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UNESP – Universidade Estadual Paulista
FFC – Faculdade de Filosofia e Ciências
Campus de Marília
Grupo de Estudos e Análise de Conjuntura BRICs
Análise de Conjuntura da China, referente ao
primeiro Trimestre de 2008
Marília
JAN/FEV/MAR 2008
Professores Coordenadores:
Luís Antonio Paulino
Marcos Cordeiro Pires
Anderson Martins Silva
Bruno Ferreira da Rosa
Gabriel Dantas
Gabriel Condi
Gustavo Erler Pedrozo
Hevellyn Albres
Jane Angélica Gulielmitti
Lais de Oliveira Pacini
Rafael Martinbianco
Rodolfo Magro
Rodrigo Gomes Abreu
Tadeu Pacheco Moraes
Talita Queiroz
PRINCIPAIS NOTÍCIAS UTILIZADAS PARA ANÁLISE DE CONJUNTURA
- China aponta para mudança no modelo de crescimento - Agência Estado
- China vai unir Olimpíada e meio ambiente - Terra notícias
- Energia: China enfrenta sua pior crise energética desde 2004 - Investnews
- China acusa países de hipocrisia ambiental - Agência Estado
- Citação de Olimpíadas em matérias sobre o Tibete irrita chineses - Reuters
- FMI pede que a China acelere a valorização da moeda – NEC Network
- Pequim vai acelerar a valorização do Yuan - Agência Estado
- China cria ministério para cuidar do Meio Ambiente, mas especialistas dizem que
não basta - O Globo Online
- China e Índia podem frear efeito de recessão na Ásia - Investnews
- Boom econômico no Tibete não beneficia a todos - AFP
- Tibete: Economia concretiza desenvolvimento de salto em 2007 - CRI
- KMT vence em Taiwan e quer política de aproximação com a China - Relnet
A ESTRATÉGIA DA INSERÇÃO. CHINESA NA ECONOMIA DE MERCADO
Em vista do extenso planejamento por parte do governo central da China, para
sua inserção na chamada economia de mercado, julgamos pertinente iniciar a
presente análise de conjuntura da China, referente aos três primeiros meses de 2008
com um pronunciamento de Jiang Zemin (2002, p.309), realizado em 1999:
O 15º Congresso Nacional do Partido assinalou que daqui aos dez
primeiros anos do próximo século estaremos no período-chave da
reforma e do desenvolvimento do nosso país. Neste período, há que
esforçar-se para estabelecer o sistema de economia de mercado
socialista relativamente completo e manter o contínuo, rápido e
saudável desenvolvimento da economia nacional.
O que identificam-se enquanto fatos portadores de futuro, pois, se encaixam
nas políticas e medidas chinesas para melhorar sua imagem perante o mundo, sem
perder a crescente influência e poder econômico, garantindo posteriormente, lugar
entre as maiores economias do mundo, isto é, posição de destaque nas relações de
forças existentes no âmbito dos Estados Nacionais e das grandes corporações e
instituições de caráter global que exercem influência em grande parte das mediações
financeiras e políticas internacionais. Se o que se propõe a China é uma crescente
inserção econômica no mercado, deve ela ceder em alguns momentos para tornar-se
“aceitável” ao mundo, principalmente ao “mundo” ocidental. Processo semelhante foi
o que passaram Taiwan, Coréia do Sul, Japão, que ao estabelecerem efetivamente
marcas consagradas pela opinião pública como LG, Samsung, Sony, atingiram outro
nível de suas economias, no papel de detentores de know-how. Partindo desse
pressuposto, organizamos a presente análise em três pontos fundamentais, de maior
recorrência na mídia recentemente: as relações político-econômicas de inserção
chinesa no mercado mundial, o conflito com o Tibete e seus desdobramentos e, por
último, mas também de relevante importância, as questões ambientais. Acreditamos,
pois, que através desses pontos fundamentais poderemos perpassar por diversas
questões que permeiam as políticas chinesas e sua estratégia para continuar no
mercado internacional suscitando cada vez menos olhares indispostos à sua inserção.
