uma fábrica de loucos: psiquiatria x espiritismo no brasil (1900-1950) angélica a. silva de...
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“Uma Fábrica de Loucos”:
Psiquiatria X Espiritismo no Brasil
(1900-1950)
Angélica A. Silva de Almeida
NUPES – Núcleo de Pesquisa em Espiritualidade e Saúde - UFJF
Introdução
● O estudo das religiões tem despertado interesse nas ciências humanas
● Religiosidade marca fundamentos da cultura brasileira
Introdução
● Brasil: grande influência do fator religioso Formação da sociedade Estruturação dos costumes
● Maior consolidação do Espiritismo
● Influência de suas idéias
Além do número de adeptos
Introdução
● Espiritismo procurou inserir-se em dois campos: o científico e o religioso.
● Igreja Católica e Médicos: grupos de maior conflito
● Médicos questionam as teorias espíritas e suas pretensões científicas
Introdução
● História do espiritismo e psiquiatria: vários pontos de contato e de
conflito
●Paradigmas alternativos: monista X dualista
Introdução
●Percepções diferentes: relação mente-corpo loucura modos de tratamento
●Uma ampla rede de hospitais psiquiátricos espíritas
A “loucura espírita”
● Conflito sobre a “loucura espírita”: pouco explorado
● Grande envolvimento da comunidade psiquiátrica brasileira
Objetivo
Investigar a construção da representação da mediunidade enquanto loucura
“loucura espírita”
● Recorte Espacial: sudeste brasileiro
● Recorte Temporal: 1900-1950
O conflito nos EUA e na Europa
● Conflito teve início nos EUA e Europa (séc. XIX)
● Dois grupos buscando espaço e legitimidade na sociedade
O conflito nos EUA e na Europa
● Visões diferentes sobre a mente, as doenças mentais e o seu tratamento
O conflito nos EUA e na Europa
● Fenômenos mediúnicos
Misticismo Fraude/Charlatanismo Fruto do subsconsciente Loucura
Como Kardec analisou a questão do misticismo
● Necessário comprovar a inexistência dos espíritos
● Sobrevivência após a morte e comunicação com os espíritos
● Não sobrenatural● Lei da natureza
Como Kardec analisou a questão do misticismo
● Teorias baseadas em estudos rigorosos
● Cientistas, ao contrário, poucas investigações
Como Kardec abordou a questão da fraude
● A existência de fraudes não implica que todos os fenômenos sejam fraudulentos
● Investigação ampla dos fenômenos espíritas por diversos cientistas
● Análise pouco criteriosa dos fatos e pesquisas já realizadas sobre a mediunidade
O espiritismo como causa de loucura
● Entre os médicos e psicólogos, dois grupos:
- Investigação dos riscos do Espiritismo
- Compreensão do funcionamento da mente
O espiritismo como causa de loucura
Ambiente místico e pouco racional de uma sessão espírita
Indivíduos predispostos
Eclosão dos fenômenos de dissociação
O espiritismo como causa de loucura
● “Delírio espírita”: modalidade da loucura religiosa não uma classe diagnóstica
particular
Como Kardec lidou com a questão da “loucura espírita”
Agentes desencadeadores da loucura
Causas biológicas Meio cultural
Influência espiritual
● Diagnóstico diferencial difícil
O debate entre psiquiatras e espíritas no Brasil
● Concorrência entre duas forças
sociais
Reconhecimento e legitimidade científica e social
Autoridade intelectual sobre a mente e a loucura
O debate entre psiquiatras e espíritas no Brasil
● Grupo vencedor: autoridade
científica e intelectual para
estudar e explicar: a mediunidade o funcionamento da mente a origem das doenças mentais
Médicos● Livros, teses, artigos, moções,
inquéritos, discursos e
conferências● Defendiam controle
governamental● Proibição de divulgação do
Espiritismo
Médicos
● “1° - É V. Excia. de opinião que exista fundamento
scientifico nos chamados phenomenos espiritas?● 2° - Conhece V. Excia. factos ou experiências que
documentem scientificamente o Espiritismo?● 3° - A pratica do Espiritismo pode trazer damnos à
saúde mental do individuo?● 4° - O exercício abusivo da arte de curar pelo
Espiritismo acarreta perigos para a saúde publica?”
