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1 Anais do III Congresso Internacional de História da UFG/ Jataí: História e Diversidade Cultural. Textos Completos. Realização Curso de História ISSN 2178-1281 PREVESTI:UNIVERSO SIMBÓLICO DE REPRESENTAÇÕES DE INSERÇÃO UNIVERSITÁRIA E DE MERCADO DE TRABALHO PARA JOVENS NEGROS E CARENTES DA CIDADE DE ITUIUTABA-MG Marivania Xavier Cavalcanti Universidade Federal de São João del Rei [email protected] Jaqueline Calixto FACIP _UFU Campos do Pontal [email protected] Resumo: Esta pesquisa tem como tema o curso Pré-vestibular para negros e carentes o PREVESTI da cidade de Ituiutaba-MG. Abordando os universos simbólicos de autorrealização a partir das visões representativas dos alunos ingressantes do ano de 2012. Com o objetivo de tentar analisar, que tipos de representações levam o aluno a querer fazer parte do curso PREVESTI? Quais são os seus “sonhos” e “desejos” diante das expectativas de inserção universitária e no mercado de trabalho? È possível perceber desejos de mudanças e empreendedorismo nas falas dos alunos em relação ao PREVESTI? Ha relevância no PREVESTI como ação de mobilidade social e combate a discriminação racial? Objetivando ter uma visão critica e mais abrangente, utilizamos como instrumento de coleta dos dados apresentados neste trabalho o questionário e entrevistas em busca de pistas que validam nossa argumentação. O questionário contou com quatorze questões, sendo que seis eram de múltiplas escolhas e oito subjetivas, as quais buscam evidenciar a visão dos alunos quanto à carreira e perspectivas de projeto de vida para o futuro. Pelos depoimentos podemos perceber um grande universo simbólico de representatividade social que variam desde as escolhas profissionais, visões de bem estar e empreendimentos futuros que validam a expectativa da inserção mediante a conjuntura de fazer parte do PREVESTI . Palavras-chaves: PREVESTI, inserção universitária, mobilidade social,projeto de vida,empreendedorismo 1 INTRODUÇÃO Os cursos Pré-vestibulares para negros e carentes vem crescendo no universo educacional, dentro da proposta de políticas publicas de ações afirmativas. As ações afirmativas são ações que tentam de forma diferenciada tratar desigualmente pessoas de grupos oriundos de discriminações e estrato sociais baixo, oferecendo oportunidades já encontradas naturalmente por outros grupos que não são discriminados. Segundo JR (2002) o principio da igualdade é totalmente elevado quando coloca todos os membros de determinada sociedade na condição de participar da competição pela vida, ou pela conquista do que é vitalmente mais significativo, a partir de posições iguais.

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Anais do III Congresso Internacional de História da UFG/ Jataí: História e Diversidade Cultural. Textos Completos.

Realização Curso de História – ISSN 2178-1281

PREVESTI:UNIVERSO SIMBÓLICO DE REPRESENTAÇÕES DE INSERÇÃO

UNIVERSITÁRIA E DE MERCADO DE TRABALHO PARA JOVENS NEGROS E

CARENTES DA CIDADE DE ITUIUTABA-MG

Marivania Xavier Cavalcanti

Universidade Federal de São João del Rei [email protected]

Jaqueline Calixto

FACIP _UFU Campos do Pontal

[email protected]

Resumo: Esta pesquisa tem como tema o curso Pré-vestibular para negros e carentes o

PREVESTI da cidade de Ituiutaba-MG. Abordando os universos simbólicos de

autorrealização a partir das visões representativas dos alunos ingressantes do ano de 2012.

Com o objetivo de tentar analisar, que tipos de representações levam o aluno a querer fazer

parte do curso PREVESTI? Quais são os seus “sonhos” e “desejos” diante das expectativas

de inserção universitária e no mercado de trabalho? È possível perceber desejos de mudanças

e empreendedorismo nas falas dos alunos em relação ao PREVESTI? Ha relevância no

PREVESTI como ação de mobilidade social e combate a discriminação racial? Objetivando

ter uma visão critica e mais abrangente, utilizamos como instrumento de coleta dos dados

apresentados neste trabalho o questionário e entrevistas em busca de pistas que validam nossa

argumentação. O questionário contou com quatorze questões, sendo que seis eram de

múltiplas escolhas e oito subjetivas, as quais buscam evidenciar a visão dos alunos quanto à

carreira e perspectivas de projeto de vida para o futuro. Pelos depoimentos podemos perceber

um grande universo simbólico de representatividade social que variam desde as escolhas

profissionais, visões de bem estar e empreendimentos futuros que validam a expectativa da

inserção mediante a conjuntura de fazer parte do PREVESTI .