ECONOMIA POLÍTICA: DESDOBRAMENTOS E CONSEQÜÊNCIAS DA
CRESCENTE ASCENSÃO CHINESA
Ao longo das últimas duas décadas passadas, a China abasteceu o mundo com
produtos mais baratos. Isso se tornou possível devido à mão-de-obra barata, à grande
escala de produção com preços extremamente competitivos e a desvalorização da
moeda perante o dólar que propiciou a entrada do capital externo. Com isto os países
concorrentes tiveram que igualar as ofertas, criando assim um movimento que teve
papel fundamental no controle da inflação em diversos países.
Nos últimos meses, foram constatados índices de que essa supremacia da China
na baixa dos preços está chegando ao fim e se inicia a era da carestia. A China enfrenta
hoje uma inflação em grande medida ocasionada por problemas no setor energético e
alimentício. As grandes nevascas que assolaram a China nesse início de ano
provocaram um colapso no sistema ferroviário que afetou o abastecimento de carvão
para as usinas termoelétricas ocasionando uma grande perda na capacidade de
produção de energia, visto que 78% da capacidade de geração de energia da China é
baseada nas usinas de carvão; e por outro lado prejudicou a produção agrícola voltada
à abastecimento da população. No que diz respeito à população, a economia foi
abalada porque grande parte das pessoas que se encontravam na miséria, hoje, se
alimenta melhor. E os que já tinham alimentos sofrem um processo que podemos
denominar “ocidentalização”, isto é, os grãos estão deixando de ser a base da
alimentação chinesa e os alimentos costumeiramente ocidentais estão entrando na
dieta dos chineses. Resumindo, os chineses estão comendo mais, a demanda por
alimentos é cada vez maior, ao passo que a produção encontra diversos problemas
atualmente, como as já ditas nevascas no território chinês e a polêmica em torno dos
biocombustíveis.
Itens indispensáveis na dieta chinesa aumentaram. A carne de porco [base da
alimentação dos chineses] subiu 63,4%, os vegetais frescos subiram 46% e o óleo de
cozinha 41%, em relação ao mesmo período de 2007. O aumento do preço da mão-de-
obra no país chegou a 80% nos últimos anos, com isso o poder de consumo da
população aumentou, colaborando para a alta dos preços. Em se tratando do cenário
externo, os americanos foram afetados por esta crise inflacionária e irão pagar em
2008 até 10% a mais pelos produtos importados da China. Na Ásia [onde se
concentram 50% da exportação chinesa] as pressões inflacionárias tendem a ser fortes
e é esperado um aumento de 3% ao ano na região até 2011. Devido ao consumo de
trigo na China, as cotações mundiais deste produto aumentaram. Na França o preço do
pão subiu 4% em relação ao mesmo período de 2007.
Os mecanismos de combate a esses aumentos inflacionários, pelo governo do
Partido Comunista, são contrários a algumas análises provenientes de órgãos
internacionais, ou mesmo Estados Nacionais simpatizantes às teorias liberais. Ao invés
da China se concentrar na taxa de juro e migrar para uma política monetária flexível,
os chineses persistem no câmbio controlado [cotação do Yuan ante o Dólar] e no
congelamento dos preços de alguns produtos. Essa desvalorização da moeda
ocasionou manifestações de diversas instituições monetárias internacionais, uma delas
o FMI, que aconselhou ao governo chinês aumentar, de forma mais rápida, a cotação
do Yuan frente ao dólar como medida de controle da inflação, porém deve-se atentar
para a relação de forças presente nessa questão. De um lado o dragão chinês que vem
abocanhando boa parte do mercado mundial com suas mercadorias, de outro, os EUA
tentando contornar a crise do setor financeiro e mantendo-se inabalável em sua
posição de potência hegemônica. O governo chinês cedeu às pressões internacionais, e
anunciou a aceleração do processo de valorização de suas divisas. Com isso, os
chineses pretendem ter mais controle sobre a inflação. Por outro lado essa medida
pode diminuir o fluxo de capitais dos EUA (não somente) para a China. Dentre outras
medidas de controle da inflação o PCCh aumentou o depósito compulsivo que os
bancos têm de fazer no banco central chinês, visando diminuir a liquidez do mercado.
