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VALDIR JOSÉ CORRÊA JÚNIOR
UMA EXPERIÊNCIA DE USO DO GEOGEBRA NA IDENTIFICAÇÃO DE PADRÕES EM TRIGONOMETRIA
ITAJAI (SC)
2014
UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI
Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE
Curso de Mestrado Acadêmico em Educação
VALDIR JOSÉ CORRÊA JÚNIOR
UMA EXPERIÊNCIA DE USO DO GEOGEBRA NA IDENTIFICAÇÃO DE PADRÕES EM TRIGONOMETRIA
Dissertação apresentada ao colegiado do PPGE, da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) como requisito à obtenção do grau de Mestre em Educação – área de concentração: Educação – (Linha de Pesquisa: Cultura, Tecnologia e Aprendizagem)
Orientador: Dr. André Luís Alice Raabe
ITAJAI (SC) 2014
RESUMO Os Indicadores dos testes aplicados em larga escala como PISA e SAEB/PROVA BRASIL tem evidenciado o que as pesquisas sobre Educação Matemática já mostravam há muito tempo. O ensino da Matemática necessita ser repensado no Brasil. Em geral o ensino voltado a transmissão de conceitos prontos, desconexos e que não fazem sentido para uma parcela significativa dos estudantes predomina na realidade das escolas, tornando cada vez mais a Matemática uma ferramenta de exclusão. Dentre as diversas abordagens possíveis para buscar reverter este processo a presente pesquisa focaliza na essência da Matemática que é a percepção de padrões, e o faz buscando o apoio nas Tecnologias da Informação e Comunicação. Nesta direção foi realizada uma sequência didática com estudantes do 9º ano do ensino fundamental buscando fomentar a habilidade de perceber padrões e representá-los simbolicamente. Na atividade, cujo tema era trigonometria, foi utilizado o software Geogebra. O referencial teórico que norteou as crenças pedagógicas está centrado numa perspectiva construcionista (Papert), envolta em contribuições das teorias piagetiana (Piaget) e sócio-histórica (Vygotsky). A pesquisa concentra-se em analisar os resultados da sequência didática desenvolvida em uma abordagem mista. Usa um design quasi-experimental com grupo de controle na fase quantitativa e como mensuração aplica um teste matemático sobre trigonometria. Na fase qualitativa utiliza análise de conteúdo das perguntas abertas de um questionário respondido pelos estudantes e o método clínico na condução e registro das entrevistas individuais realizadas com três estudantes que participaram da sequência didática. Os resultados obtidos no pós-teste e análises provenientes das entrevistas apontam para as vantagens oriundas do uso do Geogebra no desenvolvimento da habilidade de perceber e representar simbolicamente padrões, além de contribuir para a construção de uma nova relação entre os estudantes e a Matemática, mais crítica, autônoma, criativa e motivadora. Palavras-chave: Educação Matemática; Informática na Educação Matemática; Geogebra; Trigonometria;
ABSTRACT Indicators from tests applied on a large scale, such as the PISA and SAEB/PROVA BRAZIL have shown what research in mathematics education had already demonstrated long ago; that the teaching of mathematics needs to berethought in Brazil. In general, the teaching that predominates in the reality of schools is geared towards the transmission of disconnected, previously prepared concepts that do not make sense to significant portion of students, turning mathematics into a mechanism of exclusion. Among several possible approaches to reverse this process, this research focuses on the essence of mathematics, which is the perception of patterns, seeking support from Information and Communication Technologies. Along these lines, a didactic sequence was created, for use with students in the 9th grade of elementary school, aimed at fostering the ability to perceive patterns, and represent them symbolically. In the activity, which was based around the theme of trigonometry, the software Geogebra was used. The theoretical framework that guided the pedagogical premises is centered on Papert‟s constructionist perspective, permeated by contributions from Piaget‟s theories and Vygotsky‟s social historical theories. The research analyzes the results of the didactic sequence developed through a mixed approach. It uses a quasi-experimental design with a control group in the quantitative phase, and for the measurement, it applies a mathematical test on trigonometry. In the qualitative phase, it uses content analysis, based on the responses to the open questions of a questionnaire applied to the students, and the clinical method for conducting and recording individual interviews with three students who participated in the didactic sequence. The results of the post-test and analysis of the interviews highlight the advantages of using Geogebra in the development of the ability to perceive and represent patterns symbolically, as well as contributing to building a new relationship between students and Mathematics that is more critical, autonomous, creative and motivating. Keywords: Mathematics Education; Technology in Mathematics Education; Geogebra; Trigonometry
“Ignis aurum probat, miseria fortes viros.”
(Sêneca)
Tradução livre:
“O fogo prova o ouro, a miséria
(adversidade) os homens fortes”
AGRADECIMENTOS
Agradecer nem sempre é fácil: corre-se o risco do esquecimento! Mas é
preciso, afinal ninguém caminha sozinho nesta vida. Vamos lá...
Minha família. Começando pela minhã mãe, Maria Rita, mulher guerreira,
batalhadora, exemplo de vida, muito obrigado por tudo. Ao meu padrastro, Egon,
pela força que nos deu em tempos difíceis... Meus irmãos, Roberta, Paula, Júlia
e Egon, cada um do seu jeito, obrigado por acreditarem em mim. Este momento
é uma conquista de todos nós!
Fazer o mestrado com dois bebês em casa não é nada fácil, ainda mais
quando se tem que trabalhar trinta horas por dia para sustentar os pequenos.
Mas eu tive a sorte de contar sempre com ela: minha esposa Fabiana. Do seu
jeito, muitas vezes brigando comigo pelas “viradas de noite”, pelos dias em que
queria passear, mas eu tinha trabalho para fazer, leituras, textos... Estou certo
de que sem você ao meu lado eu não teria conseguido chegar até aqui. “Etam”
para sempre...
Meus filhos Gabriel, Leonardo e Guilherme, meus amados, muito do
esforço do pai vem no sentido de garantir a vocês uma boa qualidade de vida.
Ao meu segundo pai, Enio, e a minha segunda mãe, Simoni, minha eterna
gratidão. Certamente eu não estaria aqui se não fosse pela coragem, pela
dedicação, pelo amor que sempre me dedicaram e agora aos meus pequenos.
Aos meus amigos, especialmente ao meu “irmão” Leonardo Soares,
obrigado pelo carinho, respeito e consideração que sei tem por mim. E ao
grande “Giba”, valeu pelas dicas, pelos bate-papos, pela amizade verdadeira.
Desde o início da investigação tive apoio institucional, tanto
financeiramente – o Colégio Salesiano Itajaí assumiu os custos relativos ao
mestrado –, quanto no sentido de abrir espaços para que a pesquisa se
desenvolvesse. Assumir os custos faz parte de um plano de ação estratégico de
formação continuada do corpo docente. Abrir espaços para esta investigação é
sinal da preocupação que a instituição tem com a formação matemática de seu
corpo docente e discente e da crença institucional de que as novas tecnologias
podem interferir positivamente nos processos de ensino de aprendizagem
matemática. Fundamental salientar a abertura dada para consultas a dados
relativos às notas dos estudantes, a dados relativos ao quadro funcional, dentre
outros. Por isso é absolutamente imprescindível agradecer ao então diretor do
Colégio Salesiano Itajaí, Padre Arcângelo Deretti, que confiou em mim e permitiu
que meu sonho de fazer o mestrado se realizasse. Tenha certeza que saberei
reverter o investimento realizado pelo Colégio Salesiano Itajaí trabalhando em
prol da educação dos jovens de Dom Bosco.
À Verônica Roncelli, administradora do Colégio Salesiano Itajaí que me
impulsionou a fazer o mestrado e não mediu esforços para que eu pudesse, aos
trancos e barrancos, dar conta do recado, meu reconhecimento e gratidão.
Aos colegas de mestrado meu muito obrigado, seguido de um sincero
pedido de desculpas por qualquer situação ruim/desagradável que tenha
acontecido ao longo de nossos estudos. Saibam que só levarei lembranças
positivas de todos vocês.
Aos professores que sempre me ajudaram, muito obrigado mesmo. Tenho
certeza de que todos vocês são muito mais do que meros profissionais da
educação. Quero agradecer, particularmente, ao professor Marcelo pelos
conselhos e conversas que mantivemos, pela oportunidade de aprimorar minha
produção textual e ao professor Luís, o Máximo, que ao longo desse tempo todo
sempre esteve disposto a colaborar, mostrando que é o “Máximo” não somente
no sobrenome...
Ao pessoal da secretaria, Mari e Tânia, valeu por tudo! Sempre muito
prestativas. Não lembro de tê-las visto de mal humor, tristes durante esses dois
anos e meio...Sempre com um sorriso aberto para nos acolher...
Ao professor André, meu orientador, a quem aprendi a admirar e
respeitar, apesar de no começo do mestrado divergirmos em muitas coisas.
Posso dizer que conheci na universidade um grande professor com um enorme
coração, repleto de bondade e sabedoria. Obrigado por ter acreditado em mim
quando eu mesmo já estava duvidando... Parte significativa desta conquista é
sua...
Para terminar, agradeço ao meu grande amigo Rubem Alves, a quem
nunca nem sequer cumprimentei, mas que, mesmo sem saber, é minha fonte de
fé na educação e no poder das pessoas de construírem um mundo melhor...
Desculpem se esqueci de alguém... Prometo que agradeço quando
estiver terminando minha tese de doutorado...
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Grupos Experimental e de Controle e as etapas da pesquisa ........... 29
Figura 2- Corda em uma circunferência ............................................................. 47
Figura 3 - Seno de um ângulo a partir de uma corda ......................................... 48
Figura 4 - Interação aprendiz-computador ......................................................... 60
Figura 5 - Geometria Dinâmica: o poder de transformar .................................... 61
Figura 6 - Traçando retas com auxílio do Geogebra .......................................... 64
Figura 7 - Inserindo pontos com auxílio do Geogebra ........................................ 65
Figura 8 - Traçando retas paralelas com auxílio do Geogebra........................... 65
Figura 9 - Localizando um ângulo ...................................................................... 77
Figura 10 - Representação pictórica do problema .............................................. 78
Figura 11 - Resolução do problema ................................................................... 79
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 - Comparativo do PISA (Matemática) entre 2003 e 2012, por nível 17
GRÁFICO 2 - Formação acadêmica .................................................................. 31
GRÁFICO 3 - Notas dos estudantes do CSI no ENEM, em Matemática ............ 33
GRÁFICO 4 - Comparativo: CSI x outras escolas privadas ............................... 34
GRÁFICO 5 - Médias em Matemática (GE) 1º e 2º trimestres ........................... 35
GRÁFICO 6 - Resultado do Avalia, em Matemática, para o GE ........................ 36
GRÁFICO 7 - Médias em Matemática (GC) 1º e 2º trimestres ........................... 37
GRÁFICO 8 - Resultado do Avalia, em Matemática, para o GC ........................ 38
GRÁFICO 9 - Comparativo de médias GC e GE ................................................ 39
GRÁFICO 10 - Para você, o que é Matemática? ............................................... 83
GRÁFICO 11 - Descreva uma experiência positiva que você já teve com a
Matemática em sua vida .................................................................................... 85
GRÁFICO 12 - Descreva uma experiência negativa que você já teve com a
Matemática em sua vida .................................................................................... 87
GRÁFICO 13 - Qual das frases abaixo melhor representa a sua opinião em
relação à Matemática? ....................................................................................... 88
GRÁFICO 14 - Participação no pós-teste ........................................................ 104
GRÁFICO 15 - Médias no pós teste ................................................................. 106
GRÁFICO 16 - Médias consideradas do pós-teste .......................................... 107
GRÁFICO 17 - Comparação de acertos por questão – GC x GE..................... 110
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - Metodologia .................................................................................. 30
QUADRO 2 - Níveis da escala de proficiência para as competências leitora e
matemática ......................................................................................................... 36
QUADRO 3 - Síntese do experimento ................................................................ 45
QUADRO 4 - Descrição dos estágios do desenvolvimento cognitivo ................. 54
QUADRO 5 - Trabalhos relacionados ao uso de softwares para ensino de
Trigonometria ..................................................................................................... 68
QUADRO 6 - Roteiro .......................................................................................... 99
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- PISA 2003 a 2012: resultados por países (Matemática) .................... 16
Tabela 2 - Custo do atendimento ....................................................................... 22
Tabela 3 - Período e raio da órbita ..................................................................... 22
Tabela 4 - Corpo docente do CSI por gênero e nível ......................................... 31
Tabela 5 - Estatística de candidatos inscritos e classificados no Vestibular da
UFSC ................................................................................................................. 32
Tabela 6 - GC x GE: comparativo por nível do AVALIA ..................................... 39
Tabela 7 - Comparativo das médias GE x GC por intervalo ............................... 40
Tabela 8 - Médias finais GC x GE ...................................................................... 40
Tabela 9 - Comparativo entre o CSI e outras escolas por nível de proficiência do
AVALIA ............................................................................................................... 41
Tabela 10 - Estatística das amostras ............................................................... 108
Tabela 11 - Teste F .......................................................................................... 109
Tabela 12 - Teste T .......................................................................................... 109
Tabela 13 - Teste Z (questões do pós-teste).................................................... 111
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AVALIA – Empresa de Assessoria Educacional
CSI – Colégio Salesiano Itajaí
EDUMATEC – Educação Matemática
ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio
EUA – Estados Unidos da América
GC – Grupo de controle
GD – Geometria Dinâmica
GE – Grupo experimental
Geogebra – software de geometria dinâmica
GPIMEM – Grupo de Pesquisa em Informática, outras Mídias e Educação
Matemática
ICMC – Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação
IGCE – Instituto de Geociências e Ciências Exatas
IME – Instituto de Matemática e Estatística da USP
INAF – Índice de Alfabetismo Funcional
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPBM – Instituto Paulo Montenegro
LEM – Laboratório de Ensino de Matemática
LInE – Laboratório de Informática a Educação
LOGO – Linguagem de programação
NCSM – National Council of Supervisors of Mathematics
OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômicos
ONG – Organização não governamental
PISA – Programme for International Student Assessment
Poli – Escola Politécnica da USP
RSE – Rede Salesiana de Escolas
SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica
TIC – Tecnologia da Informação e Comunicação
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
USP – Universidade de São Paulo
ZDP – Zona de Desenvolvimento Proximal
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 16
1.1 TRAJETÓRIA PESSOAL ................................................................................................... 24 1.2 OBJETIVOS .................................................................................................................... 25
1.2.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................... 25 1.2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ....................................................................................... 25
1.3 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................... 25 1.4 METODOLOGIA ............................................................................................................. 27
1.4.1 1.4.1 CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA ..................................................................... 30 1.4.2 Sujeitos .................................................................................................................. 34
1.4.2.1 GRUPO EXPERIMENTAL ................................................................................ 34 1.4.2.2 GRUPO DE CONTROLE .................................................................................. 37 1.4.2.3 EQUIVALÊNCIA ENTRE OS GRUPOS .............................................................. 38 1.4.2.4 GENERALIDADE DA AMOSTRA...................................................................... 41
1.4.3 PROCEDIMENTOS ................................................................................................. 42
2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................. 47
2.1 TRIGONOMETRIA: UM POUCO DE HISTÓRIA ................................................................ 47 2.2 AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO ............................................... 49 2.3 PIAGET E O CONSTRUTIVISMO ...................................................................................... 51 2.4 AS CONTRIBUIÇÕES DE VIGOTSKY ................................................................................ 55 2.5 O CONSTRUCIONISMO DE PAPERT ............................................................................... 58 2.6 GEOMETRIA DINÂMICA ................................................................................................ 61
2.6.1 O GEOGEBRA ........................................................................................................ 62 2.6.2 USANDO O GEOGEBRA: EXEMPLO DE ATIVIDADES .............................................. 63
2.7 INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA .............................................................. 66
3 DESENVOLVIMENTO ................................................................................................ 71
3.1 INTERVENÇÃO REALIZADA ............................................................................................ 71 3.1.1 3.1.1 ONDE TUDO COMEÇOU... ............................................................................ 71 3.1.2 3.1.2 AUMENTAM-SE AS DIFICULDADES... ........................................................... 73 3.1.3 3.1.3 BUSCANDO REGULARIDADES... ................................................................... 75
3.2COLETA DE DADOS ........................................................................................................... 80 3.2.1 1ª ETAPA ............................................................................................................... 80 3.2.2 2ª ETAPA ............................................................................................................... 88
3.2.2.1 O método clínico........................................................................................... 89 3.2.2.2 Entrevistas .................................................................................................... 91
3.2.3 3ª ETAPA ............................................................................................................. 103
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 112
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 116
16
1 INTRODUÇÃO
Os problemas relacionados à Educação Matemática no Brasil são muitos.
Tomando como referência o desempenho dos estudantes brasileiros no PISA
(Programme for International Student Assessment) na área de Matemática do
ano de 2012 verifica-se que este é classificado como insuficiente. A Tabela 1 –
Comparativo de resultado/Pisa - apresenta os resultados do Brasil e de outros
países no teste PISA, em Matemática, dos anos de 2003 a 2012.
Nota-se que em 2003 a média dos estudantes brasileiros em Matemática
foi de 356 pontos e em 2012 foi de 391,5. Apesar deste aumento, os números
colocam o país abaixo de México, Uruguai e Chile e, muito abaixo de países
como a Finlândia e a Coreia do Sul, países cujos estudantes obtiveram os
melhores resultados no Pisa (Matemática) e que, consequentemente, servem
como parâmetro de comparação.
O Gráfico 1- Comparativo do Pisa (Matemática) entre 2003 e 2012, por
nível mostra que em 2012 aproximadamente 35% dos estudantes que
participaram do PISA encontram-se num nível de proficiência “abaixo de 1”,ou
seja, abaixo do mínimo. Isso significa que a Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômicos (OCDE) que aplica o teste, não especifica as
habilidades desenvolvidas pelos indivíduos cujo desempenho esteja neste nível,
ou por não terem sido desenvolvidas ou por estarem muito aquém daquelas
Fonte: Relatório PISA (site do MEC)
Tabela 1- PISA 2003 a 2012: resultados por países (Matemática)
17
relativas ao nível 1. Além disso, o gráfico mostra que menos de 1% dos
estudantes atingiram o nível 6 de proficiência, o mais alto na escala adotada
pelo PISA.
GRÁFICO 1 - Comparativo do PISA (Matemática) entre 2003 e 2012, por nível
Fonte: Relatório PISA (site do MEC)
Os resultados do SAEB/PROVA BRASIL 2011 (INEP, 2013) também são
preocupantes. Nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, por exemplo, temos
uma média aproximada de 210 pontos. Na escala utilizada pelo Sistema de
Avaliação da Educação Básica (SAEB) , isso representa o nível 4, de um total de
12. Já a média relativa aos Anos Finais do Ensino Fundamental,
aproximadamente 250 pontos, está no limite entre os níveis 4 e 5 nesta mesma
escala. Para o Ensino Médio, a média, em torno de 274 pontos, seria o
equivalente ao nível 1, de um total de 6.
O Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação educativa, co-fundadores e
executores do Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF), após pesquisa
realizada por mais de dez anos, destacam que “[...] o percentual da população
alfabetizada funcionalmente foi de 61% em 2001 para 73% em 2011, mas
apenas um em cada 4 brasileiros domina plenamente as habilidades de leitura,
escrita e matemática [...] Os resultados mostram que durante os últimos 10 anos
houve uma redução do analfabetismo absoluto e da alfabetização rudimentar e
um incremento do nível básico de habilidades de leitura, escrita e matemática.
No entanto, a proporção dos que atingem um nível pleno de habilidades
manteve-se praticamente inalterada, em torno de 25%.” (IPBM, 2014)
18
São vários fatores que se juntam para formar o quadro atual. Pode-se
falar da (des)formação docente, sinalizada por Nóvoa (1997) que menciona que
não há ensino de qualidade, nem reforma educativa, sem adequada formação
de professores. Pode-se mencionar a (des)valorização docente ou a falta de
motivação dos alunos, conforme Pozo (2002) a motivação é um requisito, uma
condição prévia da aprendizagem, afirmando que sem motivação não há
aprendizagem. Ainda sobre este aspecto, Bzuneck (2001) afirma que a
motivação talvez seja o principal elemento do êxito e da qualidade do que se
aprende na escola.
Para Vergnaud (2008), o problema está no foco dado à Matemática no
contexto escolar: muita simbologia, muito “rigor” e pouca realidade. D´Ámbrósio
(1998) sinaliza que os programas de Matemática são, em sua maioria,
justificados exclusivamente em afirmações como ”no meu tempo se fazia assim”.
A obsolescência dos programas de Matemática é absolutamente injustificável.
Quando se observa o que acontece em muitas salas de aula pode-se
entender parte do problema. Uma Matemática estéril, a-histórica, ilógica, um
aglomerado de regras/enunciados aparentemente sem sentido que, ao invés de
motivar os estudantes, acomoda-os, quando não os aterroriza, afastando-os de
qualquer tentativa de contato mais íntimo com a Matemática. Neto (1994) diz
que
Infelizmente, entre nós, o ensino da Matemática fica quase que apenas nos níveis de conhecimento e utilização de métodos e procedimentos, isto é, o aluno aprende a terminologia e as fórmulas e treina fazer substituições para resolver problemas de rotina. A Matemática fica transformada em algo rígido, acabado, chato, sem finalidade. O aluno usa apenas a memória; não desenvolve as habilidades de extrapolar, raciocinar, criar. Não tem o prazer da descoberta. Ficam faltando elementos para o seu desenvolvimento integral.(NETO, 1994)
Os estudantes não constroem conhecimento matemático pois, segundo
Chevallard (2003), tradicionalmente o trabalho matemático dos alunos não tem
sido levado a sério: na verdade, ele nunca foi considerado um verdadeiro
trabalho matemático. Dante (2000) destaca que a rapidez com que ocorrem as
mudanças na sociedade e o avanço cada vez mais célere da tecnologia
impedem que se faça uma previsão exata de quais habilidades, conceitos e
algoritmos matemáticos seriam hoje necessários para preparar um aluno para
19
sua vida futura. E continua: “...Assim, um caminho bastante razoável é preparar
a criança para lidar com situações novas, quaisquer que sejam elas.”.
Diante desta situação complexa,diversas possibilidades de atuação
aparecem. Certamente, o uso das tecnologias de Informação e Comunicação é
uma delas. Valente (2005) ressalta que hoje, a utilização de computadores na
Educação é muito mais diversificada, interessante e desafiadora, do que
simplesmente a de transmitir informação ao aprendiz. O computador pode
também ser utilizado para enriquecer ambientes de aprendizagem e auxiliar o
aprendiz no processo de construção do seu conhecimento. O uso destas novas
tecnologias abre importantes possibilidades de interação entre os estudantes e a
Matemática, interações estas que podem ser mediadas pelo professor. Kenski
(2009) aponta para os benefícios do uso das TICs ao afirmar que quando esses
recursos são bem utilizados provocam alterações nas relações entre os sujeitos
envolvidos no processo pedagógico (professores e alunos) e proporcionam um
maior aprofundamento nos conteúdos estudados. Borba e Penteado (2005)
afirmam que as TICs podem ser grandes aliadas no ensino da Matemática por
permitirem a experimentação e a ênfase no processo de visualização. Vê-se que
podem contribuir de maneira significativa para a construção de conceitos
matemáticos por parte dos estudantes. Deve-se ressaltar, porém, que esta visão
pressupõe uma utilização não meramente instrucionista destas novas
tecnologias, conforme salientado por Ponte (2003).
O uso das TICs na Educação, e, particularmente, na Educação
Matemática esteve, originalmente, envolto em controvérsias. Da substituição dos
professores pelos computadores, passando pelos prováveis malefícios que o
uso de máquinas de calcular traria aos estudantes, até a certeza de que a
educação à distância democratiza o acesso ao conhecimento (Maltempi,
Javaroni, Borba , 2011). O papel que estas novas tecnologias podem vir a
desempenhar no contexto da educação matemática ainda não está bem claro
nem para os pesquisadores, muito menos para os professores. Misculin (2008)
destaca que a inserção da tecnologia na educação deve ser compreendida e
orientada no sentido de proporcionar nos indivíduos o desenvolvimento de uma
inteligência crítica, mais livre e criadora. Ponte e Canavarro (1997) afirmam que
o uso de novas mídias pode favorecer o desenvolvimento do raciocínio, da
resolução de problemas e da capacidade crítica, ao admitir outras abordagens
20
às situações matemáticas, além dos processos formais algébricos e analíticos.
Também promove a realização de atividades de modelagem, de investigação e
exploração pelos alunos, possibilitando o envolvimento dos mesmos em
atividades de matemática intensas e significativas. Por isso é grande a
esperança de que a tecnologia possa auxiliar para a melhoria das práticas
educacionais.
Chomsky (citado por Devlin, 2004), em sua teoria gerativista, afirma que
os seres humanos apresentam uma predisposição genética que permite a
aquisição da linguagem. Para Devlin (2004) essa predisposição genética para a
linguagem é o que se precisa para lidar com a Matemática. Mas, se assim fosse,
por que pessoas com bom domínio da língua materna não se sentem “tão bons
assim” quando o assunto é a Matemática? Uma possível explicação, dada pelo
autor é que as pessoas não sabem o que é a Matemática. Segundo ele, muitas
pessoas confundem Matemática com Aritmética, o que constitui um erro, uma
vez que a Aritmética é apenas uma das tantas áreas na qual a Matemática está
dividida.
Sawyer (1955), em seu livro Prelude To Mathematics, fornece uma
definição de matemática:
Para o propósito deste livro, podemos dizer que a Matemática é a classificação e o estudo de todos os padrões possíveis. A palavra padrão é usada aqui de uma maneira com a qual nem todos concordarão. Ela deve ser entendida num sentido bem amplo, cobrindo quase qualquer tipo de regularidade que se pode imaginar na mente. A vida, e certamente a vida intelectual, somente é possível porque há certas regularidades no mundo. Uma ave reconhece as listas pretas e amarelas de uma vespa; o homem reconhece que o crescimento de uma planta se segue ao plantio da semente. E, em cada caso, uma mente está ciente do padrão.(SAWER, 1955, p.12).
