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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA
MESTRADO EM SOCIOLOGIA
AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO
NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E
DE APARECIDA DE GOIÂNIA
Autora: Patrícia Gomes de Macedo
Orientador: Prof. Dr. Pedro Célio Alves Borges
GOIÂNIA
2011
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PATRÍCIA GOMES DE MACEDO
AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO
NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E
DE APARECIDA DE GOIÂNIA
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade de
Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás,
como um dos requisitos para obtenção do título de
Mestre em Sociologia, sob orientação do Prof. Dr.
Pedro Célio Alves Borges.
GOIÂNIA
2011
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PATRÍCIA GOMES DE MACEDO
AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO
NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E
DE APARECIDA DE GOIÂNIA
Dissertação defendida e aprovada em 29 de Setembro de 2011, pela banca
examinadora constituída pelos professores:
______________________________________________
Prof. Dr. Pedro Célio Alves Borges/ UFG
Presidente da Banca
______________________________________________
Prof. Dra. Maria Francisca Pinheiro Coelho/ UNB
______________________________________________
Prof. Dr. Djaci David de Oliveira/ UFG
______________________________________________
Prof. Dra. Dalva Maria Borges L. D. de Souza/UFG
12
RESUMO
Com a promulgação da Constituição de 1988, foram criados espaços institucionalizados de
participação que possuem sua existência vinculada à exigência da legislação (federal, estadual
e municipal) como, por exemplo, os conselhos gestores e os planos diretores. A literatura
aponta que a efetividade dos processos participativos está estreitamente relacionada ao
comprometimento político do governante com a democratização da gestão pública.
Orientados pela abordagem qualitativa dos processos sociais, procuramos compreender a ação
do Estado, particularizado nas gestões dos municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia,
diante das modificações implementadas em seus monopólios sobre os meios de administração
através dos arranjos participativos, neste caso os conselhos municipais de saúde, identificando
o tipo de relação estabelecida entre as dinâmicas das duas instâncias no que tange à partilha
de poder. Ao estabelecer uma comparação entre as ações ideais e as ações praticadas pelos
secretários de saúde dos municípios estudados notamos que, em geral, as ações mostraram
uma tendência contrária a democratização do poder decisório. Com base no que foi verificado
nos discursos dos conselheiros municipais de saúde e nas observações participantes,
conseguimos definir a ação do Estado como uma ação concentradora de poder motivada por
uma concepção política verticalizada.
Palavras-chave: Conselhos Municipais de Saúde, Ação do Estado, Partilha de Poder.
13
ABSTRACT
With the enactment of the 1988 Constitution were created spaces for participation
that have institutionalized their existence coupled with the requirement of
legislation (federal, state and municipal), for example, the management councils
and the master plans. The literature suggests that the effectiveness of participatory
processes is closely related to the ruler's political commitment to the
democratization of public management. Guided by the qualitative approach of the
social processes we seek to understand the action of the state, private managements
in the cities of Goiânia and Aparecida de Goiania, given the changes implemented
in its monopoly over the means of administration through the participatory
arrangements, in this case the municipal health councils identifying the type of
relationship established between the dynamics of two bodies with regard topower
sharing. By establishing a comparison between the ideals and actions the actions
taken by the secretaries of health in the cities studied have noticed that, in general,
their actions showed a bias against the democratization of decision-making. Based
on what was found in the speeches in the comments of directors and participants
can define state action as an action motivated by concentrating power in a vertical
design policy.
Keywords: Municipal Health Councils, State Action, Power-Sharing.
14
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................09
1. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DEMOCRACIA DIRETA................................................................12
1.1 DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO......................................................................................................13
1.1.1. Democracia e participação no pensamento social clássico.........................................................13
1.2 A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA......................................................................................................14
1.2.1. A Democracia participativa para Pateman...................................................................................14
1.2.2. As concepções contra-hegemônicas da Democracia conforme Santos e
Avritzer.........................15 1.3 A COMBINAÇÃO DOS MODELOS DE DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DE DEMOCRACIA DIRETA.............................................................................................................................17
1.4. DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA E EXPERIÊNCIA CONSELHISTA NO BRASIL………..……………..............19
1.4.1. Descentralização: problematizando o
consenso............................................................................20 1.4.2. Descentralização política no Brasil: o caso dos conselhos de políticas.......................................22
2. CONSELHOS MUNICIPAIS DE POLÍTICAS: BREVE SÍNTESE DAS EXPERIÊNCIAS NO BRASIL PÓS-1988..............................................................................................................................24
2.1. ESTADO E SOCIEDADE CIVIL: CONFLITOS E PARTILHA DE PROJETOS POLÍTICOS……………………....29
2.2. A AÇÃO DO ESTADO NO CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE CURITIBA.....................................33
3. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS..................................................................................................38
3.1. A REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA.......................................................................................41
3.2. A OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GsOIÂNIA E APARECIDA DE GOIÂNIA.................................42
3.2.1. A oferta de serviços de saúde em Goiânia………………………………………………………………………………..44
3.2.2. As origens da cidade de Aparecida de Goiânia e a questão da saúde pública..............................47
3.3. PROCEDIMENTOS DE COLETA E DE ANÁLISE DOS DADOS...............................................................52
A observação pasiva……...................................................................................................................52
Entrevistas com os conselheiros do CMSAPG e do CMS....................................................................53
Análise documental...........................................................................................................................53
Aspectos éticos……………………………………………………………………………………………...................................54
4. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA ................... .....................................................63
4.1. ENTREVISTAS COM OS CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA............................................................................................55
15
Perfil dos conselheiros entrevistados................................................................................................57
Contextualização...............................................................................................................................59
Análise temática das
entrevistas.......................................................................................................60 Atuação do conselho e dos conselheiros............................................................................................60
A relação com a Secretaria Municipal de Saúde................................................................................63
A ação democratizadora do CMSG e do CMSAPG.............................................................................67
Entraves à atuação dos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia…....68
4.1.2 Considerações sobre as atas e a observação passiva.....................................................................70
A observação participante no I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Goiânia e na Reunião Ordinária de novembro de 2010................................................................................................72 Observação participante nas reuniões ordinárias no CMSG e no CMSAP..........................................73
4.2. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA........................................................................................................75
As motivações para a ação do Estado nos municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia………85
OBSERVAÇÕES FINAIS....................................................................................................................82
REFERÊNCIAS.................................................................................................................................83
ANEXOS..........................................................................................................................................87
16
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1: SÍNTESE DAS EXPERIÊNCIAS CLÁSSICAS COMUNAIS.
QUADRO 2: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GOIÂNIA – 2005.
QUADRO 3: CASOS DE DOENÇAS REGISTRADAS ENTRE A POPULAÇÃO DE
GOIÂNIA ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.
QUADRO 4: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM APARECIDA DE GOIÂNIA NO
ANO DE 2005.
QUADRO 5: CASOS DE DOENÇAS REGISTRADAS ENTRE A POPULAÇÃO DE
APARECIDA DE GOIÂNIA ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.
QUADRO 6: COMPARATIVO DAS RELAÇÕES DAS SECRETARIAS
MUNICIPAIS DE SAÚDE COM OS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE
GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA
17
LISTA DE SIGLAS
CMSC – CONSELHOS MUNICIPAL DE SAÚDE DE CURITIBA
CMSG – CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE GOIÂNIA
CMSAPG – CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE APARECIDA DE GOIANIA
SMS – SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE GOIÂNIA
SMSAPG – SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE APARECIDA DE GOIANIA
18
INTRODUÇÃO
_________________________________________________________________________
Por mais de duas décadas o interesse analítico sobre os conselhos municipais de
políticas mostra-se crescente entre os cientistas sociais. O expressivo contingente de artigos,
monografias e dissertações, bem como a presença temática em diversos congressos1,
seminários, fóruns, etc., são evidências de sua estima entre os pesquisadores de diversas
inspirações (Avritzer, 2008; Dagnino, 2002; Lubambo e Miranda, 2007; Fuks, 2005; Santos
Jr., Ribeiro e Azevedo 2004; Santos, 2002, etc.).
A temática dos conselhos se inscreve num amplo debate acerca das
potencialidades e limites da democracia participativa, em especial na vertente deliberativa, e
da coexistência das práticas de representação e participação. Tal debate é marcado por
ceticismos e otimismos sobre os efeitos democratizantes dos conselhos, entendidos como
instrumentos de participação direta na elaboração, execução e fiscalização das políticas
públicas.
No Brasil, com a promulgação da Constituição de 1988, foram criados espaços
institucionalizados de participação que possuem sua existência vinculada à exigência da
legislação (federal, estadual e municipal) como, por exemplo, os conselhos gestores e os
planos diretores. Os conselhos gestores, existentes pelo país, envolvem práticas de
participação direta na gestão das políticas públicas nas áreas da saúde, educação, dos direitos
das crianças e dos adolescentes, na questão da mulher, da cultura, da habitação, etc.
O potencial legitimador das decisões governamentais que contam com o maior
envolvimento dos cidadãos e das organizações da sociedade civil nos processos decisórios
favorece a adoção de instrumentos de participação direta como uma importante estratégia de
gestão pública municipal2, independentemente da orientação político-ideológica a que o
1 O tema dos conselhos tem presença garantida em dois dos grandes eventos de divulgação de pesquisa entre os
cientistas sociais, que são os promovidos pela ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Ciências Sociais e pela SBS (Sociedade Brasileira de Sociologia). 2 Conforme Nogueira (2004), a participação já não é mais pensada como reverso da representação ou como
instrumento privilegiado de pressão popular, mas como expressão de práticas sociais democráticas interessadas
em superar os gargalos da burocracia pública e em alcançar soluções positivas para os diferentes problemas.
Nogueira sustenta que o novo status adquirido pela participação no campo da gestão pública se deve a uma série
de fatores, entre os quais destaca: as exigências da modernidade radicalizada e da globalização capitalista; a
19
gestor se filie. No entanto, a prática política tem demonstrado que apesar do caráter
democrático de mecanismos de ampliação da participação popular, como é o caso dos
conselhos gestores, nem sempre a implementação destes resulta em democratização da gestão
pública.
A literatura aponta que a efetividade dos processos participativos está
estreitamente relacionada ao comprometimento político do governante com a democratização
da gestão pública (AVRITZER, 2008). Nesse sentido, a vontade política do gestor municipal3
é uma variável importante para aferir a efetividade dos conselhos. Argumenta-se que a
vontade política do governante, compreendida como elemento norteador de sua ação, é
fortemente influenciada por seu posicionamento político-ideológico. Entretanto, esta é uma
questão pouco explorada nas análises sobre os processos participativos.
Com base em tais considerações, este estudo se propõe a investigar a ação do
Estado, particularizado na instância municipal, no que tange à partilha de seu poder
deliberativo. Buscamos caracterizar e compreender o tipo de relação estabelecida entre Estado
e os conselhos municipais de saúde de Goiânia e Aparecida de Goiânia, bem como as
variáveis que interferem nessa relação.
A dissertação está estruturada em quatro capítulos. No primeiro capítulo
apresentamos as bases teóricas da democracia. Buscamos situar a discussão no campo de
debates sobre os novos arranjos democráticos em favor da ampliação da participação. A
primeira seção trata da questão da participação e de sua ampliação entre os teóricos clássicos
das ciências sociais. A segunda seção refere-se ao processo de descentralização política e da
experiência conselhista na cena política brasileira instituída a partir de 1988.
No segundo capítulo exploramos o modo como a literatura tem abordado a
questão da participação, via conselhos de políticas, após duas décadas de sua implementação
no Brasil. Primeiramente, discutimos os elementos considerados pela agenda de pesquisa
como determinantes aos estímulos da participação. Em seguida, abordamos as relações entre
Estado e sociedade nos estudos científicos recentes e as variáveis que interferem nestes. E por
fim, almejando justificar nossa hipótese, selecionamos um estudo de caso no qual buscamos
caracterizar a ação do Estado no que diz respeito à partilha de seu poder decisório.
O terceiro capítulo relaciona-se à metodologia e aos métodos adotados por este
estudo. Adotamos a abordagem qualitativa, no intuito de melhor compreender a ação do
insatisfação social com a gestão pública; a campanha contra o Estado (o público é inferior ao privado); aos
avanços tecnológicos, etc. 3 O termo gestor municipal se refere ao governante do dia, ou seja, o prefeito em exercício.
20
Estado, circunscrito às secretarias municipais de saúde dos municípios de Goiânia e de
Aparecida de Goiânia, quanto à divisão de seu poder decisório em virtude da inserção dos
conselhos municipais de saúde como órgãos de caráter misto com a finalidade de elaborar,
deliberar e fiscalizar a política pública de saúde. Para tanto, realizamos entrevistas com os
conselheiros, analisamos atas e regimentos internos dos conselhos de saúde dos dois
municípios, bem como utilizamos da técnica da observação participante nas reuniões destes.
No quarto capítulo apresentamos os resultados da pesquisa empreendida com os
conselhos municipais de saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia. Discorremos sobre os
depoimentos dos conselheiros com base em quatro eixos temáticos que compuseram o roteiro
de entrevista. Em seguida, expomos a interpretação do conteúdo das atas e do regimento
interno dos conselhos e descrevemos os elementos mais significativos da observação
participante realizada nas reuniões dos conselhos e no I Seminário de Capacitação de
Conselheiros de Goiânia. Após esta fase, debatemos os resultados obtidos. No primeiro
momento focalizamos em nossa compreensão a ação do Estado nesses dois municípios na
tentativa de comprovar ou de refutar nossa hipótese. Em seguida procuramos estabelecer um
paralelo com a literatura especializada, buscando identificar as semelhanças e diferenças do
experimento conselhista em Goiânia e em Aparecida de Goiânia com as experiências
nacionais.
Por último, apresentamos nossas observações finais. Fazemos um balanço da ação
do Estado empreendida em Goiânia e em Aparecida de Goiânia na área da saúde e sugerimos
uma agenda de pesquisa que venha ampliar a compreensão acerca dos processos
participativos.
21
PRIMEIRO CAPÍTULO
_______________________________________________________
1. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DEMOCRACIA DIRETA
O embate teórico-político entre a eficiência do modelo democrático representativo
versus a eficiência do modelo democrático direto tem sido frutífero para o avanço da
compreensão das democracias contemporâneas nas ciências sociais. De um lado, a
democracia representativa sustenta-se no argumento da inevitabilidade da representação nas
condições das sociedades modernas, regidas pela complexidade da vida industrial e tendo em
vista a dimensão e a complexidade dos estados modernos. As deliberações que dizem respeito
à coletividade são tomadas por representantes eleitos para este fim. No último quartel do
século XX o status hegemônico da democracia representativa é colocado à prova. A perda de
confiança nos políticos, o descrédito das instituições políticas, a perda de centralidade dos
partidos políticos como ordenadores das preferências do eleitorado, assim como a
incapacidade das instituições representativas de incorporar as novas questões (da mulher, do
meio ambiente, étnicas, etc.) à sua agenda política são responsáveis pela “crise do modelo
representativo”.4
De outro lado, o modelo da democracia direta em sua concepção clássica
caracteriza-se pela participação dos cidadãos nas decisões que lhes dizem respeito. A
participação direta da população nas deliberações possibilita a representação das diversas
identidades coletivas, a legitimidade das decisões, o maior controle sobre as ações do governo
e o aprendizado político dos cidadãos. No entanto, sua aplicabilidade torna-se inviável diante
da complexidade de relações sociais em sociedade globalizadas. Vejamos como os clássicos
4 Habermas (1997, p. 18) argumenta que as sociedades democráticas no capitalismo tardio estão passando por
uma crise de legitimação. Advoga que: “O âmago da política deliberativa consiste numa rede de discursos e de
negociações, a qual deve possibilitar a solução racional de questões pragmáticas, morais e éticas, que são
precisamente os problemas acumulados de uma fracassada integração funcional, moral e ética da sociedade.”
22
do pensamento social articularam os temas da democracia e da participação nas sociedades
modernas.
1.1. DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO
1.1.1. Democracia e participação no pensamento social clássico
A questão da participação e seus modos de realização remetem ao pensamento dos
clássicos da teoria social.
A democracia, no pensamento weberiano, é marcada pela interpenetração dos
temas da racionalidade, da burocracia e do elitismo. O autor argumenta que a expressão
“democratização” pode ser enganosa visto que o demos jamais governa, ao invés disso é
governado, de modo que sua participação se restringe à seleção de líderes executivos
(WEBER, 1974).
Para Weber, somos políticos ocasionais “quando votamos, ou consumamos uma
expressão de intenção semelhante, como aplaudir ou protestar num comício político, ou ao
pronunciar um discurso político, etc. Toda a relação de muitas pessoas para com a política se
limita a isso.” (1974, p.104).
Radicalizando essa mesma linha argumentativa, Schumpeter pensa a democracia
como método, com a finalidade de assegurar a liderança política nacional efetiva. Para ele, a
democracia possibilita a oportunidade de o povo escolher, aceitar ou recusar entre as elites
que se candidatam a governá-lo. Na sua percepção, a participação deve ser mínima, necessária
para favorecer a competição entre elites. A participação excessiva, do seu ponto de vista, leva
à indiferença política, haja vista a fraqueza e impulsividade do eleitorado (SCHUMPETER,
1961).
Almond e Verba são também criteriosos quanto às expressões e espaços de
participação num regime democrático. Sua tipologia clássica sobre cultura política classifica a
cultura cívica como modelo típico-ideal do bom funcionamento da democracia, na qual o
cidadão participa, mas não em excesso. Nela combinam-se elementos da cultura paroquial, de
sujeição e de participação. Para os autores, a mescla cultural é um fator positivo à
consolidação da democracia (ALMOND e VERBA, 1992).
Robert Dahl classifica as democracias contemporâneas como poliarquias, por
considerá-las pobres aproximações do ideal democrático. O autor trabalha com a hipótese de
23
que a democratização consiste em um progressivo processo de ampliação da competição
política e do direito à participação. Para ele “a democracia é fruto de um cálculo de custos e
benefícios feito por atores políticos em conflito [...] a democracia sustenta-se a partir de um
equilíbrio de forças, isto é, quando nenhum grupo social está em condições de eliminar os
demais. Sobretudo, é fruto de um cálculo de atores políticos em uma relação estratégica.”
(DAHL, 1997, p.21).
Weber, Schumpeter, Almond e Verba e Dahl representam a trajetória da corrente
teórica que restringe a participação aos limites de funcionamento das instituições
representativas. Seus modelos valorizam a participação como pressuposto democrático, mas
uma participação tendencial e necessariamente elitista e restritiva, característica do modelo
representativo.
1.2. A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA
1.2.1. A Democracia participativa para Pateman
Em outro extremo situam-se os chamados “participacionistas”, herdeiros da
expectativa republicana inaugurada por Rousseau. Tendo em vista os limites do modelo de
democracia representativa, as bases dessa corrente advogam sua substituição pela democracia
direta, na qual a participação seja ampliada para além do processo eleitoral em que são
escolhidos governantes e parlamentares, e os cidadãos possam alcançar as esferas de
deliberação política. Dentre seus representantes destaca-se a teoria da democracia
participativa a que chega Pateman, após reexaminar as teorias políticas de Rousseau, Mill e
Cole.
O ponto de partida de Pateman é a afirmação central de que não se pode
considerar separadamente os indivíduos de suas instituições. Somente pelos processos
participativos é que se desenvolvem as habilidades necessárias às práticas democráticas. A
função principal da participação numa teoria de democracia participativa é, portanto,
educativa, além de seu efeito integrativo e de auxílio à aceitação de decisões coletivas mesmo
por aqueles que se sintam por elas prejudicados.
O segundo aspecto da teoria da democracia participativa diz respeito às esferas de
atuação em sociedades industriais complexas, ou seja, o local de trabalho que proporciona
adicionais ao âmbito nacional (PATEMAN, 1992). Segundo Pateman (1992, p.62): “Pode-se
caracterizar o modelo participativo como aquele onde se exige o input máximo (participação)
24
e onde o output inclui não apenas as políticas (decisões), mas também o desenvolvimento das
capacidades sociais e políticas de cada indivíduo, de forma que existe um „feedback‟ do
output para o input.”
Pateman afirma que a teoria da democracia participativa apresenta vários aspectos
que refletem os principais temas da teoria política e da sociologia política recentes. Sua
capacidade autossustentável é, sem dúvida, um atrativo a muitos pensadores políticos, além
das semelhanças que possui com as teorias recentes de pluralismo social.
1.2.2. As concepções contra-hegemônicas da Democracia conforme Santos e Avritzer
O período posterior a Segunda Guerra Mundial foi marcado pelo desenvolvimento
e materialização do elitismo democrático. Ainda assim, ao lado dessa concepção hegemônica
de democracia, fundada na representação, também floresceram concepções contra-
hegemônicas caracterizadas por uma nova gramática social e cultural e pela inovação
institucional.
De acordo com Santos e Avritzer, a democracia é uma forma sócio-histórica
insubordinada a qualquer lei natural. “A democracia constitui uma nova gramática histórica.”
(Santos & Avritzer, 2005, p.51). A democracia implica na ruptura com tradições
estabelecidas, assim como, na instauração de novas instituições, normas e leis. Essa
inconstância, produzida pela gramática democrática, se reflete para além da incerteza de quem
ocupa os postos de poder.
As teorias contra-hegemônicas redefinem o procedimentalismo, antes reduzido a
um método de constituição de governos e que agora passa a ser entendido como prática social.
Conforme Santos e Avritzer, o procedimentalismo se funda na multiplicidade de formas de
vida existentes nas sociedades contemporâneas. Numa sociedade plural é preciso que a
política conte com a anuência dos atores sociais envolvidos em processos racionais de
discussão e de deliberação. Assim sendo, o procedimento democrático passa a ser uma forma
de exercício coletivo de poder político, baseado no processo livre de debate de razões entre
iguais e não um método de autorização de governos (SANTOS & AVRITZER, 2005).
Além da reconexão entre procedimentalismo e participação, a concepção contra-
hegemônica da democracia destaca o papel dos movimentos sociais na institucionalização da
diversidade cultural. Para alguns autores da teoria dos movimentos sociais a política envolve
um debate acerca de um conjunto de significações culturais. Tal debate levou ao alargamento
25
do campo político no qual ocorreria uma disputa pela ressignificação de práticas (SANTOS &
AVRITZER, 2005). Nesse sentido,
Os movimentos sociais estariam inseridos em movimentos pela ampliação do
político, pela transformação de práticas dominantes, pelo aumento da cidadania e
pela inserção na política de atores sociais excluídos. Essa literatura sobre a re-
significação das práticas democráticas teve impacto particularmente alto na
discussão democrática na América Latina, onde ela foi associada ao problema da
transformação da gramática social (SANTOS & AVRITZER, 2005, p.53).
O processo de redemocratização nos países do Sul inseriu novos atores sociais no
cenário político, o que levou a uma disputa pelo significado da democracia e a necessidade de
uma nova gramática social. Tal fato trouxe à tona uma agenda de debates sobre a democracia
que envolveu a relação entre procedimentalismo e participação social e a questão da relação
entre representação e diversidade cultural (SANTOS & AVRITZER, 2005).
No que diz respeito à relação entre procedimentalismo e participação social, a
grande participação dos movimentos sociais nos processos de democratização resultou na
necessidade de uma nova gramática social e em uma nova relação entre Estado e sociedade. A
constituição dessa nova gramática social com o intuito de mudar as relações de gênero, de
raça, de etnia e a apropriação privada de bens públicos, implicou na adoção do
experimentalismo no próprio Estado.
