anÁlise das manifestaÇÕes patolÓgicas …cp2015/link/papers/7321.pdf · bolina, f.; schneider,...

8
1 ANÁLISE DAS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS EVIDENCIADAS EM UM SISTEMA ESTRUTURAL MISTO DE AÇO, MADEIRA, CONCRETO E ALVENARIA DE UMA EDIFICAÇÃO HISTÓRICA: ESTUDO DE CASO F. L. BOLINA Engenheiro Civil, Mestrando itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected] D. SCHNEIDER Engenheiro Civil, Mestrando itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected] B. F. TUTIKIAN Engenheiro Civil, Professor Dr. itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected] RESUMO Atualmente, no Brasil, existe uma maior conscientização acerca da importância das construções históricas no âmbito de preservação de seu patrimônio arquitetônico. Devido a esta preocupação, existe a necessidade de inspeções nestas construções, objetivando preservar ao máximo as características originais, cultivando, então, a história. Muitas vezes, durante a sua vida útil, estas edificações sofrem alterações em seu uso que, combinado com a inexistência de manutenção, culminam em manifestações patológicas de magnitudes alarmantes. Este trabalho tem por objetivo apresentar um estudo de caso de uma edificação histórica que, datada de 1924, terá o seu uso alterado. Fundamentado em análises visuais e ensaios semi-destrutivos, este estudo analisa, essencialmente, as manifestações patológicas incidentes no sistema estrutural misto de concreto, aço, madeira e alvenaria autoportante que sustenta a mesma. Constatou-se que o sistema estrutural de concreto e madeira apresentavam manifestações patológicas intangíveis. Por outro lado, o sistema metálico e de alvenaria estrutural mostraram-se satisfatórios, podendo ser reaproveitados. Como conclusão, entendeu-se que todo o sistema estrutural, exceto o de alvenaria,deve ser substituído. 1 INTRODUÇÃO Atualmente, no Brasil, existe uma maior conscientização da importância das construções históricas no âmbito de preservação de seu patrimônio arquitetônico. Devido a esta preocupação, existe a necessidade de inspeções periódicas e eventuais intervenções nestas construções, objetivando preservar ao máximo as características originais, cultivando, então, a nossa história. Muitas vezes, durante a sua vida útil, estas edificações sofrem alterações em seu uso que, combinado com a renovação da incidência de agentes agressivos e uma deficiência de manutenção corretiva e preventiva, culminam em manifestações patológicas de magnitudes alarmantes e, não raras vezes, intangíveis. O grande número de manifestações patológicas em edificações antigas é um forte indicativo de que os processos construtivos empregados em décadas anteriores eram deficientes ou pouco conhecia-se acerca da durabilidade e desempenho dos materiais. O reflexo é que, em países industrialmente desenvolvidos, cerca de 40% do total dos recursos das indústrias da construção já estão sendo aplicados em restauros e apenas 60% em novas instalações [1]. Neste contexto, destaca-se a importância que a manutenção do sistema estrutural de uma edificação produz, uma vez que trata-se de um item absoluto na integridade global da edificação. Destarte, para cumprir com seu papel de elemento construtivo, os materiais devem ser não somente resistentes, mas também duráveis [2]. Como a durabilidade sob um conjunto de condições não significa necessariamente durabilidade sob um outro, costuma-se incluir uma referência geral ao meio ambiente quando se define durabilidade [1]. Segundo

Upload: lamliem

Post on 14-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1

ANÁLISE DAS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS EVIDENCIADAS EM UM SISTEMA ESTRUTURAL MISTO DE AÇO, MADEIRA, CONCRETO E ALVENARIA DE UMA

EDIFICAÇÃO HISTÓRICA: ESTUDO DE CASO

F. L. BOLINA Engenheiro Civil, Mestrando itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil [email protected]

D. SCHNEIDER Engenheiro Civil, Mestrando itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil

[email protected]

B. F. TUTIKIAN Engenheiro Civil, Professor Dr. itt Performance/Unisinos São Leopoldo, Brasil

[email protected]

