análise de demonstrações financeiras estudo de caso da perdigão s/a

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71 ANÁLISE DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS ESTUDO DE CASO DA PERDIGÃO S/A Ricardo Trovão Rego 1 4 1- INTRODUÇÃO As demonstrações financeiras balanço patrimonial, demonstração do resultado do exercício, demonstração das mutações do patrimônio líquido e demonstração das origens e aplicações de recursos - constituem o conjunto básico de dados organizados e publicados periodicamente pelas empresas. Por serem dados acumulados e organizados pelo sistema contábil para refletir o estado patrimonial e desempenho econômico de organizações, requer-se que sua leitura e interpretação sejam feitas através de determinadas técnicas. O presente artigo apresenta conceitos, importância e aplicação das principais técnicas utilizadas na análise de demonstrativos contábeis, especialmente o Balanço Patrimonial e o Demonstrativo do Resultado do Exercício, e tem como objetivo fazer um diagnóstico da situação econômica e financeira da empresa Perdigão S.A. Pelo estudo de caso sobre a empresa Perdigão S.A, conclui-se que a empresa apresentou melhorias em sua capacidade de saldar pagamentos a curto prazo além de reduzir o prazo de recebimento de vendas. Mas, ainda assim, está na média, quando comparada a outras empresas que atuam no segmento de carnes de aves e suínos do Setor de Alimentos. Foram analisados os resultados financeiros apresentados, procurando-se contextualizar as principais decisões estratégicas tomadas até 2002 e o reflexo no seu desempenho. 1 Graduado em Administração em 1997, pela UFMG, Especialista em Negócios para Executivos pela FGV- EAESP e, atualmente, Analista de Planejamento e Orçamento Sr. na CBCC.

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ANÁLISE DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS – ESTUDO DE CASO DA PERDIGÃO S/A

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ANÁLISE DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS

ESTUDO DE CASO DA PERDIGÃO S/ARicardo Trovão Rego1

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1- INTRODUÇÃO

As demonstrações financeiras – balanço patrimonial,demonstração do resultado do exercício, demonstração das mutaçõesdo patrimônio líquido e demonstração das origens e aplicações derecursos - constituem o conjunto básico de dados organizados epublicados periodicamente pelas empresas. Por serem dadosacumulados e organizados pelo sistema contábil para refletir o estadopatrimonial e desempenho econômico de organizações, requer-se quesua leitura e interpretação sejam feitas através de determinadastécnicas.

O presente artigo apresenta conceitos, importância e aplicaçãodas principais técnicas utilizadas na análise de demonstrativos contábeis,especialmente o Balanço Patrimonial e o Demonstrativo do Resultadodo Exercício, e tem como objetivo fazer um diagnóstico da situaçãoeconômica e financeira da empresa Perdigão S.A. Pelo estudo de casosobre a empresa Perdigão S.A, conclui-se que a empresa apresentoumelhorias em sua capacidade de saldar pagamentos a curto prazo alémde reduzir o prazo de recebimento de vendas. Mas, ainda assim, está namédia, quando comparada a outras empresas que atuam no segmentode carnes de aves e suínos do Setor de Alimentos. Foram analisados osresultados financeiros apresentados, procurando-se contextualizar asprincipais decisões estratégicas tomadas até 2002 e o reflexo no seudesempenho.

1 Graduado em Administração em 1997, pela UFMG, Especialista em Negócios para Executivos pela FGV-EAESP e, atualmente, Analista de Planejamento e Orçamento Sr. na CBCC.

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Os demonstrativos financeiros da Perdigão tiveram como fonte opróprio site da empresa. As informações dos concorrentes foramextraídas dos respectivos sites, além da página da Bovespa. Foramanalisados o Balanço Patrimonial e Demonstrativo do Resultado doExercício pelos métodos de Análise Vertical, Análise Horizontal eíndices de liquidez, atividade, endividamento e rentabilidade.

2 - CONCEITOS

A análise de demonstrativos contábeis se caracteriza pelaextração, transformação e condensação, usando-se diversas técnicas,de uma grande massa de dados em informações úteis e relevantesao processo de decisão. Segundo Helfert (2000), a análise dedemonstrativos contábeis é uma técnica bastante utilizada poracionistas, investidores, credores, agências governamentais e pelagerência com a finalidade de ajudar os responsáveis a tomar decisõesacertadas, de investimento, operacionais ou de financiamento, em umcontexto econômico relevante. A análise financeira é relativa, e,somente por comparações históricas com outras empresas e como setor, poderá indicar qual a real condição da empresa. Nenhumindicador é bom ou ruim isoladamente.