Em relação ao problema de escala, as experiências participativas mais exitosas, no
nível local, resultaram da capacidade dos atores sociais realocarem saberes e práticas sociais à
esfera administrativa. De modo que o êxito das inovações institucionais se deveu a
criatividade dos atores sociais.
E, por fim, acerca da questão da representação e a diversidade cultural, é preciso
tratar sobre a ampliação do número de atores sociais envolvidos na política. Esta ampliação
permite que os grupos mais vulneráveis, os setores sociais menos favorecidos e as minorias
étnicas sejam representados no sistema político.
Concluindo, para Santos e Avritzer, a democracia participativa é um dos grandes
campos sociais e políticos que, no início do século XXI, está reinventando a emancipação
social. Na próxima seção apresentamos uma proposta de articulação entre os modelos de
democracia representativa e de democracia direta restrita a consulta popular.
26
1.3 A COMBINAÇÃO DOS MODELOS DE DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E
DE DEMOCRACIA DIRETA
Ante as lacunas apresentadas pela democracia representativa, no que se refere ao
atendimento das demandas (étnicas, de gênero, ecológicas, etc.) dos novos atores sociais
inseridos no cenário político contemporâneo, alguns teóricos têm proposto modelos de gestão
pública que articulem a democracia representativa com elementos da democracia direta.
Para Lamounier, o aumento da importância da democracia direta em relação à
democracia representativa, no Brasil se deve à crença de que a maior participação direta do
cidadão nos processos decisórios viria a conformar a “verdadeira” prática democrática.
(LAMOUNIER, 1996).
O autor argumenta que os princípios da democracia representativa estariam sendo
enfraquecidos pela chamada democracia direta:
[...] isto é, pelas pesquisas de opinião pública, pelo recurso à iniciativa popular de
legislação e a plebiscitos; por uma crescente ocupação da esfera pública pela
imprensa, com o conseqüente recuo dos partidos e organizações políticas
tradicionais; e, sobretudo pelo caráter interativo da comunicação eletrônica, que
torna possível a troca praticamente instantânea de informações e opiniões dos
cidadãos entre si e entre eles e as autoridades governamentais. (LAMOUNIER,
1996, p. 35).
No entanto, prossegue, não há razões para supor que a representação partidária
deixe de ser o suporte da organização política democrática das sociedades complexas.
Haveria, sim, um alargamento da base da democracia representativa, através da expansão do
universo dos participantes do jogo político (processo eleitoral, voto) e do fortalecimento de
funções públicas sensíveis à opinião popular.
O papel da democracia direta numa democracia representativa limita-se à consulta
popular e não ao processo deliberativo. O autor não leva em conta as novas formas
institucionais que conjugam funções consultivas e deliberativas como os Conselhos gestores,
o Orçamento Participativo, as Conferências Temáticas, etc.
Numa perspectiva semelhante, Bobbio trata das promessas não cumpridas pela
“democracia real” – em constante transformação – em contrapartida à democracia ideal,
concebida por seus formuladores. Destaca seis promessas não realizadas: 1) a passagem de
uma sociedade centrípeta (com apenas um centro de poder) para uma sociedade policêntrica
27
(com vários centros de poder); 2) em relação à representação política, a violação da proibição
do mandato imperativo (os interesses particulares se sobrepõem aos gerais); 3) a persistência
das oligarquias (a presença de elites no poder); 4) a impossibilidade de se ocupar os espaços
de decisões que afetem grupos sociais inteiros; 5) a existência de poderes invisíveis (duplo
Estado) e, 6) o cidadão não-educado. (BOBBIO, 1986)
Dessa forma, tais promessas não poderiam ser cumpridas, pois desde o início se
tratavam de ilusões. Os princípios abstratos da democracia ideal tiveram que se adaptar à
realidade. Para Bobbio, o mérito da democracia representativa está no livre debate para a
formação de maiorias, enquanto que na democracia direta a escolha se dá forçada entre duas
alternativas e desse modo atrapalharia o compromisso e favoreceria o choque.
O autor caracteriza os dois modelos. Define democracia direta nos moldes
clássicos, como: “literalmente a participação de todos os cidadãos em todas as decisões a eles
pertinentes” (Bobbio, 1986, p.42). E conceitua democracia representativa como
“genericamente que as deliberações coletivas, isto é, as deliberações que dizem respeito à
coletividade inteira, são tomadas não diretamente por aqueles que dela fazem parte, mas por
pessoas eleitas para esta finalidade” (Bobbio, 1986, p.44).
Bobbio propõe um sistema de democracia integral, no qual a democracia
representativa possa interagir com a democracia direta. Neste sistema:
“cada uma delas (a democracia representativa e a democracia direta) em
conformidade com as diversas situações e as diversas exigências, e isto
porque são perfeitamente compatíveis entre si [...]. Isto implica que, de fato,
democracia representativa e democracia direta não são dois sistemas
alternativos (no sentido de que onde existe uma não pode existir a outra), mas
são dois sistemas que podem interagir reciprocamente” (BOBBIO, 1986,
p.52).
Nessa projeção, estaríamos assistindo a um processo de democratização na
passagem da democracia política para a democracia social, ou seja, da democratização do
Estado à democratização da sociedade civil. Bobbio afirma que: “o deslocamento do ângulo
visual do Estado para a sociedade civil nos obriga a considerar que existem outros centros de
poder além do Estado. Nossas sociedades não são monocráticas, mas policráticas.” (Bobbio,
1986, p.57).
Em síntese, tanto Lamounier quanto Bobbio partem de uma perspectiva
procedimental da democracia. Isto é, a democracia entendida como um conjunto de regras
para a formação de decisões coletivas, nas quais são estabelecidas quem está autorizado a
tomá-las e com quais procedimentos - decisões tomadas pela regra da maioria e de acordo
28
com os direitos de liberdade (BOBBIO, 1986). Para os autores, é inquestionável o status
hegemônico da democracia representativa como modelo mais adequado às sociedades
contemporâneas. É somente na perspectiva de aperfeiçoá-la (a democracia representativa) e
lhe conferir maior legitimidade que eles recomendam a ampliação da participação, em
especial através do alargamento do processo eleitoral.
1.4 DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA E EXPERIÊNCIA CONSELHISTA NO
BRASIL.
O desenvolvimento do capitalismo contemporâneo (reordenação do processo
produtivo, flexibilização das relações de trabalho, desemprego, etc.), os avanços tecnológicos
(internet, avanços no campo das telecomunicações, no campo de medicina, na robótica, etc.),
e o processo de globalização (compressão do “espaço/tempo”) têm implicado em mudanças
nas estruturas das interações sociais, fazendo emergir novos atores sociais, padrões distintos
de sociabilidade e identificações coletivas, além de novas reivindicações (de gênero, étnicos,
sexuais, ambientais, justiça social, culturais, etc.). No plano político tais transformações têm
colocado em xeque o modelo representativo, o papel dos partidos políticos e o Estado de bem-
estar social. Em meio a esse cenário, a descentralização político-administrativa vem sendo
defendida por várias correntes políticas como o modelo de gestão das políticas públicas que
mais se adéqua às exigências da globalização.
A reorganização do Estado ao final do século XX seguiu diferentes processos e
formas. Estes alteraram padrões de vida institucional e interferiram no exercício dos direitos
nos países centrais e nas regiões da periferia mundial alcançadas por poderes e controles
globalizados. As demandas por descentralização são entendidas como transferência de
funções do Estado central para as comunidades locais, com autonomia financeira e política.
Num primeiro momento ganham então status de equivalentes diretas da democracia (LEVY,
1997). Rapidamente, porém, é possível verificar variações substantivas nas concepções e
sentidos dados ao termo descentralização e aos efeitos dos processos orientados sob diretrizes
descentralizadoras.
Em síntese, Levy define descentralização como distribuição territorial de poder
que implica em delegação de autoridade. A autora destaca as seguintes formas de organização
do Estado: a descentralização administrativa (transferência de funções do Estado central para
uma agência local que lhe é subordinada); a privatização (transferência de funções do Estado
29
para uma organização do mercado) e a descentralização política (transferência de funções
com autonomia financeira e política para comunidades locais ou regionais). Conforme a
autora, ao analisar a descentralização é preciso ponderar sobre os meios de integração ou
subordinação que permeiam esta premissa. É também necessário verificar até que ponto a
descentralização reflete uma efetiva transferência de poder a grupos subordinados da
sociedade, permitindo que estes obtenham fortalecimento político (LEVY, 1997).
Em termos de balanço sobre o tema da descentralização nas principais correntes
de pensamento contemporâneo, Levy identifica a valorização da esfera local e o
enfraquecimento do poder central como pontos de convergência entre o pensamento de
esquerda e o pensamento conservador. Tais elementos desafiam a democracia representativa e
o Estado quanto à dominação burocrática, à necessidade de instituições supranacionais e ao
imperativo da procura por novas formas de integração social. No âmbito das divergências, a
autora destaca a caracterização conferida ao sujeito social. Enquanto para as correntes de
esquerda o sujeito social é a ação coletiva (atuação via movimentos sociais, entidades de
classe, sindicatos, etc.), para os liberais o sujeito social é o indivíduo (LEVY, 1997).
Levy (1997) conclui que as formas de governo consideradas legítimas ao longo do
tempo encontram-se questionadas, pois se na atual conjuntura o governo local ganha
proeminência, cabe constatar que as instâncias de integração não estão democratizadas, do
mesmo modo que os mecanismos que garantem a participação na ordem democrática não
foram resolvidos.
1.4.1. Descentralização: problematizando o consenso
Arretche foi uma das primeiras vozes entre os cientistas sociais brasileiros a
indicar cautela no debate acerca da descentralização5, advertindo contra a euforia e os
equívocos antiestatistas a que se chegava. Segundo a autora:
O debate sobre a reforma do Estado tem certamente na descentralização um de seus
pontos centrais. Até muito recentemente, parecia reinar quase absoluto consenso em
torno de suas virtudes e, por razões diversas, ao longo dos últimos anos, diferentes
correntes de orientação política têm articulado positivamente propostas de descentralização com diversas expectativas de superação de problemas identificados
no Estado e nos sistemas políticos nacionais. (...). Em outras palavras, a partir de
perspectivas políticas distintas se produziu um grande consenso em torno da
5 Nogueira (2004) também faz uma interessante discussão sobre os processos de reforma do Estado e da
descentralização.
30
descentralização. Passou-se a supor que, por definição, formas descentralizadas de
prestação de serviços públicos seriam mais democráticas e que, além disso,
fortaleceriam e consolidariam a democracia. Igualmente, tal consenso supunha que
formas descentralizadas de prestação de serviços públicos seriam mais eficientes e
que, portanto, elevariam os níveis reais de bem-estar da população. Portanto,
reformas do Estado nessa direção seriam desejáveis, dado que viabilizariam a
concretização de ideais progressistas, tais como equidade, justiça social, redução do
clientelismo e aumento do controle social sobre o Estado. Simetricamente, passou-se
a associar centralização a práticas não-democráticas de decisão, à ausência de
transparência das decisões, à impossibilidade de controle sobre as ações de governo
e à ineficácia das políticas públicas. As expectativas postas sobre a descentralização
e a visão negativa das formas centralizadas de gestão implicariam
como consequência, a necessária redução do escopo de atuação das instâncias
centrais de governo. (ARRECTHE, 1997, p. 44.).
Nesta linha argumentativa, essencialmente, o debate sobre a descentralização nos
anos 1980 era de cunho normativo e pautou significativos programas de reforma do Estado
em vários países. Após quinze anos de implementação de medidas descentralizadoras e de
ajuste fiscal, Arretche mostrou ser possível abordar o tema sob a ótica analítica e
problematizar o consenso de então. Sua contribuição efetiva foi demonstrar que as várias
associações positivas atribuídas ao processo de descentralização não se sustentam nem lógica
e nem empiricamente.
Contra o argumento que associa positivamente descentralização e democracia e,
ao mesmo tempo, centralização e sistemas políticos menos democráticos, a autora afirma que
a concretização dos ideais democráticos se deve mais à natureza das instituições do que ao
nível de governo encarregado da gestão das políticas. Segundo Arretche, tais associações
podem ser mais bem estudadas pela análise que articula historicamente as elites do governo
central e as elites locais regionais em um determinado modelo de Estado. Para Arretche
(1997, p.45): “é precisamente esse processo histórico, pelo qual as elites de diferentes
instâncias se integram (ou não) no interior das instituições políticas, que explica a natureza
das reformas descentralizadoras ocorridas e o discurso político que lhes serve de sustentação.”
Em relação ao argumento de que a descentralização implica em esvaziamento das
funções do nível central de governo a autora afirma - com base no exame da forma de
expansão do Estado brasileiro no regime militar e das suas implicações sobre o conflito
federativo, assim como na avaliação da dinâmica de descentralização brasileira em relação às
políticas sociais, em especial – que ao contrário dos que defendem a noção de que foi
reduzida a atuação do governo federal no Brasil, verificou-se a necessidade de uma expansão
seletiva das atividades do governo. Desse modo, o sucesso da descentralização necessita de
uma redefinição do papel estratégico do governo num novo arranjo federativo. (ARRETCHE,
1997).
31
Contra o argumento que defende que por si só a descentralização de políticas
públicas é capaz de reduzir os elevados graus de clientelismo presentes nas grandes estruturas
burocráticas, Arretche sustenta que a possibilidade de tal prática se concretizar depende mais
da natureza das relações entre as burocracias estatais e do controle efetivo dos cidadãos sobre
as ações do governo, do que da escala de governo responsável pela prestação do serviço.
Diante do exposto, parece claro que o processo de descentralização política não
constitui garantia para democratizar a gestão das cidades, como supunham seus defensores. A
adoção de formas de organização do Estado descentralizado exige a incorporação de novos
meios de gestão, a redefinição de papéis entre os entes federativos, a inclusão de novos atores
e ainda o enfrentamento de práticas políticas tradicionais como o elitismo político e o
clientelismo. No Brasil, o processo de descentralização política possibilitou a criação de uma
série de mecanismos de ampliação da participação popular na elaboração, deliberação e
fiscalização das políticas públicas, tais como os conselhos de políticas municipais.
1.4.2. Descentralização política no Brasil: o caso dos conselhos de políticas
A promulgação da Constituição de 1988 implicou em profundas modificações nas
instituições políticas brasileiras, em especial no âmbito local. Consagrou a descentralização e
a autonomia local, e então os municípios passaram a compor o pacto federativo junto com os
Estados e o Distrito Federal. Uma importante conquista foi a consagração da participação
popular no processo de gestão e elaboração das políticas públicas. A partir de então surgiu no
Brasil pós-1988 uma “infra-estrutura participativa”, utilizando um termo de Avritzer para
nomear conjuntamente as experiências do orçamento participativo, dos planos diretores
municipais e dos conselhos gestores. Centramos nosso exame nesta última.
Os conselhos estão inscritos na Constituição de 1988 e em outras leis do país na
qualidade de instrumentos de expressão, representação e participação popular. Os conselhos
deliberativos de composição paritária entre os representantes do Executivo e da sociedade
civil foram regulamentados através de leis orgânicas (pós-1988). Passaram a ser exigência
constitucional em diversos níveis administrativos (federal, estadual e municipal), além de que
tiveram suas existências vinculadas ao repasse de recursos financeiros (GOHN, 2001).
A legislação brasileira enfatiza o caráter deliberativo de parte expressiva dos
conselhos, acentuando a inclusão destes ao processo de gestão descentralizada e participativa,
32
e os vincula ao poder Executivo dos municípios como órgãos auxiliares da gestão pública. No
entanto, a autora explica que em municípios sem tradição organizativo-associativa, os
conselhos acabam reduzidos a uma realidade jurídico-formal. Muitas vezes são apenas um
instrumento a mais nas mãos do alcaide e das elites locais que falam em nome da
comunidade, não atendendo minimamente aos objetivos de se tornarem mecanismos de
controle e fiscalização dos negócios públicos (GOHN, 2001).
Santos Júnior, Ribeiro e Azevedo explicam que a criação e disseminação dos
conselhos municipais6, desde a segunda metade dos anos de 1980, são frutos da emergência
dos ideais de reforma das instituições de governo local no Brasil. O foco é o aumento da
participação direta da sociedade na gestão municipal e da eficiência e da efetividade das
políticas públicas descentralizadas (SANTOS JÚNIOR, RIBEIRO e AZEVEDO, 2004). A
respeito das expectativas quanto ao seu papel democratizador, o estudo ressalta:
Espera-se que a sua constituição e consolidação como nova arena político-
administrativa venha reconfigurar os procedimentos decisórios das prefeituras, desde
a fase de definição de objetivos, da formulação de políticas e chegando até a
implementação e avaliação das decisões. Espera-se que a existência dos conselhos
fortaleça a capacidade da sociedade de controlar os mecanismos e critérios de uso
dos recursos públicos, e como consequência sejam mais democráticas as decisões de
distribuição do bem-estar social realizada pelas políticas públicas. Espera-se que as
novas formas de interação entre governo e sociedade materializada nos conselhos
municipais estejam fazendo emergir novos padrões de governo baseados na gestão
democrática, centrada em três características fundamentais: maior responsabilidade
dos governos municipais em relação às políticas publicas e às demandas dos seus
cidadãos; o reconhecimento dos direitos sociais; a abertura de canais para ampla
participação cívica da sociedade. (SANTOS JÚNIOR., RIBEIRO e AZEVEDO,
2004, p. 12-13).
Portanto, os conselhos municipais são depositários de grandes expectativas quanto
ao seu potencial democratizador. No entanto, o que a literatura especializada nos processos de
ampliação da participação e dos novos arranjos participativos tem demonstrado é que os
conselhos enfrentam uma série de desafios em vista de sua efetivação. No capítulo a seguir
discutimos o tratamento dado pela agenda de pesquisas relacionadas à participação, bem
como os entraves a esta participação.
6 A Pesquisa de Informações Básicas Municipais do IBGE, realizada em 2001, constatou que nos 5.506
municípios brasileiros havia naquele ano um total de 32.430 conselhos de políticas setoriais instalados. O
resultado da pesquisa constatou ainda que os estados do Centro-Oeste, do Sul e do Sudeste, apresentaram o
melhor desempenho em todos os quesitos investigados (existência, o seu efetivo funcionamento, a paridade entre
representação social e governamental e a existência de fundo especial no respectivo setor) (PESSANHA,
CAMPAGNAC e MATOS, 2006).
33
SEGUNDO CAPÍTULO
_______________________________________________________
2. CONSELHOS MUNICIPAIS DE POLÍTICAS: BREVE SÍNTESE DAS
EXPERIÊNCIAS NO BRASIL PÓS-1988
O potencial democratizador dos conselhos de políticas é, sem dúvida, uma das
razões de sua popularidade no campo da produção acadêmica, seja no sentido de endossá-lo,
seja no sentido de contestá-lo. Desde o início da década de 1980, a temática da ampliação da
participação dos segmentos sociais na formulação de políticas públicas influencia grande
parte da produção intelectual comprometida com o avanço das conquistas populares na
construção da democracia.
Com o propósito de resgatar a trajetória enveredada pela agenda de pesquisas com
foco na participação popular e nas políticas públicas, Lubambo e Miranda (2007) investigam
a ênfase conferida aos elementos determinantes (cultura política / inovações institucionais) e
ao estímulo da participação da sociedade em experiências descentralizantes a partir de 1980.
As conquistas dos movimentos sociais na melhoria e na oferta de serviços
coletivos e na maior participação nos processos decisórios junto aos órgãos de governo foram
entendidas pela literatura como o reconhecimento das lideranças e organismos populares
como a criação de novas formas de representação em âmbito local e em certo espaço de
influência dos movimentos sociais na definição de prioridades em relação à elaboração das
políticas públicas (LUBAMBO E MIRANDA, 2007).
No fim dos anos 1980, a perspectiva analítica centra-se no processo de transição
democrática balizada por um tipo de “otimismo republicano”, isto é, o pressuposto de que por
si só a democracia é virtuosa e responsável por resultados benéficos para a maioria da
população. Associado a este pressuposto estava a crença de que uma nova institucionalidade,
marcada pela ampliação da participação popular, era condição necessária e suficiente para a
superação do legado de injustiças sociais no país. Entretanto, empiricamente tal pressuposto
não se sustenta.
34
A despeito dos traços de otimismo, nesse momento já se identificam
constrangimentos e obstáculos à virtuosidade da democracia, expressos, sobretudo
pelas possibilidades ampliadas de cooptação das novas organizações por parte do
estado, bem como de uma interlocução orientada para minimizar demandas e
insatisfações, marcadas por tentativas de solução a partir de interesses e opções
governamentais e não, exatamente, coletivos ou públicos. Contudo, o descompasso,
mais tarde, entre a emergente agenda de reformas institucionais e a agenda das
reformas sociais, colocadas em segundo plano, gerou um arrefecimento nas
expectativas postas no processo de democratização (LUBAMBO E MIRANDA,
2007, p.1-2)
Em meio aos obstáculos à virtuosidade da democracia, identificados acima por
Lubambo e Miranda, ganha destaque no debate durante a década de 1990 a atuação das ONGs
como instituições de mediação de interesses coletivos entre a sociedade civil e os grupos de
poder (privados e governamentais). A agenda de pesquisas começa a investigar a contribuição
das ONGs em diversos níveis, mas especialmente junto aos governos locais.
Em seguida, o debate centrou-se no processo de descentralização, evidenciando as
transformações institucionais, viabilizadas pela Constituição de 1988, com foco na
redefinição política dos níveis locais na estrutura federativa e seus impactos sobre a
delimitação da esfera pública e a governabilidade no país.
Num primeiro momento, a literatura superestimou os benefícios advindos da
descentralização. Mas outros estudos, como o de Arretche (1997), baseados em abordagens
mais analíticas e menos normativas, começaram a relativizar o consenso de então, mostrando
a descentralização como um processo heterogêneo e nem sempre positivo para a
democratização política.
Não aprofundaremos o presente estudo neste ponto, tendo em vista que no
capítulo anterior já elencamos os elementos relevantes deste debate. No entanto, cabe ressaltar
que as discussões sobre a descentralização reverberaram na criação e disseminação de novas
arenas de mediação de interesses da população junto à burocracia estatal. A literatura passou a
estudar a atuação e o impacto dos novos mecanismos de participação social na gestão
municipal (as comissões temáticas, os conselhos setoriais, o orçamento participativo, etc.).
Conforme Tendler, citado por Lubambo e Miranda (2007), as pesquisas
acadêmicas foram densamente influenciadas pelo reavivamento dos estudos sobre cultura
política e pelos conceitos de capital social e cultura cívica. Mas nem todos os autores se
entusiasmaram com “o desenvolvimento pelas coisas em âmbito local”.
Nessa contraposição, Tendler assinala que, embora associações cívicas e outras
ONGs fossem frequentemente atores relevantes nos exemplos estudados, em muitos
casos, essa relevância foi viabilizada por uma ação prévia do governo. Ou seja, o
governo permitiu e criou condições de modo que a participação das entidades não-
35
governamentais se efetivasse. O segundo aspecto discutido por Tendler é que os
limites entre o público e o privado mostraram-se muito tênues, para os membros
dessas associações, que compartilham idéias e mantêm ligações estreitas com a
burocracia do governo local (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p 5)
As autoras não discutem as críticas proposta por Tendler sobre as dinâmicas de
interação entre governo e organizações da sociedade civil em âmbito local, talvez porque,
naquele momento, tais críticas destoassem do entusiástico discurso hegemônico.
