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Análise do consumo de energia elétrica através do perfil de uso e posse de equipamentos em comunidades de baixo poder aquisitivo do Rio de Janeiro Claude Cohen, Daniele Alcantara, Luana Furtado e Francesca Pilo Resumo O presente artigo tem por objetivo apresentar os resultados parciais de um projeto desenvolvido em parceria entre a LIGHT, a COPPE/UFRJ, a PUC- RJ e a UFF, e que serviu de base para quantificar o potencial de conservação de energia elétrica e o consumo da mesma em dez comunidades de baixo poder aquisitivo do Rio de Janeiro. Para tanto, buscou-se identificar o perfil específico do consumo de eletricidade nas residências de baixo poder aquisitivo, para posteriormente estudar a abertura da comunidade em implantar novas técnicas e hábitos de uso eficiente da eletricidade. Neste artigo, especificamente, apresentar-se- ão resultados referentes ao perfil das comunidades pesquisadas quanto ao uso e a posse dos equipamentos levantados. Palavras-chave: Conservação de Energia, Desenvolvimento Sustentável, Eficiência Energética. 1. Introdução A região metropolitana do Rio de Janeiro possui atualmente cerca de 12 milhões de habitantes, distribuídos em 20 municípios e estima-se que somente na municipalidade do Rio de Janeiro haja 513 comunidades de baixo poder aquisitivo, com uma população total de 1.092.953 e uma taxa de crescimento de 11% entre 1991 e 2000 (IBGE, 2003). Isso significa que aproximadamente 20% da população mora em comunidades de baixo poder aquisitivo. Segundo COUTINHO apud ALMEIDA (2001), o Estado do Rio de Janeiro possui cerca de 1000 comunidades, das quais 300 situam-se somente na Baixada Fluminense. Os espaços ocupados pelas comunidades são muito heterogêneos do ponto de vista econômico, histórico e infraestrutural, o que dificulta que se estabeleça uma definição clara das mesmas. Até mesmo o termo usado para nomeá-las não é consenso, já 1

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Análise do consumo de energia elétrica através do perfil de uso e posse de equipamentos em comunidades de baixo poder aquisitivo do Rio de Janeiro

Claude Cohen, Daniele Alcantara, Luana Furtado e Francesca Pilo

Resumo

O presente artigo tem por objetivo apresentar os resultados parciais de um projeto desenvolvido em parceria entre a LIGHT, a COPPE/UFRJ, a PUC-RJ e a UFF, e que serviu de base para quantificar o potencial de conservação de energia elétrica e o consumo da mesma em dez comunidades de baixo poder aquisitivo do Rio de Janeiro. Para tanto, buscou-se identificar o perfil específico do consumo de eletricidade nas residências de baixo poder aquisitivo, para posteriormente estudar a abertura da comunidade em implantar novas técnicas e hábitos de uso eficiente da eletricidade. Neste artigo, especificamente, apresentar-se-ão resultados referentes ao perfil das comunidades pesquisadas quanto ao uso e a posse dos equipamentos levantados.

Palavras-chave: Conservação de Energia, Desenvolvimento Sustentável, Eficiência Energética.

1. Introdução

A região metropolitana do Rio de Janeiro possui atualmente cerca de 12 milhões de habitantes, distribuídos

em 20 municípios e estima-se que somente na municipalidade do Rio de Janeiro haja 513 comunidades de

baixo poder aquisitivo, com uma população total de 1.092.953 e uma taxa de crescimento de 11% entre 1991

e 2000 (IBGE, 2003). Isso significa que aproximadamente 20% da população mora em comunidades de

baixo poder aquisitivo. Segundo COUTINHO apud ALMEIDA (2001), o Estado do Rio de Janeiro possui

cerca de 1000 comunidades, das quais 300 situam-se somente na Baixada Fluminense. Os espaços ocupados

pelas comunidades são muito heterogêneos do ponto de vista econômico, histórico e infraestrutural, o que

dificulta que se estabeleça uma definição clara das mesmas. Até mesmo o termo usado para nomeá-las não é

consenso, já que na literatura ora aparecem como favelas, ora como comunidade1. A metodologia do IBGE

para definir favela pode levar a algumas distorções (IBGE, 2003) . O órgão define favelas e assemelhados

como habitações que "ocupam terrenos de propriedade alheia, dispostos de forma desordenada e densa e

carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais". Já no Art. 147 do Plano Diretor do Município do

Rio de Janeiro favela é definida como: “área predominantemente habitacional, caracterizada por ocupação

da terra por população de baixa renda, precariedade da infra-estrutura urbana e de serviços públicos, vias

estreitas e de alinhamento irregular, lotes de forma e tamanhos irregulares e construções não licenciadas, em

desconformidade com os padrões legais” (RIO DE JANEIRO,1992).