A análise das demonstrações financeiras deve ser entendidadentro de suas possibilidades e limitações. De acordo com Iudícibus(1998), a análise, por um lado, mais aponta problemas do que indicasoluções e, por outro, pode se transformar num painel de controle a serutilizado pela Administração. A análise limitada a um exercício apenas épouco reveladora. Assim, é interessante se ter também dados deexercícios anteriores.

As duas técnicas mais difundidas de análise são a extração deíndices financeiros, econômicos e de atividade, e elaboração dasanálises horizontal e vertical.

A extração e análise de índices refletem a ordem de grandezacomparada entre contas e grupos de contas das demonstrações,

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permitindo elaborar um diagnóstico geral da situação financeira(endividamento, liquidez, etc), econômica (rentabilidade, margem, etc)e operacional (prazo médio de estoques, recebimento de vendas, etc).

A Análise Horizontal (AH) corresponde ao estudo comparativo,em períodos de tempo consecutivos, da evolução das contas quecompõem as demonstrações financeiras. Toma-se um exercício comobase (índice 100%) e faz-se a relação conta-a-conta dos exercíciosseguintes. Assim é possível ver a variação das contas ao longo dotempo, comparando-se ao ano-base. Para que se possa extrairconclusões é necessário que se analisem três a cinco exercíciosconsecutivos. Conforme a Equipe de professores da FEA/USP (1993),o ideal é que todos os valores sejam convertidos para a moeda doúltimo exercício, usando fatores de deflacionamento.

A Análise Vertical (AV) tem como objetivo principal identificar ascontas que têm maior ou menor peso relativo na demonstração. Talanálise é feita após o valor numérico de cada conta ser transformadoem percentual em relação a um valor base. Assim, no caso do Balanço,calcula-se o percentual de cada conta em relação ao total do Ativo; naDemonstração do Resultado, toma-se o percentual de cada conta emrelação à Receita Líquida de Vendas. Mediante comparações entrevários exercícios, ou com padrões do ramo ao qual pertence aempresa, pode-se inferir se os principais itens das demonstraçõestêm-se comportado dentro ou fora das proporções típicas.

Normalmente, inicia-se a análise pela AV (Análise Vertical) paraidentificar as contas mais representativas e depois a AH (AnáliseHorizontal) para analisar a evolução dessas contas. Assim, a análisesegue uma linha de consistência.

3 - EMPRESA PERDIGÃO S.A.

A Perdigão é uma empresa do ramo de alimentos criada a partirda iniciativa de duas famílias de imigrantes italianos – os Ponzoni e osBrandalise – em 1934, na Vila das Perdizes, Santa Catarina.

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A diversificação dos negócios da empresa iniciou-se em 1939,através do início de suas atividades industriais, um pequeno abatedouroe fábrica de produtos suínos. Em 1954, a empresa investiu também emavicultura.

Em 1994, o controle acionário da Perdigão foi adquirido por um“pool” de Fundos de Pensão, determinando importantes mudanças naadministração da empresa. A implantação de uma gestão profissionallevou a uma nova cultura empresarial e a um reposicionamentoestratégico, orientados para a busca de melhores resultados.

Entre 1995 e 1999, a empresa implantou um projeto de otimizaçãode suas unidades industriais, que resultou no aumento da capacidadeprodutiva das suas fábricas em 50% e exigiu um investimento de R$272milhões. Em 2000 a Perdigão comprou 51% do controle acionário doFrigorífico Batávia, sexta empresa brasileira no ranking de processadorasde carne. Em 2001, adquiriu os 49% restantes e os incorporou àPerdigão Agroindustrial S/A, mantendo a marca Batavo no mercado.

Em 2002, a empresa abriu um escritório em Dubai, nos EmiradosÁrabes, ampliando sua presença no Oriente Médio.

Em 2003, foi inaugurado, em Goiás, o complexo agroindustrial deRio Verde, situado estrategicamente próximo dos mercados emergentesnacionais. A unidade, uma das maiores do mundo, gera, hoje, 5.500empregos. O empreendimento foi dimensionado com a capacidade deproduzir 260 mil toneladas anuais de carnes, gerando um faturamentode cerca de R$ 1 bilhão, em 2004. O complexo permitiu desconcentrarsua produção nas unidades do Sul, possibilitando que essas ficassemmais focadas nas demandas do mercado internacional. Atualmente, aPerdigão emprega mais de 27 mil pessoas.