Gleason (apud Devlin, 2004) compartilha desta visão ao escrever que a
matemática é a ciência da ordem. Ordem aqui no sentido de padrão e
regularidade. É objetivo da matemática identificar e descrever as fontes de
ordem, tipo de ordem, e as relações entre os diversos tipos de ordem que
ocorrem.
Orton (1999) sugere que os padrões:
- podem contribuir para a construção de uma imagem mais positiva da
Matemática;
21
- permitem o estabelecimento de conexões matemáticas;
- atraem e motivam os alunos, porque apelam fortemente ao seu sentido
estético e criatividade;
- permitem a promoção e desenvolvimento das capacidades e
competências dos alunos;
- ajudam a desenvolver a capacidade de classificar e ordenar informação;
- permitem a compreensão da ligação entre a Matemática e o mundo em
que se vive.
Os padrões aparecem na natureza. Desde a simetria verificada em folhas
e flores, passando pelos padrões celestes (movimento dos astros), pela música,
até os padrões geométricos nos mosaicos. E também estão presentes em
atividades tipicamente humanas. Busca-se identificar padrões que nos permitam
fazer previsões das condições meteorológicas, para prever resultados de
eleições, médicos identificam a doença que aflige seus pacientes a partir de
certos padrões (sintomas).
O que se busca aqui é mostrar que, esta habilidade de identificar padrões
é elemento fundamental para a compreensão da Matemática, principalmente nos
estágios iniciais de construção de conhecimento. Primeiro a percepção do
padrão; depois a representação simbólica dele. Para Felicetti e Giraffa
(2012):“Num primeiro momento, os conceitos são formalizados na língua
materna, transcrevendo-os posteriormente para a linguagem matemática formal.”
A inversão desta ordem, ou pior, a não importância dada à primeira, pode ser a
origem de parte dos problemas detectados no ensino da matemática. A Álgebra,
geralmente a parte da matemática mais odiada pelos estudantes, tem, dentre
outras funções , a de representar um padrão numa determinada linguagem.
- permitem a compreensão da ligação entre a Matemática e o mundo em
que se vive.
Considere um exemplo simples que mostra como a percepção de um
padrão auxilia na construção do pensamento algébrico: uma empresa cobra pela
prestação de um serviço, uma taxa fixa de R$ 5,00 por atendimento, acrescida
de R$ 1,25 por minuto de atendimento. Quanto pagará alguém que utilizar este
serviço por: 3 minutos? 7 minutos? 20 minutos? "x" minutos?
Os dados por ser organizados na Tabela 2 – Custo do Atendimento -,
conforme mostrado abaixo:
22
Tabela 2 - Custo do atendimento
TEMPO EXPRESSÃO VALOR
3 5+ 3.1,25 R$ 8,75
7 5 + 7.1,25 R$ 13,75
20 5 + 20.1,25 R$ 30,00
x 5 + x.1,25 R$ (5+x.1,25)
Fonte: Elaborada pelo autor.
A partir da análise atenta dos três primeiros exemplos (numéricos), o
estudante pode perceber que existe um padrão na expressão que permite
calcular o valor que será pago pelo atendimento. Tem-se que todas as
expressões serão do tipo: 5 + (algum número).1,25. E este (algum número)
representa o tempo de atendimento.
Outro exemplo relacionado à percepção de padrões, pode ser identificado
no trabalho de Johannes Kepler. Estudando as tabelas de Tycho Brahe, ele
procurou estabelecer relações entre os períodos de revolução dos planetas e os
raios de suas órbitas. Depois de cerca de 10 anos de tentativas, Kepler
descobriu uma relação que é sintetizada em sua 3ª lei. A Tabela 3 – período e
órbita dos planestas apresenta os dados com os quais Kepler trabalhou:
Tabela 3 - Período e raio da órbita
PLANETA PERÍODO DE
REVOLUÇÃO (T) (EM ANOS)
RAIO DA ÓRBITA (R)
Mercúrio 0,241 0,387 1,002
Vênus 0,615 0,723 1,000
Terra 1,000 1,000 1,000
Marte 1,888 1,524 0,999
Júpiter 11,86 5,204 0,997
Saturno 29,6 9,58 0,996
Urano 83,7 19,14 1,000
Netuno 165,4 30,2 0,993
Plutão 248 39,4 1,004
Raio R dado em u.a. (unidade astronômica). 1u.a = raio da órbita da Terra. A órbita dos planetas foi suposta circular.
Fonte: MÁXIMO, A. ; ALVARENGA, B.
Note-se que os períodos de revolução dos planetas (2ª coluna da
Tabela3) são bem diferentes uns dos outros. O mesmo pode ser verificado para
os raios das órbitas (3ª coluna). Entretanto, na 4ª coluna, vê-se que as razões
23
entre os quadrados dos períodos de revolução e os cubos dos raios da órbita,
tendem a um determinado valor, ou seja, convergem para um determinado valor
(representado pela constante K). Esta percepção não é óbvia (por isso foram
necessários dez anos de trabalho por parte de Kepler), mas parece razoável
supor que de posse dos atuais recursos tecnológicos, a percepção deste padrão
teria sido “mais rápida”. E pode-se, então levantar o seguinte questionamento:
quais teriam sido as conseqüências para a ciência e, conseqüentemente, para a
humanidade, de se antecipar em dez anos as descobertas de Kepler?
Na edição de Setembro de 1989 do Mathematics Teacher, o National
Council of Supervisors of Mathematics (NCSM) dos EUA descreve, num artigo
com o título "Matemática Fundamental para o Século XXI", aquilo a que chamou
"as competências matemáticas fundamentais de que os cidadãos terão
necessidade para iniciarem a vida adulta no próximo milênio". No item
Investigação Matemática, tem-se que " [...] os alunos devem aprender por si
próprios as ideias matemáticas. Devem ser capazes de identificar padrões, fazer
generalizações e usar experiências e observações para formular conjecturas
[...]"NCSM (1989)
Tomando como ponto de partida esta concepção do que seja Matemática
e do fato de que a percepção deve anteceder a representação simbólica, surge o
seguinte questionamento: que contribuições o uso do Geogebra como elemento
mediador no processo de ensino pode trazer para que os estudantes construam,
de forma mais significativa conceitos matemáticos a partir do desenvolvimento
da competência de perceber padrões?
24
1.1 TRAJETÓRIA PESSOAL
Esta pesquisa traz consigo muito da história do pessoal do pesquisador,
no que se refere à sua vivência matemática e neste sentido esta será detalhada
a seguir.
Enquanto estudante do antigo primeiro grau, nunca sentiu grande
entusiasmo em estudar e, consequentemente, aprender matemática. Achava
tudo muito sem lógica, sem um por quê. A repetição mecânica de exercícios era
tarefa maçante, enfadonha. E, além disso, os professores carregavam consigo
um certo peso, parecia um fardo. A impressão que tinha era a de que os outros
professores (de outras disciplinas) eram mais... felizes!
Porém, no ano de 1992, um sentimento diferente em relação à
matemática surgiu. Um professor, de nome Luís Carlos Maçaneiro, começou a
mudar a história. E para fazer isso não precisou de muita coisa: bastou mostrar-
se feliz com aquilo que fazia. Ele gostava de estar ali e ensinar matemática. E o
seu gostar fez com que muitos também começassem a gostar. Mas a mudança
definitiva veio com o professor de Física, Carlos Alberto de Souza. Este mudou a
vida do pesquisador! Buscava fazer com que seus alunos pensassem e não os
enchia de exercícios enfadonhos. Fazia-os “viajar”. E mostrava como a
matemática era importante para a Física. Fórmulas eram estudadas, nunca
decoradas. A compreensão e a percepção da aplicabilidade de determinados
conceitos era, para ele, mais importante do que a simples memorização de uma
fórmula.
Ao longo deste tempo, o professor-pesquisador viu-se, constantemente,
diante de situações nas quais percebia que os estudantes, em geral:
relacionavam Matemática apenas às operações e manipulações
(numéricas e algébricas);
não viam espaço para descobertas em Matemática;
acreditavam que o uso de tecnologias não auxilia no processo de
aprender Matemática (para muitos, inclusive, atrapalha este processo);
Com o intuito de superar as visões acima expostas nasceu a presente
proposta de pesquisa.
O pesquisador interessou-se em investigar acerca das possíveis
25
vantagens que a utilização do Geogebra poderia trazer no processo. E, ao invés
de realizar tais construções com os instrumentos clássicos de desenho, elas
serão realizadas com a utilização do software Geogebra. E a determinação das
razões feita a partir da utilização de uma planilha eletrônica, também disponível
neste software. Espera-se que seja criado um cenário para investigação o qual,
segundo Skovsmose (2000), é um ambiente em que os alunos são convidados
a se envolverem nos processos de exploração.
1.2 OBJETIVOS
1.2.1 OBJETIVO GERAL
Avaliar de que forma o uso do Geogebra pode contribuir para fazer com
que os estudantes aprendam Matemática ao desenvolver a habilidade de
identificar padrões.
1.2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Conhecer as concepções dos estudantes sobre a Matemática;
Analisar o processo de identificação de padrões, em trigonometria, por
parte dos estudantes;
Avaliar o impacto de uma intervenção com uso do Geogebra na
habilidade de perceber e representar simbolicamente padrões.
1.3 JUSTIFICATIVA
Uma das características mais marcantes deste conhecimento ao qual se
dá o nome de Matemática é o fato de estar presente em todas as comunidades
humanas. Este fato é analisado por D´Ambrósio (1998) que salienta que a
matemática esta presente em todos dos currículos, em todo o mundo, em função
de sua importância.. Essa dominância universal absoluta da matemática sobre
as demais disciplinas escolares, inclusive da própria língua pátria, que
obviamente não tem o caráter da universalidade, nos convida a uma reflexão
26
muito profunda e abrangente do porquê dessas características de um setor do
conhecimento humano (D`ÁMBRÓSIO, 1998).Tradicionalmente e infelizmente, a
matemática – e em especial a matemática escolar - tem sido usada como meio
para exclusão de indivíduos. D´Ambrósio (1998) adverte que desde Platão, esse
tem sido o filtro utilizado para selecionar lideranças. A matemática assume
características quase que divinas. Ela é exata! Sua estrutura serve de modelo
para outras áreas do conhecimento. Algo que se projeta desta forma, certamente
não admite a diferença. É uma visão dicotômica: ou é assim, ou não é
matemática. E aqueles que não se adaptam a esta estrutura tão rígida são,
certamente, incapazes, inferiores. A matemática tornou-se critério para
determinar a inteligência de um indivíduo. E esta situação gera sentimentos,
reações que qualquer um que já tenha vivenciado o ambiente escolar já
presenciou: o amor de uns poucos e o ódio – pior, talvez, a indiferença – de
muitos pela matemática.. Na escola tradicional, e por que não dizer na
sociedade, “a superioridade de quem atingiu um nível mais alto em matemática é
reconhecida por todos, sendo a habilidade matemática uma marca do gênio”
(Kennedy, apud D´Ambrósio, 1998). Cabe retomar aqui o que pensa Neto
(1994):
Infelizmente, entre nós, o ensino da Matemática fica quase que apenas nos níveis de conhecimento e utilização de métodos e procedimentos, isto é, o aluno aprende a terminologia e as fórmulas e treina fazer substituições para resolver problemas de rotina. A Matemática fica transformada em algo rígido, acabado, chato, sem finalidade. O aluno usa apenas a memória; não desenvolve as habilidades de extrapolar, raciocinar, criar. Não tem o prazer da descoberta. Ficam faltando elementos para o seu desenvolvimento integral.(NETO, 1994)
No livro “Na vida 10, na escola 0”, Terezinha Nunes et al mostram que
estudantes com rendimento abaixo do esperado na escola conseguem, fora dela
e num contexto mais significativo, fazer uso de idéias matemáticas de formas
muito ricas, muitas vezes mais complexas (do ponto de vista das ações mentais)
do que aquelas vivenciadas na escola.
A presente pesquisa se justifica por tentar superar os aspectos acima
mencionados (matemática como forma de exclusão, matemática como algo “só
para gênios”, matemática como algo pronto, acabado...), por meio da inserção
no processo pedagógico das TICs, particularmente do Geogebra e de um
27
redimensionamento, de uma releitura acerca do conhecimento matemático. Isto
a partir da convicção que o segredo para o desenvolvimento e construção do
conhecimento matemático está diretamente ligado à habilidade de perceber
padrões e representá-los simbolicamente.
1.4 METODOLOGIA
Shaffer e Serlin (2004) mostram que durante muito tempo se colocaram
em lados opostos as duas formas de pesquisa: a qualitativa e a quantitativa e
que, portanto, eram incompatíveis em pesquisas educacionais. Entretanto,
partindo do pressuposto de que tais formas destinam-se a responder diferentes
tipos de questões e que, na verdade, podem se complementar, muitos estudos
começaram a ser realizados tendo como base uma abordagem mista, ou seja,
que abarca as duas formas, simultaneamente. Tashakkori e Teddlie (1998)
apresentam vários estudos em que as abordagens qualitativa e quantitativa são
usadas sequencialmente ou paralelamente. Eles descrevem de que forma uma
análise quantitativa permite, por exemplo, identificar sujeitos para um estudo
qualitativo. Mostram, também, como uma abordagem qualitativa pode influenciar
na geração de hipóteses para estudos quantitativos. Como afirmam Shaffer e
Serlin (2004):
Os métodos qualitativos e quantitativos são, em última análise, métodos para garantir a apresentação de uma amostra adequada. Ambos constituem tentativas para projetar um conjunto finito de informação para uma população mais ampla: uma população de indivíduos no caso do típico inquérito quantitativo, ou uma coleção de observações na análise qualitativa. [...] .
E continuam:
O objetivo em qualquer análise é adequar a técnica à inferência, a afirmação à comprovação. As questões que se colocam a um investigador são sempre: Que questões merecem ser levantadas nesta situação? Que dados poderão lançar luz sobre estas questões? E que métodos analíticos poderão garantir afirmações, baseadas em dados, sobre aquelas questões? Responder a estas questões é uma tarefa que envolve, necessariamente, uma profunda compreensão das potencialidades e limites de uma variedade de técnicas quantitativas e qualitativas.” (SHAFFER e SERLIN,2004)grifo nosso.
Flyvbjerg (2001) salienta que
28
Além de desprovido de sentido, é contraprodutivo em termos da nossa compreensão falar da „vitória dos sinais sobre a diferença‟ ou das regras sobre o particular. […] Amputar um dos lados nestes pares de fenômenos numa dualidade „ou-ou‟ é amputar a nossa compreensão. Em vez de „ou-ou‟, deve-se desenvolver um não dualista e pluralista „ambos-e‟. Assim, não devemos criticar regras, lógica, sinais, e racionalidade em si mesmos. Devemos apenas criticar o domínio destes fenômenos sobre a exclusão de outros na sociedade moderna e nas ciências sociais. Inversamente, deve ser igualmente problemático se regras, lógica, sinais, e racionalidade forem marginalizados pelo
concreto, pela diferença, e pelo particular. [...]FLYVBJERG (2001)
A presente pesquisa realiza-se sobre a premissa de que ambas as
abordagens são viáveis e perfeitamente compatíveis, tendo em vista os objetivos
propostos. Desta forma ela está organizada em uma abordagem mista com fase
quantitativa e fase qualitativa. Será conduzida em três etapas cada uma
associada a um objetivo específico. Estas serão detalhadas na seção 1.4.3
(procedimentos). A Figura 1 - Grupos Experimental e de Controle e as etapas da
pesquisa- busca apresentar uma visão geral do modo como a pesquisa foi
conduzida.
29
Figura 1 - Grupos Experimental e de Controle e as etapas da pesquisa
A fase quantitativa adota um design quasi-experimental pelo fato dos
grupos experimental e de controle serem formados de forma não aleatória. O
grupo de controle é constituído por 101 estudantes de três classes de 9º ano e o
grupo experimental é formado por 36 estudantes da classe que vivenciou a
sequência didática. Os grupos serão comparados com base no escore em um
teste sobre percepção de padrões (numéricos e geométricos) e em
trigonometria, além da representação simbólica desses padrões, que será
aplicado a ambos os grupos (pós teste).
A fase qualitativa utilizará analise de conteúdo nas respostas de um
questionário aplicado a todos os estudantes (ambos os grupos). O objetivo do
questionário é analisar as concepções dos estudantes sobre a Matemática.
Três estudantes do grupo experimental serão selecionados para entrevistas que
serão conduzidas reproduzindo parte dos procedimentos da sequência didática
utilizando o método clínico de Piaget para analisar o processo de identificação
de padrões realizado pelos estudantes.
O Quadro 1 – Metodologia - abaixo sintetiza dá uma visão geral da
metodologia:
Fonte: Elaborada pelo autor.
30
QUADRO 1 - Metodologia
Objetivo Instrumento de Coleta Estratégia de Análise
Abordagem
Conhecer as concepções dos estudantes sobre a
Matemática.
Questionário aplicado aos sujeitos de ambos os
grupos.
Estatística descritiva
Qualitativa
Analisar o processo de identificação padrões em
trigonometria.
Entrevista (vídeo) individual com sujeitos do grupo experimental.
Método clínico
Qualitativa
Avaliar o impacto de uma intervenção com o uso
do Geogebra na habilidade de perceber e
representar simbolicamente padrões.
Quasi-experimental Prova (pós-teste)
aplicado aos sujeitos de ambos os grupos. Teste de hipótese
Testes estatísticos
Quantitativa
Fonte: Elaborado pelo autor.
A seguir são caracterizados a escola e os sujeitos onde foi conduzida a
pesquisa.
1.4.1 CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA
O Colégio Salesiano completou 58 anos de presença em Itajaí em 2014.
Faz parte da RSE – Rede Salesiana de Escolas. A RSE trabalha com uma
proposta pedagógica unificada em suas escolas e produz o próprio material
didático.
Neste contexto o Colégio Salesiano Itajaí atende - em 2014 - a mais de
1600 alunos da Educação Infantil ao Ensino Médio, a escola particular da cidade
com o maior número de alunos matriculados, segundo dados do INEP (2013)
Para atender as necessidades da escola, cerca de 120 funcionários
integram os recursos humanos da instituição. A equipe docente é formada por
69 professores, distribuídos entre as três etapas da educação básica, conforme
mostrado na Tabela 4 – Corpo docente do CSI por gênero e nível:.
31
Tabela 4 - Corpo docente do CSI por gênero e nível
Fonte: Elaborada pelo autor.
O Gráfico 2 - Formação acadêmica do corpo docente do CSI - apresenta
a distribuição dos professores em função da formação acadêmica:
GRÁFICO 2 - Formação acadêmica
Fonte: Elaborado pelo autor.
Note-se que o quadro de professores é formado por profissionais com
curso superior completo, sendo que 46 deles (66,7%) possuem especialização
em alguma área (não necessariamente ligada à educação). Apenas três
professores (4,3%) possuem mestrado e apenas um (1,4%) possui doutorado.
1211
01
22 22
0 0
21
5
2
0
14
8
10
0
5
10
15
20
25
SUPERIOR COMPLETO
ESPECIALIZAÇÃO MESTRADO DOUTORADO
EI
EF - I
EF - II
EM
32
Estes últimos números indicam a necessidade de maior capacitação do quadro
de professores, apesar de o quadro não ser tão diferente em relação às outras
escolas privadas da região uma vez que conforme Felicetti e Giraffa (2012)
Pode-se conjecturar aqui que quanto maior o estudo e aprendizagem do professor acerca das metologias de ensino, melhor será o
desempenho de seus alunos. (FELICETTI E GIRAFFA, 2012)
Os professores da Educação Infantil trabalham na instituição no horário
vespertino, assim como os professores do Ensino Fundamental I (anos iniciais),
tendo, portanto, carga horária média de 25 horas semanais. Os professores do
Ensino Fundamental II e do Ensino Médio trabalham no período matutino, com
cargas horárias que variam em função da disciplina que lecionam. Alguns
desses professores trabalham no período vespertino com aulas de Apoio
Pedagógico.
A Tabela 5 – Estatística de candidatos inscritos e classificados no
Vestibular da UFSC -apresenta os dados relativos à aprovação dos alunos
oriundos do CSI no vestibular da Universidade Federal de Santa Catarina –
UFSC, nos últimos 5 anos.
Tabela 5 - Estatística de candidatos inscritos e classificados no Vestibular da UFSC
Fonte: Elaborada pelo autor.
Os índices mostram que os estudantes do CSI tem conquistado bons
resultados no vestibular da UFSC, lembrando que é sempre difícil fazer análises
deste tipo porque, por exemplo, os dados sofrem influência do curso escolhido,
do número de candidatos inscritos, dentre outros. Por exemplo: uma escola X
teve um (1) candidato inscrito em um curso cuja relação candidato/vaga é de
0,5/1 (ou seja, tem-se mais vagas do que candidatos inscritos). E ele foi
classificado, então o índice de aprovação da escola X será de 100%.
33
Ainda no que toca os desempenho dos estudantes do CSI em avaliações
externas, são mostradas, no GRÁFICO 3, as médias dos alunos da instituição no
Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM –, nos anos de 2010, 2011 e 2012.
GRÁFICO 3 - Notas dos estudantes do CSI no ENEM, em Matemática
Fonte: Elaborado pelo autor.
Observa-se que os resultados obtidos pelos estudantes estão acima das
médias nacionais nos anos de 2009, 2010 e 2011.
Abaixo, Gráfico 4 - Comparativo: CSI x outras escolas privadas - são
apresentados os resultados obtidos (médias) em Matemática por outras escolas
privadas da cidade de Itajaí no ENEM nos anos de 2011/2012
666,24
674,83
626,85
600 610 620 630 640 650 660 670 680
2010
2011
2012
34
GRÁFICO 4 - Comparativo: CSI x outras escolas privadas
Fonte: Elaborado pelo autor.
A análise do gráfico indica que, à exceção de uma das escolas (Colégio
A), as demais, encontram-se numa faixa de resultados relativamente próximos.
Nesta situação, os resultados obtidos no ENEM (em Matemática), não as
colocariam em situação de significativa desigualdade
1.4.2 SUJEITOS
1.4.2.1 GRUPO EXPERIMENTAL
A intervenção didática foi em setembro de 2013 com 36 estudantes de
uma turma de nono ano do ensino fundamental, do Colégio Salesiano Itajaí
(CSI), com idade média de 14 anos. O grupo era formado por 12 meninos
(33,3% do total) e 24 meninas (66,6% do total). A escolha do grupo foi feita em
função da disponibilidade para aplicação da intervenção, uma vez que esta era a
527
691
606
631
626
627
557
651
652
596
0
675
542
671
629
613,5
626
651
0 100 200 300 400 500 600 700 800
Colégio A
Colégio B
Colégio C
Colégio D
Colégio E
Colégio Salesiano
MÉDIA
2011
2012
35
única turma de nono ano para qual o professor-pesquisador lecionava. Dos 36
componentes do grupo, apenas dois haviam ingressado na escola no nono ano.
Nenhum dos participantes reprovou em anos anteriores. À época da
implementação da sequência didática, a distribuição das médias, na disciplina de
Matemática apresentava-se conforme mostrado no Gráfico 5 - Médias em
Matemática (GE) 1º e 2º trimestres
GRÁFICO 5 - Médias em Matemática (GE) 1º e 2º trimestres
Fonte: Elaborado pelo autor.
O gráfico revela que os estudantes que fazem parte do grupo
experimental apresentam, em sua maioria, bom aproveitamento em Matemática,
uma vez que aproximadamente 81% deles estavam com média igual ou maior
do que sete. Saliente-se, também, que não havia estudantes com média inferior
a cinco.
Em avaliação institucional executada pela empresa AVALIA nas seguintes
áreas Leitura, Matemática e Redação , no final de 2013, (AVALIA, 2013), os
estudantes do grupo experimental ficaram assim caracterizados em Matemática
e suas Tecnologias, (Gráfico 6 - Resultado do Avalia, em Matemática, para o
GE):
0
7
17
12
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
0 |----- 5 5 |----- 7 7 |----- 8 8 |----- 10
FREQ
UÊN
CIA
AB
SOLU
TA
36
GRÁFICO 6 - Resultado do Avalia, em Matemática, para o GE
Fonte: Elaborado pelo autor.
O AVALIA propõe que os resultados dos alunos sejam interpretados por
meio da distribuição desse público em quatro níveis de uma escala de
proficiência: Avançado, Proficiente, Básico e Abaixo do Básico, conforme pode
ser verificado no Quadro 2 - Níveis da escala de proficiência para as
competências leitora e matemática (AVALIA, 2013).
QUADRO 2 - Níveis da escala de proficiência para as competências leitora e matemática
Fonte: Relatório AVALIA.
Importante salientar que os resultados do AVALIA para o grupo
experimental muito se aproximam daqueles relacionados às medias trimestrais.
Note-se que 67% dos integrantes do grupo experimental foram classificados
como proficientes e nenhum deles ficou no nível abaixo do básico.
514%
1953%
1233%
AVANÇADO
PROFICIENTE
BÁSICO
ABAIXO DO BÁSICO
37
1.4.2.2 GRUPO DE CONTROLE
O grupo de controle é formado por 101 alunos, dos quais 51 são do sexo
feminino (50,5%) e 50 são do sexo masculino (49,5%), idade média de 14
anos,todos estudantes de turmas do nono ano do CSI, no ano de 2013. Os
estudantes do grupo de controle não tinham aulas com o professor-pesquisador.
Ao longo da pesquisa o número de indivíduos no GC sofreu alterações,
passando de 101 para 108. Tal alteração deve-se ao fato da pesquisa ter sido
iniciada em 2013 e finalizada em 2014. A inserção dos indivíduos não afetou as
características gerais do GC.
O Gráfico 7 - Médias em Matemática (GC) 1º e 2º trimestres apresenta as
médias dos indivíduos que compõem o grupo de controle à época da realização
da sequência didática:
GRÁFICO 7 - Médias em Matemática (GC) 1º e 2º trimestres
Fonte: Elaborado pelo autor.
