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 Kúmá / Decolonizziamoci – Interculturalità Shirley de Souza Gomes Carreira  Amrik , de Ana Miranda: a imigração libanesa revisitada  Amrik , de Ana Miranda: the Lebanese imigration revisited Resumo:  A migração tem sido interpretada como uma condição natural da experiência humana. Sempre que é focalizada na literatura, são oferecidas aos leitores interpretações de seus processos históricos. Este trabalho visa a mostrar como a identidade cultural do imigrante libanês é representada na literatura brasileira contemporânea, por meio da análise de  Amrik , de Ana Mirand a. Ao foca lizar a migração, a autora entrelaça história e ficção, bem como proporciona um diálogo com obras literárias do Oriente e do Ocidente.  Abstract: Migration has been interpreted as a natural condition of human experience. Whenever it is focalized in literature, the readers are offered interpretations of its historical processes. This work aims to show how the cultural identity of the Lebanese immigrant is represented in contemporary Brazilian Literature, by means of the analysis of Amrik , a novel by Ana Miranda By focusing on migration, the author intertwines history and fiction as well as provides a dialogue with literary works from Eastern and Western world. 1. Introdução  Ao longo dos séculos, a migração tem sido interpretada como uma condição natural da experiência humana e a relação dos imigrantes com os países de adoção tem sido alvo de pesquisas científicas em áreas como a Sociologia, a  Antropologia e, mais recentemente , a Literatura.  A princípio, os imigrantes constituem um grupo de trabalhadores estrangeiros que interpretam sua condição de vida e a sua relação com o meio como algo provisório. Segundo Hall (2003, p. 28), a par dos variados motivos que geram a migração, dentre eles a pobreza, a falta de oportunidades e o subdesenvolvimento, cada disseminação carrega consigo a promessa de um retorno redentor. No entanto, à medida que a possibilidade de retorno ao país de origem torna-se mais remota, a relação puramente instrumental com a vida econômica do período imigratório inicial é extrapolada, estabelecendo-se um vínculo com os países receptores.  Antes vista como uma possibilidade, a idéia do retorno acaba por ser substituída por uma relação quase mítica com a terra natal, pois, intimamente, o imigrante acaba por entender que, muito embora se possa voltar ao lugar de origem, não se pode voltar ao tempo da partida, nem ao indivíduo que se era no momento da partida (Sayad, 1998, p.17). O processo migratório contínuo gera, amplia e multiplica a experiência da transculturação, uma complexa teia de relações sociais que reflete a tensão

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Kúmá / Decolonizziamoci – Interculturalità

Shirley de Souza Gomes Carreira

 Amrik , de Ana Miranda: a imigração libanesa revisitada

 Amrik , de Ana Miranda: the Lebanese imigration revisited

Resumo:A migração tem sido interpretada como uma condição natural da experiênciahumana. Sempre que é focalizada na literatura, são oferecidas aos leitoresinterpretações de seus processos históricos. Este trabalho visa a mostrar comoa identidade cultural do imigrante libanês é representada na literatura brasileiracontemporânea, por meio da análise de  Amrik , de Ana Miranda. Ao focalizar amigração, a autora entrelaça história e ficção, bem como proporciona umdiálogo com obras literárias do Oriente e do Ocidente.

Abstract:Migration has been interpreted as a natural condition of human experience.Whenever it is focalized in literature, the readers are offered interpretations of its historical processes. This work aims to show how the cultural identity of theLebanese immigrant is represented in contemporary Brazilian Literature, bymeans of the analysis of  Amrik , a novel by Ana MirandaBy focusing on migration, the author intertwines history and fiction as well asprovides a dialogue with literary works from Eastern and Western world.

1. Introdução

Ao longo dos séculos, a migração tem sido interpretada como uma condiçãonatural da experiência humana e a relação dos imigrantes com os países deadoção tem sido alvo de pesquisas científicas em áreas como a Sociologia, aAntropologia e, mais recentemente, a Literatura.A princípio, os imigrantes constituem um grupo de trabalhadores estrangeirosque interpretam sua condição de vida e a sua relação com o meio como algoprovisório. Segundo Hall (2003, p. 28), a par dos variados motivos que geram amigração, dentre eles a pobreza, a falta de oportunidades e o

subdesenvolvimento, cada disseminação carrega consigo a promessa de umretorno redentor. No entanto, à medida que a possibilidade de retorno ao paísde origem torna-se mais remota, a relação puramente instrumental com a vidaeconômica do período imigratório inicial é extrapolada, estabelecendo-se umvínculo com os países receptores.Antes vista como uma possibilidade, a idéia do retorno acaba por ser substituída por uma relação quase mítica com a terra natal, pois, intimamente,o imigrante acaba por entender que, muito embora se possa voltar ao lugar deorigem, não se pode voltar ao tempo da partida, nem ao indivíduo que se erano momento da partida (Sayad, 1998, p.17).O processo migratório contínuo gera, amplia e multiplica a experiência da

