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9 UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA MESTRADO EM SOCIOLOGIA AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA Autora: Patrícia Gomes de Macedo Orientador: Prof. Dr. Pedro Célio Alves Borges GOIÂNIA 2011

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9

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA

MESTRADO EM SOCIOLOGIA

AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO

NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E

DE APARECIDA DE GOIÂNIA

Autora: Patrícia Gomes de Macedo

Orientador: Prof. Dr. Pedro Célio Alves Borges

GOIÂNIA

2011

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PATRÍCIA GOMES DE MACEDO

AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO

NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E

DE APARECIDA DE GOIÂNIA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade de

Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás,

como um dos requisitos para obtenção do título de

Mestre em Sociologia, sob orientação do Prof. Dr.

Pedro Célio Alves Borges.

GOIÂNIA

2011

11

PATRÍCIA GOMES DE MACEDO

AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A AÇÃO DO ESTADO

NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E

DE APARECIDA DE GOIÂNIA

Dissertação defendida e aprovada em 29 de Setembro de 2011, pela banca

examinadora constituída pelos professores:

______________________________________________

Prof. Dr. Pedro Célio Alves Borges/ UFG

Presidente da Banca

______________________________________________

Prof. Dra. Maria Francisca Pinheiro Coelho/ UNB

______________________________________________

Prof. Dr. Djaci David de Oliveira/ UFG

______________________________________________

Prof. Dra. Dalva Maria Borges L. D. de Souza/UFG

12

RESUMO

Com a promulgação da Constituição de 1988, foram criados espaços institucionalizados de

participação que possuem sua existência vinculada à exigência da legislação (federal, estadual

e municipal) como, por exemplo, os conselhos gestores e os planos diretores. A literatura

aponta que a efetividade dos processos participativos está estreitamente relacionada ao

comprometimento político do governante com a democratização da gestão pública.

Orientados pela abordagem qualitativa dos processos sociais, procuramos compreender a ação

do Estado, particularizado nas gestões dos municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia,

diante das modificações implementadas em seus monopólios sobre os meios de administração

através dos arranjos participativos, neste caso os conselhos municipais de saúde, identificando

o tipo de relação estabelecida entre as dinâmicas das duas instâncias no que tange à partilha

de poder. Ao estabelecer uma comparação entre as ações ideais e as ações praticadas pelos

secretários de saúde dos municípios estudados notamos que, em geral, as ações mostraram

uma tendência contrária a democratização do poder decisório. Com base no que foi verificado

nos discursos dos conselheiros municipais de saúde e nas observações participantes,

conseguimos definir a ação do Estado como uma ação concentradora de poder motivada por

uma concepção política verticalizada.

Palavras-chave: Conselhos Municipais de Saúde, Ação do Estado, Partilha de Poder.

13

ABSTRACT

With the enactment of the 1988 Constitution were created spaces for participation

that have institutionalized their existence coupled with the requirement of

legislation (federal, state and municipal), for example, the management councils

and the master plans. The literature suggests that the effectiveness of participatory

processes is closely related to the ruler's political commitment to the

democratization of public management. Guided by the qualitative approach of the

social processes we seek to understand the action of the state, private managements

in the cities of Goiânia and Aparecida de Goiania, given the changes implemented

in its monopoly over the means of administration through the participatory

arrangements, in this case the municipal health councils identifying the type of

relationship established between the dynamics of two bodies with regard topower

sharing. By establishing a comparison between the ideals and actions the actions

taken by the secretaries of health in the cities studied have noticed that, in general,

their actions showed a bias against the democratization of decision-making. Based

on what was found in the speeches in the comments of directors and participants

can define state action as an action motivated by concentrating power in a vertical

design policy.

Keywords: Municipal Health Councils, State Action, Power-Sharing.

14

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................................................09

1. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DEMOCRACIA DIRETA................................................................12

1.1 DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO......................................................................................................13

1.1.1. Democracia e participação no pensamento social clássico.........................................................13

1.2 A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA......................................................................................................14

1.2.1. A Democracia participativa para Pateman...................................................................................14

1.2.2. As concepções contra-hegemônicas da Democracia conforme Santos e

Avritzer.........................15 1.3 A COMBINAÇÃO DOS MODELOS DE DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DE DEMOCRACIA DIRETA.............................................................................................................................17

1.4. DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA E EXPERIÊNCIA CONSELHISTA NO BRASIL………..……………..............19

1.4.1. Descentralização: problematizando o

consenso............................................................................20 1.4.2. Descentralização política no Brasil: o caso dos conselhos de políticas.......................................22

2. CONSELHOS MUNICIPAIS DE POLÍTICAS: BREVE SÍNTESE DAS EXPERIÊNCIAS NO BRASIL PÓS-1988..............................................................................................................................24

2.1. ESTADO E SOCIEDADE CIVIL: CONFLITOS E PARTILHA DE PROJETOS POLÍTICOS……………………....29

2.2. A AÇÃO DO ESTADO NO CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE CURITIBA.....................................33

3. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS..................................................................................................38

3.1. A REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA.......................................................................................41

3.2. A OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GsOIÂNIA E APARECIDA DE GOIÂNIA.................................42

3.2.1. A oferta de serviços de saúde em Goiânia………………………………………………………………………………..44

3.2.2. As origens da cidade de Aparecida de Goiânia e a questão da saúde pública..............................47

3.3. PROCEDIMENTOS DE COLETA E DE ANÁLISE DOS DADOS...............................................................52

A observação pasiva……...................................................................................................................52

Entrevistas com os conselheiros do CMSAPG e do CMS....................................................................53

Análise documental...........................................................................................................................53

Aspectos éticos……………………………………………………………………………………………...................................54

4. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA ................... .....................................................63

4.1. ENTREVISTAS COM OS CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA............................................................................................55

15

Perfil dos conselheiros entrevistados................................................................................................57

Contextualização...............................................................................................................................59

Análise temática das

entrevistas.......................................................................................................60 Atuação do conselho e dos conselheiros............................................................................................60

A relação com a Secretaria Municipal de Saúde................................................................................63

A ação democratizadora do CMSG e do CMSAPG.............................................................................67

Entraves à atuação dos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia…....68

4.1.2 Considerações sobre as atas e a observação passiva.....................................................................70

A observação participante no I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Goiânia e na Reunião Ordinária de novembro de 2010................................................................................................72 Observação participante nas reuniões ordinárias no CMSG e no CMSAP..........................................73

4.2. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA........................................................................................................75

As motivações para a ação do Estado nos municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia………85

OBSERVAÇÕES FINAIS....................................................................................................................82

REFERÊNCIAS.................................................................................................................................83

ANEXOS..........................................................................................................................................87

16

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1: SÍNTESE DAS EXPERIÊNCIAS CLÁSSICAS COMUNAIS.

QUADRO 2: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GOIÂNIA – 2005.

QUADRO 3: CASOS DE DOENÇAS REGISTRADAS ENTRE A POPULAÇÃO DE

GOIÂNIA ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.

QUADRO 4: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM APARECIDA DE GOIÂNIA NO

ANO DE 2005.

QUADRO 5: CASOS DE DOENÇAS REGISTRADAS ENTRE A POPULAÇÃO DE

APARECIDA DE GOIÂNIA ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.

QUADRO 6: COMPARATIVO DAS RELAÇÕES DAS SECRETARIAS

MUNICIPAIS DE SAÚDE COM OS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE

GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA

17

LISTA DE SIGLAS

CMSC – CONSELHOS MUNICIPAL DE SAÚDE DE CURITIBA

CMSG – CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE GOIÂNIA

CMSAPG – CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE APARECIDA DE GOIANIA

SMS – SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE GOIÂNIA

SMSAPG – SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE APARECIDA DE GOIANIA

18

INTRODUÇÃO

_________________________________________________________________________

Por mais de duas décadas o interesse analítico sobre os conselhos municipais de

políticas mostra-se crescente entre os cientistas sociais. O expressivo contingente de artigos,

monografias e dissertações, bem como a presença temática em diversos congressos1,

seminários, fóruns, etc., são evidências de sua estima entre os pesquisadores de diversas

inspirações (Avritzer, 2008; Dagnino, 2002; Lubambo e Miranda, 2007; Fuks, 2005; Santos

Jr., Ribeiro e Azevedo 2004; Santos, 2002, etc.).

A temática dos conselhos se inscreve num amplo debate acerca das

potencialidades e limites da democracia participativa, em especial na vertente deliberativa, e

da coexistência das práticas de representação e participação. Tal debate é marcado por

ceticismos e otimismos sobre os efeitos democratizantes dos conselhos, entendidos como

instrumentos de participação direta na elaboração, execução e fiscalização das políticas

públicas.

No Brasil, com a promulgação da Constituição de 1988, foram criados espaços

institucionalizados de participação que possuem sua existência vinculada à exigência da

legislação (federal, estadual e municipal) como, por exemplo, os conselhos gestores e os

planos diretores. Os conselhos gestores, existentes pelo país, envolvem práticas de

participação direta na gestão das políticas públicas nas áreas da saúde, educação, dos direitos

das crianças e dos adolescentes, na questão da mulher, da cultura, da habitação, etc.

O potencial legitimador das decisões governamentais que contam com o maior

envolvimento dos cidadãos e das organizações da sociedade civil nos processos decisórios

favorece a adoção de instrumentos de participação direta como uma importante estratégia de

gestão pública municipal2, independentemente da orientação político-ideológica a que o

1 O tema dos conselhos tem presença garantida em dois dos grandes eventos de divulgação de pesquisa entre os

cientistas sociais, que são os promovidos pela ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

Ciências Sociais e pela SBS (Sociedade Brasileira de Sociologia). 2 Conforme Nogueira (2004), a participação já não é mais pensada como reverso da representação ou como

instrumento privilegiado de pressão popular, mas como expressão de práticas sociais democráticas interessadas

em superar os gargalos da burocracia pública e em alcançar soluções positivas para os diferentes problemas.

Nogueira sustenta que o novo status adquirido pela participação no campo da gestão pública se deve a uma série

de fatores, entre os quais destaca: as exigências da modernidade radicalizada e da globalização capitalista; a

19

gestor se filie. No entanto, a prática política tem demonstrado que apesar do caráter

democrático de mecanismos de ampliação da participação popular, como é o caso dos

conselhos gestores, nem sempre a implementação destes resulta em democratização da gestão

pública.

A literatura aponta que a efetividade dos processos participativos está

estreitamente relacionada ao comprometimento político do governante com a democratização

da gestão pública (AVRITZER, 2008). Nesse sentido, a vontade política do gestor municipal3

é uma variável importante para aferir a efetividade dos conselhos. Argumenta-se que a

vontade política do governante, compreendida como elemento norteador de sua ação, é

fortemente influenciada por seu posicionamento político-ideológico. Entretanto, esta é uma

questão pouco explorada nas análises sobre os processos participativos.

Com base em tais considerações, este estudo se propõe a investigar a ação do

Estado, particularizado na instância municipal, no que tange à partilha de seu poder

deliberativo. Buscamos caracterizar e compreender o tipo de relação estabelecida entre Estado

e os conselhos municipais de saúde de Goiânia e Aparecida de Goiânia, bem como as

variáveis que interferem nessa relação.

A dissertação está estruturada em quatro capítulos. No primeiro capítulo

apresentamos as bases teóricas da democracia. Buscamos situar a discussão no campo de

debates sobre os novos arranjos democráticos em favor da ampliação da participação. A

primeira seção trata da questão da participação e de sua ampliação entre os teóricos clássicos

das ciências sociais. A segunda seção refere-se ao processo de descentralização política e da

experiência conselhista na cena política brasileira instituída a partir de 1988.

No segundo capítulo exploramos o modo como a literatura tem abordado a

questão da participação, via conselhos de políticas, após duas décadas de sua implementação

no Brasil. Primeiramente, discutimos os elementos considerados pela agenda de pesquisa

como determinantes aos estímulos da participação. Em seguida, abordamos as relações entre

Estado e sociedade nos estudos científicos recentes e as variáveis que interferem nestes. E por

fim, almejando justificar nossa hipótese, selecionamos um estudo de caso no qual buscamos

caracterizar a ação do Estado no que diz respeito à partilha de seu poder decisório.

O terceiro capítulo relaciona-se à metodologia e aos métodos adotados por este

estudo. Adotamos a abordagem qualitativa, no intuito de melhor compreender a ação do

insatisfação social com a gestão pública; a campanha contra o Estado (o público é inferior ao privado); aos

avanços tecnológicos, etc. 3 O termo gestor municipal se refere ao governante do dia, ou seja, o prefeito em exercício.

20

Estado, circunscrito às secretarias municipais de saúde dos municípios de Goiânia e de

Aparecida de Goiânia, quanto à divisão de seu poder decisório em virtude da inserção dos

conselhos municipais de saúde como órgãos de caráter misto com a finalidade de elaborar,

deliberar e fiscalizar a política pública de saúde. Para tanto, realizamos entrevistas com os

conselheiros, analisamos atas e regimentos internos dos conselhos de saúde dos dois

municípios, bem como utilizamos da técnica da observação participante nas reuniões destes.

No quarto capítulo apresentamos os resultados da pesquisa empreendida com os

conselhos municipais de saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia. Discorremos sobre os

depoimentos dos conselheiros com base em quatro eixos temáticos que compuseram o roteiro

de entrevista. Em seguida, expomos a interpretação do conteúdo das atas e do regimento

interno dos conselhos e descrevemos os elementos mais significativos da observação

participante realizada nas reuniões dos conselhos e no I Seminário de Capacitação de

Conselheiros de Goiânia. Após esta fase, debatemos os resultados obtidos. No primeiro

momento focalizamos em nossa compreensão a ação do Estado nesses dois municípios na

tentativa de comprovar ou de refutar nossa hipótese. Em seguida procuramos estabelecer um

paralelo com a literatura especializada, buscando identificar as semelhanças e diferenças do

experimento conselhista em Goiânia e em Aparecida de Goiânia com as experiências

nacionais.

Por último, apresentamos nossas observações finais. Fazemos um balanço da ação

do Estado empreendida em Goiânia e em Aparecida de Goiânia na área da saúde e sugerimos

uma agenda de pesquisa que venha ampliar a compreensão acerca dos processos

participativos.

21

PRIMEIRO CAPÍTULO

_______________________________________________________

1. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E DEMOCRACIA DIRETA

O embate teórico-político entre a eficiência do modelo democrático representativo

versus a eficiência do modelo democrático direto tem sido frutífero para o avanço da

compreensão das democracias contemporâneas nas ciências sociais. De um lado, a

democracia representativa sustenta-se no argumento da inevitabilidade da representação nas

condições das sociedades modernas, regidas pela complexidade da vida industrial e tendo em

vista a dimensão e a complexidade dos estados modernos. As deliberações que dizem respeito

à coletividade são tomadas por representantes eleitos para este fim. No último quartel do

século XX o status hegemônico da democracia representativa é colocado à prova. A perda de

confiança nos políticos, o descrédito das instituições políticas, a perda de centralidade dos

partidos políticos como ordenadores das preferências do eleitorado, assim como a

incapacidade das instituições representativas de incorporar as novas questões (da mulher, do

meio ambiente, étnicas, etc.) à sua agenda política são responsáveis pela “crise do modelo

representativo”.4

De outro lado, o modelo da democracia direta em sua concepção clássica

caracteriza-se pela participação dos cidadãos nas decisões que lhes dizem respeito. A

participação direta da população nas deliberações possibilita a representação das diversas

identidades coletivas, a legitimidade das decisões, o maior controle sobre as ações do governo

e o aprendizado político dos cidadãos. No entanto, sua aplicabilidade torna-se inviável diante

da complexidade de relações sociais em sociedade globalizadas. Vejamos como os clássicos

4 Habermas (1997, p. 18) argumenta que as sociedades democráticas no capitalismo tardio estão passando por

uma crise de legitimação. Advoga que: “O âmago da política deliberativa consiste numa rede de discursos e de

negociações, a qual deve possibilitar a solução racional de questões pragmáticas, morais e éticas, que são

precisamente os problemas acumulados de uma fracassada integração funcional, moral e ética da sociedade.”

22

do pensamento social articularam os temas da democracia e da participação nas sociedades

modernas.

1.1. DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO

1.1.1. Democracia e participação no pensamento social clássico

A questão da participação e seus modos de realização remetem ao pensamento dos

clássicos da teoria social.

A democracia, no pensamento weberiano, é marcada pela interpenetração dos

temas da racionalidade, da burocracia e do elitismo. O autor argumenta que a expressão

“democratização” pode ser enganosa visto que o demos jamais governa, ao invés disso é

governado, de modo que sua participação se restringe à seleção de líderes executivos

(WEBER, 1974).

Para Weber, somos políticos ocasionais “quando votamos, ou consumamos uma

expressão de intenção semelhante, como aplaudir ou protestar num comício político, ou ao

pronunciar um discurso político, etc. Toda a relação de muitas pessoas para com a política se

limita a isso.” (1974, p.104).

Radicalizando essa mesma linha argumentativa, Schumpeter pensa a democracia

como método, com a finalidade de assegurar a liderança política nacional efetiva. Para ele, a

democracia possibilita a oportunidade de o povo escolher, aceitar ou recusar entre as elites

que se candidatam a governá-lo. Na sua percepção, a participação deve ser mínima, necessária

para favorecer a competição entre elites. A participação excessiva, do seu ponto de vista, leva

à indiferença política, haja vista a fraqueza e impulsividade do eleitorado (SCHUMPETER,

1961).

Almond e Verba são também criteriosos quanto às expressões e espaços de

participação num regime democrático. Sua tipologia clássica sobre cultura política classifica a

cultura cívica como modelo típico-ideal do bom funcionamento da democracia, na qual o

cidadão participa, mas não em excesso. Nela combinam-se elementos da cultura paroquial, de

sujeição e de participação. Para os autores, a mescla cultural é um fator positivo à

consolidação da democracia (ALMOND e VERBA, 1992).

Robert Dahl classifica as democracias contemporâneas como poliarquias, por

considerá-las pobres aproximações do ideal democrático. O autor trabalha com a hipótese de

23

que a democratização consiste em um progressivo processo de ampliação da competição

política e do direito à participação. Para ele “a democracia é fruto de um cálculo de custos e

benefícios feito por atores políticos em conflito [...] a democracia sustenta-se a partir de um

equilíbrio de forças, isto é, quando nenhum grupo social está em condições de eliminar os

demais. Sobretudo, é fruto de um cálculo de atores políticos em uma relação estratégica.”

(DAHL, 1997, p.21).

Weber, Schumpeter, Almond e Verba e Dahl representam a trajetória da corrente

teórica que restringe a participação aos limites de funcionamento das instituições

representativas. Seus modelos valorizam a participação como pressuposto democrático, mas

uma participação tendencial e necessariamente elitista e restritiva, característica do modelo

representativo.

1.2. A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

1.2.1. A Democracia participativa para Pateman

Em outro extremo situam-se os chamados “participacionistas”, herdeiros da

expectativa republicana inaugurada por Rousseau. Tendo em vista os limites do modelo de

democracia representativa, as bases dessa corrente advogam sua substituição pela democracia

direta, na qual a participação seja ampliada para além do processo eleitoral em que são

escolhidos governantes e parlamentares, e os cidadãos possam alcançar as esferas de

deliberação política. Dentre seus representantes destaca-se a teoria da democracia

participativa a que chega Pateman, após reexaminar as teorias políticas de Rousseau, Mill e

Cole.

O ponto de partida de Pateman é a afirmação central de que não se pode

considerar separadamente os indivíduos de suas instituições. Somente pelos processos

participativos é que se desenvolvem as habilidades necessárias às práticas democráticas. A

função principal da participação numa teoria de democracia participativa é, portanto,

educativa, além de seu efeito integrativo e de auxílio à aceitação de decisões coletivas mesmo

por aqueles que se sintam por elas prejudicados.

O segundo aspecto da teoria da democracia participativa diz respeito às esferas de

atuação em sociedades industriais complexas, ou seja, o local de trabalho que proporciona

adicionais ao âmbito nacional (PATEMAN, 1992). Segundo Pateman (1992, p.62): “Pode-se

caracterizar o modelo participativo como aquele onde se exige o input máximo (participação)

24

e onde o output inclui não apenas as políticas (decisões), mas também o desenvolvimento das

capacidades sociais e políticas de cada indivíduo, de forma que existe um „feedback‟ do

output para o input.”

Pateman afirma que a teoria da democracia participativa apresenta vários aspectos

que refletem os principais temas da teoria política e da sociologia política recentes. Sua

capacidade autossustentável é, sem dúvida, um atrativo a muitos pensadores políticos, além

das semelhanças que possui com as teorias recentes de pluralismo social.

1.2.2. As concepções contra-hegemônicas da Democracia conforme Santos e Avritzer

O período posterior a Segunda Guerra Mundial foi marcado pelo desenvolvimento

e materialização do elitismo democrático. Ainda assim, ao lado dessa concepção hegemônica

de democracia, fundada na representação, também floresceram concepções contra-

hegemônicas caracterizadas por uma nova gramática social e cultural e pela inovação

institucional.

De acordo com Santos e Avritzer, a democracia é uma forma sócio-histórica

insubordinada a qualquer lei natural. “A democracia constitui uma nova gramática histórica.”

(Santos & Avritzer, 2005, p.51). A democracia implica na ruptura com tradições

estabelecidas, assim como, na instauração de novas instituições, normas e leis. Essa

inconstância, produzida pela gramática democrática, se reflete para além da incerteza de quem

ocupa os postos de poder.

As teorias contra-hegemônicas redefinem o procedimentalismo, antes reduzido a

um método de constituição de governos e que agora passa a ser entendido como prática social.

Conforme Santos e Avritzer, o procedimentalismo se funda na multiplicidade de formas de

vida existentes nas sociedades contemporâneas. Numa sociedade plural é preciso que a

política conte com a anuência dos atores sociais envolvidos em processos racionais de

discussão e de deliberação. Assim sendo, o procedimento democrático passa a ser uma forma

de exercício coletivo de poder político, baseado no processo livre de debate de razões entre

iguais e não um método de autorização de governos (SANTOS & AVRITZER, 2005).

Além da reconexão entre procedimentalismo e participação, a concepção contra-

hegemônica da democracia destaca o papel dos movimentos sociais na institucionalização da

diversidade cultural. Para alguns autores da teoria dos movimentos sociais a política envolve

um debate acerca de um conjunto de significações culturais. Tal debate levou ao alargamento

25

do campo político no qual ocorreria uma disputa pela ressignificação de práticas (SANTOS &

AVRITZER, 2005). Nesse sentido,

Os movimentos sociais estariam inseridos em movimentos pela ampliação do

político, pela transformação de práticas dominantes, pelo aumento da cidadania e

pela inserção na política de atores sociais excluídos. Essa literatura sobre a re-

significação das práticas democráticas teve impacto particularmente alto na

discussão democrática na América Latina, onde ela foi associada ao problema da

transformação da gramática social (SANTOS & AVRITZER, 2005, p.53).

O processo de redemocratização nos países do Sul inseriu novos atores sociais no

cenário político, o que levou a uma disputa pelo significado da democracia e a necessidade de

uma nova gramática social. Tal fato trouxe à tona uma agenda de debates sobre a democracia

que envolveu a relação entre procedimentalismo e participação social e a questão da relação

entre representação e diversidade cultural (SANTOS & AVRITZER, 2005).

No que diz respeito à relação entre procedimentalismo e participação social, a

grande participação dos movimentos sociais nos processos de democratização resultou na

necessidade de uma nova gramática social e em uma nova relação entre Estado e sociedade. A

constituição dessa nova gramática social com o intuito de mudar as relações de gênero, de

raça, de etnia e a apropriação privada de bens públicos, implicou na adoção do

experimentalismo no próprio Estado.

