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Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Programa de Mestrado Profissional em Rede Nacional em
Gestão e Regulação de Recursos Hídricos
Caroline Matos da Cruz Correia
Comunicação digital para a democratização de informações e
conhecimentos sobre recursos hídricos: um protótipo de aplicativo para a
população da sub-bacia hidrográfica do ribeirão Arrudas, Minas Gerais
Rio de Janeiro
2018
Caroline Matos da Cruz Correia
Comunicação digital para a democratização de informações e conhecimentos sobre
recursos hídricos: um protótipo de aplicativo para a população da sub-bacia
hidrográfica do ribeirão Arrudas, Minas Gerais
Dissertação apresentada, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre, ao Programa de
Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão
e Regulação de Recursos Hídricos, da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração:
Regulação e Governança de Recursos Hídricos.
Orientador: Prof. Dr. Carlos José Saldanha Machado
Rio de Janeiro
2018
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CTC/C
Bibliotecária responsável: Fernanda Lobo / CRB-7: 5265
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
dissertação, desde que citada a fonte.
______________________________________ ______________________
Assinatura Data
C824 Correia, Caroline Matos da Cruz.
Comunicação digital para a democratização de informações e
conhecimentos sobre recursos hídricos : um protótipo de aplicativo para
a população da sub-bacia hidrográfica do ribeirão Arrudas, Minas Gerais /
Caroline Matos da Cruz Correia. – 2018.
154 f.: il.
Orientador: Carlos José Saldanha Machado.
Dissertação (Mestrado) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
Centro de Tecnologia e Ciências.
1. Recursos hídricos – Administração – Minas Gerais – Teses. 2.
Transparência informacional – Aplicativos móveis – Minas Gerais –
Teses. 3. Administração – Participação social – Minas Gerais – Teses.
4. Ribeirão Arrudas, Rio, Bacia (MG) – Teses. I. Machado, Carlos José
Saldanha. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Centro de
Tecnologia e Ciências. III. Título.
CDU 556.18(815.1)
Caroline Matos da Cruz Correia
Comunicação digital para a democratização de informações e conhecimentos sobre
recursos hídricos: um protótipo de aplicativo para a população da sub-bacia
hidrográfica do ribeirão Arrudas, Minas Gerais
Dissertação apresentada, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre, ao Programa de
Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão
e Regulação de Recursos Hídricos, da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração:
Regulação e Governança de Recursos Hídricos
Aprovada em 27 de setembro de 2018.
Banca Examinadora:
__________________________________________________________
Prof. Dr. Prof. Dr. Carlos José Saldanha Machado (orientador)
Profágua - UERJ
____________________________________________________
Prof. Dr. Friedrich Wilhelm Herms
ProfÁgua – UERJ
____________________________________________________
Prof.ª M.a Angélica Nogueira de Souza Tedesco
ProfÁgua – Universidade Federal do Espírito Santo
Rio de Janeiro
2018
AGRADECIMENTOS
Agradeço inicialmente a Deus, por ter me conduzido na concretização desse sonho.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Carlos José Saldanha Machado, que tornou possível a
realização deste trabalho, e a todos os professores que participaram da banca examinadora,
pelas contribuições.
A todos os colegas e professores do Programa de Mestrado Profissional em Rede
Nacional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos (ProfÁgua) pela convivência,
ensinamentos, reflexões e pela oportunidade de crescimento profissional e pessoal. E,
especialmente, ao coordenador do ProfÁgua/UERJ, Friedrich Wilhelm Herms, por todo o
apoio.
Um agradecimento institucional à UERJ, uma das melhores universidades do País, e
ao ProfÁgua pelo apoio técnico científico oferecido, e à Agência Nacional de Águas (ANA) e
à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio ao
ProfÁgua aportado até o momento. Ressalto que o presente trabalho foi realizado com o apoio
da CAPES – Código de Financiamento 001 e da ANA, através do Projeto CAPES/ANA
AUXPE N.º 2717/2015.
Agradeço aos colegas do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de
Minas Gerais (Sisema), em particular, do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), que
me apoiaram em diversos momentos do curso, de diferentes formas, destacadamente Januária
da Fonseca, Adriania Guimarães, Nádia Santos, Matheus Santos, Heitor Soares Moreira,
Thiago Santana, Albert Oliveira e Alessandro Campos. Este trabalho certamente não seria o
mesmo sem a contribuição de cada um dos meus colegas/amigos que atuam em diferentes
setores do órgão.
À Eduarda Rohde Araripe Ferreira que voluntariamente e com profissionalismo
dedicou tempo e atenção na construção das telas do protótipo.
Aos meus pais, Antônio Carlos e Ivete, meu infinito agradecimento, pelo amor, apoio,
confiança e motivação.
E a todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a construção deste
trabalho.
RESUMO
CORREIA, Caroline Matos da Cruz. Comunicação digital para a democratização de
informações e conhecimentos sobre recursos hídricos: um protótipo de aplicativo para a
população da sub-bacia hidrográfica do ribeirão Arrudas, Minas Gerais. 2018. 154 f.
Dissertação (Mestrado em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos) – Universidade do
Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018.
A transparência na gestão pública e, particularmente, na gestão de recursos hídricos é
de fundamental importância para o aprimoramento da governança e para a promoção de uma
participação social isonômica e inclusiva na formulação, implementação e avaliação de
políticas públicas. No caso da política de recursos hídricos, um dos fundamentos é a sua
implementação de forma descentralizada e participativa, com a criação de espaços de
participação social na forma de conselhos de recursos hídricos e de comitês de bacias
hidrográficas. Contudo, observa-se que a transparência na gestão desses recursos ainda é
insatisfatória, impactando na falta de ampliação e de qualificação da participação cidadã no
controle da gestão da água. Nesse contexto, o presente trabalho busca contribuir com o
processo de democratização de informações e conhecimentos sobre recursos hídricos em
bacias hidrográficas urbanas por meio da elaboração de um protótipo de aplicativo para
smarthphones direcionados aos moradores da sub-bacia do ribeirão Arrudas, na Região
Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, com o intuito de envolvê-los na gestão
coletiva de um bem de uso comum do povo brasileiro vital para a saúde ambiental. A escolha
de um aplicativo para smartphone, denominado MEANDROS – Gestão Coletiva das Águas,
deve-se ao fato dessa tecnologia ser uma das principais formas de acesso à internet hoje no
País. Espera-se que este artefato tecnológico seja apropriado por um maior número de
cidadãos, ampliando seus conhecimentos, incitando o debate, a reflexão e envolvendo-os na
gestão coletiva da água na região onde vivem.
Palavras-chave: Mídias digitais. Aplicativos. Democratização de informações e
conhecimentos. Participação social. Gestão coletiva de recursos hídricos.
Bacias hidrográficas urbanas.
ABSTRACT
CORREIA, Caroline Matos da Cruz. Digital communication for the democratization of
information and knowledge on water resources: a prototype mobile application for the
population of the river basin Arrudas, Minas Gerais. 2018. 154 f. Dissertação (Mestrado em
Gestão e Regulação de Recursos Hídricos) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro, 2018.
Transparency across public management, in particularly, as it relates to administration
of water resources is fundamentally important not only to drive more robust governance but,
also the promotion of an isonomic social participation in the construction, implementation and
assessment of public policies. In the case of the “Water Assets Policy”, one of the key
elements is the enactment of the decentralization and participatory approach; creating room
for social contribution through the Water Resources Councils and the River Basin
Committees is key. That being said, it is well known and understood that transparency in the
management of these resources is still unsatisfactory, limiting the expansion and qualification
of citizen contributions to water management control. In this sense, the present work seeks to
contribute to the process of democratization of information and knowledge on water resources
in urban basins through the delivery of a prototype Mobile Application (APP) called
MEANDROS - Collective Water Management. Purpose being to improve engagement across
the residents from Arrudas river basin in the Metropolitan Region of Belo Horizonte, Minas
Gerais in the collective supervision of water, not only a common good used by the Brazilian
people but also vital for environmental health. The decision and direction to leverage a
smartphone app is due to the fact that this capability is a mainstream form of communication
and technology which is widely used in today’s modern society. Through the use of this
technology we’re anticipating that a muchgreater number of citizens will self-educated,
collaborate, reflect and become significantly more involved in the collective management of
the water across the region where they live.
Keyword: Digital media. Mobile APP. Democratization of information and knowledge. Social
participation. Collective management of water resources. Urban basins.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Matriz institucional do Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos....................................................................................
44
Figura 2 – Comitês de bacias hidrográficas instituídos no Brasil.............................. 59
Figura 3 – Planos de Recursos Hídricos de bacias estaduais e interestaduais já
existentes até 2016 .................................................................................
60
Figura 4 – Mapa da Sub-Bacia do Ribeirão Arrudas .............................................. 83
Figura 5 – Uso e ocupação do solo na sub-bacia do ribeirão Arrudas ...................... 85
Figura 6 – Distribuição da população no território da bacia do ribeirão Arrudas .... 91
Figura 7 – Mapa com os pontos de monitoramento da qualidade da água na bacia
do ribeirão Arrudas .................................................................................
94
Figura 8 – Ribeirão Arrudas no Parque Municipal, na data provável entre os anos
de 1922 e 1926 ........................................................................................
114
Figura 9 – Vista externa da fábrica de tecidos (Chita) na data provável de 1900-
1910..........................................................................................................
116
Figura 10 – Vista do ribeirão Acaba Mundo, próximo à Igreja de Nossa Senhora de
Boa Viagem .............................................................................................
116
Figura 11 – Vista do córrego Leitão na atual rua São Paulo, na data provável de
1922 a 1926 ...........................................................................................
117
Figura 12 – Canalização do ribeirão Arrudas e aterro para a formação da avenida
dos Andradas ........................................................................................
117
Figura 13 – Córrego Leitão no ano de 1942 ............................................................. 118
Figura 14 – Obra de canalização do córrego Acaba Mundo na Avenida Afonso
Pena, com a Rua Rio Grande do Norte no ano de 1966 .........................
119
Figura 15 – Inauguração do asfalto sobre o córrego Acaba Mundo na Avenida
Uruguai, em 1973 ..................................................................................
119
Figura 16 – Telas iniciais do aplicativo MEANDROS ............................................. 121
Figura 17 – Telas de Cadastro e principal .................................................................. 122
Figura 18 – Telas dos botões ‘Perfil’ e ‘Notificações’................................................ 123
Figura 19 – Telas inicias da seção Território .............................................................. 124
Figura 20 – Telas da seção Território / Usos do solo e população ............................. 125
Figura 21 – Telas da seção "Qualidade da Água'/ Fontes de poluição ....................... 126
Figura 22 – Telas da seção "Qualidade da Água'/ Situação......................................... 127
Figura 23 – Telas do botão 'Abastecimento' ............................................................... 128
Figura 24 – Telas do botão 'Esgotamento Sanitário'.................................................... 129
Figura 25 – Telas do botão 'Resíduos sólidos' ............................................................ 130
Figura 26 – Tela da drenagem urbana ......................................................................... 130
Figura 27 – Telas da seção 'Atores envolvidos' – Subcomitê de bacia ....................... 132
Figura 28 – Telas da seção 'Ação cidadã' ................................................................... 133
Figura 29 – Telas da seção 'Memória' ......................................................................... 134
Figura 30 – Telas da seção ‘Agenda’ .......................................................................... 135
Figura 31 – Telas da seção 'Fóruns de Discussão' ...................................................... 136
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1 – Principais acontecimentos na área ambiental e recursos hídricos de 1960
até 1997........................................................................................................
39
Quadro 2 – Relação das UTEs do CBH Rio das Velhas................................................. 82
Tabela 1 – Taxa anual de crescimento da População dos municípios da UTE
Ribeirão (1991/2010)....................................................................................
92
Quadro 3 – Classes do Índice de Qualidade da Água e seu Significado...................... 95
Gráfico 1 – Série história do monitoramento do IQA no ponto BV155, de 1997-
2017..............................................................................................................
96
Gráfico 2 – Série história do monitoramento do IQA no ponto BV081, de 2012-
2017..............................................................................................................
97
Quadro 4 – Classes da Contaminação por Tóxicos e seus significados.......................... 98
Quadro 5 – Série história do monitoramento da CT no ponto BV155, de 1997-
2017.............................................................................................................
99
Quadro 6 – Classes do Índice BMWP (Biomonitoramento) e seus significado .......... 101
Tabela 2 – Serviços de esgotamento sanitário na UTE Ribeirão Arrudas..................... 104
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABRH Associação Brasileira de Recursos Hídricos
ANA Agência Nacional de Águas
APP Aplicativo
ARSAE-MG Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de
Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais
BMWP Biological Monitoring Working Party Score System (Índice Biótico)
CBH Comitê de Bacia Hidrográfica
CCNC Comissão Construtora da Nova Capital
CEEIBHs Comitês de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas
CEMACT Conselho de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia
CERH Conselho Estadual de Recursos Hídricos
CETIC Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da
Informação
CMI Coeficiente de Mortalidade Infantil
CNARH Cadastro Nacional de Recursos Hídricos
CNRH Conselho Nacional de Recursos Hídricos
CNUMAD Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento
CODEMA Conselho Municipal de Defesa e Proteção do Meio Ambiente de Sabará
COMAM Conselho Municipal do Meio Ambiente de Belo Horizonte
COMPUR Conselho Municipal de Política Urbana de Belo Horizonte
COPAM Conselho Estadual de Política Ambiental
COPASA Companhia de Saneamento de Minas Gerais
CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
CODEVASF Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco
CT Contaminação por toxico
CVSF Comissão do Vale do São Francisco
DBO Demanda Química de Oxigênio
DQA-EU Diretiva Quadro das Águas da União Europeia
DEMAE Departamento Municipal de Águas e Esgotos
DNAEE Departamento Nacional de Água e Energia Elétrica
DRH Departamento de Recursos Hídricos do Estado de Minas Gerais
EaD Educação a Distância
ETE Estação de Tratamento de Esgoto
EUA Estados Unidos da América
FAMA Fórum Alternativo Mundial da Água
FEAM Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais
FEHIDRO Fundo Estadual de Recursos Hídricos
FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz
GIRH Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos
GWP Global Water Partnership
IBGC Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICE Índice de Conformidade ao Enquadramento
IEC International Engineering Consortium
IEF Instituto Estadual de Florestas
IGAM Instituto Mineiro de Gestão das Águas
IQA Índice de Qualidade da Água
IMRS Índice Mineiro de Responsabilidade Social
INTRAG Índice de Transparência no Manejo da Água
IPTO Information Processing Techniques Office
ISO International Organization for Standardization
LAI Lei de Acesso à Informação
MMA Ministério do Meio Ambiente
OCDE Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico
ODM Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
ODS Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
ONU Organizações das Nações Unidas
PBH Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
PDRH Plano Diretor de Recursos Hídricos
PIB Produto Interno Bruto
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PRECEND Programa de Recebimento e Controle dos Efluentes Não Domésticos
PROFÁGUA Mestrado Profissional em Rede de Gestão e Regulação de Recursos Hídricos
PROGESTÃO Programa de Consolidação do Pacto Nacional pela Gestão das Águas
PROSAM Programa de Saneamento Ambiental das Bacias do Ribeirão Arrudas e Onça
na Região Metropolitana de Belo Horizonte
QUALIÁGUA Programa de Estímulo à Divulgação de Dados da Qualidade da Água
RHN Rede Hidrometeorológica Nacional
RMBH Região Metropolitana de Belo Horizonte
RIMAS Rede Integrada de Monitoramento de Águas Subterrâneas
RNQA Rede Nacional de Monitoramento da Qualidade da Água
SCBH Subcomitês de Bacia Hidrográfica
SCEA-ÁGUA Sistema de Contas Econômicas Ambientais da Água
SEGRH Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos
SEMAD Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
SIAGAS Sistema de Informações de Água Subterrânea
SIAM Sistema Integrado de Informação Ambiental
SIG Sistema de Informações Geográficas
SIN Sistema Interligado Nacional
SINGREH Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
SLU Superintendência de Limpeza Urbana de Belo Horizonte
SNIRH Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos
SUDECAP Superintendência de Desenvolvimento da Capital
TIC Tecnologias da Informação e Comunicação
TVA Tennessee Valley Authority
UC Unidade de Conservação
UF Unidades da Federação
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais
UIT União Internacional de Telecomunicações
UPGRHs Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos
URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
USP Universidade de São Paulo
UTEs Unidades Territoriais Estratégicas
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................... 16
1 METODOLOGIA................................................................................................ 20
2 DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO................................................................ 26
2.1 Democracia Participativa no Brasil................................................................... 28
2.2 Democracia e conselhos de políticas públicas.................................................... 31
2.3 Democracia e direito à cidade............................................................................. 34
2.4 Democracia e governança eletrônica.................................................................. 35
3 GOVERNANÇA DE RECURSOS HÍDRICOS............................................... 39
3.1 Construção da política nacional de recursos hídricos....................................... 41
3.2 Participação social e transparência.................................................................... 48
3.3 Avaliação comparativa de 10 e 20 anos da nova política das águas................ 53
4 COMUNICAÇÃO ESTRATÉGICA E ESPAÇO TELEMÁTICO................. 64
4.1 Espaço telemático – Internet............................................................................... 69
4.2 A Internet no Brasil.............................................................................................. 75
4.3 Dispositivos e aplicativos móveis - smartphone................................................. 77
4.4 Aplicativos móveis - temática água.................................................................... 78
5 CARACTERIZAÇÃO DA SUB-BACIA DO RIBEIRÃO ARRUDAS........... 81
5.1 Uso e ocupação do solo......................................................................................... 83
5.2 Qualidade das Águas............................................................................................ 93
5.3 Saneamento Básico............................................................................................... 102
5.4 Institucional.......................................................................................................... 107
5.5 Referências históricas.......................................................................................... 113
6 PROTÓTIPO DO APLICATIVO MEANDROS – GESTÃO COLETIVA
DAS ÁGUAS.........................................................................................................
120
6.1 Abertura e tela inicial.......................................................................................... 120
6.2 Perfil, convites e notificações............................................................................... 122
6.3 Território............................................................................................................... 123
6.4 Qualidade da água................................................................................................ 125
6.5 Saneamento........................................................................................................... 127
6.6 Atores envolvidos.................................................................................................. 131
6.7 Memória................................................................................................................ 133
6.8 Agenda................................................................................................................... 134
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 137
REFERÊNCIAS .................................................................................................. 141
ANEXO A - UPGRHs de Minas Gerais, com destaque para a bacia do rio das
Velhas.....................................................................................................................
148
ANEXO B – Hidrografia da sub-bacia do ribeirão Arrudas.................................. 149
ANEXO C - Unidades de Conservação inseridas na sub-bacia do ribeirão
Arrudas...................................................................................................................
150
ANEXO D – Mapa da qualidade das águas da bacia do ribeirão Arrudas, de
1997 a 2017............................................................................................................
151
ANEXO E - Termo de Responsabilidade de Cessão de Direito de Uso de
Imagens..................................................................................................................
152
16
INTRODUÇÃO
A disponibilização de informações públicas de maneira tempestiva, atualizada e em
linguagem acessível é fundamental para a promoção de uma participação isonômica e
inclusiva dos atores sociais na formulação, implementação e controle de políticas públicas
(MACHADO et al, 2016). No caso da política de recursos hídricos, instituída pela Lei nº
9433/1997, acrescenta-se a exigência legal de implantação de instâncias consultivas,
normativas e deliberativas nas tomadas de decisões, conquistadas em parte na luta pela
redemocratização do País na década de 1980. Com este fundamento, a referida política prevê
a criação de conselhos de recursos hídricos – nacional e estaduais - e de comitês de bacias
hidrográficas, como espaços de participação formal, com a representação do poder público,
dos usuários e das comunidades, e a bacia hidrográfica1 como unidade de planejamento e
gestão. Nesse contexto democrático, um processo contínuo de comunicação social, com vistas
a promover a transparência e o acesso a informações, ganha maior relevância e deve ser
provido, sobretudo pelo Estado, mas também por outros atores envolvidos, estabelecendo uma
relação de confiança, tão necessária em ações participativas.
Cabe assinalar que a autora deste projeto é servidora do Instituto Mineiro de Gestão
das Águas (Igam), órgão que compõe o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos
Hídricos de Minas Gerais (SEGRH), com experiência na área de comunicação, incluindo o
gerenciamento de notícias do Portal dos Comitês, que reúne informações de 36 comitês de
bacias hidrográficas do Estado, e perfis organizacionais em redes sociais. Dessa forma,
entende que estudar os impactos e as oportunidades da comunicação social, em particular da
comunicação digital, corroborará para o aprimoramento de sua prática profissional, além de
contribuir com os estudos da comunicação no contexto das novas mídias digitais, um tema
que vem se desenvolvendo e ganhando espaço na área de governança ambiental, e que está
inserido na área de concentração ‘Regulação e Governança de Recursos Hídricos’, linha de
pesquisa ‘Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos’, do Mestrado Profissional em Rede
Nacional de Gestão e Regulação de Recursos Hídricos (ProfÁgua).
1 Bacia hidrográfica: é um território compreendido por um rio principal e diversos cursos d’água afluentes. Nessa
região, a água da chuva e do sistema conectado de cursos d’água escoam em direção a uma única foz, localizada
no ponto mais baixo da região, denominada enxutório (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2011).
17
Por se tratar de um tema estratégico para a gestão, instituições internacionais
multilaterais, como a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE)
e a Global Water Partnership (GWP), incluíram o acesso à informação, aqui tratado como
transparência, como peça-chave nas práticas de manejo e gestão dos recursos hídricos e como
componentes da "boa governança” (EMPINOTTI et al, 2014).
No Brasil, a disponibilização de informações públicas é também um direito
constitucional, regulado pela Lei de Acesso à Informação, denominada LAI - Lei nº
12.527/2011. De acordo com essa norma, em seu Artigo 8º, as entidades e os órgãos públicos
da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, dos três poderes – executivo, legislativo e
judiciário - têm o dever de “promover, independentemente de requerimentos, a divulgação
em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse
coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas” (BRASIL, 2011). A divulgação deve
ocorrer em local físico de fácil acesso e via internet, sendo obrigatória a divulgação em sítios
eletrônicos oficiais. A LAI prevê, ainda, a criação de serviços adequados de prestação de
informações aos cidadãos, consultas públicas e outras formas de divulgação, favorecendo a
participação popular.
Contudo, os níveis atuais de transparência nos sistemas estaduais de gestão de recursos
hídricos no País são relativamente baixos (EMPINOTTI et al, 2014; EMPINOTTI et al,
2015), o que limita a ampliação e a qualificação da participação cidadã no controle da gestão
de um bem de uso comum do povo, a água.
Diante desse cenário e, considerando que a democracia tem como desafio empoderar
os cidadãos para transformar dados em conhecimentos úteis, o presente trabalho visa
contribuir para o aprimoramento da transparência na gestão das águas e, por conseguinte,
para a ampliação e a qualificação da participação social, pensando a realidade de uma sub-
bacia hidrográfica do Estado de Minas Gerais, a do ribeirão Arrudas, que concentra mais de
99% da população nas cidades, incluindo a capital, Belo Horizonte.
Nesse sentido, esta dissertação tem o objetivo principal de analisar em que medida as
mídias digitais podem ampliar o acesso a informações sobre recursos hídricos em bacias
hidrográficas urbanas. E mais especificamente:
18
a) levantar a literatura científica que discute a democracia participativa e a
democratização de informações e conhecimentos ambientais e de recursos
hídricos, em particular;
b) identificar e analisar os limites e as potencialidades das mídias digitais
como meio de ampliar o acesso à informação e envolver novos atores nos
debates públicos; e
c) desenvolver um protótipo de mídia digital na forma de um aplicativo para
celular inteligente (smartphone), com sistema operacional Android, que
viabilize o acesso a informações, conhecimentos e evidências científicas
sobre a realidade socioambiental do território da sub-bacia hidrográfica do
ribeirão Arrudas. O aplicativo foi nomeado como MEANDROS – Gestão
Coletiva das Águas.
Os objetivos aqui traçados foram alcançados e estão descritos nos próximos capítulos
como segue.
No Capítulo 1 – Metodologia, são apresentadas as fases e etapas percorridas para a
realização desta dissertação.
No Capítulo 2 – Democracia e Participação, tem-se a exposição da literatura referente
à democracia participativa e à contextualização sobre a construção de governos democráticos
a partir do século XX, quando este regime ganhou uma centralidade no cenário mundial.
Também é abordada a questão democrática no Brasil, que passou por um processo de
redemocratização nos anos de 1980, culminando com a promulgação da Constituição de 1988
e com os mecanismos institucionais de participação social. Nesse contexto, o direito à cidade
é problematizado, uma vez que o território de estudo está inserido em uma bacia hidrográfica
urbana. O capítulo se encerra com enfoque nos conselhos de políticas públicas, sua
estruturação e formas de atuação, sendo este o modelo adotado pela política das águas.
Na sequência, no Capítulo 3 – Governança de Recursos Hídricos, é apresentado o
processo de construção da Política Nacional de Recursos Hídricos no Brasil, inserido na
conjuntura mais ampla de redemocratização no País e no cenário global e local de discussões
e ações relacionadas às questões ambientalistas, que ganharam fôlego a partir da década de
1970, quando o mundo começou a sentir os efeitos negativos do uso predatório dos recursos
naturais e, mais particularmente, aumentaram os conflitos pelo uso da água. Há um enfoque
nas instâncias participativas do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
19
(SINGREH), especialmente, os comitês de bacias hidrográficas (CBHs). O capítulo aborda,
ainda, uma avaliação de 10 e 20 anos da implementação desta política no Brasil e finaliza com
uma discussão sobre a transparência na gestão das águas no País.
O Capítulo 4 – Comunicação Estratégica e Espaço Telemático, descreve as
características da comunicação estrategicamente planejada com vista a potencializar o
processo de mobilização social, identificando os cinco possíveis espaços de visibilidade
pública a serem trabalhados nesse contexto - midiático massivo; midiático massivo local;
dirigido; presencial; e telemático, sendo o último deles apresentado de forma mais detalhada
em um tópico específico por se tratar do espaço de visibilidade privilegiado neste trabalho de
pesquisa.
No Capítulo 5 – Caracterização da Sub-Bacia do Ribeirão Arrudas, constam dados e
informações sobre a realidade do território dessa sub-bacia, oriundos de fontes diversas, que
farão parte do conteúdo do aplicativo que é apresentado, em seguida, no Capítulo 6 –
Protótipo do Aplicativo MEANDROS – Gestão Coletiva das Águas.
O trabalho é concluído com considerações que acentuam a proposta desta dissertação
de contribuir para a reflexão sobre a promoção da transparência, questão central para o
aprimoramento da gestão das águas e alcance dos objetivos da política de recursos hídricos.
Apresenta, sobretudo, uma análise dos limites e das potencialidades das mídias digitais como
meio de difusão da informação e de ampliar e qualificar a participação social na gestão das
águas, bem como uma avaliação mais específica do artefato tecnológico proposto,
correlacionando com as abordagens teóricas acerca dos temas democracia e comunicação
desenvolvidas nesta dissertação.
A seguir, na Metodologia, é detalhado o caminho traçado para alcançar cada um dos
objetivos estabelecidos e descritos anteriormente.
20
1 METODOLOGIA
Para o desenvolvimento do estudo e alcance dos objetivos traçados, a presente
pesquisa foi dividida em três fases, a saber:
a) revisão da literatura científica de referência;
b) levantamento de dados socioambientais da sub-bacia do ribeirão Arrudas; e
c) elaboração do protótipo do aplicativo MEANDROS – Gestão coletiva das
águas.
Na primeira fase, considerando que a atual Política Nacional de Recursos Hídricos foi
estruturada em um período de transição de governos ditatoriais para uma democracia
representativa que buscava fortalecer espaços de participação direta, foi realizada uma revisão
da literatura sobre democracia participativa, redemocratização no Brasil e a ampliação e o
fortalecimento dos espaços formais de participação social. Cabe ressaltar que, durante o
desenvolvimento da pesquisa, a mestranda participou de dois cursos: Introdução à Gestão
Participativa, realizado pela Agência Nacional de Águas, de 12/05/2017 a 07/06/2017; e
Experiências de Democracia Participativa na América Latina e na Europa: desafios e
impasses, realizado pelo Instituto da Democracia e Democratização da Comunicação, entre os
dias 13 e 28/11/2017, que contribuíram para o levantamento da literatura nesta área. Também
foram utilizadas referências estudadas na disciplina Gestão Participativa das Águas do
ProfÁgua. Para o estudo sobre a governança das águas no Brasil e seus instrumentos,
ferramentas e experiências de gestão, foram consideradas as referências bibliográficas
estudadas no ProfÁgua, especialmente nas disciplinas Instrumentos para a Gestão de
Recursos Hídricos e Governança e Regulação das Águas, além de documentos oficiais do
governo brasileiro e artigos científicos publicados em periódicos, indexados na base de dados
Scielo. A pesquisa sobre comunicação estratégica e espaços telemáticos foi construído a partir
de estudos sobre comunicação e mobilização desenvolvidos por Márcio Simeone Henriques e
Renan Mafra, que atuaram no projeto Mobiliza, do Departamento de Comunicação Social da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A equipe do projeto desenvolveu um
planejamento de comunicação para promover a gestão participativa das águas na bacia do rio
das Velhas, que engloba a sub-bacia em estudo nesta dissertação. O trabalho foi realizado em
parceria com o Projeto Manuelzão da Faculdade de Medicina da UFMG, transformando-se
21
em um caso de sucesso de mobilização e participação social, relatado em livros e artigos dos
próprios pesquisadores ou de seus pares, a exemplo das professoras Rebecca Abers da
Universidade de Brasília e Margaret Keck da Universidade Johns Hopkins (EUA), também
utilizados neste estudo. Foram consultadas, ainda, as obras de Manuel Castells e Dominique
Cardon, com abordagens internacionais sobre Internet, sociedade e democracia, além de
documentos oficiais do governo brasileiro, normativas e artigos científicos pesquisados na
base Scielo.
Na segunda fase, tendo em vista o objetivo de materializar uma proposta de
contribuição para a democratização de informações sobre recursos hídricos por meio da
criação de um aplicativo para smartphone, definiu-se a área de estudo, a sub-bacia do ribeirão
Arrudas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A escolha da sub-bacia do ribeirão
Arrudas como área de estudo se justifica por estar inserida na terceira maior área
metropolitana do país, a Região Metropolitana de Belo Horizonte. Trata-se de uma sub-bacia
com muitos desafios, uma vez que apresenta o pior índice de qualidade da água no Estado de
Minas Gerais e alta complexidade de gestão, com problemas substanciais para as agendas de
recursos hídricos, meio ambiente, saneamento e uso e ocupação do solo, que envolvem
diferentes níveis de governo – federal, estadual e municipal. Neste território também atuam
diferentes organismos de bacias – comitês de bacia federal e estadual – e entidade equiparada
à agência de bacia, além de conselhos municipais de meio ambiente, de saneamento e de
política urbana. Ademais, Minas Gerais é o estado onde eu atuo no campo da Comunicação
Social enquanto servidora do órgão gestor das águas do Estado – Igam. Por se tratar de um
mestrado profissional, desenvolver uma pesquisa em sua área de atuação, é um ganho
institucional importante.
Com a definição da área de estudo, foi feito um levantamento de informações
socioambientais com o intuito de descrever a realidade do território em análise, destacando-se
as seguintes variáveis: institucional, referências históricas, uso e ocupação do solo, qualidade
da água, saneamento básico e cobertura vegetal. Ressalta-se que os dados ambientais
selecionados quando analisados em conjunto refletem a interferência antrópica nas alterações
quali-quantitativas da água. A pesquisa exploratória envolveu as bases de dados e documentos
de órgãos oficiais, como o Igam, Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais (IEF), IBGE,
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), agência de bacia
(AGB Peixe Vivo) e de pesquisadores com estudos divulgados pelo comitê. Complementa-se
22
que, para uma melhor compreensão, as informações foram especializadas sempre que
possível, com o apoio voluntário da gestora ambiental que atua no Igam Nádia Santos.