De volta ao discurso predominante, os temas do associativismo, da gestão
participativa e especialmente do orçamento participativo ganham destaque na literatura até os
anos 2000. A partir daí, o orçamento participativo divide a atenção dos estudiosos com os
conselhos setoriais municipais. Os estudos realizados no pós-2000 são marcados pela
interpretação institucionalista, na qual as variáveis político-institucionais são utilizadas para
explicar os diferentes padrões das experiências participativas (LUBAMBO E MIRANDA,
2007).
Estas estudiosas centram a análise realizada nas hipóteses e explicações mais
usuais da literatura sobre os fatores determinantes ao estímulo à participação da sociedade em
instâncias deliberativas.
Inicialmente, alguns autores associam a pré-existência de uma herança política à
possibilidade de construção de capital social e de desenvolvimento de uma dada região7. Esta
abordagem atribui o fracasso de algumas experiências de conselhos de políticas a fatores
culturais8 (autoritarismo, ausência de organização social e resistência à participação tanto da
sociedade quanto do governo).
Noutra perspectiva há a corrente teórica dos que rejeitam o determinismo
histórico-cultural e apostam nas inovações institucionais9 para superar a herança cultural. A
estrutura institucional é pensada como determinante para fomentar a cooperação entre Estado
e sociedade e também para estimular a participação. A efetividade ou não das experiências
participativas é compreendida como o resultado da organização da sociedade civil e/ou dos
incentivos criados pelos governos ao fomento dos meios de participação. Embora o formato
institucional seja considerado pelos seguidores da abordagem neoinstitucionalista como
determinante ao incentivo da participação, não existe entre eles consenso sobre a correlação
entre mudança institucional e empoderamento.
Segundo Lubambo e Miranda, entre os neoinstitucionalistas existe o problema de
explicar teoricamente o papel da herança histórica sobre as instituições e a ação dos atores
7 Nessa perspectiva Lubambo e Miranda citam a obra de Putman (1993).
8 Segundo Lubambo e Miranda, Andrade (2002) e Bonfim e Silva (2003), são representantes dessa abordagem.
9 Para mais detalhes, Evans (1993) e (1996).
36
sociais. E mesmo que seus autores admitam a importância da mudança institucional, tal
mudança, ainda mais se direcionada ao empoderamento, mostra-se um processo demorado e
dispendioso.
Ou seja, embora haja condições de se induzir, por meio de mudanças no desenho
institucional, uma trajetória de empoderamento numa determinada sociedade não só
demanda tempo para consolidar-se, quanto supõe certos pré-requisitos (inclusive
históricos e de capital social) para a “largada” no curto prazo e para a consolidação
em perspectiva mais longa, sobretudo em regiões que vivenciam um
desenvolvimento tardio (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.8).
A relação entre inovações institucionais e empoderamento se fundamenta na
concepção de que os incentivos à “participação e ao empoderamento são valiosos em si
mesmo, independente de seu impacto sobre a eficiência e a eficácia das políticas públicas”
(Lubambo e Miranda, 2007, p.7) e também nos efeitos que o empoderamento produz na
sociedade (redução da apropriação privada de recursos públicos e a redução da corrupção).
Essas duas dimensões devem ser vistas de modo articulado, bem como as relações
entre empoderamento e governança10
. Lubambo e Miranda supõem que “uma estrutura
apropriada de governança é aquela que reúne características institucionais que criam
incentivos para o empoderamento.” (2007, p.8). Nessa perspectiva, um mecanismo
institucional de governança deve garantir meios de prestação de contas verticais e
horizontais11
, que envolvam a participação social em diversos níveis e dimensões. No entanto:
a efetividade dos mecanismos de prestação de contas horizontal não depende apenas
do desenho e da capacidade institucional adequada, mas também da ação coletiva
que lhes dê legitimidade e aumente sua eficácia. Significa dizer, captando elementos
analíticos para a questão inicial apresentada, que embora não possa substituir a ação
coletiva, o desenho institucional apropriado reduz os custos da mesma. Por outro
lado, o empoderamento de atores sociais permitiria potencializar a ação coletiva,
levando à mudança institucional e legal. Ou seja, as estratégias de empoderamento
operam diretamente sobre os atores, expandindo suas capacidades de barganhar e de
se organizar para eleger prioridades nas políticas públicas ou em inovações
institucionais. Por sua vez, os arranjos institucionais participativos alteram os custos
relativos de organização e de obtenção de informações, reduzindo-os e aumentando
o poder de barganha e de controle dos grupos mais vulneráveis. Na realidade, um
canal de participação novo que é introduzido em virtude da ação coletiva bem
sucedida se constitui ele próprio um forte incentivo para a organização.
(LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.8).
10
Por governança as autoras entendem o conjunto de condições para o exercício do governo. 11
O conceito de prestação de contas, segundo Lubambo e Miranda (2007), diz respeito a uma relação vertical
entre governantes e cidadãos através de eleições, e também a relação horizontal entre os poderes constituídos ou
instituições formais e entre atores institucionais no âmbito do Estado.
37
De tal modo, o debate público no Brasil está focado em formas de gestão
descentralizadas (consultivas e/ou deliberativas) como estímulo do desempenho dos governos.
Ainda que a descentralização do poder decisório seja concebida pela literatura como benéfica,
não está certo que ela seja indispensável ao bom desempenho do governo, ao modo visto no
capítulo anterior, a partir de Nogueira e Arretche.
Lubambo e Miranda questionam em que medida as experiências de
descentralização decisória, via mudanças institucionais, se vinculam ao empoderamento da
sociedade local. O empoderamento é limitado por elementos que compõem a “herança cívica
desfavorável”, isto é, resistência da sociedade à participação; reduzida credibilidade e
comprometimento do Estado; ausência de experiências locais de associativismo e às
resistências em reformar as estruturas e o funcionamento das burocracias estatais. Além
desses elementos complicadores do processo de empoderamento, há também os problemas
que dizem respeito à representação e participação popular:
Há limites contidos na representação e na participação popular intermediada por
associações de qualquer espécie, sobretudo por aquelas oriundas de mudanças
institucionais, como os modelos programáticos com nítida orientação
governamental. Além disso, independentemente da discussão sobre a eficácia dessas
tais instituições/associações, a participação/representação da população, requer uma
nova engenharia institucional também por parte do Estado, ainda despreparado, na
maioria dos casos para enfrentar os problemas mais simples da ação coletiva.
(LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.9).
Diante disso, Lubambo e Miranda (2007, p.11) indagam: “a quem de fato favorece
a abertura de novos canais entre a sociedade e o poder político local e o empoderamento
resultante dessas estratégias. Ao que afirmam que os problemas dos processos participativos
são de duas ordens: aqueles relativos à ação coletiva e os que se referem ao controle social
dos cidadãos a burocracia pública ou aos governantes.
Os problemas da ação coletiva dizem respeito à capacidade organizacional (custos
da mobilização e da participação) dos grupos marginalizados potencializados por fatores
como custos de oportunidade, custos de organização, baixo nível de informação e baixo poder
de negociação. Assim,
As possibilidades de essas instituições responderem aos grupos pobres e excluídos
são reduzidas, em virtude da combinação dos fatores citados (altos custos de
oportunidade da participação, baixos níveis de informação) e da assimetria de
relações políticas que tornam esses grupos particularmente vulneráveis ao
clientelismo e cooptação. (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.12-13).
38
Aliadas a essas questões estão os problemas do controle social das ações dos
agentes públicos e dos governantes. O desafio é a distribuição assimétrica da informação entre
os “não-governantes” e os governantes e gestores, o que diz respeito aos níveis de
transparência da ação pública.
Esse problema é reproduzido internamente nas instituições governamentais na
relação entre governantes e burocracias, como também em relação aos
representantes populares e representados. Muitas vezes, as entidades da sociedade
civil, ONGs e associações do movimento popular adquirem assento em instâncias
participativas, replicando o problema do controle social sobre suas ações. A rigor, a
associação da capacidade de decisão desenvolvida na sociedade à instituição de
estruturas de deliberação participativas, no âmbito do governo, definiria distintos
níveis de empoderamento, nos quais incidem, diferentemente, problemas de ação
coletiva e de controle social. (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.13).
Nesta linha de argumentação tem-se, portanto, que os elementos do desenho
institucional possuem os componentes importantes para a efetividade dos processos
participativos, propiciando a paulatina consolidação de empoderamento na sociedade.
2.1. ESTADO E SOCIEDADE CIVIL: CONFLITOS E PARTILHA DE PROJETOS
POLÍTICOS.
A literatura sobre os conselhos municipais de política no Brasil tem pontuado
alguns elementos nas relações entre Estado e sociedade civil que se mostram recorrentes no
debate sobre os processos de democratização. A resistência por parte do Estado em
compartilhar o poder decisório, a transformação do poder deliberativo dos conselhos em
função consultiva, a falta de recursos (estrutura física e materiais), o despreparo da burocracia
estatal e a presença de institucionalidades paralelas são alguns dos elementos que Dagnino
(2000) aponta como limites à atuação dos conselhos. Do mesmo modo, Pessanha, Campagnac
e Matos (2006), apontam como entrave a capacidade do Estado de esvaziar os conselhos. Os
meios comuns para tanto são: a tomada de atitudes dos governantes por fora dos conselhos e
também o fato de não cumprirem as decisões tomadas nestes espaços.
Para Dagnino, as relações que se estabelecem entre Estado e sociedade são sempre
tensas e permeadas pelo conflito, mesmo que variando a natureza e os graus dos conflitos. Em
suas conclusões a autora (2000, p.80) apresenta que “essa tensão deve-se à maior ou menor
aproximação, similaridade, coincidência, entre os diferentes projetos políticos que subjazem
às relações entre Estado e sociedade. [...] o conflito e a tensão serão maiores ou menores
dependendo do quanto compartilham [...] as partes envolvidas.”
39
A autora contesta as interpretações que baseiam a distinção entre Estado e
sociedade em determinações estruturais e reduzem a relação de oposição a premissa que
considera a sociedade civil como „pólo de virtude‟ e o Estado como „encarnação do mal‟
(DAGNINO, 2000). Para além desse maniqueísmo, a autora procura evidenciar a
complexidade de tendências e sentidos que permeiam as relações na esfera política.
Segundo Dagnino, a noção de projeto político pode servir de variável explicativa
para melhor interpretar as relações entre Estado e sociedade civil. Em suas palavras:
Os conflitos que permeiam essas relações não podem, portanto, ser simplesmente
reduzidas a diferenças nas respectivas „lógicas de atuação‟, derivadas de
características estruturais distintas, do Estado e da sociedade civil. O que não
significa dizer que a clivagem estrutural entre Estado e sociedade civil não é
suficiente para entender as suas relações e deve ser combinada com outras clivagens
que não necessariamente coincidem com ela, mas a atravessam (DAGNINO, 2000,
p. 281).
O foco mais acentuado dos conflitos remete à partilha efetiva de poder. De um
lado, a sociedade civil reivindicando participação efetiva nas tomadas de decisões. De outro, o
Executivo resistindo em compartilhar o seu poder exclusivo sobre as políticas públicas.
Dagnino (2000) descreve alguns desses mecanismos que bloqueiam a efetiva partilha de
poder nos espaços participativos (como os conselhos) e apresenta elementos que dificultam a
participação igualitária nos espaços públicos, em especial, a desqualificação técnica e política
dos representantes da sociedade civil. A autora afirma que em vista da novidade desses
espaços, novos desafios se impõem tanto ao Estado quanto para a sociedade civil, como por
exemplo, o reconhecimento dos diferentes interesses, a capacidade de negociação (sem perda
de autonomia), a construção do interesse público e a participação efetiva na formulação das
políticas públicas que venham a expressar esse interesse.
De volta à noção de projeto político, Dagnino apresenta três subtipos em que há
atuação conjunta entre Estado e sociedade civil: os projetos políticos compartilhados, as
complementaridades e as parcerias. Na idéia de compartilhamento de projetos políticos
participativos e democratizantes, seu argumento destaca a existência de indivíduos em
“posições-chave” no interior do aparato estatal que podem se comprometer individualmente
com projetos participativos ou então serem hostis à participação, inviabilizando o
funcionamento dos espaços participativos.
No primeiro caso é possível pensar em um compartilhamento individual de projetos,
a despeito das eventuais concepções dominantes no Estado, já que a burocracia
estatal de carreira não está necessariamente subordinada a essas concepções. No
40
segundo caso, típico dos espaços públicos de constituição obrigatória, como os
Conselhos Gestores, trata-se do confronto entre projetos distintos, em situações onde
a correlação de forças não reproduz aquela que a criação destes espaços na
Constituição de 1988 (...). A definição ampla de projeto político que estamos
utilizando aqui definitivamente inclui as visões elitistas da política (e da democracia)
que permeiam nosso universo cultural, bem como a crença do predomínio de uma
razão tecnocrática que, em última instância, é antitética em relação à expansão dos
espaços públicos e à participação da sociedade civil. (DAGNINO, 2000, p. 288).
O segundo subtipo é o do compartilhamento de um projeto político, por
complementaridade ou instrumental. Este é marcado pela confluência “perversa” entre o
projeto participatório dos anos 1980 e o projeto de Estado mínimo, enfaticamente
descentralizador. Segundo a autora, a perversidade decorre da condição de que “ambos os
projetos requerem uma sociedade civil ativa e propositiva”. Tal questão centraliza o debate
que visa avaliar as experiências de atuação conjunta entre movimentos sociais, lideranças
comunitárias e do Estado (DAGNINO, 2000).
O terceiro subtipo é o compartilhamento de projetos políticos através de parcerias.
Relaciona-se a áreas específicas em que o Estado não possui qualificação suficiente para lidar
com os desafios setoriais em questão (AIDS, movimento feminista, movimento negro, etc.).
Nesta proposição, o compartilhamento de projeto político possui caráter instrumental por
parte do poder estatal.
A tipologia proposta por Dagnino parece ser de grande valia para o objetivo desta
dissertação, isto é, de investigar a ação do Estado, particularizado na instância municipal,
diante das modificações implementadas em seu monopólio sobre os meios de administração
pelos novos arranjos administrativos, identificando o tipo de relação estabelecida entre as
dinâmicas das duas instâncias (Estado e sociedade) no que tange à partilha de poder, assim
como de caracterizar e propor uma compreensão das variáveis que interferem nessa relação. A
fonte através da qual, nos capítulos adiante, se auscultará o Estado sobre o tema em questão é
composta pelos conselheiros representantes do governo e da sociedade nos conselhos de
políticas da saúde de Goiânia e Aparecida de Goiânia.
A noção de projeto político e seus subtipos, mas especialmente de “indivíduos em
posições-chave” dentro dos conselhos, pode contribuir para a compreensão das relações
estabelecidas entre Estado e sociedade nessas instâncias. Parte-se da premissa de que o
Estado, na figura do gestor municipal, pode vir a desempenhar um papel preponderante na
efetividade dos conselhos, isto é, ele é um “indivíduo em posição-chave”. Assim, o
comprometimento político desse indivíduo com a democratização da gestão pública se traduz
em ações com potencial para afetar a efetividade das decisões e, no limite, condicionar a
41
natureza democratizadora dos conselhos. O comprometimento político com uma causa ou
crença que motiva suas ações em prol desta causa é o que se considera como “vontade
política” do gestor, isto é as motivações de ordem valorativa que condicionam sua ação.
Sugere-se que a vontade política do governante se relaciona com seu
posicionamento político-ideológico. Essa variável tem sido mencionada por pesquisadores
dos conselhos de diferentes linhas, entre eles Avritzer (2008).
Os três arranjos participativos de maior capilaridade no cenário posterior a 1988, o
Orçamento Participativo, os Planos Diretores e os Conselhos de Política, podem ser
diferenciados conforme três variáveis: iniciativa de proposição do desenho, organização da
sociedade civil na área em questão e vontade política do governo em implementar a
participação (AVRITZER, 2008).
As instituições participativas variam em sua capacidade de democratizar o
governo e, dentre as variáveis acima, o contexto de organização da sociedade civil e a
presença de atores no apoio aos processos participativos (AVRITZER, 2008).
Para demonstrar o peso da variável „contexto de organização da sociedade civil‟,
no sentido de promover a efetividade deliberativa dos conselhos, o autor analisa os casos dos
conselhos de saúde de Belo Horizonte, Porto Alegre, São Paulo e Salvador.
Avritzer (2008) afirma que os conselhos de Belo Horizonte e de Porto Alegre são
exemplos de êxito ou de efetividade deliberativa. O conselho de saúde de Belo Horizonte é
um dos mais antigos do país, assim como o movimento de saúde da cidade. Ele destaca a
eleição de um representante da sociedade civil para a presidência do conselho como o
episódio mais importante envolvendo o conselho de saúde. No conselho de saúde de Porto
Alegre, Avritzer (2008) assinala a singularidade de não se considerar os prestadores de
serviços como parte da sociedade civil. Em síntese, esses dois casos repetem o êxito do
orçamento participativo em duas cidades que possuem sociedades civis fortes.
Mas, o que de fato interessa ao autor são as experiências nos conselhos de saúde
de São Paulo e de Salvador, em razão de, diferentemente das duas anteriores, ambas lidarem
com a oposição da sociedade política e com sociedade civil fraca.
No primeiro mandato do conselho de saúde de São Paulo, em junho de 1989
durante o governo de Luiza Erundina, pelo PT, não se verificaram conflitos fundamentais
entre os representantes do Estado e da sociedade civil. Já nos mandatos subsequentes, os
conflitos se manifestaram principalmente em duas situações de tensão política: na tentativa de
privatização do sistema municipal de saúde e nas investidas por parte da administração
42
municipal na composição da representação da sociedade civil no conselho (AVRITZER,
2008). O autor explica que:
nos casos em que as organizações da sociedade civil são fortes, é possível, através
da sanção estabelecida pela lei e pela formas de organização dos movimentos
populares em questão, resistir a uma tentativa do governo de retirar poder da
instância participativa. Dessa forma, os desenhos de partilha se diferenciam dos
desenhos de participação “de baixo para cima” (orçamento participativo) devido a
sua maior independência do sistema político. ”(AVRITZER, 2008, p.55).
No caso do conselho de saúde de Salvador, as particularidades se dão em sua
composição. A representação da sociedade civil no conselho é constituída pela Arquidiocese
de Salvador, pela Associação Comercial e algumas associações ligadas a questões raciais. O
pesquisador afirma que essa composição afeta a expressão da sociedade civil no conselho,
bem como sua capacidade deliberativa.
Em uma pesquisa comparativa sobre a capacidade deliberativa dos conselhos de
saúde, o conselho de Salvador se destacou como tendo como principal deliberação o
envio de documentos ao governo. Pode-se, então, dizer que este é um caso
diferenciado no qual a fraqueza da sociedade civil e a hostilidade do sistema político
leva a um conselho inefetivo. O que diferencia o caso de Salvador do caso de São
Paulo é a fraqueza da sociedade civil, já que, no que diz respeito à hostilidade da
sociedade política [...]. (AVRITZER, 2008, p.55).
De tal modo, considera-se que a variável proposta para articular o argumento
desta dissertação, a orientação político-ideológica do gestor público, pode nortear a vontade
política do governante e conduzir a ações favoráveis ao sucesso das práticas participativas, em
especial, no caso, dos conselhos municipais.
2.2 A AÇÃO DO ESTADO NO CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE CURITIBA
Os conselhos municipais de saúde são responsáveis por grande parte da produção
de pesquisas sobre os conselhos de políticas. As razões de seu atrativo nos meios acadêmicos
são sumarizadas por Avritzer12
: são os conselhos que desfrutam de obrigatoriedade de repasse
de recursos; são considerados pela literatura o setor mais participativo; têm presença na
legislação nacional nas três instâncias; possuem competência deliberativa; apresentam
participação regular e contínua; são os mais disseminados e os mais consolidados.
12
No estudo Sociedade Civil e Participação Social no Brasil. Disponível online:
http://www.democraciaparticipativa.org/files/AvritzerSociedadeCivilParticipacaoBrasil.pdf
43
Em vista do grande número de estudos disponíveis, destacamos uma reflexão de
grande visibilidade no debate sobre os processos participativos. Buscamos identificar as
relações entre Estado e sociedade e, se possível, caracterizar esse Estado a partir da
abordagem adotada por Fuks (2004) que privilegia as dinâmicas deliberativas no interior do
Conselho Municipal de Saúde de Curitiba.
O estudo foca o comportamento político dos diversos setores no processo
decisório, no que diz respeito à concentração e dispersão da participação e da influência
política. Para tanto, explora os potenciais explicativos e os limites de modelos que associam a
posse de recursos à influência política.
Fuks (2004, p.48) avalia a influência política por meio de um critério quantitativo,
isto é, o peso da participação dos atores nos debates e decisões tomadas pelo Conselho.
Advoga que: “o conceito de „influência política‟ associado a esse critério é limitado, mas
entendemos que, em alguma medida, a influência vem acompanhada de participação política e
que essa pode ser examinada a partir de um repertório de ações, tais como o „uso da palavra‟ e
o „encaminhamento de propostas‟ para a deliberação.”
O autor analisou as cinco gestões do Conselho Municipal de Saúde de Curitiba –
CMSC -, procurando identificar nas atas os modos de distribuição da participação nas
reuniões com base em três momentos do processo decisório: iniciar e dar continuidade ao
debate, encaminhar proposta para deliberação e aprovar ou não a proposta.
A primeira constatação foi a expressiva participação dos agentes externos nas
reuniões do CMSC. As falas dos assessores técnicos superaram as intervenções iniciais dos
atores representantes da sociedade civil. Fuks afirma que:
no que diz respeito ao “ator externo”, a participação de atores estatais que atuam no
CMSC como “apoio técnico”, apresentando programas governamentais, oferecendo
esclarecimentos, transmitindo informações do governo e emitindo pareceres a
respeito de assuntos de sua competência (como, por exemplo, a prestação de contas
do Fundo Municipal de Saúde). (FUKS, 2004, p.49).
Embora minoria, os atores governamentais controlam as iniciativas de debate. Isso
se deve ao papel central que o conselheiro indicado pelo gestor ocupa, de presidente do
CMSC, e também pelo peso conferido ao conhecimento técnico na dinâmica do conselho.
Desse modo, a informação constitui um importante recurso de poder, tendencialmente
monopolizado por conselheiros de um segmento – o Estado – e, em consequência, negado aos
de outros setores que compõem o conselho.
44
Sobre a efetiva intervenção nos debates, destaca-se a presença do usuário como o
maior responsável pelas intervenções realizadas em contraposição à passividade dos
prestadores de serviço, que possui a menor participação no CMSC, inferior até ao segmento
“visitante”. A lógica da participação no CMSC segue o seguinte padrão: os atores estatais dão
início ao debate, seguidos pelas intervenções dos usuários e, em menor proporção, pelas
intervenções dos trabalhadores.
Sendo o usuário o segmento da sociedade civil que mais participa do debate e que
mais gera a controvérsia pública, podemos sugerir a presença da seguinte dinâmica
na reunião do conselho: 1) fazendo uso de recursos cognitivos e das prerrogativas
dos cargos que ocupam, os atores estatais lideram as discussões no CMSC,
apresentando os assuntos da pauta, esclarecendo questões de ordem técnica,
divulgando informações governamentais – enfim, introduzindo o debate; 2) os
usuários apresentam-se como interlocutores e, em certas circunstâncias, contrapõem
(secundados pelos trabalhadores) argumentos aos dos gestores. Portanto, o usuário e
o gestor são ativos não apenas no sentido de participarem do debate, mas também
porque são os que mais conferem a esse debate a qualidade de confrontação de
idéias. (FUKS, 2004, p. 51).