Pode-se perceber que também aqui a maior parte dos estudantes (cerca
de 66,3%) possuem nota igual ou superior a sete, enquanto que apenas dois
estudantes (cerca de 2%) encontram-se com média abaixo de cinco.
Na avaliação realizada pela AVALIA em 2013, os estudantes incluídos no
2
3230
37
0
5
10
15
20
25
30
35
40
0 |----- 5 5 |----- 7 7 |----- 8 8 |----| 10
38
grupo de controle apresentaram a seguinte distribuição entre os níveis de
desempenho estabelecidos por aquela avaliação: (Gráfico 8 - Resultado do
Avalia, em Matemática, para o GE)
GRÁFICO 8 - Resultado do Avalia, em Matemática, para o GC
Fonte: Elaborado pelo autor.
Novamente os resultados do AVALIA corroboram com os resultados das
médias trimestrais desses estudantes. Observe-se que 65% deles são, no
mínimo, proficientes. Já no outro extremo não foram identificados indivíduos no
nível abaixo do básico.
1.4.2.3 EQUIVALÊNCIA ENTRE OS GRUPOS
A Tabela 6 – GC x GE: comparativo por nível do AVALIA - estabelece um
comparativo da situação dos grupos experimental e de controle antes da
realização da pesquisa e com base na avaliação promovida pela AVALIA:
14; 15%
48; 50%
34; 35%
0; 0%
AVANÇADO
PROFICIENTE
BÁSICO
ABAIXO DO BÁSICO
39
Tabela 6 - GC x GE: comparativo por nível do AVALIA
NÍVEL AVANÇADO PROFICIENTE BÁSICO
ABAIXO DO BÁSICO GRUPO
EXPERIMENTAL 14% 53% 33% 0%
CONTROLE 15% 50% 35% 0% Fonte: Elaborada pelo autor.
Nota-se a pequena diferença entre os resultados obtidos pelos grupos de
estudantes. Tais dados fornecem indícios de que estes grupos sejam
equivalentes e que fazem parte da mesma população.
O Gráfico 9- Comparativo de médias GC e GE, mostra a distribuição dos
estudantes dos grupos de controle e experimental por intervalo de médias, à
época da aplicação da sequência didática ao grupo experimental.
GRÁFICO 9 - Comparativo de médias GC e GE
Fonte: Elaborado pelo autor.
A Tabela 7 – Comparativo das médias GE x GC por intervalo - traz um
comparativo, em termos percentuais, entre as médias dos estudantes dos
grupos experimental e de controle, à época da aplicação da sequência didática:
2 0
32
7
30
17
37
12
0
5
10
15
20
25
30
35
40
GRUPO DE CONTROLE GRUPO EXPERIMENTAL
0 |----- 5
5 |----- 7
7 |----- 8
8 |-----| 10
40
Tabela 7 - Comparativo das médias GE x GC por intervalo
INTERVALO DE MÉDIAS
GRUPO EXPERIMENTAL GRUPO DE CONTROLE
0 |----- 5 0% 1,98%
5 |----- 7 19,44% 31,68%
7 |----- 8 47,22% 29,70%
ACUMULADO 5 |----- 8
66,67% 61,38%
8 |-----| 10 33,33% 36,63 Fonte: Elaborada pelo autor.
Cabe novamente ressaltar que os percentuais no intervalo de zero
(inclusive) a cinco (exclusive) estão muito próximos, o mesmo ocorrendo no
intervalo de oito (inclusive) a dez (inclusive). Diferenças foram encontradas para
os intervalos de cinco (inclusive) a sete (exclusive) e de sete (inclusive) a oito
(exclusive). Entretanto, se agruparmos os dados em um intervalo mais amplo, de
cinco (inclusive) a oito (exclusive), os valores estariam muito próximos. Ressalte-
se que a média para aprovação é cinco e, portanto, todos os estudantes cujas
médias pertencem a este intervalo estariam, a princípio, aprovados.
A Tabela 8 – Médias Finais GC x GE apresenta as médias finais,
considerando o 1º, o 2º e o 3º trimestres de 2013 dos estudantes do grupo de
controle e do grupo experimental.
Tabela 8 - Médias finais GC x GE
INTERVALO GRUPO DE CONTROLE GRUPO EXPERIMENTAL
FABSOLUTA FRELATIVA FABSOLUTA FRELATIVA
0 |----- 5 17 16,83% 6 16,67%
5 |----- 7 35 34,65% 10 27,78%
7 |----- 8 48 47,52% 19 52,78%
ACUMULADO 5 |----- 8
83 82,18% 29 80,55%
8 |-----| 10 1 1% 1 2,78% Fonte: Elaborada pelo autor.
Nota-se não haver diferença significativa nos resultados quando
41
considerados os intervalos: 0 |----- 5, ( 16,83% para 16,67%) , 5 |----- 8 (82,18%
para 80,55%) e 8 |-----| 10 (1% para 2,78%). Estes dados permitem concluir que
os grupos de controle e o grupo experimental podem ser comparados, em
relação à Matemática, para os fins a que se propõe a presente pesquisa.
1.4.2.4 GENERALIDADE DA AMOSTRA
Com intuito de demonstrar que a amostra desta pesquisa não é atípica e
com isso conferir algum grau de validade externa, apoia-se, também, nos dados
fornecidos pela AVALIA em um conjunto de escolas.
A Tabela 9– Comparativo entre o CSI e outras escolas por nível de
proficiência do AVALIA - traz um comparativo entre os resultados obtidos (em
Matemática) pelos estudantes dos nonos anos do CSI, aqueles obtidos por
escolas semelhantes, por escolas privadas do estado, por escolas públicas do
estado e a escola definida como padrão:
Tabela 9 - Comparativo entre o CSI e outras escolas por nível de proficiência do AVALIA
Fonte: Relatório AVALIA.
Segundo o AVALIA, as escolas agrupadas se organizam da seguinte
forma:
i. Escolas semelhantes: considera a localização, o tamanho e o nível
socioeconômico das famílias atendidas.
ii. Escolas públicas de seu estado: considera instituições municipais
ou estaduais, localizadas em sua unidade da federação, que
participaram do Saeb/2009.
iii. Escolas privadas de seu estado: considera instituições de educação
escolar privadas, localizadas em sua unidade da federação, que
42
participaram do Saeb/2009.
iv. Escola-padrão: fundamentada na terceira meta do compromisso Todos
pela Educação;
Pode-se perceber, a partir da análise da TABELA 8, que o CSI, quando
comparado com as escolas semelhantes, encontra-se acima da média pelos
seguintes motivos: maior concentração de estudantes no nível avançado: 14%
contra 11% das escolas semelhantes; maior concentração de estudantes no
nível de proficiência: 51% contra 33% das escolas semelhantes; menor
concentração de estudantes nos níveis básico e abaixo do básico.
Quando os dados são comparados com as escolas privadas do estado
percebe-se não haver variação significativa no percentual de estudantes nos
níveis avançado e básico. O percentual de estudantes no nível proficiente é
significativamente maior do que a média das escolas privadas do estado.
Finalmente, a comparação com a Escola-padrão indica como fatores
positivos para CSI o não aparecimento de estudantes no nível abaixo do básico
e o fato de mais da metade dos estudantes encontrarem-se no nível proficiente.
Em contra partida, o percentual de estudantes no nível avançado está
significativamente abaixo do estabelecido como padrão e o percentual de
estudantes no nível básico está acima do padrão.
1.4.3 PROCEDIMENTOS
Esta pesquisa está dividida em três etapas, cada uma delas focando em
um dos objetivos, quais sejam:
-Conhecer as concepções dos estudantes sobre a Matemática;
-Analisar o processo de identificação de padrões numéricos, em
trigonometria, por parte dos estudantes;
- Avaliar o impacto de uma intervenção com uso do Geogebra na
habilidade de perceber e representar simbolicamente padrões;
A primeira etapa da pesquisa está relacionada ao objetivo “conhecer as
concepções dos estudantes sobre a Matemática”. Para tanto, será aplicado um
questionário aos sujeitos da pesquisa. O questionário será aberto e com ele
buscar-se-á determinar a relação que cada um dos sujeitos estabelece com a
matemática, ou seja, como o sujeito se sente em relação a ela. Rodrigues (1999)
43
afirma que "o que o indivíduo aprecia e deseja, influencia aquilo que vê e
interpreta. E, inversamente, o que é visto e interpretado influencia aquilo que se
aprecia e se deseja". Terá, também, a função de informar a concepção que cada
um deles tem acerca do conhecimento matemático, ou seja, o que caracteriza a
matemática enquanto ciência.
A segunda etapa liga-se ao objetivo “analisar o processo de identificação
de padrões numéricos, em trigonometria, por parte dos estudantes”. O livro
didático utilizado pelos estudantes que fazem parte da pesquisa traz, em seu
capítulo 10, um roteiro de atividades que foram desenvolvidas com o intuito de
fazer com que os estudantes construam o conceito acerca das razões
trigonométricas seno, cosseno e tangente. Neste roteiro foi solicitado que os
estudantes construíssem diversos triângulos retângulos utilizando régua,
compasso e transferidor e que, depois de tais construções, determinassem (com
uso da calculadora) a razão entre os lados (tomados dois a dois, numa ordem
pré-definida) dos triângulos construídos. Ao invés de realizar tais construções
com os instrumentos clássicos de desenho (compasso, transferidor, régua), elas
foram construídas com a utilização do software Geogebra. E a determinação das
razões foi realizada a partir da utilização de uma planilha eletrônica. Pode-se ter
uma visão mais detalhada da atividade na seção 3.1, Sequência Didática. Serão
escolhidos três estudantes do grupo experimental para serem estudados através
do método clínico de Piaget.
Na terceira e última etapa da pesquisa será aplicado um pós-teste a todos
os participantes da pesquisa (grupo de teste e grupo de controle). Este pós-teste
foi concebido para coletar evidências empíricas de que aqueles estudantes que
se submeteram à intervenção realizada desenvolveram uma habilidade de
perceber padrões e representá-los simbolicamente maior do que aqueles que
não se submeteram a tal intervenção.
Como já citado, farão parte dessa pesquisa estudantes dos nonos anos
do CSI/2013. Para tanto, organizou-se o experimento com duas amostras,
selecionadas de forma não-aleatória (quasi-experimento).
Amostra 1: Grupo de Controle – 101 estudantes que não participaram da
sequência didática realizada.
Amostra 2: Grupo Experimental – 36 estudantes que participaram da
sequência didática realizada (tratamento);
44
Será aplicado o mesmo instrumento aos integrantes destas duas
amostras. O instrumento será composto por questões relacionadas à “habilidade
de perceber padrões (numéricos, geométricos) e em trigonometria e sua
representação simbólica..”.
Nesta terceira etapa busca-se avaliar o impacto de uma intervenção com
uso do Geogebra na habilidade de perceber e representar simbolicamente
padrões.
Para responder a pergunta de pesquisa foi definida a seguinte hipótese: A
média do escore no Grupo Experimental será maior que a média do escore do
Grupo de Controle, ou seja,
Em se tratando de amostras grandes (n>30) assume-se a normalidade
destas e a utilização de testes paramétricos. Utilizar-se-ão os testes F, T e Z.
Com o teste F busca-se identificar se há igualdade de variâncias. O teste T será
utilizado para testar a hipótese de diferença entre os escores médios dos grupos
com um grau de confiança determinado. Para identificação das questões que
colaboraram mais fortemente para melhoria da média utilizar-se-á o teste Z para
comparação de proporções.
A prova (pós-teste) era constituída por duas partes. Na primeira parte
foram colocadas onze questões, numeradas de um a onze, oito das quais
objetivas e três abertas. Essas questões envolviam a percepção de padrões
numéricos e geométricos. A segunda parte era constituída por sete questões,
numeradas de doze a dezoito, todas objetivas, as quais envolviam a percepção
e representação simbólica de padrões. A elaboração das questões foi norteada
pelo objetivo acerca da percepção de padrões. A prova (pós-teste) encontra-se
disponível no Apêndice.
O Quadro 3 - Síntese do Experimento - sintetiza o design do experimento:
45
QUADRO 3 - Síntese do experimento
Tipo de design Quasi-experimental, dois grupos, apenas
pós-teste, seleção não aleatória.
População Estudantes do CSI/2013
Amostra
Estudantes dos nonos anos/2013: Grupo de Controle: (n= 101); Grupo Experimental: (n= 36)
Instrumento de coleta Provas categorizadas aplicadas às duas
amostras
Variáveis Dependentes
Nota média, Proporção de acertos
Variável Independente
Participação na sequência didática
Hipóteses
Procedimentos Teste F – comparar variâncias a 95%
Teste T – comparar médias a 99% Teste Z – comparar proporções 95%
Fonte: Elaborado pelo autor.
As principais ameaças à validade do experimento, segundo Wainer (2007)
e as ações de correção ou redução de seus efeitos estão listadas a seguir:
Ameaça de instrumentação: relacionada a uma diferença entre o grau
de dificuldade do instrumento de coleta, foi eliminada pela aplicação
do mesmo instrumento para as duas amostras;
Ameaça de testagem: não se aplica por envolver apenas pós-teste.
Esta ameaça está presente quando o instrumento de coleta promove
uma aprendizagem nos estudantes, afetando, assim, resultados
futuros;
Ameaça de maturação: aquela relacionada à evolução natural dos
participantes e que acontece entre o pré-teste e o pós-teste. Como
não houve pré-teste, esta ameaça não se aplica ao design adotado;
Ameaça de história: quando um evento externo ao experimento pode
ter influenciado o resultado. Esta ameaça é de difícil eliminação.
Algumas ações para minimizá-la foram: aplicar o instrumento
simultaneamente a ambos os grupos; não aplicação de aulas de
preparação ou revisão. O fato de se utilizar professores diferentes para
as amostras é uma ameaça que não pode ser eliminada;
46
Ameaça de mortalidade seletiva: em que uma das amostras possui
maior probabilidade de abandonar o experimento. Não pode ser
eliminada do experimento porque há um índice significativo de
mudança de escola nos grupos envolvidos no design, especialmente o
grupo experimental;
Ameaça de contaminação: em que indivíduos de uma amostra
repassam conhecimentos a outra amostra. Ameaça minimizada pelo
fato de o pós-teste ter sido aplicado simultaneamente aos dois grupos,
sem aviso prévio;
Ameaça de comportamento competitivo: em que uma amostra busca
ter melhores resultados que o grupo de controle. Minimizada pelo fato
de os estudantes não terem conhecimento do grupo a que pertenciam;
Ameaça de comportamento compensatório: em que uma das amostras
recebe medidas compensatórias por parte dos experimentadores.
Houve problemas nesse sentido com uma parcela do grupo de
controle a qual foi descartada na análise dos resultados;
Ameaça de expectativa do sujeito: quando o simples fato de saber que
estavam sendo avaliado altera a performance do sujeito. Não se aplica
pois os estudantes não sabiam que estavam participando de um
experimento;
Ameaça de expectativa do experimentador: quando o interesse do
pesquisador cria algum viés no experimento. Esta ameaça pode ter
alguma influência pelo fato de o pesquisador ter sido professor da
turma que compõe o grupo experimental;
Ameaça à validade externa: tratando-se de um design quase-
experimental onde a amostragem não é aleatória, a generalização do
resultado para a população não pode ser efetuada;
47
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 TRIGONOMETRIA: UM POUCO DE HISTÓRIA
A trigonometria está, desde muito, presente na história do homem.
Segundo Berlinghoff (2010)
[...] A história do seno remonta ao menos ao astrônomo grego Hiparco de Rodes (190-120 a.C). Como outros astrônomos gregos, ele queria encontrar um modelo que descrevesse como os astros e os planetas se movem pelo céu da noite. O céu era representado como uma esfera gigantesca e as posições dos astros eram especificadas por ângulos. Trabalhar com ângulos é difícil; assim, mostrou-se útil relacionar o ângulo com algum segmento (de reta). O segmento que escolheram foi a corda. Como mostra a Figura 2 – Exemplo de corda -, um ângulo centralem um círculo de raio fixo determina sua corda, e a chamamos (ou ao seu comprimento) de corda de . Usando cordas era possível calcular as posições, presente e futura, de astros e planetas. BERLINGHOFF (2010)
Acredita-se que Hiparco tenha construído uma tabela de tais cordas.
Entretanto, esta tabela nunca foi encontrada e não foi possível saber com
exatidão como as cordas eram calculadas. Coube a Claudius Ptolomeu (85-165
d.C) realizar um estudo bastante abrangente sobre as cordas, incluindo a
elaboração de diversos teoremas. É dele a primeira explicação conhecida de
como construir uma tabela de cordas.
Em Berlinghogg (2010), vê-se que os matemáticos indianos deram um
Figura 2- Corda em uma circunferência
Fonte: Elaborada pelo autor.
48
novo tratamento à tabela de cordas por perceberem que, em determinados
casos, é necessário utilizar a metade da corda do dobro do ângulo. Estes
matemáticos passaram, então, a tabular metade das cordas. Em termos
práticos, as meias cordas dos matemáticos da Índia correspondem ao que hoje
chama-se de seno de um ângulo. Ele pode ser identificado na Figura 3 – Seno
de um ângulo a partir de uma corda:
Graças ao árabes as idéias matemáticas dos indianos chegaram à
Europa. Além de propagar a matemática indiana, os árabes traziam suas
próprias contribuições. Descobriram, dentre muitas outras coisas, que havia uma
relação entre equações cúbicas e o seno de ângulos quaisquer. Foram os
árabes, também que “inventaram” a função “sombra”, que hoje é denominada
tangente. Eles construíram tabelas de meias-cordas e de sombras.
Quando esses conhecimentos chegaram à Europa, houve a necessidade
de se traduzir os escritos árabes. Quando foi feita a tradução da palavra jiba
(palavra inventada pelos árabes que significa “meia corda”), houve um erro: os
tradutores pensaram tratar-se da palavra jaib, a qual significa baía. E traduziram
jiba por sinus (baía, em latim). Dessa tradução equivocada que surge a palavra
seno.
Já foi citada a origem de duas das funções trigonométricas fundamentais:
o seno e a tangente. O cosseno surgiu como sendo o seno do ângulo
complementar, ou seja, o sinus complementi. Com o tempo passou a ser
chamado de co.sinus, passou por cosinus, até chegar à forma cosseno, utilizada
Figura 3 - Seno de um ângulo a partir de uma
corda
Fonte: Elaborada pelo autor.
49
atualmente.
Percebe-se que o nascimento da trigonometria teve como ponto de
partida os estudos da astronomia. Foi no século XVI que a trigonometria tornou-
se “independente”, graças, principalmente, ao livro Regiomontanus, escrito por
Johannes Muller, por volta de 1463, mas só publicado várias décadas depois.
Foi George Joachin Rheticus (1514-1574) quem trabalhou com o seno e a
tangente num triângulo retângulo pela primeira vez. Foi Thomas Fincke (1561-
1656) quem inventou a palavra tangente e coube a Bartholomeu Pitiscus (1561-
1613) inventar a palavra trigonometria. Foi Pitiscus quem mostrou como a
trigonometria poderia ser usada para resolver problemas relacionados à medição
de terras, altura de objetos, dentre outras aplicações. Nos dias atuais, a
trigonometria está presente na navegação, na engenharia, na arquitetura, em
diversas áreas das ciências da saúde (como na optimetria, por exemplo).
O estudo da trigonometria é feito quase que completamente no ensino
médio. Nos anos finais do ensino fundamental são estudadas, quando o são - as
razões trigonométricas fundamentais (seno, cosseno e tangente). Evidentemente
existem diferenças importantes: no ensino médio, o estudo da trigonometria é
feito, via de regra, a partir do "círculo trigonométrico", enquanto que no ensino
básico o estudo é feito a partir de triângulos retângulos.
Independentemente disso, a trigonometria é profícua na geração de
padrões e como esta pesquisa baseia-se na importância da percepção de
padrões para a aprendizagem matemática, nada mais natural do que ela se
utilizar da trigonometria para tal fim.
2.2 AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
As TICs, como manifestação concreta dos enormes progressos da ciência
e da tecnologia, estão presentes, atualmente, nas mais diversas situações da
vida humana. Papert (1994) faz uma ressalva ao questionar o por quê de não se
verificar tal presença e modificação substancial na forma como as crianças
aprendem. Segundo ele, “a escola é um notável exemplo de uma área que não
mudou tanto”.
50
Neste contexto, o uso das TICs na Educação Matemática torna-se, ainda,
muito mais incipiente. Apesar disso, parece ser esta inclusão algo necessário e
inevitável. Smart (1994) afirma que “o ensino da Matemática nunca mais será o
mesmo, em virtude da ciência da computação; o ensino da geometria nunca
mais será o mesmo, em virtude da computação gráfica.” Para se ter uma ideia
de como as novas tecnologias modificaram a forma de se construir o
conhecimento matemático, atualmente inúmeros computadores estão ligados em
rede, nos diversos continentes, buscando encontrar números primos cada vez
maiores, os quais serão utilizados para se construir sistemas de segurança cada
vez mais seguros (criptografia).
Tentativas de inserir as TICs no contexto da Educação Matemática, no
Brasil, têm sido feitos, particularmente no que se refere à modelagem e à
investigação em matemática. Borba e Malheiros (2007) salientam que as TICs
são fundamentais em muitos estudos que envolvem a modelagem, como, por
exemplo, nas pesquisas feitas na internet, na utilização de um software, na
construção de gráficos, dentre outros. O GPIMEM (Grupo de Pesquisa em
Informática, outras Mídias e Educação Matemática), vinculado ao Instituto de
Geociências e Ciências Exatas (IGCE) da UNESP de Rio Claro/SP tem
desenvolvido pesquisas ao longo de duas décadas sobre o uso das TICs na
educação matemática. A professora Sueli Javaroni realiza pesquisa sobre o
processo de ensino-aprendizagem de equações diferenciais com o uso de
tecnologias informáticas. Outro pesquisador do grupo, Ricardo Scucuglia
realizou pesquisa sobre a forma como estudantes investigam o Teorema
Fundamental do Cálculo utilizando calculadoras gráficas. Outras pesquisas
realizadas ou em curso no GPIMEM podem ser acessadas em GPIMEM.
Pode-se citar, também, o site Educação Matemática e Tecnologia
Informática – EDUMATEC- , vinculado ao Instituto de Matemática da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, criado em 2000, sob
responsabilidade da professora Maria Alice Gravina e que tem como principais
objetivos
O site Educação Matemática e Tecnologia Informática tem como um dos objetivos a apresentação de material que trate do potencial da tecnologia informática no âmbito da educação matemática escolar. Especial atenção é dada a seleção de software, com escolhas que recaem sobre aqueles que se caracterizam como ambientes de expressão e exploração, o que significa a oportunidade de
51
viabilizarpráticas pedagógicas que coloquem os alunos no papel de ativos aprendizes. Pensando-se naqueles professores ainda com pouca experiência na utilização desta tecnologia também apresentamos atividades que podem servir como ponto de partida para trabalho em sala de aula. E dado o crescente número de informação que circula na Internet, procuramos também selecionar artigos e links que contribuam para a formação de professores e alunos. O site também e' utilizado ao longo dos trabalhos da disciplina, de mesmo nome, do curso de Licenciatura em Matemática da UFRGS. Esta disciplina tem como propósito preparar o futuro professor no uso de tecnologia informática no âmbito do ensino e aprendizagem da Matemática escolar. Parte da produção dos alunos tem sido aqui publicada, criando-se desta forma um ambiente para produção de cultura no uso de tecnologia informática. (EDUMATEC, 2014)
Cabe também citar o Laboratório de Informática na Educação - LIne,
formado por pesquisadores do IME-USP, da Poli-USP e do ICMC-USP. Fazem
parte do LInE, o Laboratório de Ensino de Matemática (LEM) e o projeto iMática,
este último coordenado pelo professor Leônidas de Oliveira Brandão. O LIne tem
como um dos objetivos desenvolver e difundir atividades e sistemas para o
ensino de Matemática nos quais os alunos aprendam Matemática fazendo-a e
usando os sistemas computacionais como ferramenta catalisadora deste
processo.
A forma como estes estudos são realizados está diretamente ligada à
forma como o ser humano constrói o conhecimento e sobre o que é a
Matemática.
2.3 PIAGET E O CONSTRUTIVISMO
À primeira destas questões – como o ser humano constrói o
conhecimento – busca-se, aqui, resposta na teoria construtivista, de Jean Piaget,
a qual coloca o sujeito como agente ativo no processo de aprendizagem. É a
partir das estruturas mentais já construídas ou em construção que o
conhecimento é construído.
Piaget procurou mostrar como acontece o desenvolvimento cognitivo, o
qual, segundo Gravina (2001), ocorre a partir das interações espontâneas que
os indivíduos estabelecem com seu objeto de conhecimento, situações estas
diferentes das apresentadas no âmbito da educação escolar.
Para Piaget o conhecimento surge a partir das ações que o sujeito realiza
52
sobre o meio, ações que, ao se internalizarem e organizarem, promovem
alterações nas estruturas lógicas, em níveis crescentes de complexidade. Para
ele, a ação é a grande responsável pelo desenvolvimento das estruturas
cognitivas. Em Piaget (1967/2003), o pensamento está ancorado na ação, visto
que os esquemas operatórios diretamente derivam dos esquemas de ação.
Gravina (2001) afirma que as ações do sujeito evidenciam formas de
organização e que não se apresentam de forma caótica, desordenada e sem
conexão, mas revelam [...] estruturas lógicas cada vez mais ricas.
Ele destaca que nesse processo de desenvolvimento existem quatro
estágios básicos, os quais são imutáveis: o sensório-motor, o pré-operatório, o
operatório concreto e o estágio das operações formais.