Palavras-chaves: PREVESTI, inserção universitária, mobilidade social,projeto de

vida,empreendedorismo

1 – INTRODUÇÃO

Os cursos Pré-vestibulares para negros e carentes vem crescendo no universo

educacional, dentro da proposta de políticas publicas de ações afirmativas. As ações

afirmativas são ações que tentam de forma diferenciada tratar desigualmente pessoas de

grupos oriundos de discriminações e estrato sociais baixo, oferecendo oportunidades já

encontradas naturalmente por outros grupos que não são discriminados. Segundo JR (2002) o

principio da igualdade é totalmente elevado quando coloca todos os membros de determinada

sociedade na condição de participar da competição pela vida, ou pela conquista do que é

vitalmente mais significativo, a partir de posições iguais.

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Pelo exposto é possível perceber que o PREVESTI, tenta dentro de uma política de

discriminação positiva1, colocar a pequena parcela assistida por ele, a um nível similar de

competição ao daqueles que sempre se beneficiaram de sua exclusão.

Varias pesquisas como a da pesquisadora Rosemberg (1998), comprovam que o negro

e pobre são os maiores prejudicados na obtenção de direitos engendrados pela sociedade e um

deles é o direito a uma educação de qualidade. Seus direitos são sempre formais e não de fato

como deveria ser. Sua educação precária coloca-os em desvantagens frente ao mercado de

trabalho e posteriormente dificulta seu processo de afirmação e elevação de sua condição

precária.

Essa desigualdade diante de um sistema escolar de qualidade duvidosa é

vista como uma depreciação dos grupos étnicos de origem africana e

como uma forma de injustiça, na medida em que deixa as crianças

negras se voltarem não necessariamente segregadas, mas simplesmente

eficaz ou menos adaptada às suas dificuldades específicas, o que implica

para essas crianças, um futuro mais difícil, com menores chances de

ascensão social e de acesso a melhores cargos. (D’ADESKY, p.181,

2001)

Notadamente essas exclusões podem ser diminuídas pelo fomento de políticas públicas

sérias que abarquem as populações desfavorecidas e discriminadas com projetos que

estimulem sua afirmação e integração na sociedade, princípios básicos da cidadania. Só que a

“vigência da cidadania ativa requer, especialmente num país como o nosso a consciência clara

sobre o papel da educação” (BENEVIDES, p.156, 1998). Consciência que começa a ser

observada pelas ações empreendidas por governos recentes do país, mas e parcelas da

sociedade que incentivam projetos educacionais como continuidade do processo educacional

como o PREVESTI.

Nessa perspectiva de mudanças, o PREVESTI procura imbuir nesses alunos, valores

que os permitam a serem incentivadores de sua própria transformação, fornecendo

ferramentas que o subsidiem na convicção de sua capacidade.

O fomento de valores é cerceado por eixos que permeia a educação empreendedora,

eixos embasados pelo alicerce principal que é o conhecimento de um fazer que perceba as

diferenças e as necessidades desses educando, permitindo os revelar frente a perspectivas de

1 Discriminação Positiva “reverse discrimination”: consiste em dar tratamento preferencial a um grupo

historicamente discriminado, de modo a inseri-lo no “mainstream”, impedindo assim que o principio da

igualdade formal, expresso em leis neutras que não levem em consideração os fatores de natureza cultural e

histórica, funcione na prática como mecanismo perpetuador da desigualdade. GOMES (2001).

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futuros através do desenvolvimento de capacidades e habilidades que o universo do mercado

de trabalho espera de um bom profissional.

