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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

    CENTRO SCIO-ECONMICO

    DEPARTAMENTO DE SERVIO SOCIAL

    ROBSON DE OLIVEIRA

    A ANLISE INSTITUCIONAL E O SERVIO SOCIAL

    FLORIANPOLIS2010.1

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    ROBSON DE OLIVEIRA

    A ANLISE INSTITUCIONAL E O SERVIO SOCIAL

    Trabalho de Concluso de Curso, apresentado aoDepartamento de Servio Social da Universidade

    Federal de Santa Catarina, como exigncia parcialpara a obteno do ttulo de Bacharel em ServioSocial.Orientadora: Prof. Dr. Simone Sobral Sampaio

    FLORIANPOLIS2010.1

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    Dedico este trabalho minha av Corina. E apenas para ela...

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    AGRADECIMENTOS

    Voc j sabe como .

    Abre o trabalho, encontra a pgina de agradecimentos e l acaba lendo citaes apessoas que nunca fizeram parte de sua vida, situaes e experincias que talvez jamais tenha

    experimentado, reverncias a entidades as quais possivelmente voc no compartilhe a

    crena e juras de amizade e amor que podero ou no ser cumpridas.

    Isso sempre me incomodou.

    Como agradecer sem cometer algum tipo de injustia?

    Sem ser egosta ao referenciar apenas a minha prpria histria e as pessoas que

    fazem parte dela?

    Sem esquecer a pessoa mais importante neste momento?Por isso aqui ser diferente.

    Meus agradecimentos sero a uma nica pessoa.

    Agradeo a voc, independente de quem seja, se nos conhecemos ou no, por diversas

    razes.

    Por fazer desse trabalho mais do que um rito de passagem da graduao para a

    carreira profissional.

    Por torn-lo um instrumento de aprendizado e uma ferramenta que suscite dvidas e

    inquietaes.

    Por debruar-se sobre o resultado de um exaustivo trabalho e dedicar algum tempo de

    seu dia, noite, semana, ms, ano e vida a ele e, de certa forma, a mim tambm.

    Dessa forma, creio eu, sempre possuiremos algo para compartilhar um com o outro...

    Agradeo a voc.

    Obrigado.

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    Repartido pois entre a curiosidade que no puderareprimir e o desagrado de ver tanta gente junta, o rei,com o pior dos modos, perguntou trs perguntas seguidas,Que que queres, Por que foi que no disseste logo o quequerias, Pensars tu que eu no tenho mais nada que

    fazer, mas o homem s respondeu a primeira pergunta.D-me um barco, disse.

    Jos Saramago.

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    RESUMO

    Este trabalho tem como objetivo realizar uma reviso bibliogrfica, no mbito da produoterica do Servio Social, para discutir a anlise institucional. Na Seo 1 apresentada umabreve contextualizao acerca do sistema de produo capitalista e a formao do Estadobrasileiro para compreender a insero do debate acerca das instituies na prtica

    profissional no Servio Social e, colateralmente, da anlise institucional a partir domovimento de reconceituao do Servio Social. Nesta seo apresentam-se trs livros demeados da dcada de mil novecentos e oitenta que possuem como principal objeto depesquisa a relao entre profissionais de Servio Social e as instituies, so estes: A prticainstitucionalizada do Servio Social de Rose Mary Sousa Serra, Servio Social eInstituio A questo da participao de Maria Luiza de Souza e Saber profissional epoder institucional de Vicente de Paula Faleiros. Posteriormente apresentada a snteseanaltica dos livros e outros autores que contribuem com as idias apresentadas. Aps apresentado os aspectos normatizadores na relao instituio profissionais atravs dealguns aspectos legalistas da profisso, como o Cdigo de tica de 1993 e a Resoluo CFESS n 493/2006 de 21 de agosto de 2006 que dispe sobre as condies ticas e tcnicasdo exerccio profissional do assistente social. A seo 2 discuti a anlise institucional

    enquanto problema terico e essencial a prtica profissional utilizando autores das cinciassociais que debatem este tema. Esse trabalho ainda composto pelas consideraes finais ereferncias bibliogrficas.

    Palavras chave: Instituio, Servio Social, Anlise.

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    SUMRIO

    INTRODUO........................................................................................................... 8

    SEO ICONTEXTUALIZAO E A ANLISE INSTITUCIONAL NO SERVIOSOCIAL...................................................................................................................... 11

    1.1 O modo de produo capitalista e o Estado brasileiro............................ 111.2 A produo bibliogrfica acerca de Instituies no Servio Social........ 15

    1.2.1 A Prtica Institucionalizada do Servio Social (Rose Mary SousaSerra).................................................................................................... 18 1.2.2 Servio Social e Instituio A Questo da Participao (Maria Luiza deSouza).................................................................................... 251.2.3 Saber Profissional e Poder Institucional (Vicente de PaulaFaleiros).................................................................................................33

    1.3 Possveis Chaves Analticas e Aspectos Normatizadores....................... 431.3.1 Possveis Chaves Analticas..................................................... 431.3.2 Aspectos Normatizadores........................................................ 48

    SEO IIA ANLISE INSTITUCIONAL COMO PROBLEMA ANALTICO.................... 53

    CONSIDERAES FINAIS....................................................................................... 59

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS....................................................................... 63

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    INTRODUO

    Em Todos os Nomes, o autor portugus Jos Saramago narra a histria de um

    homem que se chama Sr. Jos. Ele funcionrio-modelo de uma repartio pblica.

    Conhece a fundo todos os procedimentos tcnicos cabveis de seu cargo e compreende com

    perfeio a misso da instituio onde trabalha. O local em questo o Conservatria

    Geral, um prdio histrico que fica de frente ao cemitrio da cidade e onde todos os cidados

    possuem uma ficha de identificao com informaes a respeito de sua data e local de

    nascimento, a escola onde estudou, os empregos que ocupou, a famlia que constituiu e, por

    fim, a data e local da morte.

    As atribuies do cargo ocupado pelo Sr. Jos pode ser dividida em duas. Uma delas

    realizar a abertura e registro das fichas dos recm nascidos, alocando-a no arquivo dosvivos. A outra atribuio localizar a ficha dos recm falecidos no arquivo dos vivos,

    registrar o bito e encaminhar a ficha repartio ao fundo do prdio, no setor dos bitos,

    onde se encontra o cemitrio de papis.

    Em um dia comum de trabalho, o Sr. Jos depara-se com a ficha de uma mulher

    perdida no cho, sente-se atrado pela foto da desconhecida e toma-a para si. Seu objetivo,

    inicialmente confuso a ele, e tambm a ns, aos poucos ganha forma: ele precisa saber quem

    , em que bairro cresceu, qual escola frequentou e, se possvel, encontrar a mulher

    desconhecida.A partir desse ato impulsivo, que viola as normas organizacionais da instituio e as

    atribuies profissionais de seu cargo, o Sr. Jos comea a descobrir sua prpria identidade,

    emergindo de um espao burocrtico e assptico em uma espcie de conto kafkaniano s

    avessas, e ao fim, alterar toda a ordem institucional dando nova significao a prtica de

    seus colegas de trabalho e da funo social da instituio, possibilitando uma reforma na

    prtica dos outros profissionais.

    O Sr. Jos ao mesmo tempo ator institucional e trabalhador que desempenha

    determinado ofcio, mas tambm um homem que precisa romper com a referncia funcionalde seu cargo para se descobrir enquanto sujeito e, posteriormente, ressignificando sua

    existncia enquanto estafe de uma instituio.

    Essa narrativa literria nos remete tanto composio de uma instituio, como a

    necessidade de se atentar para a vida que nela transcorre. Ao invs de imagin-la como algo

    cuja existncia independe dos sujeitos, repens-la a partir deles, de como a vivem, a

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    suportam, transgredindo ou no a rotina definida. Por isso, a pergunta fundamental em torno

    deste trabalho: Para que serve aos assistentes sociais pensar/analisar a instituio?

    Desse modo, o presente trabalho tem como objetivo apresentar a forma como o

    Servio Social problematizou essa questo durante e aps o Movimento de Reconceituao,

    ou seja, a anlise institucional enquanto matria legtima do Servio Social.Essa reconstruo da discusso em torno da anlise das instituies no mbito

    profissional partiu da bibliografia do Servio Social, a partir da retomada das instituies,

    no mais como lugares a serem recusados apriorie muito menos pela sua apreenso acrtica.

    O trajeto da pesquisa envolveu a eleio de trs livros da bibliografia do Servio

    Social que versam acerca das instituies enquanto espaos habitados pelos Assistentes

    Sociais. Cabe ressaltar que os livros no debatem diretamente a anlise institucional,

    apresentando-a de forma colateral. Dessa forma o que se pretende apresentar so

    aproximaes a elementos que possam constituir uma anlise institucional.Este trabalho constitudo de duas sees, consideraes finais e referncias

    bibliogrficas.

    Na seo 1 realiza-se uma contextualizao do sistema de produo e a constituio

    do Estado brasileiro para posteriormente discutir sobre a insero do debate acerca das

    instituies na categoria profissional. H trs livros de meados da dcada de 1980 analisados

    nesta seo e buscou-se ser o mais fiel possvel na apresentao deles, o que resultou em um

    possvel excesso de citaes, como tentativa de trazer a prpria escrita do autor no seu

    entendimento alocado a um perodo poltico especfico do Estado brasileiro; bem como o

    Movimento de Reconceituao na categoria profissional e a relao vivenciada entre

    instituio e profissionais. Em seguida apresentada a sntese analtica do material

    bibliogrfico pesquisado. Para essa sntese utiliza-se tambm outros autores que corroboram

    e contribuem com as principais idias at ento apresentadas. Por fim os aspectos legais e

    normatizadores da profisso para discutir a relao entre instituio e profissional visando

    problematizar a apreenso contempornea em torno dos espaos scio-ocupacionais

    habitados pelos profissionais de Servio Social.

    A seo 2 apresenta a anlise institucional enquanto problema analtico. Visa,

    tambm, desvincular desse procedimento a idia de que esta , meramente, um exerccio

    conceitual desprovido de qualquer relevncia ao exerccio profissional, por entend-la como

    viabilizadora de estratgias em consonncia com o projeto tico-poltico profissional nos

    espaos scio-ocupacionais. Cabe ressaltar a tentativa de elucidar a complexidade que

    envolve o processo de anlise institucional a partir de diferentes abordagens que trazem em

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    comum o aspecto de no se constiturem a partir de uma perspectiva economicista, se

    estabelecendo por via de outros observatrios. Por fim as Consideraes Finais e

    Bibliografia.