Médicos
● Combate ao charlatanismo
● Tratamento e internação dos médiuns
● Ampliação do tratamento médico público
Espíritas
● Livros, artigos e uma tese em medicina
● Fundaram hospitais psiquiátricos espíritas
● Críticas à Psiquiatria
Espíritas
● Defesa dos seus métodos de tratamento
● Ênfase no aspecto caritativo● Espiritismo não desencadearia
loucura
Os hospitais psiquiátricos espíritas
● 1918-40: cinco hospitais psiquiátricos espíritas inaugurados
● Outros em fase de construção
● Proposta complemetar de tratamento materializada nessas instituições
● Para os psiquiatras: reconhecimento público dos prejuízos do espiritismo
Os hospitais psiquiátricos espíritas
● 1950-: grande número de instituições
● inserção do espiritismo nos domínios da saúde mental: hospitais psiquiátricos
● Nos anos de 1980: ± 100 hospitais no Brasil
● São Paulo (1994): dos 98 hospitais psiquiátricos, 22 eram espíritas
HOJE
● 03/09/46 - 1º comissão da diretoria do hospital:
● “Ata da reunião da Diretoria do Grupo Espírita João Evangelista, (...) para o fim especial de indicar a Comissão Diretora do Sanatório João Evangelista.
● Dona Anna Germignani (Provedora)● Sr. Edgard Souza Motta (Secretário)● Sr. João Fernandes d´Almeida (Tesoureiro)● Cel. Arlindo Ribeiro de Andrade (Vogal)● Sr. Oscar Ribeiro Jordão(Vogal)● Dr. José Primavera (Médico Responsável)
HOJE
● 5/10/46 – reunião na sede provisória à Rua Rubi, nº 40, no bairro da Aclimação, residência do casal Motta
● Art. 2. – A finalidade do “SANATÓRIO JOÃO EVANGELISTA” é internar e tratar gratuitamente, enfêrmos de moléstias mentais, nervosas e toxicomaniacas, sem distinção de côr, sexo, nacionalidade ou crença religiosa.
HOJE
● Art. 4. – No Sanatório serão ministrados aos enfêrmos, sempre que possível os mais modernos recursos da ciência médica e farmacêutica inclusive a homeopata.
● Art. 17. – A Comissão Diretora e o médico responsavel esforçar-se-ão para que todo o pessoal componente do Sanatório paute seus atos e pensamentos pelos ensinos do cristo-Jesus, consubstanciados num só-: “AMAR AO PRÓXIMO COMO A SI MESMO”.
HOJE
● Art. 22. – No limite do possivel será permitido aos doentes internados a assistência espiritual do credo a que pertencerem.
● Art. 23. – Tendo o Espiritismo por base o puro Crsitianismo, e respeitando, portanto todas as convicções, não será sob qualquer forma permitido no Sanatório crítica as crenças alheias.
HOJE
● 1947 – doação do terreno e inicio da campanha de arrecadação
● 1948 – lançamento da pedra fundamental
● A inauguração do HOJE ocorreu no dia 05 de julho de 1953 em homenagem à data de nascimento do Dr. Augusto José da Silva, ‘mentor espiritual’ do GEJE e do hospital.
● A solenidade teve início com plantio de um Carvalho por D. Nina e Sr. Edgard, onde foi feita uma prece para a entrega do Hospital
HOJE
● As primeiras internações - 15/07/1953
● Importância à conjugação dos tratamentos médico e espiritual.
● Reuniões de desobsessão para os pacientes
● Reuniões de desenvolvimento mediúnico, fazendo parte os ex-internos que começaram a freqüentar a doutrina espírita.
● Todas as noites lia-se uma página do Evangelho Segundo o Espiritismo e realizava-se uma prece, antes dos pacientes dormirem.
● Sessões de cura pela irradiação mental
HOJE
● Pelos serviços prestados o Hospital foi considerado de Utilidade Pública Estadual em 20/12/1961, Utilidade Pública Municipal em 03/07/1968 e Utilidade Pública Federal em 11/07/1983.