Este será o ponto central desta pesquisa, tentar analisar, como percebe tais

perspectivas nos alunos Prevestianos, que tipos de representações levam o aluno a procurar o

PREVESTI? Quais são os seus “sonhos” e “desejos” diante das expectativas de inserção no

mercado de trabalho? È possível perceber desejo de mudanças e empreendedorismo nas falas

dos alunos em relação ao PREVESTI?

O curso conta com sessenta e três alunos divididos em duas turmas que recebem o nome

de personalidades ícones do Movimento Negro do Mundo inteiro: Nelson Mandela e Zumbi

dos Palmares. Estes ícones da luta antirracista personalizam o material pedagógico do (a)s

alunos (as). Dos sessenta e três alunos quarenta e nove estavam presentes e participaram da

pesquisa, quatorze não estava presente no dia, os quais justificaram ausência junto à

coordenadoria do projeto.

Objetivando ter uma visão critica e mais abrangente, utilizamos como instrumento de

coleta dos dados apresentados neste trabalho o questionário e entrevistas em busca de pistas

que validam nossa argumentação. O questionário contou com quatorze questões, sendo que

seis eram de múltiplas escolhas e oito subjetivas, as quais buscam evidenciar a visão dos

alunos quanto à carreira e perspectivas de projeto de vida para o futuro.

Questões relacionadas à pertença sócio-racial não foram feitas no instrumento visto que,

cor e condição social por serem estes critérios de seletividade para ingressaram ao curso.

Assim sendo, considero como pertencentes à raça negra ou pobre o (a)s Prevestiano (a)s

pesquisados.

Além do uso do questionário foi realizado uma análise documental do Estatuto, Lista de

presença e Leis de criação.

2 – PREVESTI – o que é?

As grandes transformações do mundo globalizado acabam por exigir um profissional

cada vez mais qualificado, capaz de atender as demandas do mercado de trabalho e ainda ser

criativo inteligente e visionário na arte de enxergar soluções imediatas e também a médio e

longo prazo. Mas para garantia de tantas qualidades, seu sucesso depende de sua formação

escolar que deve ser alicerçada por conhecimentos e capacidades que o permitam orientar-se

em meio a essas transformações modificando-as e permitindo-se ser modificado na medida

em que as mesmas provoquem sua inserção, recuperando seu significado pessoal e social.

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Perpassando também pela forma como utilizara os avanços tecnológicos que o progresso tem

proporcionado em uma velocidade constante. Diante dessas expectativas de formação para o

trabalho, busca da qualidade profissional, entendimento das novas tecnologias, e de atender a

demanda pela busca á Universidade, cresce em todo o país, os cursos Pré-vestibulares como

um espaço subliminar de formação instrumental que oferece passagem a um curso

universitário seja particular ou pública.

Observa-se, no entanto, que a invasão dos cursos Pré-vestibulares, acaba se tornando

privilégio daqueles que podem pagar, alimentando ainda mais o caráter seletivo do ensino

superior, pois a classe majoritária da população, ou seja, a classe negra e pobre ainda continua

fora do mercado de trabalho e sem chances de concorrer de forma igualitária à vaga nas

universidades e de sobreviver às incertezas e medos do presente e futuro. Com base a

combater essa exclusão e intensificar oportunidades, surgem políticas públicas definidas como

ações afirmativas com o intuito de assegurar a presença de segmentos da população ausentes

do processo universitário, garantindo a estes não só oportunidades justas, mas igualdade de

condições através do mérito da qualificação a concorrerem de igual para igual. Segundo

Gomes (2001),as ações afirmativas são políticas públicas voltadas à concretização do

principio constitucional da igualdade material e à neutralização e combate dos efeitos de

discriminação e preconceito. Tendo como meta, também o engendramento de transformações

culturais e sociais relevantes, inculcando nos atores sociais a utilidade e observância dos

princípios do pluralismo e da diversidade nas mais diversas esferas do convívio humano.

Assim, alicerçados por esse viés conceitual e pela luta do movimento negro, iniciativas

não governamentais com intenção de promover e apoiar negros e pobres na universidade

ganham espaços como os cursos PVCN – pré-vestibulares para negros e carentes. O primeiro

surgiu em 1994 com Frei David, que contou com apoio da igreja, contribuições e

organizações locais e de bairros (Telles p.109, 2003). Em Ituiutaba o curso surgiu em 1998,

onde foi nomeado PREVESTI, sob a responsabilidade da Fundação Municipal Zumbi dos

Palmares (FUMZUP), entidade ligada ao movimento negro local. É um curso que conta com a

contribuição de 40,00 (quarenta reais) para manutenção e aquisição de material didático para

manuseio do próprio aluno, sem fins lucrativos. Sua existência e sobrevivência também

contam com a colaboração de recursos de entidades locais, parceiros e prefeitura.