4 - AS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRASDA PERDIGÃO

A seguir, são apresentados o Balanço Patrimonial e Demonstra-ção de Resultado referentes aos exercícios de 2000, 2001 e 2002.

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Balanços Patrimoniais

Balanço Patrimonial

Em 31 de dezembro de 2000, 2001 e 2002(Valores expressos em milhares de reais)

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Demonstrações dos Resultados

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Índices Financeiros

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4.1 Balanço Patrimonial

A partir da Análise Vertical foi possível verificar que, em 2000,o Ativo Circulante correspondia a 53,5% do ativo total da empresa.Esse total caiu para 43% em 2001 e subiu para 61,9% em 2002. Asaplicações financeiras no primeiro ano respondiam por 28,8% das contasdo Ativo Circulante. Esse percentual caiu para 16,1% em 2001,aumentando para 28,4% em 2002. Nos três anos analisados,os estoques ocuparam posição de destaque no total dos ativos,participando respectivamente com 11,7%, 13,1% e 19,8%. Essecomportamento se relaciona diretamente com o aumento das vendas.

Os ativos permanentes correspondiam a 40,7% do total de ativosem 2000. Essa relação se manteve quase inalterada em 2001, mas em2002 caiu para 33,6%.

No Passivo, nota-se claramente o aumento dos empréstimos,financiamentos e debêntures de 28,7%, em 2001, para 42% em 2002.Esse aumento impactou a participação do Passivo Circulante no totaldo Passivo, passando de 41,8%, em 2001, para 55,4% em 2002.

Os empréstimos, financiamentos e debêntures a longo prazoreduziram sua participação ao longo dos anos, passando de 27,4% em2000 para 24,7% em 2001 e, por fim, 17,7% em 2002.

As contas de exigível a longo prazo como um todo representaram33,3% do passivo em 2000, diminuindo ligeiramente em 2001 para30,4% e caindo em 2002 para 22,1%. A conta capital social realizado,do patrimônio líquido, é de grande expressão, correspondendo a 18,6%do total do passivo em 2000, 17,1% em 2001 e 16,3% em 2003.

A Análise Horizontal mostra, na estrutura do Ativo, um aumentode 55,8% na parcela do Circulante do exercício de 2002 em relação aode 2000 (ano-base), influenciado, em boa parte, pelo aumento dosestoques (126,8%) e pelas aplicações financeiras (32,8%). Em 2001, ocirculante havia decrescido 12,7% quando comparado com 2000.

No Ativo Permanente, observa-se um crescimento gradativo nosanos analisados, sendo de 5,7% no Imobilizado e 38,7%, no diferidoem 2001 e 9,3% no Imobilizado e de 41,1%, no diferido em 2002,sempre em relação ao exercício de 2000.

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No Passivo, o Circulante cresceu 10,1% em 2001 e 81%, em 2002.Em 2002, este aumento se deve basicamente ao crescimento deempréstimos, financiamentos e debêntures, que representaram 42% dototal do Passivo Circulante. O Exigível a Longo Prazo caiu 10,6% em2002, em relação a 2001. No patrimônio líquido observa-se umaumento de 21,2% em 2001 e 21,8% em 2002, influenciados pelocrescimento do capital social e reservas de lucros.

4.2 Demonstração dos Resultados

A Análise Vertical do Demonstrativo de Resultados da Perdigãomostra que a relação das vendas no mercado interno / receitaoperacional líquida (ROL) caiu de 2000 para 2001, passando de 88,1%para 72,1%. Esse percentual passou para 73,2% em 2002

Por outro lado, a participação das exportações cresceu de 29,1%para 42,5% em 2001, passando para 41,3% em 2002. Esses dadosmostram o que já tinha sido concluído na análise horizontal, ou seja,maiores e melhores condições de concorrência no mercado externo, e,por conseguinte, mais receita.

O custo das vendas apresentou um comportamento oscilante. Em2000 representava 75,8% da ROL. Em 2001, esse percentual caiu para67,1% e, por fim, em 2002 subiu para 72,1%. A análise permiteconcluir que as despesas com vendas vêm aumentando em relação àROL. Essas despesas são variáveis de acordo com a receita.