Na terceira fase, iniciou-se o planejamento e o desenvolvimento do protótipo do
aplicativo móvel, em parceria voluntária com a estudante de Desenho Industrial da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, Eduarda Rohde Araripe Ferreira, que se colocou à
disposição para colaborar com a pesquisa. O planejamento do protótipo envolveu a definição
do objetivo do artefato tecnológico, do sistema operacional, do nome do aplicativo, do
público-alvo e de suas estruturas e funções através de um diálogo contínuo entre orientador e
orientanda sendo traduzindo em adequações necessárias para ajustar as possibilidades de
realização do trabalho de desenvolvimento em base viável, visto que o estudo não contou com
nenhuma ajuda financeira.
Em relação ao objetivo, o aplicativo se propõe a difundir informações sobre a
realidade socioambiental da sub-bacia do ribeirão Arrudas e, sobretudo, ser um espaço de
diálogo e interação dos moradores da bacia interessados no tema água, conectando pessoas
com vistas à ampliar e qualificar a mobilização e a participação social.
A escolha do smartphone deve-se ao fato dessa tecnologia ser uma das principais
formas de acesso à internet hoje no país, como mostram os dados do suplemento de
Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao relatar que,
considerando os domicílios com acesso à Internet em 2015, 92,1% tinham acesso através de
telefone móvel celular (IBGE, 2016). Optou-se, ainda, pelo desenvolvimento de um programa
para rodar no sistema operacional Android, que de acordo com a empresa Statcounter (2017),
especializada em pesquisas e estatísticas, é o mais popular do planeta.
O nome dado ao aplicativo, MEANDROS – Gestão Coletiva das Águas, vai ao
encontro da característica sociológica da gestão democrática da água no Brasil, que segue
caminhos emaranhados, complexos, com muitos desafios, sinuosidades e voltas. Registra-se
que esse nome já havia sido utilizado por Carlos José Saldanha Machado, orientador desta
dissertação, em 2005, na construção inicial de um projeto editorial da 5ª Revista Científica da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que, em seguida, mudou de nome para Reciis - Revista
Eletrônica de Comunicação, Informação & Inovação em Saúde2.
2 Revista disponível em < http://www.periodicos.fiocruz.br/pt-br/revista/reciis>
23
Em relação ao público-alvo prioritário do aplicativo, este é bastante diverso, tendo em
vista a multiplicidade de atores que podem se interessar e até se envolver na gestão de
recursos hídricos, tanto por meio de canais institucionais quanto por outros meios de
participação. Tratam-se, portanto, de pessoas comuns da sociedade da sub-bacia do ribeirão
Arrudas, mas também de pesquisadores, especialistas, empresários e gestores públicos que
trabalham com esta temática ou atuam em colegiados de recursos hídricos. Assim, o
aplicativo é direcionado a um público alfabetizado e incluído digitalmente e que possuem
smartphone compatível com a versão do aplicativo e o sistema operacional Android, bem
como habilidade para manuseá-lo.
Para a estrutura temática, foram definidos sete componentes:
a) território – que trata do uso e ocupação do solo;
b) qualidade da água;
c) saneamento básico – que envolve abastecimento de água, esgotamento
sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo
de águas pluviais urbanas;
d) atores envolvidos, que abrange os aspectos institucionais;
e) memórias – que traz os marcos históricos;
f) agenda coletiva; e
g) fóruns de discussão. Também foi pensado o tópico ‘perfil’, onde se
encontram o glossário e o manual do aplicativo, com explicações sobre cada
item para melhor aproveitamento por parte dos usuários, denominado
‘Ajuda’, além das ferramentas ‘convidar amigos’ e ‘notificações de atividades
dos usuários’.
Os textos que alimentam os tópicos no protótipo foram extraídos do capítulo sobre a
caracterização da sub-bacia hidrográfica do ribeirão Arrudas, desta dissertação, e buscou-se
reescrevê-los de forma mais leve e menos tecnicista com suporte de ilustrações, a exemplo de
mapas temáticos. Considerou-se que na evolução para a produção do aplicativo, a necessidade
de se trabalhar, além da cartografia tradicional, com a cartografia étnica, que faz um
mapeamento cultural participativo a partir das percepções e das representações sociais das
comunidades sobre o seu território. Também foram pesquisadas imagens históricas no
endereço eletrônico do Arquivo Público Mineiro, nas bases de dados do Arquivo Público da
Cidade de Belo Horizonte e compradas imagens digitais, na categoria para fins de pesquisa
24
acadêmica, no Museu Histórico Abílio Barreto, para compor o tópico “Memória”. A foto de
abertura do protótipo foi cedida pelo Comitê da Bacia Hidrográficas do Rio das Velhas (CBH
Rio das Velhas). Foram selecionadas imagens não protegidas por meio do website de busca
Google Imagens e do site freeimagens. Algumas delas foram tratadas no Software Adobe
Photoshop.
Em relação ao acesso, definiu-se que o cadastro no aplicativo seria necessário apenas
para permitir a participação colaborativa, a exemplo da construção da agenda de eventos, dos
fóruns de discussões e da indicação de ações cidadãs do tópico ‘Atores envolvidos’, dentre
outros. O cadastro se daria por meio de uma conta de e-mail e uma senha de preferência do
usuário, com validação por meio de mensagem recebida no e-mail cadastrado. Se o usuário
optar por não se cadastrar, o acesso é limitado às informações publicadas.
Ressalta-se que embora também seja usual a prototipagem em papel para testes com os
usuários em processos participativos (LAVAISSIÉRI, 2015), optou-se, neste trabalho, por
desenvolver as estruturas de telas (wireframes) no software Adobe Illustrator, com a
linguagem de programação Visual Basic. O tratamento das imagens foi realizado no software
Adobe Photoshop. Foi acrescentada a imagem de um smartphone para que os futuros
avaliadores possam ter uma experimentação mais próxima da real. Foram produzidas 33 telas,
salvas com a extensão .png. A navegação entre as telas pode ocorrer em celular ou
computador pessoal, com qualquer sistema operacional, e possibilitará ao usuário uma visão
ampla da funcionalidade do programa, embora as telas sejam estáticas, sem o recurso
multitoques.
A proposta do aplicativo é apresentada no sexto capítulo, denominado Protótipo do
Aplicativo MEANDROS – Gestão Coletiva das Águas. Ela se encerra na elaboração de uma
versão inicial para testes, que permite simular a interação do usuário com o aplicativo por
meio da navegação entre as principais telas. Cabe ressaltar a importância, caso se avance para
a implementação do protótipo3, de realizar a sua construção de forma participativa e com o
teste de usabilidade, que se trata de uma avaliação com grupo amostral de usuários alvos do
aplicativo.
3 O direito autoral referente à minha participação na concepção do aplicativo MEANDROS – Gestão Coletiva das
Águas foi cedido à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Rio de Janeiro, na pessoa do pesquisador titular Carlos
José Saldanha Machado, no dia 06 de dezembro de 2017, através do documento intitulado “Cessão de Direitos
Patrimoniais”.
25
Como expõe Oliveira e Peres (2015), o termo usabilidade e os seus parâmetros têm
sido estabelecidos e atualizados pela International Organization for Standardization (ISO) e
pelo International Engineering Consortium (IEC), por meio de normas, a exemplo da ISO
9241 (1998), ISO 13.407 (1999) e ISO/IEC 25010 (2011) e ISO/IEC 25040 (2011). Este é
estratégico por envolver os usuários reais na simulação de realizações das tarefas do
aplicativo, permitindo avaliar o conteúdo, as funcionalidades, a qualidade das interações,
identificar problemas e as necessidades de melhorias antes de lançá-lo. Com estas avaliações,
é possível construir novas versões das interfaces que melhor atendam as expectativas e
necessidades dos futuros usuários.
26
2 DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO
A democracia, como regime de governo, assumiu uma posição central no campo
político mundial, especialmente durante o século XX, quando os países ocidentais começaram
a vivenciar um novo contexto econômico, político e social, influenciado pelas Revoluções
Industrial, na Inglaterra, e a Francesa, que exigia novas formas de governo e aparatos
burocráticos mais amplos para gerir a coisa pública (AVRITZER; SANTOS, 2002;
MACHADO; MIRANDA; PINHEIRO, 2004).
Nesse período, intensos debates foram travados em torno da questão democrática e o
significado de democracia. Na teoria democrática, a concepção hegemônica estabelecida
implicou em uma restrição da participação social na política, com a diminuição de espaços
efetivos de participação e deliberação pública. Chamada de democracia liberal ou de baixa
intensidade, esta privilegiou o procedimento eleitoral, ou seja, as regras do processo eleitoral
para a formação e legitimação dos governos representativos, estando alinhada ao “método
democrático” defendido por Joseph Schumpeter, como expõe Samuel P. Huntington (1994):
Seguindo a tradição schumpeteriana, no presente estudo um sistema político do
século XX é democrático na medida em que nele seus principais tomadores de
decisões coletivas sejam selecionados através de eleições periódicas, honestas e
imparciais em que os candidatos concorram livremente pelos votos e em que
virtualmente toda população adulta tenha direito de voto (p.17)
Embora consolidada a concepção liberal, a transição dos Estados para regimes
democráticos tem ocorrido em sucessivas “ondas de democratização”, como categorizou
Huntington (1994). Nesse processo, segundo o autor, também há ondas reversas, quando
“algumas transições ocorreram na direção não democrática” (p.23) como na Itália de
Mussolini, em 1922, na Alemanha de Hitler, em 1933, em Portugal de Salazar em 1926.
Aqui cabe destacar a chamada terceira onda de democratização, que segundo
Huntington, ocorreu entre 1974 e 1990 e alcançou o Brasil e os demais países da Europa,
América Latina, África e Ásia. Nesse período, o modelo de democracia liberal como modelo
único e universal foi contestado.
Ganharam relevância as concepções contra hegemônicas, dentre elas, a teoria da
democracia participativa e da deliberativa, que ampliam a discussão para além de um sistema
27
político de constituição de governo, evidenciando a dimensão social e participativa
(MACHADO; MIRANDA; PINHEIRO, 2004).
Na teoria da democracia participativa, a atuação do cidadão comum no processo
político é o elemento central. A ideia é de que cada vez mais os cidadãos participem da
formulação, execução e controle das políticas públicas e de decisões políticas que afetam as
suas vidas, por meio de diferentes espaços e canais de participação. A proposta é da inclusão
dos atores sociais, ressaltando o seu caráter pedagógico e contínuo, que traz benefícios para os
indivíduos e, ao mesmo tempo, para a coletividade.
Nesse sentido, destaca-se o posicionamento de Carole Pateman (1992) que amplia a
discussão às arenas que se encontram fora dos limites do Estado, defendendo que o controle
democrático deva ser estendido a todas as esferas da vida social e em espaços variados:
“...o argumento da teoria democrática participativa de que a participação em
estruturas de autoridade não-governamentais é necessária para alimentar e
desenvolver as qualidades psicológicas (o sentimento de eficiência política)
requeridas para a participação a nível nacional (p. 72).
De acordo com a autora, “a experiência da participação, de algum modo, torna o
indivíduo psicologicamente melhor equipado para participar ainda mais no futuro”
(PATEMAN, 1992, p. 65).
Esse exercício diário de participação das pessoas nas decisões que afetam suas vidas
teria um caráter pedagógico, de acordo com autora, capacitando os indivíduos para uma
interferência mais qualificada na grande política. Dentre as instituições-chave para o exercício
de práticas democráticas cotidianas, estariam os locais de trabalho ou as comunidades onde os
indivíduos vivem.
A qualificação da participação, bem como a sua ampliação, também perpassa pelo
acesso à informação, tão crucial para o efetivo exercício da cidadania, do controle social e da
formulação de políticas públicas, contribuindo para uma participação menos assimétrica dos
diferentes atores sociais.
[...] a transparência torna-se um aspecto central de um processo democrático, porque
coloca o tema da responsabilidade das instituições para que se reduzam as
assimetrias de informação aos cidadãos. Isso coloca a necessidade, conforme Heald
(2006), de que as instituições políticas informem e prestem conta aos cidadãos, e
assumam a transparência como um valor instrumental para o exercício
da accountability (EMPINOTTI et al, 2016, p. 63).
28
Nesse contexto, as novas tecnologias de informação e comunicação (TIC), mais
destacadamente a Internet, têm revelado novas possiblidades de interação Estado-Sociedade,
além de abrir espaço para vozes dissonantes, com grande impacto no campo político, como
pode ser observado na exposição de Cardon (2012):
Ocorre que, na era digital, a democracia mudou de aparência. A Internet não permite
somente comunicar mais, melhor e mais rápido; ela alarga formidavelmente o
espaço público e transforma a própria natureza da democracia. Essa revolução que
vem acontecendo diante de nossos olhos é uma dádiva na medida em que aprofunda
e torna complexo o regime democrático. Entretanto, não se deve acolhê-la com uma
satisfação beata. Antes de celebrá-la é preciso pensá-la, questionando ao mesmo
tempo seus limites (p. 1).
Apesar de alertar sobre as limitações da Internet, como a exclusão digital, Cardon
(2012) ressalta as inúmeras possibilidades de compartilhamento de informações e saberes,
inclusão de novos sujeitos coletivos, de novas demandas e de crítica social, por meio desta
tecnologia, que será discutida mais adiante.
2.1 Democracia Participativa no Brasil
Como reflexo da “Terceira onda de democratização”, citada acima, na década de 1980,
o Brasil, bem como outros países do Hemisfério Sul, ampliou o debate sobre a democracia e a
participação popular. No país, o processo de redemocratização culminou com a promulgação
da Constituição Federal de 1988.
Nesse período, houve uma luta da sociedade civil por liberdades democráticas,
descentralização de poder e por relações mais diretas com o Estado. Destacam-se as
contribuições decisivas dos movimentos sociais e das organizações sindicais, que buscaram a
ampliação da participação social, com a inserção de novos atores, novas temáticas e novas
demandas no interior da política, além de uma nova relação entre Estado e sociedade.
Como parte do resultado do processo de redemocratização, têm-se a criação de formas
ampliadas de participação política, algumas institucionalizadas pela nova Constituição
Federal de 1988, abrindo espaço para a prática da democracia participativa combinada com o
mandato representativo, este tradicionalmente marcado pelo clientelismo e personalismo.
29
Muitos dos novos espaços de negociação e de inter-relação entre Estado-Sociedade
foram criados e/ou institucionalizados, no âmbito do poder executivo, de forma híbrida, ou
seja, com representação do Estado e sociedade. Como exemplo, o orçamento participativo –
por meio do qual os cidadãos deliberam sobre as prioridades orçamentárias do ente federativo,
os conselhos de políticas públicas – deliberativos e/ou consultivos, os conselhos tutelares, os
fóruns e as conferências (AVRITZER; SANTOS, 2002).
Cabe desatacar, aqui, o conselho de política pública, que é a forma institucionalizada
de participação adotada pela política das águas. Ele tem caráter deliberativo e/ou consultivo,
com a participação da sociedade civil, de forma paritária com a representação governamental,
com atribuições de formular e controlar a execução de políticas públicas em diferentes áreas.
Também existem no Brasil outros instrumentos de participação previstos na
Constituição Federal, em seu Art. 14, como o plebiscito, o referendo e o projeto de lei de
iniciativa popular.
Vale lembrar que este arcabouço legal introduzido pela Constituição Federal de 1988,
que trouxe inovações jurídicas na área da democracia participativa, completa 30 anos em
2018.
De acordo com as avaliações dos autores Avrtizer e Marona (2017), até 2013 a
democracia brasileira apresentava indicadores positivos em relação à sua qualidade na
dimensão procedimental, material e na inclusão social. “Com respeito à dimensão
procedimental, um indicador importante é o fato de que todas as eleições, desde a
redemocratização, transcorreram sem fortes questionamentos por parte das forças
derrotadas, com exceção da eleição de 2014” (p. 359). Os pesquisadores complementam que
as decisões do judiciário em relação às eleições sempre foram respeitadas pelas diferentes
forças políticas. No campo material, destacam o bom desempenho da economia. Sobre a
inclusão social, citaram a capacidade da democracia brasileira de ampliar o acesso à
educação, as políticas de aumento no salário mínimo e os programas de transferência de
renda. Também reforçaram a explosão de participação social no Brasil, sobretudo a partir de
1990, em espaços institucionalizados.
Contudo, o cenário que foi se estabelecendo a partir das Jornadas da Juventude, em
2013, até o fim do Governo Dilma, em 31 de agosto de 2016, por meio de impeachment
aprovado pelo Senado Federal, e mais recentemente com os últimos acontecimentos do
30
Governo Temer, demonstra a fragilidade e a crise das instituições democráticas brasileiras.
Para alguns autores, o Brasil vivencia um golpe parlamentar ou golpe civil:
O governo Dilma, antes mesmo do golpe forjado por uma farsa parlamentar-judicial
que usurpou seu mandato, já agonizava desde 2015, inclusive por incompetências e
erros. Foi sangrado até o último suspiro por seus algozes entrincheirados no
Congresso Nacional e em amplos setores do Judiciário (com a aquiescência do douto
STF) que contaram com as armas de uma Polícia Federal completamente
partidarizada e, sobretudo, com as poderosas armas ideológicas da grande mídia
burguesa. Criou-se uma situação, deliberada e irresponsavelmente, que afundou não
apenas Dilma e seu governo, mas o próprio país foi levado a uma crise monumental
que, para além de seus determinantes econômicos principais, foi piorada
conscientemente pelas classes dominantes para que atingissem a qualquer custo seus
objetivos políticos (BRAZ, 2017, p. 88).
Essa visão é reforçada por Domingues (2017), que afirma que o país vive uma crise da
república e retrocessos, embora não considere que haja uma ruptura institucional ou “estado
de exceção”, como reverberam alguns segmentos da população. O impeachment sofrido pela
presidenta eleita Dilma Rousseff, segundo o autor, tinha dentre seus objetivos frear a operação
Lava-Jato – que investiga um vasto esquema de corrupção na Petrobras – e implementar uma
pauta neoliberal, que interessa ao empresariado nacional e o capital internacional. Hoje, no
Brasil, as ações incorrem para a “retomada de um neoliberalismo econômico mais impiedoso
e um social liberalismo mais restrito” (p. 1749). O autor também pondera que a presidenta
Dilma era inábil politicamente e cometeu muitos erros na sua gestão, inclusive, no diálogo
público, incluindo as organizações que lhe deram sustentação. Somando, assim, o conflito
com o capital financeiro com a falta de sustentação social.
Domingues (2017) contextualiza que a crise do sistema político brasileiro ocorre em
um momento de desgaste geral da esquerda na América Latina. E alerta que “é bem
conhecida a situação em que, ao haver grande fragilidade do sistema político, corporações
como os militares vêm para o centro da cena e empalmam o poder” (p. 1753). No caso atual
brasileiro, vê-se o grande protagonismo assumido pelo judiciário, embora não visem tomar o
poder e governar, como analisa o autor. Para ele, é necessário um grande rearranjo no sistema
político.
Reconstruir as pontes entre o sistema político societário e o sistema político estatal
não será tarefa fácil, se é que há vontade política para isso. O risco é óbvio: que sob
formas democráticas vejamos fortalecer-se um regime liberal-oligárquico avançado,
que, em aliança com a grande mídia oligopolizada e o capital financeiro, restrinja ao
máximo o papel da participação popular (DOMINGUES, 2017, p. 1754).
Por outro lado, o autor constata uma energia social que busca vias de resistências a
este novo contexto político.
31
São evidentes as limitações de nossa democracia – de resto um problema global,
ainda que com taras próprias entre nós. Aprofundá-la pela participação popular, de
todas as formas e maneiras, bem como através da ampliação da esfera pública e do
debate, é nossa tarefa mais urgente (DOMINGUES, 2017, p. 1756).
O futuro da democracia no Brasil, portanto, ainda é incerto, mas como enfatiza
Domingues (2017) é preciso aprofundá-la por meio da ampliação e qualificação da
participação social.
2.2 Democracia e conselhos de políticas públicas
A Constituição Federal de 1988 institucionalizou formas ampliadas de participação
social, como posto acima, dentre elas, os conselhos de políticas públicas, modelo adotado na
política de recursos hídricos e, portanto, destacado aqui de maneira ampla, ao falar de
democracia no Brasil.
Os conselhos de políticas públicas são de caráter deliberativo e/ou consultivo, com a
participação da sociedade civil, de forma paritária com a representação governamental.
Destacam-se, nesta análise, os conselhos constituídos em âmbitos nacional, estadual ou
municipal, vinculados aos órgãos do poder executivo, com atribuições de formular e controlar
a execução de políticas públicas em diferentes áreas, a exemplo dos conselhos de políticas
ambientais e de recursos hídricos.
Os conselhos aqui analisados são espaços institucionais de discussão e deliberação, e
integram o que os autores Avritzer e Pereira (2005) chamam de instituições híbridas, ou seja,
aquelas com representação do Estado e da sociedade civil, embora não seja nem Estado nem
movimento social. Eles emergiram com o objetivo de ampliar a participação, integrando
novos atores e demandas, fortalecendo, assim, o controle social.
Cabe ressaltar que os conselhos diferem bastante em relação às regras de
funcionamento que são estabelecidas em seus regimentos internos. A atividade dos
conselheiros, considerada de ”relevância pública”, não é remunerada, como aponta a autora
Luciana Tatagiba (2002). Estes são eleitos para um mandato e ocupam um número de vagas
32
pré-determinado. As reuniões dos conselhos são abertas ao público em geral, ampliando a
possibilidade de participação não formal, embora estes não tenham direito a voto. É
importante ressaltar que são organismos deliberativos, mas não executivos.
Dentre os seus princípios inovadores, tem-se a composição plural – com
representantes de diferentes segmentos sociais, que muitas vezes têm visões antagônicas.
Aqui, é importante considerar que a dicotomia se expressa não apenas entre os diferentes
segmentos, mas também internamente em cada um desses segmentos, que são heterogêneos,
especialmente quando se analisa a sociedade civil. Outra inovação é o processo dialógico
como instrumento de negociação de conflitos, privilegiando o consenso, sendo que o voto é
utilizado como último recurso; e o caráter deliberativo, que dá força legal para estes órgãos
colegiados influenciarem no processo de produção das políticas públicas (TATAGIBA,
2002).
Com este arranjo, buscou-se reverter o padrão de planejamento e execução das
políticas públicas no Brasil, antes centralizado, tornando-o mais transparente, inclusivo e
aberto ao controle da sociedade, uma vez que os atores sociais estão mais próximos do
aparato estatal (TATAGIBA, 2002). Outra perspectiva é de que, ao abrir espaço para o
exercício da participação, este se torne pedagógico na promoção da cidadania e da
convivência democrática.
A pesquisadora Evelina Dagnino (2002) constata, entretanto, uma profunda resistência
e hostilidade por parte dos ocupantes do aparato do Estado em relação a formatos mais
igualitários de participação e a resistência de partilharem o seu poder. Para ela, essas arenas
de participação, “muito frequentemente, representam então cunhas democratizantes inseridas
em contextos predominantemente conservadores, sustentados por uma estrutura estatal que
retêm os traços autoritários que presidiram historicamente a sua constituição” (DAGNINO,
2002, p. 294).
A autora também aborda a baixa efetividade dessas instâncias, dada à fragmentação e
à setorialização das políticas públicas e seu o isolamento do aparato estatal. “Eles acabam se
constituindo como “ilhas” separadas, em “institucionalidades paralelas”, conservadas à
margem e com difícil comunicação com o resto do aparato estatal” (DAGNINO, 2002, p.
283).
33
A autora complementa: “Assim, o poder deliberativo para os Conselhos Gestores com
frequência se transforma na prática em uma função consultiva ou até mesmo apenas
legitimadora das decisões tomadas nos gabinetes” (DAGNINO, 2002, p. 282).
Em contrapartida, ela conclui que o exercício da participação em conselhos, com a
convivência por vezes conflituosas de diferentes atores, permite o difícil aprendizado de
reconhecer o outro como portador de direitos e exercer a capacidade propositiva dos cidadãos.
Outro autor, Gomes (2015), reconhece a ampliação e a expansão quantitativa dos
conselhos de políticas públicas no Brasil, mas argumenta que cabe refletir sobre a sua
capacidade deliberativa, sua efetividade como espaços de participação ampliada e seus
impactos reais na formulação e execução das políticas públicas.
Esse aspecto qualitativo é, realmente, mais desalentador, como revelam relatos de
experiências práticas: deficiências quanto à representatividade dos conselheiros,
quanto à capacidade de deliberar, impor suas decisões e controlar as ações do
governo são frequentemente apontadas na literatura (p. 895).
Em relação à representação, o autor destaca que a eleição de conselheiros não ocorre
por meio do sufrágio universal, o que coloca em discussão a quão democrática ela é. Já a
representatividade, que está relacionada ao vínculo estabelecido entre os conselheiros
governamentais e não governamentais com seus pares, também se apresenta ainda como um
desafio para os conselheiros revelando fragilidade de vínculos.
Nesse sentido, infere-se, a partir dos estudos apresentados, que a existência dos
conselhos já indica uma importante vitória na luta pela democratização dos processos de
decisão, mas os desafios ainda são imensos e complexos.
Conselhos Gestores de Recursos Hídricos
A Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei Federal 9433, de 08 de
janeiro de 1997, ao criar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(SINGREH), estabeleceu espaços formais de participação social no formato de conselhos
gestores, sendo: Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH); Conselhos de Recursos
Hídricos dos Estados e do Distrito Federal (CERHs); e Comitês de Bacias Hidrográficas.
Regulamentado inicialmente pelo Decreto 2.612, de 03 de junho de 1998 (revogado
pelo Decreto 4613/2003), o CNRH é um órgão colegiado consultivo, normativo e
deliberativo, que integra a estrutura regimental do Ministério do Meio Ambiente e ocupa a
hierarquia mais alta do SINGREH. É composto por 57 conselheiros com mandato de três
34
anos, sendo 29 representantes do governo federal, 10 representantes dos sistemas estaduais de
recursos hídricos, 6 representantes da sociedade civil e 12 representantes dos usuários de
água.
Similar ao CNRH, os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito
Federal têm a função de formular a política de recursos hídricos e deliberar sobre temas a ela
relacionados, na sua área de jurisdição. No total, são 26 CERHs em atuação no país
(AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017). O Estado do Acre não possui o conselho, mas
sim uma câmara técnica, no âmbito do Conselho de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia
(Cemact).
No âmbito da bacia, estão os comitês de bacias hidrográficas. Em 2016, somavam 223
colegiados em bacias de domínio estadual e 09 em bacias interestaduais.
A avaliação destes órgãos será feita no próximo capítulo, no contexto da
implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, que completou, em 2017, 20 anos.
2.3 Democracia e direito à cidade
Como a presente pesquisa tem o enfoque na bacia hidrográfica urbana, as relações
entre o meio ambiente urbano e o cotidiano das pessoas que vivem nas cidades também
ganham relevância.
No Brasil, a construção das cidades sempre ocorreu de forma predatória e
nacionalmente centralizada, desde o período colonial, sem dar autonomia para as localidades
nem contemplar a participação social. “Ressalta-se que este modelo centralizador das
decisões públicas e da arrecadação de tributos feito pela Corte, e posteriormente pelos
governantes, sufocou e ainda sufoca o desenvolvimento local, que, sem recursos financeiros,
são minados em suas expectativas de desenvolvimento” (OLIVEIRA et al, 2016, p. 10).
Sobre o desenvolvimento urbano exploratório, cabe destacar os graves problemas
ambientais gerados, afetando globalmente todos os estratos sociais, sobretudo as camadas
mais pobres da população. Oliveira et al (2016) mostram que 40% a 70% da população dos
35
grandes centros urbanos, inclusive no Brasil, moram em áreas ilegais, considerando a
legislação urbanística, muitas delas em áreas ambientalmente protegidas. “São pessoas que se
aglomeram em lugares insalubres, sem infraestrutura essencial para uma sadia qualidade de
vida, acabando por gerar outros problemas em cadeia” (p. 15).
O envolvimento da população na busca por soluções urbanísticas e melhoria na
qualidade de vida só começou a ocorrer nas cidades brasileiras na década de 1970, ainda de
maneira tímida, e representava uma luta das organizações populares. As mudanças mais
significativas na gestão das cidades vieram com a redemocratização do País, embora o caráter
tecnicista ainda prevalecesse como ponderam Oliveira et al (2016).
Em 2001, foi aprovado o Estatuto da Cidade (Lei 10.257), que estabelece diretrizes
gerais da política urbana, como a garantia do direito a cidades sustentáveis, incluindo o
saneamento ambiental e a gestão democrática por meio da participação da população.
Cabe ressaltar que hoje no Brasil os desafios no direito urbanístico ainda são imensos.
Mais de 85% da população brasileira vive nas cidades (OLIVEIRA et al, 2016), que têm se
desenvolvido sem o devido planejamento e sem infraestrutura para abrigar o grande
contingente populacional. As necessidades da população e a pressão sobre o meio ambiente
têm se ampliado. De acordo com Oliveira et al (2016), mesmo com a edição de normativas de
participação social nas políticas urbanas, a inclusão da população na tomada de decisões
permanece como um desafio.
2.4 Democracia e governança eletrônica
A presente dissertação também se propõe a estudar a mediação digital como suporte
para a interação Estado-Sociedade. Nesse sentido, é importante discorrer, de forma breve,
sobre os aspectos da governança eletrônica e a sua relação com a ampliação da prática
democrática.
Antes, é preciso compreender o conceito de governança. Oriundo do campo da
economia e da administração de empresas, o termo pode ter diversas interpretações, não tendo
36
uma definição única, uma vez que evoluiu no tempo e se adaptou às especificidades de cada
sociedade que o adotou. De forma ampla, está relacionado ao estilo de administração das
organizações e sua relação com o mundo exterior, buscando ampliar a qualidade do processo
decisório e legitimá-lo junto à sociedade.
De forma exemplificativa, têm-se abaixo a definição de governança feita por duas
instituições, citadas por Antônio de Oliveira e Beatriz Pisa (2015), expressa em dois
momentos diferentes – 1992, em Londres, e 2009, no Brasil:
a) Cadbury Committee em 1992- “O conjunto de todos os sistemas de
controle, tanto financeiros como outros, pelos quais uma firma é dirigida e
controlada” (p. 1267); e
b) Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em 2009 -
Governança corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas,
monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre
proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle. As
boas práticas de governança corporativa convertem princípios em
recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar
e otimizar o valor da organização, facilitando seu acesso a recursos e
contribuindo para sua longevidade (p. 1267).
No âmbito das políticas públicas, o termo ganha outros contornos, devido as suas
especificidades, e reflete os esforços dos estados de ampliar a sua capacidade administrativa
para atender as demandas sociais, o que exigem um papel de articulador, incorporando
diferentes segmentos sociais nas discussões e definições de políticas públicas, buscando assim
legitimidade para a execução de programas governamentais.
Nesse sentido, o conceito de governança se alinha à necessidade de o Estado atuar
para além da esfera estatal, buscando uma articulação interna e externa para solução de
problemas cada vez mais complexos. No Brasil, acrescenta-se, ainda, as novas exigências
legais no campo da transparência e prestação de contas aos cidadãos, estabelecidas a partir da
Constituição Federal de 1988.
A partir dessa nova relação estabelecida, evolui-se então para a noção de
governança, que se refere à capacidade do Estado de implementar as políticas
necessárias para o alcance dos objetivos comuns e pressupõe o aperfeiçoamento dos
meios de interlocução com a sociedade, ao passo que sejam promovidas ações que
garantam a maior atuação do cidadão e responsabilização dos agentes públicos
(OLIVEIRA; PISA, 2015, p. 1264).
37
Com o advento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), incorporadas na
administração pública, surge, então, uma nova possibilidade de governar e de se relacionar
com os cidadãos por meios digitais, cunhada no termo e-governança ou governança
eletrônica.
De acordo com Maria Alexandra da Cunha e Paulo Miranda (2013), o termo
governança eletrônica inclui três aspectos que estão inter-relacionados, quais sejam: e-
administração pública, e-serviços públicos e e-democracia. Esta divisão é apenas didática,
com delimitações difíceis de serem feitas, mas que permite visualizar o impacto das TICs em
diferentes pontos da administração pública.
Na e-administração pública, a aplicação das TICs traz benefícios para os processos
internos da gestão a exemplo do planejamento governamental, processos de compras, viagens,
recursos humanos, controle de receitas e de despesas, dentre outros.
