha

pequena mascote”.

"Muito bem”. Ele a colocou no bolso. "Agora, dê-me”. Ele a levou cuidadosamente

para o outro quarto. Ele nunca tinha pegado um bebê antes.

"Você a tem, então”, a mulher chamada Mãe disse. Ela ofereceu uma garra encardida.

"São vinte quid”.

"O quê?".

Ela encolheu os ombros e disse como um negociante de cavalos, "ela é saudável e uma

boa pequena coisa, mal chora, nunca dei a ela uma dose”.

Harry franziu o cenho. "Uma dose?".

Como resposta a mulher passou ao lado de sua cadeira e ergueu uma garrafa azul.

"Ruína azul29”, ela disse com um sorriso com cotocos de dentes podres. "O melhor leite da

Muvver para manter um bebê quieto”. Ela desarrolhou a garrafa. "Bom para o bebê e bom

para mim”. Ela tomou um longo gole, apertou os lábios, e ofereceu a Harry.

Ele recusou com um tremor. Ele tinha bebido ruína azul frequentemente no passado

na taverna do Jackson.

Ele olhou para a mulher e estremeceu novamente. Dando isto para bebês—deuses!

29 Gim. Chamado de azul pela cor, e ruína por seus efeitos.

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Ele sabia de quê isso era feito. Alguns dos homens do acampamento alimentavam

seus bebês um pouco com gim ou rum na guerra para mantê-los quietos. Mas as pessoas

fazerem isso na guerra era uma coisa. Isso aqui era bem diferente.

"Eu não vou te pagar um centavo”, ele disse a mulher. "Esta criança foi roubada de

sua mãe legítima e você foi paga por um bandido para levá-la. Nós estamos partindo”.

Ignorando seu grito alto e indignado e a torrente de abusos que o seguiu enquanto

descia os degraus, ele levou Torie através das ruas frias de dezembro. Ele a deu para

Evans, montou Sabre e a pegou de volta. Estava frio, muito frio para um bebê vestido com

nada além de trapos. Ele abriu seu casaco e colocou Torie do lado de dentro, levando-a na

curva de seu braço.

"Vamos, querida, vamos te limpar”.

Era muito tarde para voltar a Alverleigh na mesma noite. Muito tarde e muito frio. "A

pousada mais próxima e respeitável”, ele disse a Evans.

Eles acharam uma pousada e Harry ordenou que uma refeição fosse servida em uma

hora para ele mesmo e para Evans, e que nesse meio tempo um pequeno banho e água

morna fossem levados para seu quarto.

Estava escuro, mas ele enviou Evans para fora para que ele tentasse comprar roupas

para o bebê e qualquer outra coisa que ele pensasse que Torie pudesse precisar. Graças a

Deus pela ninhada grande da Sra. Evans.

Ele cuidadosamente deitou Torie na cama e começou o processo de desvendar os

trapos nocivos que ela estava embrulhada. Os últimos pedaços estavam presos em seu

pequeno corpo e quando ele tentou soltá-los, ela chorou. E chorou. E chorou.

Era um som de partir o coração. Harry ficou ansioso. Ele não tinha nenhuma ideia do

que fazer. Ele a pegou cuidadosamente; sem os trapos a envolvendo, ela era tão minúscula

e frágil que ele tinha medo de fazer mal a ela.

Ele a ergueu com uma mão atrás de seu pescoço, sustentando sua cabeça, e a segurou

contra seu ombro do mesmo modo que via as mulheres fazendo. Ela chorou

miseravelmente.

"Shh, shh”, ele murmurou, "não será tão ruim quando você estiver toda limpa”.

Ela continuou se esgoelando. Harry compassava de cima a baixo, sentindo crescer a

sua ansiedade.

Uma criada chegou com um banho de lata pequena e uma lata de água quente.

"Graças a Deus”, Harry a saudou com alívio. Ele estendeu o bebê na direção dela. "Ela está

chorando. O que eu faço?".

A menina recuou horrorizada. "Eu não sei”, ela disse. "Eu não sei nada sobre bebês”.

Ela colocou o banho na frente do fogo, encheu até a metade com água, e pôs a lata ao lado

disto. "Ela provavelmente está faminta”.

"Faminta?", Harry disse. "Mas ela se alimentou há poucas horas”.

A menina deu a ele um olhar compassivo. "Ela é um bebê”.

Harry se sentiu como um idiota. Claro. Criaturas minúsculas que estavam crescendo

se alimentavam o tempo todo. Ele sabia disso através de filhotes de cachorro e potros, por

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que ele não tinha pensado nisso sobre Torie? "Leite”, ele disse à menina. "Vá buscar um

pouco de leite para ela, imediatamente”.

Ela deu um sorriso e partiu.

Harry esfregou ternamente as costas de Torie. Ela continuou gritando. "O jantar está

vindo”, ele disse a ela. "Não vai demorar”.

A menina trouxe o leite em um receptáculo de porcelana de forma peculiar, com um

bico em forma de mamilo com pequenos furos. Estava morno.