transculturação, uma complexa teia de relações sociais que reflete a tensão

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gerada a partir da vivência, pelos migrantes, de identidades múltiplas e fluidasfundamentadas ao mesmo tempo nas sociedades de origem e nas "adotivas".O termo “transculturação” opõe-se ao conceito anglo-saxônico de“aculturação”, uma vez que este pressupõe total aderência a uma nova cultura,fruto de um desenraizamento absoluto, enquanto que aquele aponta para o

surgimento de uma identidade híbrida fundamentada na interpenetração deculturas.As ondas migratórias no Brasil foram seguidas de um comportamentoxenofóbico, que se refletiu na literatura e foi responsável pela construção deestereótipos, verificáveis, por exemplo, em obras da literatura naturalistabrasileira.Os rótulos que acompanharam os imigrantes de diversas nacionalidades,como, por exemplo, “turco”, no caso dos imigrantes de origem árabe, ou“galego”, no caso dos portugueses, funcionavam como umbrella terms, cujafinalidade era agregar os indivíduos oriundos de outros países sob a ótica daexclusão.

Na realidade, esses termos lançavam sobre os estrangeiros um estigmageneralizante. Os imigrantes portugueses, por exemplo, eram vistos comopessoas intelectualmente pouco qualificadas, a quem cabia apenas o comérciovarejista, primordialmente de secos e molhados, como atividade desubsistência. No caso dos sírio-libaneses, embora sendo reconhecidamenteherdeiros de uma vasta herança cultural, a sua ocupação principal em terrasbrasileiras, o ofício de mascate, rendeu-lhes a fama de negociantes sovinas,obcecados pelo lucro.A literatura brasileira contemporânea, no entanto, lança um olhar diferenciadosobre a imigração, possibilitando uma releitura do processo de inserção doimigrante na sociedade. Obras de autores como Milton Hatoum, Samuel Rawete Raduan Nassar, entre outros, permitem uma reflexão sobre os conflitos dacondição de estrangeiro por uma via que tanto escapa à visão estereotipada doimigrante quanto foge à mera tematização dessa condição. Essas obrasfocalizam as vivências íntimas do imigrante evocadas pela memória; se não amemória pessoal dos autores, descendentes de imigrantes em sua maioria, amemória reconstruída a partir de relatos, fragmentos da memória alheia,coletados e transformados em ficção.Nesse panorama,  Amrik , de Ana Miranda, surge de forma atípica. A partir deuma extensa pesquisa histórica e de um diversificado inventário textual, aautora, que se dedica à nova ficção histórica latino-americana, reinterpreta

criticamente a imigração libanesa no Brasil na ótica de uma narradora queexperimenta uma dupla exclusão: a situação de imigrante e a condição demulher em uma sociedade regida pelo patriarcado.Este ensaio visa à análise da representação da identidade cultural do imigranteem  Amrik , de Ana Miranda, a fim de demonstrar como a autora entrelaça amemória ficcional da personagem, que é o alicerce da narrativa, a registros daimigração libanesa no Brasil.

2. Um relato de viagem às avessas

Em O ofício do escritor , Ricardo Piglia afirma que o narrador é um viajante(1994, p. 73). Ao fazê-lo, ele caracteriza a narrativa como tributária de

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experiências que supõem o ultrapassar fronteiras, sejam fronteiras espaciais,sejam fronteiras impostas pela ordem vigente.As narrativas de viagem propriamente ditas reproduzem, em sua maioria, umpadrão textual em que as deambulações por lugares distantes se confundem àvivência reflexiva desenvolvida no contato com o Outro, cuja imagem é

condicionada pela ótica eurocêntrica.Em  Amrik , Ana Miranda constrói uma narrativa de viagem às avessas, postoque a ótica do relato localiza-se nas margens. A narradora é uma mulher,imigrante libanesa, que rememora a sua saga pessoal, desde a infância noLíbano, passando por uma frustrada experiência na América do Norte, até asua chegada ao Brasil, onde, finalmente, se estabelece. O romance é escritode modo a assemelhar-se a textos literários, escritos por imigrantes,denominados “Mahjar”.Ao contrário do que ocorre nos relatos de viagem tradicionais, o tempo não éregistrado, mas faz-se sentir nas transformações que a personagem sofre, demenina a mulher, ao longo do romance.