Nesse contexto de crise a China se apresenta na prática como líder regional, tendo,
graças a seu vigoroso crescimento, a possibilidade de fazer frente à crise americana,
mantendo a economia asiática competitiva no mercado internacional.
Em meio a esse cenário a China apontou recentemente para uma mudança no
modelo de crescimento, com medidas como a restrição a investimentos em setores
poluentes, com grande consumo de energia e com excesso de capacidade produtiva,
estímulos a setores de alta tecnologia ecologicamente corretos. Além dessas medidas
o governo chinês vai direcionar os investimentos estrangeiros diretos para os setores
como bancos, comércio, telecomunicações. Esse processo de terceirização da
economia chinesa aponta para uma nova etapa do desenvolvimento chinês, agora não
basta ser a fábrica do mundo.
O CONFLITO SEPARATISTA DO TIBETE EM BREVES PERSPECTIVAS
HISTÓRICAS
O Tibete cultiva uma tradição budista teocrática desde o século VI e, desde o
século VIII manteve-se separada, oficialmente da China pelo conselho de Lhasa. Em
1720 o território tibetano é incorporado ao império chinês sob a denominação de
protetorado. Essa região conseguiu, durante um tempo relativamente longo, conservar
características próprias de um país independente, como a não separação entre o poder
temporal e o poder espiritual. Conseguiu manter seus costumes, língua e exército
próprio. Entretanto esse status de independência nunca chegou a ser reconhecido
nem pela comunidade internacional e muito menos pela China.
Assim como ocorrido na África, a Ásia, no período expansionista europeu do
século XIX, sofreu maciças invasões que tumultuaram em grande medida a relação de
fronteiras dessa região. Nesse mesmo período constatamos que alguns dos grandes
impérios orientais conseguiram se manter na condição de independência, apesar de
não possuírem mais o poder de influencia de outrora, como é o caso de China, Japão,
Sião e Turquia. Não obstante, os imperialistas europeus conquistam várias zonas de
influência, das mais variadas maneiras e pelas mais variadas causas político-
econômicas. Figuram-se entre essas zonas de influência Índia, Birmânia, Tibete, Pérsia,
Indochina e Indonésia.
Posteriormente a tais acontecimentos, verifica-se uma intensificação de
conflitos entre Rússia e Inglaterra em conseqüência das tais zonas de influência na
região asiática. No meio desse conflito, os dois países dominadores envolvidos
resolvem por deixar a região tibetana em paz.
Em 1911 chega ao fim efetivamente a dinastia Qing, que governava o Império
chinês; e já em 1912, os tibetanos se aproveitam do enfraquecimento da China para
expulsar os residentes chineses da área que consideravam sua. Tal situação pode ser
notada até a tomada do poder pelo Partido Comunista, liderado por Mao Zedong, no
ano de 1949. Ao mesmo tempo em que combatia a invasão japonesa à leste de seu
território, os chineses revolucionários digladiavam-se com os republicanos de Sun Yat-
sen e Chiang Kai-shek, pela hegemonia interna, mas também, nesse bojo, se
esforçavam por delinear as antigas fronteiras de seu império. É nesse contexto que o
EPL (Exército Popular de Libertação) ocupa o Tibete em 1950. Rodrigues (2008, p.
única), entretanto nos alerta ao fato de que o governo republicano de Chiang Kai-shek
já reivindicava a região como parte integrante do território chinês, e só não efetuou
realmente a anexação devido à fraqueza militar.