1 A questão da nomenclatura para definir estes espaços é fruto de intenso debate sócio-político na área de planejamento urbano e regional, que não há como ser resgatado neste artigo. Para tanto, o termo adotado no presente trabalho, comunidade, releva apenas da percepção dos autores de que este tem sido aquele mais adotado na literatura da área de energia atualmente.

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Abordar a questão energética nas comunidades é uma tarefa complexa. A presença de mais de 200 mil

ligações clandestinas no Rio de Janeiro (PPE/COPPE/UFRJ/UFF/PUC-Rio, 2008), o que representa um

quarto dos clientes da concessionária local LIGHT, traz à tona a questão do fornecimento adequado de

energia elétrica, elemento central para a melhoria das condições de vida das famílias. Por isso, a pobreza

energética se caracteriza como um dos aspectos principais da pobreza (UNDP, 2000), e ocorre pela ausência

no acesso a serviços energéticos adequados, acessíveis, confiáveis que estariam na base do desenvolvimento

sustentável. Assim, refletir sobre a pobreza energética implica em abordar a noção de acesso aos serviços

energéticos. No que se refere ao acesso físico à rede no Rio de Janeiro, um programa de eletrificação das

comunidades foi implementado em 1979 pela LIGHT, o Programa de Eletrificação de Interesse Social,

visando estender o serviço a todas as comunidades de sua área de concessão. Assim no início dos anos 90, a

universalização da rede foi praticamente concluída.

Mas o acesso físico à rede, embora condição necessária, não garante que o indivíduo tenha acesso integral e

efetivo aos serviços energéticos, uma vez que isto dependerá também de sua capacidade de pagamento (e

conseqüentemente das tarifas de energia), da eficiência dos equipamentos e das características das

residências (COSTA, SCHAEFFER e COHEN (2007); PACHAURI e SPRENG (2003); FUGIMOTO

(2002)). De fato, a vulnerabilidade ocasionada por serviços energéticos caros, bem como por aparelhos

ineficientes pode incidir sobre a pobreza energética, e sendo a energia um serviço essencial, a demanda por

estes serviços é praticamente inelástica. Assim, a relação entre a redução das desigualdades sociais e o

acesso a serviços energéticos é necessariamente íntima e evidente. Nos anos 90, embora como mencionado o

acesso físico fosse praticamente completo em função da conclusão da universalização da rede, o forte

aumento das tarifas ocasionado pela desregulamentação do setor (AGUIAR, 2006), aliado a uma forma de

tarifação social baseada no consumo mensal da residência, sem levar em conta o nível de renda per capita e

número de moradores por residência, provocou efeitos regressivos sobre a universalização ou levou à

incidência de ligações clandestinas possibilitando o furto de energia.

Ademais, a forte densidade habitacional e sua precariedade (fraca incidência de luz natural), características

de muitas áreas em comunidades, também impactam no comportamento energético das famílias. A

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freqüência de uso dos equipamentos, a idade e a eficiência dos mesmos são igualmente importantes,

podendo ocasionar grandes diferenças no consumo total de energia elétrica de uma residência. Os principais

usos para a energia elétrica nas residências destas áreas, assim como para todo o setor residencial (PROCEL,

2007), permanecem sendo refrigeração, aquecimento de água e iluminação. No entanto, condicionamento

térmico, que habitualmente representa um percentual pequeno no consumo total do setor residencial, pode

ter um impacto importante dependendo da comunidade estudada em função da presença do furto de energia.

A própria precariedade da infra-estrutura urbana e dos serviços públicos dessas áreas, ademais, contribui

para o elevado grau de clandestinidade. A avaliação de mecanismos da inserção de alternativas energéticas

precisa, portanto, estar atrelada aos aspectos particulares da comunidade.

Com o objetivo de melhor conhecer a estrutura de consumo de energia elétrica das comunidades de baixo

poder aquisitivo, além desta introdução, este artigo analisa o perfil de uso e posse de equipamentos para três

usos finais (refrigeração, aquecimento de água e condicionamento térmico), referindo-se à renda média

familiar e detalhando os resultados referentes a características específicas dos equipamentos de cada uso

final selecionado, tais como idade média, tempo de uso e correlação preço-eficiência.