2.1 Uma breve viagem no tempo: a emigração libanesa para o Brasil

Roberto Khatlab, em Brasil-Líbano, amizade que desafia a distância (1990), fazum breve relato histórico da imigração libanesa para o Brasil, que foiestimulada pela visita do Imperador D. Pedro II ao Líbano em 1876.Os pioneiros da emigração árabe, conforme registra Khatlab (1990, p. 36),destacaram-se por terem entre eles uma elite política e cultural, pois “aemigração tinha por objetivo procurar uma vida melhor, em liberdade, e depoisvoltar e viver melhor em seu país de origem”. Eram, portanto, emigraçõesprovisórias.Mesmo os intelectuais libaneses chegavam ao Brasil praticamente sem nada,tendo de reiniciar a vida a partir do zero, atuando no comércio ambulante, etiveram um papel econômico e histórico, pois, a par do estabelecimento demuitos nos grandes centros, como São Paulo e Rio de Janeiro, eles também seembrenhavam pelo interior, chegando aonde nem o correio chegava, levandonotícias das grandes cidades.A fixação dos imigrantes nas metrópoles e os casamentos mistos fizeram comque eles passassem à fase da imigração de assentamento, deixando de pensar no retorno.

2.2 A viagem ficcional

A narrativa de  Amrik é cíclica; começa e termina no Jardim da Luz, quando otio da narradora, Amina, transmite-lhe o pedido de casamento do mascateAbrahão. As lembranças de Amina surgem fragmentadas e são transcritas em154 textos breves, à guisa de capítulos, agrupados em 11 partes.Ao ouvir a proposta, Amina confronta aquilo que seu tio, Naim, julga ser “felicidade” com o que realmente a espera:

“... viver numa casa imensa, de avental contar ovos, bater manteiga, ralar abóbora, picar amêndoas, a natureza nos dedos, regar uma horta no quintal,

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alface hortelã tomilho, ter sexo na noite abençoado, açucar cristal na línguahmm Nas coisas mais simples está o sentido da vida Amina [...]”. (Miranda, p.11)

A visão do tio contrasta com a imagem que se forma na mente de Amina: a

sujeição física aos desejos do mascate, ter de viver em uma casa cheia degente e sem privacidade, cozinhar para quinze pessoas, viver para ganhar dinheiro e sonhar com o retorno ao Líbano, representando, a cada noite, umamulher diferente para o encantamento do marido.O confronto de aspirações resulta na reformulação de um ditado popular quesintetiza o desejo da narradora: “Mais vale um pássaro na mão que doisvoando, não, mais vale um pássaro voando, de que vale um pássaro que nãovoa?” (Miranda, 1997, p. 12)Assim, a autora instaura no romance o embate da personagem com a estruturapatriarcal árabe. Pela via da memória, Amina resgata a imagem da avó Farida,símbolo da transgressão. A avó que lhe ensinara a dançar às escondidas, que

lhe transmitira as tradições ancestrais: as danças, a culinária, as lendas, orepositório da memória coletiva de seu povo passado de geração a geração.No universo ficcional, Amina é alvo da rejeição paterna. Seu pai, Jamil,inconformado por ter sido abandonado pela mulher, transfere para todo ogênero feminino o ódio que a traição lhe causou.

“Bêbados falavam mal de suas mulheres, das mulheres de todos, papai voltavapara casa bêbado e abria o estojo da faca, maldizia mamãe Maimunacomedora de tios-felpudos mulher quando fala mente quando promete nãocumpre quando cumpre volta atrás quando nela confiam trai quando não traifere revela facilmente sua parte íntima a qualquer um lança olhares a todossemeia discórdia um homem não pode partir para a aldeia vizinha nem por umdia se voltar antes vai encontrar a mulher na relva com um negro Ó mulheresem multidão não conseguis suportar pacientemente a ausência do objetopeludo nem por um dia?”. (Miranda, 1997, p. 16)

A concepção paterna da mulher como um ser ardiloso, desprovido de caráter,faz com que seja ela a escolhida para acompanhar o tio cego, quando este éameaçado de morte por causa de suas convicções políticas e é obrigado adeixar o Líbano.

“Por causa dos turcos e dos muçulmanos que queriam matar tio Naim oirqueescrevia contra eles tivemos de partir de nossa aldeia, tio Naim encheu um baúcom seus livros, umas jóias de ouro para trocar por comida ou roupa, umamanta de pelo de carneiro e nada mais, pediu a papai que mandasse um dosfilhos acompanhar, papai olhou os filhos, todos de olhos arregalados, numsilêncio fundo, um dois três quatro talvez todos os filhos homens quisessemcinco ir mais papai escolheu o filho que menos lhe servia, seis a única filhamulher, para que servia uma filha mulher? Os filhos iam casar e quando vovóFarida morresse as esposas iam cuidar da cozinha e fazer mais crianças parao trabalho na agricultura, ele me achava vaidosa, dissimulada, meu rostolembrava o da minha mãe e isso fazia papai sofrer ainda mais [...]”. (Miranda, p.