"Você tem sorte da cozinheira ter esta garrafa”, a empregada disse. "Alguém a deixou

aqui algumas semanas atrás”.

Ele a tomou e cuidadosamente tentou colocar o mamilo nos lábios de Torie.

Nada. Ela rugiu mais alto do que nunca.

"É melhor se você estiver sentado”, a menina aconselhou.

Ele se sentou na cama e a embalou em seus braços, balançando e murmurando. Ele

colocou o mamilo de porcelana contra sua boca. Ela soluçou amargamente.

"Levante um pouco”, a empregada disse.

Ele o ergueu e um pouco do leite espirrado na boca. Ela continuou chorando, mas a

pequena boca bebeu um pouco de leite. O resto escorreu pelo seu queixo. Ele ofereceu a

garrafa novamente, mas ela sacudiu a cabeça, evitando e soluçou.

"Acostumada com peito, acho”, a menina disse. Ela estava gostando de vê-lo todo

atrapalhado.

"Eu pensei que você não sabia nadas sobre bebês”, Harry disse acusadoramente.

"Eu não sei”, ela disse firmemente e partiu.

Ele lutou, segurando-a, balançando-a, cutucando seus lábios com o mamilo, tentando

persuadi-la a beber, e finalmente a persistência ganhou. Os gritos de Torie morreram

subitamente e ela começou a beber.

O alívio o inundou. Ela bebeu uma boa quantia do leite no recipiente e quando ela

parou, ele o colocou de lado.

"Agora para o banho”, ele disse a ela, e o momento em que ele falou, ela começou a

chorar novamente. Ele tentou o leite, no caso de ela ainda estar faminta mas ela gritou. Ele

a colocou de pé e começou a alisar suas costas, para acalmá-la.

Um arroto violento brotou de seu corpo minúsculo, e uma gota de leite azedo

escorreu pelo casaco dele. Ela parou, e Harry prendeu a respiração, mas ela olhou para ele

e continuou chorando, mas não tão desesperadamente.

Talvez o banho ajudasse. Harry colocou as mãos na água. Não estava mais quente,

apenas um pouco morna. Ele ficou tentado a chamar a menina de volta e pegar mais água

quente, mas os soluços de Torie o estavam matando, então ele segurou-a cuidadosamente

e colocou no banho.

O choro parou abruptamente em um soluço. Os olhos dela se arregalaram como se ela

estivesse se concentrando intensamente na sensação.

"Não costumavam te lavar, não é?", ele disse.

Ela deu uma pequena respiração trêmula e moveu as mãos. Os dedos minúsculos

dela se abriram e fecharam como que tentando pegar a água.

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Harry riu e imediatamente ela olhou para ele. "Você gosta da água, não é? Vamos ver

se você gosta disto”. Ele a deslizou suavemente de um lado para outro na água e sentiu o

pequeno corpo tenso relaxar.

Ela olhou para ele solenemente, um pequeno anjo, que nunca teria se esgoelado em

sua vida.

"Só espero que as aparências não enganem”, Harry disse a ela.

A água ficou preta de sujeira. Lentamente os trapos ao redor de seus pequenos

traseiros suavizaram e ele pôde descascá-los dela um por um. Sua pele delicada estava

vermelha onde eles estiveram grudados.

"Você precisa de alguma pomada, sua pobre pequenina”. Harry desejou que a Sra.

Barrow estivesse lá. Ela saberia o que fazer com aquela vermelhidão. Ele a tirou da água

suja, deitou-a em uma toalha, amparou-a com travesseiros, e chamou por alguém que

removesse a água e os trapos sujos.

Ele ordenou um segundo banho e enviou uma mensagem para o cozinheiro pedindo

um punhado de sal e um pouco de amêndoas, óleo de azeite ou gordura de ganso.

Ele deu novamente banho em Torie na água morna com um pouco de sal e ela

enrugou o rosto a princípio. Ele suspeitou que poderia estar ardendo e assim a balançou

de um lado para outro na água para distrai-la. Ela amava, chutando suas pequenas pernas

e gorgolejando com prazer. Ele riu baixinho com o som e novamente, ela olhou fixamente

para ele como se estivesse fascinada.

Ele a lavou completamente, tirou-a da água, secou e ligeiramente passou o óleo de

amêndoas sobre sua pele. "Isso deve te ajudar a acalmar”, ele disse a ela.

Ela assistiu o rosto dele atentamente. Ela tinha os olhos da mãe. Ela era toda Nell, ele

pensou. Filha de sua mãe, toda e completamente.

Evans não tinha voltado ainda, então ele a envolveu em uma toalha limpa, seca, então

a colocou dentro de uma fronha.

"Agora, vá dormir, querida”, ele disse a ela e a deixou. Ela respirou fundo, seu rosto

ficou vermelho e—"não comece de novo”, ele implorou. Ela olhou para ele com olhos

confusos, os lábios tremendo.

"Isto é chantagem”, Harry disse severamente.

Ela abriu a boca. Ele suspirou e a pegou. Ela imediatamente se acalmou.