O primeiro estágio, sensório-motor, tem início no nascimento e se
estende até por volta dos dois anos. Nesse período a criança passa das
atividades reflexas à formação dos primeiros hábitos, seguida da capacidade de
coordenar visão e preensão (olhos e mãos). Segundo Piaget e Inhleder (1986)
“... à falta de função simbólica, o bebê ainda não apresenta pensamento nem
afetividade ligados a representações, que permitam evocar pessoas ou objetos
na ausência deles.” Aqui surgem as representações lógico-matemáticas, as
quais assentam-se sobre ações sensório-motoras, exigindo, portanto, a
presença física de materiais. Por não terem ainda construído um sistema de
representação, não existe na criança (neste estágio), a relação causa-
consequência: ela precisa fazer para ver o que vai acontecer. Neste estágio os
exercícios de repetição trazem o domínio e a expansão generalizadora da ação.
Gravina (1998) evidencia a importância deste estágio:
Já no primeiro estágio de desenvolvimento, na construção e coordenação de esquemas evidencia-se o uso de regras muito próximas a da lógica - associação (união), generalização (inclusão), restrição (interseção) . Percebe-se uma construção espontânea de estruturas lógico-matemáticas, que se aproximam das utilizadas no desenvolvimento do conhecimento matemático. É a gênese do pensamento lógico-matemático, que se apresenta na forma de
generalização de ações e coordenação de esquemas.(GRAVINA,1998)
O comportamento sensório-motor é a base da aquisição de formas mais
avançadas de pensamento. Piaget (1970/2007) afirma que
Distinguiremos a esse respeito dois períodos sucessivos: o das ações
53
sensório-motoras anteriores a toda linguagem ou a toda conceituação representativa, e o das ações completadas por essas novas propriedades e a propósito das quais se apresenta então o problema da tomada de consciência dos resultados, intenções e mecanismos do ato, ou seja, de sua tradução em termos de pensamento conceitualizado. (PIAGET, 1970/2007)
No estágio seguinte, denominado por ele pré-operatório ,desenvolvem-se
a linguagem e as funções representativas, aparecem as ações em pensamento
(operações), mas com a necessidade da mediação de objetos concretos para
que tais ações de pensamento convertam-se em definições, conceitos. A criança
começa a realizar as primeiras experiências de pensamento, distanciando-se
das experiências sensoriais.
No terceiro estágio, denominado operatório-concreto, há uma
amplificação das operações e, consequentemente, ganhos nas estruturas
lógicas, em relação ao estágio anterior. A criança consegue agir sobre suas
representações, mas ainda mantém vínculos com objetos concretos que servem
como base para as ações em pensamento. As estruturas cognitivas ainda não
estão suficientemente desenvolvidas para que dêem conta do pensamento
puramente abstrato.
O quarto e último estágio – operatório formal - apresenta como fim a
capacidade de se construir o pensamento puramente abstrato, ou seja, pensa-se
e constrói-se sobre objetos abstratos. É neste estágio que a criança consegue
abstrair, independentemente de qualquer tipo de relação física com o objeto.
Aqui nascem os raciocínios hipotéticos, dedutivos, generalizantes.
Piaget explica o desenvolvimento a partir dos conceitos de assimilação,
acomodação e adaptação. Afirma Piaget (1967/2003) que o fato essencial de
que convém partir é que nenhum conhecimento, mesmo perceptivo, constitui
uma simples cópia do real, porque contém um processo de assimilação a
estruturas anteriores. Papert (1994) resume a idéia de Piaget, segundo ele,
óbvia (quando compreendida): todo funcionamento mental possui duas facetas,
que ele chama de assimilação (mudar sua representação de mundo para
encaixar-se aos seus modos de pensar) e acomodação (adaptar seus modos de
pensar para encaixar-se ao mundo.” São os desequilíbrios entre o conhecimento
assimilado por meio das estruturas já desenvolvidas pelo sujeito e a
acomodação dessas estruturas que permitem a construção do conhecimento.
O Quadro 4 – Descrição dos estágios do desenvolvimento cognitivo -
54
abaixo, resume o que foi acima exposto:
QUADRO 4 - Descrição dos estágios do desenvolvimento cognitivo
Fonte: Piaget (1967)
Gravina (2001) salienta que na teoria piagetiana, o modelo de sujeito é o
epistêmico, cujo último estágio de desenvolvimento cognitivo é o operatório-
formal. Tratando-se de um modelo, nada garante que os sujeitos reais, em
situação de aprendizagem, estejam em tal estágio ou funcionalmente aptos a
construir conhecimentos matemáticos. Seus recursos intelectuais encontram-se,
muitas vezes, em estado potencial, passíveis de serem colocados em ação
mediante provocação.
Pode-se, portanto, inferir que as ações pedagógicas tem papel
fundamental no processo de evolução das estruturas cognitivas. Estas podem
interferir positiva ou negativamente no desenvolvimento de tais estruturas.
Haidt (2000) apresenta algumas ações que devem ser implementadas
pelos professores e que surgem a partir da teoria construtivista:
- Respeitar as características de cada etapa do desenvolvimento;
- Propor atividades desafiadoras, que estimulem a reflexão e a descoberta
por parte dos estudantes;
- Utilizar uma metodologia que privilegie a estimulação do pensamento, a
construção de esquemas mentais;
- Tornar os ambientes de convivência dos estudantes ricos em materiais
diversos a fim de possibilitar o ver, o tocar, o manipular;
55
-Utilizar o jogo como elemento pedagógico, tendo em vista o interesse
que naturalmente desperta nos estudantes;
- Promover atividades que permitam a troca de idéias, a argumentação
oral e a cooperação entre os estudantes;
- Estabelecer um processo de avaliação contínuo, valorizando os avanços
conquistados e incentivando-os no processo de construção do
conhecimento;
2.4 AS CONTRIBUIÇÕES DE VIGOTSKY
Aliada à teoria construtivista, tem-se, também, a contribuição dada por
Vygotsky, principalmente no tocante aos processos de mediação e da
importância que a história individual desempenha no processo de
desenvolvimento. É importante salientar que Vygotsky estabelece diferenças
entre a educação escolar e o processo de educação em sentido amplo:
O processo de educação escolar é qualitativamente diferente do processo de educação em sentido amplo. Na escola, a criança está diante de uma tarefa particular: entender as bases dos estudos científicos, ou seja, um sistema de concepções cientíticas.(VYGOTSKY, 1998)
Para Vygotsky, durante o processo de educação escolar a criança parte
de suas próprias generalizações e significados, entrando em novos caminhos
acompanhadas de seus conhecimentos iniciais (espontâneos). Então, a partir
das explicações recebidas, ela raciocina, reproduz relações lógicas e re-significa
seus conceitos espontâneos, alterando sua estrutura.
Vygotsky baseia sua teoria na idéia de que o desenvolvimento do
indivíduo é resultado de um processo social e histórico e, portanto, cultural. Para
ele, nesse processo, a linguagem assume um papel fundamental, por tratar-se
do principal instrumento de mediação verbal, tornando-se um sistema simbólico
fundamental na mediação sujeito-objeto.
A teoria de Vygotsky parte da premissa de que as mudanças que ocorrem
no indivíduo, ao longo de seu desenvolvimento, são frutos das interações que
ele (o indivíduo) estabelece com a sociedade, com a sua história, com a cultura
e com as situações que promovem o desenvolvimento (situações de
56
aprendizagem). Vê-se, aqui, o papel que a teoria marxista da sociedade (o
materialismo histórico) exerceu sobre o pensamento de Vygotsky. De acordo
com Marx, mudanças históricas na sociedade e na vida material produzem
mudanças na natureza humana (consciência e comportamento).
Para compreender a teoria de Vygotsky é fundamental que se analisem
alguns conceitos que são importantes para o entendimento do processo de
desenvolvimento. Ei-los: mediação simbólica, signos, sistemas de símbolos,
zona de desenvolvimento proximal, desenvolvimento e aprendizado.
Entende-se por mediação como sendo um processo pelo qual a ação do
indivíduo sobre um determinado objeto é mediada por um determinado
elemento. Como o próprio termo sugere, mediar é estar “no meio”, é “estar
entre”. Este elemento mediador pode ser classificado em três categorias: os
instrumentos, os signos e os sistemas simbólicos.
Segundo Engels (1940), a especialização da mão – que implica o
instrumento, e o instrumento implica a atividade humana específica, a reação
transformadora do homem sobre a natureza. Vygotsky vê o instrumento desta
forma: como um elemento que otimiza as ações humanas sobre a natureza. Os
instrumentos são criados pelas sociedades ao longo do curso da história
humana e mudam a forma social e o nível de seu desenvolvimento cultural.
Os signos, tais quais os instrumentos, também são elementos de
mediação, porém de natureza psicológica. O signo é próprio de cada indivíduo e
serve para regular e controlaras ações psicológicas. Segundo Vygotsky (1998):
Toda forma elementar de comportamento pressupõe uma reação direta à situação-problema defrontada pelo organismo – o que pode ser representado pela fórmula simples (S R). Por outro lado, a estrutura de operações com signos requer um elo intermediário entre o estímulo e a resposta. Esse elo intermediário é um estímulo de segunda ordem (signo), colocado no interior da operação, onde preenche uma função especial; ele cria uma nova relação entre S e R. [...] Esse signo possui, também, a característica importante da ação reversa (isto é, ele age sobre o indivíduo e não sobre o ambiente. Consequentemente, o processo simples estímulo resposta é substituído por um ato complexo, mediado, que representamos da seguinte forma:
Nesse novo processo o impulso direto para reagir é inibido e é
57
incorporado um estímulo auxiliar que facilita a complementação da operação por meios indiretos. [...] Na medida em que esse estímulo auxiliar possui função específica de ação reversa, ele confere à operação psicológica formas qualitativas novas e superiores, permitindo aos seres humanos, com o auxílio de estímulos extrínsecos, controlar o seu próprio comportamento. O uso se signos conduz os seres humanos a uma estrutura específica de comportamento que se destaca do desenvolvimento biológico e cria novas formas de
processos psicológicos enraizados na cultura.(VYGOTSKY, 1998)
O símbolo é um recurso de que dispõe o indivíduo para controlar ou
orientar a interação dele (o indíviduo) com o mundo. Os sistemas de signos
(sistemas simbólicos), tais como a linguagem, a escrita, os sistemas de
numeração, são construtos sociais que, segundo Vygotsky, provocam
transformações comportamentais e estabelecem um elo de ligação entre as
formas iniciais e tardias do desenvolvimento individual.
Dentre os sistemas de signos, Vygotsky dá ênfase à linguagem. Segundo
ele, a fala produz mudanças qualitativas na estrutura cognitiva do indivíduo,
reestruturando algumas funções psicológicas, como a memória, a atenção
voluntária, a formação de conceitos, dentre outras. Sob esta perspectiva, a
linguagem é um instrumento, pois modifica estruturalmente as funções
psicológicas superiores.
Para Vygotsky existe uma estreita relação entre aprendizagem
(aprendizado) e desenvolvimento. Cabe ressaltar que qualquer situação de
aprendizado com a qual o indívíduo (ele utiliza, aqui, a palavra criança) se
defronta na escola tem sempre uma história prévia. Fundamentalmente,
aprendizagem e desenvolvimento estão inter-relacionados deste o primeiro dia
de vida da criança.
Indubitavelmente, o campo educacional, o principal conceito construído
por Vygotsky é o de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), definida por ele
como sendo a distância entre o nível real (da criança) de desenvolvimento
determinado pela resolução de problemas independentemente e o nível de
desenvolvimento potencial determinado pela resolução de problemas sob
orientação de adultos ou em colaboração com companheiros mais capacitados
(VIGOTSKY, 1998). É na zona de desenvolvimento proximal que devem agir as
intervenções pedagógicas por parte dos professores. O nível real está
relacionado com funções cognitivas que já amadureceram, ou seja, constituem-
se em produtos finais do desenvolvimento. A zona de desenvolvimento proximal
58
define aquelas funções que estão em processo de maturação. Para ele, aquilo
que é zona de desenvolvimento proximal hoje será o nível de desenvolvimento
real amanhã, ou seja, aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje,
ela será capaz de fazer sozinha amanhã. Aponta Vygotsky (1998)
[...] Esses exemplos individuais ilustram uma lei geral do desenvolvimento das funções mentais superiores, a qual achamos que pode ser aplicada em sua totalidade aos processos de aprendizagem das crianças. Propomos que um aspecto essencial do aprendizado é o fato de ele criar a zona de desenvolvimento proximal; ou seja, o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com companheiros. [...] Desse ponto de vista, aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas. (VYGOTSKY, 1998).
Finalizando, cabe ressaltar que segundo a teoria de Vygotsky, os
processos relacionados ao desenvolvimento não coincidem com os processos
de aprendizado. Aqueles ocorrem de forma mais lenta do que estes. É nesta
defasagem que nascem as zonas de desenvolvimento proximal.
2.5 O CONSTRUCIONISMO DE PAPERT
A partir da teoria piagetiana, de caráter epistemológico, uma vez que
busca definir o que é conhecimento e como ele é construído, Seymour Papert
concebeu uma teoria de aprendizagem, a qual é conhecida como
construcionismo. Ao partir da concepção piagetiana de que o conhecimento é
fruto da ação das pessoas sobre o objeto de conhecimento, Papert (1994)
caracteriza o ato de educar como o desenvolvimento de situações que
promovam o engajamento dos estudantes em situações que subsidiem o
processo de construção do conhecimento. Um dos pilares do construcionismo é
a crença de que o aprendizado ocorre quando o estudante está realizando uma
atividade que seja de seu interesse; e, além disso, a possibilidade de socializar o
resultado do trabalho realizado torna o aprendizado mais significativo. Ao
construir um produto (resultado de uma atividade) ele está mobilizando suas
59
estruturas cognitivas e construindo conhecimento. E este conhecimento o leva a
refletir sobre o produto construído, buscando melhorias e aperfeiçoamentos.
Gera-se, um círculo virtuoso, de ação, reflexão e aprimoramento.
Insatisfeito com o que vivenciava nas aulas de matemática, Papert
concluiu que seria necessário empregar novos meios para que os estudantes
pudessem construir o conhecimento matemático de forma mais interativa. Foi,
então, que desenvolveu, no início da década de 1960, a linguagem Logo de
programação. Esta linguagem, extremamente simples e de fácil assimilação por
parte dos estudantes, permite que sejam criados diversos produtos, como
figuras, animações, jogos, utilizando conhecimentos matemáticos. É na criação
que os conhecimentos vão sendo construídos. Nesta perspectiva o computador
é uma ferramenta que possibilita a concepção de ambientes de aprendizagem
baseados nas concepções construcionistas.
Almeida (2012) salienta que a metodologia de Papert supõe que a
iniciação à linguagem de diálogo com as máquinas computadorizadas se dê
através do lúdico. A linguagem viva, passo a passo, se estabelece e a criança
aprende noções de forma, de velocidade, espaço, de procedimento, número,
ângulo, variáveis, cálculo diferencial, limites, que se encontram no coração do
sistema LOGO, e não aprende segundo moldes formais e teóricos, mas no
sentido profundo e utilitário. O diálogo que a criança estabelece com a tartaruga
LOGO reproduz o próprio modo de cada um se relacionar com o material de
suas experiências e reproduz seu próprio modo de pensar.
Segundo Papert (2001), [...] a tecnologia não é a solução, é somente um
instrumento. Logo, a tecnologia por si não implica em uma boa educação, mas a
falta de tecnologia automaticamente implica em uma má educação. Saliente-se,
porém, que a perspectiva construcionista vai muito além o uso do computador.
Ela pressupõe, como já apresentado, que o estudante comunique suas idéias e
reflita sobre elas. Por isso a ênfase dada pelos construcionistas à programação
de computadores, particularmente na linguagem Logo, por permitir que se
registre, analise, experimente, modifique as estratégias e idéias utilizadas para
se resolver determinado problema.
Valente (2002) estabelece quatro ações cognitivas realizadas durante o
processo de programação e que auxiliam o entendimento de como se dá a
elaboração do conhecimento: a descrição, a execução, a reflexão e a
60
depuração.
Na descrição o estudante explana suas intenções. O que vai fazer, como
pretende fazer, que recursos irá utilizar. Aqui o professor pode identificar o nível
real de desenvolvimento do estudante.
Durante a execução o estudante vê o resultado imediato de seu trabalho.
Ligada à execução está a reflexão. Trata-se de um valioso momento no qual o
estudante pode avaliar o quão distante do pensado estado o objeto, fruto de seu
trabalho. No estágio do refletir cabe ao aluno, com a mediação do professor,
pensar se o resultado final atingiu o objetivo e como poderiam ser modificados
para um melhor aproveitamento. Se o resultado não foi o esperado, o processo
de depuração tem seu início. Nele o estudante vai analisar todo o processo
realizado e procurar identificar as causas das discrepâncias verificadas. A
experimentação tem seu lugar aqui. Não uma “tentativa-e-erro”, mas uma
“aproximação sucessiva do objeto desejado”. Esta reflexão constante e
crescente – porque se constrói sobre conhecimentos anteriores que serão
“superados” – permite ao estudante construir novos conhecimentos, fazendo que
a aprendizagem cresça, conforme apontado por Valente (2002), em forma de
espiral, pois a depuração leva a uma nova descrição, diferente da anterior. A
Figura 4 – Interação aprendiz-computador - apresenta, de forma sintética, o que
foi discutido nos parágrafos anteriores.
Figura 4 - Interação aprendiz-computador
Fonte: VALENTE(2002)
61
2.6 GEOMETRIA DINÂMICA
Parece razoável aceitar que se hoje muito se fala de Geometria Dinâmica
é porque, em algum momento, existiu ou ainda existe uma “Geométrica
Estática”. Brandão e Isotani (2003) apresentam a diferença básica entre estas
duas formas de se “fazer” geometria quando diz que
O nome “Geometria Dinâmica” (GD) hoje é largamente utilizado para especificar a Geometria implementada em computador, a qual permite que objetos sejam movidos mantendo-se todos os vínculos estabelecidos inicialmente na construção. Este nome pode ser melhor entendido como oposição à geometria tradicional de régua e compasso, que é "estática", pois após o aprendiz realizar uma construção, se ele desejar analisá-la com alguns dos objetos em outra disposição terá que construir um novo desenho.(BRANDÃO&ISOTANI, 2003).
Neste tipo de software é possível construir um objeto e, a partir do
movimento (dinâmica), mudar uma ou muitas de suas características. Por
exemplo: um quadrado pode, facilmente, transformar-se em uma pipa, pela
simples translação do vértice B, conforme mostrado na Figura 5 – Geometria
Dinâmica: o poder de transformar:
Figura 5 - Geometria Dinâmica: o poder de transformar
Fonte: Elaborada pelo autor.
62
Gravina (2001) afirma que
[...] Os ambientes de geometria dinâmica também incentivam o espírito de investigação matemática: sua interface interativa, aberta à exploração e à experimentação, disponibiliza os experimentos de pensamento. Manipulando diretamente os objetos na tela do computador, e com realimentação imediata, os alunos questionam o resultado de suas ações/operações, conjecturam e testam a validade das conjecturas [...] GRAVINA (2001)
E continua, fazendo referência à importância da geometria dinâmica na
percepção e explicação de regularidades (padrões):
Num segundo momento, coloca-se a eles o problema de explicar as regularidades que „saltam aos olhos‟ nos „desenhos em movimento, ou seja, de engajarem-se na construção de demonstrações. GRAVINA (2001)
Dentre os muitos softwares de geometria dinâmica disponíveis
atualmente, nesta pesquisa utilizar-se-á o Geogebra pelos seguintes motivos:
1 – Trata-se de um software livre;
2 – Facilidade operacional por parte dos estudantes;
3 – Relaciona diferentes representações de um mesmo objeto, particularmente
as representações geométricas e algébricas;
2.6.1 O GEOGEBRA
O Geogebra é um software que unifica, pelo menos, três eixos da
Matemática: a Geometria, a Álgebra e o Cálculo. Dos dois primeiros eixos deriva
seu nome: GEO (geometria) + GEBRA (álgebra). Estas três dimensões de um
mesmo objeto matemático interligam-se de tal forma do software que qualquer
modificação efetuada na estrutura geométrica, implica na imediata modificação
na estrutura algébrica e numérica e, de forma recíproca, qualquer alteração
algébrica implica na imediata modificação da estrutura geométrica/numérica. Por
isso, o GEOGEBRA pode ser considerado um software de geometria dinâmica.
Para Petla (2009)
O Geogebra é um programa bastante intuitivo e autoexplicativo adequado a usuário com conhecimentos avançados em informática ou para iniciantes, sendo que o conhecimento matemático é o ponto fundamental de sua utilização. Por ser um software livre há
63
colaboração de vários programadores, inclusive brasileiros, os quais disponibilizaram uma versão totalmente em português, o que facilita muito sua utilização em nosso país (PETLA, 2008)
O fato de ser um software livre de custos (exceto para uso com fins
lucrativos, conforme pode ser verificado em sua Licença, em www.geogebra.org)
é um elemento decisivo para a escolha deste software para fins pedagógicos,
principalmente para aquelas escolas que não dispõem de recursos financeiros
para a aquisição de softwares educacionais, mas que possuem disponibilidade
de computadores. Outro elemento que é muito importante é o fato do Geogebra
possuir versões on-line (atualizadas periodicamente) e versões off-line (que
podem ser atualizadas a qualquer momento, desde que o interessado possua
acesso à internet). Mesmo a versão off-line permite a realização de inúmeras
atividades pedagógicas.
O Geogebra foi utilizado nesta pesquisa como “substituto” dos
instrumentos clássicos de desenho (compasso e régua) no desenvolvimento das
atividades relacionadas à construção dos triângulos retângulos. A construção de
tais triângulos, conforme pode ser verificado em 3.1 (Intervenções Realizadas)
foi realizada de tal forma que vários conceitos importantes no contexto da
Matemática fossem retomados, tais como: segmentos de reta, ângulos,
perpendicularismo, intersecções, dentre outros. A determinação das medidas
dos lados dos triângulos, que mais tarde seriam utilizadas na determinação das
razões trigonométricas, foi feita a partir de recursos do Geogebra, bem como a
medição dos ângulos internos dos triângulos construídos que garantia tratar-se
de triângulos retângulos.
2.6.2 USANDO O GEOGEBRA: EXEMPLO DE ATIVIDADES
1. Inserir uma reta que passe por dois pontos dados, A e B (Figura 6 –
Usando o Geogebra):
64
Observe que no canto superior esquerdo (Figura 6 – Usando o Geogebra)
tem-se a janela de álgebra, onde aparecem as coordenadas cartesianas dos
pontos A e B, além da equação da reta. O Geogebra atribui “um nome” à reta.
Neste caso, a reta foi identificada por “a”. É possível renomeá-la. Também é
possível apresentar a equação da reta na forma .
2. Inserir cinco pontos que não pertençam à reta “a” (FIGURA 6)
Os pontos foram inseridos aleatoriamente. Suas coordenadas estão na janela
de álgebra, na Figura 7 – Usando o Geogebra;
Figura 6 - Traçando retas com auxílio do Geogebra
Fonte: Elaborada pelo autor.
65
Figura 7 - Inserindo pontos com auxílio do Geogebra
Fonte: Elaborada pelo autor.
3. Traçar retas paralelas à reta que passa pelos pontos A e B e que passem
pelos pontos inseridos no plano (Figura 8 – Usando o Geogebra)
Figura 8 - Traçando retas paralelas com auxílio do Geogebra
Fonte: Elaborada pelo autor.
66
As equações das retas b, c, de e estão na janela de álgebra (FIGURA 7)
Com esta atividade simples, pode-se, por exemplo, buscar "padrões",
regularidades que aparecem nas representações algébricas de um feixe de retas
paralelas.
2.7 INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: TRABALHOS
RELACIONADOS AO ENSINO DE TRIGONOMETRIA
Com o intuito de situar este estudo no contexto da literatura existente foi
realizado um levantamento bibliográfico (dissertações e artigos) de trabalhos que
tratam, especificamente, do uso das TICs na Educação Matemática no ensino de
Trigonometria. Foram considerados trabalhos nacionais realizados a partir do
ano 2000.
Moreira (2009) et al desenvolveram uma unidade de aprendizagem online
para estudo de trigonometria. Esta unidade foi elaborada por professores de
Matemática e contém 19 applets e uma apostila com atividades que promovem
investigações de natureza matemática. A unidade passou por um processo de
validação em duas etapas: primeiramente com professores de matemática e
licenciandos em matemática; em seguida, a validação deu-se com estudantes do
ensino médio. Segundo os pesquisadores, os alunos participantes da validação,
demonstraram atenção e motivação, buscando extrair todo o potencial dos
applets.
Spilimbergo (2010) et al apresentam um conjunto de atividades orientadas
que utilizam softwares livres Trigonometria e Círculo Trigonométrico. Foram
explorados conceitos de trigonometria, a partir de um roteiro e um questionário.
Segundo os autores, embora os participantes da pesquisa, em sua maioria, não
conhecessem o software, não encontraram dificuldades para utilizá-lo. O
trabalho indica que a falta de clareza sobre o significado das palavras oposto e
adjacente esta presente para alguns estudantes e que isto compromete a
compreensão dos conceitos. Foram realizadas atividades relativas ao
reconhecimento de triângulos retângulos, ao círculo trigonométrico, às razões
trigonométricas para ângulos no intervalo de 0 a 360 (graus). Os autores
concluem afirmando que perceberam mudanças na aprendizagem dos alunos,
67
no sentido de construir um conhecimento mais significativo e duradouro.
Em sua dissertação, Pereira (2002) analisa a utilização de computadores
no processo de ensino-aprendizagem, baseando-se nos modelos Construtivista
e Construcionista. Ele desenvolve um software contemplando os conteúdos
referentes às funções trigonométricas, desde seu “conceito”, passando pelo
domínio e imagem e período das funções trigonométricas. Na avaliação
realizada com professores de Matemática e alunos do terceiro ano do ensino
médio, o software obteve conceituação positiva.