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Personagem criada a partir dos relatos de familiares de Emir Sader, marido daautora, sobre um velho tio cego, para quem os sobrinhos se revezavam naleitura, tio Naim não faz da sobrinha sua serva, mas torna-se o seu mentor,educando-a “para o mundo”. Assim, Amina aprende a ler, a escrever, bemcomo aprende palavras em outros idiomas: francês, inglês, grego e aramaico,

porque “mulher saber língua estrangeira é abrir uma janela namuralha” (Miranda, 1997, p. 27).Quando Amina deixa para trás a sua casa, a avó lhe dá os seus pequenostesouros: o tamborzinho de mão, os címbalos e o pandeiro, herança que selariao seu destino. A casa, na verdade, nunca lhe parecera realmente sua, postoque, mesmo entre a sua gente, a sua família era tratada de modo diferente,como estrangeira. Amina muitas vezes se pergunta se a razão era o fato deque sua avó um dia fora dançarina, uma gháziya, segundo o glossário que aautora disponibiliza ao final do romance. Esse sentimento de inadequaçãopersegue a narradora vida afora.Amina e Naim têm por objetivo ir para a América, a tão sonhada Amrik, mas

são retidos em Beirute, onde ficam à espera de passaportes turcos e de lugar no navio.O fluxo da memória é construído em blocos de um parágrafo/capítulo, compontuação escassa e mistura de idiomas. As palavras em árabe se misturamàs do português, a interjeições e onomatopéias, descrevendo lugares epessoas a partir de impressões de caráter sinestésico.O dado histórico é incorporado à ficção no relato da passagem obrigatória doslibaneses por Beirute, na imagem da multidão amontoada no porto, “gentemiserável seminua tiritava de frio, esmolava, molhados da chuva damadrugada”, “arrastados todos pelos sonhos de riqueza ou de liberdade” (p.28).Conforme aponta Oswaldo Truzzi (2005, p. 12), a oportunidade de ganhar dinheiro exerceu um impacto profundo no equilíbrio das aldeias libanesas, a talponto que as famílias que não enviassem seus filhos temporariamente àsAméricas perdiam status e prestígio em relação às outras.Amina e Naim partem movidos pela busca da liberdade. O Líbano que Aminadeixa para trás é marcado pela dureza do patriarcado:

“... ia queimar talismãs para o navio chegar logo e me levar para Amrik, guiavatio Naim nas ruas, recebia cartas de papai, da aldeia, cartas que me faziamchorar, cruéis, se eu era suave ele brigava se eu era fria ele cuspia se eu dizia

elogio ele ignorava de noite na cozinha ele falava mal de mim com aAbduhader, falava mal de mamãe com os outros bêbados de noite e falava maldas mulheres todas elas”. (Miranda, 1997, p. 26)

A viagem é o início da desconstrução do sonho. Ao invés do “navio moderno,veloz e iluminado” pelo qual ansiavam, deparam-se com

“... um ferro velho sujo enferrujado com carne humana amontoada arrre irrraterceira classe dormiam no relento água racionada salobra nojenta arghhh paraqualquer coisa era preciso dinheirinho, beliches duros imundos insetossugavam o sangue de noite ratos mordiam comiam nossos sapatos mofo calor 

umidade sal vomitava vomitava arre o camarote era para quatro mas oitoocupavam os quatro lugares eu dormia na mesma enxerga com tio Naim e não

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podiam levantar os dois ao mesmo tempo que alguém estava sempre prontopara ocupar o nosso lugar arre”. (Miranda, 1997, p. 28)

A viagem é embalada pelas histórias contadas por Naim ou pela leitura queAmina faz dos livros do tio, que, embora leve, no baú, livros ingleses e

franceses, quer que a sobrinha leia apenas aqueles em árabe, para não perder o amor pela própria terra. Para ele, “a literatura árabe lembra sempre aexistência de outros mundos além deste que podemos ver e tocar mas nãocompreender” (p.30), mundos como o universo ficcional, em que a realidade écontinuamente transformada e recriada.

“[...] literatura das montanhas e dos desertos sem nunca criar fronteiras entre oreal e o irreal como o mundo fora uma miragem [...] uma literatura que pode ser feita e usada por pessoas que não sabem ler nem escrever, mas se ouvementendem e podem recontar que são histórias e mais histórias e assim foi umagrande parte dela, os livros antigos eram muitas vezes apenas a memória do

recitador, outras vezes eram escritos em letras de ouro ou nas paredes masfosse como fosse, nunca rompeu com a tradição e nunca romperá ainda quesejam os poetas chamados de imitadores [...] se a literatura árabe é a almaárabe, todavia, não é o mundo árabe o que as pessoas pensam, pensam que omundo árabe são as Mil e uma noites hahaha”. (Miranda, 1997, p. 31)