Nove anos após a dominação comunista do Tibete (1959) surge um levante pela
independência apoiada pelos EUA, num contexto de bipolaridade da hegemonia
mundial, entre capitalismo e socialismo. Essa insurreição fracassa e acarreta na fuga de
aproximadamente 100 mil budistas tibetanos. Desde então China e Tibete passam por
momentos de maior aproximação e outros em que se verifica uma tendência maior ao
separatismo. Atualmente, ou desde o início e março, nota-se uma intensificação das
manifestações pró-independência. Concordando ou não com a causa tibetana, há um
consenso, de que os insurgentes, oportunamente, aproveitam-se desse momento em
que a China tem grande enfoque na mídia mundial, em virtude dos Jogos Olímpicos
que serão realizados na China em agosto deste ano. Nesse impasse é inegável a
importância da opinião do Dalai Lama, líder espiritual e político dos budistas, que
governou a teocracia tibetana desde seus 15 anos, iniciando em 1950, até o seu exílio
como conseqüência do levante de separatista de 1959. Tenzin Gyatso (que recebe o
título de Dalai Lama) continua a comandar o movimento de independência do Tibete e
o estabelecimento de um Estado budista, articulando-se com personalidades
internacionais. Relevante se faz mencionar, o fato de que, em favor dos tibetanos, no
ano de 1989, o Dalai Lama recebe o Prêmio Nobel da Paz, ganhando adeptos pela
causa no mundo, e reforçando sua luta pela independência.
Em contrapartida, o Governo chinês faz resistência ao separatismo tibetano
alegando defender sua soberania nacional, chegando até mesmo a negar ajuda
oferecida pelo Canadá, como uma maneira de afirmar o caráter interno em que se
apresenta esse conflito. Outro argumento contundente explorado pela China em sua
defesa é a situação econômica do Tibete. O fato de ampliar as infra-estruturas no
interior do país tem sido usado como forma de manter uma imagem de ingratidão dos
tibetanos. Enquanto a Rádio Internacional da China (CRI) publica uma notícia com os
seguintes dizeres: “Tibete – Economia concretiza desenvolvimento de salto em 2007”,
a AFP (Agência France Presse), de Pequim noticia essa manchete: “Boom econômico
no Tibete não beneficia a todos”. A China alega estar se esforçando para desenvolver
economicamente o interior, incluindo o Tibete. Ao passo que, a opinião internacional,
em grande medida, desmascara a estratégia chinesa de permitir a entrada em massa
da etnia Han nesses territórios, diminuindo a influência dos que se reivindicam donos
do território: os tibetanos. Dessa forma os benefícios citados pela mídia chinesa não
atingiriam necessariamente os tibetanos e sim a maioria Han.
Há algum tempo, um discurso defendido pelo governo chinês de que o Dalai
Lama, que defende além da independência a implantação de uma democracia no
Tibete, estaria se valendo deste fato para continuar a receber apoio dos EUA. A crítica
dos chineses argumenta que se o Dalai Lama é um deus vivo, cuja autoridade é
incontestável, como poderia ele concorrer em eleições livres, num futuro Tibete
democrático independente? Há, entretanto, um assunto menos mencionado pela
mídia internacional que apóia o Tibete. Faz-se de enorme importância que levemos em
conta o fato de que é na cadeia montanhosa do Himalaia que nascem grande parte dos
rios que abastecem a China. Um país da dimensão demográfica da China e que almeja
sua inserção no mercado mundial pelo desenvolvimento econômico não pode se dar
ao luxo de perder preciosa fonte de água que é o Tibete. Nota-se a preocupação
chinesa em torno da água: recentemente foi reportada no Portal Exame uma política
para resolver os inúmeros problemas enfrentados pela China relacionados ao
tratamento e ao abastecimento de água. O slogan do programa encabeçado pela
General Electric é “Um camelo pode viver 30 dias sem água. Uma economia em
desenvolvimento não.”
