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2

Andréa Sandoval Padovani

Adolescência: diferenças entre iguais -

Resiliência: fatores de risco e proteção

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Psicologia

da Faculdade Ruy Barbosa como requisito parcial à obtenção do grau de psicólogo.

Salvador 2006

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3

Diferenças entre iguais :

Um estudo sobre características de resiliência entre adolescentes

comunitários e privados de liberdade

RESUMO

Este trabalho teve por objetivo verificar características que denotassem potencial de resiliência em adolescentes de dois grupos: o primeiro, de adolescentes privados de liberdade de uma instituição de atendimento a medidas sócio-educativas, a CASE, e o segundo formado por adolescentes que participavam do Programa VivaNordeste, um programa comunitário voltado a atender os moradores do Nordeste de Amaralina. Foram pesquisados 28 adolescentes, sendo 14 de cada grupo, sendo utilizados dois instrumentos: uma entrevista semi-estruturada e uma técnica projetiva – Wartegg. Os resultados indicaram que os adolescentes de ambos os grupos apresentaram alguns indicadores de resiliência, contudo estes são mais presentes entre os adolescentes do VivaNordeste, devido a diferenças sociais, como modelo familiar, quantidade de irmãos, escolaridade, participação em atividades sociais e educativas, não uso de drogas, mas, e principalmente, aos recursos internos, como percepção positiva de si, manejo na solução de problemas, objetivos e energia para atingi-los, que modificam a maneira com estes lidam com sua realidade sócio-econômica-cultural. O que pôde ser concluído é a necessidade de redes de apoio visando incentivar os jovens a pensar seu futuro, a buscar alternativas diante das dificuldades e adversidades de sua vida, desenvolver resiliência; alternativas estas que lhes possibilitem mudar o rumo de suas histórias. PALAVRAS-CHAVE: Adolescência, ECA, Resiliência.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CAM – Casa de Assistência ao Menor CASE – Comunidade de Atendimento Sócio-Educativa ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente FEBEM – Fundação Estadual de Bem Estar do Menor FUNABEM – Fundação Nacional de Bem Estar do Menor FUNDAC – Fundação Estadual da Criança e do Adolescente ILANUD - Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente PNBEM – Política Nacional de Bem Estar do Menor SPSS - Statistical Package for Social Sciences

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5

LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 – Agrupamento, por idade, dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador,

no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no

período de agosto a setembro de 2006, de acordo com informações dadas pelos sujeitos durante a

entrevista ............................................................................................................................................... 57

GRÁFICO 2 - Agrupamento, por idade e escolaridade, dos adolescentes privados de liberdade na

CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, de acordo com os dados levantados durante

a entrevista ............................................................................................................................................ 58

GRÁFICO 3 – Participação em atividades sócio-culturais, esportivas e profissionais dos adolescentes

privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes

participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, de acordo com

informações obtidas durante a entrevista .............................................................................................. 59

GRÁFICO 4 – Religiosidade dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período

de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006, informada pelos sujeitos durante a entrevista ......................................... 59

GRÁFICO 5 – Resposta dada à questão sobre a utilização de substâncias psicoativas dos

adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos

Page 6: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

6

adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, em

entrevista ............................................................................................................................................... 61

GRÁFICO 6 - Resposta à questão sobre a ocorrência de violência contra os adolescentes privados de

liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes

do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, conforme informado pelos

sujeitos durante a entrevista .................................................................................................................. 62

GRÁFICO 7 – Modelo familiar dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período

de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006, conforme dados coletados através da entrevista ..................................... 63

GRÁFICO 8 – Quantidade de irmãos informada pelos dos adolescentes privados de liberdade na CASE

– Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, durante a entrevista ................................... 63

GRÁFICO 9 – Resposta à questão sobre a pessoa responsável pelo sustento familiar, durante

entrevista, dada pelos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a

agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a

setembro de 2006 .................................................................................................................................. 64

GRÁFICO 10 – Resposta à questão sobre conflito familiar, dada pelos adolescentes privados de

liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes

do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, durante entrevista ................ 65

Page 7: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

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GRÁFICO 11 - Familiares dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de

julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006, que utilizam algum tipo de substância psicoativa, segunda informações

obtidas na entrevista ............................................................................................................................. 66

GRÁFICO 12 – Dados sobre familiares dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador,

no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no

período de agosto a setembro de 2006, que tiveram algum envolvimento com atos infracionais,

segunda informações obtidas na entrevista ........................................................................................... 67

GRÁFICO 13 – Dados referentes às respostas sobre como o adolescente se descreve, denotando a

percepção de si mesmo dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de

julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006.................................................................................................................... 68

GRÁFICO 14 – Resposta dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de

julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006, à questão da entrevista sobre como se sentem e como agem diante de

problemas .............................................................................................................................................. 69

GRÁFICO 15 – Resposta dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de

julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006, à questão da entrevista sobre como se relacionam com amigos e

familiares ................................................................................................................................................ 70

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GRÁFICO 16 – Resposta dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de

julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de

agosto a setembro de 2006, quando questionados sobre o que desejavam para o seu futuro ............ 71

GRÁFICO 17 – Dados sobre a formação do ego em adolescentes privados de liberdade na CASE –

Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo um do

teste projetivo Wartegg .......................................................................................................................... 72

GRÁFICO 18 – Dados sobre a presença choque ao realizar o teste, demonstrando dificuldades em

fortalecer o ego e lidar com si mesmo em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no

período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período

de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo um do teste projetivo Wartegg ..72

GRÁFICO 19 – Dados sobre a consciência dos valores que orientam a conduta em adolescentes

privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes

participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da

análise do teste projetivo Wartegg ......................................................................................................... 73

GRÁFICO 20 – Dados sobre a autoconfiança em adolescentes privados de liberdade na CASE –

Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do teste projetivo

Wartegg .................................................................................................................................................. 74

Page 9: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

9

GRÁFICO 21 – Dados sobre o manejo da afetividade em adolescentes privados de liberdade na CASE

– Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo dois do

teste projetivo Wartegg .......................................................................................................................... 75

GRÁFICO 22 – Dados sobre como a afetividade flui nos relacionamentos de adolescentes privados de

liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do

Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do

teste projetivo Wartegg .......................................................................................................................... 76

GRÁFICO 23 – Dados sobre a presença choque ao realizar o teste, demonstrando dificuldades em

fortalecer o ego e lidar com si mesmo em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no

período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período

de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo dois do teste projetivo Wartegg

................................................................................................................................................................ 76

GRÁFICO 24 – Dados sobre o manejo de recursos internos ao traçar metas de adolescentes privados

de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes

do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do

campo três do teste projetivo Wartegg .................................................................................................. 77

GRÁFICO 25 – Dados sobre a mobilização de energia para superar obstáculos em adolescentes

privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes

participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da

análise da pressão e tipo de traçado apresentadas nos campos do teste projetivo Wartegg ............... 78

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10

GRÁFICO 26 – Dados sobre a ação frente a barreiras, obstáculos e situações de impasse em

adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e

adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006,

obtidos através da análise do campo cinco teste projetivo Wartegg .................................................... 79

GRÁFICO 27 – Dados sobre traços que demonstram ambição em adolescentes privados de liberdade

na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo três do

teste projetivo Wartegg .......................................................................................................................... 79

GRÁFICO 28 – Dados sobre o manejo da sexualidade e da sensualidade de adolescentes privados de

liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do

Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do

campo sete do teste projetivo Wartegg .................................................................................................. 80

GRÁFICO 29 – Dados sobre a repressão da sexualidade e da sensualidade em adolescentes privados

de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes

do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do

campo sete do teste projetivo Wartegg .................................................................................................. 81

GRÁFICO 30 – Dados sobre a integração à personalidade da sexualidade e da sensualidade em

adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e

adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006,

obtidos através da análise do campo sete do teste projetivo Wartegg .................................................. 82

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GRÁFICO 31 – Dados sobre a relação com o grupo de adolescentes privados de liberdade na CASE –

Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo oito do

teste projetivo Wartegg .......................................................................................................................... 83

GRÁFICO 32 – Dados sobre a interatividade em adolescentes privados de liberdade na CASE –

Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo oito do

teste projetivo Wartegg .......................................................................................................................... 83

GRÁFICO 33 – Dados sobre o relacionamento interpessoal de adolescentes privados de liberdade na

CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise dos conteúdos

encontrados no teste projetivo Wartegg ................................................................................................ 84

GRÁFICO 34 – Dados sobre a afinidade com seres vivos de adolescentes privados de liberdade na

CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise dos conteúdos

encontrados no teste projetivo Wartegg ................................................................................................ 85

GRÁFICO 35 – Dados sobre a conduta social e o comprometimento com valores de adolescentes

privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes

participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da

análise do campo oito do teste projetivo Wartegg ................................................................................. 85

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12

GRÁFICO 36 – Dados sobre a comunicação de adolescentes privados de liberdade na CASE –

Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise dos conteúdos

encontrados no teste projetivo Wartegg ................................................................................................ 86

GRÁFICO 37 – Dados sobre a execução de tarefas de adolescentes privados de liberdade na CASE –

Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa

VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise da seqüência de

escolha dos campos do teste projetivo Wartegg ................................................................................... 87

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Medida sócio-educativa aplicada e tempo de internação dos adolescentes, participantes

da pesquisa, privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de Julho a Agosto de 2006, que

cometeram ato infracional, conforme informado pelos sujeitos em entrevista........................................ 68

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SUMÁRIO

RESUMO................................................................................................................................................ 02

PARECER DA PROFESSORA ORIENTADORA................................................................................... 03 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS................................................................................................. 04 LISTA DE GRÁFICOS............................................................................................................................ 05

LISTA DE TABELAS............................................................................................................................... 13

1. INTRODUÇÃO e JUSTIFICATIVA................................................................................................... 17

1.1. Adolescência: metamorfose do crescimento............................................................................. 17

1.2. O adolescente: resultado de uma sociedade............................................................................ 22

1.3. Adolescente em conflito com a lei: uma realidade.................................................................... 24

1.4. Adolescência e lei: um novo olhar... E um novo fazer?............................................................. 27

1.5. Risco X Proteção: Vamos falar de resiliência?.......................................................................... 33

2. PROBLEMA E OBJETIVO(S)............................................................................................................. 39

2.1 Pesquisar para melhor conhecer............................................................................................... 39

3. METODOLOGIA (PROCEDIMENTO)................................................................................................. 42

3.1 Sujeitos...................................................................................................................................... 42

3.1.1 CASE: a realidade depois do ato infracional..................................................................... 42

3.1.2 Projeto VivaNordeste: uma tentativa de promover resiliência........................................... 44

1.6. Procedimentos para coleta de dados........................................................................................ 45

2.2.1 Aplicação de Teste Projetivo – Wartegg........................................................................... 46

2.2.1.1 Wartegg: um teste projetivo.............................................................................. 48

2.2.2 Entrevista Semi-Estruturada............................................................................................. 49

1.7. Procedimentos para análise de dados...................................................................................... 49

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15

2. RESULTADOS................................................................................................................................. 50

2.1. Quem são os adolescentes da pesquisa?................................................................................. 50

2.2. A família na qual se inserem estes adolescentes..................................................................... 55

2.3. O adolescente e o ato infracional.............................................................................................. 60

2.4. O adolescente por ele mesmo................................................................................................... 61

2.5. O Adolescente por uma técnica projetiva.................................................................................. 64

3.5.1 A Formação do Eu............................................................................................................ 64

3.5.2 O Adolescente e seus conteúdos internos........................................................................ 67

3.5.3 O adolescente diante de suas metas e aspirações e frente a obstáculos........................ 70

3.5.4 A sexualidade e a sensualidade no adolescente.............................................................. 73

3.5.5 Habilidades sociais do adolescente.................................................................................. 75

3.5.6 As idéias e as ações......................................................................................................... 79

3. DISCUSSÃO .................................................................................................................................... 81

3.1. Descobrindo os adolescentes da pesquisa............................................................................... 81

4.2 A família por trás do adolescente............................................................................................... 86

4.3 O ato infracional que encobre o adolescer................................................................................. 90

4.4 Com a palavra: o Adolescente!................................................................................................... 92

4.5 O adolescente sob o olhar de uma técnica projetiva................................................................. 95

4.5.1 A formação da identidade................................................................................................. 96

4.5.2 Lidando com conteúdos internos...................................................................................... 98

4.5.3 Encarando metas e obstáculos........................................................................................ 99

4.5.4 O ato de relacionar-se..................................................................................................... 101

4.5.5 O adolescente e o ato de escolher.................................................................................. 105

4. CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 106

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................................... 113

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ANEXOS............................................................................................................................................... 117

Anexo A.................................................................................................................................... 118

Anexo B.................................................................................................................................... 119

Anexo C.................................................................................................................................... 120

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1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

1.1 Adolescência: metamorfose do crescimento

O único significado da vida é crescer. Nenhum preço é alto demais para o crescimento.

Apenas compreendendo isto, você pode ajudar alguém a crescer. CARKHUFF1

Segundo o Dicionário Houaiss, “adolescência significa a fase do desenvolvimento humano

caracterizada pela passagem à juventude e que começa após a puberdade”. Adolescência vem do

latim adolescentia, que significa “mocidade; idade de mancebo”, é sinônimo de juventude, que vem do

latim juventus, útis, “época ou condição de estar na mocidade, de ser jovem”. A definição jurídica, no

entanto, é expressa através do artigo 2º do ECA (BRASIL, 1990), lei que dispõe sobre a proteção a

crianças e adolescentes:

Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.

A adolescência, durante um grande período de tempo, foi descrita por estudiosos do desenvolvimento

como a fase entre a infância e a idade adulta ligada a estereótipos e pré-conceitos relacionados ao

senso comum que a caracterizavam como sendo a fase da rebeldia, conturbações e agressividade.

Esta fase “tem sido vista desde a Antiguidade pelo prisma da impulsividade e excitabilidade. Aristóteles

(300 a.C.) os considerava apaixonados, irascíveis e inclinados a se deixarem levar por seus impulsos”

(NEWCOMBE2 apud ASSIS, 2003, p.670).

Atualmente esta etapa tem sido alvo de muitas pesquisas e se constituem novas abordagens sobre o

tema, tendo sido Erikson3 (apud OZELLA, 2002, p.16) o “grande responsável pela institucionalização

da adolescência como uma fase especial no processo de desenvolvimento (...) identificando essa fase

1 CARKHUFF, Robert R. O Relacionamento de Ajuda para Pais, Professores, Psicólogos. Belo Horizonte: CEDEPE, 1ª. edição, 1979. 2 NEWCOMBE, N. Desenvolvimento Infantil: Abordagem de Mussen. São Paulo: Artmed, 1999. 3 ERIKSON, E. Identidade, juventude e crise. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.

Page 18: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

18

com confusão de papéis e dificuldades de estabelecer uma identidade própria”, como um período que

denota um modo de vida e não apenas um momento de transição.

A adolescência pode ser definida por passagem da infância para a fase adulta e constitui-se de

mudanças fisiológicas, psicológicas e sociais, “um período que começa na biologia e termina na

sociedade” (FERRARIS, 2005). É uma fase de transição que afeta aspectos físicos, sexuais, cognitivos

e emocionais. Porém, as transformações nem sempre ocorrem de maneira linear. Mudanças no corpo,

“na aquisição da identidade de gênero, na escolha profissional”, dos objetos sexuais, trazem consigo

algumas dificuldades, já que “novos relacionamentos, novas identificações devem ser construídas e, a

partir deles, surgem novos valores, nova visão de mundo” (NASCIMENTO, 1999, p.15).

Muitos autores vêem a adolescência como uma fase “marcada por uma modificação significativa da

representação de si (...) um conjunto de crenças, sentimentos e projetos de uma pessoa sofre

transformações” (NASCIMENTO, 1999, p.43). Reconhecer-se a si mesmo, lidar com as exigências do

grupo social, construir novas identificações são desafios característicos desta fase, que os tornam

vulneráveis às influências externas. Nesta etapa da vida, “o desejo de ser original compete com o

desejo de não ser diferente” (NASCIMENTO, 1999, p.44).

O adolescente, graças à sua personalidade em formação, coloca-se em igualdade com seus mais velhos, mas sentindo-se outro, diferente deles, pela vida nova que o agita. E, então, quer ultrapassá-los e espantá-los, transformando o mundo... (PIAGET, 1998, p.62).

Segundo Aberastury e Knobel (1981, p.9), a adolescência é um momento confuso, doloroso e repleto

de contradições, podendo ser considerado o período mais difícil do desenvolvimento humano. Os

autores partem do pressuposto de que “o adolescente passa por desequilíbrios e instabilidades

extremas”, porém estes fatores levam à crença da preexistência de uma crise no adolescente,

afirmação incômoda aos autores, que acreditam que o tema deveria ser alvo de debates mais

profundos, já que esta visão traz consigo estigmas que caracterizam a “síndrome normal da

adolescência”, cujas marcas são a rebeldia, instabilidade de afetos, tendência grupal, as crises

religiosas e de identidade, necessidade de fantasiar, as flutuações de humor, contradições excessivas,

interesse sexual exacerbado, entre outras.

Page 19: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

19

Vários são os autores que buscam definir esta etapa do desenvolvimento; de acordo com Aberastury e

Knobel (1981, p.15), a adolescência é uma “fase de reorganização emocional, de turbulência e

instabilidade, caracterizada pelo processo biopsíquico a que os adolescentes estão destinados”.

Segundo Chaves Júnior4 (apud ASSIS, 2003, p.679), “a juventude se distingue das outras gerações

não pela faixa etária, mas pelo conteúdo que simboliza, sendo responsável por determinar, de forma

mais veemente, o ritmo da história”. Enquanto que para Stone5 (apud RAPPAPORT, 1981, p.11), “a

adolescência é uma invenção cultural”.

De acordo com Piaget (1998), os planos de vida dos adolescentes ultrapassam o real, seus sistemas

hipotético-dedutivos assumem a forma de uma hierarquia de valores afetivos, mais do que um sistema

teórico; seus planos de vida são cheios de sentimentos generosos, projetos altruístas, de fervor

místico, porém também se caracterizam por uma inquietante megalomania e egocentrismo consciente.

O adolescente parece, muitas vezes, anti-social, mas isto é falso, já que ele se preocupa

constantemente com a sociedade, com o intuito de reformá-la, o que pretende demonstrar é o desprezo

pela sociedade real, condenando-a.

A duração da adolescência pode ser estabelecida em termos biológicos, porém não pode ser reduzida

a fatores sociológicos, pois estes se alteram de acordo com modelos sociais e culturais. Pesquisas

indicam que adolescentes de classes sociais desprivilegiadas não se enquadram na adolescência

típica, pois “... papéis aprendidos na sua infância (...) se mantém na idade adulta” (NASCIMENTO,

1999, p.18). Responsabilidade, realização de atividades remuneradas necessárias ao próprio sustento,

independência total ou parcial da família, falta de tempo para a diversão, para o estudo, demonstram

que, a idade cronológica e a biológica diferem do papel desempenhado por adolescentes socialmente

desprivilegiados, “os adolescentes são bastante diferentes uns dos outros, por características

individuais e condições de vida” (FERRARIS, 2005, p.51).

4 CHAVES JÚNIOR, E.O. Políticas de juventude: evolução histórica e definição, p. 41-48. Cadernos Juventude, Saúde e Desenvolvimento. Brasília: Ministério da Saúde, 1999. 5 STONE, L.J. e CHURCH, J. Infância e adolescência, 2ª. Ed. Belo Horizonte: Interlivros, 1972.

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20

Segundo Ayres (2006), a adolescência, modernamente, passou a ter uma conotação psicossocial;

sociologicamente é um período de transição em que o indivíduo passa de um estado de dependência

para uma condição de autonomia; do ponto de vista psicológico, é um período crítico de definição de

identidade, que inclui mudanças nas estruturas da personalidade e nas funções que o indivíduo exerce

na sociedade.

Segundo Rappaport (1981), o adolescente passará por crises ao efetuar escolhas dentro do mundo,

crises que farão parte do seu processo de configuração da identidade, crises que trarão à tona os prós

e contras característicos que qualquer opção, e ainda, atualização da energia, vitalidade e coragem

necessárias ao enfrentamento destas escolhas. Ao refletir sobre estas crises e dificuldades do

processo de desenvolvimento, o adolescente organiza suas aquisições.

A construção da identidade no adolescente ocorre a partir de seus atributos pessoais e de sua capacidade de conhecer a si próprio, em constante embate, confronto e diálogo com o outro. Ao se diferenciar dos outros, o adolescente reafirma o que é e percebe mais claramente o que não é6 (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Acreditar na adolescência com características universais, propondo uma igualdade entre os jovens sem

considerar sua inserção na história, no contexto social, conforme a Psicologia do Desenvolvimento tem

trabalhado até o momento, é como ocultar desigualdades presentes na sociedade, situando a

responsabilidade do agir sobre o próprio adolescente, desconsiderando a realidade que o cerca e o

fenômeno biopsicossocial que é pano de fundo para o desenvolvimento humano (OZELLA, 2002).

Segundo Mira Y Lopez (1980), o processo de criação e integração do indivíduo se dá através dos anos,

impresso por diversas circunstâncias externas e internas, e são divididos em algumas etapas, sendo a

juventude uma delas. Para o autor, esta fase se caracteriza pelo surgimento do pensamento abstrato,

pela aquisição da responsabilidade social, de ações frente à sociedade e pelo desenvolvimento da

sexualidade; sob aspectos psicológicos, é o momento de organizar, evoluir e ponderar os

conhecimentos concretos adquiridos até esta fase e durante a mesma. Junto a isto, surge a

exacerbação da agressividade e do desejo de independência, que se contrapõem ao medo ainda

infantil frente a tantas descobertas.

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O sujeito classifica e sintetiza sua bagagem de experiências infantis e estabelece seus conceitos e crenças gerais. Ao mesmo tempo descobre novos problemas (...) que embargam o ânimo. (...) Momentos em que o coração lhe dita que siga como uma criança, e a razão lhe impulsionam a pensar como homem7 (MIRA Y LOPES, 1980, P.41).

Segundo Nascimento (1999), é possível identificar alguns traços comuns nos comportamentos da

adolescência, pois são passíveis de generalização, já que se repetem independente da época ou do

tipo de sociedade, bem como da classe social. São sentimentos e comportamentos que propiciam

elementos que possibilitam identificar esta fase. A autora cita que pesquisas realizadas por Salles, com

jovens de diferentes culturas, puderam verificar que “as idéias, vontade de lutar e de trilhar novos

caminhos, construir uma sociedade melhor, eram comuns a todos eles (...) a estrutura de sentimentos é

a mesma” (NASCIMENTO, 1999, p.19). Porém se verificam particularidades, singularidades quanto ao

pensamento, atitudes, valores e crenças, delineadas por diferenças culturais, sociais e econômicas.

O conceito de adolescência não pode ser considerado universalmente, uma vez que não é identificado

em todas as culturas. O nascimento da adolescência coincide com o surgimento da família moderna, os

jovens surgem como um grupo com especificidades e a preocupação para com eles culmina com a

necessidade de melhor compreendê-los. “Problemas tais como fracasso escolar (...) delinqüência, uso

de drogas, doenças sexualmente transmissíveis, homicídios e suicídios desafiaram psicólogos e

educadores” (NASCIMENTO, 1999, p.29).

Algumas questões típicas da adolescência se manifestam durante toda a vida, “ebulição,

efervescência, paixão e devir não são passageiros como um período de desenvolvimento (...) Neste

sentido, a adolescência pode ser considerada um ”estado de espírito” cujo fim não é determinado”

(NASCIMENTO, 1999, p.17) pela idade ou papéis sociais.

Atualmente se busca uma visão menos patologizante e estereotipada da adolescência, considerando-a

uma fase de mudanças, mas não de marcas, um fato social e psicológico, constituído de acordo com a

cultura, com significados que surgem nas relações sociais, cujas únicas características universais são

as mudanças corporais e cognitivas. A totalidade social constitui a adolescência; condições sociais não

6 Grifo do autor. 7 Original em espanhol.

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apenas facilitam, contribuem ou dificultam o desenvolvimento de certas características adolescentes,

mas constroem uma determinada adolescência (OZELLA, 2002).

Segundo Rocha (2002, p.25), contextualizar a adolescência é de fundamental importância no processo

de formação dos jovens dos dias atuais que se encontram diante da

instantaneidade temporal provocada pela velocidade tecnológica, que acarreta uma certa superficialidade na aquisição de conhecimento, a cultura do consumo, geradora de múltiplas necessidades rapidamente descartáveis, o quadro recessivo, que amplia a exclusão social, associado à pulverização das relações coletivas, levando à individualização e ao desinteresse na esfera pública e política.

Este contexto, no qual se insere o adolescente atualmente, têm levado à perda de referenciais que

configuram a vulnerabilidade frente aos riscos impostos pela realidade cultural, social e econômica, que

permeia a vida destes jovens.

Para Alves8 (apud OZELLA, 2002), alguns profissionais que atuam junto a adolescentes dizem que,

apesar de se considerarem distantes do mundo adulto, estes jovens reproduzem os papéis sociais

desempenhados neste, quanto a questões políticas, sociais, questões relacionadas ao estudo, trabalho

e relacionamentos.

