angelina assis (coleção educadoras baianas)

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Page 1: Angelina Assis (coleção educadoras baianas)

Nasceu no dia 27 de junho de 1915, em Palmas de Monte Alto, no município baiano de Caetité, filha de Pedro Pinto de Carvalho Rocha e de Maria da Conceição Rocha, sendo prima do educador Anísio Teixeira, com quem mantinha estreito contato, tanto por questões de parentesco quanto por ideais educativos.Seu perfil ético e estético se identificava com o de educadora da época: dedicação total à causa da educação, a ponto de torná-la um verdadeiro sacerdócio. O modelo de Angelina pessoa se confundia com o da educadora e centrava-se principalmente na postura moral: com firmeza, determinação e austeridade, apesar de ser solidária, companheira e bondosa.“Era uma pessoa interiormente muito bonita, exteriormente muito elegante, ela sempre dizia que professor de jardim de infância tinha que se apresentar bonito para as crianças” (ex-professora da Escola Baronesa de Sauipe). Dentre suas características também há quem a considerasse tímida, apesar de ser uma presença marcante e muito apreciada onde quer que fosse. Nos congressos nacionais e internacionais, ela sempre ocupava lugares de destaque, como participando de mesas redondas, de debates teóricos e cargos de direção. Sua seriedade e competência profissionais eram reconhecidas pelas autoridades da área da educação, resultando em um tratamento especial. Além de ter

ocupado o cargo de diretora de uma escola pública (Baronesa de Sauipe) durante toda a vida, tinha trânsito livre na Secretaria de Educação. Sua ingerência nos órgãos públicos também é visível em lutas que travou, como por exemplo, na década de 70, quando a Lei 5692 não contemplou a obrigatoriedade do ensino pré-escolar, ela reivindicou junto ao Secretário de Educação da época na Bahia e exigiu dele uma tomada de decisão. Sua exigência consistia em fazer com que o Estado da Bahia tornasse essa etapa de formação obrigatória, o que seria difícil, pois ia de encontro à lei maior e exigia alto investimento. Até uma semana antes do seu falecimento, acometida por um câncer que se generalizou por todo o organismo, manteve-se no cargo de diretora, supervisionou atividades pedagógicas, visitou salas de aula, andando pelos corredores apoiada em fiéis companheiras de trabalho. “[...] Faleceu no dia 15 de dezembro de 1988. Os jornais noticiaram o fato, afirmando que o corpo seria velado na escola Baronesa de Sauipe. Também afirmaram que a educação estava perdendo um dos seus baluartes, conforme a passagem seguinte, do jornal A Tarde do dia 23 de dezembro de 1988: “[...] com a morte de Angelina Rocha de Assis, em 15 de dezembro, a Bahia acaba de perder uma das pioneiras da educação pré-escolar, que lutou a vida inteira pela manutenção do alto padrão, e de extrema dedicação à causa da educação”. ISBN 978-85-232-0647-5

Elizete Passos é Professora Universitária, pesquisadora e escritora. Licenciada em Filosofia, Mestra e Doutora em Educação, há muitos anos vem pesquisando sobre a educação feminina na Bahia e orientando teses e dissertações sobre o assunto. Acerca da temática, tem vários livros e artigos, destacando-se os seguintes livros: O feminismo de Henriqueta Martins Catharino, Mulheres moralmente fortes, De anjos a mulheres, A educação das virgens e Palcos e platéias.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAReitor

Naomar Monteiro de Almeida Filho

Vice-reitorFrancisco José Gomes Mesquita

Editora da Universidade Federal da BahiaDiretora

Flávia Goullart Mota Garcia Rosa

Conselho EditorialÂngelo Szaniecki Perret Serpa

Caiuby Alves da CostaCharbel Ninõ El-Hani

Dante Eustachio Lucchesi RamacciottiJosé Teixeira Cavalcante FilhoMaria do Carmo Soares Freitas

SuplentesAlberto Brum Novaes

Antônio Fernando Guerreiro de FreitasArmindo Jorge de Carvalho Bião

Evelina de Carvalho Sá HoiselCleise Furtado Mendes

Maria Vidal de Negreiros Camargo

Faculdade de Educação da UFBADireção

Celi Nelza Zulke Taffarel

Vice-direção Iracy Silva Picanço

Coordenação da Pós-graduaçãoRobinson Tenório

Vice-coordenação José Albertino Lordelo

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Coleção Educadoras Baianas

Elizete Passos

EDUFBA – FACEDSalvador – Bahia

2009

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EDUFBARua Barão de Jeremoabo, s/n

Campus de Ondina40170-115 - Ondina, Salvador - BA

Tel: (71) 3283-6164Fax: (71) 3283-6160www.edufba.ufba.br

[email protected]

FACEDPrograma de Pós-graduaçãoAv. Reitor Miguel Calmon, s/n, Vale do Canela 40110-100 - Salvador - BATels: (71) 2637262/2637269/[email protected]

©2009, by EDUFBA – FACED

RevisãoTania de Aragão Bezerra

Magel Castilho de Carvalho

Projeto gráfico: capa e mioloAngela Dantas Garcia Rosa

FormataçãoJeferson Bezerra

Arte-finalizaçãoGenilson Lima

Sistema de Bibliotecas - UFBA Passos, Elizete. Angelina de Assis (1915-1988) / Elizete Passos. - Salvador : EDUFBA : FACED, 2009. 76 p. - (Coleção educadoras baianas) ISBN 978-85-232-0647-5

1. Assis, Angelina da Rocha de, 1915-1988. 2. Educadoras - Bahia - Biografia. I. Série. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educação. III. Título.

CDD - 923.7

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Sumário

7 Apresentação

13 Angelina da Rocha de Assis:dados biográficos

21 Reconhecimento social

27 A educadora

33 Formação

35 Conhecimento sobre a psicologia infantil

37 Valores morais e atitudes pedagógicas

43 A Escola Baronesa de Sauípe

43 Jardim de infância

46 Clientela

48 Metodologia adotada

57 Orientação Religiosa

58 Co-educação

60 Relação da escola com os famílias

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65 A Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar – OMEP

69 Capacitação de professores

72 Referências

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A Coleção Educadoras Baianas compõe-se de 08 livros1 des-tinados aos cursos de Pedagogia, Magistério Superior e demais cursos de formação de professores, bem como a pessoas que se interessem pela História da Educação e pelos estudos de gênero.

A escolha das educadoras que são estudadas em cada um de-les: Amélia Rodrigues (1891- 1926), Maria Luiza de Souza Alves (1862-1945),Guiomar Muniz Pereira (1895-1956), Anfrísia San-tiago (1894-1970), Angelina de Assis (1915-1988), Irmã Queru-bina (1921), Candolina Rosa de Carvalho 1921-1973) e Leda Jesuíno (1924) se deu após a realização de uma pesquisa explora-tória onde foram entrevistadas pessoas estudiosas da história da Bahia e da educação baiana, assim como levantamento e análise dos nomes de mulheres dados a escolas, bem como pesquisa em jornais da época.

A intenção era trabalhar com educadoras que se destacaram no cenário educacional, a ponto de serem lembradas e reveren-ciadas ainda hoje, pois nos interessava saber o que as tinha feito chegar a esse lugar de destaque numa sociedade em que o es-paço público vem sendo destinado ao sexo masculino. Também procurávamos saber se elas eram provenientes de famílias de destaque social; se foram coerentes com os princípios, papéis e espaços concedidos ao sexo feminino ou se tiveram a “ousadia” e

Apresentação

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coragem de romper com o estabelecido e escreverem sua história, mesmo que fosse em uma área tradicionalmente feminina, como a educacional. Outras categorias referentes à sua formação foram agregadas: que autores as influenciaram? O que produziram com o conhecimento adquirido? Que trajetória fizeram?

Os livros retratam a saga de cada uma delas, com suas cir-cunstâncias, facilidades e entraves, por isso, possuem tamanhos que variam, apesar da nossa decisão ter sido por escrever textos sucintos, desde que não prejudicassem sua qualidade.

O trabalho é fruto de investigação cuidadosa e demorada em documentos, jornais, livros, resenhas e revistas; mas, principal-mente da história oral. A ausência de qualquer tipo de trabalho sistematizado sobre muitas delas nos fez entrevistar dezenas de pessoas, entre ex-alunas, companheiras de trabalho, mães, pais, dentre outros depoentes.

O que não teria sido possível se não tivéssemos contado com uma equipe de auxiliares de pesquisa, estudantes dos cursos de Filosofia, História, Sociologia e Pedagogia2; com o apoio do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM); da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal da Bahia, através do PIBIC; assim como do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPQ), com a concessão de Bolsas de Iniciação Científica e de Produtividade em Pesquisa.

Em todos eles, trabalhamos com a memória histórica e so-cial, a partir da memória individual e coletiva. O que à primeira vista pode parecer de menor importância, entretanto, um exame acurado vai revelar seu significado e alcance. Não é à toa que Le Goffe (1996, p. 426), afirma que:

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[...] tornarem-se senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas. Os esqueci-mentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva.

Compactuando com esta tese, inferimos que conhecer o ideal de mulheres/educadoras, a partir do seu corpo de saberes e dos seus valores morais, daquilo que foi revelado ou escondido na sua prática educativa, do que foi valorizado ou não pela socieda-de, saber o porque elas foram destacadas e se estavam conscientes da relação entre os meios e os fins da sua ação educativa, é uma forma de desvelar sentidos, abordar valores e entender o contex-to sócio-histórico.

A Coleção Educadoras Baianas fecha um ciclo de estu-dos que vimos realizando desde meados da década de 80 sobre a educação da mulher baiana, tendo como um dos objetivos re-cuperar a memória da educação feminina, por acreditar que a prática educacional é uma das principais fontes de manutenção das desigualdades de gênero ou de sua superação.

Nesse empenho, realizamos vários estudos de caso tomando como objeto os colégios considerados matrizes formadoras da mulher na Bahia, tais como: o Instituto Feminino da Bahia, O Colégio Nossa Senhora das Mercês, A Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia e a Faculdade de Filosofia, da mesma Universidade.

Com isso, acreditamos ter cercado a questão por todos os la-dos e, assim, ser possível, a partir da recuperação dessa memória, entender os silêncios e as falas, a que e a quem eles vêm servindo.

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Intentamos com isto auxiliar na implementação de ações edu-cativas em novas bases, onde a diferença não seja tomada como desigualdade, nem a educação seja transformada em instrumento de manutenção da mesma.

O presente livro e os demais que fazem parte da Coleção compõem essa trajetória e objetivos, porém, vão além, pois pro-curam abarcar a educação feminina na Bahia no presente século, após já termos estudado instituições educacionais voltadas para a educação feminina, termos mapeado o seu cotidiano, suas for-mas de disciplinamento e de poder e o tipo de mulher que elas produziram, volta-se agora para a figura da educadora, visando conhecer seu ideal educativo, sua consciência pedagógica, suas representações sociais.

Quase todas representam um modelo de educação tradicional, centrado na figura do educador e solidamente fundamentado em valores morais inspirados na religião católica, onde a educadora tinha como papel servir a Deus e transmitir valores e ensinamen-tos religiosos. Algumas registraram suas idéias e convicções sobre a educação em artigos e livros, como Amélia Rodrigues, Maria Luiza de Souza Alves e Leda Jesuíno, mas todas elas os pratica-ram com determinação e suas marcas são indeléveis nas pessoas que tiveram a oportunidade de conviver com elas na condição de alunas, colegas de trabalho ou colaboradoras.

Quanto ao sexo feminino, acreditavam que sua natureza era feita de amor, amor incondicional, amor materno. Não coloca-vam limites entre a mulher e a mãe, tão intrincada era a relação que elas estabeleciam entre as duas. A imagem da mulher mãe traçada por quase todas se distancia do ser humano e se aproxi-

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ma de entidades divinas. As expressões usadas por algumas delas para defini-la são esclarecedoras: “figura radiosa”, “bendita”, “su-blime”, “sacrificada”.

O estudo sobre essas e outras educadoras que continuam na mente de muitas pessoas, mas se perdendo na poeira do tempo, há muito se fazia necessário. Através delas desvendamos muito da nossa história, em especial da história da educação baiana e brasileira, sem contar que elas são matrizes da formação de gera-ções e gerações e segredam muito do que fomos e somos.

Notas1 No momento estamos apresentando ao público 06 deles, os dois restantes

sobre as educadoras Maria Luiza de Souza Alves e Irmã Querubina estão em fase final de redação.

2 Como foram muitos, uma vez que ingressaram na pesquisa um número sig-nificativo, pois fazia parte da política do Núcleo de Estudos Interdisciplina-res sobre a Mulher (NEIM) capacitar novos pesquisadores; e participaram do trabalho em momentos distintos, preferimos não nomeá-los a fim de não cometer injustiças.

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Nasceu no dia 27 de junho de 1915, em Palmas de Monte Alto, no município baiano de Caetité, filha de Pedro Pinto de Carvalho Rocha e de Maria da Conceição Rocha, sendo prima do educador Anísio Teixeira, com quem mantinha estreito contato, tanto por questões de parentesco quanto por ideais educativos.