Maia (2013) buscou minimizar as dificuldades encontradas pelos alunos
quando estudavam as funções trigonométricas seno e cosseno. Para tanto,
propôs utilizar a o software Geogebra na realização de uma sequência de
atividades sobre o conteúdo abordado. Os resultados indicam que a utilização
do software contribuiu para uma melhor compreensão dos conceitos
matemáticos estudados.
Em sua dissertação, Lopes (2010) analisa as potencialidades e limitações
do software Geogebra no ensino e aprendizagem de Trigonometria. Uma
sequência de atividades de caráter investigativo foi realizada com estudantes de
uma escola pública de Natal. O estudo identificou inúmeros vantagens acerca da
utilização do software no processo de ensino aprendizagem, destacando-se a
facilidade de se construir figuras e viabilização da experimentação. Algumas
limitações foram identificadas, principalmente relacionadas à formação dos
professores para uso dos softwares disponíveis e às condições dos laboratórios
de informática. Deste estudo surgiu um produto educacional intitulado Sequência
Didática para o Ensino de Trigonometria usando o Software Geogebra.
Bacelar (2013) em sua dissertação, cujo título é Uso do Geogebra no
ensino da Trigonometria, apresenta um estudo para utilização deste software,
versão 4.2, para desenvolver conteúdos relacionados à Trigonometria, tais
como: ciclo trigonométrico, Funções Trigonométricas, Razões Trigonométricas
no triângulo retângulo, Lei dos Senos , Lei dos Cossenos, entre outras que são
abordadas no ensino médio.
Pedroso (2012) apresenta em sua dissertação uma proposta de ensino da
Trigonometria para estudantes do Ensino Médio, com base na utilização do
Geogebra. O uso do software favoreceu a aplicação da experiência didática,
tornando-a, segundo a autora, mais dinâmica e o trabalho mais cooperativo.
68
Foram trabalhados os conceitos de ângulo, razão trigonométrica, círculo
trigonométrico, dentre outros. A experiência permitiu a experimentação de
hipóteses e a elaboração de conclusões, além de instigar discussões.
Meier (2012) desenvolve um trabalho envolvendo a modelagem
matemática em uma proposta que visa desenvolver hábitos do pensamento
matemático no Ensino Fundamental. O Geogebra foi utilizado como suporte para
algumas atividades. Este trabalho, embora não esteja relacionado ao ensino de
Trigonometria, traz como um de seus elementos importantes a percepção de
padrões, de invariâncias. Segundo o relato da pesquisadora, os estudantes
mostraram avanços em relação aos hábitos do pensamento matemático,
construindo modelos e foram capazes de explicitar seus raciocínios
matemáticos.
Oliveira e Fernandes (2010) relatam em um artigo os resultados de uma
pesquisa realizada para investigar a eficiência de estratégias pedagógicas com
tecnologias na construção significativa de conhecimentos sobre conceitos iniciais
de trigonometria. O estudo utilizou, num primeiro momento, as tecnologias
“tradicionais” e no segundo as tecnologias digitais, particularmente o Geogebra.
Concluem que a utilização do Geogebra foi importante para a aprendizagem
significativa.
No Quadro 3 – Trabalhos relacionados ao uso de softwares para ensino
de Trigonometria são descritos os trabalhos que foram consultados e que tratam
do ensino da trigonometria com a utilização de softwares:
QUADRO 5 - Trabalhos relacionados ao uso de softwares para ensino de Trigonometria
AUTOR ANO TIPO SOFTWARE RESULTADOS
PEREIRA, A. A. 2002 Dissertação Trigonométrikes O software obteve
conceituação positiva;
MOREIRA, L.S et al
2009 Artigo (RBIE) Geogebra
Despertou atenção e motivação;
Usuários buscando aproveitar todo o
potencial do material;
LOPES, M. M. 2010 Dissertação Geogebra
Facilidade para construção e
visualização das figuras;
69
Formação dos professores não
capacita para uso de tais recursos;
Elaboração de um produto educacional
SPILIMBERGO, A. P. et al
2010 Relato de
Experiência
Aplicativos: Trigonometria e
Círculo trigonométrico
Mudanças na aprendizagem dos alunos, no sentido
de construir um conhecimento mais
significativo e duradouro.
Oliveira e Fernandes.
2010 Artigo Geogebra
Concluem que a utilização do Geogebra foi
importante para a aprendizagem
significativa
PEDROSO 2012 Dissertação Geogebra
O uso do software favoreceu
a aplicação da experiência
didática, tornando-a mais dinâmica e o
trabalho mais cooperativo. A
experiência permitiu a experimentação de hipóteses e a elaboração de
conclusões, além de instigar
discussões.
MEIER 2012 Dissertação Geogebra
Os estudantes mostraram avanços
em relação aos hábitos do
pensamento matemático, construindo
modelos e foram capazes de
explicitar seus raciocínios
matemáticos.
BACELAR, 2013 Dissertação Geogebra Construção de conhecimentos
70
Fonte: Elaborado pelo autor.
A proposta desta pesquisa, embora possa ser colocada nas mesmas
categorias que as acima citadas (software Geogebra Educação Matemática
Trigonometria), difere-se destas por ter como fim a identificação do potencial do
Geogebra no desenvolvimento da habilidade de perceber padrões e como meio
a trigonometria.
trigonométricos por parte dos alunos.
MAIA 2013 Dissertação Geogebra
Contribuiu para uma melhor
compreensão dos conceitos
matemáticos estudados (função
seno e função cosseno)
71
3 DESENVOLVIMENTO
A pesquisa teve como principal etapa (já executada) a realização da
sequência didática com o grupo experimental. O relato desta experiência está
detalhado na seção seguinte. Após são discutidas as etapas futuras do trabalho.
3.1 INTERVENÇÃO REALIZADA
Um dos objetivos da pesquisa é analisar o processo de identificação de
padrões em trigonometria, por parte dos estudantes. Para realizar tal análise foi
realizada uma intervenção (tratamento) junto ao grupo experimental com o
intuito de desenvolver atividades relacionadas à percepção de padrões.
3.1.1 ONDE TUDO COMEÇOU...
O ponto de partida foi o seguinte questionamento: como poderíamos
determinar a altura de um prédio, localizado nas proximidades da escola, sem
medi-lo diretamente? Várias respostas foram dadas pelos estudantes. Depois
das explicações, foi-lhes proposta uma atividade no laboratório de informática da
escola e que envolvia a construção de triângulos através do software Geogebra.
Não foi feito nenhum tipo de comentário sobre esta atividade e o questionamento
sobre a “altura do prédio”. Grande parte dos estudantes já conhecia o software,
uma vez que o mesmo já fora utilizado anteriormente no estudo do plano
cartesiano (coordenadas cartesianas), na “visualização” do Teorema de Tales e
na construção de polígonos regulares. Os estudantes trabalharam
individualmente ou em duplas, em função da quantidade de computadores
disponíveis (30), mas estavam liberados para se auxiliarem.
Foram utilizadas diversas estratégias para a construção dos triângulos:
utilizando a ferramenta polígono, dispondo três pontos e unindo-os por meio de
segmentos, traçando-se três retas concorrentes (duas a duas). Uma vez que não
havia qualquer tipo de condição para a construção dos triângulos, esta atividade
72
foi realizada com facilidade por todos.
Num momento seguinte, foi-lhes imposta uma condição: o triângulo
construído deveria ser “retângulo”. A solução encontrada por eles, em sua
maioria, foi a seguinte: com a malha quadriculada ativada, dispor dois pontos
que estivessem numa mesma linha vertical e um ponto que estivesse na mesma
linha horizontal que um dos dois anteriores. Unindo estes três pontos,
construíram triângulos retângulos.
Esta atividade foi novamente proposta, com a condição de que não fosse
utilizada a malha quadriculada. Neste ponto os problemas começaram. Muitos
tentaram construir o triângulo “na tentativa”, mas, ao utilizarem a ferramenta que
permite a medida de um ângulo, perceberam que nenhum dos ângulos internos
do triângulo era reto e que, portanto, o triângulo não era retângulo. Neste ponto,
foi feita a primeira intervenção direta por parte do professor, com o seguinte
questionamento: que condição deve ser satisfeita por duas retas para que entre
elas “apareça” um ângulo reto? A resposta veio rapidamente: elas devem ser
perpendiculares! É importante citar que um grupo significativo de estudantes
usou o termo concorrentes e isto foi utilizado para promover uma discussão
entre o grupo. Depois de algum tempo um grupo “defensor” do
“perpendiculares”, tomou a palavra e disse que as retas perpendiculares são
concorrentes também – e apresentou a definição (com palavras próprias) do que
são retas concorrentes, o que encerrou a discussão. O problema agora era
outro: como utilizar o Geogebra para construir retas perpendiculares. Os
estudantes foram orientados a investigarem como conseguir tal construção.
Alguns foram pesquisar na web. Outros, porém, lembraram que quando do
estudo do Teorema de Tales, utilizaram a função retas paralelas. E foram no
mesmo local, onde encontraram a função retas perpendiculares. Rapidamente a
informação se espalhou e quem não havia conseguido realizar a atividade,
seguiu as instruções dadas pelos colegas e realizou. Interessante ressaltar que
a maioria dos estudantes procurou traçar uma primeira reta horizontal e,
consequentemente, a segunda reta seria construída pelo Geogebra na vertical.
Utilizando-se novamente a função ângulo eles verificaram que o ângulo entre as
retas era, realmente, reto. Para traçar o triângulo bastou escolher um ponto
sobre cada uma das retas e uni-los, o que fizeram sem maiores dificuldades.
73
3.1.2 AUMENTAM-SE AS DIFICULDADES...
A próxima sequência de atividades foi a que apresentou um maior grau de
dificuldade, em relação às anteriores: construir um triângulo retângulo, sem a
malha quadriculada, com lados não-horizontais/verticais. Poucos estudantes
perceberam que o processo utilizado anteriormente (descrito no parágrafo
anterior) é “geral”, ou seja, sua aplicação sempre dará origem a um triângulo
retângulo; a maioria dos estudantes envolvidos na atividade optou, novamente,
por uma tentativa: construíram uma reta inclinada e depois outra, concorrente a
ela, buscando formar entre elas um ângulo reto. Ao utilizarem a ferramenta para
medir os ângulos do triângulo perceberam que não se tratava de um triângulo
retângulo. Neste momento um grupo de alunos descobriu que poderia utilizar a
ferramenta que permite medir um ângulo para fazer com que o ângulo entre
duas retas fosse reto: bastava construir duas retas concorrentes, medir um dos
ângulos formados por elas e girar umas das retas em torno do ponto de
intersecção das duas, até que aparecesse o símbolo do ângulo reto. Nem
sempre conseguiam obter o ângulo de 90º . Depois de algum tempo e muita
conversa entre eles, todos conseguiram cumprir a tarefa.
Continuando o trabalho, foi-lhes solicitado que construíssem um triângulo
retângulo que tivesse um ângulo agudo de 28º, sem a utilização da malha
quadriculada. Algumas estratégias utilizadas pelos estudantes são descritas a
seguir:
- Utilizando a função polígono, construir um triângulo e medir seus
ângulos internos. Movimentar um dos vértices do triângulo até que o Geogebra
indicasse o aparecimento de um ângulo reto. Depois, movimentando-se um
outro vértice, obter o ângulo solicitado. Os que optaram por este procedimento
perceberam a dificuldade que é obter o triângulo, uma vez que a movimentação
de um dos vértices implica na possibilidade de mudança dos três ângulos do
triângulo. Alguns triângulos construídos não estavam de acordo com as
condições impostas, apesar da proximidade.
- Construir um par de retas perpendiculares, escolher um ponto em cada
uma delas e unir estes pontos. Medir os dois ângulos agudos que aparecem.
Escolher um dos pontos e movimentá-lo sobre a reta na qual se encontra, até
74
que o software indique o aparecimento de um ângulo de 28º. Novamente surgiu
o problema da precisão e um questionamento interessante surgiu, entre eles: “-
Não dá para construir um ângulo de 28º sem precisar ficar tentando?”. Neste
momento houve uma intervenção e foi-lhes solicitado que investigassem a
função Ângulo com Amplitude Fixa, seguindo as seguintes orientações:
1ª – Traçar um par de retas perpendiculares, identificar o ponto de
intersecção (com uso da função Intersecção de dois objetos) e marcar sobre
uma delas um ponto;
2ª – Selecionar a função Ângulo com Amplitude Fixa. Clicar no ponto
marcado sobre uma das retas e no ponto de intersecção delas. Na janela que se
abrirá, marcar a medida do ângulo desejado (no caso, 28º). Traçar a reta que
passa pelo ponto indicado pelo Geogebra e pelo ponto marcado sobre a reta. O
triângulo formado é reto e possui um ângulo de 28º.
Para que treinassem o processo, solicitou-se que construíssem novos
triângulos retângulos, com ângulos de 20º e 55º, o que fizeram sem maiores
problemas.
Continuando o trabalho, propôs-se que cada estudante (ou dupla)
construísse pares de triângulos retângulos (os triângulos que constituem o par
deveriam ter dimensões diferentes) com os seguintes ângulos agudos: 46º , 28º,
17º, 44º, 62º, 73º, totalizando 12 triângulos retângulos. Nestes triângulos
deveriam aparecer:
- a medida, em graus, de cada um dos ângulos internos;
- o comprimento de cada um dos lados dos triângulos;
Todos os outros elementos pertinentes à construção da figura deveriam
ficar ocultos.
Cada um dos estudantes (ou duplas, conforme o caso) recebeu uma
tabela (impressa) na qual deveriam registrar, para cada triängulo: a medida da
hipotenusa, a medida do cateto adjacente ao ängulo dado (citados acima) e a
medida docateto oposto a este mesmo ângulo. Nesta mesma tabela, com o
auxílio de uma calculadora, os estudantes deveriam determinar o valor das
seguintes razoes:
a) Razão entre o cateto adjacente ao ângulo e o cateto oposto ao
ângulo;
b) Razão entre o cateto adjacente ao ângulo e a hipotenusa;
75
c) Razão entre o cateto oposto ao ângulo e a hipotenusa;
Importante salientar que os estudantes, em sua maioria, já conheciam o
Teorema de Pitágoras e, portanto, tinham conhecimento dos termos hipotenusa
e catetos. Os termos adjacente e oposto trouxeram dúvidas aos estudantes, que
foram orientados a fazerem uma busca na internet para compreender estes
novos conceitos. Novamente a maioria deles conseguiu entender a lógica por
detrás destes termos. Neste momento foi feita por parte do mediador (professor)
uma intervenção no sentido de mostrar-lhes o caráter relativo destas palavras: o
cateto oposto a um dos ângulos agudos do triängulo retângulo é adjacente em
relação ao outro ângulo agudo deste mesmo triangulo.
3.1.3 BUSCANDO REGULARIDADES...
Depois de calcularem as razões solicitadas, os estudantes reuniram-se,
inicialmente em duplas, para compararem os resultados obtidos (registrados na
tabela). Se houvesse alguma discrepância muito significativa entre os valores
obtidos, deveriam buscar as possíveis causas para a diferença encontrada. Um
novo agrupamento, agora em quartetos, e a mesma tarefa: encontrar diferenças
entre as razões calculadas. O processo teve prosseguimento até que todos os
envolvidos comparassem os valores encontrados. Basicamente, dois tipos de
equívocos foram encontrados e que geraram as maiores diferenças:
1º - O triângulo construído não era retângulo (por exemplo, o suposto
ângulo reto media, na verdade, 89,85º ...);
2º - Houve confusão em relação aos catetos;
Os estudantes ficaram intrigados com aquilo que presenciaram: qualquer
que fosse o triângulo retângulo construído, se um dos ângulos agudos medisse
17º, então a razão entre o cateto oposto e o cateto adjacente seria um valor em
torno de 0,3; a razão entre o cateto adjacente e a hipotenusa seria algo em torno
de 0,9; e, finalmente, a razão entre o cateto oposto e a hipotenusa resultava
sempre num valor muito próximo de 0,3. E o mesmo fato acontecia (com valores
das razões diferentes) para os outros triângulos construídos.
Neste momento foi apresentado, no quadro, o seguinte problema: “Num
76
triângulo retângulo um dos ângulos agudos mede 17º e o cateto oposto a este
ângulo mede 8 cm. Qual o comprimento do outro cateto do triângulo?”
Alguns estudantes inicialmente tentaram resolvê-lo utilizando o Teorema
de Pitágoras, mas logo perceberam que faltavam dados. Um grupo significativo
de estudantes conseguiu estabelecer e verbalizar a seguinte relação: se o
triângulo é retângulo e tem um ângulo que mede 17º, então se dividirmos o
comprimento do cateto oposto ao ângulo pelo comprimento do cateto adjacente
ao ângulo, iremos obter aproximadamente 0,3. A relação foi escrita no quadro da
seguinte forma:
e, na sequência, reescrita pelos próprios estudantes, assumindo a seguinte
estrutura:
Resolvendo a equação, a medida procurada foi “descoberta”, muito
embora alguns estudantes ( quatro, com certeza, porque apresentaram sua
resolução ao professor), tenham resolvido a equação de forma equivocada.
Outras atividades semelhantes a esta foram realizadas utilizando o livro
didático adotado pela escola e não foram detectados problemas significativos
quanto à estruturação matemática dos problemas, embora erros na resolução
das equações tenham sido detectados.
O prosseguimento da atividade deu-se com um questionamento feito pelo
professor: “Tem-se informações relativas aos ângulos de 46º , 28º, 17º, 44º, 62º,
73º, mas e se o triângulo retângulo em questão tiver um ângulo agudo diferente
destes, como determinar o valor das razões para este ângulo?”
A resposta foi imediata : “- Basta construir um triângulo retângulo que
tenha um ângulo agudo com a mesma medida do ângulo em questão, medir
seus lados e calcular as razões.”
“- Mas são muitos os ângulos possíveis”, retrucou o professor. “- Será que cada
vez que precisar de informações sobre um ângulo será necessário construir um
triângulo e refazer todo este processo?”
77
“- A gente poderia construir uma tabela!”, sugeriu um estudante após alguns
instantes. “- E como seria esta tabela?”, questionou o professor. E o estudante
prosseguiu: “- A gente organiza os ângulos, faz os triângulos, calcula os valores
e completa a tabela!”.
Ficou combinado que cada estudante ficaria responsável por um ângulo
(alguns ficaram responsáveis por dois). Ao professor coube a tarefa de construir
uma planilha onde os dados coletados pelos estudantes seriam digitados (por
eles) e as razões fossem automaticamente calculadas. Depois de algum tempo a
tabela estava pronta e foi então projetada para que todos pudessem observá-la.
Nela constavam ângulos de 1º a 45º, as medidas dos catetos, da hipotenusa e o
valor das razões. Os estudantes perceberam que havia um certo padrão nas
razões e que alguns valores não estavam de acordo com tais padrões. Quando
foram verificar, encontraram os mesmos erros já citados: de construção do
triângulo e de confusão em relação aos catetos. Tais problemas foram por eles
mesmos corrigidos e a tabela com as razões foi finalizada e estava pronta para o
uso. O professor retomou o problema que deu origem aos estudos: “como
poderíamos determinar a altura de um prédio, localizado nas proximidades da
escola, sem medi-lo diretamente?”, utilizando a tabela construída?
Um estudante disse, com outras palavras, que era necessário conhecer
um ângulo. O professor perguntou: “Mas que ângulo?”. Depois de alguns
momentos de conversas um estudante e três outros que juntaram-se a ele
fizeram o um desenho para mostrar o ângulo a que se referiam. O professor
representou o desenho feito por eles no quadro para que todos pudessem
visualizar. Este desenho está apresentado na Figura 9 – Localizando um ângulo.
Fonte: Elaborada pelo autor.
E continuou: “se conhecemos o ângulo , isso é suficiente para
Figura 9 - Localizando um ângulo
78
determinarmos a altura do prédio? “Não. Precisamos do tamanho de uma das
duas linhas,” respondeu um outro estudante, referindo-se aos segmentos AB e
AC do desenho feito no quadro pelo professor. E o professor questionou este
estudante: “Na prática, qual das duas medidas é mais fácil de ser realizada?”. O
estudante respondeu prontamente que era a medida AB, porque “era no chão...”.
O professor, então, de forma aleatória, colocou uma medida para o segmento
AB e para o ângulo , conforme mostrado na Figura 10 – Representação
pictórica do problema - abaixo:
Foi solicitado aos estudantes que, a partir dos dados apresentados no
desenho, tentassem calcular a altura do prédio, que está representada pela letra
. Antes, porém, foram feitos alguns questionamentos aos estudantes:
1 - No triângulo ABC, retângulo em B, qual o valor das seguintes razões:
2 – Qual das razões nos permite calcular, imediatamente, o valor de
(altura do prédio)?
Os estudantes utilizaram a tabela trigonométrica que construíram para
determinar o valor de tais razões e, após algumas discussões entre eles
Figura 10 - Representação pictórica do problema
Fonte: Elaborada pelo autor.
79
concluíram que a razão era mais “conveniente”. Importante salientar que
alguns estudantes conseguiram perceber que, utilizando ou poderiam
descobrir o valor de e, a partir dele, calcular o valor de .
Abaixo, Figura 11 – Resolução do problema - é apresentada a resolução
feita no quadro por um estudante:
Após a resolução no quadro, discutiu-se sobre o valor obtido para . Os
estudantes perceberam que o valor encontrado era muito alto para os padrões
dos edifícios das cercanias do CSI (prédios de, no máximo, 25 andares,
aproximadamente 75 metros de altura). Surgiram duas idéias:
1ª – O ângulo de 42º não corresponde à realidade ou
2ª – A distância entre A e B não é de 230 metros
que foram “guardadas” para futuras investigações.
Os estudantes perceberam, também, que determinar a distância entre os
pontos A e B era “fácil”, mas determinar o ângulo entre AC e AB não seria tão
fácil. O professor explanou sobre o teodolito e pediu aos estudantes que
fizessem em casa uma pesquisa sobre o assunto.
A próxima etapa dos trabalhos aconteceu em sala de aula, onde os estudantes
Figura 11 - Resolução do problema
Fonte: Elaborada pelo autor.
80
realizaram os exercícios propostos no livro didático.
3.2 COLETA DE DADOS
Esta seção está dividida em três partes, cada uma relacionada a um dos
objetivos da pesquisa. A primeira parte traz os dados relativos ao objetivo
“conhecer as concepções dos estudantes sobre a Matemática” A análise das
respostas coletadas por meio de um questionário foram submetidas à análise de
conteúdo, proposta por Bardin (1977), sem categorização a priori. A segunda,
ligada ao objetivo “analisar o processo de identificação de padrões, em
trigonometria, por parte dos estudantes” traz as entrevistas que foram realizadas
com três sujeitos do grupo experimental, analisadas à luz do método clínico de
Jean Piaget. Finalmente, a terceira e última etapa, relaciona-se ao objetivo
“avaliar o impacto de uma intervenção com o uso do Geogebra na habilidade de
perceber e representar simbolicamente padrões. Com um design quase-
experimental, os dados foram obtidos por meio de uma prova objetiva (pós-teste)
aplicada aos sujeitos de ambos os grupos.
3.2.1 1ª ETAPA
Em relação ao objetivo específico “analisar as concepções dos
estudantes sobre a Matemática”, 108 estudantes responderam ao questionário,
embora nem todos tenham respondido a todas as perguntas. O questionário era
composto pelas seguintes questões:
1 – Para você, o que é Matemática?
2 – Descreva uma experiência positiva que você já teve com a
Matemática em sua vida.
3 – Descreva uma experiência negativa que você já teve com a
Matemática em sua vida.
4 – Qual das frases abaixo representa melhor a sua opinião em relação à
Matemática? (assinale apenas uma)
81
Uma matéria que ensina a calcular as coisas
Uma ferramenta que me permite compreender o mundo
e foi aplicado em sala de aula, durante o período de aulas. Coube ao professor
que estava na sala de aula zelar pelo bom andamento da atividade. Alguns
estudantes levaram o questionário para terminar o preenchimento em casa.
Outros, que faltaram no dia da aplicação, receberam o questionário em outra
oportunidade e puderam respondê-lo.
Abaixo são apresentadas as categorias e a freqüência relativa (na forma
de fração) das respostas relacionadas a cada uma delas e a transcrição de
algumas das respostas dadas e um gráfico onde estas informações aparecem
de forma sintetizadas.
Em relação à primeira das questões propostas (Para você, o que é
Matemática?) foram identificadas cinco categorias nas quais as respostas
podem ser agrupadas. Entre colchetes [ ] temos a freqüência de respostas em
relação ao total de pessoas que responderam à pergunta. Por exemplo: [60/90]
significa que das 90 respostas dadas, 60 eram do tipo “x”.
I – Matemática é a ciência que ensina a calcular [60/90]:
a) É uma forma de lidar com cálculos,números, mais facilmente. b) É o estudo dos números que é muito utilizado no dia-a-dia de todos. c) É o estudo de cálculos e prática de exercícios envolvendo números. Sendo muitas partes
necessárias, porém outras não. d) A ciência que estuda a relação dos números. e) Para mim matemática é conhecimento de algarismos, resoluções, utilização da lógica e
principalmente os cálculos, esses que utilizamos diariamente muitas vezes de forma imperceptível.
f) É o estudo dos números e sua aplicação em diversas situações. É uma ciência que se compreende por números e incógnitas que buscam respostas que variam desde situações do dia-a-dia até situações mais complexas, um estudo muito importante para todos.
g) Matemática é a forma (maneira) de explicar e/ou entender a natureza de forma quantitativa, de onde se tira valores, equações e resultados.
h) Matéria que ensina cálculos.
II – Matemática é algo que pode ser utilizado na vida/vida profissional
[6/90]
a) É a matéria da qual eu mais gosto e me identifico, é uma matéria necessária para vida independente de sua profissão.
82
b) Para mim, matemática é uma matéria escolar muito importante. Ela será de grande ajuda durante toda a nossa vida, em diversas ocasiões.
c) A matemática é um ensino que levaremos para as nossas vidas daqui em diante e de que usaremos para as nossas experiências de vida.
d) Algo que posso usar em minha futura carreira profissional, já que o que eu pretendo é fazer é quase totalmente ligado a cálculos.
e) Uma disciplina que é muito importante para o currículo escolar e para a vida, e talvez área de minha futura profissão.