A adolescência é um período vulnerável para muitos, pois é uma fase do desenvolvimento em que ocorrem mudanças físicas e psicológicas; é quando o indivíduo começa a tornar-se independente dos pais e dar mais valor aos pares; é também quando o indivíduo quer explorar uma variedade de situações com as quais ele ainda não sabe bem como lidar (SAPIENZA e PEDROMÔNICO, 2005, p.210).

1.2 O adolescente: resultado de uma sociedade

O homo sapiens é sempre e na mesma medida, homo socius. BERGER e LUCKMANN9

A sociedade moderna expressa pelo adulto, caracteriza-se pelo individualismo, pelas transformações

culturais e econômicas, que geram, entre outras condições, conflitos, banalização da violência,

desigualdade social, econômica e cultural, condutas ilícitas e cultura de consumo (ANTONI e KOLLER,

2002); fatores encontrados na vida do adolescente, que vítima, testemunha ou agente neste contexto,

8 ALVES, C.P. Eu nunca vou parar de buscar nada: emancipação frente à colonização e políticas de identidade na adolescência. Tese de Doutorado não publicada. Curso de Pós-Graduação em Psicologia Social. PUC-SP. São Paulo, 1997. 9 BERGER, Peter L. e LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, 1999.

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fica exposto à violência física e psicológica e a reproduz em suas relações, podendo, inclusive, incorrer

em atos infracionais (RANÑA, 2005).

Observamos que as crianças e os adolescentes do Brasil representam a parcela mais exposta às violações de direitos pela família, pelo Estado e pela sociedade – exatamente ao contrário do que define a nossa Constituição Federal e as leis complementares. Os maus-tratos; o abuso e a exploração sexual; a exploração do trabalho infantil... a forme ; o extermínio, a tortura e as prisões arbitrárias infelizmente ainda compõem o cenário por onde desfilam nossas crianças e adolescentes (VOLPI, 2002).

Para Trombeta e Guzzo (2002), crianças e adolescentes crescem e se desenvolvem em meio à miséria

material, afetiva e educacional, convivendo diariamente com o desrespeito à cidadania e desigualdade

social. O momento atual desafia os adolescentes

a produzir a sua própria identidade de maneira individualizada. Assim, o jovem é desafiado a ser produtor das suas próprias referências e significações, tornando-se o protagonista das suas práticas e representações, orientando-se pelos acontecimentos circunstanciais, pelas influências e pelas necessidades imediatas (PAULILO e BELLO, 2003, p. 1).

Ayres10 (apud SANTOS, 2000, p.18) sustenta a “indissociabilidade das dimensões sociais, culturais e

psicológicas para uma adequada compreensão do que seja adolescência e a saúde na adolescência”.

O adolescente se apresenta como questionador do sistema e da autoridade, através de suas

provocações, apontando para as incongruências da sociedade em que se insere. Nos jovens autores de ato infracional, essa capacidade parece estar potencializada, e tanto sua ações como suas falas colocam constantemente em análise o modo como estamos organizados socialmente (BOCCO e LAZZAROTTO, 2004, p.45).

Segundo Mira y Lopez (1980), alguns aspectos desta fase como agressividade excessiva, o desejo de

independência e o medo de enfrentar o mundo são importantes para uma melhor compreensão da

“delinqüência juvenil”. Algumas pesquisas realizadas pelo autor indicam que existe enorme influência

de fatores afetivos sobre o juízo moral. Ele acredita que a diferenciação entre bem e mal está atrelada

à socialização da mente e ao desenvolvimento da inteligência abstrata, característica da adolescência,

que permite relacionar, de forma lógica, a ação e suas conseqüências. Porém, acrescenta que

... não basta saber diferenciar o bem do mal, precisa-se sentir a responsabilidade moral, senão o sujeito, ainda conhecendo qual é seu dever, fará o que dita seu desejo (...) a capacidade de juízo moral é uma condição necessária, mas não suficiente, para assegurar uma conduta moral11 (MIRA Y LOPEZ, 1980, p.65).

Condição encontrada entre jovens “delinqüentes”, pois estes carecem do desenvolvimento do que se

convencionou chamar “sentimentos morais”. Experiências indicam que a maioria dos “delinqüentes”

10 AYRES, J.R.C. Vulnerabilidade e avaliação de ações preventivas: HIV, DST e abuso de drogas entre adolescentes. São Paulo: Casa da Edição, p.4-20, 1996.

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apresenta perturbações afetivas, e que todos nascem com tendências delituosas que visam “satisfazer

suas necessidades vitais sem levar em conta para nada o prejuízo que pode ocasionar no meio que o

rodeia...” 12 (MIRA Y LOPEZ, 1980, p.94). Porém o que é aprendido com o meio, através da interação,

irá ou não desencadear estas tendências. O autor defende que a luta contra esta tendência deve ser a

mesma travada contra as enfermidades: através da prevenção e menos através da correção.

Segundo Espinheira13 (apud SANTOS, 2000), existem crianças que são preparadas para a sociedade

através de escolas, cursos de língua, artes, prática de esportes e atividades de lazer, outras, no

entanto, em bem maior número, têm, desde cedo, que se dedicar ao trabalho, comprometidos inclusive

com o orçamento doméstico. As crianças pertencentes ao segundo grupo estão bem mais expostas à

diversidades de condições sociais, pautadas na desigualdade, que marcam como esta fase é vivida.

O adolescente, ao entrar com contato com novos contextos e interações sociais, precisa desenvolver e

aprimorar suas habilidades, que levam às mudanças na autopercepção e na percepção do outro,

criando oportunidade para novas interações. Ao experimentar uma menor liberdade de escolha, estes

adolescentes ficam mais sujeitos a riscos (SANTOS, 2000); entre eles, o envolvimento em atos

infracionais.

1.3 Adolescente em conflito com a lei: uma realidade

Eu sou o que consegui fazer com o que fizeram de mim. SARTRE14

Utilizam-se atualmente as expressões adolescentes em conflito com a lei, adolescente privado de

liberdade ou adolescente autor de ato infracional, pois expressam um momento de sua vida e não uma

categoria valorativa. “A expressão adolescente infrator é comumente reduzida a infrator, tornando o

adjetivo mais importante que o substantivo, imprimindo um estigma irremovível” (VOLPI, 2001, p.21).

11 Original em espanhol. 12 Original em espanhol. 13 ESPINHEIRA, G. De olho na rua. Cadernos do CEAS, n.154, p.1-5, Salvador, 1993. 14 SARTRE, J.P. Sartre. (Coleção Os Pensadores). São Paulo: Nova Cultural, 1987.

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A alteração do termo, para adolescente em conflito com a lei, buscou diferenciar estes dos menores

carentes ou em situação de risco, buscando acabar com a associação mecânica entre pobreza e

marginalidade, pelo menos no discurso oficial (VALLE, 2003).

Ao evidenciar o conceito de adolescente, não se acolhe à idéia de vítima nem de agressor, mas de um

sujeito de direitos, de uma pessoa em desenvolvimento.

Infração vem do latim infractione, que significa ação de quebrar. Inovar, reinventar a si mesmo,

“...quebrar com o estabelecido (...) numa autoria que procura construir territórios que de outra forma

são impedidos. Infração passou a ser (infr) ação, com especial ênfase no movimento que o termo

implica” (BOCCO e LAZZAROTTO, 2004, p.45).

Algumas teorias estudam o tema “delinqüência juvenil” com base em três níveis do qual o ato pode ser

subproduto: estrutural, que concebe os fatores sociais como responsáveis pelo engajamento em

atividades ilegais; a segunda relaciona o problema à vinculação do jovem às instituições como família,

escola e religião; e a terceira privilegia os mecanismos internos do indivíduo como determinantes,

sejam eles aspectos biológicos herdados ou características da personalidade (ASSIS, 1999). O modelo

que permeia a realização deste trabalho engloba os três níveis de forma integrada, onde todos

interagem entre si, pois somente este olhar mais profundo irá proporcionar um maior conhecimento

sobre o tema e sobre estes adolescentes.

O ato infracional cometido por adolescentes é produto de fatores complexos e de várias ordens,

podendo estar relacionado com o período de vida ou com as condições familiares e sociais nas quais

estão inseridos. “Alcoolismo, maus-tratos, abandonos, graves faltas materiais, fragilidade ou

inexistência da figura de autoridade ou de uma substituta” (CASTRO, 2002, p.122) podem ser alguns

fatores que influem sobre o cometimento do ato.

Na origem das condições que encaminham numerosos adolescentes para a socialização e a delinqüência, encontramos um sentimento de abandono, de (des)vinculação, de (des)encontro, de solidão, de isolamento, de (in)comunicabilidade. Cada adolescente em dificuldade, à sua maneira, tenta dissimular, compensar, protestar (COSTA, 1997).

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Para Carmo15 (apud PAULILO e BELLO, 2003, p.3) o contraste entre a riqueza ostentada e a pobreza,

no Brasil, suscita ressentimento. “O menor infrator que rouba uma carteira para comprar um tênis ou

comida pode sentir também a sensação de revanche ou de vingança...”. Segundo Paulilo e Bello (2003,

p.4), o jovem encontra no poder da arma de fogo, dos crimes cometidos contra a sociedade, uma

“forma de conseguir prestígio, aceitação social e dinheiro, tão importantes numa sociedade embasada

em modismos e valores consumistas”.

Conforme argumenta Volpi (2001), a sociedade é responsável por impor valores, padrões e normas

necessárias ao desempenho de um papel ligado a um determinado status e entre as camadas mais

pobres, as metas ligadas ao êxito e à ascensão social são buscadas por diferentes alternativas, estas

nem sempre se inserem no universo das normas sociais vigentes.

existe uma tensão permanente entre as expectativas da sociedade e as expectativas de cada indivíduo em relação ao desempenho de papéis que lhe são impostos, e que muitas vezes o comportamento desviante é adotado exatamente para se atingir os objetivos sociais desejáveis (VOLPI, 2001, p.41).

Segundo Rassial16 (apud BOCCO e LAZZAROTTO, 2004, p.45), o adolescente infrator sai do lugar que

a sociedade lhe atribui em busca de seu espaço. “O ato delinqüente seria uma tentativa, dentre outras,

de inventar outras regras (...) poderia ser concebido como (...) um apelo à sociedade”. Este

adolescente, segundo o autor, não é diferente de outro, estando, apenas, mais suscetível aos impasses

da relação social que o acolhe.

O ato infracional, seria então, uma resposta do sujeito, um modo de se apresentar evidenciando

comportamentos produzidos pelo contexto social no qual está inserido, ele espelha a ruptura social, se

mostra como o produto de uma sociedade capitalista, cujo desenvolvimento é centrado na

produtividade e acumulação. Segundo Carneiro17 (apud BARROS, 2003), “o infrator espelha esse outro

ruim, o lado negro da condição e das sociedades humanas que muitas vezes preferimos não enxergar,

que gostaríamos de... isolar, segregar, tirar de circulação”.

15 CARMO, Sergio Paulo. Juventude no Singular e no Plural. Cadernos Adenauer II, n. 6, São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2001. 16 RASSIAL, J. O Adolescente e o psicanalista. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 1999. 17 CARNEIRO, Carla B.L. Prefácio In Infratores: uma questão de menores? Conjuntura Política, n.13, Minas Gerais: FAFICH-UFMG, nov.1999.

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Segundo Minayo18 (apud ASSIS, 1999, p.11),

...é preciso compreender a escolha e, depois, saber que nenhuma escolha humana pode ser explicada apenas por determinações sociais, embora todas sejam realizadas frente a condições dadas... é necessário também entender que nenhuma escolha pode ser explicada apenas por determinismo biológico e de “índole”, porque todas as condições dadas são necessariamente reinterpretadas e reconstruídas pelo sujeito dentro de seu espaço de liberdade...

Alguns estudos buscam identificar a diversidade de fatores envolvidos na manifestação do ato

infracional e no seu curso de desenvolvimento. Entre eles, dois grandes focos predominam desde as

décadas de 1950 e 1960: o primeiro preocupa-se em expor os fatores envolvidos nas causas, origem e

genealogia do ato infracional, o segundo procura compreender mais que a origem, mas os processos

envolvidos no desenvolvimento deste comportamento infracional, constâncias e variações que surgem

ao longo da vida destes infratores (SILVA e ROSSETTI-FERREIRA, 2002, p.574).

Vivemos numa sociedade permeada por contradições socioeconômico-políticas que delineiam (...) um movimento crítico e tenso, de grave pontencialização de conflitos (...) deparamo-nos com um mundo globalizado e hegemônico, capaz de desenvolver processos socializadores distintos e determinados, que propiciam, ao mesmo tempo, a satisfação de alguns (...) e a frustração de muitos, excluídos até mesmo do acesso a seus direitos vitais (CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA, 2001, p.23).

Segundo Assis (1999), estudos recentes sobre o tema apresentam um novo enfoque ao ato infracional,

verificando que adolescentes sob o mesmo ambiente, desenvolvem comportamentos diferentes.

Baseando-se no termo “vulnerabilidade”, pôde-se perceber que alguns jovens se mostraram mais

resistentes, apresentando comportamento social funcional e adaptado. Para estudar a infração juvenil,

um bom caminho a seguir é identificar os fatores de risco e de proteção que agem sobre estes jovens

no momento de suas escolhas.

1.4 Adolescência e lei: um novo olhar... E um novo fazer?

Talvez desejemos viver um mundo ainda a ser concebido, em que o reconhecimento hoje consagrado das leis dos direitos

da criança e dos adolescentes seja efetivamente posto em prática. ASSIS, PESCE e AVANCI (2006)

A discussão sobre a realidade dos adolescentes em conflito com a lei é antiga e trouxe consigo a

preocupação do modo como instituições atendem as reais necessidades destes adolescentes. A

18 MINAYO. Prefácio In ASSIS, Simone Gonçalves. Traçando Caminhos em uma Sociedade Violenta: a vida de jovens infratores e seus irmãos não-infratores. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1999, 236p.

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criação do ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, foi um grande avanço, pois passou a

considerar crianças e adolescentes indivíduos em desenvolvimento e sujeitos com direitos e deveres. O

ECA

Rompeu com a doutrina da “situação irregular” e reafirmou a noção de “proteção integral”, pela qual todas as crianças e adolescentes, sem distinção, são prioridade absoluta e dever da família, da sociedade e do Estado a sua proteção (CASTRO, 2002, p.124).

Segundo Volpi (2002), os adolescentes em conflito com a lei, embora também façam parte do mesmo

quadro social, não encontram eco para defender seus direitos; por terem cometido um ato infracional,

muitas vezes são desqualificados enquanto adolescentes.

O ECA surge diante de discussões com vistas a estas diferenças e com o objetivo de reconhecer

crianças e adolescentes como detentores de direitos. Antes da criação do ECA, muitas outras leis e

políticas foram elaboradas visando atender crianças e adolescentes em suas necessidades básicas,

bem como buscando formas de lidar com o jovem que infringiu a lei. Em 1964 surge a Política Nacional

de Bem Estar do Menor - PNBEM, (Lei n 4.513/64), e é sob a ótica dessa nova política assistencialista

que surge a Fundação Nacional de Bem Estar do Menor - FUNABEM, que se subdividia estadualmente

nas Fundações Estaduais do Bem Estar do Menor - FEBEM. Apesar de terem como objetivo acabar

com o caráter correcional-repressivo, a FUNABEM e a FEBEM herdam de antigos sistemas a estrutura

física, os equipamentos e também o corpo de funcionários. Sendo assim, houve uma modificação

apenas no nome do programa, mas não foram apresentadas mudanças na forma de pensar o

atendimento ao adolescente em conflito com a lei, que continuou com a carga repressiva (CASTRO,

2002).

Em 1979, é criado o Código de Menores cujo marco é a doutrina do “menor em situação irregular” e o

Direito do Menor. Segundo Emílio Garcia Mendes19 (apud COSTA, 1997) é aplicado um conjunto de

medidas, entre elas, advertência, liberdade assistida, semiliberdade e internação, de forma indistinta

aos menores carentes, abandonados, inadaptados e infratores, não havendo qualquer distinção entre

19 MENDES, Emílio Garcia. Prefácio In COSTA, Antonio Carlos Gomes da. Pedagogia da presença: da solidão ao encontro. Belo Horizonte: Modus Faciendi, 1997, 140p.

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os casos sociais e os que se envolviam em conflitos jurídicos. Nas Delegacias de Menores

encontravam-se meninos e meninas que cometeram atos infracionais diversificados ou que estavam

simplesmente em situação irregular, ou ainda os que apresentassem comportamentos desviantes

(como a “vadiagem” e “atitude suspeita”), junto de adolescentes que cometeram atos infracionais

graves.

Na visão dualista predominante, só podiam haver duas possibilidades: ou os jovens eram criminosos, sem chances de mudanças, ou eram coitados que deviam ser tutelados e guiados a um lugar seguro para todos (BOCCO e LAZZAROTO, 2004, p.37).

Neste período, pouco foi desenvolvido quanto à proteção e reinserção social; as medidas se prestavam

mais a desenvolver e aperfeiçoar condutas anti-sociais e ainda atuavam como discriminativas

escondendo da sociedade os “irregulares”, aqueles que não aceita como seus, “... preferindo debitar a

responsabilidade da conduta anti-social na personalidade de cada indivíduo, como se ele pudesse ser

e existir sozinho no mundo” (XAUD, 2000, p.89).

Com a mudança da legislação e com as mudanças que se fizeram necessárias após a implantação do

ECA, ocorreu uma transformação no modo de ver, pensar e agir em relação a estes adolescentes,

trazendo à instituição o papel de acolher e proteger o adolescente em conflito com a lei,

proporcionando medidas visando a educação, socialização e integração, não apenas durante o período

de sua privação, mas vinda a fazer parte de sua conduta também, e principalmente, fora da instituição.

Transformação esta geradora de grande discussão entre operadores de direito e a sociedade civil

organizada com vistas a mudar o olhar para com crianças e adolescentes de todo o país, mas

talvez a grande mudança proposta pelo ECA seja a idéia de que, sem uma rede articulada e solidária entre todos os envolvidos (judiciário, governos, conselhos de direito, sociedade etc.), tornam-se improváveis intervenções bem sucedidas com os adolescentes que cometeram atos infracionais (CASTRO, 2002, p.127),

bem como com adolescentes de um modo geral, que precisam ver garantidos seus direitos à

educação, saúde, alimentação, habitação, transporte, lazer e cultura, como exposto em seu artigo 4º.:

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990, p.10).

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A elaboração do ECA rompe a divisão entre infância e menoridade, ao conceituar criança e

adolescente como sujeitos de direitos, merecedores de prioridade no atendimento a estes, garantido

por um conjunto articulado de políticas públicas elaboradas, debatidas e deliberadas, responsabilizando

a família, o Estado e a sociedade por seu cumprimento, estabelece a criança e o adolescente como

pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, estabelecendo um processo socioeducativo onde

sejam respeitadas a dignidade e subjetividade, estimulando o desenvolvimento de sua criatividade e

capacidades (VOLPI, 2001).

Ao adotar a doutrina de proteção integral da Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da Criança, o ECA consolida e reconhece a existência de um novo sujeito político e social que (...) deve ter para si a atenção prioritária de todos, constituindo-se num cidadão, independente de sua raça, situação social ou econômica, religião ou qualquer diferença cultural (VOLPI, 2001, p.34).

Em sua segunda parte (Parte Especial), o ECA dispõe sobre as diretrizes da política de atendimento

aos adolescentes que cometeram ato infracional. No que tange a prática do ato, informa considerar ato

infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal, porém declara que são penalmente

inimputáveis os menores de dezoito anos, adotando-se a data do ato, pois estes estarão sujeito às

medidas sócio-educativas previstas pelo ECA, ressalta-se que adolescentes entre dezoito e vinte um

anos também são compreendidos dentro deste limite. Estas medidas, contudo, são questionadas por

aqueles que para ela lançam um olhar mais aguçado e preocupado.

As medidas sócio-educativas são definidas pelo Juiz da Infância e da Juventude, decisão que deve ser

livre do enfoque penalista, considerando as circunstâncias e a gravidade do delito, bem como as

condições pessoais do adolescente, introduzindo um caráter social e educativo à sentença

(NOGUEIRA, 2003).

Segundo Cruz Neto, Moreira e Sucena (2001, p.15), “o sistema de medidas sócio-educativas não dá

reposta, não supre os direitos até então recusados. Ao contrário, acentua as desigualdades e a

exclusão em que vivem esses adolescentes, na medida em que funda sua pedagogia no

aprisionamento, na disciplina e na impessoalidade”. Podemos aqui citar Foucault (1987, p.208), para

descrever o sistema de internação destes adolescentes:

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A prisão, local de execução da pena, é ao mesmo tempo local de observação dos indivíduos punidos. Em dois sentidos. Vigilância, é claro. Mas também conhecimento de cada detento, de seu comportamento, de suas disposições profundas, de sua progressiva melhora...

Neste contexto de vigilância se insere a Psicologia Jurídica, que enquanto especialidade da Psicologia

é implantada por volta da década de 60 e tem como principal colaborador Mira Y Lopez e tem como

principal atribuição a realização de exames que possibilitavam a elaboração de psicodiagnósticos, a fim

de esclarecer aos profissionais do Direito sob que circunstância psicológica se encontrava o indivíduo

praticante de ato delitivo e se estas interferiram ou não em sua conduta (FRANÇA, 2004).

Conforme cita Brito (2005, p.13), “... segundo o desembargador Amaral e Silva, é oportuno questionar o

verdadeiro papel do psicólogo enquanto participante do sistema de Justiça. Partilhamos do sistema

com o objetivo de integrar; e não de excluir... o desenvolvimento do jovem não pode ser visto como

isolado do contexto social no qual está inserido”, opinião que tem por base a compreensão dos direitos

da criança e adolescentes, dispostos no ECA, cuja doutrina é a proteção integral, partindo do

pressuposto de que a prática de delitos não está vinculada à disfunções patológicas, mas inserida em

uma realidade social e cultural que permeia o agir do adolescente.

Existe uma multiplicidade de fatores que determinam o comportamento dos indivíduos. Segundo

Popolo20 (apud FRANÇA, 2004, p.75) devemos analisar a conduta considerando vários fatores, desde

o ato em si, como o contexto grupal, da família à comunidade, bem como os aspectos individuais que

estão envolvidos na prática do ato infracional. Ressaltando que este conhecimento “não representa a

compreensão do indivíduo como um todo (...) refere-se a um recorte parcial da realidade”. Para França

(2004, p.76) “devem ser seu objeto de estudo as conseqüências das ações jurídicas sobre o indivíduo”,

já que estas práticas, como as judiciárias, interferem nas relações humanas e são importantes na

determinação da subjetividade.

O olhar sobre o adolescente que cometeu ato infracional deve se distanciar de concepções

extremistas, onde o adolescente, por um lado, é visto como vítima de um sistema ou produto do meio,

20 POPOLO, Juan H. Del. Psicologia judicial. Mendonza: Ediciones Jurídicas Cuyo, 1996, 475 p.

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sendo “a prática do delito encarada como uma estratégia de sobrevivência ou uma resposta mecânica

do adolescente a uma sociedade violenta e infratora para com os seus direitos mais elementares”

(VOLPI, 2001, p.19), mesmo verificando-se uma grande quantidade de adolescentes privados de

liberdade pertencerem a classes com defasagens sociais, econômicas, culturais, não se pode atribuir à

situação social a prática do ato infracional, sem qualquer responsabilidade por parte do autor; por outro

lado, o adolescente não pode ser considerado responsável exclusivo e definitivo pelo ato, excluindo-se

qualquer responsabilidade do meio, formulação perversa indicativa de que

a índole, isto é, a tendência, a motivação interna, o caráter e a personalidade do indivíduo apresentam a propensão à prática do (...) delito. Originada da constituição de perfis e modelos comportamentais que produziriam o infrator... (Volpi, 2001, p.20).

Segundo Mira y Lopez (1980), para o jurista, delito é todo ato voluntário que se afasta das normas

legalmente estabelecidas através de leis, o material estudado é o próprio ato delituoso. Para o filósofo,

é um ato em desajuste aos princípios éticos; para o psicólogo, porém, não existe a preocupação com a

definição, mas com a compreensão da motivação dos delitos, dos determinantes que culminam no ato,

sejam internos ou externos. O autor afirma que “... não é possível julgar um delito sem compreendê-lo,

mas para isto é necessário não só conhecer os antecedentes da situação, mas o valor de todos os

fatores determinantes da reação pessoal” 21 (MIRA Y LOPEZ, 1980, p.87). Delitos aparentemente

iguais e sob as mesmas circunstâncias podem apresentar significados distintos e que representem uma

conseqüência fatal determinada por forças e fatores que devem ser considerados.

A situação atual do número de atos infracionais, “têm raízes no processo de exclusão e de

desigualdades estruturais que está, cada vez mais e com maior nitidez, apontando os que não têm

direito ao banquete da globalização das riquezas e da cultura” (CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA,

2001, p.17).

Mas por que, então, podemos supor que adolescentes diante da mesma realidade familiar, cultural,

social e econômica, não agem em direção ao ato infracional? Por que, diante de fatores considerados

de risco, o adolescente busca alternativas e segue um caminho tão diferente, até mesmo, oposto,

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criando ele mesmo condições de mudanças? Podemos afirmar que alguns indivíduos são mais

vulneráveis aos eventos, quando comparados a outros na mesma situação de risco, por diferenças

físicas ou psicológicas? Porque algumas pessoas superam-se e constroem caminhos positivos diante

de situações adversas, enquanto outros sucumbem diante dos obstáculos?