No e-serviços públicos, possibilita melhorias na prestação de serviços aos cidadãos,
bem como agilidade no atendimento.
A prestação de serviços eletrônicos através da Internet é usualmente entendida, em
muitos textos, como "e-gov". Mas, neste trabalho, cremos que o termo "e-serviços
públicos" melhor a caracteriza, é menos amplo e mais preciso e nele podem ser
incluídos: a prestação de serviços através de portais governamentais; o uso de
Internet, mas também de outros meios eletrônicos tais como o telefone celular, o
telefone fixo, o fax e, no futuro, a televisão digital; a integração na prestação de
serviços; centrais de atendimento (local físico, chamado também de agência de
atendimento ao cidadão ou lojas de atendimento); e Call Center (centrais de
atendimento telefônico) (CUNHA; MIRANDA, 2013, p. 549).
No e-democracia, as novas tecnologias possibilitam a promoção de uma maior e mais
ativa participação do cidadão na elaboração, acompanhamento e controle das políticas
públicas, suas práticas e resultados, incluindo novos atores e grupos ativistas nos debates
públicos, uma vez que reduz custos da participação ao eliminar a barreira do tempo e espaço.
Também permite maior acesso à informação para os cidadãos, o que contribui para diminuir
as assimetrias de conhecimento e poder, inclusive nas hierarquias dos próprios movimentos
sociais.
“Para nós, as iniciativas de governança eletrônica são essenciais pelo seu potencial
de catalisadoras e habilitadoras de governança democrática e de promoção de
práticas democráticas, bem como pelo seu potencial de facilitadoras do
relacionamento mais eficiente entre governo e cidadão” (CUNHA; MIRANDA,
2013, p. 546).
Os autores alertam para a exclusão digital, o que pode, inclusive, gerar um efeito
contrário ao pretendido, contribuindo para aprofundar as assimetrias entre diferentes atores
38
sociais. Mas ponderam que, apesar das divergências, é inegável as possibilidades de uso das
TICs para otimizar o processo democrático.
Para além destas duas visões antagônicas, foram identificados autores em uma
terceira posição na literatura de e-democracia: a visão utilitária (AINSWORTH;
HARDY; HARLEY, 2005), ou pragmática. Esta é uma visão otimista, contudo não
utópica, que reconhece na Internet algum potencial para uma forma de democracia
mais participativa, permitindo que os cidadãos participem no processo democrático
(CUNHA; MIRANDA, 2013, p. 551).
Assim, a relação do Estado-Sociedade mediada pelas novas tecnologias ganha
relevância nos estudos acerca de governança pública.
39
3 GOVERNANÇA DE RECURSOS HÍDRICOS
A Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei 9433/97, é resultado de
uma longa caminhada, marcada por fatos históricos, políticos, econômicos e socioambientais
nacionais e internacionais, que ocorreram, especialmente após a Segunda Guerra Mundial,
quando o mundo assistiu a um grande crescimento populacional e econômico, pautado pela
industrialização e pelo desenvolvimento tecnológico acelerados, com fortes impactos no meio
ambiente e, em particular nos recursos hídricos, hoje ameaçados em termos de quantidade e
qualidade em várias partes do globo.
Diante dessa realidade, agentes políticos, especialistas e diversos atores sociais de
diferentes países intensificaram os debates em torno da temática do meio ambiente e recursos
hídricos e buscaram redesenhar suas políticas para área ambiental. Os principais
acontecimentos internacionais, até 1997, que direta ou indiretamente influenciaram a
construção da política de recursos hídricos no Brasil estão listados no Quadro 1. Cabe
ressaltar que outros eventos e documentos internacionais foram produzidos nesse período.
Aqui foram destacados alguns deles, sem intenção de esgotar todos os debates e produtos
acerca do tema.
Quadro 1 - Principais acontecimentos na área ambiental e recursos hídricos de 1960 até 1997
ANO ATIVIDADE
1968 Conferência sobre Biosfera - Paris.
1971 Simpósio sobre problemas relativos ao meio ambiente - Tchecoslováquia.
1972 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano -
Estocolmo, Suécia.
1977 Conferência das Nações Unidas para a Água - Mar del Plata, Argentina
1981-1990 Década Internacional de Abastecimento de Água Potável e Saneamento –
ONU
1987 Protocolo de Montreal sobre as substâncias que esgotam a camada de
ozônio
1992
Conferência Internacional sobre Água e Meio Ambiente - Dublin, na
Irlanda. Gerou o Relatório ‘A Água e Desenvolvimento Sustentável’,
conhecido como ‘Declaração de Dublin’.
Instituído o Dia Mundial da Água – ONU.
Publicada a ‘Declaração Universal de Direito à Água’
Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento
(CNUMAD) - Rio de Janeiro. Foram publicadas a Carta da Terra e a
Agenda 21.
Fonte: Elaborado pela autora com informações extraídas de AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2002, e
AITH; ROTHBARTH, 2015.
40
Dentre as abordagens discutidas internacionalmente, ressaltam-se as recomendações
do Plano de Ação do documento elaborado em Mar del Plata, Argentina, em 1977:
Cada país deve formular e analisar uma declaração geral de políticas em relação ao
uso, à ordenação e à conservação da água como marco de planejamento e execução
de medidas concretas para a eficiente aplicação dos diversos planos setoriais. Os
planos e políticas de desenvolvimento nacional devem especificar os objetivos
principais da política sobre o uso da água, a qual deve ser traduzida em diretrizes e
estratégias, subdivididas, dentro do possível, em programas para o uso ordenado e
integrado do recurso (CEPAL, 1998 apud AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS,
2002, p. 12).
Outro documento que norteia a gestão das águas em todo o mundo é a ‘Declaração de
Dublin’, resultado do evento realizado em Dublin, Irlanda, em 1992, considerado um marco
da modernização dos sistemas hídricos de gestão:
O resultado dessa conferência foi a chamada Declaração de Dublin, documento que
estabeleceu quatro princípios básicos que reconhecem: I) que a água doce é um bem
finito e essencial para a continuidade da espécie humana; II) a necessidade de uma
abordagem participativa para gerenciamento da água, envolvendo a participação
cidadã e dos Estados em todos os seus níveis legislativos; III) o papel preponderante
da mulher na provisão, gerenciamento e proteção da água; IV) o reconhecimento da
água como bem econômico (AITH, ROTHBARTH, 2015, p. 164).
No mesmo ano, foi elaborada a Agenda 21, no âmbito da CNUMAD, denominada Eco
92, realizada no Rio de Janeiro, que conclamou todos os cidadãos a participarem de um
desenvolvimento sustentável, em suas localidades e dentro de suas possibilidades. O capítulo
18 deste documento é dedicado à gestão das águas e muito dos aspectos que constam nele
foram incorporados na Política Nacional de Recursos Hídricos no Brasil, como os usos
múltiplos e as prioridades de uso, o valor econômico, a gestão integrada e por bacia. “0
manejo integrado dos recursos hídricos, inclusive a integração de aspectos relacionados à
terra e à água, deve ser feito ao nível de bacia ou sub-bacia de captação” (ONU, 1992, p.
269).
É importante situar que, no bojo deste debate internacional sobre novos arranjos
institucionais para a gestão sustentável das águas, foram envolvidos técnicos do governo
brasileiro, usuários de água para fins econômicos e atores da sociedade civil, que
reverberaram as discussões no âmbito interno. Nesse momento, o país também passava por
um processo de redemocratização e luta por ampliação da participação social na gestão
pública, como já abordado no capítulo anterior. A construção da atual política nacional de
recursos hídricos será detalhada no próximo tópico.
41
3.1 Construção da política nacional de recursos hídricos
A atual política de recursos hídricos do Brasil começou a ser debatida trinta anos antes
de sua promulgação, sobretudo a partir da década de 1980, quando a gestão das águas ainda
era realizada de forma centralizada nas entidades públicas, com pouca participação social, e
de maneira fragmentada, sendo que os diferentes setores de políticas públicas – energia,
saneamento, irrigação, meio ambiente, infraestrutura – tinham suas próprias regras e
programas, muitas vezes concorrentes (ABERS;KECK, 2017).
A base legal era o Código das Águas - Decreto Federal nº 24.643/1934, instituído em
um país predominantemente rural, com água em abundância, mas em crescente
desenvolvimento econômico, que avançou em uma rápida industrialização. Na época,
privilegiou-se a geração de energia elétrica, em detrimento de outros usos.
A normativa, ainda em vigor, teve um papel importante na gestão dos recursos
hídricos naquele momento e, ainda, por iniciar a institucionalização dos instrumentos de
gestão e regulação dos usos múltiplos da água, embora nunca fora plenamente implementada.
O Relatório GeoBrasil (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2007) destaca a
importância desse marco jurídico e arranjo institucional para a gestão das águas no País:
De qualquer modo, esse modelo centralizador e de escassa participação social,
plantou as bases da organização do Estado para a gestão de recursos hídricos,
propiciou o desenvolvimento de uma massa crítica de profissionais de alta
qualidade, consolidou estruturas de capacitação e desenvolvimento tecnológico e
gerou um acervo de conhecimento e informações fundamentais para o planejamento
do setor (p. 11).
A necessidade de mudanças em relação a este modelo praticado por cerca de 50 anos
se fortaleceu porque ele já não conseguia dar respostas para os problemas que surgiam ou se
tornavam mais amplos e complexos, como os conflitos por escassez, a poluição e os eventos
críticos.
Nesse contexto, cabe ressaltar o papel dos funcionários públicos de carreira brasileiros
– estaduais e federais - que buscaram criar novas estratégias para gestão das águas, lutando
por mudanças institucionais e da política de recursos hídricos que harmonizassem todos os
usos, inclusive, a manutenção do ecossistema. De acordo com Rebecca Abers e Margaret
Keck (2017), somaram-se aos tecnocratas, diversos outros atores, inspirados por diferentes
42
motivos, mas que em comum defendiam um novo desenho institucional para a gestão das
águas no Brasil.
Era uma tentativa de construir um novo campo de ação, realinhando e recombinando
instituições existentes e criando outras, algo que exigia conhecimento técnico e
habilidade política. Embora não fosse nada fácil e grande parte dos esforços tenha
encontrado obstáculos intransponíveis, um número surpreendente de indivíduos e de
organizações públicas ou privadas às quais pertenciam persistiu por muito mais
tempo do que jamais teríamos previsto. (ABERS; KECK, 2017, p. 30)
Cabe ressaltar que as primeiras experimentações na gestão por bacia foram iniciadas
há mais tempo, a exemplo da Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), atual Companhia
de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf), criada em 1948, pelo Governo
Brasileiro. O modelo foi baseado na experiência dos Estados Unidos que, em 1933, criaram a
Tennessee Valley Authority (TVA). No Brasil, teve o objetivo integrar a construção de
barragens com o desenvolvimento regional, envolvendo produção de energia, irrigação,
navegação e outras atividades (ABERS; KECK, 2017).
A partir da década de 1970, outros modelos foram experienciados, como Comitês de
Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas (CEEIBHs), de caráter consultivo, constituídos
pelos Ministérios de Minas e Energia e do Interior, após a experimentação em São Paulo, com
o Comitê Especial do Alto Tietê. Dentre as suas atribuições estavam: “classificação dos
cursos de água da União, o estudo integrado e o acompanhamento da utilização racional dos
recursos hídricos das bacias hidrográficas dos rios federais, o aproveitamento múltiplo dos
cursos de água e a mitigação de consequências nocivas à ecologia da região” (AGÊNCIA
NACIONAL DE ÁGUAS, 2007, p 36). Foram criados mais de dez comitês de rios federais,
mas com a participação exclusiva de técnicos do Estado, não contemplando nem municípios
nem sociedade e sem poder de decisão formal.
Também contribuíram para a concepção de um novo paradigma de gestão, que
conciliasse os diversos usos da água e integrasse os diferentes campos de política pública, os
debates internos. Dentre eles, o Seminário Internacional sobre Gestão de Recursos Hídricos,
realizado em Brasília em 1983 pelo Departamento Nacional de Água e Energia Elétrica
(DNAEE) e pela Secretaria Nacional do Meio Ambiente, e o VII Simpósio Brasileiro de
Recursos Hídricos promovido em Salvador em 1987 pela Associação Brasileira de Recursos
Hídricos (ABRH).
Em 1988, a Constituição Federal é promulgada e traz inovações na área de
participação social e água, determinando a instituição de um Sistema Nacional de
43
Gerenciamento de Recursos Hídricos, direcionando a formulação da nova política das águas
(BRASIL, 1988).
Somados aos debates nacionais, diversos estados, que já apresentavam problemas
hídricos e de gestão compartilhada em rios de domínio federal, começaram a pensar e a
estruturar suas normativas. São Paulo foi pioneiro, em 1991, que inovou também pela criação
do Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FEHIDRO). Outros estados que também
estruturaram suas respectivas políticas das águas, antes da legislação nacional, foram: Ceará
(1992), Santa Catarina e o Distrito Federal (1993), Minas Gerais e Rio Grande do Sul (1994),
Sergipe e Bahia (1995) - (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2002).
Nesse período, o país passava por um processo de redemocratização, que se iniciou
com o esgotamento do regime militar, sobretudo no final da década de 1970, e foi marcado
pelo surgimento de diversas associações, sindicatos e novos partidos. Abers e Keck (2017)
mostram que, com este novo cenário democrático, o Estado e os movimentos da sociedade
tiveram que aprender uma nova gramática de negociação, contemplando diferentes interesses,
o que refletiu na reforma institucional proposta para o país, que tinha aspectos
democratizantes, liberais e resquícios desenvolvimentista dos governos que findavam. “Com
as eleições democráticas ocorrendo normalmente, os anos de 1990 foram dominados por
tentativas de reforma do Estado, variando da privatização até várias versões de reforma
administrativa, além de movimentos de participação direta dos cidadãos, especialmente no
nível local” (p. 51).
E é nesse ambiente que se estrutura a proposta de Política Nacional de Recursos
Hídricos que foi encaminhada como Projeto de Lei ao Congresso Nacional em 1991, e
promulgada em 1997, por meio da Lei 9433/97, conhecida como Lei das Águas. Ela foi
resultado, portanto, de debates, reflexões e propostas de diversos grupos de trabalho, comitês
e oficinas, que reuniam pessoas com ideias rivalizantes, mas que buscavam um novo desenho
institucional para a gestão das águas brasileiras.
O novo modelo estabelecido pela nova legislação destacou, em seus fundamentos, a
água como bem público, de uso comum do povo, estando sob a dominialidade federal ou
estadual, sendo um recurso natural limitado, diferentemente da crença nacionalmente
estabelecida de sua abundância e infinitude. Estabeleceu a gestão descentralizada e
participativa, a bacia hidrográfica como unidade básica de gestão, os múltiplos usos, não
privilegiando uma atividade ou um grupo social. E criou os instrumentos de gestão, dentre
44
eles, a cobrança pelo uso da água, que busca uma viabilidade econômica da gestão dos
recursos hídricos. Todos estes termos foram discutidos e negociados pelos diferentes grupos
de interesses pela gestão das águas.
No âmbito institucional, foram criados ou reestruturados órgãos especializados,
conselhos participativos nos âmbitos estaduais e nacional e organismos de tomada de decisões
no nível de bacia. O quadro político-institucional se estabeleceu no denominado Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, formalmente composto por: Conselho
Nacional de Recursos Hídricos (CNRH); Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do
Distrito Federal; Comitês de Bacia Hidrográfica; os órgãos de governo cujas competências se
relacionem com a gestão de recursos hídricos e as Agências de Água, como mostra a Figura 1.
Figura 1 – Matriz institucional do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
Fonte: Elaborado pela autora, adaptado de ANA, 2012
É importante observar que, sob a influência do cenário internacional, a nova política
das águas brasileiras integrou aspectos da política das águas francesa e da gestão integrada de
recursos hídricos (GIRH). Este último modelo era mais popular internacionalmente e
fomentado pelo Banco Mundial e, de acordo com Abers e Keck (2017), ambos se encaixavam
45
perfeitamente nas tendências liberalizantes dos anos de 1990, tendo como bandeiras
“soluções de mercado, descentralização e governo colaborativo” (p. 86), embora nem todos
os seus defensores se concebessem como neoliberais. As autoras ponderam, entretanto, que
essas ideias foram adotadas no Brasil com outras conotações.
A GIRH é composta por quatro aspectos básicos: descentralização; incentivos de
mercado; planejamento por bacias hidrográficas; e participação. Esta era interpretada de
diferentes formas por seus defensores, desde a participação mais ampla quanto a participação
entre aqueles que faziam o uso econômico da água.
Como um pacote institucional, a GIRH propunha que se abandonassem os
regulamentos “comando e controle” e o desenvolvimento patrocinado pelo Estado e
se passasse a imitar o mercado criando mecanismos voluntários de governo
colaborativo e valorizando a participação como meio de facilitar as negociações
entre interesses, e não tanto como meio de inclusão política (ABERS; KECK, 2017,
p 86).
Em relação ao modelo francês, os pilares são: comitês de bacias, como tomadores de
decisões; agências de bacias, de caráter mais operacional; e cobrança pelo uso da água bruta.
Estes elementos foram incorporados no modelo brasileiro, com algumas variações, a exemplo
dos comitês que, além dos usuários de água (empresas de saneamento, irrigadores, indústria
etc), é composto de forma paritária por representantes da sociedade civil (universidades,
associações, ambientalistas etc), refletindo aspectos da democracia popular.
Os comitês franceses operavam prioritariamente, pelo menos até data muito recente,
como uma arena de negociação coletiva entre interesses orientados para o mercado
(principalmente empresas de saneamento). No Brasil, no entanto, há um espaço
reservado nos órgãos deliberativos para grupos dos quais se espera que falem em
nome do interesse público, incluindo a proteção do ambiente natural (ABERS;
KECK, 2017, p 89).
A Política Nacional de Recursos Hídricos também colocou a gestão das águas
firmemente nas mãos do Estado – União e estados, o que Abers e Keck (2017) consideram um
legado desenvolvimentista, das políticas anteriores: “Essa perpetuação da autoridade do
Estado sobre o componente central da gestão de água, ou seja, a decisão sobre quem terá
acesso à água, era um sinal de que o legado desenvolvimentista não havia morrido” (p. 89).
Neste campo, também estão os instrumentos de planejamento elaborados a partir de uma
visão tecnicista, com amplo diagnóstico, normalmente por consultores externos e apenas
submetidos aos conselheiros de comitês para ratificação.
Em termos de estrutura organizacional, pôde-se observar na composição do SINGREH
que foi criada uma série de instituições parcialmente sobrepostas, com órgãos gestores –
46
federal e estaduais, agência reguladora, conselhos participativos – federal, estaduais e por
bacia, e outros. Trata-se de uma plataforma institucional multi-ator bastante complexa, cuja
implementação é bastante desafiadora.
Nesse sentido, ao colocar o sistema para rodar, os legisladores e gestores puderam
perceber as insuficiências na legislação. “Com a legislação, muitos acreditavam que uma
nova concepção de gestão havia adquirido legitimidade e força legal para transformar
práticas concretas” (ABERS, 2010, p. 22). Mas eram só os primeiros passos de uma luta que
se estende até hoje, para que este modelo complexo seja efetivado com resultados práticos,
sobretudo na melhoria da qualidade ambiental.
Assim, nesse período pós criação da Lei das Águas, os atores políticos e sociais
envolvidos intensificaram os diálogos, os estudos e os acordos - internos e globais - no
sentido de superar as questões pendentes e buscar um desenvolvimento sustentável.
No âmbito global, destacam-se as Metas de Desenvolvimento do Milênio,
estabelecidas no âmbito da ONU, após o encontro de líderes de 189 países, em setembro de
2002, com o objetivo de discutir ações para promover a melhoria no padrão de vida da
população mundial. Foram definidas oito metas a serem atingidas até 2015, dentre elas,
garantir a qualidade de vida e respeito ao meio ambiente. Os esforços brasileiros, nessa área,
foram no sentido de reduzir as taxas de desmatamento, as emissões de gases de efeito estufa,
universalizar o acesso ao abastecimento de água no meio urbano e esgotamento sanitários,
dentre outras ações.
Findado os ODMs, os líderes mundiais pactuaram em 2015, no âmbito da ONU, uma
agenda com 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Agenda 2030,
que se refere ao ano de alcance das metas. A gestão eficiente das águas impacta indiretamente
a maior parte dos objetivos estabelecidos, embora o objetivo 6 – Água potável e saneamento
esteja mais diretamente relacionado à agenda hídrica.
Dando sequência às conferências sobre meio ambiente, a ONU realizou em 2002, na
África do Sul, a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável conhecida como
Rio+10, uma vez que ocorreu dez anos após a Eco 92, e teve como objetivo avaliar os
progressos na implementação da Agenda 21 (ONU, 1992) e outros acordos celebrados durante
o evento ocorrido no Rio de Janeiro na década anterior. A conferência retornou ao Brasil, em
2012, denominada Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, ou
47
Rio+20. Tiveram como enfoque os temas relacionados à economia verde, erradicação da
pobreza e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável.
Cabe ressaltar também que em 1996, foi criado o Conselho Mundial da Água, uma
organização internacional com sede permanente na cidade de Marselha, na França, que hoje
reúne cerca de 400 instituições relacionadas à temática de recursos hídricos
de aproximadamente 70 países. O Conselho é composto de representantes de governos, da
academia, sociedade civil, de empresas e organizações não governamentais. Uma de suas
atividades é a realização do Fórum Mundial da Água, que ocorre a cada três anos. Já foram
realizadas oito edições, em quatro continentes – Europa, América, África e Ásia, sendo que a
última foi realizada no Brasil, em março de 2018, trazendo para o centro das discussões os
desafios e as necessidades do compartilhamento da água.
Paralelamente, foi criado o Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama) que é
realizado na mesma cidade anfitriã do Fórum Mundial da Água, por movimentos sociais, no
sentido de se contrapor a este. Em Brasília, o Fama compartilhou a visão de que a água é um
direito, um bem comum e não uma mercadoria, e deve estar acessível a todos os seres vivos.
Todos estes debates e reflexões mundiais descritos acima ecoam no país. Dentre as
ações internas que se apresentam como propostas de aprimoramento da gestão, destaca-se o
trabalho da ANA, denominado Projeto Legado, de consolidar sugestões de mudanças da
Política Nacional de Recursos Hídricos e do quadro institucional, por meio da sistematização
de estudos, análises produzidas pela Agência e consultas dirigidas a diferentes atores sociais,
sobretudo do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH). Em
relação ao fortalecimento do gerenciamento de recursos hídricos, tem-se o Programa de
Consolidação do Pacto Nacional pela Gestão das Águas (Progestão), criado em 2013. Com
metas e benefícios financeiros, o programa recebeu a adesão de todas as UFs.
Cabe ressaltar, mais uma vez, que estes eventos e documentos foram destacados de
forma exemplificativa por suas relevâncias, mas não representam a totalidade de acordos e
debates que ocorreram acerca do tema nos últimos 20 anos.
48
3.2 Participação social e transparência
Como abordado no tópico anterior, a legislação de recursos hídricos institucionalizou
espaços de participação social, no sentido de promover o compartilhamento de poder e
decisões com os interessados diretos nesta política, nos níveis de governo federal, estadual e
no âmbito de bacia hidrográfica. Tratam-se dos conselhos de recursos hídricos e dos comitês
de bacias hidrográficas, compostos por representantes do setor público, sociedade civil e
usuários. Estes têm atribuições consultivas, deliberativas e normativas, e integram o Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH). Eles serão o enfoque da
análise neste tópico, mas cabe ressaltar que a participação citadina vai além dos meios
formais, ocupando outros fóruns e arenas públicas. O ordenamento constitucional garantiu,
por exemplo, outros mecanismos capazes de assegurar a cidadania e a defesa do meio
ambiente, tais como: ação direta de inconstitucionalidade; ação civil pública; ação popular
constitucional; mandado de segurança coletivo e mandado de injunção, dentre outras.
Sobre os espaços formais, no topo do SINGREH, está o CNRH, que tem na sua
composição a presença majoritária do Governo Federal, impactando a qualidade e o equilíbrio
da representação dos diversos interesses e demandas da sociedade. Na base do sistema, estão
os CBHs que atuam no âmbito de bacia, abrindo espaço para a interconexão entre os atores
que vivem naquele território, promovendo o compartilhamento de informações e
conhecimentos e a discussão sobre os usos e os problemas hidroambientais da região,
buscando compatibilizar os interesses plurais e muitas vezes antagônicos.
Ele se constitui como fórum de articulação, de negociação, de discussão de
problemas emergentes, com um papel normativo; oferece espaço para a expressão e
defesa dos interesses difusos, amplos e pulverizados da coletividade, a quem dá voz
e canal de expressão ao mesmo tempo em que defende os interesses privados,
concentrados e específicos, uma vez que todas as reuniões plenárias são abertas aos
interessados e ao público em geral (MACHADO, 2003, p. 127).
O grupo, portanto, tem o desafio de pensar a gestão de maneira integrada, buscar
soluções e tomar decisões considerando toda a complexidade de uma gestão partilhada e
negociada da coisa pública e a própria natureza multifacetária da água, que envolve interesses
políticos, econômicos, sociais e culturais em seus usos. Também têm a atribuição de
solucionar conflitos pelo uso da água em primeira instância administrativa, aprovar planos de
bacia hidrográfica e propor enquadramentos dos cursos de água e negociar preços para
49
cobrança pelo uso de água. Nesse sentido, os conselheiros têm a atribuição de tomar decisões,
que não são mais exclusivas dos representantes formalmente eleitos, exercendo o controle
social.
Machado (2003) defende que a decisão tomada no âmbito de um comitê reduz os
riscos de corrupção e de condutas abusivas, se comparado com uma decisão individual do
gestor. “O Comitê, portanto, previne e reduz riscos de que o aparato público seja apropriado
por interesses imediatistas, orientando as políticas públicas e formulando planos de
desenvolvimento integrado” (p. 127).
Nesse arranjo, a gestão das águas não é pautada apenas em conhecimentos técnicos e
científicos, mas, sobretudo por meio de uma negociação sociotécnica, buscando conciliar o
diagnóstico técnico-científico com os conhecimentos e os interesses da população local.
Machado (2004) complementa que este modelo de gestão é bastante dispendioso seja do
ponto de vista político, financeiro ou emocional, além de incerto:
Ela é, pois, um jogo, na medida em que os parceiros não são iguais. Uns possuem
mais recursos econômicos, conhecimentos e habilidades técnicas-científicas do que
outros. Os participantes realizam manobras; utilizam astúcias; reorganizam seus
meios para chegar a conduzir outros a tomar decisões mediante um conjunto de
movimentos. Esse tipo de recurso tem a vantagem de ajustar melhor as partes entre
si, de ser capaz de aprofundar laços; de produzir novas situações e oportunidades,
pelo processo de barganha entre argumentos de troca, de firmar, em suma, um pacto
(p. 25).
Diante do desafio e da complexidade do modelo de gestão proposto, Abers e Jorge
(2005) reforçam que apenas a instalação de um colegiado não significa que ele esteja atuando
com eficiência.
Em outro estudo, Abers (2010) relata que os comitês de bacia no Brasil enfrentam
diversas dificuldades para se consolidar como um espaço decisório capaz de intervir
efetivamente na execução da política das águas. “O problema principal se encontra no
contexto institucional, no qual não se desenvolveu uma estrutura organizacional capaz de
alimentar os colegiados de informações técnicas e outros recursos e de transformar suas
decisões em políticas públicas” (p.28).
Pedro Jacobi e Fabiana Barbi (2007) também afirmam que o processo ainda está em
consolidação:
50
Como a institucionalização plena ainda não ocorreu, o déficit institucional, somado
à não concreção da cobrança pelo uso da água, dificulta a viabilização do processo,
na medida em que tanto a cobrança como a outorga são vistas como instrumentos
fundamentais de controle e realização de políticas (p. 241).
Jacobi e Barbi (2007) corroboram com a visão de que a plataforma institucional da
governança das águas é complexa e os avanços têm sido bastante desigual, e defendem que a
consolidação perpassa pela superação das assimetrias de informação, ressaltando o caráter
sociotécnico dos colegiados.
Trata-se de experiências inovadoras que fortalecem a capacidade de crítica e de
envolvimento de todos os segmentos. Ressalte-se a participação dos setores de baixa
renda através de um processo pedagógico e informativo de base relacional, assim
como a capacidade de multiplicação e aproveitamento do potencial dos cidadãos no
processo decisório. As mudanças em curso representam uma possibilidade efetiva de
transformação da lógica de gestão da administração pública nos estados e
municípios, abrindo um espaço de interlocução muito mais complexo e ampliando o
grau de responsabilidade de segmentos que sempre tiveram participação assimétrica
na gestão da coisa pública (JACOBI; BARBI, 2007, p. 241).
Léo Heller (2017) mostra que não há consenso nas avaliações publicadas pela
comunidade acadêmica sobre o potencial democrático e o caráter inovador dos comitês,
inclusive, com posições céticas. Segundo o pesquisador, alguns autores evidenciam limitação
do sistema participativo da água quanto:
“à qualidade, legitimidade e accountability da representação; à oligarquização,
cooptação e tutela aos conselhos; à supressão dos conflitos, à preponderância das
decisões tomadas em instâncias fora dos comitês e da dificuldade de conciliar a
diversidade de concepções, intenções e projetos” (HELLER, 2017, p. 10).
As autoras Rebecca Abers e Margaret Keck (2017) também problematizam a
discussão, inclusive, pontuando que muitos desses comitês de bacias só tiveram seus decretos
assinados por governadores, sem que a administração pública criasse condições para que eles
se tornassem de fato um espaço de debates e tomadas de decisões.
Como exemplo de um caso bem-sucedido, as autoras apontam o CBH do Rio das
Velhas, que atua na sub-bacia do ribeirão Arrudas, que é o território base da construção do
protótipo de aplicativo desta pesquisa. De acordo com as autoras, o CBH Rio das Velhas foi
criado de modo apressado para que o governo estadual cumprisse um acordo estabelecido
com o Banco Mundial em 1993, no âmbito de um empréstimo para a construção de duas
estações de tratamento de esgoto na região. Firmado antes da atual política de recursos
hídricos, as exigências do financiamento eram a elaboração de um plano de recursos hídricos
para a bacia e a criação de uma agência de águas para executá-lo. Em 1997, o Banco Mundial
51
pressionou pela conclusão do projeto e, como a nova legislação exigia a figura do comitê, o
estado decretou a criação do colegiado. Segundo as pesquisadoras, por anos o CBH Rio das
Velhas não fez absolutamente nada.
O fortalecimento do CBH ocorreu, entretanto, a partir da consolidação de um projeto
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), criado em
1997, no ano anterior à criação do Comitê da Bacia. Chamado de Projeto Manuelzão, o
trabalho desenvolvido no âmbito do internato rural focou na bacia do rio das Velhas e criou
uma rede com grupos da sociedade civil, governos locais, funcionários do Estado e empresas
em torno do tema água, em toda a bacia, para solução de problemas práticos locais. O trabalho
contava com um programa de comunicação social, desenvolvido por meio de um projeto de
extensão do Departamento de Comunicação da UFMG, denominado Mobiliza (ABERS;
KECK, 2017).
Com reconhecimento público, boa reputação e uma rede de pessoas que se sentiam
corresponsáveis pela gestão das águas na bacia, o Projeto Manuelzão beneficiou o Comitê,
uma vez que os coordenadores do Projeto atuavam no colegiado. “Nesse caso, o comitê do
rio das Velhas floresceu quando foi colocado sob as asas do Projeto Manuelzão, tornando-se
em certa medida, parte daquela organização” (ABERS; KECK, 2017. P. 238). Nos anos
seguintes, segundo as autoras, o CBH se sobrepôs ao referido Projeto.
De acordo com Abers e Keck (2017), “a bacia do rio das Velhas foi um dos poucos
casos em nossa amostra em que importantes decisões de um comitê foram transformadas em
políticas públicas” (p. 232). Tratam-se das Metas 2010 e 2014, pactuadas no âmbito do
Comitê para despoluição do rio das Velhas e que se tornaram projetos de alta prioridade para
o Governo de Minas, com resultados considerados pelas pesquisadoras como substanciais.
