análise filmes do cinema brasileiro contemporâneo

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Centro Universitário Senac São Paulo, 29 de outubro de 2014. Disciplina: Audiovisual Contemporâneo Brasileiro Professor: Cléber Eduardo Ananda Koja Resposta da Questão, 1 Proposta 1 1) Estabeleça relação entre os protagonistas de MADAME SATÃ e O CÉU DE SUELY, primeiro e segundo longa do cearense Karin Aïnouz, mesmo diretor de PRAIA DO FUTURO e um dos cineastas revelados nos anos 2000, com alta consideração dos curadores de Cannes. Leve em consideração a dramaturgia do corpo estabelecida pelo diretor e a relação desses corpos com as contingências geográficas e sociais de seus lugares, a Lapa dos anos 30 e Iguatu nos anos 2000, de modo a atentar-se para a associação entre subjetividade e ambiente O personagem principal de Madame Satã é João Francisco, pode-se dizer que em uma só pessoa ele representa várias minorias: é pobre, negro e homossexual. Além disso, ele ainda se traveste para apresentações performáticas de música, é malandro e bom capoeirista. Ele vive na Lapa dos anos 30, lugar que nos é apresentado como obscuro, um submundo ao qual João não só pertence como comanda. São quatro os principais espaços que nos são apresentados na Lapa: a casa em que João mora, que é bastante precária; o bar, onde ele procura homens para se relacionar, para furtar e que é também um lugar marcado por brigas entre os seus frequentadores; o quarto ao lado do bar onde João leva seus homens e por fim a rua, onde as brigas de bar resultam em lutas e assassinatos.

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Relação entre os protagonistas de MADAME SATÃ e O CÉU DE SUELY, primeiro e segundo longa do cearense Karin Aïnouz, mesmo diretor de PRAIA DO FUTURO e um dos cineastas revelados nos anos 2000, com alta consideração dos curadores de Cannes. Considerando a dramaturgia do corpo estabelecida pelo diretor e a relação desses corpos com as contingências geográficas e sociais de seus lugares, a Lapa dos anos 30 e Iguatu nos anos 2000.

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Page 1: Análise Filmes do cinema Brasileiro Contemporâneo

Centro Universitário Senac

São Paulo, 29 de outubro de 2014.

Disciplina: Audiovisual Contemporâneo Brasileiro

Professor: Cléber Eduardo

Ananda Koja

Resposta da Questão, 1 Proposta 1

1) Estabeleça relação entre os protagonistas de MADAME SATÃ e O CÉU DE SUELY, primeiro e segundo longa do cearense Karin Aïnouz, mesmo diretor de PRAIA DO FUTURO e um dos cineastas revelados nos anos 2000, com alta consideração dos curadores de Cannes. Leve em consideração a dramaturgia do corpo estabelecida pelo diretor e a relação desses corpos com as contingências geográficas e sociais de seus lugares, a Lapa dos anos 30 e Iguatu nos anos 2000, de modo a atentar-se para a associação entre subjetividade e ambiente

O personagem principal de Madame Satã é João Francisco, pode-se dizer que em uma só pessoa ele representa várias minorias: é pobre, negro e homossexual. Além disso, ele ainda se traveste para apresentações performáticas de música, é malandro e bom capoeirista. Ele vive na Lapa dos anos 30, lugar que nos é apresentado como obscuro, um submundo ao qual João não só pertence como comanda.

São quatro os principais espaços que nos são apresentados na Lapa: a casa em que João mora, que é bastante precária; o bar, onde ele procura homens para se relacionar, para furtar e que é também um lugar marcado por brigas entre os seus frequentadores; o quarto ao lado do bar onde João leva seus homens e por fim a rua, onde as brigas de bar resultam em lutas e assassinatos.

Assim como João é diverso, também é o modo como ele faz uso do seu corpo. Ao mesmo tempo em que ele sobe no palco travestido e dança e canta de forma delicada, ele é capaz de transformar o seu corpo em uma máquina capaz de vencer lutas desiguais contra muitos homens ou até mesmo contra pessoas armadas. Pode-se dizer que só por isso o seu corpo é seu meio de sobrevivência. As lutas os protegem, as performances lhe dão vida e com o apelo sexual ele consegue o dinheiro para se manter.

Além da questão da sobrevivência, seu corpo diverso o concebe um forte poder sobre os outros, ninguém quer contrariá-lo pois tem medo de seus golpes. Outros ficam simplesmente enfeitiçados pelo seu jeito malandro, conquistador e principalmente seguro de si, como percebe-se no diálogo em que ele briga com um homem no bar que tenta ofendê-lo pela sua escolha sexual “eu sou bixa por que quero e não deixo de ser homem por causa disso não”.

Page 2: Análise Filmes do cinema Brasileiro Contemporâneo

Já em O Céu de Suely, a personagem principal é Hermila. Que está retornando a pequena cidade de nova Iguaçu no interior do nordeste, após ter passado 2 anos em São Paulo com Matheus, o homem por quem se apaixonou e com que teve um filho. Viver lá, segundo ela estava muito cara, então ela voltou primeiro com o filho e o marido viria depois.

A vida em Iguaçu é simples, todos precisam trabalhar para conseguir o básico para sobreviver, por tanto assim que chega, Hermila começa a vender rifas de whisky a 2 reais. Quando percebe que seu marido à abandonou, Hermila passa por um momento pessoal difícil, em que não consegue se encontrar no ambiente em que está, apesar de ter boas amizades, morar bem, ainda que em uma casa muito simples, ter um relacionamento com João, homem por quem parece ter bastante consideração, ainda que não seja apaixonada, assim como ele o é por ela.

Assim, Hermila sente uma necessidade de mudar de ambiente. Apesar de ela já ter se deslocado de Iguaçu para São Paulo e depois de volta para a cidadezinha, parece que sempre o fez motivada por alguém, que não ela mesma. Dessa forma, ela decide usar o seu corpo para conseguir ir o mais longe que conseguir tentar uma vida nova, desta vez sozinha, no caso em Porto Alegre. A maneira que ela encontra, então, é a de rifar seu próprio corpo, prometendo uma noite no paraíso para o vencedor da rifa.

É interessante que mesmo sendo julgada por pessoas ao seu redor como a dona de uma loja de roupas, cujo cunhado comprou uma rifa de Hermila e a sua própria avó, a personagem parece bastante segura de si e do que isso representa para ela e seu corpo, e em nenhum momento ela hesita em continuar com a rifa. Quando sua tia diz que ideia de rifar o próprio corpo é coisa de puta ela responde: “Puta nada, puta trepa com todo mundo. Eu só vou trepar com um cara.”. E assim que termina a rifa ela parece seguir o seu caminho, ainda que triste, confiante na nova vida que está indo buscar.

Podemos dizer que a maior diferença então entre João, de Madame Satã e Hermila de O Ceú de Suely está em ele usar o corpo para sobreviver e permanecer onde está. Já ela usar o seu corpo para sair de Iguaçu. Ambos, porém, são muito confiantes sobre os seus corpos e como desejam fazer uso deles.