1.5 Risco X Proteção: Vamos falar de resiliência?

Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez. SAINT-EXUPERY22

Entre os adolescentes, que cometeram ou não ato infracional, surge aqueles que mesmo frente a

severas adversidades econômicas, sociais, desenvolvem uma capacidade de enfrentá-las, “... sujeitos

que, apesar de nascer e viver em condições de alto risco, se desenvolvem psicologicamente sãos e

com êxito social” 23 (GROTBERG et al., 1998, p.8).

Podemos aqui tecer a hipótese de que alguns adolescentes desenvolvem o que estudiosos chamam de

resiliência, cuja definição se diferencia entre os estudiosos do tema, segundo o Dicionário Houaiss, o

termo significa “capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças”,

do latim resiliens, significa saltar para trás, voltar, ser impelido, recuar, encolher-se, romper. Pela origem inglesa resilient remete a idéia de elasticidade e capacidade rápida de recuperação (...) no dicionário da língua inglesa se encontram dois raciocínios para o termo: o primeiro se refere à habilidade de voltar rapidamente para o seu usual estado de saúde ou de espírito depois de passar por doenças, dificuldades etc. (PINHEIRO, 2004, p.68).

O termo resiliência surgiu na década de 60 e no início dos anos 70 na literatura psicológica, segundo

Flach (199824 apud TROMBETA e GUZZO, 2002, p.16), o termo foi retirado de outras ciências e

“empregado na Psicologia para designar a capacidade de resistir, a força necessária para a saúde

mental durante a vida”.

Segundo Grunspun et al (2002, p.164), resiliência é a capacidade humana de se recuperar frente a

adversidades, não se tornando vítima dos acontecimentos traumáticos, estressores, tratam-se de

21 Original em espanhol. Grifo do autor. 22 SAINT-EXUPERY, Antoine de. O pequeno príncipe. 48ª. Edição. Rio de Janeiro: Agir, 2005. 23 Original em espanhol. 24 FLACH, F. Resiliência: a arte de ser flexível. São Paulo: Saraiva, 1988.

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sujeitos que submetidos a fatores de risco conhecidos, possuem imunidade e proteção psicológicas e

não apresentam danos no decorrer de sua vida, ao contrário, muitas vezes, fazendo destas

adversidades degraus para mudanças.

Porém, “a resiliência deve ser sempre relativizada e entendida dentro de um conjunto amplo de fatores

intrínsecos e extrínsecos ao indivíduo” (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006). A noção de resiliência vem

tomando uma complexidade e sendo abordada como um processo dinâmico envolvendo interação

entre os processos sociais e intrapsíquicos de risco e proteção; seu desenvolvimento baseia-se na

interação entre eventos adversos de vida e fatores de proteção internos e externos de cada indivíduo.

Com o estudo deste tema, busca-se conhecer mais e melhor a natureza tipicamente humana e suas

diferenças individuais que fazem com que pessoas reajam de maneira diferente diante de situações

semelhantes. Conhecimento este que pode levar às soluções e intervenções mais adequadas no

sentido de promover a saúde, respeitando os recursos próprios, os talentos, habilidades, sucessos e

histórias de vida de cada indivíduo, tudo o que o torna único e humano (TROMBETA e GUZZO, 2002).

Algumas características, levantadas por diversos estudos nas áreas de Psicologia, Biologia, Sociologia,

consideram como indicadores internos de resiliência, a competência social, a competência para

resolver problemas, autonomia, propósitos e confiança no futuro, auto-estima, controle de impulsos,

capacidade de atenção e concentração. “Certos atributos da pessoa têm uma associação positiva com

a possibilidade de enfrentar os fatores de risco, de aproveitar os fatores protetores, portanto de ser

resiliente” (GRUNSPUN et al, 2003, p.167).

Mas este indivíduo encontra-se inserido em um contexto, dos quais fazem parte as pessoas que com

ele interagem, as conexões entre outras pessoas do ambiente, os vínculos e influências diretas e

indiretas que este adolescente recebe a partir das mudanças do ambiente e nas pessoas que dele

fazem parte. E este ambiente precisa ser valorizado de acordo como é percebido pelo indivíduo, e não

conforme ele existe na realidade objetiva (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

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35

A resiliência surge então não como uma característica que nasce com o sujeito nem como uma

aquisição de fora para dentro, mas como um processo construído à partir da interação da pessoa com

o meio,

esse processo de combinação entre os atributos da criança ou do adolescente e de seu ambiente familiar, social e cultural resulta da interação entre aspectos individuais, do contexto social, da potencialidade dos acontecimento no decorrer da vida e dos chamados fatores de proteção (LINDSTRÖM, 200125 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.20).

Para este trabalho estaremos utilizando a definição proposta por Grotberg et al (1998) no “Manual de

Identificação e promoção da resiliência em crianças e adolescentes” 26, isto é, a “... capacidade do ser

humano frente às adversidades da vida, superando-as e, inclusive, transformando-se por elas” 27.

As adversidades não costumam ser isoladas ou independentes, pois fazem parte de um contexto

social, que envolve fatores genéticos, familiares, ambientais, culturais, socioeconômicos e políticos, a

combinação destas adversidades produz conseqüências em diferentes áreas da vida. Segundo

Grunspun et al (2003, p.163), “ser resiliente sempre é conseqüência dos fatores de risco, de sua

intensidade e duração, e dos fatores de proteção que o indivíduo possui”.

Riscos psicossociais tendem a tornar o indivíduo vulnerável com vistas ao desenvolvimento de

problemas comportamentais, emocionais e na aquisição de comportamentos inadequados, muitas

vezes relacionados a atos delituosos.

Riscos ou adversidades são variáveis ambientais ou contextuais que aumentam a probabilidade da ocorrência de algum efeito indesejável no desenvolvimento mental. Individualmente, muitas variáveis podem ser consideradas risco na infância e na adolescência (EISENSTEIN e SOUZA28 apud SAPIENZA e PEDROMÔNICO, 2005, p.210).

Porém, alguns fatores descritos como sendo de proteção, são recursos pessoais ou sociais que

diminuem ou inibem o impacto dos fatores de risco. O resiliente apresenta os fatores de proteção de

forma mais acentuada dos que os não resilientes. Os fatores protetores podem atuar como “um escudo

para favorecer desenvolvimento humano, quando pareciam sem esperança de superação por sua

intensa e prolongada exposição a fatores de risco” (GRUNSPUN et al, 2003, p.167).

25 LINDSTRÖM, Bengt, O significado de resiliência. Adolescência Latino Americana, v.2, n.3, p.133-139, 2001. 26 Nome original em espanhol: Manual de identificación y promoción de la resiliencia en niños y adolescentes. 27 Original em espanhol. 28 EISENSTEIN, E. e SOUZA, R.P. Situações de risco à saúde de crianças e adolescentes. Petrópolis: Vozes, 1993.

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36

Segundo argumenta Rutter29 (apud TROMBETA e GUZZO, 2002), resiliência é um atributo que envolve

vulnerabilidade e mecanismos de proteção, portanto não é fixo, sofre variações ao longo do tempo,

esta combinação irá modificar as respostas individuais frente a situações de risco e operar durante toda

a vida do indivíduo.

... diversas variáveis e processos precisam ser estudados sempre que o tema da resiliência estiver em destaque (...) a capacidade de amar, trabalhar, ter expectativas e projeto de vida – conseqüentemente, dar um sentido a nossa existência – denota ser a base onde as habilidades humanas se apóiam para sem utilizadas diante das adversidades da vida (PINHEIRO, 2004, p.75).

A noção de vulnerabilidade é composta por elementos que agravam a situação de risco ou impedem

respostas satisfatórias diante de situações adversas e deve ser compreendida em três planos básicos:

o individual, que está relacionado aos comportamentos, porém não reduzidos a uma ação voluntária,

mas associados às condições objetivas do meio natural e social e ao grau de consciência sobre tais

comportamentos; o segundo plano é o social, ligado ao acesso à informação, aos serviços de saúde,

condições de bem estar social; e o terceiro está ligado ao institucional, ao desenvolvimento de ações

por instituições específicas visando diminuir, ou eliminar os riscos que tornam os indivíduos mais

vulneráveis (SANTOS, 2000).

A vulnerabilidade não é regida por relações de causa-efeito, mas vincula-se a “mediações,

ponderações e interpolações éticas, culturais, filosóficas, políticas e materiais”, constituindo-se em um

indicador de privações que a sociedade impõe a determinados cidadãos (CRUZ NETO, MOREIRA e

SUCENA, 2001, p.48).

Adolescentes são considerados, por alguns estudiosos, como um segmento da população de elevada

vulnerabilidade, devido à estrutura social encontrada em países como o Brasil, e alguns aspectos

associados a essa vulnerabilidade são as dificuldades de informações adequadas; a necessidade de

explorar, buscar o novo, experimentar riscos e transgredir; a dificuldade de escolhas e a indefinição de

identidades, com conflito entre a razão e o sentimento; a susceptibilidade a pressões grupais com a

29 RUTTER, M. Stress, coping and development: some issues and some questions. In GARMEZYE, N. e RUTTER, M. Stress, Coping and Development in Children. New York: McGraw Hill, p.1-41, 1983.

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necessidade de afirmação grupal; a desagregação familiar; o acesso a drogas e a elaboração

fantasiosa quanto à sexualidade (AYRES, 2006).

A nova abordagem sobre o tema resiliência sugere uma reorientação da abordagem de risco para a

abordagem de fatores e mecanismos que potencializem as capacidades de cada adolescente para

superar suas dificuldades e as adversidades de sua vida. Mecanismos compreendidos como

mediadores entre sofrer adversidades e vivenciar suas conseqüências, formados por recursos

familiares e sociais disponíveis para atender a criança e o adolescente, bem como suas características

internas (SANTOS, 2000; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Para Costa (1997), a presença do outro se faz necessária ao desenvolvimento da personalidade e da

inserção social de todo ser humano. A vida de cada um se traduz no desejo constante da presença de

outrem. Quando estes vínculos não existem, ou são frágeis, todo o dinamismo se esvai e a conduta se

deteriora e se degrada diante da vida.

Segundo Rutter30 (apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006), estes processos de proteção não eliminam

os riscos, mas encorajam o indivíduo a lidar com as situações. Suas principais funções são a de reduzir

o impacto dos riscos, modificando a exposição às situações adversas; reduzir as reações negativas em

cadeia causadas pela exposição aos fatores de risco; estabelecer e manter a auto-estima e auto-

eficácia, através de relações seguras e o cumprimento das tarefas com sucesso e criar oportunidades

de reverter os efeitos causados pelo estresse.

Para Rutter31 (apud TROMBETA e GUZZO, 2002), as experiências estressantes deixam marcas nas

pessoas que passam por elas, contudo estas pessoas podem ser mais vulneráveis a certos

estressores, mostrando sinais de insegurança ou criando barreiras defensivas de vários tipos.

Mais do que conhecer os eventos de vida e como eles se engendram no comportamento humano,

importa saber as diferenças individuais na percepção das situações adversas. São elas que

30 RUTTER, M. Psychosocial Resilience and Protective Mechanisms. American Orthopsychiatric Association, v.57, n.3, p.316-331, 1987. 31 RUTTER, M. Protective factors in children´s responses to stress and disadvantage. In M.W. Kent & J. Rolf, Primary Prevention of Psychopathology. III University Press of New England, Hanover.

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distinguirão o modo como os problemas são enfrentados. Dessa forma, um mesmo “golpe do destino”

pode ser experenciado como adversidade por uma pessoa ou como desafio por outra (YUNES e

SZYMANSKI32 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Segundo ASSIS, PESCE e AVANCI (2006), é praticamente impossível inferir que um indivíduo é

resiliente, portanto devemos adotar a noção de potencial de resiliência, que pode ser desenvolvido ao

longo da vida, de diferente forma e grau, e deve ser incentivado, nutrido e potencializador ao longo da

vida.

32 YUNES, M.A.M. e SZYMANSKI, H. Resiliência: noção, conceitos afins e considerações críticas. In TAVARES, J. (org.). Resiliência e Educação. São Paulo: Cortez, p.13-42, 2001.

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39

2 PROBLEMA E OBJETIVO(S)

2.1 Pesquisar para melhor conhecer

Façam silêncio! Tem alguém dizendo algo Que nem ele próprio está sendo capaz de ouvir.

É quase um ruído prestes a explodir Na cara de quem não se dispõe a escutar.

VALLE33

O levantamento dos traços psicológicos e aspectos familiares, sociais e econômicos, que permeiam o

desenvolvimento dos adolescentes, além dos fatores de risco e de proteção relacionados à resiliência,

pode ser um caminho para aumentar o conhecimento de sua realidade; e para que possam ser vistos

além do estigma que permeia esta fase, mas como indivíduos, cuja subjetividade está repleta de

interferência, tanto em virtude desta fase do desenvolvimento, como do contexto no qual este

adolescente está inserido. Mecca et al34 (apud ASSIS, 2003, p.671) “enfatizam que a saúde da

sociedade depende em grande parte do estado psicológico com que as pessoas se colocam frente a

um desafio”.

A pesquisa com os adolescentes visa, através da aplicação de um teste projetivo e sua análise, e de

uma entrevista semi-estruturada, verificar a existência de características que possam indicar resiliência.

A técnica a ser utilizada será o Wartegg, técnica desenvolvida tendo como fundamentos teóricos a

Teoria dos Arquétipos de Jung e os fundamentos básicos da Gestalt (FREITAS, 1993). Segundo a

psicologia da Gestalt, o homem é uma totalidade e “o todo é mais do que a soma de suas partes”; “as

propriedades das partes dependem da sua relação com o todo; suas qualidades dependem do lugar,

papel e função que têm do todo” (FREITAS 1993, p 11). Assim, a personalidade é mais que o individuo,

à medida que demonstra sua relação com o contexto onde está inserido.

A psicologia aceita a hipótese de que qualquer pessoa que produza algo a partir de sua imaginação

está se projetando neste produto. Portanto, segundo Hammer (1991, p.1), “podemos afirmar (...) que

33 VALLE, Fernanda do. Op. cit. 34 MECCA, A. SMELSER, N.J. e VASCONCELOS, J. The social importance of self-esteem. University of Califórnia Press, Berkeley, 1989.

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40

cada ato, expressão ou resposta de um indivíduo (...) de alguma maneira apresenta a marca de sua

personalidade”. Esta é a base que norteia os testes projetivos, ao desenhar, “a percepção consciente e

inconsciente do sujeito em relação a si mesmo e às pessoas significativas do seu ambiente determina o

conteúdo do seu desenho” (HAMMER, 1981, p.1). Através do desenho, o sujeito irá esboçar seu

mundo interno, forças e fraquezas de sua personalidade, traços e atitudes e como este sujeito mobiliza

seus recursos internos para lidar com conflitos interpessoais e intrapsíquicos.

O teste projetivo, uma das técnicas utilizadas pelo psicólogo, é aplicado de maneira provocadora,

incitando o sujeito a revelar-se, buscando fazer com que o sujeito evidencie sua relação com o mundo

e com si mesmo, “A psicologia projetiva (...) Interessa-se pelas relações do homem com os outros, ao

mesmo tempo em que pelas relações do homem com o seu mundo vivenciado” (ANZIEU, 1981, p.16).

Através dos testes projetivos o sujeito produz respostas que correspondem à estrutura da sua

personalidade, “(...) a resposta do sujeito é sempre projetiva, isto é, reveladora da sua maneira peculiar

de ver a situação, de senti-la e interpretá-la” (VAN KOLCK, 1981, p.255).

Segundo Anzieu (1981), os métodos projetivos buscam investigar a personalidade enquanto estrutura

em evolução, cujos elementos que a constituem estão em constante interação.

Um teste projetivo é como um raio X. Atravessando o interior da personalidade, fixa a imagem do seu núcleo secreto em um revelador (aplicação do teste), permitindo depois sua leitura fácil, por meio da ampliação ou projeção ampliadora de uma tela (interpretação do protocolo). O que está escondido fica, assim, iluminado; o latente se torna manifesto; o interior é trazido à superfície; o que há em nós de estável e também de emaranhado se desvendam (ANZIEU, 1981, p.19).

Este trabalho teve por principal objetivo comparar fatores sociais, econômicos e familiares, bem como a

existência de traços de personalidade característicos do sujeito resiliente, entre adolescentes de um

projeto comunitário de Salvador e adolescentes que cometeram ato infracional e estão privados de

liberdade. Para que este objetivo seja alcançado, a pesquisa levanta aspectos familiares, sociais e

econômicos comuns nos dois grupos, identificando fatores de risco e proteção; verifica, através de um

teste projetivo, traços de personalidade comuns nos dois grupos, que denotem a presença de

condições ligadas a resiliência no desenvolvimento destes adolescentes.

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41

Baseando-se na literatura consultada, podemos supor que existem, entre os sujeitos dos dois grupos,

traços de personalidade relativos a esta fase do desenvolvimento; bem como aspectos familiares,

sociais e econômicos comuns. Porém, no que tange aos aspectos ligados à resiliência, acreditamos

que estes sejam mais presentes nos adolescentes participantes do projeto VivaNordeste do que nos

adolescentes privados de liberdade.

Esta pesquisa busca, através de um maior conhecimento das características psicológicas e sociais que

abarcam a adolescência, reconhecer de que forma a sociedade pode contribuir com mudanças que

visem atender as reais necessidades destes sujeitos em sua subjetividade, em sua individualidade, em

seu desenvolvimento enquanto seres humanos cujos direitos e deveres devem ser preservados,

através de condições que se não possam modificar sua realidade, mas que possam ao menos

possibilitar a eclosão da resiliência enquanto característica necessária para lidar com situações

adversas.

Spinoza, “dizia que, se quisermos compreender as coisas, se quisermos efetivamente compreendê-las

em sua natureza, em sua essência e, portanto em sua verdade, é necessário que nos abstenhamos de

rir delas, de deplorá-las ou detestá-las” (FOUCAULT, 2002, p.20). A suspensão do juízo de valor

possibilita um olhar diferenciado, do qual tanto carecem os adolescentes.

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42

2 METODOLOGIA (PROCEDIMENTOS)

2.1 Sujeitos

A amostra foi formada por 28 sujeitos, adolescentes de 12 a 21 anos (parâmetro de idade definido pelo

ECA), divididos em 14 adolescentes que cometerem ato infracional, que se encontravam privados de

liberdade, cumprindo medida sócio-educativa no período de julho a agosto de 2006 na CASE –

Comunidade de Atendimento Sócio-Educativa, e 14 adolescentes moradores do Nordeste de Amaralina

que fossem participantes de alguma atividade do Projeto VivaNordeste, no período de agosto a

setembro de 2006, que concordaram em participar da pesquisa, sendo 4 do sexo feminino e 9 do sexo

masculino em cada amostra. Tratou-se, portanto, de uma amostra não probabilística, típica e

voluntária.

2.1.1 CASE: a realidade depois do ato infracional

A primeira instituição acessada foi a CASE, nome recentemente implantado à antiga CAM – Casa de

Atendimento ao Menor. Trata-se de uma unidade de privação de liberdade, que segundo Volpi (2001,

p.66),

são instituições de atendimento em regime de internação, isto é, são entidades onde os adolescentes que cometem atos infracionais ficam internos em tempo integral... é definida por ocupar um determinado espaço físico e ter uma equipe específica.

A CASE é uma instituição localizada em Salvador/BA, no bairro de Tancredo Neves, foi inicialmente

criada em espaço físico das dependências do subsolo do Centro de Recepção e Triagem, que

recebiam adolescentes egressos da antiga Escola de Maragojipe, respaldada pela então lei vigente, o

Código de Menores. Este centro foi desativado por ter suas instalações um caráter carcerário, o que ia

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43

de encontro com a nova política de atendimento aos adolescentes decorrente da criação do ECA, em

julho de 1990, surge então a CAM - Casa de Acolhimento ao Menor.

A unidade tem capacidade para atender 120 adolescentes, sendo 70 em regime de internação

provisória e 50 em medida sócio-educativa de internação, estando atualmente com sua capacidade

ultrapassada, em Agosto de 200635, o número de adolescentes atendidos era de 212, dos quais 21 do

sexo feminino. Por mês chegam a CASE cerca de 40 adolescentes.

Nas dependências da unidade funcionam os serviços de saúde integral, educação formal, arte-

educação e qualificação profissional, serviços administrativos, envolvendo a secretaria do adolescente,

arquivo, almoxarifado e serviços gerais, além do trabalho de atendimento realizado por psicólogos,

assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e músico-terapeuta.

A teoria que embasa o trabalho dos profissionais dentro da CASE é o da Pedagogia da Presença,

teoria que tem como fundamento o enfoque de que

está socializado o jovem que dá importância a cada membro da sua comunidade e a todos os homens, respeitando-os na sua pessoa, nos seus direitos, nos seus bens. Ele agirá assim não por uma lei promulgada ou por meio de sansões, mas por uma ética pessoal que determina o outro como valor em relação a si próprio (COSTA, 1997).

A política estadual de atendimento aos adolescentes em situação de conflito com a lei, realizada

através da CASE, é executada sob a responsabilidade da Fundação da Criança e do Adolescente –

FUNDAC, desde o atendimento inicial até o cumprimento da medida sócio-educativa aplicada pela

Justiça da Infância e da Juventude. Em 2005, a FUNDAC realizou 2.199 atendimentos.

O acesso aos jovens ocorreu com o auxílio da equipe de educadores que tiveram acesso aos objetivos

da pesquisa e informaram aos adolescentes sobre o trabalho, aqueles que tiveram interesse em

participar deram seu nome e a lista foi utilizada para que os monitores chamassem os adolescentes

para participar da pesquisa. No primeiro contato, foram passadas todas as informações sobre o

trabalho e sobre as condições de participação, entre os adolescentes que se manifestaram

interessados em participar, três desistiram no momento do contato com a pesquisadora.

35 Dados divulgados no Caderno Dez do Jornal “A Tarde” em 01/08/2006.

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44

2.1.2 Projeto VivaNordeste: uma tentativa de promover resiliência

O Projeto VivaNordeste, a segunda entidade contatada para nossa pesquisa, trata-se de um programa

do Governo Estadual da Bahia desenvolvido nos bairros de Santa Cruz, Chapada do Rio Vermelho,

Nordeste de Amaralina e Vale das Pedrinhas, área reconhecida pelos problemas de violência que

enfrenta, envolvendo uma população de 83 mil habitantes.

Oferece formação profissional a 530 jovens, assegurando bolsas aos jovens da Escola de Talento,

ampliando e dinamizando a oferta artístico-educacional, com ações nas áreas de comunicação,

tecnologia digital, música, dança e esportes.

Implantado pelo Governo do Estado em 2004, o Programa tem por objetivo promover a melhoria da

qualidade de vida da população local, através da implementação de políticas básicas de inclusão

social, buscando mudanças nas condições de educação, saúde, habitabilidade, relações sociais

comunitárias, padrões econômico-financeiros e sociais das famílias e das pessoas, especialmente

aquelas em situação de maior risco social. Desenvolvido e coordenado pela SETRAS com o apoio da

SECOMP, o Programa envolve 12 secretarias estaduais e parcerias com a Prefeitura Municipal de

Salvador e diversas organizações sociais.

Para sediar o Programa, implantou-se a Casa de Serviços Viva Nordeste, espaço onde se encontram

Viva Nordeste – Abertura do Projeto Viva Jovem Tadeu Paz, o Balcão de Justiça e Cidadania, o Núcleo

de Atendimento Psicossocial e Educacional – Napse, a Escola Kabum! de Arte, Comunicação e

Tecnologia, a Sala de Arte e Cultura, o Núcleo de Dança Afro e Capoeira, o Núcleo de Balé para

crianças de 8 a 14 anos, o Infocentro Digital e Musical, a Sala de Meditação e Desenvolvimento de

Valores, a Agência do CrediBahia e a Biblioteca Comunitária "Ler é Preciso".

O programa VivaNordeste é responsável pela formação de 2610 jovens entre 16 e 24 anos, para

inserção no setor produtivo, além do fortalecimento dos dons vocacionais de dois mil jovens, através da

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45

arte. Realiza 44 cursos profissionalizantes em diversas áreas, capacitando cerca de 1600 pessoas,

além de apoiar micro-empreendimentos dos seus moradores.

Segundo dados do relatório do Programa VivaNordeste, as escolas atendem apenas 5% das crianças

em idade pré-escolar, 34% da 1ª. a 4ª. série, 31% dos jovens de 5ª. a 8ª. e apenas 25% dos

adolescentes com idade para freqüentar o ensino médio, o relatório também destacou a violência e o

tráfico de drogas como um dos principais problemas da região (MENDONÇA, 2005).

Objetivando a redução dos homicídios entre jovens integrantes de gangues responsáveis pelas "rixas"

de rua, o VivaNordeste promove atividades culturais, esportivas e educativas a exemplo da atividade

de boxe para os adolescentes de ruas de alta criminalidade, como a do Boqueirão e da Serra Verde.

São desenvolvidas ainda campanhas permanentes para a inclusão de crianças e jovens na escola,

como o projeto "Toda Criança na Escola" e outra para manter os estudantes na escola "Nenhum a

Menos".