Mas para o movimento negro local, apesar do ganho da concretização do curso,

precisava ainda de outra medida mais intensiva que garantissem a sustentação desse avanço e

garantisse a permanência dos alunos Prevestiano no ensino superior. Assim conseguiram uma

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grande conquista, como podemos perceber no pequeno trecho retirado do estatuto do

PREVESTI: “A Prefeitura Municipal de Ituiutaba concederá, a alunos negros carente do curso

pré-vestibular PREVESTI, que mantém nesta cidade, 10(dez) bolsas de estudo, no valor de

75% (setenta e cinco por cento), com objetivo de ensejar-lhes acesso ao ensino superior”

(Ituiutaba, Decreto Lei nº 3314, de 14 de dezembro de 1998. Estabelece bolsas de estudo.

Ituiutaba, MG).

A inserção de bolsas de estudo ao curso, medida oportuna e importante, oferece aos

alunos garantias da ascensão e permanência no universo universitário e consequentemente a

interiorização da diversidade em espaços até então reservados para poucos. O PREVESTI

iniciou com uma sala, hoje conta com duas salas com cerca de 63 alunos, apresentando uma

proposta pedagógica onde disciplinas específicas que aprimoram o aprendizado e

desenvolvem o intelectual dialogam através da disciplina cidadania e inclusão social como

forma de resistência e reflexão da sua realidade na construção da historicidade do negro no

Brasil como sujeitos refletidos na e da história.

3-– RESULTADOS E DISCUSSÕES

3-1 Perfil do aluno Prevestiano

De acordo com os dados coletados é possível inferir algumas características que compõem

o perfil do (a)s Prevestiano (a)s. Com relação à participação entre homens e mulheres

ingressantes no PREVESTI percebemos que o perfil do aluno Prevestiano é em grande

maioria feminino, que se encontra numa faixa etária de 17 a 20 anos, são egressos de escola

pública estadual que concluíram o ensino médio de 1 a 5 anos. A maioria são trabalhadores

que ganham de 1 a 2 salários mínimos. Conforme demonstram os gráficos abaixo:

GRÁFICO - 1 Percentual de alunos de acordo com o sexo:

0

10

20

30

40

50

60

total-49 alunos

21 homens

28 mulheres

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GRÁFICO - 2 Distribuições de alunos por idade e sexo:

GRÁFICO - 3 Distribuição de acordo com tempo de conclusão do Ensino Médio:

GRÁFICO - 4 Percentual de alunos de acordo com o tipo de escola que concluíram o

Ensino Médio:

GRÁFICO -5 Percentual de alunos que exercem e não exercem atividades remuneradas

e médias salariais

* 31 alunos que exercem atividades remuneradas

02468

1012

21

homens

17 a 20 anos

20 a 35 anos

35 ou mais

0

2

4

6

8

10

12

14

16

28

mulheres

17 a 20 anos

20 a 35 anos

35 ou mais

0

10

20

30

Mulheres

1 a 5 anos -26

alunas

5 a 10 anos-2

alunas

10 ou mais anos

- 0 alunas

0

10

20

30

40

50

49

alunos

32 E.estadual

17-E.municipal

0-particular

0

20

40

60

80

49

alunos

31 trabalham

18 não trabalham

05

1015

2025

30

28 alunos ganhamde 1 a 2 salários

3 alunos ganham de3 a 4 salários

0 alunos ganham de5 ou mais salários

0

5

10

15

20

Homens

1 a 5 anos - 16

alunos

5 a 10 anos - 2

alunos

10 ou mais anos

- 3 alunos

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Como era de se esperar, ao analisarmos o perfil do estudante Prevestiano observamos

que estes, são alunos trabalhadores ainda jovens que ajudam no sustento do lar, o que dificulta

a continuidade de seus estudos com qualidade. Entretanto, nos preocupa essa constatação,

visto que, nessa faixa etária esses jovens deveriam estar nas universidades aprofundando seus

conhecimentos em busca da sua profissionalização acadêmica, para enfrentamento do

mercado de trabalho com qualidade. Mas, apesar das dificuldades enfrentadas por estes

alunos, percebemos neles uma busca pelos seus ideais, ante a possibilidade da conquista do

diploma universitário promovido pelo acesso ao PREVESTI.