"Aquela mulher apavorante me disse que você era uma jovenzinha bem-educada”, ele

disse a ela. "Claro, que não são as palavras exatas, mas é o que ela quis dizer. Como eu vou

explicar para sua mãe que você pegou hábitos ruins enquanto estava fora?".

Ela suspirou e o observou com grandes olhos. Os olhos de Nell.

Ele a balançou contra seu peito. "Sua mãe ficará eufórica de te ver. Ela ficou com o

coração partido por sua causa, jovem Torie, e eu posso ver o porquê. Então será um grande

dia amanhã e você precisa dormir bastante”.

Ele a colocou de volta na cama, no ninho de travesseiros. Ela imediatamente chorou.

Ele a pegou e ela parou.

"Certo, eu vou te segurar até você adormecer”. Ela se ajustou perfeitamente à curva

do antebraço dele. "Durma, entendeu, jovem dama? Isto é uma ordem”.

Page 199: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Ela o assistiu com sábios olhos pequenos e movia seu pequeno punho pelo ar. Ele

nunca tinha percebido como a mão de um bebê poderia ser um milagre; cinco dedos

miudinhos, cada um com perfeitas e minúsculas unhas. O punho fechado dela era como

uma pequena samambaia, pronta para desabrochar. Ele acariciou o punho com o dedo

indicador, maravilhado no quão grande e grossa sua mão era em comparação.

O punho minúsculo dela se abriu e cinco minúsculos dedos pequenos pegaram o

dedo indicador dele e apertaram firmemente. Ela deu um pequeno suspiro, as pestanas

longas tremularam e ela adormeceu, ainda segurando o dedo dele.

O peito de Harry parecia espesso e cheio.

O pequeno fragmento de humanidade agarrada ao seu dedo, reivindicando-o. O

coração de Harry estava perdido por ela. Torie era sua. Ou melhor, ele era de Torie. Por

toda a vida.

E assim, ele tinha uma filha.

Evans retornou quarenta e cinco minutos mais tarde e achou Harry sentado na cama.

"Eu sinto muito, senhor, fui capaz apenas de achar alguns panos—para a umidade, sabe”.

"Você não conseguiu nenhuma roupa? Ela não tem nenhuma. Eu joguei fora os trapos

que ela estava usando. Eles precisam ser queimados”.

"Eu darei um jeito, senhor”, Evans disse. "E talvez enquanto eu resolvo isso, você

gostaria que eu lavasse a sua camisa? Levarei seu casaco. Está arruinado, claro, mas você

precisará de algo para vestir até sua casa, então verei se posso deixá-lo com a aparência um

pouco mais respeitável”.

Harry olhava fixamente para ele. "Evans, o que você fazia para Sir Irwin?".

"Eu era seu camareiro, senhor”.

Harry sorriu amplamente. "Excelente. Nesse caso você pode tomar minha camisa e

meu casaco com minha permissão, e veja o que pode fazer com eles. Eu precisei de um

camareiro por algum tempo”.

"Obrigado, senhor. Você não se arrependerá, senhor”.

"Eu não sou nenhum janota”, Harry o advertiu.

Evans tentou esconder um sorriso. "Oh, eu percebi, senhor”.

"Hmm”, ele disse. "Enquanto isso, há uma torta lá ficando fria”.

"Obrigado, senhor”. Evans ergueu a tampa e viu que a comida não havia sido tocada.

"Não está com fome, senhor?".

Harry agitou a cabeça. "Faminto. Mas não posso me mover”.

"Não pode se mover, senhor?", Evans pareceu preocupado. "Você se machucou?".

Harry parecia embaraçado. "Não, mas eu fui capturado”, ele admitiu. Ele deu uma

olhada abaixo para a criança dormindo em seu braço, ainda segurando o dedo. "Fico

apavorado em pensar que ela poderia acordar e começar a chorar novamente. Minha filha

tem pulmões poderosos”.

"Sua filha, senhor? Mas eu pensei que ela era—"

"Não”, Harry disse firmemente. "Ela é minha. A mãe dele e eu estamos procurado-a

há semanas”.

O rosto de Evans clareou. "Então foi tudo um terrível engano, senhor?".

Page 200: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Isso mesmo, Evans. Um terrível engano”. Não havia necessidade de que alguém

soubesse que não era verdade. Harry olhava para o fragmento minúsculo segurando-o tão

tenazmente. "Mas ela voltou para onde pertence, ou pertencerá uma vez que estiver de

volta aos braços de sua mãe”.

Ele contratou um chaise para a viagem de volta para casa; o cavalo sacudiria Torie

demais. Evans montou atrás, levando Trojan.

Ele tinha pensado em comprar uma cesta para levá-la e roupas de bebê, mas nem ele

nem Evans sabiam onde tais coisas podiam ser compradas—na experiência de Evans, as

mulheres faziam essas coisas—e no fim Harry decidiu que era mais importante levar Torie

de volta para Nell. As coisas mais importantes eram guardanapos e leite, e Harry tinha

estocado ambos.