O contato com os adolescentes participantes do programa se deu através da divulgação do trabalho

que foi realizada em um encontro com cerca de 10 adolescentes, com a participação do responsável

pelo Infocentro. Os adolescentes interessados em participar da pesquisa foram instruídos a procurar a

pesquisadora em dias e horários antecipadamente determinados. Não houve desistência por parte de

nenhum adolescente após serem passadas as informações sobre a pesquisa.

2.2 Procedimentos para coleta de dados

A coleta de dados foi realizada no período de Julho a Setembro de 2006 e a pesquisa utilizou a

abordagem combinada. Foi realizado um levantamento do perfil psicológico, através da análise dos

resultados obtidos em um teste projetivo não quantificável. Foi efetuada a análise dos dados familiares,

sociais e econômicos, através da categorização dos dados obtidos em entrevista semi-estruturada.

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46

A escolha desta abordagem se deveu ao objetivo geral e específico que a pesquisa buscou verificar.

Como tratamos de aspectos psicológicos através de um teste projetivo, a abordagem qualitativa trouxe

um melhor resultado no levantamento destes dados. Quanto aos aspectos sócio-demográficos, a

categorização possibilitou caracterizar o grupo pesquisado.

A coleta de dados ocorreu baseada em aspectos éticos, considerando-se para tanto a vulnerabilidade

dos sujeitos da pesquisa, aspectos relacionados às informações sobre objetivos da pesquisa, riscos e

benefícios para os participantes, garantia de sigilo, bem como sobre a liberdade do sujeito de não

participar ou interromper a participação a qualquer tempo.

O consentimento para a realização da pesquisa foi obtido junto aos responsáveis pelos sujeitos, no

caso dos adolescentes privados de liberdade na CASE, a autorização foi obtida através de documento

expedido pelo Juiz de Direito da 2ª. Vara da Infância e da Juventude (anexo A), quanto aos

adolescentes participantes do Projeto Viva Nordeste, esta autorização foi dada pela pessoa

responsável pelo Programa e pela inserção destes adolescentes no mesmo. Foi entregue a cada

participante um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (anexo B) onde constavam todas as

informações sobre a pesquisa, solicitando aos interessados em participar a assinatura no termo,

informações estas que foram devidamente esclarecidas pela pesquisadora anteriormente.

A coleta de dados incluiu as seguintes técnicas:

2.2.1 Aplicação de Teste Projetivo – Wartegg

A técnica projetiva foi aplicada a todos os sujeitos, de forma individual, após o estabelecimento de

rapport e antes da entrevista semi-estruturada.

Não houve limite de tempo para a execução, o que foi informado previamente aos participantes.

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47

O sujeito recebeu a folha de resposta, dois lápis pretos n. 02, devidamente apontados. O examinador

disponibilizou uma borracha que poderia ser utilizada pelo sujeito, quando este solicitasse.

Não foi permitido utilização de réguas, compasso ou qualquer outro objeto que pudesse servir de apoio

para a execução dos desenhos.

Segundo o Guia de Aplicação e Avaliação do Teste Wartegg (FREITAS, 1993), a folha foi entregue

Iniciaram-se as instruções: o participante foi informado que a folha de resposta possui oito quadrinhos

com desenhos começados e que deveriam ser terminados pelo sujeito. Informou-se que não seria

preciso saber desenhar e que os desenhos poderiam ser realizados na ordem que o participante

desejasse, porém estes deveriam anotar na folha de resposta, em local disponível para isto, a

seqüência com que efetuaram os desenhos, bem como o nome dado a cada um destes desenhos em

espaço próprio, utilizando-se a seqüência de números impressa na folha. Após o término, o examinador

confirmou as informações relativas à seqüência de execução e aos nomes dados a cada quadro.

Foram feitas as anotações sobre informações que se acreditou serem relevantes para a análise dos

dados.

As instruções foram adaptadas para o nível cultural dos sujeitos a fim de que as mesmas pudessem ser

facilmente entendidas pelos mesmos.

O teste foi aplicado buscando as condições ideais, como ambiente tranqüilo, com boa iluminação, um

bom rapport e a garantia de não interrupções, ruídos ou decorações no ambiente de aplicação.

Contudo, em algumas aplicações houveram interrupções, devido ao local de aplicação e/ou em virtude

da diminuição dos riscos para a pesquisadora. O ambiente tinha boa iluminação, contudo não era

isento de ruídos ou decorações, sendo utilizadas as salas disponíveis nas instituições. As superfícies,

onde o teste foi realizado, não apresentavam ondulações ou texturas que pudessem interferir sobre o

desenho do testando.

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48

O examinador observou o sujeito durante a execução buscando dados que poderiam ser utilizados na

análise e que pudessem revelar hipóteses sobre os participantes. Contudo não houve qualquer fato

merecedor de destaque sobre os participantes que pudessem influenciar no resultado da pesquisa.

2.2.1.1 Wartegg: um teste projetivo

O teste Wartegg, utilizado na coleta de dados, se apresenta em uma folha com oito quadrados de

quatro centímetros de lado, onde constam esboços de desenho que devem servir de estímulo para os

sujeitos realizarem seus próprios desenhos. Cada esboço mobiliza algo particular da personalidade

deste sujeito (ANZIEU, 1981). Este tipo de teste projetivo “[...] é uma prova gráfica projetiva de

personalidade que, mediante uma série de traços ou estímulos iniciais, leva o individuo a produzir

desenhos” (FREITAS, 1993, p. 9).

A técnica projetiva do desenho apresenta algumas vantagens, entre elas, podemos citar a diminuição

da influência do examinador sobre o produto dos sujeitos. No que se refere ainda à pesquisa, outra

vantagem “reside no fato de que o desenho não é uma técnica comprometida com aspectos culturais”

(HAMMER, 1991, p. 459), portanto não sofre limitações como a linguagem. Além da facilidade de

administração e manipulação, está o fato de que “os desenhos freqüentemente ultrapassam as defesas

de sujeitos evasivos e retraídos, prisioneiros de instituições correcionais etc.” (HAMMER, 1991, p.461).

Segundo Van Kolck (1981, p.351), o teste Wartegg pode ser classificado como uma técnica gráfica,

pois oferece liberdade de resposta, em uma situação projetiva, através do “complemento de desenhos,

linhas ou pontos (...) O sujeito é solicitado a traçar a lápis um desenho partindo de cada elemento

gráfico”.

Page 49: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

49

2.2.2 Entrevista Semi-Estruturada

A entrevista foi realizada utilizando-se um questionário (anexo C) com perguntas abertas e fechadas

que foi aplicada após o teste Wartegg e foi efetuada também de forma individual. As entrevistas foram

transcritas manualmente, visando criar um clima de maior confiança junto aos sujeitos pesquisados,

evitando-se qualquer tipo de constrangimento a sua participação.

O instrumento utilizado na entrevista baseou-se no Questionário – Ações Sócio-Educativas Públicas

(LIMA, 2004), e foi formado por questões divididas nas seguintes categorias: dados do adolescente,

dados sobre a família, dados sobre o ato infracional, e questões relacionadas a aspectos de resiliência,

como relacionamento com amigos e familiares, percepção de si mesmo, modo de lidar com

dificuldades e solucionar problemas e perspectiva de futuro. Foram anotadas todas as falas dos

sujeitos, de forma textual.

2.3 Procedimento para análise de dados

O Wartegg foi analisado utilizando-se a Abordagem Projetiva para a interpretação dos dados

apresentados em cada campo, conforme indicado no Guia de Aplicação e Avaliação do Teste de

Wartegg e no Livro Wartegg: da Teoria à Prática, de Nicolau José Kfouri. Estes dados foram descritos

textualmente em tabelas, utilizando-se o Word 97, versão 2003, em seguida as categorias encontradas

foram agrupados por freqüência e inseridas no Excel, versão 2003, onde foram elaborados os gráficos.

Os dados obtidos através da parte qualitativa da entrevista foram tratados da mesma forma.

Os dados quantitativos obtidos na entrevista foram lançados no programa Statistical Package for Social

Sciences (SPSS) versão 8.0 e foram analisados com base na freqüência, comparando-se entre os dois

grupos, os dados levantados, os resultados foram transportados para o Excel, versão 2003, para a

elaboração dos gráficos.

Page 50: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

50

3 RESULTADOS

3.1 Quem são os adolescentes da pesquisa?

A pesquisa de campo resultou no levantamento de dados referentes a 48 adolescentes, sendo 14

adolescentes privados de liberdade cumprindo medida sócio-educativa na CASE e 14 adolescentes

participantes do Programa VivaNordeste. O sexo dos adolescentes foi pareado em nove do sexo

masculino e cinco do sexo feminino, em cada um dos grupos. Conforme GRAF. 1, dos 14 sujeitos da

CASE, cinco tinham entre 12 a 15 anos, oito entre 16 a 18 anos e um na encontrava-se faixa etária

acima de 18 anos. Entre os 14 sujeitos do VivaNordeste, 12 encontravam-se na faixa etária de 12 a 15

anos, dois tinham entre 16 a 18 anos e nenhum sujeito tinha mais que 18 anos.

5

12

8

2

1

0

de 12 a 15 anos de 16 a 18 anos acima de 18 anos

Idade dos adolescentes

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 1 – Agrupamento, por idade, dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006. No que se refere aos dados sobre a idade e escolaridade atual, apresentados no GRAF. 2, pôde-se

verificar que todos os adolescentes do VivaNordeste estavam cursando o Ensino Fundamental, 12

sujeitos tinham entre 12 e 15 anos, dois sujeitos tinham idade entre 16 a 18 anos. Na CASE, embora

Page 51: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

51

dois sujeitos referirem escolaridade correspondente ao Ensino Fundamental Incompleto, estando um

dos sujeitos com idade entre 12 a 15 anos e um na faixa etária de 16 a 18 anos, 12 sujeitos possuíam

escolaridade correspondente ao Ensino Médio Incompleto, dos quais quatro possuíam entre 12 e 15

anos, sete estavam na faixa etária de 16 a 18 anos e um tinha acima de 18 anos.

GRÁFICO 2 - Agrupamento, por idade e escolaridade, dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006.

Conforme demonstrado no GRAF. 3, quanto à participação dos sujeitos em atividades sociais,

verificou-se que os adolescentes da CASE participavam de uma atividade cada um, sendo que nove

participavam do projeto de profissionalização, dois faziam parte do projeto artístico-cultural e um do

projeto de pré-vestibular. Alguns adolescentes do VivaNordeste participavam de mais de uma

atividade, sendo que sete participavam de projeto de profissionalização, oito adolescentes participavam

de grupo desportivo, dois participavam do projeto artístico-cultural e apenas um adolescente não

participava de nenhuma atividade.

Page 52: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

52

1 1 1

8 9

7

2 2

1

0

Não Grupo Desportivo Projeto deProfissionalização

Projeto artístico-cultural

Projeto de pré-vestibular

Participação dos sujeitos em Atividades Sociais

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 3 – Participação em atividades sócio-culturais, esportivas e profissionais dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006.

Dos adolescentes participantes da pesquisa, conforme apresentado no GRAF. 4, oito adolescentes da

CASE e três do VivaNordeste informaram não adotar nenhuma religião, sendo que 11 do VivaNordeste

e seis da CASE disseram abraçar alguma religião, entre as quais Católica (3), Adventista (1), Batista

(6) e Evangélica (7).

8

3

6

11

Não religiosos Religiosos

Religiosidade dos Sujeitos

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 4 – Religiosidade dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, informada pelos sujeitos durante a entrevista

Page 53: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

53

De acordo com os dados obtidos na entrevista, pôde-se verificar que na CASE, a maioria dos

adolescentes (12) eram residentes de municípios do interior do Estado, sendo que um morava em

Salvador e um no estado do Rio de Janeiro. Os adolescentes do VivaNordeste eram moradores do

Nordeste de Amaralina, bairro de Salvador.

Quanto aos dados referentes à participação dos adolescentes na renda familiar, de acordo com as

respostas dos sujeitos, o resultado demonstrou inversão entre os dois grupos: enquanto 10

adolescentes da CASE contribuíam para a renda da família, 10 não o faziam no grupo do

VivaNordeste.

Quanto ao tipo de atividade exercida pelos adolescentes que contribuíam para a renda familiar, todos

os adolescentes do VivaNordeste e nove da CASE realizavam atividades não qualificadas. Um

adolescente da CASE citou o ato infracional como forma de ajudar na renda familiar, contudo sem o

consentimento dos familiares, que acreditavam que o dinheiro era ganho através de mendicância ou

“bicos” realizados pelo adolescente.

Conforme demonstrado no GRAF. 5, entre os adolescentes do VivaNordeste, 12 nunca utilizaram

qualquer substância psicoativa e dois utilizaram substâncias lícitas como o cigarro e a bebida alcoólica.

Deste modo, nenhum adolescente informou utilizar substâncias ilícitas. Entre os adolescentes da

CASE, quatro referiram nunca haver utilizado substâncias psicoativas, dois referiram utilizar

substâncias lícitas, três indicaram o uso de substâncias ilícitas, como a maconha, a cocaína e o crack,

e cinco informaram consumir tanto substâncias lícitas como ilícitas.

Page 54: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

54

4

12

2 23

0

5

0

Nenhuma Substâncias lícitas Substânciasilícitas

Substâncias licitase ilícitas

Tipo de substância psicoativa utilizada pelo adolescente

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 5 – Tipo de substância psicoativa consumida por adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e dos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006.

Pôde-se verificar, através dos dados obtidos na entrevista, que nenhum adolescente do VivaNordeste

fugiu de casa, embora alguns tenham citado já ter pensado em fazê-lo, voltando atrás ao refletir sobre

o assunto e perceber que seria pior do que enfrentar o problema.

Quanto aos adolescentes da CASE, cinco informaram já ter fugido de casa, sendo que os motivos

citados foram brigas com os pais devido ao uso de drogas, à escolha de um namorado não aprovado

pela família, a agressões físicas por parte dos pais e ao próprio envolvimento com atos infracionais.

Conforme demonstrado no GRAF. 6, entre os adolescentes do VivaNordeste, 11 disseram não ter

sofrido qualquer tipo de violência, contaram que apanharam quando pequenos, porém sem qualquer

abuso e com necessidade. Três informaram terem sofrido violência física por parte dos pais, que se

excederam ao infringir punição. Entre os adolescentes da CASE, 10 disseram nunca ter sofrido

nenhum tipo de violência, dois informaram ter sofrido violência física por parte dos pais e do

companheiro, um informou ter sofrido tentativa de homicídio por parte de um vizinho e um contou ter

sofrido violência sexual por parte de um desconhecido adulto.

Page 55: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

55

10

11

1

0

2

3

1

0

Nenhuma Tentativa deHomicídio.

Violência física(apanhar).

Violência sexual.

Tipo de violência sofrida pelos adolescentes

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 6 - Resposta à questão sobre a ocorrência de violência contra os adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, conforme informado pelos sujeitos durante a entrevista

3.2 A família na qual se inserem estes adolescentes

O GRAF. 7 apresenta dados sobre o modelo familiar dos adolescentes Verificou-se que nove

adolescentes do VivaNordeste e cinco da CASE faziam parte de uma família nuclear, formada por pais

e irmãos, três do VivaNordeste e quatro da CASE participavam de famílias monoparentais cuja mãe era

a provedora e apenas um adolescente do VivaNordeste fazia parte de família monoparental cujo pai

era o provedor. Quanto à participação em família extensa, formada por parentes como tios, avós e

irmãos, sem a presença dos pais, um adolescente do VivaNordeste e cinco eram participantes deste

modelo familiar. Entre os adolescentes da CASE, quatro tinham apenas a mãe viva, um não soube

informar, pois desconhecia o paradeiro do pai e nove tinham ambos os pais vivos. No VivaNordeste

todos os adolescentes (14) tinham pai e mãe vivos.

Page 56: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

56

5

9

4

3

0

1

5

1

Família Nuclear FamíliaMonoparental

Materna

FamíliaMonoparental

Paterna

Família Extensa

Modelo Familiar

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 7 – Modelo familiar dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006.

Conforme apresentado no GRAF. 8, sete, ou seja, 50% dos adolescentes do VivaNordeste tinham

apenas um irmão, sendo que um não tinha irmãos e um tinha mais de cinco; três informaram ter até

três irmãos e dois de três a cinco irmãos. Na CASE este resultado foi praticamente inverso, 13 sujeitos,

o equivalente a 93% dos adolescentes, informaram ter mais que um irmão, sendo que um adolescente

disse ser filho único, três informaram ter de três a cinco irmãos, cinco disseram ter até três irmãos e

cinco referiram ter mais de cinco irmãos.

1 1

0

7

5

3 3

2

5

1

Nenhum Um irmão até 3 irmãos de 3 a 5 irmãos Mais de 5 irmãos

Quantidade de irmãos

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 8 – Quantidade de irmãos informada pelos dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, durante a entrevista

Page 57: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

57

De acordo com os dados apresentados no GRAF. 9, sobre a pessoa responsável pelo sustento familiar,

verificou-se que no VivaNordeste, seis sujeitos informaram serem os pais (pai e mãe) os responsáveis

pelo sustento do lar, sendo que na CASE, esta resposta foi dada por apenas um sujeito. A mãe foi

citada por sete adolescentes da CASE e três do VivaNordeste. Na CASE, três sujeitos informam ser o

pai/padrasto, um disse ser o irmão a pessoa responsável pelo sustento familiar e dois informaram que

são os amigos da família (que residiam na mesma casa) os responsáveis por sustentar a residência.

No VivaNordeste, quatro disseram ser o pai/padrasto e um citou o tio e o avó como as pessoas

responsáveis pelo sustento familiar. A totalidade dos sujeitos pesquisados no VivaNordeste e 11

sujeitos da CASE, informaram que as pessoas responsáveis pelo sustento familiar exerciam atividades

não-qualificadas. Um sujeito do VivaNordeste citou uma atividade qualificada, sendo a de cozinheiro

profissional e um citou a aposentadoria como fonte de renda, sendo que a atividade exercida

anteriormente era não-qualificada.

1

67

3

3

4

1

0 0

1

2

0

Pais (ambos) Mãe Pai/Padrasto Irmãos Tios/Avós Amigos

Pessoa responsável pelo sustento familiar

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 9 – Resposta à questão sobre a pessoa responsável pelo sustento familiar, durante entrevista, dada pelos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006

O GRAF. 10 apresenta o resultado sobre a questão referente à existência de conflito do adolescente

junto a algum familiar. Verificou-se que 13 sujeitos do VivaNordeste informaram não ter qualquer

conflito com alguém da família, apenas um citou ter conflito com a avó paterna, descrevendo-o como

Page 58: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

58

discussões com a avó acarretadas pelo ciúme desta para com seu pai, fator trazido pelo adolescente

como responsável pela separação de seus pais. Na CASE, cinco sujeitos informaram não ter nenhum

conflito familiar, sendo 3 do sexo feminino, sete informaram ter conflitos com os pais e/ou irmãos e dois

disseram que estes conflitos se deram com tios e/ou primos. Os conflitos citados por estes

adolescentes, em sua maioria (5), são discussões constantes que acabaram em brigas com certo grau

de violência. Um cita agressões físicas e agressões psicológicas como motivo do conflito, um não

explicou o motivo e um diz ser o ato infracional cometido o motivo do conflito com sua família.

5

13

7

0 0

1

2

0

Nenhum Pais e/ou Irmãos Avós Tios e/ou Primos

Familiar com o qual o adolescente tem algum conflito

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 10 – Resposta à questão sobre conflito familiar, dada pelos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, durante entrevista

Conforme o GRAF. 11, seis adolescentes da CASE informaram não possuir nenhum familiar que utiliza

substâncias psicoativas, sete disseram que seus pais e/ou irmãos utilizavam, mesmo número

encontrado entre os adolescentes do VivaNordeste, um informou que o tio fazia uso de alguma

substância. No VivaNordeste, seis informaram ter tios e/ou primos que se utilizavam de algum

substância e um citou o padrasto.

Quanto ao tipo de substância utilizada, 12 adolescentes do VivaNordeste citaram substâncias lícitas,

como o cigarro e a bebida alcoólica e dois citaram substâncias ilícitas como a maconha, a cocaína e o

Page 59: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

59

crack. Na CASE, a totalidade de adolescentes (8) que citaram algum familiar, informaram que as

substâncias utilizadas são lícitas.

6

0

7 7

1

6

0

1

Nenhum Pais e/ou Irmãos Tios e/ou Primos Padrasto

Familiares que utilizam alguma substância psicoativa

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 11 - Familiares dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, que utilizam algum tipo de substância psicoativa

Quanto às respostas obtidas sobre o envolvimento de familiares em atos infracionais, pôde-se verificar

no GRAF. 12 que entre os adolescentes da CASE, 11 não tinham nenhum familiar envolvido em ato

infracional, dois informaram ter o pai ou irmão e um informou ter um primo envolvido em atos

infracionais. Entre os sujeitos participantes do VivaNordeste, oito informaram não ter qualquer familiar

envolvido, dois disseram ter o pai ou irmão, e quatro informaram ter tios e/ou primos envolvidos em

atos infracionais.

Quanto ao tipo de ato cometido, entre os familiares dos adolescentes da CASE, um foi contra o

patrimônio e dois contra a vida. No VivaNordeste, os dados são de dois atos contra o patrimônio, três

contra a vida, uma contravenção e um ato infracional de envolvimento com tráfico de entorpecentes.

Page 60: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

60

11

8

2 2

1

4

Não Pais e/ou Irmãos Tios e/ou Primos

Familiares envolvidos em atos infracionais

CASE VivaNordeste GRÁFICO 12 – Dados sobre familiares dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, que tiveram algum envolvimento com atos infracionais

3.3 O adolescente e o ato infracional

Entre os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, nenhum informou ter tido qualquer

envolvimento com atos infracionais; entre os adolescentes da CASE, todos confirmaram a participação

no ato pelo qual estão cumprindo medida sócio-educativa. Verificou-se que o ato infracional mais citado

foi o contra a vida, cometido por nove adolescentes, seguido pelo ato contra o patrimônio, cometido por

três, um adolescente informou ter cometido ato contra os costumes e um contra a vida e Narcotráfico.

Entre os atos contra a vida, encontravam-se as tentativas e o homicídio; entre os contra o patrimônio,

estavam o roubo, furto e arrombamento de veículos ou casas; o ato contra os costumes foi relativo ao

atentado violento ao pudor e o ato citado contra a vida e narcotráfico, foi uma tentativa de homicídio

envolvendo venda de drogas.

Com relação à idade dos adolescentes privados de liberdade na CASE, na data do ato infracional, os

resultados demonstraram que 50%, portanto 7 adolescentes encontravam-se na idade entre 14 e 16

anos na data do ato, dois tinham até 13 anos e cinco tinha acima de 17 anos.

Quanto à medida sócio-educativa a qual estavam submetidos os adolescentes da CASE e o prazo de

internação, conforme dados da TAB. 1, nove estavam cumprindo internação, entre eles, dois estavam

Page 61: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

61

em cumprimento de medida no período de até seis meses, três entre seis meses a um ano e quatro

estavam em cumprimento da medida de um a dois anos. Cinco adolescentes cumpriam internação

provisória, quatro estavam privados de liberdade no prazo de até seis meses e para um adolescente

este período era de seis meses a um ano.

TABELA 1 – Medida sócio-educativa aplicada e tempo de internação dos adolescentes, participantes da pesquisa, privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de Julho a Agosto de 2006, que cometeram ato infracional

3.4 O adolescente por ele mesmo

Ao solicitar aos adolescentes pesquisados que se descrevessem, as respostas foram diversificadas, e,

portanto agrupadas em percepções positivas e negativas sobre si mesmo. Entre as positivas

agrupamos descrições como: inteligente, bonito, amigo, paciente, tranqüilo, calmo, atencioso;

respostas emitidas pela totalidade de adolescentes do VivaNordeste e por 11 da CASE. Entre as

percepções negativas, apresentadas por três adolescentes da CASE, destacou-se a impaciência, o

nervosismo frente à situação de privação de liberdade (GRAF. 13).

11

14

3

0

Percepção positiva Perepção negativa

Percepção de si mesmo

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 13 – Dados referentes às respostas sobre como o adolescente se descreve, denotando a percepção de si mesmo dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006

2 3 4 9 4 1 5 6 4 4 14

Internação

Internação Provisória

Até seis meses

de seis meses

a um ano

de um ano a dois anos

Tempo de Internação

Total

Page 62: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

62

Conforme demonstrado no GRAF. 14, ao serem questionados sobre como se sentem e agem diante de

problemas, entre os adolescentes da CASE, 53% (8) respondeu que busca o auxílio de pessoas, busca

o diálogo com outras pessoas ou as envolvidas no problema, 33% (5) disseram utilizar recursos

próprios como manter-se controlado diante da situação para resolvê-la sozinha, 7% (1) buscavam

auxiliam na religião, pedindo ajuda a Deus e 7% (1) disseram manter a tranqüilidade, mas não

conseguem, normalmente acarretando discussões e brigas. Entre os adolescentes do VivaNordeste,

63% (10) buscavam o auxílio de pessoas e o diálogo, 19% (3) utilizam-se de seus próprios recursos,

como manter a calma, 13% (2) buscavam ajuda na religião que freqüentavam e 6% (1) disseram não

se controlar e perder a tranqüilidade frente a problemas.