III – Matemática é ferramenta para resolver problemas [11/90]
a) A matemática pode ser compreendida de várias maneiras, positivamente ou negativamente, eu acredito que a matemática é um instrumento de estudo que iremos utilizar em inúmeras ocasiões de nossa vida, como na resolução de problemas, identificação de algum fator que a envolva, etc.
b) É aprender a resolver milimetricamente os problemas da vida. c) Uma matéria que facilita minha vida, me ajudando a solucionar problemas e resolver
contas. d) Matemática é a habilidade de resolver problemas relacionados com números, como
cálculos. Ela é utilizada em nosso dia-a-dia em diversas situações e é uma matéria extremamente importante para o desenvolvimento intelectual de todos.
e) É uma ciência que procura estudar e resolver os problemas do dia-a-dia de uma forma simples (a mais simples possível). Através dos números podemos calcular e compreender coisas que não seriam possíveis sem os mesmos.
f) É uma ferramenta básica dos seres humanos, usada desviar ou enfrentar pequenas ou desafiadoras situações do cotidiano.
g) É uma ferramenta que torna possível a resolução de problemas. h) É uma área de estudo que nos permite resolver problemas de uma maneira lógica e
consciente.
IV – Matemática é base para outras ciências/tecnologia [5/90]
a) Matemática para mim é uma importante ferramenta de aprendizagem, que existe para nós compreendermos o universo dos números e da lógica.
b) Pra mim matemática é uma matéria que aprendemos desde o princípio dos estudos e que usamos nas demais matérias. A matemática é utilizada desde a antiguidade e é muito útil no dia-a-dia.
c) Matemática em minha opinião é o que causa a evolução tecnológica, científica e humana. Pois está presente em qualquer coisa, seja na geometria ou então como cálculos para a produção de softwares, sistemas, celulares, casas, construções, em tudo.
d) É uma importante ferramenta de aprendizagem. e) Matemática, além de uma matéria escolar, é também uma espécie de ferramenta de
aprendizagem que nos ajuda a melhorar nosso raciocínio e pode nos ajudar muito tanto para desenvolver melhor nosso cérebro, quanto para um eventual curso de engenharia, matemática, etc na faculdade.
IV – Matemática é instrumento para raciocinar/desenvolver raciocínio
lógico/linguagem [8/90]
83
a) Matemática, para mim, é o estudo lógico de tudo aquilo que pode ser tido como verdade incontestável, os números.
b) Matemática é uma ferramenta lógica utilizada diariamente por todos. c) Matemática é uma matéria que nos ajuda a compreender situações no dia-a-dia de uma
maneira lógica e eficiente. d) É uma matéria escolar com o objetivo de melhorar o pensamento lógico e o raciocínio
rápido. e) Para mim são cálculos com linguagem lógicas com mais raciocínio, a matemática em si
serve como instrumento para raciocinar. f) Para mim, matemática é a linguagem do universo. É o que determina praticamente tudo
que é lógico no mundo, tudo ao nosso redor utiliza matemática de algum jeito. É como se fosse a programação de nosso universo, determinando suas leis e como tudo funciona.
g) Para mim matemática é utilizar a parte lógica do nosso cérebro para facilitar nossas vidas, aumentar nosso conhecimento e muitas vezes a usamos sem perceber. Ela está por todo o canto e é inegável a essencialidade da mesma.
GRÁFICO 10 - Para você, o que é Matemática?
Fonte: Elaborado pelo autor.
Fica evidente, analisando o Gráfico 10 - Para você, o que é Matemática -
que a maior parte dos estudantes (67%) ainda considera a Matemática como
uma ciência que “ensina a calcular” , visão está já apresentada por Felicetti e
Giraffa (2012) “A matemática ainda é vista como um conjunto de atividades
instrucionais, sem conexões com situações hodiernas.” Pode-se conjecturar que
esta visão tenha relação direta com o que seus professores e o meio em que
60; 67%
6; 7%
11; 12%
5; 5%
8; 9%Matemática é a ciência que ensina a calcular
Matemática é algo que pode ser utilizado na vida/vida profissional
Matemática é ferramenta para resolver problemas
Matemática é base para outras ciências/tecnologia
Matemática é instrumento para raciocinar/desenvolver o raciocínio lógico/linguagem
84
vivem acreditem ser a matemática. Devlin (1998) escreve que
Ao longo dos anos a matemática tornou-se cada vez mais e mais complicada, as pessoas concentraram-se cada vez mais nos números, fórmulas, equações e métodos e perderam de vista o que aqueles números, fórmulas e equações eram realmente e porque é que se desenvolveram aqueles métodos. Não conseguem entender que a matemática não é apenas manipulação de símbolos de acordo com regras arcaicas mas sim a compreensão de padrões – padrões da natureza, padrões da vida, padrões da beleza (DEVLIN, 1998 p. 206).
Destaca-se, também, a pequena representatividade (7%) daqueles que
consideram a matemática aplicável no cotidiano ou que será útil no futuro.
As respostas dadas à segunda questão (Descreva uma experiência
positiva que você já teve com a Matemática em sua vida) foram assim
categorizadas:
I – Nenhuma experiência positiva/não lembra [22/108]
a) Não consigo me lembrar de nenhuma. b) Por enquanto nenhuma, mas sei que quando for adulto vai me ajudar bastante. c) Não tive nenhuma experiência positiva na matemática. d) Não tenho experiências positivas em relação à matemática, pois nunca me dei bem
nesta matéria. e) Não tenho experiências positivas com a matemática e números, pois nunca me
identifiquei com essa matéria.
II – Notas altas em avaliações internas/externas [32/108]
a) Quando eu fui avançado no AVALIA de matemática. b) Uma experiência positiva eu sempre tenho quando faço uma prova ou trabalho e tiro
nota boa, pois é gratificante para mim saber que eu aprendi a matéria, a compreendi. c) Acho que a única experiência positiva que consigo me recordar de matemática, é ter
tirado um 10 em um cálculo mental, me senti muito bem e realizada. d) Quando tirei uma nota boa.
III – Utilizar a matemática em uma situação do cotidiano [48/108]
a) Nunca ser enganado quando receber o troco. b) Já trabalhei em uma estamparia e tinha que calcular as encomendas, o valor e a
quantidade eu era produzida no processo. c) Ajudo meu pai no caixa do empreendimento dele. d) Quando compreendi frações e isso me ajudou a cozinhar. e) Aprender a calcular. E posso compreender as medidas dos ingredientes de minhas
receitas. f) Consigo resolver o tangran e realizar cálculos.
85
g) Na loja do meu pai, muitas vezes uso para calcular impostos, valores em geral de mercadorias, porcentagem de desconto e do salário dos funcionários, etc.
IV – Ajudar/ser ajudado por colegas que estão em dificuldade [6/108]
a) A tutoria que tem aqui na escola onde é possível auxiliar aqueles que possuem mais dificuldade no assunto, essa interação ajuda ambas as partes (tutor e tutorada) sendo algo que influencia positivamente.
b) Esse ano comecei com as aulas de apoio é é bem legal ouvir do professor novo que você está indo bem e seu tutor dizer que você é a melhor aluna dele. Só queria ter feito isso no ano passado.
c) Uma experiência positiva na matemática é no colégio, especialmente nas terças-feiras, quando faço parte (como tutorada) na aula de apoio do Colégio, é muito bom e gratificante aprender com aqueles que estão a nossa volta.
GRÁFICO 11 - Descreva uma experiência positiva que você já teve com a Matemática em sua vida
Fonte: Elaborado pelo autor.
O Gráfico 11 - Descreva uma experiência positiva que você já teve com a
Matemática em sua vida ressalta a importância que tem para os estudantes
perceberem a aplicação daquilo que estudam em situações do cotidiano,
indicando que este pode ser um ponto de partida interessante para nortear o
trabalho do professor. Também destaca-se a obtenção de notas altas como
experiência positiva. Neste sentido,Felicetti e Giraffa (2012) já indicaram
22; 20%
32; 30%
48; 44%
6; 6%
Nenhuma experiência positiva/não lembra
Notas altas em avaliações internas/externas
Utilizar a matemática em uma situação do cotidiano
Ajudar/ser ajudado por colegas que estão com dificuldades
86
Desempenham as atividades em Matemática pensando na prova, na nota, e não em realmente compreendê-la. Não associam a Matemática da escola com a Matemática do cotidiano. Parece que a Matemática serve somente para „passar de ano‟ na escola e nada mais. (FELICETTI E GIRAFFA ,2012)
As respostas dadas à terceira questão (Descreva uma experiência
negativa que você já teve com a Matemática em sua vida) foram agrupadas em
três categorias:
I – Nenhuma experiência negativa/não recorda [33/89]
a) Tive nenhuma. b) Não consigo me recordar de nada. c) Para ser sincera, em nenhum momento tive uma experiência negativa, mesmo quando
recebia notas baixas pois fico ainda mais motivada a entender. d) Não creio que eu tenha experiências terríveis que é possível ser lembrada. Matemática é
difícil, mas se é necessário e extremamente presente no dia-a-dia, se a pessoa se esforçar ela vai começar a ter prazer em utilizar a mesma.
II - Notas baixas em avaliações [42/89]
a) Por enquanto as dificuldades em provas, que eu tiro apenas notas baixas. b) Minha dificuldade em matemática é grande, sempre tirei notas baixas nas provas e
nunca soube realizar exercícios sozinha em casa e sempre tive medo de fazer perguntas durante as aulas.
c) Matemática sempre foi uma matéria em que eu tenho muita dificuldade, então em diversas situações posso dizer que tive experiências ruins relacionadas à Matemática. Em 2013 por exemplo meu desempenho na matéria foi lamentável, resultando várias notas ruins e por fim, o exame.
d) Em inúmeras vezes ter me empenhado para alguma prova, e não ter o resultado esperado.
e) Muitas notas baixas! Todos os anos sempre tiro notas que não me agradam muito, elas me magoam, mas ao mesmo tempo me deixa intrigada por não conseguir resolver, por que é tão difícil para mim? Sempre tento entender.
f) Nunca confiar em mim por conta dos resultados das provas. g) Na verdade são a grande maioria, sempre tiro nota baixa nas provas e sinceramente não
gosto da matéria.
III – Não entender o conteúdo/relacionamento ruim com professor [14/89]
a) Este ano só tive experiências ruins, pois não consigo aprender nada com meu professor. b) A de não conseguir resolver problemas propostos pelo fato de não saber resolve-os c) De forma inversa, é a frustração em geral de não conseguir entender algum conceito
devido o quão complicado eles podem ser em matemática. d) Não aprender ou não entender algum conteúdo. e) Acho que a “pior” experiência para mim é quando não entendo algo e vou mal em
prova, mas principalmente quando não entendo.
87
GRÁFICO 12 - Descreva uma experiência negativa que você já teve com a Matemática em
sua vida
Fonte: Elaborado pelo autor.
O Gráfico 12 - Descreva uma experiência negativa que você já teve com a
Matemática em sua vida – mostra que 47% dos estudantes relacionam
experiência negativa com notas baixas em avaliações. Por outro lado, apenas
16% consideram experiência negativa não entender o conteúdo/relacionamento
ruim com professor. Fica claro que muitos estudantes ainda vêem a nota como
“um fim em si mesmo” e não como um indicador para se reavaliar o processo
seguido. Novamente o professor tem fundamental participação nestas respostas
porque elas podem indicar que o mesmo também as vê assim, acabando por
construir tal imagem junto aos estudantes.
Por fim, as respostas dadas à quarta pergunta do questionário (Qual das
frases abaixo representa melhor a sua opinião em relação à Matemática?
assinale apenas uma), ficaram assim distribuídas:
Uma matéria que ensina a calcular as coisas: [58/106]
Uma ferramenta que me permite compreender o mundo: [48/106]
33; 37%
42; 47%
14; 16%0; 0%
Nenhuma experiência negativa
Notas baixas em avaliações
Não entender o conteúdo/relacionamento ruim com o professor
88
GRÁFICO 13 - Qual das frases abaixo melhor representa a sua opinião em relação à Matemática?
Fonte: Elaborado pelo autor.
O Gráfico 13 - Qual das frases abaixo melhor representa a sua opinião
em relação à Matemática? - mostra que, tal qual já havia sido mostrado no
Gráfico 10 - Para você, o que é Matemática? - a maior parte dos estudantes
pesquisados vê a Matemática como “cálculo” e “técnicas de cálculo”. Trata-se,
indubitavelmente, de uma visão bastante limitada e limitante do que venha a ser
a Matemática. Segundo Felicetti e Giraffa (2012)
“Isto nos faz perceber que a Matemática vem sendo trabalhada de uma forma muito descontextualizada, desarticulada do pensar, do fazer e compreender, mas sim de forma decorada, instrucionista e, principalmente, algebrista.” (FELICETTI E GIRAFFA , 2012)
3.2.2 2ª ETAPA
Nesta etapa tem-se os dados oriundos das entrevistas que foram
realizadas com três estudantes do grupo experimental. Inicialmente a idéia era
escolher três estudantes que tenham se destacado no pós-teste. Depois decidiu-
58; 55%
48; 45%Uma matéria que ensina a calcular as coisas
Uma ferramenta que me permite compreender o mundo
89
se que seriam escolhidos dois estudantes de destaque (não apenas no pós-
teste, mas em todo o conjunto de avaliações realizadas: média anual (escola),
resultado no AVALIA, partipação na intervenção didática e, finalmente, o pós-
teste. Assim sendo, foram selecionados os três estudantes com os quais foram
feitas as entrevistas. Ao longo do texto eles serão identificados por A, B e C.
Antes do relato das entrevistas é importante conhecer um pouco desses
estudantes.
O estudante A é do gênero masculino, 15 anos, média anual acima de nove
em Matemática, com participação ativa na intervenção didática e nível avançado
no AVALIA em Matemática. O estudante B é do gênero feminino, 15 anos, média
anual acima de nove em Matemática, com participação ativa na intervenção
didática e nível avançado no AVALIA em Matemática. O estudante C é, também,
do gênero feminino, 16 anos, média anual muito próxima de seis, participação
ativa na intervenção didática e nível básico no AVALIA, em Matemática. Os
estudantes A e B são do tipo “que sempre se deram bem em Matemática”,
sendo bastante autônomos e confiantes em sua capacidade. Já a estudante C é
extremamente insegura e sente-se incapaz de aprender Matemática. Sempre se
viu como “burra em Matemática”. Extremamente caprichosa e dedicada,
geralmente não consegue bons resultados, apesar de todo o esforço no estudo
da matemática.
A atividade foi realizada nas dependências do CSI, no contra-turno,
individualmente. A filmagem foi feita com uma câmera fornecida pela equipe de
audiovisual do colégio. Utilizou-se o software Geogebra para o desenvolvimento
da atividade.
Tendo em vista que a estratégia de análise das entrevistas será o método
clínico, convém dissertar um pouco sobre ele.
3.2.2.1 O método clínico
Piaget utilizou o método clínico em suas pesquisas por não aceitar os
resultados dos testes padronizados, utilizados por Binet e tampouco os
resultados obtidos nas observações puras ou diretas, por terem campo muito
amplo. Neste método, que é uma adaptação do método clínico usado por
psiquiatras, o entrevistador pode formular problemas, acompanhar o processo
90
utilizado pela criança para resolver o problema e buscar entender os
pensamentos que nortearam o trabalho da criança e, consequentemente, as
respostas dadas.
Delval (2002) apresenta a origem do termo “método clínico”:
A expressão método clínico foi usada pela primeira vez em 1896, por L. Witmer, psicólogo norte-americano, que foi aluno de WilhemWundt. O método clínico servia para prevenir e tratar anomalias mentais de indivíduos, entre elas crianças com dificuldades escolares normais […]. Na medicina, a clínica constituiu-se em ramo das ciências médicas que compreende outras disciplinas, com a finalidade prática para estudar um organismo doente e poder devolvê-lo ao seu estado normal. Mas no caso da psicologia normal e do estudo do pensamento das crianças, foi Piaget quem introduziu o método clínico, dando-lhe um significado muito distinto que só guarda uma semelhança distante com suas
origens.(DELVAL, 2002)
O próprio Piaget ressalta que
Assim, desde minhas primeiras entrevistas, observei que, embora os testes de Burt tivessem méritos indubitáveis quanto ao diagnóstico, já que se fundamentavam sobre o número de êxitos e fracassos, era muito mais interessante tentar descobrir as razões do fracasso. Desse modo, empreendi com meus sujeitos conversas do tipo das entrevistas clínicas com a finalidade de descobrir algo sobre os processos de raciocínio que estavam por trás de suas respostas correlatas, com interesse particular pelo que ocultavam as respostas falsas. Descobri com espanto que os raciocínios mais simples que implicavam a inclusão de uma parte no todo ou o encadeamento de relações ou ainda a “multiplicação” de classes (encontrar a parte comum de suas entidades) apresentavam para as crianças normais até de 11 anos dificuldades insuspeitadas para o adulto (PIAGET apud DELVAL, 2002, ).
É fundamental ressaltar a mudança de paradigma trazida por Piaget:
embora os testes padronizados fossem importantes para diagnosticar os
problemas eles nada informavam acerca dos elementos que influenciam nos
resultados obtidos. Piaget queria “descobrir as razões do fracasso” e, por que
não estender tal intenção para “descobrir as razões do fracasso e do sucesso?”
No contexto da pesquisa o método clínico será utilizado para analisar o
processo de identificação de padrões em trigonometria, por parte dos
estudantes. Após a intervenção realizada (sequência didática) serão escolhidos
três estudantes que participaram de todas as atividades propostas. A estes
estudantes, individualmente, será apresentada uma situação que envolve a
percepção de padrões, a identificação de regularidades relativas ao baricentro
de um triângulo. O roteiro da atividade está descrito no APÊNDICE
91
3.2.2.2 Entrevistas
Seguem as transcrições das partes mais importantes das entrevistas
realizadas. Adotou-se o seguinte critério para identificação das falas: D
representa a descrição, feita pelo professor, das observações realizadas; P
representa uma fala do professor, enquanto que A, B e C representam falas,
respectivamente, dos estudantes A, B e C. As transcrições são fiéis às falas,
exceto por pequenos detalhes. Entre parênteses estão colocadas informações
para deixar mais claro ao leitor o que está acontecendo, com o intuito de facilitar
a visualização daquilo que está sendo falado.
Entrevista com estudante A, realizada no dia 20 de outubro de 2014, com
início às 17h12min e duração aproximada de 22min14s.
D – O ESTUDANTE JÁ HAVIA DESENHADO OS CINCO TRIÂNGULOS SOLICITADOS PELO PROFESSOR. P - Como é que tu definirias assim o ponto médio? A - Ponto no meio de dois vértices... no triângulo. P - Encontra prá mim ai um ponto médio, faz favor. D - UTILIZANDO A FUNÇÃOPONTO MÉDIO... P - Tá, só uma coisinha, .... Tu consegues identificar ali o ponto médio... Que propriedade tem o ponto médio de um segmento? Por que que ele é chamado de ponto médio? A - Porque ele é exatamente o ponto no meio de um segmento.... P - Mostra pra mim o que isso significaria aí nessa situação... D - PROCURANDO A FUNÇÃO DISTÂNCIA....MOSTRA QUE AS DISTÂNCIAS DO PONTO MÉDIO ATÉ AS EXTREMIDADES DO SEGMENTO (LADO DO TRIÃNGULO) SÃO IGUAIS. P - Beleza... D - TRAÇOU AS MEDIANAS.... P - Em cada triângulo vai ter quantos desses? A - Tres.... D - APÓS TER TRAÇADO TODAS AS MEDIANAS EM TODOS OS TRIÂNGULOS. P - Percebesse alguma coisa, não? A - Eles (referindo-se aos segmentos) se cruzam no meio do triângulo. P - O que tu entendes por meio do triangulo? A - O centro dele, né... P - O conceito de meio do triângulo é meio estranho. Como é que tu definirias o meio do triângulo? Que propriedade tem o meio do triângulo. A - Eu acho que a distância desse ponto (localizou o baricentro) até esse ponto (indicou um dos vértices e utilizou a função DISTÂNCIA)é igual a essa distância aqui (do baricentro até outro vértice. Igualmente utilizou a função DISTÂNCIA.)... Não! P - Essa tua conjectura, essa tua idéia ela seria verdadeira para que tipo de triângulo? A - Um eqüilátero... P - Um eqüilátero. Então ela é uma idéia que não é completamente equivocada, mas ela só serve para um tipo de triângulo... não é uma propriedade que pode ser generalizada. Mas tu percebeste uma coisa importante: quando a gente pega um triângulo, encontra o ponto médio dos lados e une esses pontos médios aos vértices opostos, o que que acontece? A - Todos... Eles vão se cruzar, as linhas... P - Todas elas se encontram... A - Num ponto.
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P - Num único ponto. P - Agora eu gostaria que você observasse este ponto (referindo-se ao baricentro). D - ESCOLHE UM DOS TRIÂNGULOS...NO TRIÂNGULO ESCOLHIDO (W É PONTO MÉDIO DE UM DOS LADOS, G1 É O BARICENTRO E H É O VERTICE OPOSTO AO LADO QUE CONTEM W) P - Pelo que tu estás observando, a distância entre o W e o G1 é menor, maior ou igual à distância entre o G1 e o H? A - A distância entre o W e o G1 é menor que a distância entre o G1 e o H. P - Tu estás convicto disso? A - Urum... D - FEZ O MESMO PARA OUTRAS MEDIANAS... P - Então esse ponto (baricentro) que é o ponto de encontro daqueles segmentos... a distância dele até o ponto médio do lado é sempre o que?É o que? O que estás percebendo? A - Ele (o baricentro) sempre está mais perto do ponto médio. D - V É O PONTO MÉDIO DE UM DOS LADOS, G1 É O BARICENTRO E I É O VÉRTICE OPOSTO AO LADO QUE CONTÉM V) P - Tu conseguirias, mais ou menos, pensando no (segmento)V G1 e no (segmento) G1 I, mais ou menos, quantas vezes o (segmento) G1 I é maior que o (segmento) V G1? Assim, faz uma estimativa... A - Umas duas... P - Duas? P - E para os outros valeria a mesma relação? (referindo-se às outras medianas do mesmo triângulo) A - Acredito que sim. P - E para os outros triângulos? D - UTILIZA O MESMO PROCEDIMENTO EM OUTROS TRIÂNGULOS. A - Mais ou menos a mesma coisa. P - É??? E tu achas que isso independe do tamanho do triângulo? A - Eu acho que sim. D - FAZ NOVAS MEDIÇÕES, TRANSLADA UM DOS VÉRTICES DO TRIÂNGULOE CONCLUI: A - As distâncias mudaram, mas a razão ta a mesma. P - Dá um exemplo, mostra ai... A – Aqui (aponta para uma mediana), só um pouquinho arredondou, mas deu 4,15 e 8,30... P - Se nós pegássemos o segmento que une um vértice ao ponto médio do lado oposto e o dividíssemos em três partes, quantas dessas partes ficariam aqui (entre o vértice e o baricentro)? A - Duas. P - E aqui (entre o baricentro e o ponto médio)? A - Uma. P - Então a gente poderia dizer que aquele ponto (o baricentro), o ponto G, divide o segmento (mediana) em duas partes e a razão entre essas partes é de quanto para quanto? A - Dois prá um. D - PROFESSOR DÁ NOME AO PONTO (BARICENTRO) E AOS SEGMENTOS (MEDIANAS). P - Imagine que tu tenhas que passar uma definição pelo telefone. Ó, Vavá, o baricentro de um triângulo é um ponto que é obtido assim... A - Traçando ... Com o ponto médio de cada lado do triângulo, traça uma linha desse ponto médio até o vértice oposto, e o ponto em que todos eles se cruzam, todas essas linhas se cruzarem é o baricentro. P - Tá. E o baricentro, ele divide cada uma dessas linhas... A - Em duas partes... P - Duas partes. Iguais? A - Diferentes, mas numa proporção de dois para um... P - E ta mais próximo sempre de quem? A - Do ponto médio...
Entrevista com estudante B, realizada no dia 14 de novembro de 2014,
com início às 17h e duração aproximada de 22min56s.