RESUMO Atualmente, no Brasil, existe uma maior conscientização acerca da importância das construções históricas no âmbito de preservação de seu patrimônio arquitetônico. Devido a esta preocupação, existe a necessidade de inspeções nestas construções, objetivando preservar ao máximo as características originais, cultivando, então, a história. Muitas vezes, durante a sua vida útil, estas edificações sofrem alterações em seu uso que, combinado com a inexistência de manutenção, culminam em manifestações patológicas de magnitudes alarmantes. Este trabalho tem por objetivo apresentar um estudo de caso de uma edificação histórica que, datada de 1924, terá o seu uso alterado. Fundamentado em análises visuais e ensaios semi-destrutivos, este estudo analisa, essencialmente, as manifestações patológicas incidentes no sistema estrutural misto de concreto, aço, madeira e alvenaria autoportante que sustenta a mesma. Constatou-se que o sistema estrutural de concreto e madeira apresentavam manifestações patológicas intangíveis. Por outro lado, o sistema metálico e de alvenaria estrutural mostraram-se satisfatórios, podendo ser reaproveitados. Como conclusão, entendeu-se que todo o sistema estrutural, exceto o de alvenaria,deve ser substituído. 1 INTRODUÇÃO

Atualmente, no Brasil, existe uma maior conscientização da importância das construções históricas no âmbito de preservação de seu patrimônio arquitetônico. Devido a esta preocupação, existe a necessidade de inspeções periódicas e eventuais intervenções nestas construções, objetivando preservar ao máximo as características originais, cultivando, então, a nossa história. Muitas vezes, durante a sua vida útil, estas edificações sofrem alterações em seu uso que, combinado com a renovação da incidência de agentes agressivos e uma deficiência de manutenção corretiva e preventiva, culminam em manifestações patológicas de magnitudes alarmantes e, não raras vezes, intangíveis. O grande número de manifestações patológicas em edificações antigas é um forte indicativo de que os processos construtivos empregados em décadas anteriores eram deficientes ou pouco conhecia-se acerca da durabilidade e desempenho dos materiais. O reflexo é que, em países industrialmente desenvolvidos, cerca de 40% do total dos recursos das indústrias da construção já estão sendo aplicados em restauros e apenas 60% em novas instalações [1]. Neste contexto, destaca-se a importância que a manutenção do sistema estrutural de uma edificação produz, uma vez que trata-se de um item absoluto na integridade global da edificação. Destarte, para cumprir com seu papel de elemento construtivo, os materiais devem ser não somente resistentes, mas também duráveis [2]. Como a durabilidade sob um conjunto de condições não significa necessariamente durabilidade sob um outro, costuma-se incluir uma referência geral ao meio ambiente quando se define durabilidade [1]. Segundo

