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ANEXO I A MEDIAÇÃO DAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ESCRITA COMO SEGUNDA LÍNGUA PARA ESTUDANTES SURDOS – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL COORDENAÇÃO DE ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) SURDEZ

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ANEXO IA MEDIAÇÃO DAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ESCRITA COMO SEGUNDA LÍNGUA PARA ESTUDANTES SURDOS – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO ESPECIALCOORDENAÇÃO DE ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO

ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) SURDEZ

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A MEDIAÇÃO DAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ESCRITA COMO

SEGUNDA LÍNGUA PARA ESTUDANTES SURDOS – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

1° SEMESTRE 2017

ANEXO IA mediação das tecnologias assistivas para o ensino de língua portuguesa escrita como se-gunda língua para estudantes surdos – algumas considerações

CARMONA, J. C. C1 Conforme Foucalt (1999), a linguagem está vinculada as formas redefinidas

de poder: poder de dizer quem é o outro, o que se sabe ou não. Por meio dela é instaurado um processo hierarquizante e classificatório dos indivíduos na sociedade. As instituições se articulam em torno de discursos autorizados. Na maioria das vezes, vereditos discriminatórios são dados a pessoas ou a grupos sociais como prejulgamentos estabelecidos pelo mesmo sistema que classifica sem considerar o contexto histórico e o processo político que gerou as condições apresentadas, sem esboçar nenhuma reação na busca da reversão de quadros aviltantes de exclusão social.

Nesse ínterim, a história da educação de surdos é marcada por embates em torno do reconhecimento e da negação das línguas de sinais e da cultura surda por meio de subalternizações e colonialismos impetrados pelo controle da diferença (SKLIAR, 1997). Em meio a um campo que registrou a comunidade surda na deficiência, houve o apagamento das línguas de sinais como forma legítima de se relacionar com o conhecimento e com a própria sociedade. Nesse sentido, por muito tempo, a Língua Portuguesa foi tomada como língua fonte de acesso ao conhecimento historicamente construído. Felizmente, esse cenário, alterando-se a partir do Decreto 5626/05, que regulamenta a Lei 10436/02 que dispõe sobre a educação bilíngue, tratando da inclusão da Libras como disciplina curricular, sobre formação de professores, as funções do tradutor intérprete de Libras, e sobre o ensino de Língua Portuguesa como segunda língua para estudantes surdos, além de outros aspectos importantes.

É um grande avanço o reconhecimento legal que estabelece o Português como segunda língua para os surdos, o que implica o reconhecimento de que sua aprendizagem requer metodologias diferenciadas e com referências de culturas visuais. No entanto, não se pode negligenciar os fatos históricos que imprimiram marcas profundas para as comunidades surdas, cicatrizes para muitas gerações que vivenciaram, desde cedo, uma negação de sua forma de ler o mundo, um mundo que lhes entrava pelos olhos e não pelos ouvidos.

1 Atendimento Educacional Especializado – Surdez da Coordenação de Atendimento Educacional Especializado – Departamento de Educação Especial da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Professor adjunto da Universidade Tuiuti do Paraná.

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A MEDIAÇÃO DAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ESCRITA COMO SEGUNDA LÍNGUA PARA ESTUDANTES SURDOS – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

1° SEMESTRE 2017

A Língua Portuguesa, erroneamente, como língua natural para os surdos e atravessa os tempos como instrumento de tortura e de certo modo de inferiorização para esse grupo social (SOUZA, 1998). A história poderia ser outra se tivesse havido abertura a um enfoque bilíngue e cultural e se estes estudantes não tivessem sido isolados em “ilhas de som” em salas de aula. A educação de surdos deve priorizar a língua de sinais e a cultura dos sujeitos surdos em seu processo de aprendizagem. O Português, por sua vez, deve ser assumido em seu status de segunda língua e ser submetido ao processo extremamente complexo de tradução para as modalidades de línguas visuais.