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    1 CONTEXTUALIZAO E A ANLISE INSITUCIONAL NO SERVIO SOCIAL

    1.1 O modo de produo capitalista e o Estado brasileiro

    Compreender as instituies como palcos de lutas profissionais para conquistas de

    alianas democrticas para as classes que vivem do prprio trabalho (BISNETO, 2007, p.

    40) requer conhecer a extenso do sistema de produo no qual as instituies se inserem, as

    implicaes disso na estrutura organizacional desses espaos, como se gesta a reproduo da

    vida social de seus atores, bem como o papel das instituies na constituio do Estado

    brasileiro e o reflexo desse mesmo Estado no espao institucional.

    Quando se busca desvelar a formao da sociedade brasileira necessrio

    embasarmos nossa orientao em torno da construo histrica desse Estado contemplando

    conjuntamente aspectos histricos, polticos e sociais. Essa orientao auxilia na

    compreenso de que este se constituiu por via de um [...] complexo de violncia, proibio

    da fala, mais modernamente privatizao do pblico, interpretado por alguns como categoria

    de patrimonialismo, revoluo pelo alto, e incompatibilidade radical entre dominao

    burguesa e democracia (OLIVEIRA, 2000, p. 59).

    Concomitante a essa abordagem, o conjunto de fatores histrico-econmicos ao longo

    das transformaes do capitalismo em nvel mundial so elementos necessrios para que no

    se elabore uma anlise endgena dos processos de transformao do Estado nacional.

    Harvey (1989) no livro Condio Ps-Moderna, realiza sua anlise sobre as

    transformaes histricas do capitalismo compreendendo-o pela escola de regulamentao.

    Essa abordagem possibilita um observatrio privilegiado, pois identifica no capitalismo

    caractersticas no apenas de um modo de produo econmico, mas um sistema capaz de

    gestar novas formas de organizao da vida social, quer dizer, a materializao do regime de

    acumulao, que toma a forma de normas, hbitos, leis, redes de regulamentao

    etc.(LIPIETZ 1986 apud. HARVEY, 1989, p.117) que garante a unidade do processo, [...],

    a consistncia apropriada entre comportamentos individuais e o esquema de

    reproduo(LIPIETZ 1986 apud. HARVEY, 1989, p.117). Esse tipo de entendimento refora

    a anlise que nos ensina que os novos mtodos de trabalho so inseparveis de um modo

    especfico de viver e de pensar e sentir a vida (GRAMSCI 1989 apud. HARVEY 1989, p.

    117)

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    Harvey (1989, p. 121) ao iniciar sua anlise do Fordismo aponta como data inicial

    simblica [...] 1914, quando Henry Ford introduziu seu dia de oito horas e cinco dlares

    como recompensa para os trabalhadores da linha automtica de montagem de carros. Esse

    processo acabava por estruturar no apenas um novo trabalhador, mas tambm um novo tipo

    de homem, como aponta Gramsci (1989).Aps a crise da dcada de 1930 foi necessria a redefinio do papel que o Estado

    deveria exercer junto ao sistema de produo. Keynes propunha um conjunto de estratgias

    administrativas cientficas e poderes estatais que estabilizassem o capitalismo (HARVEY,

    1989, p. 124). Isso resultou em diferentes opes por parte das naes Estado para

    alcanarem arranjos polticos, institucionais e sociais que pudessem acomodar a crnica

    incapacidade do capitalismo de regulamentar as condies essenciais de sua prpria

    reproduo (HARVEY, 1989 p. 124).

    Nesse perodo no Brasil, Getlio Vargas alado a presidncia pela aliana entre asoligarquias dissidentes (mineiros, paraibanos e gachos) e os tenentes` revoltosos (jovens

    oficiais do Exrcito e da Marinha) (SILVIA, 1992, p. 35). Um dos efeitos da crise sentidos

    no pas advm da exportao de produtos agrcolas, como o caf, perdendo-se mercados em

    decorrncia das restries do consumo alimentar ou das outras prioridades da indstria

    mundial j bastante debilitada. (VIEIRA 1992, p. 85).

    No perodo de crise entre guerras, um dos fatores que impediu a disseminao do

    fordismo foi o estado das relaes de classe no mundo capitalista, pois este ainda no era

    propicio fcil aceitao de um sistema de produo que dependia tanto da familiarizao do

    trabalhador com as longas horas de trabalho extremamente rotinizadas [...] concedendo um

    controle quase inexistente do trabalhador sobre o projeto, o ritmo e a organizao do

    processo produtivo (HARVEY, 1989, p. 123). Outro fator estava na delimitao do modo de

    interveno estatal a ser materializado para responder a crise, definindo novos poderes e uso

    do Estado. Foi possvel vislumbrar uma reestruturao em meados da dcada 1940.

    Entretanto a constatao de que o fordismo havia alcanado uma suposta

    maturidade no implicava em equilbrio constante entre a interveno econmica por parte

    do mercado e do Estado. O perodo de 1965 a 1973 tornou cada vez mais evidente a

    incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradies inerentes do

    capitalismo (HARVEY, 1989, p. 135). Como contraponto a rigidez dos investimentos, do

    mercado e dos compromissos do Estado uma srie de novas experincias nos domnios da

    organizao industrial e da vida social e poltica comea a tomar forma (HARVEY, 1989, p.

    140).

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    A acumulao flexvel [...] marcada por um confronto direto com a rigidez dofordismo. Ela se apia na flexibilidade dos processos de trabalho, os produtos epadres de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produointeiramente novos, novas maneiras de fornecimento de servios financeiros, novosmercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovao comercial,tecnolgicas e organizacional (HARVEY, 1989, p. 140).

    Paralelo a esse processo que se deu em graus e modalidades variveis de pas para

    pas, aponta-se como fenmeno central o que no Brasil

    [...] diz respeito s burguesias e [...] seu processo de intensa subjetivao daacumulao de capital, da concentrao e da centralizao, cujo emblema eparadigma a globalizao, que expressa a privatizao do pblico, ou,ideologicamente, uma experincia subjetiva de desnecessidade, aparente, dopblico. (OLIVEIRA, 2000, p. 57)

    No Brasil, todo o esforo de democratizao, de criao de uma esfera pblica, de

    fazer poltica [...] decorreu quase por inteiro, da ao das classes dominadas (OLIVEIRA,

    2000, p. 60). Nesse sentido, a presena do neoliberalismo produziu um recuo das conquistas

    sociais histricas nas disputas por hegemonia. Oliveira (2000) acrescenta nessa anlise que o

    Estado de Bem-Estar havia produzido uma espcie de naturalizao das conquistas no

    sentido de que ao se tornarem praticamente universaisliberaram-se [...] de sua base material,

    vale dizer, das prprias classes trabalhadoras. O passo para [...] esgotar as energias utpicas,

    como abandono da militncia sindical e at mesmo da simples adeso ao sindicato (2000, p.

    57).

    O processo de privatizao dos espaos estatais produziu efeitos no apenas materiais

    nas estruturas organizacionais, mas principalmente conseqncias na construo de uma

    cultura democrtica de direitos. [...] enquanto que na grande maioria dos outros pases as

    privatizaes tiveram sentidos mui pragmticos, a subjetivao descrita uma privatizao

    da esfera pblica, sua dissoluo, a apropriao privada dos contedos do pblico e sua

    reduo, de novo, a interesses privados (OLIVEIRA, 2000, p. 58). A relao entre o pblico

    e o privado constituiu-se desde o incio do Estado brasileiro como turva ou imprecisa, oneoliberalismo veio complexificar ainda mais essa relao. Acaba-se por assistir a

    privatizao de diversos espaos e servios antes estatais [...] sem a correspondente

    publicizao do privado que foi a contrapartida, ou a contradio, que construiu o sistema do

    Estado do Bem-Estar(RANGEON 1986 apud. OLIVEIRA, 2000, p. 68).

    O neoliberalismo alm de desmontar os direitos sociais presentes, produziu a

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    ideologia oficial, a desmoralizao dos trabalhadores, de funcionrios pblicos, a

    desmoralizao da prpria funo pblica, o apontar tudo que pblico como inimigo de

    cada indivduo (OLIVEIRA, 2000, p. 74). Em outros termos, Oliveira (2000) aponta o

    neoliberalismo como a volta ao indivduo, ao reino do privado e ao consequente

    desmantelamento da institucionalidade contempornea que se forjou [...] sob o signo dasegurana, ao invs do signo do contrato mercantil (2000, p. 55).

    Dessa maneira, ao apresentar ainda que sinteticamente as caractersticas atuais do

    modo de produo capitalista percebe-se que ele se caracteriza sobretudo como uma relao

    social, ou seja, no se justifica apenas atravs de relaes econmicas de produo material,

    mas tambm define-se pela produo de modos de viver viabilizados, transmitidos e

    fortalecidos, em boa medida, atravs de Instituies. Nesse processo, a constituio do

    Estado assume papel central na manuteno da hegemonia burguesa utilizando-se das

    instituies como desdobramentos funcionais de seu poder, ao mesmo tempo em que se apianelas , tambm, reconfigurada pelo modo como operam. No Brasil, isso acompanhado de

    uma relao nebulosa entre pblico e privado como fator determinante das relaes em

    mbito institucional e a maneira como se reproduz, se estruturam e a quem serve as relaes

    de poder nestes espaos.

    O quadro acima, ainda que na sua forma esquemtica, apresenta aspectos relevantes

    na compreenso dos elementos constituintes de uma anlise institucional. A produo de uma

    anlise institucional exige que determinada instituio seja analisada enraizada no solo

    histrico do qual faz parte, isto , consider-la a partir de seus determinantes histricos. Isso

    no quer dizer o predomnio de uma anlise material da produo, o que poderia resvalar ao

    economicismo. Esse tipo de sobredeterminao, no limite, aponta a inutilidade de se realizar

    uma anlise institucional tendo em vista que tudo j estaria definido de antemo pela razo

    de ser do capitalismo.