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

2

[3], “a durabilidade de um produto se extingue quando ele deixa de cumprir as funções que lhe foram atribuídas, quer seja pela degradação que o conduz a um estado insatisfatório de desempenho, quer seja pela obsolescência funcional”. Assim, provém de fundamental importância definir o instante em que o sistema estrutural já não é mais competente para cumprir com sua função. Dada a importância deste sistema no conjunto, uma falha estrutural pode culminar em um colapso global da edificação. Dentre os sistemas estruturais corriqueiramente empregados na construção civil, o concreto armado, o aço, a madeira e a alvenaria estrutural provém como elementos de merecido destaque no que tange os processos que promovem a deterioração destes, cada qual possuindo um mecanismo de deterioração muito particular. Dentre os vários tipos de agressões provenientes do meio ambiente ao concreto, por exemplo, destacam-se os processos de deterioração química que, segundo conceitua [1], “constituem-se de interações químicas entre os agentes agressivos ao ambiente e os constituintes da pasta de cimento [...] observando-se conseqüências físicas nocivas ao concreto, como aumento da porosidade, permeabilidade, perda de resistência, fissuração e lascamento”. Cada ambiente irá proporcionar a deterioração do concreto, do aço, ou de ambos, promovendo, de qualquer forma, a deterioração e a perda da capacidade mecânica dos elementos estruturais [4]. Já para os materiais metálicos, uma das condições mais significativas que promovem a sua deterioração é a corrosão. Este mecanismo, de caráter eletroquímico, promove um processo de deterioração e destruição do material e de suas propriedades mecânicas devido a reação com o meio ambiente no qual se insere [5].Outras consequências, conforme explica [6], é a perda de massa dos elementos estruturais, mudança da aparência superficial e alterações da constituição física e química deste material. Conforme [7], a presença do ar e da umidade formam condições essenciais para o desencadeamento do processo. A deterioração dos elementos estruturais de madeira, em contrapartida, pode ser de origem (a) biológica, (b) atmosférica, (c) química e (d) por ação do fogo. Alguns autores, tal como [8], dividem os referidos agentes degradantes da madeira em dois: abióticos e bióticos. Os agentes abióticos são agentes de deterioração que não possuem vida, tal como os agentes atmosféricos, químicos e o incêndio. Os agentes bióticos, por outro lado, são agentes com vida, que atacam os elementos de madeira, tal como os fungos e insetos. A madeira possui mecanismos distintos dos demais materiais, pelo fato de ser um material natural. Por outro lado, conforme destaca [9], a alvenaria estrutural, por sua grande semelhança com a alvenaria convencional, sofre basicamente os mesmos tipos de anomalias. Segundo [10], as principais manifestações observadas são as fissuras, pois os materiais utilizados na fabricação das unidades, tais como cerâmica, concreto e demais matérias primas, são frágeis e apresentam baixa resistência a tração. Segundo [9], a identificação das fissuras, ajudam a diagnosticar a sua origem, o que torna-se um fator muito importante para a definição da alternativa adequada para a recuperação da alvenaria. Deste pressuposto, o intento deste trabalho é avaliar a integridade de cada sistema estrutural da edificação. Trata-se de uma edificação histórica, em que se deseja ter o seu uso alterado. A referida edificação situa-se na cidade de Bom Princípio, interior do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil. Através de uma análise visual e de ensaios semi-destrutivos, foi possível concluir acerca dos prováveis fenômenos que culminaram na deterioração dos elementos estruturais de aço, madeira, concreto e alvenaria que constituem a referida edificação. Os elementos em madeira foram inspecionados com base em métodos não destrutivos e, como geralmente não necessita de ferramentas sofisticadas para tomada de conclusão, foram utilizadas técnicas de inspeção visual com registro fotográfico e teste sonoro com martelo. As alvenarias do sistema de vedação vertical foram vistoriadas utilizando a técnica da inspeção visual, seguido de ensaio semi-destrutivo para determinação da sua capacidade resistiva. Os perfis metálicos existentes na laje da cisterna foram vistoriados através de inspeção visual e análise de perdas de espessura, sendo esta técnica de ensaio não destrutivo útil para analisar se a corrosão é relevante. No concreto armado utilizou-se somente a técnica de inspeção visual, dada a sua visível deterioração e comprometimento. 2 CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

A edificação foi construída em 1924, sendo uma das mais antigas construções na área central de Bom Princípio, cidade do interior do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil, possuindo um importante e significativo valor histórico para a região. Uma ilustração típica da edificação em debate está apresentada na Figura 1. A edificação é dividida em duas partes. A primeira parte, principal, é composta de dois pavimentos e um subsolo. A segunda parte, que é uma extensão da primeira e foi construída quase 30 anos depois, é composta por um único pavimento. Nas Figuras 2, 3 e 4 são apresentadas, respectivamente, a planta baixa do subsolo, térreo e segundo pavimento da edificação.

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

3

Figura 1: Vista geral da edificação objeto de estudo

Figura 2: Detalhe do subsolo da edificação

Figura 3: Detalhe do pavimento térreo da edificação

Figura 4: Detalhe do segundo pavimento da edificação

A edificação principal da casa possui no pavimento térreo um salão, onde funcionava um comércio, com escritório, sala de estar e dois quartos. No segundo pavimento havia vários quartos de dormir. Somente no ano de 1953 foi construída a parte anexa a casa, onde existia uma cozinha, sala de jantar e estar, área de serviço e uma cisterna (reservatório inferior), compondo uma espécie de subsolo. O sistema estrutural da edificação é misto. Na edificação principal, as paredes são constituídas por alvenaria de tijolos maciços assentes sobre argila, o piso entre os pavimentos e a tesoura do telhado são constituídos por elementos estruturais de madeira. Na construção secundária, a extensão, o sistema de vedação vertical era idêntico ao da primeira, o piso sob a cisterna era composto por uma laje constituída de perfis tipo I metálicos, tijolos maciços e uma capa de

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

4

argamassa. A estrutura do telhado era também constituída por tesouras de madeira. O banheiro deste anexo era composto por concreto armado, havendo sobre ele um reservatório superior. Nas Figuras 5, 6, 7, 8, 9 e 10 são apresentadas ilustrações típicas desta residência.