Na inter-relação entre as línguas, torna-se perceptível o quanto a língua de sinais é crucial para os processos de subjetivação dos estudantes surdos e o quanto é imprescindível para o ensino do Português escrito, não como um mero recurso de apoio, como alguns advogam, mas como uma condição para a construção de sentidos de uma maneira mais ampla. A propósito, não podemos esquecer que as línguas se misturam e encontram espaços múltiplos de atualização e negociação de sentidos. Conforme Larossa (2004), “toda língua está atravessada por muitas línguas e está, portanto, multiplicada e dividida em seu interior”, ou seja, todos nós habitamos uma língua múltipla e temos nossas experiências na sua multiplicidade.

A construção de um campo discursivo construído em língua de sinais e traduzido para a Língua Portuguesa com o envolvimento dos estudantes implicados no processo é uma estratégia frutífera que põe em movimento as multiplicidades das línguas em seu jogo constitutivo. A criação de textos em língua de sinais possibilita um papel ativo dos estudantes surdos na atribuição de sentidos, dando vida ao texto, na tradução de experiências singulares. E a experiência, segundo Larossa (2004), “é o que nos passa, ou o que nos acontece, ou o que nos toca”. Em outras palavras, os sentidos das coisas só ocorrem com o envolvimento dos sujeitos no processo, quando se vivencia e se concebe o texto como um deflagrador de processos de subjetivação que está para além do domínio de um conjunto de informações a serem esgotadas.

As experiências com as línguas podem ser concebidas como processos desencadeados por campos reflexivos que as constroem e as descontroem. Durante esse movimento de construção e desconstrução das línguas, por meio de atos criativos, os diferentes tipos de construção textual se contrapõem e fazem emergir sentidos múltiplos no ato tradutório. Para tanto, as estratégias e recursos textuais de ambas as línguas precisam ser vislumbrados em debates regulados pelo desejo de ser, saber e fazer. A liberdade de criação impulsiona o desejo da escritura e a aprendizagem das línguas. É ela que, em certa medida, fornece elementos para a autodescoberta das potencialidades individuais e coletivas. Para isso, há a necessidade, no processo pedagógico, de incorporar os aspectos culturais, históricos e da identidade das pessoas envolvidas na aprendizagem da leitura e da escrita, expressa pela experiência visual e pela língua de sinais.

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A MEDIAÇÃO DAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ESCRITA COMO

SEGUNDA LÍNGUA PARA ESTUDANTES SURDOS – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

1° SEMESTRE 2017

Entrando no mundo da leitura e da escrita

A leitura e escrita são práticas criadas para satisfazer as necessidades produzidas e continuamente transformadas pelas relações sociais, que, por sua vez, são transformadas por outras necessidades. Estas práticas sociais se realizam pela possibilidade de acesso ao saber sistematizado, produzido pela humanidade em sua história. A questão da leitura e escrita nos remete à discussão sobre a linguagem, sobre sua relação com a fala e a relação desta com a escrita, articuladas num processo educativo para as pessoas surdas em contextos escolares. Esta discussão é de extrema valia, uma vez que a concepção de linguagem está atrelada à aprendizagem e ao desenvolvimento da criança. Essa concepção estabelece diretrizes para as práticas de alfabetização e letramento, como também direciona os processos avaliativos na escola.

A perspectiva histórico-cultural arquiteta que o conhecimento é socialmente produzido para atender às necessidades humanas. Prevê também que a construção de conhecimento pelo sujeito é mediada por outro membro de sua cultura. Portanto, esse conhecimento é dependente da interação entre pares e da mediação em uma mesma língua. Isto significa afirmar não somente a necessidade dos surdos estarem juntos num mesmo espaço – o espaço escolar, neste caso – para que tenham acesso ao conhecimento e elaborem novos conceitos sobre ele, mas, principalmente, que a língua de ensino destes estudantes seja a de sinais, língua natural dessa comunidade. Os professores necessitam conhecer esta língua e serem usuários dela, pois, por seu meio que se dá a construção de conceitos nos sujeitos surdos.

A criança desenvolve, a partir das interações dialógicas, os mecanismos comunicativos necessários, construindo progressivamente a linguagem decisiva a seus processos mentais. Desta forma, coloca-se na linguagem a condição para o desenvolvimento dos processos cognitivos. A linguagem exerce a função mediadora entre a criança e o mundo, possibilitando a apropriação da cultura e da história.