Então Torie voltou para casa, para sua mãe, vestida com várias toalhas e uma fronha e

foi nos braços de Harry. Ela parecia gostar muito de lá, olhando tudo ao redor com olhos

brilhantes, interessados, brincando com os botões de seu casaco e apertando firmemente o

dedo dele sempre que ele se apresentava.

Quando eles entraram na estrada para Alverleigh, ela estava dormindo

profundamente, aquecida dentro do casaco dele. Ele tinha parado alguns quilômetros

antes para alimentá-la, fazê-la arrotar e tinha mudado seu guardanapo para que assim ela

estivesse limpa, contente e pronta para encontrar sua mãe. Para um pequeno pedacinho de

perfeição, ela podia fazer os sons e cheiros mais horrendos. A carruagem parou e Harry

desceu cuidadosamente para não a acordar.

Tymms abriu a porta e antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, Harry pediu com o

dedo que ele fizesse silêncio. "Não diga nada aos outros, apenas informe Lady Nell—

discretamente—que há uma visita—não, duas visitas a aguardando no salão azul”.

Tymms fez uma reverência impassível, morrendo de curiosidade mas muito digno

para mostrá-la, e saiu.

Nell estava sentada na sala de visitas, tentando seu melhor para não incomodar ou

compassar. Ela afagava as orelhas de Freckles distraidamente. Harry tinha enviado sua

Freckles. Por quê? Por que ele pensou que ela precisaria de conforto? Ela estava contente

por ter seu cachorro, claro, mas ela odiava ser mantida na escuridão. Ela estava muito

preocupada com Harry. Seus irmãos todos tinham retornado, e tudo o que eles tinham

dito a ela era que Harry estava bem e que ele tinha negócios em Londres e voltaria a tempo

para o casamento.

Eles disseram que Sir Irwin tinha sido esmagado por uma carroça que passava, e ela

não tinha acreditado. Era uma história ridícula.

Eles disseram que seu Harry estava perfeitamente bem, mas eles tinham trazido Sabre

para casa e ele tinha sido baleado.

Uma bala. Então houvera tiros.

Eles estavam dizendo mentiras pelo bem dela. E isso a estava deixando louca. Como

se Harry, sabendo como ela ficava preocupada com ele, sairia para Londres a negócios.

Page 201: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Nell, querida, você não gostaria de aprender como fazer isto?", tia Maude disse para

ela. Ela estava ensinando a Callie e Tibby como tricotar. "Eu sei que você está preocupada,

minha querida, mas te ajudará a se manter ocupada”.

Nell agitou a cabeça. "Eu sou terrível para tricotar”. Tricotar só servia para fazê-la se

lembrar.

Tia Maude anuiu com a cabeça e deixou para lá.

Tymms caladamente entrou no cômodo e para surpresa de Nell, veio direito até ela,

curvou e disse discretamente em sua orelha, "há duas visitas para você, m’ lady, esperando

no salão azul”.

"Duas?", Nell saltou e saiu apressada. Eram homens que tinham vindo dizer a ela que

seu Harry estava machucado, ou pior? Esse tipo de notícia sempre vinha de duas pessoas.

Ela abriu a porta para o salão azul. Era Harry, de pé com as costas voltadas para a

porta, olhando através da janela.

"Harry”. Ela voou através do quarto.

Ele girou e ela parou, vendo que ele segurava algo nos braços.

"Shhh”, ele disse suavemente. "Não tão alto. Vai despertar o bebê”. Ele sorriu.

Ela olhou fixamente, presa no lugar. Sem movimento. O que ele estava fazendo com

um bebê? Onde ele o tinha conseguido? E por quê?

Um sentimento frio e doente assolou seu pensamento. Ele pensava que poderia trazer

para ela um substituto para Torie? Ele entendia tão pouco como ela se sentia?

Ela se forçou a falar. "Eu não… eu não preciso…", ela apontou para o bebê, a mão

tremendo.

"É Torie”.

As palavras dele despedaçaram sua compostura frágil.

Ela agitou a cabeça. "Torie está morta. Ela morreu—"

"Não”, ele disse suavemente. "Essa é Torie. Seu pai a tinha levado para Sir Irwin”.

Ela olhou fixamente, tentando descobrir por que ele diria tal coisa.

"Eu não acredito. Por que ele faria tal coisa?", ela sussurrou.

"Porque pela lei um bebê pertence a seu pai. É a mesma razão pela qual Lord

Quenborough me jogou nos degraus de meu pai naquela vez—porque eu era sua

responsabilidade. Essa é verdadeiramente Torie, sua Torie”.

Nell deu uma respiração rota. A mão voou para a boca. Ela começou a tremer. Ela não

podia tirar os olhos do embrulho nos braços dele. Ela não acreditava, mas oh… como ela

queria.

Ela não aguentava olhar, experimentar novamente a dor que ela sentia quando via

um bebê, que como todo os outros, não era sua filha.

Ela não conseguiria aguentar.

Ela foi adiante, uma mão estendida tremendo, a outra fixa medrosamente sobre o

peito. Não era Torie, Torie estava morta, ela tentou dizer a si mesma, se proteger, abafar a

esperança que germinava dentro dela.

A esperança era a emoção mais cruel.