As bases de dados referentes ao estudo compreendem a Pesquisa de Posse de Equipamentos e Hábitos de

Consumo - PPH – realizada em dez comunidades do Rio de Janeiro: Caju, Jardim Ocidental, Lixão, Mangueira, Maré,

Mata Machado, Parque Dois Irmãos, Vidigal, Vila Moretti e Vila Brasil, com tamanho médio de amostra em torno de

200 residências por comunidade, totalizando 2000. A pesquisa, além de levar em consideração as posses e uso de

equipamentos, insere-se em um projeto maior2, que inclui também questões relativas às características do domicílio,

condições socioeconômicas dos moradores, inadimplência e imagem da empresa, além de um levantamento dos

preços de mercado, grau de eficiência e idade média dos equipamentos relativos aos principais usos no consumo total

de energia elétrica da residência.

2. Uso e Posse de equipamentos

O critério de escolha dos equipamentos relevantes para serem estudados teve como variável determinante a

participação do consumo de energia de cada uso final de energia (de cada serviço energético) no consumo

final de um domicílio médio.

Os principais usos finais de energia representam, em média, 80% do consumo total de energia elétrica dos

2 Projeto realizado no âmbito das rodadas ANEEL para cumprimento da Lei de Eficiência Energética (PPE/COPPE/UFRJ/UFF/PUC-Rio, 2008)

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domicílios3. Houve um detalhamento maior sobre o perfil de consumo (incluindo no questionário perguntas

sobre tempo médio de utilização e posses médias), referente aos seguintes usos (grupo principais usos

finais): refrigeração (refrigerador e freezer); aquecimento de água (chuveiro elétrico); iluminação

(lâmpadas); condicionamento térmico (condicionador de ar); e outros usos (grupo outros usos finais):

televisão, ferro elétrico, forno microondas, grill, máquina de lavar roupa, microcomputador, máquina de

costura elétrica, prancha alisadora, panela/fritadeira elétrica, máquina de overloque, cafeteira elétrica, bomba

d’água, secador de cabelo.

Desta feita, os equipamentos elétricos relevantes este estudo estão divididos em dois grupos: principais usos

finais e outros usos finais. Dessa forma, foram selecionadas cinco categorias de usos finais mais relevantes

(ver Tabela 1) e 19 categorias de outros usos finais (ver Tabela 3).

Tabela 1: Posse média de equipamentos elétricos – Principais Usos Finais

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

De acordo com a Tabela 1, as comunidades que apresentam maior posse média desses principais bens são:

Vidigal e Mangueira (a posse média de todas as categorias é sempre maior do que a posse média de todas as

comunidades). Além dessas, Caju, Vila Moretti, Lixão, Vila Brasil e Mata Machado também têm posses

médias de equipamentos acima da média das posses médias (pelo menos 3 dos 5 itens listados na Tabela 1

correspondem a posses de equipamentos superiores à média das posses médias). Por outro lado, as

comunidades do Jardim Ocidental, Parque Dois Irmãos e Maré são aquelas cuja posse média da maioria dos

bens é menor do que a média das posses médias das comunidades.

Na análise da renda média das comunidades (Tabela 2), observa-se que a Mangueira é a comunidade com

maior poder aquisitivo (o que justifica seu elevado nível de posse desses bens). Diferentemente, Jardim

Ocidental é a comunidade com menor poder aquisitivo, fato que corrobora o seu baixo nível de posse média

de equipamentos. Assim, verifica-se, em geral, uma relação positiva entre a renda média e a posse de

equipamentos. 3 Dados referentes à média de consumo da Região Sudeste do Brasil (PPE/COPPE/UFRJ, 2007).

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No entanto, outras comunidades apresentam um nível de posse média menos correlacionado com seu poder

aquisitivo médio. De fato, Lixão, apesar de apresentar uma posse média entre as mais elevadas, possui uma

renda média das mais baixas (próxima à de Jardim Ocidental, que é a menor de todas). De outra forma, a

comunidade Mata Machado, apesar de se apresentar como uma das comunidades com maior poder

aquisitivo (comparável ao da Mangueira, que tem a maior renda média), possui uma posse média de alguns

dos principais equipamentos (condicionador de ar e lâmpada) inferior à posse média referente à do Lixão.