Os jornais da época1 dão conta que nesse período o país discutia o nacionalismo e não estava satisfeito com o caminho demagógico tomado pelas elites políticas, sem nada reverter em ações concretas em defesa da pátria, da sua governabilidade e do bem-estar social2. Tam-bém eram criticadas as atitudes políticas, consi-deradas destoantes da ética.

Os baianos faziam coro com essas queixas nacionais, mas agiam de forma discreta e cau-telosa, sob a ótica da mídia escrita local. Não silenciavam diante dos problemas do Estado e solicitavam serem tratados com a mesma de-ferência concedida a outros estados, especial-mente no tocante à distribuição de recursos

Angelina da Rocha de Assis: dados biográficos

Era uma pessoa interiormente

muito bonita, exteriormente muito elegante, ela sempre dizia que o professor

de jardim de infância tinha que

se apresentar bonito para as crianças.

(ex-professora da Escola Baronesa

de Sauípe)

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oriundos do governo federal.Os problemas econômicos vividos pelo Estado da Bahia eram explicitados, dentre outros, através de reivindicações populares, como aconteceu no ano de 1920, pelos operários da Avenida Oceânica, recomendado pelo sindicato, em prol de melhores salários.3

Nos anos 20 do século passado, os jornais também falavam da intenção da política baiana seguir os princípios éticos, iniciando pela escolha de políticos e pessoas para cargos públicos, tomando como critério competência e honestidade dos candidatos em de-trimento do partido e da linha política por eles seguida. Situação que configura em acordos, como o firmado entre governistas e oposição para a eleição de Miguel Calmon para o Senado.

Nesse contexto e tendo apenas dezenove anos, Angelina con-traiu matrimônio com Osmar Veiga de Assis, homem doente que veio a falecer seis meses após o casamento, mas foi considerado seu companheiro para sempre, pois ela guardou sua memória, mantendo-se viúva por toda a vida. A sublimação do amor inter-rompido deu-se através da educação, causa que se tornou a sua razão de ser e de viver.

Fisicamente ela era considerada uma mulher bonita e atraente, assim como bem apresentável, o que lhe rendeu a corte de vários pretendentes, inclusive pessoas de destaque político e social. Di-zem que sua negativa vinha sempre acompanhada da explicação:

“eu queria era aquele esposo e ele não pode ficar” 4. Apesar do pouco tempo de duração do matrimônio, ela se di-

zia realizada nas questões do amor e resolveu dedicar-se ao que chamava de um amor maior, aquele que atingisse um maior nú-mero de pessoas, tornando-se diretora vitalícia de uma escola da

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rede pública de ensino, como trataremos em outro momento.Até uma semana antes do seu falecimento5, acometida por um

câncer que se generalizou por todo o organismo, manteve-se no cargo de diretora, supervisionou atividades pedagógicas, visitou salas de aula, andando pelos corredores apoiada em fiéis compa-nheiras de trabalho.

[...] quando ela chegou em minha sala já tava caminhando com Conchita e Belita do lado, com a mão sustentando muito porque ela tava, né, bem debilitada. [...] e assim, no último momento ela ainda não se entregava como doente, entendeu? Tanto é que as pes-soas, algumas pessoas receberam como novidade essa coisa dela ter morrido assim, era câncer e tudo, porque naquela época até o câncer era uma coisa que não dava tanto destaque como hoje, né? (Depoi-mento de uma ex-professora da escola Baronesa de Sauípe)

Educacionalmente, a década de 30 é caracterizada pelos jornais da época como “defeituosa e falha” 6. As críticas recaiam sobre a organização do ensino e as constantes reformas a que ele sofria eram responsáveis pelo seu maior enfraquecimento. Dentre elas, os jornais locais registraram a reforma do ensino secundário que acrescentava a ele mais dois anos de Curso Anexo e a obrigatorie-dade do exame vestibular para o ingresso no ensino superior. O assunto foi discutido pelos alunos secundaristas que realizaram reuniões em escolas importantes da capital baiana, como o Gi-násio Carneiro Ribeiro, para protestarem contra as medidas da pasta da educação7.

Outras questões ocuparam as discussões educacionais da épo-ca, como a educação feminina.

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A mentalidade coletiva não duvidava que o lugar da mulher era no lar e seu principal papel manter a estrutura familiar, ge-rando e nutrindo os filhos e servindo ao marido. Para isso elas precisavam ser educadas, preparadas para saberem prender os homens, condição da existência da vida familiar socialmente im-prescindível. Escreveu Júlio Dantas, sob o título: Conselhos de Ninon, no jornal A Tarde do dia 09 de maio de 1935:

[...] para uma mulher, quem quer que ela seja, é sempre fácil des-pertar o interesse de um homem: mas é muito difícil mantê-lo [...]. [...] de um lado, a tendência natural do homem para evadir ou de dispersar, do outro, a luta da mulher para o fixar, para o prender, para o seduzir, cada vez mais à esfera da sua influência sentimental. O futuro do lar, visto que a tendência para a dispersão é própria de todos os homens, depende, por conseguinte, do poder de atração, de captação, de sugestão amorosa, de absorvente simpatia da mulher que é, afinal, a frágil criatura sobre cujos ombros delicados todos os lares repousam.

Apesar do peso que adjudicam à natureza humana, respon-sável sob a ideologia corrente, pela tendência do homem para a aventura e da mulher para a estabilidade; do homem para as questões da razão e da mulher pelas do coração, cumpre a educa-ção um importantíssimo papel, à altura da responsabilidade que delegam ao sexo feminino: a “estruturação do lar”.

Esse seria um motivo mais do que determinante para a socie-dade apostar na educação da mulher, entretanto, outro de grande monta se agrega a ele: o “moralismo” reinante na sociedade baia-na. Em nome dele, havia quem advogasse a urgência em minis-trar formação às mulheres, inclusive técnica, a fim de fazer frente

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a separações, provocadas pela “natureza” masculina, deixando as mulheres vulneráveis a atitudes “desonestas” 8.

Também à educação delegam a responsabilidade por fazer frente à outra dimensão do que consideravam natureza feminina: a frivolidade. Essa as fazia entreterem-se com assuntos munda-nos, de pouco valor espiritual e moral, como a leitura de roman-ces pouco recomendados e a apreciação de filmes também de valor duvidoso9, desaconselháveis a quem viria a ter ou já estaria desempenhando os “nobres” papéis de mãe e esposa. O exercício dessas funções era excludente com quase todas as demais, com exceção a de professora das séries iniciais, atribuição historica-mente conferida às mulheres, por ver nela uma extensão das fun-ções domesticas e afeita à suposta natureza da mulher. Angelina também foi preparada para assumi-las, mas na impossibilidade de ter as duas dedicou-se integralmente a uma. Nos anos cin-qüenta, quando ficou viúva, passou a morar com uma irmã e so-brinhos e a se dedicar integralmente à educação, através da Escola Baronesa de Sauípe10.

Sua dedicação à educação é confirmada das mais diversas for-mas. As professoras e auxiliares de serviços gerais que conviveram profissionalmente com ela falam que não havia limites entre sua vida particular e profissional. Usava o seu próprio dinheiro para comprar merenda para a escola e material didático, colocava-se disponível para servir a todos em suas dificuldades materiais ou de ordem emocional e espiritual, a ponto de emocionarem-se ao relembrar de situações vividas ao lado da educadora.

Como expressou uma ex-servente11 da Escola Baronesa de Sauípe, ao ser entrevistada:

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[...] era uma pessoa muito boa, em todos os sentidos, era sobre a me-renda, o que tivesse precisando aqui ela comprava pra dar às crianças. Falta isso, falta aquilo, ela aí tava ali com o dinheiro dela, ela mesma comprava pra não fazer falta às crianças, a vida dela era essa.

Pessoalmente, se é possível falar dela como pessoa, separado da profissional, sua imagem é de uma pessoa íntegra, atenciosa, bom caráter, amiga, determinada, exigente. Alguém em quem se podia confiar, pois agia com ética e sem preferências. Vejamos alguns depoimentos:

[...] nós chegávamos lá -“Bom dia”, ela nos recebeu muito bem, era uma pessoa extremamente atenciosa, né, carinhosa. Tinha aquela coisa, e mesmo sem conhecer a gente ela já nos tratou bem. ( Ex-professora)

[...] ela também era uma pessoa assim extremamente exigente, en-tão, ela elogiava, ela parabenizava, mas também ela exigia, né, ela exigia um trabalho com afinco, com amor, né, ela dava subsídio pra isso. (Ex-professora da Escola Baronesa de Sauípe)

[...] como pessoa, era assim humana, determinada, assim, exigente nas obrigações, nos deveres, mas compreensiva nos direitos, enten-deu. Tudo você tinha razão, tudo o que a você era devido, ela não, como se diz, se omitia nem cobrava. Era uma pessoa, digamos assim, uma alma que a gente podia dizer, assim, digna [...]. (Ex-aluna e ex-assistente social da Escola Baronesa de Sauípe)

Dentre suas características também há quem a considerava tímida, apesar de ser uma presença marcante e muito apreciada onde quer que fosse. Afirmam as informantes que nos congres-

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sos nacionais e internacionais ela sempre ocupava lugares de des-taque, como participando de mesas redondas, de debates teóricos e cargos de direção12.

Seu perfil ético e estético se identificava com o de educadora da época: dedicação total à causa da educação, a ponto de torná-la um verdadeiro sacerdócio. Como diz Nóvoa (1991), desde o século XVIII países da Europa passaram a se preocupar com o perfil do educador. Questões como: o melhor é o religioso ou o leigo? O mais apropriado e competente é aquele vinculado so-cialmente ou o que se isola, passaram a fazer parte do debate no âmbito educacional.

O modelo de Angelina pessoa se confundia com o da educa-dora e centrava principalmente na postura moral. Atitude que era exigida da educadora da época, pois além de tomarem a educação como o fim da vida, colocavam-se como exemplo a ser seguido pelos alunos, de modo que não podiam demonstrar qualquer tipo de falha moral, assim como insegurança ou incoerência. Diante do que, agiam com firmeza, determinação e austeridade, apesar de demonstrarem solidariedade, bondade e companheirismo, muito à moda da moral cristã.

Outros depoimentos dão conta que ela era um exemplar des-sa moral:

[...] ela era uma pessoa muito íntegra, como se diz, íntegra como no tempo antigo, entendeu, ela era enérgica, íntegra, mas era muito jus-ta e muito entusiasmada pelo que ela fazia. Quando ela queria fazer uma coisa ela ficava em cima, insistia, insistia, dizia: eu sei que estou sendo insistente demais, mas é porque precisa, temos que fazer isso e fazer aquilo [...]. (Depoimento de uma companheira de trabalho)

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A ânsia por ver seus projetos realizados a fazia, além de de-terminada, enérgica, íntegra e insistente, ser incansável, incenti-vadora, dedicada, sincera e até autoritária. Dizem que após ouvir as pessoas, ela acabava fazendo do seu jeito, pois lutava por suas idéias até vê-las realizadas.

Também sua integridade é uma das características mais mar-cantes e lembradas por quem a conheceu. Era professora até o fim, amiga até as últimas conseqüências, solidária sem restrições, para citar apenas alguns exemplos.

[...] era uma pessoa muito boa, muito dedicada, muito sincera, tinha que ser [...] era como tinha que ser: muito exigente. (Depoimento de uma ex-professora e colaboradora de Angelina)

Enfim, dizem que ela era uma pessoa inesquecível, um ser completo, de forma que não dava para separar a profissional da pessoa e a razão da emoção. Como confirma o argumento a seguir:

[...] Ela, Angelina, era uma das pessoas indescritíveis e inesquecí-veis. Angelina era uma pessoa, eu não sei separar a pessoa, a amiga da profissional, porque nela havia uma integração, porque era uma pessoa de muito caráter, de muito ideal, então, nela havia uma per-feita integração, não dava para separar. (Depoimento de uma mãe de aluno da escola dirigida por ela)

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Reconhecimento social

Apesar de ser reconhecida a forma como os cargos públicos historicamente vêm sendo usados para fins e interesses espúrios, a educadora foi mantida na direção de uma escola pública esta-dual ao longo de cinqüenta anos. Dizem que apesar dela não ter vínculos com nenhum partido político, “sua” escola era visitada por políticos e suas esposas pelo valor intelectual e moral que a educadora havia conferido à mesma13.

A Escola Baronesa de Sauípe era uma espécie de cartão de vi-sitas para a educação baiana, que recebia especialistas da educação de várias partes do mundo buscando conhecer a experiência de-senvolvida naquela instituição. A surpresa começava pela ordem, limpeza e zelo que a escola apresentava, motivando questiona-mentos sobre sua procedência pública. Era uma escola modelo e um campo de pesquisa para muitos estudiosos.