O bebê nos braços de Harry se mexeu e bocejou poderosamente. Ela abriu os olhos e

olhou para sua mãe.

Page 202: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

E Nell viu os olhos que lembravam sua própria mãe, viu as sobrancelhas de seu pai,

viu—

"Oh Deus, é Torie”, ela soluçou e ergueu a filha dos braços de Harry. Ela deitou seu

rosto contra o suave e pequeno pescoço de Torie e sentiu seu cheiro. Seu bebê, sua filha,

sua Torie.

"Torie, oh, Torie”. Tremendo violentamente, ela afundou no sofá embalando seu

fardo precioso, balançando-a, chorando.

Ela deslizou seus dedos tremendo no rosto de Torie, lembrando-se das delicadas

curvas de suas orelhas, a penugem dourada e suave.

Algo saiu da dobra da toalha. Uma pequena boneca de trapo.

Nell olhou fixamente. "Oh meu Deus. O que é isto?".

Harry se curvou e a pegou. "Apenas uma boneca que a menina me deu. Ela disse que

era de Torie, mas não—"

"Gire-a de cabeça para baixo”, Nell sussurrou.

Harry girou o pequeno trapo de cabeça para baixo e quando a saia caiu, outra cabeça

apareceu. "Muito curioso”, ele disse.

"É uma boneca Cinderela. Eu fiz para ela antes de ela nascer”, ela sussurrou. "Igual a

que a minha mãe tinha feito para mim. Eu tinha me esquecido. Papai deve tê-la tomado,

também. Ela verdadeiramente é a minha Torie”. Ela enterrou o rosto em seu bebê

novamente.

Torie segurou e puxou o cabelo de Nell. "Olha como você cresceu forte, meu bem”,

Nell disse, rindo e soluçando ao mesmo tempo.

Harry cuidadosamente desenredou os dedos miudinhos do cabelo de Nell e se

sentou, o braço ao redor de Nell, ao redor das duas. Parecia tão certo, tão perfeito.

Ela olhou para ele, tentando achar palavras para algo para que não havia nenhuma

palavra, e viu que seus olhos estavam molhados, também. Levaria toda a vida.

Ele a segurou, assistindo calado enquanto ela examinava cada centímetro de Torie,

maravilhada com as mudanças e tentando lidar com as inundações de emoção. Tantas

semanas de dor e lamento e agora Torie estava de volta em seus braços.

"Ela não é linda, Harry?", ela soluçou. "Eu te disse que ela era linda”.

"Claro que ela é linda”, ele disse a ela, sua voz rouca com emoção. "Ela se parece com

a mãe”.

A porta abriu e Tia Maude olhou. "Nell, você está—", ela cessou bruscamente. "Oh…

oh, minha querida…"

"Eu tenho a minha Torie de volta, Tia Maude”, Nell disse distraidamente. "Harry a

achou para mim. Ele prometeu que iria e fez”.

Tia Maude andou nas pontas dos pés e olhou para o bebê. E arrulhou. E então franziu

o cenho. "Você vestiu a minha sobrinha-neta em uma fronha, Harry Morant?".

Harry encolheu os ombros. "Ela não tinha nenhuma roupa”, ele confessou. "Mas ela

não se importa, não é, querida? Ela gosta de usar toalhas usadas e fronhas”. Ele conferiu

com Torie, que bateu feliz em suas mãos.

Page 203: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Toalhas e uma fronha?", a tia exclamou com horror. "Você vestiu essa pobre criança

com toalhas e uma fronha? Esperem aqui”. Tia Maude saiu voando da sala.

Ela retornou alguns minutos mais tarde trazendo uma cesta grande. Nell reconheceu-

a da jornada de Bath. Ela a esvaziou sobre uma mesa e ordenou, "traga esta criança aqui”.

Nell a levou e assistiu, surpresa, enquanto Lady Gosforth tirava artigo de vestuário

branco minúsculo atrás de roupa branca minúscula. Havia vestidos, coletes, sapatos,

gorros, minúsculas luvas, xales e cobertores, tudo perfeitamente tricotado. Alguns estavam

até forrados com seda. "Onde você conseguiu tudo isso?", Nell perguntou, meio que já

sabendo a resposta.

"Eu disse a você que tinha que me manter ocupada”, Lady Gosforth disse a ela

tranquilamente, com um olhar. "Eu sabia que haveria uso para eles um dia, e agora, aqui

está Torie fazendo tudo isso ter valido a pena”. Ela acariciou a suave e pequena bochecha

delicadamente. "Agora vamos colocá-la em algumas roupas bonitas e levá-la para conhecer

o resto de sua família”.

Depois da ceia Harry achou seu irmão Marcus de pé olhando fixamente para Torie no

berço que ele tinha ido buscar no sótão.

Harry aprumou os ombros. Ele tinha que engolir seu orgulho e agradecer seu irmão.

Em duas horas da chegada de Torie a Alverleigh, Marcus tinha achado uma ama de leite,

uma mulher saudável, uma doce jovem de sua propriedade que tinha seu próprio bebê e

leite sobressalente.

