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IV Simpósio Brasileiro de Geomática SBG2017 II Jornadas Lusófonas - Ciências e Tecnologias de Informação Geográfica - CTIG2017 Presidente Prudente - SP, 24-26 de julho de 2017 p. 430-436 G. O. N. Brassarote; J. F. G. Monico; E. M. Souza ISSN 1981-6251 ANÁLISE WAVELET DE SÉRIES TEMPORAIS DE COORDENADAS GNSS GABRIELA DE OLIVEIRA NASCIMENTO BRASSAROTE 1 JOÃO FRANCISCO GALERA MONICO 1 ENIUCE MENEZES DE SOUZA 2 1 Universidade Estadual Paulista - Unesp Faculdade de Ciências e Tecnologia - FCT Departamento de Cartografia, Presidente Prudente - SP [email protected]; [email protected] 2 Universidade Estadual de Maringá – UEM Departamento de Estatística, Maringá – PR [email protected] RESUMO - As séries temporais de coordenadas advêm do processamento dos dados coletados pelos receptores GNSS ao longo do tempo. Tais observações GNSS estão sujeitas às influências provenientes de diversas fontes, tais como os satélites, a propagação do sinal, o receptor/antena e a própria estação. Mesmo com a realização de uma modelagem adequada no processamento de dados, ainda pode restar erros e efeitos não modelados, os quais contaminarão as séries de coordenadas obtidas com as observáveis GNSS na forma de ruídos e sinais periódicos. A análise do comportamento periódico das séries de coordenadas de estações GNSS contínuas possibilita o acompanhamento da evolução temporal dos fenômenos geofísicos que afetam as estações. Nesse sentido, as séries de coordenadas (E, N, U) diárias de quatro estações GNSS da rede RBMC, com 10 anos de dados (período de 2006-2016), foram analisadas em multiescala a partir de wavelets não-decimadas com o objetivo de identificar e caracterizar os efeitos periódicos contidos nas séries. Os resultados mostraram que o comportamento periódico das séries de coordenadas é dependente da região geográfica em que se encontra estação GNSS. A variabilidade da coordenada vertical (U) apresenta forte relação com a sazonalidade do ciclo hidrológico, o qual é mais intenso para as estações próximas de grandes rios, como a estação NAUS, por exemplo. Palavras chave: Transformada wavelet não decimada, Séries temporais de coordenadas, Comportamento periódico, GNSS. ABSTRACT - Coordinate time series are the result of the processing of data collected by GNSS receivers over time. Such GNSS observations are influenced by errors from various sources, such as satellites, signal propagation, receiver/antenna and the station. Even with adequate modeling in data processing, it may still remain errors and unmodeled effects, which will contaminate the GNSS coordinate time series in the form of noise and periodic signals. The periodic behavior analysis of GNSS coordinate series allows monitoring of the temporal evolution of geophysical phenomena that affect the GNSS stations. In this sense, the daily coordinate time series (E, N, U) of four GNSS stations of the RBMC network, with 10 years of data (period of 2006 to 2016), were analyzed in multiscale from non-decimated wavelets, in order to identify and to characterize the periodic effects contained in these series. Results show that the periodic behavior of the coordinate time series depends on the geographical region in which the GNSS station is located. The variability of Up coordinate has a strong relation to seasonal hydrological cycles, which is more intense to GNSS stations close to big rivers, as the NAUS station for example. Key words: Non-decimated wavelet transform, Coordinate time series, Periodic effect, GNSS. 1 INTRODUÇÃO O processamento das observáveis coletadas por um receptor GNSS (Global Navigation Satellite System) ao longo do tempo dá origem, dentre outras informações, a uma sequência de coordenadas do ponto em função do tempo, denominada série temporal de coordenadas GNSS.