Em relação ao problema de escala, as experiências participativas mais exitosas, no

nível local, resultaram da capacidade dos atores sociais realocarem saberes e práticas sociais à

esfera administrativa. De modo que o êxito das inovações institucionais se deveu a

criatividade dos atores sociais.

E, por fim, acerca da questão da representação e a diversidade cultural, é preciso

tratar sobre a ampliação do número de atores sociais envolvidos na política. Esta ampliação

permite que os grupos mais vulneráveis, os setores sociais menos favorecidos e as minorias

étnicas sejam representados no sistema político.

Concluindo, para Santos e Avritzer, a democracia participativa é um dos grandes

campos sociais e políticos que, no início do século XXI, está reinventando a emancipação

social. Na próxima seção apresentamos uma proposta de articulação entre os modelos de

democracia representativa e de democracia direta restrita a consulta popular.

26

1.3 A COMBINAÇÃO DOS MODELOS DE DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E

DE DEMOCRACIA DIRETA

Ante as lacunas apresentadas pela democracia representativa, no que se refere ao

atendimento das demandas (étnicas, de gênero, ecológicas, etc.) dos novos atores sociais

inseridos no cenário político contemporâneo, alguns teóricos têm proposto modelos de gestão

pública que articulem a democracia representativa com elementos da democracia direta.

Para Lamounier, o aumento da importância da democracia direta em relação à

democracia representativa, no Brasil se deve à crença de que a maior participação direta do

cidadão nos processos decisórios viria a conformar a “verdadeira” prática democrática.

(LAMOUNIER, 1996).

O autor argumenta que os princípios da democracia representativa estariam sendo

enfraquecidos pela chamada democracia direta:

[...] isto é, pelas pesquisas de opinião pública, pelo recurso à iniciativa popular de

legislação e a plebiscitos; por uma crescente ocupação da esfera pública pela

imprensa, com o conseqüente recuo dos partidos e organizações políticas

tradicionais; e, sobretudo pelo caráter interativo da comunicação eletrônica, que

torna possível a troca praticamente instantânea de informações e opiniões dos

cidadãos entre si e entre eles e as autoridades governamentais. (LAMOUNIER,

1996, p. 35).

No entanto, prossegue, não há razões para supor que a representação partidária

deixe de ser o suporte da organização política democrática das sociedades complexas.

Haveria, sim, um alargamento da base da democracia representativa, através da expansão do

universo dos participantes do jogo político (processo eleitoral, voto) e do fortalecimento de

funções públicas sensíveis à opinião popular.

O papel da democracia direta numa democracia representativa limita-se à consulta

popular e não ao processo deliberativo. O autor não leva em conta as novas formas

institucionais que conjugam funções consultivas e deliberativas como os Conselhos gestores,

o Orçamento Participativo, as Conferências Temáticas, etc.

Numa perspectiva semelhante, Bobbio trata das promessas não cumpridas pela

“democracia real” – em constante transformação – em contrapartida à democracia ideal,

concebida por seus formuladores. Destaca seis promessas não realizadas: 1) a passagem de

uma sociedade centrípeta (com apenas um centro de poder) para uma sociedade policêntrica

27

(com vários centros de poder); 2) em relação à representação política, a violação da proibição

do mandato imperativo (os interesses particulares se sobrepõem aos gerais); 3) a persistência

das oligarquias (a presença de elites no poder); 4) a impossibilidade de se ocupar os espaços

de decisões que afetem grupos sociais inteiros; 5) a existência de poderes invisíveis (duplo

Estado) e, 6) o cidadão não-educado. (BOBBIO, 1986)

Dessa forma, tais promessas não poderiam ser cumpridas, pois desde o início se

tratavam de ilusões. Os princípios abstratos da democracia ideal tiveram que se adaptar à

realidade. Para Bobbio, o mérito da democracia representativa está no livre debate para a

formação de maiorias, enquanto que na democracia direta a escolha se dá forçada entre duas

alternativas e desse modo atrapalharia o compromisso e favoreceria o choque.

O autor caracteriza os dois modelos. Define democracia direta nos moldes

clássicos, como: “literalmente a participação de todos os cidadãos em todas as decisões a eles

pertinentes” (Bobbio, 1986, p.42). E conceitua democracia representativa como

“genericamente que as deliberações coletivas, isto é, as deliberações que dizem respeito à

coletividade inteira, são tomadas não diretamente por aqueles que dela fazem parte, mas por

pessoas eleitas para esta finalidade” (Bobbio, 1986, p.44).

Bobbio propõe um sistema de democracia integral, no qual a democracia

representativa possa interagir com a democracia direta. Neste sistema:

“cada uma delas (a democracia representativa e a democracia direta) em

conformidade com as diversas situações e as diversas exigências, e isto

porque são perfeitamente compatíveis entre si [...]. Isto implica que, de fato,

democracia representativa e democracia direta não são dois sistemas

alternativos (no sentido de que onde existe uma não pode existir a outra), mas

são dois sistemas que podem interagir reciprocamente” (BOBBIO, 1986,

p.52).

Nessa projeção, estaríamos assistindo a um processo de democratização na

passagem da democracia política para a democracia social, ou seja, da democratização do

Estado à democratização da sociedade civil. Bobbio afirma que: “o deslocamento do ângulo

visual do Estado para a sociedade civil nos obriga a considerar que existem outros centros de

poder além do Estado. Nossas sociedades não são monocráticas, mas policráticas.” (Bobbio,

1986, p.57).

Em síntese, tanto Lamounier quanto Bobbio partem de uma perspectiva

procedimental da democracia. Isto é, a democracia entendida como um conjunto de regras

para a formação de decisões coletivas, nas quais são estabelecidas quem está autorizado a

tomá-las e com quais procedimentos - decisões tomadas pela regra da maioria e de acordo

28

com os direitos de liberdade (BOBBIO, 1986). Para os autores, é inquestionável o status

hegemônico da democracia representativa como modelo mais adequado às sociedades

contemporâneas. É somente na perspectiva de aperfeiçoá-la (a democracia representativa) e

lhe conferir maior legitimidade que eles recomendam a ampliação da participação, em

especial através do alargamento do processo eleitoral.

1.4 DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA E EXPERIÊNCIA CONSELHISTA NO

BRASIL.

O desenvolvimento do capitalismo contemporâneo (reordenação do processo

produtivo, flexibilização das relações de trabalho, desemprego, etc.), os avanços tecnológicos

(internet, avanços no campo das telecomunicações, no campo de medicina, na robótica, etc.),

e o processo de globalização (compressão do “espaço/tempo”) têm implicado em mudanças

nas estruturas das interações sociais, fazendo emergir novos atores sociais, padrões distintos

de sociabilidade e identificações coletivas, além de novas reivindicações (de gênero, étnicos,

sexuais, ambientais, justiça social, culturais, etc.). No plano político tais transformações têm

colocado em xeque o modelo representativo, o papel dos partidos políticos e o Estado de bem-

estar social. Em meio a esse cenário, a descentralização político-administrativa vem sendo

defendida por várias correntes políticas como o modelo de gestão das políticas públicas que

mais se adéqua às exigências da globalização.

A reorganização do Estado ao final do século XX seguiu diferentes processos e

formas. Estes alteraram padrões de vida institucional e interferiram no exercício dos direitos

nos países centrais e nas regiões da periferia mundial alcançadas por poderes e controles

globalizados. As demandas por descentralização são entendidas como transferência de

funções do Estado central para as comunidades locais, com autonomia financeira e política.

Num primeiro momento ganham então status de equivalentes diretas da democracia (LEVY,

1997). Rapidamente, porém, é possível verificar variações substantivas nas concepções e

sentidos dados ao termo descentralização e aos efeitos dos processos orientados sob diretrizes

descentralizadoras.

Em síntese, Levy define descentralização como distribuição territorial de poder

que implica em delegação de autoridade. A autora destaca as seguintes formas de organização

do Estado: a descentralização administrativa (transferência de funções do Estado central para

uma agência local que lhe é subordinada); a privatização (transferência de funções do Estado

29

para uma organização do mercado) e a descentralização política (transferência de funções

com autonomia financeira e política para comunidades locais ou regionais). Conforme a

autora, ao analisar a descentralização é preciso ponderar sobre os meios de integração ou

subordinação que permeiam esta premissa. É também necessário verificar até que ponto a

descentralização reflete uma efetiva transferência de poder a grupos subordinados da

sociedade, permitindo que estes obtenham fortalecimento político (LEVY, 1997).

Em termos de balanço sobre o tema da descentralização nas principais correntes

de pensamento contemporâneo, Levy identifica a valorização da esfera local e o

enfraquecimento do poder central como pontos de convergência entre o pensamento de

esquerda e o pensamento conservador. Tais elementos desafiam a democracia representativa e

o Estado quanto à dominação burocrática, à necessidade de instituições supranacionais e ao

imperativo da procura por novas formas de integração social. No âmbito das divergências, a

autora destaca a caracterização conferida ao sujeito social. Enquanto para as correntes de

esquerda o sujeito social é a ação coletiva (atuação via movimentos sociais, entidades de

classe, sindicatos, etc.), para os liberais o sujeito social é o indivíduo (LEVY, 1997).

Levy (1997) conclui que as formas de governo consideradas legítimas ao longo do

tempo encontram-se questionadas, pois se na atual conjuntura o governo local ganha

proeminência, cabe constatar que as instâncias de integração não estão democratizadas, do

mesmo modo que os mecanismos que garantem a participação na ordem democrática não

foram resolvidos.

1.4.1. Descentralização: problematizando o consenso

Arretche foi uma das primeiras vozes entre os cientistas sociais brasileiros a

indicar cautela no debate acerca da descentralização5, advertindo contra a euforia e os

equívocos antiestatistas a que se chegava. Segundo a autora:

O debate sobre a reforma do Estado tem certamente na descentralização um de seus

pontos centrais. Até muito recentemente, parecia reinar quase absoluto consenso em

torno de suas virtudes e, por razões diversas, ao longo dos últimos anos, diferentes

correntes de orientação política têm articulado positivamente propostas de descentralização com diversas expectativas de superação de problemas identificados

no Estado e nos sistemas políticos nacionais. (...). Em outras palavras, a partir de

perspectivas políticas distintas se produziu um grande consenso em torno da

5 Nogueira (2004) também faz uma interessante discussão sobre os processos de reforma do Estado e da

descentralização.

30

descentralização. Passou-se a supor que, por definição, formas descentralizadas de

prestação de serviços públicos seriam mais democráticas e que, além disso,

fortaleceriam e consolidariam a democracia. Igualmente, tal consenso supunha que

formas descentralizadas de prestação de serviços públicos seriam mais eficientes e

que, portanto, elevariam os níveis reais de bem-estar da população. Portanto,

reformas do Estado nessa direção seriam desejáveis, dado que viabilizariam a

concretização de ideais progressistas, tais como equidade, justiça social, redução do

clientelismo e aumento do controle social sobre o Estado. Simetricamente, passou-se

a associar centralização a práticas não-democráticas de decisão, à ausência de

transparência das decisões, à impossibilidade de controle sobre as ações de governo

e à ineficácia das políticas públicas. As expectativas postas sobre a descentralização

e a visão negativa das formas centralizadas de gestão implicariam

como consequência, a necessária redução do escopo de atuação das instâncias

centrais de governo. (ARRECTHE, 1997, p. 44.).

Nesta linha argumentativa, essencialmente, o debate sobre a descentralização nos

anos 1980 era de cunho normativo e pautou significativos programas de reforma do Estado

em vários países. Após quinze anos de implementação de medidas descentralizadoras e de

ajuste fiscal, Arretche mostrou ser possível abordar o tema sob a ótica analítica e

problematizar o consenso de então. Sua contribuição efetiva foi demonstrar que as várias

associações positivas atribuídas ao processo de descentralização não se sustentam nem lógica

e nem empiricamente.

Contra o argumento que associa positivamente descentralização e democracia e,

ao mesmo tempo, centralização e sistemas políticos menos democráticos, a autora afirma que

a concretização dos ideais democráticos se deve mais à natureza das instituições do que ao

nível de governo encarregado da gestão das políticas. Segundo Arretche, tais associações

podem ser mais bem estudadas pela análise que articula historicamente as elites do governo

central e as elites locais regionais em um determinado modelo de Estado. Para Arretche

(1997, p.45): “é precisamente esse processo histórico, pelo qual as elites de diferentes

instâncias se integram (ou não) no interior das instituições políticas, que explica a natureza

das reformas descentralizadoras ocorridas e o discurso político que lhes serve de sustentação.”

Em relação ao argumento de que a descentralização implica em esvaziamento das

funções do nível central de governo a autora afirma - com base no exame da forma de

expansão do Estado brasileiro no regime militar e das suas implicações sobre o conflito

federativo, assim como na avaliação da dinâmica de descentralização brasileira em relação às

políticas sociais, em especial – que ao contrário dos que defendem a noção de que foi

reduzida a atuação do governo federal no Brasil, verificou-se a necessidade de uma expansão

seletiva das atividades do governo. Desse modo, o sucesso da descentralização necessita de

uma redefinição do papel estratégico do governo num novo arranjo federativo. (ARRETCHE,

1997).

31

Contra o argumento que defende que por si só a descentralização de políticas

públicas é capaz de reduzir os elevados graus de clientelismo presentes nas grandes estruturas

burocráticas, Arretche sustenta que a possibilidade de tal prática se concretizar depende mais

da natureza das relações entre as burocracias estatais e do controle efetivo dos cidadãos sobre

as ações do governo, do que da escala de governo responsável pela prestação do serviço.

Diante do exposto, parece claro que o processo de descentralização política não

constitui garantia para democratizar a gestão das cidades, como supunham seus defensores. A

adoção de formas de organização do Estado descentralizado exige a incorporação de novos

meios de gestão, a redefinição de papéis entre os entes federativos, a inclusão de novos atores

e ainda o enfrentamento de práticas políticas tradicionais como o elitismo político e o

clientelismo. No Brasil, o processo de descentralização política possibilitou a criação de uma

série de mecanismos de ampliação da participação popular na elaboração, deliberação e

fiscalização das políticas públicas, tais como os conselhos de políticas municipais.

1.4.2. Descentralização política no Brasil: o caso dos conselhos de políticas

A promulgação da Constituição de 1988 implicou em profundas modificações nas

instituições políticas brasileiras, em especial no âmbito local. Consagrou a descentralização e

a autonomia local, e então os municípios passaram a compor o pacto federativo junto com os

Estados e o Distrito Federal. Uma importante conquista foi a consagração da participação

popular no processo de gestão e elaboração das políticas públicas. A partir de então surgiu no

Brasil pós-1988 uma “infra-estrutura participativa”, utilizando um termo de Avritzer para

nomear conjuntamente as experiências do orçamento participativo, dos planos diretores

municipais e dos conselhos gestores. Centramos nosso exame nesta última.

Os conselhos estão inscritos na Constituição de 1988 e em outras leis do país na

qualidade de instrumentos de expressão, representação e participação popular. Os conselhos

deliberativos de composição paritária entre os representantes do Executivo e da sociedade

civil foram regulamentados através de leis orgânicas (pós-1988). Passaram a ser exigência

constitucional em diversos níveis administrativos (federal, estadual e municipal), além de que

tiveram suas existências vinculadas ao repasse de recursos financeiros (GOHN, 2001).

A legislação brasileira enfatiza o caráter deliberativo de parte expressiva dos

conselhos, acentuando a inclusão destes ao processo de gestão descentralizada e participativa,

32

e os vincula ao poder Executivo dos municípios como órgãos auxiliares da gestão pública. No

entanto, a autora explica que em municípios sem tradição organizativo-associativa, os

conselhos acabam reduzidos a uma realidade jurídico-formal. Muitas vezes são apenas um

instrumento a mais nas mãos do alcaide e das elites locais que falam em nome da

comunidade, não atendendo minimamente aos objetivos de se tornarem mecanismos de

controle e fiscalização dos negócios públicos (GOHN, 2001).

Santos Júnior, Ribeiro e Azevedo explicam que a criação e disseminação dos

conselhos municipais6, desde a segunda metade dos anos de 1980, são frutos da emergência

dos ideais de reforma das instituições de governo local no Brasil. O foco é o aumento da

participação direta da sociedade na gestão municipal e da eficiência e da efetividade das

políticas públicas descentralizadas (SANTOS JÚNIOR, RIBEIRO e AZEVEDO, 2004). A

respeito das expectativas quanto ao seu papel democratizador, o estudo ressalta:

Espera-se que a sua constituição e consolidação como nova arena político-

administrativa venha reconfigurar os procedimentos decisórios das prefeituras, desde

a fase de definição de objetivos, da formulação de políticas e chegando até a

implementação e avaliação das decisões. Espera-se que a existência dos conselhos

fortaleça a capacidade da sociedade de controlar os mecanismos e critérios de uso

dos recursos públicos, e como consequência sejam mais democráticas as decisões de

distribuição do bem-estar social realizada pelas políticas públicas. Espera-se que as

novas formas de interação entre governo e sociedade materializada nos conselhos

municipais estejam fazendo emergir novos padrões de governo baseados na gestão

democrática, centrada em três características fundamentais: maior responsabilidade

dos governos municipais em relação às políticas publicas e às demandas dos seus

cidadãos; o reconhecimento dos direitos sociais; a abertura de canais para ampla

participação cívica da sociedade. (SANTOS JÚNIOR., RIBEIRO e AZEVEDO,

2004, p. 12-13).

Portanto, os conselhos municipais são depositários de grandes expectativas quanto

ao seu potencial democratizador. No entanto, o que a literatura especializada nos processos de

ampliação da participação e dos novos arranjos participativos tem demonstrado é que os

conselhos enfrentam uma série de desafios em vista de sua efetivação. No capítulo a seguir

discutimos o tratamento dado pela agenda de pesquisas relacionadas à participação, bem

como os entraves a esta participação.

6 A Pesquisa de Informações Básicas Municipais do IBGE, realizada em 2001, constatou que nos 5.506

municípios brasileiros havia naquele ano um total de 32.430 conselhos de políticas setoriais instalados. O

resultado da pesquisa constatou ainda que os estados do Centro-Oeste, do Sul e do Sudeste, apresentaram o

melhor desempenho em todos os quesitos investigados (existência, o seu efetivo funcionamento, a paridade entre

representação social e governamental e a existência de fundo especial no respectivo setor) (PESSANHA,

CAMPAGNAC e MATOS, 2006).

33

SEGUNDO CAPÍTULO

_______________________________________________________

2. CONSELHOS MUNICIPAIS DE POLÍTICAS: BREVE SÍNTESE DAS

EXPERIÊNCIAS NO BRASIL PÓS-1988

O potencial democratizador dos conselhos de políticas é, sem dúvida, uma das

razões de sua popularidade no campo da produção acadêmica, seja no sentido de endossá-lo,

seja no sentido de contestá-lo. Desde o início da década de 1980, a temática da ampliação da

participação dos segmentos sociais na formulação de políticas públicas influencia grande

parte da produção intelectual comprometida com o avanço das conquistas populares na

construção da democracia.

Com o propósito de resgatar a trajetória enveredada pela agenda de pesquisas com

foco na participação popular e nas políticas públicas, Lubambo e Miranda (2007) investigam

a ênfase conferida aos elementos determinantes (cultura política / inovações institucionais) e

ao estímulo da participação da sociedade em experiências descentralizantes a partir de 1980.

As conquistas dos movimentos sociais na melhoria e na oferta de serviços

coletivos e na maior participação nos processos decisórios junto aos órgãos de governo foram

entendidas pela literatura como o reconhecimento das lideranças e organismos populares

como a criação de novas formas de representação em âmbito local e em certo espaço de

influência dos movimentos sociais na definição de prioridades em relação à elaboração das

políticas públicas (LUBAMBO E MIRANDA, 2007).

No fim dos anos 1980, a perspectiva analítica centra-se no processo de transição

democrática balizada por um tipo de “otimismo republicano”, isto é, o pressuposto de que por

si só a democracia é virtuosa e responsável por resultados benéficos para a maioria da

população. Associado a este pressuposto estava a crença de que uma nova institucionalidade,

marcada pela ampliação da participação popular, era condição necessária e suficiente para a

superação do legado de injustiças sociais no país. Entretanto, empiricamente tal pressuposto

não se sustenta.

34

A despeito dos traços de otimismo, nesse momento já se identificam

constrangimentos e obstáculos à virtuosidade da democracia, expressos, sobretudo

pelas possibilidades ampliadas de cooptação das novas organizações por parte do

estado, bem como de uma interlocução orientada para minimizar demandas e

insatisfações, marcadas por tentativas de solução a partir de interesses e opções

governamentais e não, exatamente, coletivos ou públicos. Contudo, o descompasso,

mais tarde, entre a emergente agenda de reformas institucionais e a agenda das

reformas sociais, colocadas em segundo plano, gerou um arrefecimento nas

expectativas postas no processo de democratização (LUBAMBO E MIRANDA,

2007, p.1-2)

Em meio aos obstáculos à virtuosidade da democracia, identificados acima por

Lubambo e Miranda, ganha destaque no debate durante a década de 1990 a atuação das ONGs

como instituições de mediação de interesses coletivos entre a sociedade civil e os grupos de

poder (privados e governamentais). A agenda de pesquisas começa a investigar a contribuição

das ONGs em diversos níveis, mas especialmente junto aos governos locais.

Em seguida, o debate centrou-se no processo de descentralização, evidenciando as

transformações institucionais, viabilizadas pela Constituição de 1988, com foco na

redefinição política dos níveis locais na estrutura federativa e seus impactos sobre a

delimitação da esfera pública e a governabilidade no país.

Num primeiro momento, a literatura superestimou os benefícios advindos da

descentralização. Mas outros estudos, como o de Arretche (1997), baseados em abordagens

mais analíticas e menos normativas, começaram a relativizar o consenso de então, mostrando

a descentralização como um processo heterogêneo e nem sempre positivo para a

democratização política.

Não aprofundaremos o presente estudo neste ponto, tendo em vista que no

capítulo anterior já elencamos os elementos relevantes deste debate. No entanto, cabe ressaltar

que as discussões sobre a descentralização reverberaram na criação e disseminação de novas

arenas de mediação de interesses da população junto à burocracia estatal. A literatura passou a

estudar a atuação e o impacto dos novos mecanismos de participação social na gestão

municipal (as comissões temáticas, os conselhos setoriais, o orçamento participativo, etc.).

Conforme Tendler, citado por Lubambo e Miranda (2007), as pesquisas

acadêmicas foram densamente influenciadas pelo reavivamento dos estudos sobre cultura

política e pelos conceitos de capital social e cultura cívica. Mas nem todos os autores se

entusiasmaram com “o desenvolvimento pelas coisas em âmbito local”.

Nessa contraposição, Tendler assinala que, embora associações cívicas e outras

ONGs fossem frequentemente atores relevantes nos exemplos estudados, em muitos

casos, essa relevância foi viabilizada por uma ação prévia do governo. Ou seja, o

governo permitiu e criou condições de modo que a participação das entidades não-

35

governamentais se efetivasse. O segundo aspecto discutido por Tendler é que os

limites entre o público e o privado mostraram-se muito tênues, para os membros

dessas associações, que compartilham idéias e mantêm ligações estreitas com a

burocracia do governo local (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p 5)

As autoras não discutem as críticas proposta por Tendler sobre as dinâmicas de

interação entre governo e organizações da sociedade civil em âmbito local, talvez porque,

naquele momento, tais críticas destoassem do entusiástico discurso hegemônico.