Diante deste caso de sucesso que teve como suporte um programa de comunicação
estrategicamente planejado, e apostando na importância da participação social para o
aprimoramento das políticas públicas, destaca-se como um aspecto importante do
empoderamento da sociedade o acesso à informação, como já pincelado acima por alguns
autores. Nesse sentido, ressalta-se a importância de os órgãos públicos disponibilizarem
informações adequadas para estimular e permitir a participação em diferentes canais e arenas
públicas.
52
Vanessa Empinotti et al (2014) endossa a importância de um processo contínuo de
comunicação com vistas a promover o acesso a informações pelo Estado e por qualquer outro
ator envolvido nos processos de tomada de decisão que orientam o manejo da água. Assim, de
acordo com os autores, é possível viabilizar uma participação efetivamente democrática e
justa, diminuindo a “assimetria de conhecimento e consequentemente de poder no processo
de tomada de decisão” (p 1).
Como referenciado na Introdução desta dissertação, instituições internacionais
multilaterais como a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE)
e a Global Water Partnership (GWP) alertam sobre os impactos negativos da falta de acesso à
informação na qualidade do gerenciamento das águas (EMPINOTTI et al, 2014)
Tal discussão chegou ao contexto de governança da água por meio de relatórios de
organizações como o Banco Mundial e a Internacional Transparency que atestaram
que a falta de transparência impacta diretamente a gestão das águas, tornando-se um
fator preponderante nos esforços de melhoria e distribuição nas diferentes partes do
mundo (p 2).
Nesse contexto, a transparência se torna uma ferramenta estratégica de promoção da
participação social mais democrática, contribuindo para diminuir assimetrias de
conhecimentos e poder entre os atores envolvidos nos processos decisórios, o que impacta
positivamente na construção de uma gestão justa e equitativa, aberta ao controle social.
Hoje, o acesso à informação traduz-se como transparência, um indicador de
efetividade, integralidade e legitimidade das práticas de governança, e se
transformou em um veículo para promover a diminuição da assimetria de
conhecimento e consequentemente de poder no processo de tomada de decisão
(EMPINOTTI et al. 2015, p 65).
Em contrapartida, pesquisas realizadas no Brasil mostram que os níveis atuais de
transparência nos sistemas estaduais de gestão de recursos hídricos são relativamente baixos,
como já abordado brevemente na introdução. Destacam-se aqui os trabalhos realizados pelo
Grupo de Estudo e Acompanhamento da Governança Ambiental da Universidade de São
Paulo (USP), publicados em 2013 e 2015, que buscaram identificar os níveis atuais de
transparência no SINGREH. Foi analisada a disponibilidade de dados nos sítios eletrônicos
dos órgãos responsáveis pela política das águas nos 26 Estados e no Distrito Federal. Para a
coleta de informações, os pesquisadores ajustaram o Índice de Transparência no Manejo da
Água (Intrag), desenvolvido pela organização Transparency International ao contexto
brasileiro. O questionário foi composto de 65 questões, distribuídas em seis temas:
Informações sobre o sistema; relações com o público e as partes interessadas, transparência
nos processos de planejamento; transparência na gestão dos recursos e usos da água;
53
transparência econômico financeira e transparência em contratos e licitações (EMPINOTTI et
al, 2014; EMPINOTTI et al, 2015). O índice indica os níveis de transparência em uma escala
de 0 a 100. No último ano, apenas três estados tiveram médias acima de 50%, sendo Minas
Gerais (65), São Paulo (58) e Goiás (52).
Estudos realizados pela organização WWF-Brasil em parceria com a Fundação
Getúlio Vargas (LIMA, 2014) reforçam os dados acima ao apresentarem um termômetro da
governança do SINGREH, considerando cinco dimensões: ambiente institucional;
capacidades estatais; instrumentos de gestão; relações intergovernamentais; e interação
estado-sociedade. As avaliações foram feitas por atores estratégicos do sistema, em oficinas
realizadas no ano de 2013. A dimensão interação estado-sociedade, que envolvem a qualidade
da participação e os canais de participação, foi considerada pelos participantes como em
estágio básico. “Pesquisas junto a participantes nos órgãos colegiados identificam que um
dos grandes empecilhos à participação qualificada tem sido a qualidade da informação
disponibilizada para isso” (LIMA, 2014, p 37).
3.3 Avaliação comparativa de 10 e 20 anos da nova política das águas
Em 2017, a Política Nacional de Recursos Hídricos completou 20 anos que fora
instituída. Nesse ano, a ANA publicou o Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil 2017,
com um panorama atual da gestão e situação das águas brasileiras. Dez anos atrás, a mesma
Agência, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) publicaram o Geo Brasil Recursos Hídricos, um
documento com registros, análises, avaliações e perspectivas para a gestão e setor hídrico no
País.
Nesse interim, outros documentos e relatos foram produzidos, mas esses dois
relatórios serão a base para a apresentação, neste capítulo, dos avanços e dos desafios na
implementação da política das águas, considerando estes dois marcos temporais – 10 e 20
anos da nova legislação.
54
O Relatório Geo Brasil (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2007) mostrou um
panorama socioeconômico de dez anos após a Lei das Águas. O documento mostra um País
com uma economia dinâmica e diversificada, especialmente no setor de agronegócios, alta
taxa de urbanização concentrada, sobretudo no Sudeste, e forte demanda por energia,
provocando variadas pressões sobre os recursos naturais. O documento ressalta que o Brasil
estava passando por uma redução das desigualdades econômicas regionais o que poderia
deslocar as pressões ambientais para outras regiões hidrográficas. Também destacou a então
cobertura desigual dos serviços de saneamento, sendo que a população pobre era a menos
assistida e a que pagava mais caro.
Segundo o relatório do Desenvolvimento Humano do PNUD, no Brasil a parcela de
20% da população mais rica goza de um acesso à água e saneamento em níveis
comparáveis aos dos países ricos, enquanto 20% dos mais pobres registram taxas de
cobertura mais baixas do que no Vietnam. Se há uma correlação entre cobertura e
inclusão social, as perspectivas futuras são positivas, já que o País vem registrando
nos últimos anos uma redução na desigualdade, como resultado dos programas
sociais adotados pelo governo (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2007, p. 28).
Em relação à qualidade das águas, os quadros mais críticos estavam relacionados aos
esgotos domésticos e industriais, às atividades intensivas de criação animal e extensivas da
agricultura. Sobre o balanço hídrico, o documento não aprofunda, mas ressalta os grandes
contrastes entre as regiões brasileiras. Inclusive, questiona a divisão hidrográfica adotada para
o enfrentamento dos problemas da gestão das águas, dada a dimensão geográfica do Brasil e
as especificidades regionais, que ultrapassam a questão hídrica.
Em relação aos principais avanços, destaca o arcabouço legal no âmbito federal e
estadual, informando que, com exceção de Roraima, todos as unidades federativas haviam
aprovado legislações relativas ao sistema estadual de gerenciamento de recursos hídricos. São
enumerados os espaços institucionais criados no âmbito do SINGREH: 22 conselhos
estaduais e distrital de recursos hídricos; 140 comitês de bacias federais ou estaduais, sendo
que em 1997 havia 30 colegiados instituídos; dois comitês com entidades equiparadas a
agências de águas e com todos os instrumentos de gestão implantados, inclusive a cobrança
pelo uso da água.
Outra conquista citada foi a própria instituição da Agência Nacional de Águas em
2000, autarquia em regime especial, com o objetivo de impulsionar a política nacional e
apoiar na implementação do SINGREH, especialmente a estruturação de comitês de bacias e a
implementação dos instrumentos de gestão.
55
Naquele momento, o Brasil tinha finalizado recentemente seu Plano Nacional de
Recursos Hídricos, em 2006, que atendia também a um compromisso internacional com as
Metas do Milênio, com o estabelecimento de ações e programas até 2020. Eram oito
Unidades da Federação com planos estaduais de recursos hídricos. Em nível de bacia, 75
documentos finalizados. Sobre outorga, o documento registra que a maior parte (número de
atos) era para o consumo humano e a maior vazão (volume de água) para a irrigação. A
cobrança ocorria, no âmbito federal, na bacia do rio Paraíba do Sul e no conjunto das bacias
dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, além de experiências nos estados do Ceará, Rio de
Janeiro e São Paulo. O Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH),
com dados herdados do Sistema de Informações Hidrológicas do extinto Departamento
Nacional de Água e Energia Elétrica (DNAEE), buscava avançar e se consolidar em uma
plataforma única, com módulos inter-relacionados, a exemplo, do módulo de dados quali-
quantitativos, regulação de usos e planejamento e gestão. O Cadastro Nacional de Recursos
Hídricos (CNARH) estava sendo implantado.
Embora tenha-se registrado avanços, o documento revela que a implantação do
SINGREH, considerada bastante complexa, não teve o resultado esperado por parte da
sociedade e dos atores envolvidos com a política de recursos hídricos. Dentre as fragilidades,
aponta em escala federal (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2007):
a) descompasso entre a legislação de recursos hídricos e o ordenamento
jurídico do Estado brasileiro. Como ilustração, o documento mostra que a
cobrança pelo uso da água foi definida como “preço público” por falta de
melhor opção jurídica. Assim, considerada receita orçamentária, era sujeita ao
contingenciamento e a controles não condizentes à natureza de um
instrumento descentralizado de gestão econômica;
b) dificuldades inerentes à cultura administrativa estatal a exemplo de
descentralizar efetivamente as decisões;
c) desafios relacionados à dupla dominialidade dos corpos hídricos. No caso
dos corpos de águas, existe a dominialidade federal e estadual. O documento
também cita a titularidade dos serviços de saneamento que é do município.
Assim, a governabilidade da gestão das águas depende de uma cooperação
entre diferentes níveis de governo, devendo ocorrer no âmbito da bacia, algo
bastante desafiador; e
56
a) desvios dos conceitos e fundamentos na implementação do SINGREH. De
acordo com a análise, mesmo os estados mais avançados não tinham
assimilado plenamente os conceitos da então nova política. Nesse sentido,
destaca a importância de se compreender os instrumentos de comando e
controle, de gestão social compartilhada e econômicos de gestão da política da
água.
Também apontou as deficiências dos órgãos gestores estaduais, que não conseguiam
avançar na implementação dos instrumentos de gestão (AGÊNCIA NACIONAL DE
ÁGUAS, 2007):
a) insuficiência de recursos humanos em termos de qualificação, capacitação,
remuneração, estabilidade e renovação;
b) limitação de operação das redes pluviométrica, fluviométrica e de
qualidade da água;
c) lacunas na cartografia básica, cadastros de usuários, sistemas de apoio à
decisão e outras ferramentas importantes para a gestão;
d) precariedade no funcionamento de conselhos e comitês, com frequente
falta de quórum;
e) instrumentos de planejamento – planos estaduais, de bacias hidrográficas e
planos estratégicos – com enfoque maior no diagnóstico e pouco
propositivos;
f) falta de sustentação financeira dos sistemas de gestão; e
g) ausência de mecanismos de avaliação dos sistemas de gestão.
Em relação à gestão participativa, critica os esforços dos Estados e da própria União
para a criação de inúmeros comitês de bacia, sem uma maior consolidação da gestão como a
implementação dos instrumentos de gestão, especialmente os planos de recursos hídricos, e de
fontes viáveis de financiamento da infraestrutura. Este modelo de gestão teria resultado, de
acordo com a análise, em um número grande de reuniões de plenárias e câmaras técnicas, sem
avanços significativos, e com um alto custo operacional para o Sistema.
Postos os principais problemas, o documento prossegue com proposições. Destacam-
se, aqui, fortalecimento do SINGREH como sistema descentralizado e participativo;
ampliação da gestão para além dos instrumentos de comando e controle, viabilizando os
instrumentos econômicos e os arranjos institucionais para a gestão compartilhada; construção
57
de sistemas de informações mais ágeis; definição de indicadores para medir resultados e
promover o acompanhamento e os ajustes necessários; e ações de comunicação social para
disseminar a importância dos instrumentos e da gestão de recursos hídricos, dentre outros.
Passados 10 anos desta avaliação e 20 da implementação da Lei das Águas, a ANA
publicou o Conjuntura Recursos Hídricos no Brasil – 2017. Ressalta-se que a primeira versão
do Conjuntura foi publicada em 2009, sendo no total, nove publicações, dentre relatórios
plenos e informes. Hoje, o Conjuntura se apresenta com o propósito de avaliar o estágio da
implementação do Plano Nacional de Recursos Hídricos e o cumprimento dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS), em particular do ODS 6 – Água e Saneamento. No
documento, é possível observar, em relação ao aspecto quantitativo dos recursos hídricos,
avanços no conhecimento da disponibilidade e do fluxo de água no território brasileiro, além
da modernização do monitoramento, com instalação de plataformas de coletas de dados
automáticas, o monitoramento hidrológico por satélite e o investimento na estruturação de
salas de situação nas UFs. De acordo com o Conjuntura, estes espaços funcionam como
centro de gestão de situação crítica para subsidiar as tomadas de decisão. Para a produção de
informação, a ANA gerencia a Rede Hidrometeorológica Nacional (RHN), que conta com
mais de 20 mil estações sob responsabilidade de diversas entidades públicas e privadas, além
de monitoramento específico para o setor elétrico, realizado por 583 empresas que exploram
potenciais hidráulicos. O monitoramento da água subterrânea ainda é incipiente e há uma
iniciativa da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) de implantação da Rede
Integrada de Monitoramento de Águas Subterrâneas (Rimas). Os dados de água superficial
são disponibilizados no SNIRH, e os de água subterrânea, no Sistema de Informações de
Água Subterrânea (Siagas), operado pela CPRM.
Também foi ampliado o conhecimento sobre os principais usos da água no país, seja
por meio de instrumentos de regulação, estudos setoriais ou cadastros de usuários. A análise
desses dados é feita de forma pormenorizada, por setor, cabendo destacar que 67,2% da água
é consumida no Brasil pela irrigação, seguida de abastecimento animal (11,1%), indústria
(9,5%), abastecimento urbano (8,8%), abastecimento rural (2,4%) e outros usos.
Em termos de qualidade, embora registra-se uma grande quantidade de dados, há ainda
lacunas de informações no País e nem todas as UFs realizam monitoramento ou têm dados
representativos ou consistentes. Para tentar superar esse problema e padronizar a produção e
divulgação dos dados foi criado o Programa Nacional de Avaliação da Qualidade da Água, a
58
Rede Nacional de Monitoramento da Qualidade da Água (RNQA) e o Programa de Estímulo
à Divulgação de Dados da Qualidade da Água (Qualiágua). De forma geral, a maioria (63%)
dos pontos monitorados apresentaram Índice de Qualidade da Água (IQA) na categoria
“Boa”, no período de 2001 a 2015. O grande desafio continua sendo os grandes centros
urbanos, onde são registrados os resultados “Ruim” ou “Péssimo”. O estudo destaca que a
água utilizada no saneamento básico retorna aos recursos hídricos sob a forma de esgotos
sanitários e os índices de coleta e tratamento continuam baixos, com impactos diretos na
qualidade da água e na saúde da população brasileira.
Somente, 43% da população urbana brasileira possui seu esgoto coletado e tratado e
12% utiliza a solução individual como fossa séptica. Desse modo, 55% da população
urbana brasileira pode ser considerada provida com atendimento adequado conforme
a classificação do Plansab; 18% têm seu esgoto coletado e não tratado, o que pode
ser considerado como um atendimento precário; e 27% não possuem coleta nem
tratamento, isto é, são desprovidos de qualquer serviço de esgotamento sanitário.
(AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a, p. 72)
Em relação à gestão, o Conjuntura mostra que outros quatro conselhos estaduais foram
criados, somando, em 2016, 26 CERHs atuantes. O Acre não possui um conselho próprio para
a temática, mas um fórum de discussão – Câmara Técnica de Recursos Hídricos, no âmbito do
Conselho de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia (Cemact). Cerca de 100 novos comitês de
bacias foram criados nesse intervalo, chegando a 232, sendo 223 de domínio estadual e 9 de
bacias interestaduais, sendo que dois deles, Verde Grande – que envolve os estados de Minas
Gerais e Bahia - e Piancó-Piranhas-Açu – que envolve os estados da Paraíba e Rio Grande do
Norte - são comitês únicos, ou seja, tem uma única instância deliberativa que atua nas esferas
federal e estadual (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a). A distribuição espacial
pode ser observada na Figura 2.
59
Figura 2 – Comitês de bacias hidrográficas instituídos no Brasil
Nota: Imagem trabalhada por Nádia Santos
Fonte: ANA, 2017a, p. 115.
Em relação às agências de água, são um total de cinco entidades delegatárias atuando em
bacias interestaduais.
Sobre os instrumentos de gestão, houve um número significativo de planos de bacias
hidrográficas elaborados. Em 2016, somavam 164 planos de bacias estaduais concluídos e 12
planos de bacias interestaduais (Figura 3).
60
Figura 3 – Planos de Recursos Hídricos de bacias estaduais e interestaduais já existentes até 2016
Nota: Imagem trabalhada por Nádia Santos. Fonte: ANA, 2017a, p. 120.
A efetividade dos planos de recursos hídricos, entretanto, continua sendo questionada:
No entanto, há baixa efetividade na implementação das ações propostas nesses
planos. Mesmo após aprovada a cobrança pelo uso da água em algumas bacias onde
incidem os planos, por exemplo, poucas são as intervenções efetivamente
implementadas, dentre aquelas previstas. Além disso há pouco rebatimento dos
planos na programação e orçamento dos órgãos gestores estaduais de recursos
hídricos (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a, p. 116).
Abers e Keck (2017) complementam esta visão relatada no Conjuntura afirmando que
os planos normalmente são elaborados por consultores externos, que elaboram documentos
extremamente técnicos, com diagnósticos aprofundados, sem a devida colaboração dos atores
locais. Elas acrescentam que os documentos passam pelos comitês apenas para aprovação,
depois de alguma discussão, não sendo, na grande maioria dos casos, construídos
efetivamente de modo participativo. As autoras também reafirmam que raramente os planos
61
são implantados no Brasil e sugerem que faltam mecanismos legais para a sua execução.
“Exceto em alguns poucos casos, nos quais os planos foram concebidos por meio de
processos participativos mais locais, sua existência reflete a crença de que conhecimentos
técnicos supostamente neutros podem resolver problemas políticas” (ABERS; KECK, 2017,
p. 90)
Sobre a análise de execução dos programas e ações propostos Plano Nacional de
Recursos Hídricos, constata-se “que os avanços foram aquém do esperado na maior parte dos
programas e ações prioritárias estabelecidas (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a,
p. 97).
O enquadramento de corpos de água avançou pouco nesses 20 anos. Apenas 12 UFs
possuíam em 2016 atos normativos que enquadrassem total ou parcialmente seus corpos de
água. Quando analisado o Índice de Conformidade ao Enquadramento (ICE), que mede a
conformidade da qualidade das águas ao enquadramento do trecho, no período de 2001-2015,
verifica-se que é predominantemente ‘péssimo’ no Brasil, revelando uma distância entra as
metas de qualidade pactuadas com a realidade monitorada.
Sobre a outorga, todas as UFs, com exceção do Amazonas e Amapá, já
implementaram este instrumento, embora haja um desafio para a regularização de todos os
usos, o que exige um esforço de divulgação, sensibilização e mobilização junto aos usuários.
A cobrança pelo uso da água alcançou outras bacias federais, para além do Paraíba do
Sul e Piracicaba, Capivari e Jundiaí, a exemplo das bacias dos rios São Francisco e Doce. Em
relação às UFs, seis cobram pelo uso de recursos hídricos em sua totalidade territorial ou em
algumas bacias. Em 2016, a arrecadação com a cobrança foi de 328,60 milhões (AGÊNCIA
NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a).
O SNIRH, que estava em fase inicial em 2007, registrou avanços na consolidação das
informações e hoje conta com o seguinte conteúdo temático: divisão hidrográfica; quantidade
de água; qualidade de água; usos de água; balanço hídrico; eventos hidrológicos críticos;
institucional; planejamento; regulação e fiscalização; e programa.
Para além dos instrumentos de gestão, pode-se observar algumas ações da ANA no
sentido de superar alguns desafios apontados no relatório de 2007. Um deles é a busca pelo
fortalecimento dos sistemas estaduais de gestão, com a criação, por exemplo, do Progestão,
citado no tópico anterior. Também se destaca o programa de capacitação do SINGREH, que
62
tem intensificado o número de cursos, com diferentes temas e cargas horárias, sendo
presencial, semipresencial e a distância (EaD). Inclusive, o presente Mestrado Profissional em
Gestão e Regulação de Recursos Hídricos é fruto deste trabalho. São mais de 15.000 pessoas
beneficiadas com os cursos, de 2001 a 2016. Percebe-se, ainda, um esforço da ANA de tornar
os dados técnicos mais compreensíveis para população geral, com a sua disponibilização por
meio de uma linguagem mais acessível, além da repaginação de seu sítio eletrônico.
Mas os desafios a serem superados ainda são grandes e as fragilidades da gestão foram
expostas, sobretudo com as crises hídricas ocorridas a partir de 2012 que alcançaram também
o Sudeste e o Centro-Oeste do Brasil. Aqui é importante destacar a constatação do Projeto
Legado da ANA: “As instituições do SINGREH - colegiados e instituições públicas de
gerenciamento da água – têm demonstrado limitações para dar respostas eficazes à
sociedade brasileira em situações de grave crise hídrica ou de conflito federativo”
(AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017b, p. 1).
Outro desafio posto é a avaliação e a revisão da legislação e das normativas sobre
água. O Conjuntura apresenta alguns questionamentos:
Reflexões tais como se a unidade de gestão dos recursos hídricos deve ser
unicamente a bacia hidrográfica, como preconizado na PNRH, são um exemplo.
Configurações espaciais alternativas, que confiram maior eficácia para o
enfrentamento de problemas, podem ser mais vantajosas, como na gestão conjunta
de reservatórios localizados em diferentes bacias ou a necessidade da gestão com
foco em bacias estendidas, como ocorre no caso de transposições de água, onde tem-
se bacias “doadoras” e ”receptoras” (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a,
p 166).
Há questionamentos também quanto à atuação efetiva dos entes do SINGREH.
Destacam-se a fragilidade na atuação dos comitês de bacias e os entraves para a atuação
integrada da ANA e dos órgãos gestores estaduais.
É preciso aperfeiçoar o processo participativo de gestão de recursos hídricos,
melhorando a representatividade dos colegiados e a inserção de mecanismos que
propiciem uma ampla consulta à sociedade brasileira, além de avanços no processo
de capacitação (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a, p. 167).
Ainda se discute aprimoramentos para garantir uma melhor sustentabilidade financeira
do sistema de gestão. No caso do instrumento de cobrança, verifica-se a necessidade de
revisão dos valores cobrados e, de acordo com o documento, de ampliação das possibilidades
de repasses e custeio dos valores arrecadados para financiar os serviços de gestão. Como
exemplo, “o apoio ao funcionamento das instâncias colegiadas e aos órgãos gestores de
63
recursos hídricos, à fiscalização, ao estabelecimento de uma infraestrutura de dado”
(AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2017a, p. 168).
Efetivar a implementação dos planos de bacias é outro desafio a ser superado.
É preciso inovar na forma de elaboração dos planos com a proposição de ações mais
realistas à realidade que considerem a viabilidade financeira e de execução das
ações. Além disso, ajustar os escopos dos diferentes níveis administrativos dos
planos (nacional, estaduais e de bacias) de modo a integrá-los de maneira a reduzir
redundâncias e torna-los mais complementares em termos de atuação, além da
adoção de mecanismos de acompanhamento e monitoramento durante a
implementação são desafios a serem enfrentados (AGÊNCIA NACIONAL DE
ÁGUAS, 2017a, p 168).
Diante do exposto, é possível inferir que houve avanços no sentido de institucionalizar
e instrumentalizar a gestão das águas no Brasil e consolidar dados e informações para o
gerenciamento, com participação social. Em contrapartida, as instituições gestoras e
colegiadas que integram o SINGREH, sobretudo no âmbito estadual e de bacia, ainda carecem
de fortalecimento institucional, com desenvolvimento de capacidades do corpo técnico e
gerencial. No caso dos colegiados, pondera-se também a falta de efetividade de suas
deliberações e o seu caráter pouco inclusivo, como constata o Projeto Legado ao afirmar que a
participação fica restrita a pequenos grupos melhor organizados (AGÊNCIA NACIONAL DE
ÁGUAS, 2017b). Os instrumentos de gestão de planejamento precisam avançar para a sua
implementação efetiva, se tornado um articulador do planejamento integrado, além de
direcionar o processo orçamentários ao menos dos entes do SINGREH. Embora, nesses
últimos anos tenham sido elaborados inúmeros relatórios, planos, diagnósticos e outros
estudos, é necessário se construir uma agenda mais propositiva e executiva para a gestão, bem
como disponibilizar as informações de forma consistidas, sistematizadas e cruzadas que
permitam utilizá-las como suporte à decisão e aprimoramento da gestão compartilhada e
participativa. A dificuldade de sustentabilidade financeira do sistema hídrico precisa ser
superada.
64
4 COMUNICAÇÃO ESTRATÉGICA E ESPAÇO TELEMÁTICO
Desde o processo de abertura política no Brasil na década de 1980, os espaços de
discussões e deliberações públicas têm-se multiplicado, como pôde ser constatado nos
capítulos anteriores, embora alguns autores ponderem que o País viva uma crise das
instituições democráticas e retrocessos, perpassando pelo impeachment do Governo Dilma e
mais recentemente com os últimos acontecimentos durante o Governo Temer, envolvendo os
três poderes: executivo; legislativo e judiciário (AVRITZER; MARONA 2017,
DOMINGUES, 2017; MACHADO e VILANI, 2016). Na área de recursos hídricos, são mais
de 20 anos de esforços para fortalecer a gestão participativa, que se manifesta de múltiplas
formas como descrito no capítulo 2 – Democracia e Participação, e especialmente atrair a
sociedade civil para as instâncias institucionais de decisões colegiadas.
Promover a participação social não se limita, portanto, a criação de espaços e
instrumentos formais, porque esta não pode ser apenas decretada por meio normativas, mas
construída por um processo contínuo de aprendizagem e mobilização social, como observam
Toro e Werneck (2004). E a realidade, constatada por meio de pesquisas apresentadas neste
trabalho, mostra que criar condições para a participação e manter os atores engajados, de
forma quantitativa e qualitativa, não é uma tarefa fácil e ainda é um grande desafio para a
gestão das águas no Brasil.
Toro e Werneck (2004) ressaltam que participar ou não de um processo de
mobilização é um ato de escolha, um ato de liberdade. “As pessoas são chamadas, mas
participar ou não é uma decisão de cada um. Essa decisão depende essencialmente das
pessoas se verem ou não como responsáveis e como capazes de provocar e construir
mudanças” (p. 20). Trata-se, portanto, de uma decisão consciente e com um propósito claro e
orientado para um projeto de futuro, de construção de uma ordem social desejada.
Na democracia a ordem social se produz a partir da própria sociedade. As leis são
criadas, direta ou indiretamente, pelos mesmos que as vão cumprir e proteger. A
convivência democrática começa quando uma sociedade aprende a autofundar a
ordem social. E isso também deve ser ensinado e aprendido (TORO e WERNECK,
2004, p 20).
A mobilização social, portanto, se revela um processo complexo e desafiador,
construído através do diálogo, da negociação e da busca de soluções para os problemas da
65
coletividade. É um processo essencialmente comunicativo, pois para mobilizar é preciso
compartilhar informações e conhecimentos sobre a causa e partilhar sentimentos, valores,
visões e responsabilidades acerca dela (TORO; WERNECK, 2004). É preciso “tocar a
emoção das pessoas, sem, contudo, manipulá-las” (HENRIQUES et al, 2004, p. 37) e permitir
que elas tomem posições a respeito das questões públicas de maneira crítica, que se formam
quando os múltiplos atores apresentam suas visões, argumentam, tentam convencer os demais
interlocutores, negociam, convocam outros atores a se posicionar e buscam acordos sobre a
realidade que se pretende transformar. Só assim é possível promover o engajamento dos
sujeitos, a ponto deles se sentirem corresponsáveis por aquela causa/problema e se
movimentarem no sentido solucioná-lo.
Henriques et al (2004) fazem coro ao posicionamento de Toro e Werneck (2004) de
que a mobilização é um processo de ação comunicativa e acrescenta que esta deve ser
entendida a partir de sua perspectiva relacional e não apenas informacional. Renan Mafra
(2006) também insiste que não basta circular informações. Para ele, o importante é criar
mecanismos para convocar pessoas a uma participação ativa na esfera pública, que não se
traduz em modelos autoritários e unidirecionais. É preciso garantir ações multidirecionais e
efetivamente abertas ao diálogo, que permitam a inclusão de novas vozes e novos temas.
“...mobiliza-se para estimular uma participação maior na vida coletiva, nas questões que
afligem a sociedade, em causas que são de responsabilidade de todos” (MAFRA, 2006,
p.36).
Para isso, é necessário desenvolver uma comunicação estrategicamente planejada e
integrada, pensada a partir dos públicos e não apenas dos instrumentos, e com métodos para
coordenar ações e não para controlá-las. No entanto, deve ser flexível para não cristalizar o
dinamismo da participação democrática (HENRIQUES et al, 2004)
Assim, a comunicação para mobilização deve se propor a orientar os indivíduos em
seus espaços de interação, ou mesmo criar ambientes, onde as relações e as
interações ocorrerão através do diálogo livre entre sujeitos, e o conhecimento será
aprendido e reelaborado através dos próprios contextos da comunidade. Entretanto
esta aprendizagem não será simplesmente episódica, difusa ou pontual, mas sim
estimulada por uma comunicação que estabelece “lugares” próprios de interação,
superando a pura espontaneidade através da geração de uma referência que direcione
a vivência, a troca e a apreensão de novos significados (p. 28).
Henriques et al (2004) alerta que, para esse fim, é crucial planejar ações articuladas e
contínuas, e não executar ações isoladas e pontuais. Nesse sentido, considera que as seguintes
funções da comunicação social deverão ser devidamente integradas: (a) difundir informações
66
- para que as pessoas tenham conhecimento da causa e possam formar julgamento acerca dela;
(b) promover coletivização – que gera a certeza que você não está sozinho naquela luta,
fortalecendo a mobilização, e pode ser promovida por meio de proposições de agendas
comuns; (c) registrar a memória do movimento – disponibilizando o acervo com o histórico e
os resultados obtidos; (d) fornecer elementos de identificação com a causa e com o projeto
mobilizador – a construção da identidade, por meio de elementos simbólicos comuns,
possibilita o sentimento de reconhecimento, pertencimento e solidariedade coletiva.
Estas peculiaridades da comunicação para projetos de mobilização social são
complementares. Há uma sinergia entre elas que pode ser alcançada por meio de um
planejamento estratégico, de forma que nenhuma seja negligenciada e que estejam
articuladas, em função dos recursos e veículos disponíveis (HENRIQUES et al,
2004, p. 24)
Na perspectiva de dar evidência para uma causa, colocando-a publicamente em debate,
Mafra (2006) enumera cinco possíveis espaços de visibilidade pública a serem trabalhados
pela comunicação estratégica, quais sejam: o midiático massivo; o midiático massivo local; o
dirigido, o presencial e o telemático. É importante compreender como cada um deles opera,
quais as suas limitações e possibilidades, e como aplicá-los de maneira complementar para
viabilizar diferentes estratégias e alcançar públicos diversos.
Para o referido autor, a mídia massiva é entendida como aquela gerada por meio de
comunicação que alcança um grande número de pessoas, em um território geograficamente
amplo, e tem um papel importante para promover uma grande visibilidade de uma temática de
interesse social, uma vez que alcança um grande número de pessoas, inclusive, ampliando a
possibilidade de atrair a atenção de um novo público em torno da questão. É formado pelos
meios de comunicação de massa como emissoras de televisão e rádio nacionais e estaduais,
jornais e revistas de grande tiragem e circulação.
As informações que circulam nesse espaço não apresentam especificidades de
linguagem ou tratamento da informação quanto ao público que irá recebê-la,
direcionando-se em última análise, a qualquer sujeito que se localiza em seu âmbito
de circunscrição (MAFRA, 2006, 0 49).