Outro fato que nos chama a atenção é perceber que as diferenças e as desigualdades

sociais atingem em maior número o grupo de mulheres. Apesar da emancipação da mulher na

luta pelo poder e reconhecimento, notamos que os gráficos acima demonstram de uma

maneira geral que as mulheres negras estão em desvantagens em relação ao homem negro,

seja pelo acesso à educação ou pelo ganho salarial.

Essa diferença ainda são resquícios dos estereótipos fortemente vinculados ainda pela

ideologia machista que ainda se encontra de tal forma naturalizada em nossa cultura. O que

dificulta perceber o importante papel da mulher na sociedade. Verifica-se então que a mulher

negra “representa um acúmulo de lutas, indignação, avanços e um conflito constante entre a

negação e a afirmação de suas origens étnicos raciais. De certa forma a mulher em geral

“representa também suportar diferentes tipos de discriminação”(Gomes ,p.115,1995).

Por outro lado, percebemos transformações ocorrendo, vemos mulheres

desempenhando funções antes ocupadas apenas por homens, mas ainda há uma forte

desproporcionalidade na divisão de poder e de ganhos, que quase sempre desfavorece as

mulheres como demonstra o gráfico 5.

3.2 Visão representativa do PREVESTI

É relevante observar que o fazer parte do PREVESTI, evoca a esses jovens,

representações positivas de esperança, configuradas por eles como: “porta aberta para a

universidade”, ”estabilidade financeira”, ”qualidade de conhecimento”, ”oportunidades de

mudanças”, ”garantia de futuro melhor”, ”aperfeiçoamento”, ”qualificação de pessoas negras

e carentes”. È possível perceber por estas configurações a busca pela reestruturação dentro da

sociedade, pois buscam no PREVESTI ferramentas de suporte, que os fortaleçam na quebra

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de barreiras preestabelecidas pelas divisões sociais e raciais. E que deixa claro que a escola

com suas propostas pedagógicas desvinculadas da realidade a que vivem não os habilitam

para atender suas demandas e ao mesmo tempo sobressair da sua condição de

desfavorecimento. Segundo Cavalleiro (2001), a escola veicula uma cultura de que crianças e

jovens negros não serão bem-sucedidos, desenvolvendo neles uma consciência fatalista de

fracasso, pois não validam suas experiências e sua história no cotidiano escolar. O que

também foi constatado por Rosemberg (1998), que diz que existe uma escola diferente para

pobre que:

Em vez de disporem de melhores recursos, essas escolas apresentam-se

exatamente ao contrário: os alunos carentes estudam em escolas onde a

jornada é mais curta, o número de turno é maior, a rotatividade do

professor é mais frequente, as possibilidades de sucesso, enfim menores.

Não são simplesmente, como alega a classificação da Secretaria de

Educação, escolas de carentes, muito menos escolas para carentes: são

escolas carentes. (FÚLVIA ROSENBERG, p.81, 1988 apud LIA

ROSENBERG (1981)).

Essa dimensão representativa do PREVESTI, que inclui a reestruturação do ser

enquanto sujeito de valores e de ser capaz diferentemente do que acontece nas escolas,

devolve a estes alunos uma perspectiva significativa na sua escolha profissional ou formativa,

provocando visões incentivadoras de que a concretização de mudanças vem também a partir

do nosso entendimento dessa necessidade. Visão que podemos observar na resposta de uma

das alunas entrevistadas. “O que me levou a procurar (o PREVESTI), foi à vontade de

melhorar de vida. Não ser igual aos meus pais que não teve chance de estudar. Eu tenho,

porque não estudar?”(R. P.20 anos)

Ou mesmo a necessidade de fazer a diferença, onde a inovação aliada à pesquisa são

quesitos de sucesso no universo de transformações, como pondera a aluna K.X (21) anos “Já

pensei em inventar algum tipo de remédio para acabar com o efeito das drogas”.