    Dessa forma, as determinaes histricas revelam as causas, as justificativas, a quem

    ir servir; observar as requisies, as demandas, e ao mesmo tempo, sua organizao

    primria definindo a quem se destina no pode ser tomado como nica determinao. No

    caso do capitalismo esse cuidado torna-se imperativo, pois que ele funciona por inmeros

    pontos de agenciamento, sustentao, transmisso, apoiado por uma complexa trama

    institucional. Dessa forma, compe-se um desenho de elementos constituintes de uma anlise

    institucional atravs de sua imerso histrica na constituio do Estado brasileiro, associada

    ao sistema capitalista, compreendido por sua vez como um sistema capaz de gestar diversas

    formas de arranjos da vida social e formas organizacionais.

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    com a incorporao desses elementos, isto , com o reconhecimento da

    determinao estrutural do modo de produo capitalista aliado as questes do Estado, que

    surgem as primeiras obras no interior do Servio Social sobre as instituies.

    1 . 2 - A produo bibliogrfica acerca de Instituies no Servio Social.

    O espao institucional passa a ser duramente criticado no Servio Social a partir do

    processo conhecido como Movimento de Reconceituao que

    Lanou uma srie de crticas atuao tradicional do Servio Social, dentre elas ade que a prpria assistncia social contribua para a reproduo da opresso de umsistema de classes, uma vez que viabilizava a manuteno das desigualdades pormeio da execuo de polticas sociais que apenas administravam os conflitossociais sem resolv-lo de fato. No bojo dessas constataes se inserem as crticas de

    que as entidades de assistncia social, bem como outras organizaes institucionaisem que o servio social atua, colaboram para a consolidao do regime burgus(BISNETO, 2007, p. 39).

    Isso se d devido uma apreenso muito particularizada dos conceitos de aparelhos

    ideolgicos de Estado e aparelho repressivo do Estado, estas resultantes em parte, da

    corrente Althusseriana que encontrou na realidade poltica da sociedade brasileira, e da

    Amrica Latina, que vivia um forte processo repressivo-ditadorial, condies ratificadoras do

    conceito Aparelho Ideolgico de Estado. Este dilema acabou por ser [...] superado pelo

    debate posterior, que reconheceu serem as polticas sociais e as instituies reflexos darelao de foras entre as classes sociais e formulou propostas para o Servio Social atender

    melhor os trabalhadores, mesmo na vigncia dessa contradio (BISNETO, 2007, p. 39).

    O processo de renovao1 do Servio Social brasileiro constitui-se como elemento

    catalisador das alteraes nas propostas de exerccio profissional, pluralismo terico e

    poltico que ocorreram em meados das dcadas de 1960 1980 no seio profissional. Anterior

    a esse perodo, o Servio Social

    mostrava uma relativa homogeneidade nas suas projees interventivas, sugeriauma grande unidade nas suas propostas profissionais, sinalizava uma formalassepsia de participao poltico-partidria, carecia de uma elaborao terica

    1 Segundo Netto: Entendemos por renovao o conjunto de caractersticas novas que, no marco dasconstries da autocracia burguesa, o Servio Social articulou, base do rearranjo de suas tradies eda assuno do contributo de tendncia do pensamento social contemporneo, procurando investir-secomo instituio de natureza profissional dotada de legislao prtica, atravs de respostas ademandas sociais e da sua sistematizao, e de validao terica, mediante a remisso s teorias edisciplinas sociais (1998, p.131).

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    significativa e plasmava-se numa categoria profissional onde parecia imperar, semdisputas de vulto, uma consensual direo interventiva e cvica (NETTO, 1998, p.128).

    Necessrio ressaltar que o Movimento de Reconceituao no possuiu uma nica

    vertente, ao contrrio, constituiu-se como um movimento heterogneo. Esse processo de

    renovao configura um movimento cumulativo, com estgios de dominncia terica-

    cultural e ideopoltica distintos, porm entrecruzando-se e sobrepondo-se(NETTO, 1998, p.

    152) podendo assim identificar, entre as principais linhas do desenvolvimento da reflexo

    profissional, a perspectiva modernizadora2, a reatualizao do conservadorismo3e a inteno

    de ruptura4. Em um contexto nacional, o movimento de reconceituao, mas especificamente

    na perspectiva de ruptura, possibilitou aproximao de questes

    Referentes dinmica contraditria e macroscpica da sociedade, apanhadas numaangulao que pe em causa a produo social (com nfase na crtica da economia

    poltica), que ressalta a importncia da estrutura social (com o privilgio da anlisedas classes e suas estratgias), que problematiza a natureza do poder poltico (com apreocupao com o Estado) e que se interroga acerca das especificidades dasrepresentaes sociais (indagando-se sobre o papel e as funes das ideologias). [...]E precisamente a partir de suas matrizes que se pde colocar o rol de inquietaesrelativas ao processo histrico do Servio Social, sua relao com as estratgias declasses e poder condensado no Estado, sua articulao com as vrias construesideolgicas e seu processamento como prtica profissional no mbito de instituiessociais determinadas. A requisio que dela derivou a do assistente social comoum tipo particular de intelectual colaborou decisivamente para girar a face doprofissional, propondo-o, ademais de um agente tcnico especializado, como umprotagonista voltado para o conhecimento dos seus papis sociopolticos eprofissional, envolvendo exigncias tericas mais rigorosas (NETTO, 1998, p. 302-303).

    Particularmente, no que se refere as anlises sobre instituio providenciadas pela

    categoria profissional, o processo de renovao do Servio Social no Brasil na poca da

    ps-Reconceituao contou com crticas advindas dos movimentos institucionalistas de

    diferentes matizes para alimentar o chamado debate contemporneo (BISNETO, 2007, p.

    39) sendo que a anlise acerca do exerccio profissional do assistente Social em instituies

    2 Um esforo no sentido de adequar o Servio Social, enquanto instrumento de interveno inserido noarsenal de tcnicas sociais a ser operacionalizado no marco de estratgias de desenvolvimentocapitalista, s exigncias postas pelos processos scio-polticos emergentes no ps-64 (NETTO,

    1998, p. 154).3 Trata-se de uma vertente que recupera os componentes mais estratificados da herana histrica econservadora da profisso, nos domnios da (auto) representao e da prtica, e os repe sobre umabase terica-metodolgica que se reclama nova, repudiando, simultaneamente, os padres maisnitidamente vinculados tradio positivista e s referncias conectadas ao pensamento crtico-dialtico, de raiz marxiana(NETTO, 1998, p. 157).

    4 Ao contrrio das anteriores, esta possui como substrato nuclear uma crtica sistemtica aodesempenho tradicional e aos seus suportes tericos, metodolgicos e ideolgicos. Com efeito, elamanifesta a pretenso de romper quer com a herana terica-metodolgica do pensamentoconservador (a tradio positivista), quer com os seus paradigmas de interveno social (NETTO,1998, p. 157).

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    era preponderante.

    A busca pela compreenso crtica do exerccio profissional, enquanto agente

    institucionalizado e as implicaes no espao organizacional onde se insere, pode ser

    apontado como fruto dessa acentuada efervescncia experimentada pela profisso neste

    perodo no que concerne a relao entre Instituio Profissional.Dessa forma, com o objetivo de apresentar os aspectos que prevaleciam na

    bibliografia profissional destinada as instituies prope-se a exposio de trs livros que

    refletem a inquietao em torno desta relao e apresentam chaves analticas significativas

    compreenso da anlise institucional. Todas as obras escolhidas so de meados da dcada de

    1980 e trazem discusses, principalmente acerca da prtica profissional institucionalizada e

    da insero dos assistentes sociais nos espaos institucionais. Nas obras comparecem tambm

    aspectos sobre a clientela do Assistente Social, o movimento de reconceituao enquanto

    definidor de novas possibilidades terico-prticas, interpretaes conceituais variadas sobre oEstado e o papel das instituies enquanto funcionais manuteno da ordem hegemnica.

    O primeiro a ser apresentado tem como ttulo A Prtica Institucionalizada do Servio

    Social, de autoria de Rose Mary Sousa Serra, publicado em 1983. Em sua pesquisa a autora

    utilizou um frum de debate entre profissionais de Servio Social e, a partir do registro de

    suas falas, analisou trs categorias principais: Estado, Instituio e Prtica Profissional

    Institucionalizada.

    O segundo Servio Social e Instituio A Questo da Participao de Maria

    Luiza de Souza, publicado em 1982. Nesse livro tem-se a anlise do Servio Social enquanto

    instituio e a prtica dos profissionais nos diferentes espaos em que se inserem, e quem a

    clientela da profisso.

    No terceiro livro Saber Profissional e Poder Institucional, escrito por Vicente de

    Paula Faleiros, publicado em 1985, encontram-se textos elaborados no perodo de 1979

    1984, sendo os seguintes temas tratados: poltica social, saber profissional, espao

    institucional, servio social nas instituies, entre outros.

    A seguir ser, simplesmente, apresentada as idias trazidas por esses autores,

    organizadas nos livros acima, para posterior anlise dos elementos preponderantes na

    compreenso de como as instituies aparecem na bibliografia profissional no perodo

    escolhido.

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    1.2.1 A Prtica Institucionalizada do Servio Social (Rose Mary Sousa Serra)

    Na introduo do livro A Prtica Institucionalizada do Servio Social, Serra (1983,

    p. 17) escreve que o objetivo geral de sua pesquisa refletir sobre as determinaes da

    prtica institucionalizada do Servio Social, e o objetivo especfico identificar as

    possibilidades da prtica profissional institucionalizada articulada aos movimentos

    populares. O interesse neste tema advindo da prtica concreta, tanto no exerccio

    profissional como na atividade pedaggica lecionando como professora de Servio Social.

    Uma questo levantada inicialmente era como ser coerente com o projeto de transformao

    da sociedade no interior das instituies, sabendo que estas possuem como objetivo fundante

    a reproduo das relaes de produo. Alm disso, [...] era percebida uma contradio

    entre a prtica que se pretendia encaminhar e os elementos tericos que eram adotados como

    referncia. (1983, p. 15).Partindo de pressupostos diretos do exerccio profissional, compreende-se a

    inexistncia de um nico Servio Social constitudo por princpios universais que norteiem

    sua ao de forma homognea. No que tange a prtica profissional institucionalizada so

    identificadas trs posicionamentos dos profissionais de Servio Social

    O primeiro deles v a instituio de maneira acrtica e ingnua, que resulta numaprtica conformista e atrelada ao poder vigente. A segunda postura entende que ainstituio um bloco monoltico, que a mesma est vinculada somente ao sistemade poder, o que implica a busca de espaos de prtica transformadora fora doaparelho institucional. A terceira posio concebe a instituio como um espaocontraditrio, que supe a possibilidade de nele ser travada, uma luta, no sentido dealterar as relaes institucionais (1983, p. 16).