53%

63%

33%

19%

7%

13%

7% 6%

Busca depessoas ao

redor/ Diálogo

Auto-controle Religiosidade Descontrole

Manejo de Problemas

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 14 – Resposta dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, à questão da entrevista sobre como se sentem e como agem diante de problemas

O GRAF. 15 apresenta os resultados relativos à questão sobre como é o relacionamento do

adolescente junto aos seus pais e amigos. Verificou-se que entre os adolescentes da CASE, 12

informaram ter um bom relacionamento e dois disseram que este é ruim. Entre os adolescentes do

VivaNordeste, apenas um informou ser ruim, 10 disseram ser bom e três informaram ter um ótimo

relacionamento.

Page 63: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

63

12

10

0

3

2

1

Bom Ótimo Ruim/Pouco

Relacionamento Interpessoal na percepção do adolescente

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 15 – Resposta dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, à questão da entrevista sobre como se relacionam com amigos e familiares

Quando perguntados sobre o que desejavam para o futuro, os adolescentes apresentaram as

respostas demonstradas no GRAF. 16. Entre os adolescentes da CASE, 35% (12) disseram querer

trabalhar, 21% (7) informaram o desejo de estudar, 15% (5) de mudar de vida, 18% (6) informaram o

desejo de construir uma família e ter sua casa e 12% (4) desejam ajudar sua família. No VivaNordeste,

31% (13) dos adolescentes citaram o desejo de trabalhar, 29% (12) informaram a vontade de estudar,

12% (5) disseram querer mudar de vida ou de local de moradia, 7% (3) informaram querer ter uma

família e uma casa, 14% (6) citaram o desejo de ajudar seus familiares e 7% (3) disseram querer viajar

para conhecer outros lugares.

Page 64: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

64

35%

31%

21%

29%

15%

12%

18%

7%

12%14%

0%

7%

Trabalhar Estudar Mudar devida/ local de

moradia

Ter umacasa/

Construiruma família

Ajudarfamiliares

Viajar

Objetivos para o futuro

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 16 – Resposta dos adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e os adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, quando questionados sobre o que desejavam para o seu futuro

3.5 O Adolescente por uma técnica projetiva

3.5.1 A Formação do Eu

O GRAF. 17 apresenta os dados levantados através do campo um do teste projetivo Wartegg,

relacionado à como o indivíduo formou seu eu, indicando o modo deste lidar com fatos e seus

sentimentos para estruturar sua consciência. Pôde-se verificar que sete sujeitos, de ambos os grupos,

o equivalente a 50% da amostra, tiveram a formação do ego baseada na experiência dos fatos. Cinco

sujeitos, de cada grupo, formaram sua identidade através da conceituação dos fatos e sentimentos.

Dois sujeitos de ambos os grupos se basearam em dois pontos de referência para formar sua

individualidade.

Page 65: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

65

7 7

5 5

2 2

Ego formado pelaexperiência de

sentimentos e fatos

Ego formado pelaconceituação de

sentimentos e fatos

Ego formado pelareflexão de dois

pontos de referência

Formação do Ego

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 17 – Dados sobre a formação do ego em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo 1 do teste projetivo Wartegg

Conforme dados apresentados no GRAF. 18, dez adolescentes da CASE não apresentaram traços de

dificuldade em fortalecer o ego e lidar consigo e quatro apresentaram tais traços. Entre os adolescentes

do VivaNordeste, 13 não apresentaram enquanto um apresentou tais traços.

10

13

4

1

Não Sim

Dificuldade em fortalecer o ego e lidar com si mesmo

CASE VivaNordeste GRÁFICO 18 – Dados sobre a presença choque ao realizar o teste, demonstrando dificuldades em fortalecer o ego e lidar com si mesmo em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo um do teste projetivo Wartegg

Conforme demonstrado no GRAF. 19, entre os adolescentes da CASE, nove apresentaram maior

consciência sobre os valores que os orientam, quatro tem pouca consciência destes valores e um

Page 66: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

66

demonstrou incoerência quanto a valores que o orientam. No VivaNordeste, oito denotaram maior

consciência e seis apresentaram pouca consciência destes valores.

9 8

4

6

1

0

Maior consciênciados valores

Pouca consciênciados valores

Incoerência dosvalores

Consciência dos valores que orientam a conduta

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 19 – Dados sobre a consciência dos valores que orientam a conduta em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do teste projetivo Wartegg

Conforme pode ser verificado no GRAF. 20, ao analisar os conteúdos relativos à autoconfiança,

verificou-se que entre os adolescentes da CASE, 60% (26) dos conteúdos demonstraram traços

indicativos de falta de confiança e insegurança ao relacionar-se, 16% (7) indicaram necessidade de

reconhecimento e auto-realização, 12% (5) apresentaram excesso de autoconfiança com resultados

negativos e 12% (5) apresentou traços de confiança em si mesmo. No VivaNordeste 40% (21) destes

conteúdos apresentaram falta de confiança e insegurança, 28% (15) demonstraram necessidade de

reconhecimento e auto-realização, 8% (4) apresentaram traços indicativos de excesso de

autoconfiança com resultados negativos e 25% (13) demonstraram confiança em si mesmo.

Page 67: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

67

60%

40%

16%

28%

12%8% 12%

25%

Falta deconfiança/Insegurança

ao relacionar-se

Necessidade dereconhecimento eauto-realização

Excesso de auto-confiança, com

resultados negativos

Confiança em simesmo

Auto-Confiança

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 20 – Dados sobre a autoconfiança em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do teste projetivo Wartegg

3.5.2 O Adolescente e seus conteúdos internos

Conforme apresentado no GRAF. 21, com relação à forma de agir frente à afetividade, cinco

adolescentes da CASE e três do VivaNordeste tendem a racionalizar a afetividade, respondendo de

forma racional às situações afetivas. Nove adolescentes da CASE e 11 do VivaNordeste, reagem

afetivamente às situações afetivas. Com relação à consciência sobre o papel da afetividade em sua

vida, 11 adolescentes da CASE e oito do VivaNordeste demonstraram pouca consciência, seis

adolescentes do VivaNordeste apresentaram certo grau de consciência e três da CASE demonstraram

maior grau de consciência deste papel.

Page 68: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

68

5

3

9

11

Racionalização da afetividade. Reage afetivamente às situações.

Manejo da afetividade

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 21 – Dados sobre o manejo da afetividade em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo 2 do teste projetivo Wartegg

De acordo com os dados apresentados no GRAF. 22, quanto à fluência da afetividade nos

relacionamentos, 32% (11) dos conteúdos desenhados pelos adolescentes da CASE demonstraram a

dificuldade em lidar com aspectos afetivos, 29% (10) apresentou ligação com os aspectos afetivos da

vida, 21% (7) demonstraram que a afetividade é sentida de forma negativa e 18% (6) apresentaram

traços de que a afetividade flui melhor com a natureza que com seres vivos. Entre os adolescentes do

VivaNordeste, 46% (13) dos conteúdos apresentaram dificuldade em lidar com aspectos afetivos, 29%

(8) demonstraram ligação com estes aspectos, 14% (4) apresentaram traços de que a afetividade é

sentida de forma negativa e 11% (3) de que a afetividade flui melhor com a natureza.

Page 69: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

69

32%

46%

29%

29%

21%

14%18%

11%

Dificuldade em lidarcom aspectos afetivos

Ligação com aspectosafetivos da vida

Afetividade sentida deforma negativa.

Afetividade flui melhorcom a Natureza quecom seres vivos.

Fluência da afetividade ao relacionar-se

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 22 – Dados sobre como a afetividade flui nos relacionamentos de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do teste projetivo Wartegg

Conforme apresentado no GRAF. 23, entre os adolescentes da CASE, nove não apresentaram choque

ao realizar o desenho no campo dois, o que sugere a ausência de dificuldade em lidar com a

afetividade. No VivaNordeste, o número de adolescentes cuja produção no teste teve esta

característica foi de 13. Entre os adolescentes que apresentaram choque e, portanto, traços de

dificuldade em lidar com a afetividade, seis são da CASE e um do VivaNordeste.

9

13

5

1

Não Sim

Dificuldade em lidar com a afetividade

CASE VivaNordeste GRÁFICO 23 – Dados sobre a presença choque ao realizar o teste, demonstrando dificuldades em fortalecer o ego e lidar com si mesmo em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo dois do teste projetivo Wartegg

Page 70: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

70

3.5.3 O adolescente diante de suas metas e aspirações e frente a obstáculos

Entre os adolescentes que apresentaram traços relacionados ao manejo de recursos internos ao traçar

metas, de acordo com o campo três do teste e conforme apresentado no GRAF. 24, verificou-se que

entre os adolescentes da CASE, 60% (6) demonstraram falta de objetividade e empenho, 20% (2)

direcionamento ao traçar suas metas e 20% (2) apresentaram tendência a possuir expectativa

pessimista ou sentimento de impotência frente às metas. Entre os adolescentes do VivaNordeste, 50%

(7) demonstraram falta de objetividade ou empenho, 36% (5) apresentam expectativas pessimistas ou

sentimento de impotência e 14% (2) demonstram comportamentos defensivos com preocupação de

não perder o que possuem.

60%

50%

20%

0%

20%

36%

0%

14%

Falta de objetividade eempenho

Direcionamento parametas/objetivos.

Expectativapessimista/

Sentimento deimpotência

Compto defensivo,preocupação em nãoperder o que possui

Manejo de recursos internos ao traçar metas

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 24 – Dados sobre o manejo de recursos internos ao traçar metas de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo três do teste projetivo Wartegg

Conforme apresentado no GRAF. 25, entre os adolescentes da CASE, 50% (7) demonstraram

mobilização de energia, porém inadequadamente canalizada, 29% (4) apresentaram facilidade para

canalizar energia e 21% (3) demonstraram pouca vitalidade. Entre os do VivaNordeste, 79% (11)

Page 71: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

71

demonstraram mobilização de energia porém mal canalizada, 7% (1) apresentaram facilidade para

canalizar energia e 14% (2) demonstraram pouca vitalidade.

50%

79%

29%

7%

21%

14%

Mobilização deenergia,

inadequadamentecanalizada.

Facilidade paracanalizar energia.

Pouca vitalidade.

Mobilização de energia para superar obstáculos

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 25 – Dados sobre a mobilização de energia para superar obstáculos em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise da pressão e tipo de traçado apresentadas nos campos do teste projetivo Wartegg

De acordo com os dados apresentados no GRAF. 26, entre os adolescentes da CASE, 44% (8) agiam

sem modificar as situações que geram impasses, 22% (4) procuravam entender os motivos que

geraram tais situações, 17% (3) evitavam situações de impasse, 6% (1) iam além das dificuldades

buscando superá-las, 11% (2) adiavam soluções diante das barreiras e dificuldades e nenhum

adolescentes demonstrou utilizar a reflexão para enfrentar situações de impasse. Entre os

adolescentes do VivaNordeste, 21% (6) agiam sem modificar situações que geram impasses, 4% (1)

procuravam entender os motivos que geraram tais situações, 36% (10) evitavam as situações de

impasse, 7% (2) utilizavam a reflexão frente a tais situações, 18% (5) iam além das dificuldades,

buscando superá-las e 14% (4) adiavam soluções diante das barreiras e dificuldades.

Page 72: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

72

44%

21%22%

4%

17%

36%

0%

7%6%

18%

11%

14%

Age semmodificar

situações quegeram

impasses.

Procuraentender osmotivos quegeraram

situações deimpasse

Evitasituações deimpasse.

Utiliza areflexãofrente a

situações deimpasse.

Vai além dasdificuldades,buscandosuperá-las.

Adia soluçõesdiante dasbarreiras edificuldades.

Ação frente a barreiras, obstáculos e situações de impasse

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 26 – Dados sobre a ação frente a barreiras, obstáculos e situações de impasse em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do teste projetivo Wartegg

Conforme apresentado no GRAF. 27, os 14 adolescentes da CASE apresentavam pouca ou nenhuma

ambição ao traçar metas. Entre os adolescentes do VivaNordeste, 12 apresentavam pouca ou

nenhuma ambição e dois demonstravam traços de muita ambição ao traçar metas.

14

12

0

2

Taços denotam pouca ounenhuma ambição

Traços denotam muita ambição

Traços característicos de ambição

CASE VivaNordeste GRÁFICO 27 – Dados sobre traços que demonstram ambição em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo três do teste projetivo Wartegg

Page 73: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

73

3.5.4 A sexualidade e a sensualidade do adolescente

Conforme demonstrado no GRAF. 28, entre os adolescentes, seis da CASE e sete do VivaNordeste

apresentavaam afetividade ligada à sensualidade; dois da CASE e dois do VivaNordeste

demonstravam afetividade ligada à sexualidade, que permite um envolvimento emocional nos

momentos mais. Quatro adolescentes da CASE e cinco do VivaNordeste demonstravam racionalização

da afetividade ligada à sensualidade; dois da CASE e nenhum do VivaNordeste apresentaram

racionalização da afetividade ligada à sexualidade, racionalização fruto de dificuldades passadas e não

compreendidas a respeito destes sentimentos, o comportamento sexual/sensual era dirigido pela razão

e não espontâneo, o que impedia a entrega. Entre os adolescentes, oito da CASE e 13 do

VivaNordeste apresentaram choque ao realizar o desenho neste campo, denotando dificuldade em lidar

com sua sexualidade ou sensualidade.

67

2 2

4

5

2

0

Afetividade ligada àsensualidade.

Afetividade ligada àsexualidade.

Racionalização daafetividade, ligadaà sensualidade.

Racionalização daafetividade, ligadaà sexualidade.

Manejo da Sexualidade e Sensualidade

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 28 – Dados sobre o manejo da sexualidade e da sensualidade de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo sete do teste projetivo Wartegg

Page 74: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

74

Conforme dados do GRAF. 29, cinco adolescentes da CASE e 12 do VivaNordeste não demonstraram

repressão da sexualidade ou sensualidade, enquanto nove da CASE e dois do VivaNordeste

demonstraram reprimir a ternura própria da sensualidade devido às dificuldades trazidas por esta

sensibilidade ou pouca compreensão deste sentimento.

5

12

9

2

Sexualidade/Sensualidade nãoreprimidas.

Repressão da ternura própria dasensualidade

Repressão da Sexualidade/Sensualidade

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 29 – Dados sobre a repressão da sexualidade e da sensualidade em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo sete do teste projetivo Wartegg

De acordo com as informações apresentadas no GRAF. 30, entre os adolescentes pesquisados na

CASE, cinco apresentavam a sexualidade e a sensualidade integradas à personalidade e nove

adolescentes apresentavam traços sugestivos de dificuldades de integração destas características. Nos

adolescentes do VivaNordeste, 13 apresentavam integração da sexualidade e da sensualidade à

personalidade e um apresentava dificuldades desta integração.

Page 75: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

75

5

13

9

1

Sexualidade/Sensualidade integradasà personalidade.

Dificuldade de integração dasexualidade/sensualidade.

Integração da sexualidade/sensualidade à personalidade

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 30 – Dados sobre a integração à personalidade da sexualidade e da sensualidade em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo sete do teste projetivo Wartegg 3.5.5 Habilidades sociais do adolescente

Conforme se verifica no GRAF. 31, entre os adolescentes da CASE, 39% (9) apresentavam

necessidade de receber apoio e proteção do grupo, 22% (5) racionalizavam a afetividade, interagindo

com o grupo a partir de conceitos racionais, 30% (7) apresentavam traços sugestivos de interação

através dos sentimentos e 9% apresentavam o sentimento de estarem sendo julgados pelos que o

cercam. Entre os adolescentes do VivaNordeste, 44% (11) demonstravam necessidade de receber

apoio e proteção do grupo, 16% (4) utilizavam a razão na interação, utilizando-se de conceitos, 32% (8)

interagiam através dos sentimentos e 8% (2) apresentavam características associadas ao sentimento

de estar sendo julgado pelo grupo.

Page 76: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

76

39%

44%

22%

16%

30% 32%

9% 8%

Necessidade dereceber apoio eproteção do grupo

Racionalização daAfetividade. Troca àpartir de conceitos

Interação ocorreatravés dossentimentos.

Sentimento de estarsendo julgado pelos

que o cercam.

Relacionamento com o grupo

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 31 – Dados sobre a relação com o grupo de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo oito do teste projetivo Wartegg

De acordo com os resultados apresentados no GRAF. 32, dos adolescentes da CASE, quatro

interagiam de forma moderada com o grupo, seis demonstravam grande interação, com busca de troca

de maneira ampla e afetiva e quatro apresentavam dificuldade de interagir e sentir-se protegido. Entre

os adolescentes do VivaNordeste, oito interagiam de forma moderada, cinco apresentavam grande

interação com o grupo, com troca ampla e afetiva e um demonstrava dificuldade de interação.

4

8

6

5

4

1

Interação moderada como grupo.

Grande interação com ogrupo com busca de troca

ampla e afetiva

Dificuldade deinteração/de sentir-se

protegido

Interação com o grupo

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 32 – Dados sobre a interatividade em adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo oito do teste projetivo Wartegg

Page 77: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

77

Ao analisarmos a presença de conteúdos referentes ao relacionamento interpessoal, conforme

resultados demonstrados no GRAF. 33, entre os adolescentes da CASE, 75% (6) apresentavam

dificuldade de relacionamento e 25% (2) demonstravam facilidade de relacionar-se com aceitação do

outro. Entre os adolescentes do VivaNordeste, este resultado foi inverso, sendo que 25% (2) dos

adolescentes apresentavam dificuldades de relacionar-se e 75% (6) demonstravam facilidade em

aceitar o outro e relacionar-se com ele.

75%

25%25%

75%

Dificuldade de relacionar-se Facilidade de relacionar-se comaceitação do outro

Relacionamento Interpessoal

CASE VivaNordeste

GRÁFICO 33 – Dados sobre o relacionamento interpessoal de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise dos conteúdos encontrados no teste projetivo Wartegg Com relação à afinidade destes adolescentes com os seres vivos, conforme apresentado no GRAF. 34,

93% (11) dos adolescentes da CASE demonstravam pouca ou nenhuma afinidade e 7% (1)

apresentavam afinidade com o relacionamento humano. Entre os adolescentes do VivaNordeste, 43%

(6) demonstravam pouca ou nenhuma afinidade e 57% (8) apresentavam afinidade com os seres vivos.

Page 78: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

78

93%

43%

7%

57%

Pouca ou nenhuma afinidadecom seres vivos

Afinidade com orelacionamento humano

Afinidade com seres vivos

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 34 – Dados sobre a afinidade com seres vivos de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise dos conteúdos encontrados no teste projetivo Wartegg

Conforme demonstrado no GRAF. 35, entre os adolescentes da CASE 43% (6) apresentavam traços

de dependência de conduta social e comprometimento com valores, 36% (5) respeitavam as normas e

valores de forma crítica e 21% (3) apresentavam menos receptividade social, comprometendo o

respeito às normas e valores externos. Dos adolescentes do VivaNordeste, 71% (10) apresentavam

dependência da conduta social e comprometimento com valores, 29% (4) respeitavam as normas de

forma crítica e nenhum demonstra menor receptividade social.

43%

71%

36%

29%

21%

0%

Dependência da condutasocial e comprometimento

com valores.

Respeito a normas evalores de forma crítica.

Menos receptividadesocial

Conduta social e comprometimento com valores

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 35 – Dados sobre a conduta social e o comprometimento com valores de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise do campo oito do teste projetivo Wartegg

Page 79: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

79

Conforme GRAF. 36, entre os adolescentes da CASE, 10 apresentavam interesse em ser

compreendido ao comunicar-se e quatro voltavam-se para si mesmo, sem demonstrar preocupação

com o outro. Entre os adolescentes do VivaNordeste, existiu um equilíbrio, já que sete demonstravam

interesse em ser compreendido ao comunicar-se e sete se voltavam para si, sem se preocupar com o

outro.

10

7

4

7

Interesse em ser compreendido aocomunicar-se.

Voltado para si mesmo, sempreocupar-se com o outro.

Comunicação

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 36 – Dados sobre a comunicação de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise dos conteúdos encontrados no teste projetivo Wartegg

3.5.6 As idéias e as ações

Entre os adolescentes da CASE, seis demonstraram flexibilidade na execução de tarefas, agindo em

função de escolhas próprias e da afinidade com as situações, um demonstrou imaturidade e

descontrole ao realizar tarefas, seis seguiam esquemas e métodos externos e um agia de forma

oposicionista ao meio ao realizar tarefas. Dos adolescentes do VivaNordeste, 11 demonstraram

flexibilidade na execução de tarefas, três agiam de forma oposicionista ao meio e nenhum demonstrou

imaturidade ou agia de acordo com esquemas externos (GRAF. 37).

Page 80: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

80

6

11

1

0

6

0

1

3

Flexibilidade.Afinidade com assituações. Escolhas

próprias

Imaturidade edescontrole aorealizar tarefas.

Segue esquemas emétodos externosao realizar tarefas.

Age de formaoposicionista ao

meio.

Características ligadas à execução de tarefas

CASE

VivaNordeste

GRÁFICO 37 – Dados sobre a execução de tarefas de adolescentes privados de liberdade na CASE – Salvador, no período de julho a agosto de 2006 e adolescentes participantes do Programa VivaNordeste, no período de agosto a setembro de 2006, obtidos através da análise da seqüência de escolha dos campos do teste projetivo Wartegg

Page 81: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

81

4 DISCUSSÃO

4.1 Descobrindo os adolescentes da pesquisa

A amostra inicial da pesquisa foi dos adolescentes privados de liberdade na CASE, e a quantidade

maior de sujeitos do sexo masculino está relacionada ao maior índice envolvimento de adolescentes do

sexo masculino em atos infracionais e cumprimento medida sócio-educativa, conforme verificaram

diversos trabalhos anteriores (ASSIS, 1999; CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA, 2001, VALLE, 2003;

VOLPI, 2001 e 2002). No período da pesquisa o número total de adolescentes internos na CASE era

de 212, dos quais 21 eram do sexo feminino, correspondendo a 10% da população institucionalizada,

percentual acima do valor nacional. No Brasil, em 1995, o percentual de adolescentes do sexo feminino

envolvidas em atos infracionais era de 4% e, de acordo com dados do ano de 2002 do Ministério da

Justiça36, de um total de 10.366 adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa no Brasil,

9.860 eram do sexo masculino e 506 do sexo feminino (95,12% e de 4,88%, respectivamente). Entre os

adolescentes que cumpriam medida sócio-educativa de internação, este número era de 94,73% do

sexo masculino e 5,27% do sexo feminino. Porém notou-se um aumento significativo na participação

feminina em atos infracionais - em fevereiro de 2004, a FEBEM paulista registrou um aumento de

106,4% de adolescentes do sexo feminino em cumprimento da medida de internação em relação ao

mesmo mês do ano de 2001. Apesar de ainda serem a maioria, os jovens do sexo masculino

registraram um aumento de apenas 49,3% nesse mesmo período.

As adolescentes do sexo feminino se envolvem em atos infracionais, em sua maioria, por influência de

companheiros, namorados, adultos, sendo os principais o tráfico de drogas e o roubo (CRUZ NETO,

MOREIRA e SUCENA, 2001), segundo dados da ILANUD37, as adolescentes que roubavam, por sua

36 Dados disponíveis em http://www.risolidaria.org.br/estatis/view_grafico.jsp?id=200503080025#tab2 37 Dados disponíveis em http://www.risolidaria.org.br/estatis/view_grafico.jsp?id=200503080025#tab2

Page 82: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

82

vez, revelaram que o grupo de amigos foi importante influência para enveredarem no mundo do delito.

Algumas jovens afirmaram que teriam sido cooptadas pelos colegas do sexo masculino, que

necessitavam de uma figura feminina menos visada para viabilizar o roubo.

A partir destes números foram pesquisados nove adolescentes do sexo masculino e cinco do sexo

feminino, quantidade que foi pareada no segundo grupo pesquisado, os adolescentes participantes do

Programa VivaNordeste.

Quanto à idade dos adolescentes, verificou-se que no VivaNordeste, 12 dos entrevistados possuíam

idade entre 12 a 15 anos, enquanto apenas dois entre 16 a 18 anos, fator que pode ocasionar

diferenças nos demais resultados, já que os adolescentes da CASE estão mais distribuídos entre as

faixas etárias, e o maior número, 9 adolescentes, se encontravam com idade superior a 16 anos.

Contudo a idade dos adolescentes privados de liberdade não caracterizou um perfil - o que se verificou

em outras pesquisas (VOLPI, 2002) foi a predominância de adolescentes privados de liberdade com

idade entre 15 e 17 anos.

De acordo com os dados sobre a idade e escolaridade atual, pôde-se verificar que 12 adolescentes do

VivaNordeste estavam cursando o Ensino Fundamental em idade correspondente a este grau de

escolaridade, sendo que apenas dois sujeitos tinham idade entre 16 a 18 anos, idade superior para

esta escolaridade. Na CASE, embora dois sujeitos apresentassem escolaridade de Ensino

Fundamental Incompleto, sendo um com 15 anos e outro com 18 anos; entre os adolescentes que

possuíam Ensino Médio Incompleto, oito apresentaram idade superior a 16 anos, estando em

defasagem com a idade média de 12 anos para a conclusão do Ensino Médio, parâmetro estabelecido

pelo Ministério da Educação e Cultura. “A relação Idade-Série constitui-se, assim, um dos indicadores

mais simples e sensíveis do campo da Educação... diante de um quadro tão acentuado de defasagem

educacional” (CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA, 2001, p.106).