O mesmo comportamento foi verificado nas despesas financeiras.Em 2002, o índice foi de 7,5%, ao passo que, em 2001, foi de 5,0%,e, em 2000, de 3,6%. Esse dado pode ser justificado pelo grandeaumento das despesas financeiras devido ao aumento do endividamentodecorrente da desvalorização cambial, conforme mencionadoanteriormente.

A variação dessas duas contas de despesas fez com que a relaçãodespesas totais/ROL passasse de 21,3%, em 2000, para 22,9% em 2001e 27,8% em 2002. Em conseqüência, o lucro líquido correspondeu a0,3% do ROL em 2002, enquanto que, em 2001, esse índice fora de6,9% e, em 2000, de 2,6%.

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A Análise Horizontal da DRE mostra que as vendas aumentaram35,5% em 2001 e 61,7%, em 2002, comparando-se a 2000.Percentualmente, um grande salto ocorreu nas vendas ao mercadoexterno. Em 2001, foram 102% maiores que 2000 e, em 2002, 135,4%maiores.

As exportações da Perdigão não cresceram somente em receita(devido apenas à variação cambial), mas também, em volume. Esseaumento foi propiciado não apenas pela oportunidade gerada peladoença da “vaca louca” (uma vez que o Estado de Santa Catarina eraconsiderado área não afetada) e febre aftosa na Europa, mas tambémpela conquista efetiva de mercados em países europeus, asiáticos e doOriente Médio, através da competitividade com custos menores deprodução, da inovação tecnológica, da qualidade nos processos eprodutos, envolvendo, ainda, a rastreabilidade dos animais.

O aumento da receita no mercado interno, 12,9% em 2001e 37,4% em 2002, é fruto, entre outras razões, da constantepreocupação com o atendimento dos anseios do mercado resultandonos lançamentos de novas linhas e produtos. Pode-se citar ainda aestratégia de focar suas operações logísticas no aumento da eficiênciae na redução dos custos, construindo centros de distribuição paraalcançar longas distâncias através de pontos de cross-dockings.

O resultado das vendas impactou positivamente o lucro bruto. Este,em 2001, foi 87,1% superior a 2000 e, em 2002, 90,2% superiorao ano 2000. Em contrapartida, as despesas apresentaramcomportamento crescente em 2000, 2001 e em 2002. Em 2002, asdespesas com vendas foram 95,2% maiores do que em 2000. O mesmoocorreu com as despesas gerais e administrativas: 25,3%, em 2002,maiores que 2000. Um grande aumento ocorreu com as despesasfinanceiras. Em 2001, foram 91% a mais do que em 2000 e, em 2002,246,7%.

O aumento no endividamento líquido foi resultante dadesvalorização cambial, dos investimentos realizados e da necessidadede capital de giro adicional, para aumento de estoques dematérias-primas, animais e produtos acabados.

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As despesas, no total, cresceram, em 2001, 48% e, em 2002,115,5% em relação ao ano 2000. Assim, o resultado da atividade (lucrooperacional) sofreu grande influência, passando de forte recuperaçãoem 2001 (372,3%) para forte queda em 2002 (redução de 95,1% emrelação a 2000).

O lucro antes dos impostos sofreu reflexo direto da tendêncianegativa do lucro operacional, destacando-se o ano de 2001, com fortecrescimento (353,1%), mas com decréscimo significativo em 2002(95,6%).

No que se refere ao lucro líquido, verifica-se que o ano de 2001apresentou um resultado positivo, com crescimento de 270,7%, enquantoque, em 2002, houve uma redução de 81,9% em relação ao exercíciode 2000.

5 - ÍNDICES FINANCEIROS

Foram levantados os indicadores de liquidez, atividade,endividamento e estrutura e rentabilidade.

O quadro 1 ilustra que a liquidez corrente, que compara o ativo epassivo circulante objetivando medir a capacidade de a empresaatender a seus compromissos de curto prazo, em 2000, era maior que2001 e 2002. Esse índice, no primeiro ano analisado, foi de 1,3,caindo para 1,03 em 2001 e chegando a 1,12 no último período.

O Balanço Patrimonial mostra que, em 2002, o passivo circulantefoi 81% maior que em 2000. Contribuiu para tal quadro o fato de aempresa, em 2002, ter aumentado a dívida com fornecedores, além deter alocado maiores volumes de empréstimos e financiamentos. O ILC(Índice de Liquidez Corrente) supõe que haja liquidação total deestoques para quitação de dívidas, o que, na maioria dos casos, é umasituação irreal.