Em 03 de março de 1964, o maior jornal de circulação da cida-de de Salvador publicou uma matéria onde um pai se queixava de ter sido injustiçado no critério de matrícula da Escola Baronesa de Sauípe. O assunto foi rebatido, não pela escola, na pessoa de sua diretora ou pessoas a elas ligadas, e sim por uma pessoa da sociedade que contestou que aquilo pudesse ter ocorrido, consi-derando-se a integridade das pessoas que dirigiam a escola. Den-tre os argumentos arrolados, diz o autor da mensagem pública na coluna “Opinião do Leitor”, do Jornal A Tarde:

[...] trata-se de um dos melhores Jardins de Infância do país, onde primam a organização e a orientação segura e disciplinada da sua diretora, Profª. Angelina Assis.

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Em outro trecho, o redator fala dos motivos pedagógicos que certamente levaram a Diretora à não conceder a matrícula em questão e exige, clama que o Governador da Bahia defenda a di-reção acusada e abra novos jardins de infância nos bairros, se-guindo as instruções seguras da educadora.

Sua seriedade e competência profissionais eram reconhecidas pelas autoridades da área da educação, resultando em um trata-mento especial. Além de ter ocupado o cargo de diretora de uma escola pública durante toda a vida, tinha trânsito livre na Secre-taria de Educação.

[...] ela era muito considerada nos lugares aonde ela ia, quando a gente a acompanhava à Secretaria, ela era assim muito... sobressaía, entendeu? As pessoas reconheciam, davam lugar, chamavam ela, isso e tudo. (Depoimento de uma ex-professora da Escola Baronesa de Sauípe)

Sua ingerência nos órgãos públicos também é visível em lutas que travou, como por exemplo, na década de 70, quando a Lei 5692 não contemplou a obrigatoriedade do ensino pré-escolar, ela reivindicou junto ao Secretário de Educação da época na Bahia e exigiu dele uma tomada de decisão. Sua exigência consistia em fazer com que o estado da Bahia tornasse essa etapa de formação obrigatória, o que seria difícil, pois ia de encontro à lei maior e exigia alto investimento. Mesmo não tendo obtido vitória, nesse caso, foi ouvida e recebeu as explicações que outra pessoa não teria conseguido.

Suas auxiliares de trabalho e pessoas da área da educação que a conheceram não têm dúvidas sobre a moeda usada por Angeli-

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na para ser respeitada pelos poderes constituídos: a competência técnica e sua operacionalidade. Ela detinha um saber sobre um conteúdo que pouca gente se arriscava e o fazia com segurança e determinação. Isso lhe assegurava uma distinção que revertia em tratamento especial das autoridades para com a instituição que ela dirigia.

Notas1 O Imparcial, Salvador; Diário da Bahia; A Tarde, Salvador; dentre outros.

2 Para exemplificar, registramos a matéria de Felipe Freitas, veiculada no jornal O Imparcial do dia 15 de setembro do ano de 1922, que em tom irônico tra-tou o assunto: “- Então, como vai a minha querida mãe, com seus cem anos de existência? – Menos mal filho, menos mal...O Epitácio parece que nasceu mesmo talhado para festejar coisas. É verdade que ele derrete dinheiro, mas a festa sai de arrombe...[...]. – Mas o patriotismo, minha mãe, que tal o amor dos seus filhos? _ Ai, filho, nem me fale nisto, que você me comove. Quantas odes vocês me dedicaram!... Talvez as acabe de ler pelo segundo centenário... se vocês soubessem calcular, como sabem festejar, eu estava emprestando di-nheiro a juros [...]”.

3 O assunto foi noticiado pelo jornal O Imparcial do dia 3 de setembro do ano de 1920, com o seguinte teor:

“[...] O movimento aconselhado pelo sindicato aos operários da Avenida Oce-ânica não surtiu o efeito desejado que era o aumento de salário de 2.500 e 3 para 4 [...] os operários reconsideraram melhor e entraram em acordo com os empreiteiros para receber salário pelo preço do ajuste feito anteriormente [...]”.

4 Depoimento dado por uma ex-professora da Escola Baronesa de Sauípe, que ela dirigiu por toda a vida.

5 Faleceu no dia 15 de dezembro de 1988. Os jornais noticiaram o fato, afirman-do que o corpo seria velado na escola Baronesa de Sauípe. Também afirmaram que a educação estava perdendo um dos seus baluartes, conforme a passagem seguinte, do Jornal A Tarde do dia 23 de dezembro de 1988: “[...] com a morte

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de Angelina Rocha de Assis, em 15 de dezembro, a Bahia acaba de perder uma das pioneiras da educação pré-escolar, que lutou a vida inteira pela manuten-ção do alto padrão e de extrema dedicação à causa da educação”.

6 O assunto foi noticiado pelo Jornal A Tarde do dia 03 de maio de 1935: “[...] toda gente sabe que é a barafunda do ensino no Brasil com constantes refor-mas que lhe aplicam ao organismo cada vez mais combalido, mercê dos erros monstruosos de uma terapêutica, quase sempre desastrada. Na Bahia, como em quase todo o resto do país, não menos defeituosa e falha a organização do ensino”.

7 Jornal A Tarde, 16 de abril de 1934.

8 O assunto foi objeto de algumas pesquisas realizadas por nós, tais como: Eli-zete Passos, O feminismo de Henriqueta Martins Catharino, Salvador, 1992; Pas-sos, Elizete. Mulheres Moralmente Fortes, Salvador, 1993, dentre outros.

9 “[...] você sabe tanto quanto eu, minha amiga, que as meninas de hoje são bonecas frívolas, que discutem fitas cinematográficas e atrofiam os cérebros com romances banais e falsos de Dally e Ardel. Preparemos essas meninas, esposas e mãe de amanhã, de um novo mundo”, Otto Bittencurt Sobrinho, Jornal A Tarde, 25 de abril de 1935.

10 A Escola será tratada em momento oportuno

11 Função pública ligada a escolas que se encarrega da limpeza do ambiente escolar, do preparo da merenda dentre outras.

12 “Ela era tímida, embora fosse assim aquela mulher de muita presença, uma presença extraordinária, simpática e muito afável, muito querida, porque eu viajei com ela para os congressos que aconteceram no país. Os congressos da OMEP onde ela era muto respeitada, era das figuras mais apreciadas no panorama brasileiro, na esfera da educação pré-escolar. Ela participava das mesas redondas, dos trabalhos, ela ocupou sempre um cargo de destaque na diretoria da OMEP/Brasil, mas ela guardava aquela reserva, ela não era aquela pessoa, ela se expressava no trabalho ali, organizando as coisas” (depoimento da ex-presidente da Associação de Mães da Escola Baronesa de Sauípe).

13 “[...] chegava à Escola às 7 horas, passava o dia todo na escola, dando respaldo e orientação para a gente desenvolver assim um trabalho que era considerado

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assim, na época, de primeira linha” (depoimento de uma professora da escola no período de 1958 a 1988).

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A formação do docente enquanto profis-sional foi tida como concluída no século XIX, quando o Estado assume o ensino e o professor se torna funcionário público. Ele deixa de ser uma extensão da Igreja, submetido ao pároco e à vontade da população, para ser parte da má-quina do Estado.

A situação determina algumas conseqüên-cias fundamentais. Primeiro, a maior exigência de tempo e competência técnica a quem se des-tinasse ao ensino; também, algumas formas de controle como de ingresso, considerando sua idade, seu comportamento moral e sua forma-ção técnica.

A criação das escolas normais caracterizou-se como a institucionalização da profissionaliza-ção da tarefa de educar, assim como o espaço do controle ideológico, pois era dentro delas que os valores e os saberes pedagógicos se forma-vam e fortaleciam. (NÓVOA, 1992). Tal preo-cupação justifica-se por vários motivos, dentre eles, o fato da profissão docente ser carregada

A Educadora

[...] só sei que se você estava

procurando nomes de grandes

educadoras baianas, eu reputo como

a primeira, não, é a pioneira na educação pré-

escolar, e dentro dela, como se diz, a gente via que ela

era a mestra por excelência, isso eu lhe garanto.

Fui aluna dela, trabalhei a vida

inteira, posso lhe garantir.

(Depoimento de uma ex-aluna e

ex-professora)

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de intencionalidade política, pois, no dizer do supracitado autor: “os docentes são portadores de mensagens e se alinham em torno de idéias nacionais” (op. cit. p. 122).

Mensagens que podem estar em sintonia com as do poder he-gemônico ou no caminho oposto a ele, justificando-se o controle ímpar a que o Estado submete a categoria. Os professores são capazes de divulgarem ou não uma ideologia ou serem mensa-geiros de novos valores, criados em seu próprio cerne. Eles são, portanto, agentes culturais e políticos (NÓVOA, op. cit.).

Os saberes pedagógicos de Angelina foram forjados dentro do conhecido e destacado Instituto Normal da Bahia, visando se instrumentalizar para exercer a função de professora primária. No ano de 1930, ela foi designada professora interina da Esco-la Pacífico Pereira, sendo efetivada no ano seguinte, através de concurso público. Em 1935, iniciou seu vínculo com a Escola Baronesa de Sauípe, ao ser indicada como professora regente da mesma. Em 1948, tornou-se diretora da mesma.

Sua opção pelas crianças era conhecida de todos que priva-vam da sua amizade, não como um ser inferior e desprotegido a quem se deveria cuidar e defender, mas como pessoa que de-veria ser tratada com respeito, consideração e adequação1. Uma ex-professora da escola Baronesa de Sauípe fala dessa paixão da educadora:

[...] ela gostava muito de crianças, ela foi casada ficou viúva muito cedo e não teve filhos, gostava muito de criança e gostava muito de Psicologia.

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A preocupação com a forma adequada de tratar e de educar crianças fez com que ela se aprofundasse nos estudos da Psico-logia, através de cursos de extensão, estágios e estudos como au-todidata.

Dizem que ela era uma pessoa que possuía vocação para a educação infantil e juntou essa tendência a muito estudo e de-dicação, visando tornar essa educação a mais científica possível. Nessa preocupação, relacionava-se com a Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, solicitava cursos e passava aos professores e alunos da instituição que a procuravam seu saber sobre o assunto2. Como relembrou uma depoente, ex-professora da Universidade Federal da Bahia:

[...] o importante não é o fato de ser vocacionada, e sim que ela pro-curou estudar e dar a dimensão científica à escola, ao jardim, tanto que nós da faculdade mesmo, eu coordenei um curso de Educação Inicial, um curso de pós-graduação que ela pediu à faculdade. E o curso foi discutido com ela, ela opinava, ela realmente nunca se fechou para a missão dela.

O interesse pelo assunto é analisado por especialistas de hoje como avançado para a época, pois ela se preocupou com uma área da educação em uma faixa etária que era considerada im-própria à escola e quando lá chegasse teria como função apenas o lazer pelo lazer. A educadora conferiu ao lazer, ao lúdico, grande importância e o colocou como objeto de suas preocupações aca-dêmicas. Como confirma esse depoimento de uma professora universitária que teve a oportunidade de trabalhar com ela:

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[...] eu acho que ela foi realmente um marco, e que ninguém, na época, teve a dedicação, ninguém vislumbrou, dimensionou a im-portância da educação inicial, na época, como Angelina Assis. Ela procurou dar à educação inicial uma dimensão mais científica, e não apenas como local onde deixar as crianças para brincarem, ela prestigiava o lúdico, mas desde quando o lúdico tivesse os objetivos claramente definidos.

Numa época em que o ensino era obrigatório somente a partir dos 7 anos, ela preocupou-se com a fase que precedia a entrada na escola. Criou um ambiente especial, tanto físico quanto inte-lectual, visando privilegiar a criança, oferecendo-lhe tratamento coerente com sua idade e formação. Lá as crianças aprendiam a convivência social, sem se sentirem privadas do lazer que teriam nas ruas ou em casa. Ao contrário, o teriam de forma científica, planejada. A escola também oferecia acompanhamento psicoló-gico a crianças que tivessem problemas de adaptação, por exem-plo. O depoimento de um ex-aluno da escola na década de 50 é ilustrativo:

[...] Era, eu acho que a Escola Baronesa de Sauípe foi um início de vida infantil muito sadio, a metodologia, a maneira com que eles conduziam a formação das crianças, não é, e a participação social, a participação no grupo, foi muito natural, foi ... e não deixou ne-nhuma marca, isso fez com que a gente não percebesse de sair da brincadeira de sua, vamos dizer assim, da formação irresponsável, mais informal, não é, em casa, na rua, né, então, uma formação mais séria, uma formação, eu diria, pra uma iniciação, pra um início à vida estudantil, eu acho que isso aí foi uma maneira bastante suave, não foi traumática [...].

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Para dar conta deles, dirigiu por toda a vida a Escola Baronesa de Sauípe e uma filial da Organização Mundial do Ensino Pré-Escolar (OMEP), que possuía sede na França e filiais em vários países. Pela instituição, participava de encontros científicos, in-clusive fora do Brasil, levando suas experiências, se atualizando e aprendendo coisas novas.