    A partir desse entendimento, Serra (1983) se prope a analisar trs eixos principais:

    Estado, Instituio e Prtica Profissional Institucionalizada para, atravs destes, relacionar o

    exerccio profissional nos espaos institucionais, ressaltando a caracterizao do Estado

    como essencial para que se situe as instituies no quadro da superestrutura. No que

    concerne ao desenvolvimento da pesquisa, realizou-se um frum de debate5, utilizou-se a

    fala das participantes e, posteriormente, a anlise de seus discursos.

    A problematizao do Estado, realizada pela autora, apresenta trs referencias

    principais: o Estado de Bem-Estar, a concepo de Estado no marxismo clssico, e por fim, a

    5 Realizado de 27 de outubro a 4 de novembro de 1981 no Rio de Janeiro por uma das comisses detrabalho do CRAS 7 Regio. Contou com a participao da coordenao da ABESS RegionalLeste. Com o objetivo de oportunizar a discusso em torno da prtica profissional e a articulao queest realiza com profisses atravs de exposio de conferencistas e debate aberto ao plenrio.Participaram 80 Assistentes Sociais, 91 alunos de Servio Social e profissionais de outras reas.

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    concepo de Estado Ampliado fundamentado na teoria de Gramsci.

    De maneira sucinta ao caracterizar o Estado de Bem-Estar, Serra (1983, p. 21) o

    descreve como um rbitro que atua acima dos conflitos sociais compreendendo como

    essencial a este o princpio de consenso, pois viabiliza a neutralizao dos movimentos

    sociais, objetivando manter inalterado o sistema hegemnico. Como meio para atendimentodas necessidades da populao utiliza-se de polticas sociais, da a criao das instituies

    estatais com a finalidade explicita de instrumentalizar os objetivos do Estado(1983, p. 22).

    A compreenso de Estado fundado no marxismo clssico define-o como um rgo

    de dominao de classe, um rgo de submisso de uma classe por outra, a criao de uma

    ordem que legaliza e consolida essa submisso, amortecendo a coliso de classes (LNIN

    1979 apud. SERRA, 1983, p. 22). O Estado visto como um bloco monoltico que atende

    aos interesses da classe dominante e como instrumento de domnio de uma classe sobre a

    outra. Dessa forma, as polticas sociais so uma expresso exclusiva dos interesses da classedominante, no havendo lugar, nem espao, para a defesa e incorporao dos interesses da

    classe dominada (SERRA 1983, p. 23), conseqentemente as instituies no atenderiam

    aos interesses da classe dominada, sendo apenas expresses dos interesses diretos da classe

    dominante.

    Desenvolvida por Gramsci, a concepo de Estado Ampliado parte do conceito de

    Bloco Histrico para compreenso da formao social. O Bloco Histrico teria a seguinte

    composio: estrutura ou infra-estrutura - como sociedade econmica, e superestrutura -

    composta por duas esferas: a sociedade poltica, que o aparelho de Estado e a sociedade

    civil, maior parte da superestrutura (PORTELLI 1977 apud. SERRA, 1983, p. 25). A relao

    entre os dois nveis superestruturais configura uma unidade dialtica entre consenso e fora.

    um vnculo orgnico e exatamente essa vinculao orgnica da sociedade civil e poltica

    que fundamenta a ampliao do conceito de Estado em Gramsci (SERRA, 1983, p. 25). Isso

    corrobora com a idia de que o Estado no seria um mero reflexo da classe dominante,

    possuindo autonomia e agregando em certos momentos a vontade das classes dominadas,

    como resultado das correlaes de foras que se manifestam na sociedade. Entretanto o

    Estado produz consenso por via de processos educacionais, legitimando a ideologia

    originria da hegemonia dominante, contribuindo para que a classe dominada reconhea

    como seu os interesses da classe dominante. Este processo viabilizado pelas diversas

    instituies constituintes da sociedade civil e sociedade poltica.

    Serra (1983) alega que os trs modelos de Estado exposto possibilitam distintas

    propostas de prtica profissional institucionalizada e perfis profissionais compatveis a estas.

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    A primeira delas fundada na definio de Estado como Bem-Estar e de instituiocomo Aparelho Funcional. Os profissionais adeptos dessa posio acreditam quetm uma prtica profissional acima dos conflitos dos grupos sociais, em razo desua viso ingnua da sociedade de classes e de sua concepo acrtica das relaessociais. Possuem tambm uma viso factual e casustica da realidade e nessesentido, as instituies de bem-estar social significam instrumentos adequados desoluo dos problemas sociais, numa viso parcial e setorizada. Desta forma,legitimam, conscientemente ou no, a criao de instituies para desempenharfunes especficas no atendimento de cada problema social, em consonncia,portanto, com a viso retalhada e setorizada da realidade social (1983, p. 37).

    Ao descrever o exerccio desse perfil profissional usa-se o termo acomodao como

    palavra-chave para compreender o fatalismo que orienta sua prtica por no visualizar

    mudanas de nenhum aspecto na estrutura das instituies. Esse profissional adere as

    determinaes institucionais e as reconhece como legitimas, ao mesmo tempo em que se

    considera como sujeito sem autonomia profissional.

    A concepo seguinte refere-se prtica profissional na definio de Estado como

    Instrumento e de Instituio como Aparelho de reproduo da fora de trabalho e das

    relaes sociais.

    Os profissionais partidrios dessa concepo consideram as instituies comoaparelhos de Estado que produzem as relaes de dominao e esto a servio tosomente da classe dominante. Vem as instituies como bloco monoltico, sem apossibilidade de sofrer qualquer interveno sob a tica de transformao dasrelaes de poder na sociedade. Para estes profissionais, a opo tem sido umaprtica transformadora totalmente fora das fronteiras institucionais e, muitas vezes,com carter poltico partidrio. Nesse sentido, o Estado visto como mecanismo decontrole e as instituies como instrumentos somente a servio do Estado (SERRA,1983, p. 38).

    Por outros meios, mas a exemplo do perfil anterior, esse profissional assume uma

    postura fatalista, nega os espaos institucionais como legtimos viabilizadores de

    possibilidades, no exerccio profissional, visando transformao social. Por fim, o terceiro

    perfil em torno da prtica profissional oriunda da concepo de Estado Ampliado e de

    Instituio como Aparelho Contraditrio

    Os profissionais adeptos dessa concepo consideram a prtica institucional dentrode uma viso ampla e dinmica da realidade. Admitem as instituies comoaparelhos de Estado, cuja funo precpua a execuo de polticas sociais com oobjetivo principal de manter os interesses da classe dominante. Consideram,contudo, que as instituies incorporam, necessariamente, as demandas dos gruposdominados como resposta correlao de foras de grupos sociais. Nessa direo,esses profissionais identificam que as instituies, ao incorporarem os interesses dasclasses subalternas, do margem, neste confronto, viabilizao da transformaode suas estruturas de poder atravs da luta conjunta da clientela instituda, dosprofissionais de Servio Social e de outros grupos institucionais, tendo comosuporte a conjuntura social, expressa nas lutas mais amplas da sociedade (SERRA1983, p. 38).

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    Esses profissionais reconhecem no espao institucional uma forma de articular os

    interesses das lutas presentes na dinmica da realidade, tencionando assim as contradies

    sociais ao privilegiar, via instituies, as demandas das classes dominadas. Essas mesmas

    contradies so inerentes aos espaos institucionais, e podem ser observadas no

    comportamento dos sujeitos que impem e ditam normas num processo de correlao deforas com aqueles que exercem a prtica institucional. Essa correlao de foras no se

    pauta pela simples disputa de cargos institucionais e situaes de mando, mas so decorrentes

    de determinada direo social que a instituio deve assumir. Por essa razo a importncia de

    centrarmos a anlise da instituio nos sujeitos envolvidos em seu interior, segundo Serra

    (1983) seriam esses:

    - de um lado, aqueles que estamos chamando de instituintes, isto , os responsveisdiretos pela instituio; os que mandam ou delegam poderes e - de outro lado, os

    que denominamos agentes institudos, que podem ser considerados sob dupladimenso: primeiro, os agentes que podem ser chamados de subordinados, ou seja,os profissionais e os funcionrios intermedirios; segundo a clientela efetiva ou empotencial para s-lo (1983, p. 39).

    Para que se perceba como se d a relao entre os diversos agentes institucionais

    junto aos movimentos da sociedade civil, no que tange resistncia ou prtica contra-

    institucional, necessrio delimitar os dois grupos principais neste processo: os instituintes

    ou o poder institucional e, os grupos institudos ou os agentes subalternos e a clientela. Esse

    embate dos plos institucionais verificvel atravs de certos determinantes extra-

    institucionais.

    O primeiro deles so as contradies internas da classe dominante, o que configurauma situao no-linear da questo do poder e da sua distribuio. O segundoaspecto so as contradies fundamentais da classe dominante com as classessubalternas, o que caracteriza, a priori, uma situao de conflito de interesses. OTerceiro aspecto, [...], a correlao de foras que se d entre a classe dominante eas classes subalternas, a partir de diferentes conjunturas sociais (1983, p. 39).

    Sendo a prtica institucional resultante das prticas conflitantes dos diversos sujeitos

    envolvidos, precisa-se analisar a prtica do agente profissional por, ser este, o mediador da

    prtica institucional quando a instituio convidada a intervir junto a realidade dos seususurios, sendo o profissional aquele que efetiva e concretiza os benefcios e os servios das

    instituies (1983, p. 40). Segundo Serra (1983), evidencia-se a posio do intelectual

    orgnico, no que se refere ao desempenho de seu papel ligado a classe dominante, ele se

    torna o representante institucional e, em relao funo do intelectual orgnico, vinculado

    s classes subalternas, ele assume a defesa dos interesses dessas classes (SERRA 1983, p.