O ILS (índice de liquidez seca) pressupõe que os compromissosde curto prazo serão atendidos somente pela realização das duplicatasa receber e disponibilidades, considerando a renovação dos estoques esua não realização. Novamente, o valor foi maior em 2000 do que 2001e 2002. No primeiro período 1,01; no segundo 0,71 e, por último, 0,76.

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A capacidade de a empresa honrar seus compromissos de curto prazo,não se utilizando do estoque, apresentou melhoras em 2002 em relaçãoao ano anterior, principalmente por causa do aumento das aplicaçõesfinanceiras.

O último índice de liquidez analisado, o de liquidez geral, secomportou de forma crescente no intervalo dos três anos. Em 2000 erade 0,8, passando, no ano seguinte para 0,83 e, atingindo, por fim, 0,86em 2002. Colaboraram, para tal cenário, o aumento do ativo circulanteem 2002, e redução do exigível a longo prazo de aproximadamente 10%em relação ao ano 2000.

No decorrer dos anos, a Perdigão reduziu o prazo médio derecebimento de seus clientes em cerca de 40%, o que contribuiupositivamente para o fluxo de caixa. Em contrapartida, em 2002, oprazo médio de estocagem foi de 78 dias, enquanto que, em 2001, foide apenas 64.

Os índices de endividamento mostram que a empresa utilizou, em2002, mais capital de terceiros, proporcionalmente, do que em 2001 ou2000. Tanto a relação capital de terceiros / capital próprio, quanto oendividamento geral mostram aumento na utilização e dependência derecursos externos.

A margem bruta ou lucratividade bruta decresceu de 2001 a2002. Nesse ano houve um grande aumento nos custos das vendas,influenciando negativamente o lucro bruto e, conseqüentemente, amargem bruta.

Devido ao aumento das despesas operacionais em 2002(R$810.888,00 contra R$557.170,00 em 2001) o lucro operacional semostrou inferior (R$2547,00 contra R$243.050,00 em 2001). Comisso, a margem operacional caiu de 10% para 0,1%, afetando o lucrolíquido. A redução do lucro líquido fez com que a rentabilidade sobre opatrimônio líquido passasse de 25% em 2001 para 1,2% em 2002.Por fim, o ROI foi negativamente afetado, uma vez que mede arentabilidade utilizando margem líquida (lucro líquido/vendas líquidas) egiro dos ativos.

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6 - A PERDIGÃO EM RELAÇÃO AO SEUSETOR DE INDÚSTRIA DE ALIMENTOS

A seguir, estão as comparações entre os índices financeirosapresentados anteriormente para o ano de 2002, com os índices de outrasempresas do setor de alimentos (Avipal, Bunge, Cargill, Frangosul,Parmalat, Sadia e Seara). Objetivando avaliar a performance daPerdigão em relação à sua concorrência, foram criados gráficosatravés do método de Polígonos de Freqüência Acumulada, tambémconhecido como Método de Ogivas. Por este método soma-se afreqüência das classes anteriores até a classe onde se deseja calcular afreqüência acumulada.

6.1 Liquidez Corrente

O índice de liquidez corrente é obtido pelo resultado doquociente entre ativo circulante e o passivo circulante, mostrando acapacidade da empresa em saldar seus compromissos a curto prazo.

O índice de liquidez corrente da Perdigão, apurado no exercício2002, foi de 1,12 que, conforme observamos no gráfico abaixo,encontra-se na média das empresas e demonstra uma boa capacidadede pagamento de suas obrigações a curto prazo, ou seja, para cadaR$1,00 devido há R$1,12 para saldá-lo.

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Capital de Terceiros/ Capital Próprio (Debt / Equity)

O Debt/Equity nos mostra o grau de risco financeiro obtido peloresultado do exigível total sobre o patrimônio líquido.

No gráfico acima, verificamos o valor de 3,45 para a Perdigão,significando que para cada R$1,00 de capital próprio existe R$3,45 decapital de terceiros. Conclui-se que a empresa possui um baixo nível deendividamento, comparado à grande maioria dos concorrentes, queobtiveram este índice superior a 5,00.

6.2 Margem Líquida

A margem líquida representa a rentabilidade dos negócios e émedida pelo lucro líquido sobre a receita líquida, multiplicado por 100.No exercício de 2002, a Perdigão obteve um resultado neste índice de0,28% representado uma baixa rentabilidade, porém, comparada comas demais empresas do setor, seu resultado esteve exatamente na médiapercentual, conforme observado no gráfico abaixo em que a empresacom melhor desempenho atingiu 6%.