Também de maneira oportuna países ocidentais se aproveitam do movimento
separatista no Tibete no sentido de abalar a crescente ascensão da economia chinesa
no âmbito global, uma potencial concorrente pela hegemonia mundial. Para tanto
baseiam-se em um discurso notadamente ocidental de defesa dos Direitos Humanos.
O boicote aos Jogos Olímpicos, inicialmente proposto pelo Dalai Lama, vem se
apresentando como importante arma para a luta tibetana.
Separatismo na China, entretanto, não se resume ao Tibete. Num país de 1
bilhão e 200 milhões de habitantes, em que 7% desse total representa as minorias
nacionais, o Tibete não é o único movimento separatista que podemos notar. A região
do Xinjiang, a Mongólia interior, Taiwan, são todas regiões que sempre suscitaram
problemas à administração de Beijing. Todavia, Taiwan, contrariamente ao que vem
ocorrendo no Tibete, atravessa um período de maior aproximação com a RPC
(República Popular da China). Há alguns dias, realizaram-se no território taiwanês,
eleições para a presidência, ao mesmo tempo em que se desenrolava a discussão de
possível realização de um plebiscito, proposto pelo partido contrário à aproximação
com a China e conseqüentemente de cunho separatista, o PDP (Partido Democrata
Progressista). Tal plebiscito indagaria a população sobre a entrada de Taiwan na ONU.
Favoravelmente à China o Kuomintang vence, e o plebiscito perde força e possibilidade
de seguir adiante.
Movimentos separatistas existem no mundo todo. O mais interessante a ser
notado, entretanto, é que faz com que determinado movimento ganhe maior
expressão e apoio das opiniões internacionais, enquanto outro perde espaço.
Enquanto Tibete ocupa as manchetes dos jornais de todo o mundo, Taiwan, que
propôs aproximação com China aparece em notícias de menor destaque. Por que a
imprensa mundial adota uma luta de independência e tão cinicamente ignora outra
luta de independência? Nossa explicação não foge ao indicado no início do texto: a
China é um poder em ascensão cujos sucessos econômicos ameaçam a hegemonia dos
EUA no mundo, e com isso toda a estrutura eurocêntrica que já existe há muitos anos.
Tendo em vista que o crescimento econômico chinês espanta a muitos, e às vésperas
de um evento da magnitude dos Jogos Olímpicos, o mais esperado seria que os
tibetanos engendrassem um movimento pela independência e que países que se
sentem ameaçados pela força do dragão apoiassem tal luta baseados na ideologia
ocidental do liberalismo político e dos Direitos Humanos.
MEIO AMBIENTE
Em sua pressa de recriar a revolução industrial que enriqueceu o Ocidente, a
China absorveu parte significativa das grandes indústrias que sujavam o Ocidente.
Estimuladas pelo forte apoio do Estado, as empresas chinesas se tornaram as
principais produtoras de aço, coque, alumínio, cimento, produtos químicos, couro,
papel e outros bens que enfrentavam altos custos, incluindo leis ambientais mais
severas, em outras partes do mundo. A China se tornou a fábrica do mundo, mas
também sua chaminé.
Nesse sentido, é relevante também levar em conta o aumento da quantidade
de energia e recursos naturais não-renováveis demandados pela produção em massa
da indústria pesada chinesa, o que envolve também os países fornecedores desses
recursos. A China carece de recursos naturais, incluindo minério de ferro, petróleo e
madeira, para a indústria pesada e para sua própria classe consumidora em
crescimento. Logo, seu crescimento pressiona o meio ambiente em lugares distantes
como Canadá, Brasil, Austrália e Indonésia, onde compra matéria-prima em grande
quantidade.