Dentre os encontros científicos que participou, destacam-se: V Semana Nacional de Estudos Pré-Primários da OMEP, no ano de 1965; XI Assembléia da OMEP, em Paris, no ano de 1966; no ano de 1968, o I Encontro Interamericano de Proteção ao Pré-Escolar, no Rio de Janeiro; no mesmo ano, participou em Wa-shington, nos USA, da XII Assembléia Mundial da OMEP. Em 1971, após participar de eventos nacionais sobre a temática, em estados como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, dentre outros. Compareceu à XIII Assembléia Mundial da OMEP, em Bonn, na Alemanha. Sua participação em encontros científicos foi uma constante até o início da década de 80.

Sua participação nos eventos quase sempre era acompanhada da apresentação de trabalhos científicos3, do tipo palestras, rela-to de experiência e coordenação de grupos de estudo. Para citar alguns: em 1970, fez conferência para a Associação dos Pais no Instituto Central de Educação Isaías Alves, sob o título: A profes-sora no Jardim de Infância; em 1975, falou aos pais da Associação do Jardim de Infância de São Francisco do Conde; em 1977, fez relato de experiência no II congresso de Educação Pré-Escolar, o mesmo ocorreu no I Congresso Nacional de Arte e Educação no ano de 1983.

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Sua formação esteve sempre em processo, pois nunca deixou de se reciclar. São inúmeros os cursos e estágios que fez, incluin-do alguns no Rio de Janeiro, tais como: Curso de Aperfeiçoa-mento realizado na Escola de Professores do Instituto de Educa-ção, no ano de 1930; Estágio no Jardim de Infância do Instituto de Educação, no ano de 1934; Curso de Aperfeiçoamento em Direção de Jardim de Infância INEP/MEC, em 1950; Curso de Dramatização Educativa, Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em 1952. No mesmo ano, realizou uma série de cursos naque-la cidade: Curso de Psicologia Educacional no Colégio Bennet, Curso de Higiene Mental da criança, Curso de Psico-Higiene da Criança.

Também em Salvador participou de uma série de cursos, como o de Fundamentos e Técnicas de Recreação; Curso de Fa-tores Emocionais da Aprendizagem; Curso de Fundamentos da Educação Pré-escolar; Curso Intensivo sobre Problemas Emo-cionais da criança; na Academia Americana de Medicina e Curso de Psicologia e Psicopatologia Infantil, na Associação Baiana de Medicina.

Os caminhos percorridos pela educadora em busca do seu ideal de entender e cuidar da criança são possíveis apenas a uma pessoa determinada e movida por uma forte ideologia, pois se sabe que não era comum na primeira metade do século XX mu-lheres viajarem e muito menos se dedicarem a uma profissão. Seu “destino” era a casa e a maternidade e, quando muito, o ensi-no primário, sem direito a sonhar com uma carreira de sucesso.

Com tal formação, apesar de ter escolhido a Escola Baronesa de Sauípe como seu lócus privilegiado de trabalho, ocupou vários

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cargos: docente de Psicologia Infantil na Escola de Puericultu-ra da Liga Álvaro Bahia contra a mortalidade infantil, de 1951 a 1970; de 1955 a 1958, também exerceu a função de Orientadora em um Curso de Aperfeiçoamento para Professores do Jardim de Infância, promovido pelo INEP/MEC; também foi docente de Psicologia Infantil na Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia, em 1963; docente do Curso para Professores do Jardim de Infância promovido pela Secretaria de Educação do estado da Bahia, no ano de 1967. Seu currículo ainda registra um número significativo de cursos ministrados sobre educação pré-escolar sob o patrocínio da OMEP, Bahia.

Formação

Era considerada uma educadora atualizada e estudiosa, espe-cialmente da Psicologia, pois achava que a mesma deveria ser a base da formação do professor pré-escolar. A educadora não de-veria contentar-se com a sala de aula, precisava pesquisar, inves-tigar tudo o que interessasse à sua profissão4:

[...] ela procurava sempre estudar, procurava sempre crescer, pro-curava sempre melhorar os conhecimentos dela, especialmente em Psicologia. Ela achava a Psicologia a base para a professora do curso pré-escolar5, tanto que ela trabalhou na Psicologia, no atendimento à criança com dificuldades através da Liga Baiana contra a mortali-dade infantil. (Ex-professora da Escola)

Ao participar de congressos, seminários e demais eventos científicos, dentro e fora do país, trazia além de idéias novas, li-vros e inventos ligados à educação da pré-escola, os quais eram

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socializados com as professoras da escola que dirigia e aqueles das redes de ensino pública e privada que se interessassem pelo assunto. Muitos depoimentos de professoras que trabalharam com ela, falam do cuidado de Angelina com a sua formação e o que pretendia:

[...] exigia bastante, mas também dava um lastro pra gente dar essa resposta a essa exigência. Ela estudava com a gente, trazia livros, ela participava muito de congressos, seminários, tanto aqui como fora do Brasil. Ela sempre, quando vinha, tinha que trazer alguma novi-dade para a escola. Porque às vezes ela só falava porque o dinheiro era curto, ‘olha, mas vi isso’, então ela trazia aquelas idéias com de-talhes pra gente poder pegar, ajudava, dava às pessoas que ficavam junto à coordenação da escola, então, ela dava subsídios para essas pessoas virem nos ajudar. (Depoimento de uma ex-professora)

O empenho a fazia ser uma educadora além do seu tempo no campo do conhecimento que escolheu. Dizem que ela já pensava na criança do ano 2000, em plena década de 60:

[...] já se falava na criança do ano 2000, já se estava planejando para a criança do ano 2000, então, ela tinha uma visão que foi muito, muito, tudo o que tinha de mais moderno ela queria saber, ela queria estudar, e ela estudava muito. (Ex-estagiária da escola Baronesa de Sauípe6)

Também muito se preocupava com a formação dos professo-res, em especial da pré-escola, assim, investia na sua capacitação através da sua experiência, do conhecimento que possuía e atua-lização continuadamente, bem como os incentivando a participar dos encontros científicos, como relembra uma ex-colaboradora da OMEP7:

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[...] ela era assim, uma pessoa entusiasmada por educação, princi-palmente pré-escola, e ela conseguia levar um grande número de professores daqui para congressos no Rio, Belo Horizonte, onde houvesse congresso, ela incentivava e nós participávamos.

Conhecimento sobre a psicologia infantil

Angelina se destacava porque tinha um profundo conheci-mento sobre as necessidades da criança e sua prática educativa condizia com isto. Para ela, a prática educativa deveria preparar a criança para viver em sociedade e iniciava-se antes da criança nascer, como afirmou a ex-presidente da Associação de Mães da Escola: “isso se praticava lá com bastante seriedade”.

O diferencial consistia nela advogar os direitos da criança e confiar em sua sabedoria e capacidade, em detrimento de raça, sexo ou condição social, numa época em que a mesma era tida como uma tábula rasa onde o adulto deveria imprimir suas refe-rências. Ensinava que a criança só seria “tocada” através da afeti-vidade, do carinho e do elogio. O adulto, em especial o educador, deveria tratá-las com amor, desenvolvendo sua auto-estima.

A felicidade era uma meta e um caminho a ser perseguido. As professoras deveriam ser pessoas felizes a fim de contagiarem as crianças. Como grande parte dos alunos da “sua” escola possuía uma vida sem alegria, trabalhando antes da hora e vivendo sem recursos, ela, sabedora do valor do lúdico no crescimento saudá-vel do ser, colocava a brincadeira, a alegria como um dos funda-mentos da sua prática. Lançava mão das estórias contadas pelas professoras, quase sempre com final feliz, para levar as crianças a se identificarem com a felicidade e com a alegria.

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Suas convicções, fruto da experiência e de muito estudo, con-seguiram muitos adeptos. Muitas ex-professoras da Escola Baro-nesa de Sauípe falam desse aprendizado e de como ele mudou sua práxis educativa. Como relembrou uma mãe de aluno da Escola:

[...] ela só privilegiava a criança, o universo da criança, defendendo aquele universo para que a criança não fosse [...] não fosse, me fal-tou a palavra agora, a palavra que queria dizer, mas na sua liberdade, nos seus direitos.

Suas certezas ou intuições eram ancoradas em teorias clássi-cas da Psicologia Infantil como a de J. Piaget. Estudava muito o autor, promovia cursos e capacitações, trazendo pessoas que fos-sem conhecedoras da teoria e procurava seguir suas orientações. Visando aproximar o conhecimento das crianças à realidade, esti-mulava e criava condições para que elas pudessem manipular os objetos, a fim de sentirem sua textura, diferenciarem os cheiros, experimentarem os gostos, verem e ouvirem.

Além de Piaget, sua prática pedagógica também contemplava os ensinamentos de M. Montessori e de C. Rogers. A primeira é tida como a musa inspiradora, a quem Angelina quis imitar, investindo em crianças carentes, como havia feito com crianças na faixa pré-escolar no período da Segunda Guerra. Decerto seu contato com tais teorias não se deu no momento de sua formação institucionalizada, pois as professores que trabalhavam com ela afirmam nunca terem tido contato com as mesmas nos cursos de formação de professor que fizeram, tendo sido apresentadas a elas pela educadora Angelina de Assis.

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Valores morais e atitudes pedagógicas

Assumindo a educação como uma verdadeira missão, Angeli-na procura acolher a todos com respeito, dando preferência aos mais pobres. Recebia cada criança carinhosamente, independen-te de serem negras, brancas, bem vestidas, mal vestidas, doentes ou sadias. Beijava-as, colocava-as no colo, limpava, acariciava, contava estórias.

Preocupava-se com o seu comportamento social, moral e emocional. Investigava do que gostavam, os hábitos, se eram manhosas, choronas, tristes, alegres, desatentas, atenciosas. Para tanto, participava de todas as atividades desenvolvidas na escola, visitava as salas de aula, as atividades recreativas, recebia-as na chegada e na saída da escola.

A coerência com sua ideologia era tanta que não abandonava as crianças nem mesmo quando elas estavam sob a custódia de outras instituições que não a escola. Por exemplo, criou um programa de atendimento a crianças hospitalizadas, deixando professoras na unidade do Hospital Infantil Martagão Gesteira. A intenção era menos educativa e mais solidária, pois visava transformar a inter-nação em um momento menos triste e sofrido para as crianças.

Essa atitude também reforça o argumento usado por muitos depoentes sobre sua atualidade e visão de futuro; considerando-se que só nos anos atuais os especialistas começam a se preocupar com a alegria como um elemento importante na reabilitação dos doentes, ela pensou nisto e colocou em prática três décadas atrás.

Sua preocupação com a formação do indivíduo, baseada nos paradigmas da Psicologia, também pressupunha a formação do

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caráter. Convicta que ele se dava em tenra idade, trabalhava com crianças pré-escolares visando formar-lhes hábitos, atitudes e modo de ser adequados ao viver social.

Para fazer as professoras entenderam e executarem suas idéias, ela não usava de imposições, nem atitudes que pudes-sem deixá-las envergonhadas. Investia em estudo contínuo, em momentos de reflexão sobre situações concretas e no exemplo. Então, se uma professora não estivesse conseguindo interpretar o comportamento de um aluno, ela planejava como conteúdo do próximo estudo aquele tema. Organizava material técnico: textos, livros e desenhos dos alunos, por exemplo, como descre-ve a citação a seguir:

[...] se ela sentisse que o grupo ou que uma professora estava preci-sando, ela não chegava pra dizer “você estava errada”, mas ela trazia tudo isso como objeto de estudo, né, então fazia a evolução [...] se era questão de desenho, se nós estávamos, ela sentia alguma pro-fessora com dificuldade de relatar sobre esse menino, sobre a his-tória dele ali, ela então fazia justamente, começava a reunião com a evolução do desenho, nós já chegávamos na reunião, já estava lá, os desenhos presos numa seqüência [...]. (Depoimento de uma pro-fessora da escola Baronesa de Sauípe até a década de 80)

Relatam as ex-professoras que o método adotado pela educa-dora para corrigir seus defeitos, não era agressivo e sim educati-vo8. Elas próprias iam descobrindo com o decorrer da atividade e as leituras sugeridas onde estavam suas dificuldades e como solucioná-las. Tudo sem traumas, sem medos, sem desqualifica-ções. Além disso, fazia parte da metodologia adotada pela edu-cadora, os elogios e agradecimentos às professoras e aos alunos.

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Dizem que ela não se cansava de agradecer e de sugerir aos alu-nos que também fossem gratos às suas professoras por se dedi-carem a eles.

Seus valores morais faziam com que ela se colocasse em igual-dade de condições com as demais professoras que faziam parte de sua equipe, apesar da liderança reconhecida que exercia. Assim, além de passar o dia na escola, tratar os professores com respeito também usava o mesmo fardamento que a equipe escolhesse9.

Primava pela pontualidade e pela assiduidade e era severa na exigência da responsabilidade e do profissionalismo. O que não é nenhuma novidade, pois a rigidez tem sido uma constante no comportamento moral das educadoras da época. Ela é um ele-mento fundamental no caráter dos educadores, certos que não deveriam dar maus exemplos, pois eram espelhos para os alunos e para a sociedade.