Cabe ressaltar que, embora a grande mídia permita uma ampla difusão e uma maior
visibilidade aos temas pautados, ela tem suas limitações, especialmente, ao que diz respeito a
sua efetividade, uma vez que objetiva a ampla difusão de informações, sem a intenção de
gerar e manter vínculos fortes entre o espectador/leitor com as notícias divulgadas.
67
Waisbord (2009), em seu dossiê sobre a experiência do jornalismo de defesa civil na
América Latina, também alerta que a grande mídia sofre influência do mercado e estado, e
acaba por focalizar em questões que são relevantes para os poderosos fazedores de notícias e
para as fontes convencionais de notícias; segue algumas regras próprias do fazer jornalístico
que determinam a cobertura e o valor noticioso de um evento social, o que exige uma melhor
compreensão de todas estas imbricações, para agir de maneira estratégica e alcançar êxito na
inserção de novas gramáticas sociais nesse espaço midiático tradicional.
Gamson (2011) enriquece o debate, ao ressaltar que a mídia não é apenas um meio
para difusão de informações, mas também agente que participa do processo democrático,
fomentando debates públicos, favorecendo ou desfavorecendo temas e enquadrando os fatos
conforme seus interesses. Também problematiza que as informações produzidas alcançam os
receptores de forma fragmentada e fora dos contextos políticos nas quais elas operam.
O resultado são notícias que nos chegam “em capsulas dramáticas superficiais que
dificultam a visão das conexões entre as questões, ou mesmo o acompanhamento do
desenvolvimento de uma questão particular através do tempo”. Assim, a estrutura e
a operação das relações sociais de poder permanecem obscuras e invisíveis
(GAMSON, 2011, p. 60)
As argumentações expostas reforçam o alerta de Mafra de que este não deve ser o
único espaço a ser considerado no processo de planejamento de comunicação para a
mobilização social.
O espaço massivo local tem as mesmas características do espaço descrito
anteriormente, mas com uma abrangência geográfica menor. Os veículos de comunicação
também são os mesmos - televisão, rádio, jornal e revista, porém com alcance mais
localizado.
Já o espaço de visibilidade pública dirigida é direcionado a um público específico,
classificado por uma afinidade de interesses. Ao editar a informação de forma personalizada a
um público pré-determinado, que já tem interesse pelo tema, a comunicação dirigida tem
mais chance de estimular a participação social. Em contrapartida não tem muito potencial
para agregar um novo público à causa. Os principais veículos são os jornais e revistas de
empresa, de bairro ou de associação, relatórios, informativos e blogs temáticos. Esta
modalidade engloba a comunicação comunitária que é marcada por um viés social, e
68
normalmente produzida pela comunidade e para servir a própria comunidade. Tem como
veículos rádios comunitárias, jornais e murais públicos.
Já o espaço de visibilidade presencial é aquele onde se estabelecem a comunicação
interpessoal, face-a-face. Embora o alcance seja menor, consiste, em termos qualitativos, na
comunicação mais eficaz no processo de sensibilização e mais mobilizadora. Por isso,
Henriques et al (2004) reforça que as ações de comunicação que visam à participação devem
dar atenção especial aos espaços de menor cobertura, mas de maiores impactos, sendo eles, a
rua, a cidade, as praças públicas, as reuniões, dentre outros.
Para garantir maior efetividade, a comunicação dirigida deve ser adotada
cotidianamente pelos movimentos sociais. Ela tem por finalidade transmitir ou
conduzir informações, estabelecendo uma comunicação orientada e frequente com
um público identificado. Como estratégia de comunicação dirigida, a interação face-
a-face retorna os contextos interativos de co-presença, promovendo uma maior
proximidade entre os indivíduos e possibilitando ações mais coesas (HENRIQUES
et al, 2004, p. 21)
O último espaço de visibilidade pública elencado por Mafra (2006) é o telemático,
gerado na Rede Mundial de Computadores – a Internet, que é um sistema complexo que
envolve novas tecnologias de informação e comunicação (TICs), e tem grande capacidade de
distribuir a informação sobre todas as dimensões das atividades humanas – econômicas,
sociais, políticas e culturais. Como meio de comunicação, permite, pela primeira vez, a
comunicação de muitos para muitos, em escala global. É também base tecnológica para a
forma organizacional em rede que, embora seja uma forma antiga de atividade humana, ganha
nova dimensão com a Internet. (CASTELLS, 2007).
É considerado por alguns como libertária e comunista e por outros como mais um
aparato da Indústria Cultural, mas para Cardon (2012), não é possível atribuir à Internet um
lugar no jogo político: “sua forma é inclassificável” (p. 01). Entretanto, é inegável que o
espaço telemático abre possibilidade para democratização da comunicação, como pondera
Maria Beatriz Bretas (2004):
... nem tudo o que se apresenta na Internet está compreendido nos domínios da
Indústria Cultural. O espaço telemático abriga, também, possibilidades de
democratização da comunicação, já que descentraliza os aparelhos de produção
cultural, promovendo a ação de vários participantes da rede, ainda que os
tradicionais oligopólios da mídia já estejam instalados no novo domínio. As grandes
redes de televisão, os impérios jornalísticos, as emissoras de rádio, as agências de
notícias e novos veículos, a exemplo dos search engines, disputam a condição de
69
portais para os usuários em trânsito no ciberespaço (p. 02).
Nesse sentido, a Internet se apresenta como um espaço estratégico para o
desenvolvimento de ações de mobilização social para uma participação mais ativa na arena
pública, como pontua Marcos Abílio Parreira (2011):
As redes telemáticas se baseiam principalmente em práticas descentralizadas entre
as entidades, suas bases e os militantes internautas ocasionais, através da construção
de um espaço cooperativo que oferece informações vindas das mais variadas fontes
e que pode vir a enriquecer as práticas coletivas. A imediaticidade, a capacidade de
atingir indivíduos nos mais remotos locais e a construção de redes fazem com que
esta tecnologia seja particularmente útil no processo de mobilização para ações
políticas (p. 14).
Por ser o espaço privilegiado deste trabalho de pesquisa, o espaço telemático será
detalhado a seguir, a partir da sua interface com a mobilização e a emancipação política.
4.1 Espaço telemático – Internet
A Internet, a rede mundial de computadores, começou a ser projetada no final dos anos
de 1960 pela ARPA (Advanced Research Projects Agency), uma agência de pesquisa fundada
em 1958 pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América (EUA). Foi uma
pequena equipe da Agência, a IPTO (Information Processing Techniques Office), que
concebeu os primeiros protocolos de transmissão da rede denominada ARPANET, precursora
da Internet. A proposta era a criação de uma rede informática interativa e descentralizada
(CASTELLS, 2007).
É importante contextualizar que esses estudos ocorriam no período da Guerra Fria, um
conflito militar, político, econômico e ideológico que colocava em lados opostos os EUA e a
União Soviética (URSS). As duas superpotências iniciaram, ainda na década de 1940, uma
corrida armamentista que expressava toda uma rivalidade técnico-científica entre os dois
blocos. Manuel Castells (2007) relata que o Departamento de Defesa dos EUA foi convencido
pela Rand Coorporation, um centro de investigação colaborador do governo estadunidense, de
70
construir uma rede informática que não os deixassem vulneráveis caso ocorresse um ataque
ao Pentágono, onde concentravam informações sigilosas.
O projeto ARPANET entrou em operação no ano de 1969 e, na sequência, este projeto
avançou para conectar a ARPANET a outras redes, surgindo o novo conceito de rede de
redes. Preocupado com possíveis violações do sistema de segurança, o Departamento de
Defesa dos EUA decidiu criar uma rede exclusiva para as funções militares. A ARPANET foi
renomeada para ARPANET-INTERNET, que começou a se distanciar de seu contexto militar,
e a sua gestão foi repassada para a Fundação Nacional para a Ciência.
A ARPANET teve sua origem no Departamento de Defesa dos EUA, mas suas
aplicações militares foram secundárias no seu projeto tecnológico. A preocupação
fundamental do IPTO era o de financiar o desenvolvimento da ciência da
informática nos EUA, deixar trabalhar em paz os acadêmicos e esperar que saísse
alguma coisa interessante desse trabalho (CASTELLS, 2007, p. 34)
A ARPANET não foi a única fonte originária para a construção da Internet como se
tem acesso nos dias atuais. Desenvolvida em ambiente relativamente de livre criatividade,
com contribuições das comunidades científicas e de hackers, primeiros programadores de
softawares, a Internet se manteve em sua fase de aperfeiçoamento como uma rede aberta
internacional, com a livre distribuição de códigos fonte, sendo que qualquer pessoa, com
conhecimento técnico suficiente, podia utilizar, aperfeiçoar ou desenvolver novos produtos,
em contrapartida, deveria compartilhar gratuitamente o código do programa. Essa troca e
cooperação que conectou a ciência, a investigação militar e a cultura libertária foi
fundamental para a estruturação técnica e social da rede mundial de computadores
(CASTELLS, 2007).
Dessa forma, uma série de acontecimentos e avanços tecnológicos ao longo de 30
anos se agruparam e constituíram o que hoje chamamos de Internet. Um exemplo foi o
desenvolvimento em ambiente acadêmico da USENET – uma rede de comunicação entre
computadores fora do eixo ARPANET, que posteriormente foi integrada a esta, surgindo aí a
Internet. Mas foi a criação da World Wilde Web (www), em 1990, por um programador inglês
Tim Berners-Lee, que fez emergir a utilização da Internet em escala global, com sua
apropriação para a vida social e doméstica. Em 1994, foi colocado na rede o primeiro
navegador – Netscape Navigator, criado pela Netscape Communications. Na sequência, esse
71
uso foi impulsionado pelo desenvolvimento de redes de banda larga com fio (ADSL e fibra
óptica) e sem fio (wifi, Bluethooth, 2G, 3G e 4G), e da internet móvel (WAP).
De acordo com Dominique Cardon (2012), os primeiros utilizadores da rede eram
justamente os seus promotores, que formavam um grupo bastante homogêneo social e
culturalmente, composto por indivíduos brancos, do sexo masculino, ocidentais, de classes
médias e cultas. Nos anos de 1990, com todas estas conexões tecnológicas, iniciou-se um
processo de massificação do uso da Internet.
Em dezembro de 1995, isto é, bem depois dos eventos que vieram acontecer,
computamos 16 milhões de internautas, ou seja, 0,4% da população mundial. Em
2000, no momento em que a blogosfera começa a se expandir, eles são 359 milhões
(5,9%). Dez anos mais tarde, já chegaram a 1,8 bilhão e representam um quarto da
população mundial. (CARDON, 2012, p. 22).
O mundo da Internet hoje conecta mais de três bilhões de pessoas no planeta, o que
significa um pouco menos da metade da população mundial (7,6 bilhões), de acordo com
dados da União Internacional de Telecomunicações (UIT), órgão ligado à ONU (ONU,
2016). Em contrapartida, mais da metade da população mundial (53%), ou seja 3,9 bilhões de
pessoas, não possui acesso à internet no mundo, sobretudo em países mais pobres onde a sua
penetração é de 15%. Em países emergentes, a penetração da Internet é de 40% e em países
desenvolvidos de 81%. A pesquisa mostra, ainda, que a cobertura celular está disseminada e
95% da população mundial moram em áreas que têm ao menos a cobertura 2G. A cobertura
com redes móveis de banda larda 3G ou acima alcança 84% da população mundial, mas
apenas 67% da população rural. O número de assinaturas de Internet móvel, entretanto, varia
em cada região do globo. Na América, é de 78,2%, mas na África é de 29,3%. O número de
usuários do sexo masculino ultrapassa o número de usuários do sexo feminino praticamente
em todas as regiões do mundo.
O uso da Internet está a difundir-se rapidamente, mas esta difusão segue um modelo
espacial que fragmenta a sua geografia de acordo com a riqueza, a tecnologia e o
poder. Esta é a nova geografia do desenvolvimento.
Dentro de cada país, também existem grandes diferenças espaciais na difusão do uso
da Internet. As grandes áreas urbanas são as primeiras a difundi-lo, tanto nos países
desenvolvidos como naqueles que estão em vias de desenvolvimento, enquanto que
as áreas rurais e as cidades pequenas ficam consideravelmente atrás quanto ao
acesso a este novo meio, contradizendo claramente a imagem que os futurólogos
tinham formado acerca da “casa de campo eletrônica”, segundo a qual as pessoas
iriam trabalhar e viver fora dos aglomerados urbanos de maior dimensão
(CASTELLS, 2007, p. 250)
72
Castells (2007) afirma que há uma correlação direta entre a dimensão das cidades e a
expansão da Internet em seu território, que tem crescido rapidamente em especial nas grandes
áreas metropolitanas, gerando o que ele denomina de info-exclusão. Ou seja, o seu
crescimento tem avançado de forma desigual no tempo e no espaço, concentrado nos grandes
centros urbanos do mundo, estando mais relacionado às questões econômicas, tecnológicas,
educativas e culturais.
No interior de cada território, Castells (2007) verifica outras variáveis que devem ser
consideradas na análise da info-exclusão e, por conseguinte, em um trabalho de mobilização e
convocação de novos atores sociais nos debates públicos, como o rendimento, o acesso à
educação, a questão étnica, o gênero e a faixa etária.
A disparidade entre os que têm e os que não têm Internet amplia ainda mais o hiato
da desigualdade e da exclusão social, numa complexa interação que parece aumentar
a distância entre a promessa da Era da Informação e a crua realidade na qual está
imersa uma grande parte da população mundial (CASTELLS, 2007, p. 287).
Apesar dessas e outras limitações e desafios a serem superados, é inegável que a
Internet oferece um suporte tecnológico e é um meio de comunicação importante para as
ações de mobilização social. Ela possibilita novas formas de comunicação e de interações
dinâmicas, em formato multimídia - vídeos, áudios e textos.
Em termos comunicacionais, a Internet colocou em contato dois mundos que
tradicionalmente coexistiam de maneira separada: o da produção de informações e o da
recepção das informações. Agora, a pessoa comum é também produtora de notícias,
transformando as práticas de comunicação, sendo que aquele que fala pode ser um
profissional ou um amador.
De acordo com Castells (2013), a autocomunicação de massa vem se ampliando nas
redes de comunicação sem fio, horizontais e interativas, e hoje é a principal plataforma de
comunicação da atualidade, em contínua expansão. Mas pondera: “O uso das redes de
comunicação da internet e dos telefones celulares é essencial, mas a forma de conectar-se em
rede é multimodal. Inclui redes sociais on-line e off-line, assim como redes preexistentes e
outras formadas durante as ações do movimento” (CASTELLS, 2013, p. 164).
Nesse sentido, as ações coletivas se organizam e se fortalecem em espaços de
comunicação digital, eficazes para manter laços de afinidades, especialmente à distância, que
73
é uma característica da sociedade moderna, que seleciona as suas relações com base em suas
semelhanças, mas também interagindo com a comunicação face a face e com a ocupação do
espaço presencial, do espaço urbano. Esta constatação é reforçada por Cardon (2012) que
demostra que o mundo on-line está entrelaçado ao cotidiano.
Enquanto os pioneiros sonhavam com um mundo reunido por uma circulação mais
fluida, mais aberta e mais tolerante, a massificação da Internet conduziu
inevitavelmente à multiplicação de enclaves comunitários que reagruparam sobre a
base da proximidade social, geográfica e cultural, indivíduos que compartilham
traços em comum (CARDON, 2012, p. 27)
Dessa forma, Castells (2012) mostra que a Internet tem um efeito positivo na interação
social e potencializa a sociabilidade, tanto à distância quanto localmente. Ele apresenta outras
pesquisas que revelam que o uso da Internet pode levar a um maior isolamento social,
indicando uma perda na sociabilidade, mas expõe que estes estudos estão em contradição com
a maior parte dos dados disponíveis.
Assim, a estrutura das redes sociais digitais favorece a interação dos indivíduos que
compartilham interesses comuns, contribuindo para reconhecer problemas, universalizar
valores e visões, disseminar informações e conhecimentos, avaliar possibilidades e
argumentar com base nas informações disponíveis. São criados laços e vínculos que
propiciam a busca de consensos ou não, bem como materialização da ação coletiva.
A comunicação de valores e a mobilização em torno do sentido são fundamentais.
Os movimentos culturais (entendidos como movimentos que têm como objectivo
defender ou propor modos próprios de vida e sentido) constroem-se em torno de
sistemas de comunicação – essencialmente a Internet e os meios de comunicação –
porque esta é a principal via que estes movimentos encontram para chegar àquelas
pessoas que podem eventualmente partilhar os seus valores, e a partir daqui actuar
na consciência da sociedade no seu conjunto (Castells, 2004, p. 170)
Castells defende que a Internet contribui para a democratização, uma vez que iguala,
de certa forma, as condições para que os diferentes atores sociais e entidades possam se
expressar, além de ampliar as fontes de comunicação e conectar pessoas, possibilitando que
elas partilhem as suas visões.
Ao se apresentar como um canal potencialmente horizontal, sem mediadores
tradicionais, a Internet possibilita uma comunicação mais rápida, de muitos-para-muitos. E
pode ser uma aliada poderosa das ações coletivas, potencializando suas atividades,
informando, convocando e compartilhando suas preocupações e expectativas.
74
Marcus Abílio Pereira (2011) destaca que o uso da Internet como novo meio de
comunicação e propagação da informação permite que os coletivos definam e enquadrem suas
próprias demandas, invistam em alvos potenciais, organizem sua ação coletiva,
contraponham-se às visões externas repassadas de maneira tendenciosa pela grande mídia e
até atraiam a atenção dos meios massivos em alguns momentos estratégicos. Sobre a
ferramenta, ele destaca:
(...) trata-se de um dispositivo no qual as interações podem tomar diferentes formas -
um para um, um para muitos, muitos para muitos, muitos para um, no qual as
informações e comunicações podem circular nos níveis local, nacional ou global e,
comparativamente, com baixas barreiras de entrada (Chadwick, 2006), permitindo
assim que a contra-informação, tão cara aos movimentos sociais (em função de
coberturas algumas vezes tendenciosas e outras vezes não reflexivas dos canais
tradicionais da mídia) se desenvolva e alcance espaços e indivíduos a custos mais
baixos do que através dos meios tradicionais de informação e comunicação
(PEREIRA, 2011, p. 7).
A Internet possibilita, portanto, a criação de canais informativos e de interação em
alternativa aos meios de comunicação de massa, quebrando o monopólio da opinião pública
por estes meios. Também permite a rápida difusão da informação, com custo mais baixos e
inclusão de questões antes “inexistentes”.
Pereira (2011) expõe que o ativismo político online pode ocorrer de duas formas: por
meio do uso da Internet como apoio às ações políticas que já existem, por exemplo, uma ação
presencial, ou por meio do uso da rede como único meio para a realização da ação, como uma
petição online.
A Internet é um instrumento que tem sido utilizado e aprimorado pelos movimentos
sociais e que tem promovido mudanças nos repertórios adotados através de novos
meios de publicização de informações, novas formas de comunicação e coordenação
de mobilizações, através da combinação com outras ferramentas que continuam a ser
utilizadas, tais como o fax, o telefone, a mídia impressa, assim como manifestações
presenciais. Desta forma, a apropriação das novas TICs para a articulação de ações
entre entidades e dentro das próprias entidades não significou uma ruptura com
outras ferramentas já existentes (PEREIRA, 2011, p.12).
O autor também ressalta a importância da ferramenta em romper algumas barreiras da
participação alcançando indivíduos que não têm vinculações formais a movimentos ou
organizações civis, propiciando uma militância que o autor chama de não formal. Pereira
(2011) ressalta que a maior parte da literatura responde que a Internet favorece a ação política
nos casos em que os indivíduos já têm interesse pela causa. Nesse sentido, o instrumento
“apenas reduz as barreiras à participação, mas não as rompe completamente como muitos o
desejavam” (PEREIRA, 2011, p 18).
75
4.2 A Internet no Brasil
A Internet comercial está disponível no Brasil há mais de 20 anos, segundo o Centro
Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC, 2016).
Hoje, são mais de 100 milhões de pessoas de 10 anos ou mais conectadas à rede mundial de
computadores.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2015, realizada pelo IBGE
em convênio com o então Ministério das Comunicações, apresenta e analisa os principais
indicadores referentes à utilização da Internet e à posse de telefone móvel celular para uso
pessoal no país. Em 2004, quando os temas relacionados à Internet começaram a ser
investigados pela pesquisa, o acesso à Internet no domicílio por meio de microcomputador era
de 12,2%. Em 2015, passa para 40,5%. O acesso por meio de equipamentos eletrônicos
diferentes do microcomputador - telefone móvel celular, tablet, televisão e outros, passou a
ser contemplado em 2013 e também mostrou crescimento: passou de 12,8%, em 2014, para
17,3%, em 2015, quando considerado o acesso exclusivamente por meio deles. É importante
registrar que houve queda na proporção de domicílios com acesso à Internet por meio de
microcomputador, de 42,1%, em 2014, para 40,5%, em 2015.
No total, em 2015, mais da metade dos domicílios brasileiros passaram a ter acesso à
Internet, alcançando 57,8%, correspondendo a 39,3 milhões de domicílios, sendo 63,9% na
área urbana e 21,2% na área rural.
Considerando os domicílios com acesso à Internet, em 2015, 70,1% o utilizaram por
meio de microcomputador; 92,1% tinham acesso por meio de telefone móvel celular; 21,1%
por tablet; 7,5% por televisão e 1,0% por outros equipamentos. Ou seja, o uso do telefone
celular para acessar a Internet ultrapassou o uso de microcomputador nos domicílios
brasileiros. A pesquisa revela que quanto maior a classe de rendimento mensal domiciliar per
capita, maior o percentual de domicílios com Internet.
Em relação ao número de pessoas conectadas, já são 57,5% da população de 10 anos
ou mais de idade, ou seja, 102,1 milhões de pessoas. Observa-se também nos últimos anos
uma retração no uso da Internet via microcomputador pelas pessoas, diminuindo de 43,9%,
76
em 2014, para 40,9% em 2015. E registrou-se o aumento do uso da Internet somente por meio
de outros equipamentos de 10,5%, em 2014, a 16,6%, em 2015.
A análise por gênero revelou uma diferença em relação aos dados globais, que tem um
predomínio do acesso à Internet por pessoas do sexo masculino. Dados de 2015 mostra que,
no Brasil, as mulheres (58,0%) apresentaram proporção de usuários da Internet praticamente
igual à dos homens (56,8%). Em relação à faixa etária, os mais jovens são os maiores
usuários, e o grupo formado pelas pessoas de 18 ou 19 anos de idade alcançou o maior
percentual (82,9%). O menor foi observado entre as pessoas de 60 anos ou mais de idade
(17,4%). A utilização da Internet também mostrou relação direta com os anos de estudo,
sendo maior dentre os mais escolarizados.
Outra pesquisa realizada nesta área é a Pesquisa Brasileira de Mídia 2015 realizada
pelo Instituto Ibope Inteligência e contratada pela Secretaria de Comunicação Social da
Presidência da República. O Ibope utilizou dados do Censo Demográfico Brasileiro de 2010 e
da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio 2011 do IBGE, e realizou entrevistas, que
ocorreram em 2014. Foi estabelecida uma amostra nacional de 18.312 pessoas, distribuídas
em todo o país, com leituras por UFs. As entrevistas foram realizadas face a face em
domicílios brasileiros, coletadas através de tablets.
A Pesquisa mostra que metade dos brasileiros (48%) tem acesso à Internet, sendo que
37% usam todos os dias, que ficam em média 4h59min conectados por dia, durante a semana,
e 4h24min, nos finais de semana. No país, a escolaridade e a idade dos entrevistados são os
fatores que mais interferem na frequência e na intensidade do uso da internet. Entre os
usuários com ensino superior, 72% acessam a internet todos os dias, com uma intensidade
média diária de 5h41, durante a semana. Entre as pessoas com até a 4ª série, os números
caem para 5% e 3h22. Os 65% dos jovens na faixa de 16 a 25 se conectam todos os dias, em
média 5h51 durante a semana, contra 4% e 2h53 dos usuários com 65 anos ou mais.
O uso de aparelhos celulares como forma de acesso à internet já compete com o uso
por meio de computadores ou notebooks, 66% e 71%, respectivamente. Entre os internautas,
92% estão conectados por meio de redes sociais, sendo as mais utilizadas o Facebook (83%),
o Whatsapp (58%) e o Youtube (17%).
77
4.3 Dispositivos e aplicativos móveis - smartphone
O primeiro aparelho celular comercial foi lançado em 1983, embora os experimentos
de aparelhos de comunicação móvel para fins privados remontam à década de 1940
(MANTOVANI, 2005).
O DynaTAC 8000X pesava aproximadamente 1 kg, tinha 25 cm de comprimento, 7
cm de largura e 3 cm de espessura. Um ano após a sua criação - 1984 - tornou-se
disponível para os consumidores. Porém, o custo do aparelho, bem como das
ligações era bastante elevado (p. 3).
Com um processo contínuo de avanço tecnológico, esses aparelhos se transformaram
em smartphones, em meados da década de 1990, com o lançamento do aparelho Simon da
IBM, que combinava as funcionalidades de celular com computação. Em tradução literal,
smartphones significa telefones inteligentes, com alta tecnologia, similares a de um
computador pessoal (PC). São dispositivos multifuncionais – possui funções de telefone,
computador, máquina fotográfica, câmera de vídeo, processador de texto, GPS, dentre outros,
além de permitirem o acesso à Internet e, por conseguinte, às mensagens e sítios eletrônicos.
Também suportam funcionalidades avançadas por meio de programas adicionais de
aplicativos desenvolvidos para fins específicos. Chammas et al (2014) destacam que os
smartphones compete com os usos de computadores de mesa (desktop) e computadores de
colo (laptops), como também apresentado no tópico anterior. “Esses dispositivos móveis
(mobiles) se fizeram indispensáveis no cotidiano pela sua praticidade e mobilidade, e
estenderam as possibilidades do ser humano, que alcança tudo e todos e se faz alcançar da
mesma forma” (p. 1).
Nesse contexto, outro sistema de inovação tecnológica que vem tendo um crescimento
célere são os aplicativos móveis, conhecidos como app, oriundo do termo em inglês
application. Os aplicativos são programas (softwares) desenvolvidos por diferentes empresas
e pessoas físicas que rodam em sistemas operacionais específicos de cada dispositivo móvel –
que inclui Smartphone - e desempenham algumas atividades para os usuários.
Os apps são aplicativos desenvolvidos para rodar em dispositivos mobile,
disponíveis online e adequados ao sistema operacional do fabricante do dispositivo
que se propõem a incrementar a produtividade do usuário. Entre os sistemas
operacionais para smartphones existentes, quatro destacam-se em termos de
expressividade no mercado de apps. São eles: iOS, Android, Windows Phone e
Blackberry (CHAMMAS et al, 2014, p. 2).
78
Os aplicativos diferem por sua estrutura de navegação e pelo vínculo à plataforma de
distribuição, ou seja, às lojas de aplicativos denominadas app store. Segundo Statista apud
Cantelle (2016), a Apple App Store e Google Play Store são as duas maiores lojas de
aplicativos móveis da atualidade, sendo que a primeira disponibiliza aplicativos para rodar em
sistema iOs e a segunda, em Android. Estudos realizados por Cantelle (2016) mostram que,
em julho 2015, a Apple App Store tinha cerca de 1,5 milhão de aplicativos disponíveis, dentre
gratuitos e pagos, e a Google Play Store, cerca de 1,6 milhão, sendo que este número é
crescente a cada ano.
Em função também do alcance global mais amplo em comparação aos demais,
incluindo o iOS, o sistema operacional considerado nesta pesquisa é o Android, que é uma
plataforma baseada em Linux, desenvolvido pela empresa de tecnologia Google, que
disponibiliza o código do sistema operacional sob a licença de código aberto, que permite que
a comunidade de programadores desenvolva projetos e adicione recursos para usuários mais
avançado, tendo baixo custo.
4.4 Aplicativos móveis - temática água
Diante do exposto no tópico anterior, reforça-se a importância dos aplicativos móveis
como ferramenta de compartilhamento de informações e conhecimentos. Para Cantelle
(2016), a tecnologia, com suas funcionalidades práticas, permite, inclusive, avanços práticos
na gestão ambiental:
Para Jepson e Ladle (2015), na área ambiental, os apps têm o potencial de
transformar a maneira como os seres humanos interagem com a natureza, melhorar a
quantidade e a resolução de dados de biodiversidade, democratizar o acesso ao
conhecimento ambiental, e revigorar maneiras de apreciar a natureza (p.51).
Cantellle (2016) desenvolveu um estudo relativo aos aplicativos móveis que abordam
a temática água, junto à loja Google Play Store, período de 02 de novembro de 2015 a 21 de
fevereiro de 2016. A busca foi realizada na biblioteca Google Play Scraper e conferidos
manualmente na loja Google Play Store. No total, Cantelle (2016), localizou 2.282 aplicativos
relevantes, 60% (1.366) com descrições em inglês; 37% (835), em português; e 3% (81), em
79
espanhol. Cantelle (2016) informa que foram extraídas da biblioteca informações sobre o
nome do app, valores mínimo e máximo de download, avaliação por estrelas, desenvolvedor,
data da última atualização, versão do aplicativo, tamanho, classificação etária, categoria e
preço.
Os aplicativos selecionados estavam distribuídos em 23 categorias propostas pela loja
virtual, sendo as mais representativas Personalização (16,5%), Jogos (13,9%) e Educação
(8,8%). Mas também foram identificados aplicativos nas categorias Comunicação, Clima,
Estilo de vida, Medicina, Entretenimento, Compras, Corporativo, Ferramentas, Finanças,
Fotografia, Livros e referências, Turismo e local, Social, Esportes, Mídia e vídeos, Músicas e
áudios, Transporte, Produtividade, Saúde e fitness e Notícias e revistas. Cerca de 12% dos
aplicativos tinham caráter técnico, descritos como ferramenta auxiliar para profissionais da
área, relacionados às palavras vazão, irrigação, mecânica dos fluidos, hidrostática,
evaporação, aquicultura, qualidade da água e teor de humidade.
Em relação aos acessos, 47% dos aplicativos tinham de 100 a 5000 downloads. E
apenas 3.8% tiveram mais de um milhão de downloads. Foram verificados 22 aplicativos sem
nenhum acesso. No caso dos aplicativos técnicos, 85,13% possuem menos de 5.000
downloads. Em contrapartida, a avaliação geral foi positiva, sendo que 57,5% receberam
quatro ou cinco estrelas, no total de cinco. Grande parte dos aplicativos (88%) é
disponibilizado de forma gratuita.
Dentre os aplicativos estudados por Cantelle (2016), destacam-se: FLOW Calculator,
Isco FLOW e SCS Flood Calculator direcionados para cálculos de vazão; iQwtr utilizado para
calcular a transparência e a turbidez de amostras de água; Calculadora IQA que permite
calcular o Índice de Qualidade da Água pelo método da Companhia de Tecnologia de
Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesp); Rain Collection Calculator que
possibilita calcular a quantidade média de água disponível, em galões, a partir do escoamento
em um telhado ou estrutura similar; AgSense e Connected Farm Irrigate direcionados ao
controle e ao monitoramento de sistemas de irrigação que permite aos técnicos e agricultores
visualizar dados, enviar comandos para o pivô e gerenciar remotamente e em tempo real o
sistema; Portal Hidrológico do Ceará desenvolvido pelo Governo do Estado do Ceará em
parceria com a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) e a Fundação Cearense
de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) para disponibilizar informações hídricas
como nível, volume e capacidade dos reservatórios do Ceará monitorados pela Cogerh; Portal
80
Hidrológico do Nordeste desenvolvido por meio da Cooperação Técnica entre a ANA e
Funceme, com o módulo de monitoramento do nível dos reservatórios; DOWSER permite
obter os níveis da água subterrânea em zonas mapeadas; Controle Pluviométrico desenvolvido
para substituir os cadernos de registros de medição pluviométrica usados no campo;
Poimapper – Data Collection e Poimapper Plus permitem coletar e atualizar dados referentes
ao meio ambiente, à água, ao saneamento, dentre outros, podendo ser empregado na gestão,
monitoramento ambiental e no mapeamento de água e saneamento; LEI DE BOLSO - Vade
Mecum BR que disponibiliza mais de 1000 leis brasileiras, dentre elas, aquelas relacionadas à
água.