Tabela 2: Renda média por comunidade (valores correntes)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Assim como ocorrera para os usos principais, entre os “outros usos finais de energia”, na Tabela 3, observa-

se que as comunidades Mata Machado, Vila Brasil, Vidigal e Caju estão entre as que têm, em média, maior

posse destes outros bens.

Tabela 3: Posse média de equipamentos elétricos – Outros Usos Finais

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Repetindo o padrão observado nos principais usos finais, as comunidades Jardim Ocidental, Parque Dois

Irmãos e Maré são as comunidades cuja posse média da maioria dos bens relativos a outros usos finais é

menor do que a média das posses médias das comunidades. Assim, em geral, para os outros usos finais as 5

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comunidades com maior poder aquisitivo são as que possuem maior nível de posse média de equipamentos,

enquanto que as comunidades mais pobres são as que possuem nível mais baixo de posse média.

3. Principais usos e equipamentos referentes

Uso: Refrigeração / Equipamento: Refrigerador

A refrigeração merece análise em destaque por representar um dos principais usos, sendo responsável por

um consumo considerável de energia elétrica nos lares4. Cabe destacar que o relevante consumo dos

aparelhos de refrigeração promove a necessidade do uso eficiente de energia em função do seu consumo

constante de eletricidade.

Dentro do total das comunidades, pode-se verificar a existência de aproximadamente 2.046 geladeiras. Estes

equipamentos foram classificados segundo marca, modelo, capacidade, número de portas, selo PROCEL e

faixa de eficiência. Outras especificações abordadas referem-se à potência e/ou consumo mensal do

equipamento. Na ausência de modelo descrito no questionário, buscou-se um modelo substituto com

características parecidas às do modelo não encontrado.

A partir da Tabela 4 podemos inferir que as comunidades com maior posse média de refrigerador são as

comunidades Mangueira, Vidigal e Vila Brasil, todas com cerca de 1,05 refrigeradores por domicílio,

seguidas de Mata Machado e Vila Moretti, ambas com 1,03 refrigeradores por residência. A comunidade

com menor posse média de refrigeradores é o Jardim Ocidental (0,98). Considerando todas as comunidades

em análise, a posse média agregada é de 1,02, assim, de maneira geral, há um pouco mais de uma geladeira,

aproximadamente, para cada casa analisada nas dez comunidades.

Tabela 4: Posse média de refrigeradores por comunidade

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Outra variável na qual os refrigeradores podem ser classificados refere-se à faixa de eficiência. Quanto

maior é a eficiência do refrigerador (faixa A), menor é o consumo de energia elétrica necessária para que o

4 A refrigeração representa cerca de 30% do consumo total do domicílio (PROCEL, 2007).6

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equipamento cumpra sua função. A Tabela 5 apresenta a distribuição percentual dos refrigeradores por faixa

de eficiência por comunidade e a distribuição percentual dos refrigeradores por faixa de eficiência para todas

as comunidades.

Tabela 5: Distribuição dos refrigeradores por faixa de eficiência (%)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Como se pode perceber pela Tabela 5, grande parte dos refrigeradores para o total de comunidades

analisados tem faixa de eficiência “A” (aproximadamente 59%). Refrigeradores com faixa “B”

correspondem a 20%, “D” cerca de 9%, “E” em torno de 8% e a faixa com menor freqüência é a “C” com

quase 4% dos refrigeradores estudados nas dez comunidades. No que se refere a cada comunidade em

particular, o padrão se repete e em algumas é até mais acentuado: a maior parte dos refrigeradores em cada

comunidade tem faixa de eficiência “A”. As comunidades que apresentam o maior potencial para troca de

equipamentos e, portanto, maior potencial de conservação de energia elétrica são Vidigal (46%), seguida da

comunidade de Jardim Ocidental (52%). Inversamente, a comunidade de Caju é onde há a maior

percentagem de refrigeradores com eficiência “A” (72%), sendo, portanto, aquela que apresenta o menor

potencial de troca de equipamentos.

Uso: Refrigeração / Equipamento: Freezer

De acordo com a pesquisa de campo da PUC-Rio (2007), existem 410 freezers distribuídos em 2000

residências. A Tabela 6 permite inferir que a comunidade com maior posse média de freezer é a do Vidigal

(0,29), seguida pela da Mangueira (0,27). A comunidade com menor posse média de freezers é a do Jardim

Ocidental (0,09). A posse média agregada é de 0,21 freezer por domicílio, considerando todas as

comunidades em análise.