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D - DEPOIS DE CONSTRUIR OS TRIÂNGULOS... P - Beleza. Agora escolha um triângulo qualquer e identifica prá mim o ponto médio de cada um dos lados desse triângulo que você escolheu. Com que triângulo você quer trabalhar? P–Pode ser esse aqui (aponta para um dos triângulos). D - UTILIZANDO A FUNÇÃO PONTO MÉDIO, DETERMINOU A LOCALIZAÇÃO DOS PONTOS MÉDIOS DOS TRÊS LADOS DO TRIÂNGULO. P - O que prá ti significa ponto médio? B - É o ponto que... é o ponto que fica no meio assim, entre os dois. P - E tu consegues utilizar o Geogebra para encontrar o ponto médio dos lados dos triângulos? B - Tá...Esse ponto aqui (aponta para o ponto médio de um dos segmentos) D - CONSIDERE QUE OS LADOS E SEUS RESPECTIVOS PONTOS MÉDIOS SEJAM: AB, M1; BC, M2 E CA, M3 P - Por exemplo, esse ponto aqui (aponta para o ponto M1) é o ponto médio desse segmento (mostra o segmento AB). O que a gente pode dizer sobre a distância entre esse ponto (aponta para o ponto A) e este ponto (aponta para o ponto M1) e entre este ponto (aponta para o ponto B) e este (aponta para o ponto M1)? B - A distância é a mesma. P - E tu consegues usar o Geogebraprá mostrar que é a mesma distância? B - Consigo. D - UTILIZANDO A FUNÇÃO DISTÂNCIA, DETERMINA AS DISTÂNCIAS ENTRE A E M1 E ENTRE B E M1. P - Como eu te falei no início, nós estamos buscando identificar padrões que sejam comuns a todos os triângulos. Você construiu cinco triângulos quaisquer, não houve necessidade de que eles tivessem lados iguais, nem ângulos iguais, nada disso, né? P - Pediria que você traçasse um segmento que une o ponto médio de um lado ao vértice oposto a este lado. D - CONSTRUIU OS SEGMENTOS UTILIZANDO A FUNÇÃO SEGMENTO.P - Percebeste alguma coisa? B - Que tem um ponto de encontro entre eles. P - O que tu queres dizer “que tem um ponto de encontro”? B - Um ponto em que os três segmentos que eu determinei se encontram. P - Como é que esses três segmentos foram construídos, mesmo? B - A partir dos pontos médios e dos vértices opostos. P - E daí tu percebeste que para este triângulo aí esses três segmentos... eles se encontram... B - Num ponto determinado. P - Num ponto determinado. P - Vamos fazer o seguinte: faz o mesmo procedimento, aplica a mesma idéia para os outros triângulos. D - DEPOIS DE TER REPETIDO O PROCESSO PARA TODOS OS OUTROS TRIÂNGULOS... P - Então tu percebeste que... B - Em todos os triângulos tem um ponto em que os segmentos se encontram (aponta para os pontos de encontro dos segmentos). P - Escolha um triângulo qualquer aí, qualquer um... e daí com a função mover (localiza a função) escolhe um vértice desse triângulo (aquele que ela escolheu). D - ESCOLHEU O TRIANGULO E O VÉRTICE P - Beleza. Clica sobre ele (vértice) e desloca esse vértice. Observa. Pode fazer um deslocamento qualquer. Vai variando aí o tamanho do triângulo. Tu percebes alguma coisa? B - Que esse ponto se mantém. Sempre tem um ponto de encontro. P - Ou seja, esses três segmentos... B – Eles continuam se cruzando... P - Se cruzando no mesmo ponto. B - No mesmo ponto. P - Beleza, dá uma, faz um malabarismo aí, muda de lado... (referindo-se ao vértice escolhido para mover). Pode girar, fazer a volta que tu quiseres... O tamanho do triângulo está mudando, os lados estão mudando. Os ângulos internos estão mudando? B - Os ângulos mudam... P - Mas aquele ponto (referindo-se ao ponto de encontro dos segmentos)??? B - Não. D - UTILIZOU A FUNÇÃO INTERSECÇÃO DE DOIS OBJETOS PARA DETERMINAR O PONTO
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DE ENCONTRO DOS SEGMENTOS QUE UNEM O PONTO MÉDIO DE UM LADO AO VÉRTICE OPOSTO. ESTE PONTO SERÁ, DORAVANTE, IDENTIFICADO PELA LETRA G. P - Eu queria que tu analisasses a distância entre desse ponto (G) ao lado e ao vértice. Triângulo por triângulo. B - A distância do ponto até o vértice parece maior do que a distância do ponto até o lado. P - A distância do ponto até o vértice parece maior do que a distância do ponto até o lado. Tu consegues assim, pelo desenho, fazer uma estimativa dequão maior? B - Parece que é o dobro. P - Parece que é o dobro. P - Então tu dirias, por exemplo, que se esse aqui fosse o ponto A (aponta para o ponto médio de um segmento), esse aqui o B (aponta para o ponto G) e esse aqui o C (aponta para o vértice oposto ao A), pela tua impressão, a distância entre o A e o B(G) seria a metade da distância entre o B (G) e o C. B - Sim... P - Vamos fazer uma inspeção. Usa aquela, aquela ferramenta distância prá ver se isso que tu estás dizendo faz sentido. P - Se a tua hipótese estiver certa, a distância entre o H1 e o B deveria ser quanto? B - Três e quarenta e seis... P - Três e quarenta e seis. P - Vamos ver... D - USOU A FUNÇÃO DISTÂNCIA PARA DETERMINAR TAIS MEDIDAS... P - Deu três e quarenta e sete. B - É porque aproximou, de certo. P - Vamos fazer um teste para as outras medianas nesse triângulo. Essa deu um e vinte e nove; então a outra media teria que dar mais ou menos quanto? B - Dois e sessenta. P - Dois e sessenta, dois e cinqüenta ... B - Dois e cinqüenta e oito... P - Dois e cinqüenta e oito. Certinho. P - Agora, o pessoal poderia dizer assim ó: isso é verdadeiro para esse triângulo aí. Como é que tu convencerias uma pessoa de que realmente este ponto (G) está mais perto do lado da figura do que do vértice oposto. Porque a gente desenhou cinco triângulos. O que que tu poderias fazer aí no programa que a pessoa assim se convenceria de que qualquer que fosse o triângulo esta relação de um para dois permanece a mesma. B - O que que eu poderia fazer? P - É... utilizando isso que tu tens ai... B - Eu teria feito mais outros tipos de triângulos para provar que vai ter sempre a mesma....entre aspas, “regra”... D - PROFESSOR PEDE PARA QUE COMPLETE UM DOS TRIÂNGULOS COM TODAS AS MEDIDAS. UTILIZANDO A FUNÇÃO DISTÂNCIA A ESTUDANTE O FAZ. P - Olha só: se eu te der essa medida aqui (aponta para a distância entre o baricentro e o ponto médio de um dos lados) tu já consegues estimar a outra (referindo-se à distância entre o baricentro e o vértice oposto)... Mais ou menos... B - Dois e quarenta e oito... P - Dois e quarenta e oito... Beleza. B - Posso fazer aqui? (usou a função DISTÂNCIA para verificar se seu valor estava correto). P - Vai que ele coloca sete e noventa... P - Dois e quarenta e oito, beleza. Agora o seguinte, ..., só trabalhando com este triângulo (que está com todas as medidas inseridas), mostra para um descrente que esta relação vai permanecer a mesma. P – Tu lembras o que tu fizeste com este triângulo aqui (aponta para outro triângulo) para mostrar que este ponto (o baricentro) é sempre o ponto de encontro dos três segmentos (medianas), qualquer que seja o triângulo??? B - Eu poderia mover o... P - Experimenta... Move para algum lugar bem distante.... Ai. Vamos ver o que aconteceu... P - Dois e sessenta e dois aqui (distância do baricentro ao ponto médio do lado); cinco e vinte três (distância do baricentro ao vértice oposto). Dois e sessenta e dois vezes dois??? B - Dá cinco e vinte quatro. P - Cinco e vinte quatro. Tá dentro de uma margem....de aproximação, né? P - Aqui ó, (distância do baricentro ao vértice oposto a outro lado), três e quarenta e seis... Um e
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setenta e três (distância do baricentro ao ponto médio oposto ao vértice considerado)... Razoável? B - Aham...Um e quarenta e seis, dois e noventa e dois... P - Move o vértice C para algum lugar. Vamos tentar deixar este triângulo maior. Tu consegues perceber... Te fixa num desses segmento (uma das medianas), fixa tua atenção num desses segmentos e movimenta o vértice. B - Esse vértice? (aponta para o vértice C) P - Qualquer um que tu quiseres...Só que olha o que está acontecendo com os números (distâncias entre o baricentro e o ponto médio e do baricentro e o vértice oposto ao ponto médio do lado). P - Agora é o seguinte, ... A gente vai tentar representar tudo isto que tu percebeste utilizando a linguagem matemática... OK? D - [...] PARA MELHOR ENTENDIMENTO, CONSIDERE UM TRIÂNGULO DE LADOS AB, BC E AC. O BARICENTRO SERÁ REPRESENTADO PELO PONTO G. P - O “x” representa o que para você? B - A distância entre este ponto (ponto médio do lado AB) e a interseção (referindo-se ao G). P - Beleza. Eu quero que tu representes para mim, algebricamente, a distância entre este ponto (G) e aquele lá (C). B - Dois xis... P - E para as outras? B - A mesma coisa... P - Mas será que tu podes chamar isso aqui de x também? (distância entre G e o ponto médio de BC) B - Não, porque daí é outra medida.... P - Será que tem algum caso, algum triângulo, em que estas medidas serão todas iguais? B - O eqüilátero??? P - Legal...
Entrevista com estudante C, realizada no dia 26 de novembro de 2014,
com início às 17h e duração aproximada de 34min08s.
P – Primeiro eu gostaria que tu desenhaste cinco triângulos quaisquer. Enquanto tu estás desenhando estás pensando em alguma coisa, assim, tamanho do lado, tamanho do ângulo, alguma coisa assim, ou tu estás fazendo aleatoriamente? C – Eu to fazendo aleatoriamente, só estou tentando fazer em formas diferentes. P – O que tu queres dizer com “formas diferentes”? C – Pra eles não ficarem todos iguais, da mesma maneira assim... P – Beleza. Todos triângulos... Foi difícil desenhar? C – Não... P – Tu achas que é mais fácil desenhar aí no Geogebra ou no papel? C – No Geogebra... P – Por que? C – Porque fica tudo retinho, sem precisar usar régua.... P – E se tu errares? C – Aí é só tu deletar... P – E no papel? C – Tem que apagar com borracha e o papel fica marcado... P – Então, digamos, que aí no Geogebra o teu erro some? C – Isso... P – E no papel tu sempre vais saber que tu erraste... C – Mais ou menos assim... P – Beleza, .... Tu sabes, evidentemente, que todo triângulo tem três lados, né. C – Sim. P – E eu queria que tu encontraste para mim o ponto médio de cada um dos lados desses triângulos. C – De todos os lados? P – De todos os lados.
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D -UTILIZA A FUNÇÃO PONTO MÉDIO PARA DETERMINAR O PONTO MÉDIO DE TODOS OS LADOS DE TODOS OS CINCO TRIÂNGULOS. P – Para determinar o ponto médio tu precisas colocar a flechinha (cursos) exatamente no ponto médio do segmento? C – Em qualquer lugar do segmento... só precisa deixar o negocinho mais escuro (querendo dizer que o segmento deve estar selecionado). P – O que que é o ponto médio de um segmento? C – Ponto médio é...a... o meio da reta. P – Meio da reta? C – Ou do segmento de reta... P – O..., o ponto médio ele tem uma propriedade, uma característica. Então pega, por exemplo, ali... Vai naquele primeiro triângulo, pega aquele vértice lá de cima (A) e um outro vértice (C). Agora identifica o ponto médio do segmento AC (Q). O ponto Q é o ponto médio de qual segmento? C – Do segmento AC... P – Do segmento AC. Pede pro Geogebra calcular, por favor, a distância entre o ponto A e o ponto Q. D -UTILIZA A FUNÇÃO DISTÂNCIA PARA DETERMINAR A DISTÂNCIA ENTRE A E Q. P – Dois ponto quinze.... Mede também a distância entre o Q e o C... Beleza... Então, a distância entre o A e o Q é quanto? C – Dois ponto vinte e cinco. (A distância mudou porque ela, sem querer, modificou a posição de um dos vértices). P – E entre o Q e o C? C – Dois ponto vinte e cinco. P – Que característica que tem o ponto médio de um segmento? C – Que o ponto médio vai ser a metade, vai ser o A e o Q vão ser iguais ao Q e o C. P – Por exemplo, pega um outro lado desse triângulo (selecionou o lado AB, cujo ponto médio é F1). Faz de conta... Se a distância entre A e o B foi seis, a distância entre o A e o F1 vai ser quanto? C – Três. P – E a distância entre o F1 e o B? C – Três também. P – Três também. Será que isso vale para todos os pontos médios? C – Acho que sim. P – Por que tu achas que vale? C – Na verdade depende muito de se as linhas tem tamanhos iguais, são... P – Como assim a linha ter tamanhos iguais? C – Depende se essa aqui (refere-se a um dos lados de um triângulo) for igual a essa aqui (referindo-se a outro lado do mesmo triângulo). Porque se eu pegar essa daqui (referindo-se ao terceiro lado do triângulo), vai ser maior ou menor.... P – Tá. Escolhe um lado qualquer do triângulo. C – Tá. P – Se eu pegar o ponto médio desse lado, esse ponto médio divide o lado em duas partes, certo? C – E as duas partes vão ser iguais. P – Faz o seguinte para mim: movimenta o vértice C e observa o que acontece com as medidas AQ e QC. Observa que à medida que tu moves o vértice C o triângulo vai mudando, não é mais o mesmo triângulo. C – Elas estão mudando... P – Elas estão mudando, mas... C – Mas elas sempre ficam iguais. P – Escolhe um outro triângulo aí qualquer e agora eu vou pedir para tu fazeres o seguinte: que tu ligues o ponto médio de um dos lados do triângulo ao vértice oposto a ele. Então eu quero que tu traces um segmento de reta que vai ligar o ponto médio ao vértice oposto a ele. D -USA A FUNÇÃO SEGMENTO DE RETA PARA REALIZAR A TAREFA SOLICITADA. P – Beleza. Tu traçaste um segmento de reta que une o ponto médio de um lado ao vértice oposto a ele. Faz isso para os outros pontos médios. D -REPETE O PROCEDIMENTO ANTERIOR PARA OS OUTROS PONTOS MÉDIOS. P – Percebeste alguma coisa, ....? C – Que eles se cruzam, as linhas se cruzam.
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P – Mais do que isso... C – Faz para os outros triângulos, por favor. D -REPETE O PROCEDIMENTO PARA OS OUTROS TRIÂNGULOS. C – Vai ficar sempre a mesma figura. P – Tu observaste uma coisa interessante: estas três linhas sempre se cruzam... Mas elas se cruzam em qualquer lugar? C – Não, sempre no centro. Em todo triângulo elas vão se cruzar no mesmo lugar e vão ter a mesma forma. P – Mas elas se encontram no mesmo ponto ou em pontos diferentes? C – No mesmo ponto. P – Elas se encontram no mesmo ponto... C – Aqui... no meio (apontando para o ponto de encontro dos três segmentos). D -USOU A FUNÇÃO INTERSECÇÃO DE DOIS OBJETOS PARA LOCALIZAR O PONTO DE INTERSECÇÃO DOS TRÊS SEGMENTOS. P – Escolhe um desses triângulos, escolhe um dos vértices e movimenta esse vértice. E fica olhando aquele ponto onde os três segmentos de reta se encontraram. C – (Enquanto movimenta o vértice escolhido) Ele não sai do lugar. P – Ele não sai do lugar. O que tu quer dizer com “ele não sai do lugar”? C – Que ele não se move... P – Mas eu estou vendo ele se mover. C – Não, mas ele fica sempre no mesmo... no centro. C – Ó, ele se move, mas ó, ele não saiu do centro. Ele só tem que se adaptar ao movimento que eu faço (com o vértice), mas ele sempre fica ali no centro, nunca sai. P – Tu queres dizer que estas três retas (referindo-se aos segmentos de reta) sempre se encontram no mesmo ponto? C – Urum. P – Por exemplo: não existe a possibilidade de duas dessas retas se encontrarem num ponto e a terceira num outro ponto? C – Como assim? P – Por exemplo. C – Pelo que eu vi aqui, não. Elas sempre estão passando por aqui (aponta para o baricentro). P – Então este seria o ponto de encontro delas... C – Isso. D -ESCOLHE UM DOS TRIÂNGULOS. OS VÉRTICES SÃO OS PONTOS D, E, F. OS PONTOS MÉDIOS SÃO V (DO LADO DF), U (DO LADO DE) E W(DO LADO EF). H1 É O BARICENTRO DO TRIÂNGULO. P - ..., agora eu gostaria que tu observaste o segmento DW. Mostra ele ali pra mim. (ela mostrou o segmento). Olha pro H1. O H1 é o ponto médio desse segmento? C – Não. P – O H1 tá mais perto do W ou do D? C – Do W. P – Do W. O W é o que mesmo? C – W é um ponto médio. P – Ponto médio. Então o H1 tá mais perto do W. C – Tá. P – Agora olha para o segmento FU. O H1 é o ponto médio desse segmento? C – Não. P – Ele ta mais perto do U ou do F? C – Do U. P – E o que é o U? C – O U é um segmento. É o ponto médio, desculpa. P – Olha pro segmento VE e pro H1. Ele é ponto médio do VE? C – Não. P – Ele ta mais perto do V ou do E? C – Do V, eu acho. P – Tu achas ou tu estás certa disso? C – Tô certa porque essa linha (mostrando o segmento VH1) é menorzinha. Tá mais perto do ponto médio. P – Isso aconteceu C – Em todos.
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P – Em todos. Então a gente poderia dizer que este ponto está mais próximo C – Dos pontos médios P – Do que C – Os vértices... P – Do que os vértices. Beleza. P – Agora eu vou te fazer a seguinte pergunta: tu ta vendo ali o segmento FU. C – Sim. P – E tu já sabes que o H1 não é o ponto médio. C – Não. P – E já sabes que o H1 tá mais perto do U do que do F. C – Sim. P – Se a gente fosse estabelecer uma relação, a distância entre o U e o H1 é mais ou menos o que da distância entre o H1 e o F? C – Duas vezes menor. P – Quer dizer então que e eu pegar H1U caberia quantas vezes em H1F? C – Eu acho que duas vezes. P- Duas vezes... E o H1W e o H1D? C – Eu acho que duas vezes também. P – E o H1V e o H1E? C – Duas vezes também. Eu acho que é a metade, em todos. P – Tu achas queH1U é a metade de H1F? C – Aram. P – Vamos fazer o teste. Mede ali. D -UTILIZA A FUNÇÃO DISTÂNCIA PARA DETERMINAR O COMPRIMENTO DOS SEGMENTOS. PERCEBE A RELAÇÃO EXISTENTE ENTRE OS COMPRIMENTOS. P – Então a tua idéia estava correta. P – Então esse ponto (H1) que a gente descobriu, ele tem uma característica: a distância dele , até o vértice é o que da distância dele até o ponto médio? C – É a metade. C – É o dobro... P – Beleza. Se eu disser que a distância entre D e W é x, a distância entre D e H1 vai ser o que? C – Vai ser a metade de x. P – Olha só, ..., a distância daqui (D) até aqui (W) é x. Este ponto (H1)djvide esta linha em quantas partes? C – Em duas partes. P – Tudo bem, mas tu sabes que essa parte aqui (DH1) é o que dessa (H1W)? C – É o dobro. P – Então se essa daqui (DH1) é o dobro daquela (H1W), então a gente poderia imaginar que este ponto (H1) divide esta linha (DW) em duas partes. Tudo é x. Mas esta aqui (DH1) é o dobro dessa (H1W). Quantos desse aqui (H1W) cabem na linha inteira (DW)? C – Dois... P – Não, na linha inteira. C – Quatro??? P – Esse aqui,..., (DH1) é o que deste aqui (H1W)? C – É o dobro. P – Esse (H1W) cabe quantas vezes aqui dentro (DH1)? C – Duas. P – Então ele (H1W)cabe duas vezes ele cabe aqui (DH1) e quantas vezes ele (H1W) cabe aqui (H1W)? C – Uma só. P – Então dentro dessa linha DW o H1W cabe quantas vezes? C – Três vezes. P – Se eu chamei isso tudo aqui de x (DW), esse pedacinho (H1W) aqui é o que? C – Pode ser um y. P – Pode. Mas esse pedacinho (H1W) cabe quantas vezes dentro do x (DW)? C – Três vezes. P – Se ele cabe três vezes, então que fração ele representa da linha toda. C – Três. P – Que fração, ele é um pedaço da linha toda. C – Um terço.
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P – Esse pedaço aqui (H1W) é um terço dessa linha (DW). E esse pedaço aqui (DH1)? C – Dois terços. P – Dois terços. Isso mesmo. Então, se isso tudo aqui é x (DW), isso aqui (H1W) vai ser C – Um terço de x. P – E isso aqui (H1D)? C – Dois terços de x.
O Quadro 6 – Roteiro - apresenta o desempenho de cada um dos
estudantes no processo investigativo. “OK” significa que o estudante em questão
conseguiu realizar a atividade solicitada sem maiores dificuldades. “Parcial” será
utilizado quando o estudante não conseguiu atingir o objetivo numa primeira
tentativa, sendo necessárias maiores intervenções por parte do professor para
que o mesmo fosse atingido.
QUADRO 6 - Roteiro
Investigação sobre o Baricentro de um triângulo
AÇÃO ESTUDANTE A ESTUDANTE B ESTUDANTE C
I Solicitar que o estudante construa cinco triângulos utilizando Geogebra
OK OK OK
II Solicitar que identifique o ponto médio de cada um dos lados dos triângulos construídos.
OK OK OK
III Solicitar que trace os segmentos de reta que unem um vértice ao ponto médio do lado oposto a ele;
OK OK OK
IV Determinar o comprimento de cada um dos segmentos traçados
OK OK OK
V O estudante deve perceber que os segmentos interceptam-se num ponto comum, em todos os triângulos construídos
OK OK OK
VI O estudante deve perceber que o ponto de intersecção dos segmentos está mais próximo do vértice do que do ponto médio do lado oposto;
OK OK OK
VII Determinar a distância entre o ponto de intersecção dos segmentos e o vértice e a distância entre o ponto de intersecção dos segmentos e o ponto médio do lado oposto;
OK OK OK
VIII O estudante deve perceber a relação entre os valores obtidos nos itens 4 e 7 e representar tal situação simbolicamente
OK OK PARCIAL
Fonte: Elaborado pelo autor.
Primeiramente é importante salientar que existem inúmeros tipos de
padrões, dos mais variados graus de dificuldade. Os padrões aqui trabalhados
não estão, certamente, entre os mais complexos. Mas, de qualquer forma,
dentro do contexto ao qual se aplica e dentro da visão de Matemática que daqui
100
emerge, servem para análise. O Quadro 6 – Investigação sobre o baricentro de
um triângulo - mostra que não houve diferenças significativas entre os
estudantes na maior parte da atividade. Todos conseguiram realizar e perceber
os padrões estabelecidos.
As quatro primeiras ações são “operativas”, ou seja: bastava conhecer o
funcionamento do Geogebra para realizá-las. Entretanto, para executar com
sucesso a ação VIII, é imprescindível que os conceitos envolvidos nas ações
anteriores tenham sido bem construídos. Um fato que chamou a atenção do
pesquisador foi em relação à idéia de ponto médio, apresentada na ação III.
Inicialmente os estudantes A, B e C diziam saber o que era o ponto médio.
Entretanto, ao serem colocados a darem uma definição, não conseguiram
realizá-la de maneira apropriada, ou seja, eles passaram por um processo de
desestabilização que os fez perceber que o conceito que tinham acerca do
assunto era insuficiente para defini-lo com clareza. Segundo Vale et al. (2009),
padrões tem uma importância significativa na descoberta de conceitos,
propriedades e resolução de problemas em matemática.O software apresenta
respostas imediatas aos comandos dados pelos estudantes e isso permite ao
estudante confrontar suas idéias originais com aquilo que está presenciando.
Inicia-se, então, um processo de reflexão e de consciência do saber/não saber.
Se o resultado proveniente do software não foi o esperado, o estudante precisa
repensar seus conceitos, depurando-os. Valente (2002) afirma que os diferentes
níveis de abstração que ocorrem nestes dois momentos (reflexão e depuração)
permitem ao estudante construir novos conhecimentos.
Observe-se:
.
A - Ponto no meio de dois vértices... no triângulo. B - É o ponto que... é o ponto que fica no meio assim, entre os dois. C – Ponto médio é...a... o meio da reta.
Para que o conceito de ponto médio esteja “completo”, é fundamental que
se fale da distância entre pontos. Neste momento o Geogebra foi utilizado com o
intuito de auxiliar os estudantes na reconstrução de seus conceitos, servindo
como um instrumento de mediação entre o individuo e o conceito. A partir das
representações efetuadas através do software, os conceitos iniciais dos
estudantes sofreram modificações. Segundo Piaget é a partir de estruturas já
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construídas que o novo conhecimento é construído. Note-se o “novo conceito”
surge a partir do “velho”. Como já foi visto, Valente (2002) sugere que o
conhecimento se constrói sobre conhecimentos anteriores que serão superados.
Após as intervenções realizadas pelo professor, com apoio do software, o ponto
médio deixou de ser um apenas um ponto “no meio” para ser
B - A distância é a mesma. (referindo-se à distância entre o ponto médio e as extremidades do segmento considerado) C – Que o ponto médio vai ser a metade, vai ser o A e o Q vão ser iguais ao Q e o C.(mostrando que se Q é ponto médio de AC, então AQ = QC)
Outro momento fundamental da investigação relaciona-se à ação cinco. Após o
traçado das medianas os entrevistados perceberam que
B - Que esse ponto se mantém. Sempre tem um ponto de encontro.
e esta percepção pode ser, de forma intuitiva, é verdade, mas não por isso
menos válida, generalizada, a partir do momento em que o estudante, ao
modificar a posição de um dos vértices do triângulo, conseguiu perceber que
todas as mudanças ocorridas (medidas dos ângulos e medidas dos lados) não
afetavam o ponto de encontro dos segmentos:
P - Beleza, dá uma, faz um malabarismo aí, muda de lado... (referindo-se ao vértice escolhido para mover). Pode girar, fazer a volta que tu quiseres... O tamanho do triângulo está mudando, os lados estão mudando. Os ângulos internos estão mudando? B - Os ângulos mudam... P - Mas aquele ponto (referindo-se ao ponto de encontro dos segmentos)??? B - Não.
Na ação VI novamente o uso do software agilizou o processo de identificação de regularidades, conforme mostrado no diálogo abaixo: C – Tô certa porque essa linha (mostrando o segmento VH1) é menorzinha. Tá mais perto do ponto médio. P – Isso aconteceu... C – Em todos. P – Em todos. Então a gente poderia dizer que este ponto está mais próximo C – Dos pontos médios Novamente é importante perceber que a possibilidade de alterar a forma
da figura de forma dinâmica foi determinante para a percepção desta invariante.
E, portanto, o software continua, junto é claro com a mediação do professor, a
modificar a forma pela qual os estudantes percebem os padrões, tornando-a
mais rápida.
Na ação VIII os estudantes deveriam representar o padrão detectado por
102
meio de uma representação simbólica. Não foram detectadas diferenças
significativas em relação aos estudantes A e B, mas C precisou de um tempo
maior para realizar a tarefa.