Quando Harry entrou no quarto, Marcus olhou para cima com uma expressão

embaraçada. Harry logo viu o porquê. Torie estava olhando fixamente para o conde com

seus sábios pequenos olhos, prendendo seu dedo da forma que Harry conhecia bem.

Seu outro punho se movia sem objetivo no ar. Harry o pegou para colocar sob as

cobertas, mas Torie pegou seu dedo e segurou. Ela tinha a ambos, agora.

"Tem um aperto forte como o de um lutador”, Marcus disse suavemente.

"Eu sei”, Harry disse.

"Todas as vezes que eu tento sair, ela enruga seu pequeno rosto e se prepara para

chorar”, Marcus disse a ele.

"Eu sei”, Harry disse.

Os dois homens estavam de pé, um de cada lado do berço, pegos por duas mãos

minúsculas. Por um longo momento nenhum deles falou. Então Marcus disse, "eu sinto

muito pelo modo como te tratamos na escola”.

Harry não disse nada.

"E eu sinto muito pelo o que aconteceu daquela vez nos degraus de Alverleigh

House”, Marcus continuou. "Papai estava errado em te tratar assim. Nash e eu discutimos

com ele sobre isto do lado de dentro. Mas ele foi inflexível”.

Harry tragou.

"Ele era um homem difícil, nosso pai”, Marcus disse a Harry. "Eu sinto muito”.

E com essas poucas, simples e claras palavras, a hostilidade de anos começou a drenar

do coração de Harry.

Page 204: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

"Obrigado por achar a ama de leite”, ele disse. E Marcus soube o que ele queria dizer.

Ambos eram homens de poucas palavras. Eles eram irmãos, afinal.

Capítulo XVIII.

O casamento foi comemorado na Véspera de Natal e, como prometido, foi pequeno,

privado, e muito bonito.

A antiga capela da família Alverleigh estava cheia com flores crescidas nas estufas da

propriedade: Amarílis, narcisos brancos, helleborus, e brilhantes poinsettias.

Um órgão tocou tranquilamente enquanto os convidados se acomodavam nos bancos

de carvalho polido pela idade e por cera de abelha.

Foi um casamento de família, mas os Renfrews eram uma família grande. A igreja

estava cheia de felicitadores. Tia Maude se sentou na fila dianteira, um lencinho a postos.

Tibby e Ethan se sentaram juntos, segurando as mãos em segredo. Os olhos de Tibby

estavam brilhando. Nash se sentou com Tia Maude, Rafe e Luke com os amados pais

adotivos de Harry, Sr e Sra. Barrow. A antiga babá de Nell, Aggie, estava arrulhando para

Torie enquanto a ama de leite esperava. Freckles estava sentada na porta da igreja,

recentemente escovada por um príncipe de Zindaria e usando uma tira vermelha festiva

ao redor do pescoço.

Harry estava de pé no altar com seu irmão Gabe.

A música mudou para a marcha nupcial e Nell foi ao altar nos braço de Marcus. Ela

usava um vestido primoroso de seda e veludo cor de nata com detalhes em pêssego e

verde. Ela trazia um buquê enorme de orquídeas e usava uma única orquídea no cabelo.

Harry sentiu o coração inchar.

A princesa Callie a assistia, reluzindo em um vestido verde esmeralda aveludado e

usando a tiara da mãe. Ela estava sendo escoltada por dois meninos pequenos,

solenemente vestidos com os uniformes reais de Zindarian.

Nell tinha olhos apenas para Harry enquanto caminhava devagar pelo corredor. Ela

tomou a mão dele, sorrindo vagamente, e girou para o ministro.

"Reverendo Pigeon”, ela ofegou. Era o vigário da paróquia dela, o gentil e querido

idoso, que a batizara e que a tinha visto passar por tantos testes. As lágrimas rolavam por

seu rosto mas ela não se importava.

Nem Harry; ela era sua noiva, sua dama, sua Madona, e ela brilhava como uma

pérola contra a beleza escura da igreja antiga.

Enquanto eles caminhavam através da capela e de volta para a casa, Barrow surgiu ao

lado de Harry. "Se você não se importar, rapaz, eu e a minha moça não ficaremos pro

Natal”.

"Algum problema?", Harry perguntou.

"Não, não, todo mundo tem sido muito gentil. Não, são os dois pequenos rapazes.

Não Nicky e Jim, estou falando dos dois bebês pequeninos que você mencionou quando

nos contou como pegou a jovem Torie de volta. E isso afetou muito a patroa. Ela fica de pé

Page 205: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

metade da noite se preocupando com eles. Então nós pensamos, que se você não se

importasse, nós pegaríamos emprestado o jovem Evans e iríamos para Londres com ele

para buscá-los”.

"Buscá-los?".

"Sim”, Barrow disse. "Já é hora de termos alguma vida jovem em torno de Grange

novamente. Você e o Sr. Gabe cresceram, e então Nicky e o jovem Jim foram para Zindaria,

o lugar está muito quieto. Irrita os nervos dela, sabe. Fica resmungando que não tem nada

para fazer”.