Os freezers foram classificados segundo marca, modelo, capacidade, tipo (horizontal ou vertical), selo

PROCEL, consumo mensal e faixa de eficiência. Outras especificações abordadas referem-se à potência

e/ou consumo mensal do equipamento. O modelo de freezer mais freqüente em todas as comunidades

analisadas (42 unidades) é o “Vertical FE 18 da Electrolux”, e sua faixa de eficiência é “B”. Isto denota

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algum potencial de troca para este equipamento, embora a redução de consumo de energia elétrica

proporcionada por esta troca não seja tão significativa.

Tabela 6: Posse média de freezers por comunidade

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Com relação à eficiência dos freezers, podemos inferir que não há padrão na distribuição dos mesmos. A

partir da Tabela 7, observamos que estes estão distribuídos de maneira aleatória nas comunidades. As

comunidades Dois Irmãos e Lixão são as que possuem maior percentual de freezers com faixa de eficiência

“A” (21%). O Vidigal é a comunidade com maior percentual de freezers menos eficientes (36%), o que

denota o alto potencial para troca de equipamentos nesta comunidade.

Tabela 7: Distribuição dos freezers por faixa de eficiência (%)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Uso: Aquecimento de água / Equipamento: Chuveiro Elétrico

No conjunto das dez comunidades pesquisadas, o total de chuveiros elétricos é de 1.168, sendo a posse

média de menos de um chuveiro elétrico por domicílio nas comunidades, ou seja, nem todos os domicílios

possuem este equipamento. A comunidade de Vidigal é a que possui maior média de chuveiros elétricos por

residência dentre as comunidades selecionadas: 0,95 (Tabela 8). Por outro lado, a comunidade de Jardim

Ocidental possui a menor posse média por residência: 0,22. No que se refere ao tempo de uso diário do

chuveiro elétrico, o resultado está diretamente relacionado com o número de pessoas que utilizam o

equipamento, conseqüentemente, o consumo de energia elétrica desse equipamento depende do número de

pessoas que fazem uso dele. Assim, segundo a Tabela 8, na comunidade da Mata Machado, o tempo total

médio de banho por domicílio é de aproximadamente 35 minutos por dia, e o número médio de moradores

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por domicílio que utilizam chuveiro elétrico é de 3,2 pessoas; enquanto que o menor tempo total médio de

banho por domicílio observado foi na comunidade do Jardim Ocidental: cerca de 8 minutos por dia. No

entanto, esse último resultado pode ser explicado pelo reduzido número de moradores no domicílio que

fazem uso do chuveiro elétrico na comunidade: menos de uma pessoa.

Tabela 8: Chuveiros elétricos – total, número médio de aparelhos, tempo médio e total de banhos e número de moradores por domicílio que utilizam chuveiro elétrico

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Em termos de eficiência, não se verificam diferenças substanciais entre os diferentes modelos e marcas de

chuveiros elétricos. Assim, a troca de um chuveiro elétrico por outro não possui potencial significativo de

redução do consumo de energia, não justificando, desta forma, que a mesma ocorra ou que seja incentivada a

fim de reduzir o consumo de energia elétrica pelo equipamento.

Uso: Condicionamento térmico / Equipamento: Condicionador de ar

Embora em estudos sobre o consumo de energia elétrica do setor residencial brasileiro o uso

condicionamento térmico represente menos de 5% do consumo total, vale destacar que o condicionador de

ar é um equipamento que exige um elevado consumo de energia elétrica. Na estimativa do consumo médio

total dessas comunidades, o condicionador de ar chega a representar cerca de 58 kWh/ mês, reforçando a

hipótese de ocorrência dos chamados “gatos” – furtos de energia – que ocorrem, sobretudo, nas classes de

baixo poder aquisitivo.

A fornece a quantidade de condicionadores de ar por residência. No que se refere ao total de aparelhos nas

comunidades, Mangueira se mantém como a comunidade que possui o maior número de condicionadores de

ar com 20% do total de aparelhos, seguida da comunidade de Lixão que possui 19% dos aparelhos. Por outro

lado, o menor número de aparelhos por residência está na comunidade de Jardim Ocidental, que por sua vez,

só possui 1% do total de condicionadores de ar.