Com o desenvolvimento chinês houve uma transferência maciça de indústrias
poluidoras que manchou a ascensão econômica do país, já que este ainda não dispõe
de mecanismos eficientes de proteção ao meio ambiente instalados em seu crescente
parque industrial. Com isso, o país paga um alto preço ambiental pelo crescimento
médio de 10,6% ao ano durante as últimas três décadas: 16 das 20 cidades mais
poluídas do mundo estão no país, a maioria dos rios está contaminada, 30% do
território têm chuva ácida e doenças relacionadas à poluição estão entre as principais
causas de mortes. O que o governo tenta fazer agora é limitar o crescimento de
indústrias altamente poluentes e consumidoras de energia e desenvolver setores mais
modernos, como o de serviços e alta tecnologia. A política já teve efeito no
direcionamento do Investimento Estrangeiro Direto, que no ano passado somou US$
74,8 bilhões. Deste total, 47% foram destinados ao setor terciário, que inclui serviços
como bancos, telecomunicações e comércio, áreas que o governo quer promover.
Taxas de crescimento de dois dígitos fizeram menos para melhorar as vidas das
pessoas quando os danos ao ar, terra, água e saúde humana são considerados, dizem
alguns economistas. Equipamento ultrapassado de produção terá que ser substituído
ou adaptado a um alto custo caso o país pretenda reduzir a poluição. A piora do meio
ambiente na China também afetou a geopolítica do aquecimento global. O país produz
e exporta tantos bens antes produzidos no Ocidente que muitos países ricos podem se
gabar da redução das emissões de carbono, apesar das emissões em geral do mundo
estarem crescendo rapidamente.
Um bom exemplo disso ocorreu na Alemanha, onde moradores do Vale do
Ruhr costumavam pendurar as roupas para secar e a fuligem preta da antiga
siderúrgica de ThyssenKrupp freqüentemente os obrigava a recolhê-las para lavar
novamente. A meio mundo de distância, bem ao norte da China, enfrenta-se um
problema semelhante, a fuligem preta da vizinha Handan Iron and Steel também
incomoda os moradores. Estas duas cidades siderúrgicas têm uma ligação incomum,
que se estende por 8 mil quilômetros e uma década de crescimento econômico. Elas
compartilham o mesmo alto forno, desmontado e enviado peça por peça do antigo
coração industrial da Alemanha para a província de Hebei, o novo Vale do Ruhr da
China. Mas as siderúrgicas que expelem partículas no ar e consomem eletricidade das
usinas a carvão da China são responsáveis por grande parte das crescentes emissões
do país de dióxido de enxofre e dióxido de carbono. A Alemanha, por outro lado,
limpou seus céus e agora está liderando a luta contra o aquecimento global.
Diante desta conjuntura, Pequim denuncia que os países desenvolvidos são
hipócritas quando criticam a China por causa de suas emissões de gases causadores do
efeito estufa ao mesmo tempo em que continuam comprando produtos
manufaturados no país asiático. A declaração chinesa é uma resposta à divulgação de
um novo relatório segundo o qual a China ultrapassou os Estados Unidos e tornou-se o
país que mais despeja dióxido de carbono na atmosfera. Qin Gang, porta-voz do
Ministério das Relações Exteriores da China, qualificou seu país como "a fábrica do
mundo" e assumindo logicamente a posição do governo chinês, qualificou como
injustas as críticas em torno do tema.
Foram criados ministérios para acabar com a burocracia de dezenas de agências
governamentais cujas competências se sobrepunham. O primeiro-ministro chinês,
Wen Jiabao, anunciou também a elevação da Agência de Proteção Ambiental do
Estado ao status de ministério, visando manter apenas um departamento tomando
conta de tudo, entretanto, o maior obstáculo do “superministério”(do Meio Ambiente)
continuam sendo os interesses setoriais, que se fortaleceram ao longo dos anos. Este
plano foi o ponto alto da reunião do Parlamento chinês, liderado pelo Partido
Comunista. Segundo Hua Jianmin, secretário-geral de gabinete e conselheiro de
Estado, a idéia é acabar com problemas de "desequilíbrio de responsabilidades e baixa
eficiência". Nesse sentido, o Greenpeace afirmou que a ação do governo era
necessária, mas não suficiente. Lo Sze, diretor da ONG na China, opinou em
comunicado: "A China precisa dar poder e mobilizar seus cidadãos para que sejam
mais ativos no plano ambiental.".