Nas últimas linhas da citação, a autora deixa entrever uma crítica à imagemeurocêntrica do Oriente: um mundo exótico, misterioso, que se distancia darealidade dos conflitos políticos e religiosos vivenciados pelos povos de origemárabe.Na parte 2, intitulada “Amrik”, a narrativa se reporta à estada de Amina naAmérica do Norte. Os libaneses que saiam do Líbano pensavam estar sedirigindo à América do Norte, mas poucos conseguiam entrar no país. Muitoseram rejeitados, outros enganados, e acabavam por desembarcar no Brasil, noporto de Santos. Na América, tio e sobrinha são separados. Ela fica paratrabalhar como dançarina em uma Feira de Negócios e o tio, “cachorro morto”,é despachado para a outra América.Com os olhos cheios com os atrativos da América, Amina se esquece de tudo,do tio, da terra natal, forma uma banda e persegue o seu sonho de liberdade.

“[...] eu pensava que ia ficar rica verdadeiramente rich era a terra das

liberdades das oportunidades ia me vestir como a rainha de Sabá ia me cobrir de jóias perfumes chapéus com plumas de veludo [...]”. (p. 36)

O sonho, no entanto, se dissolve rapidamente:

“[...] muito trabalho a meio dólar por dia, jornada de dez horas mas trabalhavamdezesseis, haviam marcado a minha pele com uma etiqueta na alfândega e mederam um banho, mudaram meu nome no papel, acabou a feira e me soltaramna rua”. (p. 36)

Sem dinheiro ou roupas de frio, Amina vai dormir na rua, nos dormitórios e

cortiços de imigrantes, onde crianças e velhos “morriam como moscas

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envenenadas”. O choque entre culturas é perceptível nas lembranças deAmina.

“[...] as casas eram de madeira, as galinhas ciscavam na rua, os carros para láe para cá numa velocidade estupenda e as pessoas não se matavam por 

religião mas se matavam por dinheiro, os americanos comiam aveia de manhãfeito cavalos, eram de uma religião diferente da nossa mas eu não condenavaa religião deles, rudes e falavam alto, havia desempregados, policiais estúpidosarrogantes patrões ladrões greves de empregados reuniões de operários,trabalhadores de minas viviam feito escravos, havia dedos esmagados nasmáquinas das fábricas comida em lata solidão falta de falar a língua falta dacomida da vovó Farida falta de amigos falta de um corpo falta de amor”. (p. 37)

As cartas de Naim para a sobrinha acenam com a possibilidade de vinda parao Brasil. Na descrição que ele faz da cidade de São Paulo é possível detectar apesquisa da autora no intuito de fornecer informações sobre a cidade na época

em que se passa a história:

“[...] havia na cidade de São Paulo cento e quarenta e seis lojas de fazendas eferragens, sessenta armazéns de gêneros de fora, cento e oitenta e cincotavernas, todos pagavam direitos à municipalidade [...] Vem Amina minha flor de luz [...] vem para São Paulo”. (Miranda, 1997, p. 39)

Amina vê a vinda para o Brasil como uma derrota, pois “o Brasil era um lugar de abismos e depósito de imigrantes cachorros mortos que não conseguiamentrar na outra América” (Miranda, 1997, p. 45) e resiste o quanto pode à idéiade deixar a América do Norte, o seu “eldorado”.Porém, a solidão é um flagelo diário, que faz com que um mero cumprimento,ou mesmo umas palavras trocadas, desperte em Amina uma fomedescontrolada de amor e carinho, que é narrada de forma cômica:

“[...] à luz da vela escrevi cartas para tio Naim, para vovó Farida para os meusirmãos, para desconhecidos, uma carta para um homem de cabelo vermelhoque eu vira atravessar a rua, uma carta ao Mark Twain uma carta a umremador que me dissera Good morning na fonte Bethesda no terraço de ondesaiam remadores em barcos compridos, voltei à fonte uma dezena de dias enunca mais vi o remador mas deixei para ele uma carta de amor [...] a carta

marcava um encontro e no dia marcado esperei esperei brbrbrbrbrbr geladamas ninguém apareceu, veio um policial de ronda, quem sabe porque faziamuito frio o remador não veio, caía neve suave o policial me fez umasperguntas, quase me apaixonei por ele”. (Miranda, 1997, p. 41)

A solidão acaba por vencê-la, forçando-a vir para o Brasil.Os capítulos que se seguem fornecem dados da história dos imigranteslibaneses no Brasil, bem como da cidade de São Paulo, como, por exemplo, odesvio do rio para fazer a rua 25 de março, a vida dos imigrantes libaneses,que girava em torno do Tamanduateí, na parte nova da cidade, sem nenhumprogresso, e as dificuldades de aceitação na nova terra:

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“No começo, disse tio Naim, vinham os italianos e os alemães à porta ver despejar de mais árabes, riam de nossos modos, contavam históriasengraçadas sobre nós e não tinham medo [...] mas o mascates foramprosperando e de miseráveis ambulantes descalços que vendiam cigarros embandejas dependuradas no pescoço ou quibe frito em tabuleirinhos passaram a

mascates de santos de madeira e escapulários depois a mascates de tecidosbotões linhas arre, assim os mascates se tornaram perigosos sujos traiçoeirosambiciosos usurários [...] mas não somos o que eles pensam, libaneses sãolimpos, cultos, temos a Université dos jesuítas e a Universidade Americana,sabemos falar inglês grego francês, sabemos ler escrever, inventamos álgebraastronomia matemática, os algarismos arábicos o alfabeto, disse tio Naim,trouxemos para ocidentais a laranjeira o limoeiro o arroz, ensinamos ocidentaisa melhor cultivar a alfarrobeira e a oliveira, a criar cavalos, a plantar uvas, figose imensas maças, a regar, pintar as unhas, fazer hortas de verduras e talhõesde legumes, mais de seiscentas palavras à língua dos lusis”. (Miranda, 1997, p.52)

O capítulo intitulado “Ilhas de Elisã” contém palavras começadas com “al” queforam incorporadas ao português, evocando de forma concreta no discurso aherança cultural árabe e reivindicando um espaço social, pois “os árabes sãocomo avós dos brasileiros” (p. 53).A ascensão social dos sírio-libaneses despertou não apenas a inveja de outrosgrupos de imigrantes, mas também dos brasileiros, o que contribuiu bastantepara a criação e manutenção de estereótipos negativos.Ana Miranda incorpora outros dados sociológicos à narrativa, como, por exemplo, a importância da aldeia natal:

“[...] chegavam as pessoas todas de uma mesma aldeia, gente do cultivo quevinha para a agricultura mas acabava mascate, ganhava mais dinheirinho,trabalhava para ninguém, problema dos libaneses que pensavam na aldeia,disse tio Naim, não pensavam no país, se falavam pátria diziam aldeia, suaterra sua aldeia queria dizer sua aldeia sua alma [...]”. (Miranda, 1997, p. 55)

Essa mesma aldeia passava ao imaginário do imigrante de primeira geraçãocomo um “paraíso perdido” a ser novamente alcançado, fazendo-o esquecer osreais motivos pelos quais teve de deixar sua terra.A parte 4, “Mezze”, retrata a vida na casa de Naim. Os textos constituem um

inventário da culinária, dos costumes libaneses, ao mesmo tempo em que seconfiguram parte da narrativa. A tendência dos imigrantes a se agruparem comseus conterrâneos é devidamente representada no romance:

“Tio Naim estudou na Université dos jesuítas Saint Joseph, escrevia para oALK-Ahram e agora pediam para escrever sobre imigrantes, dinheiro, política,república, ele gostava de república porque trazia prosperidade, os escritos detio Naim eram discutidos por libaneses nos mezzes as domingos, senhores demuitos espíritos contrários e dados a leis da imaginação, mais levados por seussonhos do que pela realidade, cada qual vendo mais a distância que aproximidade, misturando árabe com português [...]”. (Miranda, 1997, p. 62)

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O início do processo de intercâmbio cultural é descrito no romance, bem comoo desenvolvimento de uma interlíngua e a desconstrução paulatina do sonhodo retorno à terra natal.

“[...] um dia vão perceber que a vida passou, ficaram aqui fazendo fortuna e

não voltaram nem ficaram ricos, só alguns, Entendam logo isso e façam oscemitérios clubes igrejas mâdrassas que nos dos outros não nos aceitam [...]”.(Miranda, 1997, p. 64)

Chafic e Abrahão são representações de duas fases distintas da imigraçãolibanesa. O primeiro representa o imigrante de primeira geração, viajando decidade em cidade, mascateando. O segundo aponta para uma segundageração, para uma rede de conterrâneos a dar suporte uns aos outros. Oshomens dessa nova leva encontraram os primeiros aqui fixados, muitos delesatacadistas, podendo assim lhes fornecer mercadoria e ensinar a língua e osconhecimentos básicos para o exercício das transações comerciais:

“Abraão abriu a canastra mostrou como vendia renda, bordado, retrós sabonetemeia dentifrício coisas pequenas pesam pouco, vendem fácil, preço bom,crédito, lágrimas no olhos, Logo aprendes a língua e se sabes umas poucaspalavras podes trabalhar por tua conta, sais de manhã cedo mesmo que chovalevas pão farinha pudim de palmito bocajuva vais de casa em casa nos bairrosda Sé Santa Ifigênia, havia um mapa da capital da província de São Paulo,Abraão tinha lista de fregueses”. (Miranda, 1997, p. 176)