Por outro lado, estes universos simbólicos vinculados ao PREVESTI, evidenciam o

seu diferencial de educação que empreende:

O diferencial do PVNC em relação às outras propostas educacionais,

provavelmente, é destacar, nas suas ações, a implementação de uma

representação social positiva de negros e carentes, até então inserida

numa pedagogia do fracasso nas escolas formais. O conteúdo simbólico

do PVNC, para esses sujeitos/agentes, produz novas percepções de si

mesmo, assim como os auxilia na avaliação de suas trajetórias de vida e

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no seu desempenho escolar. (NÉLIA REGINA DOS SANTOS, p-6,

TESE MESTRADO).

É evidente que este diferencial por si só não confere a estes alunos ser

empreendedores, mas já é o pontapé inicial, da provocação empreendedora existente nesses

alunos. Todos têm sonho e desejo, mas falta a ferramenta principal para legitimá-los.

Ferramenta esta, que passa por uma boa educação, pois supõe que esta qualificação

educacional já esta integrada a características significativas do que se espera de um bom

profissional no mercado de trabalho: autoconceito, autoconfiança, visão destemida do futuro,

inovação, potencial criativo, e conhecimento. Estes significados socialmente objetivados ou

subjetivados pelo mundo do trabalho na concepção do Prevestiano podem vir a ser

cristalizado por meio do PREVESTI, o que se torna fundamental para o planejamento de suas

ações e dessa forma poderão colocá-los em prática.

3.3 - Perspectiva de inserção sócio profissional do Prevestianos: a busca pela

carreira

Quanto à inserção sócio profissional é relevante observar as escolhas apresentadas

pelos alunos Prevestianos. Analisando suas respostas, percebemos que dos quarenta e nove

entrevistados, apenas seis apresentam falta de expectativas quanto ao campo profissional.

As escolhas desses alunos passam por áreas das ciências exatas, humanas e biológicas,

conforme apresenta o gráfico abaixo:

A classificação por área ficou assim distribuída:

0

5

10

15

20

área de

escolha

13 Exatas

20 Humanas

10 Biológicas

6 não sabem

0

2

4

6

8

10

Exatas

10-engenharia

2-quimica

1-agronomia

0

1

2

3

4

5

Biológicas

5-pscicologia

3-biologia

1-veterinário

1-odontologia

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As carreiras enumeradas pelos alunos como referência de projeto de afirmação

profissional e social tem concentração maior nas áreas de humanas, mas o curioso é que se

formos somar as carreiras escolhidas, notaremos que um grande percentual dos alunos

direcionou sua possível formação acadêmica às consideradas de grande ascensão no mercado

de trabalho como: Engenharia, Direito, administração, química, agronomia, biologia,

veterinária. Estas escolhas podem estar associadas a várias concepções de sucesso, as quais

podem ser: bem estar, bens materiais, dimensão global da inserção, afirmação, estabilidade,

empreendedorismo, educacional ou necessidade de serem aceitos através do exercício de

funções importantes ou empregos considerados bem remunerados. Tal qual evidencia a fala

do aluno V.P.(25 anos) ao relatar seu projeto de vida “Penso em fazer uma Faculdade de

Direito e sonho em dar o melhor para minha filha”. Cursar uma faculdade de Direito pode

significar para estes alunos, um maior conhecimento do que são seus direitos e fazer valer no

futuro. Vivem substancialmente o direito de ser cidadãos, sua vida cotidiana mostra como é a

realidade efetiva da prática social dos direitos normatizados na Constituição, “segregada”.

Entretanto as escolhas nos revelam que esses alunos já conhecem a dura realidade que

os espera caso não tenham oportunidades como a oferecida pelo PREVESTI, pois percebem

que não tem qualificação suficiente para competir no mercado de trabalho e sua condição

social e etnia são alvos de preconceito e discriminação constantes e uma boa carreira por um

lado, pode significar ruptura da estrutura social a qual vive ou afirmação no mercado de

trabalho, pois sabem que pelas condições de pertença e situação econômica, suas chances de

sucesso são bem menores do que de outros grupos sociais. Como analisa Rosemberg.