Estratégias Discursivas
● Psiquiatras:
Representação da mediunidade
como loucura ou fraude
Inexistência de um elemento
extra-material
Estratégias Discursivas
● Associação do Espiritismo ao primitivismo e às religiões afro-brasileiras
“(...) se desenvolve (o Espiritismo) num terreno adubado pela
ignorância, pelas superstições, em meio profundamente tarado”
(Oscar de Souza apud: Pacheco e Silva, 1950)
Estratégias Discursivas
● Risco social das práticas espíritas
●Causa de loucura●Exercício ilegal da Medicina
Estratégias Discursivas
“O Livros dos Médiuns de Allan Kardec é a cocaína dos debilitados nervosos(...) e com
um agravante a mais: é barato, está ao alcance de todos e por isso mesmo leva
mais gente, muito mais, aos hospícios, do que a “poeira do diabo” (...) a sua hygiene e
prophylaxia estão, apenas, em se queimarem todos os livros espíritas e se fecharem todos os candomblés, altos,
médios e baixos, que, ora, infestam o Rio, o Brazil e todo o mundo occidental”.
(Oliveira, 1931)
Estratégias Discursivas
● Espíritas: Mediunidade: real manifestação de espíritos
Utilidade do Espiritismo para a
sociedade
Dissociar-se das outras religiões
mediúnicas
Estratégias Discursivas“(..) para esclarecimento quero fazer de princípio uma
distinção necessária: há Espiritismo e Espiritismo se assim posso me expressar. O praticado por pessoas
clarevidentes, perfeitamente a par dos princípios religiosos, phylosophicos da doutrina kardeciana, incapazes de se submetterem a absurdos e de se perderem em crenças illusorias – este é o verdadeiro e único Espiritismo. O
chamado “baixo Espiritismo” outrora adoptado, abusivamente nos nossos subúrbios, pelas baixas classes
sociaes e cujas praticas ridículas a Secretaria de Segurança Publica cohibiu de todo, este é puro embuste, e não se
pode chamar, verdadeiramente, Espiritismo. (...) Aliás, as medidas das autoridades attingiu certos meios e certas pessoas absolutamente idôneas e muito distanciados
daquellas feitiçarias” (Luiz Goes. Diário da Noite, 1939).
Estratégias Discursivas
Relativizar autoridade científica dos psiquiatras
Dogmatismo e falta de pesquisas
Questionamento das estatísticas
Complementariedade
Espiritismo/Medicina
Estratégias Discursivas
“É preciso que o publico saiba, ainda, o quanto de verdade encerram as estatísticas de alguns colegas,
pois, na sua grande maioria, são feitas do modo seguinte: O colega indaga, ligeiramente, da família do
doente, ou deste, seus antecedentes familiares, historia da doença actual e (...) se freqüentou o Espiritismo. Se o doente diz que sim, é canja um diagnóstico. La vae mais um para a estatística. Mas (...) o colega não pergunta se ele peregrinou pelos ambulatórios da especialidade sem que lhe dessem a devida atenção, se não recorreu ao
Espiritismo desanimado da sciencia official. Isso não se faz (...)”
(Gonçalves Maia. Diário da Noite, 14/06/1939).
O acirramento do confronto
● Décadas de 1930-40: ápice do conflito
Debate na imprensa leiga
Publicação de livros
Maior controle governamental
O acirramento do confronto
Moções contra programa de
rádio espírita e atividades de
cura
Espíritas intensificaram os
debates
● Aos poucos o conflito perdeu intensidade
Espiritismo se consolidou mais no
campo religioso
Psiquiatria maior respeitabilidade
científica e social
Visão mais antropológica e
culturalista
Conclusão
● Conflito intenso entre dois grupos em busca de legitimidade e hegemonia de suas idéias
● “Loucura espírita”: estratégia discursiva
● Resolução ligada à inserção e legitimação social em campos distintos
angelica.asalmeida@gmail.com
www.hoje.org.br/bves
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