De volta ao discurso predominante, os temas do associativismo, da gestão

participativa e especialmente do orçamento participativo ganham destaque na literatura até os

anos 2000. A partir daí, o orçamento participativo divide a atenção dos estudiosos com os

conselhos setoriais municipais. Os estudos realizados no pós-2000 são marcados pela

interpretação institucionalista, na qual as variáveis político-institucionais são utilizadas para

explicar os diferentes padrões das experiências participativas (LUBAMBO E MIRANDA,

2007).

Estas estudiosas centram a análise realizada nas hipóteses e explicações mais

usuais da literatura sobre os fatores determinantes ao estímulo à participação da sociedade em

instâncias deliberativas.

Inicialmente, alguns autores associam a pré-existência de uma herança política à

possibilidade de construção de capital social e de desenvolvimento de uma dada região7. Esta

abordagem atribui o fracasso de algumas experiências de conselhos de políticas a fatores

culturais8 (autoritarismo, ausência de organização social e resistência à participação tanto da

sociedade quanto do governo).

Noutra perspectiva há a corrente teórica dos que rejeitam o determinismo

histórico-cultural e apostam nas inovações institucionais9 para superar a herança cultural. A

estrutura institucional é pensada como determinante para fomentar a cooperação entre Estado

e sociedade e também para estimular a participação. A efetividade ou não das experiências

participativas é compreendida como o resultado da organização da sociedade civil e/ou dos

incentivos criados pelos governos ao fomento dos meios de participação. Embora o formato

institucional seja considerado pelos seguidores da abordagem neoinstitucionalista como

determinante ao incentivo da participação, não existe entre eles consenso sobre a correlação

entre mudança institucional e empoderamento.

Segundo Lubambo e Miranda, entre os neoinstitucionalistas existe o problema de

explicar teoricamente o papel da herança histórica sobre as instituições e a ação dos atores

7 Nessa perspectiva Lubambo e Miranda citam a obra de Putman (1993).

8 Segundo Lubambo e Miranda, Andrade (2002) e Bonfim e Silva (2003), são representantes dessa abordagem.

9 Para mais detalhes, Evans (1993) e (1996).

36

sociais. E mesmo que seus autores admitam a importância da mudança institucional, tal

mudança, ainda mais se direcionada ao empoderamento, mostra-se um processo demorado e

dispendioso.

Ou seja, embora haja condições de se induzir, por meio de mudanças no desenho

institucional, uma trajetória de empoderamento numa determinada sociedade não só

demanda tempo para consolidar-se, quanto supõe certos pré-requisitos (inclusive

históricos e de capital social) para a “largada” no curto prazo e para a consolidação

em perspectiva mais longa, sobretudo em regiões que vivenciam um

desenvolvimento tardio (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.8).

A relação entre inovações institucionais e empoderamento se fundamenta na

concepção de que os incentivos à “participação e ao empoderamento são valiosos em si

mesmo, independente de seu impacto sobre a eficiência e a eficácia das políticas públicas”

(Lubambo e Miranda, 2007, p.7) e também nos efeitos que o empoderamento produz na

sociedade (redução da apropriação privada de recursos públicos e a redução da corrupção).

Essas duas dimensões devem ser vistas de modo articulado, bem como as relações

entre empoderamento e governança10

. Lubambo e Miranda supõem que “uma estrutura

apropriada de governança é aquela que reúne características institucionais que criam

incentivos para o empoderamento.” (2007, p.8). Nessa perspectiva, um mecanismo

institucional de governança deve garantir meios de prestação de contas verticais e

horizontais11

, que envolvam a participação social em diversos níveis e dimensões. No entanto:

a efetividade dos mecanismos de prestação de contas horizontal não depende apenas

do desenho e da capacidade institucional adequada, mas também da ação coletiva

que lhes dê legitimidade e aumente sua eficácia. Significa dizer, captando elementos

analíticos para a questão inicial apresentada, que embora não possa substituir a ação

coletiva, o desenho institucional apropriado reduz os custos da mesma. Por outro

lado, o empoderamento de atores sociais permitiria potencializar a ação coletiva,

levando à mudança institucional e legal. Ou seja, as estratégias de empoderamento

operam diretamente sobre os atores, expandindo suas capacidades de barganhar e de

se organizar para eleger prioridades nas políticas públicas ou em inovações

institucionais. Por sua vez, os arranjos institucionais participativos alteram os custos

relativos de organização e de obtenção de informações, reduzindo-os e aumentando

o poder de barganha e de controle dos grupos mais vulneráveis. Na realidade, um

canal de participação novo que é introduzido em virtude da ação coletiva bem

sucedida se constitui ele próprio um forte incentivo para a organização.

(LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.8).

10

Por governança as autoras entendem o conjunto de condições para o exercício do governo. 11

O conceito de prestação de contas, segundo Lubambo e Miranda (2007), diz respeito a uma relação vertical

entre governantes e cidadãos através de eleições, e também a relação horizontal entre os poderes constituídos ou

instituições formais e entre atores institucionais no âmbito do Estado.

37

De tal modo, o debate público no Brasil está focado em formas de gestão

descentralizadas (consultivas e/ou deliberativas) como estímulo do desempenho dos governos.

Ainda que a descentralização do poder decisório seja concebida pela literatura como benéfica,

não está certo que ela seja indispensável ao bom desempenho do governo, ao modo visto no

capítulo anterior, a partir de Nogueira e Arretche.

Lubambo e Miranda questionam em que medida as experiências de

descentralização decisória, via mudanças institucionais, se vinculam ao empoderamento da

sociedade local. O empoderamento é limitado por elementos que compõem a “herança cívica

desfavorável”, isto é, resistência da sociedade à participação; reduzida credibilidade e

comprometimento do Estado; ausência de experiências locais de associativismo e às

resistências em reformar as estruturas e o funcionamento das burocracias estatais. Além

desses elementos complicadores do processo de empoderamento, há também os problemas

que dizem respeito à representação e participação popular:

Há limites contidos na representação e na participação popular intermediada por

associações de qualquer espécie, sobretudo por aquelas oriundas de mudanças

institucionais, como os modelos programáticos com nítida orientação

governamental. Além disso, independentemente da discussão sobre a eficácia dessas

tais instituições/associações, a participação/representação da população, requer uma

nova engenharia institucional também por parte do Estado, ainda despreparado, na

maioria dos casos para enfrentar os problemas mais simples da ação coletiva.

(LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.9).

Diante disso, Lubambo e Miranda (2007, p.11) indagam: “a quem de fato favorece

a abertura de novos canais entre a sociedade e o poder político local e o empoderamento

resultante dessas estratégias. Ao que afirmam que os problemas dos processos participativos

são de duas ordens: aqueles relativos à ação coletiva e os que se referem ao controle social

dos cidadãos a burocracia pública ou aos governantes.

Os problemas da ação coletiva dizem respeito à capacidade organizacional (custos

da mobilização e da participação) dos grupos marginalizados potencializados por fatores

como custos de oportunidade, custos de organização, baixo nível de informação e baixo poder

de negociação. Assim,

As possibilidades de essas instituições responderem aos grupos pobres e excluídos

são reduzidas, em virtude da combinação dos fatores citados (altos custos de

oportunidade da participação, baixos níveis de informação) e da assimetria de

relações políticas que tornam esses grupos particularmente vulneráveis ao

clientelismo e cooptação. (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.12-13).

38

Aliadas a essas questões estão os problemas do controle social das ações dos

agentes públicos e dos governantes. O desafio é a distribuição assimétrica da informação entre

os “não-governantes” e os governantes e gestores, o que diz respeito aos níveis de

transparência da ação pública.

Esse problema é reproduzido internamente nas instituições governamentais na

relação entre governantes e burocracias, como também em relação aos

representantes populares e representados. Muitas vezes, as entidades da sociedade

civil, ONGs e associações do movimento popular adquirem assento em instâncias

participativas, replicando o problema do controle social sobre suas ações. A rigor, a

associação da capacidade de decisão desenvolvida na sociedade à instituição de

estruturas de deliberação participativas, no âmbito do governo, definiria distintos

níveis de empoderamento, nos quais incidem, diferentemente, problemas de ação

coletiva e de controle social. (LUBAMBO E MIRANDA, 2007, p.13).

Nesta linha de argumentação tem-se, portanto, que os elementos do desenho

institucional possuem os componentes importantes para a efetividade dos processos

participativos, propiciando a paulatina consolidação de empoderamento na sociedade.

2.1. ESTADO E SOCIEDADE CIVIL: CONFLITOS E PARTILHA DE PROJETOS

POLÍTICOS.

A literatura sobre os conselhos municipais de política no Brasil tem pontuado

alguns elementos nas relações entre Estado e sociedade civil que se mostram recorrentes no

debate sobre os processos de democratização. A resistência por parte do Estado em

compartilhar o poder decisório, a transformação do poder deliberativo dos conselhos em

função consultiva, a falta de recursos (estrutura física e materiais), o despreparo da burocracia

estatal e a presença de institucionalidades paralelas são alguns dos elementos que Dagnino

(2000) aponta como limites à atuação dos conselhos. Do mesmo modo, Pessanha, Campagnac

e Matos (2006), apontam como entrave a capacidade do Estado de esvaziar os conselhos. Os

meios comuns para tanto são: a tomada de atitudes dos governantes por fora dos conselhos e

também o fato de não cumprirem as decisões tomadas nestes espaços.

Para Dagnino, as relações que se estabelecem entre Estado e sociedade são sempre

tensas e permeadas pelo conflito, mesmo que variando a natureza e os graus dos conflitos. Em

suas conclusões a autora (2000, p.80) apresenta que “essa tensão deve-se à maior ou menor

aproximação, similaridade, coincidência, entre os diferentes projetos políticos que subjazem

às relações entre Estado e sociedade. [...] o conflito e a tensão serão maiores ou menores

dependendo do quanto compartilham [...] as partes envolvidas.”

39

A autora contesta as interpretações que baseiam a distinção entre Estado e

sociedade em determinações estruturais e reduzem a relação de oposição a premissa que

considera a sociedade civil como „pólo de virtude‟ e o Estado como „encarnação do mal‟

(DAGNINO, 2000). Para além desse maniqueísmo, a autora procura evidenciar a

complexidade de tendências e sentidos que permeiam as relações na esfera política.

Segundo Dagnino, a noção de projeto político pode servir de variável explicativa

para melhor interpretar as relações entre Estado e sociedade civil. Em suas palavras:

Os conflitos que permeiam essas relações não podem, portanto, ser simplesmente

reduzidas a diferenças nas respectivas „lógicas de atuação‟, derivadas de

características estruturais distintas, do Estado e da sociedade civil. O que não

significa dizer que a clivagem estrutural entre Estado e sociedade civil não é

suficiente para entender as suas relações e deve ser combinada com outras clivagens

que não necessariamente coincidem com ela, mas a atravessam (DAGNINO, 2000,

p. 281).

O foco mais acentuado dos conflitos remete à partilha efetiva de poder. De um

lado, a sociedade civil reivindicando participação efetiva nas tomadas de decisões. De outro, o

Executivo resistindo em compartilhar o seu poder exclusivo sobre as políticas públicas.

Dagnino (2000) descreve alguns desses mecanismos que bloqueiam a efetiva partilha de

poder nos espaços participativos (como os conselhos) e apresenta elementos que dificultam a

participação igualitária nos espaços públicos, em especial, a desqualificação técnica e política

dos representantes da sociedade civil. A autora afirma que em vista da novidade desses

espaços, novos desafios se impõem tanto ao Estado quanto para a sociedade civil, como por

exemplo, o reconhecimento dos diferentes interesses, a capacidade de negociação (sem perda

de autonomia), a construção do interesse público e a participação efetiva na formulação das

políticas públicas que venham a expressar esse interesse.

De volta à noção de projeto político, Dagnino apresenta três subtipos em que há

atuação conjunta entre Estado e sociedade civil: os projetos políticos compartilhados, as

complementaridades e as parcerias. Na idéia de compartilhamento de projetos políticos

participativos e democratizantes, seu argumento destaca a existência de indivíduos em

“posições-chave” no interior do aparato estatal que podem se comprometer individualmente

com projetos participativos ou então serem hostis à participação, inviabilizando o

funcionamento dos espaços participativos.

No primeiro caso é possível pensar em um compartilhamento individual de projetos,

a despeito das eventuais concepções dominantes no Estado, já que a burocracia

estatal de carreira não está necessariamente subordinada a essas concepções. No

40

segundo caso, típico dos espaços públicos de constituição obrigatória, como os

Conselhos Gestores, trata-se do confronto entre projetos distintos, em situações onde

a correlação de forças não reproduz aquela que a criação destes espaços na

Constituição de 1988 (...). A definição ampla de projeto político que estamos

utilizando aqui definitivamente inclui as visões elitistas da política (e da democracia)

que permeiam nosso universo cultural, bem como a crença do predomínio de uma

razão tecnocrática que, em última instância, é antitética em relação à expansão dos

espaços públicos e à participação da sociedade civil. (DAGNINO, 2000, p. 288).

O segundo subtipo é o do compartilhamento de um projeto político, por

complementaridade ou instrumental. Este é marcado pela confluência “perversa” entre o

projeto participatório dos anos 1980 e o projeto de Estado mínimo, enfaticamente

descentralizador. Segundo a autora, a perversidade decorre da condição de que “ambos os

projetos requerem uma sociedade civil ativa e propositiva”. Tal questão centraliza o debate

que visa avaliar as experiências de atuação conjunta entre movimentos sociais, lideranças

comunitárias e do Estado (DAGNINO, 2000).

O terceiro subtipo é o compartilhamento de projetos políticos através de parcerias.

Relaciona-se a áreas específicas em que o Estado não possui qualificação suficiente para lidar

com os desafios setoriais em questão (AIDS, movimento feminista, movimento negro, etc.).

Nesta proposição, o compartilhamento de projeto político possui caráter instrumental por

parte do poder estatal.

A tipologia proposta por Dagnino parece ser de grande valia para o objetivo desta

dissertação, isto é, de investigar a ação do Estado, particularizado na instância municipal,

diante das modificações implementadas em seu monopólio sobre os meios de administração

pelos novos arranjos administrativos, identificando o tipo de relação estabelecida entre as

dinâmicas das duas instâncias (Estado e sociedade) no que tange à partilha de poder, assim

como de caracterizar e propor uma compreensão das variáveis que interferem nessa relação. A

fonte através da qual, nos capítulos adiante, se auscultará o Estado sobre o tema em questão é

composta pelos conselheiros representantes do governo e da sociedade nos conselhos de

políticas da saúde de Goiânia e Aparecida de Goiânia.

A noção de projeto político e seus subtipos, mas especialmente de “indivíduos em

posições-chave” dentro dos conselhos, pode contribuir para a compreensão das relações

estabelecidas entre Estado e sociedade nessas instâncias. Parte-se da premissa de que o

Estado, na figura do gestor municipal, pode vir a desempenhar um papel preponderante na

efetividade dos conselhos, isto é, ele é um “indivíduo em posição-chave”. Assim, o

comprometimento político desse indivíduo com a democratização da gestão pública se traduz

em ações com potencial para afetar a efetividade das decisões e, no limite, condicionar a

41

natureza democratizadora dos conselhos. O comprometimento político com uma causa ou

crença que motiva suas ações em prol desta causa é o que se considera como “vontade

política” do gestor, isto é as motivações de ordem valorativa que condicionam sua ação.

Sugere-se que a vontade política do governante se relaciona com seu

posicionamento político-ideológico. Essa variável tem sido mencionada por pesquisadores

dos conselhos de diferentes linhas, entre eles Avritzer (2008).

Os três arranjos participativos de maior capilaridade no cenário posterior a 1988, o

Orçamento Participativo, os Planos Diretores e os Conselhos de Política, podem ser

diferenciados conforme três variáveis: iniciativa de proposição do desenho, organização da

sociedade civil na área em questão e vontade política do governo em implementar a

participação (AVRITZER, 2008).

As instituições participativas variam em sua capacidade de democratizar o

governo e, dentre as variáveis acima, o contexto de organização da sociedade civil e a

presença de atores no apoio aos processos participativos (AVRITZER, 2008).

Para demonstrar o peso da variável „contexto de organização da sociedade civil‟,

no sentido de promover a efetividade deliberativa dos conselhos, o autor analisa os casos dos

conselhos de saúde de Belo Horizonte, Porto Alegre, São Paulo e Salvador.

Avritzer (2008) afirma que os conselhos de Belo Horizonte e de Porto Alegre são

exemplos de êxito ou de efetividade deliberativa. O conselho de saúde de Belo Horizonte é

um dos mais antigos do país, assim como o movimento de saúde da cidade. Ele destaca a

eleição de um representante da sociedade civil para a presidência do conselho como o

episódio mais importante envolvendo o conselho de saúde. No conselho de saúde de Porto

Alegre, Avritzer (2008) assinala a singularidade de não se considerar os prestadores de

serviços como parte da sociedade civil. Em síntese, esses dois casos repetem o êxito do

orçamento participativo em duas cidades que possuem sociedades civis fortes.

Mas, o que de fato interessa ao autor são as experiências nos conselhos de saúde

de São Paulo e de Salvador, em razão de, diferentemente das duas anteriores, ambas lidarem

com a oposição da sociedade política e com sociedade civil fraca.

No primeiro mandato do conselho de saúde de São Paulo, em junho de 1989

durante o governo de Luiza Erundina, pelo PT, não se verificaram conflitos fundamentais

entre os representantes do Estado e da sociedade civil. Já nos mandatos subsequentes, os

conflitos se manifestaram principalmente em duas situações de tensão política: na tentativa de

privatização do sistema municipal de saúde e nas investidas por parte da administração

42

municipal na composição da representação da sociedade civil no conselho (AVRITZER,

2008). O autor explica que:

nos casos em que as organizações da sociedade civil são fortes, é possível, através

da sanção estabelecida pela lei e pela formas de organização dos movimentos

populares em questão, resistir a uma tentativa do governo de retirar poder da

instância participativa. Dessa forma, os desenhos de partilha se diferenciam dos

desenhos de participação “de baixo para cima” (orçamento participativo) devido a

sua maior independência do sistema político. ”(AVRITZER, 2008, p.55).

No caso do conselho de saúde de Salvador, as particularidades se dão em sua

composição. A representação da sociedade civil no conselho é constituída pela Arquidiocese

de Salvador, pela Associação Comercial e algumas associações ligadas a questões raciais. O

pesquisador afirma que essa composição afeta a expressão da sociedade civil no conselho,

bem como sua capacidade deliberativa.

Em uma pesquisa comparativa sobre a capacidade deliberativa dos conselhos de

saúde, o conselho de Salvador se destacou como tendo como principal deliberação o

envio de documentos ao governo. Pode-se, então, dizer que este é um caso

diferenciado no qual a fraqueza da sociedade civil e a hostilidade do sistema político

leva a um conselho inefetivo. O que diferencia o caso de Salvador do caso de São

Paulo é a fraqueza da sociedade civil, já que, no que diz respeito à hostilidade da

sociedade política [...]. (AVRITZER, 2008, p.55).

De tal modo, considera-se que a variável proposta para articular o argumento

desta dissertação, a orientação político-ideológica do gestor público, pode nortear a vontade

política do governante e conduzir a ações favoráveis ao sucesso das práticas participativas, em

especial, no caso, dos conselhos municipais.

2.2 A AÇÃO DO ESTADO NO CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE CURITIBA

Os conselhos municipais de saúde são responsáveis por grande parte da produção

de pesquisas sobre os conselhos de políticas. As razões de seu atrativo nos meios acadêmicos

são sumarizadas por Avritzer12

: são os conselhos que desfrutam de obrigatoriedade de repasse

de recursos; são considerados pela literatura o setor mais participativo; têm presença na

legislação nacional nas três instâncias; possuem competência deliberativa; apresentam

participação regular e contínua; são os mais disseminados e os mais consolidados.

12

No estudo Sociedade Civil e Participação Social no Brasil. Disponível online:

http://www.democraciaparticipativa.org/files/AvritzerSociedadeCivilParticipacaoBrasil.pdf

43

Em vista do grande número de estudos disponíveis, destacamos uma reflexão de

grande visibilidade no debate sobre os processos participativos. Buscamos identificar as

relações entre Estado e sociedade e, se possível, caracterizar esse Estado a partir da

abordagem adotada por Fuks (2004) que privilegia as dinâmicas deliberativas no interior do

Conselho Municipal de Saúde de Curitiba.

O estudo foca o comportamento político dos diversos setores no processo

decisório, no que diz respeito à concentração e dispersão da participação e da influência

política. Para tanto, explora os potenciais explicativos e os limites de modelos que associam a

posse de recursos à influência política.

Fuks (2004, p.48) avalia a influência política por meio de um critério quantitativo,

isto é, o peso da participação dos atores nos debates e decisões tomadas pelo Conselho.

Advoga que: “o conceito de „influência política‟ associado a esse critério é limitado, mas

entendemos que, em alguma medida, a influência vem acompanhada de participação política e

que essa pode ser examinada a partir de um repertório de ações, tais como o „uso da palavra‟ e

o „encaminhamento de propostas‟ para a deliberação.”

O autor analisou as cinco gestões do Conselho Municipal de Saúde de Curitiba –

CMSC -, procurando identificar nas atas os modos de distribuição da participação nas

reuniões com base em três momentos do processo decisório: iniciar e dar continuidade ao

debate, encaminhar proposta para deliberação e aprovar ou não a proposta.

A primeira constatação foi a expressiva participação dos agentes externos nas

reuniões do CMSC. As falas dos assessores técnicos superaram as intervenções iniciais dos

atores representantes da sociedade civil. Fuks afirma que:

no que diz respeito ao “ator externo”, a participação de atores estatais que atuam no

CMSC como “apoio técnico”, apresentando programas governamentais, oferecendo

esclarecimentos, transmitindo informações do governo e emitindo pareceres a

respeito de assuntos de sua competência (como, por exemplo, a prestação de contas

do Fundo Municipal de Saúde). (FUKS, 2004, p.49).

Embora minoria, os atores governamentais controlam as iniciativas de debate. Isso

se deve ao papel central que o conselheiro indicado pelo gestor ocupa, de presidente do

CMSC, e também pelo peso conferido ao conhecimento técnico na dinâmica do conselho.

Desse modo, a informação constitui um importante recurso de poder, tendencialmente

monopolizado por conselheiros de um segmento – o Estado – e, em consequência, negado aos

de outros setores que compõem o conselho.

44

Sobre a efetiva intervenção nos debates, destaca-se a presença do usuário como o

maior responsável pelas intervenções realizadas em contraposição à passividade dos

prestadores de serviço, que possui a menor participação no CMSC, inferior até ao segmento

“visitante”. A lógica da participação no CMSC segue o seguinte padrão: os atores estatais dão

início ao debate, seguidos pelas intervenções dos usuários e, em menor proporção, pelas

intervenções dos trabalhadores.

Sendo o usuário o segmento da sociedade civil que mais participa do debate e que

mais gera a controvérsia pública, podemos sugerir a presença da seguinte dinâmica

na reunião do conselho: 1) fazendo uso de recursos cognitivos e das prerrogativas

dos cargos que ocupam, os atores estatais lideram as discussões no CMSC,

apresentando os assuntos da pauta, esclarecendo questões de ordem técnica,

divulgando informações governamentais – enfim, introduzindo o debate; 2) os

usuários apresentam-se como interlocutores e, em certas circunstâncias, contrapõem

(secundados pelos trabalhadores) argumentos aos dos gestores. Portanto, o usuário e

o gestor são ativos não apenas no sentido de participarem do debate, mas também

porque são os que mais conferem a esse debate a qualidade de confrontação de

idéias. (FUKS, 2004, p. 51).