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IV Simpósio Brasileiro de Geomática – SBG2017II Jornadas Lusófonas - Ciências e Tecnologias de Informação Geográfica - CTIG2017

Presidente Prudente - SP, 24-26 de julho de 2017p. 430-436

G. O. N. Brassarote; J. F. G. Monico; E. M. Souza ISSN 1981-6251

ANÁLISE WAVELET DE SÉRIES TEMPORAIS DE COORDENADAS GNSS

GABRIELA DE OLIVEIRA NASCIMENTO BRASSAROTE1 JOÃO FRANCISCO GALERA MONICO1

ENIUCE MENEZES DE SOUZA2

1 Universidade Estadual Paulista - Unesp Faculdade de Ciências e Tecnologia - FCT

Departamento de Cartografia, Presidente Prudente - SP [email protected]; [email protected]

2 Universidade Estadual de Maringá – UEM Departamento de Estatística, Maringá – PR

[email protected]

RESUMO - As séries temporais de coordenadas advêm do processamento dos dados coletados pelos receptores GNSS ao longo do tempo. Tais observações GNSS estão sujeitas às influências provenientes de diversas fontes, tais como os satélites, a propagação do sinal, o receptor/antena e a própria estação. Mesmo com a realização de uma modelagem adequada no processamento de dados, ainda pode restar erros e efeitos não modelados, os quais contaminarão as séries de coordenadas obtidas com as observáveis GNSS na forma de ruídos e sinais periódicos. A análise do comportamento periódico das séries de coordenadas de estações GNSS contínuas possibilita o acompanhamento da evolução temporal dos fenômenos geofísicos que afetam as estações. Nesse sentido, as séries de coordenadas (E, N, U) diárias de quatro estações GNSS da rede RBMC, com 10 anos de dados (período de 2006-2016), foram analisadas em multiescala a partir de wavelets não-decimadas com o objetivo de identificar e caracterizar os efeitos periódicos contidos nas séries. Os resultados mostraram que o comportamento periódico das séries de coordenadas é dependente da região geográfica em que se encontra estação GNSS. A variabilidade da coordenada vertical (U) apresenta forte relação com a sazonalidade do ciclo hidrológico, o qual é mais intenso para as estações próximas de grandes rios, como a estação NAUS, por exemplo.

Palavras chave: Transformada wavelet não decimada, Séries temporais de coordenadas, Comportamento periódico, GNSS.

ABSTRACT - Coordinate time series are the result of the processing of data collected by GNSS receivers over time. Such GNSS observations are influenced by errors from various sources, such as satellites, signal propagation, receiver/antenna and the station. Even with adequate modeling in data processing, it may still remain errors and unmodeled effects, which will contaminate the GNSS coordinate time series in the form of noise and periodic signals. The periodic behavior analysis of GNSS coordinate series allows monitoring of the temporal evolution of geophysical phenomena that affect the GNSS stations. In this sense, the daily coordinate time series (E, N, U) of four GNSS stations of the RBMC network, with 10 years of data (period of 2006 to 2016), were analyzed in multiscale from non-decimated wavelets, in order to identify and to characterize the periodic effects contained in these series. Results show that the periodic behavior of the coordinate time series depends on the geographical region in which the GNSS station is located. The variability of Up coordinate has a strong relation to seasonal hydrological cycles, which is more intense to GNSS stations close to big rivers, as the NAUS station for example.

Key words: Non-decimated wavelet transform, Coordinate time series, Periodic effect, GNSS.

1 INTRODUÇÃO

O processamento das observáveis coletadas por um receptor GNSS (Global Navigation Satellite System) ao

longo do tempo dá origem, dentre outras informações, a uma sequência de coordenadas do ponto em função do tempo, denominada série temporal de coordenadas GNSS.