Embora não apresente de maneira aprofundada e sistematizada a correlação das
categorias dos aplicativos que tiveram o maior número de download e aquelas que não
tiverem nenhum download, o estudo demonstra que há uma grande produção no mercado
virtual de programas que tratam do tema água em suas múltiplas formas, seja de maneira
lúdica ou técnica. Infere-se, portanto, que há interesse entre os usuários desta tecnologia por
este tema.
Acrescenta-se a estes aplicativos apresentados por Cantelle (2016), outros dois recém-
lançados no âmbito da gestão de recursos hídricos que são: Água Doce, lançado no 8º Fórum
Mundial da Água, com o objetivo de ampliar o canal de acesso à informação dos sistemas de
dessalinização implantados pelo programa Água Doce, do Ministério do Meio Ambiente; e o
Atlas Água e Esgotos lançado em junho de 2018 pela ANA, que permite pesquisar a situação
do abastecimento de água e do esgotamento sanitário em todos os municípios brasileiros.
81
5 CARACTERIZAÇÃO DA SUB-BACIA DO RIBEIRÃO ARRUDAS
A sub-bacia do ribeirão Arrudas, foco deste trabalho de pesquisa, está inserida na
bacia hidrográfica do rio das Velhas, localizada na região central do Estado de Minas Gerais,
onde se encontra a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), uma das principais
responsáveis pela degradação hidroambiental deste território.
Ressalta-se que Minas Gerais é dividido em 36 Unidades de Planejamento e Gestão de
Recursos Hídricos (UPGRHs), estabelecidas pela Deliberação Normativa do Conselho
Estadual de Recursos Hídricos (CERH-MG), nº 06, de 04 de outubro de 2002, e a bacia do rio
das Velhas corresponde à UPGRH SF5, que pode ser observada no ANEXO .
A bacia do rio das Velhas drena uma área de cerca de 27.850 km2, e é o maior afluente
em extensão da bacia do rio São Francisco. O território da bacia do rio das Velhas abrange 51
municípios mineiros.
Atua neste território, desde de 1998, o Comitê da Bacia Hidrográfica (CBH) do Rio
das Velhas, que reúne 56 conselheiros, dentre titulares e suplentes, que são representantes do
poder público, sociedade civil e usuários de água - como setor de saneamento, empresas,
mineração, dentre outros.
Com o objetivo de promover a capilaridade e o fortalecimento da participação social, o
Comitê aprovou por meio da Deliberação Normativa CBH Rio das Velhas nº 01, de 09 de
fevereiro de 2012, a divisão de seu território de atuação em regiões de planejamento e gestão,
denominadas Unidades Territoriais Estratégicas (UTEs), agrupadas em quatro regiões de
planejamento: alto; médio alto, médio baixo e baixo.
A sub-bacia do ribeirão Arrudas é umas das 23 UTEs do CBH Rio das Velhas, que
estão listadas no Quadro 2, e conta com um subcomitê instituído em 25 de agosto de 2006,
composto por 18 conselheiros representantes também do poder público, usuários de água e
sociedade civil. Atualmente encontram-se instalados na bacia, 14 Subcomitês de Bacia
Hidrográfica (SCBH) de cursos d’agua afluentes ao rio das Velhas, ou seja, aproximadamente
61% das UTEs já possuem seus respectivos subcomitês (COMITÊ DA BACIA
HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015a).
82
Quadro 2 - Relação das UTEs do CBH Rio das Velhas
Região UTE/SCBH
Alto
1 UTE Nascentes
2 SCBH Rio Itabirito
3 UTE Águas do Gandarela
4 SCBH Águas da Moeda
5 SCBH Ribeirão
Caeté/Sabará
6 SCBH Ribeirão Arrudas 7 SCBH Ribeirão Onça
Médio Alto
8 UTE Poderoso Vermelho
9 SCBH Ribeirão da Mata
10 SCBH Rio Taquaraçu
11 SCBH Carste
12 SCBH Jabo/Baldim
13 SCBH Ribeirão Jequitibá
Médio Baixo
14 UTE Peixe Bravo
15 UTE Ribeirões Tabocas e
Onça
16 UTE Santo
Antônio/Maquiné
17 SCBH Rio Cipó
18 SCBH Rio Paraúna
19 UTE Ribeirão Picão
20 UTE Rio Pardo
Baixo
21 SCBH Curimataí
22 SCBH Rio Bicudo
23 UTE Guaicuí Fonte: CBH RIO DAS VELHAS, 2015a, p.36.
A UTE Ribeirão Arrudas está situada na região do Alto Rio das Velhas, em sua
margem esquerda, e abrange a RMBH, uma área altamente urbanizada, que abriga um dos
maiores parques industriais do País. Com uma área de 228,37km2, que representa 0,82% da
bacia do rio das Velhas, a UTE é composta pelos municípios de Belo Horizonte, Contagem e
Sabará (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b), como mostra
a Figura 4.
83
Figura 4 – Mapa da Sub-Bacia do Ribeirão Arrudas
Fonte: Elaborado por Nádia Santos com a base de dados do Igam, 2018.
5.1 Uso e ocupação do solo
De acordo com o Relatório de Diagnóstico Específico das UTEs do Plano Diretor de
Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (COMITÊ DA BACIA
HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b), a principal classe de uso do solo da sub-
bacia do ribeirão Arrudas é a área urbana, que ocupa 75,75%.
A classe de Área Urbana se caracteriza por regiões de uso intensivo, estruturadas por
edificações e sistema viário, onde predominam as superfícies artificiais não
agrícolas. Estão incluídas nesta categoria os grandes aglomerados urbanos (como a
região metropolitana de Belo Horizonte) que são responsáveis por integrar e exercer
forte influência sobre as cidades de menor porte, podendo transformar estes
aglomerados menores em polos regionais ligados ao grupo maior (CBH RIO DAS
VELHAS, 2015b, p. 433)
Os demais usos correspondem à vegetação arbustiva (16,48%), vegetação arbórea
(4,64%), agropecuária (2,54%), afloramento rochoso (0,30%), mineração (0,24%) e
84
hidrografia (0,06%), que podem ser observados na Figura 5. Ressalta-se que a região abriga
37 unidades de conservação, o que totaliza cerca de 4 mil hectares, ou seja, mais de 17% da
sub-bacia.
85
Figura 5 – Uso e ocupação do solo na sub-bacia do ribeirão Arrudas
Fonte: Elaborado por Nádia Santos com a base de dados do Igam, 2018.
86
Hidrografia
O ribeirão Arrudas nasce da confluência dos córregos Barreiro e Jatobá no município
de Contagem, no Parque Estadual da Serra do Rola Moça, e deságua no rio das Velhas no
distrito de General Carneiro, no município de Sabará. Tem 30,24km de extensão, sendo
1,39km em Contagem, 23,3km na capital mineira e 5,5km em Sabará, de acordo com dados
da base ottocoficada do Estado de Minas Gerais. Parte do trajeto do Arrudas ocorre em seu
leito natural e parte de forma canalizada.
Destaca-se que muitas publicações sobre a sub-bacia do ribeirão Arrudas informam
que o curso d’água tem aproximadamente 43km de extensão, incluindo o Plano Diretor da
Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS
VELHAS, 2015b). Infere-se que este dado esteja considerando como extensão do ribeirão
Arrudas, o córrego Barreiro, que tem 14,4km de extensão e está em sua área de nascente.
Outra publicação do CBH Rio das Velhas – Projeto de Valorização das Nascentes
Urbanas (201?), mostra que “ao longo desse percurso, o ribeirão Arrudas recebe a
contribuição de 44 afluentes, sendo 21 pela margem esquerda e 23 pela margem direita. Belo
Horizonte concentra 29 desses afluentes, Contagem abriga três, e em Sabará estão os outros
12” (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 201?, p 9). Os principais
cursos d’água são o ribeirão Arrudas, córrego do Barreiro, córrego do Jatobá e o córrego
Ferrugem. A hidrografia da região pode ser observada no ANEXO .
É importante ressaltar que foram mapeadas e cadastradas na bacia 183 nascentes, por
meio do Projeto Hidroambiental: “Valorização das Nascentes Urbanas”4, proposto e
construído pelos Subcomitês dos Ribeirões Arrudas e Onça e viabilizado com recursos da
Cobrança pelo Uso dos Recursos Hídricos na bacia do rio das Velhas, com prazo de execução
de 19/10/2011 a 18/12/2012. Além do mapeamento, o projeto visou o cadastramento de
cuidadores das nascentes, ou seja, promoveu a mobilização, a sensibilização e o engajamento
de moradores no cuidado de um bem público, além do desenvolvimento de planos de ações
4 O detalhamento do cadastramento das nascentes da bacia do ribeirão Arrudas pode ser acessado no endereço
eletrônico: http://www.agbpeixevivo.org.br/nascentesurbanas/index.php/ribeirao-arrudas
87
para revitalização desses nascedouros (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS
VELHAS, 201?).
Outra problematização importante no contexto da hidrografia do território se refere ao
modelo de urbanismo adotado pelos gestores municipais de Belo Horizonte, em sucessivas
administrações. Para Alessandro Borsagli (2014), esta lógica remonta ao período de
planejamento da construção da capital, quando a Comissão Construtora da Nova Capital
(CCNC), presidida pelo engenheiro Aarão Reis, ao propor a planta em 1895, ignorou os
cursos de água.
O erro começou aí: construir uma cidade quadriculada sobre um relevo acidentado
de uma das bordas do quadrilátero ferrífero, não levando em conta os cursos d’água
e acreditando que a natureza se submete ao ser humano, uma utopia racionalista –
utopia cuja falência é revelada todos os anos nos períodos chuvosos (BORSAGLI,
2014, p. 262).
É importante destacar que o urbanista e o engenheiro Francisco Saturnino Brito, que
dirigiu os projetos de abastecimento de água potável de Belo Horizonte entre 1894 e 1895,
tinha críticas ao projeto de desenvolvimento da nova capital, que não respeitava o patrimônio
natural preexistente. Ele ponderou, segundo Nilo de Oliveira Nascimento et al (2013), que:
(...) o traçado geométrico proposto (e finalmente implantado) para a cidade é muito
rígido por referência à rede hidrográfica natural do sítio, pequenos cursos d’água que
drenam vales estreitos em meio a uma topografia variada caracterizada por colinas e
terrenos íngremes. Ele ilustra suas críticas por meio de um traçado viário alternativo
que valoriza a adaptação da geometria das ruas de forma a incorporar os cursos
d’água ao plano urbano segundo a orientação dos estreitos fundos de vale (p. 117)
As argumentações de Brito não foram consideradas no plano e, hoje, parte dos rios e
córregos da sub-bacia do ribeirão Arrudas, incluindo o trecho do próprio ribeirão, fica
invisível aos olhos dos moradores, uma vez que seus percursos foram canalizados e estão sob
os asfaltos, alterando significativamente a paisagem natural da cidade.
O Ribeirão Arrudas figura como o protagonista do atual encaixotamento, sepultado
pelo Boulevard Arrudas, na verdade o alargamento de pistas para uma suposta
melhoria viária ao longo do seu curso. Para além da pressão automobilística para a
expansão viária, existe também uma pressão imobiliária que não é novidade na
cidade, cujo impacto sobre os cursos de água é enorme (BORSAGLI, 2014, p.260).
As retificações e canalizações ocorreram a partir da década de 1920, inicialmente para
expansão urbana na região sul da capital, e extrapolaram ao projeto inicial, tendo em vista o
crescimento vertiginoso da metrópole, sobretudo a partir da década de 1940. “Os rios, com os
quais a população até então convivera de forma relativamente harmoniosa, passaram a ser
88
protagonistas de conflitos entre o meio físico, a sociedade e o desenvolvimento”
(BORSAGLI, 2014, p 264).
O autor reforça que o ribeirão Arrudas, desde os primeiros anos da capital, já era
degradado por esgotos, lixos domésticos e outros despejos. Com o problema viário, a solução
encontrada pela Prefeitura de Belo Horizonte, como grande parte das administrações de
grandes centros urbanos, foi a de canalizá-lo, junto com outros córregos da região central,
tentando driblar também um problema de poluição e assoreamento, com seus impactos em
épocas de cheias. Posteriormente, as canalizações avançaram para além da Avenida do
Contorno, que inicialmente limitava a área urbana planejada da capital, separando-a da área
suburbana. Ressalta-se que as canalizações não melhoraram os problemas de enchentes.
“Todos os anos as ruas e avenidas sobre os córregos sofrem com inundações devido ao
grande escoamento de vertentes impermeabilizadas para fundos de vale também
impermeabilizados”. (BORSAGLI, 2014, p 267).
Dados da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), apresentados
por Borsagli (2016), mostram que Belo Horizonte tem cerca de 650km de cursos de água,
sendo que 200km se encontram canalizados a céu aberto ou escondido sob a malha viária.
Uso da Água
Dados do Plano Diretor da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (COMITÊ DA
BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b), mostra que o principal uso da água
na bacia, considerando as vazões médias de retiradas, é o industrial (53,34%), seguido por
urbano (32,36%), mineração (10,86%), irrigação (2,71%), animal (0,44%) e rural (0,28%).
Cobertura vegetal
A vegetação natural da bacia do ribeirão era caracterizada por uma área de tensão
ecológica, no contato entre a formação de Florestas Estacionais Semi-Deciduais (Mata
Atlântica) e as Savanas (Cerrado). O desmatamento da região ocupada pela Capital mineira se
iniciou ainda nos tempos do arraial do Curral del Rey e se intensificou com a construção de
Belo Horizonte. Dados do Plano Diretor da bacia do rio das Velhas (2015b) mostram, como
visto acima, que a vegetação arbustiva ocupa hoje 16,48% do território, e se caracteriza por
áreas naturais de cerrado, que incluem as seguintes tipologias: Cerrado Arborizado, Cerrado
Parque, Cerrado Gramíneo-Lenhoso com e sem Floresta de Galeria. Outros 4,64% da bacia
são ocupados por vegetação arbórea, que são árvores de grande porte presentes, sobretudo em
89
florestas e matas. Hoje, tem-se poucos remanescentes das formações vegetais originais, e a
maior parte das áreas verdes encontra-se em unidades de conservação ou esparsas na mancha
urbana (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b). O Plano
também mostra, no quadro da vegetação da bacia, a ocupação por agricultura (1,16%) e por
pecuária/pastagem (0,08%), e as qualificam como de uso antrópico. A região abriga 37
unidades de conservação (UCs), com cerca de 4 mil hectares, ou seja, 17,14% da sub-bacia.
As UCs podem ser visualizadas espacialmente no ANEXO C.
População
A população da região é estimada em mais 1,2 milhão de habitantes, dos quais 99,9%
residem na área urbana e 0,03% na zona rural. O município de maior porte é Belo Horizonte,
que concentra 93,7% da população da sub-bacia. Os dados são do Plano Diretor de Bacia
Hidrográfica do Rio das Velhas, que foram consistidos considerando a base de informação do
Censo Demográfico realizado pelo IBGE em 2010. A estimativa da população efetivamente
inserida no interior da sub-bacia foi feita considerando os setores censitários do IBGE, que
são unidades territoriais menores que o município e permite uma maior precisão no cálculo
aproximado, além de considerar a proporção territorial dos municípios inseridos na sub-bacia
(COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b).
Os dados apresentados no Plano Diretor diferenciam do estudo realizado a partir da
metodologia de estimativa da população residente em recortes territoriais que diferem do
recorte municipal, utilizada na Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais
(Feam), que aponta uma população estimada em 1,4 milhão de habitantes, embora ambos
apontem que 99,9% residem na área urbana. O cálculo foi realizado com o apoio voluntário
do analista ambiental da Feam, Alessandro Ribeiro Campos (informação verbal)5, baseando-
se também nos setores censitários do IBGE referentes ao Censo de 2010. A metodologia
consiste na sobreposição de camadas geográficas, referentes aos limites da sub-bacia e aos
setores censitários, através de sistemas de informação geográfica (SIG). Os setores censitários
são avaliados a partir da técnica de interseção espacial de estruturas vetoriais. Assim, faz-se
uma proporção territorial dos municípios inseridos nessa área: para os setores totalmente
inseridos dentro dos limites da sub-bacia são contabilizados a população total residente e, para
os setores parcialmente inseridos, é aplicado a proporção da área inserida.
5 Dados repassados em visitas exploratórias à Feam feitas pela mestranda em agosto de 2018.
90
Diante dos dados anteriormente apresentados, é importante destacar a existência de
inconsistências, recorrentes, nesses dados ao se considerar a bacia hidrográfica como unidade
o territorial: os dados socioeconômicos e, inclusive, ambientais estão disponíveis em grande
parte considerando a divisão consagrada político-administrativa do território nacional.
A distribuição da população no território da sub-bacia do ribeirão Arrudas pode ser
observada na Figura 6, na qual é possível observar a área dos setores censitários que
extrapolam a área da sub-bacia.
91
Figura 6 – Distribuição da população no território da bacia do ribeirão Arrudas
Fonte: Elaborado por Nádia Santos com dados: do Censo IBGE, 2010
92
O Pano Diretor do Rio das Velhas também correlaciona diferentes dados, além do
censo demográfico realizado pelo IBGE em 2010, como o censo de 2000 e o Atlas do
Desenvolvimento Humano no Brasil, que permite uma estimativa da população residente em
1991 segundo a distribuição territorial dos municípios em 2000. Nesse sentido, o documento
apresenta a taxa de crescimento da população urbana na sub-bacia no período de 1991/2010.
Observa-se na Tabela 1 que a taxa de crescimento da população urbana no período 2000/2010
foi de 0,6% a.a. No mesmo período, a taxa de crescimento da população rural foi positiva –
1,8% a.a.
Tabela 1 – Taxa anual de crescimento da População dos municípios da UTE Ribeirão (1991/2010)
Unidade
Territorial
Total Urbana Rural 1991/2000 2000/2010 1991/2000 2000/2010 1991/2000 2000/2010
Belo Horizonte 0,6 0,3 0,6 0,3 - -
Contagem 0,3 0,2 0,4 0,2 - -
Sabará 0,3 01, 0,6 0,1 -2,1 0,2
UTE Ribeirão
Arrudas
1,2 0,6 1,3 0,6 -17,5 1,8
Bacia do rio das
Velhas
1,8 1,0 2,3 1,0 -6,1 -1,2
Nota: Dados do Censo Demográficos 1991, 2000, 2020 (IBGE). Estimativa proporcional à área dos setores
censitários na UTE
Fonte: CBH RIO DAS VELHAS, 2015b, p. 457
Análise presente no documento infere que a região não representa um polo de atração
para população e destaca:
Segundo o Censo Demográfico 11,1% da população dos municípios da UTE
Ribeirão Arrudas residia neste município a menos de 10 anos de forma ininterrupta
em 2010, representando uma boa aproximação da população migrante no período.
Deste total de pessoas migrantes, 73,4% residia na UTE a menos de cinco anos. Este
resultado é próximo do registrado para o conjunto dos municípios da bacia, que
contava em 2010 com 14,7% da população residente a menos de 10 anos em seu
município de origem, dos quais 72,0% a menos de cinco anos (COMITÊ DA
BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b, p. 457).
Nesse contexto, também é importante apresentar informações sobre o Coeficiente ou
Taxa de Mortalidade Infantil (CMI), que consta no PDRH-Rio das Velhas. Este mede o risco
de morte para crianças menores de um ano em relação ao total de nascidos vivos em um local
e período, informando a condição média de saúde e de saneamento básico da área.
A taxa de mortalidade infantil para o conjunto dos municípios da bacia do ribeirão
Arrudas registrada no período 2006/2010 é de 11,8 óbitos para cada 1000 nascidos vivos. Este
93
valor está próximo do aceitável pela Organização Mundial da Saúde que é de 10 óbitos por
1000 nascidos vivos, atribuído a causas naturais, mesmo com as condições de saúde e
saneamento adequadas. Registra-se, ainda, que o cálculo da taxa de mortalidade, expressa no
Plano Diretor, utilizou como base a estatística de registro civil do IBGE e o método direto
sobre o total de registros no ano (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS
VELHAS, 2015b).
Economia
O PDRH-Rio das Velhas também apresenta dados relativos à atividade econômica da
região do ribeirão Arrudas. O Produto Interno Bruto (PIB), no ano de 2010, foi de cerca de
R$28.3 bilhões, dos quais R$25.4 bilhões gerados no município de Belo Horizonte. O
território é marcado pela atividade de serviço, com um PIB superior a R$19,2 bilhões, seguido
de imposto (R$4,6 bilhões) e setor industrial (R$4,5 bilhões). O cálculo considerou uma
estimativa de PIB dos municípios, com base na área proporcional dos municípios na sub-
bacia. Cabe salientar que parte da Cidade Industrial de Contagem está situada no território do
ribeirão Arrudas (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA RIO DAS VELHAS, 2015b).
No que diz respeito à produção agropecuária, o Plano Diretor mostra que a região tem
uma estrutura fundiária baseada na distribuição de terras, uma vez que a maioria dos
estabelecimentos (37%) possui de 4 a 20 hectares e 35,1%, menos de 4 hectares. As principais
culturas temporárias são milho e cana-de-açúcar. A única cultura permanente registrada é a de
banana. O maior rebanho é o de bovinos, seguido por equinos, suínos e aves.
5.2 Qualidade das Águas
O processo de urbanização que se acelerou na segunda metade do século XX, sem o
devido planejamento sustentável, agravou os problemas da gestão das águas nas cidades,
impactando na sua qualidade e quantidade. De acordo com os Indicadores de
Desenvolvimento Sustentável 2015, do IBGE, os rios mais poluídos no Brasil se encontram
94
em áreas urbanas. Na sub-bacia do ribeirão Arrudas, que tem cerca de 75,75% do seu
território em área urbana, não é diferente: as condições hidroambientais são críticas.
O monitoramento da qualidade das águas na região é realizado pelo órgão gestor de
recursos hídricos do Estado – Igam – em duas estações de amostragem, sendo elas:
a) ponto BV155, no ribeirão Arrudas, próximo a sua foz no rio das Velhas,
depois da Estação de Tratamento Arrudas (ETE Arrudas); e
b) ponto BV081, no córrego do Barreiro no Parque Ecológico Rodrigo Burle
Marx.
Os pontos de amonstragem podem ser obervados na Figura 7.
Figura 7 - Mapa com os pontos de monitoramento da qualidade da água na bacia do ribeirão Arrudas
Fonte: Elaborado por Matheus Santos com dados do Igam, 2018
Na sequência serão apresentados os resultados do Índice da Qualidade da Água (IQA),
do Índice Contaminação por Tóxico (CT) e do Índice Biótico “BMWP”, monitorados pelo
Igam. A conceituação de cada um deles, bem como os resultados, tendo como base a série
histórica do monitoramento do Igam.
95
Índice de Qualidade da Água (IQA)
O IQA, adotado pelo Igam, é composto por nove parâmetros, sendo escolhidos aqueles
considerados pelos especialistas como os mais representativos para a caracterização da
qualidade das águas (INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2015): oxigênio
dissolvido, coliformes termotolerantes, pH, demanda bioquímica de oxigênio (DBO), nitrato,
fosfato total, variação da temperatura da água, turbidez e sólidos totais.
O IQA é particularmente sensível à contaminação por esgotos, sendo um índice de
referência normalmente associado à qualidade da água bruta captada para o
abastecimento público após o tratamento. Assim definido, o IQA reflete a
interferência por esgotos domésticos e outros materiais orgânicos, nutrientes e
sólidos. (INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2018, p. 20).
O índice varia de 0 a 100 e é categorizado entre muito ruim (<25) e excelente
(90<IQA≤100), conforme Quadro 3:
Quadro 3 - Classes do Índice de Qualidade da Água e seu Significado
Valor do IQA Classes Significados
90 < IQA ≤ 100 Excelente Águas apropriadas para tratamento
convencional visando o abastecimento
público 70 < IQA ≤ 90 Bom
50 < IQA ≤ 70 Médio
25 < IQA ≤ 50 Ruim Águas impróprias para tratamento
convencional visando o abastecimento
público, sendo necessários tratamentos
mais avançados.
IQA ≤ 25 Muito Ruim
Fonte: INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2018.
No ponto de amostragem no ribeirão Arrudas (BV155) foi registrado em 2017 o IQA
Muito Ruim, uma das piores condições observadas pelo órgão gestor no Estado, com a média
anual de 24,4. Em relação à série histórica, o monitoramento no ribeirão Arrudas é realizado
desde 1997 e os resultado podem ser observados no Gráfico 1. Nota-se uma variação entre
IQA Ruim e Muito Ruim nos últimos 20 anos, sendo que a média para todo o período
analisado é 25,3, ou seja, IQA Ruim.
96
Gráfico 1 – Série história do monitoramento do IQA no ponto BV155, de 1997-2017
Fonte: Elaborado pela autora com dados do Igam, 1997-2017.
De acordo com o resumo executivo do Igam (2018), o baixo índice de qualidade
registrado neste ponto de monitoramento pode estar associado a lançamentos de esgotos
domésticos de Belo Horizonte e do Distrito de General Carneiro em Sabará, além de efluentes
de indústrias metalúrgicas, siderúrgicas, químicas e têxteis.
Para garantir as diferentes necessidades de usos da água na bacia, este trecho foi
enquadrado pela Deliberação Normativa Copam nº 20/1997 (CONSELHO ESTADUAL DE
POLÍTICA AMBIENTAL, 1997) em classe 36, ou seja, deve ser mantida ou alcançada uma
qualidade da água que permita o abastecimento humano, após tratamento convencional ou
avançado, a irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras, a pesca amadora, a
recreação de contato secundário e a dessedentação de animais. Os resultados, portanto, não
atendem a esta meta de qualidade (classe). Cabe ressaltar que o enquadramento em questão
não foi realizado dentro das diretrizes da nova Política de Recursos Hídricos, inclusive, sendo
apreciado pelo Copam e não pelo CERH.
6 O enquadramento de corpos d’água estabelece o nível de qualidade a ser alcançado ou mantido ao longo do
tempo. Mais do que uma simples classificação, o enquadramento deve ser visto como um instrumento de
planejamento, pois deve tomar como base os níveis de qualidade que deveriam possuir ou ser mantidos para
atender às necessidades estabelecidas pela sociedade e não apenas a condição atual do corpo d’água em questão.
22,8 27,3
22,8
30,9
20,2 19,8 24,2
33,8
22,1 23,5 23,8 25,4 31,2 30,9
25,4 22,9 26,2 27,9
22,7 22,6 24,2
Média Anual do IQA - BV155
Excelente
Bom
Médio
Ruim
Muito Ruim
97
No ponto no córrego Clemente ou córrego do Barreiro (BV081), situado no Parque
Ecológico Rodrigo Burle Marx, foi registrado em 2017 IQA Bom, com média anual de 80,9.
Localizado na região de nascentes, este trecho foi enquadrado pela Deliberação Normativa do
Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) nº 20/1997 em classe especial, destinada
ao abastecimento para consumo humano, com filtração e desinfecção; à preservação do
equilíbrio natural das comunidades aquáticas; à preservação dos ambientes aquáticos em
unidades de conservação de proteção integral. “Os resultados atenderam integralmente à
classe Especial” (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DAS VELHAS, 2015b,
p. 487).
A série histórica do monitoramento da qualidade das águas neste no ponto BV081 é de
2012 a 2017, com uma média de 79,6 no período analisado, como pode ser observado no
Gráfico 2.
Gráfico 2 - Série história do monitoramento do IQA no ponto BV081, de 2012-2017
Fonte: Elaborado pela autora com dados do Igam, 2012-2017
Diante dos dados de IQA, o que se constata é que na região de nascente, situada em
área de conservação, a bacia apresenta água de boa qualidade, mas à medida que adentra na
área urbana sofre impacto sobretudo das cargas de efluentes domésticos e industriais, que são
despejados nos cursos d’águas sem tratamento adequado e/ou insuficiente para garantir a
qualidade da água, inclusive, considerando o padrão de classe 3, do trecho do ribeirão
Arrudas. Os mapas com a série histórica da qualidade da água da bacia nos dois trechos estão
expostos no ANEXO D.
82 78,4 81,2 80,8
75,8 80,9
Média Anual do IQA - BV081
Excelente
Bom
Médio
Ruim
Muito Ruim
98
Índice Contaminação por Tóxico (CT)
O índice Contaminação por Tóxico (CT), adotado pelo Igam, avalia a presença de 13
substâncias tóxicas nos corpos de água: arsênio total, bário total, cádmio total, chumbo total,
cianeto livre, cobre dissolvido, cromo total, fenóis totais, mercúrio total, nitrito, nitrato,
nitrogênio amoniacal total e zinco total. Os resultados das análises laboratoriais são
comparados com os limites definidos para as respectivas classes de enquadramento dos
corpos de água, e estabelecidos pela Deliberação Normativa Conjunta Copam/CERH nº
01/08. O Quadro 4 apresenta as três faixas de classificação do CT.
Quadro 4 - Classes da Contaminação por Tóxicos e seus significados
Valor CT / classe de
enquadramento
Contaminação Significado
Concentração ≤ 1,2 P Baixa Refere-se à ocorrência de substâncias
tóxicas em concentrações que excedem
em até 20% o limite de classe de
enquadramento do trecho do corpo de
água onde se localiza a estação de
amostragem.
1,2 P < Concentração ≤ 2
P
Média Refere-se à faixa de concentração que
ultrapasse os limites mencionados no
intervalo de 20% a 100%.
Concentração > 2P Alta Refere-se às concentrações que excedem
em mais de 100% os limites. Nota: P= limite da classe definido pela Resolução Conama nº 357/2005 ou pela Deliberação Normativa Conjunta
COPAM/CERH nº 01/2000.
Fonte: INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2015.
Em Minas Gerais, 85% pontos monitorados apresentaram a ocorrência de CT Baixa,
em 2017. A CT Alta foi observada em 11% dos pontos monitorados, sobretudo nas áreas
urbanizadas, como consta no resumo executivo do Igam:
Já contaminação Alta ocorre principalmente a jusante de grandes centros urbanos
como a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), em toda a extensão do
rio das Velhas, além das bacias do rio Paraopeba, rio Pará, rio Piranga, rio Suaçuí
Grande e rios Pomba e Muriaé. Essa condição é favorecida pela presença de áreas
urbanas, indústrias, mineração e uso de insumos agrícolas nessas regiões.
(INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2018, p. 47).
Seguindo a tendência do IQA, também foi registrado, em 2017, CT Alta no ponto de
monitoramento BV155 (ribeirão Arrudas). A séria histórica também apresenta como média, a
CT Alta para todo o período analisado, como mostra o Quadro 5.
99
Quadro 5 - Série história do monitoramento da CT no ponto BV155, de 1997-2017
Ano Classe de Contaminação por Tóxico
1997 Alta
1998 Alta
1999 Alta
2000 Alta
2001 Alta
2002 Alta
2003 Alta
2004 Alta
2005 Alta
2006 Alta
2007 Alta
2008 Alta
2009 Baixa
2010 Baixa
2011 Média
2012 Alta
2013 Média
2014 Média
2015 Baixa
2016 Alta
2017 Alta
Fonte: Elabora pela autora com dados Igam, 1997- 2017
Acrescenta-se que nos anos de 1997 a 2004, a ocorrência de CT estava associada à alta
concentração do parâmetro nitrogênio amoniacal, o que pode estar relacionado à poluição por
esgoto doméstico, sendo que no ano de 1999, também foi constatada a alta concentração do
parâmetro chumbo. Nos demais anos, a CT Alta ocorreu em função dos parâmetros cobre
(2005), cianeto (2006), nitrogênio (2007), cianeto (2008); cobre (2012), chumbo (2016) e
nitrogênio (2017). A violação de chumbo, cobre e cianeto pode estar associada aos efluentes
industriais sem tratamento nos corpos de água na bacia.
100
O BV081, como informado anteriormente, está situado em um trecho de rio
enquadrado em Classe Especial. A DN Conjunta Copam e CERH n. 01/2008, que dispõe
sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento,
bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, não indica limites
para os parâmetros de CT nesse tipo de classificação. Desta forma, não é possível calcular o
CT para este ponto. A normativa determina que nas águas de classe especial deverão ser
mantidas as condições naturais do corpo de água, bem como veda o lançamento de efluentes
ou disposição de resíduos domésticos, agropecuários, de aquicultura, industriais e de
quaisquer outras fontes de poluição, mesmo que tratados.