Harry reprimiu um sorriso. Como se manter a casa para seu marido e uma dúzia de

cavalariços não fosse nada para fazer.

"Mas com alguns pequeninos para criar, é o tipo de coisa que a faz se recuperar, a Sra.

B.”, Barrow terminou.

Harry anuiu com a cabeça. Os seios cheios da Sra. Barrow esbanjavam amor materno.

Harry tinha se beneficiado dele, assim como Gabe e, durante algum tempo, Nicky e o

jovem Jim. A ideia dela ficar se preocupando com os dois bebezinhos órfãos que ele tinha

mencionado não o surpreendia mesmo.

"Sim, claro que você pode levar o Evans. E Rafe e Luke voltarão para Londres pelo

Natal—leve-os com você. E eu te darei algum dinheiro para a menina chamada Tilda”.

"Realmente, a Sra. B teve uma ideia sobre aquela moça, também”.

"Quem, Tilda?".

Barrow anuiu com a cabeça. "Uma moça assim, com quase nada na cachola,

facilmente será desviada do caminho, mas sob a asa da minha boa senhora, bem, ela

aprenderá como se deve viver direito. Nós a protegeremos das pessoas que se aproveitam

de jovens mulheres simplórias. Ela poderia dar uma mão a Sra. B. com os jovens, se você

não tiver nenhuma objeção, claro”.

Harry sorriu amplamente. "Nenhuma objeção, mesmo. Aquela menina salvou a vida

da Torie”.

"Nós partiremos amanhã então”, Barrow disse.

"Boa sorte”. Harry abraçou seu pai de criação. "E pelo amor de Deus, não deixe que a

Sra. Barrow entre naquela casa… a menos que você queira vê-la enforcada por

assassinato”.

"Rafael, meu menino querido”, Lady Gosforth disse quando a festa de casamento

tinha chegado à parte do jantar. "Eu te acomodei com uma amiga, Lady Cleeve. Cuide

dela, sim? Ela não conhece muitas pessoas”.

Rafe olhou para Lady Cleeve, uma senhora de idade avançada com cabelos brancos.

Ele mascarou sua decepção e se curvou graciosamente. "Eu ficarei muito feliz, Lady

Gosforth”.

Ela colocou uma mão sobre o braço dele para detê-lo por um momento. "Você é um

bom menino, Rafe”, ela disse. "Pergunte a minha amiga sobre sua neta há longo tempo

perdida. Creio que você achará a história interessante…"

Page 206: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

As celebrações do casamento estavam acontecendo já há algum tempo quando de

repente houve uma comoção no lado de fora do terraço. Cascos bateram nas pedras do

pavimento. Os convidados se viraram curiosamente em direção às janelas.

Sem mostrar nenhum sinal de alarme o Conde de Alverleigh sinalizou aos

empregados que puxassem as cortinas. Três homens grandes e escuros sobre cavalos

estavam visíveis, suas silhuetas contra o céu cinza da tarde. Para a surpresa de todos,

apesar do frio, o conde ordenou que as janelas francesas fossem abertas.

Houve um zumbido de surpresa entre a multidão: os cavaleiros usavam máscaras

pretas para esconder seus rostos. Aparentemente despreocupado, o conde avançou.

"Quem é você e o que quer aqui?".

O homem mascarado no centro respondeu. "Eu sou o não-tão-jovem-Lochinvar, e eu

vim pela morena Tibby”.

Uma ondulação de diversão e especulação passou pelos espectadores quando Tibby

deslizou através da multidão e olhava fixamente com assombro para o cavaleiro. "Quem

você disse que era?".

"Não-tão-jovem-Lochinvar”, ele respondeu com um sotaque irlandês suave. "Morena

Tibby, você virá comigo?".

Os olhos dela se alargaram. "Agora?", ela deu uma olhada para seu vestido de lã

suave. Havia nevado mais cedo.

"Sim, agora”, ele disse, e como que com um sinal seus dois companheiros altos

desmontaram. Ele passou um pacote, e o homem o agitou. Era um longo capote de pele

forrada carmesim. Ele o colocou ao redor dos ombros de Tibby.

"Isso é apenas pele de coelho, mas você não sentirá frio”, o Lochinvar disse a ela.

"Então você virá, morena Tibby?".

Ela olhou para ele, seu coração tão cheio que era incapaz de falar, e anuiu com a

cabeça.

Sem outra palavra os dois homens ergueram Tibby na frente do Lochinvar. Ele tinha

uma almofada amarrada a sua sela. "Não será tão desconfortável quanto da última vez”,

ele murmurou, envolvendo-a com seu braço forte. Tibby não se importou. Ela teria ido a

qualquer lugar com ele.

"Diga adeus a eles”, Lochinvar disse para a festa que os assistia. "E não tenha medo”,

ele acrescentou, olhando diretamente para a Princesa Callie. "Morena Tibby está segura

comigo. Vocês todos estão convidado para o casamento”. E ele galopou com ela para o

oeste.

"Oh, Ethan”, Tibby disse quando finalmente pôde falar. "Isso foi maravilhoso”.