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6.3 Rentabilidade sobre o Patrimônio Líquido

A rentabilidade sobre o patrimônio líquido, como na margemlíquida, representa a rentabilidade dos negócios, mas considerando arentabilidade do patrimônio líquido sobre o lucro líquido, para que oinvestidor avalie o retorno do seu capital. Esse índice é calculado pelafórmula lucro líquido sobre o patrimônio líquido multiplicado por100. A Perdigão obteve, no exercício 2002, o resultado de 1,22%. Comono tópico anterior, avaliamos como baixa rentabilidade e, novamentecomparada às empresas do setor, seu resultado esteve na médiapercentual, enquanto o índice máximo alcançado por um concorrentefoi de 25%.

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7 - CONCLUSÃO

No último exercício (2002), percebemos que a Perdigãoapresentou evolução quanto à liquidez corrente e seca, em relação a2001, mostrando a boa capacidade de a empresa atender seuscompromissos de curto prazo. É importante salientar que esses índicesse encontram na média do setor de industrialização de alimentos.Pode-se apontar como causa desse resultado o aumento da produção edos volumes de venda como conseqüência dos investimentos emexpansão. Esses aumentos concentraram-se no ativo circulante,principalmente por causa dos acréscimos na conta de recebíveis e nosestoques. Houve também um aumento no passivo circulante devido aomaior volume nas linhas de crédito de curto prazo relacionadas aempréstimos e capital de giro. Em alguns casos, os empréstimos são emmoeda estrangeira, o que colabora para o incremento no endividamento.Entretanto, a variação no passivo não foi suficiente para prejudicar aliquidez, uma vez que contas do ativo circulante, como os estoques eaplicações, apresentaram bons resultados.

A liquidez geral apontou um índice de 0,86%, em 2002, quetambém podemos considerar um bom resultado devido ao histórico deos empréstimos a longo prazo estarem decrescendo com o passar dosanos. Esse comportamento dos empréstimos é fruto da preocupação edas ações da empresa, objetivando reduzir esse montante através dageração operacional de caixa. A maior parte do endividamento daempresa está relacionada a gastos de capital, exportações e comprasde matéria-prima.

Houve uma melhora de 40% no prazo médio de recebimento declientes. Foi determinante para tal queda a adoção de procedimentosde seletividade e análises para limites de créditos. Em casos de atrasos,esforços de cobrança são efetuados, incluindo contatos diretos com osclientes e cobrança através de terceiros. Se esses esforços não surtemefeito, processos legais são necessários.

Devido à elevação das despesas operacionais, demonstradano último ano, a empresa apresentou problemas nos resultadosfinanceiros, passando a margem operacional de 10%, em 2001, para0,1% em 2002, e a rentabilidade sobre o patrimônio líquido, de 25%,em 2001, para 1,2% em 2002. As despesas operacionais tiveram umincremento considerável em relação ao ano de 2001. Para viabilizar asexportações, os custos com fretes marítimos e terrestres além de

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armazenagem e serviços portuários, sofreram elevações. Outros fatorescausaram o aumento das despesas como reajustes das comunicações ecombustíveis e elevados gastos com marketing. A administraçãoacredita que a implementação da nova unidade produtiva em Goiás(Complexo Agroindustrial de Rio Verde- GO) poderia reduzir asdespesas operacionais, economizando- se com logística para a entregade produtos para as regiões norte e nordeste do Brasil, além de poderproporcionar maior produtividade.

Comparando os índices obtidos pela Perdigão com as empresasconcorrentes, no exercício 2002, percebemos que sua posição frenteao mercado está, em todos os itens analisados, em uma situaçãomediana, mantendo sempre o índice avaliado entre 50% e 70% emrelação aos demais, mostrando-se portanto uma empresa que atingeos resultados esperados pelo setor, mas sem grandes resultadossurpreendentes.

8 – BIBLIOGRAFIA

EQUIPE DE PROFESSORES DA FEA/USP, Contabi l idadeIntrodutória. São Paulo: Atlas, 1993.

GITMAN, Lawrence J Princípios de Administração Financeira. SãoPaulo: Harbra, 1987.

HELFERT, Erich A. Técnicas de Análise Financeira: um guia práticopara medir o desempenho dos negócios. Porto Alegre: Bookman, 2000.

IUDÍCIBUS, Sergio de. Análise de Balanços. São Paulo: Atlas, 1998.