Índice Biótico “BMWP” – Biomonitoramento
O índice BMWP, sigla em inglês - Biological Monitoring Working Party Score
System, reflete a qualidade ecológica da água, e é calculado considerando os limites de
tolerância à poluição orgânica para a maioria das famílias de macroinvertebrados bentônicos.
Estes organismos aquáticos habitam o fundo de rios e lagos e são sensíveis à poluição, por
isso são utilizados como bioindicadores para avaliar a qualidade de água.
Os níveis de qualidade do Índice Biótico são classificados como Péssimo (<25), Ruim
(40 a 26), Regular (60 a 41), Bom (80 a 61) e Excelente (>81). Este número é resultado do
somatório de um valor (score) atribuído a cada família, sendo que as mais sensíveis à
poluição têm um peso maior, variando de 0 ao número total de famílias identificadas.
Para a realização do biomonitoramento de macroinvertebrados na bacia hidrográfica
do rio das Velhas, o Igam adotou a frequência anual, e somente nos períodos de estiagem.
101
O Quadro 6 apresenta as faixas de classificação do Biomonitoramento adotado pelo
Igam.
Quadro 6 - Classes do Índice BMWP (Biomonitoramento) e seus significados
Classe Índice Biótico Qualidade de Água (BMWP)
1 >81 Excelente
2 80 – 61 Bom
3 60 – 41 Regular
4 40 – 26 Ruim
5 <25 Péssimo
Fonte: INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2015.
Na sub-bacia do ribeirão Arrudas o biomonitoramento é realizado nos dois pontos de
amostragens onde são analisados o IQA (BV155 e BV081).
No ponto BV155, no ribeirão Arrudas, que apresentou IQA Muito Ruim em 2017, o
cálculo de BMWP resultou no valor 1. Nesse trecho, só foram encontrados indivíduos
classificados como Oligochatea, que são conhecidos popularmente como minhocas. Não
foram encontrados outros organismos, “resultado de uma baixa diversidade do nicho de
macroinvertebrados bentônicos e, portanto, indicando um ambiente altamente impactado”
(INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS ÁGUAS, 2018, p. 69). A série histórica deste
ponto – de 2013 a 2017 – mostra apenas o resultado “Péssimo”.
No ponto BV081, localizado no córrego Clemente ou córrego do Barreiro, em área de
preservação, foi constatado em 2017 BMWP excelente, no valor 132. Na série histórica do
monitoramento na bacia, de 2012 a 2017, foram registrados índices excelentes, exceto no ano
de 2016, que foi registrado o índice “bom”.
102
5.3 Saneamento Básico
A sub-bacia hidrográfica do ribeirão Arrudas é composta pelos municípios de Belo
Horizonte, Contagem e Sabará, que tiveram processos diferenciados de urbanização e
desenvolvimento territorial, que impactaram no saneamento básico também de forma
diferenciada.
Belo Horizonte foi planejada para ser a Capital mineira, cuja construção ocorreu de
1894 a 1897, e o planejamento tinha perspectiva higienista, visando uma cidade limpa,
organizada e salubre. Para o esgotamento sanitário, foi escolhido o sistema separador
absoluto, para que os esgotos e as águas pluviais corressem em redes distintas. A proposta era
de que os esgotos seguissem até uma área destinada à depuração por infiltração no solo. O
referido sistema, entretanto, não ficou pronto para a inauguração da cidade, em 1897, e o
saneamento foi negligenciado nas gestões municipais seguintes, com os esgotos despejados in
natura nos rios. Na área suburbana, os esgotos corriam pelas ruas. De acordo com Carla
Wstane Moreira (2013), coexistiam duas realidades distintas nesse território:
[...] a cidade das classes média e alta, e a cidade da periferia, com suas distâncias
mutuas e índices urbanos e sociais perversamente diferenciados. Não seria uma sem
a outra. Se uma chega quase ao próximo século, a outra enfrenta problemas
sanitários tidos já como erradicados no final do século passado. (MONTE-MÓR
apud MOREIRA, 2013, p.76).
De acordo com a pesquisadora, em 1965, foi instituído no município o Departamento
Municipal de Águas e Esgotos (Demae) e criado o Conselho Municipal de Águas e Esgotos,
de caráter consultivo e opinativo, com conselheiros de diferentes áreas do conhecimento e
diferentes órgãos da Prefeitura. A revitalização das bacias que compõem a capital, entretanto,
começou a ser planejada na década de 1990, com o Programa de Saneamento Ambiental das
Bacias do Ribeirão Arrudas e Onça na Região Metropolitana de Belo Horizonte (Prosam),
mas não contavam com dados dos efluentes industriais. Assim, em 2003 foi criado o
Programa de Recebimento e Controle dos Efluentes Não Domésticos (Precend). Dois anos
antes, em 2001, foi instituída a Política Municipal de Saneamento (Lei 8.260/2001),
antecedendo a Lei Federal 11.445/07, que engloba o abastecimento de água potável, o
esgotamento sanitário, a limpeza urbana e manejo dos resíduos sólido e a drenagem e manejo
das águas pluviais. Naquele mesmo ano, foi construída a primeira Estação de Tratamento de
Esgoto na sub-bacia, a ETE Arrudas.
103
Já Contagem, que pertenceu à Sabará e Esmeraldas, foi elevada a município em 1911 e
tinha características de um município rural, com a economia baseada na pecuária. Em 1938,
perde sua condição de município, passando a pertencer a Betim. Na década de 1940, passou a
abrigar o maior complexo industrial de Minas Gerais, com impactos negativos significativos
para o uso da água e ao meio ambiente, especialmente na sub-bacia do ribeirão Arrudas, que
“concentra maior população, atividade comercial, de serviços e industriais” no município
(CONTAGEM, 2013, p. 68). O Sistema Municipal de Saneamento de Contagem foi
institucionalizado pela Lei 4377 de 2010, e o Plano Municipal de Saneamento Básico,
elaborado em 2013.
Sabará, um arraial de Bandeirantes, é o município mais antigo na sub-bacia do ribeirão
Arrudas, emancipado desde 1711, e tinha o nome de Vila Real de Nossa Senhora da
Conceição do Sabará. Ainda não possui plano de saneamento aprovado pelo município,
embora sua construção esteja em andamento, e o Plano Diretor de Recursos Hídricos do Rio
das Velhas, em seu recorte da sub-bacia do ribeirão Arrudas, apresenta poucos dados
referentes ao saneamento neste município.
É importante ressaltar que, com a nova legislação, o planejamento do saneamento
básico é de responsabilidade do município, e a prestação dos serviços pode ser feita pelo ente
público municipal ou por concessionária pública e/ou privada. Um dos princípios
fundamentais é a universalização dos serviços, com uma ampliação progressiva do acesso ao
saneamento básico.
Abastecimento
De acordo com dados do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Bacia do Rio das
Velhas (2015b), os municípios da sub-bacia do ribeirão Arrudas são abastecidos com água,
sobretudo, por sistemas localizados fora da região. “Apenas 5% da água para abastecimento
de Belo Horizonte é proveniente dessa UTE. Já Contagem é totalmente abastecida pelo
Sistema Integrado Paraopeba, com captações fora da bacia do rio das Velhas” (COMITÊ
DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DAS VELHAS, 2015b, p. 468). O documento
mostra que o índice de atendimento de água na região é de 100%, superior ao da bacia do rio
das Velhas (93,38%) e do Brasil (93,1%).
Registra-se, ainda, um consumo per capita médio de 154,10 L/hab.dia, que representa
o consumo requerido pelo indivíduo da sub-bacia, por dia. Para fins de comparação, a média
104
per capita de consumo de água no Brasil, de acordo com dados disponível no site Trata Brasil,
é de 165,3165,3L/hab.dia, considerando os três últimos anos, sendo que a média na região
Sudeste é de 192L/hab.dia.
O plano diretor da bacia também indica uma perda de água na distribuição de 35,48%,
superior à perda na bacia do rio das Velhas como um todo (30,98%), embora, seja inferior à
do Brasil (38,80%) - (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DAS VELHAS,
2015b).
Na sub-bacia do ribeirão Arrudas, os três municípios são atendidos pela Companhia de
Saneamento de Minas Gerais (Copasa).
Esgotamento sanitário
O Plano Diretor de Recursos Hídricos da Bacia do Rio das Velhas mostra que de todo
o esgoto produzido na sub-bacia, 60% é coletado, mas apenas 44% é tratado. Destaca também
que do esgoto coletado, 69,20% é tratado, como mostra a Tabela 2.
Tabela 2 - Serviços de esgotamento sanitário na UTE Ribeirão Arrudas.
UTE
Volume de
esgoto
produzido
[1.000
m³/ano]
Volume de
esgoto
coletado
[1.000
m³/ano]
Volume de
esgoto
tratado
[1.000
m³/ano]
Índice de
tratamento
de esgoto
coletado [%]
Carga de
DBO
remanescente
[Kg/dia]
DBO
removida
[%]
UTE
Ribeirão
Arrudas
228.769,96 137.936,38 100.687,91 69,20 90.897,15 44,05%
Nota: A carga de DBO foi calculada considerando uma carga de 54 g/hab.dia. A carga de DBO remanescente e
a DBO removida foram calculadas considerando o índice de esgoto tratado, informado pelo município ao
SNIS (2010).
Fonte: COMITÊ DA BACIA DO RIO DAS VELHAS, 2015b, 470
O Plano Municipal de Saneamento de Belo Horizonte (2016) destaca a dificuldade
com o gerenciamento da infraestrutura de esgotamento sanitário na capital, correlacionando
com a opção da Comissão de Construção da Nova Capital (CCNC), em 1894, pelo projeto
que continha um traçado geométrico rígido, recusando a proposta do engenheiro Saturnino de
Brito, que baseava o traçado no sistema natural de escoamento das águas.
O sistema adotado atualmente no município é o separador absoluto, com redes
coletoras e interceptoras que conduzem os esgotos às estações de tratamento. O Plano de
105
Saneamento (BELO HORIZONTE, 2016), entretanto, aponta a deficiência da interceptação
dos esgotos em várias áreas.
Tendo em vista a ausência ou a descontinuidade do sistema de interceptação, grande
parte dos córregos do Município, canalizados ou não, encontram-se poluídos por
lançamentos de efluentes de origem industrial e, principalmente, domiciliar. Existe,
ainda, um grande número de ligações clandestinas e lançamentos de esgoto na rede
de drenagem pluvial (BELO HORIZONTE, 2016, p. 32)
O documento também destaca que as áreas não atendidas correspondem sobretudo a
vilas e favelas e lista as dificuldades para a execução de obras convencionais nessas regiões
(BELO HORIZONTE, 2016, p. 34):
a) o traçado e a largura de vielas e becos muitas vezes não permitem a
implantação conjunta de rede de drenagem e de esgotos;
b) a ocupação desordenada cria situações desfavoráveis como, por exemplo,
fundos de vale em interior de quarteirão, ausência de pontos de lançamento,
formação de áreas de risco etc.;
c) o dinamismo da ocupação dificulta o planejamento de ações de médio e
longo prazo;
d) a ausência e/ou precariedade de infraestrutura urbana, muitas vezes
executada pelos próprios moradores, na maioria das vezes dificulta e encarece
a implantação dos sistemas de esgotamento sanitário.
Para tentar sanar o problema, a Prefeitura de Belo Horizonte, ao assinar um novo
convênio com a Copasa, em 2002, assumiu a responsabilidade de atuar nas áreas de
urbanização precária da cidade. “Assim, a partir dessa data, as ações de saneamento dentro
das vilas e favelas passaram a ser implantadas de maneira integrada pela PBH, com
recursos repassados pela Copasa, conforme os termos do Convênio” (BELO HORIZONTE,
2016, p. 35).
O Plano Municipal de Saneamento Básico Contagem (CONTAGEM, 2013) ressalta
que os esgotos coletados no município, no trecho inserido na sub-bacia do ribeirão Arrudas,
são encaminhados por interceptores para tratamento, mas que também existem sérios
problemas de lançamentos clandestinos diretamente nos cursos d’água e ligações de rede
coletora em galerias pluviais.
Estão em operação na sub-bacia duas Estações de Tratamento de Efluentes (ETE):
ETE Arrudas, em operação desde 2001, com capacidade de tratamento de 3.375 L/s e ETE
106
Pilar Olhos D’agua, de 2003, de pequeno porte. Os serviços de esgoto nos três municípios
também são realizados pela Copasa.
Resíduos sólidos
Em relação aos resíduos sólidos, o PDRH Rio das Velhas – Caderno UTE Ribeirão
Arrudas – informa de maneira superficial que o município de Belo Horizonte possui uma taxa
de cobertura dos resíduos sólidos, na sub-bacia, de 95%, e Contagem, somente 0,02%, ambos
com coleta diferenciada para os resíduos do serviço de saúde. A destinação final dos resíduos
sólidos é o aterro sanitário, caracterizado por adequada disposição do lixo no solo, sob
controle técnico e operacional permanente, de modo que nem os resíduos, nem seus efluentes
líquidos e gasosos, venham a causar danos à saúde pública e/ou ao meio ambiente (COMITÊ
DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DAS VELHAS, 2015b).
De maneira complementar, observou-se no Plano Municipal de Saneamento Básico de
Belo Horizonte, que os serviços de limpeza urbana na capital são realizados pela autarquia
municipal denominada Superintendência de Limpeza Urbana (SLU). De acordo com o estudo
de 2003, apresentados no referido documento (PBH, 2016), a geração diária média per capita
apurada foi de 0,692 kg/habitantes/dia, sendo que cerca de 60% é composta de matéria
orgânica. A taxa de cobertura dos resíduos sólidos a capital é de 95%, e parte dos resíduos
sólidos urbanos produzidos na localidade é transferida para o aterro sanitário da Central de
Tratamento de Resíduos Macaúbas S/A (CTR/Macaúbas), localizado no município de Sabará,
viabilizado por meio de Parceria Público-Privada, na modalidade Concessão Administrativa,
realizada em 2008. Os resíduos de saúde, coleta seletiva e oriundos da construção civil e
demolição são destinados para uma Central de Tratamento de Resíduos Sólidos, em Belo
Horizonte.
Em Contagem, a geração média per capita de 0,8kg/habitantes/dia, em 2010. Os
resíduos sólidos têm como destinação final o aterro sanitário, e a cobertura do serviço para
toda a cidade é de 99%. “O percentual que não é atendido corresponde à prestação dos
serviços em locais de difícil acesso, como vilas e áreas no perímetro rural” (CONTAGEM,
2013, p. 143).
Sabará abriga um aterro sanitário que atende a Região Metropolitana de Belo
Horizonte, denominado CTR/Macaúbas, que está em operação desde 2005.
107
Drenagem urbana
De acordo com o Plano Diretor da Bacia (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA
DO RIO DAS VELHAS, 2015b), os municípios de Contagem e Belo Horizonte apresentam
serviços de drenagem urbana subterrâneo, com áreas de risco nos perímetros urbanos que
demandam drenagem especial. Informa, ainda, que Belo Horizonte, possui Plano Diretor de
Manejo de Águas Pluviais.
Em relação à identificação de áreas de alto risco a deslizamentos e inundações dentro
dos municípios, o documento mostra que Sabará possui uma área de risco de
alagamento/inundação próximo à localidade Paciência, que é uma planície de inundação do
rio das Velhas. Há outra área com risco de inundação na Vila Dom Bosco, na divisa entre
Belo Horizonte e Contagem, onde ocorre ocupação das margens, estrangulamento do canal do
ribeirão Arrudas e drenagem insuficiente em todo o setor. Em Contagem há mais duas áreas
com risco de inundação/solapamento: Vila São Paulo (Distrito Industrial) e Vera Cruz. As
duas áreas apresentam características semelhantes: “declividade entre 0 e 10%, entulho e lixo,
estrangulamento do canal, erosão das margens, cicatriz de escorregamento e trincas em
moradia” (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DAS VELHAS, 2015b, p 474).
5.4 Institucional
O planejamento e a gestão de recursos hídricos, como a própria legislação preconiza,
abrangem múltiplas territorialidades e diferentes escalas e, por conseguinte, envolvem um
conjunto de instituições que se sobrepõem em suas atuações em uma determinada bacia, que
deveriam ser entrelaçadas por uma gestão integrada, embora esta ainda seja uma meta a ser
perseguida.
Nesse contexto, o presente tópico tem por objetivo identificar as principais instituições
que são responsáveis direta ou indiretamente pela gestão das águas na bacia do ribeirão
108
Arrudas, considerando prioritariamente aquelas que compõem os Sistemas Nacional
(SINGREH)7 e Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SEGRH)
8.
As principais instituições de âmbito nacional que compõem o SINGREH, com suas
competências, estão listadas abaixo:
Ministério de Meio Ambiente (MMA) - criado em 1992, tem como missão formular
e implementar políticas públicas ambientais nacionais de forma articulada com os atores
públicos e a sociedade. Dentre as áreas de sua competência está a política de recursos
hídricos. Para o acompanhamento da agenda de água, foi criada a Secretaria de Recursos
Hídricos e Qualidade Ambiental, responsável, dentre outras atividades, pela construção do
Plano Nacional de Recursos Hídricos, concluído em 2006. As informações produzidas pelo
Ministério do Meio Ambiente acerca da temática estão disponíveis em seu sítio eletrônico:
www.mma.gov.br.
Agência Nacional de Águas (ANA) - criada em 2000 e idealizada por um grupo de
engenheiros de recursos hídricos que, reunidos com representantes do Banco Mundial em
Brasília, propuseram a criação de uma agência executiva nacional, com substancial autonomia
e competência técnica para coordenar o planejamento e o gerenciamento de recursos hídricos
no país, sem contrapor ao fundamento de descentralização (ABERS; KECK, 2017). A ANA
foi instituída como uma autarquia sob regime especial, com autonomia administrativa e
financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente. Possui a tarefa de implementar, em
sua área de atuação, a Política Nacional de Recursos Hídricos e promover a articulação dos
planejamentos nacional, regionais, estaduais e dos setores usuários elaborados pelas entidades
que integram o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Estimula a criação
dos comitês de bacias hidrográficas e, com a aprovação, em 2010, da Política Nacional de
Segurança de Barragens, também se tornou responsável pela fiscalização da segurança das
barragens por ela outorgadas, em geral barramentos para usos múltiplos, e pela criação e
constituição do Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens. Informações
7 Compõem o SINGREH, de acordo com a Lei n. 9433/97, Art 33: Conselho Nacional de Recursos
Hídricos; Agência Nacional de Águas; Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito
Federal; Comitês de Bacia Hidrográfica; IV – órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal
e municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; e as Agências de Água
8 Compõem o SEGRH MG, de acordo com a Lei n. 13.199/99, Art 33: Secretaria de Estado de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável; Conselho Estadual de Recursos Hídricos - CERH-MG; Instituto Mineiro de
Gestão das Águas - IGAM; comitês de bacia hidrográfica; órgãos e as entidades dos poderes estadual e
municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; e agências de bacias
hidrográficas.
109
sobre a ANA e acesso aos documentos, estudos e dados estão disponível em:
www.ana.gov.br.
Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) - desenvolve atividades desde
junho de 1998, ocupando a instância mais alta na hierarquia do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos. Possui como competências, dentre outras: analisar
propostas de alteração da legislação pertinente a recursos hídricos; estabelecer diretrizes
complementares para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos; promover a
articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regionais,
estaduais e dos setores usuários; arbitrar conflitos sobre recursos hídricos; deliberar sobre os
projetos de aproveitamento de recursos hídricos cujas repercussões extrapolem o âmbito dos
estados em que serão implantados; aprovar propostas de instituição de comitês de bacia
hidrográfica; estabelecer critérios gerais para a outorga de direito de uso de recursos hídricos
e para a cobrança por seu uso; e aprovar o Plano Nacional de Recursos Hídricos e
acompanhar sua execução. As informações e deliberações do CNRH podem ser acessadas em
seu sítio eletrônico: http://www.cnrh.gov.br.
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF) - órgão colegiado,
composto por representantes do poder público, sociedade civil e empresas usuárias de água,
com atribuições normativas, deliberativas e consultivas. Criado pelo Decreto Presidencial de 5
de junho de 2001, o comitê tem 62 membros titulares. Para regionalizar a sua atuação no
território, o Comitê criou, em sua estrutura organizacional, as Câmaras Consultivas Regionais
(CCRs) das quatro regiões fisiográficas da bacia: Alto (sede: Minas Gerais), Médio (sede:
Bahia), SubMédio (sede: Pernambuco) e Baixo (sede: Alagoas). As informações sobre o
comitê estão acessíveis em: http://cbhsaofrancisco.org.br.
Entidade equipara à Agência de Bacia (Agência Peixe Vivo) - braço executivo do
CBH São Francisco e CBH Rio das Velhas, prestando-lhes apoio administrativo, técnico e
financeiro, uma vez que os comitês não têm personalidade jurídica. Trata-se de uma
associação civil, pessoa jurídica de direito privado, criada em 2006. Tem funções de agências
de bacia do CBH São Francisco desde 2010, por meio de Resolução do CNRH (Resolução
CNRH n. 114/2010) e foi escolhida por meio de processo seletivo público. E foi equiparada à
agência do CBH Velhas em 2009 por meio da Deliberação CERH n. 187/2009. Atualmente, a
Agência Peixe Vivo está legalmente habilitada a exercer as funções de agência de bacia para
dois comitês estaduais mineiros - CBH Velhas e CBH Pará, e outro comitê de âmbito federal -
110
CBH do Rio Verde Grande. As informações da agência, dos contratos de gestão com órgão
gestor, as ações desenvolvidas estão disponíveis no sítio eletrônico:
http://agenciapeixevivo.org.br.
As principais instituições de âmbito estadual que compõem SEGRH, com suas
competências, estão listadas abaixo:
Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) -
oriunda da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, a Semad foi criada
em 1995, por meio da Lei n. 11.903/1995. É responsável por formular, coordenar, executar e
supervisionar as políticas públicas de conservação, preservação e recuperação dos recursos
ambientais, visando ao desenvolvimento sustentável e à melhoria da qualidade ambiental de
Minas Gerais. A Semad é seu órgão central coordenador do SEGRH9, e tem as seguintes
competências estabelecidas no Artigo 40, da Lei 13.199/99:
I - aprovar a programação do gerenciamento de recursos hídricos elaborada pelos
órgãos e pelas entidades sob sua supervisão e coordenação;
II - encaminhar à deliberação do CERH-MG propostas do Plano Estadual de
Recursos Hídricos e de suas modificações, elaboradas com base nos Planos
Diretores de Bacias Hidrográficas de Recursos Hídricos;
III - fomentar a captação de recursos para financiar as ações e atividades do Plano
Estadual de Recursos Hídricos, supervisionar e coordenar a sua aplicação;
IV - prestar orientação técnica aos municípios relativamente a recursos hídricos, por
intermédio de seus órgãos e entidades;
V - acompanhar e avaliar o desempenho do SEGRH-MG; e
VI - zelar pela manutenção da política de cobrança pelo uso da água, observadas as
disposições constitucionais e legais aplicáveis.
As informações sobre as competências, programas, projetos, serviços e outras ações da
Semad podem ser consultadas em seu sítio eletrônico: www.meioambiente.mg.gov.br.
Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH-MG) - órgão central do SEGRH
de caráter deliberativo e normativo, que integra órgãos públicos, setor produtivo e a sociedade
civil organizada. O Conselho foi criado em 1987 (Decreto nº 26.961/87), portanto, atua antes
da existência da Semad e da própria edição da nova Política Nacional de Recursos Hídricos.
Destacam-se dentre as suas competências estabelecidas no Artigo 41, da Lei 13.199/99, as
seguintes: estabelecer os princípios e as diretrizes da Política Estadual de Recursos Hídricos;
aprovar proposta do Plano Estadual de Recursos Hídricos; decidir os conflitos entre Comitês
9 Matriz do SEGRH está apresentada no Capítulo 3 – Governança de Recursos Hídricos
111
de Bacia Hidrográfica; atuar como instância de recurso nas decisões dos comitês de Bacia
Hidrográfica; estabelecer os critérios e as normas gerais para a outorga dos direitos de uso;
cobrança e aprovar a instituição de Comitês de Bacia Hidrográfica;
É importante ressaltar que as reuniões do Conselho são abertas ao público, embora apenas
seus 40 conselheiros tenham direito à deliberação. Estes são escolhidos e empossados a partir
de um processo eletivo, com vagas para entidades, sendo 10 cadeiras para o segmento Poder
Público Estadual, 10 para Poder Público Municipal, 10 para usuários de recursos hídricos e 10
para sociedade civil. As entidades eleitas indicam seus representantes e, na sequência, a nova
composição é homologada por ato do presidente do CERH, que é o secretário de Estado de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
As informações gerais do conselho, as agendas de reuniões, as deliberações e outros
documentos podem ser acessados nos sítios eletrônicos: www.meioambiente.mg.gov.br e
www.igam.mg.gov.br. As normativas podem ser acessadas em outro endereço:
www.siam.mg.gov.br.
Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) - órgão gestor das águas em Minas
Gerais é a entidade gestora do SEGRH. Criado em 1997, mesmo ano de promulgação da Lei
das Águas (Lei n. 9433/97). Antes, era denominado Departamento de Recursos Hídricos do
Estado de Minas Gerais (DRH), e a alteração do nome foi efetivada pela Lei n. 12584/1997.O
Instituto é responsável por desenvolver e implementar a Política Estadual de Recursos
Hídricos, com ações direcionadas à preservação da quantidade e da qualidade das águas de
Minas Gerais. O gerenciamento é feito por meio de instrumentos de gestão: outorga de direito
de uso da água; enquadramento dos corpos de água; sistema de informação em recursos
hídricos; cobrança pelo uso da água; e planos de recursos hídricos. Também realiza e divulga
o monitoramento da qualidade das águas superficiais e subterrâneas do Estado e o
monitoramento do tempo, clima e comportamento dos corpos de água. Visando implementar a
gestão participativa, atua na consolidação de CBHs e Agências de Bacia. As informações
produzidas pelo Igam e os serviços disponíveis, bem como as orientações para a participação
social estão no sítio eletrônico: www.igam.mg.gov.br.
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Velhas) - o órgão
normativo e deliberativo em sua área de atuação que abrange 51 municípios, dentre eles, Belo
Horizonte, Contagem e Sabará, que integram a sub-bacia do ribeirão Arrudas. Trata-se de um
dos comitês de bacia mais antigo do Estado de Minas Gerais. Foi criado em 1998 (Decreto
112
Estadual 39.692/1998) e hoje conta com participação oficial de 28 conselheiros. Para ampliar
a participação social, o CBH Velhas adotou como estratégia a criação de subcomitês, que são
formas organizacionais regionais de apoio à estrutura do CBH, com caráter consultivo e
propositivo. As reuniões plenárias do CBH Velhas e dos subcomitês são abertas ao público e
qualquer pessoa pode expressar sua opinião, embora o poder de deliberação seja dos
conselheiros. As informações sobre o CBH Velhas, a composição, as deliberações, a agenda
de reuniões, a bacia, os estudos, dentre outros temas podem ser acessadas nos sítios
eletrônicos: www.cbhvelhas.org.br ou www.comites.igam.mg.gov.br.
Também compõem o SEGRH, órgãos e as entidades dos poderes estadual e
municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos. Nesta Seara,
destacam-se as Secretaria Municipais de Meio Ambiente de Belo Horizonte e Sabará e a
Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Contagem; e a Companhia
de Saneamento de Minas Gerais que atua nos três municípios, com serviços de água e esgoto.
Outros espaços participativos que tem interface com a gestão de recursos hídricos são:
a) Conselho Municipal do Meio Ambiente de Belo Horizonte (COMAM):
criado em 198510
;
b) Conselho Municipal de Política Urbana de Belo Horizonte (COMPUR):
criado em 199611
;
c) Conselho Municipal de Saneamento de Belo Horizonte: criado em 200112
;
d) Conselho Municipal do Meio Ambiente de Contagem: criado em 199313
;
e) Conselho Municipal de Política Urbana de Contagem: criado em 200814
; e
f) Conselho Municipal de Defesa e Proteção do Meio Ambiente de Sabará
(Codema): instituído em 199215
.
Para encerrar este tópico de conteúdo institucional, ressalta-se que as legislações e
normativas ambientais e de recursos hídricos que abrangem o Estado de Minas Gerais,
incluindo, as deliberações do CERH estão disponíveis no sítio eletrônico do Sistema
Integrado de Informação Ambiental <http://www.siam.mg.gov.br>, gerenciado pela Semad.
10
Informações: https://prefeitura.pbh.gov.br/index.php/meio-ambiente/comam 11
Informações: https://prefeitura.pbh.gov.br/index.php/politica-urbana/conselho 12
Informações: https://prefeitura.pbh.gov.br/obras-e-infraestrutura/conselhos/saneamento 13
Informações: http://www.contagem.mg.gov.br/colegiado/public/colegiados/conselho-municipal-do-meio-
ambiente-de-contagem/12 14
Informações: http://www.contagem.mg.gov.br/colegiado/public/colegiados/conselho-municipal-de-poltica-
urbana/7 15
Informações: http://site.sabara.mg.gov.br/prefeitura/secretarias-municipais/secretaria-de-meio-ambiente/
113
As deliberações dos comitês de bacias hidrográficas de Minas Gerais estão disponíveis no
Portal dos Comitês <http://comites.igam.mg.gov.br>, gerenciado pelo Igam. A legislação
específica da área de saneamento também pode ser consultada no site da Agência Reguladora
de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas
Gerais (Arsae-MG) < http://www.arsae.mg.gov.br/institucional/legislacao>.
5.5 Referências históricas
Quem viveu na recém-inaugurada capital mineira nos anos de 1890 pôde nadar, pescar
e contemplar os rios que corriam com suas águas cristalinas, repletas de peixes e integrados à
paisagem urbana. Um cenário inimaginável para os atuais moradores da capital e região
metropolitana, que circula sobre rios e córregos invisíveis da bacia do ribeirão Arrudas. Estes
agonizam debaixo do asfalto, praticamente sem vida.
O retrato daquele período em que se podia conviver harmoniosamente com os cursos
d’água é resgatado por Alessandro Borsagli (2016), em seu livro Rios Invisíveis da Metrópole
Mineira:
Desde criança eu ouvia histórias sobre os córregos de Belo Horizonte, de como eram
limpos a ponto de ser possível visualizar a partir da ponta da Rua Tupis os peixes
subindo o córrego do Leitão, de poder pescar e nadar no ribeirão Arrudas, onde meu
pai e meu avô pescavam Bagres e nadavam nas proximidades do Prado e como meu
pai levando as encomendas feitas pelo Sr. Armando Souza Pinto produzidas pelo
meu avô, um hábil seleiro, caminhava pelas águas desde a Lagoinha até a Fábrica de
Chita (104 Tecidos) observando os caramujos em meio às pedras por onde corriam
as águas virtualmente límpidas (BORSAGLI, 2016, p. 21)
A região central de Belo Horizonte é formada pelas microbacias dos córregos do
Acaba Mundo, Leitão e Serra, todos afluentes do ribeirão Arrudas. Em seus relatos, Borsagli
(2016) instiga os leitores a tentarem imaginar esses córregos circulando em seus leitos
naturais, que podem ser observados na Figura 8.
114
Figura 8 – Ribeirão Arrudas no Parque Municipal, na data provável de
1922 e 1926
Fonte: Museu Histórico Abílio Barreto
Como pincelado no tópico sobre hidrografia, a construção da capital mineira se iniciou
no ano de 1894, sendo inaugurada em 1897, nas terras do antigo arraial Curral del Rey,
fundado no início do século XVIII, depois transformado em arraial Belo Horizonte.
O planejamento da zona urbana de Belo Horizonte, a cargo da Comissão Construtora
da Nova Capital (CCNC), optou por um modelo de influência positivista, com preceitos
higienistas. O modelo já era empregado anos antes na Europa e também em algumas cidades
da América Latina, e buscava a construção de uma cidade ampla, organizada, higienizada,
ventilada e salubre.