Figura 5: Detalhe do sistema de vedação vertical

empregado na edificação

Figura 6: Detalhe do segundo pavimento da edificação

principal

Figura 7: Detalhe do sistema estrutural da cobertura da

edificação principal

Figura 8: Detalhe do banheiro, externo, adjacente à

edificação secundária (extensão)

Figura 9: Detalhe do reservatório inferior (cisterna) da

edificação secundária (extensão)

Figura 10: Vista dos fundos da edificação, onde se observa a edificação principal (D) e a extensão (E)

Esta edificação passará a ter seu uso alterado devido à aquisição da mesma por um investidor, sendo que a nova arquitetura prevê remoção de paredes e aumento da sobrecarga, o que irá requerer uma análise minuciosa da capacidade resistente dos elementos que participam da estruturação desta edificação. Para auxiliar na avaliação da integridade dos sistemas desta edificação e, por conseguinte, na interpretação das manifestações patológicas evidenciadas, foi feita uma inspeção fundada em inspeções visuais e ensaios semi-destrutivos. Não foi possível obter nenhum projeto da edificação, devido à inexistência ou extravio dos mesmos. A vistoria foi realizada nos dias 5 de setembro e 18 de outubro de 2014.

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

5

3 ANÁLISE DO SISTEMA DE VEDAÇÃO VERTICAL COM FUNÇÃO ESTRUTURAL

Para a realização desta análise, extraiu-se 5 tijolos cerâmicos com parte do material de assentamento aderida ao mesmo, e 5 tijolos sem o referido material de assentamento aderido. Devido à inexistência de Normas Técnicas Brasileiras e estrangeiras que determinam os procedimentos para ensaios a compressão de prismas de tijolos cerâmicos maciços para alvenaria com função estrutural, utilizou-se como base a ABNT NBR 15270-3:2005 [11]. Os prismas foram confeccionados unindo os tijolos que continham o material de assentamento aderido com os tijolos que não continham este material, reproduzindo, o sistema de vedação original. Contudo, com o intento de promover a união destes dois blocos (com e sem material de assentamento), aplicou-se uma fina camada de argamassa colante, como pode ser visto na Tabela 1. Sob a base e sobre a superfície deste prisma, promoveu-se a regularização com uma fina camada de argamassa convencional. Antes da união dos prismas, elaborou-se uma precisa medição a fim de determinar a área liquida de cada prisma (região de contato entre blocos, promovida pelo material de assentamento existente). Os prismas foram submetidos a ensaio de compressão axial conforme Figuras 11, 12 e 13. A velocidade da aplicação da carga foi de 500 N/minuto. Os resultados do ensaio são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1 – Resultado do ensaio de compressão dos primas

CORPO DE PROVACARGA DA

PRENSA (kN)ÁREA CONSIDERADA

(mm²)RESISTÊNCIA A COMPRESSÃO

(MPa)CP1 120,8 15000 8,05CP2 87,7 10800 8,12CP3 111,3 9000 12,37CP4 160,9 17850 9,01CP5 192,8 19800 9,74

9,461,77

MÉDIADESVIO PADRÃO

4 ANÁLISE DOS ELEMENTOS ESTRUTURAIS DE CONCRETO

Nas estruturas de concreto armado, o concreto possui papel fundamental na proteção das barras metálicas à corrosão. Primeiro, porque promove uma proteção física. Segundo, porque promove uma proteção química. Quanto a esta última, a proteção referida é fundamentada na alta alcalinidade dos poros do concreto, devido ao hidróxido de cálcio produzido na hidratação do cimento, o qual garante o pH elevado do meio. Esta redução do pH do concreto expõe as armaduras embebidas nestes elementos à corrosão. Este fenômeno foi observado no banheiro externo, na adjacência da edificação secundária (extensão da edificação principal). Destarte, quando o concreto é atacado por agentes agressivos oriundos do meio ambiente, tal como o gás carbônico e a consequente carbonatação do concreto em regiões urbanas de alta densidade veicular, a alcalinidade deste é comprometida, expondo severamente as armaduras à processos corrosivos. Nesta circunstância, contudo, o fenômeno da carbonatação é descartado uma vez que a cidade de inserção da edificação possui pouco mais de 11 mil habitantes e, por

Figura 11: Detalhe da montagem dos

prismas para realização do ensaio

Figura 12: Realização do ensaio de

compressão dos prismas

Figura 13: Detalhe da

ruptura do prisma

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

6

consequência, uma baixa incidência de veículos automotores e emissão de gases. A inexistência de indústrias poluentes há de ser, também, destacada. A hipótese mais crível para esta deterioração é que acima deste elementos deteriorados havia uma caixa d’água. Nesta, no ato da sua concepção, provavelmente não fora aplicada nenhuma impermeabilização. Esta caixa d’água, ao conter água com agentes agressivos e ser constituída por concreto de baixa qualidade (crê-se nesta circunstância devido à baixa responsabilidade estrutural deste elemento), adentra ao interior da massa de concreto, reage com os compostos hidratados e reduz o pH deste, proporcionando, por fim, um ambiente favorável ao desencadeamento da corrosão. Uma ilustração típica do grau de deterioração destes elementos é apresentado nas Figuras 14 e 15.