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    40). E configura-se uma relao institucional na qual se identifica como fator relevante a

    alterao dessas mesmas relaes, de modo que os sujeitos institudos deixem de ser os

    executantes da lgica burocrtica-funcional da instituio. Os grupos instituintes podem

    tambm colocar-se ao lado dos grupos institudos, assumindo propostas de mudanas no

    interior das instituies em que atuam.O profissional cotidianamente acaba por se colocar entre as demandas de seus

    usurios e as determinaes das instituies, sendo que estas muitas vezes definem os meios

    de interveno, bem como as modalidades de prtica profissional. Essa condio do trabalho

    profissional nem sempre percebida pelo usurio como limites interveno profissional e,

    tambm, como obstculo ao atendimento de sua demanda. A necessidade de o profissional

    compreender essa dicotomia entre a prtica profissional proposta por parte da instituio, e as

    carncias apresentadas pelos usurios, pode levar o assistente social a construir saberes

    norteadores de prticas que resguardem sua relativa autonomia.Quanto a prtica profissional, outro fator analisado o saber institucional assumido

    na retrica profissional, ou seja, o profissional utiliza o saber como algo apropriado da

    instituio e que por isso mesmo legitimo e, portanto, irrefutvel, porque produto de uma

    instncia competente, no caso a instituio proprietria do mesmo. (SERRA, 1983, p. 42).

    Assim, o compromisso do profissional junto ao usurio e a sociedade atrelam-se aos

    objetivos institucionais. Por apresentar-se como exmio executor do saber institucional, o

    Servio Social assumiu historicamente uma no propriedade terica, tendo o seu saber,

    enquanto profisso, determinado pelo Estado e voltada para a execuo das polticas sociais

    nas instituies (SERRA 1983).

    Para Serra (1983) necessrio identificar no interior da profisso, em sua relao

    com as classes dominadas, um possvel potencial de reao institucional, na medida em que,

    em funo de sua ideologia e por presses da clientela, possa imprimir novas

    intencionalidades sua prtica, colocando-se ao lado das classes dominadas, tendo em vista a

    alterao das relaes de poder (1983, p. 44).

    O Frum de Debate, utilizado como etapa da pesquisa, teve dois eixos principais:

    - nas relaes entre a prtica profissional com o aparelho institucional e o contextosocial, passando pela caracterizao da natureza e funes desses trs componentes- na prtica profissional institucionalizada e sua articulao com os movimentospopulares, passando pela relao com a organizao da categoria. (1983, p.51).

    A partir das referncias e das citaes diretas, apresentadas nas falas dos participantes,

    levantou-se a compreenso e os posicionamentos dos profissionais sobre o Estado, a

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    Instituio e a Prtica Profissional Institucionalizada.

    Percebe-se que o Estado, entre os trs, foi o que apresentou menos referncias, as

    poucas que ocorreram normalmente apresentavam confuses conceituais.

    O tema Instituio teve um debate mais significativo. A compreenso da Instituio

    como aparelho funcional no foi nenhuma vez citada o que sugere que aquela idia de queas instituies cumprem funes sociais em respostas aos diversos problemas da sociedade j

    no se constitui como uma tnica no pensamento dos profissionais [...] participantes do

    Frum de Debates (1983, p. 55). A compreenso da Instituio como aparelho de

    reproduo da fora de trabalho e das relaes sociais foi mais recorrente, os profissionais

    consideram as instituies na estrutura do sistema social vigente e, como conseqncia, a

    servio das classes que detm o poder (1983, p. 56). Contribuem assim, sem resistncia, a

    manuteno da hegemonia ao compreender o espao institucional como mera manuteno do

    status quo social, recusando qualquer proposta de alterao em suas relaes de poder.A compreenso da Instituio enquanto aparelho contraditrio possuiu maior

    representatividade nos debates demonstrando ser um tema com maior relevncia para os

    participantes, ao citarem, por exemplo, os programas em que os profissionais atuam j que

    estes, para Serra (1983), so a traduo mais concreta e efetiva das polticas sociais

    executadas nas instituies que viabiliza uma aproximao significativa entre o Assistente

    Social e a clientela.

    Prtica profissional institucionalizada foi responsvel pela maior parte das discusses,

    atravs dela foi possvel perceber um domnio por parte dos profissionais no que tange a

    prtica profissional, da natureza de seus atrelamentos, de seus entraves e [...] das

    articulaes que a prtica profissional precisa ter com as demais prticas sociais para que o

    Servio Social possa contribuir para o processo de transformao social. (SERRA 1983, p.

    60).

    A respeito dos debates desse tema foi possvel delimitar trs compreenses

    recorrentes da prtica profissional. Uma dessas a articulao da prtica profissional junto a

    sociedade, carregada de ingenuidade terica em que se evidencia uma perspectiva tecnicista e

    de modernizao com ausncia de anlise acerca dos determinantes estruturais e,

    conseqentemente, das solues coletivas que geram as transformaes sociais.

    Entende-se que a prtica profissional institucionalizada, articulada classe

    dominante, no apenas hospeda-se no aparelho institucional, mas justifica-o e o aperfeioa.

    Os sujeitos da pesquisa de Serra (1983, p. 62) compreendem o [...] profissional vinculado

    classe dominante, sendo o instrumento de repasse da ideologia e mantenedor do sistema.

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    Outros profissionais assumem em sua fala a no possibilidade de transformao social no

    mbito das instituies, outro profissional cita as favelas e comunidades como espaos onde

    se pode viabilizar um verdadeiro exerccio profissional sem controle por parte das

    instituies. Isso fica mais evidente quando um profissional cita o trabalho do assistente

    social em uma perspectiva classista, entendendo inclusive a posio desse profissional comodirigente e como intelectual orgnico vinculado a classe operria. (SERRA 1983).

    O ltimo item apresentado a prtica profissional articulada aos movimentos

    populares. possvel relacionar essa compreenso a conjuntura poltica nacional daquele

    momento bem como ao prprio estgio de desenvolvimento profissional, em que:

    A questo do compromisso do profissional com as camadas populares um dosprincpios de orientao prtica do Servio Social, levantado pelo Movimento deReconceituao. Em relao ao movimento de renovao do Servio Social dosanos recentes, h uma diferena qualitativa, ao nvel terico, na concepo de luta

    poltica, quanto a explicitao desse compromisso e nas formas de articulao dasdiversas prticas sociais. (1983, p. 65).

    Foram recorrentes as discusses sobre o profissional enquanto um intelectual no

    tocante a posicionamentos pessoais enquanto ser poltico e profissional. Como exemplo

    reproduzo um depoimento

    ...Esta sociedade tem duas grandes classes. Qual o interesse que a gente estdefendendo? ... Para mim, esse negcio de ideologia meio confuso, muitocomplicado. Por outro lado, o que significa ser intelectual? Onde ele est inserido?Economicamente, voc est proletarizado; ideologicamente, est com valores dapequena burguesia. Ento, como fica a situao do assistente social? (1983, p.65).

    Ao problematizar o profissional enquanto proletrio com valores burgueses percebe-

    se uma referncia, mesmo que incipiente, ao Intelectual em Gramsci. Identifica-se a

    vinculao do assistente social com as classes populares e a tendncia de se polarizar a

    prtica na defesa de uma classe social antagonicamente a outra. No digerir o aspecto

    contraditrio da insero profissional resulta em uma aparente crise de identidade sem saber,

    por fim, como fica a situao do assistente social no contexto institucional.

    O saber profissional debatido quando questionado a ideologia adotada pelosprofissionais no processo de formao por um comprometimento com a ideologia burguesa.

    identificada, tambm, a importncia das categorias de anlise para orientar a prtica do

    Servio Social e os interesses e necessidades das classes populares. A organizao poltica

    por parte da categoria profissional, aliada aos movimentos sociais tambm essencial ao

    processo de legitimidade e reconhecimento dos interesses da classe dominada.

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    1.2.2 Servio Social e Instituio A Questo da Participao (Maria Luiza de Souza)

    Neste livro, parte-se da compreenso do Servio Social enquanto instituio e sua

    insero no mbito scio-ocupacional para discutir a participao do profissional nestes

    espaos e a clientela enquanto fora determinante da institucionalizao da profisso. O

    material utilizado como fonte de pesquisa foram atividades realizadas em cursos, seminrios

    e palestras junto a Assistentes Sociais em diversos Estados entre os anos 1979 a 1981. A

    proposta em torno dessas atividades era refletir a significao social da prtica profissional

    e, perante a realidade dessa prtica, as alternativas de ao com vistas ao desenvolvimento

    social da populao cliente. (SOUZA 1982, p. 10). Dessa forma a autora tenta compreender

    aquele que seria o objeto de trabalho do Assistente Social, analisando como se d a insero

    da clientela do Servio Social no mbito das instituies e como os profissionais atuam

    enquanto agentes institucionalizados.O Servio Social enquanto prtica institucionalizada deve redefinir constantemente

    sua ao junto a clientela para que atenda as demandas que se expressam atravs de seus

    problemas, definidos institucionalmente, cujo limite de resoluo se d determinado pelos

    mecanismos tambm institucionais. Dessa forma, o estudo da clientela tem a ver com este

    processo de demanda que se expressa atravs dos problemas institucionalmente

    definidos(1982, p. 16). pela soluo de uma problemtica que algum se torna cliente de

    uma instituio. O estudo da clientela do servio social, [...] o estudo da

    institucionalizao da sua problemtica(1982, p. 16) visando a possibilidade de redefiniesda prtica institucional em razo das novas demandas surgidas. O trabalho, educao, cultura,

    moradia e transporte so identificados como aspectos caractersticos da problemtica da

    clientela.

    Nos termos de Souza (1982) a clientela mais comum aos assistentes sociais a

    desempregada ou subempregada, que acessam as instituies pblicas e privadas de

    assistncia social. Dentre os empregados encontram-se aqueles que utilizam habilidades

    mecnicas, manuais e desvalorizados em termos de salrio. A moradia se constitui como um

    problema significativo da clientela do Servio Social, devido residirem em locais semequipamentos sociais bsicos vinculados a sade e a educao, por exemplo; concomitante a

    isto os centros de emprego concentram-se em reas distantes o que acaba gerando outro

    problema: o escasso transporte para os locais com oportunidades de trabalho. Esta

    populao, nas condies fsicas em que vive, no tem realmente sade, higiene,

    alimentao, diverso, capazes de fazer com que acompanhe as regras de normalidade social

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    (1982, p. 18). Ainda tratando disso, as prticas que se mediatizam atravs de recursos

    assistenciais necessariamente no so apontadas como prticas profissionais, pois se

    compreende que estas se materializam atravs da palavra aliada a tcnicas diversificadas.