Tanto os adolescentes da CASE como do VivaNordeste participavam de atividades sociais, os

primeiros como parte da medida sócio-educativa, os segundos como opção para o tempo livre fora do

Page 83: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

83

horário escolar. No entanto, notou-se uma diferença entre as atividades exercidas em cada grupo -

verificou-se que os adolescentes da CASE participavam de uma atividade cada um, sendo nove do

projeto de profissionalização, onde se incluía Oficina de Artesanato, Serigrafia, Artefato de Cimento,

Acessórios e Padaria. Dois faziam parte do projeto artístico-cultural, que envolve dança e expressão

corporal e um do grupo desportivo, jogando futebol, e um do projeto de pré-vestibular, que visa à

preparação do jovem para ingresso em universidades. Apenas um adolescente não participava de

nenhuma atividade, segundo ele por estar aguardando uma vaga, já que a instituição não tinha como

atender a todos os adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa. Isto vai de encontro à

proposta do ECA, que em seus artigos 123 e 124, expressa a obrigatoriedade das atividades

pedagógicas durante o período de internação, mesmo que provisória, e o direito do adolescente

privado de liberdade de receber escolarização e profissionalização, bem como participar de atividades

culturais, esportivas e de lazer. Segundo Volpi (2001), algumas instituições utilizam como critério para a

inclusão dos adolescentes em atividades o bom comportamento e não as habilidades pessoais ou

tendências vocacionais.

No entanto, alguns adolescentes do VivaNordeste participavam de mais de uma atividade, sendo que

sete participavam de projeto de profissionalização, que envolve a aprendizagem de outra língua,

informática e fotografia, capacitações exigidas pelo atual mercado de trabalho. Oito adolescentes

participavam do grupo desportivo, que envolve lutas marciais, como judô, karatê, jiu-jitsu, futebol e

aulas de xadrez, todos com a presença de um profissional da área que lhes ensina a técnica de cada

modalidade. Nota-se que apenas um adolescente da CASE participa do Grupo Desportivo, sendo este

limitado a jogos de futebol em um campo improvisado no pátio da instituição.

Com base neste resultado, verificou-se que enquanto os jovens do VivaNordeste estão envolvidos com

a prática de esportes, juntamente com projetos de profissionalização, os adolescentes da CASE

voltam-se, exclusivamente, para os projetos de profissionalização, mas em aptidões reconhecidas no

Page 84: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

84

mercado de trabalho informal, sem ter acesso, como os adolescentes do VivaNordeste, à habilidades

requisitadas no mercado de trabalho qualificado.

Segundo ASSIS, PESCE e AVANCI (2006, p.77), entre os jovens mais resilientes “houve maior ênfase

na responsabilização dos adolescentes com tarefas” realizadas no ambiente doméstico, escolar, ou

através de programas extra-escolares. A importância desta participação em atividades além dos muros

da escola se concretiza na fala dos adolescentes do VivaNordeste que contam que não gostava de

estudar na escola anterior pois não tinha nada para fazer de interessante, agora passaram a gostar de

estudar, pois fora a escola, participam de outras atividades.

A religiosidade faz parte das atividades de alguns adolescentes. Contudo, segundo Aberastury e

Knobel (1981), na adolescência são comuns crises religiosas, indo do ateísmo intransigente ao

misticismo fervoroso. “A religião traz um modo de conhecer e explicar o mundo, de construir um

cotidiano de existência, ou simplesmente de superar (ou suportar) o cotidiano associando-o à

esperança” (ASSIS, 1999, p.101) – deste modo, conhecer a religião escolhida pelo adolescente

possibilita uma maior compreensão da sua visão de mundo e suas práticas. As religiões mais citadas

são as que estimulam os fiéis a se afastarem das coisas do mundo, “das tentações”, fazendo-os adotar

uma vida baseada na sobriedade e na moral. Entre os adolescentes do VivaNordeste, quase todos (11)

adotavam alguma religião, sendo em sua maioria levados pela família. Muitos citaram a religião como

uma forma de lidar com as adversidades da sua condição sócio-econômica e de se manterem distantes

das drogas. Na CASE, esta participação envolve apenas seis adolescentes.

Segundo Assis, Pesce e Avanci (2006), vários estudos indicam a religião e o apoio da igreja como

fatores importantes de proteção e de promoção da resiliência na vida dos jovens, oferecendo-lhes uma

comunidade de apoio e estabilidade e estimulando a expressão de sua identidade. Seu aspecto

protetor reduz comportamentos anti-sociais e uso de substâncias psicoativas.

Com relação à participação dos adolescentes na renda familiar, percebemos que os resultados são

invertidos, enquanto 10 adolescentes da CASE exerciam atividades profissionais antes da privação de

Page 85: Andréa Sandoval Padovani Andréa Sandoval Padovani

85

liberdade, 10 adolescentes do VivaNordeste nunca exerceram qualquer atividade com a finalidade de

auxiliar na renda da família. O relato das atividades exercidas,

revelam uma posição social que vem sendo caracterizada pelo desempenho de tarefas de pouca qualificação e baixa remuneração, fatores que determinam o pertencimento dos jovens a uma classe social de baixo capital cultural, econômico e social (VOLPI, 2001, p.84).

Estas atividades eram, em sua maioria, ajudante de pedreiro, de caminhão, as lavagens ou guarda de

carros, trabalho em lanchonetes, em barracas de praia, em casas de família. Estes adolescentes

são destratados como mão-de-obra abundante, desqualificada, barata e descartável, cabendo-lhes, quando conseguem vaga, funções subalternas, malremuneradas e praticamente desprovidas de possibilidade de ascensão (CRUZ NETO, MOREIRA E SUCENA, 2001, p.109).

Segundo ASSIS (1999), a inserção no mercado de trabalho ocorre pela necessidade familiar ou de

independência financeira visando atender ao apelo da mídia para o consumismo, fato observado pela

finalidade dada ao dinheiro recebido pelos adolescentes da amostra.

O fato de um adolescente citar o ato infracional como forma de auxiliar na renda familiar, nos remete à

participação de jovens no crime organizado e no tráfico de drogas como uma alternativa econômica de

sobrevivência, com rentabilidade a qual jamais teriam acesso em outra atividade (ASSIS, 1999).

No que se refere ao uso de substâncias psicoativas, pôde-se verificar que entre os adolescentes do

VivaNordeste, a maioria (12) nunca utilizou qualquer substância e os dois usuários se utilizam de

substância lícitas, sendo citada a bebida alcoólica em doses excessivas em algumas ocasiões, como

fins de semana e festas. Quanto aos adolescentes da CASE, o número de usuários é bem superior,

totalizando 10 adolescentes, sendo que oito deles utilizavam substâncias ilícitas como maconha,

cocaína e crack. “É preocupante o número de adolescentes privados de liberdade usuários de drogas”

(VOLPI, 2002, p.58), dados encontrados em pesquisas anteriores indicam que o uso de substâncias

psicoativas faz parte da realidade da maioria de adolescentes envolvidos em atos infracionais (ASSIS,

1999; CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA, 2001, VOLPI, 2002). Entre os fatores de risco para

adolescentes, encontra-se o consumo de substâncias psicoativas, conforme Grotberg (1998). Segundo

Assis (1999), adolescentes que se utilizam mais de estratégias internas e de fuga dos problemas,

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86

tendem a consumir substâncias psicoativas como um mecanismo que alivia o enfrentamento das

dificuldades.

A violência sofrida por adolescentes também é um fator de risco que os torna vulnerável e pode

diminuir a possibilidade de desenvolvimento de resiliência. Entre os adolescentes pesquisados, três de

cada grupo informaram já ter sofrido algum tipo de violência, sendo que no VivaNordeste esta foi

desencadeada pelos pais no ato de bater com violência, enquanto na CASE um adolescente sofreu

violência física mais grave, tentativa de homicídio e um sofreu violência sexual. Os adolescentes

avaliaram que eram merecedores de tal punição. Esta tendência também foi verificada na pesquisa

realizada por Assis (1999), na qual os sujeitos achavam normal que suas mães lhes batessem, não

avaliando este ato a uma forma de agressão física.

Conforme destacam Assis, Pesce e Avanci (2006, p.48), “a violência faz mal à saúde de crianças e

adolescentes”, podendo ser mais devastadora quando cometida por pessoas das quais se espera afeto

e proteção, como no caso dos pais. A violência tende a ser extremamente prejudicial, durante o

processo de desenvolvimento, acarretando maior vulnerabilidade aos demais fatores de risco.

Conhecer as práticas disciplinares utilizadas pela família para socializar a criança é uma maneira precoce de reconhecer a violência física em etapas ainda iniciais... A utilização de práticas estritas e punitivas é compreendida como indicador de risco no contexto familiar, já que está associada ao abuso físico e emocional. (KOLLER38 apud ASSIS, PESCE e AVANCI 2006, p.50).

4.2 A família por trás do adolescente

Segundo Assis, Pesce e Avanci (2006, p.68), “a importância da família no desenvolvimento saudável

de seus membros é uma questão de fundamental importância no estudo do desenvolvimento”, porém

ainda hoje existe o mito de que a família saudável é aquela formada por pai, mãe e filhos morando

juntos. Essa configuração não garante, por si só, um clima construtivo para adolescentes - a interação

familiar é aspecto de maior relevância com vistas a um crescimento saudável. Entretanto, não pudemos

38 KOLLER, S.H. Violência doméstica: uma visão ecológica. In AMENCAR (org.). Violência Doméstica. Brasília: UNICEF, p.32-42, 1999.

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deixar de notar a diferença no modelo familiar entre os grupos pesquisados: nove adolescentes do

VivaNordeste informaram fazer parte de uma família nuclear, formada por pai, mãe e irmãos, sendo

que na CASE esta participação se dá com seis adolescentes. Entre os adolescentes, três do

VivaNordeste e quatro da CASE informaram não ter o progenitor masculino como membro da família.

Um adolescente do VivaNordeste informou morar com o pai, avós e irmãos, sem a presença da mãe

que mora em outra cidade, e um informou morar com tios e avós, sem a presença dos pais. Este

modelo familiar foi encontrado em seis adolescentes da CASE, dados similares aos encontrados por

Assis (1999), que constatou a fragilidade da maioria das famílias dos adolescentes envolvidos com atos

infracionais. Segundo Cruz Neto, Moreira e Sucena (2001, p.114), “a exacerbação dos problemas

familiares concorrem fortemente para o aprofundamento da vulnerabilidade pessoal e social dos

jovens”.

A quantidade de irmãos entre os adolescentes chama a atenção, sendo que oito participantes no

VivaNordeste possuíam até um irmão e cinco têm de um a seis irmãos. Na CASE este resultado

mostrou-se quase inverso, tendo seis adolescentes com mais de seis irmãos e apenas um participante

declarou ter apenas um irmão, enquanto cinco possuíam de dois a seis irmãos. A chegada dos filhos

transforma a organização familiar e envolve muitos rearranjos, “uma criança sem irmãos aprende

desde cedo as regras e noções do mundo, sendo excessivamente estimulada e protegida” (ASSIS,

PESCE e AVANCI 2006, p.47). Com a vinda dos filhos ocorre mudança do espaço físico doméstico,

bem como, surgem disputas consideráveis, que vão de objetos ao amor dos pais. Aumenta a tensão e

as dúvidas dos pais em relação a como lidar com as diferenças de cada filho. Ocorrem, inclusive,

mudanças quanto aos recursos econômicos, materiais e emocionais que passam a ser divididos, em

famílias onde há escassez destes recursos, a vinda de novos filhos pode tornar-se um problema.

Segundo pesquisa anterior, realizada em âmbito nacional, junto a adolescentes em privação de

liberdade (VOLPI, 2001), as famílias eram compostas majoritariamente pela mãe e irmãos, com média

de quatro filhos com uma estrutura habitacional e de renda precária.

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A responsabilidade pelo sustento familiar apresentou-se com resultados diversos entre os dois grupos.

Enquanto seis adolescentes do VivaNordeste informaram ter os pais como provedores da família,

apenas um da CASE emitiu esta resposta, em contrapartida, sete indicaram a mãe como responsável

pelo sustento familiar, sendo que no VivaNordeste este número foi de três. As famílias, que têm o pai

ou padrasto como provedor, ficaram equilibradas entre os dois grupos, quatro no VivaNordeste e três

na CASE. “O adolescente infrator geralmente é oriundo de família onde a mãe é a cabeça, a

responsável pelos filhos” (VALLE, 2003, p.55). Dados obtidos em pesquisa realizada com adolescentes

envolvidos em tráfico de drogas (CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA 2001, p.114), trazem este

mesmo resultado, “evidenciando elevado índice de separações, com a responsabilidade de cuidas dos

filhos destinada ao componente feminino”. Ressalta-se que as atividades exercidas por estes familiares

são, em sua maioria, atividades não-qualificadas, como empregadas domésticas, babás, padeiros,

pedreiros, ajudantes, seguranças de rua, empacotadores, e, muitas vezes, mal remuneradas.

Para Assis, Pesce e Avanci (2006, p.70/73), “a interação familiar é um dos aspectos mais relevantes

para a construção do sentimento de afeto por si próprio” e “há evidente associação entre vivenciar bom

relacionamento com irmãos e ter mais elevado potencial de resiliência”. O perfil de proteção que

agrega a capacidade de se relacionar bem com os irmãos se configuram em oportunidade constante de

aprender a negociar, ouvir e fazer críticas, elaborando falhas e pedindo desculpas, melhorando com

isso as futuras relações que estes adolescentes terão com pessoas fora do ambiente familiar (ASSIS,

PESCE e AVANCI, 2006). Entre os adolescentes do VivaNordeste, 13 nunca tiveram qualquer conflito

familiar e um citou conflito com a avó paterna, descrevendo-o como discussões com acarretadas pelo

ciúme desta para com seu pai, fator trazido pelo adolescente como responsável pela separação de

seus pais. Este adolescente referiu empregar uma estratégia de esquiva (sair de casa sempre que a

avó “começa a falar”) para evitar conflitos com a mesma.

Na CASE o número de adolescentes que tiveram algum conflito é de nove, sendo que destes, sete o

tiveram com pais e/ou irmãos, dois entre tios e/ou primos, demonstrando certa dificuldade de interação

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e relacionamento familiar, fator de vulnerabilidade para o desenvolvimento destes adolescentes.

Segundo Cruz Neto, Moreira e Sucena (2001), o resgate do relacionamento familiar, buscando

compreender de forma a evitar os pseudomoralismos, trata-se de um fator importante para evitar que o

jovem ingresse em atitudes anti-sociais ou em atos infracionais.

A família nunca deixa de ser importante e é responsável por muitas de nossas viagens. Nós escapamos, emigramos, trocamos o sul pelo norte e o leste pelo oeste devido à necessidade de nos libertarmos; e depois viajamos periodicamente de volta para casa para renovar o contato com a família. WINNICOTT39 (apud ASSIS, PESCE e AVANCI 2006, p. 68).

O resultado quanto à questão do uso de substâncias psicoativas por parte dos familiares, trouxe um

dado interessante, divergindo de pesquisas anteriores, que afirmam que “o uso intenso de bebidas

alcoólicas pelos pais ou cuidadores é apontada como um potencializador de riscos ao desenvolvimento

infanto-juvenil e à interação” (KOLLER40 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006). Os dados levantados

não demonstraram tal correlação, já que 12 adolescentes do VivaNordeste informaram não utilizarem

nenhum tipo de substância e a totalidade de sujeitos (14) relataram que familiares faziam uso de

alguma substância, sendo que dois deles utilizavam substâncias ilícitas, como maconha, cocaína e

crack, enquanto entre os adolescentes da CASE, 10 disseram fazer uso de substâncias, lícitas e/ou

ilícitas, e seis informaram não ter ninguém na família que fazia uso de qualquer substância, sendo que

os oito que relataram ter familiares usuários, todos citaram substâncias lícitas, como o cigarro e a

bebida alcoólica. O que aqui devemos ressaltar é que o uso abusivo de bebida alcoólica, embora sendo

lícito, traz prejuízos não só à saúde física, mas, e principalmente, à saúde psíquica dos seus usuários

(RUTTER41 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Quanto à participação de familiares em atos infracionais, dos 14 adolescentes entrevistados na CASE,

11 informaram não ter nenhum familiar envolvido em atos infracionais, contudo no VivaNordeste, onde

nenhum adolescente praticou qualquer ato, seis deles relataram ter parentes envolvidos em atos

infracionais, como atos contra a vida e tráfico de drogas, sendo dois deles pais e/ou irmãos. Este

39 WINNICOTT, D.W. A família e o desenvolvimento individual. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 40 KOLLER, S.H. Violência doméstica: uma visão ecológica. In AMENCAR (org.). Violência Doméstica. Brasília: UNICEF, p.32-42, 1999.

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90

resultado diverge da pesquisa de Assis (1999, p.62), na qual apenas 14% dos adolescentes privados

de liberdade não relataram envolvimento de familiares com ato infracional:

alguns adolescentes vêm de família cuja maior parte (nuclear e estendida) é também infratora... Apesar disto, um jovem não-infrator relatou que todos os irmãos são infratores, inclusive outros membros da família. Ele é o único que não seguiu este caminho.

Entre os adolescentes do VivaNordeste, um deles citou o pai como o familiar envolvido em ato

infracional, porém diz não ter mais contato com o mesmo, já que o envolvimento no crime foi o motivo

da separação entre seus pais. O adolescente que citou o irmão diz que muitas vezes não acredita no

que lhe contam sobre o irmão, mas sabe que é verdade.. Conta ainda que a mãe lhe cede dinheiro

para comprar drogas em uma atitude desesperada tentando evitar que ele se envolva em novos atos,

pois já foi preso e passou cerca de seis meses em cumprimento de medida na CASE. Tios e primos

citados são familiares distantes, com os quais os adolescentes não mantêm contato. Os adolescentes

da CASE cujos familiares tem envolvimento com o crime não informaram detalhes sobre o fato.

4.3 O ato infracional que encobre o adolescer

Os atos infracionais cometidos pelos adolescentes da CASE são, em sua maioria, contra a vida,

embora pesquisa anterior chegasse à conclusão, considerando os dados nacionais, de que “os atos

infracionais mais graves, como o latrocínio, o estupro e o homicídio representam um percentual

pequeno em relação aos atos infracionais praticados contra o patrimônio” (VOLPI, 2002, p.62).

Contudo, de acordo com a pesquisa, os dados referentes ao Estado da Bahia indicaram um alto índice

de adolescentes envolvidos em atos infracionais contra a vida - dos 85 pesquisados, 51 praticaram

latrocínio ou homicídio. O resultado encontrado na CASE pode ser um indício de que o ECA esteja

sendo aplicado com maior rigor, já que este indica “que somente sejam privados de liberdade aqueles

41 RUTTER, M. Stress, coping and development: some issues and some questions. Journal of Child Psychology and Psychiatry, v.22, n.4, p.323-356, 1981.

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adolescentes que cometeram grave atentado à vida humana” (VOLPI, 2001, p.80), porém comprovar

tal afirmação não foi objetivo desta pesquisa.

A idade na data infracional expõe a evidência encontrada em pesquisas anteriores (CRUZ NETO,

MOREIRA e SUCENA, 2001; VALLE, 2003; VOLPI, 2001 e 2002) de que a prática de delitos tem sua

maior incidência nas idades entre 15 e 17 anos.

No Brasil, segundo dados da ILANUD42, em 2004 existiam 39578 jovens e adolescentes de 12 a 18

anos de idade, cumprindo algum tipo de Medida Sócio-Educativa. Isso representava um total de 0,2%

de toda a população, da época, entre 12 e 18 anos de idade no Brasil. Quanto ao cumprimento de

medida sócio-educativa, verificamos que entre os adolescentes, nove cumpriam medida sócio-

educativa de internação, isto é, tiveram sua sentença proferida pelo juiz e a cumprirão por período não

superior a três anos.

Segundo Volpi (2002), a internação deve ser destinada somente a adolescentes que cometem atos

infracionais graves. Embora o ECA enfatize os aspectos pedagógicos, tal medida ainda tem

conotações coercitivas e punitivas - a internação é um programa de privação de liberdade que implica

na contenção do adolescente autor de ato infracional a um sistema de segurança. A contenção em si

não é a medida, mas é a condição para que a mesma seja aplicada.

Dos adolescentes que cumpriam medida de internação, cinco estavam internados a menos de um ano,

fato demonstrado em pesquisas anteriores (VOLPI, 2001 e 2002). Entre os cinco adolescentes que

cumpriam internação provisória, um estava privado de liberdade a mais de seis meses, descumprindo o

que é estabelecido na lei. A internação provisória é aplicada ao adolescente que é apreendido pela

autoridade policial e encaminhado ao Ministério Público e tem, na forma da lei, decretada sua

internação provisória enquanto aguarda a sentença pronunciada pelo juiz da Infância e da Juventude

(VOLPI, 2002), o período máximo estabelecido pelo ECA, para esta internação, é de 45 dias.

42 Dados disponíveis em http://www.risolidaria.org.br/estatis/view_grafico.jsp?id=200503080025#tab2

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A reincidência em atos infracionais não faz parte do repertório da maioria dos adolescentes. Apenas

cinco informaram serem reincidentes, contudo estes atos são desconhecidos perante a justiça, dados

encontrados em pesquisas anteriores (VOLPI, 2001 e 2002).

4.4 Com a palavra: o Adolescente!

Às vezes eu acho que o mundo está parando e que eu estou em um sonho, mas você nunca sabe se o destino está brincando com você, às vezes você se apaixona, outras se zanga, mas a verdade é que você deve estar pronto para tudo na vida, seja o que for, seja a paixão ou a decepção, seja a vida ou a morte, seja a alegria ou a tristeza, mas o conselho que eu te dou é que viva bem a vida e aproveite bem ela, porque você nunca sabe se amanhã você morre ou continua vivendo (R.C.A. – 13 anos, Adolescente participante do Programa VivaNordeste). Quando pensava no futuro, de primeira eu queria ser policial ou professora. Quando comecei a me envolver nessas coisas (atos infracionais) eu achava que não ia conseguir, mas eu sei que tenho oportunidade, basta eu querer... eu vou conseguir (E. – 15 anos, Adolescente cumprindo medida sócio-educativa na CASE).

A percepção que o adolescente tem si é construída a partir das relações estabelecidas entre ele e o

meio no qual está inserido. Estas sofrem influência da família, amigos, pares, escola, comunidade e da

mídia. “Ao narrar as situações que vivencia, cada pessoa vai constituindo-se através das histórias que

ouviu e das que conta, frutos de seus engajamentos, suas relações e suas conexões com o mundo”

(CROSSLEY43 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.24).

Todos os adolescentes do VivaNordeste apresentaram percepção positiva de si mesmo. Entre os

adolescentes da CASE, 11 se descreveram através de elogios e características positivas e três

demonstraram percepção negativa de si mesmo, com críticas severas sobre si mesmo. Assis (1999)

destaca que, de modo geral, os adolescentes infratores apontam uma visão positiva sobre si mesmo,

diferindo do que é encontrado na literatura sobre a delinqüência. Para a autora, estes dados “nos

fazem perceber que a visão da sociedade sobre o adolescente que comete infração é muito distante da

que ele tem de si mesmo”.

Segundo Arpini (2003), o adolescente que vive em uma instituição carrega um forte estigma social, pois

as pessoas o julgam com detentor de algum problema.

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93

Segundo Assis et al (2003), atributos de sociabilidade também são importantes na adolescência, entre

as palavras que os exprimem estão: brincalhão, divertido, engraçado; palavras bastante utilizadas na

descrição de si mesmos pelos adolescentes do VivaNordeste.

Segundo pesquisadores sobre resiliência (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO,

2002), a resiliência é um atributo baseado na capacidade de possuir uma estima positiva, dispondo de

sentimentos e atitudes de aprovação de si mesmo, como uma pessoa capaz e de valor. De acordo com

COSTA (1997, p.101),

uma das características mais comuns dos adolescentes em dificuldades... é a enorme dificuldade que têm estes jovens na formação de um bom auto-conceito, base da auto-estima e da autoconfiança, sem as quais a tarefa de construir um projeto de vida torna-se muito difícil.

Quando questionados sobre como procuravam solucionar os problemas que surgiam em seu dia-a-dia,

os adolescentes citaram formas variadas de manejo, mas o destaque foi para a busca de pessoas ao

redor e o diálogo, com citação por 63% (10) dos adolescentes do VivaNordeste e 53% (8) da CASE.

Em sua maioria esta busca direcionou-se para a família, na figura da mãe, conforme verificado em

pesquisa anterior (ASSIS, 1999). Uma das características que apontam existência de potencial de

resiliência é quanto à competência para resolver problemas, a capacidade de buscar alternativas e

apoio quando uma saída não é encontrada (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; GROTBER, 1998;

GRUNSPUN, 2006; PINHEIRO, 2004; TROMBETA e GUZZO, 2002).

O apoio social é, segundo Assis, Pesce e Avanci (2006), essencial para a estruturação do adolescente.

Este pode existir na forma afetiva, emocional e de aconselhamento. O apoio emocional se expressa na

existência de pessoas que estão dispostas a ouvir; o aconselhamento é a ajuda sugere formas de

como lidar com os problemas. De acordo com as autoras, os adolescentes mais resilientes buscam

ajuda e apoio de pessoas, enquanto os menos resilientes, embora reconheçam o apoio social,

preferem guardar seus problemas para si ao invés de dividi-los.