Para Fuks, isso indica a liderança do segmento gestor no processo decisório no
CMSC, embora também revele que o segmento dos usuários é o segmento da sociedade civil
mais ativo, ao contrário do segmento dos prestadores de serviço.
O conjunto dos dados analisado permite-nos concluir que: 1) o gestor tem sido ao
longo da primeira década de existência do CMSC, o segmento com maior volume de
ação no CMSC; 2) embora não atue como membro do Conselho (portanto, sem
direto a voto) o quadro técnico do governo tem reforçado a predominância dos
atores estatais no CMSC; 3) entre os conselheiros da sociedade civil, o usuário tem-
se destacado como segmento mais atuante, tanto no debate como no
encaminhamento de propostas para deliberação, sendo o principal responsável pelo
estabelecendo uma relação de equilíbrio entre os segmentos da sociedade civil e os
setores do Conselho que atuam em nome da administração pública e 4) a presença
do prestador de serviço no Conselho é, praticamente, invisível. (FUKS, 2004, p.51).
Esse cenário revela que o nível de conflito político no CMSC tende a ser estável
ou equilibrado. No entanto, o autor afirma não ser possível realizar uma avaliação conclusiva
no que diz respeito à influência de cada segmento no CMSC, visto que todas as propostas
encaminhadas foram aprovadas. Tal fato pode indicar que os temas debatidos não são de
natureza conflituosa. De qualquer modo, Fuks argumenta que uma explicação baseada
exclusivamente em dados fornecidos pela dinâmica das reuniões é limitada para se entender
os modos pelos quais a influência política é exercida.
Para o autor, a participação assume a forma de interação política, envolta em uma
série de interesses e ações dos diversos atores. A influência, ou a eficácia da ação de cada ator
45
está, de certo modo, relacionada aos recursos que ele dispõe. Os recursos avaliados pela
pesquisa foram os recursos individuais (perfil socioeconômico e educacional dos
conselheiros) e os recursos coletivos (financeiros, materiais e humanos das entidades
representadas no CMSC).
Fuks (2004) considera que no CMSC não existe monopólio de qualquer um dos
recursos acima citados, mas sim, desigualdades dispersas na distribuição desses recursos. Em
relação aos recursos individuais, os usuários estão em desvantagem quanto à renda
eescolaridade. Também em termos de recursos coletivos as entidades representadas pelos
usuários estão em desvantagem quanto ao orçamento, funcionários e estrutura.
O autor afirma ainda que os dados apresentam uma clara hierarquia entre os
segmentos quanto a posse de recursos. No topo está o segmento dos gestores, seguido pelo da
sociedade civil, pelos prestadores e pelos usuários. Independente dos critérios adotados para
definir o peso relativo da posse de recursos, Fuks (2004) aponta para os limites de uma
explicação da influência política fundada exclusivamente na posse de recursos. A mesma
condição que faz esse indicador útil para entender a participação dos gestores e dos
trabalhadores torna-o inócuo diante da participação e o ativismo dos usuários e a “apatia” dos
prestadores de serviço.
As análises fundadas em recursos convencionais não consideram outras
dimensões relevantes para a ação política. Já na perspectiva de Fuks, a propensão dos
conselheiros para o engajamento político (interesse cognitivo e emocional), o engajamento
eleitoral, associativismo e filiação partidária, a rede de apoio político e a ação junto às
instituições estatais, são dimensões que permitem ampliar a compreensão da influência
política dentro do CMSC. Sendo assim:
Esse conjunto de condições, incluindo tanto aquelas de ordem individual e de caráter
subjetivo como as que se referem às organizações e assumem uma qualidade
objetiva, permite-nos elaborar uma compreensão mais abrangente do conceito de
“recurso”, tendo em vista os limites de uma explicação fundamentada,
exclusivamente, na posse de recursos convencionais. Assim, a militância partidária,
que se reflete no engajamento eleitoral, indica que a motivação para ação política
pode estar compensando a fragilidade dos usuários em relação a outros recursos (p.
ex.: organizacionais, cognitivos, de renda e de escolaridade). O apoio recebido por
organizações da sociedade civil (partidos políticos, instituições religiosas,
universidades) e a prática associativa (especialmente a de bairro) também parecem
compensar, em parte, a menor freqüência com que ele atua junto às instituições
políticas. (FUKS, 2004, p. 57).
Munido desses elementos o autor explica porque o amplo estoque de recursos
convencionais dos prestadores de serviço não se reverte em ação política no CMSC. O
46
principal motivo é a falta de interesse dos prestadores em participar ativamente no processo
decisório, já que estes não o consideram um espaço público privilegiado de ação política, ao
contrário dos segmentos dos usuários e dos gestores. Os prestadores de serviço não
consideram o CMSC uma arena de ação política relevante, já que os assuntos deliberados,
frequentemente, não lhe despertam interesse. Desse modo, a ausência de motivação impede a
conversão de recursos em influência política.
Finalizando, o autor argumenta que a distribuição da influência política no CMSC
é dispersa. Prevalece uma dinâmica de equilíbrio político embora haja maior predomínio da
influência dos gestores no processo decisório, tal influência é compensada pela ação política
dos usuários.
Consideramos que o estudo de Fuks avança ao evidenciar os limites das
explicações fundadas exclusivamente na posse de recursos convencionais, mas principalmente
por trazer outros elementos de ordem subjetiva e objetiva para a análise. A disposição para a
participação, o associativismo e o apoio político da rede em ações reiteradas junto às
instituições políticas estatais são elementos que permitem ampliar o estudo sobre os processos
de interação e de influência política no âmbito dos conselhos.
No entanto, sua análise apresenta lacunas quanto à caracterização do segmento
gestor. Mesmo que nela fique evidente o papel preponderante desse segmento sobre os demais
no que tange ao processo decisório, não é possível qualificá-lo. Seu estudo não possibilita
responder questões como: o que os gestores ou representantes do governo, resistentes à
partilha de poder no âmbito dos conselhos, possuem em comum? Que variáveis interferem na
vontade política dos governantes no que toca a partilha de poder? Isso nos leva a reiterar a
relevância de reforçar os estudos sobre as relações de interação entre Estado e sociedade no
interior dos conselhos.
47
TERCEIRO CAPÍTULO
__________________________________________________
3. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS
Este estudo orienta-se pela abordagem qualitativa dos processos sociais. Ao
utilizar como fontes privilegiadas de investigação as expressões e respostas dos agentes
políticos, discorrendo sobre sua própria ação e sobre o contexto de produção dessa ação, com
o objetivo de designar o sentido da ação política do Estado desenvolvida numa realidade de
mudança institucional que por definição é plural e compartilhada, como o são os conselhos
gestores, a pesquisa vê-se remetida a um campo de existência social constituído de
significados subjetivos do qual tradicionalmente se ocupam os métodos e técnicas das
ciências sociais compreensivas. Minayo (2002, p. 21-22) define essa tradição, fundada em
Weber e que atualmente encorpa diferentes tendências interpretativas, ilustradas entre outras
pelas elaborações de Moscovici (“representações sociais”) e de Bourdieu (“estruturação”),
destacando nela o propósito de capturar “o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos
processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.”
Procurou-se compreender a ação do Estado, particularizado nas gestões dos
municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia, diante das modificações implementadas em
seu monopólio sobre os meios de administração através dos arranjos participativos, neste caso
os conselhos municipais de saúde, identificando o tipo de relação estabelecida entre as
dinâmicas das duas instâncias no que tange à partilha de poder, assim como caracterizar e
propor uma compreensão das variáveis que interferem nessa relação.
A opção pelos conselhos de saúde se deu em vista de que: 1) esses conselhos estão
entre os de maior capilaridade ou institucionalização nos mais de 5.500 municípios
brasileiros; 2) demonstram comprovada efetividade de atuação no universo conselhista; 3) são
também os conselhos de saúde as instâncias enfocadas em significativo volume de pesquisas e
reflexões a respeito, disponibilizadas em áreas do conhecimento de cunho disciplinar e
também interdisciplinar que conjugam avanços políticos e teóricos sobre democracia
participativa a partir de metodologias das ciências sociais em ligação com outras áreas como
48
pode ser observado em especial nas interfaces com estudos de saúde pública, administração,
psicologia e recursos humanos, políticas públicas, etc.
A escolha dos municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia se deu em virtude
de serem estes os maiores municípios da Região Metropolitana de Goiânia – RMG - e onde os
Conselhos de Saúde desenvolvem atuação mais regular e contínua do que em outros
municípios. Além disso, apresentam características de funcionamento preliminarmente
similares às diagnosticadas na literatura para pensar a função democratizadora e os problemas
verificados nos conselhos de saúde no Brasil, durante os primeiros vinte anos, desde sua
introdução no cenário das políticas públicas do país pela Carta de 1988. Por último, pesou na
demarcação do objeto a facilidade de acesso aos conselheiros, viabilizando os meios de
pesquisa a menores custos.
Para tanto, adotou-se a perspectiva teórico-metodológica da sociologia
compreensiva de Max Weber, no intuito de entender os processos participativos como ação
social, tratando-os em seu percurso e seus efeitos. Cientes da complexidade da realidade a
qual buscamos analisar a partir de um determinado ponto de vista, isto é, o da
democratização.
Conforme Weber, a sociologia é a ciência cuja finalidade é compreender
interpretativamente a ação social desvendando suas causas, seu curso e seus efeitos. Para o
autor (2002, p.11): “ação designará toda conduta humana cujos sujeitos vinculem a esta um
sentido subjetivo. [...] O termo „ação social‟ será reservado à ação cuja intenção fomentada
pelos indivíduos envolvidos se refere à conduta de outros, orientando-se de acordo com ela.”
Como se pode notar, a abordagem compreensiva de Weber tem como unidade
interpretativa a ação social do indivíduo, entendido como portador de conduta significativa.
Busca-se compreender a ação através do sentido subjetivo que o sujeito lhe atribui. Assim,
nem toda ação é alvo de compreensão sociológica, mas apenas as que estão orientadas por um
sentido subjetivo.
De acordo com Weber (2002), o sentido de uma ação também pode significar a
compreensão explicativa. Compreensão explicativa é o que se compreende pelos motivos, o
sentido que o sujeito tinha em mente ao agir de certo modo naquele momento e naquela
situação. “Explicação” é a apreensão da conexão de sentido a que pertence uma ação
compreensível de maneira atual segundo seu sentido subjetivamente visado.
Embora Weber não defina claramente o que entende por “sentido” e por
“compreensão”, ele apresenta o conceito de “motivo”, que permite esclarecer a relação entre
esses dois conceitos. Para Weber (2002, p.8): “Denominamos „motivo‟ uma conexão de
49
sentido que para o próprio agente ou para o observador constitui a „razão‟ de um
comportamento quanto ao seu sentido.”
De tal modo, o „motivo‟ é o alicerce da ação, isto é, a causa da ação. O motivo
aponta para o fim almejado pelo agente. Assim, ao procurar compreender a ação do Estado
em relação aos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia,
procura-se reconstruir o motivo dessa ação e, deste modo, identificar o seu fim.
O método compreensivo admite captar o sentido subjetivo das ações do Estado,
possibilitando duas alternativas de consideração interpretativa das ações, as de sentido de fato
e as do sentido construído como tipo ideal (Weber, 2000).
A literatura sobre os conselhos classifica-os a partir da sua “existência efetiva”, da
regularidade de funcionamento e da capacidade de fazer valer suas decisões (poder de
sanção), formando condições que possibilitaram à pesquisa caracterizar o “sentido de fato”
dos Conselhos Municipais de Saúde dos Municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia.
Quanto ao “sentido como tipo ideal”, os critérios estabelecidos de classificação da
relação do Estado com os Conselhos de Saúde nos dois municípios, no sentido de
democratização da gestão pública de saúde foram: a) o Conselho possuir verba própria para
sua atuação; b) o Conselho manter relações com o secretário de Saúde ou com o prefeito; c) a
presença do secretário municipal de saúde ou do prefeito nas reuniões e eventos do Conselho;
d) o fácil acesso às informações da secretaria municipal de saúde; e) a elaboração conjunta
dos projetos de saúde do município; f) e o Conselho possuir boa estrutura física e de pessoal
administrativo próprio para desempenhar suas funções.
Adotou-se como uma das técnicas de investigação dos conteúdos e dinâmicas de
funcionamento dos dois conselhos a análise documental das atas das reuniões, resoluções e
dos regimentos internos dessas entidades. O objetivo foi, além de verificar as regularidades
das reuniões, a realização de conferências temáticas e os temas que estiveram em maior
evidência, principalmente de construir referências para caracterizar a atuação política dos
conselheiros representantes do Estado nesta nova esfera de institucionalidade da democracia
brasileira.
A observação passiva13
foi outra técnica utilizada no acompanhamento da
estrutura de funcionamento dos dois Conselhos bem como na percepção das condições e
processos de tomada de decisões nas reuniões plenárias e de diretorias.
13
Na qual o pesquisador não interfere na realidade observada.
50
Por fim, com o objetivo de captar o sentido que os conselheiros municipais de
saúde conferem à sua ação, empregou-se nos contatos mantidos a técnica de entrevista semi-
estruturada, isto é, o estímulo de depoimentos que se orienta por um roteiro de temas
previamente elaborados, sobre os quais os informantes possuem liberdade para se expressar.
3.1. A REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA
Além de ser capital do Estado de Goiás, Goiânia constitui, desde o final dos anos
1990, com outros onze municípios a Região Metropolitana de Goiânia, da qual é o município-
pólo. A principal finalidade da Região Metropolitana de Goiânia é “integrar a organização, o
planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum dos municípios” que a
compõem.
A Região Metropolitana de Goiânia (RMG) foi criada pela Lei Complementar nº.
27, de 30 de dezembro de 1999, juntamente com a criação da Região de Desenvolvimento
Integrado de Goiânia (RDIG) que inclui mais sete municípios do aglomerado urbano da
capital. Compõem a Região Metropolitana de Goiânia: Goiânia, Trindade, Goianira, Santo
Antônio de Goiás, Nerópolis, Goianápolis, Senador Canedo, Aparecida de Goiânia,
Hidrolândia, Aragoiânia e Abadia de Goiás. Já a Região de Desenvolvimento Integrado de
Goiânia conta ainda com os municípios de Bela Vista, Bonfinópolis, Brazabrantes, Caturaí,
Inhumas, Nova Veneza e Terezópolis de Goiás. Poucos anos depois, os municípios de
Caldazinha e Guapó, localizados também no colar metropolitano14
passam a integrar
oficialmente a RMG, estendendo-a para vinte municípios.
Conforme dados da Prefeitura de Goiânia15
a RMG é a mais expressiva região do
Estado de Goiás, visto que: contém a capital do Estado, seus municípios abrigam 35% da
população um terço dos eleitores, 80% dos estudantes universitários e aproximadamente 60%
do Produto Interno Bruto - PIB- estadual.
De acordo com pesquisa realizada pelo Observatório das Metrópoles intitulada
“Como anda Goiânia”, a taxa média de crescimento anual da população metropolitana
manteve-se estável em 3,2% desde o Censo de 1991. A maioria dos municípios da RMG
apresentou taxas de crescimento superiores à do município de Goiânia. Os autores do volume
14
A noção de “colar metropolitano” é utilizada por alguns estudiosos para suprir lacunas e imprecisões das leis
que criam regiões metropolitanas no Brasil. Ver GARSON, Sol (2010); Secretaria de Estado de Gestão e
Planejamento - SEGPLAN-GO. 15
http://www.goiania.go.gov.br/html/principal/goiania/regiaometropolitana/regiaometropolitana.shtml
51
inferem que a população metropolitana cresce em função das ofertas de serviços e
possibilidades de trabalhos oferecidas pela capital do Estado; que a maioria dos novos
contingentes populacionais vai localizar-se nos municípios do entorno da capital; e que a
manutenção da taxa de crescimento populacional, durante a década de 1990, atesta a
existência de uma grande mobilidade interna de pessoas de um município para o outro
(MOYSÉS, 2009).
Conforme este estudo, o contingente populacional da RMG sobrevive com dois
salários mínimos, em média, expressando um débil mercado interno. Em vista da polarização
exercida pela capital, a consequência mais imediata é que muitos dos problemas sociais de
Goiânia são gerados nos municípios vizinhos. Acerca disto, Moysés (2009, p. 81) aponta que
este fato “exige dos gestores urbanos desse imenso espaço territorial, ações conjuntas na
perspectiva de se alcançar resultados positivos com as políticas públicas de inclusão social.”
Segundo o estudo, os motivos do deslocamento, para trabalhar ou estudar, são
mais intensos nos municípios que apresentam alto nível de integração com a dinâmica da
região. Aparecida de Goiânia, por exemplo, é um dos municípios que apresenta alta taxa de
integração com o pólo metropolitano. Além dos deslocamentos em razão de trabalho e estudo,
há também os deslocamentos em função de outras necessidades, como busca de serviços de
saúde e assistência social.
3.2. A OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GOIÂNIA E APARECIDA DE
GOIÂNIA
O debate acerca da saúde pública mostra-se presente na cena política de Goiânia
desde sua fundação, na década de 1930, para sediar a nova capital do Estado de Goiás. A
mudança de antiga capital Vila Boa para Goiânia ocorreu num intenso clima de disputas
políticas. A construção da nova capital esteve inserida no movimento de interiorização do
desenvolvimento do Brasil proposto por Getúlio Vargas, a chamada “Marcha para o Oeste”.
Um dos argumentos que justificavam essa mudança era de ordem higiênico-sanitarista,
inscrevendo a questão da saúde pública como um elemento norteador do governo de Pedro
Ludovico Teixeira.16
.
16
No artigo “Mudança da capital: uma estratégia de poder” de Itami Campos há interessante discussão acerca
das relações entre o saber médico e a manutenção do poder político.
http://www.itamicampos.com/artigos/Goiania/MUDANCADACAPITAL.pdf. Acesso em 14/10/2010.
52
A cidade de Goiânia é uma das poucas capitais brasileiras de origem planejada.
Armando Godoy planejou a cidade para 50 mil habitantes. O restante da população habitaria
em „cidades satélites‟, ou nos centros suburbanos afastados do núcleo urbano. Na década de
1960, a cidade já havia superado em três vezes essa previsão, e contava com 153.505 mil
habitantes.
Embora urbanisticamente planejada, a cidade de Goiânia não dispunha, até o ano
de 1937, de nenhum aparelhamento de saúde pública. No Estado de Goiás havia apenas duas
instituições voltadas para o atendimento médico aos doentes, o Hospital São Pedro de
Alcântara, na antiga capital e criado em 1825, e o Hospital Evangélico de Anápolis, criado
pela iniciativa privada na década de 1920 (FAVARO, 2009).
Diante da insuficiência de recursos financeiros destinados ao setor de saúde
pública a primeira dama, Gercina Borges Teixeira, organizou campanhas de arrecadação de
recursos para a construção da Santa Casa de Misericórdia em Goiânia. Essa ação deu origem à
expansão da rede hospitalar filantrópica que assegurou o atendimento das demandas por
assistência médica no processo de construção de Goiânia, mediante subsídios públicos e a
contribuição de voluntários. A criação do pronto-socorro (1936), anexo às instalações da
futura Santa Casa (1937), sob responsabilidade dos irmãos vicentinos, a criação da Sociedade
Goiana de Assistência aos Lázaros e Defesa contra a Lepra, que originou a Colônia Santa
Marta, bem como o Preventório Afrânio Azevedo (destinado ao acolhimento dos filhos dos
portadores de lepra) e a criação em 1941 do Posto de Puericultura Santo Antônio, pela
Associação de Proteção à Maternidade e à Infância, são exemplos de ações empreendidas por
entidades privadas de caráter filantrópico em prol da saúde pública na nova Capital de Goiás,
o que lhes conferiu naquele momento grande importância social uma vez que o Estado se
eximiu de suas responsabilidades neste setor (FAVARO, 2009).
Ainda no sentido de compor o cenário da rede hospitalar e de assistência à saúde
nas primeiras décadas de Goiânia, vale registrar a criação do Hospital Adauto Botelho (1950),
destinado ao atendimento psiquiátrico/neurológico; do Hospital Pênfigo; do Sanatório
Juscelino Kubitschek, para o atendimento aos tuberculosos; do Hospital Geral de Goiânia
(1962); do Hospital da família Rassi (Casa de Saúde Dr. Rassi); do Hospital Geral do
INAMPS; e do Centro Materno Infantil entre os anos de 1966 a 1971 (FAVARO, 2009). O
estudo de Favaro não inclui em sua lista a criação de dois grandes hospitais de referência no
Estado de Goiás, o Hospital das Clínicas da UFG, criado em 1984, e o Hospital de Urgências
de Goiânia, criado em 1987.
53
Não é nosso propósito descrever minuciosamente as ações empreendidas em
Goiânia no setor de saúde pública, mas apenas pontuar suas origens bem como os atores
sociais que estiveram à frente dessa questão. Como se pode notar, as demandas da saúde
pública em Goiânia, desde sua procedência, estiveram relegadas ao setor privado e à
filantropia subsidiada pelo poder público. Somente nos casos em que a iniciativa privada não
se interessava é que o Estado intervinha, como no caso do Hospital Materno Infantil. Importa-
nos aqui contextualizar em linhas gerais a ação do Estado em relação à saúde pública.
3.2.1. A oferta de serviços de saúde em Goiânia
Atualmente, a partir da primeira década do século XXI, Goiânia constitui um
importante centro de referência médico-hospitalar do Estado de Goiás e do Brasil. O grande
número de estabelecimentos de saúde, públicos e privados, assim como de equipamentos para
exames de maior complexidade e o quadro de profissionais especializados e de referência em
determinadas cirurgias, como as de separação de gêmeos siameses, fazem com que Goiânia
amplie o escopo de atendimento médico para além de seus habitantes, atendendo também
moradores das cidades vizinhas e de outros estados do país. A Tabela 1 mostra a estrutura da
rede de serviços de saúde em Goiânia, no ano de 2005.
QUADRO 2: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GOIÂNIA – 2005.