    Quer dizer, segundo Souza (1982, p. 18)

    Ainda com essa caracterstica comum de ajustamento, as prticas de Servio Socialque se mediatizam atravs dos recursos assistenciais so comumente caracterizadascomo prticas assistenciais; e as que se mediatizam dominantemente sobretudoatravs do recurso da palavra aliada a tcnicas diversificadas so comumentecaracterizadas como prticas de Servio Social propriamente ditas.

    Em contrapartida o profissional muitas vezes no possui uma leitura apurada da

    problemtica a qual a clientela est inserida, e ao saber que este, por exemplo, ao invs de

    consumir o medicamento adquirido via assistncia o vendeu, para adquirir outro bem, no

    consegue associar a isso as condies materiais existentes na realidade da clientela. O fato

    que o cliente muitas vezes privilegia a soluo que ele vislumbra para si e no aquela

    apresentada pelo profissional. (SOUZA 1982). Ou seja, a viso da populao sobre os seus

    problemas se define em torno das necessidades imediatas e do crculo das relaes que

    mantm. (1982, p. 20). Quando o profissional se posiciona de forma a definir enquanto

    incapacidade as diversas carncias por parte de sua clientela acaba por evidenciar, da parte do

    prprio profissional

    [...] desconhecimento dos problemas causados pelo lugar que essa populao ocupano processo produtivo, o qual no foi uma deciso prpria; desconhecem-se

    tambm as consequncias da no-participao dessa populao no controle dosmeios de produo, na propriedade desses meios e no seu produto final. (1982, p.18).

    Souza (1982) escreve que a organizao institucional viabiliza clientela o acesso ao

    servio social. A populao procura a organizao em busca de servios como sade, lazer,

    creche, instruo, capacitao de mo-de-obra, etc., ou de alguns bens materiais como

    alimentos, remdios, material de construo etc. (1982, p. 39). A instituio media o acesso

    a esses servios e o Servio Social quem orienta, encaminha e destina essas demandas.

    Quando se trata de um cliente do Servio Social que se constitui enquanto fora

    produtiva de uma empresa, e o atendimento do assistente social se d via organizao

    empregadora privada, ao se diagnosticar que as normas destes espaos no esto sendo

    cumpridas aciona-se o profissional de Servio Social, quer dizer,

    Como a inobservncia ou o descumprimento dessas normas interpretada comoquesto de incapacidade, ignorncia ou de deficincias de condies de bem-estarsocial desses agentes de nvel inferior, o Servio Social se instala como servio

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    complementar em funo da disciplina e do bem-estar social desses agentes daorganizao. (SOUZA 1982, p. 39)

    Essa relao ao Servio Social, tambm, se concretiza nos espaos de servios de

    bem-estar social, por via das organizaes encarregadas da transmisso de idias, normas e

    valores sociais (famlia, escola, tribunais, etc.). Como a no-observncia com estas mesmasnormas e valores, por parte da clientela, visto como impeditivo ao usufruto do bem-estar

    social, o Servio Social deve atuar visando a reparao dessas deficincias. A este nvel a

    populao que mais apresenta problemas a desempregada, subempregada ou empregada

    cujo salrio revela baixo poder aquisitivo (SOUZA 1982).

    Na relao com as organizaes e a populao, ou nos servios de bem-estar social e

    populao

    [...] o Assistente Social o agente institucional que fala em nome dos informes que

    dizem sobre as condies gerais de funcionamento da organizao, e predisposiesnecessrias populao para que esta assuma as demais condies de normalidadeque dirigem os propsitos da organizao e orientam mais profundamente osaspectos gerais e a importncia de observ-los. As demais condies denormalidade em seus aspectos especficos so acionados por outros diferentesagentes funcionais o mdico, o professor, o advogado, o sanitarista, o engenheiro,etc. (SOUZA 1982, p. 40)

    Dessa forma o Servio Social se torna profisso institucionalizada no apenas por ser

    operada em uma organizao, mas por ter suas funes definidas para a relao de

    intermediao entre ela e a populao e visto ainda neste contexto enquanto profissional

    privilegiado no que trata da relao com os clientes.Quanto a formao das instituies, a autora as coloca como resultado da necessidade

    de controle e ao sobre um problema social e da constituio de uma sociedade calcada

    em diferenas de classes e na diviso social do trabalho onde, gradativamente, precisa-se

    criar formas de reger essa diferenciao principalmente a partir das sociedades capitalistas

    que alguns grupos, apropriando-se dos bens sociais e instrumentos de trabalho passam a

    reivindicar-lhe o domnio. Ora, reivindicar criar normas, leis, padres, valores que

    legitimem essa apropriao (1982, p. 40). Segundo Souza (1982, p. 40), [...] a ascenso da

    burguesia traz consigo o desenvolvimento e ampliao das instituies sociais, porque oscaminhos institucionais so instrumentos bsicos para a reproduo de sua estrutura de

    relaes..

    As instituies enquanto conjunto de saberes (normas, valores, ideologias) so

    elementos fundamentais dos estudos de Durkheim, que compreendia a diviso social do

    trabalho como fenmeno em si carente de significao.

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    Para Durkheim a institucionalizao transforma as diferenas provenientes dadiviso social do trabalho em relaes estveis e previsveis e, como conjuntoarticulado de normas e valores representativos da conscincia coletiva, se tornamum fenmeno moral; estes indicadores de fins a atingir, no devem ser fontes decoero, mas de respeito. A conscincia coletiva que se expressa atravs dosvalores, crenas e sentimentos comuns aos membros da sociedade, independentedas condies particulares em que os indivduos se encontram situados. (SOUZA

    1982, p. 41).

    Ou seja, valores, sentimentos e crenas eram importantes sedimentos necessrios a

    coeso social, de modo a provocar uma vinculao duradoura entre os indivduos e a

    sociedade. Esse partilhamento cultural poderia ser enfraquecido, conforme Durkhein, pela

    diviso social do trabalho, medida que os indivduos sobrepusessem interesses particulares

    em detrimento da ordem e do bom funcionamento social.

    Entender as instituies [...] entender o processo histrico que as produziu.Conforme foi dito, as instituies surgem sempre a partir de determinadas

    demandas. Como no confronto entre classes, os grupos privilegiados tm maispoder para fazerem valer as suas demandas que emergem como instituies,mescladas a supostos interesses dos demais grupos sociais. Assim, so aceitos pelacoletividade que se cr protegida contra alguns obstculos vivenciados. Valores,normas e ideologias, assim como prticas sociais institucionalizadas, tm, pois, estecarter que em geral esconde a defesa especfica da ordem social assumida comofuno principal. por isto que esse carter formal e de neutralidade precisa serpenetrado para que as reais determinaes das instituies sejam conhecidas.(SOUZA 1982, p. 42).

    Necessrio apontar ainda no que trata a reproduo da vida social atravs das idias,

    normas padres e valores disseminados pelas instituies o seu nvel de operacionalizao,

    seus meios de penetrao, observncia e realizao por via das organizaes. Estas so:

    Como engrenagens criadas pela sociedade como meio de operacionalizao doselementos institucionalizados. Como tal, o conceito de organizao tem a ver com oconceito de instituio. Se as instituies se elaboram na dinmica social, asorganizaes so como que uma aparelhagem para efetivao das funesinstitucionais. Instituio e organizao so instncias diferentes de uma mesmarealidade. Na instncia organizacional, identifica-se um conjunto de meios para arealizao dos valores e objetivos que identificam a instncia da instituio. Taisinstncias colocam-se como realidades concretas a partir das determinaes sociaisque as constituem (SOUZA 1982, p. 43).

    Souza (1982) referencia Guilhon (1978) ao afirmar que [...] uma instituio s existe

    na prtica de seus atores institucionais, a qual consiste em intervir nas relaes sociais

    submetidas soberania da instituio GUILHON 1978 (apud. SOUZA 1982, p. 44). O

    assistente social, como ator institucional, tambm artfice institucional atravs de sua

    prtica. Ao entender o papel do Assistente Social enquanto interventor nas relaes sociais

    que refletem o status quo da sociedade h de se evitar dois obstculos na efetivao da

    prtica profissional que so:

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    Um primeiro diz respeito a reduo da prtica profissional a mero epifenmeno dasinstituies...os profissionais nada mais podem fazer do que `aplicar`conhecimentos gerados a sua revelia. O outro obstculo uma inverso doprimeiro, pressupondo a autonomia absoluta dos atores concretos em relao sinstituies [...] distingue (se) como atores institucionais os agentes institucionais, omandante, a clientela, o pblico e o contexto institucional. [...] O Assistente Socialest entre os agentes institucionais e, assim, o produto das inter-relaes entre osdemais agentes e atores. Neste sentido, a dinmica dessas inter-relaes fala sobre aprpria significao da prtica do Servio Social. Uma prtica profissionalconsciente e responsvel, consequentemente, s se d a medida que o AssistenteSocial tenha presente toda a realidade. GUILHON 1978 (apud. SOUZA 1982, p.45)

    De acordo com Weber, o Estado constitudo pelo territrio e possui o monoplio

    legitimo da violncia. Dessa maneira Souza (1982, p. 46) cr a diviso social do trabalho

    enquanto nascimento do Estado, pois:

    Esta diviso no se d nem se reproduz, sem violncia. Consequentemente, osprprios conflitos provenientes das relaes desiguais agentes do trabalho

    manual, agentes do trabalho intelectual vo necessitar de um instrumento que,reivindicando o monoplio da violncia, assuma, com base neste ltimo, a defesado mais forte. Esse monoplio vai-se dar plenamente no Estado capitalista quandoassume muitas funes antes exercidas pela igreja, pela famlia, excluindo grandeparte da coletividade das funes de deciso e gesto social.

    Se inicialmente o Estado se define como repressor, tendo uma funo econmica no

    mbito do controle da fora de trabalho viabilizando a acumulao capitalista,

    posteriormente, com a entrada do capitalismo monopolista ele deixe de ser meramente

    repressor, passando tambm a regulador das funes econmicas da sociedade visando assim

    a criao de mecanismos de controle para evitar crises econmicas. Numa terceira fase oEstado no apenas repressor e regulador mas passa tambm a ser produtor associando-se ao

    capital monopolista transmutando-se em um capitalismo monopolista de Estado. Ao mesmo

    tempo como a regulao econmica nessa fase extrapola as fronteiras dos pases, apesar de se

    constituir como produtor e planejador, o Estado perde a supremacia sobre a regulao

    econmica. (SOUZA 1982).