43 CROSSLEY, M.L. Introducing narrative psychology: self, trauma and the construction of meaning. Buckingham: Open University Press, 2000.

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94

Em nossa amostra isto pode ser caracterizado nas respostas de descontrole, emitidas por 7% (1) os

adolescentes da CASE e 6% (1) do VivaNordeste. O autocontrole citado por 33% (5) dos adolescentes

da CASE e por 19% (3) do VivaNordeste, envolve a busca de recursos internos no manejo de

problemas e pode caracterizar esta dificuldade em buscar apoio, demonstrando que os adolescentes

privados de liberdade utilizam mais esta estratégia que os participantes do programa social. Isto deve

ser considerado, já que as instituições voltadas às medidas sócio-educativas têm por uma das

finalidades proporcionar apoio social, emocional e psicológico a estes adolescentes.

Fazer-se presente na vida do educando é o dado fundamental da ação educativa dirigida ao adolescente em situação de dificuldade pessoal e social. A presença é o conceito central, o instrumento-chave e o objetivo maior (COSTA, 1997, p.23).

A religiosidade é citada por 7% (1) dos adolescentes da CASE e 6% (1) do VivaNordeste como busca

de apoio para a solução de problemas. Macedo44 (apud ASSIS, 1997, p101), reconhece a importância

da religiosidade em situações de crise, ao afirmar: “Nos momentos em que a vida mais parece

ameaçada, o apelo religioso se torna mais forte”.

O relacionamento com seus familiares e com amigos, embora não seja, isoladamente, fator associado

à resiliência, é um mecanismo importante de proteção na vida do adolescente, “a qualidade da

representação que os adolescentes fazem da relação com os pais distingue-se segundo o potencial de

resiliência de cada um” (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, P.71). Segundo as autoras, as relações de

amizade “contribuem para sua competência social... favorecem a capacidade de enfrentar

positivamente as transformações do ambiente” (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.81).

Com relação aos objetivos para o futuro, os resultados se aproximam aos encontrados em pesquisas

anteriores (ASSIS, 1999; SANTOS; 2000). Os adolescentes citaram, em sua maioria, mais de um

objetivo, sendo que trabalhar foi o mais citado (35% (12) da CASE e 31% (13) do VivaNordeste). Este

objetivo, contudo, estava atrelado a outros como mudar de vida ou local de moradia (15% (5) da CASE

e 12% (5) do VivaNordeste), ajudar os familiares (citado por 12% (4) dos adolescentes da CASE e 14%

(6) do VivaNordeste) e ter uma casa e construir uma família. O estudo, citado por 21% (7) dos

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adolescentes da CASE e 29% (12) do VivaNordeste, surge como uma necessidade para se conseguir

outros objetivos, como o próprio trabalho e as mudanças por ele proporcionadas (OZELLA, 2002).

Dois objetivos citados chamaram a atenção quanto à diferença entre os dois grupos. O primeiro é

relativo a ter uma casa e constituir família, citado por 7% (3) dos adolescentes do VivaNordeste e por

18% (6) dos da CASE. Pudemos inferir que na fala dos adolescentes privados de liberdade este

objetivo fosse compatível com o socialmente desejado para um adulto, ou ainda que entre os

adolescentes do VivaNordeste os objetivos pessoais e individuais se sobressaíssem em relação aos

objetivos coletivos, dado encontrado no objetivo de viajar, com objetivo de estudar ou conhecer novos

lugares, citado por 7% (3) destes adolescentes. Estas aspirações, estes planos para o futuro são,

muitas vezes, superiores ao que as condições reais lhes oferecem. São ricos e abrangentes, mas

alicerçados na fantasia característica da adolescência (ASSIS, 1999; SANTOS, 2000). Estas

aspirações são saudáveis do ponto de vista da resiliência, já que o propósito de futuro e o otimismo em

relação às oportunidades e ao sucesso, são características que denotam resiliência (GROTBER, 1998;

GRUNSPUN, 2006; PINHEIRO, 2004; TROMBETA e GUZZO, 2002).

4.5 O adolescente sob o olhar de uma técnica projetiva

Segundo diversos autores (ABERATURY e KNOVEL, 1981; AYRES, 2006; NASCIMENTO, 1999;

OZELLA, 2002), a adolescência é uma fase de transição repleta de mudanças físicas, sexuais,

cognitivas e afetivas, que trazem consigo algumas desequilíbrios e instabilidades, geradores de

confusão e dor; é uma fase marcada pela aquisição de novos valores, novas representações de si

mesmo e do outro, necessários para a formação da identidade. Este processo é marcado por rebeldia,

instabilidade de afetos, tendência grupal, crises religiosas, emocionais e sexuais, pela necessidade de

fantasiar, flutuações de humor e crises de identidade. Segundo Assis, Pesce e Avanci (2006), a visão

44 MACEDO, C. Imagem do Eterno: religiões no Brasil. São Paulo: Moderna, 1989.

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96

de si mesmo é construída através da interação deste adolescente com seus conteúdos internos e com

as influências externas, impostas pelo contexto no qual ele está inserido.

Buscou-se, através da análise de um teste projetivo, com base nos campos utilizados, no conteúdo dos

desenhos, linhas e traços, conhecer a personalidade em formação dos adolescentes pesquisados, bem

como a existência de traços indicadores de potencial de resiliência nesta personalidade.

4.5.1 A formação da identidade

Quanto à formação do ego, o modo do adolescente lidar com seus sentimentos e fatos para estruturar

sua identidade, não se notou diferença nos resultados entre os adolescentes dos dois grupos. Sete de

cada grupo tinham o ego formado através da experiência de sentimentos e fatos, isto é, o indivíduo

experenciou os acontecimentos, sentindo-os, formando seus valores a partir da reflexão estimulada por

estes sentimentos. Cinco adolescentes formaram seu ego baseados na conceituação dos fatos e

sentimento, utilizaram-se mais do pensamento e da razão do que da afetividade para se orientar e

compreender o mundo. Dois deles, de cada grupo, tiveram o ego formado pela reflexão de dois pontos

de vistas de referência. Vale ressaltar que o ego em adolescentes ainda encontra-se em formação, não

podendo afirmar que este resultado tem teor de estabilidade, a construção de identidade está em

constante embate entre o si mesmo e o outro (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; AYRES, 2006).

A dificuldade em fortalecer o ego e lidar com si mesmo é uma das características da adolescência, já

que o indivíduo se descobre entre a situação de ser criança e ser adulto (MIRA Y LOPES, 1980;

PIAGET, 1998). Esta dificuldade não é encontrada, de forma contundente, nos adolescentes

participantes da pesquisa. Dos quais, 13 do VivaNordeste e 10 da CASE não apresentaram tal

dificuldade, o que poderia estar associado à necessidade de desenvolver-se mais rapidamente em

virtude do contexto no qual estes adolescentes estavam inseridos, contexto repleto de desigualdades e

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97

dificuldades, que altera os comportamentos típicos do adolescente em formação (AYRES, 2006;

NASCIMENTO, 1999; OZELLA, 2002).

A construção da consciência dos valores que irão orientar a conduta do adolescente faz parte do seu

processo de desenvolvimento e esta consciência é adquirida através do relacionamento com o meio

(RAPPAPORT, 1981). Entre os adolescentes pesquisados verificou-se que mais que 50%, nove na

CASE e oito no VivaNordeste apresentavam maior consciência destes valores, contudo seis

adolescentes do VivaNordeste e quatro da CASE, denotavam pouca consciência e um da CASE

demonstrava incoerência destes valores. Baseando-se na literatura pesquisada, esta consciência está

em formação durante a adolescência e o fato da maioria dos adolescentes já a possuírem também

pode estar relacionado ao contexto ao qual pertencem. Com relação à diferença entre o resultados dos

adolescentes da CASE e do VivaNordeste, embora não significativa, pode estar relacionada à idade

dos adolescentes do VivaNordeste que é, em média, inferior ao da CASE.

A autoconfiança é a capacidade de depender mais de si mesmo do que de outra pessoa, sentindo que

pode lidar com situações difíceis, de forma apta (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006). E se origina das

relações externas estáveis (RAPPAPORT, 1981). Entre os adolescentes pesquisados, os conteúdos

relativos à falta de confiança em si mesmo e insegurança ao relacionar-se, tiveram um percentual de

60% (26) na CASE e 40% (21) do VivaNordeste. O sentimento de confiança em si mesmo é um

indicador de potencial de resiliência, denotando confiança em sua própria ação para a construção da

vida. A autoconfiança tem sido vista como um importante fator de superação de obstáculos. Seu

desenvolvimento relaciona-se ao encorajamento recebido pelo indivíduo de sua família e apoio social

(ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Os resultados da análise de conteúdo relativo à autoconfiança, demonstraram que adolescentes da

CASE tinham maior índice de conteúdos que indicavam falta de confiança e insegurança ao relacionar-

se, que somados ao excesso de autoconfiança com teor negativo, totalizaram 72% (31) contra apenas

12% (5) de conteúdos indicando confiança em si mesmo. Entre os adolescentes do VivaNordeste a

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98

confiança em si mesmo é percebida em 25% (13) dos conteúdos desenhados pelos jovens. Quando à

necessidade de reconhecimento e auto-realização, esta faz parte desta fase de desenvolvimento, onde

o adolescente quer ser reconhecido pelo que faz e quer realizar-se através de suas próprias ações

(ASSIS et al, 2003; NASCIMENTO, 1999; PIAGET, 1998). Nota-se maior incidência desta característica

entre os adolescentes do VivaNordeste, sendo que apresentaram 28% (15) destes conteúdos, em

relação aos da CASE, que foi de 16% (7). As diferenças encontradas entre os adolescentes da CASE e

do VivaNordeste, puderam indicar o sentimento de exclusão ao qual os adolescentes da CASE foram

expostos quando isolados no interior deste sistema, o que os distanciou da necessidade de sentir-se

reconhecidos e, portanto, diminuiu sua busca por auto-realização (VOLPI, 2001), em contradição ao

encorajamento recebido pelos adolescentes do VivaNordeste pela sua rede de apoio social.

4.5.2 Lidando com conteúdos internos

Segundo Piaget (1998), o adolescente ultrapassa o real, e seu pensamento assume a forma de uma

hierarquia de valores afetivos, em detrimento dos sistemas teóricos e práticos. Isto parece refletido nos

resultados relativos ao manejo da afetividade, já que a maioria dos adolescentes, tanto da CASE (9)

como do VivaNordeste (11) reagem afetivamente às situações, embora também demonstrem pouca

consciência do papel da afetividade em sua vida, consciência esta ligada ao seu processo de

desenvolvimento.

A vida afetiva na adolescência se firma através da conquista da personalidade e da inserção na

sociedade adulta (PIAGET, 1998). A qualidade afetiva é indicador de adolescentes com potencial de

resilência (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006). Contudo, a dificuldade em lidar com a afetividade,

encontrada com base nos conteúdos desenhados, é o retrato da instabilidade dos afetos, característica

da adolescência (ABERASTURY e KNOBEL, 1981; AYRES, 2006), e esta dificuldade se apresentou

em 71% (24) dos conteúdos desenhados pelos adolescentes da CASE e do VivaNordeste. Os

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99

conteúdos indicadores de afetividade sentida de forma negativa e a fluência da afetividade maior com a

natureza que com seres vivos, entre os adolescentes da CASE totalizou 39% (13), resultado que pode

estar relacionado ao pouco contato afetivo estabelecidos por estes, com as pessoas que os cercam, e

aos sentimentos de desvinculação, solidão, isolamento que permeiam seus relacionamentos (COSTA,

1997).

4.5.3 Encarando metas e obstáculos

A forma de lidar com metas e com os obstáculos à sua concretização, bem como as expectativas

saudáveis, demonstram o potencial de resiliência. Adolescentes menos resilientes demonstram

sentimentos de menor força para superar obstáculos (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e

GUZZO, 2002).

Diante dos resultados, verificou-se que todos os adolescentes do VivaNordeste apresentaram

dificuldades ao traçar suas metas. Entre estes, 50% (7) demonstraram falta de objetividade, 36% (5)

expectativa pessimista e sentimento de impotência frente à realização da metas e 14% (2),

preocupação em não perder o que já possui na busca por outras aspirações. Na CASE esta dificuldade

se apresentou em 80% (8) dos adolescentes, sendo que 60% (6) demonstraram falta de empenho e

objetividade e 20% (2) apresentaram expectativa pessimista. Contudo, 20% (2) destes adolescentes

demonstraram direcionamento de seus recursos para atingir metas e objetivos, característica dos

resilientes (GROTBER, 1998; GRUNSPUN, 2006; PINHEIRO, 2004; TROMBETA e GUZZO, 2002).

A mobilização de energia, a vitalidade, empregadas na superação de obstáculos é um indicador de

resiliência; estratégias ativas de enfrentamento dos problemas são relatadas com maior freqüência por

adolescentes resilientes (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, TROMBETA e GUZZO, 2002).

Notou-se, entre os adolescentes pesquisados, pouca vitalidade entre 29% (4) dos adolescentes da

CASE e 14% (2) do VivaNordeste. Quanto à mobilização de energia com canalização inadequada, o

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100

índice é maior entre os adolescentes do VivaNordeste 79% (11) contra 50% (7) da CASE. Já a

facilidade de canalização desta energia foi maior entre os adolescentes da CASE, 29% (4) em relação

aos do VivaNordeste 7% (1). Diferenças que podem estar relacionadas à idade que era, em média,

inferior entre os sujeitos do VivaNordeste, já que a inadequação da canalização desta energia

relaciona-se às incertezas próprias da idade - o adolescente ainda não tem certeza de onde quer

chegar e quais obstáculos pretende transpor, ou não, para atingir seus objetivos (AYRES, 2006;

NASCIMENTO, 1999, PIAGET, 1998). Esta fase é um período de grandes sonhos e aspirações, mas

nem sempre realistas, sendo a possibilidade mais importante que a realidade (AYRES, 2006; PIAGET,

1998).

Segundo algumas autoras (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002), o modo

como pessoas encaram seus obstáculos varia de pessoa para pessoa e em diferentes situações,

porém compreender como as pessoas agem diante a barreiras e situações de impasse é tema

relevante para indicar potencial de resiliência. Este modo de lidar com as adversidades são chamados

de estratégias de coping, que são o enfrentamento direto e ativo das dificuldades, as estratégias

internas de reflexão sobre os problemas e a formas de evitação envolvidas neste confronto.

Entre os adolescentes da CASE, 72% (13) utilizaram-se de estratégias de evitação e passividade,

sendo que 44% (8) agiam sem modificar as situações que geraram impasses, denotando uma atitude

passiva diante das barreiras, 17% (3) evitavam tais situações e 11% (2) adiavam as soluções quando

frente a barreiras e dificuldades. Contudo, 28% (5) dos adolescentes agiam de forma positiva frente aos

obstáculos, sendo que 22% (4) buscavam entender os motivos geradores destas situações e 6% (1)

utilizavam-se da reflexão frente a situações de impasse, modelos utilizados pelas pessoas com alto

potencial de resiliência, significando que estas tomaram atitudes concretas cujo objetivo é procurar a

fonte do problema e tentar solucioná-lo (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Entre os adolescentes do VivaNordeste, 29% (8) apresentam modelo positivo de ação, sendo que 4%

(1) buscavam entender os motivos geradores de tais situações, 7% (2) utilizavam-se da reflexão e 18%

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101

(5) iam além das dificuldades buscando superá-las, característica mais relevante ao tratar-se de

resiliência. Entretanto, 71% (20) dos adolescentes demonstraram modelos de evitação e passividade,

sendo que 21% (6) agiam sem modificar situações de impasse, 36% (10) evitavam tais situações e

14% (4) adiavam soluções quando diante de dificuldades ou barreiras. Em sua maioria - cerca de 70%

(20) de ambos os grupos - os adolescentes não demonstraram estratégias que denotassem potencial

de resiliência.

As condições sociais, as dificuldades econômicas e suas conseqüências sobre a inserção social e

profissional de grande parcela da população, são importantes barreiras à ambição de jovens e

adolescentes, pois são nesta fase que se intensificam os projetos de vida e o desenvolvimento de

estratégias e ações par que sonhos se transformem em realidade (ROCHA, 2002).

Os adolescentes pesquisados, nos dois grupos, denotaram pouca ou nenhuma ambição, e os dois

sujeitos que apresentaram traços de muita ambição são adolescentes do VivaNordeste,

Os projetos de vida dos adolescentes entrevistados refletem a forma como interpretam o futuro, a partir dos acontecimentos do presente... os jovens de baixa renda... evidenciaram aspirações restritas... e limitadas pela posição social que são obrigados a assumir desde o nascimento (ASSIS, 1999, P.89).

Segundo Assis, Pesce, Avanci (2006) e Trombeta e Guzzo (2002), adolescentes com potencial de

resiliência tendem a enfrentar as situações de forma mais realista, buscando alternativas diante das

dificuldades para concretizar suas idéias; o desânimo, a emotividade exacerbada, são características

marcantes em jovens menos resilientes.

4.5.4 O ato de relacionar-se

A adolescência é marcada pela descoberta da sexualidade e por todas as inquietações que este tema

carrega, o adolescente passa a questionar o modelo dado pela estrutura familiar e se abre para novas

experiências (ABERASTURY e KNOBEL, 1981; RAPPAPORT, 1981). Entre os adolescentes

pesquisados, houve um equilíbrio quanto à forma de lidar com a sexualidade e a sensualidade.

Entretanto, 22 dos 28 adolescentes pesquisados nos dois grupos têm sua afetividade ou racionalização

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102

ligada à sensualidade, esta envolve o comportamento sutil, leve e terno entre duas pessoas. Em seis

adolescentes da CASE e sete do VivaNordeste a sensualidade é manejada pela afetividade, enquanto

quatro adolescentes da CASE e cinco do VivaNordeste racionalizavam esta afetividade ligada à

sensualidade. No entanto, apenas seis adolescentes estão mais voltados à sexualidade, que está

ligada ao envolvimento que necessita de estimulações mais evidentes, como a visual, auditiva e tátil,

para que ocorra a atração. Dois adolescentes da CASE e dois do VivaNordeste manejavam a

sexualidade através da afetividade e dois da CASE racionalizavam esta afetividade. Esta é uma

característica da adolescência - a busca de descobrir a sexualidade, muitas vezes através da

sensualidade, mantendo contatos afetivos antes dos contatos sexuais.

Ao analisar os resultados sobre a repressão da sexualidade/sensualidade e a integração da

sexualidade/sensualidade à personalidade, verificou-se que entre os adolescentes, nove da CASE

reprimiram e apresentaram dificuldade de integração da sexualidade/sensualidade, enquanto que

apenas dois do VivaNordeste apresentaram repressão e um dificuldade de integração. Esta repressão

dos adolescentes privados de liberdade pode estar associada à sua condição de interno, tendo sido

afastados do convívio social e limitados na expressão de sua sexualidade. Em pesquisa anterior,

apenas 13% dos adolescentes informaram relacionar-se sexualmente (VOLPI, 2001).

Tendo por base que a adolescência é o auge da sexualidade e o como lidar com esta fase moldará a

sexualidade adulta, a repressão sexual pode ser um indicador de dificuldades futuras. A sexualidade

por si só não é fator considerado quando se trata de resiliência, mas envolver aspectos afetivos e

emocionais ligados aos seus pares, que são fundamentais para o desenvolvimento da mesma (ASSIS,

PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002).

Os adolescentes têm necessidade de pertencer a um grupo e de sentirem-se protegidos, e esta

depende das possibilidades que são oferecidas pelo ambiente que os cercam que será de fundamental

importância para a pontecialização de resiliência (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; VILLARREAL45

45 VILARREAL, I. Prólogo. In CARVAJAL, G. Tornar-se adolescente: a aventura de uma metamorfose – uma visão psicanalítica da adolescência. São Paulo: Cortez, 1998.

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103

apud ASSIS, 1999; AYRES, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002). Entre os adolescentes pesquisados,

44% (11) do VivaNordeste e 39% (9) da CASE demonstraram necessidade de receber apoio e

proteção do grupo; 30% (7) da CASE e 32% (8) do VivaNordeste apresentaram interação através dos

sentimentos. No VivaNordeste 16% (4) denotaram racionalizar a afetividade, exercendo a troca através

de conceitos enquanto na CASE este número foi de 22% (5); 8% (2) dos adolescentes do

VivaNordeste e 9% (2) da CASE apresentaram o sentimento de estar sendo julgados.

A interação grupal é característica de jovens resilientes. O relacionamento interpessoal, a troca afetiva,

fazem parte de atributos de sociabilidade necessários ao desenvolvimento da resiliência (ASSIS et al,

2003; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002). Esta interação com o grupo,

entre os adolescentes da CASE, ocorre de forma moderada para quatro, com grande interação e busca

de troca ampla e afetiva para seis e quatro apresentam dificuldade de interação. No VivaNordeste,

apenas um adolescente apresentou tal dificuldade, sendo que cinco interagem de forma ampla e

afetiva e oito interagem com moderação. A dificuldade de interação grupo pode denotar baixo potencial

de resiliência. Este dado é corroborado pelos resultados encontrados em conteúdos desenhados por

alguns adolescentes (8 de cada grupo), que indicaram que 75% (6) dos adolescentes da CASE e

apenas 25% (2) no VivaNordeste, apresentaram dificuldade em relacionar-se.

Segundo Volpi (2001), os indivíduos privados de liberdade se inserem em um conjunto de normas e

valores que se desconfiguram com a realidade social, ele se torna alienado dos acontecimentos

sociais. Contudo, no período da adolescência a identificação com um grupo e o fato de relacionar-se é

extremamente importante para a formação e o desenvolvimento do processo de socialização e do

potencial de resiliência (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002; VOLPI, 2001).

Ao verificar-se a afinidade com o relacionamento humano e, portanto, com seres vivos, nos sujeitos

pesquisados na CASE, notou-se que 93% (13) dos adolescentes apresentaram pouca ou nenhuma

afinidade. No VivaNordeste, este resultado foi mais equilibrado, sendo que 57% (8) apresentaram

afinidade com o relacionamento humano.

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104

A facilidade de relacionar-se com as pessoas e de se preocupar com o outro parece ser uma marca de

jovens resilientes (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002). Os jovens

envolvidos em atos infracionais e privados de liberdade demonstram falta de confiança no outro,

primeiro junto aos parceiros e depois junto às pessoas envolvidas na sua institucionalização, o que

conduz a certo distanciamento de relacionamentos (ASSIS, 1999; VOLPI, 2001).

A dependência da conduta social e comprometimento com valores apareceram em 71% (10) dos

adolescentes do VivaNordeste e 43% (6) da CASE, enquanto o respeito a normas, porém de forma

crítica foi demonstrado por 36% (5) adolescentes da CASE e por 29% (4) do VivaNordeste.

Os atributos de valores e condutas socialmente aceitas é um indicador de potencial de socialização e

resiliência (ASSIS et al, 2003; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO, 2002). Alguns

autores defendem o ato infracional como uma forma de resiliência diante das adversidades impostas a

estes jovens. Embora não seja tarefa fácil pensar a relação entre resiliência e cometimento de ato

infracional, temos que refletir sobre em que medida “o fato de sucumbir ao mundo da criminalidade foi

em si um gesto de resiliência” (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.110), uma vez que uma das

características de indivíduos resilientes pode ser, justamente, a menor receptividade social. Esta foi

apresentada por 21% (3) dos adolescentes da CASE, que perceberam as normas sociais muito

distantes de sua realidade, conforme encontrado em pesquisa realizada anteriormente (VOLPI, 2001).

Entre os adolescentes do VivaNordeste, sete apresentaram interesse em ser compreendido ao

comunicar-se e sete se mostraram mais voltados para si mesmo, sem preocupar-se com o outro. Esta

é uma dicotomia típica da adolescência, quando o indivíduo está entre o egocentrismo e os

sentimentos de generosidade para com o outro (PIAGET, 1998). Entre os adolescentes da CASE, 10

demonstraram interesse em ser compreendido ao comunicar-se e apenas quatro se voltavam para si.

Este resultado pôde indicar que os adolescentes privados de liberdade apresentaram a necessidade de

falar e ser ouvido (VOLPI, 2001), e que o cometimento do ato infracional pode ter sido uma forma

encontrada de gritar sua necessidade de apoio, proteção, sentimentos de medo, inadequação, tão

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105

característicos da adolescência e que só são supridos por uma rede de apoio social bem elaborada e

bem percebida por estes adolescentes (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; TROMBETA e GUZZO,

2002).

4.5.5 O adolescente e o ato de escolher

O agir de acordo com suas próprias escolhas é característico da adolescência, contudo pode ser um

indicador de confiança em si próprio. Ao fazer suas escolhas, o adolescente busca experimentar novos

desafios, conhecer o mundo que o cerca, descobrir novos problemas e soluções (ABERASTURY e

KNOBEL, 1981; MIRA Y LOPES, 1980). Entre os adolescentes do VivaNordeste, 11 apresentaram

flexibilidade e escolhas próprias e três demonstraram agir de forma oposicionista ao meio,

característica também desta fase de desenvolvimento. Contudo, na CASE, apenas seis adolescentes

demonstraram comportamento de escolhas próprias e um de ação oposicionista, sendo que seis

demonstraram seguir regras e métodos externos. Este resultado pode indicar a dificuldade em colocar

seus próprios desejos e imposição de esquemas externos dados pela instituição, que muitas vezes, ao

contrário de auxiliar no desenvolvimento destes adolescentes, os tornaram socializados de acordo com

normas e valores que de pouco interesse a estes (COSTA, 1997; VOLPI, 2001 e 2002).