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Uma série de coordenadas GNSS 푦 =[푦 ,푦 , … , 푦 ] ∈ ℝ é representada pela tendência linear (푦 + 푟푡) mais uma soma de 푞 termos trigonométricos individuais (AMIRI-SIMKOOEI, 2007; TEUNISSEN et. al., 2008):

퐸 푦(푡) = 푦 + 푟푡 + 푎 cos(휔 푡) + 푏 sen(휔 푡),

(1) em que o sublinhado indica que 푦 é uma variável randômica, 푦 e 푟 são a interseção e a inclinação da reta, respectivamente, 푎 e 푏 são coeficientes das funções harmônicas e 휔 é a frequência. Essa representação é justificada pelo fato de que as séries de coordenadas possuem além de uma tendência linear (velocidade devida ao movimento de placa tectônica), sinais periódicos (ruídos/efeitos sistemáticos não modelados) decorrentes de processos geofísicos que afetam as coordenadas das estações (WILLIANS et al., 2004; AMIRI-SIMKOOEI, 2008).

Na Equação (1), 푦 , 푟 , 푎 e 푏 são incógnitas do ajustamento, podendo ser estimadas a partir do MMQ (Método dos Mínimos Quadrados). Já a determinação da frequência 휔 pode ser realizada a partir do MMQ ou utilizando as análises de Fourier ou wavelet.

O princípio básico da Transformada de Fourier (TF) é transformar um sinal periódico do domínio do tempo para o domínio da frequência, representando-o como a soma de funções seno e cosseno. Dessa forma, informações de frequência que não podiam ser identificadas no sinal original, podem então ser detectadas no sinal transformado. O problema é que a informação temporal dessas frequências é totalmente desorientada no sinal transformado, ou seja, por meio da transformada é possível identificar as frequências predominantes no sinal analisado, mas não a localização temporal dessas frequências. Por isso a TF é recomendada para a análise de sinais estacionários, sinais cuja frequência não muda ao longo do tempo. Essa, porém, não é a realidade dos sinais reais, os quais geralmente são não-estacionários.

A Transformada Wavelet (TW), por sua vez, expande um sinal utilizando-se de um conjunto de funções wavelets, funções essas que possuem localização tempo-frequência. Dessa forma, é possível identificar no sinal transformado a frequência de efeitos periódicos, além de mudanças abruptas presentes nas séries e sua localização no tempo. Por essa razão, a TW tem sido tão empregada na análise de séries temporais.

Nesse trabalho será realizada a análise wavelet das séries temporais de coordenadas GNSS com o objetivo de estimar o sinal periódico contido nas séries e identificar a frequência desse efeito. O longo período de dados disponível (10 anos, 2006-2016), com dados coletados diariamente, constitui uma amostra significativa para a análise do comportamento das coordenadas de estações GNSS ao longo do tempo.

2 DECOMPOSIÇÃO EM MULTIESCALA A PARTIR DE WAVELETS

Uma expansão em wavelets utiliza translações e dilatações a partir de uma única função 휓 ∈ 퐿 (ℝ), chamada wavelet mãe, permitindo obter uma família de funções

휓 , (푡) = | |휓 , 푎, 푏 ∈ ℝ, 푎 ≠ 0 , (2) em que 푎 é o fator de dilatação e 푏 o de deslocamento (DAUBECHIES, 1992). Considerando 푎 = 2 e 푏 =푘2 , 푗 ∈ ℝ, existe uma função 휓 com boas propriedades de localização tempo-frequência, tal que 휓 , (푥) =2 휓(2 푡 − 푘) constitui uma base ortonormal para o espaço de funções 퐿 (ℝ).

Então a Transformada Wavelet Discreta (TWD) de uma série temporal 푌 com relação à wavelet mãe 휓 é

푊 , = 푌 휓 , (푡), (3)

em que 푛 = 2 é o número de observações da série 푋 , 푗 =0, … , 푗 − 1 e 푘 = 0, … , 2 com 푗 ∈ ℤ. A TWD decompõe a série 푌 em níveis de resolução. O primeiro nível de decomposição está relacionado à escala mais fina, e compreende os efeitos com maior frequência. Já o último nível de decomposição está relacionado aos efeitos de menor frequência, representados pelas escalas mais suaves.