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Tabela 9: Total de condicionadores de ar (janela e split) e idade média por comunidade.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da PUC-Rio (2007)

Através das informações sobre a idade média dos aparelhos por comunidade () verifica-se que a comunidade

da Mata Machado é a que possui os condicionadores de ar com maior tempo de uso, resultando em uma

idade média de 7 anos. Os aparelhos mais novos estão na comunidade do Lixão, com idade média de 3 anos.

Fazendo uma correlação dos dados de idade média com a posse de condicionador de ar por residência, é

possível dizer que a comunidade do Lixão possui melhores condições de renda e consumo por estar entre as

comunidades com os condicionadores de ar mais novos, além de possuir maior número de aparelhos (61).

No que se refere especificamente aos aparelhos split (ver), considerando o conjunto das dez comunidades

pesquisadas, foram localizados 6 aparelhos. Dado que este equipamento é pouco comum em residências de

comunidades carentes, houve uma investigação mais aprofundada sobre o funcionamento de comércio

informal nessas residências, mas de acordo com o banco de dados, apenas 1 residência, das que possuem

condicionadores de ar, tem um comércio em funcionamento, embora o condicionador de ar não tenha sido

declarado como aparelho utilizado no comércio.

Por outro lado, a organização dos aparelhos por faixa de eficiência evidencia que, dentro de cada marca, os

aparelhos mais eficientes não possuem diferenças elevadas de valor frente aos aparelhos de baixa eficiência.

Considerando todos os condicionadores de ar, é possível verificar que, curiosamente, boa parte dos

aparelhos existentes nas comunidades é eficiente, ou seja, 59% são classificados como eficientes e 41% são

ineficientes5.

4. Correlação Preço-Eficiência

Outra consideração relevante nessa análise, diz respeito a uma possível correlação entre o preço dos

5 São considerados eficientes os aparelhos que segundo a classificação do INMETRO estão na faixa A. As demais faixas (B, C, D e, E) estão agregadas em ineficientes.

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equipamentos e sua eficiência. Ao estimar o coeficiente de correlação entre essas duas variáveis, obtiveram-

se os seguintes valores, para os diversos equipamentos:

Condicionadores de ar: -0,0657. Esse coeficiente indica que a correlação entre o preço do ar

condicionado e sua faixa de eficiência é quase nula.

Refrigeradores: -0,13052. Esse coeficiente indica uma relação inversa entre as variáveis ou

que a relação entre o preço do refrigerador e sua faixa de eficiência não explica completamente o

preço final, por este sofrer influência de outros fatores como estética, design, etc. Mas isso não ocorre

para todos os tipos de refrigeradores, pois para a categoria Frost-free, obteve-se o valor 0,1904. Esse

coeficiente indica que há relação entre o preço do refrigerador Frost-free e sua faixa de eficiência, ou

seja, os equipamentos com maior eficiência apresentam preço mais elevado.

Freezers : -0,1307. Esse coeficiente indica que não há relação entre o preço do freezer e sua

faixa de eficiência.

Dado que nem sempre os equipamentos mais eficientes são os mais caros, podemos inferir, que a diferença

de preço entre equipamentos esteja relacionada a variáveis qualitativas, como, por exemplo, marca, estética,

garantia, entre outros fatores, e nesse caso, políticas que estimulem a troca por equipamentos mais

econômicos em termos de energia são sustentáveis. Já no caso em que há uma correlação positiva entre as

variáveis, como nos refrigeradores Frost-free, políticas que estimulem a troca por equipamentos mais

econômicos em termos de energia devem incluir algum tipo de incentivo financeiro (rebate) por parte das

concessionárias de energia elétrica ou pelo governo, principalmente em comunidades de baixa renda.

5. Conclusões

Este artigo teve como objetivo apresentar o perfil de posse e uso dos equipamentos referentes aos principais

usos finais relativos ao consumo de energia elétrica, relacionando-o com a renda média, a eficiência dos

aparelhos e os preços dos mesmos, para melhor caracterizar dez comunidades de baixo poder aquisitivo, de

forma a apresentar, em artigo posterior, os potenciais de conservação (técnico, econômico e de mercado) de

redução do consumo de energia elétrica, identificando as alternativas disponíveis para um uso mais eficiente

da energia elétrica nas dez comunidades em estudo.