Estabelecimentos e equipamentos de Saúde Quantidade
Estabelecimento de Saúde Total 604
Estabelecimento de Saúde Público Total 107
Estabelecimento de Saúde Público Federal 06
Estabelecimento de Saúde Público Estadual 16
Estabelecimento de Saúde Público Municipal 85
Estabelecimento de Saúde Privada Total 497
Estabelecimento de Saúde Privado com fins lucrativos 481
Estabelecimento de Saúde Privado sem fins lucrativos 16
Estabelecimento de Saúde Privado SUS 197
Estabelecimento de Saúde com internação total 92
Estabelecimento de Saúde sem internação total 291
Estabelecimento de Saúde com apoio à diagnose e terapia total 221
Estabelecimento de Saúde com internação pública 12
Estabelecimento de Saúde sem internação pública 91
Estabelecimento de Saúde com apoio à diagnose e terapia público 04
Estabelecimento de Saúde com internação privado 80
Estabelecimento de Saúde sem internação privado 200
Estabelecimento de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado 217
54
Estabelecimentos de Saúde total privado/SUS 197
Estabelecimentos de Saúde com internação privado/SUS 46
Estabelecimentos de Saúde sem internação privado/SUS 36
Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado/SUS 115
Estabelecimentos de Saúde especializados com internação total 25
Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação total 240
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação total 48
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação total 233
Estabelecimentos de Saúde geral com internação total 19
Estabelecimentos de Saúde geral sem internação total 39
Estabelecimentos de Saúde especializados com internação públicos 03
Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação públicos 11
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação públicas 07
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação pública 48
Estabelecimentos de Saúde geral com internação pública 02
Estabelecimentos de Saúde geral sem internação pública 36
Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privados 22
Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação privados 229
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privados 41
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privados 185
Estabelecimentos de Saúde geral com internação privados 17
Estabelecimentos de Saúde geral sem internação privados 03
Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privados/SUS 14
Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação privados/SUS 81
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privados/SUS 18
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privados/SUS 70
Estabelecimentos de Saúde geral com internação privados/SUS 14
Estabelecimentos de Saúde geral sem internação privados/SUS 00
Estabelecimentos de Saúde SUS 303
Estabelecimentos de Saúde planos próprios 27
Estabelecimentos de Saúde planos de terceiros 444
Estabelecimentos de Saúde próprios 490
Estabelecimentos de Saúde única total 553
Estabelecimentos de Saúde com terceirização total 51
Estabelecimentos de Saúde terceirizados total 70
Estabelecimentos de Saúde único público 106
Estabelecimentos de Saúde com terceirização pública 01
Estabelecimentos de Saúde terceirizado público 00
Estabelecimentos de Saúde únicos privado 447
Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado 50
Estabelecimentos de Saúde terceirizados privado 70
Estabelecimentos de Saúde únicos privado/SUS 175
Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado/SUS 22
Estabelecimentos de Saúde terceirizado privado/SUS 31
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde total 5.291
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público total 1.256
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público federal 304
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público estadual 895
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público municipal 57
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 4.035
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado SUS 3.136
Mamógrafo com comando simples 50
Mamógrafo com estéreo-taxia 17
Raio X para densitometria óssea 33
Tomógrafo 37
Ressonância magnética 11
Ultrassom doppler colorido 125
Eletrocardiógrafo 217
Eletroencefalógrafo 43
Equipamento de hemodiálise 234
55
Raio X até 100mA 61
Raio X de 100 a 500mA 108
Raio X mais de 500mA 55
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial total 380
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial sem atendimento
médico
40
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento
médico em especialidades básicas
223
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento
médico em outras especialidades
230
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento
odontológico com dentista
92
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência total 75
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Pediatria 25
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Obstetrícia 33
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Psiquiatria 05
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Clínica 38
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Cirurgia 25
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Traumato Ortopedia 20
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Neuro Cirurgia 11
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Cirurgia Buco
Maxilofacial
09
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Outros 18
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 152
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Internação 56
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Emergência 38
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS UTI/CTI 20
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Diálise 12
Fonte: IBGE, Assistência Médica Sanitária 2005; Malha municipal digital do Brasil: situação em 2005. Rio
de Janeiro: IBGE, 2006. NOTA: Atribui-se zeros aos valores dos municípios onde não há ocorrência da
variável ou onde, por arredondamento, os totais não atingem a unidade de medida.
Embora os dados acima apontem para a existência de uma bem equipada e
diversificada rede de assistência médico-hospitalar, abrangendo várias especialidades, no que
diz respeito à capacidade de atendimento do sistema público a oferta de serviços de saúde não
consegue atender as demandas da população, em especial da parcela carente. A falta de
médicos nas unidades de saúde, a demora no encaminhamento para as especialidades
médicas, a carência de remédios, a falta de manutenção dos equipamentos de exame, a
ausência de leitos, etc. são alguns dos muitos exemplos das deficiências do sistema público de
saúde em Goiânia, cotidianamente retratado pela imprensa local.
Em entrevista ao jornal Opção17
o presidente da Associação dos Hospitais,
Fernando Honorato, afirma que a saúde pública piorou na última década devido à baixa
remuneração dos médicos. A carência de investimento público na saúde se reflete na
precariedade das condições de trabalho nos hospitais públicos, exemplificada por ele, pela
existência de um único tomógrafo no Hospital de Urgências de Goiás que „vive‟ quebrado.
17
Matéria do dia 12/12/10 no Jornal Opção: “O problema é o desperdício.”
http://www.jornalopcao.com.br/posts/reportagens/maior-problema-e-o-desperdicio.
56
Honorato afirma ainda que no ano de 2009 Goiás perdeu 141 leitos em hospitais
credenciados. Isto porque as unidades estavam descontentes com a baixa remuneração paga
pelo SUS aos hospitais privados. Enquanto o setor privado (Unimed) paga 43 reais por
consulta, o SUS paga seis reais.
Se, por um lado, o sistema de saúde pública tem enfrentado problemas relativos às
condições de trabalho e às queixas das entidades de classe e dos especialistas da área médica
quanto à remuneração, de outro lado, está o controle e prevenção do aumento no número de
casos de doenças como a dengue, a hepatite, a tuberculose, a AIDS e a meningite.
A Pesquisa Nacional de Avaliação das Comissões Intergestores Bipartites - CIBs
- que avalia as condições de saúde da população registrou o surgimento dos seguintes casos de
doenças no município de Goiânia durante os anos de 2005 a 2007 conforme segue o quadro
abaixo.
QUADRO 3: CASOS DE DOENÇAS
REGISTRADAS ENTRE A POPULAÇÃO DE
GOIÂNIA ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.
Doenças No. de casos
AIDS 507
Dengue 21883
Febre Amarela 1
Hepatite 988
Malária 93
Meningite 423
Tuberculose 717 Fonte: Ministério da Saúde 2010. Pesquisa Nacional de Avaliação
das CIBS/Condições de Saúde da População.
Como se pode perceber, o número de casos de dengue registrados em Goiânia
entre 2005 e 2007 eram preocupantes. Durante os anos de 2009 e 2010 esses dados levaram o
Ministério da Saúde a considerar a disseminação da doença como “situação de alerta”, de
acordo com o índice de infestação predial.18
Esses dados ilustram a precariedade da saúde
pública no município de Goiânia e refletem os desafios postos ao Conselho Municipal de
Saúde.
3.2.2. As origens da cidade de Aparecida de Goiânia e a questão da saúde pública
A fundação de Aparecida de Goiânia data da década de 1920. Abraão Lourenço
de Carvalho, João Batista de Toledo, Antônio Barbosa Sandoval, Aristides Frutuoso e José
18
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=33541&janela=1
57
Cândido de Queiroz foram os pioneiros a chegarem a Campina, onde atualmente está
localizado o centro urbano de Aparecida de Goiânia.
A construção da cidade teve influência da ação dos padres redentoristas de
Campina e pelo sentimento religioso dos habitantes. Em 1922 foi celebrada a primeira missa
campal no terreno doado pelos fazendeiros para a construção da igreja matriz. Devido à
devoção a Nossa Senhora Aparecida o povoado recebeu o nome de Arraial de Aparecida em
1932.
No ano de 1958 o povoado de Aparecida passou a ser considerado Distrito de
Goiânia, através da Lei Municipal 1.295. Nesse mesmo ano passou a ser nomeado Aparecida
de Goiás e em seguida Goialândia, por estar localizada entre os municípios de Hidrolândia e
Goiânia. No entanto, no ano de 1963 o Distrito de Goialândia passa à condição de Município,
através da Lei Estadual 4.927, e recebe o nome de Aparecida de Goiânia, já que o nome
anterior não recebeu apoio da população. O Município de Aparecida de Goiânia é composto
pelo Distrito-sede e o Distrito da Vila Brasília.
Aparecida de Goiânia chega a 2010 com uma população de 455.73519
habitantes.
De acordo com dados da SEPIN (Superintendência de Estatísticas, Pesquisa e Informações
Socioeconômicas), órgão ligado a SEGPLAN (Secretaria de Estado, de Gestão e
Planejamento do Estado de Goiás), o município foi responsável pelo 3º maior PIB - Produto
Interno Bruto- do Estado de Goiás durante os anos de 2007 e 2008. No entanto, grande parte
de sua população se desloca diariamente para Goiânia para trabalhar, estudar e em busca de
outros serviços, como os de saúde, conforme dito acima. O Quadro 4 apresenta a estrutura da
rede de serviços de saúde situada no município de Aparecida de Goiânia.
QUADRO 4: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM APARECIDA DE GOIÂNIA
NO ANO DE 2005.
Estabelecimentos e equipamentos de Saúde Quantidade
Estabelecimentos de Saúde total 52
Estabelecimentos de Saúde públicos total 23
Estabelecimentos de Saúde público municipal 23
Estabelecimentos de Saúde privado total 29
Estabelecimentos de Saúde privado com fins lucrativos 29
Estabelecimentos de Saúde privado SUS 25
Estabelecimentos de Saúde com internação total 07
19
De acordo com os resultados preliminares do Censo 2010.
58
Estabelecimentos de Saúde sem internação total 32
Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia total 13
Estabelecimentos de Saúde com internação público 01
Estabelecimentos de Saúde sem internação público 22
Estabelecimentos de Saúde com internação privado 06
Estabelecimentos de Saúde sem internação privado 10
Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado 13
Estabelecimentos de Saúde total privado/SUS 25
Estabelecimentos de Saúde com internação privado/SUS 06
Estabelecimentos de Saúde sem internação privado/SUS 09
Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado/SUS 10
Estabelecimentos de Saúde especializado com internação total 01
Estabelecimentos de Saúde especializado sem internação total 03
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação total 05
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação total 25
Estabelecimentos de Saúde geral com internação total 01
Estabelecimentos de Saúde geral sem internação total 17
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação público 01
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação público 05
Estabelecimentos de Saúde geral sem internação público 17
Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privado 01
Estabelecimentos de Saúde especializado sem internação privado 03
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privado 04
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privado 20
Estabelecimentos de Saúde geral com internação privado 01
Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privado/SUS 01
Estabelecimentos de Saúde especializado sem internação privado/SUS 02
Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privado/SUS 04
Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privado/SUS 17
Estabelecimentos de Saúde geral com internação privado/SUS 01
Estabelecimentos de Saúde SUS 48
Estabelecimentos de Saúde plano próprio 01
Estabelecimentos de Saúde plano de terceiros 29
Estabelecimentos de Saúde próprio 29
Estabelecimentos de Saúde único total 49
Estabelecimentos de Saúde com terceirização total 03
Estabelecimentos de Saúde terceirizado total 05
Estabelecimentos de Saúde único público 23
Estabelecimentos de Saúde terceirizado público 26
Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado 03
59
Estabelecimentos de Saúde terceirizado privado 05
Estabelecimentos de Saúde único privado/SUS 22
Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado/SUS 03
Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado/SUS 04
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde total 668
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público total 15
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público municipal 15
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 653
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 653
Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 04
Mamógrafo com estéreo-taxia 01
Mamógrafo com estéreo-taxia 05
Mamógrafo com estéreo-taxia 02
Ultrassom doppler colorido 09
Eletrocardiógrafo 18
Eletroencefalógrafo 04
Equipamento de hemodiálise 24
Raio X até 100mA 05
Raio X de 100 a 500mA 09
Raio X mais de 500mA 01
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial total 39
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento médico em
especialidades básicas
36
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento médico em
outras especialidades
19
Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento médico em
outras especialidades
10
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência total 11
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Pediatria 05
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Obstetrícia 04
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Psiquiatria 03
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Clínica 08
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Traumato Ortopedia 01
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Neuro Cirurgia 01
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Cirurgia Buco Maxilofacial 01
Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Outros 01
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 28
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 07
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 09
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS UTI/CTI 04
60
Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Diálise 04
Fonte: IBGE, Assistência Médica Sanitária 2005; Malha municipal digital do Brasil: situação em 2005. Rio
de Janeiro: IBGE, 2006. NOTA: Atribui-se zeros aos valores dos municípios onde não há ocorrência da
variável ou onde, por arredondamento, os totais não atingem a unidade de medida.
Como se pode notar, a rede de assistência médico-hospitalar é mais carente de
estabelecimentos e de equipamentos se comparada à estrutura da rede de saúde de Goiânia.
Em 2005, ano em que foi realizada a pesquisa do IBGE sobre a Assistência Médica Sanitária,
Aparecida de Goiânia não contava com o Hospital de Urgências de Aparecida de Goiânia
(Huapa). Este começou a funcionar em abril de 2008, mas não atendia casos de emergência e
chegou a ser reinaugurado por três vezes. O atendimento de emergência era realizado pelo
Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) que recebe pacientes das cidades vizinhas.
Além da falta de estrutura apropriada para atender às necessidades médicas de sua
população, a cidade de Aparecida de Goiânia conta também com o problema da falta de
controle e de prevenção de doenças entre a população aparecidense. Em especial, cita-se a alta
incidência da dengue.
QUADRO 5: CASOS DE DOENÇAS REGISTRADAS
ENTRE A POPULAÇÃO DE APARECIDA DE GOIÂNIA
ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.
Doenças No. de casos
AIDS 200
Dengue 14583
Febre Amarela 0
Hepatite 485
Malária 34
Meningite 199
Tuberculose 355 Fonte: Ministério da Saúde 2010. Pesquisa Nacional de Avaliação das
CIBS/Condições de Saúde da População.
No ano de 2009 o número de infestações da dengue fez com que o município
fosse classificado pelo Ministério da Saúde como “situação de alerta”. No ano de 2010 esse
índice baixou e é considerado “satisfatório” pelo Ministério da Saúde.
Não foi nossa pretensão traçar um perfil detalhado da questão da saúde nos
municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia, mas sim apresentar elementos que possam
compor, ainda que minimante, um cenário de conjuntura no período em que pesquisamos os
61
conselhos de saúde, de 2010 a 2011, no sentido de identificar os desafios postos aos
Conselhos Municipais de Saúde desses dois municípios.
3.3. PROCEDIMENTOS DE COLETA E DE ANÁLISE DOS DADOS
Para melhor compreender a ação do Estado em relação à partilha do poder
decisório com os conselhos municipais de saúde, nos servimos de três técnicas: a observação
participante, a realização de entrevistas com os conselheiros e a análise documental.
A observação passiva
Na primeira etapa da pesquisa utilizamos a observação passiva nas reuniões dos
Conselhos de Saúde de Aparecida de Goiânia e de Goiânia. No Conselho Municipal de Saúde
de Aparecida de Goiânia (CMSAPG) acompanhamos a realização de duas reuniões, uma no
mês de setembro e outra no mês de novembro20
de 2010. Já no Conselho Municipal de Saúde
de Goiânia (CMSG) acompanhamos a realização do I Seminário de Capacitação de
Conselheiros de Saúde de Goiânia e uma reunião ordinária do CMSG, ambos realizadas no
mês de novembro de 2010.
Os conselheiros do CMSAPG se mostraram mais receptivos e disponíveis para
colaborar com a realização da pesquisa, oferecendo telefones de contato do presidente, livre
acesso às reuniões e a alguns documentos do conselho. De outro lado, no CMSG houve
resistência inicial por parte de alguns mediadores, que só foi superada após a realização da
entrevista com o presidente do conselho. Depois, tivemos livre acesso às reuniões e ao curso
de capacitação de conselheiros, realizado em novembro de 2010.
As anotações de campo obtidas através da observação passiva possuem caráter
secundário, servindo de complemento às entrevistas, em vista de melhor contextualizar e
compreender os depoimentos dos entrevistados. Registramos as inter-relações dentro das
reuniões ordinárias dos conselhos e do curso de capacitação de conselheiros, o espaço físico
20
No mês de outubro não houve reunião.
62
de atuação (a sede dos conselhos e o espaço de realização das reuniões ordinárias e do curso
de capacitação dos conselheiros) e a estrutura de funcionamento dos conselhos.
Entrevistas com os conselheiros do CMSAPG e do CMSG
A segunda etapa da pesquisa consistiu na realização das entrevistas com os
conselheiros municipais de saúde dos dois municípios. No Conselho Municipal de Saúde de
Aparecida de Goiânia (CMSAPG) entrevistamos três conselheiros e no Conselho Municipal
de Saúde de Goiânia (CMSG) entrevistamos quatro conselheiros. As entrevistas foram
realizadas seguindo um roteiro previamente definido (Anexo I). O critério de escolha dos
entrevistados se deu por aspectos justificados no quarto capítulo e além destes, por
acessibilidade e disponibilidade dos conselheiros em conceder a entrevista. Todas as
entrevistas foram gravadas, transcritas e organizadas em quatro eixos interpretativos.
Análise documental
Na terceira etapa da pesquisa realizamos a análise documental com objetivo de
apreender informações que pudessem traçar um perfil da atuação do Estado em relação aos
conselhos municipais de saúde. O CMSAPG possui uma página na internet na qual
disponibiliza os seguintes documentos:
Agenda de reuniões durante o ano de 2010;
Decreto nº 558, de 13 de Abril de 2010 que homologa o Regimento Interno do
Conselho Municipal de Saúde de Aparecida de Goiânia;
Regimento Interno do CMSAPG;
Relação de Entidades com candidatura habilitada a concorrer ao cargo de
membro do CMSAPG;
Informativo explicativo sobre os representantes dos trabalhadores da saúde e
do gestor do SUS;
Portaria nº 10 que convoca a I Plenária de Eleição de Entidades e Movimentos
Sociais do CMSAPG;
63
Resolução nº 08/2010 que convoca a eleição de membros do CMSAPG;
Portaria nº 8 que trata da homologação da Resolução 05 de 25/03/2010; e o
Regimento Interno do CMSAPG.
Além dos documentos acima citados, o CMSAPG disponibiliza em seu sítio leis e
resoluções dos Conselhos Estadual e Nacional de Saúde. Emitimos um ofício solicitando
cópias das atas da atual gestão. No entanto, só tivemos acesso a algumas atas, já que o
secretário executivo do CMSAPG esteve doente e não teve tempo de redigir as atas. Na
última reunião do ano de 2010 as atas ainda estavam em processo de revisão e não haviam
sido aprovadas pelos conselheiros.
Do CMSG tivemos acesso ao Regimento Interno e a seis atas da atual gestão, pois
as demais não foram homologadas pelos conselheiros. Ao contrário do CMSAPG, o CMSG
não possui um secretário executivo próprio, de modo que as atribuições de competência da
secretaria executiva do conselho são realizadas por servidores da Secretaria deslocados para
atuarem junto ao conselho.
A análise documental objetivou caracterizar juridicamente a atuação dos
conselhos municipais de saúde das cidades de Aparecida de Goiânia e de Goiânia em relação
a: finalidade, competência, composição, funcionamento e organização administrativa, assim
como identificar nas atas as relações entre o conselho e a secretaria municipal de saúde.
Aspectos éticos
Esse estudo foi submetido ao Comitê de Ética da Universidade Federal de Goiás e
obteve parecer favorável a sua realização. Antes de iniciar as entrevistas, os conselheiros
receberam uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo A) no qual
constam os objetivos e as implicações da pesquisa. E, em conformidade com os princípios
éticos da pesquisa, todas as informações obtidas serão utilizadas unicamente para fins
acadêmicos, resguardando a identidade das pessoas envolvidas e a confidencialidade dos
dados.
64
QUARTO CAPÍTULO
__________________________________________________________________________
4. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE
DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA
Antes de apresentarmos a interpretação dos depoimentos da pesquisa
repassaremos os objetivos e as questões norteadoras deste estudo.
O objetivo geral é investigar a ação do Estado, particularizado na instância
municipal, diante das modificações implementadas em seu monopólio sobre os meios de
administração pelos conselhos municipais de saúde, identificando o tipo de relação
estabelecida entre as dinâmicas das duas instâncias no que tange à partilha de poder, assim
como caracterizá-las e propor uma compreensão das variáveis que interferem nessa relação.
Para tanto, buscamos caracterizar os conselhos de saúde nos municípios de
Goiânia e de Aparecida de Goiânia, em sua atual gestão, tentando matizar regularidades e
tendências nas ações dos governantes no que tange ao funcionamento, à regularidade das
reuniões, das condições da participação e processos de tomada de decisão, assim como
averiguar o julgamento que os conselheiros fazem a respeito das relações estabelecidas entre o
Estado e o conselho no que se refere à partilha de poder.
Este capítulo destina-se a interpretar os depoimentos dos conselheiros do
Conselho Municipal de Saúde de Goiânia (CMSG) e dos conselheiros municipais de saúde de
Aparecida de Goiânia, assim como apresentar algumas notas sobre as atas das reuniões e
algumas explanações acerca da observação participante realizada em uma reunião do conselho
e no curso de capacitação de conselheiros.
4.1. ENTREVISTAS COM OS CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE
GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA
A análise de conteúdo é, segundo Berelson apud Gil, (1999, p.13) “uma técnica de
pesquisa que visa à descrição objetiva, sistemática e qualitativa do conteúdo manifesto nas
comunicações, tem por finalidade a interpretação dessas mesmas comunicações.”
65
Com a análise dos conteúdos das entrevistas aspiramos estabelecer uma
compreensão dos depoimentos coletados, verificar nossa hipótese de pesquisa e ao mesmo
tempo ampliar os conhecimentos sobre o tema da democratização dos espaços decisórios
(MINAYO, 1992).
O corpus da análise foi dividido em duas partes: a caracterização do perfil dos
conselheiros entrevistados e a apreciação dos conselheiros sobre os temas abordados nas
entrevistas.
Os depoimentos dos entrevistados, isto é, as unidades de registro foram
decompostas em temas e organizadas em quatro eixos: 1) a avaliação da atuação do conselho;
2) a avaliação da relação com a secretaria de saúde; 3) a avaliação do papel democratizador
do conselho; e 4) os entraves à atuação do conselho.
As categorias democracia e partilha de poder nortearam o processo de
compreensão cujo foco foi a relação dos Secretários Municipais de Saúde de Goiânia e de
Aparecida de Goiânia com os respectivos conselhos. Como afirmarmos, o gestor constitui-se
em agente com “posição-chave” nas dinâmicas do conselho, de modo que seu
comprometimento político com a democratização da gestão pública reverbera em ações
capazes de contribuir para a efetividade das decisões políticas ou mesmo de direcionar a
natureza do conselho municipal de saúde de seu município. Assim, a vontade política do
governante se estabelece como um elemento importante para os estudos dos processos de
ampliação democrática no âmbito da gestão pública, visto que ela é capaz de nortear sua ação.
Com o propósito de comparar as ações dos secretários municipais de saúde de
Goiânia e de Aparecida de Goiânia propusemos uma classificação ideal de ações que
demonstrem o empenho do gestor comprometido com a democratização da gestão pública de
saúde. São elas: a) o Conselho possuir verba própria para sua atuação; b) o secretário
municipal de saúde manter relações de cooperação com o Conselho; c) a presença do
secretário municipal de saúde ou do prefeito nas reuniões e eventos do Conselho; d) o fácil
acesso às informações da Secretaria Municipal de Saúde; e) a elaboração conjunta dos
projetos de saúde do município; e f) e o Conselho possuir boa estrutura física e pessoal
administrativo próprio para desempenhar suas funções. Esta classificação serviu de referência
para confrontarmos as ações do gestor empenhado com a democratização da política
municipal de saúde com as ações dos Secretários Municipais de Saúde de Goiânia e de
Aparecida de Goiânia.