A TWD é a versão mais bem conhecida da TW sendo, na prática, calculada através de um eficiente algoritmo desenvolvido por Mallat (1989), o algoritmo piramidal. Esse processo usa filtros discretos e decimação por 2 (downsampling), em que, para cada duas saídas do filtro, uma é descartada. Desse modo, a cada estágio do algoritmo tem-se metade dos elementos considerados no estágio anterior. O downsampling requerido para o cálculo da TWD faz com que ela seja sensível à origem, o que não é ideal para algumas aplicações, principalmente envolvendo análise de séries temporais não-estacionárias.

A Transformada Wavelet Discreta Não Decimada (TWND), por outro lado, é invariante à translação (não sensível à origem da decimação), pois leva em consideração todos os elementos da amostra, eliminando o processo de downsampling. Dessa forma, por meio da TWND, um sinal é representado com o mesmo número de coeficientes em cada nível de decomposição do algoritmo piramidal. O uso da TWND na análise de séries temporais, portanto, permite uma análise multiescala completa das séries temporais: identificando as frequências de ocorrência e localização temporal de comportamentos não-estacionários de diferentes magnitudes, além de fornecer uma aproximação da magnitude desses efeitos.

O periodograma wavelet decompõe a energia, ou variância da série temporal {푋 } em 2 multiescalas, ou seja, em diferentes níveis de resolução 푗 e com localização tempo-frequência 2 푡 (NASON, 2010). Ele é calculado a partir dos coeficientes wavelet 푊 , da TWD/TWND, sendo descrito por

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퐼 , = 푊 , , (4) em que 푊 denota os coeficientes da versão não decimada da TWD obtida na Equação (3). O periodograma wavelet fornece uma boa descrição de onde mudanças significativas estão localizadas nas séries temporais, já que mudanças abruptas correspondem proporcionalmente a coeficientes wavelet de maior magnitude.

A soma de todos os coeficientes wavelet em cada escala do periodograma permite ainda calcular a variância da série temporal em cada escala, com objetivo de saber quais delas possuem maior energia. Essa tarefa pode ser executada através do espectro wavelet global,

푆 , =1푁 푊 , . (5)

O espectro wavelet global completa a análise multiescala (multiresolução) da série temporal. Através dele, a escala do periodograma que apresenta maior energia e melhor caracteriza a série temporal pode ser identificada. A Tabela 1 apresenta a interpretação da análise multiescala de séries temporais, em termos de intervalo de frequência e intervalo de período de cada nível de decomposição do periodograma wavelet (PERCIVAL, 2000).

Tabela 1 – Intervalo de frequência e intervalo de período

em cada escala 휏 = 2 .

Cada escala 휏 , relacionada ao nível de

decomposição 푗, correspondente ao intervalo de período 2휏 a 4휏 . Considerando séries temporais de observações diárias, por exemplo, a escala de nível de decomposição 8 está relacionada a efeitos presentes na série, que possuem periodicidade dentro do intervalo de 256 a 512 dias, aproximadamente 1 ano. Quanto maior o nível de decomposição 푗, mais suave será a escala 휏 = 2 , e os

efeitos relacionados a essa escala serão de baixa frequência. 3 EXPERIMENTOS

Os experimentos foram realizados utilizando as séries de coordenadas diárias das estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE, pertencentes à RBMC (Rede Brasileira de Monitoramento Contínuo) e estimadas pelo NGL (Nevada Geodetic Laboratory) (http://geodesy.unr.edu/NGLStationPages/GNSSnetmap/GNSSNetMap_MAG.html). A Figura 1 ilustra a localização geográfica das estações.

Figura 1 – Estações GNSS utilizadas no experimento.