Para Fuks, isso indica a liderança do segmento gestor no processo decisório no

CMSC, embora também revele que o segmento dos usuários é o segmento da sociedade civil

mais ativo, ao contrário do segmento dos prestadores de serviço.

O conjunto dos dados analisado permite-nos concluir que: 1) o gestor tem sido ao

longo da primeira década de existência do CMSC, o segmento com maior volume de

ação no CMSC; 2) embora não atue como membro do Conselho (portanto, sem

direto a voto) o quadro técnico do governo tem reforçado a predominância dos

atores estatais no CMSC; 3) entre os conselheiros da sociedade civil, o usuário tem-

se destacado como segmento mais atuante, tanto no debate como no

encaminhamento de propostas para deliberação, sendo o principal responsável pelo

estabelecendo uma relação de equilíbrio entre os segmentos da sociedade civil e os

setores do Conselho que atuam em nome da administração pública e 4) a presença

do prestador de serviço no Conselho é, praticamente, invisível. (FUKS, 2004, p.51).

Esse cenário revela que o nível de conflito político no CMSC tende a ser estável

ou equilibrado. No entanto, o autor afirma não ser possível realizar uma avaliação conclusiva

no que diz respeito à influência de cada segmento no CMSC, visto que todas as propostas

encaminhadas foram aprovadas. Tal fato pode indicar que os temas debatidos não são de

natureza conflituosa. De qualquer modo, Fuks argumenta que uma explicação baseada

exclusivamente em dados fornecidos pela dinâmica das reuniões é limitada para se entender

os modos pelos quais a influência política é exercida.

Para o autor, a participação assume a forma de interação política, envolta em uma

série de interesses e ações dos diversos atores. A influência, ou a eficácia da ação de cada ator

45

está, de certo modo, relacionada aos recursos que ele dispõe. Os recursos avaliados pela

pesquisa foram os recursos individuais (perfil socioeconômico e educacional dos

conselheiros) e os recursos coletivos (financeiros, materiais e humanos das entidades

representadas no CMSC).

Fuks (2004) considera que no CMSC não existe monopólio de qualquer um dos

recursos acima citados, mas sim, desigualdades dispersas na distribuição desses recursos. Em

relação aos recursos individuais, os usuários estão em desvantagem quanto à renda

eescolaridade. Também em termos de recursos coletivos as entidades representadas pelos

usuários estão em desvantagem quanto ao orçamento, funcionários e estrutura.

O autor afirma ainda que os dados apresentam uma clara hierarquia entre os

segmentos quanto a posse de recursos. No topo está o segmento dos gestores, seguido pelo da

sociedade civil, pelos prestadores e pelos usuários. Independente dos critérios adotados para

definir o peso relativo da posse de recursos, Fuks (2004) aponta para os limites de uma

explicação da influência política fundada exclusivamente na posse de recursos. A mesma

condição que faz esse indicador útil para entender a participação dos gestores e dos

trabalhadores torna-o inócuo diante da participação e o ativismo dos usuários e a “apatia” dos

prestadores de serviço.

As análises fundadas em recursos convencionais não consideram outras

dimensões relevantes para a ação política. Já na perspectiva de Fuks, a propensão dos

conselheiros para o engajamento político (interesse cognitivo e emocional), o engajamento

eleitoral, associativismo e filiação partidária, a rede de apoio político e a ação junto às

instituições estatais, são dimensões que permitem ampliar a compreensão da influência

política dentro do CMSC. Sendo assim:

Esse conjunto de condições, incluindo tanto aquelas de ordem individual e de caráter

subjetivo como as que se referem às organizações e assumem uma qualidade

objetiva, permite-nos elaborar uma compreensão mais abrangente do conceito de

“recurso”, tendo em vista os limites de uma explicação fundamentada,

exclusivamente, na posse de recursos convencionais. Assim, a militância partidária,

que se reflete no engajamento eleitoral, indica que a motivação para ação política

pode estar compensando a fragilidade dos usuários em relação a outros recursos (p.

ex.: organizacionais, cognitivos, de renda e de escolaridade). O apoio recebido por

organizações da sociedade civil (partidos políticos, instituições religiosas,

universidades) e a prática associativa (especialmente a de bairro) também parecem

compensar, em parte, a menor freqüência com que ele atua junto às instituições

políticas. (FUKS, 2004, p. 57).

Munido desses elementos o autor explica porque o amplo estoque de recursos

convencionais dos prestadores de serviço não se reverte em ação política no CMSC. O

46

principal motivo é a falta de interesse dos prestadores em participar ativamente no processo

decisório, já que estes não o consideram um espaço público privilegiado de ação política, ao

contrário dos segmentos dos usuários e dos gestores. Os prestadores de serviço não

consideram o CMSC uma arena de ação política relevante, já que os assuntos deliberados,

frequentemente, não lhe despertam interesse. Desse modo, a ausência de motivação impede a

conversão de recursos em influência política.

Finalizando, o autor argumenta que a distribuição da influência política no CMSC

é dispersa. Prevalece uma dinâmica de equilíbrio político embora haja maior predomínio da

influência dos gestores no processo decisório, tal influência é compensada pela ação política

dos usuários.

Consideramos que o estudo de Fuks avança ao evidenciar os limites das

explicações fundadas exclusivamente na posse de recursos convencionais, mas principalmente

por trazer outros elementos de ordem subjetiva e objetiva para a análise. A disposição para a

participação, o associativismo e o apoio político da rede em ações reiteradas junto às

instituições políticas estatais são elementos que permitem ampliar o estudo sobre os processos

de interação e de influência política no âmbito dos conselhos.

No entanto, sua análise apresenta lacunas quanto à caracterização do segmento

gestor. Mesmo que nela fique evidente o papel preponderante desse segmento sobre os demais

no que tange ao processo decisório, não é possível qualificá-lo. Seu estudo não possibilita

responder questões como: o que os gestores ou representantes do governo, resistentes à

partilha de poder no âmbito dos conselhos, possuem em comum? Que variáveis interferem na

vontade política dos governantes no que toca a partilha de poder? Isso nos leva a reiterar a

relevância de reforçar os estudos sobre as relações de interação entre Estado e sociedade no

interior dos conselhos.

47

TERCEIRO CAPÍTULO

__________________________________________________

3. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS

Este estudo orienta-se pela abordagem qualitativa dos processos sociais. Ao

utilizar como fontes privilegiadas de investigação as expressões e respostas dos agentes

políticos, discorrendo sobre sua própria ação e sobre o contexto de produção dessa ação, com

o objetivo de designar o sentido da ação política do Estado desenvolvida numa realidade de

mudança institucional que por definição é plural e compartilhada, como o são os conselhos

gestores, a pesquisa vê-se remetida a um campo de existência social constituído de

significados subjetivos do qual tradicionalmente se ocupam os métodos e técnicas das

ciências sociais compreensivas. Minayo (2002, p. 21-22) define essa tradição, fundada em

Weber e que atualmente encorpa diferentes tendências interpretativas, ilustradas entre outras

pelas elaborações de Moscovici (“representações sociais”) e de Bourdieu (“estruturação”),

destacando nela o propósito de capturar “o universo de significados, motivos, aspirações,

crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos

processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.”

Procurou-se compreender a ação do Estado, particularizado nas gestões dos

municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia, diante das modificações implementadas em

seu monopólio sobre os meios de administração através dos arranjos participativos, neste caso

os conselhos municipais de saúde, identificando o tipo de relação estabelecida entre as

dinâmicas das duas instâncias no que tange à partilha de poder, assim como caracterizar e

propor uma compreensão das variáveis que interferem nessa relação.

A opção pelos conselhos de saúde se deu em vista de que: 1) esses conselhos estão

entre os de maior capilaridade ou institucionalização nos mais de 5.500 municípios

brasileiros; 2) demonstram comprovada efetividade de atuação no universo conselhista; 3) são

também os conselhos de saúde as instâncias enfocadas em significativo volume de pesquisas e

reflexões a respeito, disponibilizadas em áreas do conhecimento de cunho disciplinar e

também interdisciplinar que conjugam avanços políticos e teóricos sobre democracia

participativa a partir de metodologias das ciências sociais em ligação com outras áreas como

48

pode ser observado em especial nas interfaces com estudos de saúde pública, administração,

psicologia e recursos humanos, políticas públicas, etc.

A escolha dos municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia se deu em virtude

de serem estes os maiores municípios da Região Metropolitana de Goiânia – RMG - e onde os

Conselhos de Saúde desenvolvem atuação mais regular e contínua do que em outros

municípios. Além disso, apresentam características de funcionamento preliminarmente

similares às diagnosticadas na literatura para pensar a função democratizadora e os problemas

verificados nos conselhos de saúde no Brasil, durante os primeiros vinte anos, desde sua

introdução no cenário das políticas públicas do país pela Carta de 1988. Por último, pesou na

demarcação do objeto a facilidade de acesso aos conselheiros, viabilizando os meios de

pesquisa a menores custos.

Para tanto, adotou-se a perspectiva teórico-metodológica da sociologia

compreensiva de Max Weber, no intuito de entender os processos participativos como ação

social, tratando-os em seu percurso e seus efeitos. Cientes da complexidade da realidade a

qual buscamos analisar a partir de um determinado ponto de vista, isto é, o da

democratização.

Conforme Weber, a sociologia é a ciência cuja finalidade é compreender

interpretativamente a ação social desvendando suas causas, seu curso e seus efeitos. Para o

autor (2002, p.11): “ação designará toda conduta humana cujos sujeitos vinculem a esta um

sentido subjetivo. [...] O termo „ação social‟ será reservado à ação cuja intenção fomentada

pelos indivíduos envolvidos se refere à conduta de outros, orientando-se de acordo com ela.”

Como se pode notar, a abordagem compreensiva de Weber tem como unidade

interpretativa a ação social do indivíduo, entendido como portador de conduta significativa.

Busca-se compreender a ação através do sentido subjetivo que o sujeito lhe atribui. Assim,

nem toda ação é alvo de compreensão sociológica, mas apenas as que estão orientadas por um

sentido subjetivo.

De acordo com Weber (2002), o sentido de uma ação também pode significar a

compreensão explicativa. Compreensão explicativa é o que se compreende pelos motivos, o

sentido que o sujeito tinha em mente ao agir de certo modo naquele momento e naquela

situação. “Explicação” é a apreensão da conexão de sentido a que pertence uma ação

compreensível de maneira atual segundo seu sentido subjetivamente visado.

Embora Weber não defina claramente o que entende por “sentido” e por

“compreensão”, ele apresenta o conceito de “motivo”, que permite esclarecer a relação entre

esses dois conceitos. Para Weber (2002, p.8): “Denominamos „motivo‟ uma conexão de

49

sentido que para o próprio agente ou para o observador constitui a „razão‟ de um

comportamento quanto ao seu sentido.”

De tal modo, o „motivo‟ é o alicerce da ação, isto é, a causa da ação. O motivo

aponta para o fim almejado pelo agente. Assim, ao procurar compreender a ação do Estado

em relação aos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia,

procura-se reconstruir o motivo dessa ação e, deste modo, identificar o seu fim.

O método compreensivo admite captar o sentido subjetivo das ações do Estado,

possibilitando duas alternativas de consideração interpretativa das ações, as de sentido de fato

e as do sentido construído como tipo ideal (Weber, 2000).

A literatura sobre os conselhos classifica-os a partir da sua “existência efetiva”, da

regularidade de funcionamento e da capacidade de fazer valer suas decisões (poder de

sanção), formando condições que possibilitaram à pesquisa caracterizar o “sentido de fato”

dos Conselhos Municipais de Saúde dos Municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia.

Quanto ao “sentido como tipo ideal”, os critérios estabelecidos de classificação da

relação do Estado com os Conselhos de Saúde nos dois municípios, no sentido de

democratização da gestão pública de saúde foram: a) o Conselho possuir verba própria para

sua atuação; b) o Conselho manter relações com o secretário de Saúde ou com o prefeito; c) a

presença do secretário municipal de saúde ou do prefeito nas reuniões e eventos do Conselho;

d) o fácil acesso às informações da secretaria municipal de saúde; e) a elaboração conjunta

dos projetos de saúde do município; f) e o Conselho possuir boa estrutura física e de pessoal

administrativo próprio para desempenhar suas funções.

Adotou-se como uma das técnicas de investigação dos conteúdos e dinâmicas de

funcionamento dos dois conselhos a análise documental das atas das reuniões, resoluções e

dos regimentos internos dessas entidades. O objetivo foi, além de verificar as regularidades

das reuniões, a realização de conferências temáticas e os temas que estiveram em maior

evidência, principalmente de construir referências para caracterizar a atuação política dos

conselheiros representantes do Estado nesta nova esfera de institucionalidade da democracia

brasileira.

A observação passiva13

foi outra técnica utilizada no acompanhamento da

estrutura de funcionamento dos dois Conselhos bem como na percepção das condições e

processos de tomada de decisões nas reuniões plenárias e de diretorias.

13

Na qual o pesquisador não interfere na realidade observada.

50

Por fim, com o objetivo de captar o sentido que os conselheiros municipais de

saúde conferem à sua ação, empregou-se nos contatos mantidos a técnica de entrevista semi-

estruturada, isto é, o estímulo de depoimentos que se orienta por um roteiro de temas

previamente elaborados, sobre os quais os informantes possuem liberdade para se expressar.

3.1. A REGIÃO METROPOLITANA DE GOIÂNIA

Além de ser capital do Estado de Goiás, Goiânia constitui, desde o final dos anos

1990, com outros onze municípios a Região Metropolitana de Goiânia, da qual é o município-

pólo. A principal finalidade da Região Metropolitana de Goiânia é “integrar a organização, o

planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum dos municípios” que a

compõem.

A Região Metropolitana de Goiânia (RMG) foi criada pela Lei Complementar nº.

27, de 30 de dezembro de 1999, juntamente com a criação da Região de Desenvolvimento

Integrado de Goiânia (RDIG) que inclui mais sete municípios do aglomerado urbano da

capital. Compõem a Região Metropolitana de Goiânia: Goiânia, Trindade, Goianira, Santo

Antônio de Goiás, Nerópolis, Goianápolis, Senador Canedo, Aparecida de Goiânia,

Hidrolândia, Aragoiânia e Abadia de Goiás. Já a Região de Desenvolvimento Integrado de

Goiânia conta ainda com os municípios de Bela Vista, Bonfinópolis, Brazabrantes, Caturaí,

Inhumas, Nova Veneza e Terezópolis de Goiás. Poucos anos depois, os municípios de

Caldazinha e Guapó, localizados também no colar metropolitano14

passam a integrar

oficialmente a RMG, estendendo-a para vinte municípios.

Conforme dados da Prefeitura de Goiânia15

a RMG é a mais expressiva região do

Estado de Goiás, visto que: contém a capital do Estado, seus municípios abrigam 35% da

população um terço dos eleitores, 80% dos estudantes universitários e aproximadamente 60%

do Produto Interno Bruto - PIB- estadual.

De acordo com pesquisa realizada pelo Observatório das Metrópoles intitulada

“Como anda Goiânia”, a taxa média de crescimento anual da população metropolitana

manteve-se estável em 3,2% desde o Censo de 1991. A maioria dos municípios da RMG

apresentou taxas de crescimento superiores à do município de Goiânia. Os autores do volume

14

A noção de “colar metropolitano” é utilizada por alguns estudiosos para suprir lacunas e imprecisões das leis

que criam regiões metropolitanas no Brasil. Ver GARSON, Sol (2010); Secretaria de Estado de Gestão e

Planejamento - SEGPLAN-GO. 15

http://www.goiania.go.gov.br/html/principal/goiania/regiaometropolitana/regiaometropolitana.shtml

51

inferem que a população metropolitana cresce em função das ofertas de serviços e

possibilidades de trabalhos oferecidas pela capital do Estado; que a maioria dos novos

contingentes populacionais vai localizar-se nos municípios do entorno da capital; e que a

manutenção da taxa de crescimento populacional, durante a década de 1990, atesta a

existência de uma grande mobilidade interna de pessoas de um município para o outro

(MOYSÉS, 2009).

Conforme este estudo, o contingente populacional da RMG sobrevive com dois

salários mínimos, em média, expressando um débil mercado interno. Em vista da polarização

exercida pela capital, a consequência mais imediata é que muitos dos problemas sociais de

Goiânia são gerados nos municípios vizinhos. Acerca disto, Moysés (2009, p. 81) aponta que

este fato “exige dos gestores urbanos desse imenso espaço territorial, ações conjuntas na

perspectiva de se alcançar resultados positivos com as políticas públicas de inclusão social.”

Segundo o estudo, os motivos do deslocamento, para trabalhar ou estudar, são

mais intensos nos municípios que apresentam alto nível de integração com a dinâmica da

região. Aparecida de Goiânia, por exemplo, é um dos municípios que apresenta alta taxa de

integração com o pólo metropolitano. Além dos deslocamentos em razão de trabalho e estudo,

há também os deslocamentos em função de outras necessidades, como busca de serviços de

saúde e assistência social.

3.2. A OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GOIÂNIA E APARECIDA DE

GOIÂNIA

O debate acerca da saúde pública mostra-se presente na cena política de Goiânia

desde sua fundação, na década de 1930, para sediar a nova capital do Estado de Goiás. A

mudança de antiga capital Vila Boa para Goiânia ocorreu num intenso clima de disputas

políticas. A construção da nova capital esteve inserida no movimento de interiorização do

desenvolvimento do Brasil proposto por Getúlio Vargas, a chamada “Marcha para o Oeste”.

Um dos argumentos que justificavam essa mudança era de ordem higiênico-sanitarista,

inscrevendo a questão da saúde pública como um elemento norteador do governo de Pedro

Ludovico Teixeira.16

.

16

No artigo “Mudança da capital: uma estratégia de poder” de Itami Campos há interessante discussão acerca

das relações entre o saber médico e a manutenção do poder político.

http://www.itamicampos.com/artigos/Goiania/MUDANCADACAPITAL.pdf. Acesso em 14/10/2010.

52

A cidade de Goiânia é uma das poucas capitais brasileiras de origem planejada.

Armando Godoy planejou a cidade para 50 mil habitantes. O restante da população habitaria

em „cidades satélites‟, ou nos centros suburbanos afastados do núcleo urbano. Na década de

1960, a cidade já havia superado em três vezes essa previsão, e contava com 153.505 mil

habitantes.

Embora urbanisticamente planejada, a cidade de Goiânia não dispunha, até o ano

de 1937, de nenhum aparelhamento de saúde pública. No Estado de Goiás havia apenas duas

instituições voltadas para o atendimento médico aos doentes, o Hospital São Pedro de

Alcântara, na antiga capital e criado em 1825, e o Hospital Evangélico de Anápolis, criado

pela iniciativa privada na década de 1920 (FAVARO, 2009).

Diante da insuficiência de recursos financeiros destinados ao setor de saúde

pública a primeira dama, Gercina Borges Teixeira, organizou campanhas de arrecadação de

recursos para a construção da Santa Casa de Misericórdia em Goiânia. Essa ação deu origem à

expansão da rede hospitalar filantrópica que assegurou o atendimento das demandas por

assistência médica no processo de construção de Goiânia, mediante subsídios públicos e a

contribuição de voluntários. A criação do pronto-socorro (1936), anexo às instalações da

futura Santa Casa (1937), sob responsabilidade dos irmãos vicentinos, a criação da Sociedade

Goiana de Assistência aos Lázaros e Defesa contra a Lepra, que originou a Colônia Santa

Marta, bem como o Preventório Afrânio Azevedo (destinado ao acolhimento dos filhos dos

portadores de lepra) e a criação em 1941 do Posto de Puericultura Santo Antônio, pela

Associação de Proteção à Maternidade e à Infância, são exemplos de ações empreendidas por

entidades privadas de caráter filantrópico em prol da saúde pública na nova Capital de Goiás,

o que lhes conferiu naquele momento grande importância social uma vez que o Estado se

eximiu de suas responsabilidades neste setor (FAVARO, 2009).

Ainda no sentido de compor o cenário da rede hospitalar e de assistência à saúde

nas primeiras décadas de Goiânia, vale registrar a criação do Hospital Adauto Botelho (1950),

destinado ao atendimento psiquiátrico/neurológico; do Hospital Pênfigo; do Sanatório

Juscelino Kubitschek, para o atendimento aos tuberculosos; do Hospital Geral de Goiânia

(1962); do Hospital da família Rassi (Casa de Saúde Dr. Rassi); do Hospital Geral do

INAMPS; e do Centro Materno Infantil entre os anos de 1966 a 1971 (FAVARO, 2009). O

estudo de Favaro não inclui em sua lista a criação de dois grandes hospitais de referência no

Estado de Goiás, o Hospital das Clínicas da UFG, criado em 1984, e o Hospital de Urgências

de Goiânia, criado em 1987.

53

Não é nosso propósito descrever minuciosamente as ações empreendidas em

Goiânia no setor de saúde pública, mas apenas pontuar suas origens bem como os atores

sociais que estiveram à frente dessa questão. Como se pode notar, as demandas da saúde

pública em Goiânia, desde sua procedência, estiveram relegadas ao setor privado e à

filantropia subsidiada pelo poder público. Somente nos casos em que a iniciativa privada não

se interessava é que o Estado intervinha, como no caso do Hospital Materno Infantil. Importa-

nos aqui contextualizar em linhas gerais a ação do Estado em relação à saúde pública.

3.2.1. A oferta de serviços de saúde em Goiânia

Atualmente, a partir da primeira década do século XXI, Goiânia constitui um

importante centro de referência médico-hospitalar do Estado de Goiás e do Brasil. O grande

número de estabelecimentos de saúde, públicos e privados, assim como de equipamentos para

exames de maior complexidade e o quadro de profissionais especializados e de referência em

determinadas cirurgias, como as de separação de gêmeos siameses, fazem com que Goiânia

amplie o escopo de atendimento médico para além de seus habitantes, atendendo também

moradores das cidades vizinhas e de outros estados do país. A Tabela 1 mostra a estrutura da

rede de serviços de saúde em Goiânia, no ano de 2005.

QUADRO 2: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM GOIÂNIA – 2005.