As narrativas da imigração libanesa no Brasil destacam o papel dos homens,uma vez que a princípio era uma imigração econômica. Quando esta setransforma em imigração de assentamento as mulheres libanesas entram emcena, dada a necessidade de transformar algo provisório em definitivo,estabelecendo núcleos familiares.Ana Miranda constrói, no romance, uma narrativa de focalização feminina,permitindo a reinterpretação da história da imigração pelo olhar de Amina, quesitua o papel social da mulher imigrante:

“[...] duas imigrantes passam com cestas de compras rumo ao Mercado, nestacidade a mulher que faz compra no Mercado é imigrante, arifa ou operária, asimigrantes nunca passeiam, moças feitas de trabalho, vidas diluídas, fumaças

de chaminé fufu feitas de perdas e adeuses, moram nas partes escuras dacidade, nas casas olhadas, entre os ratos e morcegos, entre os caixotes vaziose as sacas nos depósitos, nos armazéns, detrás dos balcões, nas margens dosrios um capim de fuligem e fumaça feito os navios belas coisas mesmo sujas epretas, elas sempre querem passar para o outro lado da cidade, mas sãoapenas umas mostardinhas ardidas ou umas cadelasdascadelas, corpo defaschefango galho e barro ou casa a Ana ou vira putana ou casa a Beatriz ouvira meretriz haialaia tutti senza denaro, mijar na cova e lamber o dedohmmmm elas olham para mim e estiro a língua, elas ficam tão vermelhas queparecem as telhas e apressam o passinho de garridice nos sapatos barulho deferraduras”. (Miranda, 1997, p. 186)

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Amina contraria a imagem das mulheres imigrantes que descreve, pois éavessa ao trabalho doméstico, preocupando-se, apenas, com a dança.O enfoque na dança faz com que seja o olhar de Amina a mostrar a construçãode uma imagem estereotipada da mulher oriental como sedutora, sensual eexótica:

“[...] eu sabia o que diziam mal de mim, dançar era mandar homem nas casasde putas eles em cima delas mas a cabeça em mim, que tudo era paragastarem em mim seus dinheirinhos e eu ficando rica e eles pobres [...]”. (p. 69)

Nesse aspecto, e paradoxalmente, Ana Miranda dialoga com textos ocidentais,e com visões eurocêntricas da mulher oriental, como, por exemplo, a Aziza, deFlaubert e a Mahatab, de Francis Bacon.A autora, ao fim do romance, fornece uma lista bastante detalhada de suasfontes de pesquisa, que vão de relatos de viagens e registros da imigração alivros de culinária, bem como um glossário de termos em árabe e nomes de

personagens ficcionais ou históricos citados no livro, desvelando ante o leitor amaterialidade da obra.Estudos sobre a imigração têm comprovado que a música e a culinária sãomarcas de resistência de imigrantes de primeira geração à aculturaçãoabsoluta, ou assimilação, operando como expressões privilegiadas de uma vidaentre dois mundos. No entanto, no romance, o espaço da cozinha, “o lugar domundo onde uma mulher pode sentir a si, sem precisar dos machos árabes” (p.130), com seus odores e sabores, é evocado como um dos locais onde amulher árabe não experimenta a subalternidade. A arte da dança tem papelequivalente, pois é por meio dela que a mulher pode atrair um homem,fazendo-o “andar mil passos num vale ou atravessar um deserto semcamelo” (p. 20 ).Obviamente, a recorrência aos alimentos de origem árabe, no texto, temtambém a função de apontar para o processo de integração social, uma vezque a culinária árabe foi incorporada aos hábitos dos brasileiros.Jeffrey Lesser (1999, p.22) chama a atenção para o fato de que no processo deintegração dos imigrantes no Brasil, a assimilação, na qual a cultura pré-migratória da pessoa desaparece por completo, foi rara, dando lugar às trocasculturais.O romance também registra a questão do casamento entre brasileiros elibaneses:

“Uns homens daqui mandavam buscar mulheres nas suas aldeias no Líbano,mulheres da sua mesma religião maronita e de virgindade virgindade semprevirgindade, alguns mascates logo que ganhavam um dinheiro voltavam a suasaldeias para escolher uma mulher, traziam a mulher para o Brasil ou deixavama mulher lá e voltavam sozinhos, outros casavam com uma brasileira evoltavam com ela para sua aldeia no Líbano, uma mascate casou com umabrasileira e levou a brasileira para Beirute, lá estava outra mulher e a brasileiranão aceitou a bigamia, o marido deixou a brasileira na rua, ela ficou perdidanas ruas e ia virar mendiga ou prostituta de turcos, na sala de tio Naim elesdiscutiram o destino da perdida [...] decidiram trazer de volta a brasileira ai que

sacrifício pagar passagem assim para brasileiro tanto libanês precisava trazer 

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mãe ou pai ou irmão, não ia custar tão caro, Mais caro é ter boa reputação [...]”.(Miranda, 1997, p. 67)