As estações selecionadas estão localizadas,

respectivamente, nas cidades de Manaus-AM, Salvador-BA, Brasília-DF e Presidente Prudente-SP. Por pertencerem a diferentes regiões do Brasil estão sob influência de efeitos sistemáticos distintos. Portanto, as séries temporais de coordenadas dessas estações (a componente vertical, principalmente) apresentam comportamento diferentes uma em relação às outras. A Figura 2 mostra as séries de coordenadas das estações selecionadas.

Nível de decomposição

Escala 흉풋

Intervalo de Frequência ퟏퟒ흉풋

,ퟏퟐ흉풋

Intervalo de período

[ퟐ흉풋,ퟒ흉풋

1 휏 = 1 14

,12

2 - 4

2 휏 = 2 18

,14

4 - 8

3 휏 = 4 1

16,18

8 - 16

4 휏 = 8 1

32,

116

16 - 32

5 휏 = 16 1

64,

132

32 - 64

6 휏 = 32 1

128,

164

64 - 128

7 휏 = 64 1

256,

1128

128 - 256

8 휏 = 128 1

512,

1256

256 - 512

9 휏 = 256 1

1024,

1512

512 - 1024

10 휏 = 512 1

2048,

11024

1024 - 2048

11 휏 = 1024 1

4096,

12048

2048 - 4096

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G. O. N. Brassarote; J. F. G. Monico; E. M. Souza ISSN 1981-6251

Figura 2 – Séries temporais de coordenadas (E,N,U) das

estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE.

As séries temporais diárias de coordenadas das estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE (cerca de 10 anos de dados) foram analisadas em multiescala (conforme Seção 2), por meio das wavelets não decimadas.

Os efeitos periódicos evidenciados na decomposição em multiescala das séries, foram obtidos no domínio do tempo através da aplicação da Transformada Wavelet inversa. Dessa forma, pôde-se avaliar se o sinal periódico estimado através das wavelets representava fielmente o comportamento das séries de coordenadas.

Para uma análise completa, foram gerados ainda o periodograma wavelet e espectro wavelet global do sinal periódico estimado com o objetivo de identificar, mais detalhadamente, as periodicidades contidas nesse sinal.

A implementação das etapas descritas nessa seção foi realizada em linguagem R (http://cran.r-project.org/).

Foram ilustrados apenas os resultados da análise das séries de coordenadas da estação NAUS, cujo efeito periódico das coordenadas é o que apresentada maior

amplitude. Porém, as discussões foram estendidas à todas as estações.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Conforme descrito na seção anterior, foram analisadas as séries de coordenadas locais (E, N, U) das estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE. Observa-se, na Figura 2, um comportamento tendencioso das séries de coordenadas horizontais (E e N) dessas estações, que descrevem a movimentação da placa tectônica Sul-americana a que pertence o Brasil. A coordenada E (leste) apresenta uma tendência linear descendente, e a coordenada N (Norte), uma tendência linear ascendente, indicando uma movimentação no sentido noroeste das estações (Figura 3). Essas coordenadas também descrevem um comportamento periódico, relacionado aos efeitos sistemáticos que influenciam a posição da estação. Esse comportamento periódico nas coordenadas horizontais é de menor amplitude do que o presente na coordenada vertical (U). Além disso, a coordenada vertical de estações GNSS localizadas próximas a rios ou oceanos, são influenciadas pela variação de massa d’água desses corpos d’água. Esse é o caso, por exemplo, da estação NAUS, localizada no interior da região amazônica, cujo movimento vertical tem forte relação com o ciclo hidrológico, e da estação SAVO, que por estar localizada no litoral brasileiro tem a variabilidade de sua coordenada U associada ao efeito de marés oceânicas. Por esse motivo, a coordenada U dessas estações apresentam maior variabilidade que a das estações BRAZ e PPTE.

Figura 3 – Direção e sentido do deslocamento das

estações pertencentes à rede SIRGAS-COM. Fonte: IBGE (2017).