0

2

4

6

8

10

Humanas

9 direito

6 administração

1 serv.social

2 pedagogia

1 com.social

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Os nãos brancos estão expostos à discriminação no mercado de trabalho

e, de um modo geral, enfrentam uma estrutura de oportunidades sociais

que os colocam em desvantagens relativamente ao grupo branco (...).

Portanto, sabemos que as chances de vida inferiores a que pretos e

pardos estão expostos, em decorrência do racismo passado e presente,

começam no momento da concepção e acompanham as pessoas ao longo

de todo o seu ciclo de vida. (FULVIA ROSEMBERG, 1998, apud

HASENBALG, 1992, p.12).

Nesse contexto indiferente à dignidade humana, O PREVESTI, representa para esses

egressos um simbolismo de plenitude humana, o encontro do ser com o querer ser, a garantia

de conhecimento e qualificação, pois ter uma profissão é superar a pobreza e a exclusão

social.

4– CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Por intermédio das relações coletivas vivenciadas pelo Prevestiano no espaço do

PREVESTI, observa-se que estes criam um universo simbólico de intenções, criada a partir de

sua relação vivencial dos valores construído socialmente como estrutura de sucesso e poder.

Tal fato acontece porque o PREVESTI configura um espaço de significações positivas, para

grupos discriminados pelo fator social e racial.

Nessa conjectura, o fator preponderante para a sedimentação desse simbolismo se

passa pelo viés da educação oferecida pelo curso como reforço educacional, pois para uns a

inserção pode vir pela via universidade ou pela forma de estabilidade mediante aprovação em

concurso público.

Por outro aspecto, os depoimentos nos permitiram observar aspectos relevantes da

cultura empreendedora dentro do PREVESTI, dentre eles a contribuição de êxito dos alunos

oriundos dos estratos sociais e discriminatórios. Só o fato de eles estarem ali, suscitam

significativos sentidos de mudanças e transformações: desejam ser ardentemente alguma coisa

(sonho), querer algo e saber o que é necessário pra chegar lá (ferramentas), o caminho que

liga o ser ao querer ser (desejo), autorrealização (carreira profissional), conhecimento

(inovação). Pelo depoimento da aluna R. P.C (22 anos) pode-se perceber esta construção:

Meu projeto de vida é ter uma empresa no futuro. Já pensei em como

realizá-lo, 1ª estudar no PREVESTI para passar em Engenharia de

produção, 2º fazer uma Pós-graduação em segurança do trabalho, 3º

montar esta empresa.

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Compreender a importância desse desejo de reconhecimento permite entender que o

Prevestiano reclama não apenas o reconhecimento de sua dignidade, mas também do status do

seu grupo étnico ou social. “Essas duas formas de reconhecimento estão estreitamente ligadas,

pois o reconhecimento estruturado na ideia de inferioridade relativa de uma raça, cultura ou

origem étnica é, ostensivamente, um não reconhecimento ou um reconhecimento inadequado

da pessoa ou do grupo a que este pertence”. (D’Adesky, p.193, 2001).

De modo estruturado o fazer do PREVESTI ativa o sentimento de pertença e utiliza

como instrumentos de recuo das desigualdades tão visíveis em nossa sociedade, os ideais

empreendedores, aumentando a oportunidade desses alunos a obterem empregos e posições de

prestígio alterando o quadro de mobilidade social.

Há, comumente, exemplos suficientes de brilhantes vitórias sobre as

barreiras de cor para garantir as ilusões otimistas de que elas não

existem. Casos exemplares de pessoas de cor em posições de dignidade

invejável estão sempre à disposição. (CARLOS A. HASENBALG, 1979,

p.197-apud OLIVER C. Cox, Caste, Clas and Race).

O que importa, por fim, é se despojar das falsas ilusões otimistas e buscar a plena

igualdade humana.

Outro aspecto relevante a pesquisar, seria verificar quantos alunos passaram pelo

PREVESTI, do quantitativo qual seria a percentagem que conseguiu acesso universitário?

Como se apresentam hoje os ex-Prevestianos frente ao mercado de trabalho? Houve

crescimento pessoal e social? Qual seria o relato dos professores em relação aos ex-

Prevestianos.

REFERÊNCIAS

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