O governo da China e o PNUD (Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento) começam a implementar, neste ano de 2008, um plano de ação com
o objetivo de tornar os Jogos Olímpicos, que acontecem em Pequim, ambientalmente
corretos. Estão planejadas atividades como o uso de ônibus movidos a hidrogênio para
o transporte oficial dos atletas e consumo sustentável da água. A iniciativa faz parte do
Programa de Conscientização Ambiental da China, que tem como foco alertar a
população do país sobre assuntos relacionados com o meio ambiente, por meio de
campanhas aliadas a eventos de alcance nacional, como as Olimpíadas de Pequim. “Os
Jogos Olímpicos oferecem uma oportunidade única para dar projeção aos assuntos
ambientais em nível nacional e global e envolver todas as pessoas nos trabalhos
relativos ao meio ambiente”, ressalta o jornalista Yang Lan, um dos embaixadores dos
jogos chineses.
Fica evidente que as dinâmicas ocorridas durante o período analisado na China
vêm acompanhadas de fatores internos e externos, como a demanda cada vez maior
de produtos mais baratos e produzidos em grande escala, o que provoca enormes
desequilíbrios ambientais, já que esse processo de aceleração do crescimento não vem
sempre acompanhado de programas eficientes de sustentabilidade. Nesse sentido, as
Olimpíadas em Pequim só vêm confirmar a vontade “geral” em promover uma
divulgação da relevância das questões ambientais, justamente devido à projeção de
grande impacto que esse evento terá.
RELAÇÃO DE FORÇAS E ATORES POLÍTICOS, ECONÔMICOS E
SOCIAIS
Diante da conjuntura analisada, podem-se considerar como principais atores
políticos econômicos e sociais o governo do PCCh (Partido Comunista da China) que
responde, em última instância pelas mais variadas questões recorrentes na China. O
Dalai Lama, Tenzin Gyatso líder tibetano e figura carismática no âmbito mundial. O
Federal Reserve, representando o governo dos EUA, que apesar de toda ideologia
liberal agiu de forma intervencionista na economia, para amenizar os efeitos da crise
do subprime. Também se considera como importantes atores político-econômicos,
instituições financeiras globais, como o FMI, o Banco Mundial que através de suas
declarações influenciam nas políticas econômicas tanto da China como de outros
estados nacionais. Ao falar em estados nacionais podemos considerar como atores
políticos, alguns países de peso na opinião mundial que fizeram suas declarações, na
maioria das vezes desfavorável à China, em relação à questão do separatismo
tibetano, e num sentido mais amplo os próprios movimentos pró-Tibete que se
desenrolaram ao longo do caminho percorrido pela tocha Olímpica. Ademais, são
relevantes também as instituições como o Greenpeace, que atua na defesa dos temas
ambientais, e programas como o Programa das Nações Unidas Para o
Desenvolvimento, responsável por incentivar um desenvolvimento mais sustentável da
China.
Conforme o que foi desenvolvido e demonstrado durante a presente análise, a
relação de forças que se pode detectar se enquadra na inserção chinesa, cada vez mais
maciça, quantitativa e qualitativamente, no mercado mundial. De acordo, também,
com a previsão de Jiang Zemin de que a China passaria por um momento crucial da
transição e reforma econômica ao fim de dez anos do novo milênio, nota-se a série de
medidas tomadas, não somente nesses três primeiros meses de 2008, mas como um
planejamento estratégico que vem se mostrando bem sucedido no que se propõe.