Por meio da decomposição wavelet das séries de

coordenadas, é possível detectar os sinais periódicos contidos nas séries de coordenadas das estações analisadas. A decomposição em multiescala das séries de coordenadas da estação NAUS é apresentada na Figura 4.

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Figura 4 – Decomposição wavelet das séries de coordenadas (E, N, U) da estação NAUS.

Pela análise da decomposição em multiescala por wavelets (Figura 4), observou-se que os sinais periódicos contidos nas séries de coordenadas são evidenciados principalmente nos níveis de decomposição 7 e 8 (destacados em vermelho), e referem-se, respectivamente, aos efeitos com periodicidade dentro do intervalo 128 a 256 e 256 a 512 dias (Tabela 1). Esses sinais periódicos, portanto, devem estar relacionados aos efeitos sistemáticos anuais e semianuais que afetam a posição das estações GNSS, e/ou aos efeitos de Chandler e Draconiano, cuja periodicidade é 433 e 351,6 dias, respectivamente.

Os sinais periódicos identificados no sinal transformado, foram então obtidos no domínio do tempo através da aplicação da Transformada Wavelet inversa sobre as escalas mais suaves (7 a 10) da decomposição wavelet. A Figura 5 ilustra o resultado da reconstrução dos níveis de decomposição 7 a 10 domínio do tempo, para as quatro estações analisadas.

Figura 5 – Estimativa do sinal periódico contido nas séries de coordenadas das estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE, por meio da reconstrução das escalas mais suaves

da decomposição wavelet. Comparando o sinal periódico estimado na Figura 5

com as séries de coordenadas de cada uma das estações (Figura 2), observa-se que o efeito estimado representa

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corretamente (exceto pelo efeito de bordas) a variabilidade das coordenadas das estações analisadas.

Foram gerados o periodograma wavelet e espectro wavelet global do sinal periódico estimado através da decomposição wavelet. Para tanto, foi necessário selecionar uma amostra cujo tamanho fosse potência de 2, de modo a série fosse decomposta em 푗 níveis de resolução, associados à escala 2 (Tabela 1). Por isso, os periodogramas wavelet referem-se a apenas 2048 dias de dados (2 ). A Figura 6 ilustra periodograma e espectro global do sinal periódico estimado para a estação NAUS.

Figura 6 – Periodograma e espectro wavelet global do efeito periódico contido nas séries de coordenadas da

estação NAUS

Pela análise do espectro global identifica-se qual nível de decomposição do periodograma wavelet possui maior variância (energia). A Tabela 2 sumariza os resultados obtidos para todas estações analisadas. Tabela 2 – Níveis de decomposição do periodograma dos sinais periódicos com maior variância global, com relação

a cada componente de coordenada das estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE.

Série de coordenada NAUS SAVO BRAZ PPTE

E 10 e 11 10 e 11 10 e 11 10 e 11 N 10 e 11 10 e 11 10 e 11 10 e 11 U 8 e 6 8 e 7 8 e 10 8 e 10

Avaliar as informações contidas na Tabela 2

significa identificar qual a periodicidade dos efeitos que caracterizam o sinal periódico contido nas séries de coordenadas. Essa identificação é realizada com base na Tabela 1.

Os efeitos periódicos presentes nas coordenadas horizontais (E e N) das estações NAUS, SAVO, BRAZ e PPTE, por apresentar sua maior energia concentrada nos níveis de decomposição 10 e 11 do periodograma (Tabela 2), mostram estar relacionados a efeitos com periodicidade dentro do intervalo de 1024 a 2048 dias e 2048 a 4096 dias, respectivamente, ou seja, aproximadamente 3 e 9 anos. Apesar de não tão expressivos no espectro wavelet, as séries de coordenadas E e N, contém ainda efeitos periódicos com periodicidade anual, aproximadamente (nível de decomposição 8 com maior energia, periodicidade dentro do intervalo de 256 a 512 dias). Esse efeito também está presente nas séries de coordenadas vertical (U) de todas as estações analisadas, apresentando alta variância global.