Estabelecimentos e equipamentos de Saúde Quantidade

Estabelecimento de Saúde Total 604

Estabelecimento de Saúde Público Total 107

Estabelecimento de Saúde Público Federal 06

Estabelecimento de Saúde Público Estadual 16

Estabelecimento de Saúde Público Municipal 85

Estabelecimento de Saúde Privada Total 497

Estabelecimento de Saúde Privado com fins lucrativos 481

Estabelecimento de Saúde Privado sem fins lucrativos 16

Estabelecimento de Saúde Privado SUS 197

Estabelecimento de Saúde com internação total 92

Estabelecimento de Saúde sem internação total 291

Estabelecimento de Saúde com apoio à diagnose e terapia total 221

Estabelecimento de Saúde com internação pública 12

Estabelecimento de Saúde sem internação pública 91

Estabelecimento de Saúde com apoio à diagnose e terapia público 04

Estabelecimento de Saúde com internação privado 80

Estabelecimento de Saúde sem internação privado 200

Estabelecimento de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado 217

54

Estabelecimentos de Saúde total privado/SUS 197

Estabelecimentos de Saúde com internação privado/SUS 46

Estabelecimentos de Saúde sem internação privado/SUS 36

Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado/SUS 115

Estabelecimentos de Saúde especializados com internação total 25

Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação total 240

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação total 48

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação total 233

Estabelecimentos de Saúde geral com internação total 19

Estabelecimentos de Saúde geral sem internação total 39

Estabelecimentos de Saúde especializados com internação públicos 03

Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação públicos 11

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação públicas 07

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação pública 48

Estabelecimentos de Saúde geral com internação pública 02

Estabelecimentos de Saúde geral sem internação pública 36

Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privados 22

Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação privados 229

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privados 41

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privados 185

Estabelecimentos de Saúde geral com internação privados 17

Estabelecimentos de Saúde geral sem internação privados 03

Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privados/SUS 14

Estabelecimentos de Saúde especializados sem internação privados/SUS 81

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privados/SUS 18

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privados/SUS 70

Estabelecimentos de Saúde geral com internação privados/SUS 14

Estabelecimentos de Saúde geral sem internação privados/SUS 00

Estabelecimentos de Saúde SUS 303

Estabelecimentos de Saúde planos próprios 27

Estabelecimentos de Saúde planos de terceiros 444

Estabelecimentos de Saúde próprios 490

Estabelecimentos de Saúde única total 553

Estabelecimentos de Saúde com terceirização total 51

Estabelecimentos de Saúde terceirizados total 70

Estabelecimentos de Saúde único público 106

Estabelecimentos de Saúde com terceirização pública 01

Estabelecimentos de Saúde terceirizado público 00

Estabelecimentos de Saúde únicos privado 447

Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado 50

Estabelecimentos de Saúde terceirizados privado 70

Estabelecimentos de Saúde únicos privado/SUS 175

Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado/SUS 22

Estabelecimentos de Saúde terceirizado privado/SUS 31

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde total 5.291

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público total 1.256

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público federal 304

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público estadual 895

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público municipal 57

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 4.035

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado SUS 3.136

Mamógrafo com comando simples 50

Mamógrafo com estéreo-taxia 17

Raio X para densitometria óssea 33

Tomógrafo 37

Ressonância magnética 11

Ultrassom doppler colorido 125

Eletrocardiógrafo 217

Eletroencefalógrafo 43

Equipamento de hemodiálise 234

55

Raio X até 100mA 61

Raio X de 100 a 500mA 108

Raio X mais de 500mA 55

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial total 380

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial sem atendimento

médico

40

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento

médico em especialidades básicas

223

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento

médico em outras especialidades

230

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento

odontológico com dentista

92

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência total 75

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Pediatria 25

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Obstetrícia 33

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Psiquiatria 05

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Clínica 38

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Cirurgia 25

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Traumato Ortopedia 20

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Neuro Cirurgia 11

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Cirurgia Buco

Maxilofacial

09

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Outros 18

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 152

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Internação 56

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Emergência 38

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS UTI/CTI 20

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Diálise 12

Fonte: IBGE, Assistência Médica Sanitária 2005; Malha municipal digital do Brasil: situação em 2005. Rio

de Janeiro: IBGE, 2006. NOTA: Atribui-se zeros aos valores dos municípios onde não há ocorrência da

variável ou onde, por arredondamento, os totais não atingem a unidade de medida.

Embora os dados acima apontem para a existência de uma bem equipada e

diversificada rede de assistência médico-hospitalar, abrangendo várias especialidades, no que

diz respeito à capacidade de atendimento do sistema público a oferta de serviços de saúde não

consegue atender as demandas da população, em especial da parcela carente. A falta de

médicos nas unidades de saúde, a demora no encaminhamento para as especialidades

médicas, a carência de remédios, a falta de manutenção dos equipamentos de exame, a

ausência de leitos, etc. são alguns dos muitos exemplos das deficiências do sistema público de

saúde em Goiânia, cotidianamente retratado pela imprensa local.

Em entrevista ao jornal Opção17

o presidente da Associação dos Hospitais,

Fernando Honorato, afirma que a saúde pública piorou na última década devido à baixa

remuneração dos médicos. A carência de investimento público na saúde se reflete na

precariedade das condições de trabalho nos hospitais públicos, exemplificada por ele, pela

existência de um único tomógrafo no Hospital de Urgências de Goiás que „vive‟ quebrado.

17

Matéria do dia 12/12/10 no Jornal Opção: “O problema é o desperdício.”

http://www.jornalopcao.com.br/posts/reportagens/maior-problema-e-o-desperdicio.

56

Honorato afirma ainda que no ano de 2009 Goiás perdeu 141 leitos em hospitais

credenciados. Isto porque as unidades estavam descontentes com a baixa remuneração paga

pelo SUS aos hospitais privados. Enquanto o setor privado (Unimed) paga 43 reais por

consulta, o SUS paga seis reais.

Se, por um lado, o sistema de saúde pública tem enfrentado problemas relativos às

condições de trabalho e às queixas das entidades de classe e dos especialistas da área médica

quanto à remuneração, de outro lado, está o controle e prevenção do aumento no número de

casos de doenças como a dengue, a hepatite, a tuberculose, a AIDS e a meningite.

A Pesquisa Nacional de Avaliação das Comissões Intergestores Bipartites - CIBs

- que avalia as condições de saúde da população registrou o surgimento dos seguintes casos de

doenças no município de Goiânia durante os anos de 2005 a 2007 conforme segue o quadro

abaixo.

QUADRO 3: CASOS DE DOENÇAS

REGISTRADAS ENTRE A POPULAÇÃO DE

GOIÂNIA ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.

Doenças No. de casos

AIDS 507

Dengue 21883

Febre Amarela 1

Hepatite 988

Malária 93

Meningite 423

Tuberculose 717 Fonte: Ministério da Saúde 2010. Pesquisa Nacional de Avaliação

das CIBS/Condições de Saúde da População.

Como se pode perceber, o número de casos de dengue registrados em Goiânia

entre 2005 e 2007 eram preocupantes. Durante os anos de 2009 e 2010 esses dados levaram o

Ministério da Saúde a considerar a disseminação da doença como “situação de alerta”, de

acordo com o índice de infestação predial.18

Esses dados ilustram a precariedade da saúde

pública no município de Goiânia e refletem os desafios postos ao Conselho Municipal de

Saúde.

3.2.2. As origens da cidade de Aparecida de Goiânia e a questão da saúde pública

A fundação de Aparecida de Goiânia data da década de 1920. Abraão Lourenço

de Carvalho, João Batista de Toledo, Antônio Barbosa Sandoval, Aristides Frutuoso e José

18

http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=33541&janela=1

57

Cândido de Queiroz foram os pioneiros a chegarem a Campina, onde atualmente está

localizado o centro urbano de Aparecida de Goiânia.

A construção da cidade teve influência da ação dos padres redentoristas de

Campina e pelo sentimento religioso dos habitantes. Em 1922 foi celebrada a primeira missa

campal no terreno doado pelos fazendeiros para a construção da igreja matriz. Devido à

devoção a Nossa Senhora Aparecida o povoado recebeu o nome de Arraial de Aparecida em

1932.

No ano de 1958 o povoado de Aparecida passou a ser considerado Distrito de

Goiânia, através da Lei Municipal 1.295. Nesse mesmo ano passou a ser nomeado Aparecida

de Goiás e em seguida Goialândia, por estar localizada entre os municípios de Hidrolândia e

Goiânia. No entanto, no ano de 1963 o Distrito de Goialândia passa à condição de Município,

através da Lei Estadual 4.927, e recebe o nome de Aparecida de Goiânia, já que o nome

anterior não recebeu apoio da população. O Município de Aparecida de Goiânia é composto

pelo Distrito-sede e o Distrito da Vila Brasília.

Aparecida de Goiânia chega a 2010 com uma população de 455.73519

habitantes.

De acordo com dados da SEPIN (Superintendência de Estatísticas, Pesquisa e Informações

Socioeconômicas), órgão ligado a SEGPLAN (Secretaria de Estado, de Gestão e

Planejamento do Estado de Goiás), o município foi responsável pelo 3º maior PIB - Produto

Interno Bruto- do Estado de Goiás durante os anos de 2007 e 2008. No entanto, grande parte

de sua população se desloca diariamente para Goiânia para trabalhar, estudar e em busca de

outros serviços, como os de saúde, conforme dito acima. O Quadro 4 apresenta a estrutura da

rede de serviços de saúde situada no município de Aparecida de Goiânia.

QUADRO 4: OFERTA DE SERVIÇOS DE SAÚDE EM APARECIDA DE GOIÂNIA

NO ANO DE 2005.

Estabelecimentos e equipamentos de Saúde Quantidade

Estabelecimentos de Saúde total 52

Estabelecimentos de Saúde públicos total 23

Estabelecimentos de Saúde público municipal 23

Estabelecimentos de Saúde privado total 29

Estabelecimentos de Saúde privado com fins lucrativos 29

Estabelecimentos de Saúde privado SUS 25

Estabelecimentos de Saúde com internação total 07

19

De acordo com os resultados preliminares do Censo 2010.

58

Estabelecimentos de Saúde sem internação total 32

Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia total 13

Estabelecimentos de Saúde com internação público 01

Estabelecimentos de Saúde sem internação público 22

Estabelecimentos de Saúde com internação privado 06

Estabelecimentos de Saúde sem internação privado 10

Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado 13

Estabelecimentos de Saúde total privado/SUS 25

Estabelecimentos de Saúde com internação privado/SUS 06

Estabelecimentos de Saúde sem internação privado/SUS 09

Estabelecimentos de Saúde com apoio à diagnose e terapia privado/SUS 10

Estabelecimentos de Saúde especializado com internação total 01

Estabelecimentos de Saúde especializado sem internação total 03

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação total 05

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação total 25

Estabelecimentos de Saúde geral com internação total 01

Estabelecimentos de Saúde geral sem internação total 17

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação público 01

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação público 05

Estabelecimentos de Saúde geral sem internação público 17

Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privado 01

Estabelecimentos de Saúde especializado sem internação privado 03

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privado 04

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privado 20

Estabelecimentos de Saúde geral com internação privado 01

Estabelecimentos de Saúde especializado com internação privado/SUS 01

Estabelecimentos de Saúde especializado sem internação privado/SUS 02

Estabelecimentos de Saúde com especialidades com internação privado/SUS 04

Estabelecimentos de Saúde com especialidades sem internação privado/SUS 17

Estabelecimentos de Saúde geral com internação privado/SUS 01

Estabelecimentos de Saúde SUS 48

Estabelecimentos de Saúde plano próprio 01

Estabelecimentos de Saúde plano de terceiros 29

Estabelecimentos de Saúde próprio 29

Estabelecimentos de Saúde único total 49

Estabelecimentos de Saúde com terceirização total 03

Estabelecimentos de Saúde terceirizado total 05

Estabelecimentos de Saúde único público 23

Estabelecimentos de Saúde terceirizado público 26

Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado 03

59

Estabelecimentos de Saúde terceirizado privado 05

Estabelecimentos de Saúde único privado/SUS 22

Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado/SUS 03

Estabelecimentos de Saúde com terceirização privado/SUS 04

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde total 668

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público total 15

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde público municipal 15

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 653

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 653

Leitos para internação em Estabelecimentos de Saúde privado total 04

Mamógrafo com estéreo-taxia 01

Mamógrafo com estéreo-taxia 05

Mamógrafo com estéreo-taxia 02

Ultrassom doppler colorido 09

Eletrocardiógrafo 18

Eletroencefalógrafo 04

Equipamento de hemodiálise 24

Raio X até 100mA 05

Raio X de 100 a 500mA 09

Raio X mais de 500mA 01

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial total 39

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento médico em

especialidades básicas

36

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento médico em

outras especialidades

19

Estabelecimentos de Saúde com atendimento ambulatorial com atendimento médico em

outras especialidades

10

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência total 11

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Pediatria 05

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Obstetrícia 04

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Psiquiatria 03

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Clínica 08

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Traumato Ortopedia 01

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Neuro Cirurgia 01

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Cirurgia Buco Maxilofacial 01

Estabelecimentos de Saúde com atendimento de emergência Outros 01

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 28

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 07

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Ambulatorial 09

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS UTI/CTI 04

60

Estabelecimentos de Saúde que prestam serviço ao SUS Diálise 04

Fonte: IBGE, Assistência Médica Sanitária 2005; Malha municipal digital do Brasil: situação em 2005. Rio

de Janeiro: IBGE, 2006. NOTA: Atribui-se zeros aos valores dos municípios onde não há ocorrência da

variável ou onde, por arredondamento, os totais não atingem a unidade de medida.

Como se pode notar, a rede de assistência médico-hospitalar é mais carente de

estabelecimentos e de equipamentos se comparada à estrutura da rede de saúde de Goiânia.

Em 2005, ano em que foi realizada a pesquisa do IBGE sobre a Assistência Médica Sanitária,

Aparecida de Goiânia não contava com o Hospital de Urgências de Aparecida de Goiânia

(Huapa). Este começou a funcionar em abril de 2008, mas não atendia casos de emergência e

chegou a ser reinaugurado por três vezes. O atendimento de emergência era realizado pelo

Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) que recebe pacientes das cidades vizinhas.

Além da falta de estrutura apropriada para atender às necessidades médicas de sua

população, a cidade de Aparecida de Goiânia conta também com o problema da falta de

controle e de prevenção de doenças entre a população aparecidense. Em especial, cita-se a alta

incidência da dengue.

QUADRO 5: CASOS DE DOENÇAS REGISTRADAS

ENTRE A POPULAÇÃO DE APARECIDA DE GOIÂNIA

ENTRE OS ANOS DE 2005 E 2007.

Doenças No. de casos

AIDS 200

Dengue 14583

Febre Amarela 0

Hepatite 485

Malária 34

Meningite 199

Tuberculose 355 Fonte: Ministério da Saúde 2010. Pesquisa Nacional de Avaliação das

CIBS/Condições de Saúde da População.

No ano de 2009 o número de infestações da dengue fez com que o município

fosse classificado pelo Ministério da Saúde como “situação de alerta”. No ano de 2010 esse

índice baixou e é considerado “satisfatório” pelo Ministério da Saúde.

Não foi nossa pretensão traçar um perfil detalhado da questão da saúde nos

municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia, mas sim apresentar elementos que possam

compor, ainda que minimante, um cenário de conjuntura no período em que pesquisamos os

61

conselhos de saúde, de 2010 a 2011, no sentido de identificar os desafios postos aos

Conselhos Municipais de Saúde desses dois municípios.

3.3. PROCEDIMENTOS DE COLETA E DE ANÁLISE DOS DADOS

Para melhor compreender a ação do Estado em relação à partilha do poder

decisório com os conselhos municipais de saúde, nos servimos de três técnicas: a observação

participante, a realização de entrevistas com os conselheiros e a análise documental.

A observação passiva

Na primeira etapa da pesquisa utilizamos a observação passiva nas reuniões dos

Conselhos de Saúde de Aparecida de Goiânia e de Goiânia. No Conselho Municipal de Saúde

de Aparecida de Goiânia (CMSAPG) acompanhamos a realização de duas reuniões, uma no

mês de setembro e outra no mês de novembro20

de 2010. Já no Conselho Municipal de Saúde

de Goiânia (CMSG) acompanhamos a realização do I Seminário de Capacitação de

Conselheiros de Saúde de Goiânia e uma reunião ordinária do CMSG, ambos realizadas no

mês de novembro de 2010.

Os conselheiros do CMSAPG se mostraram mais receptivos e disponíveis para

colaborar com a realização da pesquisa, oferecendo telefones de contato do presidente, livre

acesso às reuniões e a alguns documentos do conselho. De outro lado, no CMSG houve

resistência inicial por parte de alguns mediadores, que só foi superada após a realização da

entrevista com o presidente do conselho. Depois, tivemos livre acesso às reuniões e ao curso

de capacitação de conselheiros, realizado em novembro de 2010.

As anotações de campo obtidas através da observação passiva possuem caráter

secundário, servindo de complemento às entrevistas, em vista de melhor contextualizar e

compreender os depoimentos dos entrevistados. Registramos as inter-relações dentro das

reuniões ordinárias dos conselhos e do curso de capacitação de conselheiros, o espaço físico

20

No mês de outubro não houve reunião.

62

de atuação (a sede dos conselhos e o espaço de realização das reuniões ordinárias e do curso

de capacitação dos conselheiros) e a estrutura de funcionamento dos conselhos.

Entrevistas com os conselheiros do CMSAPG e do CMSG

A segunda etapa da pesquisa consistiu na realização das entrevistas com os

conselheiros municipais de saúde dos dois municípios. No Conselho Municipal de Saúde de

Aparecida de Goiânia (CMSAPG) entrevistamos três conselheiros e no Conselho Municipal

de Saúde de Goiânia (CMSG) entrevistamos quatro conselheiros. As entrevistas foram

realizadas seguindo um roteiro previamente definido (Anexo I). O critério de escolha dos

entrevistados se deu por aspectos justificados no quarto capítulo e além destes, por

acessibilidade e disponibilidade dos conselheiros em conceder a entrevista. Todas as

entrevistas foram gravadas, transcritas e organizadas em quatro eixos interpretativos.

Análise documental

Na terceira etapa da pesquisa realizamos a análise documental com objetivo de

apreender informações que pudessem traçar um perfil da atuação do Estado em relação aos

conselhos municipais de saúde. O CMSAPG possui uma página na internet na qual

disponibiliza os seguintes documentos:

Agenda de reuniões durante o ano de 2010;

Decreto nº 558, de 13 de Abril de 2010 que homologa o Regimento Interno do

Conselho Municipal de Saúde de Aparecida de Goiânia;

Regimento Interno do CMSAPG;

Relação de Entidades com candidatura habilitada a concorrer ao cargo de

membro do CMSAPG;

Informativo explicativo sobre os representantes dos trabalhadores da saúde e

do gestor do SUS;

Portaria nº 10 que convoca a I Plenária de Eleição de Entidades e Movimentos

Sociais do CMSAPG;

63

Resolução nº 08/2010 que convoca a eleição de membros do CMSAPG;

Portaria nº 8 que trata da homologação da Resolução 05 de 25/03/2010; e o

Regimento Interno do CMSAPG.

Além dos documentos acima citados, o CMSAPG disponibiliza em seu sítio leis e

resoluções dos Conselhos Estadual e Nacional de Saúde. Emitimos um ofício solicitando

cópias das atas da atual gestão. No entanto, só tivemos acesso a algumas atas, já que o

secretário executivo do CMSAPG esteve doente e não teve tempo de redigir as atas. Na

última reunião do ano de 2010 as atas ainda estavam em processo de revisão e não haviam

sido aprovadas pelos conselheiros.

Do CMSG tivemos acesso ao Regimento Interno e a seis atas da atual gestão, pois

as demais não foram homologadas pelos conselheiros. Ao contrário do CMSAPG, o CMSG

não possui um secretário executivo próprio, de modo que as atribuições de competência da

secretaria executiva do conselho são realizadas por servidores da Secretaria deslocados para

atuarem junto ao conselho.

A análise documental objetivou caracterizar juridicamente a atuação dos

conselhos municipais de saúde das cidades de Aparecida de Goiânia e de Goiânia em relação

a: finalidade, competência, composição, funcionamento e organização administrativa, assim

como identificar nas atas as relações entre o conselho e a secretaria municipal de saúde.

Aspectos éticos

Esse estudo foi submetido ao Comitê de Ética da Universidade Federal de Goiás e

obteve parecer favorável a sua realização. Antes de iniciar as entrevistas, os conselheiros

receberam uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo A) no qual

constam os objetivos e as implicações da pesquisa. E, em conformidade com os princípios

éticos da pesquisa, todas as informações obtidas serão utilizadas unicamente para fins

acadêmicos, resguardando a identidade das pessoas envolvidas e a confidencialidade dos

dados.

64

QUARTO CAPÍTULO

__________________________________________________________________________

4. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE

DE GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA

Antes de apresentarmos a interpretação dos depoimentos da pesquisa

repassaremos os objetivos e as questões norteadoras deste estudo.

O objetivo geral é investigar a ação do Estado, particularizado na instância

municipal, diante das modificações implementadas em seu monopólio sobre os meios de

administração pelos conselhos municipais de saúde, identificando o tipo de relação

estabelecida entre as dinâmicas das duas instâncias no que tange à partilha de poder, assim

como caracterizá-las e propor uma compreensão das variáveis que interferem nessa relação.

Para tanto, buscamos caracterizar os conselhos de saúde nos municípios de

Goiânia e de Aparecida de Goiânia, em sua atual gestão, tentando matizar regularidades e

tendências nas ações dos governantes no que tange ao funcionamento, à regularidade das

reuniões, das condições da participação e processos de tomada de decisão, assim como

averiguar o julgamento que os conselheiros fazem a respeito das relações estabelecidas entre o

Estado e o conselho no que se refere à partilha de poder.

Este capítulo destina-se a interpretar os depoimentos dos conselheiros do

Conselho Municipal de Saúde de Goiânia (CMSG) e dos conselheiros municipais de saúde de

Aparecida de Goiânia, assim como apresentar algumas notas sobre as atas das reuniões e

algumas explanações acerca da observação participante realizada em uma reunião do conselho

e no curso de capacitação de conselheiros.

4.1. ENTREVISTAS COM OS CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE

GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA

A análise de conteúdo é, segundo Berelson apud Gil, (1999, p.13) “uma técnica de

pesquisa que visa à descrição objetiva, sistemática e qualitativa do conteúdo manifesto nas

comunicações, tem por finalidade a interpretação dessas mesmas comunicações.”

65

Com a análise dos conteúdos das entrevistas aspiramos estabelecer uma

compreensão dos depoimentos coletados, verificar nossa hipótese de pesquisa e ao mesmo

tempo ampliar os conhecimentos sobre o tema da democratização dos espaços decisórios

(MINAYO, 1992).

O corpus da análise foi dividido em duas partes: a caracterização do perfil dos

conselheiros entrevistados e a apreciação dos conselheiros sobre os temas abordados nas

entrevistas.

Os depoimentos dos entrevistados, isto é, as unidades de registro foram

decompostas em temas e organizadas em quatro eixos: 1) a avaliação da atuação do conselho;

2) a avaliação da relação com a secretaria de saúde; 3) a avaliação do papel democratizador

do conselho; e 4) os entraves à atuação do conselho.

As categorias democracia e partilha de poder nortearam o processo de

compreensão cujo foco foi a relação dos Secretários Municipais de Saúde de Goiânia e de

Aparecida de Goiânia com os respectivos conselhos. Como afirmarmos, o gestor constitui-se

em agente com “posição-chave” nas dinâmicas do conselho, de modo que seu

comprometimento político com a democratização da gestão pública reverbera em ações

capazes de contribuir para a efetividade das decisões políticas ou mesmo de direcionar a

natureza do conselho municipal de saúde de seu município. Assim, a vontade política do

governante se estabelece como um elemento importante para os estudos dos processos de

ampliação democrática no âmbito da gestão pública, visto que ela é capaz de nortear sua ação.

Com o propósito de comparar as ações dos secretários municipais de saúde de

Goiânia e de Aparecida de Goiânia propusemos uma classificação ideal de ações que

demonstrem o empenho do gestor comprometido com a democratização da gestão pública de

saúde. São elas: a) o Conselho possuir verba própria para sua atuação; b) o secretário

municipal de saúde manter relações de cooperação com o Conselho; c) a presença do

secretário municipal de saúde ou do prefeito nas reuniões e eventos do Conselho; d) o fácil

acesso às informações da Secretaria Municipal de Saúde; e) a elaboração conjunta dos

projetos de saúde do município; e f) e o Conselho possuir boa estrutura física e pessoal

administrativo próprio para desempenhar suas funções. Esta classificação serviu de referência

para confrontarmos as ações do gestor empenhado com a democratização da política

municipal de saúde com as ações dos Secretários Municipais de Saúde de Goiânia e de

Aparecida de Goiânia.