De acordo com Vygotsky (1983), a relação entre o pensamento e a linguagem está profundamente calcada no significado das palavras, como unidade do pensamento verbal. É o significado – componente constitutivo da palavra e ato do pensamento – que estabelece o elo entre o pensamento e a linguagem, levando à mediação simbólica entre a pessoa e o mundo, inserindo-a na realidade onde interage. O significado é muito mais do que simples associação do som ao conteúdo da palavra. Enquanto generalização e conceito, o significado desenvolve-se e transforma-se a partir da prática social, sendo dinâmico e dialético. Para Vygotsky (1983), “não é simplesmente o conteúdo de uma palavra que se altera, mas o modo pelo qual a realidade é generalizada e refletida em uma palavra”. A inserção da criança no universo da linguagem e na vida social se dá por meio da atividade discursiva, do diálogo, não aquele que privilegia unicamente a comunicação, mas o que constitui interlocutores históricos, ativos, participantes. É na relação dialógica, por conseguinte, que se dá a inserção e a constituição da criança como ser social.

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O uso das TA para aprendizagem do português escritoAcessar o mundo letrado por meio das propostas educacionais existentes têm sido

um árduo caminho para a maioria dos estudantes surdos. As referências para esse acesso têm partido de diferentes perspectivas: oralismo, comunicação total e, atualmente, o bilinguismo. A carência de pesquisas neste campo, bem como de materiais elaborados para este fim contribuíram para o processo de exclusão do surdo do mundo acadêmico. Esse fracasso educacional pode ser atribuído ao fato de propostas educacionais estarem centradas apenas em aspectos linguísticos e metodológicos das línguas orais, sem levar em consideração a complexidade cultural que envolve as línguas de sinais, bem como os movimentos surdos, as identidades surdas e a experiência visual.

Para a construção de experiências visuais e ensino de línguas na atualidade, as Tecnologias Assistivas (TA) têm se revelado como um importante campo a ser explorado. Mais que mero uso de uma ferramenta de trabalho sofisticada, as experiências que utilizam as mídias tecnológicas, em especial aquelas que facilitam a comunicação à longa distância, têm ganhado terreno junto ao processo de alfabetização e letramento. As TA também têm sido muito utilizadas pela comunidade surda em suas atividades diárias.

Atualmente, tem-se à disposição da população em geral, vários aplicativos para smartphones e sites que podem ser utilizados como ferramentas no processo de ensino de Língua Portuguesa escrita como L2 para estudantes surdos. Nesta perspectiva, destacamos os aplicativos e sites de glossários e sinalários de termos da Libras e de sinais próprios de várias disciplinas escolares. Como exemplo, temos o Sinalário das disciplinas escolares, idealizado e desenvolvido pelo Centro de Apoio aos Profissionais da Educação de Surdos do Paraná (CAS) – Área da Surdez do Departamento de Educação Especial (DEE), em parceria com a Diretoria de Políticas e Tecnologias Educacionais (DPTE), que estará disponível gratuitamente em breve para download para smartphones e em um canal no site YouTube, conforme imagem 1.

Imagem 1: Tela do Sinalário Disciplinar em Libras

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Outro recurso de TA, é o manuário do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), conforme imagem 2.

Imagem 2: Tela do Manuário da TV INES. Disponível em: http://tvines.org.br/?page_id=333

Outros APP´s como o Glossário de Termos de Biologia em Libras (GBLi), desenvolvido no programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Humanas, Sociais e da Natureza da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) – Campus de Londrina, conforme imagem 3.

Imagem 3: Tela do Glossário de Termos de Biologia (GBLi). Disponível em: http://epeem.cp.utfpr.edu.br/site/?page_id=8

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REFERÊNCIAS

FOUCAULT, M. Em defesa da sociedade. Tradução de Maria E. Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

LAROSSA, J. Linguagem e educação depois de Babel. Tradução de Cynthia Farina. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

RAMIREZ, A. R. G; MASUTTI, M. L. (orgs). A educação de surdos em uma perspectiva bilíngue: Uma experiência de elaboração de softwares e suas implicações pedagógicas. Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2009.

SKLIAR, C. (Org.). Educação & Exclusão: abordagens sócioantropológicas em educação especial. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 1997.

SOUZA, R. M. Que palavra que te falta? Linguística, educação e surdez. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

VYGOTSKY, L.S. Formação social da mente. 3. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. 3. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.