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106

5 CONCLUSÃO

Com base nos dados levantados, verificou-se a existência de características relativas ao potencial de

resiliência nos adolescentes de ambos os grupos, contudo estas foram predominantes, em certos

aspectos, nos adolescentes participantes do Programa VivaNordeste. Outra hipótese confirmada foi a

existência de traços relativos à fase do desenvolvimento do qual fazem parte os sujeitos da pesquisa: a

adolescência.

No entanto, com relação aos dados sócio-demográficos apresentados pelos dois grupos, concluiu-se

que estes eram diferentes e que alguns aspectos funcionavam como fatores de proteção aos

adolescentes do VivaNordeste. A escolaridade foi o primeiro item que apresentou diferença, entre os

adolescentes do VivaNordeste, o grau escolar estava de acordo com a idade dos sujeitos, enquanto na

CASE verificou-se uma defasagem escolar, anterior à privação de liberdade e que é por esta reforçada,

já que a instituição não apresentava a estrutura ideal para atender a todos os graus de escolarização.

A participação dos jovens em atividades sócio-educativas foi outro ponto de divergência entre os

grupos, embora ambos participassem, os adolescentes do VivaNordeste apresentaram uma

diversidade de atividades, incluindo projetos profissionalizantes (voltados ao mercado atual de

trabalho), desportivos (com várias práticas esportivas) e culturais. Atividades estas que funcionavam

como mecanismos protetores, pois auxiliavam a interação destes jovens com o grupo social,

aumentando a autoconfiança, a auto-estima, trazendo, a estes adolescentes, um sentido de futuro, com

a esperança de mudar o rumo de suas vidas (ASSIS et al, 2003).

A defasagem escolar e a pouca participação em atividades sociais e desportivas, encontradas entre os

adolescentes da CASE, somadas a outros fatores delineados como de risco (ASSIS, 1999; ASSIS et al,

2006; CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA, 2001; GROTBERG, 1998), como o pouco envolvimento

religioso; a necessidade de trabalhar para auxiliar na renda familiar, explicitada pela maioria dos jovens

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107

da CASE, fator que contribui para a defasagem escolar; a violência a que foram expostos; o

envolvimento com substâncias psicoativas durante a infância e a adolescência, os conflitos familiares;

estes fatores expõem estes sujeitos a certo grau de vulnerabilidade que pode dificultar a

potencialização da resiliência.

Outros fatores que apresentaram diferenças de resultado entre os grupos se referem ao modelo

familiar, incluindo a responsabilidade pelo sustento, e à quantidade de irmãos, fatores que, não

isoladamente, são considerados de proteção ou risco. Entre os adolescentes do VivaNordeste o

modelo familiar predominante foi da família nuclear (pai, mãe e irmãos), com menor quantidade de

irmãos e o sustento sendo responsabilidade de ambos os pais, fatores que embora não possam ser

considerados ideais, tendem a diminuir a fragilidade familiar e a vulnerabilidade pessoal e social dos

jovens (ASSIS, 1999; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; CRUZ NETO, MOREIRA e SUCENA, 2001).

Segundo Assis (1999), a estrutura bem como as relações familiares é apontada como de grande

influência sobre as escolhas juvenis, mas tal estrutura também sofre influência da comunidade, das

relações de trabalho, da realidade econômica e da sociedade na qual está inserida.

Nos resultados levantados não foi possível confirmar os dados apresentados por pesquisas anteriores

(RUTTER46 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; ASSIS, 1999), sobre a influência do uso de

substâncias psicoativas ou participação de familiares em atos infracionais como sendo fatores de risco

para os adolescentes, já que não houve, nesta pesquisa, relação entre estes fatores e as condutas

anti-sociais dos sujeitos pesquisados. Resultado este que pode estar atrelado ao tamanho da amostra,

que foi inferior às pesquisas anteriores.

Alguns pontos foram ainda divergentes entre os grupos, estes se referiam ao discurso apresentado

pelos sujeitos, quanto à percepção de si mesmos, ao modo de lidar e enfrentar dificuldades e às

expectativas com relação ao futuro. Contudo estes fatores estão diretamente relacionados, ao apoio

social recebido e, principalmente, percebido por estes adolescentes. Entre os participantes do

46 RUTTER, M. Stress, coping and development: some issues and some questions. Journal of Child Psychology and Psychiatry, v.22, n.4, p.323-356, 1981.

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108

VivaNordeste verificou-se uma visão positiva de si mesmo na totalidade dos jovens; o manejo de

problemas apresentou-se neste grupo, em sua maioria, através da busca de apoio e diálogo, o que

confirma a percepção do grupo do apoio externo, fator de proteção e potencializador de resiliência.

Percepção esta que os auxiliam na construção de sua perspectiva de futuro, que entre os adolescentes

do VivaNordeste ultrapassam a sua própria realidade (ASSIS, 1999; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006;

GROTBER, 1998; GRUNSPUN, 2006; PINHEIRO, 2004; TROMBETA e GUZZO, 2002).

O que se produzir – casa habitável ou ruína estéril – será a soma do que pensaram e pensamos de nós, do quanto nos amaram e nos amamos, do que nos fizeram pensar que valemos e do que fizemos para confirmar ou mudar isso... (LUFT47 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.62).

Vale ressaltar que a privação de liberdade tem por objetivo auxiliar adolescentes na construção de sua

realidade, através de apoio social e educacional (COSTA, 1997; VOLPI, 2001 e 2002), contudo, através

desta pesquisa pôde-se verificar a dificuldade em se atingir este objetivo, por parte da instituição, dado

que merece novas investigações visando criar mecanismos que realmente protejam estes

adolescentes, cumprindo as medidas implantadas pelo ECA.

Quando os fatores analisados passam a se referir aos recursos internos dos adolescentes

pesquisados, os resultados não se mostraram tão divergentes entre os dois grupos, o que levou à

conclusão de que com relação a estes recursos, os jovens da CASE e do VivaNordeste apresentaram

fatores de risco e proteção comuns, bem como quando o tema estava relacionado aos traços de

personalidade comuns à adolescência.

A formação da identidade, a consciência dos valores orientadores da conduta, as estratégias diante de

situações de impasse, a necessidade de sentir-se protegido, foram características que se

apresentaram de forma semelhante entre os adolescentes dos dois grupos. Estas fazem parte da

estruturação da personalidade típica desta fase do desenvolvimento, onde os sujeitos buscam construir

sua própria identidade, se fortalecer diante do mundo, utilizando-se dos valores apreendidos, e

revistos. Momento em que o impasse é parte necessária ao crescimento e, a busca da independência,

se equilibra com a necessidade de proteção do meio ao qual o jovem se insere, fator importante na sua

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109

preparação para encarar novos desafios (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; AYRES, 2006; MIRA Y

LOPES, 1980; PIAGET, 1998).

Quanto à dificuldade em fortalecer o ego e lidar com si mesmo, também característica desta fase de

desenvolvimento, não se mostrou presente entre os sujeitos pesquisados. Fator que pode estar

associado ao conjunto de dificuldades e desigualdades da realidade destes jovens e que alteram os

comportamentos característicos desta fase, já que seus membros precisam se desenvolver de forma a

lidar melhor com o contexto que os cercam (AYRES, 2006; NASCIMENTO, 1999; OZELLA, 2002).

As principais diferenças encontradas entre os dois grupos de adolescentes envolvem autoconfiança,

mobilização de recursos ao traçar metas e enfrentar obstáculos, afetividade e relacionamento

interpessoal, conduta social e comprometimento com valores, comunicação e ação diante de suas

escolhas. Todos os fatores estão relacionados ao potencial de resiliência, e são desenvolvidos através

do apoio externo que envolve estes adolescentes (ASSIS, 1999; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006;

GROTBER, 1998; GRUNSPUN, 2006; PINHEIRO, 2004; TROMBETA e GUZZO, 2002), quanto mais a

realidade oferece fronteiras tranqüilizadoras, significativas e objetivas, mais seguros sentem-se os

jovens para explorar de forma autônoma o espaço que os cerca (FERRARIS, 2005).

Entre os adolescentes do VivaNordeste constatou-se maior índice de autoconfiança e flexibilidade e

escolhas próprias; enquanto adolescentes da CASE demonstraram maior índice de falta de confiança

em si mesmos e insegurança, menor necessidade de reconhecimento e realização e maior acolhimento

à regras e métodos externos, em detrimento de suas próprias escolhas. No entanto confiança, busca

de reconhecimento e escolhas próprias são características da adolescência e estão associadas às

relações externas estabelecidas de forma positiva (ASSIS et al, 2003; NASCIMENTO, 1999; PIAGET,

1998); portanto, as dificuldades apresentadas podem estar associadas ao sentimento de exclusão e de

distanciamento da realidade ao qual estão expostos os adolescentes da CASE, devido, não apenas à

privação de liberdade, mas principalmente, ao estigma social imposto, que transforma o ato infracional

cometido em história de vida deste sujeito (COSTA, 1997; VOLPI, 2001).

47 LUFT, Lia. Perdas e ganhos. Rio de Janeiro: Record, 2004.

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110

Contudo, nestes adolescentes, a mobilização de recursos e energia para atingir objetivos e superar

obstáculos; recursos internos que os tornam menos vulneráveis, aumentando seu potencial de

superação frente às adversidades, se mostraram maior. Este resultado pode ter sofrido influência da

diferença de idade entre os sujeitos dos dois grupos, já que a média de idade dos adolescentes do

VivaNordeste foi inferior aos da CASE e esta inadequação é parte da incerteza desta fase de

desenvolvimento (AYRES, 2006; NASCIMENTO, 1999; PIAGET, 1998). Porém, vale destacar, que

diante da realidade infracional, os adolescentes muitas vezes precisam lidar com adversidades

constantes e precisam desenvolver estratégias internas de enfrentamento, visando superá-las.

O relacionamento humano, que envolve afetividade, sexualidade, preocupação com o comunicar-se, o

interesse pelo ser humano, e a conduta social, apresentou resultados diferentes entre os dois grupos,

sendo que estes traços tiveram índices mais positivos nos adolescentes do VivaNordeste. A dificuldade

de relacionar-se e de interagir com o grupo, a repressão da sexualidade/sensualidade e sua não

integração à personalidade, bem como a pouca afinidade com o relacionamento humano, bem como o

pouco comprometimento com valores e conduta social, foram encontradas entre os adolescentes da

CASE. Fatores considerados de risco, já que o envolvimento afetivo, bem como a facilidade de

relacionamento e valores e condutas aceitas socialmente, são características ligadas à socialização e,

portanto, ao potencial de resiliência (ASSIS et al, 2003; ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006; GROTBER,

1998; GRUNSPUN, 2006; PINHEIRO, 2004; TROMBETA e GUZZO, 2002).

No entanto, o interesse em ser compreendido ao comunicar-se se apresentou em maior grau entre os

adolescentes privados de liberdade, chamando a atenção para a possibilidade de se olhar o ato

infracional como um pedido de socorro, como a única forma que este adolescente encontrou de pedir

apoio, proteção e reconhecimento, necessidades típicas do adolescer (ASSIS, PESCE e AVANCI,

2006; VOLPI, 2001).

O grupo está determinado a se fazer ouvir, mesmo que com violência, atitude que assume valor de linguagem e de advertência... Os adolescentes são excelentes reveladores das disfunções dos adultos: exacerbam seus defeitos, incertezas e insucessos (FERRARIS, 2005).

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111

Segundo Pinheiro (2004), diversos fatores e processos precisam ser estudados quando se trata o tema

resiliência, contudo, a capacidade de se relacionar, de ter expectativas e projetos de vida, denota

habilidades necessárias diante das adversidades. Esta pesquisa buscou levantar estas características

em adolescentes de grupos diferentes, mas cujo contexto de dificuldades e desigualdades faz parte de

suas histórias; este objetivo, embora com limitações, foi alcançado.

Contudo se fazem necessárias novas pesquisas que possam aprofundar os resultados obtidos, visando

criar ambientes que potencializem os recursos internos destes adolescentes, com vistas ao

desenvolvimento de resiliência. Os estudos sobre resiliência devem enfatizar a promoção de processos

educativos e de convivência que auxiliem as pessoas no enfrentamento das dificuldades comuns na

vida de todo ser humano (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006).

Conforme Castro48 (apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006), deve ser enfatizada a possibilidade de se

criar nas organizações educacionais, ações que promovam a resiliência e que respondam de forma

eficaz aos desafios da sociedade, proposta esta trazida também por Grotberg (1998), em seu manual

de promoção de resiliência para crianças e adolescentes.

Ressaltando-se aqui a necessidade destas ações por parte das instituições responsáveis pela

aplicação de medidas sócio-educativas, que conforme demonstrado pelos resultados desta pesquisa,

estão distantes deste caminho de promoção.

Ao dar voz aos jovens que viveram, na sua adolescência, a experiência da privação de liberdade, observamos que o contexto da aplicação das medidas sócio-educativas apresenta contradições e ambigüidades mais complexas do que um olhar superficial pode captar (VOLPI, 2001).

Segundo Assis, Pesce e Avanci (2006), o entorno a que um adolescente está exposto, nunca é perfeito

ou invulnerável, mas seu saldo protetor deve ser intenso e constante, diminuindo os efeitos danosos

das adversidades.

É a existência de um entorno afetivo e material o aspecto determinante para se proteger uma criança que enfrenta adversidades... Esse entorno precisa ser estável para dar à criança o sentimento de continuidade e de futuro; amoroso para permitir que aprenda dar e receber afeto; confiável para prover segurança e o sentimento de que

48 CASTRO, M.A.C.D. Revelando o sentido e o significado da resiliência na preparação de professores para atuar e conviver num mundo em transformação. In: Resiliência e Educação (org. José Tavares). São Paulo: Cortez, 2001.

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pode contar com os outros para superar problemas... respeitoso para que as pessoas aprendam os direitos e os deveres da vida em comunidade (ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.61).

Assis, Pesce e Avanci (2006) ressaltam ainda que o pleno desenvolvimento humano seja menos

influenciado pelas adversidades e mais pelos recursos protetores de que dispõem os sujeitos ao longo

da vida; e, portanto, enfatizar estes recursos na adolescência, e em outras fases da vida, é crucial para

o desenvolvimento do potencial de resiliência. “Jamais conseguimos liquidar nossos problemas,

sempre resta deles algum vestígio, mas podemos dar-lhes uma outra vida, mais suportável e, às vezes,

até bonita e com sentido” (CYRULNIK49 apud ASSIS, PESCE e AVANCI, 2006, p.57).

É impossível formar um juízo preciso e uniforme sobre um período da vida caracterizado por transições, mudanças e auto-afirmação como a adolescência, vivido num sistema tão marcado por valores contraditórios e jogos de poder e força, numa sociedade caracterizada por fortes desigualdades e injustiças (VOLPI, 2001).

Esta pesquisa não teve a pretensão de trazer respostas, mas, ao contrário, suscitar questionamentos

diante da realidade de adolescentes privados de liberdade, de igualdade, de oportunidades, mas que

encontram, em sua realidade, forças para superar todas estas privações. Questionamentos estes que

merecem novas pesquisas, novas dúvidas, novas ações, que busquem como resultado não apenas

conhecer, mas, especialmente, proporcionar um futuro melhor para a geração do futuro.

49 CYRULNIK, B. Os patinhos feios. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

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ANEXOS

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ANEXO A

TERMO DE AUTORIZAÇÃO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DA CAPITAL. Somos estudantes do Curso de Psicologia da Faculdade Ruy Barbosa e estamos realizando uma pesquisa para a Disciplina de Seminários de Pesquisa e Extensão I, sob a supervisão da Professora Stella Sarmento. O objetivo geral desta pesquisa é comparar fatores sociais, econômicos e familiares, bem como traços de personalidade associados a resiliência entre adolescentes de um projeto comunitário de Salvador, e adolescentes infratores em privação de liberdade. Os objetivos específicos são: identificar aspectos familiares, sociais e econômicos comuns nos dois grupos; identificar, através de um teste projetivo, traços de personalidade comuns nos dois grupos; levantar traços de personalidade que se diferenciam entre os dois grupos de adolescentes pesquisados; verificar a presença de condições ligadas a resiliência no desenvolvimento dos adolescentes de ambos os grupos.

Para a realização deste trabalho, solicitamos sua autorização para nosso acesso à CAM – Casa de Acolhimento ao Menor, unidade da FUNDAC – Fundação da Criança e do Adolescente que abrigam adolescentes que praticaram atos infracionais.

Durante a pesquisa serão utilizados dois instrumentos, sendo: - Questionário – elaborado pela pesquisadora contendo: dados do adolescente, dados sobre a

família, sobre o ato infracional,dados sobre sua vida pessoal; - Teste Wartegg, uma técnica gráfica que se apresenta em uma folha com oito quadrados de quatro

cm de lado, onde constam esboços de desenho que devem servir de estímulo para os sujeitos realizarem seus próprios desenhos.

O método a ser utilizado não cria qualquer risco para os sujeitos enquanto participantes da pesquisa. Trata-se de uma pesquisa com risco mínimo. Esta pesquisa estará contribuindo para aumentar nossa compreensão e nosso conhecimento acerca dos adolescentes infratores. Desde já agradeço sua colaboração, Andréa Sandoval

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ANEXO B

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

TÍTULO: Adolescência: diferenças entre iguais – Resiliência e outros aspectos. INVESTIGADORES: Andréa Sandoval Padovani OBJETIVO Você está sendo convidado a participar de uma pesquisa sobre o resiliência em adolescentes. PROCEDIMENTOS Você participará de uma atividade de desenho, que consta de uma folha onde existem alguns traços de desenho aos quais você deverá dar continuidade, isto é, deverá realizar um desenho a partir destes traços iniciais. Esta tarefa não terá tempo determinado e para realizá-la você poderá utilizar apenas um lápis no.2 que lhe será entregue junto à folha do teste. Após a realização deste teste você irá responder um questionário com algumas informações a seu respeito. RISCOS E BENEFÍCIOS O método não cria qualquer risco para você enquanto participante. Trata-se de uma pesquisa com risco mínimo. Ao participar da pesquisa você estará contribuindo para aumentar nossa compreensão e nosso conhecimento acerca dos adolescentes infratores. CONFIDENCIALIDADE As informações prestadas por você serão utilizadas em um trabalho de pesquisa para o Curso de Psicologia da Faculdade Ruy Barbosa. Outros trabalhos científicos podem utilizar os dados desta pesquisa, porém, em qualquer circunstância, sua identidade será mantida em absoluto sigilo. DIREITO DE RECUSAR OU DESISTIR DA PARTICIPAÇÃO Sua participação nesta pesquisa é voluntária, ou seja, você pode recusar-se a participar e se mudar de idéia durante a pesquisa, poderá desistir de participar. Negar-se a participar ou interromper sua participação não trará nenhuma conseqüência negativa para você. QUESTÕES Se você tiver qualquer pergunta a fazer, por favor, sinta-se à vontade para realizá-la. Se, no futuro, você tiver mais perguntas a fazer, entre em contato com a Faculdade Ruy Barbosa através do número ( 32051700) – Coordenação de Psicologia e solicite um retorno de umas das pesquisadoras. __________________ ______________________________________________________ Data Assinatura do participante RG ou CPF: ____________________________ __________________ ______________________________________________________ Data Assinatura do pesquisador

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ANEXO C

Questionário – Adolescentes

Data da Coleta: _____________________ Nome do aplicador: ____________________________ Dados do Adolescente

1) Sexo. 1. Masculino, 2. Feminino 2) Idade: ___________ 3) Frequenta a escola atualmente. 0.Não, 1.Sim.

4) Escolaridade atual. 0.Analfabeto, 1.Ensino Fundamental Incompleto, 2.Ensino Fundamental

Completo, 3.Ensino Médio Incompleto, 4.Ensino Médio Completo, 5.Superior Incompleto.

5) Referência de atividade labora atual ou passada (atividade profissional). 0.Não, 1.Sim.

6) Participa de alguma atividade social? 0.Não, 1.Grupo desportivo, 2.Grupo Religioso, 3.Projeto de Profissionalização, 4.Projeto artístico-cultural, 5. Outros.Quais?

______________________________________________________________________

7) Você participa de alguma religião? 0.Não, 1.Sim. Qual?

8) Bairro onde mora. __________________________

Dados sobre a família

9) Com quem mora. 0.Sozinho, 1.Pai, 2.Mãe, 3.Tio/tia, 4.Avô/Avó, 5.Madrasta, 6.Padrasto, 7.Irmãos, 8.Outros. Quem? ____________________________ (caso more com mais de uma pessoa, anotar todos)

10) Tem irmãos? 0.Não, 1.Sim, Quantos? _____ Qual(is) a(s) idade(s)?

__________________________

11) Quem trabalha na família? 1.Pai, 2.Mãe, 3.Tio/tia, 4.Avô/Avó, 5.Madrasta, 6.Padrasto, 7.Irmãos, 99.Não se aplica. (caso mais de um trabalhe, registrar todos).

12) Qual a profissão das pessoas que trabalham?

13) Você contribui para a renda da família? 0.Não, 1.Sim. De que forma?

14) Seus pais são vivos? 0.Nenhum deles, 1.Pai, 2.Mãe.

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Dados sobre sua vida

15) Descreva-me você?

16) Como é seu relacionamento com sua família/amigos ?

17) Como você se sente/reage diante de problemas?

18) O que sua família acha de você?

19) Você fugiu de casa alguma vez? 0.Não, 1.Sim. Quantas? ______ Por que motivos você

resolveu fugir? 20) Foi expulso de casa alguma vez? 0.Não, 1.Sim. Por quê? 21) Você tem (ou teve) conflito com algum familiar? 0.Não, 1.Pai, 2.Mãe, 3.Tio/tia, 4.Avô/Avó,

5.Madrasta, 6.Padrasto, 7.Irmãos, 99.Não se aplica. (caso mais de um trabalhe, registrar todos). Por que isto ocorre?

22) Utilizou alguma substância psicoativa? 0.Não, 1.Bebida alcoólica, 2.Cigarro, 3.Maconha, 4.Cocaína, 5.Crack, 6.Cola de sapateiro, 7.Anabolizantes, 8.Medicamentos, 9.Outras. Quais? __________________ ____________________________________________________

(caso haja associação entre uma ou mais substâncias, registrar todas).

23) Utiliza alguma substância psicoativa? 0.Não, 1.Bebida alcoólica, 2.Cigarro, 3.Maconha, 4.Cocaína, 5.Crack, 6.Cola de sapateiro, 7.Anabolizantes, 8.Medicamentos, 9.Outras. Quais? ____________________________________________________ 88. Nunca utilizou.

(caso haja associação entre uma ou mais substâncias, registrar todas)

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24) Ocorre uso de substâncias psicoativas por parte de algum familiar? 0.Não, 1.Sim.

25) Qual? 1.Pai, 2.Mãe, 3.Tio/tia, 4.Avô/Avó, 5.Madrasta, 6.Padrasto, 7.Irmãos, 99.Não se aplica. (caso mais de um trabalhe, registrar todos).

26) Que substância é utilizada? 0.Não, 1.Bebida alcoólica, 2.Cigarro, 3.Maconha, 4.Cocaína,

5.Crack, 6.Cola de sapateiro, 7.Anabolizantes, 8.Medicamentos, 9.Outras. Quais? _________________________ (caso haja associação entre uma ou mais substâncias, registrar todas).

27) Existe antecedentes criminais na família? 0.Não, 1.Pai, 2.Mãe, 3.Tio/tia, 4.Avô/Avó,

5.Madrasta, 6.Padrasto, 7.Irmãos, 99.Não se aplica. (caso mais de um trabalhe, registrar todos).

28) Que tipo de crime foi cometido? 1.Contra o patrimônio, 2.Contra a vida, 3.Contra os costumes,

4.Contravenção, 5.Narcotráfico/usuário, 99.Outros. Quais? _____________________________________

29) Adolescente já praticou atos infracionais? 0.Não, 1.Sim. Quais?

30) Já participou de alguma medida sócio-educativa? Qual? 1.Advertência, 2.Obrigação de reparar dano, 3.Prestação de Serviços à comunidade, 4.Liberdade Assistida, 5.Semi-liberdade, 6.Internação, 7.Remissão, 8.Outro, 99.Não se aplica.

31) Idade na data do ato infracional. ___ ___ 32) Tempo de Internação: _____________

33) Você lembra de ter sofrido algum tipo de violência na infância ou adolescência? 0.Não,

1.Sim.Qual tipo?

34) Por parte de quem? 1.Pai, 2.Mãe, 3.Tio/tia, 4.Avô/Avó, 5.Madrasta, 6.Padrasto, 7.Irmãos, 9.Vizinho, 10.Desconhecido, 11.Outros.Quem? ____________________ 99.Não se aplica. (caso mais de um trabalhe, registrar todos).

35) Como você se sente no dia de visita?

36) O que você prevê para o seu futuro?

37) Quais as queixas que seus familiares tem de você?