66

Perfil dos conselheiros entrevistados

Antes de iniciarmos as entrevistas fizemos algumas perguntas que tiveram como

objetivo traçar o perfil socioeconômico bem como a trajetória político-associativa dos

conselheiros do CMSG e do CMSAPG. Nossa intenção foi situar o depoimento dos atores aos

contextos sociais a que eles pertencem. Desse modo, identificar as origens sociais, bem como

as trajetórias políticas dos atores sociais entrevistados, constitui o primeiro passo rumo à

tentativa de compreender as relações estabelecidas entre Estado e sociedade no interior dos

Conselhos Municipais de Saúde dos municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia.

A escolha dos conselheiros entrevistados teve como critério a seleção de pessoas

com experiência em movimentos sociais e em entidades associativas (entidades profissionais,

associações de moradores, entidades religiosas, etc.) capazes de articular com clareza acerca

de suas experiências. Tivemos também o objetivo de entrevistar pessoas ligadas ao segmento

usuário, e de entrevistar um representante do segmento gestor para que pudéssemos

estabelecer comparações entre os discursos. Para além destes critérios apresentados, a

pesquisa efetivamente foi realizada com os conselheiros que além de estarem enquadrados no

perfil desenhado, manifestaram desejo de participar da entrevista. Ao total realizamos sete

entrevistas, sendo quatro com conselheiros municipais de saúde de Goiânia e três com

conselheiros municipais de saúde de Aparecida de Goiânia.

Dos quatro conselheiros do CMSG entrevistados, dois representam entidades

profissionais, um representa os usuários e um representa o sindicato. Entrevistamos três

mulheres e um homem, com idade variando entre quarenta e cinquenta anos.

Em relação à escolaridade, três possuem o ensino superior completo, sendo que

dentre eles dois com pós-graduação, e um concluiu o ensino médio. A renda familiar dos

entrevistados varia entre R$ 1.500,00 e R$ 10.000,00.

Quanto à religião, entrevistamos um evangélico, um católico, um espírita e um

que se autodenominou espiritualista.

Sobre a trajetória e experiências anteriores de ação coletiva ou de associativismo,

um entrevistado relata experiências ligadas a entidade profissional. Os demais possuem

experiências em entidades religiosas, associações de moradores, no conselho de saúde e

sindicatos. Ainda neste tópico, um afirmou ser filiado a partido político e dois afirmaram ter

67

simpatia por partidos de esquerda. Sobre a experiência no Conselho Municipal de Saúde, os

conselheiros atuam nele há mais de dois anos.

Das três entrevistas realizadas no CMSAPG, entrevistamos o presidente, um

representante do segmento usuário e um representante do segmento gestor. A idade dos

conselheiros varia de 40 a 50 anos. Entrevistamos dois homens e uma mulher. A escolaridade

varia entre o ensino fundamental incompleto e a pós-graduação. Sobre a renda familiar, a

variação é entre R$ 2.000,00 e R$ 6.000,00, sendo que um conselheiro não informou o valor

de sua renda familiar. E, por fim, sobre a prática religiosa, temos um católico, um protestante

e um espírita.

Para compor o perfil político-associativo dos conselheiros indagamos se possuíam

experiências associativas em outras organizações. Dois conselheiros afirmaram participar de

entidades ligadas às questões de saúde e também a movimentos de cunho religioso. Uma

conselheira afirmou participar de movimento ligado a questões étnico- raciais.

Sobre filiação partidária ou simpatia por partidos políticos, nenhum conselheiro

informou filiação a partidos políticos. Um conselheiro respondeu manter simpatia ao PMDB,

enquanto outro disse que sua simpatia não era por partidos, mas por lideranças políticas,

citando os nomes de Dilma Rousseff, José Serra, Marconi Perillo e Iris Rezende.

Por fim, sobre a experiência de participação no CMSAPG, dois entrevistados

participam do conselho há aproximadamente um ano, enquanto que outro participa desde a

fundação do mesmo.

Tendo em vista o perfil acima traçado, pode-se afirmar que as características

socioeconômicas e a trajetória associativa dos conselheiros entrevistados não diferem da

realidade constatada nacionalmente. Conforme Santos, Ribeiro e Azevedo a experiência dos

conselhos municipais no Brasil demonstra que esses são compostos por uma grande

diversidade de organizações sociais (instituições governamentais, instituições sindicais,

instituições patronais e as instituições da sociedade civil).

No entanto, se a representação de organizações sociais é diversificada, afirmam os

autores, o mesmo não se observa em relação aos segmentos sociais presentes nos conselhos

municipais, geralmente constituído por aqueles de maior renda e escolaridade. Embora nossa

pesquisa não nos permita afirmar que no CMSG e no CMSAPG predomine representantes

com níveis elevados de escolaridade e renda, se comparados à população de modo geral, ela

nos permite endossar, conforme os dados socioeconômicos levantados, que os segmentos

mais privilegiados economicamente são representados nos conselhos.

68

No que diz respeito à trajetória associativa dos conselheiros, também é possível

notar, guardadas as devidas proporções, similaridades com os resultados obtidos no estudo de

Santos, Ribeiro e Azevedo. A própria natureza representativa dos conselhos requisita que os

conselheiros sejam associados a algum tipo de organização, seja ela estatal ou societal.

Conforme os autores, os conselheiros representantes da sociedade se destacam por

participarem efetivamente de atividades sociopolíticas. Este fato pôde ser constatado em

nossa pesquisa, a exemplo de um conselheiro representante dos usuários no CMSG, que

também atua como conselheiro do Conselho de Ética do Hospital Araújo Jorge, como

conselheira do conselho local de sua região e como presidente de associação de moradores em

seu bairro.

A participação efetiva e diversificada dos conselheiros em outras associações e

entidades possibilita o acúmulo de capital político, de recursos não-convencionais capazes de

equilibrarem politicamente a ausência de recursos educacionais e econômicos, que em geral

leva à baixa capacidade de influência dos segmentos sociais desfavorecidos no interior dos

conselhos, como advoga Fuks (2004). No entanto, corre-se o risco da monopolização da

representação, em razão da baixa rotatividade de conselheiros e mesmo do acúmulo de

representações, num processo que pode resultar em desfavor da democratização de espaços

públicos, como o são os conselhos de políticas públicas.

Por fim, o perfil socioeconômico e a trajetória político-associativa que propomos

não visam justificar a representatividade, no sentido estatístico, do grupo acima entrevistado,

mas sim localizar os entrevistados na estrutura social.

Contextualização

A pesquisa foi realizada durante o ano de 2010, ano de eleições políticas para os

cargos de presidente da República, senadores, governadores, deputados federais, estaduais e

distritais.

Em Goiás, um dos candidatos ao governo estadual era o então prefeito da cidade

de Goiânia, Iris Rezende Machado, do PMDB, que deixou o cargo para disputar o pleito.

Portanto, tomou posse para o vice-prefeito Paulo Garcia. Em Aparecida de Goiânia era

prefeito Maguito Vilela, do PMDB.

No contexto interno, o CMSG realizou, no primeiro e no segundo semestre,

cursos de capacitação dos conselheiros locais nas regiões de Goiânia e no fim do ano realizou

o I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Goiânia que contava então com mais de

69

cinqüenta conselhos locais instalados. Já o CMSAPG realizou, no primeiro semestre, eleições

para escolha das entidades e movimentos sociais (de usuários, de profissionais e de

prestadores) que o compõe.

Deste modo, tanto no contexto externo quanto no contexto interno as gestões do

CMSG e do CMAPG foram marcadas por transições, transição administrativa, no primeiro

caso, e transição na composição dos membros, no segundo caso. Esclarecidos os contextos

nos quais se deram as condições de produção de sentido dos discursos dos entrevistados

passemos para a análise dos conteúdos da entrevistas propriamente dita.

Análise temática das entrevistas

A análise de conteúdo comporta uma variedade de técnicas que podem ser

adotadas para o seu desenvolvimento (OLIVEIRA, 2008). Dentre elas21

, utilizamos a análise

temática. Conforme dito acima, as entrevistas foram agrupadas por temas que resultaram em

quatro eixos. Cada eixo está relacionado com questões reiteradas pela literatura no que diz

respeito à dinâmica de funcionamento e à natureza política dos dois conselhos, quanto a

existência, regularidade e efetividade de atuação.

Atuação do conselho e dos conselheiros

Em relação ao impacto da existência e da atuação do Conselho para a formulação

das políticas de saúde e no controle social dessas políticas em Goiânia, predominou nos

discursos dos entrevistados a atuação do CMSG no controle social e no atendimento a

denúncias. A formulação das políticas de saúde foi mencionada por um conselheiro enquanto

um segundo plano nas prioridades das rotinas do Conselho.

Notamos que o CMSG tem se limitado à fiscalização das políticas de saúde

elaboradas pela Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia, à apreciação dos projetos e à

aprovação dos orçamentos para a área, propostos pela Secretaria de Saúde e/ou pelo gabinete

do prefeito. Nesta perspectiva, o CMSG tem atuado como uma estrutura burocrática formal

submetida às rotinas administrativas da Secretaria Municipal de Saúde visto que não possui

uma agenda política de médio ou longo prazo capaz de contribuir para a elaboração da

política municipal de saúde (AZEVEDO; RIBEIRO e SANTOS JÚNIOR, 2004).

21

Conforme Oliveira (2008) existe a análise categorial ou temática, a análise de avaliação, a análise de

enunciação, a análise de expressão, etc.

70

Cabe destacar o depoimento do Conselheiro C, para quem a atuação do CMSG

deixa a desejar em relação ao controle social, atribuindo os problemas de atuação do Conselho

às mudanças políticas, aos custos de participação e à resistência dos gestores.

O Conselho municipal é formado de 94 conselheiros. Com cada política que muda,

com cada gestor que entra, tudo muda e para nós, os consultores do SUS dentro de

Goiás, ela é sempre muito difícil. Nós, os conselheiros, não temos locais, o controle

social, local, municipal e distrital. Não temos vínculo trabalhista nenhum, mas a

gente trabalha muito, eu mesmo trabalho muito, eu faço parte de várias comissões.

Então a gente às vezes fica o dia inteiro na rua para construir o SUS, mas às vezes

sempre com muita dificuldade porque no SUS a cada dia a gente aprende um com o

outro, cada pessoa que a gente conhece, a gente está aprendendo. Só que os

governistas acabam às vezes não acatando o que tem que fazer. O que é lei, o que é

lei, o que ele tem que cobrir nos locais, nos CAIS nas unidades básicas de saúde...

Acaba é faltando, deixando a desejar, mas nem por isso, nós, os conselheiros não

vamos desistir. Não, vamos continuar construindo. (CONSELHEIRO C).

No discurso deste conselheiro podemos identificar duas dificuldades relativas à

relação do conselho com os gestores de saúde. O impacto das mudanças de governos na

atuação do conselho, visto que cada novo gestor de saúde demanda tempo para situar-se da

condição da saúde pública municipal. Esta questão diz respeito à dinâmica de funcionamento

do aparelho estatal, sendo que a alta “rotatividade do exercício do poder” é um dos

mecanismos que proporcionam o bloqueio a uma efetiva partilha de poder decisório

(DAGNINO, 2002, p.283).

A outra dificuldade diz respeito ao descompromisso do gestor com as deliberações

do conselho. Sabe-se que esta é uma estratégia adotada pelos gestores no intuito de esvaziar

os conselhos (PESSANHA, CAMPAGNAC E MATOS, 2006).

Nos discursos dos conselheiros de Aparecida de Goiânia predominou a avaliação

de que a atuação do CMSAPG é fraca. Como justificativa a esta menção, a falta de

organização da sociedade civil e a ausência dos conselheiros nas reuniões apareceram como

as principais causas da avaliação. Estes argumentos são pontos de fragilidade do Conselho,

pois uma vez que não exista o apoio do secretário de saúde também não seria possível contar

com o poder de pressão da sociedade civil para fazer valer suas decisões, tendo em vista sua

desarticulação. Assim, uma sociedade civil atuante é uma das variáveis responsáveis pela

democratização do governo, e em consequência pela efetividade do Conselho (AVRITZER,

2008).

Ainda no eixo sobre a avaliação da atuação do Conselho Municipal de Saúde de

Goiânia, os entrevistados foram questionados acerca da qualificação dos conselheiros para

debater e decidir sobre os assuntos de saúde no município. Prevaleceu nos discursos dos

71

entrevistados a ideia de que nem todos os conselheiros estão preparados para atuarem na

elaboração de políticas sociais ou no controle social das políticas de saúde. Os entrevistados

destacaram o papel da capacitação dos conselheiros como imprescindível ao bom desempenho

do CMSG.

Conforme Dagnino (2002) a exigência de qualificação técnica e política, dos

representantes de segmentos da sociedade, é um dos elementos mais importantes a fim de

propiciar uma participação mais igualitária nas atividades e decisões dos conselhos.

O Conselheiro C associa melhorias na saúde do município ao desempenho dos

gestores da saúde.

Eu espero a cada dia que a saúde melhore cada vez mais, que os gestores cumpram

com o dever, o seu dever de gestor na saúde de Goiânia. Eu acho que o Estado

também às vezes deixa muito a desejar, o gestor estadual deixa muito a desejar.

Sobra muito para o gestor do município, aí acaba o dinheiro do município tendo

que pagar muita coisa e com isso falta às vezes médicos, falta enfermeira, falta ...,

falta tudo porque às vezes a verba que vem vai para o município e não dá para

cobrir tudo porque o Estado também não quer ajudar, não quer regular.

(CONSELHEIRO C).

O depoimento do Conselheiro C releva tensões entre os níveis de governo

municipal e estadual no que diz respeito ao repasse de verbas para a saúde, para o que

argumenta que a verba do município não é suficiente para atender as demandas da saúde

pública em Goiânia e que o Governo do Estado de Goiás se omite quanto a este fato. O

Conselheiro C destaca as dificuldades encontradas pelo gestor municipal para administrar a

pouca verba que possui e que tal fato resulta na falta de profissionais de saúde. Seu

depoimento torna-se ainda mais significativo se levarmos em conta sua base representativa,

isto é, o segmento usuário. Embora represente as demandas da população, dos usuários do

Sistema Único de Saúde, tal condição não o impede de constatar que parte dos problemas de

saúde do município se deve a falta de repasse de recursos da esfera estadual. O discurso desse

entrevistado revela uma posição conciliadora ao considerar as dificuldades dos gestores na

administração do setor de saúde.

Já entre os entrevistados do CMSAPG prevaleceu a idéia de que os conselheiros

são preparados para debater e decidir sobre os assuntos de saúde no município de Aparecida

de Goiânia. Entretanto, observamos que a concepção de qualificação abrange outros

elementos além da qualificação técnica e da qualificação política, ela supõe o aprendizado do

reconhecimento da pluralidade e da legitimidade dos interlocutores envolvidos no processo

decisório (DAGNINO, 2002).

Neste primeiro eixo verificamos a presença dos elementos que matizam a relação

entre o CMSG e o gestor municipal de saúde. Cabe destacar o depoimento do Conselheiro C,

72

que antecipa alguns elementos dessa relação. Mudança de gestores na saúde, resistência ao

cumprimento das deliberações do CMSG e tensões nas relações entre município e estado

quanto ao repasse de verba para a saúde, são exemplos da oposição por parte do gestor listado

por esse entrevistado.

A relação com a secretaria municipal de saúde

No segundo eixo, os entrevistados avaliaram a relação estabelecida entre a

Secretaria Municipal de Saúde e o Conselho, no que diz respeito ao acesso às informações e

em relação à estrutura de funcionamento e pessoal administrativo do Conselho assegurado

pela secretaria.

Nos discursos dos entrevistados foi recorrente a avaliação dessa relação como

uma relação de parceria. Entretanto, o que observamos é que essa relação, frequentemente,

tem sido marcada também por conflitos e tensões.

.

Hoje ele tem uma relação assim, não sei... O nosso presidente teve alguma

dificuldade em relação ao gestor, porque o gestor atual ele ficou meio arredio às

ações do conselho, principalmente em função do funcionário que ficaria disponível

e tudo mais. Então assim... Mas no momento parece que já foi resolvida essa

relação, que não está tendo mais problema. No início teve esse problema, mas

agora está uma relação, assim, acessível. (CONSELHEIRO B).

Olha, eu acho que tem que ser uma relação de parceria, ela tem que ser uma

parceria. Agora eu falo sempre no colegiado que essa parceria, ela tem que ser

sempre de mão dupla, ou seja, ela não pode estabelecer uma parceria em que o

conselho é parceiro da secretaria e da gestão e a gente não é parceiro no conselho.

Até porque nós não temos um orçamento que é destinado, que nós administramos

ele. O orçamento que compete ao conselho, ele é na secretaria, então nós temos que

ir lá para que delibere aquilo que a gente precisa fazer. Não é delibere, mas que ele

libere para nós. Por exemplo, nós vamos fazer uma conferência então nós

dependemos do gestor para a gente acordar e fazer acontecer. Agora o que eu digo

sempre é que essa relação ela precisa melhorar e nesse sentido ela já tem

melhorado muito. Há dois anos, até o período do ano passado, a gente tinha uma

relação que era menos harmônica. Atualmente nós estamos com uma relação bem

melhorada com a secretaria. (CONSELHEIRO D).

Nos discursos acima fica evidente que classificar a relação entre a Secretaria

Municipal de Saúde de Goiânia e o Conselho como parceria é mais um anseio do que um fato.

O Conselheiro D faz um recorte temporal (há dois anos) para demarcar a passagem de uma

relação menos harmônica para uma relação mais harmônica. Esse recorte coincide com a

73

saída do prefeito Iris Rezende (PMDB) para disputar o cargo de governador do estado de

Goiás e a consequente redefinição dos cargos de confiança, sob indicação do vice-prefeito que

assumiu ao Executivo, Paulo Garcia (PT), dentre eles o cargo de secretário municipal de

saúde. A mudança da orientação partidária deve ter influenciado positivamente na relação da

SMS com o CMSG, já que o Partido dos Trabalhadores (PT) tem sido, desde o início do

processo de redemocratização brasileira, um dos principais, senão o único, defensor dos ideias

da democracia participativa (AVRITZER, 2002).

No discurso dos conselheiros municipais de saúde de Aparecida de Goiânia

também predominou a qualificação da relação da Secretaria Municipal de Saúde com o

CMSAPG como uma relação de parceria.

A relação está boa. Do ponto de vista institucional está boa. O Conselho possui um

espaço lá dentro, ocupa espaço dentro do prédio da secretaria de saúde. E essa

relação precisa ser trabalhada constantemente. A gente tem um entendimento mais

profissional. O conselho é, na verdade um órgão de secretaria de saúde. É isso que

embaraça um pouco o entendimento da população. E é algo que foi criado na esfera

federal, na Constituição, numa inteligência do legislador de forma espetacular.

Porque o legislador, quando foi fazer a Constituição, e o poder executivo federal

quando foi regulamentar o dispositivo constitucional de controle social e da

participação popular de saúde, o que o executivo e o legislador fizeram? Eles

tiveram a inteligência de criar um órgão público, cujo patrão é o controle social.

‘É’ as representações não governamentais, mas dentro de um órgão público onde o

poder executivo, que tem que funcionar como Estado, como órgão público, como

poder executivo também. Mas tem que ter essa característica administrativa de

controle social e também esse viés da obrigação do gestor público, do poder

executivo onde o conselho está lotado, no caso a secretaria municipal de saúde.

Onde esta pasta precisa de bancar, obedecendo a leis federais, estaduais e

municipais, ela que precisa bancar a administração, todas as ações do conselho.

Isso é um pouco complexo pra população entender e saber que ela pode se inserir

ali, dentro de um diapasão puramente técnico, puramente de controle de direitos e

de obrigação de fazer. E não simplesmente por política que é a leitura que a

população faz e que isso atrapalha porque tolhe o direito, por que as pessoas às

vezes, são do partido A, do partido B, do partido C, aí ele sente num bloqueio. Por

não entender que esses mecanismos jurídicos que traz o conselho de saúde, como

órgão público, mas gerenciado e administrado como ordenadores ou conselheiros

de saúde, que é um ente civil, é um ente comum, dentro de órgão público que tem

que dar espaço e atendimento pra ele. E também essa relação com a secretaria de

saúde, com o secretario de saúde, às vezes ela é ruim às vezes ela é boa, isso é uma

construção que precisa ser constante. (CONSELHEIRO A)

O discurso deste entrevistado trata de uma questão controversa entre os estudiosos

da participação. Diz respeito à autonomia dos conselhos frente ao poder executivo. Conforme

Goulart (2006), a lei considera que os conselhos fazem parte do poder Executivo e são por ele

regulados. De outro lado, a resolução 33322

do Conselho Nacional de Saúde (CNS) afirma que

22

Disponível on line em http://conselho.saude.gov.br/14cns/docs/resolucao_333.pdf

74

“os Governos garantirão autonomia para o pleno funcionamento do Conselho de Saúde,

dotação orçamentária, Secretaria Executiva e estrutura administrativa” (GOULART, 2006,

p.22). Consideramos, de acordo com os depoimentos dos entrevistados, que a SMSAPG não

tem garantido a autonomia para o funcionamento do CMSAPG, e que nesse sentido o controle

social das políticas de saúde fica prejudicado.

Sobre as informações de que o CMSG necessita para deliberar, prevaleceu nos

discursos a dificuldade dos conselheiros no acesso a elas.

Sempre solicitamos, agora, nem sempre recebemos a resposta daquilo que a gente

precisa às vezes a tempo, muitas vezes eles atrasam um pouco em função do gestor,

mas ele sempre que ele solicita, mesmo que com atraso ele tem recebido.

(CONSELHEIRO B)

Sim, às vezes algumas coisas que a gente precisa realmente ter essas informações

vem de demanda de algum tempo, até mesmo de alguns casos que os gestores

tentam sonegar as informações, mas a gente tem instrumentos legais para que a

gente consiga rever isso.(CONSELHEIRO. D)

Constatamos que a SMSG nem sempre tem atendido às demandas de informação

do CMSG a tempo. Conforme Dagnino (2002), os mecanismos de bloqueio a uma efetiva

partilha de poder podem ser resultado tanto de concepções políticas resistentes a

democratização dos espaços decisórios quanto das próprias características no funcionamento

do Estado. A falta de transparência que dificulta o acesso as informações é definida por ela

como uma característica estrutural do Estado. No entanto, como a própria autora afirma, é

difícil determinar a origem dos mecanismos de bloqueio. Independente dessa dificuldade seja

qual for a origem, importante a registrar é que esses mecanismos acabam por atrapalhar a

democratização das decisões. (DAGNINO, 2002).

Predominou nos discursos dos conselheiros do CMSAPG a ideia de que eles têm

acesso às informações que necessitam para deliberar. No entanto, as matérias que chegam

para serem deliberadas pelo CMSAPG não chegam a representar 20% das ações do governo.

De que necessita para deliberar sim, porque só entra matéria dentro do conselho de

forma documentada. Então, para deliberar, sim, tem acesso a toda informação. A

informação que a gente não tem que os conselhos não têm ou que o Conselho de

Aparecida não tem, ou outros conselhos de Goiás e do Brasil não tem, é que os

gestores não mandam nem 20% das demandas do dever de fazer, os gestores não

mandam para os conselhos apreciarem. Mas o que chega pra apreciar é

75

amplamente aberto, amplamente apreciado para poder haver deliberação.

(CONSELHEIRO A)

Averiguamos a prática de controle das informações por parte da SMSAPG.