    Como resultado das crises de regulao nos pases da Amrica do Sul cria-se

    continuamente planos e projetos que visam a regulao social assumindo a aparncia de

    contribuies com vistas a soluo de problemas de consumo das populaes assumindocompromissos para o provimento das necessidades de reproduo da fora de trabalho. Dessa

    maneira o Estado reproduz e mantm a hegemonia ao traar um compromisso fixo entre a

    classe dominante e a classe dominada, evitando, consequentemente, conflitos sociais

    (SOUZA 1982).

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    Considerando agora a significao do Estado no contexto institucional, o que sepode ter presente que a realidade do contexto institucional , sobretudo, arealidade da sociedade civil e da sociedade poltica, o qual se representa atravsdas suas instituies e organizaes. Nestas, o Estado penetra as instituies dasociedade poltica e tenta penetrar e controlar tambm as instituies da sociedade

    civil. Neste sentido, o contexto institucional da sociedade o prprio contexto doEstado. Compreender a dinmica de determinadas instituies supe, porconseguinte, conhecer as caractersticas e a dinmica do Estado (SOUZA 1982, p.49).

    Ao adensar sua discusso acerca da dinmica de poder do Estado com as instituies

    e organizaes, Souza (1982) alega que os problemas que se formam no interior destas

    correlaes de foras, incluindo os princpios e mtodos profissionais institucionalizados, so

    muito mais complexos e difceis no afetando ou sendo responsabilidade de uma profisso

    especfica. No caberia ao assistente social buscar, isoladamente, as solues.

    O objetivo profissional no abarca toda a problemtica social, mas diz respeito auma das perspectivas em que esta se aloca. Assim, essa perspectiva tem sentido medida que a problemtica e seus elementos de globalidades so conhecidos. Sassim possvel a profisso assumir seu devido lugar de instrumentalidade tcnicaem funo do desenvolvimento social da populao cliente. Considerar o problemasocial em sua realidade concreta , pois, a condio primeira para que esse lugarseja assumido, vem em seguida a questo da perspectiva dessa realidade que se fazobjeto da profisso, os objetivos que se tem a atingir e a instrumentalidade tcnicaque levar esses objetivos a sua realizao (1982, p. 49).

    toda essa dinmica que possibilita a diferenciao entre as aes de voluntrios e a

    ao profissional que se caracteriza por agregar um saber tcnico-cientfico. Souza (1982)

    aponta a poltica social e a burocracia como meios dispostos nas instituies para a ao

    profissional que incidem diretamente na clientela. Para a autora a poltica social [...]

    apresenta-se como conjunto sistemtico e relativamente organizado de diretrizes e normas

    assumidas pelo Estado como orientador das suas aes (1982, p. 50) e o meio viabilizador

    disto a burocracia sendo um sistema de conduta tcnica e racional que deve orientar as

    aes desenvolvidas nas organizaes e, como tal, as aes implementadoras dessa poltica

    social (1982, p. 50), havendo nesta um carter pedaggico em uma conduta que se apresenta

    como racional e eficaz.Souza (1982) referencia, novamente, Weber para apresentar uma definio do

    funcionamento da burocracia:

    I Rege o princpio de reas de jurisdio fixas e oficiais, ordenadas de acordo comregulamentos, ou seja, por leis ou normas administrativas. II Os princpios dehierarquia dos postos e dos nveis de autoridade significam um sistema firmementeordenado de mando e subordinao no qual h uma superviso dos postos inferiorespelos superiores. III A administrao de um cargo moderno se baseia em

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    documentos escritos (os arquivos), preservados em sua forma original ou emesboo. IV A administrao burocrtica (...) pressupe um treinamentoespecializado e completo. V Quando o cargo est plenamente desenvolvido, aatividade oficial exige plena capacidade de trabalho do funcionrio... VI Odesempenho do cargo segue regras gerais, mais ou menos estveis mais ou menosexaustivas, e que podem ser apreendidas. (WEBER 1963 apud. SOUZA 1982, p.50).

    Nessa busca por aes profissionais mais eficazes, objetivas e calculadas os atores

    institucionais tornam-se objetos. Algo semelhante ocorre com as regras e princpios formais

    que ao constiturem e viabilizarem a burocracia so tratadas como coisas, como formas. Por

    conseguinte, no h considerao nas aes polticas executadas neste espao pois seus

    princpios, enquanto instituio, estaro arraigados a esta lgica. Da o confronto entre

    aes que privilegiam as decises polticas e aquelas que tm as leis, as normas e os

    regulamentos como a verdade social entrarem continuamente em conflito (1982, p. 51).

    Entretanto estes conflitos no so apenas enfraquecidos pelas normas gestadas em funo das

    decises administrativas, mas tambm busca-se em bases da teoria das relaes humanas e na

    constituio sistmica das relaes organizao/sistema social respostas para esses conflitos

    (SOUZA, 1982).

    A teoria dos papis de Parsons e a comportamentalista de Skinner que tm nosindivduos a causa dos problemas do funcionamento social e organizacional so,neste sentido, continuamente procuradas para embasar as aes arrefecedoras dosconflitos da organizao e das relaes organizao/sistema social, atravs dosagentes sociais envolvidos. Os conflitos originrios da situao desigual ocupadapelos agentes sociais na instncia da produo dos bens materiais da sociedade noso considerados como tais; as instituies e organizaes tambm no soconsideradas como solues resultantes de tais conflitos. Este desconhecimentoconduz ao realce da neutralidade social das organizaes e da burocracia comoforma superior de ao que, por sua vez, acobertada pela aparncia da neutralidade,constitui caminho fcil para que as normas e diretrizes polticas que respondem sdemandas dos grupos privilegiados sejam assumidas pelo Estado e pelasorganizaes como oriundas da coletividade social. neste sentido que aburocracia de instrumental racional de gesto passa a ser um eficaz instrumento dedominao e explorao. (SOUZA 1982, p. 51).

    Compreende-se assim a relao indissocivel da burocracia com as polticas sociais

    do Estado, pois a burocracia gestada para a viabilizao das aes que o Estado precisa

    desenvolver.

    Poltica social e burocracia caminham juntas, portanto, enquanto contedo definidordas aes da organizao. As aes profissionais, como operam as diretrizes enormas da poltica social, as redefinem de acordo com o saber profissional e oposicionamento social assumido por este saber. Quanto mais frgil for esse saber,mais tende a encontrar nas diretrizes e normas da organizao a sua prpriaverdade. Assim, as exigncias da poltica social passam a ser exigncias daprofisso que tm na burocracia um sistema de conduta prpria a ser seguido. Apoltica social d os elementos a serem perseguidos pela ao profissional e o

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    sistema de conduta prprio das exigncias burocrticas d os elementosmetodolgicos da ao (SOUZA 1982, p. 52).

    Souza ao escrever sobre os trs mtodos tradicionais do Servio Social indivduo,

    grupo ou comunidade alega que estes no compreendem uma leitura em torno dasdesigualdades sociais, e que no cotidiano da prtica profissional, so os problemas de

    misria e pobreza os que se fazem dominantes no trato profissional do assistente social

    (1982, p. 69), por sua vez a utilizao destes acaba por engendrar uma prtica vinculada a

    intuio do profissional e algumas abordagens tcnicas dentro dos mtodos de interveno

    tradicionais. Entretanto compreender o servio social supe compreender as demandas que

    o instituram e que continuam reproduzindo-o (1982, p. 70). E estas, segundo Souza, esto

    vinculadas as transformaes do capitalismo e as redefinies da poltica econmica e social

    no pas.

    E diante dessa realidade de confronto com uma populao que enfrenta problemasbsicos de sobrevivncia e diante de um Estado que exige, atravs das suasorganizaes, posies tcnicas com a eficcia necessria para a racionalizao queo Assistente Social sente-se obrigado a perceber que, no Brasil como na AmricaLatina, as funes bsicas do Servio Social se definem a partir das condies deassistncia definida pelo Estado e operadas pelas organizaes. O assistente socialtem de definir suas funes perante essa realidade e no perante uma realidade emque os problemas scio-econmicos esto mais ou menos resolvidos, persistindo eampliando-se os problemas de personalidade em suas relaes com o meio social.(SOUZA 1982, p. 70).

    neste contexto de inquietao quanto a sua prtica profissional e leitura da realidade

    que o movimento de reconceituao do Servio Social na Amrica Latina fomentara a

    discusso em torno da prpria profisso.

    Uma das tendncias desse movimento vai levantar a cada passo a questo doServio Social: reduzir-se a simples operaes mecnicas sobre fatos isolados quenada dizem sobre o problema social que os gera. Se so trabalhados sem umapercepo da sua significao real, o Servio Social nada mais que um conjuntode operaes sistemticas que tm fim em si mesmas. O que h de mais grave nisso

    tudo o pressuposto de que a sociedade uma realidade estvel, acabada einsupervel. Este pressuposto faz com que cada problema seja tratado isoladamente.A sociedade no percebida como conjunto de foras antagnicas provenientes dasposies divergentes que os grupos sociais ocupam no acionamento da produodas suas condies materiais de existncia, mas no na incapacidade pessoal dosgrupos subalternos de adaptarem-se e assumirem com eficcia as funes e papisque lhe so atribudos pelos grupos privilegiados. (SOUZA 1982, p. 71).

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    O ocultamento dos conflitos, a busca pelo consenso social, ausncia de identificao

    dos trabalhadores entre si e a subsequente aniquilao da prpria conscincia de classe so

    fatos fortalecidos pela focalizao da problemtica desta clientela visando o ajustamento

    social em detrimento das diferenas provenientes dos grupos sociais ditos privilegiados que

    definem o modo de viver mais palatvel para as classes subalternas e projetando a estas seusvalores e estilo de vida enquanto legtimos e galgveis.

    1.2.3 Saber Profissional e Poder Institucional (Vicente de Paula Faleiros)

    O livro Saber Profissional e Poder Institucional de Vicente de Paula Faleiros rene

    textos publicados entre 1979 e 1984 que trazem como tema a anlise, como o prprio ttulo

    sugere, do poder institucional e o saber profissional. Como o autor nos apresenta logo naintroduo, a perspectiva proposta de anlise considera que [...] saber profissional e poder

    institucional so formas histricas da relao entre classes e foras sociais e da relao entre

    Estado e sociedade. (1991, p. 7). Composto por 11 captulos, esse livro apresenta discusses

    que no apenas enriquecem a compreenso da insero do Assistente Social nos espaos

    scio-ocupacionais, mas como se gesta este saber profissional e como se estruturam esses

    espaos institucionais.