Figura 14: Detalhe do grau de corrosão nas armaduras principais de uma viga, observado nos elementos de

concreto armado no banheiro da edificação.

Figura 15: Detalhe do grau de corrosão observado nas

armaduras principais e secundárias de uma viga do banheiro da edificação.

5 ANÁLISE DOS ELEMENTOS ESTRUTURAIS DE AÇO

Os elementos metálicos são fortemente agredidos, dentro de certas circunstâncias, pelo meio ambiente. A corrosão, em essência, deteriora física e quimicamente este material, culminando na perda da capacidade resistiva dos elementos que constituem a estrutura. O mecanismo de corrosão eletroquímica, mais frequente e corriqueiro nas construções civis, fundamenta-se no desencadeamento de reações de oxidação (região anódica) e reações de redução (regiões catódicas), com formação de uma corrente elétrica através do metal e uma corrente iônica através do eletrólito (água), formando um circuito fechado. Em essência, para a ocorrência deste fenômeno, é imprescindível a existência de (a) oxigênio, (b) umidade e (c) diferença de potencial. Nesta edificação, perfis metálicos estruturais foram empregados para compor a laje do piso do pavimento térreo da edificação secundária, ou seja, a extensão. Por estar inserido em um ambiente de elevada umidade (estes perfis estavam sobre uma cisterna, ou seja, um reservatório de água inferior), criou-se um ambiente propício ao desenvolvimento deste mecanismo eletroquímico, conforme se observa nas Figuras 16 e 17.

Figura 16: Detalhe da corrosão superficial verificada nos

elementos metálicos constituintes da laje do primeiro pavimento da edificação

Figura 17: Detalhe de um processo mais acentuado de corrosão dos perfis metálicos constituintes da laje do

primeiro pavimento da edificação

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

7

6 ANÁLISE DOS ELEMENTOS ESTRUTURAIS DE MADEIRA

O principal agente propulsor da deterioração das estruturas de madeira, semelhantemente as estruturas de concreto e de aço, é a água. Contudo, o mecanismo e a tipologia da deterioração das estruturas de madeira ocorrem de forma distinta ao das estruturas de concreto e das estruturas de aço devido a sua natureza vegetal. A deterioração destes elementos pode ser de origem (a) biológica, (b) atmosférica, (c) química e (d) por ação do fogo, sendo os dois primeiros os agentes mais frequentes e representativos da deterioração deste material e os que, em essência, foram evidenciados nesta edificação. A inspeção visual indicou que o sistema estrutural de madeira deve ser totalmente substituído. Observou-se, uma deterioração biológica por fungos e podridão devido à deficiência de ventilação, alta umidade do ambiente e baixo grau de ventilação. Os fungos não possuem a competência de danificar a estrutura celular da madeira, não afetando, portanto, a sua capacidade mecânica. Contudo, são organismos antecedem a formação dos fungos de podridão, ou seja, aqueles que destroem a madeira e modificam a sua capacidade resistiva (Figura 18). Os fungos são manifestações patológicas que limita-se, portanto, à superfície do elemento, através de uma alteração da coloração da peça, comprometendo, em um primeiro momento, apenas a estética do material. Observou-se, ademais, a proliferação de insetos xilófagos nos elementos estruturais deste material, evidenciado pelos buracos superficiais e pelas galerias internas nestes elementos, (conforme Figura 19, 20 e 21). Estes agentes, por destruírem a madeira, deterioram mecanicamente esta, afetando a sua competência estrutural. Além disso, notaram-se flechas excessivas devido a fluência da madeira ao longo do tempo e, finalmente, erros de concepção e detalhamento estrutural, devido ao fendilhamento da madeira proporcionado por excessiva carga concentrada na direção perpendicular às fibras vegetais deste material.