[...] ela era muito coerente com o que ela dizia e com o que ela fazia, entendeu, ela podia ser, às vezes, muito austera, muito rígida em certas maneiras, mas a maneira dela assim em servir, a docilidade em mostrar a realidade da escola. (Depoimento de uma pessoa que trabalhou na OMEP com a educadora na década de 60).

A aparente austeridade dava lugar para uma grande generosi-dade no convívio cotidiano. As companheiras de trabalho falam dela como uma pessoa afável, solidária, companheira e alegre. Tomava cada professora como filha, acompanhava-as em almo-ços e jantares, aconselhava-as, participava de suas vidas.

Estava sempre disposta e combativa, não se deixando abater por nada. Esse espírito combativo ela procurava transmitir às suas

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professoras, de modo carinhoso e não ditatorial, dizem que ela não mandava, ensinava, orientava, conduzia. A forma de ser da educadora deixou marcas profundas em todos aqueles que con-viveram com ela. Ao relembrarem da convivência, emocionam-se, chegando às lágrimas. O sentimento é de terem perdido uma mãe: de personalidade forte, mas compreensiva, amiga e respei-tadora10. Alguns depoimentos falam claramente o que a educa-dora representava para quem teve a oportunidade de conhecê-la mais de perto, como suas professoras:

pra mim é uma assim pessoa maravilhosa, inesquecível, não tem melhor [...] fazia na pré-escola e faço em qualquer outro grupo de aprendizes, eu não trabalho de outra forma, sem usar o referencial que eu aprendi com dona Angelina.

[...] nós tínhamos assim em dona Angelina o modelo pra gente, em organização, em postura, em tudo, tudo. Então, pra mim foi assim o modelo na minha condição de pessoa jovem, de moça, de futura mãe [...] ela foi o exemplo de honestidade, sinceridade, correta, ela fazia tudo dentro do que era certo, irrepreensível.

[...] o convívio dela com as professoras da escola, embora ela fosse uma pessoa muito exigente, de uma grande energia, mas as profes-soras não [...] entravam lá e não saíam, porque ela contagiava pela dedicação, pelo amor e pela consciência de que estava fazendo o melhor para a criança.

Notas1 Dizem as depoentes, ex-professoras, ex-alunos e pais entrevistados, que ela

tinha um grande amor pelas crianças, que admirava tudo o que vinha delas,

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que sorria muito com o que as crianças diziam, que achava que elas tinham sempre razão.

2 Muitas professoras dizem que foram apresentadas a pensadores como Piaget, Montessori e tantos outros por Angelina. A educadora recorria a eles para fundamentar suas idéias e sua prática ao tempo em que as incentivava a pro-curar conhecê-los, o que foi feito por muitas. Algumas ex-alunas da escola, quando adultas, também fundaram pré-escolas particulares na cidade de Sal-vador, seguindo os ensinamentos da mestra.

3 Dizem as depoentes ex-professoras da Escola que ela era muito humilde e fazia questão de não tomar a autoria dos trabalhos. Sempre os apresentava como sendo fruto dos esforços da equipe.Seu entusiasmo com a causa in-fantil é reconhecido e contagiante, pois ela conseguia atingir a todas que esti-vessem ao seu redor. Tudo deveria e poderia ser feito em benefício do maior número de crianças.

4 Dizem as entrevistadas que ela chegava à escola antes de todos e quando a primeira professora chegava, ainda em torno das 6 horas da manhã, ela já tinha lido os jornais e estava atualizada sobre tudo o que estava acontecendo na sociedade e no mundo. Como afirmam: “a gente se encantava com dona Angelina, ela era demais”.

5 Ela estimulou muitas professoras a estudarem Psicologia e se especializarem no ensino pré-escolar, inclusive ajudando-as a conseguirem bolsas de estudo. Elas dizem que dona Angelina as ensinou a amar as crianças, a gostar da pro-fissão e procurar se aperfeiçoar sempre, mesmo sabendo que jamais consegui-riam ser iguais a ela. Entretanto, procuraram seguir seus ensinamentos pela vida a fora: “[...] ela é uma grande mestra, foi a pessoa que me ensinou tudo, até nas classes de quinta à oitava com adultos, todo mundo que eu trabalho hoje em dia, meu ponto de partida, minha maneira, minha postura, é muito ainda o que aprendi lá” (depoimento de uma ex-professora da Escola).

6 Foi uma escola pública, criada a partir do empenho de Angelina de Assis, de-dicada à educação pré-escolar. Será objeto de análise de um capítulo.

7 Organização Mundial de Educação Pré-Escolar. Será tratada posteriormente.

8 “[...] como educadora, a gente pode dizer, ela educava desde os serventes, não é, as crianças e todos que lá chegavam. Ela era assim como uma mestra. Se

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mestra é um nome, assim, de cátedra que a gente pode falar, ela é, foi uma mestra, mestra”. (depoimento de uma ex-aluna e depois assistente social da Escola Baronesa de Sauípe).

9 Reconhecem que ela era uma mulher muito elegante, entretanto, não se in-comodava de vestir farda e menos ainda de ser a mesma das professoras.

10 “[...] ela era uma mãe (chora), dona Angelina pra mim foi uma pessoa que marcou profundamente a minha vida, até hoje eu me emociono quando penso nela. Há poucos dias eu peguei um santinho distribuído na missa de sétimo dia de dona Angelina e me bateu uma saudade muito grande, mesmo. Ela respeitava o professor dentro da sua personalidade, ela nunca impôs a personalidade dela, embora ela fosse uma pessoa de personalidade forte” (de-poimento de uma ex-professora da Escola Baronesa de Sauípe).

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A Escola Baronesa de Sauípe foi fundada no dia 13 de maio do ano de 1935, no então gover-no intervencionista de Juracy Magalhães, volta-da para a educação pré-escolar, na cidade baixa, no Largo do Papagaio, em Salvador, em terre-no doado pela Baronesa de Sauípe e seguindo o modelo alemão. Iniciou com duas salas ape-nas, depois 4, duas pela manhã e duas à tarde, respeitando-se a idade dos alunos. Iniciou em uma casa comum e tempo depois sofreu gran-de reforma1 que consistiu na demolição da sede inicial para dar lugar a uma construção nova e adequada, comportando 10 salas e atendendo a uma clientela de cerca de 340 alunos2.

Jardim de Infância

Numa época em que competia ao Estado oferecer educação às crianças a partir dos 7 anos de idade, tendo a finalidade de ensiná-las a ler e escrever, Angelina criou um jardim de infân-cia e na rede pública de ensino. Sua finalidade era preparar as crianças na fase que precedia a

[...] mas, graças à

transmutação dos valores, Cupido é

uma criança e para uma psicóloga a sublimação veio

ao seu encontro, e [...] conseguiu que

para essa criança que tanto amava, construíssem, não uma escola, mas

um templo: a famosa Baronesa de Sauípe, e lá,

como deusa e como criança,

reinou absoluta, dona e senhora

do fenômeno educacional

chamado pré-escolar que lá teve sede e

floresceu.

Leda Jesuíno, 1991

A Escola Baronesa de Sauípe

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entrada na escola, para que despertassem o gosto e a curiosidade para a leitura e para a escrita.

Essas idéias foram defendidas em fóruns científicos, nos cur-sos e palestras ministradas e postas em prática no seu fazer peda-gógico. Também, visando difundi-las, sistematizou-as em forma de texto, como o publicado na Revista do Ensino, de Porto Alegre, no ano de 1959. Nele, define os objetivos do Jardim de Infân-cia, afirmando que ele deveria ser menos formal do que a esco-la a partir da primeira série. Por exemplo, as crianças deveriam aprender brincando e jogando espontaneamente, segundo seus próprios interesses. Lá não deveria existir espaço para a leitura e a escrita, tarefas de responsabilidade da escola primária.

A defesa da pré-escola como momento da brincadeira, vinha acompanhada de informações importantes sobre o desenvolvi-mento emocional e psicológico da criança e das conseqüências que a ruptura com essa orientação poderia acarretar, dentre elas, a repetência na primeira série. Como escreveu, o êxito da apren-dizagem da leitura e da escrita dependeria:

[...] boa coordenação motora visual e auditiva, memória e atenção bem desenvolvidos, um bom vocabulário oral, ampla e variada ex-periência, sem as quais a criança não será capaz de dominar técnicas da leitura e da escrita. Um dos problemas que mais preocupa as pessoas que lidam com assuntos educacionais é o da repetência no 1º ano, certamente, esta aprendizagem prematura há de ser uma das causas desse insucesso. (Assis, 1959, p. 62)

Pregava, quase que isoladamente na Bahia, a necessidade dos poderes públicos darem atenção a essa faixa etária3, atitude, sob

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sua avaliação, urgente e grandiosa, considerando-se a carência em que vivia grande parte das crianças nos primeiros seis anos de vida, o que dificultava, senão impedia, o seu desenvolvimento. Dada a grandiosidade da missão, apesar de considerá-la de res-ponsabilidade dos poderes públicos, não eximia a sociedade de sua parcela de contribuição. Todos deviam somar esforços em prol da questão: pais, políticos, administradores, assistentes so-ciais, administradores e demais agentes sociais.

Sua proposta contemplava a criança de idade inferior aos sete anos, independente da raça, classe social, credo ou sexo, entre-tanto, priorizava aquelas da camada trabalhadora, por serem as mais prejudicadas pela pobreza de estímulos e oportunidades. Por isso, sua luta se dava na esfera pública, junto às autoridades constituídas e sua prática também em escola da rede do governo.

A Escola Baronesa de Sauípe era considerada o melhor Jardim de Infância da cidade de Salvador e do país, inclusive referencia-da em revistas de outros estados como o Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

Nos anos 50, com apenas duas salas de aula, havia grande con-corrência dos pais para conseguirem uma vaga na escola, pois além de ser considerada da mais alta qualidade, também era o início do deslocamento das mulheres para o mercado de trabalho e a escola representava, na ausência de creches, a solução para as mães.

A disputa por uma vaga ensejava insatisfações em quem não a conseguia, chegando até mesmo aos meios de comunicação de massa, como vimos anteriormente, na qualidade de uma queixa acusatória. Acusação que era prontamente rechaçada pela opinião pública, conhecedora da qualidade moral de sua diretora e do de-

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sejo dos pais de conseguirem passar pelo fino crivo do processo seletivo. Como relembra uma mãe: “[...] aquela escola era uma escola de sonho”.

Seu conceito de jardim de infância, como dissemos, rompia com o que os pais e a sociedade esperavam ver realizados com as crianças que fossem para a escola: que aprendessem a ler e a escrever. Ela argumentava contra essa proposta para crianças menores de 7 anos, idade que ela definia como da brincadeira, sem espaço para as lições formais ou a aparelhagem simbólica utilizada na escola normal.

Seu conceito de jardim de infância era compreendido e aceito por muitos pais que, com segurança, falam que seus filhos não iam para lá aprender a ler, mas ganhar gosto e vontade de fazer isso. Como confirma o depoimento seguinte:

[...] as crianças iam à escola aprender a ler e escrever, e lá não se falava de ler nem de escrever, preparava-se para que nascesse esse gosto, essa curiosidade pela leitura e conseqüentemente pelo ensino. A criança era respeitada nas suas características de crescimento, de desenvolvimento, tratadas com muito carinho, muito carinho. (De-poimento de uma mãe)

Clientela

Quando a Escola foi criada na década de 30, a Cidade Baixa, em Salvador, e seus bairros como Penha, Mont Serrat, a Penín-sula Itapagipana era habitada por famílias de alto poder aquisiti-vo, assim como por engenheiros, médicos e advogados, e foram os filhos delas que constituíram ao longo de 15 anos a principal clientela da Baronesa de Sauípe.

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A escolha não partiu da Escola nem dos seus dirigentes, e sim das próprias famílias, que mesmo não entendendo muito bem o valor da pré-escola, confiavam na competência de Angelina de As-sis.Os filhos de famílias de padrão econômico mais baixo concen-travam-se na escola Luiz Tarquínio, situada no mesmo bairro, po-rém dentro do conjunto de casas oferecidas aos trabalhadores das fábricas existentes no local, devido à proximidade das residências, não sendo necessário portador para conduzir as crianças, e por ser mantida pelas fábricas, oferecia alimentação e fardamento.

Com o passar dos tempos, o crescimento do bairro, a cons-trução de conjuntos habitacionais próximos à escola e o ingresso das mulheres no mercado de trabalho, sua clientela tornou-se mista, incluindo alunos das camadas trabalhadoras, ao lado da-queles de camadas média e alta, numa convivência harmoniosa.

Como afirmam os entrevistados (pais, alunos e educadores) não havia nenhuma forma de discriminação na escola, nem de classe, nem de raça, nem de gênero, nem religiosa. A todos eram ensinadas as mesmas coisas e eram tratados igualmente. A fim de evitarem constrangimentos, já que existiam alunos de camadas sociais diferentes, a Escola trabalhava com a simplicidade e obje-tos e trajes de pouco valor econômico.