O recente pronunciamento do governo chinês de uma mudança no modelo de
crescimento demonstra a chegada da economia chinesa em outra fase. A rápida
industrialização, proposta pelos planos iniciais de modernização e reforma na China,
vem sendo substituída por políticas que geram maior simpatia da comunidade
internacional. A principal bandeira chinesa se mostra através das mais recentes
políticas vinculadas à responsabilidade ambiental, assunto totalmente atual nas
discussões que permeiam o desenvolvimento econômico, não só da China, mas de
uma maneira geral, tudo isso alavancado pelos Jogos Olímpicos que direcionam o foco
da imprensa de todo o mundo para território chinês. Como visto ocorre um processo
de substituição de indústrias pouco eficientes, do ponto de vista energético, ou o
fechamento de outras que também não correspondem aos apelos de ambientalistas.
No tocante às pendências econômicas, percebe-se uma queda de braço
principalmente entre EUA e China, mas não somente entre esses. No contexto da
possível recessão estadunidense, as autoridades do governo americano pressionam a
China para que haja uma aceleração na valorização do Yuan. De um lado os EUA,
amparados por um grupo de instituições de peso no contexto global, afirma que a
valorização da divisa chinesa auxiliará no controle da inflação, que só vem
aumentando na China. Essa medida, entretanto, beneficia os Estados Unidos, pois
além de diminuir os investimentos no setor produtivo advindos de seu território, os
americanos ainda jogam com a possibilidade de conseguirem penetrar com maior
vigor o mercado interno chinês. Ainda falando da economia, esse controle da inflação
e a possível desaceleração do crescimento industrial chinês suscitam rumores de que
as relações comerciais da China com outros países poderiam ser melhoradas à medida
que o superávit bilateral chinês fosse diminuindo.
A China, no contexto em que se insere, causa incômodo a muitos. São
socialistas que adotaram a economia de mercado, mas também são capitalistas que
não seguem as “normas” de liberalismo econômico, possuem um governo que se
autodenomina Ditadura Democrática Popular e principalmente, cada vez mais,
abocanham uma fatia maior do mercado mundial. Os chineses, com uma estratégia
bem definida e planejada de inserção na economia mundial vêm obtendo êxito. Pode-
se dizer que o movimento separatista do Tibete tem fundamento, assim como também
são válidas as críticas direcionadas à China no que diz respeito à preservação
ambiental, e em certa medida, até mesmo as políticas econômicas adotadas pelo
governo do PCCh são alvos de contestação embasada. O importante, pois, é salientar
que as condenações atribuídas às atitudes tomadas pelos chineses carregam interesses
maiores, e se mostra de enorme importância o entendimento e a percepção de tal
relação de forças.
A relação de forças que rege esse processo, como se pôde perceber, pelo
menos por enquanto, tende para a coexistência, pois os atores envolvidos, mesmo
dispondo críticas às políticas das mais variadas esferas que vêm sendo realizado na
China, ainda não partiram para ações mais afirmativas e impositivas nesse tema. É
provável que essa situação se mantenha até que os interesses envolvidos nesse
processo comecem a ser confrontados, ou seja, até que o “equilíbrio de interesses”
não seja quebrado, a tendência maior é de negociações e acordos que busquem um
melhor quadro tanto político, econômico e social para as questões que evidenciam a
China no cenário internacional.
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA
AGÊNCIA ESTADO. Disponível em < www.estadao.com.br/agestado> acesso em:
14/04/08
CHINA’s Radio international (CRI). Disponível em: <http://portuguese.cri.cn/>
acesso em 22/03/2008.
FOLHA Online. Disponível em <http://www.folha.uol.com.br/> acesso em
10/04/2008.
FRANCE PRESSE, Agência (AFP). Disponível em:
<http://www.afp.com/portugues/home/> acesso em: 10/04/2008.
INVESTNEWS. Disponível em: <www.investnews.com.br> acesso em: 12/04/08
JIANG, Zemin. Consolidar a confiança, aprofundar a reforma e criar uma nova
situação de desenvolvimento das empresas estatais. In: Reforma e Construção na
China. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2002.
RODRIGUES, Alexandre Reis – Breve Apontamento da História do Conflito
Tibetano. Disponível em:
<http://www.jornaldefesa.com.pt/conteudos/view_txt.asp?id=574> acesso em:
17/04/2008