Os estudantes A e B conseguiram representar de forma simbólica o
padrão detectado, sem necessidade de uma maior interferência do professor. As
respostas dadas por eles indicam que realmente se apropriaram das idéias
trabalhadas:
P - Tá. E o baricentro, ele divide cada uma dessas linhas... A - Em duas partes... P - Duas partes. Iguais? A - Diferentes, mas numa proporção de dois para um... P - E ta mais próximo sempre de quem? A - Do ponto médio...
não por terem “cumprido a tarefa”, mas pela forma como conseguiram expor seu
raciocínio, revelando que compreenderam o que estavam fazendo.Porque,
segundo Piaget (1978):
[...] fazer é compreender em ação uma dada situação em grau suficiente para atingir os fins propostos, e compreender é conseguir dominar, em pensamento, as mesmas situações até poder resolver os problemas por elas levantadas, em relação ao porquê e ao como das ligações constatadas e, por outro lado, utilizadas na ação (PIAGET, 1978, p. 176).
O estudante C apresentou dificuldade para representar o padrão
simbolicamente. Isso pode ser percebido no tempo de duração da entrevista
(34min), cerca de 50% a mais do que o tempo necessário para que os outros
estudantes realizassem a mesma atividade e nas inúmeras tentativas que fez
até acertar a resposta. No contexto da pesquisa esta situação foi muito
importante, porque revela que a percepção de um padrão e a sua representação
simbólica não se relacionam na forma de ação-reação, ou seja, o fato de alguém
identificar um padrão não é garantia de que será capaz de representá-lo
algebricamente. E aqui se estabelece um possível dilema: o que é mais
importante, identificar um padrão ou representá-lo simbolicamente. Aqui a opção
do pesquisador é clara: a percepção é mais fundamental e representativa do
pensamento matemático. Só se pode representar algebricamente algo que já
existe na mente como um padrão.
Os entrevistados A, B e C apresentam, como já foi relatado, vivências
103
completamente distintas em relação à Matemática. Mas, apesar disso, tiveram
desempenhos semelhantes, exceto pela última ação. Isso pode ser um indício
de que a identificação de padrões não esteja diretamente relacionada com o
desempenho escolar do estudante em Matemática, mas às interações que eles
estabelecem, mediados pelo professor e pelo instrumento (no caso o Geogebra)
com o objeto de estudo. A impressão deixada pelas entrevistas é a de que a
representação simbólica, esta sim, está, de algum modo ligada ao desempenho
escolar do estudante. O que ora se acaba de conjecturar é de extrema
importância porque se:
1. Matemática é a ciência dos padrões e,
2. A percepção de padrões não está ligada ao desempenho acadêmico
e,
3. A mediação é elemento fundamental nesse processo,
então a Matemática é acessível à quase totalidade dos seres humanos (não se
tem aqui condições de avaliar o impacto desta afirmação sobre indivíduos que
sejam portadores de necessidades especiais), conforme já afirmado por Devlin
(2004, p.294): “A tese que defendo nesse livro é que todo mundo tem a
capacidade básica – todos nós temos o “gene da matemática”.
3.2.3 3ª ETAPA
A terceira etapa da pesquisa tinha como relaciona-se com o objetivo
“avaliar o impacto de uma intervenção com uso do Geogebra na competência”
de perceber e representar simbolicamente padrões.
Nesta etapa da pesquisa foi aplicado um pós-teste aos participantes da
pesquisa (grupo de teste e grupo de controle). Este pós-teste foi concebido para
coletar evidências empíricas de que aqueles estudantes que se submeteram à
intervenção realizada desenvolveram uma habilidade de perceber padrões e
representá-los simbolicamente maior do que aqueles que não se submeteram a
tal intervenção.
Amostra 1: Grupo de Controle – 101 estudantes que não participaram da
sequência didática realizada.
104
Amostra 2: Grupo Experimental – 36 estudantes que participaram da
sequência didática realizada;
Foi aplicado o mesmo instrumento aos integrantes destas duas amostras.
O instrumento era composto por questões relacionadas à “habilidade de
perceber padrões (numéricos, geométricos) e perceber e representar
simbolicamente padrões em trigonometria.” As questões, em número de
dezessete, eram objetivas, com cinco alternativas em cada uma.
O Gráfico 14 - Participação no pós-teste - indica o número de estudantes
que se esperava participassem do pós-teste e os que efetivamente participaram:
GRÁFICO 14 - Participação no pós-teste
Fonte: Elaborado pelo autor.
Percebe-se que aproximadamente 83,2% dos integrantes do grupo de
controle participaram do pós-teste, enquanto que o percentual dos integrantes
do grupo experimental ficou em torno de 52,8%. Duas observações são
importantes para que se avalie tais números: primeiro, o pós-teste foi opcional,
ou seja, coube ao indivíduo a decisão de participar ou não da atividade. Como
se percebe, alguns optaram por não fazê-lo (notar a diferença entre o número
esperado e o número observado); segundo, no grupo experimental não houve
ingresso de integrantes, uma vez que este grupo era constituído por estudantes
101
36
84
19
0
20
40
60
80
100
120
GC GE
Nº Esperado
Nº Observado
105
que, em 2013, estavam na turma que participou da sequência didática. E um
número considerável desses estudantes saiu da escola no final do ano de 2013.
Infelizmente, porém, após a realização do pós-teste, descobriu-se que os
dados oriundos de uma das turmas que compunham o grupo de controle
poderiam estavam corrompidos, uma vez que não foi dada a devida atenção
pelo aplicador ao caráter individual da atividade. Para garantir que os resultados
representassem o mais fielmente possível a realidade, todos os dados relativos
a esta turma foram excluídos da análise. Ao todo, 32 avaliações do grupo de
controle foram descartadas e o número de integrantes do grupo de controle
considerado para a analise caiu de 84 para 52, representando, portanto, pouco
mais de 50% do público esperado.
Para responder a pergunta de pesquisa foi definida a seguinte hipótese: a
média do escore no Grupo Experimental será maior que a média do escore do
Grupo de Controle, ou seja,
O Gráfico 15 - Médias no pós teste apresenta a média dos estudantes,
ressaltando que o grupo de controle é constituído por estudantes das turmas A,
B e C e o grupo experimental por estudantes da turma D.
106
GRÁFICO 15 - Médias no pós teste
Fonte: Elaborado pelo autor.
Inicialmente observou-se que as médias do grupo de controle ficaram
maiores do que as médias do grupo experimental. Tendo em vista o problema
ocorrido, as médias sofreram alterações, e assumiram a distribuição mostrada
no Gráfico 16 - Médias consideradas do pós-teste:
7,2
7,6
7
7,3
6,7
6,8
6,9
7
7,1
7,2
7,3
7,4
7,5
7,6
7,7
Questões sobre Trigonometria Questões gerais
GC
GE
107
GRÁFICO 16 - Médias consideradas do pós-teste
Fonte: Elaborado pelo autor.
Observa-se que as médias do grupo experimental, após a exclusão dos
dados corrompidos, tornaram-se maiores do que as médias do grupo de
controle. Entretanto, essa diferença não foi significativa, conforme foi verificado
pelos testes realizados. Com o teste F buscou-se identificar se havia igualdade
de variâncias. Foram realizados os testes F, T e Z. Com o teste F buscou-se
identificarse havia igualdade de variâncias. O teste T serviu para testar a
hipótese de diferença entre os escores médios dos grupos com um grau de
confiança determinado. Já o teste Z foi utilizado para comparação de
proporções.
Todos os testes realizados mostraram não existir diferenças
significativas entre os resultados dos dois grupos
Portanto, a hipótese de que a média do grupo experimental seria maior do
que a média do grupo de controle não foi verificada.
É fundamental ressaltar que o pós-teste foi realizado em setembro de
2014, quase um ano após a realização da intervenção didática junto aos
indivíduos do grupo experimental, fato este que pode ter afetado os resultados.
Serão apresentados, agora, as descobertas realizadas a partir dos
resultados da prova (pós-teste). Todos os cálculos foram realizados no Excell.
A Tabela10 – Estatística das amostras -fornece elementos estatísticos
6,4
7,1
6,7
7,2
6
6,2
6,4
6,6
6,8
7
7,2
7,4
Questões sobre Trigonometria Questões gerais
GC
GE
108
importantes relativos às as duas amostras utilizadas no experimento. Atenção
especial à media, mediana e ao desvio-padrão, os quais serão utilizados
posteriormente para verificar possíveis alterações oriundas da aplicação da
intervenção didática.
Tabela 10 - Estatística das amostras
GC
GE Média 7,082692308 Média 7,166666667
Erro padrão 0,198271588 Erro padrão 0,39092889
Mediana 7,2 Mediana 7,2
Modo 7,2 Modo 8,9
Desvio padrão 1,429756753 Desvio padrão 1,791461229
Variância da amostra 2,044204374 Variância da amostra 3,209333333
Curtose 0,207318085 Curtose 0,882266377
Assimetria -0,363295708 Assimetria -1,089495941
Intervalo 6,7 Intervalo 6,6
Mínimo 3,3 Mínimo 2,8
Máximo 10 Máximo 9,4
Soma 368,3 Soma 150,5
Contagem 52 Contagem 21
Maior(1) 10 Maior(1) 9,4
Menor(1) 3,3 Menor(1) 2,8
Nível de confiança(99,0%) 0,530519694
Nível de confiança(99,0%) 1,112325492
Fonte: Elaborada pelo autor.
A utilização do teste F permitiu identificar a igualdade das variâncias entre
as amostras ( ) e, assim sendo, indicou o tipo de teste T que seria
adequado para a comparação entre as médias (teste T para duas amostras
independentes com variâncias iguais), conforme apresentado na Tabela 11 –
Teste F -:
109
Tabela 11 - Teste F
Teste-F: duas amostras para variâncias
GC GE
Média 7,082692308 7,166666667
Variância 2,044204374 3,209333333
Observações 52 21
Gl 51 20
F 0,636956078 P(F<=f) uni-caudal 0,098510805 F crítico uni-caudal 0,561842225 Fonte: Elaborada pelo autor.
Utilizou-se o teste T do Excell para verificar a hipótese experimental. O
resultado encontrado está destacado na Tabela 12 – Teste T - abaixo:
Tabela 12 - Teste T
Teste-t: duas amostras presumindo variâncias equivalentes
GC GE
Média 7,082692308 7,166666667
Variância 2,044204374 3,209333333
Observações 52 21
Variância agrupada 2,372409715 Hipótese da diferença de média 0 gl 71 Stat t -0,21086366 P(T<=t) uni-caudal 0,416798846 t crítico uni-caudal 1,666599659 P(T<=t) bi-caudal 0,833597692 t crítico bi-caudal 1,993943341
Fonte: Elaborada pelo autor.
O valor calculado foi comparado com um valor crítico tabelado que
depende do grau de confiança utilizado. Neste caso o valor encontrado é menor
que o valor crítico tabelado para o grau de confiança estabelecido. Diante deste
resultado não foi possível rejeitar a hipótese nula, ou seja, não conseguiu-se
evidências estatísticas de que a média do grupo experimental fosse maior do
que a media do grupo de controle.
Embora não tenha sido validada a hipótese alternativa, houve algo de
positivo e que merece atenção: a média do grupo experimental também não é
inferior à média do grupo de controle, mesmo o pós-teste ter acontecido quase
110
um ano após a intervenção didática. Este fato pode ser um indício de que as
aprendizagens construídas ao longo da intervenção didática foram reais e
conservaram-se ao longo do tempo.
O Gráfico 17 – Comparação de acertos por questão – GC x GE -
apresenta um comparativo, em termos percentuais, de acertos nas questões do
pós-teste pelos sujeitos do grupo de controle e do grupo experimental:
GRÁFICO 17 - Comparação de acertos por questão – GC x GE
Fonte: Elaborado pelo autor
Na primeira parte da prova (padrões em geral) o grupo de controle obteve
melhores resultados em sete das onze questões, um percentual de
aproximadamente 63,3%; já o grupo experimento apresentou melhores
resultados em quatro das onze questões, algo próximo de 36,4%. Na segunda
parte da prova (padrões em trigonometria) o grupo de controle apresentou
melhor resultado em uma das sete questões, aproximadamente 14,3%. Por sua
vez o grupo experimental destacou-se, obtendo melhor resultado em seis das
sete questões propostas, um percentual de aproximadamente 85,7%. Este
número é significativo se for utilizado como base para uma analise qualitativa: o
estudo das razões trigonométricas tendo como suporte o Geogebra produz
aprendizagens, no mínimo, similares àquelas promovidas pelas tecnologias
“tradicionais”.
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
GC
GE
111
Na Tabela 13 – Teste Z (questões do pós-teste) -, tem-se os resultados
do Teste Z para a diferença de proporções:
Tabela 13 - Teste Z (questões do pós-teste)
QUESTÃO Q1 Q2 Q3 Q4 Q5 Q6 Q7 Q8 Q9
GC 0,92 0,81 0,69 0,69 0,98 0,62 0,88 0,5 0,79
GE 1 0,86 0,67 0,62 0,81 0,86 0,81 0,62 0,67
Z 1,31 -0,5 0,21 0,6 *2,62 -2,01 0,84 -0,9 1,09
QUESTÃO Q10 Q11 Q12 Q13 Q14 Q15 Q16 Q17 Q18
GC 0,44 0,96 0,92 0,67 0,62 0,62 0,77 0,5 0,37
GE 0,43 0,86 0,95 0,57 0,62 0,71 0,81 0,52 0,52
Z 0,11 1,6 -0,45 0,82 -0,03 -0,8 -0,38 -0,18 -1,25
Fonte: Elaborada pelo autor.
O teste Z foi aplicado às questões com o intuito de verificar quais
questões apresentaram melhoras na proporção de acertos, lembrando que as
questões de 1 a 11 referem-se a padrões gerais, enquanto que as questões de
12 a 18 estão relacionadas com padrões em trigonometria.A questão 05
apresentou melhoria com grau de confiança de 95%. Esta questão refere-se à
percepção de um padrão numérico em uma dada sequência. Para as demais
questões o Teste Z para a diferença de proporções não indicou melhora na
proporção.
112
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista o objetivo geral desta pesquisa - avaliar de que forma o
uso do Geogebra pode contribuir para fazer com que os estudantes aprendam
Matemática ao desenvolver a habilidade de perceber padrões – esperava-se que
os resultados apontassem para:
1 – uma concepção tradicional do que é a Matemática, por parte dos
estudantes, e que acaba comprometendo a aprendizagem;
2 – A validação da hipótese, mostrando que o uso do Geogebra auxilia no
desenvolvimento da habilidade de perceber padrões;
É fundamental retomar aqui os objetivos específicos desta pesquisa, para
que se possa avaliar o que ora foi feito com base no alcance ou não desses
objetivos. A discussão que segue será feita em função do processo exploratório
que buscou dar conta de cada um deles.
O primeiro objetivo da pesquisa era o de conhecer as concepções dos
estudantes acerca do que seja a Matemática. Os resultados apontaram para o
que há muito já se sabe, quer seja, a idéia de que a Matemática é a “ciência das
contas”. Pudera. Grande parte do tempo que o estudante passa diante da
Matemática é destinado para este fim. A escola continua a reforçar esta postura,
principalmente porque os professores, em sua maioria, acreditam que realmente
a Matemática é isto mesmo e, intencionalmente ou não, acabam perpetuando
suas crenças e convicções em seus alunos. Neste contexto o professor deveria
tornar-se um animador da inteligência coletiva dos grupos que estão ao seu encargo. Sua atividade será centrada no acompanhamento e na gestão das aprendizagens: o incitamento à trocados saberes, a mediação relacional e simbólica, a pilotagem personalizada dos percursos de aprendizagem, etc. (LÉVY, 1999 p.171)
Mas, ao não agir assim, a proposta da pesquisa que relaciona de forma
indissociável a construção do conhecimento matemático com a habilidade de
perceber padrões, fica como a semente jogada em terra seca, não vinga, não
produz frutos. Infelizmente ainda tem-se, na maioria das escolas, um trabalho
algebrista, como mencionado por Felicetti e Giraffa (2012, p.58):
113
Mesmo os bons alunos em Matemática tem uma visão muito limitada da mesma. Manipulam corretamente a Aritmética, a Álgebra, mas apresentam dificuldades em relacioná-las com situações cotidianas, e sentem limitações nas atividades que requerem o pensar. Isto nos faz perceber que a Matemática vem sendo trabalhada de forma muito descontextualizada, desarticulada do pensar, do fazer e compreender, mas sim de forma decorada, instrucionista e, principalmente, algebrista. (FELICETTI eGIRAFFA,2012, p..58)
É notório o valor dado pelos estudantes ao cálculo escrito e à resolução
tradicional de problemas. Qualquer pensamento diferente já os tira da zona de
conforto e os incomoda. Mais intrigante, ainda, é a dificuldade que eles tem de
aceitar o uso das novas tecnologias nas aulas de Matemática. Em aulas com os
estudantes do terceiro ano do ensino médio, resoluções criativas de muitos
problemas propostos no livro didático e realizadas com o auxílio do Geogebra
são desprezadas, colocados em um nível inferior. Quantas vezes ouvi os alunos
se manifestarem perguntando se “não iriam fazer do jeito certo”, referindo-se ao
uso do papel e do lápis. O principal argumento ,mesmo nos anos finais do
ensino fundamental, é o de que “no vestibular não é permitido o uso desses
recursos”. Inove-se com um barulho desses...
Apesar deste panorama difícil a pesquisa acena com uma nova forma de
se ver e se fazer Matemática, a partir da colaboração com o outro. Saliente-se
que uma parcela dos estudantes citou como experiência positiva em Matemática
a possibilidade de ajudar/ou ser ajudado, mediante a tutoria. depoimentos são
significativos e revelam que embora o jogo esteja difícil, ele ainda não foi
perdido. E vale a pena investir em novas formas de se trabalhar a Matemática na
escola, sem que ela esteja centrada no professore em processos que não
reconheçam o valor da diversidade e da diferença como forma de construção de
conhecimento, inclusive o matemático.
Um dos momentos mais importantes desta pesquisa foi a intervenção
didática realizada com os estudantes do grupo experimental, no final de 2013,
tendo o Geogebra como elemento fundamental. Esta intervenção está
diretamente ligada com o objetivo de analisar o processo de identificação de
padrões, em trigonometria, por parte dos estudantes. Foi uma experiência muito
significativa porque foi possível, pelo menos por algumas semanas, fazer um
novo tipo de Matemática, criadora, investigativa, democrática e, ainda sim,
Matemática. O uso do Geogebra mostrou-se de um valor inestimável,
principalmente porque permitiu que muitos estudantes tivessem uma experiência
114
diferente com a Matemática e com a construção do conhecimento. Estudantes
que sempre viveram escondidos atrás do medo, da baixa auto-estima, do
fracasso conseguiram, a seu tempo e modo, aprender Matemática. As
entrevistas realizadas trouxeram à tona elementos importantes na construção do
conhecimento, da construção de conceitos, das aproximações sucessivas para
reconstruir significados. Nessa perspectiva, o Geogebra assume o papel de
instrumento, tal qual sugerido por Vygotsky. Segundo ele entende-se por
mediação como sendo um processo pelo qual a ação do indivíduo sobre um
determinado objeto (a Matemática) é mediada por um determinado elemento (o
Geogebra). Como o próprio termo sugere, mediar é estar “no meio”, é “estar
entre” e o Geogebra desempenha, em simbiose com o professor, este papel.
Na intervenção ficou claro para o pesquisador que a percepção de
padrões, do ponto de vista do “pensar matematicamente”, é muito mais
significativo do que a mera aplicação de algoritmos, particularmente com o uso
do Geogebra, por permitir a exploração, a investigação de novas possibilidades.
Convém lembrar Ferreiro (2000, p.31) quando afirma que “nenhuma prática
pedagógica é neutra. Todas estão apoiadas em certo modo de conceber o
processo de aprendizagem e o objeto dessa aprendizagem”.
Urge salientar que, após a intervenção didática com uso do Geogebra, os
estudantes foram colocados diante dos exercícios propostos pelo livro-didático,
muitos dos quais, digamos, “tradicionais”. E, diga-se, não encontraram
dificuldades para resolvê-los, mesmo não tendo sido treinados para fazê-los. Os
resultados obtidos em avaliações internas (provas) não indicavam nenhum tipo
de inferioridade em relação aos estudantes que haviam participado de aulas
“tradicionais” (sem uso do Geogebra). Destacam-se, ainda, os seguintes fatos
associados à intervenção didática:
Participação ativa dos estudantes em todos os momentos;
O professor (mediador) não precisou chamar atenção dos
estudantes por estarem fazendo outras coisas, desinteressados;
Os constantes pedidos para sair de sala (particularmente para ir ao
banheiro) foram praticamente zerados;
Houve intensa colaboração entre os estudantes, uma vez que a
conversa, o diálogo, o levantar e ajudar alguém no outro lado da
sala não seriam vistos como “ato de indisciplina”;
115
Muitos estudantes “baixaram” o software em seus computadores
de uso pessoal para “brincar” com o Geogebra;
Em relação ao terceiro objetivo específico, avaliar o impacto de uma
intervenção com uso do Geogebra na habilidade de perceber e representar
simbolicamente padrões, os dados obtidos não permitiram concluir que a média
dos estudantes do grupo experimental, num pós-teste (prova categorizada),
seria maior do que a média dos estudantes do grupo de controle. Os dados
indicam uma equivalência entre essas médias. Neste ponto é imprescindível
uma análise sobre o caminho traçado pelo estudantes do grupo de experimental.
Durante o ano de 2013 esse grupo de estudantes desenvolveu algumas
atividades utilizando o Geogebra e com ênfase na percepção de padrões:
quando estudaram o Teorema de Tales e no estudo dos polígonos regulares.
Depois no estudo da trigonometria (intervenção didática que serviu como ponto
de partida para esta pesquisa). Depois, durante o ano de 2014, não utilizaram
mais o Geogebra com a finalidade de perceber padrões, mas de uma forma
meramente substitutiva (como para construir o gráfico de uma função do 2º grau,
por exemplo.).
Acredito que educação seja processo. E não serão ações pontuais que
consolidarão mudanças significativas no processo de construção de
conhecimentos matemáticos com o uso do Geogebra. É fundamental que o uso
do software seja uma “política escolar”, ou seja, deve estar presente no dia-a-dia
do estudante. Só assim as novas tecnologias, e particularmente o software
utilizado na pesquisa, passarão efetivamente a serem vistas como instrumentos
e aprendizagem.
Diante da realidade em que se encontra a educação brasileira,
particularmente a educação matemática, é fundamental que se investigue e se
busquem alternativas para tornar os processos de aprender e ensinar
matemática mais eficientes e eficazes. E, por trazer à tona a discussão acerca
do potencial do Geogebra neste processo, esta pesquisa se justifica e se faz
relevante.
116
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APÊNDICE1
Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação, Extensão e Cultura – ProPPEC Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE
Curso de Mestrado Acadêmico
QUESTIONÁRIO
Identifique seu número e sua turma em 2014: Nº___ Turma: 1º [A][B][C][D]
1) Para você, o que é Matemática? 2) Descreva uma experiência positiva que você já teve com a Matemática em sua vida
3) Descreva uma experiência negativa que você já teve com a Matemática em sua vida? Qual das frases abaixo representa melhor sua opinião em relação à Matemática? [Assinale apenas uma]
Uma matéria que ensina a calcular as coisas
Uma ferramenta que me permite compreender o mundo
Em 2013você estudava em qual turma? 9º A 9º B 9º C 9º D
Muito obrigado por sua participação!
INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA
Título Uma experiência de uso das TIC´s na descoberta de padrões em trigonometria Pesquisador/Orientador Valdir J. Corrêa Júnior – vava_prof@hotmail.com Professor Orientador - Doutor André Luis Alice Raabe Objetivo Identificar as percepções e concepções que os estudantes têm sobre Matemática, através da aplicação de um questionário, que será aplicado aos estudantesde 07/07/2014 a 11/07/2014, no período matutino. O tempo previsto para se responder ao questionário é de quinze minutos. Importante Os dados serão tratados de modo a garantir absoluto sigilo em relação às informações prestadas e seguindo a ética acadêmica da pesquisa. Será reservado o direito de anonimato, ou seja, o estudante poderá responder às questões apresentadas sem precisar identificar-se.
123
APÊNDICE 2
Roteiro para análise – Método Clínico
Investigação sobre o Baricentro de um triângulo
1- solicitar que o estudante construa cinco triângulos utilizando Geogebra;
2- solicitar que identifique o ponto médio de cada um dos lados dos triângulos
construídos.
3- solicitar que trace os segmentos de reta que unem um vértice ao ponto médio
do lado oposto a ele;
4- determinar o comprimento de cada um dos segmentos traçados;
5 - O estudante deve perceber que os segmentos interceptam-se num ponto
comum, em todos os triângulos construídos;
6- O estudante deve perceber que o ponto de intersecção dos segmentos está
mais próximo do vértice do que do ponto médio do lado oposto;
7- determinar a distância entre o ponto de intersecção dos segmentos e o vértice
e a distância entre o ponto de intersecção dos segmentos e o ponto médio do
lado oposto;
8 - O estudante deve perceber a relação entre os valores obtidos nos itens 4 e 7
e representar tal situação simbolicamente;
124
APÊNDICE 3
PÓS-TESTE
125
126
127
128
129
130
131
ANEXOS
Anexos disponíveis nos endereços eletrônicos listados abaixo.
Anexo A:
http://download.inep.gov.br/acoes_internacionais/pisa/marcos_referenciais/2013/
matriz_avaliacao_matematica.pdf
Anexo B:
http://download.inep.gov.br/educacao_basica/prova_brasil_saeb/escala/2011/esc
ala_desempenho_matematica_medio.pdf
Anexo C:
http://download.inep.gov.br/educacao_basica/prova_brasil_saeb/escala/2011/esc
ala_desempenho_matematica_medio.pdf
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