A proletarização da Escola também foi uma decisão da sua direção que não se contentava em não prestar um serviço a quem mais necessitava dele. Nesse intuito, ao lado de suas colabora-doras, fazia visitas às famílias carentes, a fim de convencê-las a mandarem os filhos para a escola, ao tempo em que realizava atividades visando arrecadar fundos para garantir o fardamento e o lanche dos mesmos.

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A qualidade da escola aliada às mudanças sociais fez com que a mesma passasse a ser super-procurada, a ponto de pais dormi-rem na fila para garantirem uma vaga. Angelina ficava chocada, pois seu desejo era atender a todos. Isso forçou o crescimento da escola, que saltou de duas classes para quatro, para oito e depois para dez, atendendo uma média de 340 alunos por ano. Situação que enchia de orgulho sua diretora-fundadora, especialmente por estar prestando um serviço a camadas menos privilegiadas, a quem ela colocava em primeiro plano. Estratégias para privi-legiá-los eram usadas, tais como: efetivar em primeiro lugar a matrícula dos alunos carentes, como os oriundos da comunida-de dos Alagados4.

Metodologia adotada

Dizem as entrevistadas que ela não falava em método e sim em “filosofia” da escola, que consistia em respeitar a criança, supondo-se que ela tinha um potencial que precisava ser apro-veitado. Todo ser humano possuía, para ela, capacidade de cres-cer e aprender em detrimento da classe social a que pertencesse. Como confirma o depoimento a seguir:

[...] ela tinha essa visão, então, era uma filosofia socioconstrutivista, ela usava o mesmo, o trabalho com o social, o respeito à comuni-dade, o respeito às diferenças, né, de classe que tinha lá, então ela não trabalhava destacando isso ou aquilo, as religiões também, tinha esse respeito às religiões.5

Compreensão que demonstra uma visão da práxis educativa, além do fazer e da escolha de formas de realizar, pois pressupu-

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nha que esses decorriam de uma visão de mundo, de um com-promisso ideológico.

Envolvida por tal convicção, para ela, o fazer pedagógico de-via ser precedido de uma compreensão do ser humano e o que se esperava dele no mundo. A criança era o centro do processo, dotado de potencial que devia ser reconhecido e respeitado pela escola e pelos sujeitos da educação. Como dissemos, para ela, to-dos eram capazes de aprender e muitas carências poderiam ser superadas através da sensibilidade dos professores.

Assim, não usava nenhum método em específico, ao contrá-rio, fazia adaptações de teorias reconhecidas, como a de Piaget, a de Montessori e a Construtivista, à realidade brasileira.

[...] eu não digo que fosse inovador, era uma escola que ela não seguia diretamente a linha montessoriana, ela fazia uma espécie de adequação de acordo com nossa própria realidade. (Depoimento da ex-presidente da Associação de Mães)

A opção por alguns autores, entretanto, pode nos dar a indica-ção precisa do caminho trilhado. Além de Montessori, Piaget era um pilar do trabalho de Angelina, especialmente nas orientações a respeito das fases da criança e seu desenvolvimento. Orientação cara para a educadora que tinha intuitivamente a certeza que a criança precisava ser tratada e respeitada conforme seu momento de crescimento e de desenvolvimento.

A filosofia educacional seguida por Angelina é identificada por muitos professores que trabalharam com ela como socioconstru-tivista, por ela levar em conta o social e o respeito às diferenças:

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[...] o método, ela dizia muito mais filosofia, não usava metodolo-gia da escola e dizia sempre que a escola era uma escola-laboratório. (Ex-professora da escola até a década de 80)

Seguindo o processo de atualização das teorias psico-peda-gógicas e as exigências do tempo, a educadora incluiu em sua orientação metodológica teses do método natural, tendo em vis-ta o mesmo propósito de acompanhar o desenvolvimento livre das crianças.

As crianças eram consideradas o centro do processo e tudo feito para seu crescimento harmonioso e saudável6. Exercitavam livremente sua criatividade, os professores discutiam com elas o que iriam realizar ao longo do dia, assim como os hábitos e atitu-des que deviam ter, como indicam alguns depoimentos:

[...] aquela programação do dia a dia era feita era feita assim com eles em sala de aula. E a participação em tudo, na maneira de sentar, não é de esperar, de se dirigir ao colega, todos esses hábitos sociais a gente desenvolvia assim, de maneira espontânea, com teatro, não é essa participação que depois lhe mostro, ainda tem as fotos, e elas se integravam mesmo, era a socialização. (Depoimento de uma ex-aluna e depois assistente social da Escola).

[...] a gente colocava papel à vontade, tinta, massa de modelagem que a gente mesmo fabricava e todo esse material ficava à disposi-ção das crianças e elas faziam como queriam, a gente nunca fez um desenho para dizer assim, agora vão cobrir, não, a gente estimulava a criatividade, a espontaneidade [...].7

Os motivos do valor atribuído por Angelina à pré-escola são do conhecimento de todos que trabalharam ou estudaram na

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Escola Baronesa de Sauípe. A educadora ensinava que a perso-nalidade era formada naquela faixa etária e tudo o que nela se aprendesse ficaria para toda a vida. Seus ensinamentos ancora-vam-se tanto na teoria quanto na prática. Além de citar autores estudados, mostrava o exemplo de ex-alunos da Escola, naquele momento já adultos, e como se portavam com distinção e dig-nidade na sociedade. Assim, a teoria iluminava os fatos e esses atestavam aquela.

As crianças gostavam da escola e a via como a “melhor escola do mundo”, conforme atesta o depoimento de uma mãe ao con-tar que certa feita estava preparando um discurso para ser pro-ferido na escola pela passagem do aniversário da mesma e seu filho pequeno, ex-aluno de lá recomendou que ela deveria dizer apenas que uma escola é boa quando o aluno gosta dela e que aquela era a melhor do mundo. Vejamos o relato:

[...] era aniversário da escola [...] e meu filho menor, o caçula, ali perto de mim, ele me perguntou o que é que eu estava fazendo, e eu disse: − é um discurso, que vai ser o aniversário da escola”, então ele disse: − basta você botar que a escola é boa quando a gente se sente feliz, e não há escola melhor. (Depoimento de uma ex-mãe e pessoa influente no campo da educação)

São muitos os depoimentos elogiosos de quem vivenciou a experiência de ser aluno da Escola Baronesa de Sauípe. Relatam o prazer que tinham em irem para a escola, pois lá não ditavam ordens, nem forçavam o aluno a aprender, tudo era natural e ale-gre. Aprendiam participando, brincando, trocando experiências com outras crianças, de forma livre e à vontade. Nesse processo,

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aprendiam desde o relacionamento social até os princípios mo-rais e o conteúdo técnico.

As crianças sentiam e sabiam que a escola era para eles, era deles. Eram tratadas com respeito e de forma adequada ao seu processo de crescimento, sem se esquecerem das normas e dos limites sociais, até o lanche era diferenciado. A escola dava gran-de importância às atividades recreativas, as crianças voltavam para casa com saudade da escola.

Quanto aos mecanismos disciplinares, a escola, em alguns mo-mentos, se assemelha às tradicionais. Os alunos eram isolados da turma, diante de uma transgressão, permanecendo algum tempo na secretaria, porém sem atitudes que pudessem constrangê-los. As repreensões verbais não eram feitas individualmente e sim no coletivo, de modo que cada um pudesse colocar sua carapuça. Como confirma o depoimento a seguir, de um ex-aluno da dé-cada de 50:

[...] Não, eles não humilhavam, não humilhavam a criança perante os outros colegas, né. Quando tinha assim um pito, era pito gene-ralizado, eles davam um carão a todo mundo que errou, que os me-ninos fizeram errado, que bagunçava, falava, reclamava, mas tudo dentro da pedagogia, não fazia nada pra traumatizar a criança, nem nada.

Os alunos entrevistados são unânimes em afirmar que não sentiram nenhum ato de violência nem de autoritarismo na es-cola. Seus desejos e ações eram respeitados e, quando necessário, reconduzidos de forma tão “natural” que não sentiam. Confor-me avalia um ex-aluno do passado com o olhar do hoje:

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[...] elas procuravam contornar, procuravam ver porque tal, mas não ficavam obrigando a criança a fazer. Era, eu acho que a Escola Baro-nesa de Sauípe foi o início de uma vida estudantil muito sadio[...].8

As turmas eram divididas por cores: sala verde, a primeira; amarela, lilás, rosa, azul [...].O professor só assumia uma classe após um ano de observação da professora efetiva, onde se pro-curava conhecer seu perfil, a forma como tratavam as crianças, sua competência teórica e como ele lidava com a transmissão do conhecimento. A orientação básica consistia em colocar o aluno como centro do processo, cientes que já havia passado a época em que o professor ensinava e o aluno aprendia, e o momento era de levar o aluno a fazer, tendo o professor à frente: carinhoso, atencioso, presente em todos os momentos e situação.

Uma ex-professora relatou sua experiência de observação das classes antes de começar a trabalhar efetivamente na Escola Ba-ronesa de Sauípe:

[...] tudo o que eu não conhecia, lá, de onde eu vinha, era mais a produção do professor, era o professor ali naquele regime de ensi-no-aprendizagem, que o professor ensina e o aluno só aprendia. Já lá naquela época era diferente, e não era uma coisa daquela época, segundo as colegas que já estavam trabalhando e a própria Dona Angelina que comentava, era a tradição da escola desde 1935, então, já tinha várias décadas que isso acontecia com essa preocupação com o aluno, o aluno era respeitado, eram alunos carentes.

Também o período de estágio de um futuro professor era se-guido de perto pelo professor da classe a quem competia orientar, ensinar-lhe os princípios metodológicos da Escola. Como afir-

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mam os entrevistados, a educadora partilhava do entendimento que um estagiário precisava de modelo a ser copiado e não podia ficar com a responsabilidade de uma classe em período de sua formação.

As crianças aprendiam fazendo e observando o professor, as pessoas e a natureza. Observavam o desenvolver de uma planta e de um animal, participavam de experiências e de encenações e dramatizações, visando o seu desenvolvimento integral: lingua-gem, acuidade visual, motora e intelectual.

As professoras trabalhavam de maneira integrada e procura-vam ensinar os alunos de forma concreta: as noções de Matemá-tica eram dadas usando-se objetos como flores, grãos, sementes etc, o mesmo fazia com as demais informações de Português, estudos sociais e Ciências. As lembranças de um ex-aluno são esclarecedoras do método adotado na escola dirigida pela profes-sora Angelina:

[...] eles tinham a escola mas, como... não como escola, entende, de ... é... você ir pra lá pra ficar vendo o professor ditando ordens e lhe instruindo e tal, a escola era mais assim como uma... eu me lembro bem de ir pra lá, eu adorava ir para a escola porque eu ia pra um re-creio, eu ia pra um lugar onde eu ia aprender mas brincando, apren-der participando, aprender com outros colegas, outros meninos que tinham os mesmos problemas que eu tinha, as mesmas brincadeiras, então, eles deixavam a gente livre, bem, bem, bem à vontade e sem-pre eles iam mostrando não só toda parte de coordenação motora como parte de instrução, de primeiras letras, o alfabeto, isso eles iam mostrando, mas muito ameno, muito assim... naturalmente, né, não... ‘hoje vamos aprender o alfabeto’, não, a gente aprendia naturalmente assim, durante aquela recreação, aquelas brincadeiras.

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O material didático era atual, porém simples e quase todo construído pelas próprias professoras. Também Angelina gastava parte do seu salário na compra de material, cada vez que viajava para participar de eventos científicos.

Também fazia parte das atividades das professoras manterem um arquivo atualizado sobre o desempenho de cada aluno. As professoras deviam observar cuidadosamente e de forma conti-nuada cada aluno e registrar sua avaliação. As anotações serviam para compor a história do aluno e eram objeto de análise da edu-cadora Angelina que, a partir delas, indicava os procedimentos que deviam ser tomados em relação a cada aluno.

Visando auxiliar os professores para que desempenhassem bem sua função, criou as atividades complementares, numa épo-ca em que não se pensavam nelas. Após promover reuniões de avaliação, onde passava sua impressão sobre o desempenho das professoras durante a semana9 e oferecia atividades que pudes-sem sanar as dificuldades. As mesmas aconteciam inicialmente aos sábados e domingos e depois passaram para as sextas, ficando os alunos sob a responsabilidade de auxiliares de classe.

O cuidado que a educadora dispensava à formação das pro-fessoras decorria do grande valor e responsabilidade que ela con-feria a quem ia trabalhar com crianças menores, pelos motivos alegados, indo na contra-mão da compreensão da época, que achava que essas professoras deveriam ser aquelas menos quali-ficadas ou quem tivesse muita vocação. Ela advogava o contrário, chegando a defender a formação universitária a todos os profes-sores da pré-escola.