Outros efeitos periódicos, relacionados aos níveis de decomposição 7 e 6 também aparecem na componente vertical das séries de coordenadas das estações SAVO e NAUS, respectivamente. Esses efeitos possuem suas respectivas periodicidades dentro do intervalo de 128 a 256 dias (semianual) e 64 a 128 dias. No caso da estação SAVO, o efeito de periodicidade semianual (nível de decomposição 7) deve estar relacionado ao efeito de maré oceânica que exerce influência sobre esta estação, situada no litoral brasileiro. Enquanto que para a estação SAVO, a periodicidade identificada, próxima de 90 dias (nível de decomposição 6), possivelmente está associada à influência do ciclo hidrológico sobre a posição vertical da estação, já que a mesma está localizada próxima a grandes rios. 5 CONCLUSÕES

A metodologia proposta nesse trabalho possibilitou estimar e caracterizar o sinal periódico contido nas séries temporais de coordenadas GNSS.

As séries de coordenadas horizontais (E e N) apresentam uma tendência linear e um comportamento periódico de pequena amplitude. A análise wavelet dessas

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séries apontou a influência de um efeito periódico de aproximadamente 3 anos sobre a posição das quatro estações GNSS analisadas.

A componente vertical (U), por sua vez, apresenta uma variabilidade sazonal de maior magnitude quando comparada às coordenadas horizontais. Esse comportamento periódico depende da localização geográfica da estação, já que diferentes estações estão sob influência de efeitos sistemáticos distintos. A coordenada vertical de estações próximas a rios e oceanos, por exemplo, são mais afetadas pela variação de massa d’água desses corpos d’água. Assim, as séries de posição dessas estações tendem a apresentar uma maior variação periódica. No caso da estação NAUS, localizada na região amazônica, verificou-se, através da análise wavelet, periodicidades anual e semianual dos efeitos que caracterizam o sinal periódico contido na série de coordenada vertical. Tais periodicidades podem estar relacionadas ao ciclo hidrológico que afeta a posição vertical da estação GNSS. REFERÊNCIAS AMIRI-SIMKOOEI, A. R. Least-squares variance component estimation theory and GNSS applications. 208p. Ph.D. Thesis. Delft: Netherlands Geodetic Commission, 2007. AMIRI-SIMKOOEI, A. R. Noise in multivariate GNSS position time-series. Journal of Geodesy, v. 83, n. 2, p. 175-187, 2008. DAUBECHIES, I. Orthonormal bases of compactly supported wavelets. Communications on pure and applied mathematics, v. 41, n. 7, p. 909-996, 1992. IBGE. SIRGAS – Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geodesia/default_sirgas_int.shtm>. Acesso: 15 março 2017. MALLAT, S. G. A theory for multiresolution signal decomposition: the wavelet representation. IEEE transactions on pattern analysis and machine intelligence, v. 11, n. 7, p. 674-693, 1989. NASON, Guy. Wavelet methods in statistics with R. Springer Science & Business Media, 2010. PERCIVAL, D. B.; WALDEN, A. T. Wavelet methods for time series analysis, Cambridge Series in Statistical and Probabilistic Mathematics, England, 2000. TEUNISSEN, P. J. G.; AMIRI-SIMKOOEI, A. R. Least-squares variance component estimation. Journal of Geodesy, v. 82, n. 2, p. 65-82, 2008. WILLIAMS, S. D. P.; BOCK, Y.; FANG, P.; JAMASON, P.; NIKOLAIDIS, R. M.; PRAWIRODIRDJO, L.;

MILLER, M.; JOHNSON, D. J. Error analysis of continuous GNSS position time series. Journal of Geophysical Research: Solid Earth, v. 109, n. B3, 2004.