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Assim, pelo que se pôde verificar dentre os principais usos finais analisados, no tocante à refrigeração, a

maior parte dos refrigeradores das comunidades pesquisadas é classificada como faixa de eficiência “A”,

denotando um baixo potencial de conservação de energia através da troca dos equipamentos de refrigeração

nestas localidades. Por outro lado, a maioria dos freezers das comunidades possui faixa de eficiência “B”, o

que indica algum potencial de conservação de energia através da troca do equipamento por outro mais

eficiente, embora a redução do consumo de energia elétrica proporcionada por esta troca não seja muito

significativa.

No que diz respeito ao aquecimento de água, em termos de potencial de conservação energética, a

substituição do chuveiro elétrico por outras tecnologias, como por exemplo, aquecimento solar, pode trazer

uma redução no consumo de energia significativa. Contudo, considerando o baixo poder aquisitivo das

famílias em estudo e o elevado investimento inicial destas tecnologias alternativas, verifica-se a necessidade

de incentivos para estimular a substituição do chuveiro elétrico por tecnologias mais eficientes.

Com relação ao condicionamento térmico, embora a posse média de condicionadores de ar por residência

não seja muito elevada nas comunidades, notou-se que quando há equipamentos, o consumo de energia

elétrica associado ao uso destes é significativo. De modo geral, acerca das características dos equipamentos,

constatou-se que a maior parte (aproximadamente 59%) é classificada como eficiente (Selo PROCEL A) e, a

idade média está em torno de 4,5 anos. Dentro do conjunto, a comunidade de Mangueira apresentou o maior

número de aparelhos, um pouco acima de 3 aparelhos a cada 10 domicílios. E Lixão possui aparelhos com

menor tempo de uso (3 anos em média), o que pode ser associado ao fato desta comunidade possuir

melhores condições de renda e consumo.

No que se refere aos possíveis benefícios diretos oriundos da utilização de tecnologias mais eficientes, quais

sejam os ganhos econômicos decorrentes de despesas com eletricidade reduzidas em função de um seu

menor uso, resultados parciais, indicam que, não obrigatoriamente, nas comunidades examinadas, estes

ganhos de eficiência se dariam através de custos maiores para a aquisição de equipamentos mais eficientes.

Correlações mostram que, não necessariamente, aumentos de eficiência energética implicam na aquisição de

bens de consumo duráveis mais dispendiosos. Uma primeira evidência forte que começa a emergir do estudo

é que, provavelmente, as principais barreiras à difusão de tecnologias mais eficientes no mercado passam

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pela desinformação dos consumidores. Portanto, tão importante quanto à avaliação das alternativas

tecnológicas mais eficientes do ponto de vista energético é a identificação de ações que permitam um amplo

acesso dos consumidores à informação.

Por outro lado, o uso eficiente da energia deve ampliar o acesso da comunidade a este bem, permitindo uma

melhoria geral da qualidade de vida. É preciso ressaltar que as mudanças decorrentes da determinação do

potencial de conservação de eletricidade vão além da utilização racional da energia. As transformações

envolvem a questão da inserção energética de comunidades carentes, e neste sentido, as modificações atuais

ocasionadas pela pacificação de comunidades têm um impacto muito grande sobre estas questões. Assim,

uma maior coibição dos furtos de energia (o que é natural com uma presença mais ostensiva das Unidades

de Polícia Pacificadora e da ausência do crime organizado) reduzirá substancialmente o acesso à energia

elétrica para famílias que não têm capacidade de pagamento muito elevada, ressaltando a importância de

uma utilização mais racional da energia seja através do modo de usar os equipamentos, seja através da maior

eficientização dos mesmos e o acesso às tarifas sociais. Para tanto a participação da Universidade, das

empresas de energia e do Governo, são essenciais, formando um tripé de atuação que garantirá a melhoria da

qualidade de vida das famílias destas áreas, dentro do princípio da cidadania e colaborando para o bem-estar

geral da sociedade.

6. Agradecimentos

Os autores agradecem as contribuições de Anna Cecília Jasmim de Aguiar, Bruno Menezes, Gláucio Faria,

Guilherme Santoro, Gustavo Malaguti, Mônica Chagas e Vanderlei Martins, membros da equipe que

participou da realização deste projeto, inicialmente no âmbito das rodadas ANEEL para eficiência energética

e atualmente financiado graças a recursos da FAPERJ, no âmbito do prêmio Jovem Cientista do Nosso

Estado (Claude Cohen), e ao IPEA pela bolsa de mestrado concedida à Daniele Alcantara.

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Orientador: Claude Cohen.

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