    Pode-se considerar o Servio Social como uma profisso que assumiu as relaes

    interpessoais enquanto a principal forma de sua ao profissional. Essa perspectiva

    concretizava-se atravs dos processos de casos, grupos e comunidades. Entretanto, sem

    possuir uma qualificao psicolgica, a escuta tornou-se incmoda para o profissional j que

    este no conseguia apresentar solues para as demandas, tomando como elementos

    norteadores fatores psicossociais e o conhecimento do meio em que vivia sua clientela. Esse

    processo de escuta humanizada contribua para a legitimao de processos de explorao. O

    profissional era visto pela classe dominante como um profissional benevolente disposto a

    ouvir, entretanto, esta ao foi se modificando [...] frente ao prprio questionamento do

    profissional pelas classes dominadas e pela exigncia de produtividade do prprio

    capitalismo (FALEIROS, 1991, p.17).

    O profissional tornou-se ento um agente solucionador de problemas e isso acabou

    por alargar e esvaziar a prtica profissional, pois o Assistente Social que atuasse na rea de

    distribuio de alimentos focava o problema na ausncia de alimentos; o profissional que

    atuasse na rea de habitao identificava o foco do problema como sendo ausncia de

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    moradias.

    Esta diversidade de problemas a partir da tica institucional levou a uma busca deunificao metodolgica da atuao profissional.[...] No entanto, a busca de ummtodo comum a tantos problemas eliminou a questo central da discusso, isto , ocontexto institucional e de poder da atuao profissional (FALEIROS, 1991, p. 17).

    Para Faleiros (1985), essa eliminao ocorreu de duas formas: pela reduo da

    metodologia a um apanhado de etapas de conhecimento e pela opo de uma ao anti-

    institucional a partir de movimentos sociais que combatessem essas instituies. Os

    profissionais [...] que viam na metodologia apenas um meio de melhorar sua eficcia e sua

    eficincia no trabalho institucional no souberam distinguir os objetivos profissionais dos

    objetivos institucionais (1991, p.18).

    Ao repensar a sua prtica profissional, o assistente social se voltou analise das

    condies concretas. Sendo um profissional assalariado passou a questionar a venda da sua

    fora de trabalho, de sua insero enquanto profisso til ao acmulo do capital, da dualidade

    entre trabalho com produtividade e sem produtividade. (FALEIROS 1991).

    O trabalho concreto do assistente social encobria seu carter abstrato. Este trabalhoconcreto parecia til em si mesmo aos indivduos, oferecendo-lhes pequenascompensaes na realidade de explorao, mas abstratamente o assistente socialvende sua fora de trabalho e, portanto, se encontra nas mesmas condies deexplorao (FALEIROS 1991, p. 19).

    Partindo da relao entre profissional e instituio em que o assistente social carecia

    de maior poder de deciso - e da relao entre assistente social e cliente - que visava rompercom a figura de apoio psico-emocional e financeiro para avano por parte do cliente - que

    viu-se ento a necessidade de repensar as mediaes da atuao profissional numa

    perspectiva mais global, a ponto se situ-las no contexto do Estado capitalista. (1985, p.20).

    Faleiros (1991) aponta como processos no lineares a lgica de acumulao e

    dominao, entretanto as relaes de classe e de fora seriam processos estruturais que

    acabam por condicionar o processo de acumulao. A reflexo acerca do processo de

    acumulao contribui para que se entenda o Servio Social como uma forma de reproduo

    do capital atravs da reproduo da fora de trabalho. Embora a lgica da acumulao sejaatualmente percebida em todos os detalhes da vida cotidiana deve-se compreend-la como

    um processo contraditrio e no como um compl ou fruto de uma fuso ntima entre

    Estado e capital. (FALEIROS 1991, p. 21).

    Identificam-se atravs dos processos de acumulao, nas reas chamadas do social,

    trs formas de interveno:

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    1. A lgica da acumulao atravs da mercantilizao dos servios sociais. Esta

    mercantilizao se materializa na transformao de situaes de perda de capacidade

    de trabalho em fontes de lucro. A compra e venda de servios de sade, educao.

    Nos seguros, o segurado paga previamente sua aposentadoria ou outros servios que

    venha obter;

    2. A lgica das equivalncias institucionais consiste na necessidade de submeter

    todos os indivduos aos mesmos critrios para que tenham acesso ao mesmo

    benefcio. Assim se define o acesso a um servio pela capacidade ou no de pag-lo.

    A equivalncia se ope ao critrio utilizado na prtica profissional tradicional, que

    parte da noo de que cada caso um caso, escondendo esta situao abstrata da

    prpria prtica (1991, p. 23);

    3. Obrigatoriedade de uma poupana compulsria esta poupana permite o

    desenvolvimento do capital financeiro e os programas chamados sociais servem de

    instrumento para aumentar o nvel de poupana. Essa arrecadao obrigatria,

    atravs de contribuies para a grande quantidade de fundos controlados pelo Estado,

    servem ao mesmo tempo para financiamento de grandes projetos e no voltam

    necessariamente populao (1991, p. 23).

    Para Faleiros (1991) a ideologia distributiva, sob a qual se apresentava o Servio

    Social, entrou num processo de desaparecimento em virtude das novas relaes do Estado. O

    momento desenvolvimentista e populista nacional no absorveu o contingente populacional e

    a lgica do crescimento entrou em crise, dessa forma o autor atesta que Para obter mais

    recursos o Estado est necessitando transformar a populao toda num exrcito de

    contribuintes, por um lado, e de produtivos, por outro. (1991, p. 24). E complementa O

    cidado se torna contribuinte, mas, pelo autoritarismo, no pelo direito de controlar a prpria

    aplicao de seus tributos e os servios prestados pelo Estado vo se tornando cada vez maiscaros (1991, p. 24). Dessa forma, o trabalhador produzido pelas empresas na mesma

    escala em que o Estado vem produzindo o pagador de impostos.

    O autor destaca a relao contraditria da insero profissional nos processos de

    interveno junto ao Estado, possibilitando diferentes direes que tanto podem reforar o

    processo de dominao e acumulao como contribuir para o fortalecimento das

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    organizaes populares. Identifica-se aquilo que podemos compreender como as direes

    pretendidas no exerccio profissional em um contexto institucional capitalista e autoritrio.

    (FALEIROS 1991).

    O saber profissional, a competncia legitimada pela instituio serve ou tem

    servido justamente para deslegitimar e desmobilizar as organizaes populares. Oprocesso de conhecimento pois uma relao de fora. A preocupao de que esteconhecimento profissional venha a servir produo de conhecimentos por partedas organizaes populares (FALEIROS 1991, p. 27).

    imprescindvel ao profissional saber utilizar os recursos institucionais junto aos

    interesses da populao. No cabendo ser apenas o bom profissional na utilizao de suas

    competncias individuais, mas um profissional capaz de formar coalizes, saber quando deve

    avanar e recuar nas estratgias gestadas no mbito institucional.

    Ao discutir a insero dos Assistentes Sociais nas instituies, o autor aponta que uma

    das principais falhas do movimento de reconceituao foi privilegiar de maneira desmedida a

    fora crtica sem levar em considerao a resistncia aos processos de mudana institucional.

    (FALEIROS 1991). Ainda sobre o movimento de reconceituao escreve:

    Por paradoxal que parea, no so os trabalhadores sociais que esto provocando asmudanas institucionais mais significativas. So as novas polticas exigidas peloprocesso de modernizao que esto impondo novos padres de eficcia eeficincia. No se deve entender modernizao como uma evoluo autnoma, mascomo resultante do processo global das contradies sociais (1991, p. 31).

    Assim a prtica institucional, enquanto reao ao movimento de reconceituao, tem

    um duplo aspecto: reafirmar a prtica estabelecida e adaptar a prtica em um contexto de

    modernizao. (FALEIROS 1991).

    As instituies ao se organizarem enquanto aparelhos permeveis aos interesses da

    classe dominada, entretanto comprometida com a manuteno do status quo das classes

    dominantes, contribuem ao consenso social necessrio hegemonia e direcionam os

    processos sociais. Sendo assim as classes dominantes, atravs das instituies, conseguem

    exercer a sua hegemonia (FALEIROS 1991).

    As instituies no so um simples fenmeno superestrutural. So organizaestransversais a toda sociedade. Elas aparecem como mecanismos reguladores dascrises do desenvolvimento capitalista em todos os nveis. Mesmo distantes de umaempresa, elas podem `compensar` desequilbrios do processo produtivo. No interiorde uma empresa produtiva, a institucionalizao dos servios sociais est vinculadaao processo poltico global do desenvolvimento das condies da acumulao docapital. (FALEIROS 1991, p. 32)

    As instituies se mostram preocupadas com o bem-estar da populao e essa

  • 7/24/2019 ANLISE INSTITUCIONAL E SESO.pdf

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    aparente preocupao um dos fatores que viabiliza seu aceite por parte da classe dominada,

    essa face oculta a utilizao da violncia em busca do consentimento, da aceitao, numa

    srie de medies organizadas para convencer, moldar, educar a compreenso e a vontade das

    classes dominadas. (1991, p. 32).

    O contrato a qual o cliente se submete a uma instituio se constitui, desde o princpiocomo desigual, pois o cliente colocado em uma posio passiva. Se no aceita as normas

    excludo dos benefcios possveis. Se se integra s normas da instituio socialmente

    excludo, institucionalizado cliente, marcado pelas etiquetas profissionais, e s vezes

    confinado pela mesma instituio VIRILO; BROBOFF; LUCCIONI 1972 (apud.

    FALEIROS 1991, p. 33). Policia-se a vida do usurio atravs de fichas, entrevistas, visitas

    tornando a instituio uma patrulha ideolgica da vida social do cliente.

    Ao mesmo tempo exerce-se a mercantilizao para aqueles que no possuem meios

    para consumir, ou seja mecanismos especiais de integrao ao sistema de produo-consumo existente, por intermdio da institucionalizao de certos servios (FALEIROS

    1991, p. 33) so as casas populares, os bnus de alimentao. As instituies so veculos

    dessa mercantilizao de bens e servios, transformando as