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Considerava “sua” escola como um “laboratório”. Segundo uma informante, ela assim se referia à Escola Baronesa de Sauípe:

“a nossa escola é de caráter experimental, a gente tem de estar ex-perimentando sempre, vivenciando sempre novas técnicas, no-vas formas de encaminhar as coisas”10. Com esse propósito de ser uma escola experimental, recebia crianças com deficiências audi-tivas, problemas de fala, de doença mental e deficiência física.

A Escola era ponto de referência para todos aqueles que se interessavam pela educação infantil, figurava como “uma sala de visitas”, como afirmam seus ex-professores e alunos, para visi-tantes ilustres, estudiosos e quem mais quisesse saber sobre o assunto. Como confirma o depoimento seguinte:

aqui era atuante, professores de todos os lugares. Olhe, da França, da Inglaterra, da Argentina de todo lugar dos Estados Unidos, en-tão, vinham pra trocar idéias, todos professores de renome visitam a escola.

Os visitantes ficavam perplexos por ser aquela uma escola pú-blica, onde tudo funcionava perfeitamente bem, desde as condi-ções físicas, até a qualidade do trabalho pedagógico. Ela procu-rava cumprir esse papel com empenho e orgulho, mas sem des-curar do seu compromisso principal: a educação e o crescimento dos alunos.

Nesses momentos, os alunos apresentavam-se como os prin-cipais protagonistas, recepcionando os visitantes com poesias, músicas e discursos, pois a diretora e suas auxiliares, de acor-do com a metodologia de valorização dos alunos, procuravam

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desenvolver seus talentos. Como nos relatou um ex-aluno da década de 50:

[...] nós tínhamos visitas, eu me lembro de Adroaldo Ribeiro Costa que foi lá uma vez, nós todos preparamos, né, foi feita uma recepção para ele, e teve uma menina que fez poesia, teve outra que falou, né, tudo pequenininho, pequenininho, e eles exploravam muito os dons e as aptidões de cada um.

A educadora procurava fazer com que “sua escola” fosse um modelo, um campo de pesquisa sobre o assunto, o que realmente se dava na prática de orientadores de ensino. Assim, portava-se como modelo de ensino, de organização e de cooperação.

Orientação religiosa

Ela seguia a religião Católica11, mas não impunha nem ensi-nava nenhuma religião aos seus alunos. Sua opção religiosa só era explicitada em alguns momentos como na data do seu ani-versário ou no da escola quando mandava celebrar missa em ação de graça. Também, em alguns momentos, rezavam o Pai Nosso com os alunos por acreditar que ela era uma oração universal.

Essa fé era demonstrada, também, em homenagens feitas a Nossa Senhora de Fátima, padroeira da Escola e outras comemo-rações como as referentes ao Mês de Maria, em maio, mas cada aluno era respeitado em sua opção religiosa. Como respondeu enfaticamente uma ex-professora da Escola ao ser questionada se a escola dava orientação religiosa aos seus alunos: “Não, não, não. Isso aqui era livre, né? Cada um dentro da sua religião e a gente procurava respeitar”.

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A Escola concentrava-se em ensinar às crianças princípios morais de respeito pelo outro e solidariedade sem seu aspecto caritativo de cunho religioso cristão. Os alunos eram levados a acreditar em Deus e sentir sua presença pela presença do outro. Aprendiam a respeitar, a obedecer a Deus na figura dos pais, dos avós, dos mais velhos, e aos outros na figura dos irmãos e dos colegas. Tudo à altura do entendimento das crianças, de acordo com a metodologia seguida pela Escola:

O mês de Maria era muito simples, primeiro porque as crianças não iam entender, mas todos participavam cantando ‘Mãezinha do céu’, levando flores, aprendendo a obedecer, a respeitar através da mãe, da própria mãe deles, se trabalhava muito o amor entre os irmãos, essa fraternidade, se trabalhava muito o amor pelos mais velhos, pe-los pais, pelos avós. (Depoimento de uma ex-professora da escola)

O mesmo tipo de espontaneísmo e liberdade não acontecia com a formação cívica. Os ex-alunos recordam-se que cantavam o Hino Nacional e o Hino à Bandeira e o Hino a 2 de Julho, data comemorativa da Independência da Bahia. Relembram que has-teavam a bandeira cotidianamente, que eram levados a desenhá-la, a compreender o seu significado e que a escola incutia nelas o respeito e o amor à pátria.

Co-educação

Também colocou em prática a co-educação, dispensando a meninos e meninas os mesmos ensinamentos teórico, prático e moral. Como descreveu uma depoente, ex-professora da Escola Baronesa de Sauípe:

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[...] as classes eram mistas, nunca se pensou em separar. Tudo era misto, recreio, a farda era igual, o conteúdo trabalhado também era o mesmo, não havia de jeito nenhum distinção. Eu acho assim que ela tinha uma visão na frente, muita coisa na frente.12

Os alunos eram tratados como seres sociais, que refletem em sua prática as condições concretas da existência. Nos anos 80, a escola possuía crianças de camadas trabalhadoras e que convi-viam com experiências sexuais dos adultos próprios de uma vida sem privacidade, a educadora tratava a situação com naturalidade, conversando, falando na linguagem delas, que aqueles eram jogos dos adultos, que esses também tinham suas brincadeiras. Tam-bém acontecia de trocá-las de lugar, quando se fazia necessário, ou mantinha-as ocupadas durante todo o tempo, sem chamar-lhes a atenção nem puni-las. Princípio que extraia da pedagogia montessoriana, que orienta que o professor deve ensiná-los pelo exemplo e não através de punições.

Avessa a moralismos e amparada numa metodologia que pri-vilegiava a simplicidade e o tratamento das coisas e das pessoas de forma real, a escola não possuía sanitários diferenciados por sexo e promovia banhos de chuveiro ou de mangueira com todos juntos e sem roupa. O propósito era não despertar a malícia, nem o preconceito, mas formar seres livres, íntegros e verdadeiros.

Do mesmo modo, não ensinavam brincadeiras diferentes para meninos e meninas. Eles podiam experienciar qualquer uma, a depender do seu gosto e vontade. Meninos e meninas podiam brincar de bonecas sem nenhuma censura por parte da instituição, porém, apesar de estarem na faixa etária entre 4, 5 e

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6 anos, já haviam internalizado o modelo social e mantinham a tradição de brincadeiras para meninos e para meninas: eles com bolas ou em papéis masculinos como de pai e marido, e elas com bonecas, em papéis tradicionais femininos de mãe e esposa. Atitudes contrárias eram evitadas porque sua formação lhes dizia que não era devida ou por medo de sofrerem recriminações por parte dos colegas.

Assim, a co-educação foi um dos pilares da práxis educativa desenvolvida por Angelina, que usava a conversa, as estórias e a criatividade para fazer frente a perguntas intrigantes sobre sexo, feita por algum discente, ou atitudes não recomendadas. Evitan-do-se, sempre, a mentira alimentada por falsos pudores.

Relação da escola com as famílias

A escola mantinha uma relação aproximada com os pais. Pos-suía uma associação de pais ativa e conversava francamente com eles quando sentia que os alunos estavam demonstrando algum tipo de desajuste. Procurava saber o que se passava em casa que pudesse justificar ou explicar o comportamento do aluno.

Do mesmo modo os envolvia nas condições econômicas da escola, de onde tinha resposta satisfatória sempre que fosse soli-citado. O depoimento de uma ex-aluna e ex-assistente social da Escola é elucidativo:

os pais participavam, as nossas campanhas envolviam assim as fa-mílias naquele modo de ter, como diz, a escola sempre avante, por-que as verbas, às vezes, escasseavam, então a gente fazia campanhas, campanhas de garrafa, de latas [...] então, os pais levavam revistas, tudo o que podia para a gente, então, transformar em dinheiro.

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A escola também fazia questão de reuni-los em momentos festivos, como Dia das Mães, Dia da Pátria, festejos de São João e outros do calendário religioso, cívico e cultural. A certeza da qua-lidade do trabalho realizado, o reconhecimento público do mes-mo e a preocupação em criar um clima ajustado para as crianças, evitando que elas vivenciassem em casa o contrário do que lhes era ensinado na escola, fazia a educadora se sentir no direito de participar ativamente da vida das famílias.

Chamava a atenção dos pais quanto ao comportamento que tinham, sobre seus hábitos, forma de viver e de se comportar. Di-zem que ela reclamava do cabelo descuidado, da roupa, do atra-so no horário de ir buscar a criança na escola13; conversava com quem estivesse vivendo um momento difícil e ajudava a resolver questões familiares. Em todos os momentos, relembrava-os que estava educando o seu filho e que não poderia fazer sem a cola-boração da família14.

Ao tempo em que educava os filhos, também educava os pais, muitos deles oriundos de famílias carentes e sem uma forma-ção moral e social socialmente aceitável. A convivência que eles tinham com a Escola facilitava a mudança de valores e atitudes, condição que ela julgava imprescindível ao bom resultado do seu trabalho na formação das crianças, pois não teria a casa desfazen-do o que a escola procurava construir.

Também envolvia a família nas condições financeiras da Esco-la, como os tomando como alunos em cursos profissionalizantes, como corte e costura, a fim de angariar fundos para a instituição, trazê-los para a escola e, muitas vezes, dar-lhes uma alternativa de gerar renda para a própria família.

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Notas1 A construção da nova sede foi acompanhada de perto pela educadora Angeli-

na de Assis. Era ela quem conversava com engenheiros e mestres-de-obra. As salas foram pintadas respeitando-se a cor indicada por cada professora.

2 Apesar do propósito e da metodologia adotada, as turmas não eram pequenas, pois havia grande demanda social. Como indica o seguinte depoimento:

“[...] eles eram pequenos em idade, mas eram turmas bem grandes, porque era uma afluência imensa, pais que queriam mesmo dormir na porta da escola para conseguir matrícula” (ex-professora da escola).

3 A ignorância sobre o assunto era grande e atingia às mais variadas pessoas. Como exemplifica o depoimento de uma ex-professora da Escola Baronesa de Sauípe e participante dos cursos da OMEP: “eu fui pedir a um prefeito para ele liberar uma professora nossa também, pra ir pra uma bolsa de estudo em Belo Horizonte durante um ano. A prefeitura não tinha gasto nenhum, era apenas a licença. Ele ficou muito admirado: estudar criança dessa idade? A senhora vai fazer curso pra fazer o que com criança dessa idade? Eu vou dispensar a professora pra ficar passeando em Belo Horizonte?”

4 Bairro popular, de grande pobreza, com residências construídas sobre pala-fitas.

5 Depoimento de uma professora da Escola Baronesa de Sauípe na década de 80.

6 Nada na escola era feito aleatoriamente, o planejamento era rigorosamen-te elaborado e seguido, como esclarece o seguinte depoimento: “ [...] tinha essa coisa, que era atrelado, geralmente, ao tema trabalhado, ela não fazia nada assim solto, tudo tinha que ter, haver com o planejamento, que era feito em sala de aula, em cima desse planejamento já destacava o que vai ser feito com os pais, o que vai ser feito com as crianças dentro das salas, o que vai ser feito com as professoras, o que elas vão produzir, o que os meninos vão estar produzindo, o que os pais vão estar produzindo”. (Depoimento de uma professora da escola).

7 Ex-aluna e Assistente Social da Escola.

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8 O depoente foi aluno da Escola na década de 50.

9 “[...] toda quinzena nós tínhamos que discutir todos os problemas que as crianças apresentavam, problema de linguagem, problema de audição, pro-blema de agressividade, tudo isso era tratado dentro do próprio colégio. Nós recebíamos a orientação de como íamos tratar aquela criança, era um trabalho muito bem feito, muito bem feito” (Depoimento de uma ex-professora da escola Baronesa de Sauípe).

10 Professora da Escola os anos 80.

11 “dona Angelina era muito católica, e as crianças cantavam, como ainda can-tam antes da merenda, agradecendo ao papai do Céu, aprendiam de um modo geral o que é Deus, e Jesus, eles aprendiam. Ela sempre teve muito cuidado, e me recomendou, isso eu também fiz na minha escola, cuidado em não limitar os nossos ensinamentos religiosos a uma religião, porque as crianças pertenciam a outras religiões”.(trabalhou com a educadora na OMEP – Or-ganização Mundial de Educação Pré-Escolar).

12 A depoente foi professora da Escola no período de 1958 a 1988.

13 Dizem as entrevistadas que ela ficava muito irritada e chegava a se atritar com os pais que negligenciassem quanto ao cumprimento do horário de buscar as crianças na escola. O motivo principal era ter deixado a criança em segundo plano, situação que ela não admitia.

14 Conforme depoimento de uma ex-professora da escola na década de 80: “[...] ela tinha aquela vigilância de querer que os pais se cuidassem para vir à escola, então ela dava nota no cabelo, se tivesse uma coisa assim: “olha, pai,nós estamos trabalhando com seu filho, olhe isso, veja o senhor também”. Ela ficava na entrada e na saída, quando ela estava lá em prontidão, porque ela queria ver esse momento da entrada dos pais e aí, expressão de carinho, conversa com um, os que tinham algum problema ela já ia apontando: “olha, pai, é bom ver isso”. Quem precisava de uma conversa maior, então: “olha, pai, já estou lhe aguardando aqui, no retorno a gente conversa”.