66
Perfil dos conselheiros entrevistados
Antes de iniciarmos as entrevistas fizemos algumas perguntas que tiveram como
objetivo traçar o perfil socioeconômico bem como a trajetória político-associativa dos
conselheiros do CMSG e do CMSAPG. Nossa intenção foi situar o depoimento dos atores aos
contextos sociais a que eles pertencem. Desse modo, identificar as origens sociais, bem como
as trajetórias políticas dos atores sociais entrevistados, constitui o primeiro passo rumo à
tentativa de compreender as relações estabelecidas entre Estado e sociedade no interior dos
Conselhos Municipais de Saúde dos municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia.
A escolha dos conselheiros entrevistados teve como critério a seleção de pessoas
com experiência em movimentos sociais e em entidades associativas (entidades profissionais,
associações de moradores, entidades religiosas, etc.) capazes de articular com clareza acerca
de suas experiências. Tivemos também o objetivo de entrevistar pessoas ligadas ao segmento
usuário, e de entrevistar um representante do segmento gestor para que pudéssemos
estabelecer comparações entre os discursos. Para além destes critérios apresentados, a
pesquisa efetivamente foi realizada com os conselheiros que além de estarem enquadrados no
perfil desenhado, manifestaram desejo de participar da entrevista. Ao total realizamos sete
entrevistas, sendo quatro com conselheiros municipais de saúde de Goiânia e três com
conselheiros municipais de saúde de Aparecida de Goiânia.
Dos quatro conselheiros do CMSG entrevistados, dois representam entidades
profissionais, um representa os usuários e um representa o sindicato. Entrevistamos três
mulheres e um homem, com idade variando entre quarenta e cinquenta anos.
Em relação à escolaridade, três possuem o ensino superior completo, sendo que
dentre eles dois com pós-graduação, e um concluiu o ensino médio. A renda familiar dos
entrevistados varia entre R$ 1.500,00 e R$ 10.000,00.
Quanto à religião, entrevistamos um evangélico, um católico, um espírita e um
que se autodenominou espiritualista.
Sobre a trajetória e experiências anteriores de ação coletiva ou de associativismo,
um entrevistado relata experiências ligadas a entidade profissional. Os demais possuem
experiências em entidades religiosas, associações de moradores, no conselho de saúde e
sindicatos. Ainda neste tópico, um afirmou ser filiado a partido político e dois afirmaram ter
67
simpatia por partidos de esquerda. Sobre a experiência no Conselho Municipal de Saúde, os
conselheiros atuam nele há mais de dois anos.
Das três entrevistas realizadas no CMSAPG, entrevistamos o presidente, um
representante do segmento usuário e um representante do segmento gestor. A idade dos
conselheiros varia de 40 a 50 anos. Entrevistamos dois homens e uma mulher. A escolaridade
varia entre o ensino fundamental incompleto e a pós-graduação. Sobre a renda familiar, a
variação é entre R$ 2.000,00 e R$ 6.000,00, sendo que um conselheiro não informou o valor
de sua renda familiar. E, por fim, sobre a prática religiosa, temos um católico, um protestante
e um espírita.
Para compor o perfil político-associativo dos conselheiros indagamos se possuíam
experiências associativas em outras organizações. Dois conselheiros afirmaram participar de
entidades ligadas às questões de saúde e também a movimentos de cunho religioso. Uma
conselheira afirmou participar de movimento ligado a questões étnico- raciais.
Sobre filiação partidária ou simpatia por partidos políticos, nenhum conselheiro
informou filiação a partidos políticos. Um conselheiro respondeu manter simpatia ao PMDB,
enquanto outro disse que sua simpatia não era por partidos, mas por lideranças políticas,
citando os nomes de Dilma Rousseff, José Serra, Marconi Perillo e Iris Rezende.
Por fim, sobre a experiência de participação no CMSAPG, dois entrevistados
participam do conselho há aproximadamente um ano, enquanto que outro participa desde a
fundação do mesmo.
Tendo em vista o perfil acima traçado, pode-se afirmar que as características
socioeconômicas e a trajetória associativa dos conselheiros entrevistados não diferem da
realidade constatada nacionalmente. Conforme Santos, Ribeiro e Azevedo a experiência dos
conselhos municipais no Brasil demonstra que esses são compostos por uma grande
diversidade de organizações sociais (instituições governamentais, instituições sindicais,
instituições patronais e as instituições da sociedade civil).
No entanto, se a representação de organizações sociais é diversificada, afirmam os
autores, o mesmo não se observa em relação aos segmentos sociais presentes nos conselhos
municipais, geralmente constituído por aqueles de maior renda e escolaridade. Embora nossa
pesquisa não nos permita afirmar que no CMSG e no CMSAPG predomine representantes
com níveis elevados de escolaridade e renda, se comparados à população de modo geral, ela
nos permite endossar, conforme os dados socioeconômicos levantados, que os segmentos
mais privilegiados economicamente são representados nos conselhos.
68
No que diz respeito à trajetória associativa dos conselheiros, também é possível
notar, guardadas as devidas proporções, similaridades com os resultados obtidos no estudo de
Santos, Ribeiro e Azevedo. A própria natureza representativa dos conselhos requisita que os
conselheiros sejam associados a algum tipo de organização, seja ela estatal ou societal.
Conforme os autores, os conselheiros representantes da sociedade se destacam por
participarem efetivamente de atividades sociopolíticas. Este fato pôde ser constatado em
nossa pesquisa, a exemplo de um conselheiro representante dos usuários no CMSG, que
também atua como conselheiro do Conselho de Ética do Hospital Araújo Jorge, como
conselheira do conselho local de sua região e como presidente de associação de moradores em
seu bairro.
A participação efetiva e diversificada dos conselheiros em outras associações e
entidades possibilita o acúmulo de capital político, de recursos não-convencionais capazes de
equilibrarem politicamente a ausência de recursos educacionais e econômicos, que em geral
leva à baixa capacidade de influência dos segmentos sociais desfavorecidos no interior dos
conselhos, como advoga Fuks (2004). No entanto, corre-se o risco da monopolização da
representação, em razão da baixa rotatividade de conselheiros e mesmo do acúmulo de
representações, num processo que pode resultar em desfavor da democratização de espaços
públicos, como o são os conselhos de políticas públicas.
Por fim, o perfil socioeconômico e a trajetória político-associativa que propomos
não visam justificar a representatividade, no sentido estatístico, do grupo acima entrevistado,
mas sim localizar os entrevistados na estrutura social.
Contextualização
A pesquisa foi realizada durante o ano de 2010, ano de eleições políticas para os
cargos de presidente da República, senadores, governadores, deputados federais, estaduais e
distritais.
Em Goiás, um dos candidatos ao governo estadual era o então prefeito da cidade
de Goiânia, Iris Rezende Machado, do PMDB, que deixou o cargo para disputar o pleito.
Portanto, tomou posse para o vice-prefeito Paulo Garcia. Em Aparecida de Goiânia era
prefeito Maguito Vilela, do PMDB.
No contexto interno, o CMSG realizou, no primeiro e no segundo semestre,
cursos de capacitação dos conselheiros locais nas regiões de Goiânia e no fim do ano realizou
o I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Goiânia que contava então com mais de
69
cinqüenta conselhos locais instalados. Já o CMSAPG realizou, no primeiro semestre, eleições
para escolha das entidades e movimentos sociais (de usuários, de profissionais e de
prestadores) que o compõe.
Deste modo, tanto no contexto externo quanto no contexto interno as gestões do
CMSG e do CMAPG foram marcadas por transições, transição administrativa, no primeiro
caso, e transição na composição dos membros, no segundo caso. Esclarecidos os contextos
nos quais se deram as condições de produção de sentido dos discursos dos entrevistados
passemos para a análise dos conteúdos da entrevistas propriamente dita.
Análise temática das entrevistas
A análise de conteúdo comporta uma variedade de técnicas que podem ser
adotadas para o seu desenvolvimento (OLIVEIRA, 2008). Dentre elas21
, utilizamos a análise
temática. Conforme dito acima, as entrevistas foram agrupadas por temas que resultaram em
quatro eixos. Cada eixo está relacionado com questões reiteradas pela literatura no que diz
respeito à dinâmica de funcionamento e à natureza política dos dois conselhos, quanto a
existência, regularidade e efetividade de atuação.
Atuação do conselho e dos conselheiros
Em relação ao impacto da existência e da atuação do Conselho para a formulação
das políticas de saúde e no controle social dessas políticas em Goiânia, predominou nos
discursos dos entrevistados a atuação do CMSG no controle social e no atendimento a
denúncias. A formulação das políticas de saúde foi mencionada por um conselheiro enquanto
um segundo plano nas prioridades das rotinas do Conselho.
Notamos que o CMSG tem se limitado à fiscalização das políticas de saúde
elaboradas pela Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia, à apreciação dos projetos e à
aprovação dos orçamentos para a área, propostos pela Secretaria de Saúde e/ou pelo gabinete
do prefeito. Nesta perspectiva, o CMSG tem atuado como uma estrutura burocrática formal
submetida às rotinas administrativas da Secretaria Municipal de Saúde visto que não possui
uma agenda política de médio ou longo prazo capaz de contribuir para a elaboração da
política municipal de saúde (AZEVEDO; RIBEIRO e SANTOS JÚNIOR, 2004).
21
Conforme Oliveira (2008) existe a análise categorial ou temática, a análise de avaliação, a análise de
enunciação, a análise de expressão, etc.
70
Cabe destacar o depoimento do Conselheiro C, para quem a atuação do CMSG
deixa a desejar em relação ao controle social, atribuindo os problemas de atuação do Conselho
às mudanças políticas, aos custos de participação e à resistência dos gestores.
O Conselho municipal é formado de 94 conselheiros. Com cada política que muda,
com cada gestor que entra, tudo muda e para nós, os consultores do SUS dentro de
Goiás, ela é sempre muito difícil. Nós, os conselheiros, não temos locais, o controle
social, local, municipal e distrital. Não temos vínculo trabalhista nenhum, mas a
gente trabalha muito, eu mesmo trabalho muito, eu faço parte de várias comissões.
Então a gente às vezes fica o dia inteiro na rua para construir o SUS, mas às vezes
sempre com muita dificuldade porque no SUS a cada dia a gente aprende um com o
outro, cada pessoa que a gente conhece, a gente está aprendendo. Só que os
governistas acabam às vezes não acatando o que tem que fazer. O que é lei, o que é
lei, o que ele tem que cobrir nos locais, nos CAIS nas unidades básicas de saúde...
Acaba é faltando, deixando a desejar, mas nem por isso, nós, os conselheiros não
vamos desistir. Não, vamos continuar construindo. (CONSELHEIRO C).
No discurso deste conselheiro podemos identificar duas dificuldades relativas à
relação do conselho com os gestores de saúde. O impacto das mudanças de governos na
atuação do conselho, visto que cada novo gestor de saúde demanda tempo para situar-se da
condição da saúde pública municipal. Esta questão diz respeito à dinâmica de funcionamento
do aparelho estatal, sendo que a alta “rotatividade do exercício do poder” é um dos
mecanismos que proporcionam o bloqueio a uma efetiva partilha de poder decisório
(DAGNINO, 2002, p.283).
A outra dificuldade diz respeito ao descompromisso do gestor com as deliberações
do conselho. Sabe-se que esta é uma estratégia adotada pelos gestores no intuito de esvaziar
os conselhos (PESSANHA, CAMPAGNAC E MATOS, 2006).
Nos discursos dos conselheiros de Aparecida de Goiânia predominou a avaliação
de que a atuação do CMSAPG é fraca. Como justificativa a esta menção, a falta de
organização da sociedade civil e a ausência dos conselheiros nas reuniões apareceram como
as principais causas da avaliação. Estes argumentos são pontos de fragilidade do Conselho,
pois uma vez que não exista o apoio do secretário de saúde também não seria possível contar
com o poder de pressão da sociedade civil para fazer valer suas decisões, tendo em vista sua
desarticulação. Assim, uma sociedade civil atuante é uma das variáveis responsáveis pela
democratização do governo, e em consequência pela efetividade do Conselho (AVRITZER,
2008).
Ainda no eixo sobre a avaliação da atuação do Conselho Municipal de Saúde de
Goiânia, os entrevistados foram questionados acerca da qualificação dos conselheiros para
debater e decidir sobre os assuntos de saúde no município. Prevaleceu nos discursos dos
71
entrevistados a ideia de que nem todos os conselheiros estão preparados para atuarem na
elaboração de políticas sociais ou no controle social das políticas de saúde. Os entrevistados
destacaram o papel da capacitação dos conselheiros como imprescindível ao bom desempenho
do CMSG.
Conforme Dagnino (2002) a exigência de qualificação técnica e política, dos
representantes de segmentos da sociedade, é um dos elementos mais importantes a fim de
propiciar uma participação mais igualitária nas atividades e decisões dos conselhos.
O Conselheiro C associa melhorias na saúde do município ao desempenho dos
gestores da saúde.
Eu espero a cada dia que a saúde melhore cada vez mais, que os gestores cumpram
com o dever, o seu dever de gestor na saúde de Goiânia. Eu acho que o Estado
também às vezes deixa muito a desejar, o gestor estadual deixa muito a desejar.
Sobra muito para o gestor do município, aí acaba o dinheiro do município tendo
que pagar muita coisa e com isso falta às vezes médicos, falta enfermeira, falta ...,
falta tudo porque às vezes a verba que vem vai para o município e não dá para
cobrir tudo porque o Estado também não quer ajudar, não quer regular.
(CONSELHEIRO C).
O depoimento do Conselheiro C releva tensões entre os níveis de governo
municipal e estadual no que diz respeito ao repasse de verbas para a saúde, para o que
argumenta que a verba do município não é suficiente para atender as demandas da saúde
pública em Goiânia e que o Governo do Estado de Goiás se omite quanto a este fato. O
Conselheiro C destaca as dificuldades encontradas pelo gestor municipal para administrar a
pouca verba que possui e que tal fato resulta na falta de profissionais de saúde. Seu
depoimento torna-se ainda mais significativo se levarmos em conta sua base representativa,
isto é, o segmento usuário. Embora represente as demandas da população, dos usuários do
Sistema Único de Saúde, tal condição não o impede de constatar que parte dos problemas de
saúde do município se deve a falta de repasse de recursos da esfera estadual. O discurso desse
entrevistado revela uma posição conciliadora ao considerar as dificuldades dos gestores na
administração do setor de saúde.
Já entre os entrevistados do CMSAPG prevaleceu a idéia de que os conselheiros
são preparados para debater e decidir sobre os assuntos de saúde no município de Aparecida
de Goiânia. Entretanto, observamos que a concepção de qualificação abrange outros
elementos além da qualificação técnica e da qualificação política, ela supõe o aprendizado do
reconhecimento da pluralidade e da legitimidade dos interlocutores envolvidos no processo
decisório (DAGNINO, 2002).
Neste primeiro eixo verificamos a presença dos elementos que matizam a relação
entre o CMSG e o gestor municipal de saúde. Cabe destacar o depoimento do Conselheiro C,
72
que antecipa alguns elementos dessa relação. Mudança de gestores na saúde, resistência ao
cumprimento das deliberações do CMSG e tensões nas relações entre município e estado
quanto ao repasse de verba para a saúde, são exemplos da oposição por parte do gestor listado
por esse entrevistado.
A relação com a secretaria municipal de saúde
No segundo eixo, os entrevistados avaliaram a relação estabelecida entre a
Secretaria Municipal de Saúde e o Conselho, no que diz respeito ao acesso às informações e
em relação à estrutura de funcionamento e pessoal administrativo do Conselho assegurado
pela secretaria.
Nos discursos dos entrevistados foi recorrente a avaliação dessa relação como
uma relação de parceria. Entretanto, o que observamos é que essa relação, frequentemente,
tem sido marcada também por conflitos e tensões.
.
Hoje ele tem uma relação assim, não sei... O nosso presidente teve alguma
dificuldade em relação ao gestor, porque o gestor atual ele ficou meio arredio às
ações do conselho, principalmente em função do funcionário que ficaria disponível
e tudo mais. Então assim... Mas no momento parece que já foi resolvida essa
relação, que não está tendo mais problema. No início teve esse problema, mas
agora está uma relação, assim, acessível. (CONSELHEIRO B).
Olha, eu acho que tem que ser uma relação de parceria, ela tem que ser uma
parceria. Agora eu falo sempre no colegiado que essa parceria, ela tem que ser
sempre de mão dupla, ou seja, ela não pode estabelecer uma parceria em que o
conselho é parceiro da secretaria e da gestão e a gente não é parceiro no conselho.
Até porque nós não temos um orçamento que é destinado, que nós administramos
ele. O orçamento que compete ao conselho, ele é na secretaria, então nós temos que
ir lá para que delibere aquilo que a gente precisa fazer. Não é delibere, mas que ele
libere para nós. Por exemplo, nós vamos fazer uma conferência então nós
dependemos do gestor para a gente acordar e fazer acontecer. Agora o que eu digo
sempre é que essa relação ela precisa melhorar e nesse sentido ela já tem
melhorado muito. Há dois anos, até o período do ano passado, a gente tinha uma
relação que era menos harmônica. Atualmente nós estamos com uma relação bem
melhorada com a secretaria. (CONSELHEIRO D).
Nos discursos acima fica evidente que classificar a relação entre a Secretaria
Municipal de Saúde de Goiânia e o Conselho como parceria é mais um anseio do que um fato.
O Conselheiro D faz um recorte temporal (há dois anos) para demarcar a passagem de uma
relação menos harmônica para uma relação mais harmônica. Esse recorte coincide com a
73
saída do prefeito Iris Rezende (PMDB) para disputar o cargo de governador do estado de
Goiás e a consequente redefinição dos cargos de confiança, sob indicação do vice-prefeito que
assumiu ao Executivo, Paulo Garcia (PT), dentre eles o cargo de secretário municipal de
saúde. A mudança da orientação partidária deve ter influenciado positivamente na relação da
SMS com o CMSG, já que o Partido dos Trabalhadores (PT) tem sido, desde o início do
processo de redemocratização brasileira, um dos principais, senão o único, defensor dos ideias
da democracia participativa (AVRITZER, 2002).
No discurso dos conselheiros municipais de saúde de Aparecida de Goiânia
também predominou a qualificação da relação da Secretaria Municipal de Saúde com o
CMSAPG como uma relação de parceria.
A relação está boa. Do ponto de vista institucional está boa. O Conselho possui um
espaço lá dentro, ocupa espaço dentro do prédio da secretaria de saúde. E essa
relação precisa ser trabalhada constantemente. A gente tem um entendimento mais
profissional. O conselho é, na verdade um órgão de secretaria de saúde. É isso que
embaraça um pouco o entendimento da população. E é algo que foi criado na esfera
federal, na Constituição, numa inteligência do legislador de forma espetacular.
Porque o legislador, quando foi fazer a Constituição, e o poder executivo federal
quando foi regulamentar o dispositivo constitucional de controle social e da
participação popular de saúde, o que o executivo e o legislador fizeram? Eles
tiveram a inteligência de criar um órgão público, cujo patrão é o controle social.
‘É’ as representações não governamentais, mas dentro de um órgão público onde o
poder executivo, que tem que funcionar como Estado, como órgão público, como
poder executivo também. Mas tem que ter essa característica administrativa de
controle social e também esse viés da obrigação do gestor público, do poder
executivo onde o conselho está lotado, no caso a secretaria municipal de saúde.
Onde esta pasta precisa de bancar, obedecendo a leis federais, estaduais e
municipais, ela que precisa bancar a administração, todas as ações do conselho.
Isso é um pouco complexo pra população entender e saber que ela pode se inserir
ali, dentro de um diapasão puramente técnico, puramente de controle de direitos e
de obrigação de fazer. E não simplesmente por política que é a leitura que a
população faz e que isso atrapalha porque tolhe o direito, por que as pessoas às
vezes, são do partido A, do partido B, do partido C, aí ele sente num bloqueio. Por
não entender que esses mecanismos jurídicos que traz o conselho de saúde, como
órgão público, mas gerenciado e administrado como ordenadores ou conselheiros
de saúde, que é um ente civil, é um ente comum, dentro de órgão público que tem
que dar espaço e atendimento pra ele. E também essa relação com a secretaria de
saúde, com o secretario de saúde, às vezes ela é ruim às vezes ela é boa, isso é uma
construção que precisa ser constante. (CONSELHEIRO A)
O discurso deste entrevistado trata de uma questão controversa entre os estudiosos
da participação. Diz respeito à autonomia dos conselhos frente ao poder executivo. Conforme
Goulart (2006), a lei considera que os conselhos fazem parte do poder Executivo e são por ele
regulados. De outro lado, a resolução 33322
do Conselho Nacional de Saúde (CNS) afirma que
22
Disponível on line em http://conselho.saude.gov.br/14cns/docs/resolucao_333.pdf
74
“os Governos garantirão autonomia para o pleno funcionamento do Conselho de Saúde,
dotação orçamentária, Secretaria Executiva e estrutura administrativa” (GOULART, 2006,
p.22). Consideramos, de acordo com os depoimentos dos entrevistados, que a SMSAPG não
tem garantido a autonomia para o funcionamento do CMSAPG, e que nesse sentido o controle
social das políticas de saúde fica prejudicado.
Sobre as informações de que o CMSG necessita para deliberar, prevaleceu nos
discursos a dificuldade dos conselheiros no acesso a elas.
Sempre solicitamos, agora, nem sempre recebemos a resposta daquilo que a gente
precisa às vezes a tempo, muitas vezes eles atrasam um pouco em função do gestor,
mas ele sempre que ele solicita, mesmo que com atraso ele tem recebido.
(CONSELHEIRO B)
Sim, às vezes algumas coisas que a gente precisa realmente ter essas informações
vem de demanda de algum tempo, até mesmo de alguns casos que os gestores
tentam sonegar as informações, mas a gente tem instrumentos legais para que a
gente consiga rever isso.(CONSELHEIRO. D)
Constatamos que a SMSG nem sempre tem atendido às demandas de informação
do CMSG a tempo. Conforme Dagnino (2002), os mecanismos de bloqueio a uma efetiva
partilha de poder podem ser resultado tanto de concepções políticas resistentes a
democratização dos espaços decisórios quanto das próprias características no funcionamento
do Estado. A falta de transparência que dificulta o acesso as informações é definida por ela
como uma característica estrutural do Estado. No entanto, como a própria autora afirma, é
difícil determinar a origem dos mecanismos de bloqueio. Independente dessa dificuldade seja
qual for a origem, importante a registrar é que esses mecanismos acabam por atrapalhar a
democratização das decisões. (DAGNINO, 2002).
Predominou nos discursos dos conselheiros do CMSAPG a ideia de que eles têm
acesso às informações que necessitam para deliberar. No entanto, as matérias que chegam
para serem deliberadas pelo CMSAPG não chegam a representar 20% das ações do governo.
De que necessita para deliberar sim, porque só entra matéria dentro do conselho de
forma documentada. Então, para deliberar, sim, tem acesso a toda informação. A
informação que a gente não tem que os conselhos não têm ou que o Conselho de
Aparecida não tem, ou outros conselhos de Goiás e do Brasil não tem, é que os
gestores não mandam nem 20% das demandas do dever de fazer, os gestores não
mandam para os conselhos apreciarem. Mas o que chega pra apreciar é
75
amplamente aberto, amplamente apreciado para poder haver deliberação.
(CONSELHEIRO A)
Averiguamos a prática de controle das informações por parte da SMSAPG.