"Você não quer voltar?".

Ela agitou a cabeça. Alguns flocos de neve caíram.

"Eu reservei dois quartos em uma pousada na próxima cidade”, Ethan disse a ela. "Se

você quiser, posso contratar uma empregada para manter o decoro”.

Ela girou a cabeça e olhou para ele. "Nenhuma empregada”, ela disse firmemente.

Ele sorriu e aumentou o aperto. Eles montaram através da noite escura.

"Ethan, você é um homem rico?", Tibby perguntou a ele depois de alguns minutos.

Page 207: Anne gracie - cavaleiros infernais 02 - a lady cativa

Os dentes brancos dele relampejaram e ele disse com uma voz fácil, "não, querida, eu

não sou. Importa?".

"Sim”, ela disse. "Importa. Muito”.

Ele olhou para ela com lânguida consternação. "Importa?”.

Ela solenemente anuiu com a cabeça. "Se você não for um homem rico, muda tudo”.

"O quê? Mas você sabia—"

Tibby continuou, "nós não temos condições de desperdiçar um bom dinheiro com um

segundo quarto. Um será ótimo para nós dois”.

Era Véspera de Natal. Nell despertou durante a noite e achou Harry acordado,

apoiado sobre o cotovelo, observando-a.

"Qual é o problema?", ela perguntou, sentando-se. "É a Torie?".

"Não, não, ela está dormindo profundamente lá no berço”, ele disse ternamente. Nell

ainda não era capaz de deixar Torie fora de sua visão. "Não é nada. Volte a dormir”. Ele

disse novamente. Seu braço deslizou ao redor dela, trazendo-a contra ele daquele modo

amado e familiar, e ela fechou os olhos e não pensou mais nisto.

Mas uma hora mais tarde ela despertou novamente, e o achou quieto, acordado e

olhando-a fixamente.

"O que foi, Harry?", ela sussurrou.

Ele não disse uma palavra. O sono ainda estava tentando arrastá-la de volta, mas a

expressão nos olhos dele a pegou. Ela se apoiou sobre um cotovelo e pôs uma mão na

bochecha dele. "Você parece horrível. O que foi?".

Ele não respondeu.

A ansiedade dela cresceu. "Aconteceu algo, Harry? Diga. Independente do que seja,

nós daremos um jeito”.

"Não há nada errado”.

Ela esquadrinhou o rosto dele preocupada. "Algo deve estar te aborrecendo, caso

contrário por que você não consegue dormir?".

Ele olhou para ela por um longo e intenso momento, então deu um gemido baixo e

fundo. "Eu amo você”, ele disse.

Ela se sentou. "O que você disse?", ela perguntou sem ar.

"Eu te amo, Nell”. Ele a envolveu com os braços e a puxou firme contra ele,

apertando-a tão firmemente que a respiração dela quase ficou presa nos pulmões. "Eu te

amo tanto”.

"Eu pensei—", ela começou.

"Eu acho que me apaixonei por você no primeiro dia na floresta, mas não acreditei

que… não pensei…", o apertou dele aumentou. "Eu não poderia te dizer na época; você

teria pensado que eu era louco”.

"Não, eu—"

"E então eu te sequestrei e te prendi com o casamento”. Ele agitou a cabeça. "Eu fui

tão arrogante, tão certo de que poderia fazer o que prometi…"

Ele ficou mudo. Ela não estava certa do que ele estava pensando, mas ela não o

interrompeu.

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"E então nós não a achamos”, ele disse. "E eu te prendi com uma falsa promessa”.

"Não, eu—"

"Mas eu achei Torie, e fiz tudo direito, então agora eu posso te dizer”.

"Dizer o quê?", ela sabia, mas desejava ouvir há tanto tempo que precisava ouvi-lo

dizer novamente.

"Que eu amo você. Que você é meu coração, minha vida”. Ele embrulhou os braços ao

redor dela e puxou firme contra ele, embreando tão firmemente que a respiração dela

quase não saía. "Eu te amo, Nell Morant. Não me deixe”.

"Nunca”, ela sussurrou. "Nunca, meu amor. Eu te amo, Harry Morant. Primeiro você

capturou meu corpo, então você roubou meu coração. Eu sou sua para sempre, corpo e

alma”.

FIM

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Nota da autora

Eu tomei algumas liberdades com os detalhes do processo do Hospital do Enjeitado.

Eles tinham parado de aceitar fichas de mães há mais de cinquenta anos antes da minha

história começar, e os artigos eram armazenados em envelopes, não em uma caixa com

etiquetas. Mas eu fiquei tão comovida com as fichas quando as vi no Museu do Enjeitado

que eu não pude resistir a usá-las na minha história. Eu suspeito também que tenha sido

mais fácil para os meus personagens conseguirem as informações do diretor do que

provavelmente teria sido; Porém, eu atribuo isso ao jeito de Harry. As exceções são

frequentemente feitas para as regras.

Se você for visitar Londres, o Museu do Enjeitado vale uma visita, e é muito fácil de

chegar pelo metrô. Há também mais informações no meu site: www.annegracie.com.