O novo centro da administração do Estado seria edificado de acordo com os ideais
sanitaristas e higienistas da época, proporcionando o convívio social através de
inúmeras praças e vias arborizadas, em conformidade com as mais modernas cidades
europeias (BORSAGLI, 2016, p.48).
Em contrapartida, desprezava os cursos d’água, em seu contexto de bacia hidrográfica
e a sua integração no uso e ocupação do solo urbano. Ou seja, os recursos naturais, como o
hídrico, estavam ali para servir à cidade, submetidos à racionalidade técnica e as necessidades
funcionais do ambiente urbano. No caso da água, cuja abundância foi um fator determinante
na escolha do local para sediar a nova Capital, a preocupação era, sobretudo com o
abastecimento e o esgotamento sanitário.
Os estudos realizados por Borsagli (2016) também mostram que o projeto da nova
capital era elitista determinando, inclusive os espaços a serem ocupados pelas classes sociais.
115
Em relação aos impactos ambientais, estes já eram visíveis ainda na construção da
cidade com a intensificação do desmatamento, plantio de novas culturas, extração de areia e
exploração mineral. Com a crescente urbanização, somatizaram os problemas com
esgotamento sanitário.
Cabe ressaltar, como pincelado no tópico sobre saneamento, que foi escolhido como
modelo para o saneamento de Belo Horizonte o sistema separador absoluto, no qual os
esgotos e as águas pluviais correm por duas redes distintas. As águas das chuvas seriam
despejadas diretamente nos cursos de água e os esgotos seguiriam até uma área destinada à
depuração por infiltração no solo. A capital mineira, entretanto, foi inaugurada com estas
redes inacabadas e os esgotos eram despejados in natura nos rios, comprometendo desde o
início a qualidade dos mananciais.
Os esgotos seguiam para o ribeirão Arrudas por todos os caminhos menos pela rede,
enquanto na zona suburbana o esgoto corria pelas ruas. O tratamento através da
infiltração do solo na margem direita do ribeirão Arrudas não havia sido implantado
e a construção de uma Estação de Tratamento de Esgoto não era cogitada, fazendo
do ribeirão o receptor de todo o esgoto produzido na Cidade de Minas
comprometendo desde já o uso da água ao longo da zona planejada e a jusante dela.
Era o prelúdio de uma tragédia anunciada (BORSAGLI, 2016. P. 73).
Cidade de Minas foi o primeiro nome dado à nova Capital, que nos primeiros anos
possuía cerca de 12.000 habitantes. O autor conta que o saneamento básico em Belo
Horizonte foi negligenciado por décadas, e a poluição dos córregos e ribeirões só aumentava,
além do desmatamento para a expansão da área suburbana. Esta área era a que mais sofria
com a falta de saneamento, embora fosse a mais povoada e a que mais se expandia. É
importante assinalar que o crescimento planejado para a Capital seria do centro para a
periferia. Na prática, o crescimento ocorreu de modo inverso.
No início dos anos de 1900, começaram a se instalar as primeiras fábricas na região
que ampliaram a arrecadação municipal, mas também o uso e a poluição da água, do ar e a
produção de resíduos sólidos. Parte dessas indústrias era construída às margens do ribeirão
Arrudas, como pode ser observada na Figura 9, que mostra um dos primeiros
estabelecimentos industriais da capital, na Praça da Estação.
116
Figura 9 – Vista externa da fábrica de tecidos (Chita) na data provável de 1900-
1910
Fonte: Arquivo Público Mineiro
Na década de 1920, foram retomadas as intervenções em cursos d’água, com
canalizações, retificações, revestimentos das margens e outras obras visíveis que, segundo
Borsagli (2016), eram politicamente importantes. Um exemplo é a canalização do ribeirão
Acaba Mundo, como mostra a Figura 10, com data provável de 1920 a 1930, de acordo com
dados do Arquivo Público Mineiro. A canalização ocorre nas proximidades da Igreja da Boa
Viagem, área central do antigo arraial do Curral del Rey. Na sequência tem-se a canalização
do córrego Leitão, na região da atual rua São Paulo, acima da Guajajaras (Figura 11).
Figura 10 – Vista do ribeirão Acaba Mundo, próximo à Igreja de
Nossa Senhora de Boa Viagem
Fonte: Arquivo Público Mineiro
117
Figura 11 – Vista do córrego Leitão na atual rua São Paulo, na data
provável de 1922 a 1926
Fonte: Museu Histórico Abílio Barreto
O esgoto sanitário continuava sendo negligenciado. Na Figura 12, é possível observar
que o rio canalizado está recebendo esgotos, que de acordo com Borglasi (2016), trata-se de
efluentes da área planejada de Belo Horizonte.
Figura 12 – Canalização do ribeirão Arrudas e aterro para a formação
da avenida dos Andradas
Fonte: Arquivo Público Mineiro
Iniciaram-se também os projetos de avenidas sanitárias, mas a tão necessária
ampliação da rede esgoto e o desassoreamento dos rios continuavam parados. Borsagli (2016)
relata que havia coletores apenas ao longo dos trajetos dos córregos Acaba Mundo e Leitão e
em parte do córrego da Serra. As intervenções nos anos de 1940 podem ser vistas na Figura
13.
118
Figura 13 – Córrego Leitão no ano de 1942
Fonte: Arquivo Público Mineiro
Em 1941 o ribeirão Arrudas já estava completamente retificado e canalizado na zona
planejada da cidade. E para retratar a situação do ribeirão Arrudas, o pesquisador cita em seu
livro uma frase atribuída ao engenheiro Manoel Marques, que era integrante do corpo técnico
a prefeitura em 1951 que retrata a situação caótica do ribeirão Arrudas: “sem medo de erro,
pode-se afirmar que 2/3 do Arrudas, já na ponte do Matadouro Velha, é constituída pelo
esgoto da cidade” (BORSAGLI, 2016, p.178).
Nas décadas de 1960 e 1970, intensificam-se as obras que substituam os rios pelo
asfalto.
Em meio à turbulência na qual se encontrava o país no período, a metrópole mineira
passaria novamente por uma profunda mudança espacial, onde os elementos naturais
foram suprimidos com uma velocidade nunca vista na cidade, assim como os
espaços e terrenos públicos, valiosos para os eternos especuladores, eram
negociados à revelia da sociedade, prelúdios da nova reforma urbana que estava no
horizonte (BORSAGLI, 2016, p. 267).
As obras de canalização dos córregos podem ser observadas na Figura 14 e Figura 15,
que traz uma faixa com os dizeres “O Acaba Mundo já era. Obrigada Prefeito!”, um grupo de
pessoas andando com o prefeito sobre o córrego, sepultado debaixo do asfalto.
119
Figura 14 – Obra de canalização do córrego Acaba
Mundo na Avenida Afonso Pena, com a
Rua Rio Grande do Norte no ano de 1966
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte/Ascom
Figura 15 – Inauguração do asfalto sobre o córrego Acaba
Mundo na Avenida Uruguai, em 1973
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte/Ascom
Mesmo com a criação do Programa Drenurbes, em Belo Horizonte no ano de 2002,
que tinha como proposta a conservação dos rios urbanos em seus leitos naturais, foi executada
a criação do Boulevard Arrudas, com a cobertura do ribeirão Arrudas no ano de 2009.
120
6 PROTÓTIPO DO APLICATIVO MEANDROS – GESTÃO COLETIVA DAS
ÁGUAS
O protótipo do aplicativo MEANDROS – Gestão Coletiva das Águas, desenvolvido
conforme metodologia descrita no capítulo 1, busca criar espaços de difusão de informações,
diálogos e interações entre os moradores da bacia do ribeirão Arrudas, com vistas a ampliar a
transparência, a mobilização e a participação social na gestão das águas local. A proposta,
portanto, é de ser uma arena para difundir continuamente informações e construir de maneira
coletiva o conhecimento sobre a bacia, bem como viabilizar a organização de encontros em
espaços físicos ou virtuais e, assim, a proposição de agendas comuns. É também um espaço
para o registro da memória e dos acontecimentos considerados pelos usuários como
relevantes, bem como para o fortalecimento da identidade dos cidadãos da bacia que lutam
por um território mais sustentável. A estrutura adotada para o MEANDROS está de acordo
com as funções da comunicação para mobilização estudadas anteriormente, que conciliam
aspectos da comunicação informacional e da relacional.
Nos tópicos abaixo, estão as telas do protótipo, com uma estrutura visual que se propõe de
fácil uso. Produzidas no Software Adobe Illustrator e salvas em extensão .png, elas permitem
ao usuário ter uma visão ampla das funcionalidades do programa, em um futuro teste de
usabilidade. Ressalta-se que foram privilegiadas as imagens em detrimento de textos longos,
para tornar as telas mais atrativas.
6.1 Abertura e tela inicial
O aplicativo se inicia com uma imagem da sub-bacia do ribeirão Arrudas ainda
preservada, e com um convite aos usuários para navegar pela sub-bacia, que no aplicativo é
denominada apenas como bacia, uma vez que geograficamente os termos não se diferenciam,
sendo aquela subdivisão mais aplicada no contexto da gestão. Nesta tela, os usuários têm as
opções de criar uma conta no programa ou autenticar (login), caso já seja cadastrado. Ao
121
autenticar, terá acesso a todas as funcionalidades do aplicativo. Seguem abaixo a tela inicial e
a de registro (Figura 16).
Figura 16 - Telas iniciais do aplicativo MEANDROS
Fonte: Elaboradas por Eduarda Rohde Ferreira.
Para o cadastro, basta inserir o nome do usuário, o endereço de e-mail e a senha de sua
preferência e ativar a conta por meio de mensagem recebida no e-mail cadastrado. Para o
registro do usuário cadastrado, basta inserir o nome do usuário (ou e-mail) e senha. Outro
caminho é navegar sem registro, que permite o acesso às informações, mas não permite a
interação e a inserção de conteúdo; para isto, o usuário deve se cadastrar.
Na sequência, carrega-se a tela principal com os botões: Território; Qualidade da água;
Saneamento; Atores envolvidos; Memória e Agenda, cujos conteúdos podem ser
compartilhados pelos usuários para os seus amigos em outras redes sociais digitais, ao clicar
no seguinte ícone: . A Figura 17 exemplifica essas funções. Ainda na tela inicial, na parte
superior, há outros ícones: perfil ( ); fóruns de discussão ( ); convidar amigos ( ) e
notificações ( ), que serão detalhados adiante.
122
Figura 17 - Telas de Cadastro e principal
Fonte: Elaboradas por Eduarda Rohde Ferreira.
6.2 Perfil, convites e notificações
Na tela principal, ao clicar no ícone do perfil, o usuário poderá fazer o registro (login),
ir para a página inicial ou para as páginas ‘Eventos’ e ‘Fóruns’, onde podem acessar os
eventos que ele cadastrou ou os fóruns de discussão dos quais ele participa, bem como criar
novos eventos ou novos fóruns. Terão, ainda, acesso ao glossário com os principais termos
técnicos da área de recursos hídricos, elaborado pela Agência Nacional de Águas,
denominado ‘Lista de Termos para o Thesaurus de Recursos Hídricos16, e à seção ‘Ajuda’,
com orientações sobre a navegação no programa. No caso do usuário cadastrado, aparecerá
seu nome e sua imagem na parte superior. Ao clicar em ‘Notificações’, aparecerá alertas de
criação de novos fóruns de discussão ou de novas mensagens de fóruns que ele já fizer parte
ou de um novo evento cadastrado, dentre outros (Figura 18). Em relação ao ícone ‘Convidar
amigos’, o usuário terá a possibilidade de compartilhar um convite padrão do aplicativo
MEANDROS em suas redes sociais digitais, como o Facebook e o WhatsApp.
16
A Lista de Termos para o Thesaurus de Recursos Hídricos da ANA está disponível em:
<http://arquivos.ana.gov.br/imprensa/noticias/20150406034300_Portaria_149-2015.pdf>
123
Figura 18 - Telas dos botões ‘Perfil’ e ‘Notificações’
Fonte: telas elaboradas por Eduarda Rohde Ferreira
6.3 Território
Na tela inicial, o usuário poderá acessar o botão ‘Território’. Nesta seção, encontrará
informações gerais da sub-bacia, como a área, os municípios abrangidos e a extensão do rio
principal. Irão saber que aquele território está dentro da bacia do rio das Velhas, que por sua
vez, está inserida na bacia do rio São Francisco (Figura 19).
Recomenda-se que, ao avançar para a produção do aplicativo, os mapas que constam
neste tópico sejam trabalhados de forma a integrar saberes, combinando a cartografia
tradicional com a cartografia étnica, que representa o território a partir das percepções e das
representações da própria comunidade, sendo, portanto, elaborada por meio de um processo
de participação social. Estes mapeamentos formais e humanitários ganham relevância neste
trabalho, uma vez que o aplicativo proposto consiste em uma ferramenta com abordagem
técnica e social com o propósito de empoderar a população da bacia para a gestão coletiva das
águas. Assim, permitirá aos usuários conhecer e mostrar a bacia também por meio de seus
olhares e percepções como moradores do território.
Para o desenvolvimento dos mapas humanitários, recomenda-se o uso de programas de
mapeamento colaborativo em bases livres como o Projeto Open Street Map, que em tradução
124
livre significa Mapa Aberto de Ruas, que permite editar mapas valorizando o conhecimento
local.
Figura 19 – Telas inicias da seção Território
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira
Ainda neste tópico, rolando um pouco a tela, terá acesso a outros mapas com dados
dos principais usos do solo da bacia e da população, inclusive, onde ela está mais ou menos
concentrada (Figura 20). Em todas as telas, o usuário poderá ter acesso aos mapas formais,
que se referem às Figuras 5, 6 e 9, e aos Anexos A-D, e aos mapas étnicos. Caso queira se
aprofundar na temática, o usuário do MEANDROS também poderá ter acessar ao Plano
Diretor de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas.
125
Figura 20 - Telas da seção Território / Usos do solo e população
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira
6.4 Qualidade da água
Ao clicar no botão ‘Qualidade da água’, é possível verificar a qualidade da água na
bacia tendo como referência um ponto de monitoramento na área de nascentes e outro na área
próximo à foz, bem como acessar mais informações sobre as prováveis fontes de poluição e o
mapa com a série histórica do monitoramento nos dois pontos (ANEXO D), como pode ser
observado na Figura 21.
126
Figura 21 - Telas da seção "Qualidade da Água'/ Fontes de poluição
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
Na Figura 22, o visitante poderá ver que a qualidade da água coletada na nascente é
‘Boa’ e na foz é ‘Muito Ruim’. A proposta é de que sejam elaborados mapas com facetas
técnicas e também com a reprodução da percepção dos usuários sobre a qualidade na bacia,
por meio de um IQA informal. Este pode incorporar como parâmetros a cor da água, o cheiro,
a presença ou ausência de matas ciliares e a presença ou ausência de peixe. Assim, seria
produzido anualmente o mapa da qualidade das águas formal e atualizado o mapa informal,
propiciando uma construção coletiva de saberes socialmente compartilhados.
127
Figura 22 - Telas da seção "Qualidade da Água'/ Situação
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
6.5 Saneamento
Na seção ‘Saneamento’, o visitante terá acesso aos botões: abastecimento;
esgotamento sanitário; resíduos sólidos e drenagem urbana. Ao clicar em abastecimento, será
direcionado a uma página que mostra que este é satisfatório na bacia, sem necessidade de
ampliação do sistema, embora a perda de água na distribuição ainda seja alta (35,48%), como
pode ser observado na Figura 23. Se rolar um pouco a tela, terá acesso aos endereços
eletrônicos de instituições17
que atuam nesta agenda, ao Plano Diretor de Recursos Hídricos
da Bacia e aos planos de saneamentos dos municípios de Belo Horizonte e Contagem18
, caso
tenha interesse em obter mais informações.
17
Arsae – Agencia Reguladora de Servicos de Abastecimento de Agua e de Esgotamento Sanitario do Estado de
Minas Gerais: www.arsae.mg.gov.br; Secir – Secretaria de Estado de Cidades e de Integração Regional:
http://www.urbano.mg.gov.br; e Copasa – Companhia de Saneamento de Minas Gerais: www.copasa.com.br. 18
Plano Municipal de Saneamento de Belo Horizonte 2016/2019 disponível em < https://bit.ly/2JJbKG9 >; e
Plano Municipal de Saneamento Básico de Contagem disponível em < https://bit.ly/2NEybdT >
128
Figura 23 - Telas do botão 'Abastecimento'
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
No botão ‘Esgotamento sanitário’, são visualizados o volume de esgoto produzido na
bacia, o volume coletado e o volume que, além de coletado, é tratado. No final da página, é
disponibilizado o caderno do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do
Rio das Velhas referente à sub-bacia do ribeirão Arrudas19
, para quem tem interesse em
compreender melhor o tema (Figura 24). Rolando um pouco mais a tela também terão acesso
aos planos de saneamentos dos municípios envolvidos.
19
Caderno do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, UTE Ribeirão
Arrudas disponível em <https://bit.ly/2xddmmz>
129
Figura 24 - Telas do botão 'Esgotamento Sanitário'
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
No botão de ‘Resíduos sólidos’, consta a taxa de cobertura dos municípios de Belo
Horizonte e Contagem, que possuem Planos de Saneamento, inclusive, disponibilizados no
final da página, por meio de endereços eletrônicos que direcionam para os documentos nos
respectivos sites das Prefeituras. É informado que o município de Sabará não possui Plano de
Saneamento nem dados disponíveis no Plano Diretor da Bacia do Rio das Velhas sobre o
tema (Figura 25). Se o usuário clicar no município irá aparecer informações sobre a
destinação final dos resíduos sólidos urbanos, que nos três casos são o aterro sanitário.
130
Figura 25 - Telas do botão 'Resíduos sólidos'
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
No botão drenagem urbana, o usuário terá acesso a um mapa mostrando as áreas com
alto risco de deslizamento ou inundação na bacia do ribeirão Arrudas (Figura 26). Além do
mapa formal, aqui também pode ser trabalhado o mapa étnico com o mapeamento coletivo de
áreas de deslizamento e inundações.
Figura 26 - Tela da drenagem urbana
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
131
6.6 Atores envolvidos
Na seção, é possível conhecer os representantes do governo, da sociedade civil e dos
usuários que participam do Subcomitê do Ribeirão Arrudas, que é uma estrutura
descentralizada do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, bem como pessoas e
entidades indicadas pelos próprios usuários do aplicativo como atores sociais importantes no
contexto da gestão local das águas. A Figura 27 mostra, de forma exemplificativa, que
acessando o botão ‘Governo’, visualizará a lista dos seis representantes de governo no
referido Subcomitê. Ao clicar na palavra ‘representantes’, abrirá uma caixa de diálogo
mostrando o mandato do grupo, neste caso, é de 2016-2018. A mesma operação se repete, se
clicar em sociedade ou usuário. É importante destacar que, no final da tela, ao clicar em
“Clique aqui para mais informações” têm duas perguntas para orientar os visitantes sobre: (1)
o que faz o Subcomitê do Ribeirão Arrudas; e (2) quem pode participar. As respostas são
dadas em caixas de diálogos que aparecem se ele clicar nas perguntas, sendo:
a) parte da estrutura do Comitê do Rio das Velhas, discute localmente os
problemas e soluções da bacia e leva para o plenário do Comitê, que tem
poder de decisão e de influenciar políticas públicas. Apoia ações de educação
ambiental e mobilização, dentre outras; e
b) qualquer pessoa pode participar das reuniões. Para se tornar membro, o
representante da instituição deve se inscrever no processo eleitoral,
promovido e divulgado pelo comitê, indicando o segmento de interesse,
podendo ser: governo, usuário ou sociedade civil. Caso haja mais inscritos do
que vagas, é feita uma negociação entre os interessados para indicar os
representantes naquele mandato.
132
Figura 27 - Telas da seção 'Atores envolvidos' – Subcomitê de bacia
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
Na sequência, ao clicar em ‘Ação cidadã’, os visitantes poderão conhecer os atores
sociais – pessoas físicas ou jurídicas – que atuam na bacia para além da estrutura do
Subcomitê. Trata-se, portanto, de outro espaço colaborativo, ou seja, o usuário cadastrado
pode conhecer e indicar atores – pessoa ou instituição – que consideram importantes para a
gestão das águas na bacia e descrever brevemente suas ações, bem como indicar um endereço
eletrônico para mais informações, como pode ser observado na Figura 28. Cabe ressaltar que
fica destacado quem está compartilhando a informação (foto e nome) e abaixo o nome ator
social/instituição indicado. Ao clicar neste, têm-se acesso à descrição da atividade que ele
desenvolve e um endereço para mais informações.
133
Figura 28 - Telas da seção 'Ação cidadã'
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
6.7 Memória
Nesta seção, o visitante poderá conhecer, resgatar ou registrar a memória dos
acontecimentos na bacia do ribeirão Arrudas, desde o início de seu uso e ocupação, quando os
cursos de água ainda estavam visíveis. As contribuições dos moradores da bacia devem ser
enviadas para o gerenciador do aplicativo, que incluirá a memória se for pertinente à política
de gestão da informação do programa. As primeiras postagens exemplificativas podem ser
vistas na Figura 29.
134
Figura 29 - Telas da seção 'Memória'
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
6.8 Agenda
Na ‘Agenda’, além de consultar os eventos relacionados à temática água, os usuários
cadastrados podem compartilhar seu evento, informando o nome, quando ocorrerá, onde, se é
pago ou gratuito, apresentar uma breve descrição das atividades e um endereço eletrônico
para mais informações, bem como relacionar a uma categoria. As categorias podem ser
definidas no processo coletivo de construção do aplicativo, mas sugere-se aqui as seguintes:
Capacitação; Eventos Técnicos; Manifestações Socioambientais; e Lazer, Arte e Cultura. As
contribuições deverão ser analisadas pelo administrador do aplicativo e publicadas, se
estiverem de acordo com a política de gestão da informação do programa.
É importante ressaltar que a agenda é um espaço estratégico para promover encontros
digitais ou presenciais, ações coletivas, divulgar atividades institucionais e capacitações, que
permitem a construção de agendas comuns de diálogos, resistências, lutas e proposições em
prol da qualidade ambiental da bacia, ampliando a gestão democrática das águas. As telas
propostas podem ser vistas na Figura 30.
135
Figura 30 – Telas da seção ‘Agenda’
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
Por fim, é possível interagir neste ambiente digital por meio de ’Fóruns de discussão’,
citados na abertura deste capítulo. Estes podem ser criados pelos próprios usuários, e abordar
temas variados, dentre assuntos técnicos, comunitários, culturais e outros, como por exemplo:
qualidade da água; cuidadores de nascentes urbanas; e revitalização do córrego Leitão. Para
aderir a um fórum de interesse, basta clicar no tema de interesse e em ‘Seguir’. Ao aderir a
um fórum, o usuário pode inserir seu comentário no final da página ou logo abaixo de um
comentário específico já postado no local. Para criar um fórum, basta estar registrado no
programa e informar o nome do fórum e a descrição (Figura 31).
É importante ressaltar que o Fórum foi pensado como um espaço de construção
coletiva do conhecimento, estimulando, junto aos demais espaços participativos do
MEANDROS, o protagonismo da população na causa da água na bacia.
136
Figura 31 - Telas da seção 'Fóruns de Discussão'
Fonte: Eduarda Rohde Ferreira.
137
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A avaliação da implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos no Brasil
nos últimos vinte anos revela avanços importantes, mas também expõe fragilidades. O seu
fortalecimento perpassa, em parte, pela ampliação e pela qualificação da participação social,
tão necessária, sobretudo neste momento em que a democracia brasileira vive uma crise das
instituições democráticas e retrocessos.
Nesse contexto, a comunicação mobilizadora que democratiza o acesso às
informações, conecta pessoas e sensibiliza os atores para a participação no campo político
ganha maior relevância. Esta deve ser estruturada a partir de um planejamento de ações
contínuas, e não pautadas em ações isoladas e pontuais. Como problematizado na revisão da
literatura, deve ser estrategicamente pensada com vistas a promover a difusão de informações,
a coletivização, registrar e socializar memórias e criar uma identidade que estabeleça um elo
entre os atores envolvidos. É preciso criar um ambiente de diálogo e de negociação que
permitam sempre a inclusão de novas vozes na construção das agendas das políticas públicas
brasileiras e, especificamente, na política das águas, fortalecendo, assim, a democracia
participativa como regime de governo. Tal qual o governo democrático, a comunicação
mobilizadora não pode ser autoritária e unidirecional, mas pautada por ações multidirecionais
e abertas ao diálogo.
Nesse contexto, e de acordo com a literatura estudada, as mídias digitais se apresentam
como meios potenciais para se promover ações de comunicação com vistas à mobilização
social para uma participação cidadã, embora também tenham limitações. As potencialidades e
as limitações desses meios foram levantadas, na pesquisa desta dissertação, a partir da
aplicação da metodologia F.O.F.A que permite analisar as Forças e Oportunidades e as
Fraquezas e Ameaças, considerando os ambientes internos e externos. Para a análise, foram
consideradas as informações e os dados apresentados na revisão bibliográfica.
Em relação às potencialidades, têm-se o seguinte alcance: a mídia digital tem como
suporte tecnológico a Internet, que hoje conecta mais de 3 bilhões de pessoas em todo o
mundo, ou seja, cerca de 47% da população mundial. No Brasil, o número de pessoas
conectadas representa 57% da população com 10 anos ou mais. Esse número está em
constante expansão, sobretudo com a disseminação do uso da Internet por meio da telefonia
138
móvel. Como apresentado no capítulo 4, cerca de 95% da população mundial moram em áreas
que têm pelos menos a cobertura 2G, ou seja, há possibilidades reais de se ampliar
enormemente a abrangência dessa tecnologia em curto prazo, diminuindo a exclusão digital.
Outra oportunidade é o de se trabalhar com o público jovem, mais escolarizado, nas cidades,
que são os principais usuários de Internet no País.
A estruturação da rede digital também concorre para a democratização das
informações e a mobilização social, uma vez que permite aos diferentes usuários
compartilharem seus conhecimentos, visões e valores, igualando de certa forma, o lugar de
fala dos diversos atores sociais. Neste sentido, as mídias digitais quebram o monopólio dos
grandes meios de massa, transformando a pessoa comum em produtora de notícias, gerando
uma comunicação de muitos para muitos. Essa estrutura contribui para uma rápida difusão das
informações, sem mediadores e com um baixo custo. Outro ponto forte das mídias digitais é
que elas permitem interações dinâmicas, em formato multimídia, com vídeos, áudios e textos,
além quebrarem as barreiras do tempo e do espaço. As informações ou ideias difundidas por
um grupo podem ganhar dimensões locais, nacionais e até globais. A comunicação digital
também pode ser realizada com características de um espaço de visibilidade massiva ou
dirigida, a depender da intencionalidade. E pode ser usada para fortalecer também a
comunicação face a face.
Por outro lado, as mídias digitais têm limites. Um deles está relacionado à exclusão
digital, uma vez que elas não alcançam 53% da população mundial. E ficam de fora,
sobretudo a população rural e as pessoas maiores de 60 anos. A escolaridade também é um
fator de exclusão, com impacto negativo maior sobre os menos escolarizados. Essas
informações são fundamentais e devem ser consideradas no planejamento estratégico de uma
comunicação democrática com vistas à ampliação da participação social nas políticas
públicas. Neste caso, deverá haver a complementariedade das ações digitais, para que não se
aumente o hiato de participação, amplificando as vozes que já ressoam nas arenas públicas.
Sobre as fraquezas, destaca-se, ainda, a denominada autocomunicação de massa, que
embora também seja uma potencialidade, traz também questões a serem enfrentadas.
Primeiro, com as múltiplas vozes que ecoam no ambiente virtual, torna-se um desafio imenso
ser ouvido, ou seja, atrair uma audiência. Como qualquer pessoa é uma potencial produtora de
notícias, temos uma condição favorável à produção e disseminação de notícias falsas (fake
139
News) que, dia após dia no Brasil, têm assumido um grande volume e extensão nas redes
sociais.
Analisando de forma mais específica os aplicativos para tecnologias móveis, observa-
se, em concordância com as citações apresentadas nesta dissertação, que se tratam de
ferramentas de comunicação com forte crescimento e que atrai o interesse de milhares de
pessoas. Esta abrangência é potencializada no MEANDROS – Gestão Coletiva das Águas com
a escolha do sistema operacional Android, que tem alcance global mais amplo, e pelo fato de
o aplicativo ter sido projetado para uma bacia hidrográfica urbana, onde concentra a maior
porcentagem do público com acesso à Internet. Esta força também se revela como fraqueza,
como exposto acima, quando analisada sob a perspectiva da exclusão digital.
É importante enfatizar que o MEANDROS foi pensado no e para um contexto de um
governo democrático e de uma política pública que tem como fundamento a gestão
participativa e descentralizada. A ferramenta, portanto, foi idealizada com o propósito de
ampliar e fortalecer a democracia participativa das águas, por meio de uma comunicação
mobilizadora que integra aspectos da comunicação informacional e de interação relacional.
Assim, MEANDROS tem como ponto forte o seu conteúdo – informações e conhecimentos da
bacia – construído de maneira colaborativa. Aqui, destaca-se a construção de etnomapas e os
espaços de diálogos, de negociações e de busca de soluções para problemas da coletividade,
como os fóruns de discussão. Além disso, tem-se a construção de uma agenda de eventos
técnicos, culturais e de resistências que tem uma função também de conectar as pessoas no
mundo real, uma vez que os autores consultados reforçam a importância da comunicação face
a face no processo de sensibilização, considerada a mais mobilizadora e a que possibilita
ações mais coesas. Outro espaço é o do registro da memória que, de acordo com os teóricos
da comunicação, se trata de um aspecto importante para manter um acervo histórico e
registrar as lutas e os resultados obtidos. A linguagem acessível, com suporte de imagens, é
outra força do aplicativo.
Dentre os limites observados para o MEANDROS estão os custos para o seu
desenvolvimento, que demanda uma interface customizada, integração com websites (links),
interação dos usuários com o app e acesso restrito (login). Além disso, tem-se os custos de
manutenção do aplicativo, incluindo, uma equipe de gerenciamento diário da ferramenta para
atualizar dados e informações e aprovar as contribuições dos usuários.
140
A despeito dos limites e das potencialidades, conclui-se que as mídias digitais – com
suas inovações e dinamismo – são ferramentas estratégicas para ampliar o acesso a
informações e conhecimentos sobre recursos hídricos em bacias hidrográficas urbanas. Mas,
ganha sentido e validade se fizer parte de um planejamento integrado, como destacado pelos
autores estudados no referencial teórico desta dissertação.
Cabe ressaltar, como posto na metodologia, que, caso se avance para a implementação
deste protótipo, é necessário realizar o teste de usabilidade com o grupo amostral de usuários
alvos, para verificar a eficácia das telas propostas. E mais, é preciso que o seu projeto seja
integrado ao planejamento global da entidade que irá operacionalizá-lo. Dessa forma, o
programa poderá se tornar mais efetivo em sua finalidade de contribuir com a democratização
de informações e conhecimentos sobre recursos hídricos, se tornando um ponto de encontro
digital relevante entre os moradores da bacia do ribeirão Arrudas, com impactos positivos na
gestão das águas no território.
141
REFERÊNCIAS
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estão sendo criados?. Ambient. soc., Campinas, v.8, n.2, p.99-124, Dec. 2005. Disponível
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Poder nos Organismos Colegiados de Bacia Hidrográfica no Brasil, São Paulo: Annablume,
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148
ANEXO A - UPGRHs de Minas Gerais, com destaque para a bacia do rio das Velhas
Fonte: Elaborado por Nádia Santos com a base de dados do Igam, 2018.
149
ANEXO B - Hidrografia da sub-bacia do ribeirão Arrudas
Fonte: Elaborado por Nádia Santos com a base de dados do Igam, 2018
150
ANEXO C - Unidades de Conservação inseridas na sub-bacia do ribeirão Arrudas
Fonte: Elaborado por Nádia Santos com a base de dados do Igam, 2018.
151
ANEXO D - Mapa da qualidade das águas da bacia do ribeirão Arrudas, de 1997 a 2017
Fonte: Elaborado por Nádia Santos. Dados Igam 2018
152
ANEXO E - Termo de Responsabilidade de Cessão de Direito de Uso de Imagens
153
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