Dizendo de outro modo, 80% da política pública de saúde municipal deixa de ser elaborada,

executada e fiscalizada pelo CMSAPG. A omissão de informação é uma conduta relatada por

Weber (1979, p.269) nos estudos sobre a burocracia: “Toda burocracia busca aumentar a

superioridade dos que são profissionalmente informados, mantendo secretos seu

conhecimento e intenções [...] na medida em que pode, oculta seu conhecimento e ação da

crítica.” Assim, ao controlar o acesso dos conselheiros as informações sobre as políticas

municipais de saúde a SMSAPG mantém-se imune a ação fiscalizadora do CMSAPG.

A respeito da estrutura de funcionamento dos conselhos prevaleceu nos discursos

a concepção de que o CMSG possui uma boa estrutura física, embora não tenha um secretário

executivo.

Temos sim, graças a Deus, nosso conselho eu não digo que ele é 100% mas ele pelo

menos uns 80% ele é. Hoje nós temos funcionários, nós temos motoristas, nós

temos... o prédio não é nosso, é alugado, mas temos sala de recepção, temos

secretária, não secretária executiva, que agora nós já temos uma pessoa age como

secretária e temos dois motoristas. Eu acho que é um grande avanço, já avançamos

bastante para quem não tinha nada, temos computador, temos tudo.

(CONSELHEIRO C)

Olha, nós podemos dizer que parcial porque primeiro o que rege a lei é que o

conselho tem que ter uma secretaria executiva e o nosso conselho nunca teve essa

secretaria executiva e nós, nessa administração, estamos tentando de todos os meios

implantar essa secretaria e nós estamos tendo problema por isso. Porque na

verdade quando você fala em funcionário administrativo nós não temos o quadro

administrativo que a gente precisaria ter e ai a gente fica esbarrado com essa

questão da secretaria executiva. A secretaria ela tem aberto, para gente tem

melhorado, mas nós já tivemos um tratamento muito ruim. Ultimamente eu não sei o

que a gestão entendeu da importância do conselho e tem melhorado um pouco essa

questão do tratamento com a gente, e melhorou mas ainda é preciso avançar nesse

sentido. (CONSELHEIRO D)

Sobre a estrutura de funcionamento do CMSAPG, os entrevistados relataram que

ele não possui uma boa estrutura, já que sua sala é pequena e o secretário executivo não é

capacitado para a função.

É, a secretaria tem assegurado agora cumprir essa seguridade, está muito a

contento. Você tem que ficar correndo atrás e acaba que passa os quatro anos do

gestor, passa dos dois anos do presidente, passa os dois anos dos conselheiros e

eles não conseguem muito. É sempre essa luta de buscar... Porque dentro de uma

76

relação de entes que precisam ter boa relação existe a seguridade tanto jurídica

como política, agora o duro é você fazer essa seguridade virar de fato algo que traz

mesmo a suficiência pra te dar condições pra você poder trabalhar. O Conselho

mesmo funciona numa sala que já foi observada pelo DENASUS do Ministério da

Saúde e tem já um relatório de auditoria que ele não pode ter uma sala daquele

jeito, um ambiente daquele jeito. Mão-de-obra, mão-de-obra administrativa é

pouca, só conta com um secretário executivo e ainda não é muito bem capacitado.

Nós pedimos, deliberamos na última reunião, a admissão de um auxiliar

administrativo e foi deliberado. Constitui um processo administrativo e até agora,

já quase dois meses, que na última reunião não houve pauta, não teve reunião, já

vai pra dois meses e essa assinatura do prefeito ainda não chegou ao processo.

Então começa a parar, começa a ter problemas. Mas a seguridade ela existe, está

existindo sim ali em Aparecida de Goiânia. Precisa é ser mais célere no

cumprimento das determinações do Conselho. (CONSELHEIRO A).

Por enquanto não, assim por enquanto tem um local que não é ainda um local

adequado porque é uma sala pequena com um pouco de equipamento da mesma

forma que a secretaria. Como nós estamos pretendendo ampliar a secretaria nós

também ganhamos espaço ali até para melhorar não só a parte de estrutura física

do conselho como da secretaria e futuramente uma sede própria da secretaria.

(CONSELHEIRO B)

Constatamos nos discursos dos conselheiros dos dois conselhos (CMSG e o

CMSAPG) que as ações de suas respectivas secretarias não têm garantido a autonomia para o

seu pleno funcionamento, nos termos da resolução 333 do Conselho Nacional de Saúde -

CNS. O CMSG possui uma estrutura física adequada, mas não possui um secretário

executivo. Já o CMSAPG possui um secretário executivo, mas não possui uma estrutura física

adequada. E ambos não possuem orçamento próprio. Assim, tanto o CMSG quanto o

CMSAPG tendem a serem dependentes dos interesses políticos do poder Executivo, o que

pode dificultar a efetiva democratização do processo decisório das políticas municipais de

saúde (MOREIRA e ECOREL, 2009).

Neste segundo eixo, outros elementos que matizam as relações das secretarias de

saúde e de seus respectivos conselhos municipais de saúde vieram à tona. Embora os

discursos dos conselheiros tendam a endossar os aspectos positivos dessa relação, ações como

o controle de informações e a falta de condições físicas adequadas e de pessoal administrativo

próprio nos levam a compreender que essa relação é mais tensa e conflituosa do que uma

relação de parceria.

A ação democratizadora do CMSG e do CMSAPG

O terceiro eixo trata da percepção dos entrevistados quanto ao papel

democratizador do CMSG e do CMSAPG.

77

Quanto ao papel do CMSG os discursos centraram-se na ação fiscalizadora como

um de seus principais atributos, ao lado de atender as demandas da população na área da

saúde. Para os entrevistados, o Conselho deve tratar de temas ligados ao sistema de saúde, tais

como a aprovação dos planos de saúde e de gestão e a análise dos projetos da secretaria de

saúde. Questões como a importância da educação popular, divulgação das ações do CMSG

na mídia, maior acolhimento dos novos membros nos movimentos sociais e investimento em

ações de mobilização apareceram nos discursos dos entrevistados.

Sobressaíram também as ideias de que o papel do conselho de saúde é o de

fiscalizar as políticas de saúde e de participar na elaboração dessas políticas. Em relação aos

temas a serem debatidos nos conselhos os depoimentos foram bem diversificados. Para um

dos conselheiros, é preciso tratar de temas relacionados à vigilância sanitária. Outro

entrevistado apontou que é preciso que os conselheiros possuam conhecimentos de natureza

política para compreender o sistema de financiamento da saúde, enquanto que o terceiro

conselheiro acredita que é preciso discutir soluções para os casos de maior urgência e a

aplicação dos projetos ligados ao plano municipal de saúde.

Verificamos que os discursos dos entrevistados, de maneira geral, tendem a

superestimar as ações e práticas de seus respectivos conselhos. Para eles, os conselhos têm

cumprido seu papel democratizador. Entretanto é possível perceber que suas ações têm-se

restrito à fiscalização das políticas implementadas pelas secretarias. É cabível inferir que em

relação à atribuição de participar da elaboração da política municipal de saúde, os dois

conselhos pesquisados não atingem este objetivo como deveriam.

Entraves à atuação dos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de

Goiânia

A relação com o gestor aparece como o maior entrave à atuação do CMSG nos

discursos dos entrevistados.

Se o gestor ele é uma pessoa realmente voltada para essa área de luta e tudo mais

ele vai ser mais aberto a isso vai ser um gestor tipo, ele vai ser mais fechado, vai

criar dificuldade ele vai deixar de cumprir algumas coisas que são solicitadas pelo

conselho, ele vai enrolar, vai fazer um monte de coisa. Agora se for uma pessoa

realmente do povão, uma pessoa que é sempre da saúde publica que sempre lutou

pela saúde publica, ele vai ser diferente, ele vai está ali aberto com vontade

realmente de mudar. Agora se for um cara que é o atual agora que é o gestor da

privada, das empresas privadas ele vai realmente... Não vai querer muito que o

posto da saúde publica vá para frente não. Então, são essas dificuldades, o

idealismo do gestor. Se ele é um gestor da área realmente da saúde pública ele vai

78

ser mais aberto, vai estar dando todo o apoio, agora... vai dificultar.

(CONSELHEIRO B)

Olha, um dos dois entraves, às vezes, é a questão da gestão, nós temos problema

com a gestão. Quanto à gestão, e olha não deveria ser assim, porque o conselho é

paritário, ele funciona com 50% de usuários do sistema. Os outros 50% é dividido

em 20% desses trabalhadores da saúde e os outros 25% é os gestores e prestadores

de serviços do SUS. Então, se o gestor tem cadeira cativa se ele participa

efetivamente do conselho, se for obrigação inclusive conhecer o funcionamento e o

papel real do conselho, mas na maioria das vezes isso não funciona assim até

porque às vezes os gestores eles querem fazer as coisas, querem formular as coisas

ao bel prazer, ou seja, da forma que ele acha que deve ser. Quando ele encontra

esse entrave pelo conselho porque às vezes ele pode formular uma proposta e traz

para o conselho e o conselho estuda aquilo e delibera que aquilo não pode ser

daquele jeito, então isso contraria o gestor, contraria a gestão e muitas vezes as

coisas travam, não acontece. Felizmente, aqui em Goiânia a gente até tem

conseguido avançar nesse aspecto os gestores tem entendido e tem sido solidário,

mas nós temos experiência de conselhos até bem próximo da gente onde as coisas

não funcionam de jeito nenhum porque o gestor trava mesmo e aí vem a

perseguição porque de repente aquele trabalhador que está ali no conselho é

perseguido ou até mesmo aquele usuário que está ali ele é ameaçado. Alguma coisa

deixa de acontecer para ele e isso causa até uma desmotivação das pessoas

participarem do conselho, se fosse diferente seria muito melhor. Os principais

entraves eu vejo que é isso, mas tem também a falta de conhecimento, se as pessoas

conhecessem o papel do conselho e soubesse qual a importância dele, o porquê da

existência dele e o que ele realmente representa e viessem fazer parte eu acho que

melhoraria muito seria muito importante. (CONSELHEIRO D)

O discurso do Conselheiro B destaca a importância do posicionamento político-

ideológico do gestor de saúde para que ele mantenha uma boa relação com o Conselho. Para

ele, o atual secretário não está interessado em contribuir na melhoria do SUS já que está

ligado aos interesses da rede privada de saúde. Conforme Fernandes e Bonfim (2005, p.137,

apud Cortes, 1998:1995), a posição ideológica do gestor está estreitamente relacionada com

sua trajetória política de experiências junto aos movimentos populares e da sociedade civil,

sendo que “se for um indivíduo com ligação com a sociedade civil, este terá um processo

decisório de estímulo aos grupos sociais.”

Podemos concluir que o maior entrave à atuação do CMSG tem sido a sua relação

com o gestor, o secretário de saúde do município, seja porque ele está ligado a interesses da

iniciativa privada, seja porque há desentendimentos dele com o Conselho, resultando em

resistência do gestor em acatar as deliberações tomadas no âmbito dessa instância.

Entre os conselheiros municipais de saúde de Aparecida de Goiânia, os discursos

foram variados. Um entrevistado apontou que o maior entrave à atuação do Conselho é a falta

de profissionais na área de saúde na rede pública, especificamente no atendimento básico.

Para outro, o maior entrave é a falta de conhecimento e a falta de capacitação para o

79

desenvolvimento das atribuições de conselheiro. Já o Conselheiro A apontou como maior

entrave a falta de um gestor de carreira na saúde.

São entraves você não ter gestores de carreira e nem ter servidores públicos da

pasta de carreira. Mas de carreira e nas funções de gerência, nas funções de chefia.

Porque o modelo político brasileiro, ah, mudou a política, se nomeia politicamente

secretários, se nomeia todo o segundo escalão o terceiro escalão, funções

puramente políticas. E muita das vezes aquele servidor entra e ele não é capacitado

para aquilo ele não está capacitado para aquilo. Até ele descobrir, até ele entender

o mecanismo do SUS que é muito complexo é um bojo de legislação muito vasto, até

ele entender esse mecanismo e até ele ter interesse, porque na verdade ele não está

ali para cumprir função de carreira ele tá ali para cumprir função e função política

às vezes, lamentavelmente. Então o que precisaria, precisaria nesse modelo que o

secretário de saúde tivesse nomeação de carreira, de preferência com nomeação do

colegiado. Essa é uma tendência que já aconteceu na educação. Quem que nomeia

diretor de escola? Já é aluno e pais de alunos. Porque não seria a população ou até

mesmo o conselho de saúde quando bem representado, bem legitimo do ponto de

vista institucional, por que não o conselho nomear o secretário? Isso precisaria

acontecer isso é um dado que precisa acontece. E isso prejudica os trabalhos. Por

quê? Na esfera federal, que o governo federal tem uma mega estrutura. Aí o

governo federal sempre solta o que as secretarias têm que fazer, o que as

secretarias de saúde têm que fazer. Solta as missivas a cumprir um prazo muito

sufocante. Secretário de saúde só vive correndo, gerente/gestor de saúde só vive

correndo. Passa muito rápido, não dá para você ter um controle, do ponto de vista

de estratégia de construção de melhoria. Aí acaba que passa os quatro anos e você

tem a mesma história repetida. Isso precisaria acabar e acabando com isso fere

interesse, mas fere interesse político e não interesse público. Não fere interesse

social, pelo contrário isso é uma tendência que as autoridades políticas já são

conscientes que precisa acontecer. Agora é uma conquista que a sociedade precisa

fazer que não tem ainda. A educação já conseguiu um pouquinho, que é os seus

alunos e pais de alunos nomear diretor, mas ainda não nomeia secretário.

(CONSELHEIRO A)

O depoimento do Conselheiro A oferece uma proposta com a finalidade de

democratizar o assento da Secretaria Municipal de Saúde. Para ele, o cargo de Secretário

Municipal deveria ser um cargo eletivo, a exemplo do que ocorre na educação, para cargos de

diretor de escolas. Os candidatos a secretário deveriam ser escolhidos via voto popular e não

por questões de ordem partidária ou política. Assim, nessa concepção, o posto seria ocupado

por pessoas com capacitação para tal e democraticamente eleitas para isso. Normalmente, a

indicação dos gestores da saúde em Goiânia esteve associada a práticas clientelistas e não por

critérios técnicos (FAVARO, 2009).

Na seção seguinte, exploramos as atas e a observação participante empreendidas

nas reuniões do CMSG e do CMSAPG e no I Curso de Capacitação de Conselheiros de

Goiânia.

4.1.2. Considerações sobre as atas e a observação passiva

80

Como mencionado anteriormente, a análise de conteúdo das atas, do regimento

interno do CMSG e do CMSAPG e também as anotações de campo, obtidas através da

observação passiva, possuem caráter auxiliar, servindo de complemento às entrevistas, em

vista de melhor contextualizar e compreender os depoimentos obtidos.

O CMSG nos disponibilizou as cópias de seis atas, sendo cinco de reuniões

ordinárias e uma de reunião extraordinária, de fevereiro a agosto de 2010. Já o CMSAPG nos

forneceu a cópia de cinco atas das reuniões ordinárias que datam de agosto a dezembro de

2010. A análise dos conteúdos das atas focalizou as relações entre as secretarias municipais de

saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia e seus respectivos conselhos municipais de

saúde.

Antes de iniciarmos a análise do conteúdo propriamente dita, cabem algumas

considerações sobre a estrutura das atas para assim compreendermos as dinâmicas e processos

de discussão e de deliberação do CMSG. Os registros das reuniões em atas seguem o seguinte

roteiro: Data, Local, Chamada, Informes, Informes da Mesa Diretora, Encaminhamento das

Comissões, Encaminhamento dos Conselhos Locais, Apreciação de Projetos e Pauta para a

próxima reunião. O CMSAPG segue um roteiro semelhante, exceto pela chamada e pelos

encaminhamentos, visto que Aparecida só conta com o Conselho Municipal de Saúde sem

dispor de conselhos locais.

A prescrição das atas é feita em média por três funcionários da SMS colocados à

disposição do CMSG. Já no caso do CMSAPG as atas são redigidas pelo secretário do

Conselho. Nas atas dos dois conselhos constatamos problemas gramaticais e ortográficos na

maioria das atas. Tal fato reitera a necessidade de uma secretária executiva conforme

observamos nos depoimentos dos conselheiros de Goiânia e a necessidade de um auxiliar para

o CMSAPG.

De acordo com o Regimento Interno do CMSG em seu capítulo V, art. 24º, cabe à

SMS dotar de infra-estrutura física, financeira e material e de recursos humanos a Secretaria

Executiva para que o conselho possa funcionar plenamente. Tal atribuição não está sendo

cumprida pela SMS.

Em relação à presença dos conselheiros representantes do governo, constamos que

o conselheiro titular representante da SMS não compareceu a nenhuma das seis reuniões

realizadas pelo CMSG. Apenas seu suplente participa, como representante da SMS, de quatro

das seis reuniões. Esse dado, aliado aos depoimentos dos conselheiros nas entrevistas, nos

permite interpretar a ausência do conselheiro titular da SMS como descaso deste para com o

CMSG. O mesmo foi verificado nas reuniões do CMSAPG já que o conselheiro titular

81

representante da SMSAPG não compareceu a nenhuma das cinco reuniões do segundo

semestre. A representação da SMSAPG deu-se através de pessoas responsáveis pela

apresentação de projetos de saúde ou em busca da aprovação dos relatórios de gestão.

Ao analisar o conteúdo das atas, verificamos o registro de alguns dos problemas

destacados nos depoimentos dos conselheiros entrevistados, a respeito da relação entre a SMS

e o CMSG. A falta de um profissional qualificado para atuar como secretário executivo do

CMSG e a demora no repasse de informações são exemplos desses problemas. No entanto,

outros elementos dessa relação emergem das atas, como a ausência do conselheiro titular da

SMS nas reuniões do CMSG, o não atendimento das solicitações do conselho por parte do

secretário municipal de saúde, a não homologação da resolução de 19/12/2007 e a ausência

dos gestores nas reuniões dos conselhos locais. Em conjunto, essas situações repõem o tema

do desinteresse da SMS com relação ao CMSG, nos mesmos termos expressos pelos

conselheiros.

Nas análises dos conteúdos das atas do CMSAPG também constatamos a

indiferença da SMSAPG para com suas atribuições. Em geral, as ações do conselho têm se

limitado a: apreciação das prestações de contas da secretaria e dos projetos elaborados por ela,

sendo que os relatórios de gestão são enviados com prazo exíguo para a realização das

reuniões do Conselho, sem que este tenha tempo hábil para apreciá-los. A criação das

comissões de fiscalização visava agilizar o processo de análise dos relatórios de gestão, no

entanto, a secretaria não tem enviado os relatórios com prazos adequados. Outro ponto de

destaque nas relações entre o CMSAPG e a SMSAPG diz respeito ao descumprimento das

deliberações encaminhadas pelo Conselho. Na ata do dia 30/09/2010, o plenário deliberou a

equiparação salarial do secretário executivo e a contratação de um auxiliar administrativo.

Entretanto, passaram-se três meses e esta deliberação ainda não havia sido cumprida pela

SMSAPG.

A observação passiva no I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Goiânia e na

Reunião Ordinária de novembro de 2010.

De 25 a 27 de novembro de 2010 foi realizado o I Seminário de Capacitação de

Conselheiros de Saúde de Goiânia, no auditório da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e

no SINDSAÚDE. A programação contemplou os seguintes temas: a história e os princípios

do SUS, o controle social no SUS em Goiânia, o poder do conselho e atribuições dos

conselheiros por segmento e o planejamento e atividade do Conselho Municipal de Saúde. O

82

seminário contou com uma boa estrutura física e material e teve grande procura entre os

conselheiros, em especial, entre os conselheiros locais.

Assim como na análise do conteúdo das entrevistas, buscamos registrar os

elementos que evidenciassem o tipo de relação estabelecida entre a SMS e o CMSG. A

primeira constatação foi a ausência do prefeito e do secretário municipal de saúde no

seminário.

Nos momentos de debates, os participantes questionaram o fato de o então

secretário municipal da saúde estar ligado a interesses privados, já que o mesmo é dono de

hospital particular em Goiânia. Este é um dos pontos levantados no seminário, que pode ser

considerado como um entrave à consolidação do SUS. Para os conselheiros, o cargo de

secretário municipal de saúde deveria ser um cargo eletivo e não uma escolha de cunho

político. Alguns deles denunciaram ainda o fato de existir um grande montante de verba

paralisada durante a gestão de Paulo Rassi.

Outro ponto levantado pelos conselheiros durante o debate diz respeito a

dificuldade do CMSG em fazer com que a secretaria cumpra suas deliberações. A orientação

de um dos palestrantes é que o conselho invista em sua capacidade de negociação, já que

existe uma dependência mútua entre a SMS e o CMSG. Estas duas discussões foram

consideradas relevantes dentre os assuntos que permearam o seminário durante a observação

participante realizada. Isto porque auxiliam na compreensão da relação entre a SMS e o

CMSG.

Observação nas reuniões ordinárias no CMSG e no CMSAPG

No dia 30 de novembro de 2010 foi realizada a Reunião Ordinária do CMSG do

no auditório da FUNASA, que começou com um atraso de mais de uma hora e meia, por falta

de quorum. Esta reunião contou com a presença de um grande número de conselheiros locais

que haviam participado do I Seminário de Capacitação de Conselheiros de Saúde, evento

ocorrido na semana antecedente.

No momento de encaminhamento das comissões reapareceram questões presentes

nas reuniões anteriores a exemplo da cobrança por uma secretaria executiva, a demora do

secretário de saúde em repassar o relatório de gestão e a falta de documentos requeridos à

SMS em junho e recebidos somente em setembro.

A Comissão de Finanças relatou o atraso na prestação de contas do Fundo

Municipal de Saúde - FMS, exemplificando que a aprovação do orçamento do trimestre de

83

2009 foi realizada com um ano de atraso. Devido a falta de documentos comprobatórios das

despesas, o presidente sugeriu que o relatório não fosse aprovado com ressalvas.

Do mesmo modo, a Comissão de Pareceres e Projetos queixou-se de que a SMS

não tenha enviado um representante para esclarecer sobre o projeto de expansão do Programa

de Saúde da Família - PSF. Em virtude de divergências entre a apresentação do representante

da SMS e o material impresso sobre o projeto conselheiro foi sugerido que a apresentação

fosse cancelada até que todos os conselheiros tenham acesso ao projeto correto.

Para finalizar a reunião, o presidente do CMSG afirmou que os representantes

titulares dos gestores da secretaria não estavam comparecendo às reuniões, e que em virtude

disto, deveria ser encaminhado um comunicado ao secretário de saúde e ao prefeito

solicitando a substituição dos conselheiros.

Em relação ao CMSAPG, participamos de duas de suas reuniões ordinárias, uma

realizada no mês de setembro e outra em dezembro de 2010. As reuniões ordinárias são

realizadas na Escola de Governo de Aparecida de Goiânia, que possui uma estrutura física

adequada para a atividade.

Na reunião ordinária de setembro foi possível identificarmos algumas tensões na

relação entre o CMSAPG e a SMSAPG já citados anteriormente, como por exemplo, a

possível omissão de informações por parte da SMSAPG ao enviar o relatório de gestão

relativo aos exercícios fiscais de 2009. Diante disto, a assembleia não aprovou o relatório

solicitando à SMSAPG que enviasse novo documento com a discriminação dos gastos

efetuados.