Dizendo de outro modo, 80% da política pública de saúde municipal deixa de ser elaborada,
executada e fiscalizada pelo CMSAPG. A omissão de informação é uma conduta relatada por
Weber (1979, p.269) nos estudos sobre a burocracia: “Toda burocracia busca aumentar a
superioridade dos que são profissionalmente informados, mantendo secretos seu
conhecimento e intenções [...] na medida em que pode, oculta seu conhecimento e ação da
crítica.” Assim, ao controlar o acesso dos conselheiros as informações sobre as políticas
municipais de saúde a SMSAPG mantém-se imune a ação fiscalizadora do CMSAPG.
A respeito da estrutura de funcionamento dos conselhos prevaleceu nos discursos
a concepção de que o CMSG possui uma boa estrutura física, embora não tenha um secretário
executivo.
Temos sim, graças a Deus, nosso conselho eu não digo que ele é 100% mas ele pelo
menos uns 80% ele é. Hoje nós temos funcionários, nós temos motoristas, nós
temos... o prédio não é nosso, é alugado, mas temos sala de recepção, temos
secretária, não secretária executiva, que agora nós já temos uma pessoa age como
secretária e temos dois motoristas. Eu acho que é um grande avanço, já avançamos
bastante para quem não tinha nada, temos computador, temos tudo.
(CONSELHEIRO C)
Olha, nós podemos dizer que parcial porque primeiro o que rege a lei é que o
conselho tem que ter uma secretaria executiva e o nosso conselho nunca teve essa
secretaria executiva e nós, nessa administração, estamos tentando de todos os meios
implantar essa secretaria e nós estamos tendo problema por isso. Porque na
verdade quando você fala em funcionário administrativo nós não temos o quadro
administrativo que a gente precisaria ter e ai a gente fica esbarrado com essa
questão da secretaria executiva. A secretaria ela tem aberto, para gente tem
melhorado, mas nós já tivemos um tratamento muito ruim. Ultimamente eu não sei o
que a gestão entendeu da importância do conselho e tem melhorado um pouco essa
questão do tratamento com a gente, e melhorou mas ainda é preciso avançar nesse
sentido. (CONSELHEIRO D)
Sobre a estrutura de funcionamento do CMSAPG, os entrevistados relataram que
ele não possui uma boa estrutura, já que sua sala é pequena e o secretário executivo não é
capacitado para a função.
É, a secretaria tem assegurado agora cumprir essa seguridade, está muito a
contento. Você tem que ficar correndo atrás e acaba que passa os quatro anos do
gestor, passa dos dois anos do presidente, passa os dois anos dos conselheiros e
eles não conseguem muito. É sempre essa luta de buscar... Porque dentro de uma
76
relação de entes que precisam ter boa relação existe a seguridade tanto jurídica
como política, agora o duro é você fazer essa seguridade virar de fato algo que traz
mesmo a suficiência pra te dar condições pra você poder trabalhar. O Conselho
mesmo funciona numa sala que já foi observada pelo DENASUS do Ministério da
Saúde e tem já um relatório de auditoria que ele não pode ter uma sala daquele
jeito, um ambiente daquele jeito. Mão-de-obra, mão-de-obra administrativa é
pouca, só conta com um secretário executivo e ainda não é muito bem capacitado.
Nós pedimos, deliberamos na última reunião, a admissão de um auxiliar
administrativo e foi deliberado. Constitui um processo administrativo e até agora,
já quase dois meses, que na última reunião não houve pauta, não teve reunião, já
vai pra dois meses e essa assinatura do prefeito ainda não chegou ao processo.
Então começa a parar, começa a ter problemas. Mas a seguridade ela existe, está
existindo sim ali em Aparecida de Goiânia. Precisa é ser mais célere no
cumprimento das determinações do Conselho. (CONSELHEIRO A).
Por enquanto não, assim por enquanto tem um local que não é ainda um local
adequado porque é uma sala pequena com um pouco de equipamento da mesma
forma que a secretaria. Como nós estamos pretendendo ampliar a secretaria nós
também ganhamos espaço ali até para melhorar não só a parte de estrutura física
do conselho como da secretaria e futuramente uma sede própria da secretaria.
(CONSELHEIRO B)
Constatamos nos discursos dos conselheiros dos dois conselhos (CMSG e o
CMSAPG) que as ações de suas respectivas secretarias não têm garantido a autonomia para o
seu pleno funcionamento, nos termos da resolução 333 do Conselho Nacional de Saúde -
CNS. O CMSG possui uma estrutura física adequada, mas não possui um secretário
executivo. Já o CMSAPG possui um secretário executivo, mas não possui uma estrutura física
adequada. E ambos não possuem orçamento próprio. Assim, tanto o CMSG quanto o
CMSAPG tendem a serem dependentes dos interesses políticos do poder Executivo, o que
pode dificultar a efetiva democratização do processo decisório das políticas municipais de
saúde (MOREIRA e ECOREL, 2009).
Neste segundo eixo, outros elementos que matizam as relações das secretarias de
saúde e de seus respectivos conselhos municipais de saúde vieram à tona. Embora os
discursos dos conselheiros tendam a endossar os aspectos positivos dessa relação, ações como
o controle de informações e a falta de condições físicas adequadas e de pessoal administrativo
próprio nos levam a compreender que essa relação é mais tensa e conflituosa do que uma
relação de parceria.
A ação democratizadora do CMSG e do CMSAPG
O terceiro eixo trata da percepção dos entrevistados quanto ao papel
democratizador do CMSG e do CMSAPG.
77
Quanto ao papel do CMSG os discursos centraram-se na ação fiscalizadora como
um de seus principais atributos, ao lado de atender as demandas da população na área da
saúde. Para os entrevistados, o Conselho deve tratar de temas ligados ao sistema de saúde, tais
como a aprovação dos planos de saúde e de gestão e a análise dos projetos da secretaria de
saúde. Questões como a importância da educação popular, divulgação das ações do CMSG
na mídia, maior acolhimento dos novos membros nos movimentos sociais e investimento em
ações de mobilização apareceram nos discursos dos entrevistados.
Sobressaíram também as ideias de que o papel do conselho de saúde é o de
fiscalizar as políticas de saúde e de participar na elaboração dessas políticas. Em relação aos
temas a serem debatidos nos conselhos os depoimentos foram bem diversificados. Para um
dos conselheiros, é preciso tratar de temas relacionados à vigilância sanitária. Outro
entrevistado apontou que é preciso que os conselheiros possuam conhecimentos de natureza
política para compreender o sistema de financiamento da saúde, enquanto que o terceiro
conselheiro acredita que é preciso discutir soluções para os casos de maior urgência e a
aplicação dos projetos ligados ao plano municipal de saúde.
Verificamos que os discursos dos entrevistados, de maneira geral, tendem a
superestimar as ações e práticas de seus respectivos conselhos. Para eles, os conselhos têm
cumprido seu papel democratizador. Entretanto é possível perceber que suas ações têm-se
restrito à fiscalização das políticas implementadas pelas secretarias. É cabível inferir que em
relação à atribuição de participar da elaboração da política municipal de saúde, os dois
conselhos pesquisados não atingem este objetivo como deveriam.
Entraves à atuação dos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de
Goiânia
A relação com o gestor aparece como o maior entrave à atuação do CMSG nos
discursos dos entrevistados.
Se o gestor ele é uma pessoa realmente voltada para essa área de luta e tudo mais
ele vai ser mais aberto a isso vai ser um gestor tipo, ele vai ser mais fechado, vai
criar dificuldade ele vai deixar de cumprir algumas coisas que são solicitadas pelo
conselho, ele vai enrolar, vai fazer um monte de coisa. Agora se for uma pessoa
realmente do povão, uma pessoa que é sempre da saúde publica que sempre lutou
pela saúde publica, ele vai ser diferente, ele vai está ali aberto com vontade
realmente de mudar. Agora se for um cara que é o atual agora que é o gestor da
privada, das empresas privadas ele vai realmente... Não vai querer muito que o
posto da saúde publica vá para frente não. Então, são essas dificuldades, o
idealismo do gestor. Se ele é um gestor da área realmente da saúde pública ele vai
78
ser mais aberto, vai estar dando todo o apoio, agora... vai dificultar.
(CONSELHEIRO B)
Olha, um dos dois entraves, às vezes, é a questão da gestão, nós temos problema
com a gestão. Quanto à gestão, e olha não deveria ser assim, porque o conselho é
paritário, ele funciona com 50% de usuários do sistema. Os outros 50% é dividido
em 20% desses trabalhadores da saúde e os outros 25% é os gestores e prestadores
de serviços do SUS. Então, se o gestor tem cadeira cativa se ele participa
efetivamente do conselho, se for obrigação inclusive conhecer o funcionamento e o
papel real do conselho, mas na maioria das vezes isso não funciona assim até
porque às vezes os gestores eles querem fazer as coisas, querem formular as coisas
ao bel prazer, ou seja, da forma que ele acha que deve ser. Quando ele encontra
esse entrave pelo conselho porque às vezes ele pode formular uma proposta e traz
para o conselho e o conselho estuda aquilo e delibera que aquilo não pode ser
daquele jeito, então isso contraria o gestor, contraria a gestão e muitas vezes as
coisas travam, não acontece. Felizmente, aqui em Goiânia a gente até tem
conseguido avançar nesse aspecto os gestores tem entendido e tem sido solidário,
mas nós temos experiência de conselhos até bem próximo da gente onde as coisas
não funcionam de jeito nenhum porque o gestor trava mesmo e aí vem a
perseguição porque de repente aquele trabalhador que está ali no conselho é
perseguido ou até mesmo aquele usuário que está ali ele é ameaçado. Alguma coisa
deixa de acontecer para ele e isso causa até uma desmotivação das pessoas
participarem do conselho, se fosse diferente seria muito melhor. Os principais
entraves eu vejo que é isso, mas tem também a falta de conhecimento, se as pessoas
conhecessem o papel do conselho e soubesse qual a importância dele, o porquê da
existência dele e o que ele realmente representa e viessem fazer parte eu acho que
melhoraria muito seria muito importante. (CONSELHEIRO D)
O discurso do Conselheiro B destaca a importância do posicionamento político-
ideológico do gestor de saúde para que ele mantenha uma boa relação com o Conselho. Para
ele, o atual secretário não está interessado em contribuir na melhoria do SUS já que está
ligado aos interesses da rede privada de saúde. Conforme Fernandes e Bonfim (2005, p.137,
apud Cortes, 1998:1995), a posição ideológica do gestor está estreitamente relacionada com
sua trajetória política de experiências junto aos movimentos populares e da sociedade civil,
sendo que “se for um indivíduo com ligação com a sociedade civil, este terá um processo
decisório de estímulo aos grupos sociais.”
Podemos concluir que o maior entrave à atuação do CMSG tem sido a sua relação
com o gestor, o secretário de saúde do município, seja porque ele está ligado a interesses da
iniciativa privada, seja porque há desentendimentos dele com o Conselho, resultando em
resistência do gestor em acatar as deliberações tomadas no âmbito dessa instância.
Entre os conselheiros municipais de saúde de Aparecida de Goiânia, os discursos
foram variados. Um entrevistado apontou que o maior entrave à atuação do Conselho é a falta
de profissionais na área de saúde na rede pública, especificamente no atendimento básico.
Para outro, o maior entrave é a falta de conhecimento e a falta de capacitação para o
79
desenvolvimento das atribuições de conselheiro. Já o Conselheiro A apontou como maior
entrave a falta de um gestor de carreira na saúde.
São entraves você não ter gestores de carreira e nem ter servidores públicos da
pasta de carreira. Mas de carreira e nas funções de gerência, nas funções de chefia.
Porque o modelo político brasileiro, ah, mudou a política, se nomeia politicamente
secretários, se nomeia todo o segundo escalão o terceiro escalão, funções
puramente políticas. E muita das vezes aquele servidor entra e ele não é capacitado
para aquilo ele não está capacitado para aquilo. Até ele descobrir, até ele entender
o mecanismo do SUS que é muito complexo é um bojo de legislação muito vasto, até
ele entender esse mecanismo e até ele ter interesse, porque na verdade ele não está
ali para cumprir função de carreira ele tá ali para cumprir função e função política
às vezes, lamentavelmente. Então o que precisaria, precisaria nesse modelo que o
secretário de saúde tivesse nomeação de carreira, de preferência com nomeação do
colegiado. Essa é uma tendência que já aconteceu na educação. Quem que nomeia
diretor de escola? Já é aluno e pais de alunos. Porque não seria a população ou até
mesmo o conselho de saúde quando bem representado, bem legitimo do ponto de
vista institucional, por que não o conselho nomear o secretário? Isso precisaria
acontecer isso é um dado que precisa acontece. E isso prejudica os trabalhos. Por
quê? Na esfera federal, que o governo federal tem uma mega estrutura. Aí o
governo federal sempre solta o que as secretarias têm que fazer, o que as
secretarias de saúde têm que fazer. Solta as missivas a cumprir um prazo muito
sufocante. Secretário de saúde só vive correndo, gerente/gestor de saúde só vive
correndo. Passa muito rápido, não dá para você ter um controle, do ponto de vista
de estratégia de construção de melhoria. Aí acaba que passa os quatro anos e você
tem a mesma história repetida. Isso precisaria acabar e acabando com isso fere
interesse, mas fere interesse político e não interesse público. Não fere interesse
social, pelo contrário isso é uma tendência que as autoridades políticas já são
conscientes que precisa acontecer. Agora é uma conquista que a sociedade precisa
fazer que não tem ainda. A educação já conseguiu um pouquinho, que é os seus
alunos e pais de alunos nomear diretor, mas ainda não nomeia secretário.
(CONSELHEIRO A)
O depoimento do Conselheiro A oferece uma proposta com a finalidade de
democratizar o assento da Secretaria Municipal de Saúde. Para ele, o cargo de Secretário
Municipal deveria ser um cargo eletivo, a exemplo do que ocorre na educação, para cargos de
diretor de escolas. Os candidatos a secretário deveriam ser escolhidos via voto popular e não
por questões de ordem partidária ou política. Assim, nessa concepção, o posto seria ocupado
por pessoas com capacitação para tal e democraticamente eleitas para isso. Normalmente, a
indicação dos gestores da saúde em Goiânia esteve associada a práticas clientelistas e não por
critérios técnicos (FAVARO, 2009).
Na seção seguinte, exploramos as atas e a observação participante empreendidas
nas reuniões do CMSG e do CMSAPG e no I Curso de Capacitação de Conselheiros de
Goiânia.
4.1.2. Considerações sobre as atas e a observação passiva
80
Como mencionado anteriormente, a análise de conteúdo das atas, do regimento
interno do CMSG e do CMSAPG e também as anotações de campo, obtidas através da
observação passiva, possuem caráter auxiliar, servindo de complemento às entrevistas, em
vista de melhor contextualizar e compreender os depoimentos obtidos.
O CMSG nos disponibilizou as cópias de seis atas, sendo cinco de reuniões
ordinárias e uma de reunião extraordinária, de fevereiro a agosto de 2010. Já o CMSAPG nos
forneceu a cópia de cinco atas das reuniões ordinárias que datam de agosto a dezembro de
2010. A análise dos conteúdos das atas focalizou as relações entre as secretarias municipais de
saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia e seus respectivos conselhos municipais de
saúde.
Antes de iniciarmos a análise do conteúdo propriamente dita, cabem algumas
considerações sobre a estrutura das atas para assim compreendermos as dinâmicas e processos
de discussão e de deliberação do CMSG. Os registros das reuniões em atas seguem o seguinte
roteiro: Data, Local, Chamada, Informes, Informes da Mesa Diretora, Encaminhamento das
Comissões, Encaminhamento dos Conselhos Locais, Apreciação de Projetos e Pauta para a
próxima reunião. O CMSAPG segue um roteiro semelhante, exceto pela chamada e pelos
encaminhamentos, visto que Aparecida só conta com o Conselho Municipal de Saúde sem
dispor de conselhos locais.
A prescrição das atas é feita em média por três funcionários da SMS colocados à
disposição do CMSG. Já no caso do CMSAPG as atas são redigidas pelo secretário do
Conselho. Nas atas dos dois conselhos constatamos problemas gramaticais e ortográficos na
maioria das atas. Tal fato reitera a necessidade de uma secretária executiva conforme
observamos nos depoimentos dos conselheiros de Goiânia e a necessidade de um auxiliar para
o CMSAPG.
De acordo com o Regimento Interno do CMSG em seu capítulo V, art. 24º, cabe à
SMS dotar de infra-estrutura física, financeira e material e de recursos humanos a Secretaria
Executiva para que o conselho possa funcionar plenamente. Tal atribuição não está sendo
cumprida pela SMS.
Em relação à presença dos conselheiros representantes do governo, constamos que
o conselheiro titular representante da SMS não compareceu a nenhuma das seis reuniões
realizadas pelo CMSG. Apenas seu suplente participa, como representante da SMS, de quatro
das seis reuniões. Esse dado, aliado aos depoimentos dos conselheiros nas entrevistas, nos
permite interpretar a ausência do conselheiro titular da SMS como descaso deste para com o
CMSG. O mesmo foi verificado nas reuniões do CMSAPG já que o conselheiro titular
81
representante da SMSAPG não compareceu a nenhuma das cinco reuniões do segundo
semestre. A representação da SMSAPG deu-se através de pessoas responsáveis pela
apresentação de projetos de saúde ou em busca da aprovação dos relatórios de gestão.
Ao analisar o conteúdo das atas, verificamos o registro de alguns dos problemas
destacados nos depoimentos dos conselheiros entrevistados, a respeito da relação entre a SMS
e o CMSG. A falta de um profissional qualificado para atuar como secretário executivo do
CMSG e a demora no repasse de informações são exemplos desses problemas. No entanto,
outros elementos dessa relação emergem das atas, como a ausência do conselheiro titular da
SMS nas reuniões do CMSG, o não atendimento das solicitações do conselho por parte do
secretário municipal de saúde, a não homologação da resolução de 19/12/2007 e a ausência
dos gestores nas reuniões dos conselhos locais. Em conjunto, essas situações repõem o tema
do desinteresse da SMS com relação ao CMSG, nos mesmos termos expressos pelos
conselheiros.
Nas análises dos conteúdos das atas do CMSAPG também constatamos a
indiferença da SMSAPG para com suas atribuições. Em geral, as ações do conselho têm se
limitado a: apreciação das prestações de contas da secretaria e dos projetos elaborados por ela,
sendo que os relatórios de gestão são enviados com prazo exíguo para a realização das
reuniões do Conselho, sem que este tenha tempo hábil para apreciá-los. A criação das
comissões de fiscalização visava agilizar o processo de análise dos relatórios de gestão, no
entanto, a secretaria não tem enviado os relatórios com prazos adequados. Outro ponto de
destaque nas relações entre o CMSAPG e a SMSAPG diz respeito ao descumprimento das
deliberações encaminhadas pelo Conselho. Na ata do dia 30/09/2010, o plenário deliberou a
equiparação salarial do secretário executivo e a contratação de um auxiliar administrativo.
Entretanto, passaram-se três meses e esta deliberação ainda não havia sido cumprida pela
SMSAPG.
A observação passiva no I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Goiânia e na
Reunião Ordinária de novembro de 2010.
De 25 a 27 de novembro de 2010 foi realizado o I Seminário de Capacitação de
Conselheiros de Saúde de Goiânia, no auditório da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e
no SINDSAÚDE. A programação contemplou os seguintes temas: a história e os princípios
do SUS, o controle social no SUS em Goiânia, o poder do conselho e atribuições dos
conselheiros por segmento e o planejamento e atividade do Conselho Municipal de Saúde. O
82
seminário contou com uma boa estrutura física e material e teve grande procura entre os
conselheiros, em especial, entre os conselheiros locais.
Assim como na análise do conteúdo das entrevistas, buscamos registrar os
elementos que evidenciassem o tipo de relação estabelecida entre a SMS e o CMSG. A
primeira constatação foi a ausência do prefeito e do secretário municipal de saúde no
seminário.
Nos momentos de debates, os participantes questionaram o fato de o então
secretário municipal da saúde estar ligado a interesses privados, já que o mesmo é dono de
hospital particular em Goiânia. Este é um dos pontos levantados no seminário, que pode ser
considerado como um entrave à consolidação do SUS. Para os conselheiros, o cargo de
secretário municipal de saúde deveria ser um cargo eletivo e não uma escolha de cunho
político. Alguns deles denunciaram ainda o fato de existir um grande montante de verba
paralisada durante a gestão de Paulo Rassi.
Outro ponto levantado pelos conselheiros durante o debate diz respeito a
dificuldade do CMSG em fazer com que a secretaria cumpra suas deliberações. A orientação
de um dos palestrantes é que o conselho invista em sua capacidade de negociação, já que
existe uma dependência mútua entre a SMS e o CMSG. Estas duas discussões foram
consideradas relevantes dentre os assuntos que permearam o seminário durante a observação
participante realizada. Isto porque auxiliam na compreensão da relação entre a SMS e o
CMSG.
Observação nas reuniões ordinárias no CMSG e no CMSAPG
No dia 30 de novembro de 2010 foi realizada a Reunião Ordinária do CMSG do
no auditório da FUNASA, que começou com um atraso de mais de uma hora e meia, por falta
de quorum. Esta reunião contou com a presença de um grande número de conselheiros locais
que haviam participado do I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Saúde, evento
ocorrido na semana antecedente.
No momento de encaminhamento das comissões reapareceram questões presentes
nas reuniões anteriores a exemplo da cobrança por uma secretaria executiva, a demora do
secretário de saúde em repassar o relatório de gestão e a falta de documentos requeridos à
SMS em junho e recebidos somente em setembro.
A Comissão de Finanças relatou o atraso na prestação de contas do Fundo
Municipal de Saúde - FMS, exemplificando que a aprovação do orçamento do trimestre de
83
2009 foi realizada com um ano de atraso. Devido a falta de documentos comprobatórios das
despesas, o presidente sugeriu que o relatório não fosse aprovado com ressalvas.
Do mesmo modo, a Comissão de Pareceres e Projetos queixou-se de que a SMS
não tenha enviado um representante para esclarecer sobre o projeto de expansão do Programa
de Saúde da Família - PSF. Em virtude de divergências entre a apresentação do representante
da SMS e o material impresso sobre o projeto conselheiro foi sugerido que a apresentação
fosse cancelada até que todos os conselheiros tenham acesso ao projeto correto.
Para finalizar a reunião, o presidente do CMSG afirmou que os representantes
titulares dos gestores da secretaria não estavam comparecendo às reuniões, e que em virtude
disto, deveria ser encaminhado um comunicado ao secretário de saúde e ao prefeito
solicitando a substituição dos conselheiros.
Em relação ao CMSAPG, participamos de duas de suas reuniões ordinárias, uma
realizada no mês de setembro e outra em dezembro de 2010. As reuniões ordinárias são
realizadas na Escola de Governo de Aparecida de Goiânia, que possui uma estrutura física
adequada para a atividade.
Na reunião ordinária de setembro foi possível identificarmos algumas tensões na
relação entre o CMSAPG e a SMSAPG já citados anteriormente, como por exemplo, a
possível omissão de informações por parte da SMSAPG ao enviar o relatório de gestão
relativo aos exercícios fiscais de 2009. Diante disto, a assembleia não aprovou o relatório
solicitando à SMSAPG que enviasse novo documento com a discriminação dos gastos
efetuados.