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A organização iniciou-se na França e disse-minou-se, através de suas filiais, por vários pa-íses. A filial da Bahia, em Salvador, foi fundada no ano de 1963, pela educadora, e chegou a ser considerada a segunda maior do país. Tinha um ritmo de atividades intenso: cursos, seminários e congressos2.

O envolvimento de Angelina com a OMEP foi total e por toda a sua vida, por ser essa uma organização voltada para o estudo da educação pré-escolar, ideal de vida da educadora. Ela pre-sidiu a filial da Bahia desde a fundação e ao lon-go de toda a sua vida. De início, por não possu-írem uma sede própria, a mesma funcionava na Escola de Puericultura, enquanto a educadora procurava captar recursos para a aquisição de uma sede própria, que aconteceu após ter sedia-do um congresso mundial em Salvador.

A Organização Mundial fazia congressos em diferentes países, como, por exemplo: França, Bélgica e Estados Unidos; e as filiais do Brasil, em vários estados, tais como: Belo Horizonte,

A Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar – OMEP1

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Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A educadora Angelina parti-cipava, no Brasil, de todos, e no exterior, de muitos.

A própria educadora se responsabilizava pela divulgação e or-ganização e de suas atividades, visitando escolas, convidando pro-fessores, levando a notícia aos meios de comunicação de massa. O jornal A Tarde do dia 20 de maio de 1980 trouxe matéria onde a educadora anunciava o IV Congresso da OMEP a ocorrer em Brasília, momento em que autoridade, políticos, pesquisadores e educadores estariam debatendo a educação pré- escolar. Naquele momento, ela relatou ao referido jornal que a atenção à criança era um dos temas mais desafiadores: “[...] pela urgência e pela magnitude”.Diante disso e aportada em sua própria experiên-cia, ela considerava que todos os estados da federação deveriam e tinham condições de abrir instituições comprometidas com a formação de crianças na idade pré-escolar. Considerava que o evento científico seria uma oportunidade para colocarem em dis-cussão tais idéias. Outros jornais locais também noticiaram3 o evento do ano de 1980 e enfatizaram que a abertura do mesmo seria feita pelo então Ministro da educação, Eduardo Portela, e que a professora Angelina apresentaria o trabalho intitulado: Ati-vidade Lúdica e o Pré-escolar.

A filial da OMEP sediada na Bahia, preocupada com a forma-ção do professor responsável pela educação pré-escolar, mantinha grande oferta de cursos e capacitações, de variadas modalidades, indo desde aqueles de fim-de-semana ou fins de tarde, até os que duravam um ano.

Também variavam no conteúdo, contemplando desde o estu-do das teorias educacionais e psicológicas, como J. Piaget, a ma-

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temática, psicologia e demais conteúdos técnicos e de interesse do professor da pré-escola. A clientela era variada, composta por professores das redes públicas (municipal e estadual), particular, bem como do interior e da capital. Como esclarece o depoimen-to a seguir:

[...] a OMEP era uma associação que acolhia qualquer pessoa que chegasse lá, você podia ser de escola particular ou de escola pública, inclusive, a gente facilitava muito pras escolas públicas, que eram dadas bolsas, porque geralmente era um convênio [...] ela não tinha essa diferença se era de escola pública, ou era de escola particular, era professora da pré-escola, era alguém que estava ali para nos aju-dar a dar uma assistência melhor pras crianças pequenas, fossem elas da escola particular ou pública. (Depoimento de uma secretária da OMEP no período de 1963 a 1988)

O acolhimento dos profissionais das escolas particulares era mal visto por alguns que consideravam, com isso, que ela esta-va contribuindo com escolas que só visavam o lucro econômico. Seu argumento, entretanto, era lógico e bem sedimentado, fruto de um embasamento ideológico seguro: todos visavam a educa-ção infantil, o desenvolvimento da criança e, quanto mais qualifi-cados, melhores serviços prestariam. Sua atitude contribuía para a unificação do ensino pré-escolar, pretensão que só é possível a quem goza de reconhecimento profissional e social.

Os cursos e treinamentos eram ministrados por professores do Estado da Bahia, de outros estados do país e convidados de outros países. As informantes relembram a vinda daqueles de nacionalidade Argentina, que eram convidados, recebidos e aco-lhidos pela educadora. Todas as iniciativas eram tomadas por ela,

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desde o convite à captação de recursos para as despesas de passa-gem e hospedagem.

Os depoentes são unânimes quanto à qualidade do trabalho desenvolvido por ela e de sua total dedicação à educação pré-escolar. O depoimento a seguir serve para exemplificar:

[...] ela suou ali, ela deu sangue, né, porque foi feito com muito amor, com muito carinho, então, tudo que ela fazia, tudo o que ela entrava nós seguíamos porque sabíamos que ia se tudo bem feito. Quando tinha congresso aqui, ela fazia tudo com muito amor, com muito carinho, era muito exigente, mas era uma pessoa muito coe-rente, ela queria tudo de melhor para representar a Bahia. (Funcio-nária da OMEP desde 1963)

O valor dos mesmos começou a ser reconhecido pela socieda-de, especialmente pelas escolas particulares que passaram a exigir que seus professores fizessem os referidos cursos. Possuir um certificado de curso realizado na OMEP também fazia a diferen-ça a ponto de aprovar ou reprovar alguém em um concurso para o ensino.

Angelina expandia seus conhecimentos de toda forma. Man-tinha contato com estados do eixo Rio-São Paulo, que tinham maior experiência com a educação pré-escolar, área praticamente desconhecida nos estados do Nordeste. Também participava de viagens de estudos a outros países como os Estados Unidos. Lá visitava escolas, tomava cursos e, ao chegar, fazia questão de re-passar o conhecimento adquirido aos professores da “sua escola” e a todos aqueles que se dedicassem ao ensino pré-escolar, como era chamado.

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Em todas as oportunidades de viagens de estudos, ela era considerada uma personalidade ilustre. Participava de mesas re-dondas, debates, e era assediada pelos participantes. Conforme relato de uma professora que muito a acompanhou nas referidas viagens:

[...] ela era tímida, embora fosse assim aquela mulher de muita pre-sença, uma presença extraordinária, simpática e muito afável. Muito querida, porque viajei com ela para os congressos que houve no pais, os congressos da OMEP onde ela era muito respeitada, era das fi-guras mais apreciadas no panorama brasileiro, na esfera da educação pré-escolar. Ela participava das mesas redondas, dos trabalhos, ela ocupou sempre um cargo de destaque

Capacitação de professores

A OMEP Bahia, por intermédio da professora Angelina, se preocupava com a capacitação e atualização dos educadores da pré-escola, de modo que oferecia dois a três cursos anualmente, além de seminários, palestras, semanas de estudo e congressos arcando com as despesas ou contando com o apoio das partici-pantes. Com os professores da Escola Baronesa de Sauípe, em muitos momentos, ela fazia questão de pagar as horas gastas nos cursos, pois achava que era para o trabalho e estavam ocupando seu tempo livre. Aqueles das escolas da rede pública, ela oferecia bolsas de estudo e facilitava de todas as formas sua participação.

Visando atingir o mesmo objetivo, ou seja, melhor qualidade na educação oferecida a crianças até 7 anos, a OMEP, através da iniciativa de sua Presidente, mantinha com a Secretaria de Edu-

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cação do Estado uma relação aproximada. Levava suas impressões sobre o que via nas escolas, fruto das visitas que fazia às mesmas com a intenção de acompanhar o trabalho ali desenvolvido. Tal contato e o prestígio que a educadora possuía, resultava, muitas vezes, em atenção especial da SEC às mesmas, com a vinda de recursos materiais, humanos e intelectuais.

Fazia entre a OMEP e a Escola Baronesa de Sauípe uma via de mão dupla, onde uma ajudava a outra. Por exemplo, do mesmo modo que ela oferecia cursos na primeira e convidava as profes-soras da segunda, também fazia o contrário, promovia palestras, cursos e vivências na escola e convidava os professores filiados da OMEP.

Como dissemos, ela considerava que o professor da pré-escola deveria ter mais qualificação do que os demais, especialmente de Psicologia, pois para ela, a educação infantil deveria apoiar-se nos estudos psicológicos. Assim, ficava atenta aos novos educadores dessa área de ensino e investia na sua formação.

Os futuros professores4 realizavam estágios supervisionados, onde o professor da classe os acompanhava e se colocava como exemplo a ser seguido. Conforme esclarece o depoimento:

[...] quando nós entrávamos na escola a gente não assumia a sala, a gente ficava um ano junto com a professora que sabia, né, era, um ano junto, ajudando, mas não assumia a sala, no segundo ano a gen-te assumia. (Ex-professora da Escola Baronesa de Sauipe)

O comentário da professora ainda contempla uma comparação e uma crítica ao modelo de formação do educador da atualidade, onde os alunos são entregues a estudantes, ainda não preparados

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para o ofício. Situação que poderia acontecer na época em ques-tão, porém, não na escola dirigida por Angelina, que impunha seus princípios e métodos para capacitar o futuro educador da pré-escola.

Notas1 Considerando os interesses deste estudo, nos ateremos apenas à prática da

educadora na OMEP e não da instituição em si.

2 Inicialmente não possuía sede própria e realizava suas atividades na escola de Puericultura.

3 A Tarde, 20 de maio de 1980. Matéria: “Organização Mundial de ensino Pré-Escolar pede atenção para as crianças”

4 A influência de Angelina sobre os professores da pré-escola na Bahia foi mui-to grande e ainda tem reflexos hoje. Por exemplo, muitas das escola infantis consideradas de excelência em Salvador são dirigidas ou de propriedade de professores que participaram dos cursos da OMEP, sob sua orientação.

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Nasceu no dia 27 de junho de 1915, em Palmas de Monte Alto, no município baiano de Caetité, filha de Pedro Pinto de Carvalho Rocha e de Maria da Conceição Rocha, sendo prima do educador Anísio Teixeira, com quem mantinha estreito contato, tanto por questões de parentesco quanto por ideais educativos.Seu perfil ético e estético se identificava com o de educadora da época: dedicação total à causa da educação, a ponto de torná-la um verdadeiro sacerdócio. O modelo de Angelina pessoa se confundia com o da educadora e centrava-se principalmente na postura moral: com firmeza, determinação e austeridade, apesar de ser solidária, companheira e bondosa.“Era uma pessoa interiormente muito bonita, exteriormente muito elegante, ela sempre dizia que professor de jardim de infância tinha que se apresentar bonito para as crianças” (ex-professora da Escola Baronesa de Sauipe). Dentre suas características também há quem a considerasse tímida, apesar de ser uma presença marcante e muito apreciada onde quer que fosse. Nos congressos nacionais e internacionais, ela sempre ocupava lugares de destaque, como participando de mesas redondas, de debates teóricos e cargos de direção. Sua seriedade e competência profissionais eram reconhecidas pelas autoridades da área da educação, resultando em um tratamento especial. Além de ter

ocupado o cargo de diretora de uma escola pública (Baronesa de Sauipe) durante toda a vida, tinha trânsito livre na Secretaria de Educação. Sua ingerência nos órgãos públicos também é visível em lutas que travou, como por exemplo, na década de 70, quando a Lei 5692 não contemplou a obrigatoriedade do ensino pré-escolar, ela reivindicou junto ao Secretário de Educação da época na Bahia e exigiu dele uma tomada de decisão. Sua exigência consistia em fazer com que o Estado da Bahia tornasse essa etapa de formação obrigatória, o que seria difícil, pois ia de encontro à lei maior e exigia alto investimento. Até uma semana antes do seu falecimento, acometida por um câncer que se generalizou por todo o organismo, manteve-se no cargo de diretora, supervisionou atividades pedagógicas, visitou salas de aula, andando pelos corredores apoiada em fiéis companheiras de trabalho. “[...] Faleceu no dia 15 de dezembro de 1988. Os jornais noticiaram o fato, afirmando que o corpo seria velado na escola Baronesa de Sauipe. Também afirmaram que a educação estava perdendo um dos seus baluartes, conforme a passagem seguinte, do jornal A Tarde do dia 23 de dezembro de 1988: “[...] com a morte de Angelina Rocha de Assis, em 15 de dezembro, a Bahia acaba de perder uma das pioneiras da educação pré-escolar, que lutou a vida inteira pela manutenção do alto padrão, e de extrema dedicação à causa da educação”. ISBN 978-85-232-0647-5

Elizete Passos é Professora Universitária, pesquisadora e escritora. Licenciada em Filosofia, Mestra e Doutora em Educação, há muitos anos vem pesquisando sobre a educação feminina na Bahia e orientando teses e dissertações sobre o assunto. Acerca da temática, tem vários livros e artigos, destacando-se os seguintes livros: O feminismo de Henriqueta Martins Catharino, Mulheres moralmente fortes, De anjos a mulheres, A educação das virgens e Palcos e platéias.