Figura 18: Podridão da madeira, evidenciada no subsolo

da edificação principal

Figura 19: Evidência do ataque por carunchos, onde se observa asas desprendidas do inseto (que se formam na

idade adulta deste, após o ciclo larval)

Figura 20: Detalhe das galerias internas formadas nos

elementos de madeira, resultantes do estágio larval dos carunchos

Figura 21: Erro construtivo de dente realizado

erroneamente em uma viga

Em alguns elementos, observou-se, no ato do impacto com martelo, um som cavo, indicativo da presença de galerias internas ao elemento estrutural de madeira. Estas galerias são oriundas do ataque por carunchos, os quais, em seu ciclo evolutivo, alimentam-se da madeira até a sua idade adulta. As demais manifestações patológicas, tal como a umidade,

BOLINA, F.; SCHNEIDER, D.; TUTIKIAN, B., Análise das manifestações patológicas evidenciadas em um sistema estrutural misto de aço, madeira, concreto e alvenaria de uma edificação histórica: estudo de caso

8

formação biológica de fungos e fendilhamento da madeira devido a erros construtivos foram tratados como anomalias intangíveis. 7 CONCLUSÃO Do exposto, evidencia-se que o sistema estrutural constituído de concreto armado e madeira deve ser substituído, uma vez que apresentam manifestações patológicas intangíveis. Os elementos de concreto armado possuem um acentuado processo de corrosão, com exposição total das armaduras principais e secundárias, seguido de redução significativa do seu diâmetro nominal. Os elementos estruturais constituídos por madeira apresentam em estado alarmante de deterioração, contendo perda de massa significativa, oriundo de insetos xilófagos que se alimentam deste material. Erros de concepção estrutural foram também observados nestes elementos, promovendo um fendilhamento da madeira. Ademais, alguns elementos de madeira apresentam bolores e fungos cromógenos superficiais. O risco de colapso dos elementos de concreto armado e madeira é eminente, portanto. Por outro lado, as vigas constituídas por perfis metálicos apresentam uma corrosão apenas superficial, removível com o lixamento da superfície. A perda de seção transversal não se mostrou significativa. Estes elementos podem ser aproveitados na recuperação que será realizada nesta residência. O sistema de alvenaria estrutural, após análise a compressão realizado em laboratório, mostrou um desempenho satisfatório e não necessita ser substituído. Apenas alguns elementos pontuais devem ser trocados, com o intento de garantir a estabilidade global da edificação.

8 REFERENCIAS [1] Metha, P. K.; Monteiro, Paulo J. M. “Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais”. 3. ed. São Paulo:

Ibracon. 2008. [2] Meseguer, Á. G.; Cabré, F. M.; Portero, J. C. A. “Hormigón Armado”. 15. Ed.Barcelona: Gustavo Gili, 2009. [3] Associação Brasileira de Normas Técnicas. “ABNT. NBR 15575-1: Edifícios habitacionais de até 5 pavimentos –

Desempenho parte 1: Requisitos gerais”. Rio de Janeiro, 2010. [4] Bolina, F.; Tutikian, B. “Revisão da durabilidade e vida útil das estruturas de concreto frente a mecanismos

químicos de deterioração”. In: XII Congreso Latinoamericano de Patologia de la Construcción. Anais... Cartagena de las Índias, 2013.

[5] Borges, P.C. “Corrosión en estructuras de concreto armado: teoría, inspección, diagnóstico, vida útil y reparaciones”. Colonia Florida: IMCYC, 1998.

[6] Stansbury, E.E.; Buchanan, R.A. “Fundamentals of electrochemical corrosión”. Novelty: ASM International, 2000.

[7] Gentil, V. “Corrosão”. LTC: 6. Ed. Rio de Janeiro, 2011. [8] Gato, A. C. “Madera: patologías e tratamiento”. 1. Ed. Madri: Bubok, 2007. [9] Sampaio, M. B. “Fissuras em edificios residenciais em alvenaria estrutural”. 2010. Dissertação (mestrado) –

Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos. [10] Holanda, O. G. “Influência de recalques em edifícios de alvenaria estrutural”. 2002. Tese (doutorado) – Escola de

Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos. [11] Associação Brasileira de Normas Técnicas. “ABNT. NBR 15270-3: Componentes cerâmicos – Parte 3: Blocos

cerâmicos para alvenaria estrutural e vedação – Métodos de ensaio”. Rio de Janeiro, 2005.