O tipo de situação descrita no romance se reporta a uma fase da imigração emque os casamentos mistos ainda não eram comuns. Segundo Oswaldo Truzzi

(2005, p. 33) “o padrão de buscar a noiva na terra de origem” era muito comumentre os pioneiros.A parte 5, intitulada “Casa de Amina”, relata a tentativa de independência danarradora, de preenchimento de um vazio interior que ela não conseguediagnosticar. Ela vai morar em um sobrado da Rua 25 de março, em meio aoburburinho de pessoas, os odores estranhos da cozinha dos lusis, as lágrimassufocadas da portuguesa, o agarramento do português com a empregadanegra, na escada, o frio intenso no inverno e o calor absurdo no verão. Ospoucos objetos que leva com ela apontam para uma característica dapersonalidade de Amina: a facilidade com que se encanta, e desencanta, comas coisas.

Assim é que se apaixona por Chafic, um mascate que vê pela janela, a tomar banho nu, no rio. Por Tenura, a empregada de Naim, fica sabendo que ele émascate de fogos de artifício e que quando não está no Mercado, vai de aldeiaem aldeia no Mato Grosso. A dançarina, acostumada a brincar com a atraçãodos homens rende-se a uma única visão daquele corpo masculino. E, maisuma vez, os odores e sabores da culinária árabe surgem para metaforicamenteexpressar a ebulição em Amina;

“[...] nunca mais na minha vida o veria, nunca no exterior de mim apenas overia no escuro de minhas pálpebras , nu encostando sua língua na boca damulher, fora ele um castigo mandado pelo Deus dos maronitas para eu pagar minhas maldades todas que fiz contra os homens, Chafic moeu meu coração,marinou temperou com pimenta intercalou num espeto com pedaços delágrimas de cebola assou na brasa grelhou e não comeu [...]”. (p.88)

Da parte 7 em diante, o diálogo com a história cede lugar à história pessoal deAmina, que é contratada para dançar no casamento do mascate Abrahão. Por recomendação do pai da noiva, não deveria dançar a dança do al nahal , o queacaba por fazer, deixando os homens presentes hipnotizados, o velho fellahrevoltado, um casamento desfeito e uma noiva suicida.O romance termina no mesmo ponto em que começa, com tio Naim

perguntando a Amina se ela aceita casar-se com o mascate, que retornara ricoda América do Norte e que nunca a esquecera.

3. Conclusão

A par dos matizes proporcionados pela criatividade de Ana Miranda, o romancerevela a cuidadosa pesquisa histórica e textual empreendida na suaelaboração. Ao incorporar os referentes históricos à sua obra, ela engendrauma tessitura que se reporta em detalhes à história da imigração libanesa noBrasil sem, no entanto, perder o estatuto de ficção.

A representação da identidade cultural do imigrante em  Amrik  revela-sediferente se comparada, por exemplo, a de autores como Milton Hatoum.

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Enquanto este cria personagens que, embora imigrantes, estão totalmenteintegrados ao país de adoção, constituindo identidades híbridas, Ana Mirandadetém-se nos primórdios da imigração e no choque entre culturas.Em várias entrevistas dadas à época do lançamento de  Amrik , Ana Mirandaafirmou que Amina não é real, que foi inspirada em suas fantasias de criança,

em suas leituras sobre Sheerazade, Simbad, califas e odaliscas, bem como nainterpretação que autores como Borges, Flaubert e Rimbaud tiveram doOriente. Paradoxalmente, a personagem por ela criada tem como local de falaa concepção eurocêntrica do Oriente que combate.Ao dialogar com a historiografia, a literatura assume ser capaz de contar histórias que historiografia não sabe nem pode contar.  Amrik é uma narrativade olhares, pois, conforme nos explicou Said (2001, p.16-17), “o Oriente é umaidéia quem tem uma história e uma tradição de pensamento, imagística evocabulário que lhe deram realidade e presença no e para o Ocidente”.Assim como Naim, que via o mundo através dos olhos dos que o cercavam, oleitor se debruça sobre a narrativa de  Amrik  certo de que essa é mais uma

dentre as múltiplas interpretações do Oriente, uma vez que o romance foiescrito a partir de um olhar ocidental e contemporâneo.

Kúmá / dicembre 2009

Referências bibliográficas

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TRUZZI, Oswaldo. Imigrantes no Brasil. Sírios e libaneses. SP: CEN, 2005.

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Shirley de Souza Gomes CarreiraDoutora em Literatura Comparada- UFRJ-

Pós-Doutora em Literaturas de Língua Inglesa- UERJProfessora da UNIGRANRIO

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