Ainda nessa reunião a SMSAPG enviou o projeto de implantação da política de

atenção integral à saúde do homem no município de Aparecida de Goiânia para ser apreciado

pelo CMSAPG. O projeto se encontrava pronto quando foi remetido ao Conselho,

necessitando apenas ser apreciado e aprovado. No entanto, a secretaria não havia o enviado

com antecedência adequada para ser analisado pelo CMSAPG. Houve, em seguida, a decisão

coletiva de não aprovar qualquer projeto apresentado pela SMSAPG até que fosse apresentada

a documentação completa que comprovasse as despesas do Centro de Apoio ao Doente de

AIDS (CADA) financiadas pela SMSAPG. O presidente do CMSAPG prestou

esclarecimentos aos conselheiros na direção de conscientizá-los para o fato de que são

corresponsáveis pela política de saúde do município. Então, a partir desta premissa, ficou

explicado que caso o Conselho aprovasse o relatório sem a documentação necessária, o

mesmo teria que responder legalmente por este ato. Outro agravante apresentado foi o fato de

84

que esta situação não é provável de acontecer com o gestor, pois este possui o amparo da

procuradoria.

Para o presidente do CMSAPG a alta rotatividade de funcionários dentro da secretaria

é responsável pela falta informação e de documentos necessários ao trabalho dos conselheiros.

No entanto, um conselheiro expôs sua opinião que é baseada na ideia de que a Secretaria

Municipal de Saúde não empenha a seriedade necessária à atuação do Conselho.

Na reunião ocorrida em novembro de 2010, reapareceu a questão da prestação de

contas do Centro de Apoio ao Doente de AIDS (CADA). A SMSAPG enviou representantes

do seu setor de epidemiologia para prestar contas das despesas do CADA durante o ano de

2009. Membros da comissão responsável por analisar o relatório apresentado pela secretaria

denunciaram que os representantes citados se apresentaram com um curto prazo para o início

da atividade, fato agravado pelo fato de estarem desorganizados e sem os documentos das

despesas do ano de 2008. Diante de todas estas ocorrências, o presidente do Conselho

ameaçou encaminhar o relatório ao Ministério Público para providências.

Em outro ponto de pauta, devido à insistência de uma representante de outro setor da

SMSAPG, foi apresentada a proposta de construção das Unidades de Pronto Atendimento

Ambulatorial - UPA -, que visam atender, segundo o projeto, casos de urgência nos setores

Brasicon, Buriti Sereno e Maranata.

A plenária desse dia ficou esvaziada e antes do término da reunião muito conselheiros

já haviam se retirado do local.

Diante dos resultados da pesquisa apresentados acima, é possível identificar o tipo

de ação consumada pelo Estado, aqui compreendido como a Secretaria Municipal de Saúde de

Goiânia e a Secretaria Municipal de Saúde de Aparecida de Goiânia, como uma ação relutante

em compartilhar o poder de decisão sobre os rumos da política municipal de saúde com os

seus respectivos conselhos. Tais resultados serão discutidos adiante.

4.2. A AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE

GOIÂNIA E DE APARECIDA DE GOIÂNIA

Argumentamos que o Estado possui um papel preponderante para a efetividade dos

conselhos municipais. Com isso não pretendemos concluir que a ação do Estado seja a única

responsável na definição da natureza política dos conselhos municipais, em particular dos

conselhos municipais de saúde, mas ressaltar sua centralidade devido ao grande impacto que

sua condução provoca nos processos de democratização dos espaços públicos.

85

Diante disso, estabelecemos uma classificação ideal de ações que corresponderiam ao

desempenho de um gestor comprometido com a democratização dos espaços públicos de

deliberação, isto é, dos Conselhos Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de

Goiânia. Essa classificação constitui o parâmetro a partir do qual podemos lidar

analiticamente com as ações do Estado materializadas nos gestores municipais de saúde dos

municípios aqui estudados. No quadro abaixo demonstramos o comparativo entre as dos

gestores comprometidos com a democratização das decisões políticas com as ações das

Secretarias Municipais de Saúde de Goiânia e de Aparecida de Goiânia, relatadas nos

depoimentos dos conselheiros, na observação descritiva e nas atas das reuniões dos conselhos.

QUADRO 6: COMPARATIVO DAS RELAÇÕES DAS SECRETARIAS MUNICIPAIS

DE SAÚDE COM OS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE

APARECIDA DE GOIÂNIA

ITENS

AÇÕES IDEAIS

AÇÕES DA SMS

AÇÕES DA SMSAPG

Estrutura física Garantir estrutura

física adequada.

Garantiu uma estrutura

física adequada.

Não garantiu uma

estrutura física

adequada.

Pessoal

administrativo

Garantir pessoal

administrativo.

Falta secretário

executivo.

Possui pessoal

administrativo

inadequado.

Orçamento

próprio

Garantir autonomia

orçamentária.

Não possui verba

própria.

Não possui verba

própria.

Informações

Livre acesso às

informações da

secretária.

Demora no repasse de

informações, tentativa

de sonegação.

Controle das

informações com

destinação de apenas

20% das mesmas para

apreciação do CMSAPG.

Política

Municipal de

saúde

Elaboração

conjunta da Política

Municipal de

Saúde.

Os projetos são

encaminhados prontos

para apreciação do

Conselho.

Os projetos são

encaminhados prontos

para apreciação do

Conselho.

Deliberações

Homologar as

deliberações do

conselho.

Resistência em

homologar as decisões

do Conselho.

Demora a homologar as

decisões do Conselho.

Relação entre a

secretaria e o

conselho.

Relação de

cooperação.

Relação conflituosa e

tensa. Divergência de

concepções políticas.

Ausência dos

representantes titulares

do governo nas

reuniões e eventos do

Conselho.

Relação conflituosa e

tensa. Divergência de

concepções políticas.

Ausência dos

representantes titulares

do governo nas reuniões

do Conselho.

86

As ações ideais propostas acima constituem o resultado do esforço para instituir nessa

dissertação um tipo puro que nos viabilize alcançar determinados traços da realidade, mas

que, conforme Weber, não possuem correspondente na realidade (WEBER, 1979). Nesse

caso, procuramos realçar ações que corresponderiam ao esperado de um gestor comprometido

com a democratização da gestão de saúde.

Ao estabelecer uma comparação entre as ações ideais e as práticas dos secretários de

saúde nos municípios, estudados notamos que, de um modo geral, suas ações mostram uma

tendência contrária a democratização do poder decisório. Nos itens avaliados, as ações dos

gestores dos dois municípios parecem limitar o poder deliberativo e fiscalizador do CMSG e

do CMSAPG, ao ponto de desvalorizar e reduzir suas atribuições relativas ao seu papel

consultivo previsto em lei.

Fernandes e Bonfim (2005) argumentam, baseando-se em autores do pensamento

clássico brasileiro (Oliveira Vianna e Vitor Nunes Leal), que a vida política municipal sempre

foi dotada de um caráter vertical nas relações entre governantes e governados. Embora os

autores adotem uma postura mais otimista em relação a democratização da gestão municipal,

atitudes como a omissão e o controle de informações e a resistência em acatar as deliberações

dos Conselhos são constantemente reiteradas nos estudos sobre os processos participativos

(DAGNINO, 2002: MOREIRA E ESCOREL, 2009: PESSANHA, CAMPAGNAC E

MATOS, 2006).

Diante do exposto, como qualificar a ação do Estado nos municípios de Goiânia e de

Aparecida de Goiânia? Como vimos nos discursos dos conselheiros e nas observações

realizadas nas reuniões e no seminário, é possível reiterar aqui o pressuposto de definir a ação

do Estado como uma ação concentradora de poder. Embora amparados por leis federais,

estaduais e municipais que garantem sua legitimidade, o CMSG e o CMSAPG têm enfrentado

obstáculos na democratização da gestão municipal que são impostos por suas respectivas

secretarias.

Entretanto, uma vez caracterizada a ação do Estado é necessário verificar suas

motivações, haja vista que nossa hipótese sustenta que a orientação político-ideológica do

gestor público pode nortear sua vontade política e, consequentemente, conduzir ações

favoráveis ou desfavoráveis ao sucesso das práticas participativas.

87

As motivações para a ação do Estado nos municípios de Goiânia e de Aparecida de Goiânia

Ponderamos que a vontade política do governante está estreitamente vinculada ao

seu posicionamento político-ideológico. Por “vontade política” entendemos o

comprometimento político com uma causa ou crença que motiva suas ações em prol desta

causa, ou seja, as motivações de ordem valorativa que condicionam sua ação.

Diante disso, realizamos uma caracterização do gestor municipal em Goiânia e em

Aparecida de Goiânia, no intuito de identificar suas orientações político-ideológicas e, assim,

compreender as motivações para suas ações.

Ao assumir a segunda gestão da prefeitura da cidade de Goiânia (2009-2012), o

então prefeito, Iris Rezende (PMDB), nomeou o médico Paulo Rassi para a pasta da

Secretaria Municipal de Saúde, sendo que na época da nomeação o médico era presidente do

Sindicato dos Hospitais do Estado de Goiás23

.

A família Rassi foi uma das pioneiras na área da saúde privada no Estado de

Goiás. No ano de 1944, Alberto Rassi fundou a Casa de Saúde Dr. Rassi. Os irmãos Rassi

construíram ainda o Hospital Geral de Goiânia e o Hospital São Salvador que leva o nome de

Alberto Rassi.

Em abril de 2010, Iris Rezende deixou o governo de Goiânia para disputar a

eleição para Governador do Estado de Goiás. Assumiu a prefeitura da capital o médico Paulo

Garcia (PT), que promoveu mudanças na equipe do governo. Paulo Rassi deixou a SMS e o

secretário municipal de saúde nomeado foi Elias Rassi24

, médico e professor assistente da

Universidade Federal de Goiás. Elias Rassi já ocupou anteriormente o cargo de secretário de

saúde 25

no mandato de Nion Albernaz (PSDB), de 1997 a 2000.

Em Aparecida de Goiânia, o prefeito Maguito Vilela (PMDB) nomeou o médico

Cairo Louzada como Secretário Municipal de Saúde. Louzada permaneceu por poucos meses

na secretaria, pois precisou se afastar para tratar de um câncer que o levou a óbito. O médico

Rafael Nakamura ocupou interinamente o cargo de secretário municipal de saúde durante o

23

http://www.jornaldaimprensa.com.br/Editorias/1204/Secretariado-de-Iris-tem-perfil-jovem 24

http://www.portal730.com.br/noticias/politica/16983-prefeito-paulo-garcia-anuncia-mudancas-no-

secretariado.html 25

http://meduardosantana.wordpress.com/2011/01/26/elias-rassi-neto-secretario-municipal-de-saude-de-goiania-

no-governo-de-paulo-garcia/

88

afastamento do titular e pouco tempo depois, em junho de 2010 foi empossado26

como titular

da pasta.

Tanto a cidade de Goiânia quanto a de Aparecida de Goiânia, durante o decorrer

deste estudo, conviveram com prefeitos do PMDB. Em Aparecida de Goiânia, o governo

peemedebista corresponde a todo o período da pesquisa e em Goiânia, o governo do partido

citado se estendeu até março de 2010. O PMDB é classificado ideologicamente, pela

literatura, como um partido de centro ou de centro direita (RODRIGUES, 2002). Segundo

Reis (2010), o PMDB tem mantido uma postura excessivamente clientelista e pragmática nos

enfrentamentos eleitorais da última década.

Em Goiás, a imagem do PMDB sempre esteve associada à de um de seus

principais líderes, Iris Rezende. A história política de Iris Rezende Machado data do final dos

anos 50. Segundo Cunha (2008), ao longo desse período, Iris forjou-se como um político

centralizador, reproduzindo práticas políticas de caráter tradicionalistas. Iris Rezende

“construiu um estilo próprio de fazer política, que mescla a visão de que o Estado é

fomentador do processo de desenvolvimento econômico, mas também a de um Estado ausente

da economia quando a iniciativa privada pode ser mais competente que o Poder Público”

(Cunha, 2008, p.38).

Diante do exposto podemos considerar que a vontade política de Iris Rezende se

fundamenta numa concepção verticalizada do poder político, na qual cabe ao governante

decidir e aos governados acatar. Nessa visão política, práticas como o clientelismo político, o

autoritarismo administrativo, o controle das informações e a concentração de poder são

recorrentes.

Assim, o presente estudo sobre a relação da SMS e da SMSAPG, respectivamente

com o CMSG e com o CMSAPG, no que diz respeito à divisão do poder decisório, nos

permitiu identificar o tipo de ação praticada pelo Estado quanto à democratização da gestão

municipal no setor da saúde em Goiânia e em Aparecida de Goiânia. Verificamos que nos

dois municípios a ação do Estado pode ser qualificada como uma ação concentradora de

poder motivada por uma concepção política verticalizada.

Diante disso, nota-se que o processo de ampliação do demos na pólis é marcado

por ambuiguidades. Embora, os conselhos sejam considerados novidades institucionais

acabam por reproduzir práticas políticas tradicionais. A baixa rotatividade entre os

conselheiros pode converter-se numa espécie de elitização do cargo. Assim como, o controle

26

http://www.vitoria87fm.com.br/v1/index.php?option=com_content&view=article&id=666:maguito-empossa-

rafael-nakamura-na-secretaria-de-saude-de-aparecida-&catid=3:noticias

89

das informações e a demora no repasse de documento são problemas que podem ser

relacionados à burocracia. De modo que, elitismo e burocracia, temas que perpassam a prática

democrática na conepção weberiana, nos levariam a endossar a impossibilidade de governar

por parte do demos.

Ainda no campo da ambiguidade. Os conselhos “são instrumentos de expressão,

representação e participação da população”, inseridos na esfera pública e vinculados ao poder

executivo, conforme define Gohn (2001). Nesse sentido, possuem um duplo caráter, são

instâncias de fiscalização das políticas empreendidas pelo poder executivo e ao mesmo tempo

são por ele mantidos, no que se refere a estrutura física e orçamento. São autônomos para

fiscalizar a política de saúde, mas são também dependentes dos recursos financeiros e do

repasse de informações por parte do poder executivo. Como demonstrado nesse estudo, a

dependência dos conselhos de saúde de Goiãnia e de Aparecida em relação ao executivo

municipal foi um dos elementos responsáveis pela ineficiência de sua atuação. Questão que

nos leva a indagar, até que ponto, o vínculo institucional favorece ou não a democratização

das esferas deliberativas.

Tais questões parecem evidenciar os limites relativos à democracia participativa, uma

vez que, os conselhos representam o esforço de conjugar representação e participação, isto é,

de ampliar a participação social dentro das esferas de deliberação política.

No entanto, também é possível vislumbrar nesse estudo as potencialidades da

democracia participativa. Em primeiro lugar, seu papel educativo, como defende Pateman

(1992), essa é a principal função da participação numa democracia participativa. É pelo

processo participartivo que se desenvolvem as habilidades necessárias à prática democrática.

Nas reuniões, plenárias, seminários, os conselheiros vão aprendendo as dinâmicas de

funcionamento das instituições públicas, a densenvolver argumentos e a tomar decisões

políticas.

Em segundo lugar, o desenvolvimento da criatividade dos atores sociais na perspectiva

de Santos e Avritzer (2005). Para os autores a efetividade das experiências participativas, no

nível local, resultaram da realocaçao de saberes e práticas sociais à esfere administrativa.

Nesse sentido, a experiência do CMSAPG tem muito a contribuir. A possibilidade de acionar

o Ministério Público em caso de problemas na prestação de contas da secretaria municipal de

saúde expressa uma alternativa criativa de assegurar a efetiva fiscalização das política de

saúde do município. Outro exemplo de criatividade foi a sugestão de eleição para o cargo de

secretário de saúde, assim, o cargo seria ocupado por pessoas capacitadas para exercê-lo. A

90

criatividade dos atores sociais emerge das necessidades e das constatações do cotidiano de sua

prática política e podem representar grandes avanços na democratização das esferas de poder.

Em suma, o processo de ampliação do demos na pólis é complexo e assinalado por

limites e potencialidades. Àqueles que defendem a democracia representativa sobressaem os

seus limites, já àqueles que defendem a democracia participativa sobressaem suas

potencialidades. Duas faces de uma mesma moeda, a Democracia real como pobre

aproximação do ideal democrático.

91

OBSERVAÇÕES FINAIS

O estudo realizado procurou refletir sobre um aspecto cada vez mais presente na

compreensão das relações ente Estado e sociedade. Pesquisamos cenários formados por

processos participativos na gestão pública do setor de saúde, nos municípios de Goiânia e de

Aparecida de Goiânia, assinalando desafios encontrados pelos conselheiros municipais de

saúde no processo de democratização da gestão local.

A partir da identificação dos elementos que matizaram as relações entre as secretarias

de saúde e seus respectivos conselhos, buscamos qualificar a ação do Estado bem como as

motivações que vieram a configurar a “vontade política” do gestor como um fator relevante

para a compreensão dessa nova forma política, instaurada no Brasil a partir da Constituição de

1988.

Nas duas experiências conselhistas, consideramos a ação do gestor como ação

essencialmente concentradora do poder. A falta de estrutura física e de pessoal administrativo

adequados, a falta de verba orçamentária própria, o controle das informações, o

encaminhamento de projetos acabados para mera apreciação do conselho, a resistência em

homologar suas deliberações, a ausência dos representantes titulares e do secretário de saúde

nas reuniões e eventos realizados pelo conselho exemplificam as dificuldades para que a

“partilha de poder” aconteça como componente democratizador das políticas públicas, tendo

por referência os conselhos municipais. Assim, pudemos perceber que as motivações que

orientam as ações dos gestores estudados são norteadas por uma concepção vertical do poder,

no qual a participação se dá através da seleção dos líderes políticos, nos termos de Weber, e

não no processo de elaboração, execução e fiscalização das políticas públicas.

A mera existência de arenas de participação no interior do Estado não é condição

suficiente para a democratização dos espaços de decisão política. O processo de ampliação do

demos na pólis é complexo e envolve uma série de componentes políticas (projetos políticos

divergentes) e de condições (uma sociedade civil forte e atuante) para a sua efetivação como

argumenta Dagnino. A “vontade política” do dirigente político pode contribuir para elucidar

um desses elementos que desafiam as novas instâncias de participação a criarem mecanismos

de superação de tais obstáculos (denúncias no Ministério Público, não aprovação dos

relatórios de gestão, etc.), constituindo-se em área ainda carente de estudos a respeito.

92

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em dez/2010.

96

ANEXOS

_________________________________________________________________________

ANEXO A

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado (a) para participar da pesquisa AMPLIAÇÃO DO DEMOS NA PÓLIS: A

AÇÃO DO ESTADO NOS CONSELHOS MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E DE

APARECIDA DE GOIÂNIA, vinculada ao Programa de Pós-graduação em Sociologia da Universidade

Federal de Goiás.

Você foi selecionado(a) pelo fato de fazer parte da atual gestão do conselho municipal de saúde da cidade

de Goiânia/Aparecida de Goiânia. Sua participação contribuirá para o avanço do conhecimento das práticas

democráticas em nossas cidades, bem como para evidenciar os desafios a serem superados. Sua

participação não é obrigatória, a qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu

consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a

Universidade Federal de Goiás.

O objetivo deste estudo é averiguar o julgamento que os conselheiros representantes da sociedade e do

governo fazem a respeito das relações estabelecidas entre o Estado e o conselho no que se refere à partilha

de poder. As perguntas que vamos fazer não pretendem trazer nenhum desconforto ou risco. Sua

participação nesta pesquisa consistirá em relatar suas experiências enquanto conselheiro(a), bem como

emitir seu julgamento a respeito da dinâmica de funcionamento do conselho e das relações estabelecidas

neste ambiente.

Tais informações serão gravadas e posteriormente transcritas. Asseguramos que elas são confidenciais e

que serão utilizadas apenas para fins acadêmicos. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar

sua identificação, pois somente os pesquisadores envolvidos neste projeto terão acesso a estas informações.

Dados como nome, profissão, local de moradia, ou qualquer outro que possa lhe identificar não serão

divulgados.

Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço institucional do pesquisador

principal e do CEP, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer

momento.

______________________________________

Mestranda: Patrícia Gomes de Macedo

Estrada Goiânia-Nerópolis, caixa postal 131 – Goiânia-GO - CEP: 74001-970. (62) 3521-1100

Pró-Reitoria de Pesquisa e Graduação/UFG – Prédio da Reitoria, Térreo, Campus II – Goiânia-GO,

CEP: 74001-970. Fone: 3521-1076

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em

participar.

_________________________________________

Sujeito da pesquisa

97

ANEXO B

ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS CONSELHEIROS DOS CONSELHOS

MUNICIPAIS DE SAÚDE DE GOIÂNIA E APARECIDA DE GOIÂNIA

Data:_______________________________________

Local:______________________________________

Hora Início:_____________Término:______________

Dados básicos (econômicos, sociais, culturais e políticos)

1. Qual a entidade que o (a) Senhor (a) representa?

2. Qual o seu nome?

3. Qual a sua idade?

4. Sexo

5. Qual a sua profissão?

6. Qual o seu nível de escolaridade?

7. Qual a renda total de sua família?

8. Qual a sua religião?

Trajetória/experiência anterior de ação coletiva ou associativismo

1. O (a) Senhor (a) já participou ou possui alguma experiência anterior em outras

entidades ou movimentos sociais (ONGs, sindicados, movimentos religiosos,

associação de moradores, associação profissionais outros conselhos)?

2. O (a) Senhor (a) é filiado (a) a algum partido político? Se sim, qual? Se não, tem

simpatia por algum partido político?

3. Há quanto tempo o (a) Senhor (a) participa como conselheiro (a) do Conselho de

Saúde?

Questões sobre a dinâmica de funcionamento do Conselho de Saúde

1. O que motivou sua participação neste Conselho?

2. Em sua opinião qual a sua principal função como membro do Conselho? E quais

98

as outras funções?

3. Como você foi indicado para participar do Conselho? Você acha que representa o

segmento que o indicou para o Conselho? Se sim, como você faz esta

representação?

4. Como o (a) Senhor (a) analisa a questão da participação popular na elaboração e

no controle da política municipal de Saúde em seu município?

5. Na sua percepção, qual tem sido o impacto da existência e da atuação do Conselho

para a formulação das Políticas de Saúde, no Controle Social? De que modo o

Conselho tem atuado na formulação das Políticas e no controle delas?

6. Em sua opinião, os conselheiros estão preparados para debater e decidir sobre os

assuntos de Saúde da população? O que você espera da sua participação enquanto

conselheiro de saúde?

7. As decisões tomadas são de natureza colegiada?

8. O Conselho tem acesso a todas as informações de que necessita para deliberar?

9. Pra você qual é o papel do Conselho de Saúde?

10. Qual a relação do Conselho de Saúde com a Secretaria de Saúde de

Goiânia/Aparecida? Como você acha que deve ser esta relação?

11. Como você avalia a atuação do poder municipal (Estado) frente ao Conselho de

Saúde? Exemplifique.

12. Quais os principais temas, que em sua opinião devem ser tratados nas reuniões do

conselho?

13. A Secretaria tem assegurado a estrutura de funcionamento do Conselho? O

Conselho tem uma sede e pessoal administrativo?

14. Além dos segmentos representados outras organizações ou interesses também

participam das reuniões do Conselho? Se sim, quando?

15. Quais os mecanismos utilizados pelo Conselho de Saúde para a definição de

agenda e/ou hierarquia de prioridade dos problemas da população?

16. Como são as reuniões do Conselho? Como é definida a pauta? Como são

encaminhadas as deliberações?

17. O Conselho tem trabalhado com as decisões da Conferência Municipal de Saúde?

Em que medida? São feitos checagens e balanços periódicos nesse sentido?

18. Em sua opinião, existem interferências político-partidárias nos Conselhos de

Saúde do em seu município? Se houver, quais as formas mais comuns dessas

interferências? Quais as consequências, no seu modo de ver?

99

ANEXO C – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA

100

101

ANEXO D – CERTIFICADO DO I SEMINÁRIO DE

CAPACITAÇÃO DE CONSELHEIROS DE SAÚDE DE GOIÂNIA

102