Ainda nessa reunião a SMSAPG enviou o projeto de implantação da política de
atenção integral à saúde do homem no município de Aparecida de Goiânia para ser apreciado
pelo CMSAPG. O projeto se encontrava pronto quando foi remetido ao Conselho,
necessitando apenas ser apreciado e aprovado. No entanto, a secretaria não havia o enviado
com antecedência adequada para ser analisado pelo CMSAPG. Houve, em seguida, a decisão
coletiva de não aprovar qualquer projeto apresentado pela SMSAPG até que fosse apresentada
a documentação completa que comprovasse as despesas do Centro de Apoio ao Doente de
AIDS (CADA) financiadas pela SMSAPG. O presidente do CMSAPG prestou
esclarecimentos aos conselheiros na direção de conscientizá-los para o fato de que são
corresponsáveis pela política de saúde do município. Então, a partir desta premissa, ficou
explicado que caso o Conselho aprovasse o relatório sem a documentação necessária, o
mesmo teria que responder legalmente por este ato. Outro agravante apresentado foi o fato de
84
que esta situação não é provável de acontecer com o gestor, pois este possui o amparo da
procuradoria.
Para o presidente do CMSAPG a alta rotatividade de funcionários dentro da secretaria
é responsável pela falta informação e de documentos necessários ao trabalho dos conselheiros.
No entanto, um conselheiro expôs sua opinião que é baseada na ideia de que a Secretaria
Municipal de Saúde não empenha a seriedade necessária à atuação do Conselho.
Na reunião ocorrida em novembro de 2010, reapareceu a questão da prestação de
contas do Centro de Apoio ao Doente de AIDS (CADA). A SMSAPG enviou representantes
do seu setor de epidemiologia para prestar contas das despesas do CADA durante o ano de
2009. Membros da comissão responsável por analisar o relatório apresentado pela secretaria
denunciaram que os representantes citados se apresentaram com um curto prazo para o início
da atividade, fato agravado pelo fato de estarem desorganizados e sem os documentos das
despesas do ano de 2008. Diante de todas estas ocorrências, o presidente do Conselho
ameaçou encaminhar o relatório ao Ministério Público para providências.
Em outro ponto de pauta, devido à insistência de uma representante de outro setor da
SMSAPG, foi apresentada a proposta de construção das Unidades de Pronto Atendimento
Ambulatorial - UPA -, que visam atender, segundo o projeto, casos de urgência nos setores
Brasicon, Buriti Sereno e Maranata.
A plenária desse dia ficou esvaziada e antes do término da reunião muito conselheiros
já haviam se retirado do local.
Diante dos resultados da pesquisa apresentados acima, é possível identificar o tipo
de ação consumada pelo Estado, aqui compreendido como a Secretaria Municipal de Saúde de
Goiânia e a Secretaria Municipal de Saúde de Aparecida de Goiânia, como uma ação relutante
em compartilhar o poder de decisão sobre os rumos da política municipal de saúde com os
seus respectivos conselhos. Tais resultados serão discutidos adiante.
4.2. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE
GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA
Argumentamos que o Estado possui um papel preponderante para a efetividade dos
conselhos municipais. Com isso não pretendemos concluir que a ação do Estado seja a única
responsável na definição da natureza política dos conselhos municipais, em particular dos
conselhos municipais de saúde, mas ressaltar sua centralidade devido ao grande impacto que
sua condução provoca nos processos de democratização dos espaços públicos.
85
Diante disso, estabelecemos uma classificação ideal de ações que corresponderiam ao
desempenho de um gestor comprometido com a democratização dos espaços públicos de
deliberação, isto é, dos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de
Goiânia. Essa classificação constitui o parâmetro a partir do qual podemos lidar
analiticamente com as ações do Estado materializadas nos gestores municipais de saúde dos
municípios aqui estudados. No quadro abaixo demonstramos o comparativo entre as dos
gestores comprometidos com a democratização das decisões políticas com as ações das
Secretarias Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia, relatadas nos
depoimentos dos conselheiros, na observação descritiva e nas atas das reuniões dos conselhos.
QUADRO 6: COMPARATIVO DAS RELAÇÕES DAS SECRETARIAS MUNICIPAIS
DE SAÚDE COM OS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE
APARECIDA DE GOIÂNIA
ITENS
AÇÕES IDEAIS
AÇÕES DA SMS
AÇÕES DA SMSAPG
Estrutura física Garantir estrutura
física adequada.
Garantiu uma estrutura
física adequada.
Não garantiu uma
estrutura física
adequada.
Pessoal
administrativo
Garantir pessoal
administrativo.
Falta secretário
executivo.
Possui pessoal
administrativo
inadequado.
Orçamento
próprio
Garantir autonomia
orçamentária.
Não possui verba
própria.
Não possui verba
própria.
Informações
Livre acesso às
informações da
secretária.
Demora no repasse de
informações, tentativa
de sonegação.
Controle das
informações com
destinação de apenas
20% das mesmas para
apreciação do CMSAPG.
Política
Municipal de
saúde
Elaboração
conjunta da Política
Municipal de
Saúde.
Os projetos são
encaminhados prontos
para apreciação do
Conselho.
Os projetos são
encaminhados prontos
para apreciação do
Conselho.
Deliberações
Homologar as
deliberações do
conselho.
Resistência em
homologar as decisões
do Conselho.
Demora a homologar as
decisões do Conselho.
Relação entre a
secretaria e o
conselho.
Relação de
cooperação.
Relação conflituosa e
tensa. Divergência de
concepções políticas.
Ausência dos
representantes titulares
do governo nas
reuniões e eventos do
Conselho.
Relação conflituosa e
tensa. Divergência de
concepções políticas.
Ausência dos
representantes titulares
do governo nas reuniões
do Conselho.
86
As ações ideais propostas acima constituem o resultado do esforço para instituir nessa
dissertação um tipo puro que nos viabilize alcançar determinados traços da realidade, mas
que, conforme Weber, não possuem correspondente na realidade (WEBER, 1979). Nesse
caso, procuramos realçar ações que corresponderiam ao esperado de um gestor comprometido
com a democratização da gestão de saúde.
Ao estabelecer uma comparação entre as ações ideais e as práticas dos secretários de
saúde nos municípios, estudados notamos que, de um modo geral, suas ações mostram uma
tendência contrária a democratização do poder decisório. Nos itens avaliados, as ações dos
gestores dos dois municípios parecem limitar o poder deliberativo e fiscalizador do CMSG e
do CMSAPG, ao ponto de desvalorizar e reduzir suas atribuições relativas ao seu papel
consultivo previsto em lei.
Fernandes e Bonfim (2005) argumentam, baseando-se em autores do pensamento
clássico brasileiro (Oliveira Vianna e Vitor Nunes Leal), que a vida política municipal sempre
foi dotada de um caráter vertical nas relações entre governantes e governados. Embora os
autores adotem uma postura mais otimista em relação a democratização da gestão municipal,
atitudes como a omissão e o controle de informações e a resistência em acatar as deliberações
dos Conselhos são constantemente reiteradas nos estudos sobre os processos participativos
(DAGNINO, 2002: MOREIRA E ESCOREL, 2009: PESSANHA, CAMPAGNAC E
MATOS, 2006).
Diante do exposto, como qualificar a ação do Estado nos municípios de Goiânia e de
Aparecida de Goiânia? Como vimos nos discursos dos conselheiros e nas observações
realizadas nas reuniões e no seminário, é possível reiterar aqui o pressuposto de definir a ação
do Estado como uma ação concentradora de poder. Embora amparados por leis federais,
estaduais e municipais que garantem sua legitimidade, o CMSG e o CMSAPG têm enfrentado
obstáculos na democratização da gestão municipal que são impostos por suas respectivas
secretarias.
Entretanto, uma vez caracterizada a ação do Estado é necessário verificar suas
motivações, haja vista que nossa hipótese sustenta que a orientação político-ideológica do
gestor público pode nortear sua vontade política e, consequentemente, conduzir ações
favoráveis ou desfavoráveis ao sucesso das práticas participativas.
87
As motivações para a ação do Estado nos municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia
Ponderamos que a vontade política do governante está estreitamente vinculada ao
seu posicionamento político-ideológico. Por “vontade política” entendemos o
comprometimento político com uma causa ou crença que motiva suas ações em prol desta
causa, ou seja, as motivações de ordem valorativa que condicionam sua ação.
Diante disso, realizamos uma caracterização do gestor municipal em Goiânia e em
Aparecida de Goiânia, no intuito de identificar suas orientações político-ideológicas e, assim,
compreender as motivações para suas ações.
Ao assumir a segunda gestão da prefeitura da cidade de Goiânia (2009-2012), o
então prefeito, Iris Rezende (PMDB), nomeou o médico Paulo Rassi para a pasta da
Secretaria Municipal de Saúde, sendo que na época da nomeação o médico era presidente do
Sindicato dos Hospitais do Estado de Goiás23
.
A família Rassi foi uma das pioneiras na área da saúde privada no Estado de
Goiás. No ano de 1944, Alberto Rassi fundou a Casa de Saúde Dr. Rassi. Os irmãos Rassi
construíram ainda o Hospital Geral de Goiânia e o Hospital São Salvador que leva o nome de
Alberto Rassi.
Em abril de 2010, Iris Rezende deixou o governo de Goiânia para disputar a
eleição para Governador do Estado de Goiás. Assumiu a prefeitura da capital o médico Paulo
Garcia (PT), que promoveu mudanças na equipe do governo. Paulo Rassi deixou a SMS e o
secretário municipal de saúde nomeado foi Elias Rassi24
, médico e professor assistente da
Universidade Federal de Goiás. Elias Rassi já ocupou anteriormente o cargo de secretário de
saúde 25
no mandato de Nion Albernaz (PSDB), de 1997 a 2000.
Em Aparecida de Goiânia, o prefeito Maguito Vilela (PMDB) nomeou o médico
Cairo Louzada como Secretário Municipal de Saúde. Louzada permaneceu por poucos meses
na secretaria, pois precisou se afastar para tratar de um câncer que o levou a óbito. O médico
Rafael Nakamura ocupou interinamente o cargo de secretário municipal de saúde durante o
23
http://www.jornaldaimprensa.com.br/Editorias/1204/Secretariado-de-Iris-tem-perfil-jovem 24
http://www.portal730.com.br/noticias/politica/16983-prefeito-paulo-garcia-anuncia-mudancas-no-
secretariado.html 25
http://meduardosantana.wordpress.com/2011/01/26/elias-rassi-neto-secretario-municipal-de-saude-de-goiania-
no-governo-de-paulo-garcia/
88
afastamento do titular e pouco tempo depois, em junho de 2010 foi empossado26
como titular
da pasta.
Tanto a cidade de Goiânia quanto a de Aparecida de Goiânia, durante o decorrer
deste estudo, conviveram com prefeitos do PMDB. Em Aparecida de Goiânia, o governo
peemedebista corresponde a todo o período da pesquisa e em Goiânia, o governo do partido
citado se estendeu até março de 2010. O PMDB é classificado ideologicamente, pela
literatura, como um partido de centro ou de centro direita (RODRIGUES, 2002). Segundo
Reis (2010), o PMDB tem mantido uma postura excessivamente clientelista e pragmática nos
enfrentamentos eleitorais da última década.
Em Goiás, a imagem do PMDB sempre esteve associada à de um de seus
principais líderes, Iris Rezende. A história política de Iris Rezende Machado data do final dos
anos 50. Segundo Cunha (2008), ao longo desse período, Iris forjou-se como um político
centralizador, reproduzindo práticas políticas de caráter tradicionalistas. Iris Rezende
“construiu um estilo próprio de fazer política, que mescla a visão de que o Estado é
fomentador do processo de desenvolvimento econômico, mas também a de um Estado ausente
da economia quando a iniciativa privada pode ser mais competente que o Poder Público”
(Cunha, 2008, p.38).
Diante do exposto podemos considerar que a vontade política de Iris Rezende se
fundamenta numa concepção verticalizada do poder político, na qual cabe ao governante
decidir e aos governados acatar. Nessa visão política, práticas como o clientelismo político, o
autoritarismo administrativo, o controle das informações e a concentração de poder são
recorrentes.
Assim, o presente estudo sobre a relação da SMS e da SMSAPG, respectivamente
com o CMSG e com o CMSAPG, no que diz respeito à divisão do poder decisório, nos
permitiu identificar o tipo de ação praticada pelo Estado quanto à democratização da gestão
municipal no setor da saúde em Goiânia e em Aparecida de Goiânia. Verificamos que nos
dois municípios a ação do Estado pode ser qualificada como uma ação concentradora de
poder motivada por uma concepção política verticalizada.
Diante disso, nota-se que o processo de ampliação do demos na pólis é marcado
por ambuiguidades. Embora, os conselhos sejam considerados novidades institucionais
acabam por reproduzir práticas políticas tradicionais. A baixa rotatividade entre os
conselheiros pode converter-se numa espécie de elitização do cargo. Assim como, o controle
26
http://www.vitoria87fm.com.br/v1/index.php?option=com_content&view=article&id=666:maguito-empossa-
rafael-nakamura-na-secretaria-de-saude-de-aparecida-&catid=3:noticias
89
das informações e a demora no repasse de documento são problemas que podem ser
relacionados à burocracia. De modo que, elitismo e burocracia, temas que perpassam a prática
democrática na conepção weberiana, nos levariam a endossar a impossibilidade de governar
por parte do demos.
Ainda no campo da ambiguidade. Os conselhos “são instrumentos de expressão,
representação e participação da população”, inseridos na esfera pública e vinculados ao poder
executivo, conforme define Gohn (2001). Nesse sentido, possuem um duplo caráter, são
instâncias de fiscalização das políticas empreendidas pelo poder executivo e ao mesmo tempo
são por ele mantidos, no que se refere a estrutura física e orçamento. São autônomos para
fiscalizar a política de saúde, mas são também dependentes dos recursos financeiros e do
repasse de informações por parte do poder executivo. Como demonstrado nesse estudo, a
dependência dos conselhos de saúde de Goiãnia e de Aparecida em relação ao executivo
municipal foi um dos elementos responsáveis pela ineficiência de sua atuação. Questão que
nos leva a indagar, até que ponto, o vínculo institucional favorece ou não a democratização
das esferas deliberativas.
Tais questões parecem evidenciar os limites relativos à democracia participativa, uma
vez que, os conselhos representam o esforço de conjugar representação e participação, isto é,
de ampliar a participação social dentro das esferas de deliberação política.
No entanto, também é possível vislumbrar nesse estudo as potencialidades da
democracia participativa. Em primeiro lugar, seu papel educativo, como defende Pateman
(1992), essa é a principal função da participação numa democracia participativa. É pelo
processo participartivo que se desenvolvem as habilidades necessárias à prática democrática.
Nas reuniões, plenárias, seminários, os conselheiros vão aprendendo as dinâmicas de
funcionamento das instituições públicas, a densenvolver argumentos e a tomar decisões
políticas.
Em segundo lugar, o desenvolvimento da criatividade dos atores sociais na perspectiva
de Santos e Avritzer (2005). Para os autores a efetividade das experiências participativas, no
nível local, resultaram da realocaçao de saberes e práticas sociais à esfere administrativa.
Nesse sentido, a experiência do CMSAPG tem muito a contribuir. A possibilidade de acionar
o Ministério Público em caso de problemas na prestação de contas da secretaria municipal de
saúde expressa uma alternativa criativa de assegurar a efetiva fiscalização das política de
saúde do município. Outro exemplo de criatividade foi a sugestão de eleição para o cargo de
secretário de saúde, assim, o cargo seria ocupado por pessoas capacitadas para exercê-lo. A
90
criatividade dos atores sociais emerge das necessidades e das constatações do cotidiano de sua
prática política e podem representar grandes avanços na democratização das esferas de poder.
Em suma, o processo de ampliação do demos na pólis é complexo e assinalado por
limites e potencialidades. Àqueles que defendem a democracia representativa sobressaem os
seus limites, já àqueles que defendem a democracia participativa sobressaem suas
potencialidades. Duas faces de uma mesma moeda, a Democracia real como pobre
aproximação do ideal democrático.
91
OBSERVAÇÕES FINAIS
O estudo realizado procurou refletir sobre um aspecto cada vez mais presente na
compreensão das relações ente Estado e sociedade. Pesquisamos cenários formados por
processos participativos na gestão pública do setor de saúde, nos municípios de Goiânia e de
Aparecida de Goiânia, assinalando desafios encontrados pelos conselheiros municipais de
saúde no processo de democratização da gestão local.
A partir da identificação dos elementos que matizaram as relações entre as secretarias
de saúde e seus respectivos conselhos, buscamos qualificar a ação do Estado bem como as
motivações que vieram a configurar a “vontade política” do gestor como um fator relevante
para a compreensão dessa nova forma política, instaurada no Brasil a partir da Constituição de
1988.
Nas duas experiências conselhistas, consideramos a ação do gestor como ação
essencialmente concentradora do poder. A falta de estrutura física e de pessoal administrativo
adequados, a falta de verba orçamentária própria, o controle das informações, o
encaminhamento de projetos acabados para mera apreciação do conselho, a resistência em
homologar suas deliberações, a ausência dos representantes titulares e do secretário de saúde
nas reuniões e eventos realizados pelo conselho exemplificam as dificuldades para que a
“partilha de poder” aconteça como componente democratizador das políticas públicas, tendo
por referência os conselhos municipais. Assim, pudemos perceber que as motivações que
orientam as ações dos gestores estudados são norteadas por uma concepção vertical do poder,
no qual a participação se dá através da seleção dos líderes políticos, nos termos de Weber, e
não no processo de elaboração, execução e fiscalização das políticas públicas.
A mera existência de arenas de participação no interior do Estado não é condição
suficiente para a democratização dos espaços de decisão política. O processo de ampliação do
demos na pólis é complexo e envolve uma série de componentes políticas (projetos políticos
divergentes) e de condições (uma sociedade civil forte e atuante) para a sua efetivação como
argumenta Dagnino. A “vontade política” do dirigente político pode contribuir para elucidar
um desses elementos que desafiam as novas instâncias de participação a criarem mecanismos
de superação de tais obstáculos (denúncias no Ministério Público, não aprovação dos
relatórios de gestão, etc.), constituindo-se em área ainda carente de estudos a respeito.
92
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em dez/2010.
96
ANEXOS
_________________________________________________________________________
ANEXO A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado (a) para participar da pesquisa AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A
AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE
APARECIDA DE GOIÂNIA, vinculada ao Programa de Pós-graduação em Sociologia da Universidade
Federal de Goiás.
Você foi selecionado(a) pelo fato de fazer parte da atual gestão do conselho municipal de saúde da cidade
de Goiânia/Aparecida de Goiânia. Sua participação contribuirá para o avanço do conhecimento das práticas
democráticas em nossas cidades, bem como para evidenciar os desafios a serem superados. Sua
participação não é obrigatória, a qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu
consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a
Universidade Federal de Goiás.
O objetivo deste estudo é averiguar o julgamento que os conselheiros representantes da sociedade e do
governo fazem a respeito das relações estabelecidas entre o Estado e o conselho no que se refere à partilha
de poder. As perguntas que vamos fazer não pretendem trazer nenhum desconforto ou risco. Sua
participação nesta pesquisa consistirá em relatar suas experiências enquanto conselheiro(a), bem como
emitir seu julgamento a respeito da dinâmica de funcionamento do conselho e das relações estabelecidas
neste ambiente.
Tais informações serão gravadas e posteriormente transcritas. Asseguramos que elas são confidenciais e
que serão utilizadas apenas para fins acadêmicos. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar
sua identificação, pois somente os pesquisadores envolvidos neste projeto terão acesso a estas informações.
Dados como nome, profissão, local de moradia, ou qualquer outro que possa lhe identificar não serão
divulgados.
Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço institucional do pesquisador
principal e do CEP, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer
momento.
______________________________________
Mestranda: Patrícia Gomes de Macedo
Estrada Goiânia-Nerópolis, caixa postal 131 – Goiânia-GO - CEP: 74001-970. (62) 3521-1100
Pró-Reitoria de Pesquisa e Graduação/UFG – Prédio da Reitoria, Térreo, Campus II – Goiânia-GO,
CEP: 74001-970. Fone: 3521-1076
Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em
participar.
_________________________________________
Sujeito da pesquisa
97
ANEXO B
ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS CONSELHEIROS DOS CONSELHOS
MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E APARECIDA DE GOIÂNIA
Data:_______________________________________
Local:______________________________________
Hora Início:_____________Término:______________
Dados básicos (econômicos, sociais, culturais e políticos)
1. Qual a entidade que o (a) Senhor (a) representa?
2. Qual o seu nome?
3. Qual a sua idade?
4. Sexo
5. Qual a sua profissão?
6. Qual o seu nível de escolaridade?
7. Qual a renda total de sua família?
8. Qual a sua religião?
Trajetória/experiência anterior de ação coletiva ou associativismo
1. O (a) Senhor (a) já participou ou possui alguma experiência anterior em outras
entidades ou movimentos sociais (ONGs, sindicados, movimentos religiosos,
associação de moradores, associação profissionais outros conselhos)?
2. O (a) Senhor (a) é filiado (a) a algum partido político? Se sim, qual? Se não, tem
simpatia por algum partido político?
3. Há quanto tempo o (a) Senhor (a) participa como conselheiro (a) do Conselho de
Saúde?
Questões sobre a dinâmica de funcionamento do Conselho de Saúde
1. O que motivou sua participação neste Conselho?
2. Em sua opinião qual a sua principal função como membro do Conselho? E quais
98
as outras funções?
3. Como você foi indicado para participar do Conselho? Você acha que representa o
segmento que o indicou para o Conselho? Se sim, como você faz esta
representação?
4. Como o (a) Senhor (a) analisa a questão da participação popular na elaboração e
no controle da política municipal de Saúde em seu município?
5. Na sua percepção, qual tem sido o impacto da existência e da atuação do Conselho
para a formulação das Políticas de Saúde, no Controle Social? De que modo o
Conselho tem atuado na formulação das Políticas e no controle delas?
6. Em sua opinião, os conselheiros estão preparados para debater e decidir sobre os
assuntos de Saúde da população? O que você espera da sua participação enquanto
conselheiro de saúde?
7. As decisões tomadas são de natureza colegiada?
8. O Conselho tem acesso a todas as informações de que necessita para deliberar?
9. Pra você qual é o papel do Conselho de Saúde?
10. Qual a relação do Conselho de Saúde com a Secretaria de Saúde de
Goiânia/Aparecida? Como você acha que deve ser esta relação?
11. Como você avalia a atuação do poder municipal (Estado) frente ao Conselho de
Saúde? Exemplifique.
12. Quais os principais temas, que em sua opinião devem ser tratados nas reuniões do
conselho?
13. A Secretaria tem assegurado a estrutura de funcionamento do Conselho? O
Conselho tem uma sede e pessoal administrativo?
14. Além dos segmentos representados outras organizações ou interesses também
participam das reuniões do Conselho? Se sim, quando?
15. Quais os mecanismos utilizados pelo Conselho de Saúde para a definição de
agenda e/ou hierarquia de prioridade dos problemas da população?
16. Como são as reuniões do Conselho? Como é definida a pauta? Como são
encaminhadas as deliberações?
17. O Conselho tem trabalhado com as decisões da Conferência Municipal de Saúde?
Em que medida? São feitos checagens e balanços periódicos nesse sentido?
18. Em sua opinião, existem interferências político-partidárias nos Conselhos de
Saúde do em seu município? Se houver, quais as formas mais comuns dessas
interferências? Quais as consequências, no seu modo de ver?